ESCOLA DE GUERRA NAVAL CC (EN) Charles Fernandes da Silva
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ESCOLA DE GUERRA NAVAL
CC (EN) Charles Fernandes da Silva
ASPECTOS POLÍTICOS DO EMPREGO DE SUBMARINOS DE PROPULSÃO
NUCLEAR:
POLÍTICA DE OFFSETS APLICADA PARA O DESENVOLVIMENTO TECNOLÓGICO
DE VÁLVULAS DE CASCO PARA O SUBMARINO NUCLEAR BRASILEIRO
Rio de Janeiro
2019
CC (EN) Charles Fernandes da Silva
ASPECTOS POLÍTICOS DO EMPREGO DE SUBMARINOS DE PROPULSÃO
NUCLEAR:
POLÍTICA DE OFFSETS APLICADA PARA O DESENVOLVIMENTO TECNOLÓGICO
DE VÁLVULAS DE CASCO PARA O SUBMARINO NUCLEAR BRASILEIRO
Monografia apresentada à Escola de GuerraNaval como requisito parcial para aconclusão do Curso Superior.
Orientador: CMG Maurício do NascimentoPinto
Rio de Janeiro
Escola de Guerra Naval
2019
RESUMO
A política nacional de offsets está presente no Programa de Desenvolvimento de Submarinos
que tem como principal objetivo a obtenção do primeiro submarino com propulsão nuclear
brasileiro. O Brasil possui diversos instrumentos legais que norteiam esta política que se
baseia no uso do poder de compra do Estado em aquisições militares internacionais para se
obter compensações do Estado exportador. O Brasil busca com estas compensações benefícios
tais como: desenvolvimento tecnológico, independência externa, inovação na indústria
brasileira, fomento da base industrial brasileira, e desenvolvimento de setores estratégicos.
Nesse contexto, esta pesquisa analisou o caso da nacionalização das válvulas de casco para
emprego no futuro submarino nuclear decorrente de uma parceria estratégica firmada com a
França em 2008. A pesquisa bibliográfica realizada sobre políticas de offsets estabeleceu os
pressupostos teóricos no sentido de verificar a viabilidade de seus objetivos que, segundo os
autores pesquisados, não seriam facilmente constatáveis. Esta pesquisa responde a seguinte
questão: É possível evidenciar os benefícios da política de offsets aplicada no projeto de
nacionalização de válvulas de casco? A importância desta pesquisa está em, ao responder à
pergunta proposta, constatar se o Estado estaria utilizando adequadamente o seu poder de
barganha para a consecução de objetivos nacionais. Por meio de pesquisa direta com coleta de
dados de entrevistas com atores envolvidos no processo, concluiu-se que foi possível
evidenciar vantagens da política de offsets quanto aos aspectos de inovação, independência
estrangeira, fomento à base industrial de defesa, além da relevante participação da
Universidade Federal do Rio Grande do Sul.
Palavras-chaves: Política de offsets. Nacionalização. Submarino nuclear. Válvulas de casco.
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS
BC - Brazilian Company1
BID - Base Industrial de Defesa
CCIM - Centro de Controle Interno da Marinha
CENPES Centro de Pesquisas Leopoldo Américo Miguez de Mello
COGESN - Coordenadoria-Geral do Programa de Desenvolvimento de Submarino comPropulsão Nuclear.
DCNS - Direction de Constructions Navales, Services et Systèmes2
DEN - Diretoria de Engenharia Naval
EMA - Estado-Maior da Armada
END - Estratégia Nacional de Defesa
ECTFE - Etileno clorotrifluoroetileno
FAB - Força Aérea Brasileira
MB - Marinha do Brasil
ICT - Instituição Científica, Tecnológica e de Inovação
LAMEF - Laboratório de Metalurgia Física
LDO - Lei de Diretrizes Orçamentárias
MD - Ministério da Defesa
OJT - On-the-job training3
OM - Organização Militar
PETROBRAS - Petróleo Brasileiro S.A.
P&G - Petróleo e gás natural
PND - Política Nacional de Defesa
1 Brazilian company é um termo da língua inglesa que pode ser traduzido para a língua portuguesa como“empresa brasileira” (Tradução nossa).2 Direction de Constructions Navales et Services é um termo da língua francesa que pode ser traduzido para alíngua portuguesa como “Direção de Construções Navais e Serviços” (Tradução nossa).3 On-the-job training é um termo da língua inglesa que pode ser traduzido para a língua portuguesa como“formação no local de trabalho” (Tradução nossa).
PROSUB - Programa de Desenvolvimento de Submarinos com Propulsão Nuclear
RFQ - Request for Quotation4
SN-BR - Submarino Nuclear Brasileiro
ToT - Transference of Technology5
UFRGS - Universidade Federal do Rio Grande do Sul
4 Request for Quotation é um termo da língua inglesa que pode ser traduzido para a língua portuguesa como“pedido de cotação” (Tradução nossa).5 Transference of Technology é um termo da língua inglesa que pode ser traduzido para a língua portuguesa como“transferência de tecnologia” (Tradução nossa).
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO................................................................................................................6
2 POLÍTICAS DE OFFSETS NA ÁREA DA DEFESA.................................................8
2.1 Características gerais das políticas de offsets..................................................................8
2.2 Política brasileira de offsets militares.............................................................................10
2.3 Os offsets no PROSUB....................................................................................................12
3 PROJETO DE NACIONALIZAÇÃO DE VÁLVULAS DE CASCO......................14
3.1 O processo de nacionalização e transferência de tecnologia.........................................14
3.2 Inovação e desenvolvimento tecnológico........................................................................16
3.3 Participação de instituição de ensino.............................................................................17
3.4 Independência estrangeira e fomento à BID...................................................................19
4 CONCLUSÃO...............................................................................................................20
REFERÊNCIAS............................................................................................................23
ANEXOS........................................................................................................................28
APÊNDICES..................................................................................................................41
6
1 INTRODUÇÃO
No intuito de obter o primeiro submarino nuclear6 brasileiro (SN-BR), em 23 de
dezembro de 2008 o Governo Federal estabeleceu parceria estratégica com o governo francês.
Os termos do acordo intergovernamental definiram a assessoria francesa, por intermédio da
empresa então denominada Direction de Constructions Navales et Services (DCNS)7, para
todas as fases do projeto do SN-BR, exceto a planta nuclear e instalações associadas que estão
sendo desenvolvidas com tecnologia inteiramente nacional. (BRASIL, 2015).
Para viabilizar a construção do SN-BR em território nacional, foram construídos
no município de Itaguaí/RJ pela empresa Odebrecht, com assessoria de projeto francesa, um
estaleiro de construção e um estaleiro de fabricação de estruturas metálicas. Além destes
estaleiros, está em construção uma base naval de submarinos e um estaleiro de manutenção
ambos em Itaguaí. (BRASIL, 2019a; 2019b; 2019c).
Este empreendimento da Marinha do Brasil (MB) faz parte do Programa de
Desenvolvimento de Submarinos (PROSUB) que ainda contempla a construção de quatro
submarinos convencionais também com transferência de tecnologia da Naval Group. Este
programa constitui o maior programa de capacitação tecnológica industrial da história
nacional representando investimentos na ordem de R$ 23 bilhões. (LANA, 2014).
As importações brasileiras de produtos de defesa (PRODE)8 são reguladas no
âmbito do Ministério da Defesa por meio da portaria normativa no. 764, de 27 de dezembro
de 2002. Este dispositivo legal obriga a adoção de Política de Compensação9 Comercial,
Industrial e Tecnológica nas aquisições de PRODE que superem os cinco milhões de dólares
americanos. (BRASIL, 2002). O PROSUB, por estar inserido nesta política, possui, dentre
seus sete contratos, um contrato específico com a Naval Group que trata sobre offsets. Estes
offsets referem-se às compensações em forma de know-how por transferência de tecnologia e
assistência técnica francesa. Assim, por meio destes offsets está sendo possível a
6 O Glossário de Vocábulos e Expressões Básicas de Uso na Marinha estabelece que submarino nuclear é "a“denominação dos submarinos dotados de sistema propulsor nuclear.” (BRASIL, 1981b, p. 113).7 A Direction de Constructions Navales et Services (DCNS), é um grupo francês com mais de 350 anos deexperiência na construção de navios de guerra e uma das líderes mundiais no setor, a DCNS garante ao Brasil atransferência da mais moderna tecnologia na construção de submarinos. Em 28 de junho de 2017 a DCNS passaa denominar-se Naval Group. (BRASIL, 2019c).8 Produtos de defesa (PRODE) são aqueles utilizados nas "atividades finalísticas de defesa, com exceçãodaqueles de uso administrativo." (BRASIL, 2012).9 Compensação refere-se a "toda e qualquer prática acordada entre as partes, como condição para a compra oucontratação de bens, serviços ou tecnologia, com a intenção de gerar benefícios de natureza tecnológica,industrial ou comercial."(BRASIL, 2012). Esta pesquisa adota os termos compensação e offset com sentidosequivalentes.
7
nacionalização de equipamentos e sistemas para aplicação no submarino nuclear e nos
submarinos convencionais brasileiros. (BRASIL, 2019b).
O problema identificado para a presente pesquisa surge da conclusão de alguns
autores que, após analisarem o tema políticas de offsets, expuseram a dificuldade em se obter
evidências que resultariam em vantagens para o País importador de produtos bélicos. Este
problema é relevante pois uma ineficácia nesta política representaria prejuízo financeiro ao
Governo importador. Isto deve-se ao fato de, ao impor medidas compensatórias nos contratos
de aquisição, o Estado estaria pagando valores mais elevados e ainda deixando de usar seu
poder de barganha para obtenção de descontos junto ao exportador.O objetivo desta pesquisa é analisar os resultados no campo do desenvolvimento
tecnológico advindos do projeto de nacionalização da fabricação e fornecimento de válvulas
de casco de submarinos pela empresa Micromazza10. Este projeto é parte do Programa de
Nacionalização, que consiste em uma das medidas compensatórias previstas no contrato de
offsets do PROSUB. Esta transação foi selecionada para o estudo de caso pelo fato de se tratar
de um offset diretamente relacionado ao PROSUB e por envolver aspectos de capacitação
tecnológica mediante transferência de tecnologia estrangeira. Cabe ressaltar que as válvulas
de casco são itens críticos para a integridade de um submarino e que sua produção autóctone11
contribuiria favoravelmente para a promoção de nossa autonomia produtiva e tecnológica, que
é um dos objetivos nacionais12 de defesa previstos na Política Nacional de Defesa (PND)13.Assim, baseando-se no problema definido e no objetivo a ser alcançado, a
pesquisa analisará o caso concreto citado cujas conclusões deverão responder à seguinte
questão: É possível evidenciar os benefícios da política de offsets do PROSUB aplicada no
projeto de nacionalização de válvulas de casco? Esta pesquisa descritiva utilizará o método dedutivo14 cujas premissas estarão
baseadas em conceitos e análises obtidos em pesquisa bibliográfica especializada, além de
bases normativas brasileiras relacionadas ao tema que serão desenvolvidas na segunda seção
desta Monografia. Será analisado na terceira seção o caso concreto por meio de técnica direta
10 O Grupo Micromazza, localizado no município de Vila Flores/RS trabalha na fabricação e desenvolvimento deprojetos de válvulas de dimensões, classes de pressão e aplicações diversas, além de outros componentes para aindústria petrolífera. (MICROMAZZA, 2019).11 O termo autóctone refere-se à: "que tem origem no local ou onde se manifesta.". (AUTÓCTONE, 2019, s.p.).12 Os objetivos nacionais "são aqueles que a Nação busca alcançar, em decorrência da identificação denecessidades, interesses e aspirações, ao longo das fases de sua evolução histórico-cultural." (BRASIL, 2017, p.1.1).13 A PND é a "política de Estado, voltada para ameaças externas, que tem por finalidade fixar os objetivos para adefesa da Nação e, também, orientar o preparo e o emprego da capacitação nacional, com o envolvimento dossetores civil e militar, em todos os níveis e esferas de poder [...]".(BRASIL, 2017, p.201).14 O método dedutivo é um tipo de método científico que se caracteriza por se destinar em suas conclusões aexplicar as premissas adotadas não gerando um novo conhecimento (MARCONI; LAKATOS, 2003).
8
de coleta de dados de entrevistas com atores envolvidos naquele projeto de nacionalização.
Assim, serão realizadas correlações do estudo de caso com as premissas anteriormente obtidas
na pesquisa bibliográfica. Finalmente, na quarta seção, os resultados da pesquisa qualitativa
obtidos no estudo de caso serão analisados a fim de se deduzir as conclusões no intuito de se
responder à pergunta formulada.
2 POLÍTICAS DE OFFSETS NA ÁREA DA DEFESA
Esta seção apresenta conceitos fundamentais sobre offsets aplicados à PRODE,
aspectos relacionados com a Política de Offsets no PROSUB, assim como os pressupostos
teóricos que servirão de base para a análise do caso concreto da nacionalização das válvulas
de casco do PROSUB que será realizada na próxima seção.
2.1 Características gerais das políticas de offsets
Os offsets são obrigações contratuais que estabelecem exigências de
contrapartidas como condições para a compra de bens e serviços de fornecedores estrangeiros.
Estas compensações são normalmente reguladas pelos Ministérios de Defesa dos países
envolvidos e podem ser do tipo diretas, quando as contrapartidas estão relacionadas com o
objeto principal contratado, ou indiretas, quando não têm relação com os produtos
importados. (DHOFF, Kevin; DOWD, John; KWON, 2014). Taylor (2004) ressalta que a
decisão pela aplicação de offsets na modalidade direta ou na modalidade indireta, está
relacionada com os objetivos a serem alcançados. Se o Estado comprador deseja se valer
destas práticas a fim de se reduzir os riscos envolvidos na transação com outro Estado
estrangeiro, os offsets diretos são mais adequados. Por outro lado, se o Estado comprador
almeja resultados mais amplos com maiores efeitos para o desenvolvimento econômico, os
offsets indiretos são os mais indicados. O caso a ser analisado nesta pesquisa é um offset
direto, considerando se tratar de nacionalização de um componente a ser empregado para a
obtenção dos submarinos convencionais e do SN-BR, sendo este último o objetivo principal
dos contratos do PROSUB.
Dumas (2004) identifica nestas práticas compensatórias uma forma de os
governantes atenuarem as resistências daqueles que seriam politicamente contrários aos altos
custos envolvidos nas importações de PRODE. Isto devido ao fato de poderem ser usados a
favor os argumentos sobre os benefícios advindos daquelas práticas.
9
Neste sentido, esta Monografia se dedicará a verificar se os benefícios
relacionados por Dumas (2004) com relação ao incremento das habilidades da força de
trabalho nacionais, ao serem exigidas transferências de tecnologias mais desenvolvidas,
aumento da relação custo/benefício da transação internacional, e desenvolvimento tecnológico
e industrial nacionais estão presentes no estudo de caso proposto.
Taylor (2004) observa que por meio das políticas de offsets o Governo pode
atingir múltiplos objetivos incluindo apoio a indústrias estratégicas, ganho de novos mercados
e formação de parcerias internacionais estratégicas. Taylor (2004) ressalta ainda a atratividade
política dos offsets, considerando que os resultados esperados, seriam mais perceptíveis do
que um eventual desconto no custo das importações militares que o comprador poderia obter
valendo-se de seu potencial poder de compra. Desta forma, Taylor (2004), assim como Dumas
(2004), também vislumbrou potenciais vantagens de uma política de offset complementando
àquelas já citadas por Dumas (2004). Esta pesquisa irá analisar se estes benefícios adicionais
são identificáveis no caso da nacionalização das válvulas de casco do PROSUB.
Matthews (2000) expõe que os resultados dos offsets seriam difíceis de serem
mensurados, o que prejudicaria a evidência das vantagens econômicas advindas destas
políticas. Mathews (2000) explica que para que se atinja resultados positivos por meio de
transferência de tecnologia estrangeira15, é necessário que o País absorvedor detenha políticas
que permitam a efetiva promoção da indústria de base local, que possua uma força de trabalho
com nível de qualificação compatíveis, que existam companhias locais aptas a receber o novo
conhecimento, e que tecnologias locais também possam ser empregadas. Desta forma, a fim
de se identificar a ação necessária do Estado, conforme análise de Matthews (2002), a seção
secundária seguinte irá exemplificar a política brasileira referente aos offsets militares. Esta
pesquisa irá verificar se os pré-requisitos para a transferência de tecnologia eficaz
identificados por aquele autor estão presentes no estudo de caso proposto.
Dumas e Taylor (2004) assim como Matthews (2000) reconhecem a possibilidade
de ganhos para o Estado importador de PRODE ao serem implementadas políticas de offsets.
Porém, como explicitado por Matthews (2000), os resultados destas políticas não são
facilmente evidenciáveis. Neste sentido, esta pesquisa fará uma avaliação dos resultados
obtidos no caso do offset de nacionalização de válvulas de casco do PROSUB.
15 Transferência de tecnologia é o “processo por meio do qual um conjunto de conhecimentos, habilidades eprocedimentos aplicáveis aos problemas da produção são transferidos, por transação de caráter econômico, deuma organização a outra, ampliando a capacidade de inovação da organização receptora.” (HIRSCHFELD,2014, p.11).
10
2.2 Política brasileira de offsets militares
Em regimes políticos democráticos como o brasileiro, as grandes decisões sobre
ciclos de investimentos, pesquisa, desenvolvimento e produção de inovações tecnológicas,
particularmente de aplicação militar, são tomadas por meio de políticas públicas. Isto devido à
magnitude dos recursos normalmente envolvidos nestas atividades, assim como a diversidade
de interesses e a força de trabalho específica. (MOREIRA, 2012).
A primeira medida de compensação16 identificada no Brasil remonta da década de
50 em transação na forma de Barter17 com a Inglaterra. Nesta operação a Força Aérea
Brasileira (FAB) adquiriu daquele país aeronaves Gloster Metero TF7 e TF-8 tendo sido
exigido como offset a compra de algodão brasileiro no valor equivalente ao destas aeronaves.
(IVO, 2004). Não houve, porém, avanços significativos na legislação brasileira na área
tecnológica até a promulgação da Constituição Federal de 1988. Naquela Carta Magna foram
previstos os artigos 218 e 219 que impuseram responsabilidades ao Estado brasileiro na busca
da promoção e incentivo do desenvolvimento científico, da pesquisa e da capacitação
tecnológica do país. (TAVARES, 2014; BRASIL, 1988).
O Ministério da Defesa (MD) fortaleceu-se politicamente ao lhe serem atribuídos
pela Lei Complementar 136/2010, conhecida como “Lei da Nova Defesa” competências,
dentre outras de formular políticas, emitir diretrizes e, exercer o papel central na consolidação
das propostas orçamentárias das Forças Armadas, atendendo às prioridades da Estratégia
Nacional de Defesa (END) e da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO). (MOREIRA, 2012;
BRASIL, 2010).
Assim, a Portaria Normativa nº 764 do MD, de 27 de dezembro de 2002, aprovou
a política e as diretrizes de compensação comercial, industrial e tecnológica do Ministério da
Defesa e fixou os seguintes objetivos:
I - promoção do crescimento dos níveis tecnológico e qualitativo das indústrias dedefesa, com a modernização dos métodos e processos de produção e aquisição denovas tecnologias, visando ao estado da arte;II - fomento e fortalecimento dos setores de interesse do Ministério da Defesa,criando condições para o aperfeiçoamento das indústrias de defesa e da sua basetecnológica, visando a aumentar suas cargas de trabalho e também a permitir acompetitividade no mercado internacional;
16 A legislação brasileira define medida de compensação como "qualquer prática compensatória de natureza in-dustrial, comercial ou tecnológica estabelecida como condição para o fortalecimento da produção de bens, do de-senvolvimento tecnológico ou da prestação de serviços nacionais (BRASIL, 2012, art 2, VIII)".17 Barter é um termo da língua inglesa equivalente à modalidade troca direta. Neste tipo de transação há um úni-co contrato normalmente de curta duração que estabelece os termos onde uma parte troca com sua contrapartedeterminados bens por outros de valor equivalente (SANTOS, 2004).
11
III - ampliação do mercado de trabalho, mediante a criação de novas oportunidadesde emprego de alto nível tecnológico, através da especialização e doaperfeiçoamento dos recursos humanos dos setores de interesse;IV - obtenção de recursos externos, de toda ordem, diretos e indiretos, para elevar acapacitação industrial e tecnológica dos setores de interesse da área de defesa; e V - incremento da nacionalização e a progressiva independência do mercadoexterno, no que diz respeito a produtos de defesa. (BRASIL, 2002, art 2, I ao V).
A fim de alcançar os objetivos anteriormente citados, aquela Portaria estabeleceu,
dentre outras, a estratégia de interação das Forças Armadas com outras organizações
governamentais, buscando apoio à base industrial de defesa (BID)18 e de se valer do seu poder
de compra em contratos internacionais de importação de PRODE a fim de se obter práticas
compensatórias. Releva ainda mencionar o caráter obrigatório da existência de compensações
imposto por aquele instrumento normativo para negociações de PRODE realizadas pelas
Forças Armadas que superem os cinco milhões de dólares americanos.
Perlo-Freeman (2002), ao analisar o caso brasileiro de política de compensação,
cita que desde a década de 60 o governo busca estabelecer uma indústria bélica nacional no
intuito de obter status de grande potência mundial e de reduzir a dependência bélica de
governos estrangeiros. Para a consecução de tais objetivos, a política de offsets tem sido
implementada sobretudo na forma de transferência de tecnologia de nações desenvolvidas que
tem sido normalmente fator decisivo nas negociações de importação de armamentos.
Assim, pelos exemplos destacados, é possível verificar que o Estado brasileiro
possui atualmente um arcabouço jurídico que baliza uma política de offsets para as
importações de PRODE voltada para o desenvolvimento tecnológico, capacitação, autonomia,
incremento da BID, e nacionalização.
2.3 Os offsets no PROSUB
Em 23 de dezembro de 2008, foi firmado no Rio de Janeiro o Acordo na Área de
Submarinos entre a República Federativa do Brasil e a República Francesa. Neste acordo, a
transferência de tecnologia19, a nacionalização de equipamentos e sistemas, e a capacitação de
pessoal foram estabelecidas como premissa básicas. (BRASIL, 2015; 2019a). Naquela mesma
ocasião foram assinados sete acordos comerciais no âmbito do PROSUB, dentre os quais
18 "A BID é o “conjunto das empresas estatais ou privadas que participam de uma ou mais etapas de pesquisa, de-senvolvimento, produção, distribuição e manutenção de produtos estratégicos de defesa – bens e serviços que,por suas peculiaridades, possam contribuir para a consecução de objetivos relacionados à segurança ou à defesado país.” (BRASIL, 2017b, s.p.).19 A transferência de tecnologia pode ocorrer mediante licenciamento, instrução e treinamento, investimento dire-to, assistência técnica e assistência mútua. (FREITAS, 2014). Para esta pesquisa restam importantes as modalida-des instrução e treinamento, assim como assistência técnica, embora outras também sejam observadas no escopodo PROSUB.
12
releva para a presente pesquisa o Contrato nº 8, assinado entre a MB e a empresa francesa
Naval Group, que trata dos offsets. (BRASIL, 2019d).
O Contrato n° 8 do PROSUB, dentre suas 21 operações, estabeleceu cláusulas de
offsets no total de aproximadamente 400 milhões de euros para a capacitação de empresas
nacionais. Pelo menos 100 milhões de euros foram destinados à aquisição de produtos
(máquinas, sistemas, componentes e materiais) nacionalizados para os submarinos
convencionais e outros 100 milhões de euros para o SN-BR. A nacionalização é viabilizada
por meio de transferência de tecnologia não nuclear da França para o Brasil com know-how
fornecido pela empresa francesa Naval Group. De acordo com Lana (2014), a ocorrência das
compensações foi determinante para que o governo brasileiro firmasse os contratos do
PROSUB com o governo francês. Desta forma, verifica-se o cumprimento da condição de
obrigatoriedade de offsets para as aquisições internacionais de PRODE em conformidade com
a Portaria Normativa nº 764 do MD. (BRASIL, 2002).
O programa de nacionalização de materiais, sistemas e manutenção do submarino
nuclear brasileiro e dos submarinos convencionais, sob a responsabilidade da Coordenadoria-
Geral de Desenvolvimento de Submarino de Propulsão Nuclear (COGESN20), é uma das
transações (offset n° 3) estabelecidas no contrato n° 8. Este programa é constituído por 104
projetos, sendo 52 prioritários, conforme informado por De Barros (2019), dentre os quais
está previsto o projeto de nacionalização de válvulas de casco que é objeto desta pesquisa. De
acordo com De Paula (2016, p.20), o offset de nacionalização possui fator multiplicador21
igual a quatro. (ANEXO C). Isto vem a demonstrar o elevado interesse estratégico e
tecnológico desta operação para a MB.
De uma forma geral, o processo de nacionalização do PROSUB é longo e
composto por fases bem definidas. Em uma fase preliminar, são definidos quais os itens
passíveis de nacionalização são de interesse estratégico para a MB. Na fase posterior de
busca, a Naval Group inicia a busca das empresas nacionais capazes de suprir a demanda ou
ainda que possam ser capacitadas para o fornecimento. Nesta fase, então, ocorre a
qualificação da empresa pré-selecionada pela Naval Group. Na fase de cotação, a Naval
Group solicita cotação às empresas candidatas já qualificadas. Em uma fase de negociação, a
20 A COGESN é “o setor da Marinha, subordinado à Diretoria-Geral de Desenvolvimento Nuclear e Tecnológicoda Marinha (DGDNTM), responsável pelo gerenciamento de todas as atividades de projeto, desenvolvimento,nacionalização e construção, sendo, portanto, a gestora de todos os contratos comerciais com empresas parcei -ras.” (BRASIL, 2019c, s.p.).21 O fator multiplicador é um índice numérico utilizado para valorizar determinado offset atribuindo um maior oumenor crédito de compensação (BRASIL, 2016c). Este índice varia de dois a cinco para as transações previstasno contrato de offset do PROSUB. (DE PAULA, 2016, p.19).
13
Naval Group e a empresa proponente negociam os custos. Após o término das negociações,
inicia-se a fase de escolha, quando a Naval Group propõe à MB a empresa escolhida e todas
as condições contratuais entre a empresa candidata e a Naval Group. Na fase de aprovação, a
MB se posiciona sobre a aprovação ou não da proposta após considerar o escopo da
nacionalização, os créditos compensatórios relacionados, o contrato ente a Naval Group e o
possível fornecedor nacional e, sobretudo, a capacidade técnica da empresa a ser contratada.
Finalmente, na fase de acompanhamento, tanto a Naval Group quanto a MB fazem o
acompanhamento de todo o processo produtivo e de fornecimento dos itens nacionalizados
diretamente nas instalações da empresa contratada. Ainda nesta fase final, são reconhecidos os
créditos em favor da Naval Group após a constatação da conclusão satisfatória do projeto.
(FONSECA JR., 2015; DE BARROS, 2019).
As transferências de tecnologia no PROSUB ocorrem por meio de transferência
direta da Naval Group ou de algum de seus fornecedores por meio de assistência técnica, de
cursos ministrados na França ou no Brasil, ou ainda por on-the-job training (OJT)22 .
Os offsets do PROSUB estão norteados nas diretrizes estabelecidas pelo Comando
da MB por meio da Portaria nº 223/MB, de 25 de julho de 2016, e ainda pelo Estado Maior da
Armada (EMA,) no que se refere à governança de Offset na MB, de acordo com a Circular nº
8, de 27 de julho de 2016. (BRASIL; 2016b, c). Ambos os documentos normativos estão
consoantes com a Política de Offsets definida pelo MD.
3 PROJETO DE NACIONALIZAÇÃO DE VÁLVULAS DE CASCO
Esta seção desenvolve a análise do projeto de nacionalização de válvula de casco
do Programa de Nacionalização do PROSUB buscando-se evidenciar, neste caso, as
vantagens da implementação da Política de Offsets, utilizando-se como referências os
pressupostos teóricos expostos na seção anterior. As informações específicas foram extraídas
principalmente por meio de entrevistas de profissionais que atuaram diretamente no processo.
Estas entrevistas estão reproduzidas nos Apêndices A, B e C.
3.1 O processo de nacionalização e transferência de tecnologia
A empresa Micromazza, sediada no município de Vila Flores, no Rio Grande do
Sul, foi pré-selecionada pela Naval Group, dentre empresas fabricantes de válvulas no
22 On-the-job training é um “treinamento realizado no próprio local de trabalho quando o treinando recebe o trei-namento ao executar o trabalho.” (ON-THE-JOB..., 2019, s.p.).
14
mercado nacional, para participar do projeto candidato de nacionalização de válvulas de casco
de acordo com o contrato n° 8 do PROSUB. A busca por esta empresa brasileira deveu-se a
sua comprovada capacidade técnica como fornecedora de válvulas há mais de vinte e cinco
anos no segmento de petróleo e gás (P&G)23. (CÂMARA, 2019; APÊNDICE B). De acordo
com De Barros (2019), a Diretoria de Engenharia Naval (DEN)24 também atestou a aptidão
técnica daquele fornecedor para participar do processo de nacionalização de válvulas de
casco. Constatou-se, então, que a Micromazza atendia aos pré-requisitos de mão de obra com
nível de qualificação compatível, aptidão para recebimento de novos conhecimentos, e
possibilidade de utilização de tecnologia local. Assim, verificou-se a existência daquelas
condições expostas por Mathews (2000) para uma transferência de tecnologia eficaz
decorrente de um acordo de offset.
Uma vez pré-selecionada a participar do processo de nacionalização, a empresa
brasileira candidata, denominada Brazilian Company (BC), deveria responder ao Pedido de
Cotação da Naval Group, mais conhecido pelo termo em inglês Request for Quotation (RFQ).
Para tanto, foi necessário que a Naval Group inicialmente transmitisse o conhecimento
necessário a respeito das especificidades da fabricação de válvulas de casco25. Desta forma, a
Micromazza ao final de 2014 recebeu a expertise necessária por meio de transferência de
tecnologia na forma de cursos. A primeira etapa de cursos foi realizada na França para dois
engenheiros da BC, sendo um da área de engenharia de projeto e outro da área de manufatura
e usinagem. Estes treinamentos ocorreram durante cinco dias e foram ministrados pela
Issartel France, que é um fornecedor histórico de válvulas para a Naval Group. Durante estes
treinamentos, os engenheiros receberam conhecimentos sobre a estrutura organizacional do
projeto e sobre as atividades técnicas de fabricação relacionados à produção de uma válvula
de casco para submarinos. A segunda parte do treinamento de cinco dias ocorreu no Brasil
para dois engenheiros da Micromazza, sendo um da área de engenharia e projeto e outro
engenheiro da área de manufatura e usinagem. Este treinamento ocorreu nas dependências da
empresa Issartel Brasil26, que é uma subsidiária da Issartel France, localizada em São José
23 A empresa Petróleo Brasileiro S.A concedeu à Micromazza, dentre diversos fornecedores inclusive internacio-nais, o prêmio da edição de 2018 de melhor fornecedor de válvulas. (PETROBRAS, 2018).24 A DEN é uma organização militar (OM) da MB que tem como propósito: “[...] realizar atividades normativastécnicas e de supervisão de Engenharia Naval relacionadas com sua área de atribuição [...].” (BRASIL, 2019d).25 Válvulas de casco são itens de segurança para o submarino. A falha em um destes dispositivos representa altorisco de perda de material e de vidas humanas. Neste sentido, existem critérios muito rigorosos relacionados à fa-bricação e testes para a aceitação destes itens para emprego em um submarino.26 A Issartel do Brasil, uma subsidiária da Issartel France, foi criada no intuito de fabricar no Brasil os compo-nentes das válvulas de casco. Assim, esta empresa também recebeu know-how da fabricante de válvulas francesae posteriormente treinou a Micromazza na modalidade on-the-job training para a montagem e testes das válvulasequipadas.
15
dos Campos/SP. Neta segunda etapa do treinamento foram transmitidos conhecimentos pela
Issartel Brasil sobre a montagem dos atuadores no corpo das válvulas a serem fabricadas pela
Micromazza. (CÂMARA; DE BARROS, 2019).
A Micromazza, após a etapa de treinamentos intermediados pela Naval Group,
fabricou um protótipo de válvula de casco. Foram aplicados tanto conhecimentos próprios
quanto aqueles adquiridos nos treinamentos para customização do item aos requisitos
impostos pela contratante francesa. Este protótipo foi submetido a rigorosos testes de
qualidade em fábrica que atestaram a qualidade do produto. Após os resultados satisfatórios
do protótipo e superadas as fases de cotação e negociação entre a Naval Group e a BC, a
proposta da Micromazza foi escolhida pela Naval Group para a nacionalização de válvulas de
casco do PROSUB.
Conforme ressaltou Câmara (2019), apesar da experiência na fabricação de
válvulas para a indústria de P&G, a Micromazza enfrentou desafios haja vista que a produção
de válvulas de casco requer resultados muito rígidos de tolerâncias de fabricação e de controle
de vazamentos. Além disso, o processo de fabricação de válvulas de submarinos exige um
nível de rastreabilidade27 superior ao exigido no mercado de P&G em todas as etapas da
produção. (APÊNDICE B).
O projeto candidato apresentado pela Naval Group para a fabricação de válvulas
de casco para submarinos pela empresa nacional Micromazza dentro do Programa de
Nacionalização do PROSUB foi aprovado pela MB no final de 2015, após as análises da
COGESN e da DEN. (BRASIL, 2016a). Em março de 2016, a Naval Group emitiu o
Certificado de Qualificação de Fornecedor, reproduzido no ANEXO A, que atesta que a
Micromazza está qualificada para o fornecimento de válvulas de casco para a Naval Group, o
que comprova o resultado satisfatório desta nacionalização por transferência de tecnologia
estrangeira.
3.2 Inovação e desenvolvimento tecnológico
A BC vislumbrou uma oportunidade de inovação28 a ser implementada no
processo de fabricação de válvulas de casco para submarinos em relação ao projeto original
francês. Assim, foram realizados testes para a utilização de revestimento orgânico
27 Rastreabilidade é a “qualidade do que é rastreável [...]; capacidade para acompanhar o percurso de um produ-to, ou de conhecer o seu processo de produção, manipulação, transformação, embalagem ou expedição.” (RAS-TREABILIDADE, 2019, s.p.).28 “A inovação constitui a utilidade, principalmente no âmbito comercial para algo novo, algo criado, inventado.Daí a diferença entre inovação e invenção, onde a invenção se norteia principalmente na criação e a inovação nautilização desta criação.” (LYRO; TERRA, 2016, p.56).
16
anticorrosivo ECTFE (Etileno clorotrifluoetileno) Halar® 6614 para camada base e Halar®
6014 para as camadas de acabamento que revestiram a parte interna do protótipo da válvula
de casco com aplicação por meio de pistola. (FACCIO, 2017).
Conforme Câmara (2019), o revestimento ECTFE já era utilizado pela Naval
Group como anticorrosivo no projeto original, porém com aplicação totalmente manual. Além
disso, a aplicação com pincel demanda maior habilidade do aplicador, o que exigia uma mão
de obra especialmente qualificada para tal atividade. O processo proposto pela Micromazza e
posteriormente aprovado pela Naval Group empregou pistola de alta eficiência. Este processo
tem a vantagem de aumentar a produtividade e garantir maior vida útil da válvula pela menor
possibilidade de incidência de defeitos em relação a uma aplicação com pincel.
Para a qualificar tal procedimento, foram necessários diversos ensaios de ciclos de
pressão, circulação sob vazão, circulação com água arenosa, e ensaios de corrosão com e sem
defeito imposto. Modelos em escala reduzida também foram fabricados para a realização de
testes de adesão e de fadiga. Após aproximadamente seis meses de ensaios, os resultados
foram considerados satisfatórios por atenderem aos critérios preestabelecidos em
procedimento interno especialmente desenvolvido pela Naval Group. Desta forma, restaram
comprovados o bom desempenho e a confiabilidade do revestimento assim como sua técnica
de aplicação mesmo em situações altamente corrosivas e de extrema responsabilidade. Desta
forma, a Micromazza obteve seu procedimento de aplicação do revestimento anticorrosivo
por pistola em válvulas de casco validado pela Naval Group. (FACCIO, 2017).
Câmara (2019) ainda ressalta outra melhoria implementada pela Micromazza no
processo produtivo original francês. Trata-se da fundição da tampa das válvulas realizada pela
própria Micromazza. Este procedimento era anteriormente realizado por um fornecedor
qualificado francês diferente do fabricante do corpo da válvula. O procedimento de fundição
nacional foi auditado e qualificado pela Naval Group. Em maio de 2016, conforme ANEXO
B, a Micromazza recebeu a certificação da Naval Group de fornecedor qualificado também
para a parte fundida das válvulas de casco. Isto foi fundamental para a adequada
nacionalização do produto.
Embora a Micromazza já detivesse conhecimento técnico suficiente para a
produção das válvulas para o mercado de P&G, inclusive tendo realizado melhorias ao projeto
original de válvulas de casco da Naval Group, verificou-se que a transferência de tecnologia
francesa foi necessária. Isto devido às particularidades requeridas para o fornecimento de uma
válvula de emprego militar quanto à gestão de processo, que exige completa rastreabilidade
da produção. Além disso, o projeto deve atender a requisitos militares específicos não
17
presentes em aplicação civis, como resistência a choque, que demandam maior robustez do
equipamento dificultando sua produção.
Assim, é possível constatar que a empresa nacional Micromazza adquiriu novos
conhecimentos relacionados a um PRODE por meio de transferência de tecnologia
estrangeira. O resultado satisfatório atestado pela Naval Group (ANEXO A) permite
evidenciar que o offset de nacionalização de válvulas de casco atingiu o objetivo de
crescimento de nível tecnológico e modernização de métodos e processos de produção
daquela empresa. Este objetivo está em conformidade com a Política de Compensação do MD
tal como definido em Brasil (2002).
3.3 Participação de instituição de ensino
A inovação quanto ao tipo de aplicação do revestimento orgânico anticorrosivo
descrita na subseção anterior foi viabilizada mediante parceria tecnológica entre a
Micromazza e a Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). Os testes que
possibilitaram a qualificação do revestimento ECTFE foram realizados nas instalações do
Laboratório de Metalurgia Física (LAMEF) da UFRGS. A equipe técnica do LAMEF realizou
naquele laboratório as adaptações e a programação do Controlador Lógico Programável
(CLP) cedido pela Micromazza. Este CLP teve a função de controlar um atuador pneumático
responsável pelas aberturas e fechamentos das válvulas durante os testes de operação.
(CÂMARA, 2019; FACCIO, 2017).
Conforme mencionado, as válvulas de casco, devido a requisitos militares de
resistência, possuem paredes mais espessas que as válvulas habitualmente produzidas pela BC
para o mercado de P&G, o que impõe dificuldade adicional no processo de deposição do
revestimento. Isto, demandou o desenvolvimento de um procedimento especial de inspeção
não destrutiva a fim de se verificar se o material depositado após os testes continuava íntegro
e aderente ao corpo metálico da válvula. Neste sentido, foi desenvolvido um procedimento de
inspeção por correntes parasitas29 pela BC em conjunto com o LAMEF. (CÂMARA, 2019).
A UFRGS em parceria com a BC atuou como uma Instituição Científica,
Tecnológica e de Inovação (ICT)30 tal como previsto no "Novo Marco Legal da Inovação",
29 As correntes parasitas são induzidas no material de teste por uma bobina indutora. A presença de defeitos nomaterial resultará em uma redução no fluxo destas correntes. Esta redução no fluxo das correntes parasitas resul-tará em uma variação da impedância da bobina que indicará a ocorrência do defeito. (MARQUES, 2017).30 ICT é qualquer “órgão [...] sem fins lucrativos legalmente constituída sob as leis brasileiras, com sede e foro noPaís, que inclua em sua missão institucional ou em seu objetivo social ou estatutário a pesquisa básica ou aplica-da de caráter científico ou tecnológico ou o desenvolvimento de novos produtos, serviços ou processos.”. (BRA-SIL, 2016d).
18
Lei nº 13.243, de 11 de janeiro de 2016, que alterou a Lei nº 10.973, de 2 de dezembro de
2004, que dentre outros, destaca-se:
[...] Art. 1º Esta Lei estabelece medidas de incentivo à inovação e à pesquisacientífica e tecnológica no ambiente produtivo, com vistas à capacitaçãotecnológica, ao alcance da autonomia tecnológica e ao desenvolvimento do sistemaprodutivo nacional e regional do País, [...]Parágrafo único. As medidas às quais se refere o caput deverão observar os seguintesprincípios: [...]V - promoção da cooperação e interação entre os entes públicos, entre os setorespúblico e privado e entre empresas;VI - estímulo à atividade de inovação nas Instituições Científica, Tecnológica e deInovação (ICTs) e nas empresas, inclusive para a atração, a constituição e ainstalação de centros de pesquisa, desenvolvimento e inovação e de parques e polostecnológicos no País; [...]XIII - utilização do poder de compra do Estado para fomento à inovação; [...]Art. 3º A União, os Estados, o Distrito Federal, os Municípios e as respectivasagências de fomento poderão estimular e apoiar a constituição de aliançasestratégicas e o desenvolvimento de projetos de cooperação envolvendo empresas,ICTs e entidades privadas sem fins lucrativos voltados para atividades de pesquisa edesenvolvimento, que objetivem a geração de produtos, processos e serviçosinovadores e a transferência e a difusão de tecnologia [...]Art. 4º A ICT pública poderá, mediante contrapartida financeira ou não financeira epor prazo determinado, nos termos de contrato ou convênio: (Redação pela Lei nº13.243, de 2016).I - compartilhar seus laboratórios, equipamentos, instrumentos, materiais e demaisinstalações com ICT ou empresas em ações voltadas à inovação tecnológica paraconsecução das atividades de incubação, sem prejuízo de sua atividadefinalística[...]. (BRASIL, 2016d, art 1, V, VI, VIII; art 3; art 4, I).
A utilização de uma ICT no caso da nacionalização das válvulas de casco foi
identificada como um benefício da política de offset uma vez que permitiu a integração desta
política com os aspectos da "Lei da Inovação" conforme verificado nos aspectos citados da
referida lei. Verificou-se benefícios à UFRGS uma vez tendo ocorrido investimento financeiro
privado no LAMEF, desenvolvimento de novos equipamentos de teste e procedimentos, e
oportunidade de aquisição de novos conhecimentos que foram referências para outros projetos
similares ou com outras aplicações. (Borges, 2019).
Desta forma, foi possível identificar que a UFRGS incrementou a habilidade da
sua força de trabalho, devidos aos conhecimentos adquiridos pela equipe técnica envolvida na
parceria com a Micromazza, assim como o desenvolvimento tecnológico nacional, devido ao
desenvolvimento de novos procedimentos técnicos, que são benefícios característicos de uma
política de offset eficaz conforme apontado por Dumas (2004).
3.4 Independência estrangeira e fomento à BID
19
Conforme Câmara (2019), a Micromazza decidiu participar do Programa de
Nacionalização do PROSUB no intuito de ingressar no ramo da Defesa Nacional. Tratou-se
de um projeto bem-sucedido que culminou nas certificações de qualificação daquela empresa
nacional como empresa fornecedora da Naval Group (ANEXOS A, B). Desta forma, a
Micromazza está comprovadamente apta a fornecer válvulas de casco para os submarinos
nuclear e convencionais brasileiros em conformidade com os rígidos controles de qualidade
exigidos para um item de segurança para um submarino.
De acordo com De Barros (2019), já foram entregues ao PROSUB em torno de
130 válvulas com índice de nacionalização atingido de 100%. Isto demonstra que a
nacionalização foi satisfatória quanto à meta de independência do mercado externo para
PRODE em conformidade com o previsto na Política de Offsets do MD (BRASIL, 2002, art 2,
V).
A Política de offset aplicada na nacionalização de válvulas de casco possibilitou a
inserção de uma nova empresa na indústria de defesa nacional. Assim, verificou-se o
benefício de ampliação de nossa BID, o que constitui um dos quatro eixos principais da END
conforme o MD. (BRASIL, 2017b). O ingresso da empresa nacional Micromazza na área da
Defesa favorece o ciclo logístico31 da MB em sua fase de obtenção32 de válvulas de casco para
submarinos. De acordo com Câmara (2019), a Micromazza possui interesse em realização de
reparos de válvulas dos nossos atuais submarinos da classe Tupi. Isto resultará em facilidades
para as atividades da função logística33 de manutenção em quarto escalão34 destes itens.
4 CONCLUSÃO
O Governo brasileiro trata com especial importância a Política de offsets
relacionados com importações de PRODE. Isso pôde ser constatado ao ser verificada a
existência de um sólido ordenamento jurídico que incentiva e, em alguns casos, obriga a
inserção de cláusulas de compensações nos contratos como condição para aquisições daqueles
produtos, conforme consta na Portaria Normativa 764/MD, de 20DEZ2002. Como visto, esta
31 Ciclo Logístico é o “processo permanente, contínuo e ordenado em fases inter-relacionadas, que organiza a sis-temática de apoio”. (BRASIL, 2016e, p. 15). 32 Obtenção é a “fase em que são identificadas as fontes e tomadas as medidas para a aquisição e o recebimentodos recursos necessários.” (BRASIL, 2016e, p. 19).33 Função Logística é a “reunião, sob uma única designação, de um conjunto de atividades logísticas afins, corre-latas ou de mesma natureza [...].” (BRASIL, 2016e, p. 23). 34 Manutenção de 4º escalão (Nível Indústria) compreende as “ações de manutenção cujos recursos necessáriosrequerem o emprego de instalações fabris da respectiva Força, o concurso do fabricante ou representante autori -zado, ou, ainda, o uso de instalações industriais especializadas [...].” (BRASIL, 2016e, p. 28).
20
Portaria estabeleceu claramente os objetivos da Política de Compensações no âmbito do MD,
assim como as estratégias, forma de gerenciamento e diretrizes gerais. Decorrente deste
instrumento normativo, diretrizes específicas ainda foram estabelecidas pelas Forças
singulares. Estas diretrizes baseiam-se nos potenciais benefícios do desenvolvimento
tecnológico, do fomento à BID e da conquista da independência estrangeira, que podem ser
abreviados por meio de offsets, notadamente por meio de transferência de tecnologia
estrangeira. A pesquisa identificou que a implementação das compensações está alinhada com
a abordagem de Mathews (2000), haja vista o protagonismo do Estado brasileiro na definição
e promoção destas políticas.
No contexto dos offsets diretos previstos no PROSUB, esta pesquisa analisou o
caso do projeto de nacionalização por transferência de tecnologia das válvulas de casco da
empresa francesa Issartel para a empresa nacional Micromazza. Por meio de consulta à
documentação e entrevistas, foi possível constatar que o know-how francês necessário foi
plenamente absorvido, o que resultou na qualificação da Micromazza como fornecedora de
válvula para a Naval Group. O processo de nacionalização contou com uma fase de pré-
seleção. Nesta fase, a Micromazza foi avaliada quanto a seus processos técnicos e suas
instalações tanto pela Naval Group quanto pela MB. Assim, esta BC foi previamente
considerada apta ao processo de nacionalização. Esta ação foi relevante pois demonstrou que
o processo coincidiu com o exposto por Matthews (2000) no sentido de que a empresa
absorvedora de tecnologia estrangeira necessita de um nível de qualificação compatível com a
tecnologia a ser absorvida. A Micromazza utilizou-se de sua experiência como fornecedora de
válvulas para a indústria de P&G com o propósito de agregar melhorias ao processo de
fabricação original da Naval Group. Desta forma, resta verificado o exposto por Matthews
(2000) quanto ao aproveitamento de tecnologias nacionais no processo de transferência de
tecnologia.
A Micromazza atingiu um novo patamar tecnológico ao se tornar fornecedora de
válvulas de casco para submarinos para o grupo francês Naval Group. Isto foi possível por
meio da combinação de sua experiência anterior com os conhecimentos específicos obtidos
por meio da transferência de tecnologia francesa tanto na área de gestão do processo quanto
no tocante aos aspectos técnicos que envolvem requisitos militares inerentes a submarinos. A
parceria com a UFRGS para o desenvolvimento dos testes para a homologação do
revestimento anticorrosivo trouxe benefícios tecnológicos também para a universidade. Desta
forma, foi possível identificar os benefícios expostos por Dumas (2004) quanto ao
21
desenvolvimento tecnológico e industrial, ao incremento das habilidades da força de trabalho
nacional e, consequentemente, quanto à relação custo/benefício da transação internacional.
O fomento à BID foi verificado posto que a empresa nacional qualificada como
fornecedora de válvulas não continha PRODE como item de fornecimento em seu portfólio.
Assim, houve uma ampliação da indústria de defesa para obtenção de válvulas de casco,
assim como para reparos. Além disso, esta nacionalização propiciou a almejada autonomia
estrangeira que é um objetivo estratégico fundamental para as Forças Armadas constante na
Portaria Normativa 764/MD, de 20DEZ2002. Ressalta-se que a qualificação obtida pela
Micromazza, para se tornar um fornecedor da Naval Group, possibilita o estabelecimento de
parceria internacional com esta empresa francesa para fornecimentos para outros Programas.
A possibilidade desta parceria com ganho de novos mercados são os benefícios adicionais da
política de offset observados por Taylor (2004).
Pelo exposto, ao ser analisado o caso da nacionalização de válvulas de casco para
o submarino nuclear e convencional do PROSUB, esta Pesquisa evidenciou os benefícios da
Política de Offsets militares tal como relacionados pelos autores Taylor (2004), Matthews
(2000) e Dumas (2004). Desta forma, a partir dos resultados advindos daquele processo de
nacionalização, constatou-se que o Estado se utilizou adequadamente de seu poder de
barganha para a obtenção de desenvolvimento tecnológico, autonomia estrangeira, fomento à
BID, e inovação, o que responde à pergunta inicialmente formulada nesta Pesquisa.
Ademais, tendo em vista os resultados plenamente satisfatórios da Política de
Offset nacional aplicada na nacionalização das válvulas de casco, esta Pesquisa apresenta
subsídios à MB concernente ao incentivo pela busca de novos offsets diretos com
transferência de tecnologia estrangeira em futuros contratos internacionais para aquisições de
PRODE. Novos pesquisadores poderão realizar análises similares para outros projetos de
nacionalização ou ainda para outras transações que constituem o Contrato de Offset do
PROSUB. Desta feita, também seria possível analisar situações de naturezas distintas, como
os casos com offsets que, embora sejam indiretos para o PROSUB, trazem benefícios para
outros programas de interesse da MB. Assim, subsídios adicionais poderiam ser providos à
MB no tocante à implementação eficaz da Política de Offsets estabelecida pelo MD.
Em última análise, vale ressaltar a importância prática deste estudo, uma vez que
foi possível constatar que foi estabelecido para o PROSUB todo um processo bem definido
para a implementação de Política de Offsets que já demonstra resultados satisfatórios. Neste
sentido, futuros programas da MB, que envolvam importações de PRODE, podem ter suas
tarefas simplificadas ao se valerem desta experiência, principalmente no tocante à
22
transferência de tecnologia de nações desenvolvidas, que pode ser aplicada aos diversos
setores da MB.
23
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ANEXOS
ANEXO A - Certificado de Qualificação de Fornecedor de Válvulas de Casco
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ANEXO B - Certificado de Qualificação de Fornecedor de Componente Fundido para
Válvulas de Casco.
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ANEXO C - Extrato da Apresentação da COGESN sobre Contrato de Offset do
PROSUB
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APÊNDICES
PESQUISA DE CAMPO DE MONOGRAFIA
APÊNDICE A – Entrevista com o engenheiro de produção Ângelo Rodrigues de Barros-
COGESN
1 -Qual sua atual função na COGESN?
R - Analista de Projetos de Nacionalização - Área Hidráulica.
2 - Em que consiste o Programa de Nacionalização previsto no PROSUB?
R - Consiste em priorizar a fabricação nacional de itens e sistemas de alto grau de tecnologia
para o submarino nacional e convencionais por meio de transferência de tecnologia da
empresa francesa Naval Group e de seus parceiros. Estas empresas nacionais após capacitadas
irão fornecer seus produtos de forma independente para os atuais ou futuros projetos de
submarinos ou ainda de navios de superfície. Importante ressaltar o potencial uso dual das
tecnologias desenvolvidas.
3 - Quais as responsabilidades da COGESN no Programa de Nacionalização do PROSUB?
R - Gerenciamento em todas as etapas de programa de nacionalização, com acompanhamento
em fases predefinidas na produção dos itens que são objetos do contrato, acompanhamento da
ToT para as empresas participantes e nos treinamentos pertinentes aos projetos.
4 - Qual foi a participação da Diretoria de Engenharia Naval no processo de nacionalização
das válvulas de casco?
R - A DEN atuou realizando análise técnica nas propostas de nacionalização além de realizar
inspeções nas instalações e processos da empresa Micromazza atestando sua capacidade de
fabricação e testes de válvulas de casco.
5- Como uma empresa é selecionada para participar do Processo de Nacionalização?
R – De acordo com as seguintes etapas: 0 – Preliminar – análise dos itens associados a cada
projeto candidato pela Naval Group e MB; 1 – Busca – Naval Group realiza busca de
empresas indicadas por ela e pela MB. Qualificação das empresas a cargo da Naval Group; 2
– Cotação – Naval Group envia Pedido de Cotação (RFQ) às empresas brasileiras pré-
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selecionadas; 3 – Negociação – Naval Group avalia e negocia as propostas com as empresas
brasileiras; 4 - Escolha Naval Group - Naval Group propõe à MB a empresa escolhida. Plano
de Nacionalização, Custos Associados, Qualificação e Contrato (Naval Group e BC); 5 –
Aprovação MB – MB aprova ou não a proposta: análise do escopo de nacionalização,
montante de créditos de nacionalização requerido, verifica a capacidade técnica da empresa
brasileira selecionada e o contrato (Naval Group e BC); 6 – Acompanhamento –
Acompanhamento da nacionalização do item na empresa brasileira. Análise de
reconhecimento de Créditos de Nacionalização para projetos concluídos.
6- Como são realizados os acompanhamentos das atividades de nacionalização pela COGESN
e pela Naval Group? Existe algum índice?
R – A Naval Group realiza inspeções periódicas preestabelecidas no cronograma de
fabricação, que é formatado de acordo com cada projeto. A Marinha acompanha juntamente
com a Naval Group algumas etapas de inspeções intermediárias predefinidas entre as partes e
todos as inspeções onde a Naval Group recebe os equipamentos produzidos pela empresa.
7- Quantos projetos estão envolvidos na nacionalização do PROSUB?
R - Do total de 104 projetos, existem 56 projetos considerados prioritários.
8- Quais os critérios para a aprovação de uma empresa e seu projeto?
R - A MB avalia a proposta enviada pela Naval Group onde são descritos o escopo e prazo
proposto para atender ao projeto, que deve atender plenamente a descrição do Anexo H do
contrato 1A, sendo observado que os valores apresentados na proposta são créditos a serem
reconhecidos à Naval Group.
9- Qual o estágio atual da nacionalização de válvulas de casco envolvendo a Micromazza?
Quantas válvulas já foram fornecidas?
R - O projeto está em execução em fase final de fabricação das válvulas para o SBR-4.130
válvulas de diversos tipos já foram fornecidas.
10- Como ocorreu o processo de nacionalização para as válvulas de casco para submarinos?
R - A empresa nacional Micromazza foi selecionada pela empresa francesa Naval Group a
participar do Projeto Candidato ME-5 (prioridade 7). A empresa nacional passou por um
processo de transferência de tecnologia com assistência técnica e treinamento de um
44
fornecedor histórico da Naval Group que após a aprovação de um protótipo foi considerada
qualificada pela Naval Group. Após, a Micromazza presentou uma cotação à Marinha do
Brasil para o fornecimento e testes das válvulas de casco conforme os requisitos técnicos do
projeto francês de forma a garantir o grau de estanqueidade necessários para o submarino em
sua máxima profundidade de mergulho.
11- Na visão da COGESN a transferência de tecnologia foi bem-sucedida?
R – Sim, tendo em vista que a Micromazza já está produzindo válvulas de casco com
qualidade comprovada nos testes em fábrica e documentação técnica.
12- Houve inovações desenvolvidas pelo Micromazza?
R - Sim, houve a aplicação de revestimento orgânico anticorrosivo na parte interna das
válvulas que não era previsto no projeto original francês. O processo foi homologado pela
Naval Group após diversos testes que comprovaram a qualidade do uso destes revestimentos.
Os testes ocorreram nas dependências da Universidade Federal do Rio Grande do Sul que
firmou parceria com a empresa Micromazza.
13- O processo de nacionalização envolvendo a empresa Micromazza para a fabricação de
válvulas de casco para submarinos pode ser considerado um exemplo de projeto bem-
sucedido? Por quê?
R - Sim, pois todas as etapas preestabelecidas no contrato foram cumpridas, o escopo de
nacionalização foi plenamente atendido.
14- Qual o índice de nacionalização alcançado para as válvulas de casco?
R - 100%
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PESQUISA DE CAMPO DE MONOGRAFIA
APÊNDICE B – Entrevista com Walter Câmara- Gerente de Projeto da
MICROMAZZA
1 - Qual sua atual função na Micromazza?
R - Gerente de Novos negócios e no caso do projeto com a Naval Group/MB sou o Gerente
do Projeto
2 - Quais outros projetos relacionados à Marinha do Brasil possuem envolvimento da
Micromazza?
R - A MICROMAZZA iniciou sua experiência em produtos para área de defesa, através do
projeto PROSUB. A empresa foi auditada e qualificada para fornecimento de válvulas de
casco conforme projeto do Naval Group e desenvolveu projetos próprios de válvulas esfera
customizados as dimensões do layout do submarino e especificações de resistência a combate,
definidas pelo Naval Group. Com a experiência obtida, foi planejada oportunidade de reparar
e fornecer válvulas para os submarinos classe TUPI e a força de superfície, mais não houve
oportunidade de negócio e não encontramos interesse dos responsáveis pela manutenção da
Força de Submarinos.
3- Qual a motivação da Micromazza para participar do programa de nacionalização de
válvulas de casco de submarino?
R - Na época que aderimos ao projeto o mercado de P&G estava em pleno vapor (antes da
crise e operação Lava Jato) e não existia interesse econômico, porém a grande motivação foi o
sentimento nacionalista de atuar na área de defesa e buscar juntamente com a Marinha,
desenvolvimento tecnológico e participar de uma oportunidade de retomada da indústria de
defesa que foi muito forte no passado.
4 -Em que consistiu o processo de transferência de tecnologia ocorrido na França e no Brasil?
Quantas pessoas foram enviadas e quais especialidades?
R - O projeto apresentou a premissa de transferência de tecnologia da empresa francesa Naval
Group (que contratou a empresa de válvulas Issartel França para realizar o mesmo) para a
empresa Brasileira fabricante, sob custo da MB. A transferência ocorreu em duas etapas:
Transferência de tecnologia para terceirização de fabricação das válvulas, sob o projeto
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francês, no sentido de entender a estrutura organizacional do projeto, conhecer uma empresa
de válvula de casco na França (Issartel França), conhecer particularidades da fabricação e
práticas/procedimento de fabricação. Transferência realizada em 5 dias na França e para dois
engenheiros da MICROMAZZA das áreas de engenharia/projeto e Manufatura/Usinagem; A
segunda etapa ocorreu na planta da Issartel Brasil que fabricaram os atuadores das válvulas e
o objetivo era de apresentar a montagem de dois tipos de atuadores (o projeto previa oito
tipos, se não me engano) e a sua integração com a válvula, uma vez que a MICROMAZZA
assumiu o compromisso de fabricar as válvulas e integrá-las aos seus acessórios/atuadores que
foram fabricados pela Issartel Brasil. Esse treinamento ocorreu também em cinco dias em São
José dos Campos/SP também para dois engenheiros da área de engenharia/projeto e um
técnico de montagem e assistência técnica.
5- Como a empresa se preparou para a transferência de tecnologia francesa?
R - A maior diferença observada entre o nosso projeto de válvula, nossa fabricação e o projeto
Naval Group, foi a forma de documentação aplicada ao produto com rastreabilidade total de
cada etapa do processo fabril, diferentemente de como estávamos habituado e exigido pelo
mercado de P&G.A API define criticidade diferente para cada componentes e tratativas de
documentação frente a essa classificação de criticidade, para o Naval Group todos os itens são
críticos e todos com grande exigência de controle passo a passo. Respondendo à pergunta, não
houve uma preparação adequada para essa exigência e foi muito difícil controlar a fabricação
sob essa exigência, frente a nossa experiência com nossos projetos de P&G.
6- Quais as maiores dificuldades encontradas no processo?
R - O grande desafio foi o de gestão processual, não houve desafio tecnológico, pelo
contrário, nós é que melhoramos o projeto original Naval Group, oferecendo um revestimento
anticorrosivo de maior eficácia, que o sugerido pelo projeto francês. Esse assunto é bastante
citado pela MB nas reuniões com a engenharia do Naval Group, para defesa da indústria
Brasileira.
7- Como surgiu a alternativa do uso de revestimento interno anticorrosivo para estas válvulas?
R - O projeto original do Naval Group já apresentava esse revestimento, porém adequado para
equipamentos estáticos (vasos e tanques, e não tão adequado para equipamentos com
montagem com interface mecânica, como corpo, esfera e sede), com aplicação manual-pincel,
implicando em qualificação do operador. A MICROMAZZA já oferecia uma evolução desse
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revestimento orgânico ECTFE nas suas válvulas (tecnologia mais atualizada), desenvolvido
juntamente com a PETROBRAS/CENPES, com aplicação por pistola com alta eficiência na
aplicação e na vida útil (deixo um paper desenvolvido pela MICROMAZZA para
conhecimento)
8- O que o uso deste revestimento representou em termos de qualidade e custo?
R - Custo não mensurado, face ao ganho na produção e eficiência na vida útil.
9 - Quanto a melhoria mencionada em relação ao produto francês, em que consistiu? Somente
a questão do revestimento? Houve ganho de produtividade?
R - As melhorias foram : 1) Ao processo do revestimento, que sugerimos uma substituição por
uma tecnologia já desenvolvida pela MICROMAZZA, para fornecimento à PETROBRAS e
utilizada em nossos produtos para a área de P&G; 2) O projeto Francês, previa a tampa da
válvula em curva e um fundido especial a ser importado de empresas qualificadas pela Naval
Group na França, porém a MICROMAZZA assumiu o risco de fundir no Brasil (com nosso
processo já qualificado) sob qualificação e chancela do Naval Group. Fomos auditados por
especialistas do NG e obtemos a qualificação para ser uma empresa qualificada pelo Naval
Group para fundição.
10 - Foi mencionado que o revestimento já era previsto no processo original francês, mas que
a Micromazza já aplicava em suas válvulas uma tecnologia mais avançada. Isto se refere
apenas à técnica de aplicação ou também ao tipo de revestimento que foi aplicado nas
válvulas customizadas para os submarinos.
R - O ganho foi em ambas os questionamentos, ou seja: Na tecnologia que era mais atualizada
e apropriada para um projeto mecânico com interface de montagem e geometria complexa,
como também para aplicação pois não iria precisar capacitar um aplicador conforme o
revestimento exigido pelo projeto francês.
11- Como ocorreu a parceria com a UFRGS no desenvolvimento deste revestimento?
R - A MICROMAZZA já mantinha uma parceria tecnológica com o laboratório LAMEF da
Universidade UFRGS para os nossos projetos. Porém para a aplicação do Halar nas válvulas
do Naval Group, foi observado que a válvula é mais robusta e apresenta uma massa metálica
(grande espessura de parede) para atender exigências de projeto militar, e essa grande
espessura exigia procedimento de aplicação e de inspeção diferenciado, face à perda da
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temperatura durante a aplicação. Dessa forma, desenvolvemos com o LAMEF uma inspeção
não destrutiva, por corrente parasitas, que assegura que o revestimento aplicado está integro e
bem aderente ao corpo metálico.
12- Qual o resultado da produção das válvulas?
R - Aprovado plenamente! Também desenvolvemos para essa válvula uma curva fundida no
material requisitado no projeto, que o Naval Group não acreditava que fôssemos capazes em
desenvolver, fomos auditados, elogiados e qualificados pelos técnicos do Naval Group.
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PESQUISA DE CAMPO DE MONOGRAFIA
APÊNDICE C – Entrevista com professor doutor Marcelo Favaro Borges - UFRGS
1 - Qual sua atual função na UFRGS? Qual formação acadêmica?
R - Professor Adjunto, Doutor.
2 - Qual a sua participação há época na condução dos testes para homologação das válvulas
com o revestimento anticorrosivo?
R - Participação no projeto dos equipamentos de testes, execução dos ensaios e análise dos
dados.
3- O que motivou a participação da UFRGS? Algum interesse específico?
R - Linha de pesquisa do projeto alinhada com as da UFRGS além do interesse no
desenvolvimento de novas competências e colaborar para o aumento da capacidade produtiva
do país (nacionalização de produtos e equipamentos).
4 - Houve algum investimento da universidade ou da empresa Micromazza para que os testes
fossem realizados?
R- Sim, investimento financeiro da Micromazza.
5 - Houve a necessidade de desenvolver algum conhecimento para condução dos testes?
R - Sim, tanto conhecimentos específicos quando desenvolvimento de equipamentos de teste e
procedimentos.
6 - Houve dificuldades ou desafios?
R - Sim, durante o desenvolvimento e os pré-testes surgiram condições não mapeadas como
por exemplo nos testes com areia foi previsto um sistema de aquecimento com capacidade
para atender os parâmetros do teste, porém devido ao atrito das partículas com as tubulações e
válvulas o fluído de trabalho necessitou ser resfriado. Todos os equipamentos foram
reprojetados e os procedimentos alterados gerando conhecimento e aprendizado para a equipe
envolvida.
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7 - Outros trabalhos foram facilitados em decorrência das atividades relacionadas aos testes?
Houve novas qualificações?
R - Sim, o conhecimento gerado serviu de referência para outros projetos envolvendo
circulação de fluídos abrasivos e corrosivos. Houve novas qualificações, porém para
aplicações diferentes.
8 - De uma forma geral os resultados da parceria foram satisfatórios?
R - Sim, o modelo provou-se valido e de sucesso tendo sido repetido em outros casos.
9 - Os testes foram conclusivos em relação à qualidade do revestimento para a aplicação da
válvula?
R - Sim, porém os resultados não podem ser divulgados sem consentimento das partes
envolvidas.