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Rosaura Soligo https://rosaurasoligo.wordpress.com/ Escola - lugar de aprendizagem de todos 1 Rosaura Soligo Este texto trata da concepção de escola reflexiva, como postula Isabel Alarcão, e de organização aprendente, como nomeiam Michael Fullan e Andy Hargreaves. Ou seja, da escola como contexto favorável à aprendizagem de todos os seus segmentos e como produtora de conhecimentos que se revertem em benefício para educadores, alunos, familiares e comunidade como um todo. A opção foi abordar inicialmente essa questão na forma de um artigo de opinião – à semelhança dos que são publicados em alguns jornais quando se pretende tematizar assuntos polêmicos – por ser esse um gênero que exige a apresentação de argumentos que contribuem para iluminar a discussão em pauta. __________________________________________________________ É possível transformar a escola? NÃO. Não é possível transformar a escola. A escola é uma instituição fundamentalmente conservadora. Nem o advento do computador – e, mais recentemente, da internet –, considerado parte de uma revolução tecnológica que inevitavelmente provoca mudanças significativas nos hábitos pessoais e no funcionamento de muitas instituições, tiveram poder de transformar a escola. Tampouco o processo de democratização do acesso à escolaridade, para a legião de crianças que não tinha assegurado o seu direito de estudar, teve poder de mudar estruturalmente essa instituição. Em meio a um contexto mutante como o que vivemos, no olho de um furacão tecnológico, tendo os filhos da classe trabalhadora como a maioria dos alunos, a escola é, na essência, a mesma de sempre. Tanto é assim, que há uma história antiga, conhecida de toda gente, que diz que depois de congelado por décadas um homem foi despertado de seu sono e não se adaptava em parte alguma, tal a dimensão das mudanças que em tudo se havia operado. Estava ele em tamanho estado de ansiedade e tormento, que a todos preocupava. Até que uma professora muito 1 Texto publicado originalmente em 2003, no Caderno do Professor - Programa ‘São Luís Te Quero Lendo e Escrevendo’, divulgado pela Secretaria Municipal de Educação de São Luís do Maranhão, e ampliado posteriormente. Professora universitária, formadora, assessora pedagógica e coordenadora de projetos do Instituto Abaporu de Educação e Cultura.

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Rosaura Soligo https://rosaurasoligo.wordpress.com/

Escola - lugar de aprendizagem de todos1

Rosaura Soligo

Este texto trata da concepção de escola reflexiva, como postula Isabel Alarcão, e de organização aprendente, como nomeiam Michael Fullan e Andy Hargreaves. Ou seja, da escola como contexto favorável à aprendizagem de todos os seus segmentos e como produtora de conhecimentos que se revertem em benefício para educadores, alunos, familiares e comunidade como um todo.

A opção foi abordar inicialmente essa questão na forma de um artigo de opinião – à semelhança dos que são publicados em alguns jornais quando se pretende tematizar assuntos polêmicos – por ser esse um gênero que exige a apresentação de argumentos que contribuem para iluminar a discussão em pauta.

__________________________________________________________

É possível transformar a escola?

NÃO.

Não é possível transformar a escola.

A escola é uma instituição fundamentalmente conservadora. Nem o advento do computador – e, mais recentemente, da internet –, considerado parte de uma revolução tecnológica que inevitavelmente provoca mudanças significativas nos hábitos pessoais e no funcionamento de muitas instituições, tiveram poder de transformar a escola. Tampouco o processo de democratização do acesso à escolaridade, para a legião de crianças que não tinha assegurado o seu direito de estudar, teve poder de mudar estruturalmente essa instituição.

Em meio a um contexto mutante como o que vivemos, no olho de um furacão tecnológico, tendo os filhos da classe trabalhadora como a maioria dos alunos, a escola é, na essência, a mesma de sempre.

Tanto é assim, que há uma história antiga, conhecida de toda gente, que diz que depois de congelado por décadas um homem foi despertado de seu sono e não se adaptava em parte alguma, tal a dimensão das mudanças que em tudo se havia operado. Estava ele em tamanho estado de ansiedade e tormento, que a todos preocupava. Até que uma professora muito

1 Texto publicado originalmente em 2003, no Caderno do Professor - Programa ‘São Luís Te Quero Lendo e Escrevendo’, divulgado pela Secretaria Municipal de Educação de São Luís do Maranhão, e ampliado posteriormente. Professora universitária, formadora, assessora pedagógica e coordenadora de projetos do Instituto Abaporu de Educação e Cultura.

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perspicaz sugeriu, com esperança: ‘Vamos levá-lo a uma escola, que por certo o lugar lhe será familiar – nada na escola mudou desde que ele adormeceu, desde sempre, na verdade’. Levaram o cidadão para a escola mais próxima (nem foi necessário escolher uma em especial) e então ele recobrou a tranquilidade, pois ali tudo permanecera inalterado...

O fato é que, do ponto de vista dos resultados obtidos, sob certos aspectos a escola piorou, mas sob outros efetivamente não.

Uma análise mais cuidadosa da situação revela que, desde a metade do século passado, quando começaram a ser aferidos os percentuais de promoção/retenção dos alunos brasileiros, os resultados variaram muito pouco: “os índices de fracasso escolar apresentados pelo IBGE e INEP2 desde os anos 50 (tabela abaixo) revelam que nesse tempo todo não se tem garantido minimamente a aprendizagem dos alunos ao final da primeira série – apenas metade das crianças em média é promovida e, como sabemos, o principal critério de promoção nesse caso é a alfabetização. Nos últimos anos, os índices nacionais de aprovação na passagem da primeira para a segunda série chegaram a 68,7%, o que faria supor um percentual idêntico de alfabetização. Entretanto, como várias secretarias de educação adotaram o sistema de progressão continuada – que não implica retenção de uma série à outra – não é possível aferir com precisão a quantidade de alunos alfabetizados ao término do primeiro ano no Ensino Fundamental.”3

Taxa de aprovação ao final da 1a série do Ensino Fundamental (IBGE/INEP)4

1956 1987 1988 1989 1990 1991 1992 1993 1994 1995 1996 1997*

1998*

41,8% 47% 46% 49% 51% 51% 51% 50% 53% 53% 58% 65% 68,7%

* No s a n o s d e 1 9 9 7 e 1 9 9 8 , a l g u m a s s e c r e t a r i a s d e e d u c a ç ã o p a s s a r a m a a d o t a r o s i s t e m a d e c i c l o s , p r e v i s t o n a L e i d e D i r e t r i z e s e B a s e s d a E d u c a ç ã o Na c i o n a l ( L D B ) .

Os pesquisadores Michel Fullan e Andy Hargreaves, que publicaram recentemente no Brasil A escola como organização aprendente, admitem no livro que “quando os professores receiam partilhar suas ideias e seus sucessos, por medo de serem percebidos como arautos de seus feitos; quando os professores relutam em contar aos outros uma ideia nova por receio de que possam roubá-la ou assumir seu crédito (ou por acreditar que os outros devam passar por todo o processo de descoberta pelo qual passou); quando os professores, jovens ou mais velhos, têm medo de solicitar ajuda porque podem ser percebidos com pouco competentes; quando um professor utiliza o mesmo método, ano após ano, mesmo que ele não traga resultados – todas essas tendências dão sustentação às paredes do individualismo. Elas limitam fundamentalmente o crescimento e o aperfeiçoamento, porque limitam o acesso a ideias e a práticas que poderiam oferecer maneiras mais eficientes de se fazer as coisas. Elas institucionalizam o conservadorismo.”

Não é este, afinal, um retrato fiel de como funcionam as coisas no magistério?

2 IBGE: Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística / INEP: Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais do Ministério da Educação. 3 In Letramento-e-alfabetização, de Rosaura Soligo (2002). 4 In Documento de Apresentação do Programa de Formação de Professores Alfabetizadores (PROFA), MEC/2001.

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As instituições só mudam quando as pessoas que as constituem se modificam. E por que razão os professores iriam querer se transformar, se vivem/trabalham em péssimas condições sob todos os aspectos? De onde sairia o desejo de mudança? Por acaso a sociedade funciona como um contexto favorável à transformação de instituições como a escola?

Dizia Habermas que só o ‘eu’ que conhece a si próprio e questiona a si mesmo é capaz de aprender e se transformar. Pois quem há de fazer a instituição escolar se conhecer e se questionar? Quem assumiria a liderança para operar na escola esse milagre? Os diretores? Os coordenadores pedagógicos? Os professores? Claro que não. Também eles são peças do jogo conservador de que a escola é emblemática.

A realização do sonho de uma escola renovada, inovadora, nova de fato, depende do desejo e da ação de quem não se dispõe a dar o passo, a tomar nas mãos o desafio, a assumir a vez.

Deixemos, portanto, esse sonho de lado. Não há nada que se possa fazer.

__________________________________________________________

SIM.

Com certeza, é possível transformar a escola.

O fato das transformações não serem significativas até hoje

de forma alguma representa uma impossibilidade.

“Assim como alimentação, saúde, convívio social e lazer, o conhecimento é fundamental para a qualidade de vida de todo indivíduo. Quanto mais se sabe, mais se pode saber – o que sabemos nos faz melhores observadores, melhores intérpretes e, por certo, melhores cidadãos.

A escola é, portanto, uma instituição extremamente poderosa: tanto pode dar à luz o conhecimento e o prazer de aprender como, ao contrário, pode cristalizar a ignorância, obscurecer.

Um exemplo dramático sobre o prejuízo causado pela ausência de conhecimento à compreensão do mundo, das coisas e dos textos foi apresentado em 2001 pelo artista plástico Antonio Veronese no programa ‘Ação’, comandado por Serginho Groismann, quando relatava sua experiência de arte-educação com jovens. Para iniciar um trabalho de apreciação do quadro “Guernica”, de Pablo Picasso, resolveu escrever uma frase breve e simples que sintetizasse o contexto retratado na tela. O texto era mais ou menos assim: ‘...Guernica é uma cidade da Europa que sofreu um ataque aéreo na Segunda Guerra Mundial e foi completamente destruída...’. Diante da ausência de reação mais significativa, foi indagando os jovens sobre o que sabiam a respeito e descobriu que muitos desconheciam onde era a Europa, qual o significado da expressão ‘sofreu um ataque aéreo’ e o que teria sido a Segunda Guerra Mundial... Como poderiam então compreender o texto, impressionar-se com o seu significado, comover-se com o quadro?

Pode-se ensinar muita coisa para os alunos ou negar a eles o direito de aprender. Tudo depende de acreditar na sua capacidade e nas suas possibilidades, porque para ensinar muito – e bem – é

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preciso acreditar verdadeiramente que todo aluno é capaz e tem direito ao conhecimento. Essa crença é a maior virtude de um professor, pois quando existe, é ela que orienta suas ações.

Se a escola não tem como meta ensinar a todos, se não crê que seus alunos sejam verdadeiramente capazes e se eles dependem fundamentalmente dela para aprender, o resultado pode ser dramático: pessoas que nunca ouviram falar da Europa, da Segunda Guerra Mundial e de ataques aéreos que destroem cidades, pessoas que desconhecem a geografia e a história do mundo e do próprio país, as lutas sociais e seus protagonistas, as invenções e descobertas científicas, os temas e dilemas da atualidade, as artes, a literatura, os textos e os assuntos de que tratam. Que tipo de cidadania se pode exercer nessas condições? Na prática, a pessoas assim está negada a possibilidade de plena participação social...

A superação desse quadro é tarefa da educação escolar. É preciso ensinar os alunos. É preciso alfabetizar os alunos – no sentido estrito e no sentido lato. Quando a escola não consegue nem mesmo alfabetizar a todos, presta um desserviço aos alunos e à sociedade, porque não cumpre com uma de suas mais antigas finalidades.

Se tomarmos em conta que a maior categoria profissional do país é o magistério (mais de um milhão e seiscentos mil professores!) e que 97% das crianças brasileiras estão na escola e nela passam pelo menos quatro horas durante 200 dias ao ano, fica evidente o enorme poder de formação e de informação que isso representa. No mundo atual, geralmente é com o professor que as crianças mais convivem: de segunda a sexta-feira, por pelo menos quatro horas diárias, anos e anos a fio – hoje, poucos familiares gozam do privilégio de ficar tanto tempo com elas. Não se pode dizer que 800 horas-ano é pouco tempo...”5

Mas o fato é que, como bem coloca a professora e pesquisadora Isabel Alarcão, “assiste-se hoje a uma forte inadequação da escola para fazer face às demandas da sociedade – a escola precisa abandonar os seus modelos mais ou menos estáticos e posicionar-se dinamicamente (...). A mudança de que a escola precisa é uma mudança paradigmática. Porém, para mudá-la, é preciso mudar o pensamento sobre ela. É preciso refletir sobre a vida que lá se vive, em uma atitude de diálogo com os problemas e as frustrações, os sucessos e os fracassos, mas também em diálogo com o pensamento, o próprio e o dos outros.”

Essa mudança é desejável. Necessária. Essa mudança é possível.

Como fazê-la?

Vejamos...

5 SOLIGO, Rosaura. Letramento-e-alfabetização, 2002.

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É POSSÍVEL FAZER DA ESCOLA UM LUGAR DE CONHECIMENTO PARA TODOS

Hoje, não são poucos os pesquisadores e profissionais da educação que defendem a escola como um possível e privilegiado espaço de aprendizagem para todos – alunos, profissionais, familiares e comunidade em geral.

Há quem prefira chamar uma escola desse tipo de ‘reflexiva’, como é o caso de Isabel Alarcão (2001), há quem prefira chamá-la de ‘organização aprendente’, como Michael Fullan, Andy Hargreaves (2000) e outros tantos. Rui Canário (2000), por exemplo, afirma que esse sentido metafórico de ‘organização aprendente’, de ‘escola que aprende’ se coloca quando aprendem coletivamente os seus atores, os seus autores, os sujeitos que nela atuam.

Uma escola que aprende pode ser também uma escola que produz conhecimento – à medida que os seus educadores assumem o desafio de pesquisar respostas para as questões que se colocam no exercício da profissão e de sistematizar os saberes construídos nesse processo. Essa possibilidade certamente pressupõe a transformação da cultura predominante nas escolas, conservadora, que, além de não favorecer a aprendizagem e a pesquisa, em geral dificulta.

Para que a escola possa se constituir e se consolidar como um lugar de aprendizagem e de produção de conhecimento, portanto, é preciso que se converta em um contexto propício para relações interpessoais solidárias, trabalho coletivo e desenvolvimento profissional contínuo, apoiado no estudo, na reflexão sobre a prática, na discussão de situações-problema e respostas para elas, na investigação de questões relevantes para a comunidade escolar.

Utilizando como referência o conceito de professor reflexivo, hoje bastante difundido e aceito, Isabel Alarcão desenvolve6, por analogia, o conceito de escola reflexiva e apresenta dez ideias que traduzem o seu pensamento a esse respeito, aqui resgatadas, ampliadas e ilustradas com o depoimento de dez educadores brasileiros. Em linhas gerais, são estas as ideias:

Tomar como princípio que o mais importante são as pessoas. Considerar que liderança, visão, diálogo, pensamento e ação são fundamentais na escola. Construir e consolidar um projeto educativo próprio, explícito e compartilhado. Compatibilizar a dimensão local e universal. Garantir o exercício da cidadania no interior da própria escola. Articular as ações de natureza político-administrativa, curricular e pedagógica. Criar contextos que favoreçam o protagonismo e a profissionalidade dos professores. Favorecer o desenvolvimento profissional e a ação refletida. Desenvolver uma epistemologia da vida da escola. Pautar-se por uma perspectiva de desenvolvimento ecológico.

A seguir, cada um desses pressupostos é tematizado a partir da voz e da experiência de profissionais empenhados em concretizá-los nas instituições em que trabalham.

O texto contido neste subtítulo foi publicado como capítulo do livro ‘Para ensinar a todos - Narrativas pedagógicas de experiências na escola’, produzido pela Secretaria Municipal de Rio Branco em parceria com o Instituto Abaporu de Educação e Cultura, em 2007. 6 In Escola reflexiva e nova racionalidade, Artmed, 2001.

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Tomar como princípio que o mais importante são as pessoas

É exatamente nessa dialética de sermos constituídos e modificados pelas relações que nos afetam

ao mesmo tempo em que desenvolvemos a potência de transformar o território que habitamos, que

se insere a experiência escolar. Diversamente da educação doméstica, a educação escolar lida

mais diretamente com a diferença e a alteridade, ensinando a todos da comunidade escolar – e não

apenas aos alunos – a difícil tarefa de conviver e aprender com os que não são feitos à nossa

imagem e semelhança. É por meio da circulação discursiva no interior das práticas escolares que

nos apropriamos e inventamos os valores necessários para nossa inscrição social; aprendemos

mais sobre as relações de poder; criamos laços e ampliamos nossa circulação social. Mesmo com a

existência de proposições massivas nas políticas de educação, é no interior de cada escola e na

qualidade das relações ali estabelecidas que reside a maior ou menor chance de se avançar em

relação ao que já existe ou apenas repetir o que já é sabido. Cada comunidade escolar é portadora

de particularidades que a tornam única e essa é uma das maiores riquezas.

Yara Sayão

Psicóloga do Serviço de Psicologia Escolar da USP

Os projetos institucionais bem-sucedidos têm reafirmado a convicção de que o mais importante de fato são mesmo as pessoas, suas ideias, suas ações e sua efetiva interlocução: tanto para impulsionar o trabalho quanto para criar resistências, quando não estão convencidas de que ele vale a pena. É pelo diálogo que as pessoas se manifestam, confrontam seus pontos de vista, concordam ou discordam do que a elas se apresenta como possibilidades, aprofundam seus pensamentos, revelam seus sentimentos, colocam suas propostas, assumem responsabilidades e se organizam. As pessoas criam e recriam os contextos e neles convivem e se socializam – sem elas, qualquer outro recurso perde o sentido e a pertinência.

Assim, quem torna viva a escola são aqueles que dela fazem parte: os educadores, os demais funcionários, os alunos e seus familiares. A qualidade das relações que se estabelecem entre esses sujeitos, e deles com a escola e com o que nela fazem, é essencial para constituir um contexto favorável à busca de uma educação melhor a cada dia.

Considerar que liderança, visão, diálogo, pensamento e ação são fundamentais

Na escola e, em especial, no exercício da coordenação pedagógica, é que aprendi a exercer a

possibilidade de liderança, fundamentalmente porque compreendi que era necessário assumir a

construção de um projeto para escola e na escola, independente das orientações desencontradas de

sucessivas administrações públicas.

A transformação da escola num espaço permanente de estudo, mobilizada por projetos pessoais e

coletivos e sob a liderança de profissionais que ainda acreditam que podem fazer a diferença e se

dispõem continuamente a refletir sobre sua prática, me parece ainda a única possibilidade de

romper com o individualismo e com uma cultura institucional que pressupõe professores isolados

em suas salas de aula.

A crença na proposta de trabalho, o investimento – pessoal e coletivo – na formação do grupo de

educadores e os resultados alcançados são imprescindíveis para a conquista de parceiros e de

sucesso dos projetos que desenvolvemos.

Rosanea Mazzini Coordenadora Pedagógica da Rede Municipal de Educação São Paulo.

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Hoje há um razoável consenso que uma organização dinâmica, situada, responsável e humana tem cinco características que, articuladas, lhe dão sustentação: liderança, visão, diálogo, pensamento e ação. Ou seja, em toda instituição, é preciso que alguns profissionais assumam o papel de parceiros experientes e coordenadores das ações pensadas e definidas pelo grupo, que juntos encontrem os caminhos que procuram, por meio do diálogo, da complementaridade, da disposição para agir coletivamente. Não basta haver lideranças se estas não têm uma visão ampliada dos acontecimentos, se não dialogam, se não potencializam as ideias e as ações. Também não basta ter visão, boas ideias e iniciativa para agir se os demais profissionais não estão pessoalmente implicados com o que se pretende fazer porque a interlocução através do diálogo e da reflexão partilhada não foi suficiente para que assim fosse.

Tal como se pode inferir da experiência relatada acima, apenas a existência de uma liderança propositiva não garante a concretização em atos das boas ideias: é preciso que o coletivo de educadores discuta fraternalmente as suas questões e se engaje num projeto comum, contando com apoio efetivo e com um espaço de interlocução sobre como desenvolvê-lo adequadamente.

Construir e consolidar um projeto educativo próprio, explícito e compartilhado

Começamos a consolidar o Projeto Educativo da Creche a partir do envolvimento de todos os

educadores na identificação dos acertos que imprimiam qualidade à ação educativa, dos

problemas que impediam o melhor desenvolvimento destas ações e na busca de soluções para os

mesmos. Os espaços de formação em serviço foram o grande fórum onde aconteciam o debate e a

construção permanente do Projeto.

A sua elaboração contínua teve como objetivo central favorecer a todos os educadores da Creche a

compreensão do que fazem, por que fazem de uma certa maneira e os resultados a que chegam.

Identificar a responsabilidade de cada um na organização e desenvolvimento das ações,

evidenciando que o coletivo necessário para sustentar um Projeto Educativo de qualidade não

pode ser nada menos que um organismo vivo e que as funções e responsabilidades de todos os

sujeitos/grupos que o compõem são interdependentes – esse era um dos desafios. Cada grupo da

Creche – seja de educadores, pessoal de apoio (que trabalha na manutenção e limpeza), equipe da

cozinha, lavanderia, direção, coordenação – é responsável por níveis diferentes de concretização

do Projeto Educativo.

A avaliação permanente das ações desenvolvidas, realizada por todos, favoreceu/favorece a

reflexão sobre os alcances e limites do Projeto Educativo, imprimindo a ele um caráter provisório,

na medida em que deve ser reestruturado de acordo com as necessidades identificadas por todos a

quem ele se destina e que dele fazem parte direta ou indiretamente: crianças, educadores e

comunidade.

Rosana Dutoit Mestre em Educação pela FEUSP,

ex-coordenadora pedagógica da Creche Central da USP/Coseas,

formadora de educadores

O projeto educativo de uma instituição pressupõe três dimensões às vezes tomadas como dissociadas: o que acontece de fato no dia-a-dia, o resultado da discussão dos seus profissionais sobre as concepções e propostas que consideram pertinentes e o registro das propostas definidas/realizadas.

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A concretização de um projeto próprio depende de se acordar os níveis de execução, dividir responsabilidades e estabelecer os mecanismos de monitoramento de todo o processo, inclusive de avaliação dos resultados: implica ao mesmo tempo cumprir com a função social da instituição educativa e encontrar os próprios caminhos a partir das peculiaridades locais.

E a autonomia inerente a um projeto próprio não é – pelo menos não deve ser – incompatível com diretrizes gerais definidas em instâncias mais amplas. Se essas diretrizes gerais tomam como referência o que conta de fato – as reais possibilidades e necessidades de aprendizagem dos alunos e dos profissionais – é pouco provável que não sejam consonantes com as definições específicas das escolas, a menos que estas estejam desvirtuadas de sua função educativa...

Compatibilizar a dimensão local e universal

Sob nenhum argumento, é admissível que a escola e os educadores contribuam, mesmo que

involuntariamente, para alimentar a roda da exclusão social em nosso país, que há décadas

mantêm gerações alijadas dos seus direitos básicos de cidadania – de acesso, permanência e

sucesso escolar, inclusive.

Garantir a todos o direito ao conhecimento historicamente construído pela humanidade e, ao

mesmo tempo, resgatar e valorizar a cultura e os saberes da comunidade local é um desafio e uma

tarefa necessária para a real democratização da escola pública. Esse compromisso implica tomar

o aluno como sujeito e protagonista do processo de aprendizagem, o que pressupõe uma dupla

perspectiva pedagógica – e política. De um lado, considerar os seus conhecimentos e saberes

culturais – tratados como relevantes, válidos e, portanto, dignos de serem abordados na escola – e,

de outro, possibilitar o domínio dos conteúdos que são de responsabilidade da escola ensinar – e

que devem favorecer a plena participação social e as suas possibilidades de escolha como cidadão.

Ensinar a todos os alunos é, portanto, um modo de combater a exclusão social, é um modo

poderoso de praticar de fato a educação escolar inclusiva.

Walter Takemoto Educador, Assessor Pedagógico

e Diretor do Instituto Abaporu de Educação e Cultura

O desafio que se coloca para a implementação de um trabalho educativo consequente é compatibilizar a universalidade da dimensão educativa e socializante de toda escola e a especificidade local característica de uma instituição que é parte de uma comunidade singular.

Essas perspectivas não são excludentes, com às vezes se supõe, são complementares.

Essa complementaridade é mais evidente quando o trabalho educativo se orienta por uma concepção ampla de conteúdo escolar, que toma como tal não apenas os fatos e conceitos tradicionalmente predominantes no currículo, mas também as práticas sociais, os valores, as normas de convívio, as atitudes, os procedimentos e tudo o que é necessário trabalhar na escola para que os alunos possam de fato se desenvolver em todos os aspectos.

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Garantir o exercício da cidadania no interior da própria escola

A experiência pedagógica tem revelado que não é pelo discurso, pela explicação detalhada dos

conteúdos, que adquirimos/desenvolvemos certos procedimentos e atitudes, especialmente aquelas

que envolvem valores. Tomar essa perspectiva é uma via para compreender que à escola não cabe

preparar para a cidadania, mas, para além disso, cabe vivenciá-la na complexidade de seu

cotidiano. Exercitando a autonomia, a liberdade e a responsabilidade em ações diárias consigo

mesmo e com os outros que o cercam – profissionais da escola, estudantes, pais e comunidade local

– o sujeito pode desenvolver ‘possibilidades de cidadania’. Ações no cotidiano escolar, desde a

forma de tratamento dos estudantes para com os funcionários da escola – e vice-versa – até a

correlação com a comunidade local, são algumas delas. Cuidar do espaço físico, das árvores e

plantas no prédio escolar, fazer separação do papel utilizado para rascunho e para reciclagem

encaminhando-o para cooperativas de trabalho, garantir o atendimento periódico a famílias e

estudantes, para redirecionar caminhos e atitudes, dar vez e voz às professoras quanto às

propostas de trabalho no dia-a-adia da escola etc., são outros indícios da cidadania posta em atos.

Cláudia Ferreira Doutora pela Faculdade de Educação da Unicamp,

Coordenadora pedagógica

A tarefa formativa da escola não é preparar para o exercício futuro da cidadania, como muito já se propagou, mas para o aprendizado da cidadania no dia-a-dia da própria escola: na compreensão da realidade, no exercício da liberdade e da responsabilidade, na atenção e no interesse pelo outro, no respeito pela diversidade, na tomada de decisões pertinentes, no compromisso com o desenvolvimento humano, social e ambiental.

Bem sabemos que toda formação pautada em valores depende do exemplo, da coerência, do convívio com outros que os compartilham. Pouco adianta o discurso sobre a importância de atitudes cidadãs, se o contexto não as valoriza em atos, tampouco favorece o seu desenvolvimento.

Uma escola verdadeiramente comprometida com a aprendizagem de todos com certeza é um espaço de experimentação da cidadania no cotidiano.

Articular as ações de natureza político-administrativa, curricular e pedagógica

Ao longo de minha vida profissional atuei como professora, diretora de escola, supervisora de

ensino e ocupei cargos em órgãos técnicos e pedagógicos da Secretaria de Estado da Educação de

São Paulo. Nessas situações vivenciei e senti os efeitos da desarticulação entre discussões e ações

referentes a questões de natureza política, administrativa, curricular e pedagógica, infelizmente,

uma marca do sistema educacional brasileiro. Assistimos a alguns desastres ocasionados pela falta

de clareza e de estratégias de comunicação eficientes entre os órgãos centrais e as escolas. Os

exemplos são muitos: a implementação de políticas de organização da escola por ciclos (o ciclo

básico e outros), a instituição de propostas de avaliação rotineiramente identificadas como

promoção automática, a disseminação de inovações curriculares e pedagógicas como, por

exemplo, as ideias de interdisciplinaridade, contextualização, projetos etc. A falta de comunicação

entre a concepção de ideias e a sua realização concreta produz deturpações geralmente graves. Há

ainda o sério problema de descontinuidade de políticas de uma administração para outra, com a

interrupção frequente e inexplicável de projetos, o que produz nos profissionais, insegurança,

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desconfiança e resistência. Mas essas desarticulações ocorrem também no interior da escola, em

que a divisão das tarefas de diretores, coordenadores, pessoal da secretaria e de apoio e

professores nem sempre convergem para a consecução de metas que deveriam ser propostas,

compartilhadas e perseguidas por todos os segmentos, pela falta de diálogo, de debate, de reflexão,

de estudo coletivo.

Por esses motivos, considero que o sistema educativo deve inspirar-se no modelo de uma rede em

que a escola seja vista como unidade de interação dos órgãos públicos com a rede de ensino. É

ela que propõe e desenvolve projetos, os acompanha e avalia, não de forma solitária, mas

procurando situar a dinâmica do conhecimento em contextos mais amplos. A rede escolar deve ser

analisada como uma rede com características de heterogeneidade – cada escola é uma escola – e

de fractalidade – os efeitos se propagam na rede e cada escola, ao mesmo tempo em que funciona

como unidade na grande teia educacional, é, ela própria, composta por toda uma rede, que inclui

processos muitas vezes vistos como pertinentes exclusivamente em níveis superiores da

organização, tais como projetos de formação de professores, política do livro didático,

investimento de recursos e, em especial, organização de currículos. Como nó da rede é

fundamental que a escola se enraíze na comunidade, assumindo o papel de mobilizadora e

organizadora de um processo, num movimento que deve envolver os pais e comunidade, integrar os

diversos espaços educacionais que existem na sociedade e, sobretudo, ajudar a criar o ambiente

científico-cultural para o desenvolvimento de atitudes criativas do cidadão. A organização

curricular deve criar um ambiente escolar que possa ser caracterizado como um espaço em que,

além de buscar dados e informações, as pessoas têm possibilidade de construção do seu

conhecimento e de desenvolvimento de sua inteligência, com suas múltiplas competências. Esse

espaço do conhecimento deverá estar, como parte de uma rede, permanentemente aberto.

Célia Maria Carolino Pires Professora Titular do Departamento de Matemática daPUC/SP,

professora do Programa de Estudos Pós Graduados em Educação Matemática

e Coordenadora do Curso de Licenciatura em Matemática

Como se vê, é preciso dar um tratamento sistêmico às ações de natureza político-administrativa, curricular e pedagógica, única forma de superar a fragmentação que quase sempre inviabiliza a conquista dos resultados que se espera da educação escolar. Toda educação formal pressupõe uma política e requer apoio administrativo, que precisam, por sua vez, se coordenar com a dimensão curricular e com a dimensão pedagógica, de modo a potencializar o trabalho, o relacionamento entre os diferentes atores envolvidos no processo educativo e a conquista dos resultados pretendidos. Nesse sentido, mais uma vez o diálogo, o poder esclarecedor ou argumentativo da palavra e a aceitação do ponto de vista do outro são essenciais. E uma certa dose de paciência histórica, como diria o Mestre Paulo Freire. Porque não se transforma uma cultura de décadas – a da compartimentalização das coisas da educação – de uma hora para outra. Conquistar um planejamento sistêmico requer muita discussão, disponibilidade interna das pessoas e persistência para imprimir um modo completamente diferente de pensar e agir.

Criar contextos que favoreçam o protagonismo e a profissionalidade dos professores

Ser ator e protagonista da escola: o que isso pode querer dizer? Se for sensato afirmar que “cada

escola tem a cara de seus membros”, posso concluir que o projeto de cada escola depende da

contribuição de todas as pessoas envolvidas em torno da mesma paixão (pelo futuro?) e combina

com esse coletivo. Nesse caso, os professores como mediadores de conhecimentos, ideias, valores e

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sentimentos, precisam fazer escolhas, isto é, inventar (e protagonizar) um jeito de ensinar e

aprender, “dar cara” à escola. Podem se enganar, é fato, mas precisam estar comprometidos com

um certo saber-viver que os permita acertar o máximo possível. Esse saber-viver, que transcende a

dimensão pedagógica, é construído nas experiências pessoais, nas várias instâncias de formação,

nas reuniões com os outros professores, no trabalho coletivo. Das muitas lições que aprendi como

professora e como coordenadora pedagógica na escola onde atuei por catorze anos, uma se

destaca entre as lembranças mais preciosas – o conselho da diretora, que reconhecia e valorizava

o papel do professor e sua autonomia: “Faça sempre o que você achar certo e prudente; seja fiel

aos seus princípios”. Lição aprendida, repetida, multiplicada. Fonte de inspiração. Ser professora-

protagonista na escola é buscar insistentemente a coerência individual e coletiva, fazendo da

pluralidade uma possibilidade de unidade...

Renata Barrichelo Cunha Professora-pesquisadora, formadora de professores,

Doutora pela Faculdade de Educação da Unicamp

Defender que as pessoas são fundamentais na organização da escola, implicar defender que devem protagonizar a ação que nela acontece. É certo que todos que convivem no espaço escolar são atores importantes. Mas é certo também que são os professores os atores de primeiro plano.

Hoje já se verificam avanços importantes na compreensão de alguns fatores que contribuem para a profissionalização do magistério: por um lado, a sociedade e os gestores do sistema de ensino demonstram maior clareza em relação às condições necessárias para o exercício da docência; por outro, os professores tomam consciência de sua profissionalidade e de seu poder e responsabilidade em termos individuais e coletivos. Sem dúvida tudo isso ajuda, mas o que conta de fato são as ações decorrentes dessa compreensão ampliada.

Do ponto de vista institucional, é preciso criar contextos que favoreçam o protagonismo dos professores e a profissionalidade docente, que vão muito além da dimensão pedagógica. E do ponto de vista pessoal, é preciso assumir o desafio de ser um profissional comprometido com os resultados do próprio trabalho.

Favorecer o desenvolvimento profissional e a ação refletida

A reflexão é a possibilidade de nos pôr em movimento na profissão – tomado o uso do verbo latino

‘reflectere’, significa ‘virar’ ou ‘dar a volta’, ‘voltar para trás’, e ‘jogar ou lançar para trás’.

Nesse sentido, a reflexão não pode ser confundida com a informação, nem mesmo como um fim em

si mesmo. É um dispositivo para a mobilização de novas aprendizagens. Uma compreensão que

posiciona o professor na condição de aprendente.

Aprender significa a possibilidade de se tornar um criador de possibilidades, e também de exercer

uma ação política na educação, uma vez que possui valor coletivo. Não há possibilidade de uma

ação solitária; toda reflex-ação implica muitos indivíduos, tornando-se ao mesmo tempo uma

singularização coletiva.

Aprender com a fúria e a alegria de um cão que cava seu buraco: assim o professor vai trilhando

seu presente, potencializando a militância.

Carla Ropelato Professora Doutora

e Supervisora da Secretaria Municipal de Educação de Joinville

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Aprender significa a possibilidade de se tornar um criador de possibilidades, e também de exercer uma ação política na educação, uma vez que possui valor coletivo... Eis uma convicção importante para inspirar nossos atos.

A complexidade dos problemas que hoje se colocam à escola não encontra soluções prontas e facilmente aplicáveis, ao contrário, demanda capacidade de análise dos acontecimentos e de encontrar respostas estratégicas a partir da cooperação, de olhares multidimensionais e de uma atitude de investigação na ação e pela ação. Por essa razão, as iniciativas de formação continuada, especialmente aquelas que se desenvolvem na escola, pautadas no trabalho coletivo, representam um caminho necessário para os educadores e um investimento obrigatório para os gestores do sistema de ensino. Sem ações efetivas de formação, a defesa do direito dos educadores ao desenvolvimento profissional contínuo não passa de um discurso apenas.

Desenvolver uma epistemologia da vida da escola

Participei por vários anos do projeto ‘Escola Singular: Ações Plurais’, na EMEF Padre Francisco

Silva, da rede municipal de ensino de Campinas, em parceria com uma professora universitária da

Unicamp e um grupo de professores-pesquisadores da escola.

Essa experiência tem permitido produzir um conjunto de saberes e conhecimentos a respeito dos

processos de ensino e de aprendizagem, bem como uma lúcida e circunstanciada compreensão dos

problemas e dilemas cotidianos, buscando respostas possíveis a essas questões. O desafio, posto e

constantemente assumido por todos nós, é o de encontrar soluções para determinadas dificuldades

de aprendizagem dos estudantes buscando superá-las, planejar ações de apoio ao trabalho

educativo e propostas que mobilizem várias séries, realizar projetos a partir de uma perspectiva

interdisciplinar, em que professoras e professores, estudantes e demais atores desenvolvem suas

proposições a respeito de determinados conteúdos de ensino, entre muitas outras.

Forjado pela reflexão coletiva, o trabalho pedagógico é fruto da construção compartilhada entre

Universidade e Escola, entre estudantes, professores e demais sujeitos, o que configura um

‘currículo em ação’ pautado em princípios de participação e colaboração.

Buscando encontrar resposta para as diferentes situações-problema vividas na instituição, temos

conseguido criar, como o diria o Mestre Paulo Freire, alguns inéditos viáveis – construções

compreensivas da realidade, próprias e singulares, algo do sonho que utopicamente imaginamos,

mas que vamos conseguindo realizar e que se encontra destacado no conturbado cotidiano da

escola, visível por uma práxis libertadora. Assim, vai se transformando a cultura predominante e se

abrindo a perspectiva de produzir saberes e conhecimentos a partir da constante elaboração

teórica da instituição escolar e da instituição universitária e do diálogo entre essas duas

instâncias. Trata-se de uma experiência importante de parceria efetiva e dinâmica, que temos

procurado – e conseguido – viver com sabedoria e emoção.

Guilherme do Val Toledo Prado Professor Dr da Faculdade de Educação da Unicamp

e Coordenador do Gepec - Grupo de Estudos e Pesquisas em Educação Continuada

A possibilidade dos educadores produzirem conhecimento sobre a escola, na perspectiva defendida por Donald Shön, de uma epistemologia da prática, é fruto de um processo de reflexão,

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coletiva e contextualizada, sobre a vida da escola. Considerar os educadores de fato protagonistas da ação pedagógica que desenvolvem, e capazes de produzir conhecimento a partir da reflexão sobre a própria ação, significa considerá-los capazes de fazer o mesmo em relação à escola como um todo.

Quando esses profissionais têm uma participação ativa e crítica no projeto educativo – do ponto de vista das suas definições, da concretização das propostas, da avaliação dos resultados e dos encaminhamentos e também do registro – certamente estão produzindo em algum nível uma epistemologia da vida da escola. E quando se pode contar com parcerias produtivas que potencializam essa experiência, como no exemplo descrito acima, as possibilidades se ampliam consideravelmente e todos saem ganhando: os profissionais da escola, os pesquisadores da universidade e principalmente os alunos, razão de ser de tudo o mais.

Guilherme Prado (2006), autor desse depoimento – e co-autor da experiência relatada – argumenta que fazemos pesquisa na escola sempre que há:

uma questão para a qual intencionalmente buscamos respostas, soluções, alternativas; o ‘diálogo’ com interlocutores, ‘outros significativos’, que trazem contribuições para a

compreensão da questão que se investiga: autores que estudaram o assunto, colegas de trabalho e demais profissionais com os quais se discute, amigos que ajudam a pensar etc.;

organização e análise das informações disponíveis para compreender e encontrar respostas, soluções, alternativas para a questão

se possível, uma reflexão sobre o percurso que vai desde a definição do que se pretendia investigar até esses resultados, ainda que provisórios ou parciais;

algum tipo de registro que documente isso tudo, com vistas à socialização, por se tratar de assunto de interesse de outros profissionais.

Assim, produzir uma epistemologia da vida da escola passa necessariamente por um processo de pesquisa dessa natureza, que pressupõe buscar coletivamente respostas para os problemas que nela se identifica e para os quais os educadores se consideram capazes de, em parceria, encontrar soluções ou, pelo menos, formas de minimizá-los ou atenuar seus efeitos.

Pautar-se por uma perspectiva de desenvolvimento ecológico

O Centro de Atividades Comunitárias de São João de Meriti (CAC) foi fundado em 1987 com a

intenção de fornecer subsídios para a reflexão dos movimentos populares e sindicais sobre saúde,

educação e produção. Na área da educação criou uma escola para crianças, com o propósito de

ser referência para um trabalho de formação de professores, e uma biblioteca comunitária, que se

organizou como um Centro de Promoção de Leitura e Pesquisa. O trabalho na área da educação

foi construído na busca por aliar o saber popular ao conhecimento científico, o que implicava

estabelecer relações com instituições e pessoas que possuíam estes diferentes tipos de

conhecimento. Portanto, o CAC já nasceu com a necessidade formalizada de interação, pois tinha

que desenvolver relações colaborativas com outras organizações a fim de acumular conhecimento,

compartilhar suas elaborações, trocar experiências e inclusive sobreviver financeiramente porque

dependia de doações e convênios, por ser uma instituição comunitária.

Mas, como bem sabemos, a instituição não existe sem a vontade das pessoas. O que de fato fez do

CAC uma referência de qualidade foi a capacidade do grupo, que deu início às atividades na área

de educação, comungar um projeto que ia se constituindo e se incorporando em cada sujeito,

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inclusive nos que foram chegando ao longo dos anos, e afetando os aspectos não só profissionais,

mas também pessoais e sociais. Essa capacidade provocou uma autonomia entendida como o atuar

em função dos objetivos comuns do grupo, constituídos como objetivos individuais de cada sujeito.

Nesse sentido, o partilhar experiências sempre foi a própria essência do CAC. O compartilhar

conhecimentos extrapolava o espaço institucional e não era um compartilhar de um grupo de

amigos que trabalhavam juntos. Ser amigo era circunstancial, neste caso, o que interessava era

que o princípio de partilha de informações, democratizando o que cada um sabia, assumia

proporções maiores do que a de um grupo sustentado por relações afetivas e se multiplicava em

outros espaços além da instituição. Desde a fundação do CAC foram crescentes as relações com

outras escolas, Ongs, secretarias de educação, fundações nacionais e internacionais, associações,

sindicatos, universidades e com outros professores, inclusive de outros estados e de outros países.

Houve um efeito multiplicador das ações do CAC para além da própria instituição.

E é importante destacar que a capacidade de tornar individual o objetivo coletivo gerou no grupo,

algo que julgo ser um grande ‘patrimônio’: a capacidade de alegrar-se com o sucesso do outro, ao

assumi-lo para si. O sucesso profissional do outro é também meu sucesso!

Maria da Conceição Rosa (Nalu) Professora do Instituto de Aplicação da Universidade do Estado do Rio de Janeiro

e Membro da Equipe de Educação do Centro de Atividades Comunitárias

de São João de Meriti - CAC

A perspectiva de desenvolvimento ecológico, a que se refere Isabel Alarcão, pressupõe que as instituições, assim como as pessoas, são ‘sistemas abertos’, em permanente interação com o ambiente e, portanto, precisam ser permeáveis às peculiaridades do tempo histórico em que vivem. Essa disposição de ‘abertura’ é o que pode contribuir para que encontrem amigos críticos, parceiros solidários e respostas para os desafios, tal como acontece com o Centro de Atividades Comunitárias e com muitas outras instituições.

Talvez não seja ousadia afirmar que as experiências que dão vida a cada uma dessas dez ideias se inspiram em todas elas, a despeito dos autores dos relatos não terem se posicionado explicitamente a respeito. Afinal, as concepções e as características que marcam as escolas de qualidade guardam mais semelhanças do que distinções, fato comprovado por algumas pesquisas importantes das últimas décadas.

Em 1989, por exemplo, uma pesquisadora chamada Rosenholtz investigou o que chamou de “escolas travadas – ou ‘empobrecidas quanto à aprendizagem’ – e as escolas em movimento – ou ‘enriquecidas em termos de aprendizagem’”7. As escolas ‘travadas’ eram escolas onde os estudantes tinham os níveis mais baixos de sucesso, onde os professores costumavam trabalhar sozinhos e raramente solicitavam ajuda. E as escolas ‘em movimento’ eram aquelas onde os professores trabalhavam coletivamente e reconheciam que, sendo a tarefa docente complexa e difícil, muitas vezes precisavam de ajuda. Dessa perspectiva, dar e receber ajuda não tinha a ver com incompetência pessoal: era parte da busca comum de aperfeiçoamento contínuo. Assim, o apoio dos colegas e a possibilidade de interagir com eles sobre o trabalho traziam maior confiança, maior certeza quanto aos encaminhamentos e ao próprio processo de aprendizagem.

7 Pesquisa citada por Michel Fullan e Andy Hargreaves, em seu livro A escola como organização aprendente, 2000.

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“Nas escolas eficientes, a colaboração está associada a normas e a oportunidades de

aperfeiçoamento contínuo e aprendizagem ao longo da carreira: ‘Presume-se que o

aperfeiçoamento do ensino é um empreendimento mais coletivo do que individual, e que

análise, avaliação e experimentação junto com os colegas são condições mediante as quais

os professores tornam-se melhores’. Como consequência, os professores apresentam maior

probabilidade de confiar, valorizar e legitimar o partilhar de conhecimentos, a busca de

conselhos e a oferta de ajuda, tanto dentro como fora da escola. Muito possivelmente,

tornar-se-ão professores cada vez melhores em sua profissão: ‘Tudo isto significa que é

muito mais fácil aprender a ensinar, e aprender a ensinar melhor, em algumas escolas do

que em outras’.

Para Rosenholtz, o efeito mais importante da colaboração entre os professores é seu

impacto sobre a incerteza do trabalho que, quando enfrentada sem ajuda, pode diminuir

demasiadamente o senso de confiança de um professor. Da mesma maneira, outros dois

estudiosos, Ashton e Webb (1986), descobriram que o principal benefício da colaboração é

sua capacidade de reduzir a sensação de impotência dos professores e aumentar sua

sensação de eficiência” (Fullan e Hargreaves: 2000).

Nessa mesma época, 1989, a Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE) já publicava suas pesquisas sobre as características comuns entre as melhores escolas de diferentes países, apresentando os seguintes indicadores de qualidade: projeto educativo compartilhado; um certo ‘espírito de escola’ pautado em valores comuns com os quais se sentem identificados os profissionais, alunos e pais, para além de seus próprios valores e opções pessoais; planejamento coletivo da tarefa docente em uma perspectiva de experimentação, avaliação e revisão constantes; organização e funcionamento ágeis, onde o planejamento e a tomada de decisões conjuntas coexistem com a liderança de determinados membros da equipe; estabilidade do quadro de educadores; desenvolvimento profissional contínuo na própria escola e/ou em programas externos; apoio ativo, substancial e continuado da administração e das autoridades educativas das quais depende diretamente a escola.

Para tanto, cabe aos responsáveis pelas políticas de educação e gestores dos sistemas de ensino: estimular e promover o interesse social e o debate constante em torno dos objetivos da educação escolar e da qualidade do ensino; assegurar uma boa formação inicial aos professores e oferecer-lhes oportunidades adequadas para prosseguir e aprofundar seu desenvolvimento profissional; melhorar as condições salariais e de trabalho do magistério; garantir algumas formas de organização e funcionamento da escola que sejam sólidas, ágeis e flexíveis – assegurar os recursos materiais, técnicos e humanos necessários para o desenvolvimento adequado ao trabalho; implementar projetos de elaboração e difusão de materiais curriculares de qualidade; e, como pano de fundo dos aspectos acima, garantir o exercício responsável da autonomia e liberdade de ação da equipe de educadores.

Tendo em conta esse conjunto de constatações, a conclusão é uma só: a conquista de uma escola que seja de fato lugar de conhecimento para todos – profissionais, pesquisadores, alunos e comunidade – depende da transformação de modelos de funcionamento institucional cristalizados ao longo do tempo, tanto nas escolas como nas secretarias de educação a que são vinculadas. Os ambiciosos resultados que desejam os educadores de fato comprometidos com o próprio trabalho, que a sociedade espera da escola e a que têm direito os alunos só poderão ser alcançados com um investimento concentrado e simultâneo na resolução dos diferentes problemas que, direta ou indiretamente, interferem na qualidade da educação. Ou seja, um

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investimento simultâneo em desenvolvimento profissional permanente, condições institucionais adequadas para um trabalho educativo de qualidade, infra-estrutura material, carreira e avaliação do sistema de ensino e dos resultados obtidos em relação à aprendizagem.

Assim é muito mais provável que se realize a necessária transformação cultural que poderá fazer da escola uma instituição voltada para o aprendizado coletivo, um lugar de aprendizagem de todos.

E, além daquilo que é de responsabilidade dos gestores dos sistemas de ensino, há a parte que cabe diretamente aos educadores: a realização de projetos nas escolas que favoreçam o acesso de todos a informações úteis, interessantes e instigantes, bem como a imersão em processos de aprendizagem que ampliam o horizonte cultural e o universo de conhecimentos. Para tanto, é necessário:

· criar espaços para tornar públicos os saberes adquiridos/produzidos por alunos, profissionais da escola e familiares;

· implementar propostas de ampliação de conhecimentos nas diferentes áreas do conhecimento;

· promover intercâmbio entre escola, familiares e demais membros da comunidade, para favorecer a socialização dos saberes de todos;

· estabelecer parcerias com os demais equipamentos sociais da comunidade (bibliotecas, grupos culturais, centros de saúde e outras instituições) para potencializar as ações da escola destinadas a ampliar o universo de conhecimento de seus segmentos.

E o que se pode fazer nesse sentido? Muita, muita, muita coisa...

Algumas delas: Mural geral de toda a escola no pátio / Mural da classe aberto à visitação / Apresentação do resultado dos projetos de estudo aos demais alunos e aos seus familiares / Produção de livros, jornais, revistas, folders e outros portadores, com lançamento aberto a familiares e à comunidade / Organização de rádio da escola / Elaboração de projetos de pesquisa / Mostras de trabalhos / Uso dos meios de comunicação disponíveis na comunidade para divulgação dos trabalhos produzidos / Roda de leitura de textos de diferentes gêneros / Leitura diária, pelo professor, de textos de diferentes gêneros / Projetos significativos de leitura e escrita / Correspondência entre alunos de diferentes escolas / Uso frequente de acervos e bibliotecas / Uso de computador para escrever e pesquisar / Trabalho com gráficos e tabelas de jornais e outros portadores / Projetos de estudo de temas relevantes que trazem informação sobre assuntos das Ciências Humanas, das Ciências Naturais e dos Temas Transversais / Estudo de marcos relevantes da história do país e do mundo / Leitura de biografias de personagens relevantes nas diferentes áreas de conhecimento / Estudo de invenções e descobertas científicas / Estudo de diferentes paisagens / Estudo de diferentes culturas / Estudo de conteúdos que remetem às raízes culturais dos alunos / Visitas a museus e espaços culturais / Excursões a lugares que acrescentam ao conhecimento dos alunos / Estudos do meio relacionados aos conteúdos estudados / Trabalho de resgate de danças, jogos e brincadeiras que fazem parte do patrimônio cultural / Estudo de manifestações culturais características de diferentes regiões do país / Pesquisa dos saberes que os familiares possuem e que podem alimentar os projetos de estudo / Rede do saber / Visitas conjuntas a locais que interessam aos alunos e pais conhecerem (espaços históricos, de apresentação cultural etc). Etc., Etc., Etc.

... E por que então não começar desde já?

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Referências

ALARCÃO, Isabel. Escola reflexiva e nova racionalidade. Porto Alegre: Artmed, 2001.

FULAN, Michael; HARGREAVES, Andy. A escola como organização aprendente – buscando uma educação de qualidade. Porto Alegre: Artmed, 2000.

GÓMES, A. I. Perez. A cultura escolar na sociedade neoliberal. Porto Alegre: Artmed, 2001.

CANÁRIO, Rui. Educação de adultos: um campo e uma problemática. Lisboa: EDUCA, 2000.

PRADO, Guilherme V. Toledo Prado. CUNHA, Renata Barrichelo. Percursos de autoria: exercícios de pesquisa. Campinas, SP: GEPEC/UNICAMP/Editora Alínea, 2007.