Espaço, Técnica e Dominação: Estudo de caso do acesso à rede ...

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Universidade Federal do Espírito Santo Centro de Ciências Humanas e Naturais Departamento de Geografia VICTOR ARAUJO GALVÃO Espaço, Técnica e Dominação: Estudo de caso do acesso à rede elétrica no Alto Bairro da Penha, Vitória, ES. VITÓRIA 2009 Create PDF files without this message by purchasing novaPDF printer (http://www.novapdf.com)

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Universidade Federal do Espírito Santo Centro de Ciências Humanas e Naturais

Departamento de Geografia

VICTOR ARAUJO GALVÃO

Espaço, Técnica e Dominação: Estudo de caso do acesso à rede elétrica no

Alto Bairro da Penha, Vitória, ES.

VITÓRIA

2009

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VICTOR ARAUJO GALVÃO

[email protected]

Espaço, Técnica e Dominação: Estudo de caso do acesso à rede elétrica no

Alto Bairro da Penha, Vitória, ES.

Monograf ia apresentada ao Departamento de Geograf ia do Centro de Ciências Humanas e Naturai s da Universidade Federal do Espír i to Santo, como requi si to parcial para obtenção do t í tulo de Bacharel em Geograf ia. Orientador: Prof . Dr. Cláudio Luiz Zanotel l i .

VITÓRIA 2009

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VICTOR ARAUJO GALVÃO

Espaço, Técnica e Dominação: Estudo de caso do acesso à rede elétrica no

Alto Bairro da Penha, Vitória, ES.

Monograf ia apresentada ao departamento de Geograf ia do Centro de Ciências Humanas e Naturai s da Universidade Federal do Espír i to Santo, como requisi to parc ia l para obtenção do t í tu lo de Bacharel em Geograf ia .

Aprovada em 16 de abr i l de 2009.

COMISSÃO EXAMINADORA

Prof . Dr. Cláudio Lui z Zanotel l i Universidade Federal do Espír i to Santo Orientador Prof . Dr. Carlos Tei xei ra Campos Junior Universidade Federal do Espír i to Santo Prof . Dra. Ana Lucy Frei re Universidade Federal do Espír i to Santo Prof . Dr. Paulo Cezar Scari n Universidade Federal do Espír i to Santo Suplente

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A Anna, minha companheira, namorada e

amiga. Que acredi ta nos meus devaneios e

me faz acredi ta r neles.

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AGRADECIMENTOS

Final izar este trabalho de monograf ia me faz lembrar a minha trajetória

desde a decisão em prestar o vestibular para Geograf ia a té aqui ,

quando estou a formar-me Geógrafo e iniciar uma nova trajetória

enquanto tal . Mui tos foram os que inf luíram nesta caminhada e

certamente não haveria espaço aqui para fazer justiça a todos.

Agradeceria à minha amiga, Maria Cecíl ia, que com a sua inquietação,

seu modo de ver o mundo, ainda na minha adolescência, me instigou a

um inconformismo. Se não fosse a sua amizade, as nossas conversas

imaturas, mas inconformadas, inquietas, sobre as “injust iças do

cap i talismo”, nossas part icipações em manifestações e em part idos

pol ít icos, talvez eu não tivesse desistido de cursar di rei to em favor da

Geograf ia. Neste momento, mereceria a minha gra tidão, até mesmo, o

meu professor de Geograf ia do Ensino Médio, ao mostrar-me a

possibil idade que essa ciência poderia me dar na compreensão do

mundo e em uma prát ica combativa.

Agradeço a todos os co legas da turma 2005/1, companheiros durante a

caminhada na univers idade.

Aos professores do curso de Geograf ia da UFES.

À minha famíl ia, e em especial , aos meus pa is, pela possibil idade que

me deram de me dedicar somente aos estudos durante todo o curso.

A todos que me ajudaram nesta pesquisa: aos empregados da Escelsa,

aos servidores da Setran e do Projeto Terra, ambos da Prefei tura

Municipal de Vi tória. Aos moradores do Al to Bairro da Penha e , em

especial , ao presidente da Associação de Moradores, Daniel , pela

indispensável ajuda nos trabalhos de campo.

Ao meu orientador, amigo e a quem admiro bastante, o professor

Cláudio Zanotel l i. Aqui se torna muito dif íci l de expressar toda a minha

grat idão por todo o aprendizado que pude construi r graças às suas

orientações e pelas oportunidades que pude viver nestes quase dois

anos em que estamos trabalhando juntos.

Finalmente, agradeço a Deus, pois continuo acredi tando que sua ajuda

é essencial no caminho para a sabedoria e para o conhecimento.

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Nunca na hi stór i a do mundo houve um

subsistema de técnicas tão invasor. Nos períodos

anter iores, nenhum deles se apresentou com tal

força de di fusão e ta l capacidade de se impor e

espalhar quanto agora. Ao mesmo tempo, o

sis tema técnico representat ivo da atual idade

tende à unidade. É a pr imeira vez na hi stóri a do

homem em que há apenas um s istema técni co

regendo toda a at iv idade humana. É verdade,

também, que em nenhum momento, nem mesmo

agora, um sis tema técnico se impôs

completamente à total idade dos lugares e dos

homens (Santos, 2006; p. 221 – gr i fo nosso).

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RESUMO

Anal isa as redes enquanto paradigmas técnicos responsáveis pela construção do espaço geográf ico e a sua importância na nova conf iguração terri torial global , caracterizada como os “terri tórios-rede”. Busca desvendar os mecanismos a part i r dos quais as redes são art iculadas com os terri tórios de maneira desigual , dentro da lógica sele tiva de produção capi talis ta do espaço e os processos de segregação e f ragmentação sócio-espacial daí resul tantes. Neste intui to , buscou-se fazer uma anál ise teórica ampla e global sobre as redes e, então, de maneira empírica , uma aná lise sobre as redes elétricas e suas terri to riali zações na parte mais pobre de uma favela no município de Vi tória , art iculando, assim, o global ao loca l (e vice-versa). O acesso e o consumo d iferenciados à /da energia elétrica na área de estudo demonstram a subordinação do ci rcui to inferior para com o superior, na medida em que a fatia mais modesta da população, estando sujei ta aos mesmos anseios de consumo, não têm condições de ter um acesso permanente a eles, o que acaba, no f inal do processo, ocasionando relações de dominação para com os mais pobres, expressas na subordinação do ci rcui to inferior ao superior de maneira que aquele sempre acaba contribuindo para o “engordamento” deste úl timo.

Palavras-chave: redes e létricas, inf ra-estrutura , f ragmentação, dominação, “dois ci rcui tos urbanos”.

ABSTRACT

Analyze the networks as the techniques responsible for the geographic space construction and i ts importance at the new global terri torial conf iguration, characterized as the “network-terri tories”. Try to unmask the mechanism how the networks are art i culated wi th the terri tories deferentially, inside the select ive logic of production capi talist of the space and the process of segregation and f ragmentat ion socio -spatial resul ted by that. In thi s wants, we tried to make an ample and global theoreti cian analysis about the networks, and them, an empiric analysis about the electric networks and i ts territo rial i za t ions at the must poor part of a slum in Vi toria Ci ty, art iculat ing, this way, the global and the local . The di f fe rentiate access and uses of the electric energy a t the study area shows the subordination of the inferior ci rcui t wi th the superior ci rcui t , once the must poor people has the same needs than the medium and high class, but they can`t has a permanent access of these products and services. That makes, in the end of the process, a domination relationship wi th the musts poor, expressed at the subordination of the inferior c i rcui t wi th the superior c i rcui t . This way, the inferior ci rcui t always makes the superior ci rcui t get fa tter.

Key words: electri c networks, inf rastructure, f ragmentation, domination, “two urban c i rcui ts”.

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LISTA DE FOTOGRAFIAS

Fotograf ia 1 – Rua principal na parte baixa do Bairro da Penha... . . . . . ..50

Fotograf ia 2 – Beco no Al to Bairro da Penha. .. . . . .. . . . . . . . . .. . . . . . . . . .. . . . . . . . . .50

Fotograf ia 3 – casa de madeira no Al to Bairro da Penha. .. .. . . . . . . . . .. . . . . .53

Fotograf ia 4 – poste no meio do beco, di f icul tando a passagem e possíveis reformas para melhoria da escadaria no Al to Bairro da Penha.... . . . .. . . . . . . . . .. . . . . . . . .. . . . . . . . . .. . . . . . . . . .. . . .. . . . . . . . . . . . . .. . . . . . . . .. . .. . . . . . . .. . . . . . .55

Fotograf ia 5 – base podre de um poste de madeira no Al to Bairro da Penha... . . . . .. . . . . . . . . .. . . . . . . . .. . . . . . . . . .. . . . . . . . . .. . . .. . . . . . . . . . . . . .. . . . . . . .. . .. . . . . . . . .. . . . . . .56

Fotograf ia 6 – emaranhado de f ios extremamente mal esticados no Al to Bairro da Penha... . . . . . . . .. . . . . . . . . .. . . . . . . . . .. . . . . .. . . . . . . . .. . . . .. . . . . . . . . .. . . . . . . . . .. . . . . . .56

Fotograf ia 7 – beco sem nenhum poste e sem i luminação pública no Bairro da Penha... . . . . . . . .. . . . . . . . . .. . . . . . . . . .. . . . . .. . . . . . . . .. . . . .. . . . . . . . . .. . . . . . . . . .. . . . . . .57

LISTA DE FIGURAS

Figura 1 – Local ização dos bairros da Penha e da Fonte Grande... . . . . . . . . . .. . . . . . . . . .. . . . . . . . .. . . . . . . .. . .. . . . . . .. . . . . . . . . . . . . .. . . . . . . . . .. . . . . . . . . .. . . . . .48

LISTA DE GRÁFICOS

Gráfi co 1 – Prof issão dos entrevistados. ... . . . . . . . . . . . . .. . . . . . . . . .. . . . . . .. . .. . . . . . .51

Gráfi co 2 – moradores por domicíl io no Alto Bairro da Penha... . . .. . . . . . . .53 Gráfi co 3 – número de lâmpadas incandescentes por domicíl i o. . . .. . . . . . .54

Gráfi co 4: domicí l ios que se encontram cadastrados no programa “baixa renda” para subvenção nas tarifas de energia elétrica no Al to Bairro da Penha.... . . . .. . . . . . . . . .. . . . . . . . .. . . . . . . . . .. . . . . . . . . .. . . .. . . . . . . . . . . . . .. . . . . . . .. . .. . . . . . . . .. . . . . . .66

LISTA DE TABELAS

Tabela 1 – Usinas e Centrais Geradoras no ES... . . . . . . . .. . . . . . . . . .. . . . . . . . . .. .42

Tabela 2 – volume e recei ta da energia elétrica vendida pela Escelsa em 2006... . . . . . .. . . . . . . . . .. . . . . . . . . .. . . . . . . . . .. . . . . . . . .. . . . . . . .. . . . . .. . . . . . . . . .. . . . . . . . . .. . . . . . .44

Tabela 3 – Renda e desemprego dos entrevistados no Al to Bairro da Penha.... . . . .. . . . . . . . . .. . . . . . . . .. . . . . . . . . .. . . . . . . . . .. . . .. . . . . . . . . . . . . .. . . . . . . .. . .. . . . . . . . .. . . . . . .51

Tabela 4 – Tabela de Consumo dos Aparelhos... . . . . . . . . .. . . . . . . . .. . . . . . . . . .. . .61 Tabela 5 – Valores de venda de energia para o setor residencia l por kWh em Vi tória em 2007. .. . . . . .. . . . . . . . . .. . . . . . .. . . . . . . . . . . . . .. . . . . . . . . .. . . . . . . . . .. . . . . . .64 Tabela 6 – Tabela para desconto na tarifação “Baixa Renda”.. . . . . . .. . . . . .65

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LISTA DE SIGLAS

Aneel - Agência Nacional de Energia Elétrica

ENBr – Energias do Brasil

ENP – Energias de Portugal

Esce lsa – Espíri to Santo Centrais Elétricas

PIR – Planejamento Integrado de Recursos Energéticos

PMV – Prefei tura Municipal de Vi tória

Setran – Secretaria Municipal de Transportes

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SUMÁRIO

1. INTRODUÇÃO. . . . . . . . . . .. . . . . . . . . . . . . . .. . . . . . . . . .. . .. . . . . . . . . . . . . .. . . . . . . . . .. . . . . . . . .10

2. DISCUSSÃO CONCEITUAL . . . . . . . .. . . . . . . . . . . .. . . . . . . . . . . . . .. . . . . . . . . .. . . . . . . . .13 2.1 Da gênese do consumo ao consumismo: breves

ref lexões... . . . . . .. . . . . . . . . .. . . . .. . . .. . . . . . . . . .. . . . . . . . .. . . . . . . . . . . . . .. . . . . . . . . .. . .13

2.2 As redes e a f ragmentação sócio-espacial. . . . . . . . . . . . . .. . . . . . . . .20

2.3 A f ragmentação enquanto produto da dominação: uma

anál ise a part i r dos dois ci rcui tos da economia urbana... . . . . . .29

3. A REDE ELÉTRICA . . . . . . . . .. . . . . . . . . .. . . . . . . . . .. . .. . . . . . . . . .. . . .. . . . . . . . . .. . . . . . . .38 3.1 Aspectos técnicos da rede de geração, comerc ialização e

distribuição de energia elétrica no Espíri to Santo .. . . .. . .. . . . . . . ..40

3.2 A energia enquanto mercadoria... . . . . . . . . .. . .. . . . . . . . . . . . . .. . . . . . . . .43

4. OS ACESSOS À ENERGIA ELÉTRICA E SEUS USOS DIFERENCIADOS NO CIRCUITO INFERIOR: O CASO DO ALTO

BAIRRO DA PENHA . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .. . . .. . . . .. . . . . . . . .. . . . . . . . . .. . . . . . . . .48

4.1 O Bairro da Penha: uma breve apresentação... . . . .. . . . . . . . . .. .48

4.2 A estru tura f ísica da rede no Al to Ba irro da Penha.... . . . . . . .52

4.3 Os acessos e usos diferenciados... . . . . . . .. . .. . . . . . . . . . . . . .. . . . . . .. .58

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS E CONCLUSÕES . . . . . . . .. . .. . . . . . . .. . . . . . . . . .69

6. REFERÊNCIAS . . . . . . . . . . . . . . . . .. . . . . . . . . .. . . . . . . . . ... . . . . . . . . . . . . .. . .. . . . . . .. . . . . . . .72

ANEXOS . . . . . . . . . . .. . . . . . . .. . . . . . . . . .. . . . . . . . . .. . . . . . . .. . . . . . . . . . . . . .. . . . . . . . . .. . . . . . .75

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1. Introdução

A História nos mostra que cada sociedade, dentro do modelo sócio -

pol ít ico-econômico que lhe é pecu liar, se art icula através do trabalho

dentro dos seus anseios e das suas formas de (re)produção. Tal

art iculação se dá através de um conjunto de aparatos técnicos

necessários para transformar a natureza e garanti r a sua reprodução e

o seu desenvolvimento1. Desta forma se dá a conjugação entre

sociedade e espaço, sendo a configuração espacial resu ltante

profundamente marcada pelo estado das técnicas, inf luenciando a

sociedade e sendo inf luenciada por ela .

Santos (2006) af i rma que:

As caracterí st icas da soc iedade e do espaço geográf i co,

em um dado momento de sua evolução, estão em relação

com um determinado estado das técnicas. (. . . ) Cada

período é portador de um sent i do, part i lhado pelo espaço

e pela soc iedade, representat ivo da forma como a

histór ia real iza as promessas da técnica (Santos, 2006;

p. 171).

O presente trabalho visa estudar as relações contrad i tórias entre a

técn ica e o espaço, uma vez que as técnicas possuem sentidos sociais

e estão inseridas num determinado modelo sócio -pol í tico-econômico. O

subsistema técnico que se impõe no atua l período histórico em que

vivemos (o qual se tornou conhecido pe los teóricos das ciências

humanas em geral como o paradigma das redes) torna possível a

art iculação entre terri tórios extremamente longínquos e em escala

global , objetivando, assim, a globa lização2. Contudo, a lógica sócio -

econonômico-pol í t ica capital is ta a part i r da qua l são estru turadas as

redes no espaço tende a se manifestar na configuração espacial das

cidades, produzindo processos que i rão se manifestar na formação da

1 Longe de buscar qualquer aproximação com interpretações positivistas, empregamos aqui o termo “desenvolvimento” apenas para nos referirmos ao “processo de transformação” pelo qual passam as sociedades desejando tornarem-se “melhores”. Ver mais a esse propósito em Souza (2006; pp. 95 – 104).

2 Aqui o termo “globalização” é utilizado a partir de uma abordagem crítica que entende a globalização como um processo seletivo e produzido de acordo com interesses produtivo-financeiros das grandes corporações multinacionais e não objetivando o bem comum.

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cidade f ragmentada. Tal forma fragmentada se consti tui , f inalmente, em

processos de dominação econômica, po lí tica e ideológica.

Essas primeiras af i rmações são capazes de resumir o que este trabalho

busca anal isar. O próximo capítulo i rá versar sobre algumas

considerações a respei to da sociedade de consumo, uma vez que o

“consumismo” se mostrou um concei to essencial a ser anal isado em

nosso trabalho. Irá, depois, discorrer sobre a defini ção das redes e sua

art iculação “contradi tória” com o espaço. As especif icidades da rede

elétrica e o motivo metodológico de sua esco lha como ob jeto de estudo

serão explic i tados posteriormente. Por f im, serão apresentados os

resul tados da análise empírica no Al to Bairro da Penha (que foi nosso

local de estudo de caso) e a discussão sobre a forma f ragmentada da

cidade que se dá, também, através de processos de dominação social .

A pesquisa que evolu iu para o presente trabalho de monograf ia teve

início no mês de agosto do ano de 2007 a part i r de um subprojeto da

pesquisa “Acessos e Usos da Rede Elétrica Como Reveladores da

Segregação e/ou Fragmentação Urbana em Vi tória” v inculada ao

Programa Insti tucional de Bo lsas Para Iniciação Científ ica –

PIBIC/UFES, coordenada pelo professor Dr. Cláudio Luiz Zanotell i .

A etapa empíri ca compreendeu a realização de cinco entrev istas com

diferentes funcionários da empresa Escelsa em dois dias (15-10-2007 e

17-12-2007), tendo como referência os indicat ivos de questões abertas

apresentados no anexo 1. Além desta, outras inst i tuições foram

procuradas por nós na busca de dados, como o Proje to Terra Mais

Igual , da Prefeitura de Vi tória e a Div isão de Iluminação Pública , na

Secretaria de Transportes, também da Prefeitura de Vi tória.

Foi fei ta a análise das inf ra-estruturas de energia elétrica a través da

percepção crít ica a part i r da observação da área de estudo, além da

anál ise dos mapas das inf ra-estruturas das redes, fornecidos pela

Esce lsa através da intermediação da Divisão de I luminação

Públ ica/Setran/PMV.

Foram, também, realizadas incursões em campo a f im de efetuar cerca

de três ou quatro entrevistas com grupos de moradores. Tal

metodolog ia obje tivou promover discussões entre os moradores a parti r

de temas por nós levantados e, então, tentar entender a dinâmica dos

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fenômenos por nós estudados e a sua expressão espacial nos bairros.

No intento de buscar maior segurança em relação aos dados adquiridos

por esta metodologia foram apl i cados 22 questionários (anexo 2) com

perguntas abertas e fechadas aos moradores do Al to Bairro da Penha.

Os questionários foram aplicados aos moradores dos domicíl ios nas

diferentes partes do bai rro com o maior nível de heterogeneidade

possível l evando em conta as di ferenças quanto ao sexo, à idade e ao

tempo de moradia no bairro , mas, sem buscar amostragens que

garanti ssem rigor estatístico. Tais questionários se deram de maneira

complementar, a f im de ajudar a confi rmar ou refu tar nossas anál ises

que foram resul tado da percepção crítica da paisagem, da análise dos

dados conseguidos em diferentes órgãos e das entrevistas realizadas

com moradores e com os técnicos da Escelsa. Acredi tamos , assim, ter

alcançado certa representação dos fatos que se aproxima do real .

Em razão disso, as análises quanti tativas esta tíst icas, apresentadas no

anexo 3, devem ser apreciadas com o máximo de cautela, uma vez que,

como di to, não derivam de uma amostragem esta tíst ica rigorosamente

def in ida metodologicamente.

As ativ idades de campo real izadas i n loco foram em total de 6 , entre os

meses outubro de 2007 e março de 2008. Foram apl icados 22

questionários a part i r da metodologia já apresentada. O fa to de ser o

bairro terri torial izado por grupos l igados ao comérc io varej ista i legal de

drogas me trouxe dif iculdades ao me impossibil itar de entrar no bairro

por quatro vezes devido a incursões recentes da Pol ícia Mi li tar no local ,

fato que f reqüentemente tornava aconse lhável , por parte do presidente

da associação de moradores, ad iar as at iv idades de campo a serem

realizadas.

Também por este motivo não foi possível confeccionar um bom número

de fotos, uma vez que determinados becos do bairro eram

constantemente escol tados por garotos l igados ao tráf i co de drogas e

que não me permi t iam fazer as fo tos. Ainda assim, ressal to que, no

geral , não houve resistência nem impedimento por parte dos garotos

l igados ao tráf ico para que eu pudesse realizar as ap licações dos

questionários, sendo que um deles, ao dia 9 de março de 2008 me

concedeu uma breve entrevista. Concluímos, então, que para nossos

obje t ivos, as visi tas real izadas ao bairro foram sufi cientes e que,

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mesmo com as limi tações de entrada no bairro, não houve prejuízos

consideráveis para os resul tados alcançados.

A postura adotada pe la Escelsa em nos negar todos os dados

quanti tat ivos em relação ao consumo e ao furto de energia, bem como

os mapas por nós pedidos nos t i rou a possibi l idade de fazer uma

anál ise quanti tativa precisa dos consumos e dos furtos de energia no

bairro estudado, real idades que foram mensuradas qua li tativamente a

part i r das percepções que tivemos durante os trabalhos de campo.

Ressal tamos, por f im, que por toda a duração da pesquisa foi fei to um

grande esforço no levantamento de fontes bibliográf i cas (técnicas,

científ icas e midiát icas) que nos trouxeram benef ícios em relação à

metodolog ia e aos concei tos e processos que deveriam ser priorizados

em nossa anál ise.

2. Discussão Conceitual

2.1 Da Gênese do Consumo à Ideologia do Consumismo: Breves Reflexões

Bauman (2003) nos trás considerações importantes sobre o concei to de

comunidade. Para ele , a comunidade é caracterizada essencialmente

pela existência de três atributos entre um determinado grupo de

pessoas num determinado espaço: o isolamento, o “entendimento

prévio” e o convív io harmonioso. Para os nossos ob jet ivos, achamos

necessárias algumas palavras sobre o primei ro atributo, o isolamento.

Segundo Bauman (Ib id.) na comunidade “o isolamento em relação a

‘eles’ [os de fora da comunidade] é quase completo, as ocasiões para

rompê-lo são poucas e espaçadas” e que a comunidade entra em

colapso quando “a comunicação entre os de dentro [da comunidade] e o

mundo exterior se intensif ica e passa a ter mais peso que as trocas

mútuas in ternas (p.18).

Já para Karl Marx (1980, cap. 17), o consumo é criado a parti r do

contato entre diferentes comunidades, uma vez que é este contato que

cria as necessidades de consumo (considerando aqui o consumo

essencialmente enquanto a sua manifestação a priorizar o valor de

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t roca3). É a parti r de tais necessidades de consumo que o comércio tem

a sua gênese. Num primeiro momento, o comércio é pra t icado através

do escambo, ou seja, pela troca de mercadorias com diferentes va lores

de uso que tendem a possuir valores de troca equiparados. Marx

também afi rma que, uma vez iniciado o processo de troca com outra

comunidade, as práticas comerciais tendem a se intensif icar, tanto entre

comunidades dist intas, como no interio r de uma mesma comunidade.

Ora, se nos apo iarmos no aparato teórico proposto por Bauman (Ibid . ),

torna-se claro que os laços comunitários se deterioram a part i r do

incremento das trocas comerciais. O “contato entre os d iferentes”, por

sua vez, tende a criar estru turas socia is de organização mais complexas

e para além da comunidade, gerando uma div isão social do trabalho. A

part i r de então, o comércio passa a se desenvolver , tornando-se cada

vez mais complexo, com incrementos nas formas de produção,

aumentando o volume e a variedade dos produtos comerciados. A este

fenômeno está relacionada a gênese do dinheiro .

O dinheiro, que segundo definição de Marx, se caracteriza como “uma

mercadoria adotada e empregada como equivalente de todas as

diferentes mercadorias” (1980; p. 220), se torna necessário quando o

consumo se in tensi f ica de tal modo que a sua variedade e o seu volume

exigem que o comércio se real ize exclusivamente através de

mercadorias part i culares que acabam se cristal izando como d inheiro.

Assim, nos di ferentes espaços e períodos históricos podemos observar

o dinheiro nas mais variadas espécies: gado, seres humanos na forma

de escravos, ouro , pape l moeda, etc.

Torna-se importante ressal tar que existi ri am outros fatores a serem

anal isados, como o surgimento de a tores sociais e relações de poder

nos diferentes modos de produção que são gestados, contudo, não

i remos nos ater a is to. Nossa preocupação aqui é demonstrar que desde

o desfazer dos laços comunitários pelo incremento das trocas

3 O valor de uso remete às qualidades de determinado objeto, o que o garante determinadas funcionalidades ou finalidades. Já os valores de troca se manifestam a partir da “relação quantitativa pela qual os valores de uso de uma espécie se trocam pelos valores de uso de outras” (Marx, 1980; p. 24). Neste sentido, o valor de troca surge a partir de “uma abstração do valor de uso das mercadorias” (Ibid.; p. 25) que lhe garantem uma mensuração quantitativa de valor monetário. Isso significa que, objetos distintos e, por conseqüência, com valores de uso distintos se tornam equivalentes ao possuírem o mesmo valor de troca.

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comercia is, o consumo4 desempenhou papel primordial nos diferentes

modos de produção nas di ferentes sociedades no tempo e no espaço.

Ocorre que, no modo de produção capi tal ista, a necessidade constante

do aumento da produção, a f im de garanti r o aumento das taxas de

mais-val ia e, por conseguin te, a acumulação, ocasionaram uma

exacerbação cada vez maior no papel do consumo. Contudo, sobre o

consumismo exacerbado e suas contradições nós i remos discuti r

posteriormente, por agora achamos necessário falar sobre o que

consideramos a materialidade f ísica, ou a expressão espacial do

fenômeno: a técnica.

Para cada modo de produção, distribuição e consumo criados, existe um

sistema técnico incorporado ao terri tório sem o qual tal modelo

discutido até aqui seria impossível . Mais que isso, o sistema técnico de

cada período histórico é parte indissoc iável do seu sistema sócio -

pol ít ico-econômico. É através da técnica que sociedades modif icam a

natureza, criam formas de energia, compõem sistemas e meios de

comunicação e de transporte, etc. Discutindo a respe i to das revoluções

técn icas que se deram com o incremento da industrialização no modo

de produção capi talis ta, Marx af i rma que:

A transformação no modo de produção da indústr ia e da

agr icul tura tornou notadamente necessária uma

t ransformação nos meios de comunicações e de

t ransporte. Os meios de comunicação e de t ransporte ,

l egados pelo período manufaturei ro, torna ram-se logo

sér ios embaraços à grande indústr ia, com sua rapidez

vert i ginosa de produção em al ta escala, sua

t ransferência cont ínua de capi ta is e de operár ios de uma

esfera de produção para a outra, seus constantes

empregos no mercado mundial ( . . . ) o si stema de

t ransporte e de comunicações foi pouco a pouco

adaptado ao modo de produção da grande i ndústr ia pela

i ntrodução de vapores f luviais, t rens de ferro,

t ransat lânt icos, telégrafos. (1980; p. 84).

Atualmente é consenso nas ciências sociais que o mundo já não v ive

mais somente a era industria l do cap i talismo. Autores como Castel ls 4 Mais uma vez nos referimos à prioridade dada ao valor de troca nas transações, e este será o sentido dado ao termo “consumo” em todo o trabalho, a não ser que façamos quaisquer ressalvas no momento em que estejamos nos referindo a ele.

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(1999), que def ine o atua l período como a “Era da Informação” e Santos

(2006; 2007) que o denomina como “Período Técnico-científ ico -

informacional” fazem alusão ao novo momento em que v ivemos, no qual

é emerso um novo paradigma técnico: as redes. Sobre elas falaremos

no próximo sub-capítulo e , de maneira geral , seu conteúdo estará

permeando o trabalho como um todo.

Falando novamente sobre a importância do consumo no modo de

produção capi tal ista , queremos tecer algumas observações,

primeiramente em relação à era puramente industrial do capi tal ismo.

Segundo Marx, a única fonte de valor para determinada mercadoria é o

trabalho acumulado na produção desta mercadoria 5. O incremento das

máquinas, por sua vez, garantiu ao capi ta lista industrial a possibil idade

de aumentar a sua produção enormemente com um número menor de

operários, o que fez maximizar de maneira grandiosa os seus lucros.

Contudo, tal fenômeno se dá somente no momento da expansão da

produção. A part i r do momento em que tal expansão se di funde,

incorporando tanto o mercado consumidor como as demais indústrias do

mesmo ramo, a tendência é que as taxas de lucro caiam de maneira

vertiginosa já que o número de trabalhadores se torna diminuído e,

como d i to, a única fonte de va lor para as mercadorias é o trabalho,

sendo, por sua vez, a extração da mais-va lia a única fonte de lucro.

Desta maneira , a solução encontrada para manter a taxa média de lucro

foi aumentar a inda mais a produção, o que s ignif ica comprar mais

máquinas e contratar mais operários, lembrando que estes em

proporção cada vez mais reduzidas em re lação às máquinas. Assim, é

retomado o ciclo descri to: aumento da produção, aumento das taxas de

lucro , queda das taxas de lucro, aumento da produção... Fica clara, 5 Assim, se determinado tempo “t” de trabalho produziu um determinado valor “v”, “v” corresponderia ao salário “s” do operário para o número de horas trabalhadas (quantia que também sofre variações no tempo e no espaço) – considerando que os valores dos trabalhos anteriores na extração de matérias-primas, transporte, etc., estejam acrescidos na forma de capital constante do capitalista.

v = s = t Desta maneira, para ganhar o lucro, o industrial capitalista deveria extrair do trabalhador a mais-valia “mv”, que corresponderia à quantia produzida em um determinado tempo, sem que esta fosse incorporada ao salário do operário. Em outras palavras: a quantia produzida pelo número de horas que o operário fornece ao capitalista gratuitamente. Desta forma, mantendo-se o salário constante, temos que uma mais-valia de 100% corresponderia a duplicar o tempo de trabalho a fim de se produzir o dobro do valor.

mv = s = 2t

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desta forma, a sede do capi ta lismo por mercados consumidores e a sua

vocação para a expansão em escala mundial .

Após a 2ª Guerra Mundial , o co lossal volume da produção industrial não

somente culminou na estruturação dos monopólios, mas fez do consumo

o principal p ilar do desenvolv imento econômico mundial .

O anal ista de vendas [do presidente norte-americano,

E isenhower] Vic tor LeBow articulou a solução que se

tornari a a norma de todo o sistema. Ele di sse:

“A nossa enorme economia produt i va exige que façamos

do consumo a nossa forma de vida, que tornemos a

compra e uso de bens em r i tuais, que preocupemos a

nossa sat isfação espi r i tual , a si tuação do nosso ego, no

consumo (. . . ) Prec i samos que as coi sas sejam

consumidas, destruídas, subst i tuídas e descartadas a um

r i tmo cada vez maior” 6 (Story of Stuf f s web si te, acesso

em 26-02-2009).

Permeando essa estratégia o que aconteceu foi o levantar de uma

verdadeira ideologia do consumismo. Esta se deu, sobretudo, a part i r de

dois fatores conhecidos como: a “Obsolência Planejada”, e a

“Obsolência Perceptiva” (Story of Stuffs web si te, acesso em 26-02-

2009). A Obsolência Planejada se trata da estratégia de p rodução dos

bens de consumo de modo que estes se tornem obsoletos o mais rápido

possível , contudo, de maneira que os consumidores mantenham nele a

fé suf ic iente para que seja comprado outro a f im de repô -lo. Em outras

palavras, os produtos são criados para i r p ro l ixo , uma vez que se

tornam inúteis cada vez mais rapidamente. Tal estra tégia de produção é

visível , sobretudo, nos computadores. Chega a ser surpreendente a

forma como um computador pode v i r a se tornar um verdadei ro entrave

ao traba lho com menos de dois anos de uso. Os novos s istemas

operaciona is e sof twares que são lançados a cada dia exigem cada vez

mais processadores mais rápidos, mais memória interna, etc. , o que faz

com que os computadores se tornem obsoletos em curtíssimo tempo.

6 "Our enormously productive economy demands that we make consumption a way of life, that we convert the buying and use of goods into rituals, that we seek our spiritual satisfaction, our ego satisfaction, in consumption.(…) We need things consumed, burned up, replaced, and discarded at an ever-increasing rate." (in) LeBow, Victor (1955; p. 5).

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Ao lado da Obsolência Planejada, trabalha a Obsolência Perceptiva . Na

verdade, se trata da estratégia de convencimento dos consumidores a

jogarem fora produtos que ainda são perfei tamente ú teis através da

mudança na aparência dos produtos. Um exemplo extremamente

presente é a moda. Através dela, de estação em estação , indivíduos

são condic ionados a reformarem seus guarda-roupas, ainda que suas

roupas estejam em perfeito estado . A mesma coisa acontece com todos

os outros produtos. Os celulares, por exemplo, ainda que funcionem

perfei tamente, necessi tam serem trocados constantemente dev ido aos

novos designs que chegam ao mercado a cada dia. No consumismo

desenf reado que é resul tante, a mídia, a publ icidade e o marketing tem

papel fundamental . Quessada (2003) af i rma que:

Para def i ni r e impor os cr i tér ios do novo império, par a

conqui star, integrar e cri ar ordem ci vi l , os grupos de

publ ici dade exercem efet ivamente um papel fundamental .

As agências locai s desses grupos mundiais devem tenta r

tornar os produtos globai s não somente acei táveis, mas

também desejávei s nos países onde são distr ibuídos (p.

41).

A global ização signi f ica que a chave do sucesso para a

exploração de mercados mundiai s reside no lançamento

de produtos globais: Produtos idênt icos, d i fundidos com

a ajuda de meios publ ici t ár ios e mercat ique 7

padronizados. Em suma, vender com um mesmo slogan e

uma mesma imagem, um mesmo produto numa mesma

embalagem no mundo intei ro (p. 39).

Cabe, agora, dizer que a industrialização das nações

“subdesenvolv idas”8, a part i r da década de 1940, não objetivaram

somente a transferência da exploração da mais-valia para os países do

7 Segundo nota de tradução da obra: “Ramo do marketing especializado no estudo dos aspectos teóricos e gerais da venda (Obs.: Em português, o neologismo ‘mercática’ não está dicionarizado)”. 8 Optamos utilizar o termo “subdesenvolvido” em todo o texto, uma vez que o utilizamos fazendo menção, principalmente, a Santos (2004). Contudo, acreditamos que seria mais correto o termo, “semi-periférico”, utilizado por Souza (2006) ao caracterizar a posição do Brasil da Divisão Internacional do Trabalho, na medida em que, mesmo estando na periferia econômica, o Brasil possui uma posição que lhe coloca como potência econômica regional, sendo sua posição extremamente diferente de países “periféricos” da África Subsaariana, por exemplo, estando incorreto, portanto, desfrutar da mesma classificação. Acrescenta-se a isso aos equívocos filológicos que a interpretação do termo “subdesenvolvimento” pode gerar. A esse respeito ver Souza (2006,capítulo 2).

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sul , a f im de f inanciar a reconstrução e o Estado de bem-estar social

europeu e norte-americano, mas também a expansão dos mercados

consumidores dos produtos industrial i zados globais. Com a

industrialização, veio a se instalar nas grandes cidades das nações

“subdesenvolv idas” um circu i to econômico moderno, ou ainda, o

“ci rcu i to superior da economia urbana” (Santos, 2004). O c i rcuito

superior se caracter izou, então9, pelas formas modernas de produção,

distribuição e consumo importadas das nações desenvolv idas , que são

acompanhadas de al ta tecnologia, formas de crédi to ef iciente e

enal tecimento dos valores de troca. Além d isso, cabe salientar a

disposição dos aparatos técnicos no terri tó rio, que também contribuíram

para a modern ização do espaço das c idades, como: produção e

distribuição energética em al ta escala, sistemas e meios de transporte e

comunicação mais complexos e mais ef ic ientes, etc.

Não se deve esquecer, do mesmo modo, que a modernização das

nações “subdesenvolvidas” e, de maneira particular, do Brasi l se deu à

custa do aumento da d ívida externa, da selet iv idade espacial , da

despreocupação com as especif icidades sociais, econômicas e

demográficas internas, da prioridade dada à exportação e ao consumo

da insipiente classe média interna, seguindo a lógica da concentração

de renda necessária a manter a dominação social . Tal fato ocasionou a

emergência de outro ci rcui to econômico não moderno, que, apesar de

possuir suas próprias leis, é totalmente dependente do c i rcui to superior:

o “c i rcui to inferior da economia urbana” (Santos, 2004). Este se

caracteriza pe la produção, distribuição, comercialização e consumo de

mercadorias através de outras formas que não são aquelas modernas. O

sistema de crédi to, bem como o trabalho e a renda são diferenciados. O

consumo aqui , também é fei to de maneira peculiar, onde grande parte

das vezes são priorizados os valores de uso e não de troca.

9 Afirmamos no passado, pois acreditamos que, sobretudo ao analisar o caso do Brasil, o conceito dos dois circuitos necessita ser revisto, uma vez que as noções de modernidade se alteraram, bem como houve certa difusão de tecnologia no espaço, relativo aumento do crédito ao circuito inferior aumentando, assim, seus padrões de consumo. Ainda assim, mantemos tal definição por dois motivos: o primeiro é que, ao falarmos de formação territorial, ou territorialização das técnicas no contexto brasileiro, é plenamente cabível tratar o circuito superior enquanto tal. Ao mesmo tempo, não se pode de modo algum afirmar que as contradições da economia brasileira tenham se solucionado ao ponto de não haver mais a contraposição entre circuito superior e inferior. De fato, nossa análise empírica no capítulo 4 mostrará que o circuito inferior persiste na realidade da economia espacial das cidades brasileiras, ainda que, é preciso dizer, muitos pontos da teoria necessitem atualizações.

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Chamamos à atenção para a anál i se sobre os dois ci rcuitos da

economia urbana, pois eles demonstram as relações de dominação

sócio-pol í ti co-econômicas, que estariam dando margem para os

processos de uma suposta “f ragmentação” do tecido sócio -espacial das

cidades em nações “subdesenvo lvidas”, como é o caso do Brasi l. Aqui ,

o consumo também tem papel fundamenta l. Na verdade, a causa

essencial para a existência dos dois ci rcu i tos da economia urbana e as

relações de dominação entre eles é que o consumo se impõe enquanto

necessidade universal a part i r do c i rcui to moderno, contudo, na medida

em que os mais pobres não têm condições de se manterem

permanentemente l igado à esfera do consumo que lhes é imposto, são

criadas formas diferentes de produção, distribuição, comercialização e,

até mesmo, de consumo dos produtos. Em cada uma destas etapas, que

também possuem ramif icações ao considerarmos as relações de

trabalho e crédi to nelas, o ci rcui to inferio r é subordinado ao superior ,

contribuindo para o engordamento deste úl timo. Tal subordinação se dá,

primord ialmente, pela forma de produzir que lhe é imposta a qual se dá

justamente acordando com os padrões de consumo modernos. Sobre os

dois ci rcui tos da economia urbana e as re lações de dominação entre

eles, falaremos no sub-capítulo 2.3 e, de maneira empírica, no sub-

capítulo 4.3 .

Finalmente, é preciso dizer que, o enal tecimento do consumo na atual

fase do capi ta lismo, com suas contradições expressas nas relações de

dominação social que são visíveis nos dois ci rcui tos urbanos, se

material iza através das técnicas de maneira selet iva no espaço,

tendendo a produzi r uma suposta f ragmentação do tecido s ócio-espacial

das c idades. Contudo, o concei to de f ragmentação, trazendo uma série

de armadi lhas, necessi ta cautela em sua análise, ta refa a qual

buscaremos nos ocupar no próximo sub-capítulo.

2.2 As Redes e a Fragmentação Sócio-espacia l

Este sub-capítulo se objet iva a discuti r o que seriam as redes, a sua

funcional idade no a tual período histórico e a maneira contradi tória com

a qual tal aparato técnico se a rti cula com o terri tório promovendo,

enf im, processos de f ragmentação do tecido sócio -espacial das cidades.

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Diante disso, achamos por bem começar clarif icando o que entendemos

aqui como a f ragmentação sócio -espacial.

Lefebvre (2008) caracteri za a forma urbana como sendo essencialmente

o “espaço do contato entre as di ferenças”. O urbano, devido à enorme

diversidade de relações que ele torna possíve l , seria então

caracterizado pela sua capacidade de “centra lizar”, por em contato,

aproximar a diversidade. Desta forma, o “fenômeno urbano” seria,

enf im, caracterizado por relações, proximidade, contato entre diferenças

e até mesmo choques e confli tos.

O que ela [a forma urbana] cr ia? Nada. Ela centra l iza as

cr iações. E, no entanto, ela cr ia tudo. Nada exi ste sem

t roca, sem aproximação, sem proximidade, isto é, sem

relações. Ela cr ia uma si tuação, a si tuação urbana, onde

as coi sas di ferentes advêm umas das outras e não

exi stem separadamente, mas segundo as di ferenças (. . . ).

Contudo, o urbano não é indi ferente a todas as

diferenças, pois ele preci samente as reúne. Nesse

sent ido, a ci dade constrói , destaca, l iberta a essência

das relações soc iai s: a exi stênc ia recíproca e a

mani festação das di ferenças procedentes dos conf l i tos,

ou levando a conf l i tos. A c idade, o urbano, não são a

razão e o sent ido desse del í r io rac ional? As relações

(soc iai s) sempre se deteri oram de acordo com uma

distânc ia, no tempo e no espaço, que separa as

i nst i tuições e os grupos. Aqui , el as se revelam na

negação (vi r tual ) dessa di stância. ( . . . ) . Os signos do

urbano são os signos da reunião: as coi sas que permi tem

a reunião (a rua, a superf ície da rua, pedra, asfal to,

cal çada, etc. ) . (Lefebvre, 2008; p. 109).

A f ragmentação espacial , segundo consideramos neste trabalho,

remeteria a processos que i riam de encontro a esta característ ica

fundamental do espaço urbano apresentada por Lefebvre: a diversidade

dos conta tos entre os di ferentes. Ou, como definiu Souza (2008):

Fragmentação tem a ver, obviamente, com f ragmentos. E

f ragmentos são partes de um todo que ou não se

conectam mais, ou quase não se conectam mais umas

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com as outras ( . . . ) se t rata de algo que vai além, até

mesmo, de um processo de segregação (p. 56).

A f ragmentação é, assim, um processo amplo, de escala que vai a lém

do aspecto setoria l . Trata-se de um processo de caráter sócio-pol í t ico e

econômico, com implicações na configuração espacial . É mais do que o

f ruto do agravamento das disparidades sociai s ou de outros fatores

isolados. Assim, a f ragmentação seria o resul tado da quase “não-

comunicação” e “não-interação” entre as classes sociais na cidade

enquanto tota lidade.

Neste sentido, vários têm sido os trabalhos que buscam analisar as

diversas causas que produziriam a f ragmentação do tecido espacia l das

cidades, como a planif icação funcional das cidades a part i r do

urbanismo (Lefebvre, 2008), a criminalidade v iolenta que estaria

supostamente colocando em perigo a tota lidade terri torial das cidades

(Zanotel l i , 2004), ou a “terri torialização” de favelas por grupos ligados

ao tráf ico de drogas juntamente com a auto-segregação das eli tes e das

classes médias em condomínios exclusivos (Souza, 2008).

Contudo, queremos chamar a atenção para a anál ise fei ta por Zanotel l i

(2004), na qual ele conclui que tal ruptura no espaço social das cidades

jamais se real iza de maneira completa e que entre os diferentes

“pedaços mal conectados” da cidade, existe uma série de conexões,

contatos, relações.

A global ização da economia leva a uma diferenciação

forte entre centros e per i fer ias, conectados e

desconectados, mas há também uma di sputa dos

espaços centrai s pelos “desconectados” que desaf iam

certo t i po de cent ro l impo exclusi vo e se i nserem c laro

de maneira dominada, no espaço soc ial da modernidade

(como por exemplo, o comérc io e os serviços i nformais) .

( . . . )

Mas para além da questão residencial , devemos pensar

nas redes que l igam os di ferentes f ragmentos e

microf ragmentos da cidade. As pessoas c i rculam e não

se encontram fechadas em seus bai rros, t rabalham fora

ou se relacionam fora dos espaços de moradia, como por

exemplo as empregadas domést icas, os motor istas de

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ônibus, de caminhão, c laro, eles são dominados, mas

algo aparece desses contatos – consciênc ia da

exploração, aprendizado do conf l i to, ou colaboração

subordinada. (Zanotel l i , 2004; p.6).

De fa to, uma análise minuciosa sobre as redes, que busca se art icular

em diferentes escalas, evidencia que anal isar os processos de

sele tividade terri torial das técnicas sob a ót ica da f ragmentação poderia

esconder as verdadeiras lóg icas de produção da c idade di ta

“f ragmentada”, uma vez que a f ragmentação v ista da forma que

pretendemos demonstrar no presente trabalho não se manifesta

enquanto um azar, ou um efei to inesperado a parti r de processos

contradi tórios desiguais de formação do espaço urbano .

A anál ise proposta sobre os dois ci rcui tos da economia urbana nos

mostra que os contatos e as relações entre os diferentes espaços

homogeneizados-hierarquizados da cidade (Lefebvre, 1974 - apud.

Zanotell i , 2004), ou seja , os contatos entre os espaços dominados e os

dominantes se fazem sempre de modo a perpetuar as relações de

dominação existentes. Assim, a f ragmentação seria, em si , parte

integrante; processo consti tuinte plenamente racional e coerente com a

lógica dominante de formação do espaço urbano , uma vez que o c i rcui to

inferior é subordinado ao superior10. Esta idéia será mais bem discutida

de maneira teórica no sub-capítulo 2.3 e a part i r da aná lise empírica

sobre as redes elé tricas nos sub-capítulos 3.2 e 4.3. Por agora nos

interessa introduzir a prob lemática da f ragmentação enquanto processo

de construção sócio-espacial pelas redes, a objet ivação f ísica da

técn ica no atual período histórico.

As redes não são construções sociais recentes. Sa int -Simon (apud.

Dias, 2005) já evocava sua teoria sobre redes, na qual ele faz uma

analogia do terri tório com o corpo humano. Afi rmava que o corpo

humano morre quando a ci rculação é suspensa, e que sobre o corpo

(terri tório) deveria ser assegurada a ci rculação de todos os f luxos sobre 10 Não se quer dizer aqui que tais processos de dominação se desenvolvam sem dialética e formas de resistência. Muito menos, é nosso objetivo passar uma visão fatalista sobre tal realidade. Ao contrário, cremos que existe sim a possibilidade de modelos alternativos, dos quais alguns já estão sendo gestados, para que o circuito inferior deixe de ser o que é, e que seus espaços se convertam em territórios de prática político-econômica combativa e autônoma. Ver mais a esse respeito, por exemplo, na teoria de Santos (2007) sobre o “Período Popular” e em Souza (2006), sobre as “práticas político-pedagógicas”.

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toda a sua extensão. Da mesma forma, Stanislawski (2006), ao discuti r

a conf iguração terri to rial das cidades como tabulei ro de xadrez, de

forma a garanti r (dentre outras co isas, mas principalmente) uma

ci rculação ef iciente sobre toda a extensão terri torial da c idade, mostra

que já há 3.000 anos antes de Cristo – na cidade de Mohenjo-Daro –

hav ia tais preocupações sobre o p lanejamento do terri tório :

Essa cidade não fo i const ruída ao acaso. A prec isão de

seu planejamento não poderia ter sido acidental . Trata -

se de uma concepção bem art iculada, dest inada a

atender as necessidades de um povo al tamente

organi zado e urbani zado (. . . ) a concepção era a de uma

c idade orgânica, na qual todas as partes se dest inavam a

func ionar dentro do todo (pp. 20-21).

A especif icidade do presente período histó rico, contudo, é que a

tendência que se processa v i rtualmente do estabelecimento de relações

de produção e comercial ização em escala global , torna a f luidez, seja

de informações, seja de produtos e /ou pessoas, um fa tor fundamental .

Isso, vale recordar, se processando em tempos i rr isórios, o que

acarretaria segundo muitos pensadores “pós -modernos” a “an iquilação

do espaço pelo tempo” (apud. Haesbaert, 2004).

As redes são objetos tecnológicos que se superpõem no espaço

geográf ico com a f inalidade de promover os f luxos. Dias (2005) define

as redes como a grande variedade de f luxos que atravessam o espaço

geográf ico, podendo ser: migratórios, comerciais, informacionais,

monetários e f inanceiros. Diz, a inda, que a rede pode, também, “ser

obje t ivada como matriz-técnica – infraestrutura rodov iária, estrada de

ferro, te legraf ia , modif icando a relação com o espaço e com o tempo”

(p.15). No a tual momento em que vivemos, tais técnicas (sobretudo

aquelas relacionadas às tecnologias da informação, como as redes de

internet, mas sem negl igenciar a importância de demais redes como é o

caso das redes elétricas) relativ izam as distâncias e tornam possível a

art iculação entre terri tórios extremamente longínquos em escala g lobal ,

dando forma aos “terri tórios-rede”. É interessante ressal tar que a

conexão de terri tórios pe las redes – princípio primordial para o

processo de globalização – é fei ta exclusivamente a part i r dos

interesses produtivos dos grandes conglomerados internacionais a part i r

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das vantagens locacionais de cada “fragmento” no espaço das cidades –

não se deve esquecer dos incentivos proven ientes dos poderes públicos

de cada Estado-nação, condizendo com a pol í t ica internacional de

abertura de mercados e de desregulamentação econômica (Santos,

2003, 2006 e 2008; Castells , 1999; Haesbaert, 2004).

Desta forma, seria um equívoco se o presente trabalho evocasse

estudar “as redes pelas redes” como se tais técnicas não fossem

obje tos dotados de sentidos sociais específ icos correspondentes ao

atores que a conformam no terri tó rio, e que, f inalmente, comporiam o

aparato de técnicas que permitem o modelo global de produção e

consumo capi tal ista. Aqui achamos necessário desenvolver essa idéia

em mais alguns parágrafos.

Ao buscar estudar as técnicas e a sua art iculação com o espaço ,

achamos os objetivos do presente trabalho part icularmente ambiciosos,

no sentido em que se torna necessário a todo instante art icular duas

vertentes principa is de anál ise. Aquela que diz respe i to ao aparato

técn ico na sua manifestação f ísico-terri torial , que i rá se dispor de

maneira diferenciada em cada “fragmento” do espaço da cidade,

representando, de certa maneira, a outra vertente, aque la que manifesta

os sentidos da rede, uma vez que o sistema técnico de cada sociedade

é representativo da sua diversidade de elementos sociais, polí t icos,

econômicos e cul turais que compõem a sua identidade.

Giddens (1991), segundo Haesbaert (2004), fala da desterri to rial ização 11

a part i r da base tecnológica na modernidade, a qual seria responsável

por dois mecanismos de “desencaixe” espaço-tempo: as “f ichas

simból icas” e os “s istemas peri tos”. As “f ichas simból icas” são os

“meios de intercâmbio que ci rculam sem considerar ambientes de

característ icas específi cas de grupos ou con junturas part icu lares, como

o dinheiro e os cartões de crédi to”. Enquanto os “s istemas peritos”

seriam “um conjunto de conhecimentos e/ou técnicas [que permitem]

11 O termo “desterritorialização”, usado por Haesbaert (2004), remete, de maneira geral, a um discurso produzido entre alguns intelectuais para os quais os territórios estavam fadados ao desaparecimento após a emergência das redes globais. As relações fluidas com os territórios a partir das redes viriam a produzir a aniquilação dos territórios, no sentido em que eles estariam perdendo a sua importância em favor do “tempo”. O autor demonstra que o que ocorre, na verdade, são novas relações que se estabelecem com os territórios, ao mesmo tempo em que emergem novos padrões territoriais, os quais, pela dificuldade de serem analisados, passaram a ser meramente desqualificados no discurso da “desterritorialização”.

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26

que se usuf rua de inúmeras tecnologias e serv iços pe la simples

conf iança no conhecimento peri to dos experts que o concebem” (p.158).

Analogamente à teoria de Santos sobre a formação do espaço

geográf ico, em A Natureza do Espaço (2006), poderíamos considerar

esses mecanismos de “desencaixe” como um exemplo de técnicas

sociais (bastante evidentes na modernidade) e que produzem

tecnologias diferenciadas, as quais, ao serem incorporadas ao espaço,

produzem formas diferenciadas e usos/relações, da mesma forma,

diferenciados. Ou seja, quando Haesbaert af i rma que “nas sociedades

modernas e, mais notadamente, nas sociedades global izadas da

modernidade tardia ou radica lizada, ocorre o fenômeno do ‘desenca ixe’ ,

def in ido por Giddens como o deslocamento das relações sociais de

contextos locais de interação e sua reestru turação através de extensões

indef inidas de espaço-tempo” (2004, p. 157), entendemos que os

mecanismos que promovem esse desencaixe devem ser entendidos

como técnicas sociais de produção do espaço.

Por exemplo: um ind ivíduo moderno que dispõe do seu cartão de crédi to

(uma f icha simból ica) nos seus diversos anseios de consumo cotidiano,

tais como alimentação, vestuário, lazer, etc. E que usa, também, outras

formas de “sistemas peri tos” em suas relações sociais “sobre” e com o

terri tório, tais como a internet, o celu lar, a rede de metrô e tc. (sendo

estas tecnologias incorporadas ao espaço por necessidades

temporais/h istóricas específ icas da modernidade em que vivemos),

possui relações bem mais f lexíveis com o terri tório do que um indiv íduo

menos favorecido pelo sistema, morador de favela, que não possui

tantas facil idades em manter uma relação tão f lexível com o terri tório e,

da mesma forma, com a art iculação dos terri tórios que é (re)criada

constantemente e já caracteriza um novo padrão de configuração

espacial : a dos terri tórios-rede. Desta forma, o fenômeno da

f ragmentação vem se manifestar nas di ferentes formas de construção

espacial entre os diferentes espaços dominantes e dominados,

condicionada, neste caso, pelos diferentes acessos e usos às/das

técn icas.

As redes, como demonstra Castells (1999), são os aparatos técnicos

que propiciam não somente a art iculação de terri tórios. A part i r das

redes são emersas novas formas de vivência com os terri tórios, novos

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27

padrões de produção e também de consumo, mui to mais f luídos e

globais. Contudo, ainda que ta is padrões venham a moldar o c i rcui to

moderno da economia e neste sentido seja realmente global , ele insere

de maneira precária a maio r parte da população, que não tem condições

de se manter de manei ra ef iciente e permanente nos padrões de

consumo propostos por este novo paradigma técnico, ainda que a todo

instante seja motivada a ter os mesmo anseios de consumo 12.

Neste sentido, são esclarecedoras as constatações de Davis (2006). No

período ápice da sociedade de consumo e da globalização dos

mercados, o autor demonstra através de diversos dados que em poucos

anos a população urbana no planeta ul trapassará a rural , com

tendências ao crescimento das grandes metrópoles e do surgimento de

outras novas metrópoles. Ocorre que o preço desta nova ordem urbana

será a desigualdade cada vez mais acentuada:

Desde 1970, o cresc imento das favelas em todo o

Hemisféri o Sul ult rapassou a urbani zação propr iamente

di ta (. . . ) As favelas de São Paulo – meros 1,2% da

população em 1973, mas 19,8% em 1993 - cresceram na

década de 1990 no r i tmo explosi vo de 16,4% ao ano. Na

Amazônia, uma das f rontei ras urbanas que cresceram

com mais velocidade em todo o mundo, 80% do

crescimento das c idades tem-se dado nas favelas (. . . )

t ornando assim sinônimos “urbani zação” e ‘ f avel ização” .

(p. 27).

De fato, hoje as zonas suburbanas de mui tas ci dades

pobres são tão vastas que fazem ver a necessidade de

repensar a per i feralidade ( . . . ) esses complexos são

chamados de per iurbanos, mas, na real i dade, é a c idade

propri amente di ta que é per i fér ica. (pp.46-47 ).

12 De qualquer maneira, ao considerarmos as condições naturais de reposição dos recursos pelo meio ambiente, fica claro que a forma de consumo proposta pelo American Way of Life é impossível. De fato, apenas 1% dos produtos comprados por um consumidor normal norte-americano ainda são usados decorridos seis meses da compra. Caso o mundo todo consumisse segundo os padrões norte-americanos, o colapso ambiental gerado pelas formas predatórias de exploração dos recursos naturais como extração de matérias-primas e de fontes de energia, além da poluição por gases tóxicos e lixo, geraria a necessidade de três a cinco planetas Terra a fim de sustentar tal modelo (Story of Stuffs web site, acesso em 26-02-2009).

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É certo que a segregação não se reduz à favelização, pelo fato óbvio de

que nem toda a massa populacional segregada do ci rcui to capi talista

global se encontra nas favelas. Ainda assim, cremos que a favela 13 é a

expressão terri torial mais evidente da segregação na modernidade.

Vale re tomar agora a idéia da dupla anál ise que é fei ta das redes,

buscando seu v iés f ísico-terri torial e, ao mesmo tempo, seu sentido

sócio-pol í ti co-econômico-cul tural . Assim, o relativo abandono da

maioria da população pelo ci rcui to cap i talis ta moderno no que diz

respe i to à manifestação das re lações sociais de produção e de consumo

(com seus inf ini tos desdobramentos) forma par com a estru tura f ís ica

das redes incorporadas no terri tório, uma vez que, é ocioso re lembrar,

elas são os paradigmas técnicos responsáveis pelas re lações sócio -

econômicas capi ta listas globalizantes (fato que é demonstrado com

clareza na análise empírica sobre as redes elétricas no sub-capítulo

4.2). Ou, como af i rma Vel tz (1996; apud. Haesbaert, 2004):

Essas redes cri am ao mesmo tempo novas conexidades e

efei tos ‘ t únel ’ para as zonas atravessadas, mas não

servidas ( . . . ) mui to perturbadoras do ponto de vista da

cont inuidade terr i tor ia l (p. 296).

A f ragmentação sócio -espacial advém enquanto processo resul tante da

sele tividade social e terri torial das técn icas e dos seus usos que se dão

de acordo com as vantagens locacionais de cada “f ragmento” terriorial

usado. Ao se impor como modelo sócio-po l í tico-econômico dominante o

cap i talismo monopoli sta neol iberal se art icula de maneira selet iva nos

espaços das cidades dos países “subdesenvolvidos”, criando a

descontinuidade existente entre as classes dominantes e médias, e

suas terri to rialidades que se mantém verdadeiramente incluídas , e as

classes dominadas, estão marginal izadas neste c i rcui to. As af i rmações

de Santos (2004) buscam ilustrar esta idéia ao mesmo tempo em que

inic iam l inks com o aprofundamento desta discussão que se fará no

sub-capítulo que se segue.

13 A Favela, segundo definição da ONU, é “caracterizada por excesso de população, habitações pobres ou informais, acesso inadequado à água potável e condições sanitárias de insegurança da posse da moradia. Essa definição operacional adotada pela ONU (...) está restrita ‘às condições físicas e legais do assentamento’ e evita as ‘dimensões sociais’, mais difíceis de medir, embora igualem-se, na maioria das circunstâncias à marginalidade econômica e social” (Davis, 2006; p. 33). Para uma definição de favela contextualizada no Brasil, ver Valadares, 1980.

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29

Do ponto de vi sta das condições espaciai s das grandes

f i rmas, pode-se falar, nos países desenvol vidos, de uma

especial ização vert ical do terr i tór io. A f ricção do espaço

é re lat i vamente nula e sua f lu idez assegura a

complementar idade funcional entre pontos d iferentes em

que as produções complementares se real izam. Nos

países subdesenvol vidos, só se po de falar de

especial ização hor i zontal , com uma selet ividade do

espaço para os di ferentes nívei s de produção industr ial ,

devido à rar idade dos pontos que dispõem de vantagens

l ocacionais signi f icativas. Há uma tendência para as

concentrações com efei tos cumulat ivos (p. 279).

Moderni zação e tecnocracia, sendo sinônimas nas

condições atuai s, o movimento para a concentração é

apoiado por uma poderosa argumentação técnica, que

faz entrever num futuro não distante, a d i fusão

geográf ica e socia l do crescimento. O resul tado,

entretanto, é o contrár io: pobreza di fundida por toda a

parte, pobreza concentrada nos pontos de cresc imento.

I sso, não podemos negar, const i tui um dos resul tados

mais graves da associação func ional do Estado com os

monopól ios (p. 282).

2.3 A Fragmentação Enquanto Produto da Dominação: Uma Análise a Partir dos Dois Circuitos da Economia Urbana

Até aqui buscamos caracterizar o parad igma técnico da atualidade,

demonstrando que, apesar do seu discurso supostamente universa lista,

ele tende a se manifestar de maneira extremamente selet iva, fato que

se materializa na morfologia urbana através do processo de

f ragmentação do tecido sócio-espacial . Cabe-nos agora desvendar este

processo em seus pormenores, buscando anal isar as causas e as

conseqüências da f ragmentação do tecido urbano enquanto produto da

terri torialização setorial das técnicas.

Estudos minuciosos (por exemplo: Santos, 2003; Santos, 2008;

Maricato, 2000) mostram como a modern ização dos países

“subdesenvolv idos” se deu a part i r de interesses externos aos

nacionais. Os aparatos tecnológicos foram dispostos nos espaços das

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cidades desconsiderando as escalas locais, ao mesmo tempo em que

seguiram em grande parte a lógica exportadora. Ora, o resul tado foi a

formação da cidade f ragmentada, com terri tórios sele tos nas cidades

dispondo de obje tos tecno lógicos ef icientes, enquanto os demais

f icaram marcados pela precariedade de tais serv iços, pelo rela tivo

“abandono”, enf im, pela pobreza. Desta maneira, a segregação social

passa a se tornar mais patente nestas cidades, fato que, no limi te , veio

a desenvolver a f ragmentação do tecido sócio-espacial . A f ragmentação

passa a ter, então, o seu v iés f ísico-terri torial , nít ido ao contrapor as

inf ra-estru turas dos espaços centrais aos periféricos das c idades14 (que

também será estudado em seus pormenores posteriormente, ao

discuti rmos o caso das redes elé tricas). Não tão nítido, talvez, seja o

viés das relações sócio-econômicas da fragmentação, para o qual

achamos imprescindível a compreensão dos dois ci rcui tos da economia

urbana (Santos, 2004) a f im de entendê-lo.

A maneira como a modernização dos países “subdesenvolv idos” se deu,

sobretudo nas décadas de 1950, 60 e 70, vale recordar: objetivando

interesses externos e com caráter setorial /selet ivo nos espaços das

cidades, foi responsável pela criação do ci rcu i to superior da economia

urbana nesses países, ci rcui to este representado pelas indústrias

monopol ísticas de uso intensivo de tecno logias e de capi tal , além do

comércio atacadista e varej ista moderno. A realidade é que as

promessas de di fusão da técn ica e do desenvolvimento tanto no espaço

como nos estratos sociais não aconteceu de maneira plena. Ainda que

houvesse certa difusão da técnica no espaço, esta se deu de maneira

precária, como é o caso da energia elé trica nos bairros perifé ricos.

Sobre a difusão do consumo moderno, falaremos nas próximas l inhas.

De qualquer forma, o fato é que a industriali zação passou a ser cada

vez mais exógena e independente do mercado interno e da mão-de-obra

nas nações “subdesenvolvidas”. Assim, “à medida que o país se

14 Periferia aqui se refere à tradição da análise sócioespacial brasileira para indicar lugares com status social e econômico precário em áreas com serviços e equipamentos urbanos raros e insuficientes. O que se chama “periferia” pode, como no caso do presente estudo, se referir a favelas situadas nas proximidades dos bairros de residência das classes dominantes; pois se encontram na periferia socioeconômica e em espaços, morros íngremes, onde o habitat e o que o acompanha é precário e frágil. Mas, no interior desses lugares há também uma diferença de morfologia espacial e social, diferenciações e complexidades que se constroem de maneira permanente. Ver a esse propósito Roselaine Oliveira dos Santos, 2006.

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31

industrializa, a urbanização torna -se cada vez mais terc iária” (Santos,

2008; p.193).

Contudo, é preciso que tenhamos cautela ao anal isar a af i rmação de

Mi l ton Santos de maneira isolada. Na verdade, o ci rcu ito inferior da

economia urbana não se resume ao setor te rc iário. Como ele mesmo

atenta :

Ora, pensamos que a apreensão do “c i rcui to infer ior”

recobre uma real idade mui to mais ampla que a expressa

pelo termo “terciár io”. ( . . . ) o ci rcui to infer ior é resul tado

de uma si tuação dinâmica e engloba at ividades de

serviço, como a domést ica e os t ransportes, assim como

as at i vidades de t ransformação como o artesanato e as

formas pré-modernas de fabr icação ( . . . ) é um elemento

fundamental da vida urbana nos países

subdesenvol vidos, por seu papel de abr igo da população

pobre, migrante ou ori ginár ia da c idade, que só

raramente pode consumir e t rabalhar no c i rcui to moderno

(Santos, 2008; p. 201).

Não se pode d izer, contudo, que as populações mais modestas sejam,

de fa to, desnecessárias, sobretudo no que diz respei to à esfera do

ci rcui to de consumo capi talis ta. Sobretudo nos úl timos anos, com o

governo do presidente Lula, por exemplo, observou-se, no Brasi l um

aumento do consumo moderno pelo ci rcu i to inferior, devido ,

principalmente, ao aumento do créd ito para a população deste extrato

social e, ao menos no plano do discurso, uma diminu ição da pobreza .

Mas que t ipo de diminuição da pobreza? De fato, o que seria a

pobreza? Santos (2007), apresentando uma defin ição mais qual i tativa

que aquela apresentada pelos números of iciais do Governo, af i rma que:

A pobreza é uma si tuação de carência, mas também de

l uta, um estado vi vo, de vida at iva, em que a tomada de

consciência é possível .

Miserávei s são os que se confessam derrotados. Mas os

pobres não se entregam. Eles descobrem cada dia

formas inédi tas de t rabalho e de luta. Assim, eles

enf rentam e buscam remédios para suas di f i culdades.

( . . . )

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32

A pol í t ica dos pobres é baseada no cot idiano vivido po r

todos, pobres e não pobres, e é a l imentada pela simples

necessidade de cont inuar exi st indo. Nos lugares, uma e

outra se encontram e se confundem, daí a presença

simul tânea de comportamentos contradi tóri os,

a l imentados pela i deologia do consumo. Este, ao serviço

das forças soc ioeconômicas hegemônicas, também se

entranha na vida dos pobres, susc i tando neles

expectat ivas e desejos que não podem contentar (pp.

132 – 133).

Desta maneira, acredi tamos que um determinado aumento nos padrões

do consumo moderno pelo ci rcui to inferior não s ignif i ca, de nenhum

modo, um avanço na solução das contradições socioeconômicas

internas dos países “subdesenvolvidos”. Pelo contrário, apesar da sua

aparência progressista, os desejos de consumo sanados – e somente

em parte, é importante dizer – pelos modestos aumentos do salário e do

crédi to ao ci rcui to inferior, somente contribuem ainda mais para a

manutenção da sua subordinação ao c i rcui to superior. Santos, em

trabalho bem mais antigo (primeiro ano de publicação em 1979), já

hav ia af i rmado que:

De ora em diante, dever-se-á dar aos pobres a

impressão, e não somente a esperança, de que estão

emergindo da pobreza. Eles passarão, portanto a

testemunhar um aumento em termos absolutos de sua

renda, isto é, de seu consumo de bens e serviços. Mas

como está fora de questão reduzi r as taxas de

acumulação e de desigualdade, o que signi f icar ia a morte

do si stema, a pobreza não será el iminada, apenas

mascarada (2003; p. 33) .

Torna-se mais claro , então, que a inserção do ci rcuito inferior, de

maneira dependente e subordinada ao superior, é essencial para a

manutenção do atual modelo de produção -d istribuição-consumo

cap i talis ta. É neste sentido que discordamos da af i rmação de Castel ls

(1999, p . 176), a nosso ver ambígua e contradi tória, ao dizer que:

Não af i rmo que as soc iedades desses setores

“marginais” não estejam conectadas ao resto do si stema,

visto que não há nenhum vácuo social . Mas sua lógica

soc ial e econômica baseia-se em mecanismos

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33

c laramente di st intos do da economia informacional .

Embora a economia informacional afete o mundo intei ro

e, nesse sent ido, seja g lobal mesmo, a maior parte das

pessoas do planeta não t rabalha para a economia

i nformacional /g lobal nem compra seus produtos.

Entretanto, todos os processos econômicos e sociai s

re lac ionam-se à lógica da estrutura dominante nesta

economia .

Ora, se não há vácuo social , como pode e le af i rmar que a massa

“marginal izada” não trabalha para a economia informacional global [ou

seja , os grandes conglomerados monopol ísticos que se articulam em

rede] e nem compra seus produtos!? A ve rdade é que, como demonstra

Santos (2004, principalmente capítulos 7 e 8) o c i rcui to inferio r está

intimamente l igado ao superior, não somente através do trabalho e do

consumo, mas também, da distribuição, do comércio , dos serviços, do

crédi to, da ci rculação f iduciária, etc., de maneira que, no f inal , o

ci rcui to inferior acaba sempre contribuindo para o engordamento do

ci rcui to superior. É desta forma que acredi tamos que a f ragmentação

sócio-espacia l , quando analisada sobre o viés das técnicas, é f ruto

primeiramente deste processo de dominação existente entre os dois

ci rcui tos da economia urbana, uma vez que ele emergiu a parti r da

disposição das técnicas no espaço, seguindo as ideologias da

modernização e do desenvolv imento a part i r do período de

industrial ização que se seguiu nas décadas de 1950, 60 e 70.

A verdade é que com a modern ização v inda de fora e para fora15,

desinteressando-se nas especif icidades demográficas e econômicas

locais, o que houve foi uma verdadeira distorção em relação ao ci rcuito

superior e o meio econômico e social no qual ele veio a se instalar,

criando as condições para a existência do ci rcui to inferio r da economia

urbana.

A exi stênc ia de uma massa de pessoas com salári os

mui to bai xos ou vivendo de at ividades ocasionais, ao 15Em nome do pragmatismo gostaríamos de deixar claro mais uma vez que não estamos dizendo que a modernização objetivou somente o mercado consumidor externo. Estamos fazendo alusão aos interesses dominantes neste processo que foram, de fato, exógenos, principalmente objetivando a transferência espacial da extração de mais-valia para as nações “subdesenvolvidas”. Não afirmamos, contudo, que não houve difusão do consumo nestas nações, principalmente entre as classes dominantes e médias, mas também entre as classes pobres. Já dizemos anteriormente que isso é condição essencial para a manutenção das desigualdades e da subordinação necessárias à vitalidade do sistema.

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l ado de uma minor ia com rendas mui to elevadas, cri a na

soc iedade urbana uma di vi são entre aqueles que podem

ter acesso de maneira permanente aos bens e serviços

oferecidos e aqueles que, tendo as mesmas

necessidades, não têm condições de sat i sfazê -l as. Isso

cr ia ao mesmo tempo di ferenças quant i tat ivas e

qual i tat i vas no consumo. Essas di ferenças são a causa e

o efei to da existênc ia, ou seja, da cr iação ou da

manutenção, nessas c idades, de doi s ci rcui tos de

produção, d istr i buição e consumo de bens e serviços

(Santos, 2004; p. 37).

Assim, o ci rcu ito superior ao mesmo tempo em que não cria condições

para que toda a massa populacional se mantenha permanentemente

l igada ao consumo de seus produtos, ele consegue di fundir os seus

modos de consumir em todos os extratos sociais. Desta maneira, a

massa populacional mais pobre, tendo as mesmas necessidades de

consumo, tenderá a desenvo lver formas diversas de consumo. Serão

priorizados determinados produtos a serem consumidos, outros serão

consumidos de maneira precária, outros, ainda, de maneira “paralela”,

como é o caso da energia elétrica que será demonstrado no estudo de

caso no sub-capítu lo 4.3. Tal forma de consumo, a través do uso

intensivo do trabalho e da criativ idade, é característ ica fundamental do

ci rcui to inferior, no qua l o consumo se mostra grande parte das vezes

através da apropriação coletiva , com maior v isibi l idade aos valores de

uso; contrapondo-se ao ci rcui to superior onde, priorizando o uso

intensivo do capi tal e da al ta tecnologia homogeneizantes, não há luga r

para outra forma de consumo que não aquela indiv idualista

sobrepujante do valor de troca.

A modern ização e a expansão do setor moderno e dinâmico – o c i rcui to

superior – se processaram (e ainda assim o são) de maneira

excludente16, deixando cada vez fat ias maiores da população na

pobreza. Contudo, ao mesmo tempo em que o c i rcui to superior é

excludente no que tange à produção (e a conseqüente criação de

empregos), ele é extremamente ef i ciente ao inclui r no que tange aos

16 Excludente no sentido em que a modernização não se dispôs a abarcar a totalidade da população em postos de trabalho e mercado consumidor modernos, contudo, a exclusão nunca se manifesta de maneira completa. Como dito anteriormente, parafraseando Castells, não há “vácuo social”. Desta maneira, talvez, fosse mais pragmático dizer “inclusão parcial” ou “incompleta”.

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modos de consumo, e isso se deu basicamente em dois níveis: na

aniqui lação da produção artesanal através das formas de produção pela

indústria moderna e na profunda massif icação ideológica da sociedade

de consumo (e do consumo em si , como dito no sub-capítulo 2.1). Ou

seja , ainda que o c i rcu i to superior não seja ef i caz enquanto consti tuição

de um mercado produtor e consumidor interno, pois mantém sua

capacidade de produção baseada no monopól io e na capacidade ociosa,

vol tando-se para o mercado externo e para a pequena parcela

representada pelas c lasses médias e al tas domésticas – que

material izam a concentração de renda necessária para a subordinação

em relação aos países desenvolv idos (Santos, 2004; pp. 133 – 159) –

ele, o ci rcui to superior, é ef icaz enquanto ideologia de consumo e ,

neste sentido, podemos dizer que a to tal idade da população é por ele

abarcada, o que, aparentemente, estaria atenuando as f ragmentações

sociais e terri to riais. Ao mesmo tempo em que provoca a impressão de

uma unidade social , econômica e cul tural (sendo a cul tura , em ú l tima

instância , representada pelas formas de consumo) quando, na verdade,

o que existe é o dualismo entre os ci rcui tos superior e inferior, com

suas manifestações na conf iguração espacial das cidades.

Se considerarmos o v iés do consumo desta forma, seremos obrigados a

conclui r que a subordinação do ci rcui to inferior para com o superior

(dentro da esfera do consumo) ul trapassaria o aspecto meramente

econômico alcançando outra esfera de dominação, mui to mais subjetiva,

semelhante àquela def in ida por Bourdieu (2007) como o “poder

simból ico”: aquele que onde menos se deixa ver, onde ele é mais

ignorado é que é mais exercido. Aquela forma de poder que não tem

seu centro em parte alguma, mas em toda parte; “esse poder invisível o

qual só pode ser exercido com a cumplicidade daqueles que não querem

saber que lhe estão sujei tos ou mesmo que o exercem” (pp. 8 – 9).

Bourdieu (2007) fala da atuação do poder simból ico a parti r da criação

de ideologias pelas classes dominantes que, sendo internalizadas

sub jet ivamente pelas classes dominadas, passariam a ser ignoradas e

nesse sentido reproduzida como crença não questionada.

A cul tura dominante contr ibui para a integração real da

c lasse dominante (assegurando uma comunicação

imediata entre todos os seus membros e di st inguindo-os

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36

das outras c lasses); para a i ntegração f ictíc ia da

soc iedade no seu conjunto, portanto, à desmobi l ização

( fa lsa consciênc ia) das classes dominadas; para a

l egi t imação da ordem estabelec ida por meio do

estabelec imento das di st inções (hierarqui as) e para a

l egi t imação dessas dist inções. Esse efei to ideológi co,

produ- lo [ sic . ] a cul tura dominante dissimulando a função

de di visão na função de comunicação: a cul tura que une

( i ntermediár io de comunicação) é também a cul tura que

separa ( instrumento de dist inção) e que l egi t ima as

dist inções compel indo todas as cul turas (designadas

como subcul turas) a def ini rem-se pela sua distância em

relação à cul tura dominante (Bourdieu, 2007; pp. 10-11).

Assim, a modernização dos países subdesenvolv idos e a conseqüente

criação do c i rcui to superior criam assimetrias sociais e terri toriais ao se

funcional izar de manei ra exógena, o que proporciona as condições

favoráveis ao estabelecimento nestes países do ci rcui to inferior. A

conexão entre os dois ci rcui tos se dá em diversos níveis, contudo

sempre com o ci rcu ito inferior subordinando-se ao superior. No que diz

respe i to ao consumo, a imposição no p lano simból ico -subjet ivo de

formas específ icas de consumir a part i r da eli te dominante, se articulam

dentro do que Bourdieu chama como ideologia. Certo t ipo de ideo logia

do consumo que, de fato , cria l inks entre os dois ci rcui tos a part i r dos

mesmos anseios de consumo (uma forma de consumo dominante) e

relativ iza a f ragmentação, legi timando a exploração econômica pelos

que são impossibi l i tados de consumir de maneira permanente, se

colocando em posição de “desprovidos” (ou seja, classi fi cados em

relação à classe dominante: os “prov idos”) e necessi tando consumir de

maneira d iferenciada, o que pre tendemos demonstrar no sub-capítulo

4.3.

Neste sentido, é preciso rever a relação entre a pobreza e a suposta

“marginal idade”, mui tas vezes t idas quase como sinônimas. A verdade é

que a “marg inal idade” não existe17, mas sim a exploração econômica e

pol ít ica. Isso seria a condição para as relações de dominação entre os

17 Consideramos aqui o termo “marginalidade” enquanto um conceito a partir do qual os mais pobres estariam às margens, ou seja, não participando do sistema sócio-político-econômico. Na verdade, o que temos buscado demonstrar é que o circuito inferior está plenamente inserido neste sistema, claro que dentro da lógica subordinadora dominante.

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37

dois c i rcui tos e a subordinação do ci rcu ito inferior ao superior, que se

dá em diversas escalas. No caso do consumo, por exemplo, os mais

pobres não têm acesso aos produtos modernos de maneira permanente,

os quais determinam as diferenças entre os “providos” e os

“desprovidos”. Assim, os desprovidos se qual if icam enquanto tal a part i r

de uma estrutura que lhes é imposta. Sair da subordinação s igni f icaria,

neste caso, gastar seus esforços para consegui r “vencer na vida”,

entrar para o grupo dos “providos”, sem lutar, desta forma, contra as

verdadeiras estruturas de poder dominantes. Contudo, a realidade não é

tão fatal is ta quanto tal análise pode demonstrar. Santos (2007) af i rma

que as condições para a emergência de um novo período econômico-

produtivo poderiam surgir, paradoxalmente, a parti r das experiências de

decepções trazidas pelo capi tal ismo na sua atual forma.

Mas há também a desi lusão das demandas não

sat i sfe i tas, o exemplo do vizi nho que prospera, o

cot i diano contradi tór io. Talvez por aí chegue o despertar .

Num pr imei ro momento, este é, apenas, o encontro de

poucos f ragmentos, de algumas peças do puzzle, mas

também a di f iculdade para entrar no labi r into: fal ta- lhes

o própr io si stema do mundo, do país e do l ugar. Mas a

semente do entendimento j á está plantada e o passo

seguinte é o seu f lorescimento em at i tudes de

i nconformidade e, tal vez, rebeldia (Santos, 2007; p .

133).

Não enaltecemos, contudo, o papel das manifestações simból icas do

poder nas relações de dominação. Apenas buscamos chamar a atenção

para um aspecto da dominação entre os dois ci rcui tos que vai além do

material ismo e passa pelo campo da subjetiv idade social nas relações

de poder. Fechando esses parênteses e retornando à material idade

sócio-econômica das relações de dominação entre os dois ci rcui tos, o

que achamos importante f ri sar é que a estrutura de monopólios (base

do ci rcui to superior da economia urbana) garante uma padronização das

estruturas de consumo, ainda que estas não se disponham a abarcar a

total idade da população “numa sociedade que não pode mais manter

todos os seus membros part icipando do jogo [do consumo] , mas deseja

manter os que podem jogar ocupados e feli zes, e acima de tudo

obedientes” (Bauman, 2003; p. 111).

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38

3. A rede elétrica

O uso da eletric idade não é algo recente, civi l izações antigas já

conheciam propriedades elétricas de a lguns materiais. A pa lavra

eletric idade deriva do vocábulo grego elektron (âmbar), como

conseqüência da propriedade dessa substância de atrai r partículas de

pó ao ser a tri tada com f ibras de lã (Copel , 2008). Contudo, a

“revolução” do uso da e letricidade tem seu início no século XVIII . Neste

século, o francês Charles François de Cisternay Du Fay comprovou a

existência de dois t ipos de força elétrica: de a tração e de repulsão.

Beijamin Franklin atribuiu a essas cargas sinais posi tivos e negativos, e

foi ele quem demonstrou pela primeira vez que o relâmpago era um

fenômeno elétrico com a sua famosa experiência ut i l izando uma pipa. A

part i r dessa experiência ele produziu o primeiro pára-ra ios. Mui tos

outros c ientistas contribuíram para o desenvolv imento na área da

eletric idade, tais como Priest ley, Cavendish, Coulomb, Alessandro Vol ta

e Georg Ohn, até que, em 1873, o cient ista belga Zénobe Gramme

demonstrou que a eletricidade poderia ser transmit ida de um ponto a

outro através de cabos condutores aéreos. Em 1879, o americano

Thomas Edison inventou a lâmpada incandescente e, dois anos depois,

construiu, na cidade de Nova Iorque, a primeira central de energia

elétrica com sistema de distribuição. A eletric idade já tinha aplicação,

então, no campo das comunicações, com o te légrafo e com o telefone

elétrico e, pouco a pouco, o saber teórico acumulado foi introduzido nas

fábricas e residências.

A anál i se das redes elétricas já re f lete em si uma escolha metodológica.

Dada a complexidade das redes é impossível conhecer todos os seus

dinamismos, naturezas, extensões e conseqüências sobre o espaço

(Corrêa, 2006, p.312). Assim, desejando anal isar as lógicas sociais

pelas quais as redes se materializam no terri tó rio, mas reconhecendo

que as redes são diversas, conectam terri tórios diversos e com funções

e usos diversos, a escolha para análise de uma rede técnica específ ica,

tal como a rede elétrica, nos pareceu ser um caminho para entender a

rede e a construção dos terri tó rios.

Castell s (1999, pp. 74-75), fala das revoluções industriais ocorridas nos

séculos XVIII e XIX como, na verdade, “revoluções energéticas”. Para

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Page 40: Espaço, Técnica e Dominação: Estudo de caso do acesso à rede ...

39

ele, as revoluções industriais só ocorreram devido ao incremento

tecnológico proporcionado pelos usos de energia na produção industrial ,

bem como a disseminação social de uma forma de consumo baseada

nos usos de energia. De fato , o consumo de energia persiste em nossa

sociedade como o paradigma essencial para todas as necessidades

vi tais em relação à sobrevivência da própria sociedade de consumo. A

energia, especialmente a energia elétrica, se insere nas diversas

cul turas do globo desde a escala da habi tação e do cotidiano até às

formas de produção, locomoção e f luxos informacionais nas suas

também diferentes escalas.

As redes elé tri cas estão int imamente l igadas ao nosso cot id iano. Sem

elas seria impossível sustentar todas as necessidades criadas em nossa

sociedade moderna, desde a produção ao consumo, passando pelo

lazer e pelas manifestações cul turais. Jannuzi & Swisher (1997),

af i rmam que:

O aumento da urbani zação e a industr ial ização que se

processam em paralelo seguem padrões i ntensivos de

energia. A população demanda transporte (de bens e

pessoas), novos produtos industr iais e out ros serviços

como saneamento, saúde, comércio, etc . ,que dependem

de energia. Desse modo, construi r e opera r

equipamentos de inf ra-estrutura urbana, industr ia l e

comerc ial requer energia, especialmente eletr ic idade, e

aumentar padrões de vida mater ial da população resul ta

em grandes demandas por novos serviços que consomem

energia. Em mui tas nações em desenvolvimento a

eletr i f icação rural é pri or idade, poi s se reconhece que

uma pequena oferta de eletr ic idade pode aumenta r

signi f icativamente as condi ções de vida e contr ibui r para

a diminuição do f luxo migratór io para as c idades (p. 1).

Colaborando com ta is af i rmações, Bermann (2003) destaca diversos

usos f ina is de energ ia que são incorporados no cot id iano da nossa

sociedade, tai s como: “i luminação, força motriz, calor de processo e

aquecimento di re to, necessários para a sat i sfação de necessidades

como al imentação (cocção e ref rigeração), transporte, cul tura , lazer,

etc.” (p. 60).

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40

3 .1 Aspéc tos técn icos da r ede de ge raç ão , comerc ia l i zação e d is t r ibu i ção de ener g ia e lé t r i ca no E sp í r i to S anto

Ao iniciarmos a exposição de idéias no presente tópico, torna-se

oportuno esclarecer que o obje tivo aqui não é uma anál ise profunda

sobre os mecanismos técnicos do s istema de produção, distribuição e

comercia lização de energia elétrica. Tra ta-se somente de elucidar

questões básicas essenciais para se entender a rede elétrica, e que

precisam ser compreendidas para que não haja equívocos em nosso

procedimento anal í tico 18.

No Brasi l, a principal fonte de geração de energia elétrica é a

hidráu lica, part icipando com quase 83% de toda a energia elétrica

gerada no país (ANELL, 2005; p. 43). São nas usinas hidroe létricas que

a energ ia hidrául ica será transformada em elétrica através de

eletroímãs de orientação variável que produzem correntes al ternadas.

Essas correntes são conduzidas com o auxil io de cabos de al ta tensão

até as chamadas subestações elevadoras. As subestações e levadoras

são aquelas responsáveis pelo aumento da tensão, a f im de diminuir as

perdas energéticas durante a transmissão da energ ia das hidroelé tri cas

até as subestações nos centros urbanos19.

A part i r daí, a corrente elé trica é conduzida para as chamadas torres de

transmissão. Delas a corrente segue para uma subestação abaixadora,

que i rá diminuir a tensão a f im de que a corrente seja conduzida para

seus diversos usos através dos postes. O valor da tensão em cada

subestação não é padronizado. Isso depende da carga energética

exigida para cada região de fornecimento de energia de cada

subestação, ou seja, em regiões predominantemente residenciais a

18 Para informações um pouco mais detalhadas sobre os processos de geração e distribuição de energia no Espírito Santo pode-se ler a entrevista 3 no anexo 4. 19 Tais perdas são as chamadas perdas técnicas, ocasionadas pelo fenômeno físico conhecido como “Efeito Joule”. Efeito Joule, de maneira genérica, se refere às perdas de energia ocasionada pelo aquecimento gerado pela corrente elétrica ao atravessar os cabos condutores. Este aquecimento é gerado pelo atrito da corrente com os cabos. Como a velocidade da corrente é inversamente proporcional à tensão, a tensão é elevada a fim de diminuir a velocidade e, assim, o atrito. Ou seja, com o aumento da tensão é diminuído o Efeito Joule. Em Furrnas, por exemplo, a energia elétrica é gerada em uma tensão de 13,8 kV. A tensão é elevada em uma subestação elevadora para cerca de 138 kV. Nos centros urbanos essas tensões são novamente reduzidas em subestações abaixadoras para, novamente, cerca de 13,8 kV ou 11,4 kV. As subestações abaixadoras na Grande Vitória são: Carapina, Praia, Pitanga, Camburi, Paul, Ibes, Bento Ferreira, Alto Lage.

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41

tensão é de cerca de 34 kV, enquanto em reg iões predominantemente

industriais a tensão é de 138 kV. Cada subestação serve uma

determinada região que é def inida através das pol í ti cas de

planejamento de distribuição energética que são fei tas pela empresa

concessionária de energia.

A parti r das subestações abaixadoras, a corrente elétrica é transmit ida

para os centros urbanos pelos postes. Nesta e tapa, a tensão é abaixada

para 128 V através dos ci rcui tos elétricos de baixa tensão que estão

interl igados aos transformadores. A potência de cada ci rcu i to e létrico

i rá variar de acordo com a demanda energética de cada região

específ ica que é atendida pelo ci rcui to.

No Espíri to Santo, os serviços de distribuição e comercia lização de

energia elé trica f icam a cargo da empresa Espíri to Santos Centrais

Elétricas – Escelsa (sobre a empresa falaremos de manei ra específ ica

no próximo capítulo).

A Escelsa não tem autonomia energética. Boa Parte (cerca de 70%) da

energia ut i l izada no Estado é comprada da Usina Hidroelé tri ca de

Furnas. Além de Furnas, existem no Espíri to Santo c inco Usinas

Hidroelétricas de Energ ia – UHE, e onze Pequenas Centrais

Hidroelétricas – PCH (cf . tabela 1). Destas, apenas duas UHE

(Mascarenhas e Rio Boni to) e seis PCH20 (Viçosa, Alegre, Fru tei ras,

Jucu, São Joaquim e Suíça) fornecem energia para o sistema de

transmissão da Escelsa, as outras são uti l i zadas por outras companhias

privadas, sob concessões da Agência Nacional de Energia Elétrica –

ANEEL, pelos sistemas de “Autoprodução de Energia ”, ou “Produção

Independente de Energia”, através dos quais tais companhias podem

vender a energia para terceiros através de leg islações específ i cas da

Aneel .

20 As Pequenas Centrais Hidroelétricas começaram a ser implantadas do Brasil a partir de 1998, como estratégia da ANEEL para aumentar a oferta energética no país. São voltadas ao atendimento das necessidades energéticas de pequenos centros urbanos e de zonas rurais e são caracterizadas por uma produção energética superior a 1MW e inferior, ou igual, a 30MW, não podendo a sua extensão ultrapassar a 3 Km². As resoluções da ANEEL permitem que a energia gerada pelas PCH’s entrem no sistema de transmissão e distribuição sem que o empreendedor pague as taxas pelo seu uso. Além disso, as PCH’s não pagam aos estados e municípios pelo uso dos recursos hídricos.

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42

Tabela 2: Usinas e Centrais Geradoras no ES

Usina Classificação Potência

Outorgada (kW)

Proprietário Município

Aimorés UHE 330000 49% para CEMIG Geração e Transmissão S/A - 51% para

Valesul Alumínio S/A

Aimorés, MG - Baixo Guando, ES

Alegre PCH 2056 100% para Castelo Energética S/A Alegre, ES

Viçosa (Bicame) PCH 4500 100% para Castelo Energética

S/A Conceição do Castelo, ES

Franca Amaral PCH 4500 100% para Quanta Geração S/A

Bom Jesus do Itabapoama, RJ - São José do Calçado, ES

Fruteiras PCH 8736 100% para Castelo Energética S/A

Cachoeiro do Itapemirim, ES

Jucu PCH 4840 100% para Castelo Energética S/A Domingos Martins, ES

Mascarenhas UHE 185500 100% para Energest S/A Aimorés, MG - Baixo

Guando, ES

Rio Bonito UHE 16800 100% para Castelo Energética S/A Santa Maria de Jetibá, ES

Rosal UHE 55000 100% para Rosal Energia S/A Bom Jesus do

Itabapoama, RJ - São José do Calçado, ES

Suíça UHE 31590 100% para Energest S/A Santa Leopoldina, ES

Fumaça IV PCH 4500 100% para Caparaó Energia S/A Caiana, MG - Dores do Rio Preto, ES

Calheiros PCH 19000 100% para Calheiros Energia S/A Bom Jesus do

Itabapoama, RJ - São José do Calçado, ES

São Joaquim PCH 21000 100% para São Joaquim Energia

S/A Alfedro Chaves, ES

São Simão PCH 27000 100% para São Simão Energia S/A Alegre, ES

Marechal Floriano PCH 26100 100% para Mizu S/A Domingos Martins, ES -

Marechal Floriano, ES

Pirapetinga PCH 15700 100% para Rio PCH I S/A Bom Jesus do

Itabapoama, RJ - São José do Calçado, ES

Pedra do Garrafão

PCH

16500

100% para Rio PCH I S/A

Capos dos Goytacazes,

RJ - Mimoso do Sul, ES

Lasa UTE 3200 100% para Linhares Agroindustrial S/A Linhares, ES

Alcon UTE 20600 100% para Companhia de Álcool Conceição da Barra S/A Conceição da Barra, ES

Ceisa (Ex-Disa) UTE 36000 100% para Central Energética

Itaúnas S/A Conceição da Barra, ES Le g en d a : P C H – P e q u en a C e n t r a l Hi d r o e l é t r i c a U HE – U s i n a Hi d r o e l é t r i c a d e E n er gi a

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43 U TE – U s i n a T er m el é t r i c a d e E n er gi a F o n t e : A N E E L, B a n c o d e In f or m a ç õ e s d e G e r a çã o .

Sob os impactos ambientais, a energia h idrául ica é considerada uma

fonte de energia l impa, uma vez que não l ibera grandes quantidades de

gases estufas e poluentes à atmosfera . Seus impactos estão ligados à

formação dos imensos reservatórios e, conseqüentemente, a inundação

de grandes áreas, o que gera a necessidade de transportar gran des

contingentes de populações humanas (aniquilando, mui tas vezes, seus

modelos econômicos locais) e de animais s i lvestres para outras áreas.

A formação dos reservatórios de água pode também ocasionar

al terações no regime das águas, formação de microclimas e

desequil íb rios entre as espécies, com aparecimento de vetores de

doenças endêmicas, como a malária e a esquistossomose.

3 .2 A energ ia enquanto mer cador ia

Fato importante na anál ise sobre as redes elétricas é observar dois

importantes períodos no contexto brasilei ro de estruturação das inf ra -

estruturas de energia e létrica e seus usos e , a part i r disso, os

desdobramentos que merecem maiores considerações. O primeiro

momento diz respei to às décadas de 1950, 60 e 70, no contexto de

industrialização nacional , no qual a energia elétrica era destinada,

essencialmente, à produção industrial .

O Estado se encarrega de todas as operações, poi s uma

das condições para obter f inanciamentos externos é o

fornecimento barato da elet ri cidade ao setor industr ial ,

que é um grande consumidor, ou seja, as f i rmas

mul t inacionai s e as grandes empresas do país. Assim, as

grandes indústr ias açambarcam a produção da

eletr i cidade a preços favorávei s, enquanto a população é

i nsuf ic ientemente abastecida (Santos, 2004; p. 171).

A anál ise de Santos (2004) é ainda mais importante quando ele

demonstra que, além do f inanciamento do consumo de energia elétrica

do setor industrial pelo residencial , este úl timo se torna precariamente

atendido em favor do primei ro . Os dados apresentados pelo auto r na

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44

década de 1970 mostram que enquanto 24% da produção de energia

elétrica no Brasil era destinada às indústrias, 26% da população no país

não tinha acesso a este bem. Hoje ainda, especif icamente no caso do

Espíri to Santo, a prio ridade dada ao consumo energético industrial é

patente. Embora o volume de MwH de energia elétrica vendida para o

setor industrial seja inferior às vendas para o setor residencial , é no

setor residencial , que paga-se energ ia elé trica mais cara em 48% que o

setor industrial , f inanciando, portanto, o desenvo lvimento deste úl t imo

(cf . tabela 2).

Tabela 2 : volume e recei ta da energia e létr ica vendida pela Escel sa em 2006.

Fornecimento Volume de Energia

Vendida em 2006 (MwH)

Receita Operacional (R$

mil) kWh em real*

Indust ri al 1.041.063 221.042 0,212

Residencial 1.372.831 431.222 0,314

Total 2.413.994 652.264 - * Inc lu i P IS /PASEP, COFINS e ICMS Fonte: Re la tór io Adm in is t rat ivo Esce lsa, ano 2006, d isponíve l em: HTTP: / /www.escelsa. com.br /energia/ ivest idore/ re lat or ios_adm in ist ratacao.asp

O segundo momento a ser destacado se dá a part i r de meados da

década de 1990 até os dias de hoje , com as pol í t icas de priva tizações

do setor energético. Ressa l tamos este período devido às impl icações

geradas a part i r dele, uma vez que a energia elétrica deixa de ser

apenas substrato inf raestru tural para o circu i to superior, passando a ser

em si parte consti tuinte dele: uma mercadoria produzida pelos grandes

conglomerados monopol íst icos internaciona is. A Espíri to Santo Centrais

Elétricas (Escelsa S/A), empresa concessionária de energia elétrica no

Espíri to Santo , é gerida pela Holding Energ ias do Brasil , que controla

companhias nos setores de geração, d istribuição e comercialização de

energia elétrica nos estados do Ceará, Espíri to Santo , São Paulo,

Tocantins e Mato Grosso do Sul . O grupo Energias do Brasil , por sua

vez, tem como sócio -majori tá rio (62,4% das ações) o grupo Energias de

Portugal . Este é um dos maiores do ramo energéti co na Europa. Tem

forte presença em vários países da América Latina, nos Estados

Unidos, Espanha, Portugal , França, Bélgica e China. (Conforme si te da

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45

Energias do Brasil .

http:/ /www.energiasdobrasil .com.br/energia/index.asp. Ul t imo acesso

em 08/2008).

A pol ít ica de privat izações das companhias elétricas no Brasi l,

demonstrat iva da nova e tapa de modernização e desenvolv imento

neol iberal pela qual passaram as nações “subdesenvolv idas”, se deu

com a ausência de qualquer marco regu latório que previsse pol í ti cas

sociais de venda de energia elétrica 21. Como bem destaca Bermann

(2003):

O primei ro l ei lão para venda de uma empresa de

distr ibui ção de eletr ic idade – a Escelsa – ocorreu em 11

de julho de 1995, enquanto que o órgão regulador do

setor elétr ico – Agência Nacional de Energia Elétri ca

(ANEEL) – foi cr iado apenas em 06 de outubro de 1997,

através do decreto 2.335. Até a cr iação da agência de

regulamentação, quatro empresas de dis tr ibuição de

eletr i cidade j á haviam sido t ransfer idas para a inic iat i va

pr ivada. (p. 45).

Na verdade, a despei to do discurso que pregava a maior ef iciência na

maquina pública ao transferi r empresas “não-rentáveis” para a inicia tiva

privada, o que houve foi a completa aniquilação do poder decisório do

Estado em relação ao planejamento de um recurso que, mais do que

substrato inf ra-estrutura l para a industrialização moderna, ou

mercadoria a ser consumida de acordo com padrões impostos por atores

dominantes, é “uma necessidade da sociedade moderna, já que seus

serv iços são agora considerados tão básicos como a inf ra -estrutura de

provisão de água, saneamento, transportes, saúde pública, etc.”

(Jannuzzi & Swisher, 1997; p. 12).

Do ponto de v ista da sustentabi l idade energética é fundamental que a

produção e a distribuição de energia na escala nacional este jam

ancoradas no chamado Planejamento In tegrado de Recursos

Energéticos – PIR. De maneira s impl i sta, o PIR poderia ser def inido

pelo uso de pol ít icas e tecnologias a f im de promover usos ef icientes de

energia, isto é: quantidades cada vez menores de energ ia para um

21É preciso aqui fazer um contraponto. De fato, grande parte da produção hidroelétrica do Brasil ainda é estatal, através das grandes hidroelétricas tais como Furnas, Tucuruí e Itaipú .

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46

determinado uso f ina l , sem que seja a l terada a sua ef ic iência. A

priva tização das companhias de energia elétrica veio a aniqui lar as

possibil idades reais de haver um PIR realmente ef icaz no Brasi l , isso

por basicamente duas razões. A primeira se exp lica pela

“desvertical ização” das empresas. Agora, diferentemente da

organização “pré-priva tizações”, as companhias de energia elétrica não

atuam con juntamente no plano da produção, distribuição e fornecimento

de energia elétrica, o que causa a d if iculdade de art iculação entre as

empresas no sentido de promover investimentos padronizados de

maneira conjunta a f im de alcançar tecnologias ef icientes de usos

f inais. Como Bermann (2003) bem constata :

Algumas empresas do setor elétr ico brasi le i ro já estavam

incorporando alguns instrumentos do Planejamento

Integrado de Recursos Energét icos (PIR) quando o

processo de pr i vat ização prat icamente desart iculou as

possib i l idades desse t ipo de in ici at ivas (p. 51)

A segunda razão se dá simplesmente pela ót ica mercanti l ista sobre a

energia elétrica, através da qual as empresas não se sentem motivadas

a adotar investimentos – mui tas vezes al tos – em projetos ef icazes de

ef iciência energética , que v i riam a reduzi r o consumo to tal de

eletric idade e, conseqüentemente, suas fat ias de lucro, ainda que tal

pol ít ica poderia trazer a democratização do uso da energia elétrica , uma

vez que ela tenderia , a longo prazo, a se estender para a parcela da

população que hoje consome energia elétrica de maneira l imi tada e

compensaria, assim, a redução do consumo pelos programas de

ef iciência.

Atualmente o que existe em matéria de PIR no Brasi l são programas

tímidos e com pouca efetiv idade. A resolução número 242 da Aneel , de

24 de julho de 1998, obriga que 1% da rece i ta operacional anual das

empresas de distribuição de energia elé trica sejam destinadas a

programas de ef i ciência energética . No caso da Escelsa pudemos

constatar que o programa adotado pela empresa se resume à troca de

geladeiras e lâmpadas em alguns domicí l ios peri fé ricos, quase que

majori tariamente no município de Cariacica (ver entrevista 2 – anexo 3),

o que é ut i l izado pela empresa como marketing social . Bermann também

percebe essa s i tuação de maneira mais ampla ao af i rmar que: “mui tos

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47

desses programas não passam de simples pro jetos de substi tuição de

lâmpadas com preços sobrevalorizados, no in tui to de alcançar ou se

aproximar facilmente dos valores correspondentes a 1%” (2003; p . 51).

Januzzi e Swisher (1997), que d iscutem amplamente a questão do PIR,

trazem contribuições interessantes no tocante à ót ica mercanti l ista

sobre a energia elétrica pelas empresas elétricas e a pol í tica de

planejamento energético baseada quase que exclusivamente nesses

fatores.

Esse t ipo de vi são é o dominante naquelas empresas de

energia que somente consideram as vendas de kWh (. . . )

como fontes de recei tas. No caso do setor e létr ico essa é

a f i losof ia que tem inf luenciado as in ici ativas da

expansão da oferta e est ímulos ao aumento do mercado

e do consumo (Jannuzzi & Swisher, 1997; p. 11).

A v isão da energia enquanto mercadoria, claro, passa a fazer parte do

cenário brasi lei ro a part i r das privatizações, momento em que as

empresas de energia se integram mais completamente como sociedades

com in teresses lucra tivos. A eletric idade passa, assim, a se consti tu i r

enquanto mercadoria, parte do ci rcui to superior, tendo as mesmas

contradições enquanto um produto a ser consumido por todos, mas, ao

mesmo tempo, não totalmente acessível . Sendo d isposta de acordo com

um padrão de consumo imposto pelo circui to superior, consumida no

ci rcui to inferio r de maneira desigual , em função da d isponibil idade

monetária para os consumos de base necessários e, no limi te, usada

por meio do acesso ilegal , como será ana lisado no sub -capítulo 4 .3. A

prioridade dada ao lucro pelas companhias de energia elétrica, enf im,

talvez se ja a causa da precariedade dos equipamentos nos bairros

periféricos, como é demonstrado no es tudo de caso no sub-capítulo 4.2,

uma vez que os Programas Integrados de Recursos Energéticos – PIR,

não fazem parte das inicia tivas de p lanejamento e expansão da oferta

de energia a f im de democrat izar o seu uso pe las camadas mais pobres,

como já foi di to.

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48

4. Os acessos à energia e létrica e seus usos diferenciados no circuito inferior: o caso do Alto Bairro da Penha

4.1 O Bairro da Penha: uma breve apresentação

O Bairro da Penha está local izado na porção centro -leste, de ocupação

mais recente, da parte insular do município de Vi tória, capi tal do

Espíri to Santo (cf.f igura 1). Está em um morro no entorno do qual

passam importantes eixos viários não só do município de Vi tória, mas

da Região Metropol i tana como um todo: as Avenidas Lei tão da Si lva e

Marechal Campos e conta com uma população de 4.410 habi tantes.

Contudo, é importante f r isar que a e tapa empírica da pesquisa se

desenvo lveu na parte al ta do bairro, onde a população alcança

aproximadamente um terço desse total .

Figura 1: Local ização do Bairro da Penha

O fato é que existe terri torial izações dist intas entre os moradores do

bairro que o divide entre Bairro da Penha e Al to Bairro da Penha,

contando inclusive com duas diferentes associações de moradores. Elas

ref letem os dois momentos diferentes de ocupação do bairro. O primeiro

nas décadas de 1940 e 50, ocupação da baixada, e o segundo nas

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décadas de 70 e 80, ocupação do que ho je é o Al to Bairro da Penha,

através de “invasões”22 por populações de baixíssimo poder aquisi tivo

que se sujei tavam a condições de habi tação extremamente precárias e

sem qualquer inf ra-estrutura . Os processos de “invasão” que marcaram

a ocupação do Al to Bairro da Penha promoveram uma organização

espacial diferenciada e que torna a paisagem perceptivelmente

diferente em relação à Baixada. As casas são de menor qual idade e não

existem vias que permitam o acesso de carros, mas somente becos.

Estes são em números de 11 e estão dispostos de forma difusa,

chegando até a cota l imítrofe habi tada do morro . Ao observarmos que

esta “terri toria lização” tem repercussões diretas nas inf ra-estru turas de

energia elétrica dispostas no terri tório (menor qual idade da rede e maior

uso de “gambiarras”23), bem como em relação ao uso paralelo de

energia (maior quantidade de desv ios) percebemos que seria mais

viável concentrar nossos esforços nas aná lises das inf ra -estruturas das

redes elétricas no Al to Bairro da Penha.

22 Segundo Davis (2006; p. 47): “Invadir, claro, é se apossar da terra sem compra nem título de propriedade. A terra periférica sem custo tem sido muito discutida como o segredo mágico do urbanismo do terceiro mundo: um imenso subsídio não planejado aos paupérrimos. No entanto, é rara a invasão não ter algum custo prévio. O mais comum é que os invasores sejam coagidos a pagar propinas consideráveis a políticos, bandidos, ou policiais para ter acesso aos terrenos e podem continuar pagando esses ‘aluguéis’ em dinheiro e/ou votos durante anos. Além disso, há o custo punitivo de um local sem serviços públicos e longe do centro urbano”. 23 Falando de “gambiarras” fazemos menção à própria maneira diferenciada de fazer usos dos equipamentos no circuito inferior. Sem o aparato técnico necessário, como projetos elaborados por engenheiros especializados em elétrica, tais populações dispõem de maneiras criativas para equipar suas casas com os circuitos elétricos, a partir de conhecimentos adquiridos com a prática, o que, via de regra, acaba ocasionando a precariedade das instalações elétricas. Diz respeito, também, aos concertos realizados na própria rede pública pelos moradores, devido à precariedade dos serviços de manutenção destes equipamentos no bairro. Esses usos diferenciados, improvisados, ao qual chamam-se de gambiarras, acabam por contribuir na visível diferenciação das redes e dos circuitos elétricos nos bairros periféricos, quando comparados com bairros mais elitizados.

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Fotograf ia 1 : Rua pr inc ipa l na par te ba ixa do B air ro da Penha

Fotograf ia 2 : Beco no Alto B air ro da Penha.

É verdade que o ci rcui to inferior não se resume às at ividades produtivas

e ao consumo. A aná lise de Santos (2004; p. 199) ao caracterizar o

ci rcui to inferior a part i r do reaprovei tamento, seja de roupas, materiais

para a construção civi l , motores e peças de carros antigos, etc., mostra

que a anál ise do ci rcui to inferior é complexa, na medida em que não i rá

se resumir aos aspectos da produção, da venda e do consumo, mas às

próprias formas de uso dos objetos. O presente traba lho também

concorda com esta realidade ao buscar caracterizar o ci rcui to inferio r a

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part i r dos hábi tos diferenciados no uso de energia elétrica , mas ao

mesmo tempo, mostrando as re lações mercantis desse consumo e as

formas de dominação que estão inscri tas neste processo, além das

formas como tais relações contradi tórias são cristalizadas na morfologia

espacial . Contudo, uma maneira que encontramos de dimensionar a

importância do ci rcui to inferior na área de estudo foi mensurar as

ocupações de trabalho. Nos resul tados dos questionários aplicados,

pudemos perceber a importância do ci rcui to inferior como fornecedor de

postos de trabalho (cf . gráf ico 1). Observamos assim, os baixos níveis

de renda entre os entrevistados, com 100% das famíl ias com renda

inferior a 3 salários mínimos (R$ 380,00 no período de apl icação dos

questionários) (cf . tabela 2). A Taxa de desemprego foi de 21%.

Tabela 3: Renda e desemprego dos entrevistados no Alto Bairro da Penha.

Renda Domiciliar: até 3 SM (380 Reais) em %

Desempregados (%)

Trabalham sem carteira assinada (%)

Bairro da Penha (21 entrevistados) 100 21 ND

Gráfico 1: Profissão dos entrevistados.

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4.2 A estrutura física da rede no Alto Bairro da Penha

O Bairro da Penha é em um caso de f ragmentação sócio-espacia l dentre

mui tos outros existentes no municíp io de Vi tória . Ainda que (para o ano

de 2000 como referência), segundo a Prefeitura Munic ipal de Vi tória , a

extensão terri torial das favelas no município equivalesse a somente

6,5% da área do município – fato que poderia trazer a impressão de que

Vi tória não seja tão f ragmentada –, a população total dessas favelas

representava 28,87% tota l do município (Terra Mais Igual , 2004; p. 2 ),

demonstrando, assim, a grande densidade demográfica existente nestas

fave las24.

Ainda que haja um padrão de verticalização das habi tações se

processando nas favelas de V i tória, é óbvio o fato de não ser

comparável às vertical izações apresentadas na c idade legal . Este fato

nos faz conclu i r que estas al tas densidades populacionais estão

relacionadas à superlotação das unidades habi tacionais. Além dos

graves malef íc ios à saúde física , mental e social que esta al ta

densidade populacional trás à população (ver Acioly & Davidson, 1998;

pp. 32 – 33), tais fenômenos de superocupação das habi tações e

conseqüente crescimento da densidade populaciona l estão in timamente

l igados à qualidade das redes técnicas inf ra -estruturais.

( . . . )assentamentos humanos de al ta densidade podem

também sobrecarregar e mesmo causar uma saturação

das redes de inf ra-estrutura e serviços urbanos,

colocando até uma maior pressão de demanda sobre o

solo urbano, terrenos e espaço habi tacional , o que

conseqüentemente produzi rá um meio ambiente

superpopuloso e inadequado ao desenvol vimento humano

(Acio ly & Davidson, 1998; pp. 16-17).

Nossas ativ idades em campo no Alto Bairro da Penha nos permit i ram

observar um padrão de baixa qualidade das habi tações, mui tas delas

fei tas de madeira, com pouco espaço interno, outras mal constru ídas,

estando com muros de lajotas expostos na parte externa das

construções.

24 Tais afirmações, que foram retiradas de documentos da Prefeitura de Vitória, são questionáveis, uma vez que nunca existiu no município um estudo rigoroso classificando quais seriam as favelas e a porção ocupada por elas no município.

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Fotograf ia 3 : casa de madeira no Alto B a ir ro da Penha.

Pudemos observar também através da aplicação dos questionários que

existe também um padrão de elevada ocupação destas habitações, v isto

que 45,45% delas possuem entre 4 e 6 habi tantes e 27,73% mais de 7

habi tantes (cf . gráf ico 2), ou seja, 73,18% das moradias têm mais de

quatro habi tantes. Gostaríamos de f ri sar que tal padrão representa uma

elevada densidade de ocupação devido ao pouco espaço interno das

habi tações no Al to Bairro da Penha.

Gráf ico 2 : moradores por dom ic í l io no A lto Ba ir ro da Penha .

A al ta densidade de ocupação das moradias, al iada à baixa qual idade

das instalações elé t ricas tendem a proporcionar uma menor qualidade

da energia ut i l izada e, ao mesmo tempo, um maior consumo. Isso

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porque as perdas energéticas se tornam maiores quando a instalação

dos ci rcui tos elétricos nos domicí l ios não é fei ta da forma correta.

Soma-se a isso o fato que os ele trodomésticos antigos, bem como as

lâmpadas incandescentes, que são maioria nas referidas habi tações,

produzem um consumo maior de energia elétrica (cf . gráf ico 3).

Gráf ico 3 : núm ero de lâm padas incand escentes por dom ic í l io .

A baixa qual idade das redes elétricas, contudo, não se resume às

instalações residenciais. A terri to rialização das redes elé tri cas no Al to

Bairro da Penha se dá de maneira extremamente precária, mui to embora

um empregado de al to escalão na empresa Escelsa, tenha nos d ito que

a “Escelsa alcança de maneira iguali tária os seus ma is de 1 mi lhão de

cl ientes e o índice de satisfação da empresa é excelente ”.

A f rase de uma moradora entrevistada i lustra bem a percepção dos

moradores quanto aos serviços prestados pela Escelsa no Bairro: “É

uma empresa que presta um serviço que faz parta do dia -a-d ia (. . .) Ela

cede a energia e quer receber, não quer saber da realidade do cliente” .

As constatações a part i r das nossas observações são desanimadoras.

Todos os postes presentes no Al to Ba irro da Penha são de madeira,

mui tos deles estão podres e tortos. Mui tos becos não têm i luminação, o

que causa insegurança nos moradores destes becos. Os cabos aéreos

são mal est icados, dev ido a isso, com f reqüência quando há chuvas ou

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ventos fortes, ocorrem cortes no f luxo de energia. Por este motivo

existe no bai rro um costume de desligar os aparelhos eletrodomésticos

e desconectá-los das tomadas sempre que o tempo aparenta ameaçar

sintomas de chuvas fortes. Outro fato a ser destacado é o número

extremamente baixo de transformadores no bairro e que não atende de

forma ef i ciente a demanda energética requerida no bairro . Um morador

reclama desta realidade:

Neste beco aqui não há um transformador. Aqui não há

mui tos gatos e por i sso deveri a haver um tratamento

mais igual i tár io. Deveria haver um maior invest imento na

questão técnica, pois a demanda tem crescido.

A moradora mencionada anteriormente, quando indagada se achava o

seu bairro desfavorecido em relação a outros na questão re lat iva ao

fornecimento de energia elétrica, respondeu:

Com certeza. Em mui tas coisas. Curtos ci rcui tos

f reqüentes, f ios caídos [mal est icados] , postes e

equipamentos desmantelados. . .

Fotograf ia 4: poste no meio do beco, d if ic ultando a passagem e possíve is re formas

para m elhor ia da escadar ia no Alto Ba ir ro da Penha.

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Fotograf ia 5: da base podre de um poste de made ira no Alto Ba ir ro da Penha.

Fotograf ia 6: Emaranhado de f ios ext rem am ente m al est icados no Alto Ba ir ro da

Penha.

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Fotograf ia 7: beco sem nenhum poste e sem i luminação púb lica no Ba ir ro da Penha.

Como foi di to no sub-capítulo 3.2, a “mercantil ização” da energia pelo

ci rcui to superior após os processos de privatizações das companhias

elétricas tende a manter e agravar cada vez mais o descaso para com o

uso energético pelas populações periféricas, uma vez que não está na

agenda das empresas o investimento em tecnologias para uma maior

ef iciência energética , juntamente com mudanças nos hábi tos de

consumo da população como um todo e também nos padrões de

desenvo lvimento econômico, uma vez que o modelo de industrialização

adotado no Espírito Santo é um exemplo claro de in-sustentabil i dade,

dev ido às suas prioridades vol tadas às indústrias que consomem mais

energia, tais como as siderúrgicas e as ce lulósicas (ainda que haja a

exceção da Companhia Mital Arcelor, a qual produz sua própria energia

e, inclusive, vende o excedente à Escelsa) , que v isam quase que

exclusivamente o mercado externo.

Dentro do setor industr i al podemos destacar algumas

at ividades caracter i zadas como energo- intensi vas, isto é,

at ividades que consomem mui ta energia. São elas:

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siderurgia, responsável por 8% de toda energia

consumida, a lumínio (4,3%), papel e celu lose (3,5%).

(Bermann, 2003; p. 38).

Assim, a prioridade dada ao ci rcui to superior, seja pelo consumo

energético industrial , seja pelo seu uso residencial nas classes médias

e altas, se material iza no descaso para com a estru tura f ísica das redes

elétricas nos bairros periféricos, como é no Al to Bairro da Penha . Como

di to no sub-capítulo 2.2, a anál ise da f ragmentação a part i r das redes

necessita ser fe i ta de manei ra dupla. A primeira é esta que

demonstramos no presente sub-capítulo, a qual buscou demonstrar o

viés f ísico-terri torial das redes e sua composição seletiva , desigual ,

dando forma à f ragmentação sócio -espacial . A outra análise, que é

aquela que diz respe i to às relações existentes entre as classes na

cidade, conformando a fragmentação enquanto processo de dominação

econômica, social , pol í tica e ideológica, é a que será discutida mais

abaixo.

4.3 Os acessos e usos diferenciados

Canaes (2006) apresenta uma diferenciação entre as chamadas perdas

técn icas e as perdas comerciais. As perdas técnicas se referem àquelas

que são devidas ao efei to Joule e as perdas magnéticas nos processos

de geração e distribuição de energia. Quando ele fala das perdas

comercia is, se refere à inadimplência e ao “gato” nas suas múlt iplas

formas. Em relação às perdas no Brasi l ele af i rma que elas são da

ordem de 15% do total da energ ia requerida, contudo apenas 32% desta

fat ia é o que equivale às perdas comerciais (p. 4).

O “gato ” é um termo popular que é usual para se referi r ao “consumo”

de energia e létrica através de desvios do f luxo de energia para o uso

part icular i legal . A prática do “gato”, contudo, é de certa forma

complexa, está sujei ta a diversos fatores. Entrar no mecanismo de

desvio de energia elétrica faz parte de um processo que começa na

inad implência repetida do usuário que não dispõe de meios para pagar

as contas, o que leva a empresa a cortar o fornecimento de energia. As

famíl ias não podem se passar da energia, do conforto que ela propicia,

e, assim, começam a desviá -la para o uso cot idiano.

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Segundo o Gerente de Combate às Perdas Energéticas da Escelsa,

entrev istado no f im de 2007, há três formas de se pra ticar o “gato”. A

primeira é aquela em que o “gato” é fei to através de ligação direta na

rede. Neste caso, a pessoa coloca do is f ios pendurados nos cabos

aéreos dos postes, os qua is são ligados diretamente à residência. A

segunda forma é aquela que se dá quando as pessoas rompem o lacre

da caixa do medidor e fazem desvio de energia dentro da caixa de

medidor. A tercei ra é quando as pessoas desmontam o medidor e fazem

um art i f ício dentro dele, de modo que a contagem do consumo se dá de

forma inversa, ou seja , a medição da eletric idade uti l izada passa a

rodar ao contrário, mascarando, assim, a u t i l ização real da eletricidade

em determinada residência.

A Gerência de Combate às Perdas da Escelsa é o setor específ i co para

o “combate” aos “gatos”. O gerente deste setor nos af i rmou que a ação

contra os gatos tem sido ef iciente e que ela se dá de três formas: a

primeira é f iscalizar todos os medidores, principalmente em bairros

periféricos. Onde a população tem baixo poder aquisi t ivo , a f iscal ização

é mais intensa, o que já revela um preconcei to e um controle social

just if icado das c lasses pobres. Assim, quando os medidores têm por

vários meses consecutivos o consumo equivalente a zero, a residência

é autuada.

A outra forma de combate aos “gatos”, e que é pra ticada, também,

sobretudo nos bairros perifé ri cos, é trocar as redes. Reti ram-se as

redes onde os cabos são “nus” e se colocam cabos encapados isolados

a f im de dif icul tar aquela forma de “gato” que se dá colocando f ios

di retamente nos cabos aéreos dos postes. Além disso, existe uma

tercei ra forma que é reti rar os medidores das residências e colocar

medidores eletrônicos di retamente nos postes.

Em geral , ainda segundo o gerente entrevistado, os furtos de

eletric idade têm diminuído substancialmente nos bairros periféricos. O

Bairro da Penha, contudo, possui certas part icularidades terri toriai s que

inf luem decisivamente na questão do “gato” e no seu combate. O

mesmo gerente nos af i rmou que no Bairro da Penha é dif íci l se fazer o

uso de práti cas para o combate aos gatos devido à sua topologia e à

sua configuração terri to rial , ou seja, por ser um morro com ausência de

ruas nas cotas mais al tas, existem al i somente becos, é impossível

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circular pelo bairro de carro. Este fa to, al iado à dominação do terri tório

por traf icantes compromete a ação da Escelsa para combate ao “gato”.

O gerente ainda nos disse que a Esce lsa possu i uma boa relação com o

Grupo de Apoio Operacional – GAO, batalhão da Pol ícia Mi l itar, e que

se necessário for qualquer ação, eles estão à disposição da empresa.

Contudo, tais ações “são evi tadas para preservar a imagem da empresa

perante a população” .

De fato, o “gato” é uma real idade bem presente no Al to Bairro da

Penha. É dif íci l mensurar com precisão quais os domicíl ios que al i

fazem uso do “gato”.

Ao questionarmos os moradores sobre a opin ião deles quanto ao “gato ”

ser uma al ternativa para a economia na conta de energia, poucos foram

os que responderam de maneira af i rmativa (27,28% dos entrevistados),

o que, em alguns casos pode realmente representar as convicções e

ações de alguns moradores, entretanto, em sua maioria nós pudemos

conclui r que as respostas negativas a esta pergunta representam o

receio por parte dos moradores em dizer o que realmente pensam e

prat icam a respei to do “gato ” . Nós podemos af i rmar isto com convicção

baseados em certos motivos, tais como: a resposta a estas perguntas

era, na maioria das vezes, acompanhada de risos (mesmo que fosse

uma resposta negativa), ou dadas de maneira i rônica, tal como: “aqui

quando tem gato a gente come com farofa e cerveja”, ou ainda,

respostas do t ipo : “esse assunto aqui no morro é bico ca lado”.

Além disso, uti l izamos uma metodologia para auferi r o valor pago na

conta de energia com o número de aparelhos eletrodomésticos que cada

domicíl io possui, através da tabela 4, e levando em consideração o fato

que analisaremos mais adiante , onde prat icamente nenhum morador

possui subvenção em suas contas de energia. Ou seja , com as

perguntas número 13 e 14 do questionário ap licado (ver anexo 2),

pudemos auferi r uma média de domicíl ios que estariam lançando mão

do uso do “gato”, a part i r da discrepância entre o valor d i to o e o valor

que deveria ser pago. Eis a lguns exemplos:

No segundo questionário aplicado ao dia 09-03-2008, o morador af i rmou

pagar R$ 29,00 por mês, sem fazer uso do benef ício de tari fação baixa

renda. Este mesmo morador, af i rmou possuir 1 geladeira, 1 ferro

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elétrico, 1 tanquinho, 1 TV 14 po legadas, 3 lâmpadas f luorescentes, 1

lâmpada incandescente, 1 ventilador e 1 rádio, o que equivaleria a um

consumo médio mensal de 200 kW h, que representaria uma conta no

valor de R$ 80,00.

Outro exemplo pôde ser v isto no sexto questionário desse mesmo dia,

no qual o morador declarou pagar entre R$ 25,00 e R$ 30,00. Nesta

casa hav ia 1 ge ladei ra , 1 ferro elétrico, 1 chuvei ro elétrico , 1 tanquinho,

1 TV 14 polegadas, 6 TVs 20 polegadas, 5 lâmpadas incandescentes 1

aparelho de DVD, 1 rádio e dois venti ladores. Tal consumo representa

uma média de 280 a 300 kWh, ou seja , um valor mensal de ma is de R$

100,00.

Com tal metodologia, pudemos auferi r que mais de 60% dos domicíl ios

entrev istados estariam lançando mão do desvio de energia.

Tabela 4: Tabela de Consumo dos Aparelhos

Tipo do Aparelho

Potência média (Watts)

Dias de uso por mês

Tempo médio de uso (dia)

Consumo médio mensal (kWh)

Geladeira de uma porta 200 30 10h* 60

Freezer 400 30 10h* 120 Chuveiro 3500 30 40min** 70 Forno a

Resistência 1500 30 1h 45

Ventilador 100 30 8h 24 Lâmpada 100 30 5h 15

TV em cores de 20 polegadas 90 30 5h 13.5

TV em cores de 14 polegadas 60 30 5h 9

TV em preto e branco 40 30 5h 6

Forno de Microondas 1300 30 20min 13

Lavadora de roupa 1500 12 2h 9

Aparelho de som 20 30 4h 2.4 Computador com

impressora e estabilizador

250 30 3h 22.5

Bomba d'água 300 30 30min 4.5

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62 *O tempo médio de utilização para geladeira e freezer refere-se ao período em que o compressor fica ligado para manter o interior do aparelho na temperatura desejada. ** Considerados cinco banhos de oito minutos cada.

Fonte: http://www.escelsa.com.br/energia/utilidades/dicas_uso_racional/dicas_uso_racional.asp, acesso em: 16 de março de 2009.

Mas não foi o nosso objet ivo produzi r cá lculos estatísticos a parti r de

uma amostra conf iável da população em nossa região de estudo. Ainda

que estejamos a demonstrar alguns dados percentuais a part i r dos

questionários apl icados, tai s questionários foram produzidos de forma

qual i tativa e se deram em conjunto com outras ativ idades, tais como a

anál ise e percepção crít ica do terri tório estudado e entrevistas com

alguns grupos de moradores reun idos. Assim, torna -se impossível para

nós, objet ivarmos com precisão o número de “gatos” no bairro e a

quantidade de energia furtada nele (dado que a Escelsa se recusou a

nos fornecer). A part i r da metodologia apl icada e especialmente através

de uma pergunta que indagava o morador se ele já teria v isto “gatos” no

bairro, pudemos entender que o fenômeno no Al to Bairro da Penha se

material iza no terri tório como um todo. Contudo, ele aumenta de forma

substancial na medida em que são elevadas as cotas al t imétricas, como

nos mostrou, entre outros, os relatos desses dois moradores:

Já vi e já f iz mui tos gatos por aqui .

Por aqui não há gatos, mas aí pra cima há mui tos gatos.

Eu acho que aí pra cima ninguém paga luz, todo mundo

tem gato. A Escel sa já desi st iu de fazer algo, porque

eles t i ram os gatos e no outro dia os moradores já o

fazem de novo.

As anál ises rea lizadas nos f izeram conclui r que o descaso para com a

energia elétrica nos bairros perifé ri cos não se dá somente em rel ação

ao desmantelamento dos equipamentos das redes, mas, sobretudo em

relação à dif iculdade do acesso à energ ia de maneira legal pelos mais

pobres. Isso ocorre primeiramente porque o “consumo” energético das

habi tações mais precárias nas favelas podem ser, de maneira geral ,

maiores do que aqueles de residências dos bairros das classes médias.

Tal fato é dev ido à baixa qual idade das instalações elétricas nessas

moradias, al iadas ao al to consumo dos aparelhos antigos, que não têm

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a mesma ef ic iência energética que os aparelhos mais novos. Bermann

(2003) af i rma que:

A disseminação de uma geladei ra mais ef ici ente pode

representar uma economia no consumo de energia que

pode chegar a mais de 60% (. . . ) a subst i tu ição das

l âmpadas incandescentes pelas lâmpadas f luorescentes

compactas ( . . . ) reduzem o consumo em cerca de 75%.

Um empregado da Esce lsa nos disse que o consumo real dos bairros

periféricos é maior que nos bairros centrais, devido à baixa qualidade

dos aparelhos eletrodomésticos, que consomem mais energia que os

aparelhos novos, os quais têm tecnologias mais avançadas de usos

f inais e estão de acordo com os programas de ef iciência energética.

Como exemplo, o entrevistado ci tou que uma geladeira antiga pode

chegar a consumir 150 kWh, o que representa o consumo médio de uma

residência em um bairro residencial de c lasse média, tal como Jardim

Camburi , em Vi tória . Em contrapartida, uma ge ladei ra nova pode chegar

a consumir cerca de 20 kWh, af i rmação que nos parece um pouco

exagerada, uma vez que não encontramos registros de geladeiras com

tal ef iciência (vide tabe la 4).

Como podemos observar as residências têm muitas lâmpadas

incandescentes, mais bara tas no comércio que as f luorescentes, mas

que consomem muito mais energia (cf . g rá f ico 3 ).

Outro fator que dif icu lta o acesso legal dos mais pobres à energia são

as tarifas praticadas. Assim, o valor médio cobrado de todos os

usuários de energia elétrica de acordo com a média constatada nas

contas mensais de diferentes bairros da Grande Vi tória é de R$ 0,26 por

kWh, se acrescentamos os impostos (PIS/PASEP, COFINS e ICMS)

chega-se a um valor de R$ 0 ,41 por kWh (cf . Tabe la 5). Tal tarifação,

caso o usuário faça uso de eletrodomésticos como uma geladeira, um

chuveiro elé tri co, um televisor, um ferro elétrico e três lâmpadas

incandescentes, pode chegar a 148 kWh por mês. O volume consumido

foi est imado a part i r de uma tabela di fundida pela PROCEL (Programa

Nacional de Conservação de Energia Elétrica) da Elétrobrás (2008).

Assim, o valor da fatura mensal pode se elevar à R$ 60,68 (R$ 0,41 x

148 kWh). No Al to Bairro da Penha, constatamos que a renda da

maioria dos entrevistados se s itua entre dois e três salários mínimos

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(considerando o salário mínimo da época das entrevistas de R$380,00).

A conta de ele tricidade representaria entre 5% e 8% da renda da

maioria das famíl ias, o que, há de se conv ir, é um valor signif icativo

quando comparado ao insignif icante percentual que representaria o

consumo de eletricidade sobre a renda de uma família de classe média.

Tabela 5: Valores de venda de energia para o setor residencial por kWh em Vitória em

2007/2008. Médias das Contas de energia da Escelsa Sem taxas e impostos R$ 0.261

Valores permitidos pela ANEEL* R$ 0.2816

Valores das contas de energia da Escelsa com taxas e impostos R$ 0.413

*Valor referente a tarifa homologada pela ANEEL em vigência de 08/08/2007 a 06/08/2008. Fonte: ANEEL e média de contas de energia elétrica residencial da cidade de Vitória.

Esses valores podem ser comparados, a t i tulo de exemplo , se as fontes

do Jornal Brasi l de Fato estiverem corretas, àqueles pagos por grandes

empresas da região Norte do Brasil , “(. . .)Com a renovação dos

contra tos a Alcoa e a Vale pagarão, respectivamente, R$0,04 e R$0,03

pelo Kw, até 2024...” (Jorna l Brasi l de Fato , Jun. 2008) . Ou seja, as

empresas ci tadas pagarão 10 vezes menos que a tarifa residencial ,

incluindo taxas e impostos, pagas em Vi tória.

É bem verdade que a Esce lsa, de acordo com as d isposições legais da

Agência Nacional de Energia Elétrica – ANEEL, possui um sistema de

tarifação di ferenciado para os usuários que se enquadram dentro da

classe “Baixa Renda”, o que lhes garantir ia um desconto entre 2 ,82% e

66,35%, sobre o consumo (conforme demonstra a tabela 6 ).

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Tabela 6 : Tabela para desconto na tar ifação “Baixa Renda”

Descontos na Fatura de Energia Elétr ica

Até 30 kWh 66 ,35 %De 31 a 80 kWh 42 ,04 %De 81 a 100 kWh 41 ,70 %De 101 a 180 kWh 12 ,54 %Acima de 180 kWh 2 ,82 %

Fonte: ht tp: / /www.escelsa.com. br/energia/ut i l i dades/ programa_ baixa_renda/ programa_ baixa_renda. asp

Para que os usuários se enquadrem nesta tarifação diferenciada

existem dois cri té rios. O primeiro é que todos devem ter uma média

anual de consumo inferior a 79 kWh, incluindo o consumo do mês em

que estiver sendo faturado e, também, que não possua um mês com

consumo superior a 120 kWh. Neste caso, os usuários estariam

automaticamente enquadrados na unidade consumidora “Ba ixa Renda”.

É importante sal ientar que o uso de uma geladeira de uma porta, uma

televisão em cores de 14 polegadas, um chuveiro elétrico e uma

lâmpada incandescente equiva lem, em média, a um consumo mensal de

118 kWh, portanto superior à média máxima de consumo para ter

desconto “Ba ixa Renda”. Se aliarmos este fato à outra realidade já

discutida e que nos mostra que geralmente os consumidores “Baixa

Renda” possuem eletrodomésticos antigos que consomem muito mais

energia e também eletrodomésticos novos e numerosos, chegaremos à

conclusão que a inclusão dos usuários pobres no programa “Baixa

Renda” não é possível .

O segundo cri té rio para inclusão dos usuários neste sistema de

tarifação “Baixa Renda” é que, caso eles não se enquadrem no primeiro

cri tério, devem possuir um consumo médio mensal , no período de 12

meses, entre 80 e 220 kWh e comprovar estar inscri to no

Cadastramento Único de Programas Sociais do Governo Federal . Mas

para tal as pessoas teriam que conhecer o programa “Baixa Renda” e

fazer a demanda para fazer parte do mesmo.

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Seja pela inef iciência do sistema criado, seja pela fal ta de informação

dos usuários quanto a este di rei to, o s istema de tari fação para usuários

“Baixa Renda” certamente não alcança os mais pobres. Prova disso é

que, da totalidade dos domicíl ios que tivemos a oportunidade de aplicar

questionário no Alto Bairro da Penha, somente um declarou conhecer e

part icipar do programa “Baixa Renda” para desconto na conta de

energia elétrica.

Gráfico 4: domicí l ios que se encontram cadastrados no programa “bai xa renda” para subvenção nas tar i f as de energia elétr ica no Al to Bai rro da Penha.

Ressal tamos que, de acordo com o Jornal Brasil de Fato , ( junho de

2008), o Tribunal Regional Federal de Rondônia expediu l iminar

favorecendo todas as famílias que consomem até 220 kWh a se

enquadrarem no “Baixa Renda” automaticamente sem precisar dar

provas de que estão inscri tos em qualquer programa social do Governo

Federa l. Assim o usuário que necessita de desconto na conta de

energia não teria a obrigação de estar inscri to nesses programas de

bolsas e de fazer a demanda de inclusão no programa. Mas ainda não

se divu lgou essa liminar junto aos consumidores de energia elétrica ,

perpetuando as dif iculdades no enquadramento neste tipo de tari fação

diferenciada.

Contudo, há que se cri t icar, a inda, a própria lógica deste sistema de

tarifação para a população mais pobre. Bermann (20 03) torna a anál ise

ainda mais contundente ao estabelecer um padrão de uso fami li ar de

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energia elétrica tido como essencial para a dignidade indiv idual ,

mostrando que este chegaria a um consumo mín imo mensal de 220 kWh

(p. 61). Tal fato torna ainda mais evidente a necessidade de superar a

visão meramente mercanti l sobre a energia elétrica caso se deseje uma

distribuição mais democrática deste t ipo de serviço, criando

mecanismos para promover a tarifação diferencia apenas de acordo com

a renda fami l iar e não com a quantidade de energia ut i l izada, ao mesmo

tempo em que fossem criados os mecanismos para que a população

como um todo uti l izasse energ ia de maneira racional e sem

desperdícios, somando-se a i sso investimento em Programas de

Eficiência Energética - PIR. Ou, como o próprio Bermann sal ienta, “sob

o ponto de vista da sustentabi l i dade, seria mais coerente estipular tetos

de consumo e não cestas básicas [energéticas]” (2003; p. 17).

Bermann (2003; pp. 57 -60) ao caracterizar quatro equipamentos t idos

como básicos e essenciais (rádio, televisão, geladeira e máquina de

lavar roupas), que e le denomina como “cesta básica energética”, nos

chama a atenção para o fato que, caso houvesse no Brasil uma maior

equidade social que poderia ser promovida pela energ ia elé trica com a

posse somente desses quatro aparelhos eletrodomésticos – isso sem

mencionar outros equipamentos que, talvez, seriam tão essenciais como

esses, sobretudo em nossa sociedade que va loriza e requer cada vez

mais ef ic iência no tempo e na forma como realizamos nossas a tiv idades

diárias ut i l i zando computador, ferro elétri co, l iquidif icador, e tc. –, a

demanda energéti ca seria acrescida em um percentual correspondente a

11,2% do consumo residencial nacional (p. 59).

Ou seja, a precariedade energética nestes espaços periféricos, com a

sua subordinação e carência, é f ruto da pol í tica energética adotada pela

empresa, que v isando exclusivamente a maximização dos lucros, com

investimentos i rri sórios em programas de ef iciência energética (tão

necessários à equidade social ), simplesmente não teria condições de

supri r a demanda energética requerida caso a população mais pobre

ut i l izasse energia de maneira mais iguali tária .

Como discutido nos capítulos anteriores, a modernização , que no

presente trabalho não consideramos como nada mais que o aumento

exacerbado do consumo se processando de maneira global através das

forças homogeneizantes da técnica que se impõem globalmente,

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legi timando, assim, uma única forma de se produzir e,

conseqüentemente, de consumir. O fato é que tal modernização e

terri torialização das técnicas se dá de maneira seletiva , cris tal izando

nos espaços urbanos “subdesenvolv idos” a f ragmentação sócio -

espacial , como tentamos demonstrar de maneira empírica no sub -

capítulo anterior.

Ao mesmo tempo, no presente sub-capítulo, buscamos através do

empirismo, demonstrar que a través da selet ividade terri torial das

técn icas é possível enxergar as relações de dominação existente entre

as classes sociais. Paradoxalmente, tais relações de dominação

estariam atenuando a “f ragmentação”. A un icidade das técn icas e o seu

sentido social (que é, antes de tudo, a homogeneidade e a exacerbação

do consumo) trazem aos mais pobres, como no exemplo do nosso

estudo de caso, a impossibi l i dade de eles v iverem sem energia e létrica

– neste sentido a eletricidade se co loca enquanto um bem

necessariamente universal .

Mas a mesma unicidade que promove conta tos, relações,

homogeneização, e, portanto, atenuaria a “f ragmentação”, promove os

processos de dominação social . A apropriação da energia elétrica pelo

ci rcui to superior – sobretudo após a década de 1990 com as

priva tizações – e a sua transformação em mercadoria a ser consumida

de acordo com padrões hegemônicos, ou seja, o consumo enquanto

mera rea lização do valor de troca, trouxe aos mais pobres tarifas pelas

quais eles se vi ram impossibil i tados de pagar. Assim, o “gato” se torna

a única maneira de obter acesso à energia, ao mesmo tempo em que a

sua repressão se mani festa como forma de controle social e

manutenção da subordinação ao impedi r um modo de v ia digno

proporcionado pelos usos de energia, os quais deveriam se contrapor

aos “valores de troca” e terem seus usos racionalizados e moni torados.

A repressão ao “gato”, demonstrada no in ício deste sub-capítulo ,

evidencia como a dominação com os mais pobres é real , não somente

no plano subjetivo ou na materialização de um consumo subal terno, mas

também de manei ra violenta por meio de uma legi timação da repressão

e da contensão social . A criminalização e a mili tarização nada mais são

que a imposição de uma ordem desigual e excludente que coloca os

mais pobres acuados e est igmatizados em uma posição de criminosos

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(o “gato” é crime previsto no Código Penal Brasi le i ro ), por não

conseguirem partic ipar do mesmo jogo do consumo que,

paradoxalmente, os seduzem e os excluem a todo o tempo.

Neste sentido, o desvio da eletric idade é tolerado pela sociedade e

tolerável na medida em que não se soluciona a si tuação dos baixos

salários e do desemprego, bem como não se reduz as tarifas de

eletric idade de maneira automática para os mais pobres e não se

promove um programa geral de ef iciência energética que contribua para

uma maior equidade na distribuição energética de maneira sustentável .

Tal fato condiz com a anál ise fei ta no sub -capítulo 2.3 sobre a inserção

subordinada do ci rcui to inferior, uma vez que a desigualdade e a

concentração de renda são fundamentais para a v i tal idade do sistema.

5. Considerações finais

Esperamos que a discussão a part i r dos terri tórios -rede (re)produzindo

terri torialidades subordinadas tenha contribuído para elucidar o fa to que

a nova configuração terri torial pelas redes se dá de forma d iferenciada,

privil egiando determinadas el i tes hegemônicas no atual processo

produtivo global . A part i r disso, determinados terri tó rios se mantém

incorporados de maneira precária neste processo, dando forma à

segregação/f ragmentação dos terri tórios periféricos.

A h ipótese de que a precariedade das redes nos bairros parte da v isão

mercantil is ta da Escelsa sobre a energia elétrica e que, po r isso, são

mal estru turadas num terri tório não rentável não se mostrou de todo

coerente. Não se pode dizer que tais terri tórios não sejam rentáveis

para a empresa concessionária de energ ia elétrica. A quantidade de

moradores que habi tam os espaços perifér icos e que, em boa parte,

compram a energia representa a maioria da população da Grande

Vi tória (conforme Zanotel l i , 2005) e são determinantes nos lucros da

empresa (lembrando que a população da Grande Vi tória equivale a

cerca de 40% da população do Espíri to Santo).

A verdade é que para a Escelsa não há preju ízos, uma vez que todas as

perdas energéticas por desvios são contabil izadas nas revisões

tarifárias pela ANEEL anualmente. Além disso, os próprios dados da

empresa mostram que as perdas energéticas ocasionadas pelos “gatos”

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são da ordem de 5,4%, enquanto as perdas energéticas ocasionadas

pelas l imi tações técnicas de ef iciência na distribuição são da ordem de

7,7%. Mas, apesar dessas perdas, o lucro l íquido da empresa em 2006

foi da ordem de R$ 139,6 mi lhões de Reais (Conforme o Relatório

Administrativo da Escelsa, 2006).

A dominação social se manifesta na forma de espoliação urbana, pois

os trabalhadores se vêem obrigados a se reproduzirem com rendas

baixas. Estando inseridos no mesmo modelo de consumo imposto pelo

ci rcui to superior, mas sem possib il idade de se manterem

permanentemente consumindo tais produtos, o consumo será, então,

selecionado a parti r das prioridades e possibil idade dos pagamentos.

Assim, “consumos” relat ivos à habi tação, por exemplo, se manterão

marg inalizados e a popu lação mais pobre acaba por encontrar fo rmas

de habi tar em bairros sem planejamento. De forma semelhante ocorre

com a energia elétrica, que necessi ta ser usada de maneira criat iva e

na i legal idade, por causa da prioridade dada a formas de consumo,

part icularmente aqueles que necessi tam da energia elé trica, os ele tro -

eletrôn icos, que, como frisado neste trabalho, são essenciais no modo

de vida constru ído pela sociedade em que vivemos. Isso reforça ainda

mais a expropriação dos pobres e o engordamento do c i rcuito superior,

uma vez que o c i rcui to inferior acaba novamente servindo como fonte de

acúmulo para os que fazem o comércio destes t ipos de bens e serviços.

Assim, reaf i rmamos que tais populações pobres não são supérf luas,

desnecessárias no c i rcui to de consumo, uma vez que consti tuem um

mercado consumidor rentável , ainda que a concentração de renda seja

cada vez mais patente.

A conseqüência deste modelo de dominação social no espaço urbano se

dá através da produção de uma cidade f ragmentada, marcada pela

concentração ef iciente de serviços e equipamentos públ icos em

determinados espaços centrais, sendo a peri feria marcada pela

precariedade de tais serv iços e pela pobreza, como é o caso das redes

elétricas nos bairros peri féricos. No Alto Bai rro da Penha, além da

baixíssima qual idade dos equipamentos da rede elétrica, as pessoas

são obrigadas a se inseri r de manei ra i legal no consumo da energia

elétrica, pois como demonstramos nas discussões relat ivas ao “gato”,

os furtos são essencialmente est imulados pelas al tas tarifas praticadas

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pela Escelsa. Ao mesmo tempo, paradoxalmente, a Esce lsa, que

promove acessos precários às redes, criminal iza os acessos ilegais, se

serv indo desse aspecto para melhor controlar e recobri r os lucros

extraídos da maioria da população modesta.

O atua l percurso histórico pelo qual passamos torna ainda mais

necessária uma anál ise s istêmica, que busque articular o local no global

e vice-versa. O presente traba lho, buscando anal isar de maneira ampla

a inserção das redes como uma técnica global, discutindo de maneira

específ ica as redes elétricas e mostrando como nos países

“subdesenvolv idos” tais técnicas são dispostas a parti r de interesses

mercantis contradi tórios, oligopolizados e internacionais , produzindo,

f inalmente, a c idade f ragmentada ao compor as técnicas de maneira

setorial , sem art icular a totalidade do espaço das cidades e as suas

especif icidades sociais, pol ít icas, demográficas, etc., à modernização.

Ao analisar como estudo de caso de um ba i rro periférico específ ico,

buscou-se articular o local na anál ise, pois achamos i sso imprescindível

se ob jet ivamos desvendar a manei ra como tais processos de

f ragmentação se consti tuem, também, em processos de dominação

social , sobretudo na esfera do consumo e dos usos diferenciados do

ci rcui to superior pelo inferior, que foi de maneira mais específ ica objeto

de nossas análises. O fato é que tais populações (e terri tórios) estão

inseridas de maneira ef iciente dentro da lógica dominadora do sistema,

inseridas na dinâmica econômica urbana, subordinadamente, por meio

dos dois c i rcui tos, e não meramente desconectadas, idéia que um

determinado concei to de “f ragmentação” poderia trazer. E esta é a

causa essencial para af i rmarmos que no bairro em estudo (e mui to

provavelmente nos demais bairros periféricos que são f rutos do mesmo

processo de f ragmentação do espaço urbano), a fo rma fragmentada do

espaço se dá resul tando em terri torialidades subordinadas.

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ANEXOS: ANEXO 1: Roteiro para entrevistas com os funcionários da

Escelsa

Quais as usinas hidroelétricas responsáveis pela geração da

energia elétrica distribuída na Grande Vi tória?

Elas estão li gadas a quais subestações?

Quais são as subestações de elevação da tensão na Grande

Vi tória?

Qual a tensão específ ica delas? Esse valor é padron izado?

Qual a capacidade de distribuição energética de cada uma delas?

Para quais regiões cada uma de las é responsável pelo

abastecimento energético?

Onde estão local izadas as torres de transmissão da energia

elétrica?

Para quais regiões cada uma é responsável pelo abastecimento de

energia elétrica?

Com quais subestações de abaixamento da tensão cada uma delas

está conectada?

Diante do que foi conversado até então, discorra sobre quaisquer

aspectos que se inter-relacionam com o funcionamento técnico dos

processos de geração e distribuição de energia elétrica e que não foram

abordados.

Existe uma base cartográf ica que espacial ize todas essas inf ra -

estruturas? (ou seja, mapas que demonstrem onde estão local izadas as

hidroe létricas, torres de transmissão, subestações e as suas conexões

entre s i , além de del imi tar as regiões de recebimento de energia e létrica

que são def inidas de acordo com padrões específ icos da empresa)

Como são estabelecidos os l imi tes das quantidades de energia

elétrica que será fornecida para cada região?

Qual é o l imi te estabelecido para o Bairro da Penha, em Vi tória,

ES? E para Fonte Grande?

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Sabe-se que até a crise energética que at ingiu o Brasi l há alguns

anos atrás e que f icou conhecida como “apagão”, a tarifação da energia

era definida a part i r de valores diferenciados para os sistemas

monofásicos, bifásicos ou tr ifásicos. Atualmente, a tarifação é

diferenciada a part i r da referência de uma tabela mais complexa e que é

def in ida a parti r do consumo da energia .

Explique como é o funcionamento desta tabela e o que mudou com

essa nova forma de tarifação.

O que é o gato?

Quais as conseqüências do gato?

Quais são as formas da empresa de descobri r e l idar com o gato?

Qual o volume total de energia furtada na Grande Vi tória?

O que isso representa em somas de prejuízos para a empresa?

Qual é o vo lume de energia furtada nos ba irros Penha e Fonte

Grande?

Qual o volume de energia comprada na Grande Vi tória?

Qual o volume de energia comprada nos bai rros Penha e Fonte

Grande?

Qual o volume de energ ia consumida por setor econômico

(primário , secundário , terciário ) na Grande Vi tória?

Qual o volume de energ ia consumida por setor econômico

(primário , secundário , terciário ) nos bairros Penha e Fonte Grande?

Existem mapas que demonstrem as inf ra-estruturas de d istribuição

da energia elétrica nos bairros Penha e Fonte Grande?

Quais são as formas de cobrança da empresa?

Os bairros Penha e Fonte Grande possuem acessos dif íceis para a

cobrança da energia elétrica?

A forma de cobrança é diferenciada nos ba irros Penha e Fonte

Grande?

Qual a relação que a empresa tem com esses bai rros e de maneira

mais geral com outros bairros populares e/ou bairros periféricos?

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A empresa f inancia algum proje to social nesses bairros?

Qual é a imagem que a empresa tem junto à população?

Qual é o modo de uti l ização da ele tricidade por parte dessas

populações?

Em sua opinião, existem outras informações que sejam relevantes?

Existe alguma publ icação, seja l ivro ou um breve texto, que esteja

relacionado ao assunto e que o senhor que ira nos indicar?

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ANEXO 2: Modelo dos questionários aplicados no Alto Bairro da Penha Roteiro da entrevista: Entrevistador: Data:___/___/___ Local de aplicação:

1) Quantos anos o(a) senhor(a) tem? ______

2) A quanto tempo o (a) senhor(a) mora no bairro? Menos de 6 meses( ) Mais de 1 ano ( ) mais de 5 anos ( ) mais de 10 anos ( )

3) Onde o senhor(a) nasceu?_________ Onde o senhor morava antes de vir para o bairro da Penha?_________

4) O(a) Senhor(a) encontra-se atualmente: Empregado ( ) Desempregado ( ) Vive de “bicos” ( ) Qual sua profissão?______________________ Tem carteira assinada? Sim ( ) Não ( )

5) Qual o grau de escolaridade do(a) senhor(a)? Não completou o 1°grau ( ) 1° grau completo ( ) 2° grau incompleto ( ) 2° grau completo ( ) Superior incompleto ( ) Superior completo ( ) Analfabeto ( )

6) Quantas pessoas vivem em sua casa? (Mãe, Pai, Filhos, Primos, Irmãos e etc.) ______

7) De quanto é a renda de sua família? (soma de tudo o que sua família ganha) Até 380,00 ( ) Entre 380,00 a 570,00 ( ) Entre 570,00 a 950,00 ( ) Acima de 950,00 ( ) No que se refere ao consumo de energia elétrica, pretende-se testar a qualidade e confirmar

ou contestar os dados adquiridos na entrevista feita pela Escelsa.

TABELA DE QUALIDADE

__1____2__.__3____4__.__5____6__.__7____8__.__9____10__ Muito ruim ruim regular boa muito boa

8) Numa escala de 1 a 10, que nota você da para a qualidade do serviço da energia elétrica, prestado pela ESCELSA no seu bairro?

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__1____2__.__3____4__.__5____6__.__7____8__.__9____10__ Muito ruim ruim regular boa muito boa

9) Numa escala de 1 a 10, que nota você dá para o equipamento de energia elétrica

do seu bairro? (postes, fios, transformadores, relógios e etc)

__1____2__.__3____4__.__5____6__.__7____8__.__9____10__ Muito ruim ruim regular boa muito boa

10) Numa escala de 1 a 10, que nota você da para o serviço de manutenção de

energia elétrica no seu bairro? (troca de postes, manutenção de fios, reparação nos danos e etc)

__1____2__.__3____4__.__5____6__.__7____8__.__9____10__ Muito ruim ruim regular boa muito boa

11) Você considera o valor da energia elétrica que você paga caro? Sim ( ) Não (

).

12) Qual a média do valor da conta de energia você costuma pagar mensalmente? ______ (conta dos últimos 3 meses). Quantos Kw por mês?

13) Quais e quantos desses itens você tem na sua casa? Itens básicos residências e consumo de energia

Itens Sim Quantos Geladeira Ferro elétrico Chuveiro elétrico Tanquinho TV 14’ TV 20’ TV 29’ Lâmpada fluorescente Lâmpada incandescente DVDs, radio, outros

14) Quanto tempo você costuma fazer uso diário dos seguintes aparelhos

domésticos? Do chuveiro elétrico _____ Da lâmpada acesa _____ Do televisor ____ polegada _____ Ferro elétrico _____ Outros descrever ____

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15) Você acredita que a ESCELSA se preocupa com seus interesses? Sim ( ) Não ( )

16) Você confia nos serviços prestados pela empresa ESCELSA? Sim ( ) Não ( ) 17) Você compreende as informações da sua conta de luz? Sim ( ) Não ( )

18) Você confia nas informações prestadas pela ESCELSA em sua conta? Sim ( )

Não ( )

19) Já houve algum aparelho queimado em sua casa por causa da interrupção da energia elétrica? Se sim qual?__________________ qual o prejuízo?________________

20) Se existisse outra empresa que prestasse serviços se de energia elétrica você trocaria de empresa? Sim ( ) Não ( )

21) Como você percebe a empresa ESCELSA?

22) Em sua opinião, o que a ESCELSA poderia fazer pelo seu bairro?

23) Você acredita que o “gato” seja uma solução para a economia na conta de luz?

24) Você já viu “gatos” por aqui?

25) Você considera o bairro desfavorecido em relação aos outros bairros? Por quê?

26) As torres de energia que passam no bairro te incomodam, podem provocar doenças e etc.?

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ANEXO 3: Resultados dos questionários aplicados no Alto Bairro da Penha Pergunta 1:

Pergunta 1B:

Pergunta 2:

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Pergunta 3:

Pergunta 3B:

Pergunta 4:

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Pergunta 5:

Pergunta 6:

Pergunta 7:

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Pergunta 8:

Pergunta 9:

Pergunta 10:

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Em relação às perguntas 8, 9 e 10, observamos que os índices de

sat isfação dos usuários de energia em relação à Escelsa se qualif icam

entre regular e bom. Em relação à qualidade do serv iço de energia

elétrica prestado no bairro, as notas dadas pelos moradores

entrev istados alcançaram uma média de 6,7 no Al to Bairro da Penha.

No quesi to relacionado aos equipamentos (postes, f ios,

transformadores, re lógios, e tc.), observamos a menor nota: 5,9. Já no

quesi to relacionado ao serviço de manutenção dos equipamentos no

bairro, chegamos à nota média 6 ,0. Assim, traçando uma média das três

notas como forma de criar um índice de sat isfação dos c lientes com a

empresa, observamos uma nota média equivalente a 6,2 , o que

representa um índice de satisfação regular .

Contudo, há que se mencionar as l imitações de tal metodo logia a f im de

mensurar a qualidade da rede elé tri ca. De fato, o ato de a tribuir nota é

extremamente relat ivo e subjetivo. Durante a apl icação dos

questionários f reqüentemente os moradores falavam sobre a qual idade

da rede elétrica nos ba irros como sendo péssima, contudo, no momento

em que pedíamos para dar uma nota, esta a lcançava uma qual if icação

regular. Talvez os habi tantes receassem dar uma nota ruim, pois já

habi tuados a ter serv iço de má qualidade não percebessem que ele

poderia melhorar. Isso talvez tenha, também, haver com o fato que os

moradores desses bairros acredi tam pagar menos pelo consumo da

eletric idade que os habi tantes dos bairros da cidade formal ou legal .

Pergunta 11:

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Pergunta 12:

Pergunta 13:

Sobre as perguntas número 13 e 14, a sua f inalidade foi , sobretudo auferi r uma média de domicíl ios que estariam lançando mão do uso do “gato”, a part i r da discrepância entre o valor di to o e o valor que deveria ser pago. Eis a lguns exemplos:

No segundo questionário aplicado ao dia 09-03-2008, o morador af i rmou pagar R$ 29,00 por mês, sem fazer uso do benef ício de tari fação baixa renda. Este mesmo morador, af i rmou possuir 1 geladeira, 1 ferro elétrico, 1 tanquinho, 1 TV 14 po legadas, 3 lâmpadas f luorescentes, 1 lâmpada incandescente, 1 ventilador e 1 rádio, o que equivaleria a um consumo médio mensal de 200 kW h, que representaria uma conta no valor de R$ 80,00.

Outro exemplo pôde ser v isto no sexto questionário desse mesmo dia, no qual o morador declarou pagar entre R$ 25,00 e R$ 30,00. Nesta casa hav ia 1 ge ladei ra , 1 ferro elétrico, 1 chuvei ro elétrico , 1 tanquinho, 1 TV 14 polegadas, 6 TVs 20 polegadas, 5 lâmpadas incandescentes 1 aparelho de DVD, 1 rádio e dois venti ladores. Tal consumo representa

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uma média de 280 a 300 kWh, ou seja , um valor mensal de mais de R$ 100,00.

Como estes, vimos inúmeros exemplos nos questionários apl icados, dando base ao que foi exposto no sub-capítulo 4.3 a respei to dos “gatos”.

Pergunta 15:

Pergunta 16:

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Pergunta 17:

Pergunta 18:

Pergunta 19:

Como expl ici tado no sub -capítu lo 4 .2, eu pude perceber nos trabalhos de campo que esta real idade é devida ao costume dos moradores de

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desligar os eletrodomésticos sempre que há chuva com ventos fortes, pois nestes eventos são constantes os cortes de energia no bairro .

Pergunta 20:

As perguntas a part i r da 16 em d iante, e principalmente da 21 em diante, são muito mais quali tativas que quanti ta t ivas, de maneira que seria um grande e desnecessário esforço transcrever todos os relatos aqui . Tais relatos estão permeando a nossa análise presente no estudo de caso no capítulo 4.

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ANEXO 4: Transcrição das entrevistas com os empregados da Escelsa Realizamos, ao total , quatro entrevistas com diferentes empregados de

diferentes setores da empresa Escelsa, em dois dias diferentes. As três

primeiras entrevistas ocorreram em um único dia. Como meu padrasto já

trabalhou na empresa, eu o pedi para contatar um empregado que me

pudesse fornecer informações. Este empregado, por ser amigo do meu

padrasto, se mostrou bem disponível em me ajudar e me ped iu que eu

env iasse a ele o que eu gostaria de saber precisamente para que ele

pudesse me ajudar.

Assim, preparamos (eu, juntamente com o orientador e o outro bols ista

da pesquisa) um rote i ro de entrevista (conforme o anexo 1) , o qua l o

env iamos. Com isto, foi marcada reunião no dia 15 de dezembro de

2007 com três empregados de três setores dist intos: a Gerência de

Combate às Perdas Energéti cas, o Setor de Efic iência Energética e o

Setor das Linhas de Transmissão. As três primeiras transcrições se

referem às entrevistas que realizei nestes três setores neste dia .

Nesse dia , busquei ao máximo não falar sobre a pesqu isa e fazer o

mínimo de contrapontos possíveis, de ixando que os empregados

entrev istados se senti ssem bem à vontade para dizer o que queriam.

Mui tas vezes, por exemplo, me mostrei surpreso e tão indignado quanto

o gerente de combate às perdas para com os pobres subversivos que

fazem “gatos” e “roubam” da Escelsa.

A quarta entrevista se deu com um empregado da Gerência de

Planejamento de Redes, no dia 17 de dezembro de 2007. Esta já foi

fei ta comigo e com o orientador – o prof . Cláudio Zanote ll i – em uma

sala da UFES. Uma reunião marcada devido a um of ício que enviamos a

Esce lsa requisi tando alguns dados que não foram fornecidos nas

primeiras entrevistas, pois fo i alegado que eram dados confidenciais e,

assim, fui aconselhado a pedir tais dados de maneira mais formal, com

um of ício . Contudo, o que me pareceu naquela entrevista foi que o

empregado entrev istado não sabia das outras entrevistas que eu já

hav ia fei to. Daí algumas contradições presentes em suas af i rmações em

relação àquelas da primeira entrevista . Nesta entrev ista nós também

demonstramos um posicionamento diferenciado, e por f im, para que os

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dados nos fossem fornecidos, o entrevistado nos pediu que

env iássemos o projeto de pesquisa, para que ele soubesse de fato do

que a pesquisa tratava. O resul tado, enf im, foi que jamais recebemos

qualquer resposta.

1ª Entrevista: Com o Gerente de Combate às Perdas Energéticas

Eu: Olá, bom dia.

Gerente: Bom dia .

Eu: Nós estamos buscando compreender os d iferentes acessos e usos à

energia elétrica.. . Em sua opinião, existe diferença entre os usos de

energia nos bairros periféricos e os bairros mais de classe média , por

exemplo?

Gerente: Acontece que o consumo nos bairros periféricos é maior,

justamente por causa dos eletrodomésticos antigos, inef icientes.

Geralmente gasta-se com eletrodomésticos novos entre 30 e 75% a

menos do que os ele trodomésticos velhos. Geralmente a periferia tem

um consumo médio maior.

Eu: Ah é? O consumo médio da periferia é maior?

Gerente: Às vezes é maior. O consumo real , ta. Aí o que que acontece

na periferia? Como você tem um consumo médio maior devido aos

eletrodomésticos deficientes, aí você tem muita f raude. Aí se você for

olhar assim, qual a média do consumo na periferia? Daí vai ser menor,

mas é por causa de ligação clandestina, de desvio de energia, mas o

consumo i rregular dessas pessoas é mui to alto.

Eu: Chegando a ser maior que o consumo das classes médias e al tas.. .

Gerente: É, porque uma geladeira velha, por exemplo, às vezes só uma

geladeira velha consome 150 kWh e isso é o consumo de uma unidade

toda em um apartamento em Jardim Camburi , por exemplo. Então o

consumo médio da periferia é al to. Por isso que não se pode auferi r

renda a part i r de consumo energéti co. Por exemplo , se o cara consome

150 kWh não dá pra dizer se ele mora em Jardim da Penha ou num

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bairro de perife ria, então você não pode usar o consumo como padrão

para essas coisas.

Eu: Interessante, pois eu acabo de ver um trabalho, uma defesa de

monograf ia, na qual o autor justamente demonstra a v iabi l idade, através

de ferramentas estatísticas, enf im, sobre você uti l i zar o consumo

energético como ferramenta para auferi r um indicador de renda... Mas

como você diz do consumo real . . . O que ele fez foi justamente pegar o

consumo demonstrado nas contas de energia, aí talvez dê para se

aproximar esses dados...

Gerente: É, aí talvez dê para se aproximar, mas a tendência nesses

dados é que.. o que que acontece? Nas favelas, por exemplo , não tem

jane la. Quer dizer, tem janela , mas não tem vidro. Então não tem janela

aberta durante o d ia, até porque tem índice de criminal idade a l ta. En tão

jane la fechada, porta fechada, lâmpada acesa. Quer dizer, lâmpada

acesa o dia todo. O níve l de permanência das pessoas dentro de casa é

maior. Nos bairros de... de n ível de renda maior, geralmente as pessoas

trabalham e estudam, então tem menos gente de casa durante o dia.

Mas em peri feria, em regra não. Se você vai num bairro em periferia,

em regra, você encontra várias pessoas consumindo energia durante o

dia. É radio, televisão, tanquinho. Isso é comum de você encontrar, o

consumo al to durante todo o dia. Como os e letrodomésti cos são menos

ef icientes, consomem mais. Quem tem renda maior, sempre tem

preocupação em economizar. Tem eletrodoméstico novo, se tem algum

problema tenta acertar. Troca a borracha da geladeira quando tem

problema... Se você v i r a borrada de geladeira desse pessoal aí, a porta

f ica aberta, amarrada com barbante ou com qualquer outra coisa assim.

Eu: Mas a té mesmo a forma de cobrança é diferenciada de a cordo com

o consumo, não é isso?

Gerente: De acordo com o consumo?

Eu: É.

Gerente: É.. . mais ou me... é, na verdade se você pegar o cri tério de

consumo, na verdade, ele é uniforme né. Se você pegar uma conta de

100 reais, se ela tiver na Praia do Canto, se ela t iver no Bairro da

Penha, vai pagar da mesma forma. Corta a energia com o mesmo

prazo...

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Eu: Sim, sim. Eu me ref i ro a aquela tarifação diferenciada. Onde até 80

kWh é um valor, depois tem outros intervalos de desconto.. .

Gerente: Ah, você ta falando da tarifa social .

Eu: É, como funciona isso?

Gerente: A tarifa socia l . . . na verdade a legislação atual da tarifa social

eu não sei não. Realmente quem consome até 80kWh tem uma tarifa

reduzida. Residencial e monofásica. Que que é monofásico, né? Porque

a instalação é fei ta por carga. Quando tem uma carga pequena,

geralmente necessi ta de uma fase só. Aí leva só um f io pra casa do

cara, que tem carga até.. . 9000 Watts. Dá pra um chuveiro elétrico e

mais algumas coisinhas. Quem tem uma carga um pouco maior, de 9 a

15 (mi l Watts) é instalação bifásica, então já ta fora do cri tério da tarif a

social . Quem tem mais carga ainda, aí leva três fases, a gente chama

de atendimento tr ifásico, aí já ta completamente fora. Então pras casas

que tëm uma carga pequena e que tem consumo baixo, geralmente, em

regra, ta na tarifação socia l . Independente se ta no Bairro da Penha ou

na Praia da Costa. Porque? Porque não tem como cadastrar todo

mundo. Primeiro a idéia da Aneel era primeiro cadastrar na tari fação

social quem ta cadastrado nos programas do Governo, só que o nível de

informação é baixo, então muita gente f icaria fora, você estaria

prejud icando muita gente . Ela acabou até 80 kWh dá o desconto,

incondic ional . O Governo do Estado também, até 50 kWh ele não cobra

ICMS. Então, é pra quem consome pouquinho. Tem esses negócios.

Tem na peri feria gente que consome muito pouco? Tem. Em regra,

quem não tem regularidade nenhuma. Porque tem muita pouca coisa.

Tem gente que é mui to pobre. Só uma lâmpada dentro de casa, um

rádio...

Eu: É, porque, realmente 80kWh é muito pouco.

Gerente: É. Pra eletrodoméstico ef ic iente não é tão pouco não. Uma

geladeira ef iciente consome 20 kWh, então daria pra l igar 4 geladeiras.

Agora, uma geladeira inef ic iente consome sozinha, 100, 150 kWh.

Eu: Interessante isso. O acesso das pessoas aos eletrodomésticos

estaria diferenciando.. .

Gerente: É porque geralmente o que que acontece? A pessoa de classe

média sempre compra um eletrodoméstico novo. Aí tem um velho,

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inef iciente , em casa. Que que ela faz? Dá pra empregada. A empregada

vai e leva. De repente ela nem usa, mas ela dá pra um vizinho. Só que

aqui lo é presente de grego né...

Eu: Esse setor aqui é de combate às perdas. O que efetivamente ele

faz?

Gerente: Combate as f raudes, os desvios.

Eu: Que combate os gatos. Existe alguma d iferenciação entre os gatos?

Gerente: Não. Na verdade gato é o nome popular, né. Quem deu foi a

população. Por exemplo, se não me engano em Pernambuco é macaco,

não é gato . Então é um nome popular. Na verdade, desvio de energia,

que é furto de energia você tem de várias formas. Tem as pessoas que

furtam direto na rede. Elas vão lá e colocam aqueles dois f iozinhos

pendurados no poste que você v isualmente consegue enxergar. Têm as

pessoas que rompem o lacre da caixa e fazem desvios lá dentro da

caixa do medidor, e têm as pessoas que pegam e desmontam lá o

medidor e fazem um art if ício lá dentro do medidor. Tem todo o t ipo de

furto de energia né. O nome certo seria o furto de energ ia. Isso que é o

gato, gato é o furto de energ ia né. O nome popular que é gato. Tanto

que a gente vai lá fazer a inspeção do padrão, a primeira co isa que a

gente ouve é, “ta procurando gato?” porque gato é o nome popular.

Então seria isso aí. Independente da onde que seja né.

Eu: E como a Escelsa faz para combater o gato? É combater que vocês

chamam, não é?

Gerente: É, combate. Têm duas linhas. Tem uma que é a fi scal ização, a

gente vai lá inspecionando e lacrando todos os medidores. A gente sai

aí e.. . têm vários a lgori tmos né. As residências que têm muitos

consumos zero consecutivos, é estranho né? Alguém f icar pagando taxa

mínima à toa. Geralmente se a pessoa abandona o imóvel ela vai lá e

pede o desligamento. Aí passou um certo número de consumo zero a

gente vai lá inspecionar. Em áreas pobres assim, né, de baixo poder

aquisi tivo, que em regra tem muita f raude a gente inspeciona todo

mundo. Abra caixa por caixa, medidor por medidor e vai olhando. Aí tem

“n” indicadores que a gente vai f iscali zando.

A outra l inha, sobretudo nesses bairros peri féricos, é você trocar a

rede. Tira essa rede que é nua, onde os cabos são l isos pra colocar o

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ganchinho, aí isola o cabo. Que aí ele já tem que subir no poste,

descascar se e le quiser fazer o gato, aí já dá mais trabalho, então inibe

né. E tem uma parte de ti rar o medidor mesmo de dentro da casa e

colocar no poste. Um medidor eletrônico, com uma caixa rela tivamente

pequena, então o medidor f ica fora do acesso e ele não tem como fazer

desvio né, de energia. Não tem como furtar energia.

Eu: Mas aí um medidor só dá conta pra todas as casas?

Gerente: Não, são vários né. É uma caixa com vários medidores,

porque na verdade o medidor é do tamanho de um celular. Aí a gente

coloca uma caixa desse tamanho assim com 10 medidores dentro

di retamente no poste. E sem polu i r v isualmente o bairro, entendeu?

Aí no ramal de energia que vai pra unidade consumidora, el e já ta com

a energia medida, então se ele tentar fazer o furto, não faz sentido né?

Porque já estaria medido lá em cima.

Eu: Então, a maioria dos gatos são fei tos no medidor mesmo?

Gerente: No medidor, no padrão... Têm áreas que não, onde a rede é

aberta, que é fácil colocar e t i rar , as pessoas colocam lá, por quê?

Porque quando a Escelsa chega com o carro, como não ta amarrado lá

em cima, ta só encostado porque os f ios são nus, o cara vai e puxa, se

puxa sai , o cara vai enrola rap idinho e f ica quieto lá esperando a

Esce lsa passar. Agora quando o f io é isolado não, que tem que

descascar e amarrar aí não. Aí f ica mais fáci l de ver, a gente vai lá e

pega. Mas é c landestinidade mesmo né, por isso que chama de l igação

clandestina né, porque a pessoa f ica na clandestinidade. A pessoa f ica

lá esperando, v igiando. Porque nesses bairros, a maioria das pessoas,

grande parte das pessoas, f i cam em casa durante o dia. Aí f icam lá

vigiando. Quando vê que a Esce lsa ta chegando e les vão lá e puxam.

Eu: E vocês tem dados do to tal de energia furtada?

Gerente: Temos. Porque como é que funciona? Toda energia que chega

na concessionária é medida. Daí eles medem o tanto que ta sendo

vendida e daí sabe o quanto que você perdeu.

Eu: Mas, por bairro, vocês têm esses dados?

Gerente: Por bairro não. Porque bairro é dimensão geográf ica né? A

gente sabe por ci rcui to elétrico . Por exemplo, sai da subestação um

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alimentador que vai atender, por exemplo, tem aí um a l imentador que

vai atender Bairro de Fátima, Jardim Camburi e Jardim Carap ina, a í a

gente sabe a perda do alimentador.

Aí a gente não sabe se ta perdendo mais num ba irro que no outro. Sabe

a part i r da característ i ca social , né. Jardim Carapina, por exemplo, tem

mais f raude de energia que em Bairro de Fátima e em Jardim Camburi .

Por que? Porque a gente tem históri co né. Sabe que historicamente

acontece mais em bairro de maior pobreza né? A gente chama de

complexidade social . Bairro onde tem maior índice de v io lência, né,

menor renda, tudo que favorece a clandestinidade.

Eu: Então, existe uma relação entre esses indicadores?

Gerente: Existe. Geralmente nesses ba irros que têm grandes índices de

violência. É, Feu Rosa, Planal to Serrano, esses bairros que são top em

assassinato, né. Homicídio, por exemplo, Nova Rosa da Penha, Terra

Vermelha. Se botar um medidor na porta do bairro pra fazer

comparação, a perda é de entre 50 e 70%.

Eu: É mesmo?

Gerente: É, por isso, que a gente parte para a ret i rada do medidor

mesmo. Justamente para coibi r e funciona.

Eu: Funciona?

Gerente: Funciona. Porque a população não quer se expor mui to,

entendeu: Não quer f i car no gato. É questão da consciência . Então a

maioria acaba desistindo. Sempre têm os insistentes né. Mas a maioria

absoluta desiste. Aí você consegue abaixar de 60% pra, sei lá, 10%,

15%. Aí f ica com um nível até, digamos assim, razoável . Não acei tável ,

né, mas razoáve l .

Eu : E no caso do Bairro da Penha?

Gerente: Num morro é mais dif íci l de f iscalizar, por que sof re a

repressão do tráf ico . E, é morro né. Não tem rua. Você não consegue

transi tar de carro. Tem que deixar o carro em baixo e subir a pé. Aí é

mais dif íci l . Mas aqui em Vitória , por exemplo, não tem muito problema.

Pelo menos aqui a pol ícia tem facil idade de transitar. O GAO, por

exemplo , (Batalhão da Pol ícia Mi l i tar em Vi tória para missões especiais)

tem uma relação boa com a Escelsa. Então, se a gente precisar, eles

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estão à disposição. A gente evi ta né, até porque, uma vez que você

sobe lá com a pol ícia f ica mais dif íci l de vol tar. E também para

preservar a imagem da empresa perante a população. Mas a gente não

tem problemas como no Rio de Janeiro, onde o pessoal lá tem que i r

vis i tar, pedi r bença pra subir. . .

E você, você ta subindo lá no Bairro da Penha?

Eu: Sim, na verdade a nossa pesquisa se dá em dois bairros distin tos, o

Bairro da Penha e o da Fonte Grande. Eu estou focando o Ba irro da

Penha.

Gerente: E como é pra subir lá?

Eu: Eu sempre subo com o presidente da Associação de Moradores, até

para f icar mais fáci l , ele introduz aos moradores a questão dos

questionários a serem aplicados...

Gerente: E o Pro jeto Terra, já subiu lá?

Eu: Já. Inclusive estão desapropriando muitas casas por lá.. .

Gerente: É. Eles têm um jei t inho interessante para subir nesses morros.

Eu já conheci a lguma coisa, mas informalmente. Aí eles falando, que

pra chegar lá eles conversam com as lideranças comunitárias, lançando

um marketing insti tuciona l e vão sempre plantando nas comunidades o

que eles querem implantar. Nunca fazem nada sem o apo io das

comunidades né. É um pouco dirigido né, mas é sempre assim. Não

adianta, você vai fazer uma praça aqui, eles não querem a praça e

quebram a praça todinha. Agora se eles chegarem ao ponto de ped ir a

praça, aí eles não quebram. Eles têm uma forma de contado bem

interessante.

Eu: E sobre as conseqüências do gato?

Gerente: É o desvio é crime. Mas são muitos e a pol ícia não teria

condições de prender todos. Os casos de maior vu l to geralmente vão

até pra imprensa né. Prende dono de restaurante.. . A pol ícia busca

pegar os mais relevantes, como não tem como fazer todos né. E

diretamente o que a Escelsa faz é buscar a cobrança retroativa,

acrescida de multa de 30%. E a parte do Estado, que ele nem sempre

faz, é levar adiante os processos penais.

Eu: E os dados de furto. Podem ser d isponibil i zados?

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Gerente: Na verdade, eu não posso disponibi l i zar. Por estar dentro da

hierarqu ia da empresa né. Uma empresa de capi tal aberto, alguns

dados são confidencia is. Não podem ser dispon ibil izados. Mas como

você ta fazendo uma pesquisa, seria interessante mandar uma carta

pelo seu departamento pedindo dados em tais e tais bairros. Mas em

regra, todos esses bai rros violentos têm uma perda acima de 50%.

Todos, eu nunca vi uma exceção.

Eu: Mas, por exemplo, quando é planejado um circui to para uma

determinada região. Se, você plane ja esse c i rcui to para abaixo da

capacidade de energia que ele vai realmente fornecer, ele pode ser

dani f icado.

Gerente: É, na verdade, que que acontece? É através de fundamento

histórico né. Você vai planejar um circui to para atender uma demanda e

daí você já sabe quanto que aquele espaço mais consumi r mais ou

menos. E daí você já planeja um fornecimento maior, por que você sabe

que o consumo rea l nesses bairros va i ser maior que o consumo

vendido.

Eu: Então a Escelsa já se planeja pra atender a té os furtos?

Gerente: Até os furtos, claro. Se não o ci rcui to do alimentador não

agüentar atender a demanda o que ia acontecer é que o ci rcui to ia se

degradar mui to rápido. Aí ninguém ia ter energia de qual idade, a

energia ia cai r toda hora. Então o que acontece é i sso mesmo. A gente

se planeja pra atender todo mundo e, no f ina l , todo mundo paga a

conta. Tanto que a Escelsa, na rev isão tarifária da Aneel , considera

todos os furtos anualmente.

Eu: Muito obrigado pela sua disponibi l i dade.

Gerente: Por nada, bom dia e sucesso na pesquisa.

Eu: Obrigado, bom dia!

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2ª Entrevista: Setor de Eficiência Energética da Escelsa

Eu: Olá. Na verdade eu v im aqui procurando algo a respei to de

programas sociais implantados pela empresa em bai rros periféricos em

Vi tória. Me pediram para conversar com vocês aqu i .

Empregado: O que a gente faz aqui são ações para ef iciência

energética. No caso do setor residencial , o que a gente faz é promover

a troca de geladeiras em bairros periféricos. Nós visi tamos o bai rro

através de uma empresa terceirizada, vamos casa por casa através das

residências que são atendidas com ligação monofásica e são bairros

periféricos geralmente. Nesses bairros a gente faz a v isi ta, troca duas

ou três lâmpadas incandescentes por f luorescentes, fazemos uma

conscientização através de fo lders e fazemos uma análise técnica da

geladeira e depois dizemos se a geladeira vai ou não ser trocada, a

part i r da pontuação obtida por essa geladeira.

Diante disso, esse entrevistador retorna, coloca esses dados na

plan ilha e a gente define se esses c lientes i rão receber a geladeira .

Então a transportadora vai leva a geladeira nova e recolhe a geladeira

velha. A ge ladeira é recolhida para que geralmente ti re essa carga do

mercado, pois se ela f icar lá ela será l igada na casa de outro e são

geladeiras realmente sucateadas, com um a l to consumo de energia

elétrica, fazendo com que o c liente onere a conta dele de energia

elétrica devido à fal ta de manutenção ou rea lmente a geladeira bem

rium, sem porta, porta caindo, sem vedação. Nós t i ramos essa geladeira

e env iamos a sucata para uma empresa contratada em São Paulo para

t i rar o gás e reaproveitar a sucata.

Então o cliente f ica com uma geladeira com um consumo est imado em

24kWh. A gente tem atuado mais em Cariacica, onde tem um maior

bolsão de pobreza e vamos continuar lá. Estaremos entregando cerca

de 2.400 geladeiras por lá. Os cl ientes também são convidados a ouv ir

palestras conscientizando sobre a economia de energia . E então assina

um termo de compromisso concordando que i rá trocar a gelade ira e

mui tas vezes ele acaba até desist indo na hora.

Eu: Desist indo de trocar ge ladeira?

Empregado: É.

Eu: Mas por quê?

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Empregado: Porque às vezes a geladeira dele é maior. Essa que a

gente coloca é uma de 252 l i t ros, geladeira pequena. Aí às vezes o

marido não quer, a mulher quer, enfim, tem a lguns que desistem. Assim

como tem uns que não acredi tam e acham que a Escelsa vai cobrar a

geladeira deles. Aí quando as geladeiras começam a chegar eles l igam

pra cá querendo geladeira, existe de tudo.

O que a gente percebe é que na periferia existe um consumo al to e que,

conseqüentemente, tem uma conta al ta . Assim e las não podem pagar a

energia, acaba tendo problemas com inadimplência, com o furto. Mas

isso vem de uma cul tura onde as pessoas não costumam pagar a conta,

outras porque a insta lação elétrica dentro das residências é mal fei ta.

No caso da geladeira, nós trocamos aqueles que são os aparelhos que

mais consomem energia dentro da residência deles. Geralmente são

geladeiras velhas que ganham das patroas, o que é mui to comum. Uma

patroa dá uma geladeira duplex pra empregada e aí ela não consegue

pagar essa conta . Esse é o motivo desse projeto aqui .

O ob jetivo nosso nesse processo de ef ic iência energética é economizar

energia para que você possa usar energia de uma maneira melhor e

diminuir esse pico no consumo de energia.

Eu: Obrigado pe las informações. Tenha um bom dia .

Empregado: Por nada. Bom dia.

3ª Entrevista: Setor de transmissão da energia elétrica

Eu: Quais são as hidroelétricas responsáveis pela geração de energia

na Grande Vi tória?

Empregado: Olha só, o si stema Escelsa não tem autonomia na

produção de energia. A grande parte da energia que é distribuída no

estado é comprada de Furnas, quase a totalidade.

Eu: Quase a to talidade?

Empregado: No Estado temos as cinco principa is usinas, mas elas não

são capazes de produzir o suf iciente para a nossa demanda.

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Eu: Fora furnas, quais são as outras hidroelétricas pela geração da

Energia usada na Grande Vi tória?

Empregado: Nós temos duas três in terligações com Furnas que são as

duas l inhas de Campos-Vi tória e uma l inha Vi tória-Ouro Preto, todas

elas em 345 mi l Vol tz e uma linha com o Sistema da Semig que é a

l inha Mascarenhas-Governador Valadares que é de 230 mil Vol tz, porém

a capacidade de transporte de energia dela também é pequena e a

grande quantidade de energia rea lmente vem de Furnas. E, além disso,

existem as 5 usinas hidroelé tri cas, que são: a de Mascarenhas, que é a

maior do Estado e f ica em Baixo Guandu; a usina de Frutei ras; a do

Jucu, que é mais uma usina histórica que propriamente de geração de

energia propriamente; a usina de Rio Boni to. Essas são as maiores.

Eu: Sobre as subestações. Existem as de elevação e as de

abaixamento. Você poderia falar um pouco sobre isso?

Empregado: Quando você gera a energia elétrica, você geralmente a

gera a uma tensão de 13,8 ou 11,4 kV. E você precisa elevar a tensão

para fazer o t ransporte, porque existe uma relação de que quanto maior

for a tensão, menor será a corrente necessária. Assim, a potência é

constante , é a mesma para a tensão e para a corrente. Então, mantendo

a potência constante, se eu aumento um, eu acabo diminuindo o outro.

E a corrente elé trica é responsável por alguns sérios fatores de perda,

por exemplo, aquecimento, e daí quando maior a corrente maior a perda

por efei to Joule. Então a gente vai e eleva a tensão pra poder

transportar aquela carga de energia numa corrente menor. Então cada

usina tem uma subestação elevadora para fazer a transmissão da

energia. E o que seria a transmissão? Seria você transportar a energia

a grandes blocos. Então você trás a energia da usina, de Furnas, por

exemplo , e trás para Pi tanga, chegando em Pi tanga tem que distribu ir

para o estado intei ro. Então, toda essa distribuição para grandes blocos

é fei ta com uma tensão elevada, que vai de 34.500 até 138.000 Vol ts.

Aí quando eu chego no centro urbano eu não posso transmiti r essa

corrente com uma tensão tão grande. Por quê? Porque a distância que

eu ia precisar entre condutores para garanti r o isolamento seria mui to

grande. Você pode ver que todas essas torres são enormes. Não tem

como eu trafegar com essas torres num centro urbano. Então você

passa pra uma estação abaixadora, que vai voltar essa tensão de novo

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pra uma classe de 13,8 ou 11,4 kV. E porque que não abaixa di reto para

120 V? Porque você ia ter um aumento na corrente, porque diminuiu a

tensão, e daí ia aumentar as perdas. Daí, para diminuir essas perdas, a

gente eleva a tensão para conseguir atender o pessoal na faixa de

tensão que é estipulada pela Aneel .

Eu: E pensando em extensão geográf ica. Qual seria esta extensão que

cada subestação consegue distribui r energia? Isso é padronizado?

Empregado: Não. Isso depende muito da classe de tensão da

subestação e da potência que você tem instalada naquela subestação.

A gente tem uma área na Escelsa que é a área de planejamento e que é

normalmente essa área define o melhor espaço a ser escolhido para a

implantação de cada subestação, em função da expectativa de

crescimento para aquela área. No norte do estado, vou te da r um

exemplo , a gente ta construindo uma subestação agora perto de Nova

Venécia em 130 kV. Porque perto de Nova Venécia? Porque Nova

Venécia f ica meio que no meio do estado, então al i eu consigo d istribuir

energia com mais facil idade para as outras subestações que estão al i

ao redor e também para as subestações mais aqui na Grande Vi tória.

Então isso é definido em função de um estudo sobre as expectativas de

crescimento. Se eu tenho para daqui a 15 anos uma expectativa de

crescimento grande para aquela região, então eu vou instalar al i uma

subestação com 138 kV, já prevendo que ela possa aumentar de tensão.

Ou então, uma subestação que eu vou implantar lá em Água Doce do

Norte, uma região que não tem uma expectat iva tão grande de

crescimento, então bota uma subestação de 34,5 kV, pequenin inha, com

um transformadorzinho só, mas com espaço para crescer , mas sem

desapropria uma área tão grande.

Eu: Na Grande Vi tória, quais seriam as subestações existentes?

Empregado: Carapina, Praia, Pi tanga, Camburi , Vila Ve lha, Paul , Ibes,

Bento Ferre i ra e Al to Lage.

Eu: E sobre o valor da tensão em cada subestação: Isso é padronizado?

Empregado: Bem o valor não é padronizado. Isso vai depender da

carga requerida. Se eu tenho uma região que exige mui ta carga eu boto

uma estação de 138 kV, quando tem muita indústria, mui to cl iente, eu

boto 138 kV. Porque? Para uma potência de, vamos botar 100 mW, eu

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vou precisar de uma corrente pequena em re lação se eu botasse 34,5

kV. Pros mesmos 100 mW, a corrente que ci rcular al í ia ser mui to maior

que os 138. Ia ser três vezes maior no caso, então não tem

padronização. Você não pode falar que toda ela é 138. O que a gente

tem em 138 é Carapina, Pi tanga, Bento Ferrei ra. Mas tem também 34,

Paul , Camburi , porque Camburi é pra ticamente residenc ial , então não

precisa de ter uma subestação grande.

Eu: Então a diferenciação das subestações se deve exclusivamente ao

planejamento da Escelsa, de acordo com cada extensão “geográf ica” a

ser serv ida por cada subestação?

Empregado: Isso. A gente tem subestações que vão fazer

exclusivamente a transmissão de energia. Por exemplo, Carapina, ela

quase não tem consumidor. Ela serve mais para pegar toda a energia

que vem de Furnas e distribuir para as diversas subestações, João

Neiva, Auto Lage... pra fazer t ipo uma in terligação. E tem também

algumas subestações, que são exclusivamente destinadas à d istribuição

de energia: Bento Ferrei ra, tem uma alimentação de Bento Ferrei ra em

138 (kV), mas toda a carga que chega em Bentro Ferrei ra é distribuída

para aquela região, Praia do Canto , Enseada do Suá. Em Paul , a carga

que chega em Paul , é distribuída pra região de Paul , São Torquato, Um

pouco a lí pro lado da Prainha al í . Então cada subestação tem uma...

como d izer assim... ela pode servi r tanto pra distribuir energi a, como

pra ser fonte de interligação no sistema.

Eu: E essa de interl igação de sistema seria mais a de Carapina.

Empregado: Carapina... as grandes subestações. Carapina, Al to Lage,

João Neiva, Nova Venécia, Cachoeiro. Mas na Grande Vi tória é só a de

Carapina. Carap ina que concentra toda a energia que chega no estado

tem que passar por Carapina, quase toda energia que chega no estado,

porque ela chega a través de Furnas até Pi tanga, depois eu tenho quatro

l inhas de Pi tanga chegando até Carapina. Então, quase que 70% da

energia que chega no estado passa por Carapina.

Eu: Então pra que eu entenda. A energia sai de uma subestação

elevadora a 138 kV, para as torres de transmissão...

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Empregado: Normalmente 138 kV. E então vai para as torres e das

torres vai pra uma outra subestação que vai ba ixar essa tensão para

11,4 kV ou 13,8 kV para mandar a energ ia pros consumidores.

Eu: E para baixar novamente pra 120 V, aí já é nos transformadores.

Empregado: Isso. Aí já é fei to naqueles transformadores que f icam nos

postes. Que sai de 11,4 kV para 127 V ou 220 V.

Eu : E cada transformador também varia de acordo com a necessidade

energética da região que ele abastece?

Empregado: Isso. Por exemplo, você tem um... sua casa. Que atente

dua casa. Você tem um alimentador, você mora na Grande Vi tória?

Eu: Sim.

Empregado: Então. Aqui a distribuição é em 11,4 kV, aí na região

entrono da sua casa tem várias casas. Então passa por um

transformador, e você tem um circui to de baixa tensão que vai atender

as várias casas. Então cada transformador, dependendo da região, ele

tem uma potência diferente. Eu posso tem 112,5 kVA, que é pra atender

normalmente um b loco de carga grande, se t iver algum prédio na

região. Aí tenho 70 kVA, 30 kVA, 45 kVA. Aqui na reta do aeroporto tem

só tem i luminação pública, ali tem um transformador de 15 kVA. Porque

a potência instalada de carga é menor que 15 kVA, então cada

transformador consegue atender um número determinado de carga. E

isso a í é tudo d ividido em circui to, então uma rede de al ta tem vários

transformadores pendurados nela, e nesses transformadores, cada

transformador tem um circu i tinho de baixa tensão.

Eu: Eu não entendi o que é o ci rcui to.

Empregado: Ci rcui to a gente chama tudo aquilo que está interl igado

naquele transformador. Você num ponto 138 kV, por exemplo . Daí você

vai passar por um transformador, a í nesse transformador, você vai

transformar aqui é 11,4 kV, que é essa tensão que tem na rua, nos

postes. Aí nessa tensão de 11,4 kV vc tem t ipo uma barra, com vários

alimenadores, cada um para atender uma determinada carga numa

determinada região. Então cada coisa dessa aqui é um circuito , a gente

chama de um ci rcui to, porque: Porque se eu desligar aqui , eu desligo

todos os consumidores que se seguem em diante dele. E aqu i é a

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tensão de 11,4 kV. Daí pra f rente terão vários transformadores que i rão

transformar em 127 V. Então se eu desl igar esse transformador, eu

deixo de atender essas casas que ele está serv indo. Mas os outros

transformadores continuarão funcionando. Então, esse transformador, é

um circui to, dentro do outro c i rcui to .

Eu: Entendi . Então, cada c i rcui to quantif ica o total de energia que está

sendo concedida.

Empregado: Sim. Se eu pegar e somar quanto que eu medi e quanto

cada casinha dessas pagou de energia, vai dar quanto que e sse

alimentador forneceu de energia.

Eu: Aí é que está onde eu quero chegar. Daria quanto que foi fornecido

se não houvesse o gato.

Empregado: É. Isso seria se não houvesse o desvio. Se eu somar tudo

eu tenho a energia faturada. Que é aqui lo que eu realmen te recebi . A

soma de toda energ ia faturada deveria ser igual à soma da energia

fornecida, isso se não houvesse o desv io. Que que acontece: Por causa

do desvio, a energia que passa por aqui acaba sendo maior do que a

energia realmente faturada. Entao, na subestação eu tenho como saber

quando de energia que tá sendo desviada.

Eu: Mas no transformador, também não daria para saber?

Empregado: Do transformador, se eu insta lar o aparelho medidor no

transformador, sim. Agora, sem o equ ipamento, só na saída da

subestação que eu tenho e em alguns pontos crí t i cos. Por exemplo, em

Feu Rosa, nós temos dois medidores nos dois al imentadores que

fornecem energia para aquela região. Por quê? Porque nós sabemos

que aquela região é uma das que tem grande quantidade de desvio de

energia. E como esses dois eu consigo medir se as ações da Escelsa

tem sido ef icazes ou não para reduzir os desvios.

Eu: Ok. Acho que no momento isso é suf iciente. Mui to obrigado pela

ajuda.

Empregado: Sem problema, e qualquer dúvida você pode me l igar o

mandar um emai l no decorrer da pesqu isa.

Eu: Obrigado, bom dia .

Empregado: Bom dia.

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4ª Entrevista. Com um funcionário de alto escalão da empresa

Como di to, esta entrevista fo i real izada em momento diferente e em

si tuações di ferentes. O problema é que aqui não houve gravação da

entrev ista, desta maneira, optamos em transcrever algumas palav ras do

entrev istado que nós conseguimos tomar nota, sobretudo aquelas que

têm a lgumas contradições com a primeira entrev ista .

“Depois do apagão vi rou-se costume generali zado no Brasil o furto de

energia devido a esse costume ter s ido usado para mascarar o consumo

real durante o racionamento energético. Virou-se no Brasil um costume

de que furtar energia não trás problema.”

“Nosso serviço tem que ser estruturado. A nossa polí t ica é de acabar

com as gambiarras.”

“A distribuição na energia é um dado estratégico da empresa e não

pode ser disponibil i zada, somente a transmissão energética através dos

mapas.”

“A rede é planejada para ser ót ima. Ela não é plane jada de acordo com

o perfi l econômico. O planejamento é fei to de acordo com a quantidade

requerida pelos di ferentes espaços urbanos, tanto na atual idade como

num plane jamento para os próximos 10 anos.”

“O benefício tarifário só é concedido para pessoas que se enquadram

no perf i l de baixa renda e que têm um consumo inferior a 80 Kw

mensais.”

“A prát ica de se u ti l i zar um único relógio em prédios mul t ifami liares

começou com o apagão. A Escelsa não questiona os registros de

imóveis cadastrados pe la prefe i tura. Para l igar a energia a Escelsa

exige apenas o CPF e o endereço legal , mas se as pessoas li gam

diversos domicí l ios em um ún ico relógio, nós não podemos fazer nada.

Isso tudo é in teligência negativa, as pessoas não compreendem o que é

viver em comunidade.”

“A Escelsa têm uma lógica para traçar os parâmetros de perf i l de

consumo dos usuários de energia, mas isso não é fei to somente como

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forma de combate aos gatos. Isso é fei to como forma de melhorar a

nossa rede, pois a nossa preocupação é fornecer o melhor serv iço.”

“Um serviço momentâneo de menor qualidade não just i fi ca o uso do

gato, a té porque existe o serviço de atendimento ao cliente.”

“Nosso índice de satisfação é exce lente.”

“A Escelsa não têm índices de inadimplência locais, somente gerais.”

“A Escelsa alcança todos os seus mais de 1 mi lhão de c lientes.”

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