Espiral 27

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N.º 27 - Abril / Junho de 2007 boletim da associação FRA FRA FRA FRA FRATERNIT TERNIT TERNIT TERNIT TERNITAS AS AS AS AS MOVIMENTO MOVIMENTO MOVIMENTO MOVIMENTO MOVIMENTO SER SER SER SER SERVIR E AMAR VIR E AMAR VIR E AMAR VIR E AMAR VIR E AMAR espiral espiral espiral espiral espiral Servir e amar 1 Notícias breves 2 Dossier: Encontro Nacional Fraternitas 3 Coincidências 7 Catolicismo com forte humanismo 8 Cristo, o maior socialista? 8 Sumário: Sumário: Sumário: Sumário: Sumário: « A espiritualidade e a teologia cristãs não po- dem ser separadas. Deus as uniu num laço indissolúvel. A liturgia reverencia e manifesta essa uni- dade vital. Ela nos transmite a “mente de Cristo”, a consciência que Jesus manifestou da Realidade Últi- ma como Abbá, o Deus da compaixão infinita, to- talmente transcendente e totalmente preocupado com a condição humana. Se as pessoas que participam da liturgia têm uma preparação e uma compreen- são adequadas, essa experiência de Deus é transmi- tida numa intensidade crescente.» (In T. Keating, O Mistério de Cristo Mistério de Cristo Mistério de Cristo Mistério de Cristo Mistério de Cristo). Foi assim o Encontro Nacional da Fraternitas, em Fátima, de 27 a 29 de Abril, no qual a nossa Euca- ristia, prolongada pelo encontro fraterno e amigo do almoço de despedida foi, como sempre, o ponto alto dos três dias de reflexão. O tema de reflexão «Fraternitas – fragilidade e força do nosso Movimento» foi oportuníssimo, e os textos distribuídos sobre os subtemas «As mulheres da Fraternitas», «O nível etário da Fraternitas», e «A situa- ção institucional da Fraternitas» foram um óptimo es- tímulo para o diálogo. Diálogo sempre vivo e aceso entre irmãos e irmãs que livremente dizem o que pen- sam e sentem porque sabem que estão numa Famí- lia (com dez anos) e mesmo discordando uns dos outros, todos são aceites e amados. Começámos por descobrir a força das nossas fra- gilidades, e será uma reflexão a continuar por todos e cada um. Descobrimos a força da mulher, no ca- sal, com a sua afectividade própria, e a força do casal, com a especificidade de ele ser padre, viven- do e sentindo uma responsabilidade acrescida na família, na sociedade e na Igreja, numa maior exi- gência da espiritualidade, de vivência cristã e de tes- temunho. O nível etário, avançado na maioria, também se pode tornar numa força, com mais tempo disponível para tarefas de gratuidade para os outros, crescen- do na sabedoria e no amor. Isto, sem esquecer o pequeno grupo jovem, a continuar a caminhada da Fraternitas, inserido na vida e testemunhando a ale- gria e a responsabilidade de famílias cristãs autênti- cas. Na última fragilidade da Fraternitas – a situação institucional – vamos descobrindo a força da nossa Fé, Esperança e Caridade para com todos os que hesitam em nos abrir as janelas. Enfim, foi uma reflexão inovadora, criativa, com ampla participação feminina, que mais uma vez nos tornou conscientes da imensa riqueza humana, cultu- ral e espiritual da Fraternitas. Por vezes pensamos que seríamos bem proveito- sos para a Santa Mãe Igreja, que pede exaustiva- mente «operários para a sua messe». Mas vamos per- cebendo que a vocação dos nossos maridos sacer- dotes casados se realiza, cada vez mais, no caminho certo que é a vocação para SERVIR, como Jesus tan- to insistiu com os apóstolos, que até ao fim sonha- ram com «cargos» e «primeiros lugares no Céu». Afi- nal, o sacerdócio é essencialmente para SERVIR os irmãos, como tão bem disse o presidente da Fraternitas, Vasco Fernandes. Encontramos a Fraternitas nos hospitais, nos ban- cos alimentares, com os ciganos, os drogados, os idosos, animando liturgias dominicais, na formação de jovens, etc... Servir e Amar, na Fé e na Esperança de um mundo melhor, é a nossa FORÇA. Maria Humberta Santos

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N.º 27 - Abril / Junho de 2007

boletim da associação FRAFRAFRAFRAFRATERNITTERNITTERNITTERNITTERNITASASASASAS MOVIMENTOMOVIMENTOMOVIMENTOMOVIMENTOMOVIMENTO

SERSERSERSERSERVIR E AMARVIR E AMARVIR E AMARVIR E AMARVIR E AMAR

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Servir e amar 1

Notícias breves 2

Dossier: Encontro Nacional Fraternitas 3

Coincidências 7

Catolicismo com forte humanismo 8

Cristo, o maior socialista? 8

Sumário:Sumário:Sumário:Sumário:Sumário:

«A espiritualidade e a teologia cristãs não po-dem ser separadas. Deus as uniu num laço

indissolúvel. A liturgia reverencia e manifesta essa uni-dade vital. Ela nos transmite a “mente de Cristo”, aconsciência que Jesus manifestou da Realidade Últi-ma como Abbá, o Deus da compaixão infinita, to-talmente transcendente e totalmente preocupado coma condição humana. Se as pessoas que participamda liturgia têm uma preparação e uma compreen-são adequadas, essa experiência de Deus é transmi-tida numa intensidade crescente.» (In T. Keating, OOOOOMistério de CristoMistério de CristoMistério de CristoMistério de CristoMistério de Cristo).

Foi assim o Encontro Nacional da Fraternitas, emFátima, de 27 a 29 de Abril, no qual a nossa Euca-ristia, prolongada pelo encontro fraterno e amigo doalmoço de despedida foi, como sempre, o pontoalto dos três dias de reflexão.

O tema de reflexão «Fraternitas – fragilidade eforça do nosso Movimento» foi oportuníssimo, e ostextos distribuídos sobre os subtemas «As mulheres daFraternitas», «O nível etário da Fraternitas», e «A situa-ção institucional da Fraternitas» foram um óptimo es-tímulo para o diálogo. Diálogo sempre vivo e acesoentre irmãos e irmãs que livremente dizem o que pen-sam e sentem porque sabem que estão numa Famí-lia (com dez anos) e mesmo discordando uns dosoutros, todos são aceites e amados.

Começámos por descobrir a força das nossas fra-gilidades, e será uma reflexão a continuar por todose cada um. Descobrimos a força da mulher, no ca-sal, com a sua afectividade própria, e a força docasal, com a especificidade de ele ser padre, viven-do e sentindo uma responsabilidade acrescida nafamília, na sociedade e na Igreja, numa maior exi-gência da espiritualidade, de vivência cristã e de tes-temunho.

O nível etário, avançado na maioria, também sepode tornar numa força, com mais tempo disponívelpara tarefas de gratuidade para os outros, crescen-do na sabedoria e no amor. Isto, sem esquecer o

pequeno grupo jovem, a continuar a caminhada daFraternitas, inserido na vida e testemunhando a ale-gria e a responsabilidade de famílias cristãs autênti-cas.

Na última fragilidade da Fraternitas – a situaçãoinstitucional – vamos descobrindo a força da nossaFé, Esperança e Caridade para com todos os quehesitam em nos abrir as janelas.

Enfim, foi uma reflexão inovadora, criativa, comampla participação feminina, que mais uma vez nostornou conscientes da imensa riqueza humana, cultu-ral e espiritual da Fraternitas.

Por vezes pensamos que seríamos bem proveito-sos para a Santa Mãe Igreja, que pede exaustiva-mente «operários para a sua messe». Mas vamos per-cebendo que a vocação dos nossos maridos sacer-dotes casados se realiza, cada vez mais, no caminhocerto que é a vocação para SERVIR, como Jesus tan-to insistiu com os apóstolos, que até ao fim sonha-ram com «cargos» e «primeiros lugares no Céu». Afi-nal, o sacerdócio é essencialmente para SERVIR osirmãos, como tão bem disse o presidente daFraternitas, Vasco Fernandes.

Encontramos a Fraternitas nos hospitais, nos ban-cos alimentares, com os ciganos, os drogados, osidosos, animando liturgias dominicais, na formaçãode jovens, etc... Servir e Amar, na Fé e na Esperançade um mundo melhor, é a nossa FORÇA.

Maria Humberta Santos

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NOTÍCIAS BREVESA pobreza deve ser abolida e declarada ilegal,

tal como aconteceu com a escravatura, o apartheidou a violência doméstica. A ideia foi defendida emLisboa pelo actual subdirector-geral da UNESCO,Pierre Sané, durante a conferência da ComissãoNacional Justiça e Paz (CNJP), no dia 25 de Maio.

Sane, ex-secretário-geral da Amnistia Internacio-nal, justifica a sua proposta dizendo que se registano mundo um genocídio silencioso. «Se olharmospara os números, eles são apocalípticos: onze mi-lhões de crianças morrem cada ano, por doençasligadas à pobreza, má nutrição, fome, falta de águapotável, diarreia...» Tais mortes são imorais, «porquesabemos que isso vai acontecer nos próximos 12meses, temos os meios de o remediar e não o faze-mos,» acusa ele. «Trata-se de um crime contra a hu-manidade.» Todavia, «infelizmente, os pobres não têmvoz, são invisíveis, não contam, as suas mortes nãoatrapalham o nosso quotidiano».

Pierre Sané considera a pobreza como o desafiocentral no início do século XXI. E diz que a suaerradicação será o cumprimento da Declaração Uni-versal dos Direitos Humanos. «Seria preferível falarda abolição da pobreza, tal como da abolição datortura ou da pena de morte, porque se trata de ac-tos contra a dignidade do ser humano. Na realidadea pobreza mata mais certeiramente que as guerras,e mata sobretudo mulheres e crianças.» Mas, «a mo-bilização [contra a pobreza] só será conseguida secada um conceber a pobreza como uma injustiça».Se nos contentássemos com pouco mais do que oestilo de vida dos africanos, precisaríamos apenasde meio planeta, mas como invejamos o consumoamericano, são necessários seis planetas, lamenta ele.

Na mesma linha, a economista Manuela Silva,presidente da Comissão Nacional Justiça e Paz de-fende que «a Humanidade já venceu outros desafiosao longo da História (aboliu a tortura, a escravatura)e, com os recursos materiais actuais (a riqueza, osbens produzidos, a tecnologia, o conhecimento) aHumanidade pode abolir a pobreza».

HUMANIDADE PODE ABOLIR A POBREZA

«Há um novo laicismo radical que quer desenca-dear um novo fundamentalismo, em vistas de umapurificação social, que atira os valores morais e reli-giosos para fora do âmbito público», denunciou Ra-fael Navarro-Valls, catedrático da UniversidadeComplutense e académico da Real Academia deJurisprudência e Legislação, de Espanha.

Valls demonstrou que a característica mais surpre-endente deste novo laicismo radical é substituir a «ve-lha teocracia» por «novas ideocracias», vazias de re-ligião. Como exemplo, referiu o crescente redesenhardas festividades do Natal, nas quais se trocam asreferências a Cristo por felizes férias; e também asubstituição de festas cristãs (como matrimónio, bap-tismos), por eventos civis.

Navarro Valls argumenta que o novo laicismo serege pelo «politicamente correcto», por uma «religio-sidade light», que não são mais do que uma corrup-ção da consciência. É por este agnosticismo que mui-tos jovens se afastam da Igreja, quando a opiniãodela choca com os «valores modernos» propagadospelas ideologias políticas ou por grupos de opinião,a que não são alheios os meios de comunicaçãosocial. É também este laicismo que faz com que mui-tos fiéis tomem decisões contrárias à moral cristã, eaté as defendam, sem considerar que estão a entrarem choque com a sua fé.

LAICISMO AGNÓSTICO IMPÕE-SE

Magdeleine Hutin, a fundadora das Irmãzinhasde Jesus, que viveu entre 1898 e 1989, e seguiu ospassos de Charles Foucauld, imprimiu um novo ca-rácter à convivência entre cristãos e muçulmanos, edeve inspirar a humanidade no mesmo sentido. «Oseu exemplo de diálogo da vida entre cristãos e mu-çulmanos teve valor profético, mudou a Igreja Cató-lica e teve influência no Concílio Vaticano II», afirmouFrancesca De Lellis, autora do livro «Magdeleine deJesus e as Pequenas Irmãs no mundo do Islão», cujaapresentação decorreu na Grande Mesquita deRoma, em 21 de Abril passado.

O Papa Bento XVI fez referência a três desafiosque o mundo enfrenta hoje, na mensagem à Acade-mia de Ciências Sociais, em Maio passado.

«O primeiro diz respeito ao ambiente e ao desen-volvimento sustentável. A comunidade internacionalreconhece que os recursos do mundo são limitados eque cada povo tem o dever de adoptar políticas vi-sando a protecção do ambiente, a fim de prevenir adestruição daquele património natural cujos frutos sãonecessários para o bem-estar da humanidade.

O segundo refere-se ao conceito de pessoa hu-mana. Há que reconhecer todos os seres humanoscomo pessoas, dotadas de uma dignidade inviolável.E isso há-de ter consequências práticas sobre os pro-blemas globais, como o fosso entre países ricos epaíses pobres e a desigualdade na distribuição dosrecursos naturais e da riqueza.

O terceiro desafio corresponde aos valores doespírito, que, ao contrário dos bens materiais, expan-dem-se e multiplicam-se quando se comunicam; equanto mais partilhados, mais são interiorizados.Mais, só o amor ao próximo inspira justiça ao servi-ço da vida e da promoção da dignidade humana.»

PAPA ENUNCIA TRÊS DESAFIOS

SENSIBILIDADE FEMININA NO DIÁLOGO INTERFÉS

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ENCONTRO NACIONAL - Fátima 27, 28 e 29 de Abril 2007

Anossa Associação apresenta várias fragilida-des notórias. Uma delas reside nitidamente na

sua componente feminina. Somos uma Associação depadres – todos homens, portanto. É verdade que nosdistinguimos dos outros homens padres – somos pa-dres casados. Mas não importam as mulheres comquem casámos: elas continuam gente indiferenciada,anónima. Todos os holofotes, tanto na Igreja como nasociedade em geral, estão assestados na nossa condi-ção de casados, não por sermos casados, mas porsermos padres. É certo que também as nossas esposasse realçaram, sobretudo no início. Mas apenas por te-rem casado com padres, o que, salvo uma ou outrasituação em que funcionou mais a inveja que o apre-ço, ao anonimato lhes juntou muitos olhares de soslaioe, portanto, uma mais ou menos acentuada margina-lização. No centro continuam assim, de forma quaseexclusiva, os homens com quem elas casaram.

E na nossa Associação? Não continuam elas sendoapenas companheiras de uma Fraternitas – uma frater-nidade – de padres? Não comandam e não decidemeles tudo no grupo, que todos certamente queremosuma verdadeira Comunidade? Não continuam sendoeles os que escolhem os temas dos encontros e os queos desenvolvem segundo parâmetros sacerdotais e te-ológicos, desde os conferencistas, quase sempre bis-pos ou teólogos, até à simples conversa em grupo detrabalho, que se quereria de verdadeira partilha?

Ora elas são, desde o casamento, essencialmentecompanheiras de dores, prazeres, alegrias e cansaçosiguaizinhos àqueles que existem em todos os casais destemundo. Há um, há dez, há trinta anos, talvez mais!...Na maior parte dos casos este tempo do anonimatocomum a todas as vidas é ou virá a ser mais longo doque o caminho «segregado», elitista, excepcional, doseminário e do exercício do sacerdócio institucional emconjunto. Porque há-de então este tempo de vida naestufa clerical ter mais peso nos nossos encontros doque aquele outro tempo tão fecundo de vivência doamor e da dor numa família comum? Foi mais impor-tante neste sempre tenso tempo de vida anónima eledo que ela? Dir-se-á que terá que haver sempre qual-quer coisa de específico num casal em que ele é pa-dre. É claro que há. Como há sempre qualquer coisade específico em qualquer casal deste mundo, porexemplo num casal em que ela é médica ou em queele é trolha. É claro que há uma razão de peso paramerecermos as atenções especiais da Igreja e do mun-do: nós abalámos irreversivelmente um dos mais sóli-dos pilares em que assenta a estrutura do poder eclesi-ástico. Mas este facto não pode ofuscar toda a riquezade uma vida familiar em que a esposa e a mãe não

teve certamente um papel menos determinante doque o companheiro.

Ora esta riqueza, onde está ela na nossaFraternitas, nos nossos encontros? E se ela apare-cesse, tendo as mulheres como protagonistas? Opersistente silêncio das mulheres é certamente umagrande fragilidade da nossa Associação; se fossequebrado, este silêncio haveria de se transformarnuma nova, enorme Força!

AS MULHERES DA FRATERNITAS

O homem é a mais elevada das criaturas.A mulher é o mais sublime dos ideais.Deus fez para o homem um trono,Para a mulher um altar.O trono exalta, o altar santifica.O homem é o cérebro; a mulher o coração.O cérebro produz luz, o coração amor.A luz fecunda, o amor ressuscita.O homem é o génio, a mulher o anjo.O génio é imensurável, o anjo indefinível.A aspiração do homem, é a suprema glória,A aspiração da mulher, a virtude extrema.A glória traduz grandeza,A virtude traduz divindade.O homem tem a supremacia,A mulher a preferência.A supremacia representa força,A preferência representa o direito.O homem é forte pela razão,A mulher é invencível pela lágrima.A razão convence, a lágrima comove.O homem é capaz de todos os heroísmos,A mulher de todos os martírios.O heroísmo enobrece, o martírio sublima.O homem é o código, a mulher é Evangelho.O código corrige, o Evangelho aperfeiçoa.O homem é um templo, a mulher um sacrário.Diante do templo, descobrimo-nos,Diante do sacrário, ajoelhamo-nos.O homem pensa, a mulher sonha.Pensar é ter cérebro,Sonhar é ter na fronte uma auréola.O homem é um oceano, a mulher um lago.O oceano tem a pérola que o embeleza,O lago tem a poesia que o deslumbra.O homem é a águia que voa,A mulher o rouxinol que canta.Voar é dominar o espaço,Cantar é conquistar a alma.O homem tem um farol: a consciência;A mulher tem uma estrela: a esperança.O farol guia, a esperança salva.Enfim, o homem está colocadoOnde termina a terra,A mulher onde começa o céu…

Víctor Hugo

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ENCONTRO NACIONAL - Fátima 27, 28 e 29 de Abril 2007

Outra grande fragilidadeda nossa Associação é o

seu nível etário. E este facto é cer-tamente tranquilizador para aque-les que eventualmente temessemum qualquer arroubo renovadorpassível de abalar a ordeminstitucional estabelecida. Para ou-tros, entre os quais se incluem tal-vez alguns de nós, a idade avnçadaserá essencialmente o tempo dedescanso da vida, de onde já pou-co haverá a esperar comocontributo para o Progresso.

O Progresso, aliás, comanda econdiciona tiranicamente as nos-sas vidas. Por isso todo o valor éatribuído à «população activa»,que situaríamos, grosso modo,entre os 25 e os 65 anos. Prote-gem-se os menores de 25 porqueo Progresso vai precisar deles; ar-rumam-se os maiores de 65 por-que se tornaram peças desgasta-das da máquina do Progresso.Crianças e jovens são um investi-mento; os velhos são sucata huma-na que o Progresso, com polidodesprezo, procura arrumar mais oumenos esteticamente, para nãodesfear a cidade, esta sim, a pre-ocupação máxima de quem co-manda o mundo.

Todos atribuem um valor pró-prio à infância e à juventude. Masninguém atribui um valor específi-co à velhice. Na última idade davida tudo é perda: o velho perdeua beleza e o vigor; a influência e oprotagonismo; o poder de decisãoe o controle dos acontecimentos.Realçam-se-lhe as fragilidades,aparecem os achaques. E porqueé muito duro ficar para trás e per-der, o velho disfarça até ao limiteas deficiências, que se vão acen-tuando e acumulando.

Que pode ele fazer? Sente in-teriormente que a sua vida é pre-ciosa e tenta conservá-la o maispossível, mas ela pesa cada vez

mais. A morte inevitável perfila-seentão diante dele, cada vez maisnítida, e é nessa fase última queele nota que os seus sentimentosestão todos lá, fortes como sem-pre, que as suas emoções estãoparticularmente vivas, mesmo queapenas façam doer, doer muito…

No coração, ele não envelhe-ceu. É aqui, no coração, que resi-de toda a força da velhice: por elepassaram as mais tensas e amplasondas da vida, que o alargaram,querendo, por vezes, romper-lhe oslimites. Por isso o velho sente comintensidade maior do que a crian-ça, o jovem, o adulto. Podem pre-dominar nele os sentimentos nega-tivos, à medida que se aproximada morte: saudade, desilusão,mágoa, ressentimento, solidão,medo. Mas ele sente. Muito inten-samente. Ele sabe coisas que ascrianças e os jovens não entendeme que os adultos não querem ou-vir. Ninguém tem tempo, porque aroda da vida rola, inexorável, tri-turando toda a paz e todo o silên-cio em que os corações da primeirae da segunda idades poderiam re-ceber a luz acumulada nos cora-ções da terceira e quarta idades.

Ninguém, como os velhos, pos-sui tamanha lucidez; se a nãousam, é porque a têm cansada deninguém a querer receber. À im-potência da carne junta-se-lhes aimpotência do espírito. Facilmenteconcordamos em que tudo isto jun-to forma um peso tanto mais insu-portável quanto maior é a lucidez.Surge então o vírus particularmen-te corrosivo da resignação, queproduz vida esterilizada.

A não ser que a lucidez seja ali-mentada por uma Fé viva e poruma Esperança indomável. Todosos padres da nossa Associaçãoproclamaram muitas vezes do Al-tar abaixo, solenemente, que, paraos que crêem, «a vida não acaba;apenas se transforma». Se eles crê-em no que pregaram, a velhice éo tempo privilegiado para o teste-munhar. Para isso, não é necessá-ria nenhuma força especial, da-quelas que a «população activa»aprecia; basta acreditar naquelaoutra palavra do Mestre Jesus,quando diz que o que é vil e des-prezível aos olhos do mundo é queDeus escolheu para confundir o queo Sistema considera forte eprestigiante.

O nível etário da Fraternitas

Se por um lado a nossa ida-de avançada pode serenar

aqueles que receiam a«Fraternitas» como uma lufada re-formista a desestabilizar as estru-turas vigentes da Igreja, por outrolado essa idade pode tentar osmembros da nossa Associação ajulgarem-se inúteis no progressoda sociedade.

Reconhecemos que hoje ape-nas se consideram as crianças eos jovens como forças de progres-so. Podem os membros da«Fraternitas» sentir o aguilhão dasaudade, da desilusão, e até de

Será a «Fraternitas» um mundo de velhos?

uma certa mágoa por ingratidõesque não deviam ter acontecido.Mas constata-se que têm muita lu-cidez e aquela sabedoria que sóa experiência de vida pode dar,embora os mais novos não osqueiram escutar.

Apesar de tudo, os membros da«Fraternitas» cultivam uma Fé e umaEsperança muito vivas, que lhesabrem infinitos horizontes de vidacom capacidade de interviremmuito positivamente na renovaçãoda pastoral da Igreja e na vivênciados grandes valores da vida soci-al, cultural e religiosa.

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ENCONTRO NACIONAL - Fátima 27, 28 e 29 de Abril 2007

Fraternitas: «brigada do reumático»?

Como grupo, reunidos em ple-nário, concluímos que se torna ne-cessário descobrirmos as forças es-condidas na nossa «fragilidade»,como seja, uma nova lucidez paraos valores da vida. E foram apre-sentados alguns testemunhosvivenciais de membros que traba-lham activamente em vários Mo-vimentos das suas paróquias. Nãofoi esquecido o exemplo do fale-

cido Papa João Paulo II que, cominvejável lucidez, lutou até ao últi-mo momento da sua vida!

A conclusão surgiu espontânea:Se as contingências da idade nosbloquearem a manifestação dasnossas capacidades, a «Fraternitas»deve ser a grande forçadinamizadora em que nos pode-mos apoiar, e a grande esperan-ça no caminhar da última etapa

da nossa vida, porque só «é ver-dadeiramente velho o homem quepára de aprender, quer tenha 20ou 80 anos», como disse HenryFord.

Saímos deste Encontro daFraternitas com alma nova, comum acrescentado sentimento deinterajuda e uma visão optimistado nosso valor.

Manuel Paiva

VELHICE VENERANDA

Se o que ocorreu em Fátima,no Encontro da Fraternitas,

teve feição de uma boa e jucundafraternidade, revelou, também, oalcance de um alto propósito eensinamento: comprovou-se que aFraternitas é uma família de mem-bros afeiçoados, disponível paraservir a Igreja e os seus irmãos,fazendo, por si, um elogio à ida-de madura, escrevendo a páginade um «De Sanectute», que, se nãotem o valor de Cícero, põe, noentanto, em evidência o que avelhice é para cada espírito bemformado, o qual entende comocumpre o valor da vida.

A velhice no conceito cristãonão é um declinar; é um progres-so, de que bem podemos come-morar as grandezas, as alegriasíntimas, os deveres solenes e a su-prema esperança.

Quando com o progredir dosanos sentimos e reconhecemos quedescem uns princípios de sombrasaos nossos olhos, os primeiros fri-os nos nossos ossos, as primeirasneves a engrinaldar a nossa fron-te, somos tentados a exclamarcomo o Sol que se põe: «Eu decli-no». Sim, declinamos como, na re-alidade, tudo declina. Mas decli-namos quanto ao corpo: aí temoso velho inválido após 60, 70 anosde trabalho ao serviço de uma

imortal rainha. Mas é a esta Santarainha, à alma, que devemosolhar. E esta não declina. Pelo con-trário, sobe, sobe sempre.

Suponhamos que, nas noitessolenes do Pólo, um viajante devesubir a uma elevada montanha.Do cume, o sol invisível meses emeses, aparece-lhe no horizontelongínquo. Os cumes já estão ilu-minados, enquanto que a noitepolar ainda se estende aos seuspés no fundo vale.

Assim é a velhice. Pela largue-za e vastidão das perspectivas quese descobrem, pelos revérberos elampejos que se desvelam, pelascumeadas que cintilam e que bemdepressa serão coroadas por umsol que nunca se devera apagar,o viajor da vida, o velho pode – esó ele pode –, avaliar a atura aque o levaram os anos. Ele sobe…sobe sempre. Subindo leva consi-go a recordação da infância lu-minosa e alegre, passada debai-xo do tecto doméstico, sob o olharacariciador dos pais, entretecidade tantas pequenas coisas, que sechamavam brincadeiras, e na qualtambém já se originavam dores…

Depois as lembranças da virili-dade, com as canseiras, as respon-sabilidades, as obras… com diasventurosos e outros de trovoada…com lágrimas e glórias.

Subindo assim, levando apósde si preciosos tesouros, assoman-do à imortalidade, a velhice tor-na-se veneranda.

Veneranda pelo cabedal deexperiência que leva consigo.«Quando era menino, pensavacomo menino, falava como meni-no», disse S. Paulo de si, e todospodemos dizer de nós próprios.Chegados à idade avançada,desaparecem as ideias e palavrasinfantis: a mente está cheia de co-nhecimentos, as palavras do con-selho, as virtudes do exemplo, paraserem chamariz, estímulo e incita-mento para os jovens.

A vida da velhice ilumina-se,mas também se purifica. A purezado ar que corre nas alturas, corretambém nestes corações libertos dojugo das paixões e só preocupa-dos com as funções e com os des-tinos do espírito. Para encher dealegria completa a bela idadeavançada, dizemos com os discí-pulos de Emaús: «Fica connosco,Senhor, porque anoitece!»

Fica connosco, Senhor, paranos dar luz, força e alegria nosanos que ainda nos concederes,na garantia segura de que das glo-riosas memórias do passado re-montaremos às mais puras visõesda vida imortal.

Henrique maria dos santos

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ENCONTRO NACIONAL - Fátima 27, 28 e 29 de Abril 2007

«Os padres não podem casar e às mulheres – a maio-

ria dos fiéis – o poder vai continu-ar vedado» – assim escreveu oJornal de Notícias em 14/3/07, apropósito da recente ExortaçãoApostólica Sacramentum Caritatis.

Foi justamente esta situaçãoque conduziu à fundação daFraternitas e marcou as nossas vi-das e até outras vidas próximas denós, nalguns casos traumaticamen-te. Mas a situação mantém-secomo um aguilhão espicaçandopessoas em particular e a socie-dade em geral, a ponto de, voltae meia, se tornar notícia.

De facto, vistas as coisas comalguma atenção, esta autênticapedra de tropeço torna-se verda-deiramente absurda. É só olharpor um momento, sem interferên-cias perturbadoras: há algumacoisa no carpinteiro Jesus que separeça sequer com um padre, umbispo, um papa? Quem conseguever no pescador Simão um papa?Imaginemos um João padre, umTomé padre, o publicano Mateuspadre, o zelota Simão padre. Nãoficam ridículos? Imaginemo-losbispos com aquelas sotainas,aquelas faixas, aqueles cabeções,com aqueles paramentos, aque-les báculos, aquelas mitras. Nãoficam mais ridículos ainda? Todosnós, homens e mulheres, temosobrigação de conhecer bem osEvangelhos. Encontramos lá algu-ma coisa que cheire sequer a pa-dre? Olhemos outra vez. Encon-tramos lá alguma coisa que chei-re sequer a poder? O que lemosé que Jesus fustigou os sacerdotesque existiam, fugiu quando O qui-seram aclamar rei e morreu esma-gado «como um verme e não umhomem, o opróbrio de todos e aabjecção da plebe». E os mila-gres? E a sedução do Mestre, quearrastava multidões? Os milagresde nada Lhe valeram e as multi-

dões desfizeram-se como que porencanto quando o poder O desa-creditou completamente naquelejulgamento e naquela cruz.

Tudo se tornaria então simplesse não houvesse padres e se nãohouvesse poder, na Igreja. Exacta-mente a situação em que nos en-contramos: já não há aqui padrese não temos poder nenhum (sacer-dotes podemos ser nós, os homens

da Fraternitas, mas isso tem muitoque se lhe diga, desde logo por-que também as mulheres, pela suasimples vocação cristã, pertencema um «povo de sacerdotes»…).

Está aqui, pois, a terceira fragi-lidade da nossa Associação: a fra-gilidade institucional. A Instituição éhierarquia e é poder; nós não te-mos hierarquia nem poder algum.Não ocupamos sequer um deter-minado lugar na hierarquia, masaqueles de nós que nela ocuparamum lugar de destaque, como pa-dres, foram «reduzidos ao estadolaical», isto é, tornaram-se povo co-mum. Inesperadamente, se atentar-mos bem, somos agora, aqui reu-nidos na nossa pequena Comuni-dade, muito mais parecidos comaquele grupo que se reuniu à voltado carpinteiro de Nazaré, do quequando éramos quadros classifica-dos de uma hierarquia, segrega-dos do comum povo.

Agora não temos poder, nãotemos influência nenhuma nas ins-

tâncias do poder. E é nesta nossafragilidade institucional que está anossa força. Uma força que nãosabemos até onde poderá ir senela acreditarmos. Certo é quetoda esta força se perderá, se cair-mos na tentação de voltar à vidasegregada e ao poder hierárqui-co.

É de todo indiferente que ospadres sejam casados ou celiba-

tários: desde que haja padres, hápoder instituído, em nada diferentedo poder deste mundo, e portan-to contrário ao caminho do Evan-gelho. Já que nos encontramosfora da teia do poder, porquehavemos de desejar ser de novoenredados nela?

Fraternitas: Movimento com prazo de validade?

MUITOS OS CHAMADOSDeus chamou quatro pessoas para a Missão na Igreja. Cha-

mavam-se Toda-a-Gente, Alguém, Qualquer-Um e Ninguém.Toda-a-Gente tinha a certeza que Alguém responderia. Qual-

quer-Um podia fazê-lo, mas Ninguém o fez.Alguém zangou-se porque era um trabalho para Toda-a-

Gente. Toda-a-Gente replicou que Qualquer-Um podia tê-lo fei-to, mas Ninguém constatou que Toda-a-Gente não o faria.

No fim, Toda-a-Gente culpou Alguém, quando Ninguém fezo que Qualquer-Um poderia ter feito.

Estes três tópicos «As mulhe-res da Fraternitas», «O níveletário da Fraternitas», e «A si-tuação institucional daFraternitas» ajudaram a reflec-tir o grupo que se reuniu emFátima no Encontro Nacional.Mas a discussão não se esgo-tou lá.

Envie o seu comentário so-bre um, dois ou aos três tópi-cos para o correio electrónicodo Movimento (ver páginas 4e 5), como por exemplo:[email protected].

Depois, consulte os comen-tários na página da Internetwww.fraternitas.pt.

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COINCIDÊNCIAS

Era o funeral do Papa JoãoPaulo II. A urna com os res-

tos mortais do Papa era colocadaem lugar de destaque à vista detodos quantos localmente assisti-am. Sobre ela encontrava-se umaBíblia. As televisões transmitiam es-sas imagens para todo o mundo.

No momento em que os car-deais entravam em procissão paraocuparem os respectivos lugares,irrompeu subitamente uma forteventania, qual pequeno ciclone emredemoinho, que varria os solidéusdas cabeças dos purpurados, agi-tava violentamente os seus para-mentos e folheava freneticamentea Bíblia que estava sobre a urna.Foi patente a aflição de cada umdos cardeais com uma das mãosa segurar o solidéu enquanto a ou-tra impedia que os paramentosadejassem violentamente.

Passado pouco tempo o ventoamainou e a Bíblia fechou-se. Ascerimónias decorreram com todaa normalidade.

Era o dia da trasladação dosrestos mortais da Irmã Lú-

cia, do Carmelo de Coimbra paraa Basílica de Fátima. O evento es-tava a ser transmitido na íntegrapelas televisões nacionais. Eu se-guia as cerimónias pela TVI. Ocaso, que quero relatar, ocorreudurante a celebração da Eucaris-tia presidida pelo Senhor D. AlbinoCleto, na Sé Nova em Coimbra.

Foi na altura da consagração.Momento solene, silêncio profun-do: o celebrante pronuncia as pa-lavras da consagração do pão,eleva a hóstia, poisa-a sobre oaltar e genuflecte. E nesse precisomomento ouve-se na TV uma vozde homem quebrando o silêncio eanunciando: «Voltei! Voltei!» As ce-rimónias continuaram no seu ritmo.

No primeiro caso, não faltouquem se lembrasse da «forte raja-da de vento», referida na Sagra-da Escritura em Act. 2, 2, que en-

cheu toda a casa onde se encon-trava a pequena comunidade cris-tã. Então, o vento varria o velhoparadigma e abria caminho aonovo paradigma cristão. Vinhamaí tempos novos, caía o que nãoera autêntico e começava uma eranova, baseada no reconhecimen-to da dignidade da pessoa huma-na, na mensagem de Jesus. Na-quele momento, em que a comu-nidade cristã nascente era confron-tada com um novo programa acumprir, também lhe era transmiti-da a força e a audácia para oimplementar. Surgia a nova Igrejafundada em Jesus Cristo que iria

crescer sob a acção do EspíritoSanto.

É claro que a ocorrência da-quele tornado com o início da ce-rimónia fúnebre do Papa João Pau-lo II foi mera coincidência dum fe-nómeno meteorológico com umevento marcado por vontade hu-mana para aquela data. Portan-to, não passa de pura especula-ção tentar descobrir nessa coinci-dência eventuais interpretações desentido social ou religioso.

Mas quem, porventura, estiverpreocupado com o caminho quea comunidade eclesial está a per-correr na sua relação com este«mundo» a-religioso ou anti-religi-oso, ou com a lenta evolução da

comunidade dos crentes neste pósVaticano II, que hesita entre umsalutar progressismo e um regres-so ao antigo, e se interrogue so-bre os sinais orientadores que oEspírito Santo esteja a dar a en-tender, poderá muito bem lembrar--se do que aconteceu no dia dePentecostes: «Subitamente ressoou,vindo do céu, um som compará-vel ao de forte rajada de vento,que encheu toda a casa onde seencontravam» (Act. 2,2).

Como se o Espírito Santo qui-sesse hoje dizer àqueles velhos se-nhores: «Deixai arejar as vossaspurpúreas vestes, ventilai as vossasideias e hábitos demasiado imbu-ídos do espírito da Antiguidade,da Idade Média feudal e dos tem-pos modernos, não vos agarreisangustiadamente às vossas capaspurpúreas, com as quais pretendeisa todo o transe abafar qualquerideia nova, mas voltai finalmenteà fonte pura e refrescante da BoaNova de Jesus Cristo». (RudolfSchermann, KI, 05/05, p. 4)

Quase em jeito de resposta ede orientação, a ventania mostra-va rapidamente cada página daEscritura. É ali, naquelas páginas,que se descobre o roteiro de na-vegação da Barca de Pedro. UmaIgreja simples como uma criança,acessível aos humildes e ao servi-ço dos pobres. Nada do esplen-dor imperial romano, que é reinodeste mundo.

O caso de Coimbra foi certa-mente provocado pelo P. Rego (eraa voz dele), que era o comentadorda emissão, ao falar sem saberque estava no ar. Mas uma vozassim, naquele momento tão so-lene, remeteu-me para a voz quese ouviu quando Jesus foi baptiza-do nas águas do Jordão (Mt3,17), ou a voz vinda da nuvemno monte da transfiguração (Mt17, 5).

João Simão

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espiralespiralespiralespiralespiral Responsável: Fernando FélixPraceta dos Malmequeres, 4 - 3º Esq.Massamá / 2745-816 Queluze-mail: [email protected]

Boletim daAssociação Fraternitas Movimento

N.º 27 - Abril/Junho de 2007N.º 27 - Abril/Junho de 2007N.º 27 - Abril/Junho de 2007N.º 27 - Abril/Junho de 2007N.º 27 - Abril/Junho de 2007www.fraternitas.ptwww.fraternitas.ptwww.fraternitas.ptwww.fraternitas.ptwww.fraternitas.pt

O saudoso Papa João XXIII, quando decidiua realização do Concílio Vaticano II, um dos

objectivos seria «abrir as portas e janelas da IgrejaCatólica ao mundo inteiro», dando ocasião à «en-trada de novas lufadas do Espírito de Deus», para atornar mais fresca e acolhedora, expurgando ara-gens mofas, que afastavam dela o mundo e impedi-am muitos homens e mulheres de entrarem. Foi comesta forte e formosa esperança que se ficou, desde oseu anúncio até ao encerramento e consequente ca-minhar durante estas décadas. E este Pastor, a quemchamavam o «Papa bom», sempre se empenhou naconcretização do sonho, mesmo nos pequeníssimospormenores, tal como uma mãe carinhosa.

Paulo VI, que lhe sucedeu, tentou cumprir este pro-grama, arrojando-se a atravessar os Oceanos parafalar num grande areópago, a ONU, cumprindo nãosó o sonho do Papa do Concílio, mas também ummandamento do Senhor, que Lhe era tão querido:«Ide por todo o mundo, ensinai a Boa Nova».

João Paulo I, cujo Pontificado durou apenas 33dias, viveu de tal modo o Concílio, e não só, queisso lhe bastou para que lhe fosse já aberto o Proces-so de Beatificação. Também mereceu ser chamadoo «Papa do sorriso».

Sobre a acção de João Paulo II, durante 26 anos,nada mais há a acrescentar, tão fresca está na nossamemória…

Bento XVI singra na mesma Barca. A sua ida à

Turquia foi um acto de inspiração divina, no meuparecer, tal o mar de dificuldades que a antecede-ram, o inesperado êxito que teve e as consequênciasque se esperam, não só quanto àquele país, comoàs regiões circunvizinhas, a breve, a médio e a longoprazo, nomeadamente quanto ao ecumenismo.

Agora, depois da reflexão até aqui, dá-me von-tade de, sinceramente, me exprimir dizendo que anossa Santa Igreja Católica continua a olhar muitopara dentro de si própria e a preocupar-se muitocom as suas estruturas institucionais, organizativas,eclesiais e pastorais, mas que, na prática, muito poucotranspira para a vida cristã, individual, familiar, pa-roquial, diocesana, nacional e mundial. Do muitopouco que transpira, parece-me que fica tudo muitodistanciado, com muito pouco acesso ao comum doscrentes, mesmo que quase imperceptível, insuficientepara ser respirado pela (quase) totalidade dos cris-tãos, mesmo militantes. Assim, parece-me que é nãosó necessário mas mesmo urgentíssimo, inadiável (enão será já tarde?) dar uma volta…; em poucaspalavras «fazer penetrar o catolicismo de um maisforte humanismo«, isto é, cada católico interiorizar-sede um mais forte humanismo. Recorde-se o lema ins-pirado de João Paulo II: «A Igreja é o caminho doHomem!» Por outras palavras: a Igreja foi instituída/fundada e existe por causa do Homem! É precisoreflectir!...

CATOLICISMO COM FORTE HUMANISMO

José da Silva Pinto

No dia 11 de Janeiro passado, o Presidente daVenezuela, Hugo Chávez, ao fazer o juramento paraum terceiro mandato de seis anos, com a possibili-dade de promover uma reeleição sem limite, disseque o fazia em nome de «Cristo, o maior socialistada História». Na tarde do mesmo dia, Daniel Ortega,ao assumir a presidência da Nicarágua para os pró-ximos cinco anos, sustentou que «deve imperar o Rei-no de Cristo e não o reino das guerras, do empobre-cimento ou da destruição da natureza». É o mesmocomandante que, há anos, quando os bispos come-çaram a criticar os desvios marxistas do sandinismo,afirmou: «Eu creio em Cristo, mas não nos bispos».

A Igreja latino-americana reagiu a várias vozes,entre elas a de D. Felipe Arizmendi Esquivel, Bispo deSan Cristóbal de Las Casas, no México. Para o pre-lado, antes de tudo, é preciso distinguir o que se en-tende por socialismo. Se for considerado equivalenteao marxismo, que é um materialismo fechado à trans-cendência, centrado na economia e na boa inten-

ção de fazer a todos iguais, obstruindo as liberdadesindividuais e a iniciativa pessoal, é óbvio que estesocialismo já está superado pela História. E, portan-to, se o sistema socialista for identificado com o mar-xismo, Cristo não é socialista.

Ao contrário, se por socialismo se entende a lutapara que o sistema social, político e económico sejajusto e solidário, sobretudo para que os pobres vi-vam com a dignidade que Deus quer, isso está muitode acordo com o que Cristo veio ensinar. A Sua mai-or preocupação foi que aprendêssemos a amar-noscomo irmãos, com uma opção solidária pelos mar-ginalizados. Essa é a prova de que realmente o com-preendemos e de que somos discípulos Seus.

Os primeiros cristãos distinguiam-se por compar-tilhar fraternalmente os bens, de forma que entre elesnão havia quem passasse necessidades. Se isso é oque se pretende pôr em prática quando se fala desocialismo, bem-vindo seja! E todos teremos de com-prometer-nos em pô-lo em prática, pois nisso se vê anossa identidade cristã. A Igreja dará a sua contri-buição, mantendo-se fiel à sua Doutrina Social.

CRISTO, O MAIOR SOCIALISTA?