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1 ESPOLIAÇÃO LATINO-AMERICANA Uma leitura panorâmica e possibilidades de reações Valter Borges dos Santos 1 Resumo Este artigo é uma revisão do artigo O LADO NEFASTO DO CAPITALISMO, de minha autoria, que procura desnudar a espoliação que vitimou a América Latina a partir da visão de Eduardo Galeano, acrescidas, nesse presente artigo, da análise da conjuntura neoliberal, criminalização dos movimentos sociais e as possibilidades de reações a partir dos elementos conceituais do Manifesto do Partido Comunista 2 de Marx e Engels, finalizando com considerações sobre uma teoria da revolução brasileira. Palavras-Chaves: América Latina, Exploração, Marx e Revolução. Introdução O presente artigo é em cumprimento da exigência para a conclusão do Curso “Realidade Brasileira”, realizado pela Escola Nacional Florestan Fernandes. O presente artigo visa articular a questão histórica das espoliações a que foram sujeitos a América Latina e o Brasil, a partir da visão de Eduardo Galeano, a contínua espoliação através de novas de formas de exploração que culmina na versão atual de exploração do capitalismo, na sua forma neoliberal. 1 Teólogo, Licenciando em Ciências Sociais e Mestrando em Ciências da Religião, ambas pela UMESP. E-mail: [email protected] 2 Manifesto originalmente escrito em 1848, por Marx & Engels

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ESPOLIAÇÃO LATINO-AMERICANA

Uma leitura panorâmica e possibilidades de reações

Valter Borges dos Santos1

Resumo

Este artigo é uma revisão do artigo “O LADO NEFASTO DO CAPITALISMO”, de

minha autoria, que procura desnudar a espoliação que vitimou a América Latina a partir

da visão de Eduardo Galeano, acrescidas, nesse presente artigo, da análise da conjuntura

neoliberal, criminalização dos movimentos sociais e as possibilidades de reações a partir

dos elementos conceituais do Manifesto do Partido Comunista2 de Marx e Engels,

finalizando com considerações sobre uma teoria da revolução brasileira.

Palavras-Chaves: América Latina, Exploração, Marx e Revolução.

Introdução

O presente artigo é em cumprimento da exigência para a conclusão do Curso

“Realidade Brasileira”, realizado pela Escola Nacional Florestan Fernandes. O presente

artigo visa articular a questão histórica das espoliações a que foram sujeitos a América

Latina e o Brasil, a partir da visão de Eduardo Galeano, a contínua espoliação através de

novas de formas de exploração que culmina na versão atual de exploração do

capitalismo, na sua forma neoliberal.

1 Teólogo, Licenciando em Ciências Sociais e Mestrando em Ciências da Religião, ambas pela UMESP.

E-mail: [email protected] 2 Manifesto originalmente escrito em 1848, por Marx & Engels

2

Analisa também, á partir de Marx e Engels, as possibilidades de superação desse

sistema, numa leitura do Manifesto do Partido Comunista, que possibilite à superação

do atual sistema e suas tentativas históricas, finalizando na possibilidade de uma teoria

da revolução brasileira.

Os conceitos aqui apresentados fornecem uma base sólida que pode configurar

ambiente que permita uma reação revolucionária e libertadora para os flagelados

miseráveis latino-americanos, que vive desde a época colonial o crescimento da miséria

entre os proletários, revivendo-as nas novas formas de exploração, potencializado pelo

neoliberalismo.

Espoliação Latino-Americana

“... nos deram espelhos e vimos um mundo doente

Tentei chorar e não consegui”

Índios (legião Urbana)

A melancolia de Renato Russo é a melancolia do povo latino-americano, e de

todas as gerações pós-invasão europeia. A geração espoliada, dominada, forçada a viver

uma vida que nada tem a ver com sua cultura, forçada a executar trabalhos escravos

para sustentação alheia, sem nada em troca, sem nada, apenas um espelho que reafirma

o quão difícil foi assimilar esse mundo doente “tentei chorar e não consegui” (Índios,

RENATO RUSSO).

O capitalismo tem produzido mais miséria do que riquezas no contexto mundial,

e a América Latina tem sido a “mina de ouro” do capitalismo, ou seja, a fonte de onde

emanavam (e, emanam) rios de riquezas para manutenção da luxúria europeia e depois

estadunidense. Procurando definir as características do capitalismo na América Latina, e

mais especificamente no Brasil, é substancial perceber a importância de mergulhar nas

sequelas e efeitos colaterais de um sistema que exclui, rouba, espolia, enferma e não

mata (pois, é preferível manter doente o enfermo que deixá-lo morrer e secar a “fonte de

riquezas”, onde se pode explorar mais e mais).

É insaciável a fome capitalista, onde muitos são submetidos em condições

subumanas para o capricho de uma minoria, cuja disparidade da desigualdade aumenta

cada vez mais a cada ciclo estudado. Assim, desde quando aportaram naus europeias em

terras ameríndias o continente sustentou os países europeus na época do imperialismo

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ibérico, e, depois por meio do capitalismo através da espoliação sofrida, e, estes, agora,

num contexto imperialista neoliberal continuam a enganar, dominando, fazendo com

que os latinos olhem a si mesmos com os olhos dos dominadores,3 ludibriando com uma

falácia ideológica que não ameniza a dor, nem o sofrimento, muito menos a miséria; e

promove, no fim, a desvalorização do ser humano e a supervalorização do capital.

O vírus do capitalismo tem consumido internamente o doentio Continente

Latino-Americano, extraindo sua força vital, suas defesas, sua beleza, deixando-a sem

brilho, sem fontes, sem renda, sem trabalho, sem dignidade, sem nada...! Não é de

estranhar a frase de Galeano que diz que “no fim das contas, tampouco em nosso tempo

a existência dos centros ricos do capitalismo pode explicar-se sem a existência das

periferias pobres e submetidas: umas e outras integram o mesmo sistema.”

(GALEANO, 2009, p. 49). Essa constatação nos remete aos efeitos colaterais de uma

enfermidade endêmica. As “minas de ouro”, tão almejadas pelo capitalismo estão no

coração da América Latina, e, para tomá-las é preciso anestesiar, estudar, imolar, e,

promover a permanente invalidez, tornando este continente incapaz de reação e

recuperação, perpetuando a espoliação de suas riquezas. Mas será que não esboçariam

reações?

O lado nefasto do capitalismo age nas periferias miseráveis como fábrica de

miséria e miseráveis, e, está, na verdade, produzindo uma massa de excluídos tão

vultosa que assusta até mesmo o pior dos pessimistas. A acentuação das desigualdades

pode perturbar a já tão conturbada ordem mundial. Haverá (ou, já houve) um tempo na

qual o enfermo, depois de descoberto o diagnóstico, procurará o remédio para sua

enfermidade. Então a luta por sobrevivência não terá heróis, nem mocinhos, mas, tão

somente... Sobreviventes. Ouvem-se os gritos de independência, sentem-se as dores da

escravidão, veem-se as misérias dos miseráveis.

América Latina: Periferias Miseráveis - o lado nefasto

“...quem me dera, ao menos uma vez,

Provar que quem tem mais do que precisa ter

Quase sempre se convence que não tem o bastante

E fala demais por não ter nada a dizer”.

Índios (legião Urbana)

3 Galeano critica os ideólogos, impotentes, que ecoam a voz dos senhores do capital, incapazes de fazer

uma análise aprofundada da espoliação que eles próprios estão submetidos.

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O termo “nefasto”, segundo o Dicionário Michaelis, é um adjetivo, originário do

latim “nefastu”, que significa “que é de mau agouro; que causa desgraça; triste; lutuoso;

danoso; funesto”. Essas significações traduzem bem o que o capitalismo provoca na

grande maioria das pessoas e povos envolvidos, voluntária ou forçosamente, neste

sistema.

O acúmulo de capital a qualquer custo, realmente custou a vida de pessoas e

populações inteiras. Desde seus primórdios, o sistema capitalista vem colecionando uma

massa de excluídos e “doentes terminais” que, agora, estão buscando uma solução para

suas crises. A esperança depois da exaustão, após tantos séculos de contínua exploração,

é uma virtude, na qual o doente se agarra para levantar-se, curar-se, andar sozinho,

buscar autonomia, deixar de depender de médicos que não curam, mas que fazem de

tudo para o doente permanecer... doente..., com fins duvidosos! É o caso dos médicos

do terceiro Reich, como o Dr. Sigmundo Rascher em Birkenau, Dachau e Auschwitz,

que, a pretexto de descobrir técnicas de reanimação depois do congelamento, apoiados

pelo comando nazista, promoveram “experimentos” com jovens judeus4 onde para

congelá-los, colocavam a vítima numa cuba de água gelada, nus, e com uma sonda, que

media a queda de temperatura corporal, introduzida no reto da vítima5.

Assim, como aqueles jovens sofredores e injustiçados, os países latino-

americanos, foram, também, colocados “numa fria”, mas, quando perceberam a

gravidade, seus corpos já não conseguiam mais reagir e muitos morreram de hipotermia.

Certo economista afirmou que o capitalismo na América Latina é um

capitalismo tardio.6 Essa constatação é, utilizando a linguagem emprestada da

psicologia, a imposição de comportamentos maduros em crianças, incapazes de lidar

com responsabilidades, pela sua própria natureza. É semelhante aos pais irresponsáveis

4 Disponível em http://translate.google.com.br/translate?hl=pt-BR&langpair=en|pt&u=http://www.re

member.org/educate/medexp.html, acessado em 15/03/2012 às 01h40. Grifo meu. 5 Esses experimentos tinham a finalidade de simular as condições dos exércitos diante do frio, pois “as

forças alemãs estavam mal preparadas para o frio. Milhares de soldados alemães morreram de frio ou

estava debilitado por lesões [decorrentes] do frio”. “As experiências de congelamento foram divididas

em duas partes. Em primeiro lugar, para estabelecer quanto tempo levaria para baixar a temperatura do

corpo até a morte e segundo a melhor forma de reanimar a vítima congelada”. Sondas eram colocadas

no reto da vítima. Essa sonda era mantida no reto da vítima por um anel metálico expansível, que foi

ajustada para abrir dentro do reto para segurar a sonda firmemente no lugar. Soube-se que a maioria das

vítimas perdeu a consciência e morreu quando a temperatura corporal caiu para 25ºC. As experiências de

ressuscitação ou aquecimento eram tão cruéis e dolorosas como as experiências de congelamento. 6 Escutei essa teoria no Programa “A Invenção do Contemporâneo”, exibido pela TV Cultura em

03/05/2010.

5

que tiram suas crianças das escolas e as obrigam a sustentar a casa, colocando-as nos

faróis para pedir esmola. Essa prematuridade é um flagrante delito contra a pessoa

humana e suas possibilidades de estruturação. A América Latina fora obrigada a

sustentar os países europeus, por meio da Espanha, que empobrecida, recebia a riqueza

advinda da espoliação dos latino-americanos (GALEANO, 2009, p. 40), e,

imediatamente, essa riqueza era transferida para pagar os credores da Espanha.

Os credores do reino, em sua maioria estrangeiros, esvaziavam

sistematicamente a Arca Verde da Casa de Contratação de Sevilha, destinada

a guardar sob três chaves, e em três mãos distintas, o tesouro que vinha da

América. A Coroa estava hipotecada. Cedia por adiantamento quase todos os

carregamentos de prata aos banqueiros alemães, genoveses, flamengos e

espanhóis... Só uma mínima parte da prata americana se incorporava à

economia espanhola; embora fosse formalmente registrada em Sevilha,

paravam em mãos dos Függer, poderosos banqueiros que adiantaram ao papa

os fundos para terminar a catedral de São Pedro, e de outros grandes

usurários da época, no estilo dos Welser, os Sherts ou os Grimaldi. A prata

destinava-se também ao pagamento das exportações de mercadorias não

espanholas com destino ao Novo Mundo. (GALEANO, 2009, p. 41)

Enquanto a Europa se transformava com a espoliação dos tesouros latino-

americanos, esses optavam pelo suicídio para evitar sofrimento maior com a

obrigatoriedade do trabalho escravo, além de matarem seus próprios filhos.

Em sua busca por tesouros e bens, os europeus exterminavam pessoas, culturas e

tudo que não lhes interessavam. Amparada pela fé católica, que se debatiam sobre a

questão da alma dos negros e índios, os exploradores foram legitimados quando

combatiam os pagãos e os expatriavam de suas heranças (terra, cultura, dignidade

humana): os europeus, sim, eram os verdadeiros selvagens.

Essa visão, errônea, de mundo, escravizou os negros africanos, aprisionaram os

índios, não respeitando a pessoa, a dignidade humana, produzindo desigualdades sem

limite na América Latina, embora, a “roda” da economia dependesse desses pobres

miseráveis. Os dominadores surrupiaram a riqueza dos nativos, deixando um rastro de

violência, pobreza e miséria, pilhando milhares à margem da sociedade. Até hoje,

oligarquias lutam para manter seus poderes e domínios em detrimento da maioria “de

índios, pobres e negros”. Alguns problemas ainda existentes são a intolerância religiosa

e étnica, além das desigualdades sociais. Sim, nós, os latino-americanos, temos pobres,

desigualdade social, trabalho escravo, à mercê do capitalismo selvagem; falta de

educação superior aos pobres e negros, existem conflitos de natureza étnico-sociais e

divisões ideológicas; além disso, não podemos nos esquecer dos problemas fundiários e

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ambientais. Sim, hoje somos um continente subdesenvolvido, principalmente nas áreas

educacional, econômico e social. Somos vistos como uma sociedade de dominados.

Sim, há violência, dificuldades econômicas, baixo nível educacional, cultura e economia

subestimada, pobreza, exploração infantil: sexual e no trabalho. E a culpa é de quem?

O saqueio, interno e externo, foi o meio mais importante para a acumulação

primitiva de capitais que, desde a idade Média, possibilitou o surgimento de

uma nova etapa histórica na evolução econômica mundial. À medida que se

estendia a economia monetária, o intercâmbio desigual abarcava cada vez

mais segmentos sociais e regiões do planeta. Ernest Mandel somou o valor do

ouro e da prata arrancados da América até 1660, o espólio da Indonésia pela

Companhia Holandesa das Índias Orientais desde 1650 até 1780, os lucros do

capital francês no tráfico de escravos durante o século XVII, os ganhos

obtidos pelo trabalho escravo nas Antilhas britânicas e o saque inglês da

Índia durante meio século: o resultado supera o valor do capital investido em

todas as indústrias europeias até 1800. Mandel observa que esta gigantesca

massa de capitais criou um ambiente favorável aos investimentos na Europa,

estimulou o “espírito de empresa” e financiou diretamente o estabelecimento

de manufaturas, dando um grande impulso à revolução industrial. Mas, ao

mesmo tempo, a formidável concentração internacional da riqueza em

benefício da Europa impediu, nas regiões saqueadas, o salto para a

acumulação de capital industrial “A dupla tragédia dos países em

desenvolvimento consiste em que não só foram vítimas deste processo de

concentração internacional, mas também, posteriormente, tiveram de

compensar o atraso industrial, ou seja, realizar a acumulação original de

capital industrial, em um mundo inundado pelos artigos manufaturados por

uma indústria já madura, a ocidental” (Ernest Mandel, La teoría marxista de

la acumulación primitiva y la industrializacón Del Tercer Mundo, revista

Amaru, n. 6. Lima, abril/junho de 1968). As colônias americanas foram

descobertas, conquistadas e colonizadas dentro do processo de expansão do

capital comercial. (GALEANO, 2009, p. 48)

A riqueza nunca fora aplicada na própria região latino-americana, mas foi usada

para benefício de outras nações. A América Latina não estava preparada para ser

incluído, como primo pobre, na família capitalista, mas, assim mesmo, fora colocada

nessa associação, como aquele sócio que entra com a mão de obra e não tem direito aos

dividendos produzidos. Que o diga a África, as Índias e a América Latina! Mesmo o

pouco que ficava na colônia era praticamente administrado por mercadores, donos das

minas e grandes proprietários “que repartiam entre si o usufruto das mãos-de-obra

indígena e negra, sob o olhar ciumento e onipotente da Coroa e seu principal sócio, a

Igreja” (GALEANO, 2009, p. 48).

A não acumulação de capital na própria América Latina é um principio do atraso

das colônias. Os ingleses não se intimidaram em erguer sua indústria com o ouro

brasileiro, após o acordo com a Coroa Portuguesa:

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Celso Furtado fez notar que a Inglaterra, seguindo uma política clarividente em

matéria de desenvolvimento industrial, utilizou o ouro do Brasil para pagar

importações essenciais de outros países e pôde concentrar inversões no setor

manufatureiro. (GALEANO, 2009, p. 48)

O lado nefasto do capitalismo demonstrou como sobrepujaram a astúcia dos

colonizadores, primeiramente, enganando os nativos ameríndios, convencendo-os que

deveriam ceder seu ouro e sua prata sem resistência. Tomando emprestada a linguagem

bíblica do anticristo que, primeiramente, se manifestará como amigo, mas, que, depois

de um período se manifestará como carrasco mundial que destruirá a tudo e todos,

dominando e moldando o sistema religioso, político e econômico à sua ideologia

dominante, também, aqui, temos essa analogia. Os colonizadores dominaram tudo, e,

para levar todo o ouro, mataram o futuro de um continente, impondo uma cultura,

religião, sistema econômico e político que causa resignação, repulsa e escravidão.

Da Colonização ao Neoliberalismo: contínua espoliação

“... venha! Meu coração está com pressa

Quando a esperança está dispersa

Só a verdade me liberta

Chega de maldade e ilusão

Perfeição (legião Urbana)

As grandes transformações ocorridas no século XX contribuíram para acirrarem

mais ainda as dificuldades, já enormes, dos países latino-americanos. O

desenvolvimento do capitalismo gerou em seu seio um sem número de contradições

que, aliado ao imperialismo, patrocinou o aprofundamento da miséria, sofrimento e

decadência da América Latina. Destacamos que o capitalismo e o imperialismo

contribuíram, sim, para a situação terceiro-mundista do considerado subcontinente. A

instabilidade patrocinada pelo capital, que se desdobram em muito sofrimento,

desigualdades, injustiças; provocaram miséria, fome e empobrecimento intelectual e

cultural, além do sequestro de terras e mentes, fazendo dos latino-americanos uma

região castigada pela selvageria do capitalismo e de seu aliado: o imperialismo, que

domina e nos faz pensar como marionetes para manutenção de seu poder dominador.

O capitalismo, em sua práxis, está fundado em três pontos principais:

concentração de renda e terra; exploração de mão de obra; consumismo. Esses fatores,

articulados durante a história, em diversos contextos, locais e épocas, produziram muita

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miséria, dor, sofrimento, além de indignação, revolta e desejo legítimo de liberdade. Na

América Latina, a história não foi diferente. Longe do centro do poder político e

econômico, sofreu com as atrocidades advindas, primeiramente, da colonização

europeia, que introduziu seu domínio, com as armas, produzindo muita violência, com a

finalidade de explorar o máximo que puder das novas terras.

É notório a todos que a América Latina foi vitimada pela imposição europeia de

sua cultura, religião, além de modelos políticos que visavam à implantação de sistemas

de exploração, escravidão e domínio das mentes. Portanto, desde o século XVI os

latino-americanos foram obrigados a viverem sob a coação e exploração. As capitanias

hereditárias, sesmarias, foram formas de governos, que associada à religião da época

(catolicismo português e espanhol) impôs o domínio de poucos sob uma multidão

incalculável que, consideradas selvagens, sem alma, eram, portanto, sujeitos aos

dominadores. Não na vbvisão dos colonizados!

Essa imposição foi fundamentada na necessidade de extrair riquezas das terras

latino-americanas, através do roubo (espoliação) a fim de sustentar a luxúria europeia,

enriquecendo aquelas nações. A América Latina, desde o século XVI passou a sofrer

contínuas ingerências e intervenções dos países europeus, que, em sua ânsia

imperialista/colonialista “estuprou” com violência as nações ameríndias, capturando

suas terras, sua gente e suas mentes, num carrossel de matança, escravidão, exploração

dos bens naturais, deixando um rastro de morte, fome, desrespeito, e roubo, aliás, muito

roubo: de terras, bens e pessoas. Com o chamado darwinismo social, tiravam africanos

de suas terras, e plantavam nas terras latino-americanas a fim de, junto com o trabalho

forçado indígena, multiplicar a produção, com mão de obra escrava, com o propósito de

produzir mais riquezas. Ocuparam os espaços, levando riquezas para suas nações. A

partir do século XIX, com a revolução industrial, velhas formas de exploração foram

adaptadas pelo mercado e o neoliberalismo, que no seu âmago, trouxe novas formas de

expansão.

Como as grandes economias necessitavam desenvolver-se e, para tanto, minerais

e matérias primas faziam-se necessários, não é demais relembrar que, a “fonte de

riqueza” latino-americana fluía muito ainda, para sustentar os impérios. Então, as novas

formas de espoliação vieram com outra face (a face oculta), ora através dos golpes de

Estado, revoluções, espionagens e aventuras nas selvas amazônicas, ora através da

mídia, da imposição da cultura, e, também, da força. Os empréstimos, a pretexto de

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desenvolvimento, as investidas enclausuradoras do FMI, o protecionismo, a invasão dos

bancos, as multinacionais, as importações de produtos industrializados, enfim o

capitalismo tardio fazia sangrar cada vez mais as sensíveis couraças da resistência

latino-americana.

A situação colonial que a América latina foi vitimada persistiu por mais de três

séculos, quando os movimentos de independência passaram a acontecer.

Inevitavelmente, em pouco tempo, todos os países buscariam e conseguiriam sua

liberdade, não só política, mas (esperava-se) econômica, também. A sustentabilidade

deveria ser abalizada pela reforma agrária, de forma a expelir a concentração de terras,

cujos donos exploravam os trabalhadores nativos. Então, os burgueses, a igreja e o

Estado, articularam de forma que a concentração de riqueza perdurasse e perpetuasse

nas mãos de poucos. Assim com a transição do colonialismo ao capitalismo, da

revolução comercial à grande indústria; a revolução burguesa no sentido econômico e

político formaram monopólios, fizeram com que as terras continuassem de alguma

forma, no poder desses poucos, onde se acirrava a concorrência capitalista, com poucas

empresas comandando setores inteiros de produção.

Assim, a revolução industrial, não foi uma revolução para o bem de todos,

inclusive dos pobres, mas uma revolução burguesa, que visava, com seus conceitos, a

contínua exploração de mão de obra, o enriquecimento da minoria (cada vez menor), e

consequentemente a miséria.

O capitalismo e o imperialismo estão, na verdade, intimamente ligados e

relacionados. O capitalismo se utilizava do imperialismo para expandir sua dominação

dos mercados, e na busca por mão de obra escrava (barata), bens e terras. Entretanto, na

procura por expansão de mercados, não sendo mais contidos por Estados, estes

passaram a servir o capitalismo, na busca por mais mercados. Desse modo, todos os

países fazendo a mesma coisa, no capitalismo, uma crise era eminente, principalmente

por conta da necessidade de re-divisão inter-imperialista do mundo, quando, por conta

disso, estouraram a 1ª Grande Guerra Mundial.

Assim, se instalou crises generalizadas, insatisfações e o crescimento da

hegemonia norte-americana, e, em paralelo a tudo isso, a ascensão do comunismo, como

busca pela superação capitalista (o que veremos no capítulo “Um Chamado à Superação

do Capitalismo”, mais a frente).

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O capitalismo se fortalecia com o fordismo e seus conceitos de produção em

grande escala, o que se fazia necessário buscar mais mercado, e, consequente mão de

obra barata. Somando-se isso ao nacionalismo dos países europeus, que buscavam

refrear a expansão norte-americana e de seus vizinhos, crescia o protecionismo,

impedindo a expansão capitalista, assim inicia-se a briga por espaços e estados,

estourando a 2ª grande guerra, principalmente com a força do nacionalismo alemão.

Após a 2ª guerra mundial, houve a divisão do mundo (novamente) em duas

partes: comunistas e capitalistas. “Forças ocultas” procuravam minar as condições dos

países que resistiam ao capitalismo e eram simpáticos ao socialismo. Essa simpatia era

o resultado natural dos anseios de uma sociedade que conhecia apenas um lado (o lado

nefasto do capitalismo). Assim, o desejo por um novo sistema que propiciasse novas

condições, mais justas, era imperativo e urgente, devido ao grande sofrimento das

populações latino-americanas. E o socialismo era esse modelo alternativo, é o que

falava a linguagem dos pobres e sofridos, dos dominados. A necessidade de contrapor a

ideologia imperialista/capitalista, mesmo àqueles que não optaram pelo modelo

alternativo do socialismo, quando pretendiam sua emancipação eram tidos como tais, e

apresentados de forma negativa, através da mídia, também, a serviço do sistema

capitalista. Até hoje, a demonização do termo (comunista) causa repulsa e graves

dificuldades àqueles que desejam mudanças, e que se opõe aos interesses dos donos do

capital.

O capitalismo e o imperialismo são duas faces da mesma moeda: de um lado,

poder, de outro, a riqueza. A resistência a essa “dupla dinâmica”, fez explodir no mundo

todo lutas por mais independência, pois, os países pobres, escravizados pelo capitalismo

(portanto, explorados ao extremo), passaram a reagir e desejar novo modelo de sistema

econômico e político, que viabilizasse mais dignidade ao ser humano explorado e

excluído desse sistema. A América Latina, vítima desse sistema mundial excludente,

perdeu e perde muito com a exploração de suas riquezas, terras e gentes.

Dominação e exploração estão na veia do capitalismo que abriu vários fossos de

desigualdades sociais, auxiliados pelo imperialismo das grandes potências. Esses

compravam produtos baratos e revendiam a preços exorbitantes, deixando cada vez

mais pessoas na marginalidade. Assim, mais detidamente, nos países latino-americanos,

todos os movimentos de independência política e financeira eram considerados

“comunistas”, portanto, na visão capitalista, marginais; pois estavam desestabilizando

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os interesses do capital. Quando os interesses do capital ficavam prejudicados, o Estado,

a serviço do capital, influenciou direta ou indiretamente nos governos, intervindo na

forma de Golpes de Estado, que estouraram por todos, ou, pelo menos na maioria, dos

países latino-americanos. A finalidade era proteção ao capital, e a perpetuação da

exploração de mão de obra, com a finalidade de concentrar mais capital, explorando os

trabalhadores, que não podiam usufruir do fruto de seu trabalho, uma vez que, sua

produção, era direcionada a outros mercados.

Assim temos a parceria Estado-Capital, e posteriormente, a submissão do Estado

ao capitalismo, inclusive ao capital financeiro, onde ficaram sujeitos às oscilações do

movimento do capital mundial. Eis o retrato da geopolítica latino-americano! Reduzidos

e submetidos à colônia do capital e imperialismo estadunidense.

O capitalismo, negando suas contradições, a cada ciclo de crise, se reinventa. O

nascedouro do neoliberalismo (modelo atual) deu-se, quando, na década de 70, Hayek e

seus amigos elaboraram uma proposta (neoliberal) que tinha como ponto central o

combate ao Estado de Bem-estar europeu e ao New Deal norte-americano. Eles

propuseram uma orientação ideológica com a finalidade de combater o keynesianismo e

o solidarismo e preparar as bases de outro tipo de capitalismo, duro e livre de regras

para o futuro. Sendo, contrários a toda e qualquer regulação do mercado por parte do

Estado.

Hayek e seus companheiros argumentavam que o novo igualitarismo, embora,

ainda, relativo, promovido pelo Estado de bem-estar, destruía a liberdade dos cidadãos e

a vitalidade da concorrência, da qual dependia a prosperidade de todos, segundo eles.

Defendiam que a desigualdade era um valor positivo para as sociedades ocidentais.

A Inglaterra, através do governo Thatcher, foi o primeiro país empenhado em

colocar em prática o programa neoliberal, sendo este o pioneiro e o mais puro dos

projetos neoliberais.

O governo Thatcher contraiu a emissão monetária, elevaram as taxas de

juros, baixaram drasticamente os impostos sobre os rendimentos altos,

aboliram controles sobre os fluxos financeiros, criaram níveis de desemprego

massivos, aplastaram greves, impuseram uma nova legislação anti-sindical e

cortaram gastos sociais. Lançando, posteriormente, um amplo programa de

privatização, começando por habitação pública e passando em seguida a

indústrias básicas como o aço, a eletricidade, o petróleo, o gás e a água. Esse

pacote de medidas é o mais sistemático e ambicioso de todas as experiências

neoliberais em países de capitalismo avançado. (ANDERSON, 1995)

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Já nos Estados Unidos a história foi diferente, embora sua “prioridade neoliberal

era a competição militar”, segundo Anderson:

A variante norte-americana era bem distinta. Nos Estados Unidos, onde quase

não existia um Estado de bem-estar do tipo europeu, a prioridade neoliberal era

mais a competição militar com a União Soviética, concebida como uma

estratégia para quebrar a economia soviética e, por esta via, derrubar o regime

comunista na Rússia. Deve-se ressaltar que, na política interna, Reagan

também reduziu os impostos em favor dos ricos, elevou as taxas de juros; e

aplastou a única greve séria de sua gestão. Mas, decididamente, não respeitou a

disciplina orçamentária; ao contrário, lançou-se numa corrida armamentista

sem precedentes, envolvendo gastos militares enormes, que criaram um déficit

público muito maior do que qualquer outro presidente da história norte-

americana. (ANDERSON, 1995)

As ideias de Hayek e o neoliberalismo nascente consideram que (1) O

liberalismo é uma teoria não estacionária (que foi cerceada). (2) A liberdade como

queriam os socialistas é utópica – ressignificação do conceito de liberdade. (3) Deve

haver alternativas para economias planificadas, dirigidas: não um laissez-faire, mas uma

estrutura racional para competição. (4) Uma direção centralizada das atividades

econômicas pressupõe um amplo código comum de valores. (5) À medida que a esfera

de ação do governo se expande, a possibilidade de acordo diminui - a ilusão de um

"controle" democrático – sendo a liberdade e não a democracia como valor máximo. (6)

O primado da liberdade numa sociedade livre nenhum propósito pode permanentemente

dominar todos os outros; nem mesmo a eliminação do desemprego; mas que, segundo

Hayek, a realização da maior parte de nossas esperanças depende de um rápido

progresso econômico.

Ao analisar historicamente o neoliberalismo, Anderson conclui que um balanço

acerca do neoliberalismo “só pode ser provisório”, considerando-o, ainda, como um

movimento “inacabado”. Segundo Anderson, economicamente, o neoliberalismo

“fracassou, não conseguindo nenhuma revitalização básica do capitalismo avançado”.

Ele afirma, ainda, que socialmente, conseguiu “muitos dos seus objetivos”, ao

promover sociedades mais desiguais. Anderson concorda que “política e

ideologicamente” o neoliberalismo foi além de seus propósitos ao disseminar a ideia

hegemônica de que não existe alternativa “para os seus princípios” e que todos devem

se amoldar às normas neoliberais, embora “milhões de pessoas não acreditem em suas

receitas e resistam a seus regimes”.

Anderson afirma que aguarda por parte dos opositores do neoliberalismo novas

propostas, isto é, “outras receitas e preparar outros regimes”, mas que há uma incógnita

13

quanto ao tempo e espaço em que uma nova onda surja para surpreender e brecar os

rumos neoliberais.

Com a crise que se instalou desde 2008, provocada pela irresponsabilidade do

mercado, o capitalismo neoliberal esperava pelo socorro urgente de um “pai” [leia-se

Estado], ou mesma uma “seguradora” [leia-se, novamente, Estado] que socorresse a

tempo o mercado que sucumbia vítima do próprio veneno.

Alguns especialistas se dividiam da forma que isso se daria. Em suas teorias,

passaram a formular o papel do Estado em tais circunstâncias de crise: ora observador e

ora interventor.

Ocorre que eles, segundo Beluzzo, economista, não entenderam que o Estado e o

mercado estão, intrinsecamente, interligados, e que a “farra financeira” criara bolhas,

não sendo, portanto uma falha do Estado, mas uma série de ações fundadas numa fusão

de interesses, onde as relações entre Estado e mercado são orgânicas e constitutivas. A

segurança das instituições privadas de finanças é a capacidade do Estado em garantir o

“ganho” por meio da “existência de um estoque de ativos líquidos e seguros emitidos

pelo governo do país hegemônico”.

Ou seja, o próprio sistema capitalista sempre será vítima de si mesmo.

É interessante a postura de alguns especialistas que promovem uma áurea de

“esperança” de solução da crise. Entretanto, a crise se agrava e pode contaminar

economias periféricas, pois a emissão de moeda norte americana, que a princípio,

patrocinaria a retomada do crescimento, não sem antes “produzir” guerras para reativar

a economia estadunidense, paga por todos os povos que usam a moeda norte-americana

em seus intercâmbios.

A crise pode chegar logo ao Brasil, de forma mais robusta, pois, atualmente, ela

está maquiada com um crescimento pífio que se apresenta, mas sua estrutura econômica

já está afetada. As exportações brasileiras já estão atingidas e com isso o atraso

brasileiro permanecerá, ainda, por muito tempo.

Estado e capitalismo estão de mãos dadas, quando um não está bem, o outro o

sustenta “segurando sua mão”, e vice-versa, não sem um custo muito alto: seres

humanos, que sofrem muito nesse processo, até de forma fatal.

Interessante que esses seres humanos são o que mantêm, mesmo que

inconsciente, e sustentam este sistema, através do consumismo e do pagamento dos

Impostos a que são sujeitos, por isso os dois [Estado e mercado] se mantêm, através de

14

discursos enganadores, ou seja, pela ideologia dominante. Em suma, muda-se a forma

de gestão do capitalismo, mas ele continua reinante com as bênçãos do Estado.

O Brasil como resultado da espoliação

Colonização, escravidão e latifúndio são fatores que marcaram a formação

política brasileira, contaminando todas as relações políticas.

O “encobrimento” da cultura nativa no novo mundo, conforme Dussel, marca a

existência da América Latina, comprometendo a originalidade e privilegiando a

reprodução, levando-nos à dependência extrema externa, desnudando a realidade da

dominação e opressão que foi submetida os países sul-americanos. Assim, a espoliação

do Brasil foi ajudada pela figura do homem cordial, incapaz de se desvincular da

família, que favorece o ímpeto de dominação externa dominado pelo colonizador

ibérico, que busca status e riqueza fáceis.

O Estado e a sociedade vão-se, então, reproduzir esse relacionamento na qual

“este espírito de fidalguia, característico da cultura ibérica, orientou a colonização”

(Piza, 2010, p. 60). Assim há uma crônica do atraso, onde a modernidade não pode se

desenvolver, pois não há igualdade, nem direitos iguais, muito menos justiça, pois

prevalece a lei da dominação, onde se privilegia poucos em detrimento de muitos.

Isso é facilmente compreendido pelo desenvolvimento político no Brasil, onde

após as revoltas e movimentos pretensamente revolucionários, a independência

manifestou mais em uma disputa de poder, onde após esmagar a revolução, a burguesia

nacional se impõe, com as massas populares mantidas em uma sujeição completa, “por

meio de leis e instituições opressivas, passam para um segundo plano, tornando-se

passivas, politicamente passivas” (Piza, 2010, p.63).

Assim, o opressor, se manteve com privilégios desde a colonização, onde, com o

predomínio das grandes propriedades, a escravidão indígena e africana, forma-se uma

classe de opressores e outra de oprimidos, sendo a política moldada de acordo com esta

relação de produção. Então, vemos que a política continua submetida aos interesses de

poucos, em todas as fases do desenvolvimento político no Brasil: onde leis favorecem

poucos, e muitos veem reproduzir em suas vidas a injustiça, impunidade, desigualdade e

desrespeito à pessoa humana.

15

Faz parte da estratégia capitalista, reduzir toda forma de alternativas e de lutas

contra esse sistema. Um exemplo é a frequente criminalização dos movimentos

populares e sociais.

A criminalização sistemática dos movimentos sociais no Brasil tem seu foco

centralizado em impedir o seu crescimento e fortalecimento. Não é comum os

movimentos sociais receberem apoio de governos, pois os mesmos servem aos

dominadores capitalistas, cujas riquezas estão apoiadas na propriedade privada e dos

desdobramentos daí decorrentes.

A América Latina é um dos continentes mais injustos, socialmente, do mundo.

As discrepâncias sociais beiram o absurdo, o fosso das diferenças sociais, e, de renda,

são fenomenais. As reformas necessárias nunca ocorrem, e o que se vê é uma luta

silenciosa, que vez ou outra, desponta na mídia, interessada apenas em destacar os

piores momentos de enfrentamentos desses movimentos, principalmente, quando são

confrontados com os latifundiários, industriários, varejistas, construtores, banqueiros,

entre outros.

A mídia que se alimenta dos rios de dinheiros da burguesia, se alia a essa, e,

propõe uma pauta nacional, na qual os movimentos sociais não têm vez nem voz. As

reportagens tendenciosas desprezam a verdadeira razão desses movimentos: justiça

social, moradia, trabalho, escola, segurança, bem-estar, futuro... São necessidades reais,

verdadeiras, nuas e cruas, cuja urgência é deixada de lado, pois os usurpadores de terra,

renda, e trabalho; não pretendem compartilhar da valorização dessas pessoas.

Para uns, esses movimentos, nada mais são do que entraves para seus objetivos

de dominação total das riquezas das terras brasileiras. Os movimentos sociais, para os

burgueses, incomodam, pois, denunciam (1) o fracasso do capitalismo; e, (2) a exclusão

proporcionada, em grande escala, mas, silenciosa, do sofrimento de grande parcela da

sociedade para os privilégios de poucos. Para o capitalismo, esses movimentos são a

doença, é o câncer que precisa ser extirpado. Mas de que forma? Pois, numa sociedade

“democrática” (?), atitudes anti-humanas podem prejudicar a imagem de grandes

empresas, pois, afinal de contas, os consumidores podem deixar de fazer movimentar a

roda da fortuna delas, por isso a aparência de “bons-moços”.

Então, aproveitar e usar da mídia para banalizar as origens, os fundamentos e as

razões que mobilizam milhares de pessoas pelos seus direitos, aliás, já preservados pela

Constituição, é a tônica dos donos do poder. A mídia, portanto, em troca de muito ouro,

16

se serve de “matadores de aluguel”, com a finalidade, de produzir matérias que

demonstram apenas a fúria dos movimentos. Eles são provocados, e impotentes, fazem

uso da força a fim de serem lembrados e criminalizados num país cuja Constituição

Federal, apelidada da Constituição Cidadã, está só no papel!

Procurar esconder as reais injustiças feitas em décadas no Brasil contra os menos

favorecidos, e produzir factoides, interessa a grande elite, que não quer ser incomodada

pelos Zés, Marias e Franciscos; que foram expatriados de sua própria pátria, deserdados

de suas próprias terras, cuja alma e dignidade foram arrancadas com muita força,

deixando um mar de sangue, suor e dor.

Enquanto o Brasil preterir os debates políticos e preferir o futebol; enquanto

fazem carnavais e enchem a “cara” de cerveja, e acharem que alcançamos o patamar de

primeiro mundo, iludidos pelas pinturas nas ruas em épocas de eleição, e engodo do

político demagogo profissional, haverá milhares Joãos, Severinos e Terezas, que

morrem lutando por um direito já conquistado, mas deles violentamente tomados. Como

disse Martin Luther King “O que me preocupa não é o grito dos maus. É o silêncio dos

bons”.

Mas, enquanto isso, a luta continua! Não se pode continuar indiferentes. “Temos

de nos tornar na mudança que queremos ver” (Mahatma Gandhi). Pois se podemos,

devemos!

Piorando essa situação, temos o advento da tecnologia que, no fim das contas,

contribui para a perpetuação do sistema capitalista, pois, suas inovações são,

imprescindivelmente, feitas para baratear o custo de produção, eliminando postos de

trabalhos, e interferindo diretamente nas relações sociais.

Cada vez mais vai se precarizando as condições mínimas necessárias para a

manutenção de laços humanos (importantes para a sociedade) nas relações sociais. A

“corrida pelo ouro” que influencia toda sociedade, promovendo uma concorrência sem

limites, faz do crescente relativismo uma “arma” que serve à burguesia; que, por sua

vez, se utiliza disso favoravelmente, de forma a desarticular a sociedade e os

trabalhadores.

Isso conduz a uma anestesia social geral que leva ao ostracismo toda

possibilidade de luta contra esse mesmo sistema. Assim, sem resistência, o sistema

capitalista, que continua enriquecendo poucos e empobrecendo muitos, perpetua o

17

círculo vicioso de exploração, exclusão e miséria. Esse amortecimento é prejudicial,

pois, os seres humanos aceitam pacificamente o sistema que os explora e os escraviza.

Um chamado à Superação do Capitalismo

O conhecimento da história é imprescindível para interpretar a sociedade e suas

contradições presentes e construir um futuro diferente e melhor. A importância do

conhecimento da história faz-nos compreendermos quem somos, e porque agimos como

agimos. Além disso, nos fornece possibilidade de alterar a realidade futura, aprendendo

e refletindo com os erros do passado.

Os fatos históricos são relatos que nos são passados, entretanto, é preciso fazer a

interpretação desses fatos, e isso altera profundamente nossa compreensão da história.

Um conhecimento correto dos fatos históricos nos dá a possibilidade de acertos na

interpretação deles, não sem antes termos um critério importante: o tempo.

Foi Fernando Braudel quem definiu o tempo como fator imprescindível para

compreensão da história, pois, esse fator, pode nos revelar aspectos diferenciados do

mesmo fato histórico. Ao tempo, portanto, atribuímos às diversas interpretações de um

mesmo fato histórico. Onde, pode-se abordar o passado a partir de três compreensões do

tempo: tempo breve – ou curta duração -; tempo conjuntural – período maior -; e tempo

de longa duração – que destaca as estruturas econômicas.

Durante a formação da escola precedente, a historiografia positivista tem se

prevalecido, onde entendiam que a função da história era organizar certa narrativa de

fatos a partir dos documentos oficiais, destacando heróis do passado e datas mais

relevantes, pois, para muitos, decorar datas, nomes de grandes personagens e conhecer

os eventos mais importantes era compreender a história. Um equívoco, pois com a

escola dos Annales e o marxismo é dado importantes passos, lembrando-se dos agentes

esquecidos da história, obrigando-nos a re-interpretar a história.

Portanto, após essa breve análise histórica da espoliação que o continente latino-

americano atravessou, e ainda atravessa; passamos a considerar as soluções

apresentadas no conteúdo do Manifesto do Partido Comunista.

Marx e Engels fizeram constatações importantes e propuseram mudanças de

sistemas de produção que possibilitem a diminuição das desigualdades, finalizando esse

18

processo contínuo de exploração das massas. Eles demonstraram, inicialmente, a

constatação já historicamente comprovada da contínua luta de classes, acentuada no

capitalismo. Relatam como se deu o desenvolvimento da burguesia e o proletariado. O

conteúdo expressos no Manifesto Comunista versa sobre conscientização e

reivindicação, além de fornecer bases teóricas para fundamentação das razões de suas

ações, fomentando mais indignação contra a burguesia exploradora. Diante da opressão

da burguesia, Marx e Engels tecem sua teoria social e passam a denunciar a ameaça

burguesa, detalhando a crueza dessas relações sociais e dos conflitos entre burgueses e

proletários, com o aprofundamento das desigualdades, por conta do sistema de produção

capitalista.7 Essa realidade, Marx desmascara sem piedade, expondo a nu, as entranhas

do poder que promove o declínio do proletariado, transformando tudo, inclusive

pessoas, “a meras relações monetárias” (MARX & ENGELS, 2010, p.46).

Depois de explicitar seu ponto de partida, demonstrando a luta atual de classe

(burgueses/proletariados), Marx, passa então, e definir outro ponto: a associação entre

proletários e comunistas. Para isso procura mostrar que o comunismo não é um partido,

mas uma representação cujos objetivos são a “constituição do proletariado em classe,

derrubada da dominação da burguesia e a conquista do poder político pelo proletariado”

(MARX & ENGELS, 2010, p.59). Para seus fins defende o fim das relações de

propriedade,8 e que os salários

9 deixem “o caráter miserável dessa apropriação...”

(MARX & ENGELS, 2010, p.61). Com essas informações partilhadas, Marx e Engels

passam a analisar a relação exploratória na dicotomia burgueses/proletários, abordando

temas complexos como a “liberdade burguesa”, “família burguesa”, “educação

burguesa”, entre outros assuntos pertinentes. Enfim, Marx procura responder a cada

acusação burguesa, que questiona o modo de produção comunista. Acontece, que eles,

os burgueses, não têm razão, nem argumentos suficientes para manutenção de seu status

quo, portanto Marx passa a “pregar” a revolução comunista, mostrando seu caráter

revolucionário.

7 O capitalismo, entre outras coisas, requer a exploração do trabalho de seres humanos, e a fermentação

de um mercado que acabou extrapolando as barreiras nacionais, fazendo “quebrar” os pequenos

empreendimentos familiares, sempre acompanhadas pela ação política. 8 Não a propriedade conquistada adquirida pelo “suor” de seu próprio trabalho, que deve ser preservada;

mas a propriedade advinda do sacrifício de trabalhadores miseravelmente remunerados, pela qual a

burguesia se apropriou. 9 Marx não condena a apropriação pessoal dos produtos do trabalho, mas destaca que essa apropriação é

extremamente pouca, em função de permitir apenas a subsistência do trabalhador; o que defende ele é

melhores salários de forma que o trabalhador possa viver dignamente, e se desenvolve como ser humano

em todos os aspectos de sua vida. Não vivendo exclusivamente para dar lucro aos seus senhores.

19

Marx e Engels revisitam as formas de superação do capitalismo, e, demonstra as

várias formas de socialismo através de sua literatura. E, após, análise desses

documentos, percebe-se uma apologia ao comunismo, onde, demonstra que os

socialismos reacionários, feudal; pequeno-burguês, alemão; e, o socialismo burguês;

não tiveram fôlego suficiente para a ruptura. Sua atuação não ultrapassava o aspecto

teórico, não conseguindo impor uma revolução real, concreta. Marx e Engels, ao

relataram comparativamente as várias fases do socialismo, demonstram a força do

comunismo, fornecendo, enfim, a posição do partido comunista, conclamando todos à

revolução, dizendo: “Proletários de todos os países, uni-vos!”.

Marx e Engels procuram fornecer subsídios esclarecedores acerca da vocação do

Partido Comunista, ora esclarecendo alguns pontos, ora respondendo a seus opositores,

ora redefinindo estratégias de atuação, inclusive procedendo aos movimentos anteriores,

demonstrando seu caráter revolucionário. Marx, portanto, define a posição dos

comunistas, assim: “Os comunistas lutam para alcançar os interesses e objetivos

imediatos da classe operária, mas no movimento presente representam ao mesmo tempo

o futuro do movimento” (MARX & ENGELS, 2010, p.81). Marx entende que cada país

possui características próprias, mas, sem nunca negar o caráter revolucionário do

movimento comunista, conclamou os proletários dentro de sua realidade histórica, e,

hermeneuticamente, para todos nós, hoje; motivando uma resposta simples, mas, que

demonstra sua força; quando afirmam “Unidos, venceremos!”. Aqui eles respondem, na

verdade, ao chamado imperativo, que deve ressoar por muito tempo ainda: “Proletários

de todos os países, uni-vos”!

Com a declaração “um espectro ronda a Europa”, Marx e Engels demonstra

desde a introdução do Manifesto Comunista o tom de denuncia que prevaleceria nos

escritos dado o contexto de forte ação ideológica da burguesia dominante que propunha

enfraquecer toda possibilidade de novos levantes, depois de alguns movimentos

operários intentarem insurreições, mesmo que fracassadas sob as diversas variantes. O

manifesto, então, era um esclarecimento e ao mesmo tempo um chamamento. Era uma

denúncia e o chamado a mudanças, à revolução.

O manifesto não foi o início de tudo, mas uma materialização de um processo de

reorientação e reorganização, sendo ele o resultado ou redação final de um documento

resultante de dois congressos de intensos debates. E, que, mais tarde, com sua

divulgação, e ao mesmo tempo com a entrada da Liga dos Justos na política, eclodia a

20

revolução que se estenderia para toda a Europa, cujo caráter revolucionário está em sua

atuação concreta em favor do proletariado, levando em conta seus protagonistas,

promovendo a ruptura com a atual cosmovisão burguesa, eclodindo no fim da

propriedade privada. Sem a qual qualquer movimento que se insinue a favor dos

proletários, não se sustentaria tendo em vista a atual conjuntura do sistema de produção

capitalista.

E, esse fato, desde Marx, não é algo disfarçado, nem escondido, mas patente a

todos. Eles não negam suas origens, mas “declaram abertamente que seus objetivos só

podem ser alcançados com a derrubada violenta de toda a ordem social até aqui

existente” (MARX & ENGELS, 2010, p.82).

O abrir dos olhos: Continente de reações

A exclusão provocada pelo interesse do capital provocava o interesse dos povos

dominados por uma solução através da exigência do reconhecimento do interesse

humano, pois crescia uma forte reação contra o capital e sua contínua deterioração do

ser humano. Uma das bases para a independência é a reforma agrária, que dava

condições de sustentabilidade e distribuía mais a renda.

Assim, a reforma agrária era uma das propostas de superação dos imensos

problemas gerados pelos interesses do capital, em flagrante desumanização, sendo essa

uma das possibilidades concretas de efetivação, num contexto dominado e domesticado

para o capitalismo e imperialismo excludente, cujo tema inevitável era o da fome.

A pergunta era patente “por que existem tantos famintos?” Josué de Castro

denunciou “a apropriação injusta e ilegal da generosidade e abundância dos recursos da

natureza...” (que é)... “responsável pelo subdesenvolvimento, gerador de miséria e a

fome” (CASTRO, 2008).

Falta de vontade política, governos cujas práticas voltadas para o capital, falta de

formação humana, e a voracidade do capital articulado pelo latifundiário perpetuava a

miséria, que gera, então, violência.

Não é uma questão nova, veja: a apropriação das terras por grandes

latifundiários desde os tempos da colonização; expropriação das terras pelos

colonizadores; resultou na expulsão dos pobres; produzindo, consequentemente,

21

exclusão social; motivado pelo interesse do capital. Hoje, há grandes latifundiários que

não querem uma reforma para acabar com a fome; não querem perder poder político,

nem a valorização da mão-de-obra; muito menos produzir de forma a ajudar a acabar

com a fome; nem perder as terras. Além disso, temos a questão do imperialismo

estadunidense amparado pelo capital; o uso da terra para fins de capital e interesses

externos; provocando mais pobreza, exclusão e fome.

Agora, também, grandes multinacionais e governos de países desenvolvidos

fazem de tudo para explorar a riqueza de países subdesenvolvidos.

Nesse caldeirão, se deu a Revolução Cubana, conjugado pela tirania dos regimes

ditatoriais apoiados pelos EUA, resultando numa reforma agrária sem precedentes na

história latino-americana. Os EUA não aceitaram a soberania cubana, nem os ideais de

reforma agrária, e, com o desrespeito político americano forçou uma reação de Cuba em

favor do lado comunista. “... A revolução exprimiu dramaticamente as contradições não

resolvidas entre os Estados Unidos e os demais países da região” (BANDEIRA, 2008),

provocando um impacto extremamente político na região, resultando no rompimento

com a política estadunidense para a América Latina.

Reações como as cubanas, foram exemplos de tentativas de superação do capital

selvagem, entretanto as sanções impostas reduziam sua visibilidade.

Com Estados enfraquecidos um processo de integração latino-americana iniciou-

se, desagradando os interesses imperialistas norte-americanos. Pois uma economia

regional poderia ser uma solução possível para manter as riquezas latino-americanas

para usufruto dos próprios povos sul-americanos.

A necessidade natural de uma sociedade nacional é a constituição da Nação-

Estado, e, posteriormente, na consequente conquista dessa unidade fundamental é que

germina o processo de integração. Muitos desafios são sentidos nessa questão. Temos,

assim, a realidade da formação da sociedade nacional, suas origens e transformações,

crises e dilemas. Essa formação está entrelaçada com questões como Estado-Nação;

democracia-ditadura; dualismo estrutural antigo insuperável, arcaico-moderno, que

resultam em miséria, violência, autoritarismo, tirania. Produzindo uma América Latina

22

precária, provisória, inacabada, mestiça, exótica, deslocada, fora do lugar, folclórica.

Nações sem povo, nem cidadãos; apenas indivíduos e população 10

.

Urge a metamorfose da raça em povo; ou da população de trabalhadores em

povo de cidadãos. Deve-se considerar, também, a problemática história da “Terra e

Liberdade”, que, na colonização, desenvolveu-se longo processo de monopolização de

propriedade e exploração da terra. Então, o problema agrário está, também, na base da

questão nacional, cuja população foi desalojada de suas terras. Assim, a luta pela terra,

ganha, junto com outros pontos, lugar na relação de problemas da Questão Nacional da

América Latina. Então, temos as seguintes dificuldades: (1) articulações das regiões

como a nação; (2) desigualdades sociais, culturais e outras; (3) metamorfose da

população em povo; e, (4) problema agrário.

A nação não se delimita na fronteira, mas por relações internas e externas. A

fronteira não está na geografia, mas na sociedade, Estado, história. Porto Rico revela a

tendência forte do que significam as relações dos Estados Unidos com os países latino-

americanos: dominação dos territórios, produção, serviços, mercados e mentes. Há

outros estados associados, que se definem como soberanos, independentes, aliados,

parceiros do EUA, mas que são, na verdade, Estados-Livres-Associados. “Uma

sociedade vive uma situação colonial quando é governada em função dos interesses

econômicos de classes dominantes de uma sociedade estranha” (MARTÍNEZ PEÁES,

1979, p. 574). Eles são empurrados, não desenvolvidos, por forças externas, que não são

emanados ou construídos por eles próprios. A chamada “quinta fronteira” está nas

relações econômicas, políticas, militares, culturais. Não tem pátria, associam aqui e

acolá, conforme o movimento do capital. As forças externas (grandes) quando

encontram reverberação interna (pequenos), dominam. Poeticamente, a quinta fronteira

vai longe: cerca, canal, dívida, invasão, mar. Ela tem muitas formas, está sempre na

história e no imaginário dos povos da América Latina.

As desigualdades sociais, a baixa autoestima do povo latino-americano, a cultura

escravagista, os movimentos sociais, os meninos de rua, as mulheres maltratadas, o

subemprego, os milhões de indigentes sociais, o analfabetismo (inclusive funcional), as

crateras e fossos de desigualdades, a falta de moradia, a infraestrutura inexistente ou

precária, pessoas sem vez, nem voz, nem rosto, sem remédios, sem tetos, e sem terras,

10

IANNI, Octavio. A Questão Nacional na América Latina. Texto apresentado no Simpósio

Interpretações Contemporâneas da América Latina, realização do Instituto de Estudos Avançados —

Universidade de São Paulo — São Paulo, 24 e 25 de junho de 1987 - Sala do Conselho Universitário.

23

os sem espaço, sem esperanças, sem cultura, sem raízes, sem cidadanias, sem comida,

sem vestes, sem lazer, sem direitos, sem tranquilidade, sem capital, sem humanidade,

sem respeito, sem ouro, sem riquezas minerais, sem memória; estão na verdade,

procurando um lugar ao sol.

Que a riqueza produzida aqui, na América latina, fique aqui! Para tanto, num

mundo globalizado, faz-se necessário um mercado regional forte. Uma integração que

viabilize intercâmbios e fortalecimento de uma poupança sólida para um real

desenvolvimento.

Considerações Finais

Mesmo debilitados, os enfermos latino-americanos, empobrecidos, nas favelas,

nos cortiços, nas casas no meio do sertão, reafirmam-se, sobrevivem, e,... Lutam.

Embora a situação colonial permaneça evidente, mas, agora, em novas formas, “uma

sociedade vive uma situação colonial quando é governada em função dos interesses

econômicos de classes dominantes de uma sociedade estranha” (MARTÍNEZ PEÁES,

1979, p. 574), a América Latina esboça reações.

Por enquanto a resistência do povo encontra forças em suas próprias raízes para,

de fato, demonstrar que seus espaços estão sendo invadidos e explorados, sem seu

consentimento. Essas relações externas de exploração e domínio são como um “corpo

estranho”, que precisa ser expelido, nas relações sul-americanas. A integração é uma

questão de tempo, por questão de sobrevivência. Haja vista os esforços venezuelanos

contra ALCA e pró ALBA, cujos desdobramentos foram a forte resistência do capital

representado pelo imperialismo norte-americano tentando impedir essa integração

regional sul-americana, o que nos leva a alguns questionamentos.

Será que a solução de superação das contradições do capitalismo está dentro do

próprio sistema capitalista? Esse sistema não está, já, necessitando de superação dada

suas contradições? Qual a melhor forma de superação? É a revolução? Qual o lugar da

revolução? Como ela é construída? Ele deve ser uma mudança gradual ou mudança

drástica?

É importante frisar que a revolução não é programada, mas é proporcionada por

um conjunto de fatores que conduzem, inevitavelmente, à eclosão de um processo

24

revolucionário. Dentro os quais há sinais que precisam ser percebidos. Plínio de Arruda

Sampaio ao escrever o Apêndice “Sete Notas Sobre a Teoria da Revolução Brasileira”,

do Livro “Clássicos Sobre a Revolução Brasileira”, citou questões debatidas no âmbito

da Consulta Popular com a finalidade de apontar “algumas questões – inspiradas no

pensamento de grandes intérpretes do Brasil – que devem orientar a reflexão sobre os

desafios da revolução brasileira” (p. 125). São eles: Formar uma (1) “Teoria da

Revolução Brasileira”, como programa de transformação das estruturas da sociedade

com o objetivo de resolver os problemas fundamentais do conjunto da população.

Entender que (2) “O segredo da Revolução está na História”, isto é, para efetivação das

transformações necessárias é preciso que suas reflexões sejam fundamentadas numa

análise real e concreta da história da sociedade brasileira. Estabelecer, de fato, quais (3)

“Os dilemas da formação nacional”, que precisam ser levadas em conta para sua

superação, dada a condicionalidade da população brasileira de subalterna e situada na

periferia do sistema capitalista mundial. É preciso ter claro (4) “O objetivo da

Revolução Brasileira”, que precisa estar pautada pela lógica das “transformações

socioculturais profundas, que criem as bases de uma sociedade equitativa e auto

referida”. Situar os conceitos de (5) “Nacionalismo e internacionalismo”,

proporcionando o ultrapassar os paradigmas antigos com novas “formas superiores de

organização social e política, de alcance supranacional”. Ter em mente a (6) “Reversão

Neoloconial e Barbárie”, de forma a superar o capitalismo dependente e a violência

urbana. Finalmente, entender (7) “A Hora e a Vez da Revolução Democrática” numa

urgente ruptura com a situação de dependência externa, “trata-se de saber se temos um

futuro como nação que conta na construção do devenir humano”.

Evidentemente que contra reações ocorrerão, e isso poderá eclodir numa

problemática onde de crescente violência, pois, aqueles que estão no poder, lutarão para

permanecer no poder, e quem está na periferia do poder quer ir para o centro do poder

(Bourdieu). Entretanto, as rupturas são necessárias, se as soluções se encontrarem, o que

não é o caso, no próprio capitalismo, haverá um dilema e um círculo vicioso pode se

estabelecer. Pois, quem está sofrendo do lado nefasto do capitalismo, atualmente, são os

latino-americanos, e estes, desejando mudar de lado; fica a pergunta: Quem ocupará,

então, o lugar dos latino-americanos nesse lado nefasto? A pergunta é pertinente, pois,

no sistema capitalista, para manutenção do lado rico, é preciso espoliar outros povos.

Quem serão eles? Para acabar com o lado nefasto do capitalismo requer a diminuição da

25

distância entre ricos e pobres. Entretanto, esse sistema não aproxima os opostos, mas

distancia-os cada vez mais. Portanto, urge pensar alternativas que não seja a mesmice

capitalista, para não ocorrer de trocar “seis por meia dúzia”. Daí a proposta de

revolução, que para tanto é preciso observar os sinais dos tempos.

Referências Bibliográficas

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