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Bol. da Saúde, v. 15, n. 1, 2001 v 1 EDITOR Ricardo Burg Ceccim COMISSÃO EDITORIAL Cristianne Maria Famer Rocha Carlos Dácio Araújo Manoel Mayer Júnior Ricardo Burg Ceccim Ruth Sant’Helena da Silva Sandra Maria Salles Fagundes CONSELHO EDITORIAL Airton Stein – FFFCMPA Alcindo Antônio Ferla – SES/RS Álvaro Crespo Merlo – UFRGS Carlos Alvarez – Universidade de Alicante/Espanha Carmem Silveira Oliveira – UNISINOS Célia Regina Pierantoni – UERJ Ceres Víctora – UFRGS Cristianne Maria Famer Rocha – UERGS Dagmar Elisabeth Estermann Meyer – UFRGS Denise Rangel Ganzo de Castro Aertes – SMS/PMPA Emerson Elias Merhy – UNICAMP Giorgio Solimano – Universidade do Chile/ALAESP Jaime Breilh – EQUADOR Jairnilson Silva Paim – ISC/UFBA Janice Dornelles de Castro – UERGS José Luis Araújo – FIOCRUZ Jussara Gue Martini – ABEN/UNISINOS Liane Beatriz Righi – UNIJUI Maria Ceci Araújo Misoczky – UFRGS Maria Cecília Souza Minayo – FIOCRUZ Maria Luiza Jaeger – SES/RS Marlow Kwitko – PUC/RS Moacyr Scliar – FFFCMPA Moisés Goldbaum – USP Newton Barros – AMRIGS Paulo Duarte Amarante – ENSP/CEBES Ricardo Burg Ceccim – ESP/RS ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL SECRETARIA DA SAÚDE ESCOLA DE SAÚDE PÚBLICA

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Bol. da Saúde, v. 15, n. 1, 2001 v 1

EDITORRicardo Burg Ceccim

COMISSÃO EDITORIALCristianne Maria Famer RochaCarlos Dácio AraújoManoel Mayer JúniorRicardo Burg CeccimRuth Sant’Helena da SilvaSandra Maria Salles Fagundes

CONSELHO EDITORIALAirton Stein – FFFCMPAAlcindo Antônio Ferla – SES/RSÁlvaro Crespo Merlo – UFRGSCarlos Alvarez – Universidade de Alicante/EspanhaCarmem Silveira Oliveira – UNISINOSCélia Regina Pierantoni – UERJCeres Víctora – UFRGSCristianne Maria Famer Rocha – UERGSDagmar Elisabeth Estermann Meyer – UFRGSDenise Rangel Ganzo de Castro Aertes – SMS/PMPAEmerson Elias Merhy – UNICAMPGiorgio Solimano – Universidade do Chile/ALAESPJaime Breilh – EQUADORJairnilson Silva Paim – ISC/UFBAJanice Dornelles de Castro – UERGSJosé Luis Araújo – FIOCRUZJussara Gue Martini – ABEN/UNISINOSLiane Beatriz Righi – UNIJUIMaria Ceci Araújo Misoczky – UFRGSMaria Cecília Souza Minayo – FIOCRUZMaria Luiza Jaeger – SES/RSMarlow Kwitko – PUC/RSMoacyr Scliar – FFFCMPAMoisés Goldbaum – USPNewton Barros – AMRIGSPaulo Duarte Amarante – ENSP/CEBESRicardo Burg Ceccim – ESP/RS

ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL

SECRETARIA DA SAÚDE

ESCOLA DE SAÚDE PÚBLICA

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2 v Bol. da Saúde, v. 15, n. 1, 2001

Ronaldo Bordin – UFRGSSarah Escorel – CEBESSandra Maria Salles Fagundes – UERGSSoraya Vargas Côrtes – NIPESC/UFRGSStela Meneghel – UNISINOSTeresa Borget Armani – ESP/RSVânia Maria Fighera Olivo – UFSMVirginia Alonso Hortale – ENSP

EQUIPE TÉCNICAAna Paula Andrioli Taday – versão português-espanhol; digitaçãoAntônio Sergio Freitas Ferreira – capaCamila Slomp – capaGeisa Costa Meirelles – CRB 10/1110Luiz Cezar F. de Lima – editoraçãoMárcia Stypulkowski – CRB 10/1172Raquel Macagnan Silva – versão português-inglêsRuth Sant’Helena da Silva – CRB 10/666Silvana Matos Amaro – CRB 10/1098Simone Silveira Nascimento – capaSimone Pereira – revisão português

TIRAGEM2000 Exemplares

A Revista Boletim da Saúde é associada à Associação Brasileira de EditoresCientíficos

B668 Boletim da Saúde / Secretaria da Saúde do Rio Grande doSul; Escola de Saúde Pública. – v. 15, n. 1 (1969). –Porto Alegre: SES/ESP, 1969 –

Semestral.ISSN 0102-1001

1. Boletim da Saúde – Periódicos I.Secretaria daSaúde-RS. II.Escola de Saúde Pública-RS

NLM WA

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Apresentação

Relançar a revista Boletim da Saúde não foi fácil, era preciso primeirorecuperar o potencial de produção intelectual de nossa Escola de SaúdePública (ESP/RS), de devolvê-la à vanguarda da formação em saúde coletiva,inserindo-a nos novos tempos da Reforma Sanitária Brasileira.

As bases da Reforma Sanitária Brasileira foram lançadas, também, poresta Escola, mas sua presença acadêmica e documental foi sendo defasadada liderança intelectual desse processo.

Muito trabalho foi feito junto à sociedade gaúcha e este trabalho deveganhar curso na sociedade maior. Nessa hora, registrar e disseminar oregistro é condição de democracia e abertura à interlocução.

Oferecemos ao Boletim da Saúde uma nova política editorial, buscamosum conceito editorial de elevada credibilidade no Brasil, América Latina eCaribe, desencadeando o processo de construção de uma revista científicaque dê sustentação intelectual à Educação em Saúde Coletiva como fazemosno Rio Grande do Sul. Temos cursos de pós-graduação acadêmica, cursosde educação em serviço (residências), cursos de educação profissional,projetos de educação permanente de trabalhadores e de gestores em saúde,bem como temos projetos de educação popular em saúde e de fortalecimentoda gestão de políticas públicas de saúde junto aos movimentos sociais.Temos, ainda, a meta da eficiente documentação em saúde com sofisticadoacervo de Informação Técnico-Científica, com a recuperação da Memória eHistória da Saúde Pública no Rio Grande do Sul, com a documentação daEducação Popular em Saúde junto ao Movimento Social gaúcho, com acervopara a educação em saúde em multimeios, com a participação no projeto emrede da América Latina e do Caribe de configuração da Biblioteca Virtual emSaúde e com a documentação da produção intelectual da Escola de SaúdePública/RS e da Secretaria da Saúde (SES/RS), seja por meio da produçãomonográfica de cursos e programas de ensino e pesquisa, seja por meio dareflexão intelectual sobre a produção da gestão, dos serviços, do controlesocial e da educação.

A presente revista compõe o projeto de uma Linha Editorial para adisseminação de todos estes componentes da Informação e Documentaçãoem Saúde Coletiva. Entendemos uma revista como o convite ao debate e nãoa expressão de palavras de ordem científica ou política, assim, uma revistadeve consumar, por meio da disseminação de dados, informações,conhecimentos e interpretações a abertura e o confronto de idéias.

Boa leitura e boa luta na defesa do SUS, com informação de qualidade ecom um veículo de disseminação de informação rigorosamente trabalhadopela dedicação acadêmica de nossa Escola de Saúde Pública.

Como disse no número anterior de Boletim da Saúde, repito aqui a falatradicional de nosso governador, o Olívio Dutra, por sua força mobilizadora e

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desafiadora de um projeto de sociedade: “Boa Luta para Todos, para que oSUS seja legal, não só na legislação, mas na vida da população brasileira!”Insisto mais uma vez: que a leitura possa ajudar a construir mais vida comqualidade, igualdade e eqüidade para todos!

Maria Luiza Jaeger,Secretária da Saúde do Estado do Rio Grande do Sul

1999 a 2002

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Sumário

Enfoquev Informação como ferramenta de gestão: desenvolvimento de parâmetros

para acompanhamento do sistema de saúde a partir da análise integradados sistemas de informaçãoAlcindo Antônio Ferla / 9

Artigov A importância da conservação, preservação e restauração e os acervos

bibliográficos e documentais em saúde coletivaIara Jurema Quintela Moreira da Silva / 29

v Hospitalização em pediatria e as situações de aprendizagem da criança:percepções da equipe de saúde em uma unidade hemato-oncológica deum hospital universitárioLuciana Borges Medina / 37

v Tuberculose: histórico, epidemiologia e imunologia, de 1990 a 1999, e co-infecção TB/HIV, de 1998 a 1999, Rio Grande do Sul – BrasilRoberta Campos; Celso Pianta / 61

v Um centro de informação e documentação em saúde pública/saúdecoletiva: compromissos, interfaces e perspectivas possíveis e a estanteda utopia – Parte IIRuth Sant’Helena da Silva / 72

Ensaio e Reflexãov Pediatria, puericultura, pedagogia...: imagens da criança e o devir-criança

Ricardo Burg Ceccim / 87

Memória e Históriav A singularidade da melhoria habitacional para o controle da doença de

Chagas na região noroeste do Rio Grande do SulCleonara Bedin; Tânia M. Stasiak Wilhelms; Maria Amélia Torres; Paulo R.da Silva Abbad; Kátia Jobim Lippold; Luís Alberto Senff; Paulo R. Sackis /107

v A arquitetura e os estabelecimentos de saúde: algumas consideraçõesEdnezer Rodrigues Flores / 117

v Instituto de Pesquisas Biológicas: memória institucional e trabalho depesquisa históricaMárcia Aiub de Mello / 121

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v A Residência Integrada em Saúde: Dermatologia Sanitária – umaexperiência interdisciplinar vista pelo enfoque da PsicologiaMarisa Campio Müller; Cristina Beatriz Haag; Juliana Dors Tigre da Silva /129

Especialv Nossos saberes, nossos fazeres – Atenção Integral versus Vigilância à

Saúde: aftosa e saúde mental em JóiaMaria Luíza Raminelli de Almeida / 141

Resumov Processo de territorialização: vivências de uma equipe

A. A. Poitevin; A. A.Torres; S. C. Scariote; L. V. Miranda; C. Oliveira; C. P.Piva; R. F. D. Oliveira; L.Teixeira; P. Barros; V. Mello; A. Volkmer; C.Rocha;K. L. Pegas; J. O. Lacerda; L. K. Amakawa; M. Colisse; M. Tavares; E.Farias / 149

v Desafio da promoção de saúde com adolescentes: uma abordageminterdisciplinarBeatriz Mallmann1; Cláudia Sá Freire; Débora Drehmer; EduardoAlbuquerque D’Elia; Fabiana Aguiar Guimarães / 151

v A Interdisciplinaridade: um novo fazer na saúde da família e dacomunidadeBeatriz Mallmann; Oswaldina Lopes; Ruth Mincaroni; Carla Patrícia Paiva;Fabiana Aguiar Guimarães; Gláucia Regina Siqueira Franco / 153

v A observação da Unidade Básica de Saúde 5 do Centro de Saúde – EscolaMurialdoCláudia da Silva Chitollina; Daniela Michelin Letti; Débora TomatisPacheco; Sandra Oscham Medvedovsky / 155

v Acadêmicos de medicina e a atenção primária à saúdeCristina Lunardi Munaretti; Patrícia Caspary; Rita Cristina C. Sotelo / 157

v Mortalidade em crianças de cinco a nove anos, Porto Alegre, 1988 a 2000Fernanda Rocha; Elson Romeu Farias; Carolina Neis; Eliana Restellato /159

Atos Normativosv Portaria Nº 183/2001 / 163v Resolução Nº 23/2001 – CES/RS / 165

Normas Editoriaisv Política e Normas Editoriais / 171

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EnfoqueEnfoqueEnfoqueEnfoqueEnfoque

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Atenção montadora página 8 é branca

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Informação como ferramenta de gestão: desenvolvimento de parâmetro para ...

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Informação como ferramenta de gestão:desenvolvimento de parâmetros paraacompanhamento do sistema de saúde apartir da análise integrada dos sistemasde informação 1

Alcindo Antônio Ferla2

Resumo: Relato analítico do processo de gestão da política estadual de infor-mação e informática em saúde no Rio Grande do Sul desde 1999, quando, principal-mente por meio do desenvolvimento de indicadores e parâmetros para acompanha-mento dos sistemas municipais, regionais e estadual de saúde, integrando bases dedados e desenvolvendo tecnologias de suporte, buscou-se transformar, na prática, eaprofundar o uso da informação no suporte à gestão descentralizada do SistemaÚnico de Saúde.

Palavras-Chave: Informação; Informática em saúde; Sistemas de informaçãoem saúde; Gestão do Sistema Único de Saúde.

Introdução

As décadas de 80 e 90 do século passado caracterizaram-se como umperíodo de mudança significativa no modo de conceber e organizar os servi-ços de saúde no Brasil.

Desde então, contingentes populacionais anteriormente excluídos doacesso à atenção à saúde vêm sendo paulatinamente inseridos no sistemapúblico; há progressiva incorporação de tecnologias especializadas nos ser-viços; avança-se, mesmo que tenuemente, na definição de critérios deequanimidade para a distribuição de recursos financeiros. Entretanto, algu-mas áreas estratégicas necessitam de desenvolvimento mais rápido para for-talecer esse processo de qualificação do sistema de saúde, adequando-o ao

1 Relato analítico do projeto “Desenvolvimento de parâmetros assistenciais para a avaliação epara o planejamento a partir da análise integrada dos sistemas de informação em saúde noRio Grande do Sul”, classificado em 2º lugar na Área Temática de Gestão dos Serviços deSaúde do Concurso Nacional de Experiências Inovadoras no SUS.2 Coordenador da Rede Gaúcha de Informações em Saúde e do projeto premiado.

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Alcindo Antônio Ferla

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que dispõem a Constituição Brasileira e as Leis Federais nº 8080/90 e nº8142/90. Ainda se fazem necessários avanços na área de informação einformática em saúde, planejamento, acompanhamento, controle e avaliação,com a produção de tecnologias de gestão compatíveis com a racionalidadeque fundamenta a estrutura que está em implantação, o Sistema Único deSaúde (SUS). Essas áreas ainda se mantêm atreladas às características domodelo técnico-assistencial que antecedeu ao SUS, ou mesmo espelhadasacriticamente em tecnologias internacionais utilizadas, com graus variadosde sucesso em seus próprios contextos, na maioria das vezes muito diversosda realidade brasileira, tanto em seus aspectos de diversidade histórica, so-cial, política, demográfica e sanitária, quanto na própria configuração do sis-tema de saúde definido legalmente.

Nas décadas de 60 e 70 do século XX, as políticas sociais brasileirastiveram uma organização fragmentária, com diversos órgãos do poder públi-co atuando autônoma e paralelamente; com as estratégias de proteção socialorientadas para atingir grupos específicos de população; definidas pelatecnocracia estatal quase que exclusivamente a partir da lógica de viabilidadeeconômica; observando prioritariamente direitos sociais dos segmentospopulacionais pertencentes às corporações reconhecidas pelo Estado e querecolhiam contribuições previdenciárias; centralizadora, uma vez que tanto adefinição das políticas quanto o controle do financiamento estavam concen-tradas no governo federal. Os serviços de saúde também estiveram submeti-dos a essa lógica e no final da década de 70, a exemplo das demais açõessociais do poder público, tiveram uma importante expansão de cobertura, pro-duzida pela combinação do aumento da demanda em decorrência dos efeitosda crise econômica, das pressões sociais e do mercado produtor de serviços.Essa expansão, entretanto, deu-se principalmente pela contratação de açõesproduzidas pela iniciativa privada, tendo sido muito pequeno o investimentonos serviços públicos de saúde, bem como em tecnologias de controle públi-co sobre eles (Almeida; Chioro; Zioni, 2001).

Na década de 80 deste último século, o crescimento da mobilização so-cial em torno dos direitos sociais e de saúde provocou uma série de mudan-ças institucionais. Foram implementadas parcialmente diversas estratégiasdo Movimento de Reforma Sanitária, produzindo algum grau de integraçãodas ações e serviços ofertados pelas diversas instituições federais, estaduaise municipais, bem como a desconcentração da oferta das ações e serviços. Adiminuição progressiva dos gastos públicos com saúde, nas análises históri-cas que corrigem os valores anuais com os índices oficiais de inflação oumesmo os que indexam as moedas mais estáveis, e o crescente comprome-timento desses recursos com o ressarcimento dos serviços privados, alémdos níveis crescentes de corrupção, principalmente nestes serviços, consoli-dou um quadro de crise financeira e de legitimidade social que fortaleceu aspropostas mais radicais de mudança. Esse contexto influenciou fortemente aelaboração da Constituição Brasileira de 1988, que criou o SUS (Mendes;

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Informação como ferramenta de gestão: desenvolvimento de parâmetro para ...

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Carvalho; Marques, 2001).A partir da Constituição, foram desenvolvidos mecanismos que estão

organizando o conjunto desarticulado de ações e serviços e transformando-os num sistema e, segundo as diretrizes legais, com direção única em cadaesfera de governo. Assim, fica indicado o movimento de descentralização dagestão, sendo os Municípios responsáveis, com a cooperação técnica e fi-nanceira dos Estados e da União, pela organização da base do sistema na-cional de saúde. A gestão é entendida, na definição legal, como a prerrogati-va e a responsabilidade compartilhada que tem cada uma das esferas degoverno de “dirigir um sistema de saúde, mediante o exercício das funçõesde coordenação, articulação, negociação, planejamento, acompanhamento,controle, avaliação e auditoria” (Brasil, 1996). No contexto da tradição políticae administrativa centralizadora, a diretriz constitucional da descentralizaçãoda gestão envolve um processo de transformações institucionais, com“redistribuição de poder e de recursos, redefinição de papéis das três esferasde governo, reorganização institucional, reformulação de práticas, estabeleci-mento de novas relações entre os níveis de governo e controle social” (Brasil,1993).

Outra idéia importante da Constituição Brasileira é a de democratizaçãoda saúde, entendida não somente como o resultado do acesso às açõesassistenciais, mas como o resultado das condições de vida das pessoas.Assim, além de oferecer ações e serviços de saúde, faz parte das atribuiçõesdos governos, para responder ao direito das pessoas por saúde, a garantia deemprego e salário regular e suficiente e de posse da terra para quem trabalhanela, de educação e cultura, de saneamento básico e proteção do meio am-biente, de habitação, de produção e acesso a alimentos e acesso aos produ-tos e bens necessários. Enfim, pela melhoria no nível de vida das pessoas.

O ápice da democratização da saúde está na definição constitucional,regulamentada principalmente pela Lei Federal nº 8142/90 (Brasil, 1990b), daparticipação popular no sistema de saúde. Essa participação tem a prerroga-tiva legal de avaliar e propor diretrizes para a política de saúde em cada esfe-ra governamental, bem como deliberar e formular estratégias e controlar aexecução das ações e serviços de saúde. Essas características desafiam àreorganização do sistema público de saúde no Brasil desde a ConstituiçãoBrasileira, particularmente à gestão.

Nesse amplo processo de mudanças, a área da informação e dainformática tem importantes contribuições, principalmente no que se refereao planejamento, à formulação, ao acompanhamento, à avaliação e àregulação do sistema de saúde, bem como no fortalecimento do controle so-cial. Essa área já vem se constituindo há várias décadas, tendo uma boatradição no tratamento dos dados, uma significativa quantidade de bancos dedados demográficos, epidemiológicos e de prestação de serviços e diversasagências de informação tanto no âmbito federal, quanto no estadual e munici-pal.

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Alcindo Antônio Ferla

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Uma enorme quantidade de dados e mesmo informações é produzidacotidianamente no país para os mais diversos fins. Dessas, uma grande partepode contribuir significativamente para a qualificação do sistema de saúde,entendida como item importante para a qualidade de vida da população. Es-pecificamente em relação à assistência à saúde e às demais atividades reali-zadas pelos serviços de saúde, são produzidos e sistematizados regularmen-te dados sobre vigilância em saúde, estatísticas vitais, produção, coberturaassistencial e capacidade instalada dos serviços, financiamento público desaúde, principalmente por intermédio dos grandes bancos de dados nacio-nais, mas também por meio de sistemas próprios dos estados e municípios.

Também estão disponíveis na área da saúde bancos de dados produzi-dos por outros setores, como o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística(IBGE); Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA) e estudosamostrais produzidos por universidades, centros de pesquisa e outras institui-ções.

Porém, todos esses bancos de dados e sistemas são ainda insuficientespara a análise das necessidades de saúde da população, quer por ausênciade informações sobre a incidência e/ou prevalência de agravos importantesno perfil epidemiológico da população, devido a falhas na cobertura dos siste-mas de informação hoje existentes e, mesmo, por decorrência desses esta-rem restritos a alguns aspectos do sistema de saúde, permitindo apenas vi-sões parciais e fragmentárias. A insuficiência de informações ocorre tambémdevido à falta de tecnologias que permitam a articulação de diferentes basesde dados para obtenção de informações contidas nas mesmas, bem comopela precariedade de estratégias de compartilhamento entre os gestores dagestão da política de informação e informática em saúde.

Outra questão relevante é a de que as informações disponíveis normal-mente não são de fácil acesso aos gestores locais e sua utilização é dificulta-da pela complexidade das tecnologias ou por incompatibilidades conceituaisou geográficas das diferentes bases de dados. Por vezes, até mesmo hádesconhecimento do potencial de uso da informação como ferramenta para agestão descentralizada. Paralelamente, observa-se a necessidade de desen-volver mecanismos que possibilitem aos usuários dos serviços de saúde e deseus representantes nos conselhos, bem como aos próprios trabalhadoresem saúde, apropriarem-se do conteúdo das informações já disponíveis, demodo que possam melhor exercer sua representação e sua cidadania(Almeida, 1995).

Por último, cabe lembrar que o uso restrito das informações na definiçãode prioridades, na avaliação e no controle do sistema de saúde (Moraes,1994; Moreira, 1995), quaisquer que sejam as causas mais relevantes paracada caso, produz um grave atenuamento na função de gestão das Secreta-rias de Saúde. Adicionalmente à fragmentação e à qualidade insuficiente dasbases de dados, também contribuiu para a cultura restrita do uso sistemáticode informações uma certa tradição na área da informação e informática em

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Informação como ferramenta de gestão: desenvolvimento de parâmetro para ...

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saúde de substituir a discussão das necessidades da gestão nessa área àspossibilidades das novas tecnologias desenvolvidas, progressivamente maissofisticadas. Colocada nesse contexto, a área da informação e informáticaem saúde muitas vezes torna a gestão refém de seus conhecimentos, aocontrário de fortalecê-la com produtos e serviços acessíveis e com qualidade.

Esses diagnósticos, compartilhados pelo conjunto de atores sociais queatuam na área, vêm produzindo alguns consensos também no que se refere adiretrizes para a superação desses problemas. Em 1996, durante a 10ª Con-ferência Nacional de Saúde, uma Mesa Complementar recuperou as formula-ções prévias de fóruns sobre informação em saúde e definiu diretrizes para aconfecção de uma política para a área.

Compatível com as disposições legais do SUS, também existe a neces-sidade urgente de descentralizar a gestão da política de informação, de modoa garantir aos gestores do SUS das três esferas os níveis de informaçãonecessários, suficientes e acessíveis para o planejamento e tomada de deci-sões para as ações de saúde. Da mesma forma, a diretriz constitucional decontrole social faz com que seja necessária uma nova lógica para organizarestes sistemas, não mais considerando como critério único, sequer prioritário,as necessidades administrativas e gerenciais das instituições federais, masprincipalmente como o desafio de instituir uma nova cultura em saúde e, maisainda, como uma contribuição essencial para a democratização da socieda-de. A necessidade que se apresenta é de efetivar uma política e um sistemanacional de informação e informática em saúde, reorientando o atual enfoquede sistemas federais, estaduais e municipais paralelos, concorrentes, inefi-cientes e expoliadores do escasso recurso público para a área. Já foram pro-duzidos avanços significativos na desconcentração operacional da coleta esistematização dos dados de diversos subsistemas de informação.

Com relação à disseminação das informações dos sistemas, atualmen-te os dados de alguns deles encontram-se disponíveis em diversos meios(BBS, CD-ROM e Internet), o que deve facilitar o acesso para todos os níveisde gestão e de usuários externos, contribuindo dessa forma para uma maioreficiência da gestão e do controle social do sistema. Uma articulação entre osdiversos projetos desenvolvidos pelas secretarias de saúde e o Ministério daSaúde na área de informação e informática em saúde, bem como a constitui-ção de uma rede envolvendo gestores do SUS, serviços de saúde e conse-lhos de saúde, foi desencadeada por meio da Rede Nacional de Informaçõesem Saúde (RNIS), com apoio do Banco Mundial. No Estado do Rio Grande doSul, esse projeto foi denominado Rede Gaúcha de Informações em Saúde(RGIS) e vem sendo coordenado pela Secretaria da Saúde do Estado (SES/RS). Considerando a importância dessa área e do reordenamento na suagestão, o Conselho Nacional dos Secretários Estaduais de Saúde (Conass)apoiou desde 1999 a implantação de um Fórum Nacional dos CoordenadoresEstaduais da RNIS, patrocinado pela Coordenação Nacional do Projeto.

Porém, apesar de todos os esforços que vêm sendo desenvolvidos, in-

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Alcindo Antônio Ferla

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clusive pela comunidade científica e algumas agências oficiais produtoras deinformação, no sentido de criar uma Política Nacional de Informação eInformática em Saúde com gestão compartilhada e controle social, ainda nãofoi possível a superação da fragmentação institucional, principalmente noâmbito federal, do distanciamento entre diversas agências e da falta de co-municação entre os diversos bancos de dados. Essa fragmentação, bemcomo a utilização de critérios isolados para a definição de prioridades no de-senvolvimento de sistemas, fluxos, investimentos, definição de tecnologiasetc, atualiza na gestão da política nacional de informação e informática emsaúde os problemas verificados na gestão do sistema de saúde como umtodo: na realidade, temos um certo nível de confusão entre o que é uma polí-tica federal de informação e informática em saúde, responsável pelo supri-mento das necessidades identificadas para o gerenciamento das estruturasvinculadas ao governo federal, e a política, suficiente e fortalecedora da ges-tão em todos os níveis e para o SUS, conforme determina a nacional Consti-tuição Brasileira.

Assim, ainda é muito tênue sua utilização integrada no processo de or-ganização das ações e serviços de saúde, muitas vezes sendo concebidosburocraticamente como processo de trabalho isolado e necessário apenaspara cumprir as atribuições delegadas pelos níveis estadual e federal do SUS,principalmente quando esse trabalho é realizado por estruturas específicas edescoladas do planejamento e da avaliação da atenção à saúde (Castro;Ferla; Robinson, 1997). Também é comum que cada um desses bancos dedados tenha a sua apropriação acessível apenas por setores específicos,onde está concentrada a operacionalização ou a orientação técnica das açõesque geram os dados, com restrição de acesso às demais áreas.

Embora tenham sido pensadas tecnologias compatíveis na produçãodesses bancos de dados, ainda é excepcional sua utilização integrada nasinstâncias de gestão dos serviços de saúde. Por outro lado, tecnologias deassociação de bases de dados e de extração de conhecimentos são maisviáveis de serem desenvolvidas no ambiente acadêmico. A decisão de supe-rar os problemas relativos a essa área, bem como a opção política de fortale-cer as funções de gestão no sistema estadual de saúde do Rio Grande doSul, fez com que fossem desencadeadas ações de reordenamento dessaárea não somente no território estadual, mas também com uma forte partici-pação no cenário nacional. Essas ações incluíram o uso mais cotidiano dosdados e informações pela SES/RS, qualificação da infraestrutura deinformática, mas também parcerias interinstitucionais, como se verá a seguir.

Informação como suporte para a gestão em saúde no Rio Grandedo Sul

O contexto nacional descrito influenciou e influencia a organização e ofuncionamento das estratégias gaúchas relativamente à informação e

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informática em saúde, bem como aos demais aspectos do SUS. É inevitávelque isso ocorra, já que, como a própria denominação indica, há unicidade nosistema nacional de saúde. Entretanto, como apontou a NOB 93, essaunicidade não implica em padronização/modelação de todos os aspectos dosistema no tão diverso e heterogêneo território nacional. Segundo essa NOB,“a expressão ÚNICO de que falam a Constituição e a Lei 8080 deve ser en-tendida como um conjunto de elementos de natureza doutrinária ouorganizacional, comuns aos diversos modelos ou sistemas de saúde existen-tes ou que possam vir a existir” (Brasil, 1993). Assim, a unicidade do sistemasignifica, do ponto de vista doutrinário, universalidade, eqüidade eintegralidade, e do ponto de vista organizacional, descentralização,regionalização e controle social.

A unicidade em torno de princípios doutrinários e organizacionais aplica-se também para a área de informação e informática, onde União, estados emunicípios devem ser co-gestores da Política Nacional, incluindo a responsa-bilidade de desenvolver ações no seu âmbito. Essa é inclusive uma prerroga-tiva afirmada em outros instrumentos legais. A Lei Federal nº 8080/90 afirmareiteradamente como objetivos e atribuições do SUS, a identificação e disse-minação de fatores condicionantes e determinantes da saúde, a capacidadeinstalada dos serviços, o direito dos cidadãos no acesso às informações desaúde. Além dessas disposições gerais, a mesma Lei estabelece, em seuArtigo 15, que é atribuição comum da União, dos estados e dos municípios a“organização e coordenação do sistema de informações de saúde” (IncisoIV), (Brasil, 1990a).

Nesse contexto, em 1999, ao iniciar um reordenamento das questõesrelativas a essa área, a SES/RS propunha-se a assumir as atividades e res-ponsabilidades de sua competência. Para a equipe que assumiu a gestão dosistema estadual de saúde naquele ano, a área da informação deveria tornar-se um insumo de maior relevância no subsídio ao processo de gestão, neces-sitando, para isso, de um ordenamento compatível com a lógica de gestão doSUS.

No processo mais recente de reordenamento da área de informação einformática no sistema de saúde gaúcho, podem ser identificadas quatro eta-pas distintas, representando os planos de decisão política relativamente aela3. Essas etapas, representadas no Quadro 1, têm recortes relativos aosavanços obtidos na cultura institucional da SES/RS e na aplicação detecnologias específicas para operar sobre as bases de dados existentes, comvistas a gerar indicadores e parâmetros para o acompanhamento do SUS/

3 Evidentemente, a sistematização dessas etapas não correspondeu a uma substituição linearda situação anterior da informação e da informática no SUS/RS. Essas etapas representam aqualificação progressiva da cultura das instâncias decisórias da SES/RS relativamente a essaárea. A interface com o contexto nacional e mesmo a cultura residual de algumas áreas técni-cas, além de limites práticos, fazem com que, atualmente, estejam presentes na Secretariatraços das quatro etapas descritas.

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RS. Um primeiro plano de interesses para esse projeto particularizava o com-ponente da assistência para esse exercício. Constatado que a redução doSUS à forma com que se organiza a assistência é um dos principais viesesdas análises sobre o atual sistema de saúde brasileiro e, principalmente, iden-tificados os limites que decorrem dessa simplificação, ampliou-se o foco decompetências da informação e informática para aspectos dos três compo-nentes já mencionados.

Quadro 1 – Etapas do processo de gestão da informação e informática –SUS/RS

Etapa Características principaisEtapa 0 Sistemas de informação fragmentados e burocratizados, infraestrutura

precária, uso tênue da informação no suporte à gestão, informação depropriedade de setores específicos, capacitações fragmentadas edirigidas aos operadores de cada sistema.

Etapa 1 Agregação artesanal de informações para suporte à gestão, devoluçãode dados agrupados por sistema aos gestores regionais e municipais,qualificação da infraestrutura de informação e informática, composiçãoartesanal de indicadores e parâmetros simples para monitoramento dagestão.

Etapa 2 Incorporação de novas tecnologias de associação e análise de dados,georreferenciamento de informações para suporte à gestão, elabora-ção de parâmetros e indicadores mais complexos para o acompanha-mento da gestão, desenvolvimento de estratégias para a incorporaçãode novas bases de dados.

Etapa 3 Sofisticação das tecnologias de associação de bases de dados, criaçãode mecanismos com tecnologia complexa para a análise das informa-ções, ampliação de parcerias para a área da informação e informáticaem saúde, desenvolvimento de produtos de fácil operação para subsí-dio à gestão do SUS.

No que se denomina de Etapa 0, onde está identificada a situação en-contrada pela equipe diretiva da SES/RS em janeiro de 1999, similar à situa-ção descrita na parte inicial desse texto como representativa do contexto na-cional, há algumas particularidades que merecem ser destacadas. O trata-mento dado a alguns subsistemas de informação pela SES/RS mesmo antesde 1999, particularmente para o Sistema de Informações de Nascidos Vivos(Sinasc) e de Mortalidade (SIM), tornou-os referência nacional. Nesse mes-mo período, no âmbito estadual, houve desconcentração às então chamadasDelegacias Regionais de Saúde (DRS) da digitação de dados dos mesmossistemas.

A Etapa 1, desencadeada principalmente a partir de 1999, representou o

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início do reordenamento da relação da direção da SES/RS com a área deinformação e informática e incluiu ações de incorporação de equipamentos,organização de uma rede com as já então denominadas CoordenadoriasRegionais de Saúde (CRS), ações de capacitação em informação einformática (e não apenas isoladamente em cada um dos subsistemas espe-cíficos), criação de um Comitê Estadual de Informação e Informática e umaestratégia “artesanal” de disseminação de um conjunto heterogêneo de infor-mações com base municipal às CRS e aos municípios. Essa coletânea dedados, na realidade uma coletânea de relatórios pré-formatados de cada umdos subsistemas existentes na SES/RS, agrupados numa encadernaçãomanufaturada na própria Secretaria, foi chamada de “Prontuário de Informa-ções Municipais”. Inicialmente continha dados de produção e pagamento deserviços (SIA e SIH, principalmente)4, com comparativos de padrões médiospor prestador, município, região e estado. Foi um primeiro esforço de estabe-lecer indicadores simples e parâmetros, por meio do acesso transparente àinformação e de consensos e negociações. Um embrião de indicadores maiscomplexos foi gestado por algumas das 19 CRS ao pactuarem metas de tetosfísicos e financeiros para a assistência, associando individualmente dados deincidência e prevalência de algumas doenças e agravos, capacidade instala-da de serviços e compromisso de prestadores e gestores com a qualificaçãodos serviços e ampliação da regulação pública sobre as ações oferecidas.

Esse processo de definição pactuada de indicadores e metas a partir daanálise regional de relatórios e bases de dados isolados subsidiou o início doprocesso denominado Pactuação Solidária da Saúde. No ano de 2000, esseprocesso foi aprofundado com as bases de dados que permitiram analisar aAtenção Básica à Saúde e, imediatamente após, também indicadores e me-tas da Vigilância Epidemiológica foram identificados, discutidos e pactuados.A tecnologia de tratamento e análise manteve-se constituída pela análise iso-lada de bancos de dados e de indicadores simples, com validação por meioda consensualização entre os gestores.

Esse movimento inicial criou, como reação, um significativo aumento dedemanda por acesso a novas tecnologias (equipamentos, softwares, acessoà Internet) e por capacitação para o uso dessas tecnologias de trabalho coma informação, gerando a necessidade de uma evolução na disponibilização euso desses componentes na estrutura da SES/RS.

Em 2001 este processo avançou muito e praticamente todas as coorde-nações centrais e coordenadorias regionais da SES/RS, além do ConselhoEstadual de Saúde, envolveram-se na análise de dados, estudando e formu-lando novos indicadores e parâmetros que explicitassem mais fidedignamen-te a realidade da saúde no Estado. Foi possível, após ampla discussão, orga-nizar e integrar as informações, elaborar a Agenda Solidária da Saúde e pro-

4 SIA é o Sistema de Informação Ambulatorial e SIH o Sistema de Informação Hospital, queregistram a produção assistencial dos serviços de saúde.

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por os indicadores que passam a compor o quadro de metas no Plano Esta-dual de Saúde. A Agenda Solidária da Saúde contempla as particularidadesdo Estado e é um importante instrumento para a gestão e o controle social ecompõe uma das estratégias do processo de Pactuação Solidária da Saúdeno Rio Grande do Sul.

O movimento seguinte de apropriação da gestão estadual da informa-ção, como insumo para qualificar os processos de direção do SUS/RS, foi adecisão de implementar um projeto de alocação de recursos estaduais aosmunicípios com base em indicadores e parâmetros derivados dos Sistemasde Informação. A Municipalização Solidária da Saúde, projeto descrito commaior detalhe em outras publicações5, utilizou-se em 1999 do coeficiente depopulação total do Município para alocar recursos estaduais. Nos anos se-guintes, o projeto utilizou-se da combinação de outros critérios. Esse projetomarcou definitivamente a apropriação da informação como suporte à gestão:a informação passou a compor, de forma diferenciada, a agenda dos gestoresno Rio Grande do Sul, subsidiando, inclusive as funções de financiamento eregulação.

É significativo nesse processo de gestão estadual de informações parasuporte à gestão a rápida adesão e qualificada alimentação dos dados pelosmunicípios do Rio Grande do Sul do Sistema de Informações sobre Orça-mentos Públicos em Saúde (Siops), que já no ano de implantação (1999, coma base de dados do ano anterior) teve a cobertura de 91% do estado, tendosido o de melhor resposta no país. Desta forma, tornou-se possível a utiliza-ção destes dados para critérios de cálculo dos Recursos financeiros daMunicipalização Solidária da Saúde.

A evolução do projeto de informação e informática no Estado do RioGrande do Sul foi delegada particularmente à Rede Gaúcha de Informaçõesem Saúde (RGIS), que foi responsabilizada pela operacionalização do objeti-vo de dar suporte à gestão do SUS no âmbito estadual, regional e municipal,por meio de estratégias de qualificação do trabalho com a informação emsaúde, bem como das tecnologias de informática. Entre estas estratégias,buscou-se a qualificação do parque tecnológico, a produção e organizaçãodas informações, a ampliação das atividades de capacitação, o desenvolvi-mento de softwares, o financiamento de projetos específicos, a publicações eoutras formas de disseminação e parcerias com outras instituições.

A participação da SES/RS no Programa Nacional de Capacitação emInformação e Informática em Saúde para Trabalhadores do SUS, desenvolvi-do pela RNIS, é uma das estratégias desenvolvidas para atuar nesse contex-to de cultura fragmentada e atenuada de uso da informação, o que compro-mete seu uso para a gestão tal qual é configurada na legislação. O ProgramaNacional de Capacitação partiu da constatação da necessidade de um pro-cesso amplo de capacitação dos profissionais de saúde, como um dos princi-

5 Sugere-se os artigos de Ferla e Martins Jr., 2000 e Ferla et al., 2001.

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pais problemas a serem enfrentados para garantir a melhoria da qualidade dainformação, bem como intensificar o seu uso no processo de gestão em saú-de. Esse projeto desenvolveu, como produto, uma seqüência de seis cursoscom os principais temas relacionados à informação e informática em saúde, eserá aplicado numa estratégia de Ensino à Distância (EAD) via Web. Os cur-sos têm os seguintes temas: Novos processos de gestão e o uso da informa-ção; Conceitos e metodologias de análise dos Sistemas de Informação emSaúde; Informação no planejamento e no Controle Social do SUS; Análise dasituação em saúde; Produção e crítica da informação em saúde; Comunica-ção em saúde. Em esforço colaborativo com outros estados, coube à SES/RS a responsabilidade pelo desenvolvimento do 6º curso.

A partir dessas estratégias iniciais, houve uma maior sensibilização detrabalhadores, conselheiros e gestores quanto à importância do uso da infor-mação como subsídio ao processo decisório e ao controle social.

Em decorrência desta sensibilização, houve ampliação e consolidaçãode mecanismos de acesso à informação, favorecendo sua disseminação eapresentação adequada, conforme as necessidades e demandas dos dife-rentes segmentos envolvidos no processo, bem como a ampliação das ativi-dades integradas de capacitação de servidores dos municípios e da SES/RSnos diferentes Sistemas de Informação em Saúde existentes, contribuindopara a qualificação da informação, reduzindo inconsistências na sua alimen-tação e garantindo maior confiabilidade e atualidade de dados.

As informações disponíveis, a partir de dados qualificados e de adequa-dos processos de tratamento, interferem diretamente nas discussões,embasam propostas políticas, subsidiam processos de pactuação e a elabo-ração de parâmetros, permitem avaliações mais criteriosas e que as deci-sões, no âmbito de gestão do SUS, sejam tomadas com mais segurança.

A RGIS/RNIS, envolvendo gestores do SUS, serviços e conselhos desaúde, vem valorizando a integração de projetos e instituições que atuam naárea de informação e informática em saúde no estado. O Comitê Gaúcho deInformação e Informática em Saúde é a instância que congrega diversos ór-gãos que atuam nesta área (Procergs, Datasus/RS, Universidades e outros),bem como, os diversos setores da SES/RS, visando maior organização epotencialização do uso da informação em saúde. Po intermédio desse proje-to, foram adquiridos equipamentos de informática (microcomputadores e im-pressoras) para distribuição às Secretarias Municipais de Saúde, Conselhosde Saúde, às Coordenadorias Regionais de Saúde e para setores de coorde-nação central da SES/RS, com recursos captados por meio de convênios,além de outros equipamentos e tecnologias financiados com recursos própri-os.

A parceria com a Companhia de Processamento de Dados do Estado doRio Grande do Sul (Procergs), possibilitou o acesso à rede Internet para to-das as Coordenadorias Regionais de Saúde e para as Secretarias Municipaisde Saúde interessadas que, até então, não possuíam este acesso, com sub-

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sídio estadual. A partir desta nova realidade, houve a agilização do fluxo deinformações, e, principalmente, a criação de um importante canal de comuni-cação entre o gestor estadual, conselhos de saúde e gestores dos municí-pios, permitindo uma maior integração entre eles.

A descentralização das informações, qualificando as discussões locais,foi fundamental para o processo de Regionalização do Sistema Estadual daSaúde, demandando progressivamente mais respostas e mais facilidades noseu uso. Nessa demanda tem origem a chamada Etapa 2 do processo degestão da informação no estado. Na elaboração do Plano Diretor deRegionalização do Sistema de Saúde do Rio Grande do Sul, a associação dedados demográficos, epidemiológicos e de capacidade instaladageorreferenciados permitiu a identificação de problemas e proposição de es-tratégias municipais, micro e macrorregionais.

Essa necessidade de associar dados com maior facilidade mediante detecnologias mais sofisticadas, de uso ampliado, gerou outras conseqüênciasna gestão estadual do SUS. A sensibilização para o trabalho com as informa-ções foi refletida no acolhimento, pelo conjunto dos municípios, à implanta-ção do Cartão Nacional de Saúde (CNS). Em 2001, os gestores estadual emunicipais de saúde do estado, entendendo de que o CNS facilitará a asso-ciação das bases de dados, qualificando o atendimento aos usuários, a ges-tão e o trabalho de prestadores e profissionais de saúde, assinaram o Termode Adesão ao Cadastramento Nacional dos Usuários do Sistema Único deSaúde e iniciaram o processo de cadastramento.

A análise das informações no processo de realização dos sucessivosdesenhos da regionalização do SUS no Rio Grande do Sul e, principalmente,de sua compatibilização ao recorte do componente da assistência decorrenteda aplicação da Norma Operacional da Assistência à Saúde (NOAS), foramfeitas utilizando-se como suporte principalmente dois softwares degeorreferenciamento: o Tabwin, desenvolvido pelo Datasus/MS, e um produtocomercial (Mapinfo).

A cultura institucional de trabalho com a informação, fortalecendo o usodas informações para a gestão, foi produzindo avanços na gestão da informa-ção. Assim é que as respostas às demandas por bases de dados contem-plando novos aspectos do sistema estadual de saúde foram sendo planeja-das de forma integrada. Bom exemplo foi a criação do Sistema de Informa-ções em Saúde do Trabalhador (SIST), com o objetivo de coletar, tratar, ana-lisar e disseminar dados sobre acidentes e doenças do trabalho. Atualmente,o sistema já ampliou seu foco e coleta dados de acidentes e violências emquatro grupos populacionais prioritários: trabalhadores, mulheres, crianças eidosos. Criado como projeto-piloto de um sistema de informações sobre aci-dentes e violências, já incorporou os conceitos da descentralização desdesua concepção. A escolha deste foco respondeu a uma prioridadeepidemiológica (o grupo de causas externas respondeu por 9,5% das mortesno Rio Grande do Sul no ano de 2000, ficando em 1º lugar entre as causas de

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morte na população entre os 20 e os 29 anos e, na população masculina,também entre os 30 e os 49 anos, sendo o principal grupo de causas quesubtrai anos potenciais de vida no estado; o mundo do trabalho é responsávelpor boa parte desses eventos) este foco respondeu, ainda, à priorização polí-tica (a associação entre condicionantes e determinantes da saúde tem serestringido à própria área da saúde, sendo poucas as iniciativas de monitoraras condições de trabalho como explicação para o adoecimento e a morte) dagestão estadual.

O sistema estadual de informações de acidentes e violências coleta da-dos dos atendimentos de saúde realizados na rede de serviços do SUS. Seusoftware, desenvolvido em parceria com a Procergs, permite que os municí-pios interessados, as Coordenadorias Regionais de Saúde, Conselhos deSaúde e as áreas centrais da SES/RS sistematizem e consolidem relatóriosde dados do seu território. Indicadores e parâmetros relativos são fornecidospelo sistema, que opera on line, para suporte à gestão. O referenciamentogeográfico desses dados, em software livre, permite o mapeamento dos ris-cos ambientais relacionados a acidentes e violências, particularmente nosrecortes anteriormente referidos.

Essa nova cultura da gestão da informação dos dirigentes do SUS noestado, fez com que se desenvolvesse uma matriz para a gestão da informa-ção, conforme está esquematicamente representado na Figura 1. Nessa figu-ra, pode-se verificar que a tomada de decisões da gestão implica no uso dedados submetidos a sucessivos processos de tratamento. Os dados de saú-de, não somente aqueles relativos à incidência e prevalência de doenças emortes, são submetidos a processos de qualificação e analisados por meiode métodos e técnicas que lhe agregam valores explicativos. Assim transfor-mados em informações, são novamente analisados, desde a proposta políti-ca que fundamenta a gestão (no caso da saúde, minimamente deve contem-plar os princípios e diretrizes do SUS). Dessas informações, são destacadosindicadores e a eles são associados parâmetros, consensuados entre osgestores e aprovados pelo controle social. Essas informações, submetidas anovo processo de tratamento, a partir dos indicadores e parâmetros pactua-dos, permite avaliar a situação do sistema de saúde e subsidiar a tomada dedecisões por parte da gestão e do controle social. Assim, a informação, queserve de subsídio à gestão e ao controle social, fortalece principalmente asações de planejamento e avaliação. Essa matriz orientadora sistematizoucontribuições de diversos autores (Ferreira; Azevedo, 1998; Soboll; Carvalho;Eduardo; Tanaka; Moreira, 2001) e orienta o processo de gestão da informa-ção no SUS/RS.

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Figura 1 – Processo de gestão da informação na gestão do SUS/RS

Assumir essa matriz operativa para a gestão da informação significou,concomitantemente, dada a crescente demanda pela informação para supor-te à gestão, incorporar novas tecnologias que respondessem mais agilmenteàs suas necessidades. Novas parcerias, novas tecnologias e novos arranjosforam desencadeados, sem o objetivo de substituir completamente as ante-riores. É a etapa que foi chamada de Etapa 3, relatada a seguir.

Para desencadear essa etapa, está sendo desenvolvido um projeto depesquisa por meio de uma parceria interinstitucional com pesquisadores doGrupo de Inteligência Artificial do Instituto de Informática da UniversidadeFederal do Rio Grande do Sul (Ufrgs) para buscar a associação desubsistemas de informação para a produção de novos conhecimentos na áreada saúde pública, fortalecendo projetos atualmente em execução na Secreta-ria da Saúde do Estado do Rio Grande do Sul e embasando a formulação depolíticas públicas de saúde no estado. Além do interesse local, as tecnologiasdesenvolvidas serão oferecidas para os demais gestores estaduais do SUSpor meio da RGIS.

Os objetivos deste projeto são desenvolver uma metodologia para extra-ção de conhecimento baseada em um paradigma híbrido a ser utilizada portécnicos e não por pesquisadores, repassar esta metodologia aos técnicos daSES/RS e produzir conhecimento aplicável às atividades de planejamento,formulação, acompanhamento, avaliação, regulação e controle das ações eserviços de saúde, com vistas a qualificar e agilizar a implantação efetiva doSUS no estado, a partir de bancos de dados utilizados pela SES/RS. Paraisto, propõe-se estudar e desenvolver técnicas e tecnologias para a Desco-berta de Conhecimento em Bases de Dados (DCBD), utilizando um

dados

informações

avaliação

tomada dedecisão

Gestão

Processos

ParâmetrosPropostapolítica*

Pactuação*

* Inclui a decisão sobre

o nível de tecnologia

que será oferecido

ControleSocial

*

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paradigma híbrido, como diferentes métodos de Inteligência Artificial (IA) sim-bólica e conexionista e técnicas estatísticas.

A importância de tecnologias mais complexas, mas de fácil operação, éuma reivindicação importante da gestão. No Relatório Final da 11ª Conferên-cia Nacional de Saúde, em dezembro de 2000, constata-se a denúncia deque, ao invés de potencializar a gestão do SUS, as tecnologias da área têm,muitas vezes, tornado esta refém daquela (Conferência Nacional de Saúde,2000). É preciso o uso de novas tecnologias que ofereçam indicadores maiscomplexos e mais potentes para a tomada de decisões. Conforme é observa-do por pesquisadores da área da informática, nas “últimas décadas, comavanços da tecnologia de informação, uma enorme massa de dados tem sidoproduzida e armazenada”(Costa; Montagnoli, 2001). Segundo Costa eMontagnoli, op. cit., análises que identifiquem relacionamentos e tendênciasentre dados tornam cada vez mais interessantes a atual armazenagem degrande parte desses dados, de maneiras variadas. Segundo esses mesmosautores, normalmente “os trabalhos nessa área envolvem a aplicação, sobrebases de dados, de métodos de reconhecimento de padrões”, entretanto osautores afirmam que “a integração entre reconhecimento de padrões e basesde dados”, a que denominam mineração de dados, constitui “um ramo deuma área maior, a descoberta automática de conhecimento”.

O projeto de utilização de tecnologias de inteligência artificial para a ela-boração de indicadores de acompanhamento da gestão do SUS no Rio Gran-de do Sul, com a associação de bases de dados, está atualmente em fasebastante preliminar. Ainda assim, tem servido para consolidar asconstatações decorrentes de experiências anteriores da RGIS, que apontamque a informação em saúde pode ser, de fato, uma potente ferramenta para agestão pública do SUS e para desvelar novos sentidos e patamares de saúdeda população. Mais do que pelo fato de estar na lei, “O SUS É LEGAL”, pormonitorar e acompanhar a aplicação dos direitos e das conquistas da cidada-nia, com variados níveis de sofisticação tecnológica, permitindo mais eficáciae tomada de decisões da gestão e do controle social.

Información como herramienta de gestión: desarrollo de parámetros paraacompañamiento del sistema de salud a partir da análisis integrada de los sis-temas de información

Resumen: Relato analítico del proceso de gestión de la política estadual deinformación e informática en salud en Rio Grande do Sul desde 1999, cuando, prin-cipalmente por medio del desarrollo de indicadores y parámetros paraacompañamiento de los sistemas municipales, regionales y estadual de salud, inte-grando bases de datos y desarrollando tecnologías de soporte, se buscó transfor-mar, en la práctica, y profundizar el uso de la información en el soporte a la gestióndescentralizada del Sistema Único de Saúde.

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Palabras Clave: Información; Informática en salud; Sistemas de informaciónen salud; Gestión del Sistema Único de Saúde.

Information as a managing tool: development of parameters to theassistance of the health system from the integrated analysis of the informationsystems

Abstract: Analytical report of the management process of the estate politics ofinformation and computers in health in Rio Grande do Sul since 1999, when, espe-cially by the development of indicators and parameters for the assistance of the mu-nicipal, regional and estate health systems, integrating data bases and developingsupporting technologies, we tried to transform, in practice, and to go deeper in theuse of information in the support to decentralized management of the Sistema Únicode Saúde.

Key-words: Information and computers in health; Information systems inhealth; Management of Sistema Único de Saúde.

Referências

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Informação como ferramenta de gestão: desenvolvimento de parâmetro para ...

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ArtigoArtigoArtigoArtigoArtigo

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A importância da conservação, preservação e restauração e os acervos bibliográficos e ...

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A importância da conservação,preservação e restauração e osacervos bibliográficos edocumentais em saúde coletiva

Iara Jurema Quintela Moreira da Silva1

Resumo: O objetivo do presente artigo é divulgar o trabalho de preservaçãode documentos em papel desenvolvido no Centro de Informação e Documentaçãoem Saúde-Ceids da Escola de Saúde Pública/RS (ESP/RS), relatando as ações dehigienização e preservação da coleção doada pela família do Prof. Ernani SaldanhaCamargo, que dirigiu a ESP/RS de janeiro de 1968 a janeiro de 1971, sendo partedessa obra adicionada ao acervo histórico institucional. Também é referenciado otrabalho na mini-oficina de restauração, onde se recupera obras do acervo de livros.É apresentado um histórico do trabalho e noções básicas de preservação,enfatizando os cuidados essenciais nessa área que devem ser tomados em bibliote-cas e centros de documentação.

Palavras-Chave: Documentação; Preservação; Conservação; Restauração;Encadernação; Memória Institucional; Escola de Saúde Pública/RS; Secretaria daSaúde.

Introdução

O Centro de Informação e Documentação em Saúde (Ceids), da Escolade Saúde Pública do Estado do Rio Grande do Sul (ESP/RS), desenvolve,entre outras funções, um trabalho como biblioteca setorial especializada emSaúde Coletiva. Dentre suas propostas de trabalho, busca conscientizar seususuários sobre a importância da documentação, não só como fonte de conhe-cimento e consulta, mas como instrumento preservador de memória, no caso,a memória e história institucional. O processo de recuperação e qualificaçãodo acervo existente e também daquele da memória histórica institucional fun-damenta a preocupação com possíveis perdas de mananciais de dados futu-ros, que deverão ser restaurados, preservados e conservados dentro de téc-nicas existentes. Como os documentos em papel são os de maior fragilidade,

1 Restauradora do Centro de Informação e Documentação em Saúde da Escola de SaúdePública/RS (Ceids-ESP/RS), e-mail: [email protected]

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Iara Jurema Quintela Moreira da Silva

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consideramos prioridade sua preservação e buscamos destacar e conheceros fatores de sua degradação (causas internas e externas) e a disseminaçãodos meios de estancar tal processo. Esse conhecimento poderá auxiliar naconscientização de usuários da informação documental e dos funcionáriosdas instituições de saúde sobre a necessidade de que todos sejam solidáriose parceiros no trabalho de preservação de acervos.

Conservação, preservação e restauração

O acesso à herança cultural, por meio do resgate de documentos, res-ponde à busca do homem pelo seu passado, de onde viemos e quem somos.As mensagens deixadas nos proporcionam o entendimento de nós mesmos,a que sociedade pertencemos e que espaço ou papéis ocupamos sócio-his-toricamente. A preservação de documentos contribui ao esclarecimento denossa origem étnica e ao enriquecimento do patrimônio cultural do mundo. Épapel do conservador-restaurador buscar a sobrevivência física e materialdestes objetos, sendo responsável pela permanência da informação armaze-nada mediante a sua conservação, preservação e restauração. A conserva-ção se dedica à preservação do patrimonial, mantendo a integridade dos do-cumentos, minimizando a deterioração. A preservação é o agir em procedi-mentos que visam ao retardamento ou à prevenção de deterioração ou dosestragos nos documentos. No caso do suporte em papel, isso ocorre por in-termédio do controle do meio ambiente, das estruturas físicas e dos acondi-cionamentos que possam mantê-lo numa situação de guarda estável. A res-tauração é o agir mediante procedimentos que possam devolver o estadooriginal ou o seu estado mais próximo do original, com o mínimo de prejuízo àsua integridade estética e histórica, conservando a sua personalidade.

Noções básicas de fatores externos de degradação

Consideramos como fatores externos de degradação aqueles direta-mente ligados às condições ambientais de guarda do acervo e externos àconstituição do papel. São eles:

• Umidade e temperatura. Devido ao clima tropical, para que se mante-nha em condições ideais de temperatura e umidade o local de guarda doacervo, é necessário o uso de umidificadores para locais secos edesumidificadores para locais úmidos, com controle por higrômetros e medi-dores de umidade. A temperatura deve ser mantida com aparelho de ar con-dicionado ligado 24 horas, com controle de temperatura automático por meiode termômetros. A oscilação da umidade provoca dilatação na fibra do papel(ao absorver a umidade) ou contração (ao perder umidade). Esses movimen-tos causam enfraquecimento no papel, ocasionando rupturas em sua estrutu-ra. A temperatura elevada, aliada à umidade excessiva e falta de aeração,

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gera a proliferação de esporos de fungos e bactérias. A temperatura adequa-da para manutenção de um acervo é de 22ºC a 25ºC e a umidade relativa de55%.

• Luminosidade. A luz natural, ou seja, a luz do sol, emite radiações ele-tromagnéticas do tipo luz visível, ultravioleta e infravermelha. Cada uma delasatua de modo danoso sobre o acervo em maior ou menor escala. As luzesartificiais, oriundas das lâmpadas elétricas comuns, emitem uma quantidademuito grande de calor e as lâmpadas fluorescentes emitem radiaçãoultravioleta. Esses são os elementos básicos da fotodegradação, processode degradação da celulose que provoca o rompimento da fibra do papel, cau-sando seu envelhecimento precoce e acelerado. Devemos considerar tam-bém outros fatores, como a faixa de radiação, intensidade da radiação inci-dente, tempo de exposição e a natureza química dos suportes de documenta-ção. É necessária a proteção constante dos acervos contra esse tipo de de-gradação por meio da utilização de persianas, cortinas e filtros absorventesde radiação ultravioleta.

• Poluição atmosférica. A poluição atmosférica é gerada pela poeira acu-mulada no dia-a-dia e também pela emissão de gases tóxicos produzidos porautomóveis, fábricas, queima de lixo entre outros. Essa poeira, nos grandescentros, normalmente contém resíduos que catalisam reações químicas, ace-lerando a degradação dos acervos, principalmente quando os níveis de umi-dade do ambiente estão elevados. Como exemplo, temos o que costumamoschamar de manchas d’água, que são manchas de cor marrom, como se al-gum líquido houvesse sido derramado. Ela surge da poeira acumulada nasuperfície do papel sendo empurrada pela umidade para o interior das fibras,migrando da superfície para o interior do papel. Causa grandes danos estéti-cos, suprimindo áreas do documento e afetando a estrutura das fibras. É im-portante a criação de sistemas regulares de higienização do acervo, como umsistema de ar refrigerado e sistema de ventilação com filtros para ar.

• Insetos, roedores e fungos. Denominados agentes biológicos de de-gradação, são devastadores. Sua proliferação pode destruir bibliotecas intei-ras, sendo, também, danosa ao prédio. O clima tropical é propício ao desen-volvimento destes agentes, por causa da temperatura e da umidade eleva-das. Eles normalmente são atraídos pela ação do homem e pela deposiçãode resíduos de alimentos. Os insetos mais comuns nos acervos de papel sãoas traças, as baratas e os cupins. Os fungos, conhecidos como mofo ou bolor,atacam todo tipo de acervo. Como são organismos vegetais desprovidos declorofila, não sendo capazes de efetuar a fotossíntese, utilizam-se de mate-riais orgânicos de onde podem tirar seus nutrientes. Sua disseminação ocor-re por esporos, que ficam em suspensão no ar. Sua proliferação se dá emtemperatura elevada, na umidade e onde o ar fica estagnado. Há normas e

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procedimentos que se devem seguir para evitar infestações. Alguns cuidadosbásicos são manter o local do acervo longe de fontes de alimentos, evitarrefeições nesse local, evitar localizar refeitórios ao lado do local do acervo eretirar o lixo diariamente após o expediente. Armários onde haja livros guar-dados devem ser arejados diariamente por algumas horas. O extermínio sedá com uso de produtos químicos, por meio da desinfestação do acervo.

• A ação humana. Na tentativa bem intencionada de estancar o proces-so de degradação de um documento, podemos fazer uso de instrumentosque, inverso ao seu intento, podem provocar uma degradação muitas vezesirreversível, no caso do uso de colas e adesivos inapropriados, por exemplo.Pelo desconhecimento dos princípios que norteiam os fundamentos da con-servação, esses procedimentos tornaram-se ações comuns e corriqueiras atodos e alertamos sobre algumas recomendações de medidas corretas nomanuseio de documentos em papel:

– manter as mãos limpas;– guardar os livros nas estantes em sentido vertical;– evitar guardar os livros semi-inclinados, quando os mesmos não cou-

berem nas estantes;– guardar os livros nas estantes em sentido horizontal, quando os volu-

mes excederem em tamanho a área para guarda em sentido vertical;– não sobrepor mais de três volumes ao guardar volumes em sentido

horizontal;– manter sempre os volumes maiores como base ao guardá-los em sen-

tido horizontal;– não superlotar as estantes;– reservar espaço de três milímetros entre cada livro para facilitar a reti-

rada da prateleira e evitar o atrito entre as capas (desgaste porabrasão);

– utilizar bibliocantos para impedir que os livros tombem;– não puxar os livros pelo topo (cabeça) ao retirá-los. Os volumes de-

vem ser retirados da estante pelo centro da lombada;– evitar umedecer as pontas dos dedos com saliva para virar as páginas

do livro;– evitar dobrar as folhas para marcar as páginas;– evitar encapar os livros com papel pardo ou similar, pela sua natureza

ácida;– não utilizar fitas adesivas tipo durex e fita crepe, devido à composição

química que provoca acidez e manchas irreversíveis;– evitar uso de grampos ou clips metálicos. Esses materiais enferrujam

com o passar do tempo, deixando no local manchas marrons e mar-cas devido ao tensionamento das fibras do papel;

– não encostar as estante nas paredes. Isso evita que a umidade pre-sente nas paredes se transmita aos volumes;

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– não abrir os livros que forem atingidos diretamente por água e queestejam com as folhas molhadas;

– nunca secar os livros molhados com calor: sol, forno de cozinha, seca-dor de cabelo. O calor em excesso faz o papel secar muito rapidamen-te, causando ondulações no material;

– usar lápis 6B quando precisar fazer anotações de identificação do li-vro, nunca caneta esferográfica;

– controlar o manuseio e orientar o público;– optar por encadernação inteira, ao mandar encadernar;– evitar excesso de tinta nos carimbos. O tamanho e forma deve ser

padronizado pela instituição e coerente, evitando que atinja o texto;– manter constante higienização do acervo;– solicitar ajuda de profissional ligado à área perante algum problema.

Noções básicas de fatores internos de degradação

Os fatores internos de degradação são aqueles que provêm do proces-so de feitura do papel, inerentes à estrutura do mesmo, tais como:

• Tipos de fibra. Os tipos de fibra que compõem o papel, constituídos decelulose pura, que não apresentam lignina em sua fibra, não possuindo aci-dez em sua estrutura, como os de trapos de algodão e linho, são os de maiordurabilidade. A fibra da madeira, quando não sofre o processo necessáriopara eliminação da lignina, torna o papel de baixa qualidade em cor, textura eresistência, isto é, ele torna-se quebradiço e amarelado. Quase a totalidadedos papéis são hoje produzidos com fibra de madeira. Sua degradação emmaior ou menor grau vai depender da purificação no processo de fabricação etambém do controle dos fatores externos de degradação.

• Encolagem. A encolagem é o processo sofrido pelo papel após suafabricação, quando lhe é aplicada uma substância que tem como finalidadefixar a tinta de escrever e de impressão. O uso desta cola evita que a tinta seespalhe sobre o papel, fixando-a sem borrões. Caso o papel não receba essacola, ele absorverá a tinta como um mata-borrão. Até a segunda metade doséculo XIX, usava-se a cola de cartilagem. Após, a cola de cartilagem foisubstituída pelo breu, que é solubilizado na água com adição do alúmen, umsal ácido. Esse composto, na presença de umidade atmosférica, gera ácidosulfúrico, acelerando a degradação do papel.

• Produtos químicos utilizados no fabrico do papel. Quando os produtosquímicos não são eliminados totalmente, provocam reações químicas ácidas,causando degradação do papel.

• Recipientes metálicos utilizados na fabricação do papel. Os recipientes

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depositam partículas metálicas na polpa durante o processo, tornando-secatalisadores de reações ácidas, gerando manchas de ferrugem no papel(foxing).

Higienização

Em 2001, o projeto Ceids-ESP/RS de Recuperação da Memória e Histó-ria Institucional da SES/RS promoveu a busca de dados sobre a ESP/RS, ohistórico dos diretores e dos projetos político-pedagógicos de cada gestão. Abusca de documentos e o estabelecimento de contatos com ex-diretores fa-ziam parte da recuperação da educação em saúde pública no Rio Grande doSul. A família de um dos ex-diretores, prof. Ernani Saldanha Camargo, man-tinha um acervo pessoal resultante da dedicação do professor à memória daESP/RS.

A coleção do Professor Camargo foi doada à ESP/RS. Ela relata suatrajetória pessoal na saúde pública, incluindo o período como diretor na ESP/RS. Em 2001, no processo de recuperação de memória histórica da ESP/RS,este acervo foi resgatado, sofrendo então um processo de análise de suascondições físicas e a necessidade de procedimentos cabíveis para sua pre-servação. Após análise e constatação de degradação pela ação de insetos,pensou-se ser prioritário sua higienização. Frente às condições físicas e re-cursos materiais existentes, concluiu-se que o melhor seria o uso de CO2 noprocesso. Os livros foram colocados em sacos plásticos próprios para lixoseco. Em cada saco foi introduzida uma mangueira ligada a um botijão de gáscarbônico e sua entrada foi lacrada por 72 horas. Os livros, em número dedois, no interior de cada saco, foram colocados de pé, abertos, facilitando adistribuição do gás e mantendo a posição correta do livro, evitando que seupeso afetasse a lombada. Após 72 horas, os sacos foram abertos um a um,sendo designado um funcionário para a chamada limpeza mecânica. Comum pincel largo de cerdas macias, foram limpas folha por folha, de baixo paracima, evitando que qualquer sujidade caísse sobre si. É fundamental que to-das as pessoas envolvidas nesse processos, desde a análise do acervo, es-tejam devidamente equipadas com luvas, máscara, e guarda-pó, resguardan-do-se de qualquer tipo de contaminação que possa ocorrer. Após a limpeza,todos os volumes foram acondicionados em caixas-arquivo, aguardando opasso seguinte: a análise do conteúdo da obra e sua indexação.

O acervo do prof. Camargo recompõe uma riqueza de detalhes do ensi-no e projeto educativos da Saúde Pública/Saúde Coletiva na ESP/RS.

Encadernação

Em 2002, foi montada no Ceids-ESP/RS uma mini-oficina de restaura-ção com equipamento e material suficiente para que se possa trabalhar narecuperação do acervo. Foram disponibilizados um espaço com mesa, uma

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prensa de encaixe e material como tipos de papel variados para a recupera-ção de folhas, capa dura, lombada e cola neutra apropriada ao processo.Ainda não temos o ideal, mas é o suficiente para que possamos manter oacervo da biblioteca em constante recuperação. Todo o livro com algum tipode degradação na capa, folhas, lombada e outros é enviado ao responsávelpela oficina. É feita uma análise da condição geral do que se pode e como sepode recuperar. Cada livro tem uma característica a partir de sua encaderna-ção original: brochura, capa dura, espiral. Estudado como ele foi montado,traçamos como será a sua restauração, que tipo de costura vai ser usada e sedá início ao desmonte, à recuperação de folhas e à limpeza, quando necessá-rio. Os livros atuais são, em sua maioria, brochura, o que os fragiliza devidoàs folhas soltas coladas que, com o manuseio, tendem a desprender-se,mantendo, contudo, as capas intactas. Nesses casos é feita uma costuraserrotada que fortalece a união das folhas, é composta nova folha de rosto ecolocada uma capa dura sobre a original, não perdendo, assim, a identidadedo documento restaurado. Para um efeito estético, foi padronizado o uso dacor azul marinho para as capas.

Continuidade do trabalho

Ainda está no inicio este processo e ainda temos muito a resgatar, masa valorização do trabalho do restaurador dentro do Ceids é importante nacontinuidade e no desenvolvimento desta ação. O incentivo a todos que delaparticipam e o exemplo aos demais centros de documentação são fatoresque mobilizam para o cuidado com a conservação, preservação e restaura-ção dos documentos que, afinal, permitem o conhecimento e apropriação docontexto histórico institucional e, também, do importante referencial teórico-reflexivo ao qual devemos zelar pela permanência e disponibilização ao aces-so público e democrático.

La importancia de la conservación, preservación y restauración y losacervos bibliográficos y documentales en salud colectiva

Resumen: El objetivo del presente artículo es divulgar el trabajo depreservación de documentos en papel desarrollado en el Centro de Informação eDocumentação em Saúde de la Escola de Saúde Pública (ESP/RS), relatando lasacciones de higienización y preservación de la colección donada por la familia delProf. Ernani Saldanha Camargo, que dirigió la ESP de enero de 1968 a enero de1971, siendo parte de esa obra adicionada al acervo histórico institucional. Tambiénse hace referencia al trabajo en el minitaller de restauración, donde se recuperaobras del acervo de libros. Se presenta un histórico del trabajo, las nociones básicasde preservación y los cuidados esenciales en ese área que deben ser tomados enbibliotecas y centros de documentación.

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Iara Jurema Quintela Moreira da Silva

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Palabras Clave: Documentación; Preservación; Conservación; Restauración;Encadernación; Memoria Institucional; Escola de Saúde Pública/RS; Secretaria daSaúde/RS.

The importance of conservation, preservation and restoration of thebibliographic and documental collections in public health

Abstract: The objective of the present article is to publish the work ofpreservation of documents in paper developed in the Centro de Informação e Docu-mentação em Saúde – CEIDS of the Escola de Saúde Pública (ESP/RS), reportingthe hygiene and preservation actions of the collection donated by the family of Prof.Ernani Saldanha Camargo, who ran ESP/RS from January 1968 to January 1971,and part of that work was added to the historical collection of the institution. It is alsoreferred the work in the mini-workshop of restoration, where it is possible to restoreworks of the collection of books. It is presented a report of the work and basic notionsof preservation, emphasizing the essential cares in that area that should be taken inlibraries and documentation centers.

Key-words: Documentation; Preservation; Conservation; Restoration; Binding;Institutional memory; Escola de Saúde Pública/RS; Secretaria da Saúde do Rio Gran-de do Sul.

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Hospitalização em pediatria e as situações de aprendizagem da criança: percepções da ...

Bol. da Saúde, v. 15, n. 1, 2001 v 37

Hospitalização em pediatria e assituações de aprendizagem da criança:percepções da equipe de saúde em umaunidade hemato-oncológica de umhospital universitário 1

Luciana Borges Medina2

Resumo: O artigo busca apresentar as muitas possibilidades de aprendiza-gem da criança na instituição hospitalar, durante a internação pediátrica, por meio docontato com a equipe de saúde que convive diariamente com ela. Procura destacarsituações de aprendizagem da criança em que o psicopedagogo/pedagogo possaatuar, tornando o período passado dentro do hospital em uma experiência positivaque possibilite o crescimento e o amadurecimento cognitivo e psíquico. De entrevis-tas com a equipe de saúde da Unidade de Internação Hemato-Oncológica, do Hos-pital Universitário de Santa Maria, foram extraídos os sentimentos e as percepçõessobre aprendizagem e conhecimento e sobre as relações entre aprendizagem e re-cuperação da saúde. A equipe de saúde presencia diariamente, muitas situaçõesonde a pessoa hospitalizada adquire conhecimento e também o transmite. É impor-tante que neste meio tão rico de informações, sejam elas de origem sociocultural, deconhecimentos oriundos de diferentes mundos em relação à doença, ou ainda, so-bre os procedimentos terapêuticos que são aplicados, atue um profissional que ori-ente e aproveite criativamente esta troca de conhecimentos, para que a mesma nãoseja, de nenhuma forma, desconsiderada. A psicopedagogia/pedagogia encontradentro do hospital aquilo que é o seu objeto de estudo: a aprendizagem cognitiva e odesenvolvimento psíquico.

Palavras-Chave: Aprendizagem e desenvolvimento; Psicopedagogia; Peda-gogia hospitalar; Educação e saúde; Hospitalização.

1 Artigo extraido da monografia de conclusão do Curso de Especialização em Psicopedagogia,Centro Universitário Franciscano – Santa Maria/RS.2 Pedagoga/psicopedagoga, aluna do Programa de Educação Continuada do Programa dePós-Graduação em Educação da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, no GrupoTemático da Educação em Saúde. e-mail:[email protected]

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Luciana Borges Medina

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Introdução

De um modo geral, sinto que, quando trabalhamos com o ser humano,não devemos deixar que apenas a habilidade técnica permeie nosso traba-lho. É necessário usar a sensibilidade e a compreensão quando se lida comvidas, seja na área educacional, seja na área da saúde.

Quando acadêmica do curso de Pedagogia, participei do projeto “Aids –educação e cidadania”, do Hospital Universitário de Santa Maria, que era for-mado por acadêmicos do curso de Enfermagem da Universidade Federal deSanta Maria. Esse projeto tinha como objetivo dar apoio clínico e assistênciade enfermagem às crianças portadoras do vírus HIV.

Uma vez em contato com o projeto, o meu trabalho era dar apoio peda-gógico e educativo às crianças que ali chegavam e que esperavam algumtempo para serem atendidas. Durante esse período, conheci histórias decrianças, e até mesmo de adultos, que alteravam totalmente o seu cotidianoem função de buscarem alívio e melhora para o seu estado de saúde.

Essas pessoas iam ao hospital não apenas para mais uma consulta ouexame, mas também em busca de uma palavra amiga, de algo que pudessefazê-las sentir que valiam a pena todos os seus esforços, que sua luta não eraem vão. E o grupo “Anjos da Guarda” fornecia esse apoio às famílias queeram atendidas no ambulatório pediátrico daquele hospital.

Ao conhecer de perto essa realidade, notei que eu, como educadora,tinha um papel importante dentro do mundo da saúde, só não sabia por ondeiniciar.

Ao ingressar no Curso de Especialização em Psicopedagogia – Aborda-gem Clínica e Institucional, do Centro Universitário Franciscano – Santa Ma-ria/RS, conheci a Psicopedagogia Hospitalar, que propõe uma forma de inter-venção psicopedagógica dentro do hospital. Seu objetivo, segundo Souza(2000)), é contribuir para melhorar a capacidade cognitiva e incentivar o de-senvolvimento psíquico, produzindo conhecimentos que, inclusive, favo-reçam inserção ou reinserção, no meio escolar, daqueles que dele estiveremafastados por motivos temporários ou prolongados. Seu objetivo principal,porém, é propiciar autoconhecimento, reconhecimento das capacidades oulimites, particularidades ou necessidades e promovendo a responsabilidade eautonomia nos tratamentos de saúde.

A minha angústia era saber que, entre tantos pacientes, havia criançasem idade escolar que não freqüentavam a escola, fosse por medo de agrava-rem a doença (devido às condições climáticas, por exemplo) ou por receio deque a comunidade escolar descobrisse o segredo de seu adoecimento e pas-sasse a discriminá-la.

O que passava pela minha cabeça era a pergunta sobre como podiaalgo assim acontecer? Tantas crianças impossibilitadas de viverem o que épeculiar da sua idade: irem à escola, brincar, jogar e estar entre amigos. Oque faltava, talvez, fosse um elo de ligação entre escola e hospital, entre so-

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ciedade e serviços de saúde.O psicopedagogo/pedagogo é um profissional que trabalha com as

questões de ensino e aprendizagem e, para tanto, deve estar preparado paratrabalhar em qualquer ambiente em que possa, de alguma maneira, proporci-onar aprendizagem, seja ela formal ou não. A aprendizagem pode ocorrer emum espaço institucionalizado, em um clima social onde a interação com acultura de forma articulada se faz presente.

Dentro do hospital, o psicopedagogo/pedagogo tem a função de orien-tar, estimular e motivar a pessoa enferma e hospitalizada a prosseguir comseu aprendizado, afinal ela continua em crescimento e desenvolvimento. Mui-to antes de ser um “paciente internado” é um ser em aprendizagem, constru-indo entendimento e concepção de mundo, de vida e de sociedade. Este pro-cesso não pode e não deve ser interrompido por ocasião de uma internação.O homem não deixa nunca de aprender, de adquirir conhecimento, nem mes-mo quando se encontra em situação de fragilidade, como muitas vezes ocor-re nas instituições hospitalares, e a função do psicopedagogo é auxiliar namanutenção e no prosseguimento dessa aprendizagem, trabalhando por seudesbloqueio e por sua potencialização.

Percebo, no entanto, que este aspecto da vida muitas vezes é negligen-ciado por parte da equipe de saúde quando há a internação hospitalar. Nãoque tenha menos importância, mas cada especialista da equipe de saúdepreocupa-se apenas com o aspecto físico/biológico que lhe compete e quedeve ser atendido para a recuperação do estado sadio. Esta função é primor-dial, mas não completa as responsabilidades com a atenção integral à saúde.

É nesse ponto que se faz necessária a atuação do psicopedagogo/pedagogo hospitalar ou do pedagogo nas equipes de saúde em pediatria.Com o estudo aqui relatado, viso a esclarecer esses pontos e encontrar su-gestões e algumas conclusões para que este trabalho em equipe passe aacontecer. O estudo exploratório das percepções e posições da equipe desaúde foi desenvolvido com os profissionais em atuação na Unidade deInternação Hemato-Oncológica do Hospital Universitário de Santa Maria epretendeu investigar “de que maneira é possível desenvolver o trabalhopsicopedagógico/pedagógico no ambiente hospitalar?”

Considerando as experiências vividas e a concepção do serpsicopedagogo/ser pedagogo, o estudo empreendido teve como objetivosconstatar as infinitas situações de aprendizagem que ocorrem dentro da ins-tituição hospitalar; conhecer os valores, sentimentos e atitudes da equipe desaúde em relação à aprendizagem de pessoas hospitalizadas e reconhecer otrabalho do psicopedagogo ou do pedagogo como um elo entre educação esaúde.

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Revisão bibliográfica

Para a revisão bibliográfica, foram buscados alguns temas importantescomo saúde, hospitalização, psicopedagogia, aprendizagem e equipe de saú-de, a fim de fundamentar os objetivos estabelecidos.

Encontramo-nos em uma nova era, um novo milênio, época em que atecnologia cada vez mais é apontada como solução para muitos dos proble-mas que ocorrem com o ser humano. Nos centros hospitalares, esta realida-de não é diferente: cirurgias já estão sendo feitas com o auxílio de robôs eaparelhos de última geração e os sinais vitais dos pacientes são monitoradospor computadores. Não há como negar que isso tudo é bom e que ajuda asalvar vidas, mas como fica o toque, o calor do ser humano, a sensibilidadepara acalmar a angústia, a dor, o medo e o sofrimento do paciente?

O corpo humano, segundo Capra (1982, p. 116), termina consideradocomo “uma máquina que pode ser analisada em termos de suas peças” e adoença vista como “um mau funcionamento dos mecanismos biológicos eque deve ter o seu defeito consertado”. Para o autor, a medicina atual não vêa pessoa “como um ser humano completo”, chegando “até mesmo a reduzir asaúde a um funcionamento mecânico”.

Esse processo acontece em decorrência da alta especialização dos pro-fissionais da saúde: cada membro dentro de uma equipe trata de uma partedo organismo humano.

Cada um desses profissionais tem obrigações muito claras, com fun-ções definidas e cuja ausência é capaz de provocar grandes transtornos, che-gando, algumas vezes, ao impedimento do exercício pelo qual a equipe res-ponde. Portanto, não podemos pensar na vida do hospital sem todos os pro-fissionais que o fazem funcionar.

O que se entende por saúde depende da concepção que se possua doorganismo vivo e sua relação com o meio ambiente. Essa concepção mudade uma cultura para outra, de uma era para outra, e as noções de saúdetambém mudam.

Concordo com Capra (1982, p. 314) quando este afirma que “uma novaestrutura para a saúde só pode ser efetivada se baseada em conceitos eidéias que temos na nossa cultura”.

A condição de uma pessoa depende sempre do seu meio ambiente na-tural e social, não pode haver um nível absoluto de saúde que seja indepen-dente desse meio ambiente. Mudanças contínuas no organismo de uma pes-soa em relação às variações ambientais, incluirão, naturalmente, fases tem-porárias de saúde precária, sendo impossível, algumas vezes, traçar umalinha entre saúde e doença.

Estar saudável envolve muito mais aspectos do que somente o físico/biológico. São importantes também os aspectos psicológicos, sociais evivenciais, todos interdependentes.

Para ser saudável, deve haver um movimento dinâmico onde os aspec-

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tos supracitados estejam integrados. É necessário também preservar a auto-nomia individual do organismo.

A assistência à saúde individual, segundo Capra (1982, p. 326), deveriabasear-se “no reconhecimento de que a saúde dos seres humanos é determi-nada acima de tudo por seu comportamento, sua alimentação e a natureza doseu meio ambiente”. Deve-se destacar que os fatores socioeconômicos eculturais cumprem um papel fundamental nas interações e nas oportunidadesde vida e relacionamentos. Desta forma, há que se pensar em tratamentosdiferenciados.

No processo de redução da enfermidade, houve desvio da atenção dosmédicos do ser humano integral. Ao invés de tratar o paciente como um todo,a ciência médica concentrou-se apenas na doença.

Nos hospitais, por exemplo, o tratamento da doença tornou-segradativamente despersonalizado e, segundo Capra (1982, p. 14), “os hospi-tais converteram-se em grandes instituições profissionais, enfatizando mais atecnologia e a competência científica do que o contato com o paciente”.

O hospital é um local onde, antes de tudo, deve-se proibir o contatohumano. A relação entre enfermos hospitalizados e equipe de saúde deve serestreita, a fim de que a pessoa sob tratamento adquira confiança no cuidadorecebido e naqueles que lhe dão atendimento.

O ser humano é um ser sensível por natureza, não só quando está doen-te e, ao sentir-se doente, a pessoa torna-se mais fragilizada, negativista,superemotiva e, temporariamente, receptiva às ordens médicas e recomen-dações da equipe que lhe vai prestar cuidados e atenções até a sua recupera-ção total. Desta forma, recorro a Mittempergher (1998) para afirmar que

é importante uma transformação nas posturas profissional e pessoal decada um dos envolvidos neste processo, o trabalho em equipe exige, nomais amplo sentido, não se deixar cristalizar no seu saber exclusivo, umavez que permite uma visão global do paciente enquanto indivíduo, visãoessa constituída por conhecimentos que não devem ser colocados lado alado, mas permear-se mutuamente (Mittempergher, 1998, p. 17).

Em uma equipe de saúde, vários são os membros e especialistas quelutam pela manutenção da vida: médicos, enfermeiros, auxiliares de enfer-magem, psicólogos, nutricionistas e assistentes sociais, que devem trabalharem sintonia para a recuperação total da pessoa enferma. É preciso que seuscomponentes não se percebam isolados, que decisões sejam tomadas emconjunto. Assim, Motta (1997, p. 101) refere que a equipe de saúde deveassumir uma característica de individualidade: “seus componentes fundem-se num só e não se percebem isolados, formam uma imagem em comum”.

No entanto, tais decisões devem vir acompanhadas de sensibilidade, deresponsabilidade, de envolvimento com a pessoa enferma, não apenas se-rem guiadas por técnicas e procedimentos frios. Dentro do hospital deve ha-ver uma relação de afeto e cooperação entre aquele que está enfermo e a

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equipe de saúde.O convívio em equipe auxilia inclusive o próprio profissional a comparti-

lhar angústias e as ansiedades do mundo do hospital.A equipe de saúde deve ser especial para o enfermo e vice-versa. Se-

gundo Motta (1997, p. 143), a equipe de saúde é “a protagonista das cenas domundo do hospital”, devendo demonstrar “sensibilidade e solicitude no pro-cesso de cuidar”. Essa mesma equipe, entretanto, “necessita de uma estrutu-ra emocional que habilite-a a desempenhar seus papéis de forma equilibra-da”.

O tratamento do câncer, por exemplo, é longo, com grande desgasteemocional e físico e requer persistência e esperança da pessoa com a doen-ça e da família. Toda a doença é uma situação traumática e com o câncer nãoé diferente.

É uma doença que traz consigo o estigma da morte e a relação entre aequipe de saúde e a pessoa com a doença mostra-se com característicasbem diferentes de situações menos graves. Portanto, é fundamental umaequipe que se compadeça e que tenha competência técnica para lidar com asdiversas fases da doença.

Pela falta de informação da população, câncer e morte constituem qua-se que uma relação de equivalência, o que, graças aos novos processosterapêuticos, não mais corresponde à realidade. O câncer afeta o indivíduo, afamília e, por vezes, toda uma comunidade com suas característicassocioculturais. De acordo com Carvalho (1994, p. 59), “o contato diário com ocâncer e a morte é tarefa altamente ansiogênica e cria na equipe de saúdecomportamentos defensivos”. A autora coloca que “não se pode esquecerque o paciente tem uma percepção do que acontece em volta dele e com ele”.

Ao ser cerceada do convívio familiar, a pessoa hospitalizada sente-sedesamparada e com receio do futuro por não saber quais as possibilidadesde tratamento ou o porquê deste ou daquele procedimento estarem sendorealizados.

Nesse ponto, observa-se que a pessoa hospitalizada fica alienada dosconhecimentos que lhe dizem respeito no tocante ao próprio corpo e ao queestá sendo feito com ele.

Aqui, entra a questão do não saber e, de acordo com Mittempergher(1998, p. 18), a função do “não saber” é a mantenedora de “um estado quenão se deseja ver alterado”.

Cada um de nós tem uma relação muito própria com o significado dosaber e do aprender. Neste estudo, utilizo o termo aprender e recorro aMittempergher (1998, p. 18) para definí-lo. Para a autora, o aprender está“associado à apreensão do mundo, elemento repleto de conteúdos a seremexplorados e conhecidos, incluindo assim a aprendizagem formal e informal”.Para tanto, é necessário que o profissional de pedagogia/psicopedagogia co-nheça de que modo ocorre essa aprendizagem e em que condições ela podeser apreendida.

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De acordo com Bossa (2000, p. 23), “é necessário também que opsicopedagogo saiba o que é ensinar e o que é aprender”, bem como saibade que forma “interferem os sistemas e os métodos educativos”, além deconhecer “os problemas estruturais que intervêm no surgimento das dificul-dades de assimilação da aprendizagem”.

É nesse momento que o psicopedagogo/pedagogo assume o seu papel.O fazer psicopedagógico dentro do ambiente hospitalar tem como temática ocorpo, o corpo que aprende sobre si, sobre o que está ao seu redor e sobre oseu mundo, a função do psicopedagogo é reconhecer e atender às alteraçõesda aprendizagem sistemática e/ou assistemática. Desta forma, de acordocom Mittempergher (1998), “o trabalho psicopedagógico no hospital assumeuma nova proporção, uma vez que contribuiria para construção dinâmica econstante da aprendizagem”.

O profissional de psicopedagogia tem como principal objetivo as diferen-tes possibilidades de aprendizagem, sempre levando em consideração o con-texto psicossocial onde o indivíduo aprendiz está inserido. Assim, conformeAlessandrini, citada em Peres (1998, p. 42), a psicopedagogia “é uma áreainterdisciplinar de prestação de serviços educacionais, por intermédio da qualpsicólogos, fonoaudiólogos, educadores e outros profissionais, desde a pers-pectiva de sua formação básica, buscam ajudar crianças ou adultos em suasdificuldades de aprendizagem”.

É necessário pensar que aprendizagem e saúde caminham juntas. Apsicopedagogia, além de comprometer-se com a aprendizagem, comprome-te-se com a saúde. Desta forma, percebo que a pessoa hospitalizada, emface do crescimento e desenvolvimento especiais, seja pela faixa etária ououtras condições psicossociais, deva ter assistência psicopedagógica ouatendimento pedagógico, pois ela necessita continuar com o seu aprendiza-do, que traz as concepções do mundo e da realidade de onde veio.

A psicopedagogia hospitalar talvez seje o caminho para que o indivíduo,por meio do conhecimento de ser que vai além da doença e de qualquer outroaspecto de sua vida, forme com ele um todo indissociável.

Metodologia

A minha proposta, neste trabalho, foi conhecer e refletir sobre a percep-ção da equipe de saúde acerca das situações de aprendizagem e, assim, ametodologia mais adequada pareceu ser a pesquisa qualitativa.

Contar, neste trabalho, com a fenomenologia é poder, a partir desta refe-rência metodológica, entender o fenômeno educação-saúde da maneiracomo se apresenta. O método fenomenológico é a investigação e a descriçãode fenômenos que são experienciados pela consciência, sem teorias sobresua explicação causal e tão livre quanto possível de pressupostos e precon-ceitos.

A fenomenologia não privilegia o sujeito nem o objeto, mas sim, a rela-

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ção entre ambos, pois entende que um é determinante do outro, é a relaçãoentre o mundo do vivido e a descrição direta de nossa experiência. O que afenomenologia enfatiza é o relato do componente subjetivo do comportamen-to das pessoas.

O psicopedagogo, segundo Noffs (1995, p. 22), “atua mediante o conhe-cimento das teorias e instrumentos da pedagogia, aliados à ressignificaçãoda aprendizagem, desta maneira tem seu objeto de estudo voltado para oconhecimento”.

Sendo assim, a metodologia a ser adotada durante este processo devepreocupar-se com o conhecimento, sua construção, sua aquisição e suasorigens. A informação, na sua essência mais profunda, necessita ser intuídae não apenas descoberta. Essa essência poderia ser pesquisada com a aju-da da fenomenologia e concordo com Merleau-Ponty (1990, p. 86) quandocita que “a experiência vivida só é interessante imediatamente para quem seinteressa pelo homem”.

Neste sentido, o método fenomenológico não se preocupa com resulta-dos objetivos, mas sim procura interpretar a subjetividade das respostas atra-vés dos possíveis significados existenciais. Propõe descrever fatos e não arealidade em si.

A hermenêutica complementa o processo de descrição dafenomenologia, preocupando-se com a interpretação. O métodohermenêutico, segundo Terra (1998, p. 24), “tem como objetivo interpretar e,desta maneira, compreender o fenômeno em questão”.

Esta pesquisa, portanto, não poderia buscar outro auxílio senão aFenomenologia-Hermenêutica, pois a saúde e a aprendizagem necessitamde compreensão e de sensibilidade, e quando dois fenômenos tão comple-mentares são objetos de estudo, não se pode simplesmente qualificá-los, énecessário entender como e de que maneira afetam e modificam a vida doser. Relembrando Capra (1982, p. 135), “a arte de curar não pode serquantificada” e, ousaria complementar, nem a arte de aprender e ensinar, eladeve ser compreendida.

Para complementar o processo metodológico, recorro a narrativa dosprofissionais de saúde, por meio de entrevista como recurso para conhecersuas vivências, seus entendimentos e percepções sobre a psicopedagogia/pedagogia hospitalar.

Neste sentido, Bogdan e Biklen (1994, p. 134) citam que “a entrevista éutilizada para recolher dados descritos na linguagem do próprio sujeito, per-mitindo ao investigador desenvolver intuitivamente numa idéia, sobre a ma-neira como os sujeitos interpretam aspectos do mundo”.

Caracterização do local

O presente estudo foi realizado na Unidade de Internação Hemato-Oncológica (UHO) do Hospital Universitário de Santa Maria (HUSM).

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O HUSM localiza-se no campus da Universidade Federal de Santa Ma-ria (UFSM), bairro Camobi, desde o ano de 1982. Caracteriza-se por ser umhospital-escola onde estagiam, atuam e estudam alunos dos vários cursos daárea da saúde (Medicina, Enfermagem, Fisioterapia, Fonoaudiologia e Far-mácia). É um órgão público federal, sendo um centro de referência estadual.Em Santa Maria, é o único que prioriza o Sistema Único de Saúde (SUS),atendendo a pacientes oriundos de vários municípios da região. Conta com67 salas ambulatoriais e 310 leitos em funcionamento.

Em 1984, surgiu no HUSM o Serviço Hemato-Oncológico, situado naClínica Médica II, 5º andar, onde funciona o Isolamento Protetor.

O Serviço Hemato-Oncológico é composto pela Unidade Hemato-Oncológica (UHO), pelo Centro de Transplante de Medula Óssea (CTMO),pelo Ambulatório de Quimioterapia, pelo Laboratório de Hematologia, Huma-no-Genética e Histoimunocompatibilidade.

A UHO, o CTMO e o Ambulatório de Quimioterapia situam-se no 1º an-dar, junto à Unidade de Psiquiatria.

A estrutura física é compreendida pelos seguintes ambientes: sala deexpurgo, serviço de nutrição, sala de lanche da equipe de enfermagem, am-bulatório de quimioterapia e salas para administração de quimioterápicos.

A UHO é composta por sala de passagem de plantão e preparo de me-dicamento. Dispõe de 18 leitos, 6 para adultos e 12 pediátricos. Cada quartoe cada enfermaria contém um banheiro exclusivo para aqueles que estãohospitalizados e cada criança tem direito a acompanhante.

A Unidade visa dar assistência àqueles com diagnóstico confirmado ouem investigação de doenças hematológicas ou oncológicas, pessoas rece-bendo quimioterapia ou imunodeprimidas.

O horário de visitação é diário, das 14 às 15 horas, sendo permitidasduas (02) visitas por pessoa hospitalizada.

Caso a pessoa hospitalizada tenha condições, poderá receber um nú-mero maior de visitas nas salas de espera do Ambulatório de Quimioterapia.

A UHO dispõe da seguinte equipe de saúde: 07 enfermeiros, 14 auxilia-res de enfermagem, 04 bolsistas de enfermagem, 02 secretários, 06 médicoshemato-oncologistas, 02 funcionários para auxílio/transporte no turno da ma-nhã, 02 residentes médicos, 07 funcionários para o serviço de higiene e lim-peza da unidade, 01 pedagoga, 01 psicóloga, 01 assistente social e 01nutricionista.

Seleção dos sujeitos da pesquisa

Foram entrevistados dez profissionais de saúde que trabalham na UHO,pois em meu entendimento, nesta Unidade há uma visão da relação educa-ção e saúde já traduzida na inclusão do trabalho de pedagogia no tratamentosob internação de crianças e adolescentes. Na apresentação da análise dosdados, será garantida a omissão da profissão e nomes, compromisso que foi

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firmado por ocasião das entrevistas. Os profissionais foram identificados como nome de pedras preciosas para a sistematização e registro das opiniõesemitidas.

Foi utilizada a técnica da amostragem aleatória para que todos os profis-sionais da equipe de saúde, incluídos na população, possuíssem a chance depertencer à amostra. As entrevistas foram realizadas no HUSM, algumas nasala do espaço pedagógico, gentilmente cedido pela pedagoga, ou na sala daenfermagem da UHO e foram agendadas de acordo com a disponibilidadedos profissionais e da pesquisadora, ficando livre a escolha de querer ou nãoparticipar.

Utilizei a entrevista semi-estruturada e informal, com o objetivo de pro-porcionar uma melhor interação com os profissionais. O material auxiliar foi ogravador, com autorização prévia desses profissionais. O tempo de duraçãofoi, no máximo, de uma hora.

As questões norteadoras deste trabalho foram as seguintes:1. Como você percebe a pessoa hospitalizada?2. Qual o seu sentimento em relação às pessoas hospitalizadas?3. As pessoas hospitalizadas em sua Unidade comentam com você so-

bre a vida anterior e após a internação?4. As pessoas hospitalizadas em sua Unidade demonstram curiosidade

em saber o que se passa com elas dentro do ambiente hospitalar?5. O que significa para você: aprendizagem; apoio; vida?6. Como você percebe a equipe de saúde no hospital?

Análise das entrevistas

Nesta etapa da pesquisa, foram apresentados os resultados obtidos pelaanálise das entrevistas, tanto na forma de descrição quanto de interpretaçãodos mesmos. Ela tem a finalidade de analisar e interpretar as respostas dasentrevistas referentes às percepções da equipe de saúde sobre a atuação dopsicopedagogo na área hospitalar, mostrando o que eles pensam sobre otema proposto.

Para poder apresentar os conteúdos, procurei colocar em ordem os da-dos, organizando as situações vivenciadas pela equipe de saúde. Realizei aleitura das situações coletadas nas entrevistas, que foram escritas após asua realização. Essas situações revelaram-me a forma de perceber o traba-lho do psicopedagogo na área hospitalar. O entendimento das situações ocor-reu-me a partir da compreensão de enunciados, idéias e reações obtidas nasentrevistas com a equipe.

A partir desses dados, vou identificar cada experiência como sendo si-tuações vivenciadas pela equipe ao longo das entrevistas.

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Primeira situação: SENTIMENTOS

Nos relatos das entrevistas, percebi que, na equipe de saúde, as emo-ções vêm à tona; o medo bane o raciocínio, os componentes tornam-sefragilizados emocionalmente porque o seu bem-estar mental repousa, emparte, na ilusão de que somos invulneráveis. Isto evidencia que a vida emotivaé inseparável da profissional nas pessoas que compõem esta equipe. Os fa-tos demonstram que os profissionais passam da insensibilidade emocionalpara uma existência emocionalmente centrada no afeto, o que confirma aidéia de Motta (1997, p. 113) de que “a equipe de saúde mostra-se sensível àdor física e emocional do paciente e ao sofrimento da família e procura apoiá-los no processo de cuidar”. Para esta autora, ao vivenciar o fato de que ostratamentos muitas vezes não conferem os resultados esperados, produz-se,na equipe de saúde, sentimentos de impotência e tristeza.

[...] dá uma certa fragilidade o estado dele, porque a gente sabe que táenfraquecido; vem toda uma carga de dor [...] não há emoções puras, háum misto de emoções: revolta, pesar, alegria... Aprender envolve senti-mentos (Ônix).

Eu tenho sentimento de muito carinho, há um grande apego com o pa-ciente... a gente tá aprendendo sempre através do sofrimento, atravésdas tristezas, a gente aprende a dar valor para a vida [...] (Ametista).

Eu noto que o meu sentimento já mudou bastante... eu sentia muita pena,mas com o tempo a gente tem que converter essa pena em ajuda[...] avida tem que ter objetivos, deve ser compartilhada, e nessa vida tem queestar incluído o emocional, o espiritual (Água Marinha).

[...] o meu sentimento principal é de que eles melhorem, de ver todosbem, livres de todos esses problemas que eles têm (Safira).

[...] quando tu prevê que a coisa tá afundando, aí tu te angustia demais,tu acaba te estressando demais [...] (Topázio).

Segunda situação: RACIONALIDADE/SENSIBILIDADE

Pelos relatos das entrevistas, o movimento racionalidade/sensibilidadeestá presente de maneira muito forte em todas as falas dos entrevistados:

[...] às vezes acaba passando daquela fase mais científica do tratar ade-quadamente, sabendo que tantos por cento dá certo ou não ou mesmosabendo que não vai dar certo, tentando medidas a mais para ver seconsegue algum resultado [...] (Topázio).

As pessoas não são tão robotizadas que pudessem ter uma só emoção.É claro que te dá pesar por ver um paciente que pelas leis naturais esta-

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ria brincando, que pela idade natural estaria curtindo o melhor que temda vida (Ônix).

Um ponto conflitante, revelado nas entrevistas, refere-se ao reduzidoespaço das manifestações emocionais reservado pela racionalidade. Perce-bo um bloqueio, o controle das manifestações de seus sentimentos, a esco-lha por uma fronteira de autopreservação. Para Maffesoli (1984, p. 119) “amáscara ou a duplicidade é a proteção contra as formas de absolutização, oautor coloca que é a brecha, o desvio, que permite à vida a carapaça contra aameaça e a agressão, isto é, um espaço de liberdade que se instaura em faceda opressão”.

Se a autenticidade perturba, é necessário empregar a máscara que pos-sibilita existir:

[...] mas é complicado porque o choro está sempre presente conosco, agente vai tentando sufocar o choro e a dor, a gente veste uma máscara,uma roupagem de profissional e tenta sempre colocar o lado bom de to-das as histórias [...] (Ônix).

[...] antigamente, há oito anos atrás, eu tinha uma atitude mais passional,eu tinha uma atitude onde me envolvia mais com o paciente e eu fui como tempo mudando a minha atitude para não perder a minharacionalidade[...] procurei me abster o máximo possível para manter aminha racionalidade profissional, antigamente eu me envolvia mais coma família e o paciente [...] hoje eu procuro me preservar até para nãoinfluenciar toda essa carga de perda, de mortes freqüentes na vida pes-soal [...] (Rubi).

[...] mas eles falam e a gente escuta eles, mas o envolvimento tem quecontrolar porque eu já me envolvi bastante querendo ajudar e acabei en-trando em depressão também. Então, eu procuro controlar, eu ajudo, mascom limites (Esmeralda).

Alguns profissionais admitem a dificuldade de serem apenas o profissio-nal, desvinculado de qualquer emoção e reconhecem o seu envolvimentoemocional, mas este sempre vem acompanhado de restriçõe, como identifi-carei nas falas a seguir:

É difícil tu ser só [...], só profissional, ir lá fazer o que tem que ser feito,não é verdade. Há um envolvimento emocional, só que a gente sabedosar isso [...]. Por exemplo, quando eu saio do hospital, raramente eusaio pensando no paciente, saio do hospital e a enfermeira ficou aquidentro, porque se tu for levar todos os problemas que têm aqui dentro tuavida vai virar um inferno (Água Marinha).

A princípio teria que ver a relação profissional – paciente, teoricamente,sempre proporcionar o tratamento adequado, o melhor conforto possível

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para o paciente e na medida do possível se envolver, mas não demais[...] (Topázio).

Terceira situação: RELAÇÃO EQUIPE – ENFERMO

A relação entre a equipe de saúde e a pessoa hospitalizada aparececom força, com fragilidade e com algumas dúvidas: a relação entre essesdois elementos deve ser somente orientada por procedimentos profissionaise científicos ou também há lugar para as emoções e para a intuição? Segun-do Goleman (1995 p. 180) para a pessoa hospitalizada ‘“qualquer contatocom uma enfermeira ou um médico pode ser uma boa oportunidade paraobter informações acerca do seu estado clínico e, assim, ficar mais tranqüilo,reconfortado, aliviado, mas, se, pelo contrário, esse contato for desastroso,pode ser um convite ao desespero”.

Identifiquei algumas preocupações desta natureza nas seguintes falas:

[...] se a primeira abordagem não for feita da maneira mais correta possí-vel, nós corremos o risco deste paciente vir fazer a primeira etapa dotratamento e depois nunca mais voltar (Rubi).

A gente procura vê-lo como um todo e não ver somente a doença e vendono todo há um envolvimento bem maior (Água Marinha).

O primeiro contato, eu acho, que é de estranheza, ele está num ambientenovo, ele não sabe muito bem o que tem ainda, é uma fase de adaptaçãono primeiro contato. Eu tento ter uma relação profissional – paciente, bemboa, procurar explicar como é que são os serviços porque geralmenteeles chegam num mundo bem diferente (Brilhante).

[...] às vezes eles (pacientes) mantêm uma certa distância, mas com aconvivência, com todo o processo do tratamento, eles dão uma melhora-da neste comportamento (Ametista).

A maioria dos entrevistados reconhece a importância desta relação serpermeada por diálogo e troca de experiências, trazendo um benefício para oenfermo hospitalizado.

Segundo Goleman (1995, p. 195), o relacionamento proveniente doscuidados de saúde são os “mais importantes na vida da gente e as pessoascom quem se mantêm um contato cotidiano são importantes para nossa saú-de”. O autor destaca que “quanto mais significativo for o relacionamento maisele é importante para a preservação da nossa saúde”.

[...] diariamente tu conversa e eu recordo que aquela assistência profis-sional que eu dava não era o principal, era sentar, conversar, ouvir opaciente, contar histórias [...] (Rubi).

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Há uma proximidade entre mim e o paciente através de encontros e reu-niões de grupo[...] é uma parte educativa para tentar acalmar medos eanseios (Safira).

Quarta situação: FUNÇÃO DO SABER OU NÃO SABER

Aqui aparece a questão sobre a dificuldade de aprendizagem em rela-ção aos conteúdos da instituição: qual a doença? Quais as possibilidades detratamento? O por que de alguns procedimentos e exames? Sendo que, deacordo com Mittempergher (1998, p. 18), “dada a carga emocional ligada àprópria doença em pauta, talvez a questão do não-saber esteja vinculada aoperigo de saber”. A autora ressalva que “a função do não saber pode sermantenedora de um estado que não se deseja ver alterado”.

[..]. os pacientes sabem tudo e a curiosidade que eles têm a gente procu-ra esclarecer (Ônix).

Eles procuram saber o que está acontecendo e isso ocorre bastante. Setu disser que tem uma bibliografia ou alguma coisa relacionada com adoença eles chegam pra gente e perguntam o que é isso, o que é aquilo.As dúvidas, geralmente, são em relação à doença (Esmeralda).

Ao ser definido o diagnóstico, então é colocado que vai haverquimioterapia ou outro tipo de tratamento, é falado sobre os efeitoscolaterais (Água Marinha).

Eles têm que saber: sabem os resultados dos exames, alguns já sabem oque está alto e o que está baixo, eu não preciso ser a detentora do co-nhecimento para que ele confie em mim somente... só o paciente bemorientado vai contribuir no seu tratamento (Rubi).

Eles têm curiosidade e a gente não omite nada sobre a doença, todos ospacientes têm perfeita consciência e conhecimento de todos os seus exa-mes (Safira).

Os adolescentes também sabem o dia da coleta de sangue e chegam atéa deixar a gente meio confuso perguntando: Já veio o exame? Quantoestão as minhas plaquetas? Eles têm uma noção boa do tratamento(Topázio).

Um dos entrevistados faz o papel inverso, é ele quem pergunta se opaciente ou a família conhecem a situação, se sabem alguma coisa sobre adoença:

[...] é feita uma ficha psicossocial e eu pergunto se eles sabem o que elestêm e aí eu identifico se eles estão bem esclarecidos e aí a gente sabeque podem ser várias coisas: ou o médico não sabe ainda o diagnóstico,

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ou o médico disse, mas com termos difíceis e ele não entendeu nada,então é parte do meu trabalho perguntar se sabe ou não e no caso de nãoestar esclarecido eu falo com o médico e dou o retorno para o pacienteou familiar (Turquesa).

“A mãe não sabe o que vai acontecer, não sabe o que a criança tem, eutento pelo menos explicar tudo, dar o melhor suporte, o que vai ser feito,tirar as dúvidas... os pais sempre querem saber e varia de acordo comcada profissional, eu, por exemplo, chego e já digo o que vou fazer, sem-pre explico antes de qualquer coisa. Eu procuro não esconder nada paraque as crianças não percam a confiança” (Brilhante).

Quinta situação: AS MUDANÇAS NA VIDA DA PESSOA HOSPITALIZADA

Quando o indivíduo é hospitalizado e sofre de uma doença que vai deixá-lo por um longo período internado, ocorre uma ruptura na normalidade docotidiano: serão novas pessoas, novas perspectivas, certamente haverá so-frimento, dor e angústia, isso tudo envolto em cuidados e precauções. Então,como ficarão os vínculos anteriores e os conhecimentos? Será que ocorrerãomudanças no seu modo de pensar, de ver a vida? E depois, quando sair dohospital, quais são as expectativas?

Mittempergher (1998, p. 21) afirma que

o conhecimento vindo da escola, de casa, da rua, de si mesmo e do pró-prio hospital, deve adquirir um novo significado para a pessoa hospitali-zada, esse conhecimento deve ser mais positivo, para que sua qualidadede vida seja elevada, não só se pensando na cura e conseqüentereinserção nas atividades diárias de cada uma, mas também na sua vidadurante o tratamento, vida essa que prossegue e deve ser bem cuidada.Mittempergher (1998, p. 21)

[...] esta ruptura da vida, da ordem normal, da hospitalização traz bastan-te transtorno para a família. Então, no primeiro momento que ele interna,a primeira coisa é a mãe colocar como era antes a vida: como o filho tinhasucessos, como tinha uma vida leve, a escolarização... estão sempre tra-zendo o que tem no passado para de certa forma trazer um pouquinho dahistória do paciente, ela (a mãe) tenta contextualizar a criança para queele seja visto como um ser humano, que tiveram vida anterior, não são sóum número no Same (Ônix).

Geralmente, quem estuda comenta sobre a vida que tinha antes, queeles estudavam e, de repente, eles se encontram ali, naquela situação(Ametista).

Eles contam sobre a vida de casa que para uns é triste e outros comen-tam as dificuldades financeiras que eles já têm, independente do trata-mento (Esmeralda).

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[...] eles comentam sobre a vida anterior e, quando não querem comen-tar, a gente até puxa: onde mora, quantos irmãos têm, o que tu faz, setem bichinho. Se não, fica uma ruptura muito grande, sabe, imagina seele não comentar da vida dele antes do hospital e ter lembranças, no quevai virar a vida dele? (Água Marinha).

[...] é uma fase bem difícil porque adolescente tu imagina que tem queestar do lado de fora, curtindo a vida, namorando, fazendo festa e tudoisso aqui, de uma maneira ou de outra acaba trazendo algumas caracte-rísticas negativas [...] eles falam “antes eu saía bastante, eu podia namo-rar, até mesmo tinham relações sexuais ativas” e depois que apareceuisso aí, a doença, eles se queixam que foram trancados para muitas coi-sas (Safira).

[...] as mães sempre colocam a situação de como era a vida antes: toda areestruturação que eles têm que ter em casa e deixar os filhos pequenoscom outros familiares ou com os pais (Brilhante).

Quanto ao futuro, as expectativas são as mais variadas, conforme de-monstram as falas a seguir:

[...] eles acham que, com o tratamento, tudo vai melhorar, tudo vai mudar,até mesmo adulto. Os cuidados com a vida mudam (Esmeralda).

[...] muitos querem estudar, fazer faculdade, fazer magistério, enfim (ÁguaMarinha).

[..]. eles têm planos de futuro porque isso é que move eles a continuaremo tratamento, senão não continuariam (Rubi).

[...] quanto às expectativas, eles comentam que gostariam de ter umavida mais ativa, de passar mais tempo em casa, com a família e os ami-gos (Safira).

[...] alguns comentam sobre o futuro, mas não é prioridade deles, o futuropara eles é ficar livre da doença (Turquesa).

Tem alguns que falam que querem estudar para serem médicos para cu-rar os outros da mesma doença, tem outros que não comentam. [...] Amaioria quer voltar a estudar; como eles ficam muito tempo em tratamen-to, eles param um ano ou dois e acabam perdendo o colégio (Brilhante).

Sexta situação: APRENDIZAGEM

O ponto mais importante desta pesquisa refere-se à aprendizagem eesta aparece de diferentes formas, sendo uma construção do conhecimentoque ocorre cotidianamente. Assim, a aprendizagem, segundo Bossa (2000, p.

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28), “é responsável pela inserção da pessoa no mundo da cultura”. Mediantea aprendizagem, conforme a autora, “o indivíduo se incorpora ao mundo cul-tural, com uma participação ativa ao se apropriar de conhecimentos e técni-cas, construindo em sua interioridade um universo de representações simbó-licas”.

A grande maioria dos pacientes internados vêm da zona rural, então elestêm aquela vida relacionada com aquele meio ali. Muitas coisas damodernidade eles não conhecem, vão vir aprender aqui no hospital [...]eles vão ter um conhecimento mais abrangente, vão ter uma ampliaçãodo mundo deles, até o simples fato de ir daqui do hospital até a rodoviá-ria, para a família, é um ganho porque eles não conhecem a cidade. [...]Tudo o que vai modificar a conduta de alguém, de um sujeito, é um ato deaprender (Ônix).

Todo o sujeito incorpora a representação do mundo, ao qual, por suavez, incorpora-se e sujeita-se. Conforme Paín (1992, p. 17-18), “tal processocompreende todos os comportamentos dedicados à transmissão da cultura,inclusive os objetivados como instituições que, específica (escola) ou secun-dariamente, promovem a educação”.

[...] é o objetivo de estarmos neste mundo, de estarmos a cada dia apren-dendo. É sempre uma troca. Se a gente passa pela vida sem aprendernão vale a pena (Água Marinha).

A aprendizagem é contínua[...] a gente aprende a cada dia, porque acada dia tu vem trazendo uma carga de uma vida anterior e de cadapessoa que tu conhece tu leva um pouquinho e deixa um pouquinho de titambém (Rubi).

[...] a gente aprende muito com essas famílias da compreensão de mun-do, de amor, da solidariedade, da capacidade de expressar os sentimen-tos, pra mim a aprendizagem é uma relação de troca (Turquesa).

O hospital, enquanto instituição, constitui um meio social que cria infini-tas situações de aprendizagem, sejam elas relacionadas com o conhecimen-to de procedimentos realizados no hospital, ou de convivência com outro tipode mundo, ou ainda do amadurecimento que ocorre diante da situação deestar internado. É nesta situação que o psicopedagogo compromete-se a tra-balhar: intervindo no processo de aprendizagem que, de uma forma ou deoutra, produzirá alterações, seja no comportamento, na maneira de entenderou de ver o mundo, fazendo com que as experiências vivenciadas neste pe-ríodo de internação, sejam elas positivas ou negativas, tragam uma novaconstrução de conhecimento que o norteará para uma mudança de vida. Parareafirmar essa idéia, cito Souza (2000), que afirma que “a aprendizagem estásempre relacionada com o próprio sujeito, com o sujeito e o objeto, com o

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sujeito e o meio, sistematicamente”. A posição da autora é de que “opsicopedagogo está comprometido em qualquer modalidade de aprendiza-gem e não só na acontecida ou provocada na escola”.

[...] a aprendizagem está acontecendo a cada segundo em que o pacien-te está aqui. Ele está estabelecendo relação com o outro e há uma troca,há um crescimento mútuo e há todo um mundo a ser descoberto dentrodo hospital (Ônix).

Aprendizagem é a experiência de vida que estou vivenciando junto com opaciente, é uma aprendizagem na vida da gente (Esmeralda).

Os pacientes aprendem comigo e eu aprendo com eles (Safira).

Existe aprendizagem dentro do hospital e não é só aprendizagem cientí-fica, até de estilo de vida, de tudo. Aprender tu está, constantementeaprendendo, vê coisas novas o dia inteiro, o problema é captar tudo aqui-lo, assimilar (Topázio).

Confirmando a percepção da equipe de saúde sobre aprendizagem,concordo com Motta (1997, p. 102) quando diz que “é na relação com o outro,e através do outro, que o ser passa a assumir sua existência humana, come-ça a conhecer-se e a reconhecer-se como um ser único, manifestando suaprópria maneira de ser”.

Os profissionais da equipe de saúde também levantaram a questão doprocesso de crescimento e de amadurecimento que as crianças e os adoles-centes passam durante o período de internação e em decorrência da própriadoença. Há uma valorização maior da vida e os valores e visões de mundotambém acabam se modificando, conforme os depoimentos a seguir:

Eu acho que depois que passa por uma situação dessas, uma doença detão longa duração e o tratamento bastante agressivo, eles não são maisa mesma pessoa. O amadurecimento acontece por eles terem que cuidarda vida tão cedo, por eles passarem por uma situação difícil, dizem que osofrimento amadurece e a responsabilidade que eles são obrigados a terfora do tempo (Água Marinha).

Aqui temos dois perfis de pacientes: os muito pobres, aonde a gente temque ensinar a usar o sanitário porque não conhece, ensinar a usar chu-veiro porque não conhece, até aquele paciente classe média. Aconteceum amadurecimento ao ponto que aquele que não tinha nenhum conhe-cimento amadurece, cresce no conhecimento na maneira de conversar,na maneira de se cuidar. E aquele que tem um padrão muito alto acabadescendo um pouco e então eles chegam quase a um ponto médio, por-que eles têm uma coisa em comum: a vontade de viver e isso é que vaidirecionar as ações deles, então aquele que tem pouco conhecimento,

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que não sabe o que fazer, ele vai procurar esse conhecimento da manei-ra dele pra conseguir sucesso no tratamento (Rubi).

Sétima situação: EQUIPE DE SAÚDE

A equipe de saúde está voltada para o bem-estar daqueles que estãohospitalizados. Cada profissional, dentro da sua especificidade, trabalha parao pronto reestabelecimento dos pacientes.

Nas falas dos profissionais da equipe, percebi a grande preocupação demanterem um trabalho direcionado e coeso para que os enfermos que aliestavam se sentissem amparados e protegidos. Todos reconhecem a suamissão e a sua importância dentro da equipe para que o andamento do aten-dimento não seja prejudicado. Para reforçar a minha idéia, recorro à Motta(1997, p. 110) que nos define cuidado: “o cuidado é compreendido, pela equi-pe, a partir de um encontro com o outro, é um processo complexo, com umavariedade de significados envolvendo o ser doente, a família e os integrantesda equipe”.

Existe um corpo de profissionais, uma referência de serviços, cada um nasua especificidade, atuando, interagindo todos juntos, trocando influên-cias em benefício do paciente (Ônix).

Quando se consegue a adesão de vários membros, o trabalho é muitomelhor, os resultados para o paciente e para a equipe são muito melho-res também (Rubi).

O trabalho em equipe é imprescindível (Safira).

O trabalho em equipe é importantíssimo principalmente no serviço dehemato-onco, onde tu não podes trabalhar sozinho (Topázio).

A possibilidade de ampliação da equipe de saúde foi sempre citada pe-los profissionais que reconhecem a necessidade de que outros profissionaisfaçam parte da equipe, profissionais estes que se direcionem para outrasáreas, além da saúde:

Sempre se precisa de outros profissionais para que dê outro olhar quenão foi dado ainda (Ônix).

[...] e até pra poder abrir outras fontes de trabalho, de ação que hoje nãopode ser explorado porque não tem quem faça (Rubi).

[...] existem outras áreas que têm que ser abordadas também. A pessoanão é uma ilha isolada, todos interagimos com várias áreas[...] não é só aparte de saúde (Topázio).

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[...] haveria outras atividades que poderiam ser desenvolvidas (Esmeral-da).

Considerações finais

Baseada no estudo da percepção sobre a atuação do psicopedagogo/pedagogo na área hospitalar em um hospital universitário, em uma unidadeespecializada, onde o tempo de internação tende a ser longo ou com muitasreinternações, pude constatar um cenário de atuações, mas igualmente umcenário de novas e surpreendentes aprendizagens à educação profissionaldeste especialista.

Durante as entrevistas, observei que cada profissional reagia diante dosquestionamentos à sua própria maneira, mas em sua totalidade,demostraram tranqüilidade e interesse em colaborar e entender o trabalhoque o psicopedagogo poderia desenvolver na área hospitalar. Todos os entre-vistados demonstraram preocupação com a pessoa hospitalizada: seus pro-blemas pessoais, de aprendizagem, como também com a qualidade de vidadurante e após o tratamento. Senti que os entrevistados preocupam-se emcontrolar as suas emoções para não prejudicarem a relação equipe – enfer-mo e, até mesmo, a sua vida pessoal, mas a expressão de sentimentos e ovínculo afetivo não estão excluídos da qualidade do cuidado.

Percebi que os profissionais da equipe controlam suas emoções e, como passar do tempo, com os anos de profissão, estas emoções vão se ameni-zando e sua interação vai se colocando mais tranqüila. Observei que os mui-tos sentimentos expressos pela equipe trazem uma aprendizagem, uma mu-dança na forma desses profissionais enxergarem as pessoas hospitalizadas.Percebi que os profissionais da equipe procuram sempre se preservar, colo-cando o lado racional em um nível mais elevado do que o emocional, com afinalidade de não deixarem que suas emoções influenciem na avaliação doquadro de doença e evolução do tratamento.

Pude constatar que, apesar do controle de sentimentos e emoções, ainteração entre a pessoa hospitalizada e a equipe de saúde é muito boa e issoocorre porque existe uma troca de experiências e a preocupação de ver apessoa hospitalizada como um todo, inserido dentro de um contexto social eisto envolve reconhecer que as pessoas têm uma visão de mundo e a vivênciade uma aprendizagem adquirida anteriormente. Aqui, o psicopedagogo tem afunção de mediar e de reverter esta troca em novos conhecimentos, tantopara o paciente como para a equipe.

Notei que há preocupação e até uma necessidade de que as pessoashospitalizadas saibam e conheçam tudo o que as envolve, não há nada a serescondido ou não revelado. O saber, para a pessoa hospitalizada, funcionatambém como um elemento a mais que contribuirá para o seu tratamento.Surge, então, dessa maneira, um outro campo a ser trabalhado pelo

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psicopedagogo: proporcionar momentos em que a pessoa possa questionare discutir sobre a doença, em que o profissional possa sempre demonstrar olado positivo de todo o tratamento e também resgatar o vínculo com o conhe-cimento que ele já possui.

Senti que mudanças ocorrem na vida da pessoa hospitalizada e que, dealguma forma, elas têm que assimilá-las. O mais difícil é a fase de transiçãoentre a descoberta da doença e a internação, pois é nesta fase que elas, alémde serem internadas, serão cerceadas do convívio com a família, com osamigos, de ir à escola, de continuar a estar no mundo do mesmo modo comoestavam. A psicopedagogia/pedagogia auxiliará na transformação do mundonovo do hospital em conhecimento, e esse conhecimento em aprendizagem,em amadurecimento para uma vida futura após o tratamento, para enfrentar omundo novamente.

Constatei que todos os membros da equipe de saúde têm uma amplarelação com a aprendizagem. Na visão dos profissionais, a aprendizagemacontece de duas formas: o conhecimento trazido pela pessoa hospitalizadado seu mundo e que deverá ser aprimorado dentro do hospital e a troca deexperiências que ocorrem durante a internação, diante das situações pelasquais passam a pessoa hospitalizada e a equipe de saúde. Diante de situa-ções de aprendizagem como essas, a psicopedagogia/pedagogia trabalhapara que todo esse conhecimento que há dentro do hospital não sejadesconsiderado. O profissional pode auxiliar a equipe a reverter essa apren-dizagem para que a pessoa hospitalizada adquira conhecimento de si, desuas potencialidades, de suas peculiaridades físicas, procurando promover apessoa, de um doente passivo para ativo em seu tratamento.

Durante o decorrer deste estudo, notei que todos os profissionais entre-vistados enfatizam o amor e o carinho para com as pessoas sob seus cuida-dos e que têm uma preocupação muito grande em fazer da Unidade Hemato-Oncológica uma extensão da casa, da família da pessoa internada, proporci-onando um ambiente agradável e confortável durante o período de hospitali-zação, para que, de certa forma, a pessoa tenha uma vida o mais normalpossível.

Pude atestar que a instituição hospitalar oferece muitas situações deaprendizagem, sejam elas de origem sociocultural, sobre procedimentos ourelativas ao crescimento pessoal. Cabe ressaltar que a psicopedagogia/pe-dagogia encontra seu objeto de estudo dentro do hospital, ou seja, o aprendizque constrói o seu conhecimento no dia-a-dia e que não escolhe local parafazê-lo.

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Hospitalización en pediatría y las situaciones de aprendizaje del niño:percepciones del equipo de salud en una unidad hemato-oncológica de un hos-pital universitario

Resumen: El artículo busca presentar las muchas posibilidades de aprendizajedel niño en la institución hospitalar, durante la internación pediátrica, por medio delcontacto con el equipo de salud que convive diariamente con él. Busca destacarsituaciones de aprendizaje del niño en que el psicopedagogo/pedagogo puedaactuar, haciendo el período pasado dentro del hospital una experiencia positiva, queposibilite el crecimiento y la madurez cognitiva y psíquica. De entrevistas con elequipo de salud de la Unidad de Internación Hemato- Oncológica, del Hospital Uni-versitário de Santa Maria, fueron extraídos los sentimientos y las percepciones so-bre aprendizaje y conocimiento y sobre las relaciones entre aprendizaje yrecuperación de la salud. El equipo de salud presencía, diariamente, muchas situa-ciones donde la persona hospitalizada adquiere conocimiento y también lo transmi-te. Es importante que en ese medio tan rico de informaciones, sean ellas de origensociocultural, de conocimientos oriundos de diferentes mundos en relación a laenfermedad, o aún, sobre los procedimientos terapéuticos que son aplicados, actúeun profesional que oriente y aproveche criativamente ese cambio de conocimientos,para que el mismo no sea, de ninguna forma, desconsiderado. La psicopedagogía/pedagogía encuentra dentro del hospital lo que es su objeto de estudio: elaprendizaje cognitivo y el desarrollo psíquico.

Palabras Clave: Aprendizaje y desarrollo; Psicopedagogía; Pedagogía hospi-talar; Educación y salud; Hospitalización.

Hospitalization in pediatrics and the situation of the learning of children:perceptions of the team of health in an haemato-oncologic unit of a teachinghospital

Abstract: The article tries to present the many possibilities of the child’slearning in the hospital, during the pediatric internment, through the contact with theteam of health that lives together daily with him/her. It tries to detach situations of thechild’s learning in which the psycho-pedagogue/pedagogue can act, turning theperiod inside the hospital into a positive experience that makes possible the cognitiveand psychic growth. From interviews with the team of health of the Unidade deInternação Hemato-oncológica, of the Hospital Universitário de Santa Maria, wereextracted the feelings and the perceptions on learning and knowledge and about therelationships between learning and recovery of health. The team of health witness,daily, a lot of situations where hospitalized people acquire knowledge and alsotransmit it. It is important that in this environment so rich of information, either ofsocio-cultural origin, knowledge originating from different worlds in relation to thedisease, or even, on the therapeutic procedures that are applied act a professionalthat lead and creatively take advantage of this exchange of knowledge so that it isnot, in any way, inconsiderate. The psycho-pedagogy/pedagogy finds inside the hos-pital what is his/her object of study: the cognitive learning and the psychicdevelopment.

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Hospitalização em pediatria e as situações de aprendizagem da criança: percepções da ...

Bol. da Saúde, v. 15, n. 1, 2001 v 59

Key-words: Learning and development; Psycho-pedagogy; HospitalPedagogy; Education and health; Hospitalization.

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Atenção montadora página 60 é branca

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Tuberculose: histórico, epidemiologia e imunologia, de 1990 a 1999, e co-infecção TB/HIV, ...

Bol. da Saúde, v. 15, n. 1, 2001 v 61

Tuberculose: histórico, epidemiologia eimunologia, de 1990 a 1999, e co-infecçãoTB/HIV, de 1998 a 1999, Rio Grande doSul – Brasil

Roberta Campos1

Celso Pianta2

Resumo: O presente artigo tem como objetivo a investigação da história datuberculose no estado do Rio Grande do Sul, assim como sua recuperaçãoepidemiológica e imunológica, entre os anos de 1990 a 1999, e da ocorrência daco-infecção TB/HIV, entre os anos de 1998 a 1999. A metodologia utilizada foi apesquisa e a revisão de artigos científicos indexados na Medline; o levantamentobibliográfico de periódicos e artigos da biblioteca do Laboratório de Saúde Pública/Laboratório Central (Lacen/RS); a obtenção de dados atualizados junto aos progra-mas de controle da tuberculose do Ministério da Saúde (MS) ou Organização Mundi-al da Saúde (OMS) e Secretaria do Estado da Saúde (SES/RS). As pesquisas apon-taram que, neste estado, os pacientes em tratamento, a incidência de casos de tu-berculose e os óbitos diminuíram consideravelmente entre os anos de 1976 a 1990.Entretanto, a partir da década de 1990, houve o crescimento constante dos casos dedoença. Em 1990, foram 4.435 casos novos. Já em 1998, foram registrados 5.144casos, representando um aumento de 13,78%. O coeficiente de mortalidade, em1990, foi de 2,9/100.000 habitantes e, em 1998, foi de 3,6/100.000 habitantes. A co-infecção TB/HIV, em 1998, foi de 10,51% entre os casos de tuberculose notificadose, em 1999, foi de 12,74%. O grupo mais atingido pela co-infecção é o da faixa etáriados 25 aos 34 anos de idade, com 17,9% dos casos em 1998 e 22,2% em 1999. Estefato se deve à baixa imunidade das pessoas com HIV-positivo, com vivências depromiscuidade e usuárias de drogas. Outras circunstâncias se associam a esterisco como alcoolismo e vivência no cárcere penitenciário. Segundo a Secretaria deEstado da Saúde, 85% dos casos de tuberculose ocorreram em adultos e 15% emcrianças. Dois terços dos casos ocorrem nas minorias populacionais; 66,4% atingemo sexo masculino e 33,6% o sexo feminino. Concluiu-se que o crescimento gradualde casos de tuberculose no estado é uma tendência constante, ocorre como conse-qüência de vários fatores, podendo estar correlacionados ou não. São eles apandemia da Aids, o crescimento mundial das condições de pobreza e de popula-ções marginais, o abandono do tratamento quimioterápico e o aumentomultidrogarresistência pela co-infecção TB/HIV.

Palavras-Chave: Tuberculose; HIV; Epidemiologia; Imunologia; Rio Grande doSul.

1 Bióloga, mestranda em Biotecnologia pela UCS/CAPES, e-mail: [email protected] Médico Veterinário, Dr. em Ciências e Tecnologia de Alimentos/CNPq, e-mail:[email protected]

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Histórico

A tuberculose é uma das doenças transmissíveis mais antigas do mun-do, afetando o homem desde a pré-história. Existem registros arqueológicosda doença entre diversos povos da Antigüidade, como nas múmias egípcias,onde foram encontradas lesões que sugeriam a doença na coluna espinhal,conhecida como Mal de Pott (Rosen, 1994).

Nas américas, apesar de alguns autores sugerirem que esta doença jáexistia antes da colonização, é de consenso geral que foram os europeus quetrouxeram-na durante as suas expedições, causando milhares de mortes naspopulações indígenas, virgens de contato com o Mycobacterium tuberculosis,o agente causal da doença (Leite; Telarolli Jr., 1997 ).

No Brasil, alguns colonizadores jesuítas chegavam doentes, mantinhamcontato permanente com os índios e infectavam dezenas de nativos. Acredi-ta-se que o padre Manuel da Nóbrega, que chegou ao Brasil em 1549, tenhasido o primeiro morador ilustre do país a morrer da doença ( Hijar, 1994; Leite;Telarolli Jr., 1997).

Sendo a tuberculose uma doença infecciosa, a disseminação foi muitorápida nas grandes cidades européias durante a urbanização e RevoluçãoIndustrial no século XIX. Assim como na Europa, no Brasil não foi diferente. Aepidemia se tornou muito comum nas maiores cidades brasileiras. Estimati-vas apontam que a mortalidade por tuberculose no Brasil, em 1855, era de1/150 habitantes (Leite; Telarolli Jr., 1997).

Durante o século XIX, os serviços de saúde ainda eram muito precáriose os problemas de higiene e urbanização nas grandes cidades ficavam sobresponsabilidade de autoridades locais. A saúde pública dava prioridade aosinteresses econômicos e políticos das classes dominantes. A população ca-rente ficava aos cuidados de entidades filantrópicas ligadas à Igreja Católica.As práticas sanitárias visavam ao controle de doenças que poderiam afetarsomente a força de trabalho e a expansão econômica capitalista (Costa,1983), limitando-se ao Rio de Janeiro até 1920. No campo institucional, foramas Santas Casas de Misericórdia que assistiram aos tuberculosos desde acolonização do Brasil até a fundação de sanatórios e dispensários (Hijjar,1994).

A partir de 1927, sob o monitoramento da Liga Brasileira Contra a Tu-berculose, começava a vacinação de recém-nascidos nas maternidades doRio de Janeiro. Em seguida, o Bacilo de Calmette e Guérin (BCG) despertariainteresse em outros centros nacionais. Foram organizados laboratórios paraprodução e distribuição da BCG no Rio Grande do Sul e em São Paulo, sob adireção de Pereira Filho, Faillace e Clemente Vaz (Mac Dowell, 1949). O trata-mento da doença era feito com medicamentos pouco eficazes. Algumas des-cobertas no campo científico e assistencial na Europa repercutiram ampla-mente no Brasil, motivando a criação de organizações para o combate datuberculose. Os primeiros métodos de profilaxia foram a aeração, a dieta ali-

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mentar, o internamento em dispensários, os sanatórios e os abrigos ou colô-nias agrícolas. Evitava-se o convívio familiar do paciente. A família era regu-larmente visitada por agentes da saúde, para averiguar outro possível contá-gio (Faillace, 1948).

Em 1946, o índice de mortalidade de tuberculose no Rio de Janeiro esta-va em torno de 1.000/100.000 habitantes. Algumas capitais brasileirascontabilizavam um índice de mortalidade da doença de 246/100.000 habitan-tes. Com a perspectiva de ser erradicada até 1970, a doença recrudesceu emtodo o mundo a partir da década seguinte, constituindo hoje uma das princi-pais causas de morte por doenças infecciosas (Leite; Telarolli Jr., 1997).

Em 1970, a saúde pública começou a desenvolver planos de vigilânciaepidemiológica, fazendo levantamento de prevalência da infecção em escola-res, para implantação nacional da vacina BCG por via intradérmica. Nessaépoca, foi criada também a Rede Nacional de Laboratórios de Tuberculose,integrada aos Laboratórios de Saúde Pública de cada Estado (Hijjar, 1994).

Em 1975, o Estado do Rio Grande Sul firmou o primeiro convênio com oInstituto Nacional de Assistência Médica da Previdência Social (Inamps) parao controle e vigilância da epidemia, padronizando e introduzindo o tratamentode antibióticos tuberculostáticos.

Em 1978, foi criada a Sociedade Brasileira de Pneumologia e Tisiologia(SBPT), a partir da fusão de dois órgãos importantes: a Federação das Socie-dades Brasileiras de Tuberculose e Doenças Respiratórias e a SociedadeBrasileira de Pneumologia. A Sociedade congregava os maiores especialis-tas em doenças respiratórias do Brasil, com a primeira sede em Porto Alegre.

Em 1984, foi criado, no Rio de Janeiro, o Centro de Referência Profes-sor Hélio Fraga, que ainda hoje é o mais importante centro de referência parao controle da tuberculose nas áreas de diagnóstico, ensino especializado epesquisa científica e epidemiológica para os demais centros do país.

Hoje, a tuberculose é uma doença totalmente curável, que só leva opaciente à morte se não for tratada com seriedade. Entretanto, com a emer-gência da Aids, na década de 1980, mudaram as características da doença,agravando a situação epidemiológica, constituindo um dos principais fatorespara a deterioração do quadro da doença em países com alta taxa das duasinfecções, como o Brasil (Brasil, 1994).

Epidemiologia

A tuberculose é uma doença infecciosa causada pelo M. tuberculosis. Ocomplexo Mycobacterium é um agente etiológico constituído de outras espé-cies como o M. tuberculosis, M. bovis, M. africanum e M. microti (Brasil, 1999).Certas micobactérias também podem induzir a um quadro clínico semelhanteà tuberculose, sendo necessário o diagnóstico diferencial de culturas e a ade-quada identificação.

A doença é transmitida por três vias diferentes. A primeira relaciona-se

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com a ingestão de material contaminado, como leite in natura, infectando asubmucosa intestinal, que se torna um foco de infecção primária (Spkowitz et.al, 1995). Atualmente, esses casos são muito raros, pois a pasteurização eli-mina o M. bovis do leite. A segunda via de transmissão diz respeito àinoculação direta do bacilo, que acomete particularmente os trabalhadores desaúde. Essas pessoas têm cinco vezes mais chances de contrair a doença,comparadas com a população em geral (Brasil, 1994). A terceira via se dá portransmissão aérea, pela inalação de gotículas contendo M. tuberculosis,quando o infectado espirra ou tosse. Esta forma de transmissão é a maisimportante, pois propaga rapidamente a doença. Estima-se que uma pessoainfectada, antes mesmo do diagnóstico e tratamento da doença, pode trans-miti-la para mais cinco pessoas (Smith; Moos, 1994).

A tuberculose pode infectar qualquer órgão do corpo. Mas a principalincidência é a da tuberculose pulmonar bacilífera. Em 1992, foram registradosno Brasil 85.955 casos, dos quais 86% eram pulmonares. Entre as formasextrapulmonares, que correspondem à 15%, as mais comuns são as pleuraise ganglionares periféricas, seguidas pelas genito-urinárias, ósseas e ocula-res, em menores percentuais. Outras formas extrapulmonares, como a tuber-culose-meningite e miliar, contribuem com 5% e 6%, respectivamente (Hijjar,1994).

A Organização Mundial da Saúde (OMS) estima que um terço da popu-lação mundial, ou 2 bilhões de pessoas, apresentem infecção latente do M.tuberculosis e aproximadamente 4 milhões de casos sejam notificados aoano. Mas, segundo estatísticas, esse número pode chegar, na realidade, aonúmero de 7 a 9 milhões de casos ao ano, 95% nos países em desenvolvi-mento. A mortalidade anual é estimada em 3 milhões de pessoas, ou seja,7% de toda a mortalidade mundial (OPS, 1998). Dois terços dos casos detuberculose ocorrem nas minorias populacionais. O risco de infecção na po-pulação indigente é cerca de 300 vezes maior que na população geral. Outrosgrupos de risco são os alcoolistas, usuários de drogas ilícitas e a populaçãocarcerária (Id., 1998).

No Brasil, estima-se que de 35 a 45 milhões de pessoas estão infectadaspelo M. tuberculosis, com 100 mil casos novos ao ano. O número de óbitospela doença é de 4 a 5 mil pessoas ao ano. Em 1992, o coeficiente de incidên-cia da tuberculose em todas as suas formas (TB/TF) foi de 57,6/100.000 ha-bitantes. A Região Sul apresentou incidência de 8.369 casos, sendo 4.299respectivos ao Rio Grande do Sul. Os pacientes em tratamento, as notifica-ções de tuberculose pulmonar e os óbitos diminuíram consideravelmente en-tre os anos de 1976 e 1990 (Haggsträm; Tonietto, 1998). Entretanto, notou-seque a partir da década de 1990 houve um crescimento gradual do número decasos notificados. Em 1990, foram 4.435 casos, comparados com 5.144 ca-sos notificados em 1998, representando um aumento de 13,78%. O coefici-ente de mortalidade, em 1990, foi de 2,9/100.000 habitantes e, em 1998, foide 3,6/100.000 habitantes (tabela 1). Conforme os dados da Secretaria de

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Estado da Saúde (SES/RS), 66,4% dos casos incidem no sexo masculino e33,6% no sexo feminino.

Tabela 1 – Incidência da tuberculose no estado do Rio Grande do Sul de 1990a 1999

Casos novos Ações de tratamento – TB/TF1

TB/Pulmonar Abandono CoeficienteAno TB/TF1 (BK+)2 Alta3 Cura (%) (%) Mortalidade4

1990 4435 2203 5141 80 14 2,91991 4242 2251 4831 78 15 3,01992 4299 2350 4768 77 16 3,11993 4447 2425 4957 76 15 3,51994 4816 2747 4826 75 18 3,81995 4843 2715 4984 72 21 3,71996 4920 2781 2556 67 23 2,21997 4954 2761 5038 73 17 2,91998 5144 2890 4975 73,97 15,26 3,21999 4720* 2651 4795 79,8 11,6 3,2

Fonte: Secretaria de Estado da Saúde/RS – Coordenação de Atenção Integral à Saúde(CAIS-SES/RS)

1 Tuberculose de todas as formas.2 Tuberculose Pulmonar com Baciloscopia Positiva.3 Alta de pacientes prevalentes (antigos + novos).4 Coeficiente de Mortalidade/100.000 habitantes* Dados preliminares, sujeitos a alterações.

Imunologia

Os conhecimentos da microbiologia e parasitologia do século XIX es-treitaram o caminho às pesquisas científicas de agentes infecciosos causa-dores de doenças. Após a descoberta do Mycobacterium tuberculosis, porRobert Kock, em 1882, começou-se a especular sobre a possível erradicaçãoda doença.

Hoje, a doença ainda persiste como grande problema de saúde(Ferreira; Fonseca, 1997). A maioria das pessoas infectadas pelo bacilo deKock não desenvolve a doença, entretanto, a infecção pode persistir por anose a pessoa infectada pode acabar desenvolvendo a doença, uma vez queeste bacilo tem a capacidade de assumir parasitismo intracelular facultativo epermanecer sob um estado de latência durante anos. Segundo estatísticasatuais, 85% dos casos ocorrem em adultos e 15% em crianças (Haggsträm;Tonietto, 1998).

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Segundo a Pneumologia Sanitária da Secretaria da Saúde do Rio Gran-de do Sul, nem todas as pessoas que têm o bacilo de Kock no organismodesenvolvem a doença. Em pessoas com o sistema imunológico eficiente, obacilo acaba aprisionado dentro de uma célula de defesa, o macrófago, po-dendo permanecer latente por toda a vida, sem manifestar a doença. A disse-minação linfática e hematogênica ocorre antes do desenvolvimento de umaresposta imune efetiva, constituindo novos focos no organismo. Esta infecçãodenomina-se tuberculose primária e é, geralmente, assintomática. Nos ca-sos em que a resposta imune é inadequada, a doença se desenvolve acom-panhada de sintomas pulmonares. Nas infecções primárias, encontram-selesões mínimas dos tecidos pulmonares e uma adenopatia hilar, constituindoo Complexo de Gohn (Andreoli et al., 1997). A tuberculose pós-primária ocor-re quando os mecanismos de defesa do organismo tornam-se comprometi-dos, reativando os sítios com bacilos viáveis que estavam em latência. Quan-do o indivíduo sofre a segunda infecção, a partir do contato com pessoasdoentes, desenvolve a doença, com reativação endógena (Tuberculose,1999).

As ações desenvolvidas contra a tuberculose têm como meta principal aredução de um problema de saúde pública reconhecido como importante emnosso meio, tendo em vista a incidência de casos de tuberculose pulmonarcontagiante em adultos, a mortalidade e a crescente associação com a Aids(Haggsträm; Tonietto, 1998).

A tuberculose é um dos temas centrais das atividades da OMS, desde asua criação, em 1964, ano em que essa entidade propôs a elaboração deProgramas Nacionais de Controle da Tuberculose (PNCTB). Desde então, aOMS tem apoiado qualquer iniciativa técnica e operacional. Essas propostasbaseiam-se na bacteriologia para diagnósticos corretos, tratamentomedicamentoso eficaz em ambulatórios e imunização com BCG em crianças(Yañez, 1991).

Os serviços de saúde pública do Estado do Rio Grande do Sul iniciaramo preparo e a administração do BCG em 1928. Os técnicos da saúde compre-enderam o alcance prático da calmetização, como recurso eficaz e de baixocusto para imunização e prevenção da doença. Ainda hoje, empregam-nacom perseverança e rigor técnico, mesmo que tenha ocorrido alguma resis-tência oposta à vacina como preventivo do bacilo (Faillace, 1948).

A padronização e a normatização das ações de prevenção, diagnósticoe tratamento são coordenadas pela SES/RS, por intermédio da Seção dePneumologia Sanitária. A prevenção pressupõe vacinação de 100% dascrianças de até 1 ano de idade, com BCG intradérmico e revacinação emcrianças em idade escolar (6 anos), independentemente de ter ou não cicatrizvacinal (Brasil, 1998).

As atividades de diagnóstico buscam, principalmente, os pacientes comtuberculose bacilífera, que são os disseminadores da doença (Haggsträm;Tonietto, 1998). As medidas de tratamento visam à cura de pelo menos 80%

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dos casos por meio de esquemas terapêuticos padronizados. Essas medidaspermitem diminuir a incidência da doença entre 8 a 13% ao ano (Brasil, 1994;OPS, 1998).

Atualmente, alguns cientistas estão pesquisando a vacina gênica da tu-berculose, que está em fase de experimentação. Essas vacinas poderão tor-nar-se uma grande solução de combate às doenças infecciosas. Segundo opesquisador Célio Lopes da Silva, da Faculdade de Medicina de Ribeirão Pre-to, para a produção da vacina gênica os cientistas retiram o DNA do agentecausador da doença. Quando inoculado em animais, esse segmento de DNA,que codifica uma proteína imunogênica ou um fator de virulência, tem a po-tencialidade de induzir o sistema imunológico a produzir anticorpos ou esti-mular a imunidade imediata das células, protegendo-as contra a infecção cau-sada pelo agente patogênico de onde se originou o DNA (Silva, 2000).

Co-infecção TB/HIV

Com o surgimento, em 1981, da Síndrome da Imunodeficiência Adquiri-da (Aids), observou-se, tanto em países desenvolvidos como em países emdesenvolvimento, o aumento dos casos de tuberculose em pessoasinfectadas pelo vírus HIV. A co-infecção TB/HIV constitui, atualmente, umsério problema de saúde pública em muitos países (Brasil, 1999; Aids: asdoenças oportunistas, 1996). A tuberculose pulmonar era utilizada como indi-cador de desenvolvimento periférico, mas hoje, com a disseminação dapandemia da Aids, tornou-se a terceira doença oportunista mais freqüenteem pacientes HIV positivos (Job et al., 1998).

A Aids está sendo um fator determinante nas mudanças epidemiológicasda tuberculose, modificando o caráter da doença, de uma evolução crônicapara aguda, podendo levar os pacientes ao óbito em poucas semanas. Aconseqüência mais alarmante da co-infecção é a capacidade do HIV tornar opaciente tuberculoso multidrogaresistente, ou seja, sem tratamentoquimioterápico (Leite; Telarolli Jr., 1997).

A estimativa mundial da OMS é que exista mais de 1 bilhão e 900 mi-lhões de infectados com o bacilo de Kock e 14 milhões de infectados com oHIV. Estariam co-infectados cerca de 5,6 milhões de pessoas. O impacto dainfecção pelo HIV na morbidade da tuberculose em uma determinada regiãodepende da prevalência e da tendência da infecção pelo HIV; da prevalênciada infecção por M. tuberculosis entre os indivíduos da faixa etária de 15 a 49anos; da taxa de conversão de TB/infecção para TB/doença nessa popula-ção; da taxa de detecção de cura, de abandono e de recidiva da doença emindivíduos bacilíferos e infectados ou não pelo HIV (Dalcolmo; Kritski, 1993).

O Brasil registrou mais de 71 mil casos de Aids entre o início da décadade 80 e agosto de 1995. Nesse mesmo período, o país apresentou em média90 mil casos de tuberculose por ano (Brasil, 1993; Job et al., 1986). Estimati-vas preliminares do Ministério da Saúde indicam que existem mais de 400 mil

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pessoas infectadas pelo HIV no Brasil e que 30%, ou seja, mais de 120 milpessoas, apresentam também a infecção pelo bacilo de Kock. Tendo em vistaa manutenção do mesmo número de casos novos de tuberculose em adultosno país, a epidemia do HIV deverá promover um acréscimo de 25% de casosde tuberculose (Loures, 1995). Sabe-se que o esquema terapêutico utilizadomundialmente é capaz de curar cerca de 95% dos casos de tuberculose (Jobet al., 1986), mas quando o indivíduo apresenta a co-infecção, geralmente,as características clínicas são incomuns ao paciente tuberculoso e podemcausar dificuldades no diagnóstico, retardando o tratamento (Zumla et al.,2000).

No Rio Grande do Sul, segundo o Programa de Controle da Tuberculo-se, em 1998 foram registrados 5.144 casos novos de tuberculose, do quais541 eram HIV-positivo, ou seja, 10,51% dos pacientes apresentaram co-in-fecção TB/HIV. Em 1999, a incidência da tuberculose foi de 4.675 casos, sen-do 596 HIV-positivo, ou seja, 12,74% apresentaram co-infecção TB/HIV. Ogrupo mais atingido pela co-infecção é o da faixa etária dos 25 aos 34 anos,com 17,9% dos casos em 1998, e 22,2% em 1999. Geralmente, esse fato sedeve à baixa imunidade das pessoas com HIV-positivo, que desenvolvemtuberculose com muita facilidade, à vida sexual ativa e ao uso de drogas,segundo características desta faixa etária (tabela 2).

Tabela 2 – Ocorrência de co-infecção TB/HIV no Rio Grande do Sul, segundogrupo etário: 1998 a 1999.

Casos AIDS1 Incidência TB Co-infecção2 TB/HIV (%)3

Grupo Ano Ano TB/TF TB/TF Ano Ano Ano Anoetário 1998 1999 1998 1999 1998 1999 1998 1999

00-14 120 79 178 169 14 18 7,8 10,615-24 352 291 794 696 84 92 10,5 13,225-34 973 856 1275 1042 229 232 17,9 22,235-44 693 581 1292 1025 157 187 12,1 18,245-54 237 232 784 799 53 64 6,7 855-64 75 86 497 503 3 2 0,6 0,365 + 18 24 327 441 1 1 0,3 0,2TOTAL 2.468 2.149 5.144 4.720 541 596 10,51 12,74

Fonte: Secretaria de Estado da Saúde/Programa de Controle da Tuberculose/RS

1 Número de casos, conforme programa DST/AIDS – Ministério da Saúde2 Casos de HIV+ entre os casos de TB notificados3 Percentual de casos com HIV+ entre os casos de TB

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Tuberculose: histórico, epidemiologia e imunologia, de 1990 a 1999, e co-infecção TB/HIV, ...

Bol. da Saúde, v. 15, n. 1, 2001 v 69

Tuberculosis: histórico, epidemiología e inmunología, de 1990 a 1999, ycoinfección TB/VIH, de 1998 a1999, Rio Grande do Sul – Brasil

Resumen: El presente artículo tiene como objetivo la investigación de lahistoria de la tuberculosis en el Estado del Rio Grande do Sul, así como surecuperación epidemiológica y inmunológica, entre los años de 1990 y 1999, y laocurrencia de la coinfección TB/VIH, entre los años de 1998 y 1999. La metodologíautilizada fue la investigación y revisión de artículos científicos indexados en Medline;el levantamiento bibliográfico de revistas y artículos de la biblioteca del Lacen/RS(Laboratório Central); obtención de datos actualizados de la SES/RS (Secretaria daSaúde del Rio Grande do Sul) - Programa de Control de la Tuberculosis, Ministeriode la Salud y Organización Mundial de la Salud (OMS). Las investigacionesseñalaron que, en este estado, los pacientes en tratamiento, la incidencia de casosde tuberculosis y los óbitos disminuyeron considerablemente entre los años de 1976a 1990. Sin embargo, a partir de la década de 1990, hubo el crecimiento constantede los casos de enfermedad. En 1990, fueron 4.435 casos nuevos. Pero, en 1998,fueron registrados 5.144 casos, representando un aumento de 13,78%. El coeficien-te de mortalidad, en 1990, fue de 2,9/100.000 habitantes y en 1998 fue de 3,6/100.000 habitantes. La coinfección TB/VIH, en 1998, fue de 10,51% entre los casosde tuberculosis notificados y, en 1999, fue de 12,74%. El grupo más afectado por lacoinfección es el de personas de 25 a 34 años, con 17,9% de los casos en 1998 y22,2% en 1999. Este hecho se debe a la baja inmunidad de las personas con VIHpositivo, con vivencia de promiscuidad y uso de drogas. Otras circunstancias seasocian a este riesgo, como alcoholismo y vivencia en la cárcel penitenciaria. Segúnla Secretaria da Saúde/RS, 85% de los casos de tuberculosis ocurrieron en adultosy 15% en niños. Dos tercios de los casos ocurren en las minorias poblacionales;66,4% afectan el sexo masculino y 33,6% el sexo femenino. Se concluye que elcrecimiento gradual de casos de tuberculosis en el estado es una tendencia cons-tante, ocurre como consecuencia de varios factores, que pueden estarcorrelacionados o no. Son ellos: la pandemía del SIDA; el crecimiento mundial delas condiciones de pobreza y de pueblos marginales; el abandono del tratamientoquimioterápico; el aumento de la multiresistencia a medicinas por la coinfección TB/VIH.

Palabras Clave: Tuberculosis; VIH; Epidemiología; Inmunología.

Tuberculosis: history, epidemiology and immunology in the period of1990-1999, and co-infection TB/HIV from 1998 to 1999, Rio Grande do Sul-Brazil

Abstract: The present article has the objective of investigating the history oftuberculosis in the State of Rio Grande do Sul, as well as its epidemic andimmunological recovery, between the years 1990 to 1999, and of the occurrence ofthe co-infection TB/HIV, between the years 1998 to 1999. The methodology usedwas the research and the revision of scientific articles indexed in Medline; thebibliographical verification of newspapers and articles of the library of the Laboratóriode Saúde Pública/Laboratório Central (Lacen/RS); the obtaining of updated data fromthe Programs of Control of Tuberculosis of the Ministério da Saúde (MS) or World

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Roberta Campos et al.

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Health Organization (WHO) and Secretaria da Saúde do Estado (SES/RS).Researches showed that, in this state, in the patients in treatment, the incidence ofcases of tuberculosis and the deaths decreased considerably between the years1976 to 1990. However, from the 1990’s on, there was the constant growth of thenumber of cases of that disease. In 1990, they were 4.435 new cases. But in 1998,5.144 cases were registered, representing an increase of 13,78%. The mortalitycoefficient, in 1990, was 2,9/100.000 inhabitants and, in 1998, it was 3,6/100.000inhabitants. The co-infection TB/HIV, in 1998, was of 10,51% among the cases oftuberculosis notified and, in 1999, it was of 12,74%. The most affected group by theco-infection is the age group of 25 to 34 years old, with 17,9% of the cases in 1998and 22,2% in 1999. This fact is due to the low immunity of HIV-positive people, withpromiscuity and the use of drugs. Other circumstances are associated to this risk,such as alcoholism and imprisonment and the penitentiary population. According tothe Secretaria da Saúde do Estado, 85% of the cases of tuberculosis occurred inadults and 15% in children. Two thirds of the cases occur in the population minorities;66,4% are of the masculine sex and 33,6% the feminine sex. It was concluded thatthe gradual growth of cases of tuberculosis in the state is a constant tendency,occurring as a consequence of several factors, which could be correlated or not.They are the pandemic Aids, the world wide growth of the poverty conditions and ofmarginal populations, the abandonment of the chemotherapeutic treatment and theincrease of multi drug-resistance for the co-infection TB/HIV.

Key-words: Tuberculosis; HIV; Epidemiology; Immunology; Drug-resistance;Co-infection.

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Tuberculose: histórico, epidemiologia e imunologia, de 1990 a 1999, e co-infecção TB/HIV, ...

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Um centro de informação edocumentação em saúde pública/saúdecoletiva: compromissos, interfaces eperspectivas possíveis e a estante dautopia – Parte II 1

Ruth Sant’Helena da Silva2

“Que nossos esforços desafiem as impossibilidades”.Charles Chaplin

Resumo: Ao tempo em que se discute e estabelece as políticas para ogerenciamento dos recursos informacionais na ESP/RS, segue a implementação doProjeto de um Centro de Informação e Documentação em Saúde na Escola de Saú-de Pública/RS – Ceids, gradativamente, definindo um perfil técnico-político e prático-funcional fecundado no compromisso com a socialização e democratização do aces-so ao conhecimento em saúde coletiva. No presente artigo-documentário dá-se se-guimento a um artigo anterior. Em ambos são apresentados os caminhos que mos-tram as várias facetas e interfaces desta trajetória. De igual modo, são apresentadosos instrumentos e estratégias operativas que buscam viabilizar a consecução dotrabalho, mercê dos descompassos, sempre presentes entre estas formulações esua efetiva implementação.

Palavras-Chave: Informação em saúde; Projetos de ação; Memóriainstitucional; Escola de Saúde Pública; Secretária da Saúde-RS; Documentação.

Introdução

No âmbito da Ciência da Informação, inúmeros estudos têm buscadoconstruir uma teoria acerca do fenômeno/processo informação. Dentro dadiversidade de conceitos, entendemos conveniente destacar alguns signifi-cados de caráter multidisciplinar, para sustentar nosso projeto de Centro deInformação e Documentação em Saúde.

1 Este artigo dá seguimento à Parte I, publicada no Boletim da Saúde, v. 14, n. 1, 1999-2000.2 Sanitarista, Bibliotecária/Documentalista, com Especialização em Administração de Siste-mas de Bibliotecas. Coordenadora do Centro de Informação e Documentação em Saúde –Ceids-ESP/RS. e-mail: [email protected]

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Ruth Sant’Helena da Silva

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Etimologicamente, “informação é uma palavra de origem latina, do verboinformare que significa dar forma, criar, representar, construir uma idéia ounoção” (Cunha, 1985, p. 47).

Seu sentido contraditório se expressa por um perfil estático – mensa-gem, conceito – e um perfil dinâmico – criação de significados, produção deinteligência, instrumentalização da comunicação, em contextos culturais es-pecíficos.

Segundo Cunha (1985, p. 47), filosoficamente, a informação pode serconcebida, numa primeira fase, dentro do “idealismo – matéria criada e ati-vada pelo pensamento” e, noutra fase, dentro do “materialismo, em que osujeito e o objeto do pensamento se unem na prática social, resolvendo-se nacontradição realidade e idéia por meio da ação”.

Relacionada a dados e documentos, a informação adquire atributos deobjeto, já que pode ser medida e tocada (Reis, 1999).

Se usada como sinônimo de conhecimento, a informação torna-se flui-da, imponderável, intangível e intocável (Id., 1999, p.154).

Mikhailov et al. (1994) entendem informação como conhecimento, que éobjeto de armazenamento (registro em algum suporte físico), mas é tambémcompartilhamento e transformação.

Belkin e Robertson (1976) afirmam que informação é o que é capaz detransformar as estruturas e Wersig (1985) diz que informação é conhecimen-to para a ação.

Cardoso apud Reis (1999, p. 154) entende que a informação

é um saber que ao ser partilhado, permutado, comunicado, produz umestado dialógico de compreensão, de apreensão de seu significado, ouseja informação é um significante que encontra significado, que faz sen-tido, que estabelece uma relação entre [...] pessoas.

Marteleto (1995, p. 89) define informação como “um artefato cultural,como forma de criação dos significados [...] como modo de produção, contro-le e distribuição social dos bens simbólicos”.

Quando se percebe a informação com uma visão crítica e não ingênua,contextualizada no aparato das estruturas histórico-sociais e econômicas, fi-cam claras as articulações de poder e produção do saber, as disponibilidadesdesiguais no seu acesso, as diferenças e conflitos sociais no usufruto dosbens culturais simbólicos acumulados e, principalmente, em suas aplicaçõestecnológicas. Portanto, a informação não pode ser considerada como umaentidade facilmente isolável para análise.

Para Araujo (1995, p. 56), a informação “não é, na verdade, um conceitoúnico, singular, mas sim, uma série de conceitos conectados por relaçõescomplexas.” Sua dimensão histórico-social, carregada de potencialidades,tem valor filosófico (intrínseco ao ser humano, intelectual, subjetivo e emocio-nal) e valor prático (instrumental de uso e troca), no sentido de benefício eco-

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nômico e social.O sentido de valor é partilhado e se estabelece durante o processo da

comunicação, “considerando-se, não apenas a essência ou conteúdo da in-formação, mas, também, seus contextos de uso” (Novelino, 1998, p. 138).

Informação em saúde

Trazendo estas considerações para uma abordagem mais limitada à in-formação em saúde, pode-se conferir a ela atributos como natureza pública,relevância social (contexto histórico-social), valor intrínseco, uso socialabrangente e irrestrita distribuição (a partir de processos de comunicaçãodefinidos).

Branco (1998, p. 164) considera informação em saúde como o “dadoútil” – registrado, classificado, organizado relacionado e interpretado “dentrode um contexto para transmitir conhecimento”. Contudo, estoques de infor-mação em saúde são estáticos e por si só não produzem conhecimento. É atransferência da informação que propicia acesso, uso, assimilação e criaçãode um novo estado de conhecimento. Neste caso, a transferência da informa-ção pode ser definida como “um conjunto de ações e práticasinstitucionalizadas ou não, que visa transmitir a pessoas ou instituições infor-mações registradas em algum tipo de documento, não importando seu supor-te físico” (Figueiredo, 1979, p. 120).

Para que o fenômeno ocorra, atualmente, é necessário um certo apara-to: recursos financeiros, infra-estrutura de informática e telecomunicações,referências, redes e sistemas, bases de dados e canais de divulgação e con-sulta. Para que o processo se efetive adequadamente, com rapidez e intensi-dade, fica implícita a dependência do estágio de desenvolvimento da comuni-dade onde se estabelece, tendo, entretanto, como fatores limitantes, as di-mensões físicas, comunicacionais, cognitivas e sociais ou antropológicas. Jáum sistema de informação em saúde é aquele que efetiva um processo decomunicação.

Um sistema de informação pressupõe: uma estrada para armazenaruma representação da informação, de tal modo que permita uma busca oupesquisa; um processamento que implica executar uma função de recupera-ção em resposta a uma questão; uma saída de exibição da informação.

A área da saúde tem sido privilegiada em termos de produção e transfe-rência da informação de âmbito mundial. Entidades internacionais como aONU, Unesco, FAO, OMS e Opas especialmente, têm se empenhado no de-senvolvimento do conhecimento científico e tecnológico em saúde e meioambiente, notadamente quanto ao estabelecimento de políticas nacionais,apoio e fomento a projetos de pesquisa, concepção, incremento e manuten-ção de sistemas de informação.

A OMS recomenda desde 1979 (Ruff, 1985) a adoção de sistemas na-cionais de informação sanitária, reunindo-se um fundo documental a partir de

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três componentes: informação sobre gestão, informação técnico-científica einformação epidemiológica. Acredita-se que estes níveis ofereçam suportenecessário para que o profissional, gestor, usuário ou outrem, desenvolvamou requeiram ações de saúde dentro de critérios adequados. Contudo, pou-cos países têm programas nacionais integrados compatíveis com esta orien-tação. Falta, via de regra, a infra-estrutura que garanta uma organização efi-caz dos serviços de informação, a cooperação e o intercâmbio necessário e,sobretudo, uma política determinada sobre o assunto.

Por outro lado, as necessidades de informação em saúde podem estarclaramente definidas ou latentes e potenciais. O seu uso pode ser estimuladopelo conhecimento, democraticamente oferecidos às suas fontes, serviços erecursos informacionais disponíveis, por intermédio das facilidades e progres-sos crescentes das tecnologias da informação.

A evolução das tecnologias da informação, embora como instrumento emeio facilitador do processo de comunicação, tem promovido inegável altera-ção nas formas de acesso ao conhecimento, à formação, às competênciasprofissionais, ao entretenimento, à cultura e à criação.

Basta pensar, como destaca Masetto (2001, p. 136), na “oportunidadede entrar em contato com as mais novas e recentes informações, pesquisase produções científicas do mundo todo, em todas as áreas, a oportunidade dedesenvolver a auto-aprendizagem e a interaprendizagem à distância” [peloacesso às] bibliotecas, teleconferências, bate-papos on-line, listas de discus-são, correio eletrônico e uso da Internet (leitura, acesso e comparação, repro-dução de textos, sons e imagens).

Este autor chama a atenção para os fatores de incentivo à auto einteraprendizagem, o estímulo à exploração ilimitada, ao intercâmbio, àseletividade e conseqüente criticidade quanto à quantidade e qualidade dainformação disponível e de interesse.

De outra parte, Saracevic (1996, p. 58) introduz a pergunta “até que pon-to as aplicações das tecnologias permitem, realmente, o eficiente acesso àinformação e à comunicação dos amplos estoques disponíveis de conheci-mento?”

No caso específico da saúde, critérios como “relevância, utilidade, qua-lidade, seletividade, veracidade, síntese e/ou impacto da informação” exigemavaliação permanente quanto ao uso dos sistemas existentes.

Implementação do Projeto Ceids 3

As melhorias na área da informação bibliográfica e documental conti-nuarão sendo implementadas na Escola de Saúde Pública/RS durante o anode 2002, tendo como objetivo a consolidação do Projeto Ceids, instalando-se

3 A Parte I do presente documento apresenta a concepção do Projeto Ceids.

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+474%

de forma gradativa, mas com estratégias permanentes de interação à propos-ta político-pedagógica da própria Escola, como segue:

1) Desenvolvimento da coleção

Em 2001, foram incorporados ao acervo 2082 títulos de livros, 2700 fo-lhetos, 183 fitas de vídeo e houve o acréscimo de 153 novos títulos de perió-dicos, além da atualização de 23 coleções.

Os quadros I e II mostram o crescimento do acervo e a evolução donúmero de atendimentos.

Quadro 1 – Crescimento do acervo do Ceids-ESP/RS

Período Nº de títulos Incorporação de títulos(Itens/mês)

Anteriormente à 1999 9.485 22Gestão 1999-2002 3.241 77TOTAL 12.726

Fonte: Ceids-ESP/RS – registro do acervo

Quadro 2 – Atendimento de usuários: informação bibliográfica e documental

Anos Nº de Atendimento*1998 15361999 14962000 51692001 7274

Fonte: Ceids ESP/RS – estatística de atendimento* A incorporação de novos recursos tecnológicos de busca e uso da informação bi-bliográfica e documental no Ceids, bem como a ampliação do acervo em processo,nos permitem afirmar que em 2002 ultrapassaremos a marca dos 10.000 atendimen-tos/ano.

2) Melhoria da infra-estrutura

Nesse mesmo ano, foram adquiridos microcomputadores, impressoras,linhas telefônicas de uso exclusivo da Biblioteca e uma linha dedicada paraacesso rápido à Internet, enquanto segue inviabilizado o acesso à fibra ótica.

Com recursos decorrentes de aprovação de Projeto de Apoio ao Desen-

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volvimento Institucional da ESP/RS4, foram adquiridos recursos para a exe-cução de infra-estrutura elétrica e lógica para instalação de 06 (seis) pontosde rede local no Ceids, equipamentos de informática (computadores, servidorde rede, complementos e sistema operacional, gravador de disco compacto,impressora etc.), materiais de escritório e biblioteca (armário de aço,bibliocantos, porta-revistas, estantes, fichários etc.) e videocassetes.

3) Incremento de trabalhadores

Em 2001, foram nomeados mais 5 profissionais bibliotecários e 1 auxi-liar de biblioteca. Ao todo, o Ceids passou a contar com 9 bibliotecários, 3auxiliares de biblioteca, 5 estagiários e 1 historiadora.

Ações estratégicas e serviços inovadores

a) Resgate da memória e da história

Em 25 de maio de 2001, o Ceids realizou o seminário “Informação, Me-mória e História em Saúde Pública”, com o objetivo geral de sensibilizaçãopara a necessidade de tratamento adequado da documentação institucionalde caráter técnico-administrativo, técnico-científico e patrimonial, construin-do-se, dessa forma, as bases para o resgate da memória e da história naSES/RS.

Neste Seminário, os representantes das instituições participantes fize-ram o relato do trabalho de memória e história que está sendo desenvolvido:Escola de Saúde Pública – ESP/RS, Centro de Saúde-Escola Murialdo –CSEM, Fundação Estadual de Produção e Pesquisa em Saúde – Fepps, Hos-pital Colônia Itapuã – HCI, Hospital Sanatório Partenon – HSP, Hospital Psi-quiátrico São Pedro – HPSP.

Um debate entre os participantes marcou a iniciativa que apresentou,formalmente, à SES/RS, o trabalho em execução, convocando a todos paraserem informantes, intérpretes e sujeitos da construção da Memória e da His-tória na Secretaria.

b) Integração à Biblioteca Virtual em Saúde (BVS), coordenada peloCentro Latino-Americano e do Caribe de Informação em Ciências daSaúde (Bireme)

Em 2001, foi assinado o Termo de Cooperação Técnica entre a Biremee a ESP/RS, em que o Ceids passa a constituir-se em centro cooperante daRede Brasileira de Informação em Ciências da Saúde.

4 Projeto financiado pela Fapergs: Educação em Saúde Coletiva: melhoria da infra-estruturapara estudo, ensino e pesquisa na Escola de Saúde Pública da Secretaria da Saúde – ESP/RS.Em andamento.

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Pelo Termo de Cooperação Técnica, a Bireme se compromete a repas-sar ao Ceids-ESP/RS metodologias, bases de dados e aporte técnico à mi-gração do Sistema De Gerenciamento das Informações Bibliográficas – SIB/Procergs para o Sistema CDS/ISIS-WINISIS da Unesco, sob a coordenaçãoda Bireme.

A contrapartida principal do Ceids é alimentar a base de dados da Litera-tura Latino-Americana e do Caribe de Informação em Ciências da Saúde –Lilacs com a produção intelectual da SES/RS.

O processo de migração do sistema SIB para o CDS/ISIS-WINISIS estáem andamento.

c) A Pesquisa sobre os profissionais da SES/RS

Uma pesquisa sobre a oportunidade de educação continuada/desenvol-vimento dos trabalhadores da SES/RS e para a implantação de um serviçode Disseminação Seletiva da Informação – DSI no Ceids, no âmbito da SES/RS, foi levada a efeito em 2001.

A DSI consiste em identificar e fornecer informação seletiva a públicosespecíficos, através de notificações pessoais ou a grupos, de acordo com osperfis de interesse dos usuários, previamente definidos.

A pesquisa acabou tendo um alcance maior e iniciou-se em agosto de2000, com os seguintes objetivos:

• realizar um levantamento exaustivo do perfil da força de trabalho daSES/RS no sentido de conhecer, valorizar e qualificar a atuação dos trabalha-dores do SUS, contextualizando políticas de ensino, pesquisa e desenvolvi-mento;

• realizar um levantamento das potencialidades docentes entre os servi-dores da SES/RS para as diversas modalidades de formação nos cursos mi-nistrados pela ESP/RS (docência em cursos de pós-graduação e educaçãoprofissional ou aperfeiçoamento), bem como áreas de investigação e dedica-ção técnico-científica etc;

• definir um Perfil de Usuários da Informação Técnico-Científica daSES/RS, visando conhecer necessidades de informação, comportamentosfrente à problemática de busca de informação documental em saúde epotencialidades e uso das fontes de informação em saúde;

• promover a Disseminação Seletiva da Informação em saúde coletivade forma rápida, direcionada, atualizada e pertinente à populaçãopesquisada.

A 1ª fase da investigação está consolidada na construção de um bancode dados, executado em Microsoft Access e Excel, permitindo inúmeros cru-zamentos de variáveis conforme interesses específicos e necessidades cir-cunstanciais de serviço.

O banco de dados elaborado está à disposição no Ceids-ESP/RS e na

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Ruth Sant’Helena da Silva

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Coordenação de Educação, Desenvolvimento e Administração de Trabalha-dores em Saúde – Cedats-SES/RS para todos os que tiverem interesse emdissecá-lo mais detalhadamente, especialmente a pesquisadores que quei-ram aprofundar alguma singularidade no estudo da força de trabalho naSES/RS, no período de agosto de 2000 a abril de 2001.

Parcialmente concluído, o trabalho já mostra tendências de diagnósticoe sinaliza para tomada de decisão quanto a algumas questões e situaçõesdetectadas, que dizem respeito às áreas de formação e documentação, mastambém sugerem diretrizes para fluxos e processos de comunicação e apro-ximação entre gestores, serviços, necessidades, aspirações e interfaces dapopulação pesquisada.

d) Centro de Referência de Educação Popular em Saúde Coletiva –CREPSC

A proposta de criação do CREPSC emerge oferecendo materialidade àpolítica de promoção, divulgação e educação em Saúde Coletiva, conforme oitem C do projeto Ceids.

Nossa proposta visa a oferecer este espaço técnico-político para facilitaro intercâmbio, o compartilhamento, a reflexão e a troca de saberes – técnico–científico e saber popular, através do acesso e uso do conhecimento produzi-do nas diferentes instâncias de conhecer, documentar, interpretar e viver oprocesso saúde/doença.

O desenvolvimento do CREPSC contempla algumas ações em anda-mento:

– a criação da base de dados sobre legislação produzida pela SES/RS eCES/RS junto à assessoria Jurídica da SES/RS;

– a videoteca da ESP/RS, que incorpora a pesquisa, coleta, reunião eprocessamento de fitas de vídeo que veiculam educação em saúde,políticas públicas de saúde, experiências de gestão, educação popularem saúde e registro e relato de movimentos sociais que aprofundamdebates e contribuam na construção de ações de cidadania e saúde;

– a organização de acervo de materiais de apoio pedagógico (textuaisou não) que digam respeito ao processo de produção, identificação,captação, armazenamento, recuperação e divulgação de recursos deeducação em saúde caracterizados, como multimeios, mediante con-vênios e articulações com entidades produtoras, divulgadoras ouusuárias.

Como multimeios arrolamos, além dos vídeos, os fôlderes, cartazes, ál-buns seriados, discos compactos, slides, cartilhas, literatura em quadrinhos,fotografias, artefatos, fitas cassete etc.

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e) Publicações

Em sua trajetória histórica, a ESP/RS tem produzido conhecimento emsaúde pública/saúde coletiva gestado na relação teoria/prática em serviçoatravés do ensino, da documentação, da pesquisa aplicada, das atividadesde extensão educativa e ação comunitária direta, além do fomento ao debatepara o desenvolvimento da qualidade das políticas públicas de saúde (RioGrande do Sul, 1999).

A guarda ou arquivamento na Biblioteca é insuficiente como açãosocializadora. É necessário uma dinamização ampliada que confere reconhe-cimento e propicia compartilhamento, apropriação, diálogo entre saberes eagregação permanente à prática, influenciando a qualidade das ações de saú-de e de vida.

Com este compromisso e nesta direção, a ESP/RS, através do Ceids,trabalha um projeto de editoração de publicações, principalmente através dedois produtos de disseminação da informação e do conhecimento produzido:

• duas séries monográficas: Escola de Gestão do SUS e O Fazer emSaúde Coletiva;

• o relançamento da revista Boletim da Saúde.

Com as Séries Monográficas, pretende-se publicar a produção dos alu-nos dos Cursos de Saúde Pública e de outros cursos que exijam a elaboraçãode trabalhos de conclusão para obtenção dos certificados, além da produçãointelectual de técnicos, pesquisadores, docentes e colaboradores da SES/RS.

Já o Boletim da Saúde, periódico da SES/RS publicado pela ESP/RS,teve interrompida a sua edição em 1986. Após um longo intervalo, a revistaestá sendo retomada com nova política editorial, alinhada como um periódicocientífico e expectativa de continuidade efetiva ao longo do tempo.

Conclusão

As considerações teóricas mescladas, com relato de ações operativasinerentes às práticas documentais, têm intencionalidade bem definida. Emprimeiro lugar, quer se afirmar que a aplicação de técnica uniforme e acríticade normas, regras e procedimentos pode parecer aparentemente objetiva.

Contudo, tais regramentos são constantemente perturbados por incerte-zas, indagações e busca de pressupostos que ofereçam sustentabilidadeconceitual à compreensão, avaliação, seletividade e disponibilização de infor-mação em saúde, na dimensão concomitante tanto biológica e humana comoeconômica e social. As questões da saúde requerem respostas adequadas epertinentes.

O conhecimento alcançado estabelece as bases da hegemonia na pro-dução do saber e na legitimação do poder técnico-científico. Os contextossociais de uso da informação e do conhecimento em saúde são dinâmicos,

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complexos e conflituosos. As práticas documentais acríticas se subvertem nocompromisso profissional da busca, organização e oferta de informação emsaúde pertinente e potencialmente transformadora, impulsionando ações decidadania, controle social e qualidade de vida.

As conquistas logo se transformam em novos desafios. As convicções eperspectivas, contudo, se reafirmam na convergência e centralidade do valorda informação em saúde, pertinente e de qualidade, e sua desejadacapilaridade em sustentação às ações de ensino, pesquisa, educação conti-nuada, extensão e prática em saúde pública/saúde coletiva. As certezas e oencanto se evidenciam no sentido da dimensão permanente da escuta e dainterlocução para a conectividade, o intercâmbio, o acesso, o uso e a produ-ção da informação documental em saúde, com seus canais de comunicaçãoque possibilitem o alcance de conhecimentos novos, desvelados durante oprocesso informativo gerador de surpreendentes e infinitas possibilidades epotencialidades.

Un centro de información y documentación en salud pública/saludcolectiva: compromisos, interfaces y perspectivas posibles y la estantería dela utopía – Parte II

Resumen: Al tiempo en que se discute y se establece las políticas para elgerenciamiento de los recursos informacionales en la ESP/SES-RS, sigue laimplementación del Proyecto Ceids, gradativamente, definiendo un perfil técnicopolítico y práctico funcional fecundado en el compromiso con la socialización y de-mocratización del acceso universal al conocimiento en salud colectiva. Se recorrelos caminos que muestran las varias facetas e interfaces de esta trayectoria. Deigual modo, son presentados los instrumentos y estrategías operativas que buscanviabilizar la consecución del trabajo, merced de los descompases, siempre presen-tes entre estas formulaciones y su efectiva implementación.

Palabras Clave: Información en salud; Proyectos de acción; Memoriainstitucional; Escola de Saúde Pública; Secretária da Saúde/RS; Documentación.

A center of information and documentation in collective/public health:commitments, interfaces and possible perspectives and the shelf of the utopia– Part II

Abstract: By the time the politics for the administration of the informationalresources in ESP/RS are discussed and established, there is the implementation ofthe Project of a Centro de Informação e Documentação em Saúde in the Escola deSaúde Pública/RS – Ceids, gradually defining a technician-political and practical-functional profile fecundated in the commitment with the socialization anddemocratization of the access to knowledge in collective health. In the present article-documentary there is a continuation of the previous article. Both present the roads

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that show the several facets and interfaces of this trajectory. In an equal way,instruments and operative strategies are presented that seek to make possible theattainment of the work, depending on the variations, always present between theseformulations and their effective implementation.

Key-words: Health Information; Action projects; Institutional memory; Escolade Saúde Pública/RS; Secretaria da Saúde do Rio Grande do Sul; Documentation.

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Ensaio e ReflexãoEnsaio e ReflexãoEnsaio e ReflexãoEnsaio e ReflexãoEnsaio e Reflexão

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Atenção montadora página 86 é branca

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Pediatria, puericultura, pedagogia...: imagens da criança e o devir-criança

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Pediatria, puericultura, pedagogia...:imagens da criança e o devir-criança 1

Ricardo Burg Ceccim2

Resumo: O presente documento registra a abordagem revisada da conferên-cia realizada pelo autor em um Seminário Nacional: Imagens da criança – a infâncianas artes. A abordagem escolhida foi a de descrever uma história da infância, captu-rando demarcações à pediatria, puericultura e pedagogia, áreas de conhecimentoespecífico ou originário da infância. Problematiza-se, então, as imagens da criançacomo representações que propõem reapresentações do mundo (modelização domundo) e desafia-se pensar o mundo como indefinido, aberto às produções, onde acriança não tenha uma imagem representada, mas uma perspectiva visível dosdevires inventivos, criativos, curiosos, ativos diante do mundo (invenção de mun-dos). Em lugar da imagem como representação e fixação do mundo, a imagem comopotência de realidades, aberta às produções, invenção de mundos.

Palavras-Chave: Criança; Devir; Infância; Subjetividade; Pediatria; Puericul-tura; Pedagogia; Saúde Coletiva.

Introdução

Uma imagem é uma definição de contornos ou uma territorialização, for-jada pela coagulação ou cristalização de um circuito de conexões que fazemergir as figuras da realidade.

Podemos pensar a imagem como representação e opor real (as repre-sentações da realidade) e irreal (sem veracidade concreta), onde a noção deimaginário surge para incorporar o campo de transição entre realidade eirrealidade. Admitindo-se um modelo de verdade, o imaginário serviria paradiscernir verdadeiro e falso na realidade.

Podemos, entretanto, pensar a imagem como configuração e em lugarde opor o real ao irreal, captar o movimento de constituição das figuras darealidade, compreendendo a existência de uma virtualidade compondo-secom o real. Neste caso, o real é entendido como o atual (o visível das formase o invisível das sensações como dimensões reais da realidade atualizada) e

1 Este texto se refere à conferência realizada no Seminário Nacional “Imagens da Criança – ainfância nas artes” realizado pela Secretaria Municipal da Cultura (Coordenação do Livro eLiteratura), Porto Alegre, 18 a 20/06/98.2 Sanitarista, Doutor, Diretor da Escola de Saúde Pública/RS, professor de educação em saú-de na Universidade Federal do Rio Grande do Sul.

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compreendendo o falso como potência de devir sobre a verdade (sem ummodelo de verdade, o falso é potência de atualidade de uma verdade), onde oimaginário é instância inventiva de imagens ou potência de atualização.

A distinção entre imaginário representativo e imaginário inventivo é queno primeiro as distinções real-irreal e verdadeiro-falso são substituíveis, liga-das às noções de consciência, progresso e razão, enquanto no segundo asdistinções são reversíveis, ligadas à noção de circuitos de troca. Real e virtualou verdadeiro e falso invertem-se e reinventam-se pelo atual, compondo ima-gens para assegurar circuitos de troca (inventar a realidade, inventar o mun-do, inventar a si mesmo).

O imaginário inventivo não busca novas sínteses ou a superaçãodialética, mas configurações segundo a necessidade de afirmar potênciascriativas e não aquilo que seja mais verdadeiro. Ao imaginário inventivo inte-ressam as simulações, não a busca de essências, origens, evolução ou cons-ciência racional.

Deleuze, estudando sobre cinema, passou a formular uma noção deimaginário como cristais de tempo, dizendo que aquilo que se vê no cristalsão imagens de tempo (potências do falso) e, então, o imaginário seria umaimagem-cristal (Deleuze, 1992).

Paul Klee, conforme Luzán (1998) falava que sua arte não podia refletira superfície (isto que uma chapa fotográfica pode fazer) porque ele refletiaaté o coração e, por isso, seus rostos humanos eram mais verdadeiros queos originais. Para Luzán (op. cit.), Klee fala de uma interioridade que se distin-gue claramente da superfície, sem opor aparência e essência. Não é a es-sência que precisa ser buscada, mas o circuito de conexões invisíveis (ínti-mas, por acoplamento afetivo, páticas) que compõem o real e só podem sercaptadas, não fotografadas.

Destaco aqui um artista porque é da arte essa condição de sensibilidadee contato com a alteridade. É da arte dar visibilidade ao invisível, escutar/vero inventivo sob o representativo e torná-lo visível/audível. Assim como é dacriança a invenção e a criatividade ou a facilidade de enveredar pelos estra-nhos e insólitos universos do jogo, do desenho e dos brinquedos. O imaginá-rio-criança é o das sintonias afetivas, dos acoplamentos cognitivos, da inven-ção de linguagens para descobertas vividas. Um imaginário-criança não pos-sui o verdadeiro, experimenta. Não analisa logicamente, descobre afetos.Não organiza identidades e limites, embarca na expansão.

Crescimento e desenvolvimento como extinção da criança

Reaver as práticas históricas de como as sociedades tratavam a criançaou como lidavam com a infância nos defronta com a construção histórica dosconceitos morais de civilização, razão, consciência e perfeição humana.

Se hoje entendemos por condição especial das crianças o fato de esta-rem em fase de intenso crescimento físico e desenvolvimento psíquico , o

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que lhes dá garantias morais e legais de preferência no direito à saúde e àeducação, não podemos deixar de lembrar que, no século XVII, o crescimen-to e desenvolvimento significavam debelar e rejeitar o estado infantil em queos homens se encontravam nas idades precoces. Era pela luta contra o quede infância houvesse em nós que poderíamos nos alçar à humanidade e àcidadania.

A infância não se confundia com ingenuidade, identificava-se comanimalidade e com incapacidade: ausência de razão, de domínio lingüístico ede consciência moral. Entendia-se que uma criança aprendia com o corpo enão com o intelecto, sua vontade era instintiva e não crítica, logo faltava-lhecaráter, inteligência e competência humana.

Até o início do século XVIII, o pensamento social vigente propunha queos homens se faziam humanos pela expulsão de tudo que neles houvesse dacriança. O modelo de homem era o adulto racional e consciente da realidade.

O historiador francês Philippe Ariès estudou a transformação dos senti-mentos de infância e de família, pesquisando as criações artísticas na pintu-ra, na decoração de igrejas e túmulos e em fontes documentais como testa-mentos e diários de famílias, legando-nos a História social da criança e dafamília (Ariès, 1981) que nos permite detectar o surgimento da família nucle-ar, da escola e do sentimento de infância contrapostos à hipótese de que afamília e a escola sempre existiram e sempre tiveram a mesma designaçãosocial ou de que uma natureza infantil sempre caracterizou a criança comoalvo de carinho, proteção e amor parental.

Outra extensa pesquisa foi empreendida pela filósofa Elisabeth Badinterque retomou a história e os comportamentos sociais para examinar a condi-ção da maternidade em Um amor conquistado: o mito do amor materno(Badinter, 1985), revelando o sentimento de amor materno como um senti-mento humano entre outros e não indefectível, detendo-se nos comporta-mentos de pais, mães e filhos e oferecendo-nos densos elementos para com-preender a condição das crianças.

No Brasil, um estudo de fôlego semelhante é apresentado pelo sanitaris-ta e psicanalista Jurandir Freire Costa em Ordem médica e norma familiar,onde vasculha, com cuidadosa pesquisa, a história dos comportamentos re-lativos à infância e à família na época colonial (Freire Costa, 1989).

A alta mortalidade infantil e a criança-esperança

A ausência de um sentimento de infância, tal como o conhecemos hoje,atravessou a história da humanidade, registrando épocas de grande abando-no e mortandade das crianças.

Antes da era cristã, as crianças indesejadas eram expostas à morte,sendo empilhadas em monturos públicos de deposição dos enjeitados, colo-cadas em barcos e lançadas ao mar, largadas no campo ou na rua para quefossem recolhidas por algum interessado ou devoradas por insetos rasteiros,

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cães e outros animais. Podiam ser queimadas em fogueiras de dejetos ousacrificadas em rituais místicos ou religiosos e ainda mutiladas para justificaro pedido de esmolas ou apelo de ajuda sócio-econômica por adultos pobres,comerciantes decadentes e escravos fugidos.

Na Antigüidade, o infanticídio era prática comum e até incentivada, in-clusive como proposta política de controle populacional. O infanticídio era ain-da tão freqüente até o século XIII que os hospitais foram orientados pela igre-ja a receber e recolher crianças abandonadas para que não se acumulassemtantas mortes miseráveis.

Robert Darnton mostra que muitos dos contos infantis, hoje acusadosde perversão contra crianças, como os contos do Chapeuzinho Vermelho ede João e Maria, narravam, em verdade, experiências da vida quotidiana dasfamílias camponesas (Darnton, 1986)3 . Essas práticas perduraram em maiorou menor proporção durante o século XVIII.

Até o século XII, não constavam crianças nas criações artísticas e nemmesmo a pintura retratava a imagem corporal de crianças. Os artistas pinta-vam as crianças como adultos, eram adultos em tamanho reduzido, ou seja,não havia uma figura social para a criança. A criança não existia, as criançasnão eram nem mesmo o adulto em potencial ou em crescimento, elas eram oadulto, ainda em miniatura.

No século XIII, o hábito de entregar um filho a Deus, passando sua edu-cação à Igreja para se tornarem freis ou freiras se disseminou entre as famí-lias pobres como reivindicação do direito à honra e ao respeito social, dandolugar ao freqüente abandono de crianças diante das portas de igrejas, mostei-ros e conventos.

No século XV, durante a Renascença, passamos a ver a criança retrata-da na pintura, elas figuram como anjinhos róseos ou azuis-claro. Surge umafigura à infância: representação do ingênuo, do inocente, do bom e puro. Aescultura é farta de figuras infantis angelicais: risonhas, bochechudas e roli-ças. Os anjos podem ser nus e sexuados e vão de Eros ao Menino Jesus.

A criança agora ganha a figura da esperança, da promessa de vir-a-ser.Ser criança é ser ninguém, mas que virá a ser, a criança é a alegoria da almado adulto. A criança é a reserva de pureza e inocência e revela o tempo daausência de moral e pudor a serem conquistados e nunca mais perdidos. Acriança pode andar nua, o adulto não mais. Viver, para a criança, passa a sera esperança de uma vida no futuro.

No século XVI começam a disseminar-se os colégios, claramente orien-tados pela segregação da criança, seu adestramento moral, disciplinamento

3 Darnton conta que aquilo que tornava comoventes os contos populares não era o seu finalfeliz como lhes acontece depois do século XVIII, principalmente quando se tornam contosinfantis. Eram contos populares e não contos dirigidos às crianças, sugeriam cautela e nãobom comportamento. Apontavam que nenhuma moral governa o mundo em geral e que o bomcomportamento não determina o sucesso. Desastres não podem ser prevenidos, nem explica-dos, devem ser simplesmente suportados.

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Pediatria, puericultura, pedagogia...: imagens da criança e o devir-criança

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físico e rigidez de pensamento. Os colégios religiosos e filantrópicos acolhemcrianças pobres e sem família, funcionando como instituições reformadoras ede prevenção da delinqüência, como se fossem abrigos de polícia social (Ca-sas de Recolhimento).

Durante o século XVIII, na modernidade, as crianças eram submetidasas mais severas restrições e proibições, utilizadas para trabalhos de granderisco como a limpeza das chaminés industrias (já que podiam penetrá-las),abusadas fisicamente por circuncisão, infibulação, castração ouclitoridectomia, fechadas em emplastros de folhas, couro ou borracha,acorrentadas, surradas, amedrontadas e castigadas. Viver para a criança eraapenas permanecer vivo.

O abandono de crianças ao longo de toda a história foi tão freqüente quea assistência às crianças expostas se materializou em instituições de finalida-de específica: as Casas dos Expostos ou Casas dos Enjeitados ou, ainda,Casas da Roda.

As Casas da Roda eram instituições que possuíam um dispositivo gira-tório como uma fenestra em uma parede no qual havia um balcão. Este bal-cão, girado para fora, permitia que ali fossem depositados os bebês enjeita-dos e, então, girado para dentro onde seria recolhido por funcionários daCasa. Ao girar a Roda soava uma sineta que avisava aos funcionários a de-posição de mais um bebê. A identidade daquele que abandonava a criançapermaneceria desconhecida para sempre e o futuro da criança para sempredesconhecido daquele que a abandonara.

Inventada no século XIII, as Rodas chegaram ao Brasil em 1726, sendoinstaladas nas Santas Casa de Misericórdia das principais cidades brasilei-ras. A primeira foi instalada em Salvador (1726), seguida pela do Rio de Ja-neiro (1738), Recife (1789), São Paulo (1825), São Luiz (1829) e Porto Alegre(1837). No Rio Grande do Sul, instalada no Hospital Irmandade Santa Casade Misericórdia de Porto Alegre, funcionou durante 103 anos, tendo sido fe-chada há aproximadamente 60 anos, em 1940.

Somente a partir do século XX a criança passa a ter o reconhecimentode estar vivendo um período especial do desenvolvimento psicológico do ho-mem. Pelas descobertas de Freud sobre o inconsciente e suas raízesconstitutivas, de Spitz sobre o abandono afetivo e a necessidade de intimida-de e estimulação e de Bowlby sobre o apego e a importância do vínculo amo-roso, a criança surge como montagem do adulto.

O modelo de caracterização do humano que veio sendo construído noplano da visibilidade, da moral e da lei desde a Antigüidade até a Modernidadeé o modelo de homem de sexo masculino, raça branca, adulto, de orientaçãoheterossexual, detentor das faculdades de raciocínio lógico e consciência,possuidor de grande força física, que dá nome a família, possuindo bens epatrimônio que honram esse nome.

A qualquer dessas tendências, quando dirigidas à configuração das for-mas da subjetividade, Nietzsche chamou “humano, demasiado humano”

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(Nietzsche, 1987). São essas tendências que justificam, na modernidade, acriação da categoria “diferente” para incluir, entre os humanos, a mulher, acriança, os loucos, os deficientes mentais, os deformados, os doentes, osnegros e a orientação sexual homoerótica, por exemplo.

Essa noção de diferença só se cria e se mantém na vigência de umamoral social demasiado humana. Como se pode notar, essas diferenças nãoinstauram outro plano para o humano, sua lógica é a das equivalências esubstituições ao padrão (mantido) em referência.

Emergência da higiene materno-infantil

Tomando-se as figuras históricas da criança, pode-se perceber as confi-gurações históricas com que se impunham as figuras da vida e do saber comoprisioneiras de um limite representativo demasiado humano.

A figura da criança mais comum na história é a do filho, uma imagemsem qualquer especificidade ou peculiaridade ligada à infância. Do ponto devista afetivo, sua posição é suplementar (como um adicional, como um acrés-cimo) e não complementar (como exigência afetiva para suprir e completar onúcleo familiar) e instrumental (pode ser chamada a exercer certas funçõeseconômicas, sociais ou de poder na família ou sua linhagem), mas não é tidacom o caráter utilitário com que se tem os escravos ou servos4 .

A mulher e os filhos compõem a célula primária dos direitos do pai, dãoconfiguração e consistência ao poder do pai.

Quem é alvo de direitos, atenção, cuidados e proteção especial é o pai eisto podemos reconhecer como vigente até bem pouco tempo em nossa or-ganização social. Porém, até o nascimento da psicanálise e mais ainda dapsicanálise infantil, a criança não era objeto de desvelo e amor materno ouparental e nem alvo de intensa afeição, hoje condições defendidas pela pue-ricultura como cruciais ao desenvolvimento físico e psíquico sadios da crian-ça.

Não havia positividade em ser criança, ser criança era ser incompleto eincompetente, era preciso crescer para se tornar competente naquilo que seé: um adulto. O universo das subjetivações, da Antigüidade à Modernidade,se remetia ao culto à propriedade, ao passado e às leis divinas. Ao pai cabiaa figura da propriedade, do passado e da lei, donde advém a linguagem de ochefe da família, a casa paterna, o pátrio poder, o homem da casa, por exem-plo, que investem as figuras da mulher, do filho e dos adultos não pais, entrea parentela, como um desdobramento.

É preciso entender que durante todas as épocas históricas em que seconviveu com a escravidão e servidão de concidadãos a liberdade era o equi-

4 A distinção entre o filho e as utilidades distingue as relações afetivas com que se perde,abandona ou sacrifica os filhos. Essas práticas não eram indiscutivelmente isentas dos senti-mentos de tristeza, frustração ou pena, por exemplo.

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valente de propriedade. Nos regimes em que a polarização social se deu en-tre proprietários e escravos/servos, as lutas sociais se esgotavam entre apro-priar-se (ter posse) e ser apropriado (nada possuir).

Os homens livres eram a menor proporção dos cidadãos da Antigüidadee da Idade Média, as chances de liberdade (escapar da polarização da propri-edade) eram mínimas e extremamente difíceis de alcançar (a igreja, a sapi-ência filosófica, o pequeno comércio, o trabalho médico e o trabalho jurídicoforam as alternativas históricas mais freqüentes e terminaram por constituirnovas figuras representativas para a liberdade).

A vivência passada, o entendimento do passado e a reverência ao pas-sado tornavam respeitável o adulto e venerável o idoso. O homem responsá-vel devia controlar a mulher, os filhos e os escravos (ignorantes ou inocentes,menos racionais e menos lógicos) e, estes, deviam respeito ao pai de família(patrão e protetor).

As leis do pai ou leis do patriarca ou leis divinas dão forma ao prestígio eà honra do nome do pai, à manutenção das tradições e continuidade sagradada moral. As leis renovam a mentalidade patriarcal e justificam os castigosfísicos e a obediência incontinenti ao pai. As crianças eram punidas com fartaviolência física (é fácil lembrarmos das palmatórias, das varas de marmelo,dos galhos de goiabeira, entre vários métodos, mas haviam outros: objetosde sevícia e duras humilhações psicológicas).

Sobre as filhas os poderes do pai eram ilimitados, uma vez que reuniama condição de serem mulheres, crianças e filhas. Os pais eram patrões egozavam da autoridade de patriarcas e protetores, constituindo-se em reser-va e fonte da subsistência pelas vias de conquistar alguma propriedade, re-presentar e dignificar o passado e consagrar a moralidade. O pai era a garan-tia de vitalidade da família. A geração e conservação de bens e posses pro-movia a família em conjunto e a cada um de seus membros. O poder, prestí-gio e honorabilidade acumulados pelo pai se extendiam para toda a família esua derrota significava a derrota de toda a família.

A religiosidade na cultura medieval, ao investir a criança com a figura doanjo, oferece aos séculos seguintes uma imagem à importância da obediên-cia, do respeito ao pai e do respeito às regras como se pregava para o adultoem relação à igreja e à Deus (era o respeito e a obediência que levariam àperfeição da alma).

A criança retratada como anjo, os putti da pintura e escultura medievais,possuía clara influência eclesiástica, fornecendo uma figura da criança íntimacom o paraíso e o reino dos céus. Numa época em que a mortalidade infantilera extremamente elevada, a criança morta era um anjo que ia para o céu,pois uma alma pura só poderia encontrar o reino do paraíso. A vida estavarepresentada pela obediência e a criança, que já representava a obediência,encarna a pureza e a inocência como um signo, por isso, não implicava seramada e cuidada.

A criança passa a ser o signo da alma do adulto. Somente almas puras

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(obedientes, tementes e amantes do patrão e do poder) podem alcançar oparaíso. Alcançar o paraíso é a promessa que só seria atingível após a morte.Entra-se no século XVIII com uma excessiva mortalidade infantil sem que talfato mobilizasse preocupação nas famílias, médicos e administradores.

No final do século XVIII, a alta mortalidade começa a mobilizar moralis-tas, administradores e médicos e surge um novo discurso às subjetivações: odiscurso da maternidade. A maternidade engloba a gravidez, parto,amamentação e cuidados com o recém-nascido. Seu conteúdo discursivo,prescrito pelos movimentos moralistas de higiene social, visava conter a dis-seminação das doenças e mortes na sociedade. A preocupação dos higienis-tas não é com as crianças, mas com a contenção epidemiológica dosadoecimentos e da mortalidade.

A pediatria mesma, como especialidade de conhecimento médico só vaisurgir no século XX, essa era uma tarefa das mulheres (das curandeiras/dasenfermeiras). As doenças comuns da infância só eram conhecidas por seupotencial epidêmico e não pelo interesse de uma atenção ou proteção à saú-de das crianças. Como, até o século XIX, mais de 50% da mortalidade geralocorria em menores de 6 anos, estes se tornaram alvo prioritário das campa-nhas higiênicas. No que se refere à saúde individual, alguém teria que serresponsabilizado pela vigilância sanitária. Assim, surgem os deveres da mãepara com a maternidade.

Os deveres da mãe iniciam com a gestação, se prolongam pelaamamentação do próprio filho até o surgimento da primeira dentição e naoferta de cuidados de higiene corporal e das roupas do bebê. A mãe deveagora dedicar a vida ao filho, dela dependerá a sua sobrevivência, sua saúde,sua beleza física e sua vitalidade.

A própria psicanálise, enquanto não ousa o desafio de inventar lingua-gens para detectar a potência de vida de outros afetos na invenção do simesmo e do mundo, renova e ressignifica as figuras representativas (semousar sair da representação, não há invenção e, sem invenção, os afetos sãoreificados). A tradicional interpretação psicanalítica reconduzia toda a subjeti-vidade ao pai e à mãe. Hoje a literatura psicanalítica que escapa da represen-tação coloca o pai e a mãe como meios, entre outros, de experimentação domundo pela criança e não como matriz única e inelutável dos afetos. ChaimKatz diz que uma psicanálise da crianceria afirma insistentemente o desejocomo imanente e não se deixa capturar pelo desejar desde o desejo do outro(Katz, 1996).

A prevenção das mortes precoces também se relaciona com a conten-ção dos nascimentos e todo um discurso médico recairá sobre a higiene damaternidade: casamento, fidelidade conjugal, ausência de prazer sexual elongo espaçamento da prática sexual após um nascimento. Após o adventoda psicanálise, as mães serão promovidas de responsáveis a culpadas portudo que de bom ou mau aconteça às crianças. Para chegar até aí os estudossobre a mortalidade infantil foram detectando novas responsabilidades a se-

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rem assumidas pelas mães.Entre as práticas relacionadas com alta prevalência de mortes infantis

estavam a confiança dos bebês às amas-de-leite, a amamentação por amasmercenárias, entrega de bebês aos asilos e orfanatos e o abandono de crian-ças. A prática de entregar bebês às Casas de Expostos tornou-se alvo doshigienistas porque, criadas para proteger da morte as crianças indesejadas(os enjeitados), registravam altas taxas de mortalidade infantil.

As crianças que eram entregues às Casas dos Expostos (a Roda) eramcrianças filhas de uniões adúlteras, uniões proibidas pelos pais, filhos de es-cravos que tentavam salvar suas crianças da escravidão, filhos de escravascom o patrão ou com os filhos do patrão, filhos que resultavam de prostituiçãoou de estupros, bebês que nasciam com deformidades ou doenças, bebês departos complicados, bebês de famílias já muito numerosas, filhos de mulhe-res que preferiam comercializar seu leite materno e obter renda, filhos se-qüestrados das escravas por seus patrões para alugarem seu leite materno,filhos de jovens prometidas pelos pais etc..

As Casas da Roda terminaram por revelar nas estatísticas higiênicasuma elevada proporção de nascimentos ilegítimos, uma elevada proporçãode partos mal realizados, uma elevada proporção de mortes no primeiro mêse no primeiro ano de vida, más condições de higiene do meio social, abusosmorais e sexuais, entre outras características das más condições de vida dapopulação. Enquanto os higienistas definiam padrões de moralidade e sani-dade às populações, as Casas da Roda, inesperadamente, competiam pelainutilidade dos valores morais pregados.

Como a mortalidade infantil era indubitavelmente maior entre os meno-res de um ano e, nestes, recaía massivamente sobre os menores de 30 dias,os higienistas elegeram a amamentação e o cuidado materno como o alvo desua maior teorização, pesquisa e educação social. Surge a disciplina da higi-ene materno-infantil como prioridade ao estudo da saúde pública e da educa-ção e cuidado dos filhos. A criança passa a ocupar uma nova figura social,cada vez mais identificada como alvo de cuidados, desvelo e amor.

Uma nova ordem familiar começa a nascer desde a passagem do sécu-lo XVIII ao XIX e na consolidação dos desígnios à subjetivação no novoséculo.

Maternidade, colégio e puericultura

Para atenuar a mortalidade infantil e melhorar a saúde nas cidades, coma ascensão dos conglomerados urbanos, era preciso modificar o sentimentode poder dos homens. Modificar o sentimento de poder dos homens significa-va conter-lhes os abusos diante de escravos, filhos e esposas, as mulheres eas crianças em geral. Uma súmula da higiene doméstica poderia se resumirem: pai provedor, mãe educadora, criança em crescimento e desenvolvimen-to físico, moral e intelectual no seio de um lar com vistas ao bom serviço à

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sociedade.Novas relações econômicas estavam realizando o surgimento de uma

ciência do Estado. O movimento de unificação da Alemanha depõe em favorda nova lógica social em curso no que se refere à família e à criança. Estavasendo gestado o Estado-nação, onde todos os cidadãos são filhos da nação edevem respeito ao pai-Estado, seu protetor. Se precisava mais pais e menospatrões, para que todos servissem ao capitalismo monopolizante.

Os pais não poderiam mais ser proprietários, mas tutores dos filhos danação, os cidadãos do futuro. Para fazer nascer o sentimento de nação erapreciso redefinir os papéis dos pais e das crianças, cabendo a toda família adevoção ao Estado que seria uma devoção à humanidade.

A modernidade impõe um novo modo de vida que vai aparecer no finaldo século XVIII, mas que se desenvolverá e criará raízes na subjetividade aolongo do século XIX. Um modelo de vida que se voltará para a interioridade eintimidade do lar e da família de onde sobrevêm laços amorosos que esgotama vigência exclusiva dos laços consangüíneos aprendidos da família feudal.

A mãe passa a ser o centro da célula familiar e a matriz dos afetos dosfilhos. A higiene e a medicina social nascente neste mesmo período, tantocontribuiu a este sentimento, quanto lançou suas bases de vigilância extre-mada sobre os hábitos, condutas e atitudes da população, disciplinando in-tensamente a vida e os conceitos de saúde e doença. Foucault (1992) des-creve essa normalização médica da vida social nas vertentes da saúde públi-ca: a Polícia Médica (alemã), a Medicina Urbana (francesa) e o Sanitarismo(inglês).

A educação das crianças em colégios entrava neste perfil de vigilância edisciplinamento do corpo e da mente, se apresentando como única saída paraformar cidadãos com retidão moral, capazes de amar e servir à Humanidadee detentores do conhecimento competente para explicar o mundo e as rela-ções entre os homens.

Se amar aos filhos tornava-se fundamental, educá-los corretamente eraa única garantia de que se tornariam os adultos desejados pela sociedade. Odiscurso da medicina social era de que as famílias não sabiam amar, esque-ciam-se de regras morais, adulavam as crianças e expunham-nas às experi-mentações da rua. Era preciso saber onde se esgotava o papel materno eonde começava o papel do colégio.

À mãe caberia, agora, o período do aleitamento, das fraldas, de apren-der a falar, andar e controlar os esfíncteres, aprender a vestir-se e calçar-sesozinha e a assumir sua própria higiene. A seguir, a criança de boa família ouque visasse a melhor integração social deveria ser enviada ao colégio, osmais eficazes seriam os colégios internos.

Todas as saídas do internato colegial, os contatos com a rua e o próprioretorno ao convívio familiar eram acusados por pedagogos e médicos comoperigosos porque as crianças teriam acesso às conversas indiscretas, à leitu-ra de romances, aos entretenimentos secretos, à masturbação, às perver-

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sões morais que grassavam entre os iletrados, os vadios e devassos.No colégio, a criança abandonaria seus afetos infantis para aprender o

que é o belo, o bom e o honesto. Um novo homem e um novo mundo teriamseu começo nos bancos escolares, submetidos às mais criteriosas regraspedagógicas e ao mais criterioso conhecimento científico. Mas de locus privi-legiado das normas de ser e das ordens médicas, o internato passou a reper-cutir, inesperadamente, em incitação à masturbação e à homossexualidade.

Aos poucos, e sob a pressão das mulheres, o pai se defronta com amaternagem. A puericultura se atualiza com os movimentos de mulheres pelomundo. Os estudos sobre a educação infantil passam a refletir novas ordenssobre as aprendizagens cognitivas e sobre o brinquedo e o brincar para acriança. A mortalidade infantil se reduz drasticamente e a natalidade também.As escolas passam por modelos cada vez mais diversos, ainda assim, o dis-curso do poder ou da necessidade da alegria na escola começa a ganharvigência nas representações pedagógicas.

O que as relações sociais e econômicas da modernidade instalaram nasubjetivação atual da criança e da família é que a criança é o vir-a-ser. Elaserá tudo o que não conseguimos ser. Para ela o futuro será melhor, ela é aesperança.

A criança passa a encarnar uma promessa, um pacote de subjetividadevoltado para o futuro. A criança seria muito diferente do adulto porque estevive no mundo real, material e objetivo, mensurável e palpável. O adulto érazoável e comedido, a criança é insensata.

O mundo infantil seria de fantasia, a criança deveria ser preparada paraum futuro suposto, ela estaria no caminho do futuro e, assim, pais, pediatras,puericultores e pedagogos apontavam os caminhos que a criança deveriaseguir para se tornar um adulto.

A nova figura à criança é o vir-a-ser, a esperança, ou seja, há algo jádeterminado a alcançar no futuro, futuro desejado que se pode antecipar porplanejamento e eleição de condutas apropriadas.

Devir-criança

Se em vez de localizarmos a criança como vir-a-ser, reconhecêssemos,por intermédio da criança, o devir, poderíamos admitir que o seu desenvolvi-mento não remete às exigências do futuro, mas às experimentações em quepode exercer as suas potências, se compondo com os diferentes meios comos quais convive, incluindo as pessoas, entre elas, principalmente, os pais eos irmãos.

O desenvolvimento do bebê se faz por sintonia afetiva e acoplamentocognitivo com o adulto, servindo os adultos como meio à exploração e nãocomo matriz dos significados que vão povoar para sempre o inconsciente. Oinconsciente é aberto, conectando-se com as forças que compõem encontrose acasos, ele é a criança que insiste no adulto, não é o reservatório traumáti-

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co das representações.A criança é um conjunto de potências devindo. A marca da criança é sua

expressão por intensidades, sua aprendizagem pela experimentação e pelojogo. A criança realiza o encontro real-imaginário. O imaginário infantil contacom um corpo com órgãos (seu corpo físico) e com um corpo acessório (semórgãos) com o qual ela se compõe o tempo todo, por isso pode entrar emdiferentes sintonias, realizar diferentes acoplamentos com o que vive5 .

O que as grandes teorias e os adultos tentam fazer é eliminar essa po-tencialidade da criança, fazendo dela um pré-adulto, devolvendo-a sistemati-camente às compreensões únicas e verdadeiras, interpretando suas atitudese condutas, segundo as grandes referências (como se fossem únicas e ver-dadeiras).

A criança não existe só pela faixa etária, ser criança é aceitar a aventurade se compor com as aprendizagens, deixar seu corpo descobrir experiên-cias, explorar ambientes, percursos e emoções. Ser criança é aceitar a ousa-dia das viagens nômades, a coragem de se transportar para diferentes uni-versos incessantemente, ao sabor de suas experiências cognitivas e afetivas,para extrair conhecimentos e vivências intensivas, reencontrando real e ima-ginário.

A criança, por ser criança, não pode ser classificada como fora da reali-dade ou alienada, ela realiza experiências de pensamento com o corpo todo enão busca estados de equilíbrio solidamente estáveis. Ela não pára, ela em-barca em paixões, em novidades, em aventuras, em excursões, em progra-mas da televisão, nas conversas dos adultos, nas cores que se estampamem roupas e cadernos, nos desenhos da luz filtrada por venezianas e fres-tas...

A criança é o que se liga nas chances de trajeto e traça cartografias deexpedição. Inventa línguas para o que vê, sente e faz. Não se compõe com“permanências”, arrasta sua expedição para outras terras.

O que diferencia a criança do adulto é que o adulto prefere mapas queindicam os percursos a seguir, localiza onde está, decide onde quer chegar,compra o mapa que possui esse roteiro e migra de um lugar para o outro. Acriança cartografa em viagem, prefere a viagem. Os lugares, ela os localizana sua carta, assinalando seus conhecimentos e se movendo pelo produto deencontros e acasos, afetos-criança. Produz a si mesma.

A criança como faixa etária da infância e a criança como devir encon-tram identidade e diversidade. Falo do fato que, na infância, o devir criança éforça ativa de subjetivação, aprendizagem, crescimento e desenvolvimento.Mas a criança cronológica ao longo da história teve este devir afastado de suaontologia, chamada ao cultural e ao biológico que exilam não apenas o devircriança, mas vetam o direito à infância.

5 Deleuze e Guattari retomaram do ator e mestre do teatro Antonin Artaud a expressão Corposem Órgãos para destacar a necessidade de aprendermos a coragem para experimentar avida.

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Pediatria, puericultura, pedagogia...: imagens da criança e o devir-criança

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Adorno traçou em A experiência precoce da punição um perfil da socia-lização da criança nos territórios da delinqüência ou da adversidade das con-dições de existência na contemporaneidade. Carentes de alimentação, habi-tação, saúde, escolarização e lazer, direitos de um universo eminentementeinfantil, “um mundo onde realidade e o caráter lúdico da convivência com osoutros se encontram entrelaçados em uma unidade indissociável”, as crian-ças são empurradas para o mundo adulto, onde permanecer infantil, não as-sumindo responsabilidades, passa a ser tido como atributo de incapacidade edesvalia. Precocemente descoladas do devir de que são reservatórios na hu-manidade, as crianças experimentariam uma socialização incompleta. Entre-tanto, um mundo assim é forjado: inserções sociais regradas em moralidadese racionalidades perversas à inventividade, criatividade e diversidade; amplasexclusões sociais naturalizadas; clamor e devoção às identidades e sofrimen-to psíquico diante das derivações, rebeldias e desobediências às regras enormas identitárias.

O entusiasmo com a aventura e a iniciativa, a coragem afetiva e a ruptu-ra com os padrões moralistas, preconceituosos e segregadores recompõemo devir criança. A criança como potência do falso ao adulto, ao branco, aoheterossexual, ao racionalismo, ao forte, à forma homem (demasiado huma-na) permite/autoriza ousar e desafiar-se às novidades ou aos estadosinventivos, criativos, inconformados e ativos.

A criança cronológica fica adulta, aceita os agenciamentos de subjetivi-dade que a sociedade faz, que as instituições impõem, que os pais achambelos, bons, honrados, mas um devir-criança é a resistência a essesagenciamentos e a criança sobrevêm no adulto, sobressai-se em seus aces-sos de alegria, em sua curiosidade risonha, no bom-humor ou quando detectauma nova suavidade nos encontros.

Para um devir-criança não existe o homem, muito menos demasiadohumano. O universo é para ser experimentado e vivido, crescer não é emuma direção e sentido, é invenção de direções e sentidos, desenvolver-senão é amadurecer e ficar adulto, é detectar potências de vida e dar-lhes exis-tência. Só a criança sabe que a vida não é somente biológica e que a comuni-cação não é só pela palavra. A vida envolve múltiplos circuitos de conexão emúltiplas semióticas. Um bebê se conecta com o móbile sobre o berço, com opróprio berço, com o paninho com que ronca e fuça, ela murmura com o narize com a baba, ela murmura com a teta e com a água do banho.

Um devir-criança é uma atividade cartográfica, produto das potências deafetar e ser afetado, mesclar “real” e “imaginário” como realidade atual.

Guattari (1987) fala em devir-criança para afirmar que uma revolução,em qualquer domínio que seja, passa pela libertação prévia de uma energiade desejo e por acabar com todas as relações de alienação que pesam sobreas mulheres, as crianças, as minorias sexuais, as sensibilidades atípicas,sobre o amor aos sons, às cores, às novas idéias...

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Aprender com a criança

A mágica das crianças no brinquedo é que elas não só imitam, elas setornam aquilo com que jogam, entram em zonas de vizinhança entre o quesão e o que simulam nas brincadeiras.

Este estado é o mesmo que leva o artista à produção de arte, à entrarem zonas de indiscernibilidade entre o racional e o sensível. O artista só podetornar visíveis as sensações que ele mesmo experienciou.

A experiência da sensação é a experiência do devir-artista, ela é equiva-lente às simulações da criança, é a experiência da conexão por afetos e daescuta áptica (escuta que capta o universo de fragmentos e os encaixa emuma dimensão cognitiva não racional).

O devir-criança e o devir-artista comungam a constituição de complexosde subjetivação e cognição que agenciam possibilidades individuais e coleti-vas e criam modalidades inéditas de aprender e conviver.

A simulação da criança é o aprendizado que os artistas entendem e osadultos deveriam se permitir. A simulação infantil nos serviria para forjar figu-ras reterritorializadoras, sem recorrermos aos modelos identitários ou de ver-dade, mas às figuras finitas que dilatam as probabilidades da realidade e in-troduzem novas marcações de temporalidade.

A diferença de um devir-artista ou de um devir-criança-em-nós está nofato de que com a primeira composição produzimos obras de arte e com asegunda composição produzimos a própria vida.

É da criança produzir a vida, seu desígnio é crescer, desenvolver-se,inventar figuras para ser, abandonar essas figuras, inventar novas, experi-mentar personagens com os quais aprenda sobre si, seus afetos e seu poderde vida, experimentar amigos imaginários para experimentar o desafio à lógi-ca racional e aos valores morais e explorar o mundo com expediçõescartográficas.

As brincadeiras de faz-de-conta e o jogo com diversos papéis sociaisdesnaturalizam a vida quotidiana e modificam a estrutura perceptiva. No brin-quedo, a criança pode imaginar comportamentos, atuar experiências vividase investir competências mais avançadas do que as que consegue agir quoti-dianamente. Efeitos de subjetivação emergem dessas atividades.

É da arte atingir esse estado infantil que não se esgota pela demasiadahumanidade, colocando em existência visível o movimento dedesmanchamento e engendramento das figuras da realidade, o surgimentode singularidades, a invenção de percursos e inscrição aos processos devivência. Deleuze coloca que “à sua maneira, a arte diz o que dizem as crian-ças”.

O mundo demasiado humano, o mundo onde impera o adulto (sem oque diz a criança) está na história da cultura ocidental moderna: uma civiliza-ção da consciência (da intelectualidade cartesiana), superando a civilizaçãotrágica (da sabedoria) e dicotomizando instinto e razão, estética e conheci-

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Pediatria, puericultura, pedagogia...: imagens da criança e o devir-criança

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mento, arte e ciência.Aprender com a criança? Será que aprender com a criança é observá-

la? Será que é inverter a relação adulto-criança pela redução/eliminação daautoridade do adulto? Será que é valorizar todas as atitudes da criança comopuras, belas e boas, porque são crianças? É bem mais simples e bem maiscomplicado... Trata-se de acolher um devir-criança-em-nós e não deixarmosde ser os adultos cronológicos que somos. Nossa responsabilidade com ascrianças é de adultos, é também a de pediatras, puericultores, pedagogos eartistas.

A arte já está trazendo esta figura de criança aos nossos olhos e ouvi-dos. Não posso deixar de destacar o filme Central do Brasil (melhor filme noFestival de Berlim, 1998), que faz o encontro do adulto (uma mulher fria, raci-onal, lógica, de olhar duro e reto) com a criança (um menino disposto a des-cobrir os afetos que podem mudar sua vida) e vai mostrar a estrada, o percur-so. Tudo acontece no percurso, nada está ou esteve nas paradas. WalterSalles, o autor e diretor, diz: “é um filme de estrada, que é matéria viva, prontaa renovar-se e à remodelar-se, em função das surpresas que encontramos eda inventividade de todos os que colaboraram em sua realização”.

Destaco: matéria viva/ pronta a renovar-se/ pronta à remodelar-se/ emfunção das surpresas/ em função da inventividade...

O adulto do filme vai se ressensibilizando, descobrindo a alteridade epresentificando uma mudança afetiva que o atravessa em todos os sentidos.Ali a figura da criança é a da iniciativa de ação, coragem exploratória, desejode expedição.

Tomada a iniciativa, empreendida a expedição, começa uma nova liber-dade. Liberdade não, como vimos, a propriedade, a pureza de alma, a obedi-ência e temor a Deus ou ao poder. Liberdade como um poder pegar a estrada,empreender a vida: viagem das crianças.

Pediatría, puericultura, pedagogía...: imágenes del niño y el devenir-niño

Resumen: El presente documento registra el planteamiento revisado de laconferencia realizada por el autor en un Seminario Nacional: Imágenes del niño – lainfancia en las artes. El abordaje elegido fue la descripción de una historia de laniñez, capturando demarcaciones a la pediatría, puericultura y pedagogía, áreas deconocimiento específico o originario de la infancia. Se problematiza las imágenesdel niño como representaciones que proponen reapresentaciones del mundo(modelización del mundo) y se desafia a pensar el mundo como indefinido, abierto alas producciones, donde el niño no tenga una imagen representada, pero una pers-pectiva visible de los devenires inventivos, criativos, curiosos, activos delante delmundo (invención de mundos). En lugar da imagen como representaciones yfixaciones del mundo, la imagen como potencia de realidades, abierta a lasproducciones, invenciones de mundos.

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Palabras Clave: Niño; Devenir; Infancia; Subjetividade; Pediatría; Puericultu-ra; Pedagogía; Salud colectiva.

Pediatrics, child care, pedagogy...: the child’s images and the becoming-a-child

Abstract: The present document registers the revised approach of theconference held by the author in a National Seminar: the Child’s Images - thechildhood in the arts. The approach chosen was to describe a history of thechildhood, capturing demarcations to the pediatrics, child care and pedagogy, areasof specific knowledge or originating from the childhood. There is a problematizationof the child’s images as representations that propose re-showing the world (modelingthe world) and there is a challenge to think the world as indefinite, open to theproductions, where the child does not have a represented image, but a visibleperspective of the inventive, creative, curious, active transformations before the world(invention of worlds). Instead of an image as representation and fixation of the world,an image as potency of realities, open to the productions, invention of worlds.

Key-words: Child; Transformations; Childhood; Subjectivity; Pediatrics; Childcare; Pedagogy; Collective health.

Referências

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6 Obra que não foi consultada para este texto, mas é listada devido a sua indicação quando mereferi à introdução de um novo pensamento sobre a infância e relações maternas e familiares.

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Pediatria, puericultura, pedagogia...: imagens da criança e o devir-criança

Bol. da Saúde, v. 15, n. 1, 2001 v 103

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Texto assinado em 20/06/1998; contém a revisão empreendida para apublicação atual, embora sem atualizações que lhe retirassem o caráter data-do de elaboração.

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Memória e HistóriaMemória e HistóriaMemória e HistóriaMemória e HistóriaMemória e História

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Atenção montadora página 106 é branca

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A singularidade da melhoria habitacional para o controle da doença de Chagas na região ...

Bol. da Saúde, v. 15, n. 1, 2001 v 107

A singularidade da melhoria habitacionalpara o controle da doença de Chagas naregião noroeste do Rio Grande do Sul

Cleonara Bedin1

Tânia M. Stasiak Wilhelms2

Maria Amélia Torres1

Paulo R. da Silva Abbad3

Kátia Jobim Lippold3

Luís Alberto Senff3

Paulo R. Sackis4

Resumo: A promoção da melhoria das habitações onde se verifica ofavorecimento da colonização de vetores da doença de Chagas apresenta-se comosingularidade na região noroeste do estado do Rio Grande do Sul/Brasil. A necessi-dade de melhorar as habitações se configura como melhoria das condiçõesperidomiciliares e como interferência nos hábitos econômico-culturais de utilizaçãodos espaços de moradia rural. O Governo do Estado do Rio Grande do Sul, por meioda Secretaria da Saúde, em parceria com a Fundação Nacional de Saúde, vem tra-balhando na implantação do Programa de Melhoria Habitacional para o Controle dadoença de Chagas na região noroeste do estado, cujo objetivo é tornar as unidadeshabitacionais refratárias ao Triatoma infestans (barbeiro), transmissor da doença deChagas. Observou-se que o Programa desencadeou um processo que envolveucapacitações, inquérito domiciliar, ajuste de propostas municipais, oficinaseducativas, reorganizações administrativas e técnicas e a integração dos gestoresdo Sistema Único de Saúde. Os investimentos públicos nesta área de melhoriahabitacional têm-se tornado uma motivação para a população dos municípios emrealizar a vigilância do vetor, bem como refletir em questões de qualidade de vidaambiental como uma demanda dos agricultores.

Palavra-Chave: Doença de Chagas; Melhoria habitacional; Triatoma infestans;Saneamento domiciliar; Vigilância à saúde; Vigilância ambiental.

1 Técnico da Coordenação da Política de Controle de Zoonoses e Vetores da SES/RS. e-mail:[email protected] Secção de Aquitetura e Engenharia-SES/RS. e-mail: [email protected] Serviço de Engenharia e Saúde Pública-Funasa. e-mail: [email protected] 14ª Coordenadoria Regional de Saúde-SES/RS.

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Cleonara Bedin et al.

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Introdução: o conceito de habitação

Com um histórico de mais de 25 anos, o Programa de Controle da doen-ça de Chagas está em uma nova fase. Após sucessivos ciclos de tratamentoquímico e vigilância entomológica, verificou-se a persistência da infestaçãodo Triatoma infestans, principal transmissor da doença.

No estado do Rio Grande do Sul, extremo sul do Brasil, a dificuldade deeliminação do vetor é atribuída às condições sócio-culturais dos moradores eaos hábitos e costumes na forma de armazenamento de madeira eimplementos agrícolas, bem como à manutenção de anexos às áreas domici-liares construídas.

No Programa de Melhoria Habitacional para o Controle da Doença deChagas, implementado numa parceria entre a Secretaria de Estado da Saúde(SES/RS) e a Fundação Nacional de Saúde (Funasa), se entende que o con-ceito de habitação vai além dos aspectos de área construída para moradia ede infra-estrutura básica de saneamento. O meio ambiente externo à constru-ção e os seus habitantes influem sobremaneira nas condições de manuten-ção da infestação. O conceito de habitação integra o ambiente que se relaci-ona com a moradia, incluindo-se na melhoria habitacional os anexosperidomiciliares, como os galinheiros, paióis, forno, cerca, chiqueiros e ou-tros, onde cada casa é um caso.

O Programa aqui relatado está sendo dirigido às áreas de risco compersistência de infestação nos últimos 5 anos. As 11 (onze) cidades envolvi-das inicialmente foram Alegria, Ajuricaba, Campina das Missões, CândidoGodói, Catuípe, Doutor Mauricio Cardoso, Horizontina, Independência, Re-dentora, Santo Cristo e Três de Maio.

Nestas cidades, as localidades de risco estão nas zonas rurais. A eco-nomia rural é caracterizada pela pequena propriedade, onde encontra-se re-sidências com vários anexos. Essas cidades foram colonizadas principalmen-te por imigrantes italianos e alemães, mantendo costumes e hábitos caracte-rísticos de suas origens, adaptados à realidade da região sul do Brasil.

A característica da infestação do vetor na região noroeste do Rio Gran-de do Sul é única em todo o Brasil, o Triatoma infestans se aloja nos ambien-tes peridomiciliares e nas casas, estando associado às condições físicas quepossibilitam a colonização dos triatomíneos e dificultam a borrifação de inse-ticida, favorecendo a reinfestação e a persistência do transmissor da doençade Chagas. Na região noroeste do Rio Grande do Sul, a persistência do vetornão esta relacionada com as frestas, tão comuns nas habitações de barro ousopé de outras regiões endêmicas no Brasil, mas com as condiçõesperidomiciliares e os hábitos de moradia na economia rural desta região.

O programa de melhorias habitacionais está sendo desenvolvido de for-ma integrada com o Programa de Educação em Saúde e Mobilização Social,obedecendo normativa da Funasa, que estabelece esta integração como cri-tério técnico para o investimento financeiro em saneamento. O processo

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A singularidade da melhoria habitacional para o controle da doença de Chagas na região ...

Bol. da Saúde, v. 15, n. 1, 2001 v 109

educativo permanece ao longo do desenvolvimento das ações do Programa esegue após a conclusão das obras físicas, em caráter de avaliação.

As ações estão em fase de análise e orientação técnica e estão sendopropostas interferências nas restaurações, reconstruções e no projetoeducativo municipal.

O recurso para a execução dos convênios vai sendo disponibilizado acada município, com acompanhamento e avaliação permanentes. Após afase de prestação de contas dos convênios entre os municípios e a Funasa,juntamente com a SES/RS, será feita a avaliação do Programa de MelhoriaHabitacional para o Controle da Doença de Chagas na Região Noroeste doRio Grande do Sul.

Os investimentos e a interferência no saneamento da residência e doperidomicilio para interromper a transmissão da doença desencadeiam, pormeio de um processo educativo, a apropriação, pelas pessoas envolvidas,das questões implícitas na melhoria habitacional, onde o saneamento estadirecionado à promoção da participação social e da qualidade de vida am-biental.

Desenvolvimento do Programa de Melhoria Habitacional e ocontrole da doença de Chagas

O Programa de Melhoria Habitacional para o Controle da Doença deChagas está sendo desenvolvido em municípios da região noroeste do esta-do do Rio Grande do Sul, envolvendo a parceria e a participação da Coorde-nação Regional da Fundação Nacional de Saúde (Funasa), da SecretariaEstadual da Saúde, por meio das Coordenadorias Regionais de Saúde (CRS-SES/RS), Associação Sulina de Crédito e Assistência Rural da AssociaçãoRiograndense de Empreendimentos de Assistência Técnica em ExtensãoRural (Ascar/Emater) e dos municípios.

O Programa fundamenta-se em critérios epidemiológicos e segue asorientações técnicas dos convênios de cooperação técnico-financeira com aFunasa na escolha de municípios e moradores beneficiados. O processoconvenial consta de projeto de engenharia, projeto educativo, acompanha-mento técnico e avaliação contínua. A melhoria do ambiente domiciliar ruralenvolve a organização do espaço, restauração e reconstrução de casas, pai-óis, galinheiros, pocilgas, fornos etc..

O Programa de Melhoria Habitacional está inserido no Programa deControle da Doença de Chagas (PCDCh), que visa à eliminação do Triatomainfestans e conseqüente interrupção da transmissão vetorial da doença deChagas por Triatoma infestans. A descentralização das ações de atenção àsendemias para a gestão dos estados tornou premente a parceria dos gestoresdo SUS para a continuidade e a viabilização do referido Programa, permitindoque ambiente de moradia, ambiente cultural e ambiente sócio-econômico in-tegrem as moções de habitação, onde não basta a ação de saneamento am-

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Cleonara Bedin et al.

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biental para efetuar o controle da endemia de Chagas.No Rio Grande do Sul, a dificuldade de eliminação do vetor é atribuída

às condições culturais e sócio-economicas dos moradores. A persistência dainfestação na região noroeste é determinada pelos hábitos e costumes demanuseio do ambiente como, por exemplo, o armazenamento de madeira,utensílios e, principalmente, a manutenção de vários anexos (fotografia 1 e2). A região é caracterizada pela pequena propriedade, colonizada, predomi-nantemente, pela cultura da imigração italiana e alemã.

Fotografia 1: Vista geral de uma unidade residencial rural. Região noroeste do estado doRio Grande do Sul.

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A singularidade da melhoria habitacional para o controle da doença de Chagas na região ...

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O Programa de Melhoria Habitacional no Rio Grande do Sul, entenden-do que o conceito de habitação vai além dos aspectos da área construída damoradia e da infra-estrutura básica de saneamento e que integra o ambientecircundente que se relaciona com a moradia, como galinheiros, fornos, cer-cas, paióis, pocilgas e outros, configura o peridomicilio como habitação. Oshabitantes e o ambiente externo à construção principal da moradia determi-nam a manutenção da infestação deste vetor e de outros agravos que favore-cem o adoecimento da população agricultora. O Programa, então, dirigido àárea de risco com persistência da infestação nos últimos anos, dirigi-se àhabitação ampliada: domicilio, peridomicilio, hábitos culturais, participaçãosócio-econômica, organização da vida domiciliar.

A seguir, veremos as áreas delimitadas recentemente para a ação docontrole da doença de Chagas, pela persistência da infestação do Triatomainfestans no Rio Grande do Sul (Mapa 01).

Figura 2: Peridomicilio, Predomínio da madeira nas construções.

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Cleonara Bedin et al.

112 v Bol. da Saúde, v. 15, n. 1, 2001

Conclusão

Onze (11) cidades foram selecionadas como área de risco com resíduode infestação pelo Barbeiro, sendo incluídas para o Programa de MelhoriaHabitacional para o Controle da Doença de Chagas: Alegria, Ajuricaba, Cam-pina das Missões, Cândido Godói, Catuípe, Doutor Mauricio Cardoso,Horizontina, Independência, Redentora, Santo Cristo e Três de Maio. Todasjá foram ou estão sendo incluídas no programa de convênio Funasa-SES/RS-Município.

Foram realizadas reuniões de integração entre a Coordenação Regionalda Funasa, CRS-SES/RS e municípios com a participação de representantesda Ação-Emater/RS. Estes encontros foram de capacitação para o desenvol-vimento dos processos de montagem dos convênios de cooperação eassessoramento técnico e financeiro, preparação para as visitas técnicas e oinquérito domiciliar, bem como o desenvolvimento dos projetos de engenhariae ação educacional.

Com este Programa estão sendo beneficiadas 514 famílias com proje-tos que envolvem obras de reforma em casas e anexos ou a construção denovas casas e/ou novos anexos.

Os municípios foram assessorados e os projetos analisados e revisadosno sentido de integrar o objetivo das reformas, restaurações e construçõescom a finalidade de controle do vetor. Foram visitados todos os municípios,

Mapa 01: Áreas de risco com resíduos de infestação porTriatoma infestans, 2001, RS.

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Bol. da Saúde, v. 15, n. 1, 2001 v 113

com visitas casa-a-casa, realizando-se adequações dos projetos de enge-nharia e educacionais, envolvendo o quadro técnico-administrativo da Prefei-tura com a população beneficiada, com o apoio das CRS-SES/RS e Ascar-Emater/RS. Promoveu-se oficinas de educação com dinâmicas de gruposque objetivaram à conscientização da importância do projeto para todo omunicípio e aos cuidados necessários para o desenvolvimento do processoeducativo. Ressaltou-se a importância de atrelar a vigilância entomológica dovetor de Chagas, executada pela a CRS-SES/RS, à execução das obras deengenharia.

Dando continuidade ao Programa de Melhoria Habitacional no Rio Gran-de do Sul, estado prioritário no país na luta pela eliminação do Triatomainfestans, está sendo indicada a listagem de municípios prioritários pelainfestação persistente por este vetor para destinação de novos recursos doreferido Programa. Esta indicação, como a que a precedeu, está respaldadaem estudos e reuniões da equipe técnica de vigilância entomológica da SES/RS, Funasa/RS e Comitê e Gerência Nacional do Programa de Controle daDoença de Chagas.

Entende-se que o saneamento e a melhoria habitacional previnem vá-rios agravos de saúde, não somente o controle da doença de Chagas. Cons-tata-se que o mais importante no Programa é o processo educativo desen-cadeado pelos investimentos públicos, principalmente nas discussões sobrea qualidade de vida do agricultor.

No desenvolver do programa, verificaram-se necessidades de melhoriana organização da estrutura administrativa municipal para atender à deman-da, assim como a geração de trabalho e circulação de recursos financeiroslocais e a motivação das instâncias de participação popular, como os Conse-lhos de Saúde e Agropecuário. O Programa de Melhoria Habitacional seráavaliado, quanto aos objetivos, no decorrer da sua execução, sob acompa-nhamento continuo das obras e da vigilância entomológica pela Funasa eSES/RS.

La singularidad de la mejoría habitacional para el control de laenfermedad de Chagas en la región noroeste del Rio Grande do Sul

Resumen: La promoción de la mejoría de las habitaciones donde se verifica elfavorecimiento de la colonización de vectores de la enfermedad de Chagas sepresenta como singularidad en la región noroeste del estado del Rio Grande do Sul/Brasil. La necesidade de mejorar las habitaciones se configura como mejoría de lascondiciones peridomiciliares y como interferencia en los hábitos econômicos yculturales de utilización de los espacios de habitación rural. El Gobierno del Estadodel Rio Grande do Sul, a través de la Secretaria da Saúde, en mancomunidad con laFunasa (Fundação Nacional de Saúde), está trabajando en la implantación del Pro-grama de Mejoría Habitacional para el Control de la Enfermedad de Chagas en laregión noroeste del estado, cuyo objetivo es convertir las unidades habitacionales

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Cleonara Bedin et al.

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refratarias al Triatoma infestans (barbeiro), transmisor de la enfermedad de Chagas.Se observó que el Programa desencadenó un proceso que envolucrócapacitaciones, averiguación domiciliar, ajuste de propuestas municipales, tallereseducativos, reorganizaciones administrativas y técnicas y la integración de losgestores del Sistema Único de Saúde. Las inversiones públicas en este área demejoría habitacional se han vuelto en una motivación para la población de losmunicipios en realizar la vigilancia del vector, así como reflejar sobre cuestiones decalidad de vida ambiental como una demanda de los agricultores.

Palabra Clave: Enfermedad de Chagas; Mejoría habitacional; Triatomainfestans; Saneamiento domiciliar; Vigilancia a la salud; Vigilancia ambiental.

The singularity of housing improvement for the control of the Chagas’disease in the northwest area of Rio Grande do Sul

Abstract: The promotion of the improvement of the houses where the favoringof the colonization of vectors of the Chagas’ disease is verified as a singularity in thenorthwest area of the state of Rio Grande do Sul/Brazil. The need to improve thehouses is configured as an improvement of the conditions around the home and asan interference in the economical-cultural habits of use of the spaces in rural homes.The Government of the State of Rio Grande do Sul, through the Secretaria da Saúde,in partnership with the Fundação Nacional de Saúde has been working in theimplantation of the Program of Home Improvement for the Control of the Chagas’disease in the northwest area of the state, whose objective is to ban the from thehome units the Triatoma infestans (reduviid bug), transmitter of the Chagas’ disease.It was observed that the Program started a process that involved training, homeinquiry, adjustment of municipal proposals, educational workshops, administrativeand technical reorganizations and the integration of the managers of the SistemaÚnico de Saúde. The public investments in this area of home improvement havebecome a motivation for the population of the municipal districts in accomplishing thesurveillance of the vector, as well as reflecting on matters of environmental quality oflife as a demand of the farmers.

Key-words: Chagas’ disease; Home improvement; Triatoma infestans; Homesanitation; Surveillance to health; Environmental surveillance.

Referencias

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A singularidade da melhoria habitacional para o controle da doença de Chagas na região ...

Bol. da Saúde, v. 15, n. 1, 2001 v 115

FUNDAÇÃO NACIONAL DE SAÚDE. Orientações para a elaboração do programade educação em saúde e mobilização social como parte de projetos. Brasília,2000.FUNDAÇÃO NACIONAL DE SAÚDE. Modelos utilizados nas ações de melhoriassanitárias domiciliares : manual de instruções. Brasília, 1998.

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A arquitetura e os estabelecimentos de saúde: algumas considerações

Bol. da Saúde, v. 15, n. 1, 2001 v 117

A arquitetura e os estabelecimentos desaúde: algumas considerações

Ednezer Rodrigues Flores1

Resumo: Esta carta aos editores do Boletim da Saúde traz um brevíssimorelato sobre os projetos arquitetônicos das construções ou projetos da equipe técni-ca do Serviço de Arquitetura e Engenharia da Secretaria da Saúde – SES/RS, apartir do ano de 2000. O destaque do relato é a apresentação do projeto deedificação do Centro de Informação e Documentação em Saúde da Escola de SaúdePública (Ceids-ESP/RS) e algumas das várias implicações que devem ser conside-radas na arquitetura de prédios de uso na área de saúde.

Palavras-Chave: Arquitetura; Secretaria da Saúde; Escola de Saúde Pública;Biblioteca; Memória institucional; Estabelecimentos de saúde.

Atuo na Secretaria da Saúde do Estado do Rio Grande do Sul e, ao fazereste relato2, permito-me citar o trabalho que desenvolvo juntamente com asequipes da Escola de Saúde Pública/RS– ESP/RS e da Seção de Arquiteturae Engenharia – SAE-SES/RS na montagem do projeto arquitetônico do Cen-tro de Informação e Documentação em Saúde – Ceids-ESP/RS, empreendi-mento esse que visa à implantação de um setor de referência em informação,pesquisa e apoio técnico e documental às ações da Educação em SaúdeColetiva que são desenvolvidas em nosso estado. Não quero relatar ou discu-tir a ciência da arquitetura em si mesma, mas pautar sobre este conhecimen-to vinculado à ciência da saúde e a grande interface que existe entre ambasno processo de criação e apoio à estruturação de uma rede física de estabe-lecimentos, que contribua à implantação de um Sistema Único de Saúde jus-to, igualitário, planejado e eficiente na sua finalidade de acolher e cuidar comintegralidade.

Iniciamos em 2000 um processo de discussão sobre o Projeto Ceids,onde se visualizasse no complexo físico da ESP/RS a implantação de umaedificação que propiciasse o uso de áreas como biblioteca, auditório, área de

1 Arquiteto, consultor e administrador hospitalar, especialista em arquitetura de estabeleci-mento de saúde, especialista em administração hospitalar. e-mail: [email protected] O autor cumprimenta os precursores desta iniciativa de resgatar um instrumento histórico dasaúde pública do estado do Rio Grande do Sul, que é o Boletim da Saúde, bem como agradecee compartilha a honra de contribuir com esta ferramenta, relatando experiências vividas naárea em que atua, que é a da Arquitetura para Estabelecimentos de Saúde.

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Ednezer Rodrigues Flores

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acervos históricos e técnicos sobre saúde pública, por parte da sociedade emgeral e, especificamente, por trabalhadores e pesquisadores em saúde.Como todo processo moroso de discussão, não se conseguiu concluir emcurto espaço de tempo este trabalho, mas estamos hoje com um projetodefinido. Suas exigências e necessidades são significativas, já que se quer omáximo possível de qualidade nos serviços oferecidos.

No decorrer de 2001, além das diversas ações desenvolvidas em para-lelo a esse empreendimento, outras vieram e todas com o mesmo grau deurgência, sempre em prol de oferecer suporte às ações em saúde. As ne-cessidades iniciais previstas para o projeto sofreram readaptações, que pas-saram por uma avaliação de todo o complexo arquitetônico da ESP/RS, daadequação de seus espaços administrativos, de integração (atual biblioteca)e de ensino (salas de aula), resultando nas reformas que ocorrem no prédioexistente. Questionadas num primeiro momento, as readaptações resultaramnum projeto integrador, referencial e produtivo, colocando em prática ideaistécnicos, científicos e sociais que possibilitarão um avanço na melhoria doatendimento em saúde pública.

Na recuperação da ESP/RS e projeção do Ceids, estavam em foco oresgate patrimonial da estrutura física existente; o mapeamento de acolhi-mento dos estabelecimentos que atendem pelo Sistema Único de Saúde,entre eles a ESP/RS; a identificação real das referências de atendimento,entre elas o acesso à busca e ao uso da informação bibliográfica e documen-tal; a correta interpretação legal para a reestruturação de projetosarquitetônicos e das responsabilidades técnicas das instituições em prol deresultados práticos para o usuário do SUS e para a capacitação dos profissio-nais e trabalhadores, diretos ou indiretos, da área de saúde; a aceitação prá-tica de novas propostas arquitetônicas para novos acolhimentos em saúde ea própria invenção de alternativas para a concretização de respostas estataisàs demandas públicas, com qualidade tecnológica, financeira, social, políticae intersetorial. Uma Escola de Saúde Pública e um Centro de Informação eDocumentação pertencentes ao SUS precisam corresponder às diretrizesnormativas dos campos da saúde, da educação e da documentação, mas,como serviços públicos, também às diretrizes das políticas de educação, saú-de e cultura. No caso específico da inserção no SUS, precisam validar-se noconjunto de diretrizes e princípios de sua legislação orgânica específica.

Neste universo do muito o que fazer, iniciamos um projeto básico dearquitetura para o Ceids que está sendo concluido e gostaríamos de dar con-tinuidade para a concretização de mais este sonho, que na realidade projetoua ponta de um iceberg a ser mais trabalhado, mais moldado, mais polido. Hámuito o que abordar sobre edificações voltadas ao abrigo de atividades desaúde, no que tange a sua identificação arquitetônica, sua volumetria, a rela-ção espacial com seus entornos arquitetônicos, seus fluxos internos e exter-nos, sua organização funcional na rede física do setor e seus aspectosreferenciais físico-funcionais, a relação dos equipamentos arquitetônicos a

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A arquitetura e os estabelecimentos de saúde: algumas considerações

Bol. da Saúde, v. 15, n. 1, 2001 v 119

serem incluídos em prédios existentes e a formalização técnica de equipesmultidisciplinares para atuar em ações de assessoria às atividades de arqui-tetura e engenharia na implantação dos estabelecimentos do SUS.

Quero emitir os parabéns a todos nós pelo lançamento do Boletim daSaúde, que saberemos usufruir desta ferramenta na construção esolidificação de um Sistema que, apesar das inúmeras dificuldades e bata-lhas que se apresentam, espero poder continuar contribuindo para que me-lhore.

La arquitectura y los establecimientos de salud: algunas consideraciones

Resumen: Esta carta a los editores del Boletim da Saúde trae un brevísimorelato sobre los proyectos arquitetónicos de las construcciones o proyectos del equi-po técnico del Servicio de Arquitectura e Ingeniería/SES-RS, a partir del año de2000. El destaque del relato es la presentación del proyecto de edificaciones delCentro de Informação e Documentação em Saúde, de la Escola de Saúde Pública(Ceids-ESP/RS), y algunas de las varias implicaciones que deben ser consideradasen la arquitectura de edificios de uso en el área de salud.

Palabras Clave: Secretaria da Saúde; Arquitectura; Escola de Saúde Pública;Biblioteca; Memoria institucional; Establecimientos de salud.

Architecture and health institutions: some considerations

Abstract: This letter to the editors of the Boletim da Saúde presents a veryshort report on the architectural projects of the constructions or projects of thetechnical team of the Service of Architecture and Engineering of the Secretaria daSaúde – SES-RS, from the year 2000 on. The highlight of the report is thepresentation of the project of construction of the Cenro de Informação e Documenta-ção em Saúde of the Escola de Saúde Pública (Ceids-ESP/RS) and some of theseveral implications that should be considered in the architecture of buildings in usein the area of health.

Key-words: Architecture; Secretaria da Saúde do Rio Grande do Sul; Escolade Saúde Pública/RS; Library; Institutional memory; Institutions of Health.

Referências

BRASIL. Agência Nacional de Vigilância Sanitária. Resolução RDC no 50, de 21 feve-reiro de 2002. Dispõe sobre o regulamento técnico para planejamento, programação,elaboração e avaliação de projetos físicos de estabelecimentos assistenciais de saú-de. Diário Oficial [da] República Federativa do Brasil , Brasília, DF, 20 mar. 2002. n.54, Seção 1.

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Ednezer Rodrigues Flores

120 v Bol. da Saúde, v. 15, n. 1, 2001

BRASIL. Ministério da Saúde. Portaria nº 025/ 96. Dispõe sobre os documentos ne-cessários para instruir as proposições que contemplem obras e serviços de arquitetu-ra e engenharia ou aquisição de equipamentos para EAS e dá outras providências.BRASIL. Lei nº 5194, de 24 de dezembro 1966 . Regula o exercício das profissões deengenheiro, arquiteto e engenheiro-agrônomo, e dá outras providências. Diário Ofici-al [da] República Federativa do Brasil , Brasília, DF, 27 dez. 1966. p. 14.892.DINSMORE, P. C. Gerência de programas e projetos. São Paulo: Pini, 1992.175 p.RIO GRANDE DO SUL. Decreto nº 23.430, de 24 de outubro de 1974. Aprova regula-mento que dispõe sobre a promoção, proteção e recuperação de saúde pública. Cole-tânea de leis e decretos estaduais , Porto Alegre, p. 408, 1974.RIO GRANDE DO SUL. Lei Estadual no 6.503, de 22 de dezembro de 1972. Dispõesobre a promoção, proteção e recuperação da saúde pública. Diário Oficial [do] Es-tado , Porto Alegre, 29 dez. 1972. n. 138, p. 2.

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Instituto de Pesquisas Biológicas: memória institucional e trabalho de pesquisa histórica

Bol. da Saúde, v. 15, n. 1, 2001 v 121

Instituto de Pesquisas Biológicas:memória institucional e trabalho depesquisa histórica

Márcia Aiub de Mello1

Resumo: Neste artigo, descrevemos o histórico do Instituto de Pesquisas Bio-lógicas – IPB/Lacen, atualmente incorporado pelo Laboratório Central – Lacen, den-tro da estrutura da Fundação Estadual de Pesquisa e Produção em Saúde – Fepps,partindo da documentação disponível na instituição e narrando todos os processosrealizados para a mudança de prédio pela qual o instituto passou, quando buscou-se recuperar e preservar sua memória e história. A sensibilização realizada junto aosfuncionários e os procedimentos metodológicos utilizados para dar o tratamento ade-quado à documentação, que seria acondicionada e transportada na mudança deprédio para as novas e atuais instalações, são abordados para evidenciar o cuidadocom a memória institucional e com a oportunidade de pesquisa histórica.

Palavras-Chave: Memória institucional; Instituto de Pesquisas Biológicas; Se-cretaria da Saúde – RS; História da saúde pública; Instituições de Saúde.

Introdução

O Instituto de Pesquisas Biológicas desempenha suas funções desde10 de agosto de 1902, tendo sido instituído pelo decreto estadual nº 519, quecriou o laboratório de análises do Estado2. A partir de 1926 começou a atuarcomo um Laboratório de Saúde Pública, com suas respectivas seções. Esta-va ligado administrativamente ao Departamento Estadual de Higiene e SaúdePública – DEHSP e localizava-se na Praça da Matriz, nº 26, no centro dePorto Alegre. Este primeiro prédio de sua trajetória histórica situava-se nasimediações do palácio do governo estadual e Catedral Metropolitana.

Com a reorganização dos serviços de saúde, efetivada em 1938, pela

1 Historiadora e especialista em história contemporânea, e-mail: [email protected] A essa repartição competia a fiscalização dos gêneros alimentícios, bebidas e medicamen-tos. A força de trabalho do laboratório compunha-se de 1 diretor, 1 ajudante, 4 fiscais e 1servente.

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Márcia Aiub de Mello

122 v Bol. da Saúde, v. 15, n. 1, 2001

então denominada Secretaria de Estado dos Negócios da Educação e Saúde,os serviços de higiene e saúde pública do Estado passam para a incumbên-cia do Departamento Estadual de Saúde – DES, criado para esse fim3.

As autoridades sanitárias da época reconheceram a importância que oLaboratório de Saúde Pública do Estado estava obtendo no contexto sanitá-rio, principalmente em relação à pesquisa diagnóstica das doençastransmissíveis e endêmicas. Em relação ao crescimento dos serviços do la-boratório, as autoridades observaram também a necessidade da ampliaçãode seu espaço físico e instalações.

Sua transformação em um Instituto de Pesquisas Biológicas, com insta-lações de tecnologia de ponta, adequada e atualizada segundo os moldesdos modernos institutos da época, tornava-se urgente e necessária. Essedesejo era almejado por todos os trabalhadores do Laboratório e por ummentor intelectual incansável, Jandyr Maya Faillace, como se pode provarpela documentação histórica existente sobre este acontecimento no próprioIPB, atualmente incorporado pelo Laboratório Central (Lacen).

Essa aspiração tornou-se, em parte, realidade com a promulgação daLei nº 314, de 6 de outubro de 1948, que criou o Instituto de Pesquisas Bioló-gicas - IPB, artigo 193, inciso III da Constituição do Estado do Rio Grande doSul, promulgada pelo então governador do Estado, Walter Jobim.

Foi na gestão de Jandyr Maya Faillace como diretor do DES que se con-cretizou a criação institucional e física do IPB. Foi efetivada a compra deterreno próprio para instalar o Instituto. A inauguração das novas instalaçõesocorreu em 30 de setembro de1960. Jandyr Maya Faillace ocuparia a direçãodo IPB posteriormente, bem como Newton Neves da Silva, seu colega noDES, que se destacará na implantação do segundo prédio da história do Ins-tituto e no desenvolvimento de seu novo perfil tecnológico.

O IPB hoje é o suporte laboratorial das ações da Vigilância em Saúde,estando organizado na forma de rede de laboratórios de saúde pública, com 4divisões operacionais, realizando análises e diagnósticos em Vigilância Sani-tária, Epidemiológica e Ambiental. Realiza o diagnóstico das doenças de no-tificação compulsória (Dengue, Meningite, Hepatite, HIV e Leptospirose, en-tre outras) e realiza Análise de Produtos (alimentos, medicamentos,saneantes, embalagens para alimentos etc.). Atualmente, o IPB integra aFundação Estadual de Pesquisa e Produção em Saúde – Fepps, criada emdezembro de 1994, absorvendo diversos órgãos estaduais de apoio ao Siste-ma Estadual de Saúde. O IPB passou a integrar o Laboratório Central e arede de laboratórios de saúde pública.

3 O Instituto de Pesquisas Biológicas – IPB, após está modificação, ficou representado comoLaboratório de Saúde Pública, contando com as seções de microbiologia, que disponibilizavaos serviços de diagnóstico e pesquisa; de anatomia patológica e de soros e vacinas; de quími-ca, que disponibilizava os serviços de química analítica, controle de águas e esgotos; controlee avaliação de leite e laticínios; bromatologia geral.

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Instituto de Pesquisas Biológicas: memória institucional e trabalho de pesquisa histórica

Bol. da Saúde, v. 15, n. 1, 2001 v 123

No dia 26 de abril de 2002, foi inaugurado o prédio que abriga o Labo-ratório Central do Estado (IPB/Lacen). Este é o terceiro prédio que a institui-ção habita em sua trajetória histórica.

O IPB/Lacen instalou-se com suas atuais divisões (Divisão de Análisede Produtos - DAP, Divisão de Biologia Médica - DBM, Divisão de Laboratóri-os de Saúde Pública – DILASP e Divisão de Apoio Operacional – DAO) quedão suporte técnico laboratorial às ações de Vigilância em Saúde, em umaárea física de 3.740 m², construída segundo as normas de segurançaexigidas para um Laboratório de Referência e segundo os requisitos deBiosegurança inerentes a uma área de laboratório.

Memória institucional e pesquisa histórica

Ao buscar a recuperação e preservação da memória institucional do IPB,buscamos a história da saúde pública no Estado do Rio Grande do Sul. Odiagnóstico laboratorial, a anatomia patológica, a produção de soros e vaci-nas, a química analítica, entre outras ações de saúde, em uma trajetória inici-ada em 1926, descrevem, em seu recorte histórico, prioridades, métodos epolíticas na saúde pública gaúcha.

Segundo o historiador Ulpiano Bezerra de Menezes, a orientação e aeficácia do trabalho com o patrimônio cultural dependem visceralmente denosso projeto de sociedade, isto é, do tipo de relação que desejamos instau-rar entre os homens.

O patrimônio cultural não se resume a uma listagem de objetos selecio-nados por técnicos competentes, mas se define como complexo fenôme-no social. Segundo o autor, é indispensável defrontar-se com o problemado valor e dos sistemas de valor que toda sociedade formula, segundoseus diversos segmentos, afirmando ainda que, obviamente, as repre-sentações sociais e respectivos “patrimônios culturais” não poderão serabstratamente apresentados, mas deverão ter lugares sociais definidos(Menezes, 1992).

Para desenvolver o projeto de resgate da memória e da história do IPB/Lacen, tornou-se necessária uma série de procedimentos técnicos, como in-vestigar, reconhecer, inventariar, higienizar, separar, acondicionar e arquivaros diferentes documentos de memória encontrados. Exemplo: correspondên-cias técnicas, telegramas, relatórios, plantas baixas, projetos arquitetônicos,fotos, teses de mestrado e doutorado, trabalhos científicos, artigos de jornais,artigos de funcionários, projetos de pesquisa, currículo de ex-diretores, im-presso do regulamento do DES, fôlderes, impressos diversos sobre as Se-manas do IPB, etc.

Documentos em diversos tipos de suporte, como metal, madeira, vidro eoutros; equipamentos e utensílios utilizados no trabalho diário pelos funcioná-rios da instituição; peças que necessitaram ser inventariadas, higienizadas e

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Márcia Aiub de Mello

124 v Bol. da Saúde, v. 15, n. 1, 2001

acondicionadas em locais apropriados, passando a fazer parte da reservatécnica irão compor a informação museológica, que encontra-se em fase deconstituição.

Pretendemos, por meio de relatos dos trabalhadores do IPB(metodologia da história oral), construir e reconstruir uma identidade cultural,uma significação do trabalho coletivo desenvolvido ao longo da sua trajetóriahistórico-institucional e, com esse trabalho, dar um significado de pertença àspessoas e profissionais envolvidos com o IPB/Lacen de maneira geral. Pormeio dos relatos, é possível perceber a identidade cultural, o referencial ou asignificação que liga os trabalhadores à instituição a que pertenceram (IPB)ou que ainda pertencem (IPB/Lacen).

Informação, documentação, memória e história: pesquisa, preser-vação e conhecimento

O trabalho de pesquisa começou a ser desenvolvido no IPB/Lacen esurgiu um novo desafio: a mudança de prédio que a instituição iria sofrer.Esse fato ocorreu entre outubro de 2001 e junho de 2002, quando a mudançafoi sendo efetuada por etapas, isto é, segundo um cronograma elaborado poruma comissão para esse acontecimento. Cada seção teria um dia e o mêscorrespondente para a sua mudança. O IPB/LACEN passaria ao seu terceiroe atual prédio e instalações.

Uma Comissão de Pesquisa Histórica passou a dar orientações referen-tes ao tratamento adequado a ser dado para a documentação existente nainstituição durante a mudança de prédio e desenvolveu uma série de procedi-mentos a serem utilizados pelos funcionários. Para isso, foi feita umasensibilização com as chefias de seções e demais funcionários.

Na sensibilização, foi apresentado por uma historiadora e uma bibliote-cária da Escola de Saúde Pública/RS o projeto de resgate e preservação damemória institucional da saúde pública estadual, desencadeado, a partir de1999, na criação do Centro de Informação e Documentação em Saúde(Ceids-ESP/RS). Deste projeto participam várias instituições, principalmenteo Hospital Psiquiátrico São Pedro, o Hospital Sanatório Partenon, o HospitalColônia Itapuã, o Centro de Saúde-Escola Murialdo, a Escola de Saúde Públi-ca e o Instituto de Pesquisas Biológicas. A bibliotecária do IPB/Lacen apre-sentou as providências a serem tomadas referentes à biblioteca e a historia-dora responsável pelo trabalho de pesquisa histórica no IPB/Lacen apresen-tou os procedimentos práticos a serem adotados em relação à documentaçãoexistente na instituição.

A Comissão de Pesquisa Histórica efetuou a distribuição de algumastarefas e a explicação sobre alguns procedimentos a serem utilizados duran-te o processo de mudança, como o uso de uma etiqueta padronizada para ascaixas-arquivo. A etiqueta contém na sua descrição: a origem dos documen-tos, divisão de origem, seção de origem, nome do responsável da seção de

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Instituto de Pesquisas Biológicas: memória institucional e trabalho de pesquisa histórica

Bol. da Saúde, v. 15, n. 1, 2001 v 125

origem, telefone, data, quantidade, observações e tipo de conteúdo: papel,vidro, metal, madeira, outros.

A padronização desses procedimentos foi uma preocupação relevante,por isso foi distribuído um material escrito explicando as orientações geraisem relação aos diferentes tipos de documentos (papéis, fotos, utensílios me-tálicos, microscópios, vidraria), bem como o seu acondicionamento e trans-porte, visando à conservação e à preservação desses. Foi distribuído um pe-queno texto com a definição de alguns conceitos históricos para a melhorcompreensão do trabalho histórico-documental entre os trabalhadores, quena sua maioria são oriundos das ciências naturais.

Com a mudança de prédio e o envio da documentação pelas seções deorigem à Comissão de Pesquisa Histórica, está sendo constituído um arquivointermediário, onde a documentação ficará por um tempo determinado pelalegislação arquivística, segundo sua função. Posteriormente, essa documen-tação será analisada por uma equipe de profissionais designados para essefim, quando passará por uma seleção, segundo critérios técnicos, e depoisserá arquivada segundo normas da arquivologia.

A Comissão de Pesquisa Histórica desenvolveu, também, o trabalho dehistória oral, obtendo relatos de funcionários, ex-funcionários e pessoas quetiveram relações significativas com a instituição. Nas entrevistas de históriaoral, foram resgatadas as histórias de vida profissional dessas pessoas. Es-sas entrevistas foram gravadas e estão sendo transcritas e transformadasem documento escrito.

A história oral é uma linha metodológica que nos permite colocar umolhar sensível sobre o que os fatos revelam, ela nos ajuda a aprofundarverticalmente as significações, referências e identidades do passado e co-nhecer os sentidos da trajetória histórica.

Este trabalho de resgate da memória e da história do IPB/Lacen, umainstituição com 100 anos de história, que estamos tentando desenvolver, nãoé um trabalho fácil de se fazer e, muito menos, finito. Ele terá, sem dúvida,recortes temporais, que serão necessários fazer para fins metodológicos. Oprocesso histórico é, contudo, contínuo, como deve ser também o seu relatoe a preservação da sua documentação.

Neste informe tentamos ressaltar e exemplificar um pouco da relevân-cia deste trabalho. Futuramente, os documentos históricos que fazem partedo acervo serão disponibilizados aos usuários para consulta e pesquisa emgeral. Essa prática precisa estar na base das muitas instituições, pois sãoinúmeros os gestores que se queixam dos projetos e ações que se perdemno tempo e ficam apenas na memória de seus autores.

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Márcia Aiub de Mello

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Instituto de Pesquisas Biológicas: memoria institucional y trabajo deinvestigación histórica

Resumen: En este artículo describimos el histórico del Instituto de PesquisasBiológicas – IPB, actualmente incorporado por el Laboratório Central – Lacen.Partiendo de la documentación disponible en la institución y narrando todos losprocesos realizados para el traslado de edificio por lo cual el instituto ha pasado, enel que se buscó recuperar y preservar su memoria e historia. La sensibilizaciónrealizada junto a los funcionarios y los procedimientos metodológicos utilizados paradar el tratamiento adecuado a la documentación, que sería acondicionada y trans-portada en la mudanza de edificio para las nuevas y actuales instalaciones, sonplanteados para evidenciar el cuidado con la memoria institucional y con laoportunidad de investigación histórica.

Palabras Clave: Memoria institucional; Instituto de Pesquisas Biológicas; Se-cretaria da Saúde – RS; Historia de la salud pública; Instituciones de Salud.

Instituto de Pesquisas Biológicas: institutional memory and the work ofhistorical research

Abstract: In this article, it was intended to describe the history of IPB/Lacen, toexplain the reason for the creation of that public health institution and in which healthcontext it came up. For that purpose, a research was done, starting from documentsavailable in the institution. It was done a description of the processes realized in thechange that the institute went through, the sensitization of the staff and the way thatmethodological procedures were elaborated to give adequate treatment todocumentation that would be kept and transported.

Key Words: Institutional memory; Rio Grande do Sul; History of public health;Secretaria da Saúde; Institucions of Health.

Referências

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Instituto de Pesquisas Biológicas: memória institucional e trabalho de pesquisa histórica

Bol. da Saúde, v. 15, n. 1, 2001 v 127

MENEZES, Ulpiano T. Bezerra de. O Patrimônio cultural entre o público e o privado. In:SÃO PAULO. Departamento do Patrimônio Histórico. O direito à memória : patrimônioe cidadania. São Paulo,1992.PAES, Marilena Leite. Arquivo : teoria e prática. 3. ed. rev. ampl. Rio de Janeiro: Fun-dação Getúlio Vargas, 1997.RIO GRANDE DO SUL. Constituição Estadual (1948). Diário Oficial do Estado , Por-to Alegre, 7 out., 1948.SÃO PAULO. Secretaria de Estado da Cultura. Departamento de Museus e Arquivos.Manual de orientação museológica e museográfica. 2. ed. São Paulo, 1987.SCHEMES, Claudia; SAUTER, Cristina Silva. A Pesquisa histórica no caminhoinvestigativo da história oral. Revista de Estudos FEEVALE , Novo Hamburgo, v. 24,n. 2, p.171-175, dez. 2001.SIQUEIRA, Márcia Dalledone. Lacen/Laboratório Central do Paraná : mais de umséculo de história. Curitiba: Lacen/PR, 1996.

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Atenção montadora página 128 é branca

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A Residência Integrada em Saúde: Dermatologia Sanitária – uma experiência ...

Bol. da Saúde, v. 15, n. 1, 2001 v 129

A Residência Integrada em Saúde:Dermatologia Sanitária – uma experiênciainterdisciplinar vista pelo enfoque daPsicologia

Marisa Campio Müller1

Cristina Beatriz Haag2

Juliana Dors Tigre da Silva3

Resumo: O presente artigo discorre sobre o Programa de Residência Integra-da em Saúde da Escola de Saúde Pública do Estado do Rio Grande do Sul. Institu-ída pela Portaria nº 16/99 da Secretaria da Saúde, em 1º de outubro de 1999, inte-gra três áreas de ênfase: Atenção Básica em Saúde Coletiva, Saúde Mental Coletivae Dermatologia Sanitária. Destaca-se esta última instituição, onde se integram resi-dentes de três diferentes profissões: medicina, enfermagem e psicologia. Especifi-camente, a residência de psicologia divide sua atuação em três setores: o Ambula-tório de Psicodermatoses, o Centro de Testagem e Aconselhamento em HIV e oAmbulatório de Hanseníase. Por meio do trabalho realizado pela psicologia, verifica-se a importância do trabalho integrado e interdisciplinar entre os profissionais daárea da saúde, trazendo maior benefício para os usuários, que são considerados emsua totalidade.

Palavras-Chave: Residência Integrada em Saúde; Saúde Coletiva; Psicolo-gia; Educação em Saúde Coletiva; Residência multiprofissional; Memóriainstitucional.

O Ambulatório de Dermatologia Sanitária (ADS), da Secretaria da Saúdedo Estado do Rio Grande do Sul (SES/RS), situado em Porto Alegre/RS, éreferência em atendimentos relacionados à contaminação pelo vírus daImunodeficiência Humana ou adoecimento pela Síndrome daImunodeficiência Adquirida (HIV/Aids), à dermatologia, à hanseníase e àsdoenças sexualmente transmissíveis. As atividades realizadas pela psicolo-gia no Ambulatório de Dermatologia Sanitária fazem parte do Programa de

1 Preceptora de Psicologia no Programa de Residência Integrada em Saúde: DermatologiaSanitária. Professora da PUC/RS, e-mail: [email protected] Psicóloga Residente do Ambulatório de Dermatologia Sanitária – período 2001 e 2002.3 Psicóloga Residente do Ambulatório de Dermatologia Sanitária – período 2000 e 2001.

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Marisa Campio Müller et al.

130 v Bol. da Saúde, v. 15, n. 1, 2001

Residência Integrada em Saúde da Escola de Saúde Pública do Estado doRio Grande do Sul (ESP/RS), em uma de suas ênfases na Educação emSaúde Coletiva: a dermatologia sanitária.

A Residência Integrada em Saúde da ESP/RS foi instituída pela Portarianº 16/99 da Secretaria de Estado da Saúde do Rio Grande do Sul (SES/RS),em 1º de outubro de 1999. Esta portaria acrescentou o Programa de Aperfei-çoamento Especializado ao Programa de Residência Médica já existente, tor-nando esta residência multiprofissional e interdisciplinar. O histórico dos pro-gramas de residência na Escola de Saúde Pública/RS remonta a algumasdécadas. Em 1976, iniciou a primeira turma de Residência Médica em SaúdeComunitária e, em 1977, esta Residência oferecia vagas multiprofissionais,com o ingresso de enfermeiros, assistentes sociais e médicos veterinários.

Esta residência multiprofissional do final da década de 70 durou poucosanos e funcionou sob distintas regras para os diferentes profissionais. A re-muneração e o tempo de duração diferiam entre os residentes médicos e osresidentes das demais profissões (Ceccim; Armani, 2001).

A partir de 1999, a Residência Integrada em Saúde passou a integrartrês áreas de ênfase, em três distintos locais:

a) o Centro de Saúde-Escola Murialdo recebe a Residência Médica emMedicina Geral Comunitária (para médicos) e o Aperfeiçoamento Especiali-zado em Atenção Básica na Saúde Coletiva (para assistentes sociais, enfer-meiros, nutricionistas, odontólogos e psicólogos);

b) o Hospital Psiquiátrico São Pedro/Projeto São Pedro Cidadão recebea Residência Médica em Psiquiatria (para médicos) e o Aperfeiçoamento Es-pecializado em Saúde Mental Coletiva (para assistentes sociais, enfermeiros,profissionais de educação física, profissionais de educação artística, psicólo-gos e terapeutas ocupacionais);

c) o Ambulatório de Dermatologia Sanitária recebe a Residência Médicaem Dermatologia (para médicos) e o Aperfeiçoamento Especializado em Pro-jetos Assistenciais em Dermatologia Sanitária (para enfermeiros e psicólo-gos).

Estes três programas de residência existem como formaçãointerprofissional 4 em serviço, tendo como base as diretrizes do Sistema Úni-co de Saúde (SUS), o trabalho em Equipe de Saúde e as funções fundamen-tais da saúde coletiva (Educação em Saúde Coletiva e Atenção Integral àSaúde).

Ceccim e Armani (2001) salientam que o contato continuado dos profis-sionais da saúde com os usuários das ações e serviços permite o cruzamentode saberes e o desenvolvimento de novos perfis profissionais, mais adequa-dos à exigência ética de atender a cada pessoa conforme sua necessidade,também considerando as necessidades epidemiológicas e sociais das popu-

4 A Residência Integrada em Saúde foi formulada como educação pós-graduada em serviço,sob orientação, de caráter multiprofissional e interdisciplinar.

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A Residência Integrada em Saúde: Dermatologia Sanitária – uma experiência ...

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lações sob atendimento. Desta forma, a educação em serviço busca desen-volver o aperfeiçoamento profissional por meio da aprendizagem prática epermitindo a troca, tanto com os usuários, como com a equipemultiprofissional.

O Ambulatório de Dermatologia Sanitária teve o seu primeiro Programade Residência instituído em 1997, oferecido para graduados em medicina.Após a Portaria nº 16/1999, o Ambulatório de Dermatologia Sanitária passoua oferecer a Residência Integrada em Saúde para psicólogos, enfermeiros emédicos. O ingresso dos primeiros profissionais destas três áreas aconteceuem janeiro de 2000, tendo o Programa a duração de dois anos para enfermei-ros e psicólogos e três anos para médicos, conforme legislação específica.

Os residentes das três áreas distintas do Ambulatório de DermatologiaSanitária realizam algumas atividades específicas de cada carreira e algu-mas atividades de forma integrada. A Psicologia, neste contexto, visa a possi-bilitar a prática transdisciplinar mediante uma visão integral, histórico-social epsicossomática da pessoa nos atendimentos. Também busca identificar osaspectos emocionais envolvidos nas doenças dermatológicas, compartilharpesquisas abrangendo as especificidades da dermatologia, enfermagem epsicologia, contribuindo, desta forma, para aproximar essas áreas que semostram tão inter-relacionadas.

Os residentes em psicologia do ADS atuam em diferentes setores dolocal, tanto de forma específica como integrada, e suas atividades são práti-cas e teórico-científicas. Dentre as atividades de cunho teórico, os residentesde psicologia assistem às aulas e à reunião clínica em dermatologia, com oscolegas médicos e enfermeiros, assistem às aulas sobre Doenças Sexual-mente Transmissíveis (DST) e controle da infecção pelo HIV junto com osenfermeiros, realizam seminários teóricos específicos para a área da psicolo-gia e seminários teóricos versando sobre psicodermatoses e bioética inte-grados com os residentes de todas as profissões, além das disciplinas e pa-lestras que ocorrem na própria Escola de Saúde Pública/RS.

Dentre as atividades de cunho mais prático, os residentes de psicologia,aliados aos residentes de enfermagem, coordenam a educação em saúdeque ocorre na sala de espera para os usuários do ADS. A atividade da sala deespera consiste em palestras-relâmpago sobre questões básicas de saúdepública, como a dengue, a hanseníase, as DST etc.

Para a população em geral, os residentes de psicologia, novamente emparceria com os residentes de enfermagem, ministram palestras educativas einformativas extra-muro, versando sobre HIV, DST, dengue, higiene corporale micoses, entre outras.

No ambulatório de hanseníase, os psicólogos assistem às consultasmédicas e aos procedimentos tecnoassistenciais e coordenam o Grupo deEncontro em Hanseníase, um espaço grupal oferecido para os pacientes por-tadores de hanseníase e seus familiares (esta atividade é realizada de formaintegrada com os enfermeiros).

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Marisa Campio Müller et al.

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No Centro de Testagem e Aconselhamento para o HIV e Aids (CTA), osresidentes de psicologia atuam como aconselhadores, ministrando palestrassobre HIV e DST, entregando os resultados de exames de HIV e Sífilis eauxiliando na coordenação do Grupo de Adesão aos Antiretrovirais, um espa-ço oferecido para pacientes soropositivos em acompanhamento no ADS. Estegrupo também é realizado de forma integrada com os enfermeiros.

O atendimento oferecido no Ambulatório de Psicodermatoses abrange apsicoterapia breve, individual e grupal para adultos, adolescentes e crianças,tanto do sexo masculino, quanto feminino, portadores de doenças como ovitiligo, a psoríase, a dermatite atópica, a alopecia e outras. Os pacientes sãoencaminhados pelos médicos dermatologistas e, em seguida, passam poruma entrevista inicial (triagem) e são encaminhados para o atendimentogrupal ou individual feito pelos residentes de psicologia. Alguns desses aten-dimentos grupais são executados conjuntamente com a equipe de enferma-gem e medicina e todos os pacientes recebem atendimento integrado médicoe psicológico. Além disso, o ambulatório de psicodermatoses realiza e apre-senta pesquisas unindo os saberes e resultados das diferentes profissões.

O atendimento psicoterápico realizado neste ambulatório possui umaabordagem mente-corpo que busca a promoção de um entendimento maisamplo sobre a doença e suas correlações emocionais, visando à integraçãodestas duas polaridades. Os pacientes são estimulados a refletirem sobre asinfluências emocionais que podem estar atuando na doença dermatológicaque possuem e como administrar tais aspectos para obter uma melhor qua-lidade de vida. Durante o andamento do processo psicoterapêutico, são trans-mitidas informações sobre as doenças dermatológicas com o intuito de esti-mular o paciente a apropriar-se melhor da doença que está desenvolvendo.Isto estabelece ao atendimento um enfoque também educacional, seguindoa abordagem da psicologia da saúde .

A duração do tratamento é de seis meses, com sessões semanais de 1he 30 min, caracterizando, desta forma, um processo de psicoterapia breve.Este tipo de tratamento possui um foco determinado, sendo este a ampliaçãoda consciência do paciente sobre sua doença e a melhora da sua qualidadede vida. É dada também prioridade ao atendimento grupal que, além deabranger um maior número de pessoas a serem atendidas, constitui-se comouma condição estimuladora para o desenvolvimento de seus participantes,por proporcionar a troca de vivências e encontro entre iguais.

De acordo com Fiorini (1981), a psicoterapia breve é um tipo de trata-mento psicoterápico que possui um foco de atuação determinado, condizenteaos principais conflitos do paciente que, naquele momento, estão interferindona sua vida.

Neste estilo de psicoterapia, o terapeuta tem um papel essencialmenteativo e este deve elaborar um plano individualizado para seus pacientes e, nodecorrer do processo, manter o foco da terapia. Deve existir também flexibili-dade quanto às estratégias de atuação durante a evolução do tratamento.

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Para Braier (1997), a psicoterapia breve também é denominada de tera-pia de objetivos limitados, pois suas metas são mais modestas do que a re-construção da estrutura da personalidade, como almejado no tratamento psi-canalítico. A psicoterapia breve está vinculada às necessidades imediatas dopaciente e visa à superação dos sintomas e dos problemas da sua realidadeatual. Esta terapia tem como norte a possibilidade de enfrentar situações deconflito e recuperar o auto-desenvolvimento.

O mesmo autor afirma que a duração breve deste tipo de tratamento épositiva na medida que estimula o progresso da terapia, por meio da fixaçãode um prazo de encerramento. Além disso, confere à terapia uma estruturadefinida em termos de princípio, meio e fim, introduzindo um elemento neces-sário de realidade à relação terapêutica, esmorecendo a produção de fanta-sias regressivas de união permanente com o terapeuta. O tratamento inclina-se para a estimulação e o reforçamento da iniciativa pessoal, ou seja, dascapacidades autônomas do paciente.

Durante o processo, são aplicados instrumentos para auxiliar na avalia-ção do nível de ansiedade, sendo este, o Inventário de Ansiedade Traço-Estado (Idate) e o Questionário de Qualidade de Vida.

Aliada ao tratamento psicoterápico, é utilizada também a técnica de rela-xamento e visualização. Esta técnica tem o objetivo de encorajar o paciente atomar mais consciência do próprio corpo, aprendendo a relaxar suas tensõese ansiedades.

Carvalho (1994) comenta que a visualização tem sido usada nos pro-cessos de cura desde os tempos mais remotos. Há informações de cura naChina, no século XVII a.C., no Egito, no Tibet, na Grécia, na África, entre osesquimós e índios norte-americanos e sul-americanos. Segundo a mesmaautora, Asclépio, Aristóteles e Hipócrates utilizavam a visualização para odiagnóstico das doenças e para os tratamentos.

De acordo com Epstein (1990), as imagens mentais são um tipo de pen-samento usado para fazermos contato com nossa realidade subjetiva interna.Estas imagens provêm do tipo de pensamento intuitivo que contrapõe o pen-samento lógico. Sem este tipo de pensamento intuitivo, não poderíamos pen-sar em nada novo.

Rossi (apud Müller, 2001) refere que a mente, por meio das imagens,pensamentos, crenças, memórias e emoções, sob uma interação constante einvoluntária, pode alterar a estrutura bioquímica e o sistema nervoso. A rela-ção mente e corpo, a partir da análise do mecanismo do estresse, mostra seuefeito no sistema hormonal e no sistema imunológico.

O atendimento psicológico feito com os pacientes que possuem proble-mas dermatológicos segue também o enfoque de um ramo da dermatologiachamado psicodermatologia.

A psicodermatologia é a área da dermatologia que abrange aquelasdoenças de pele que possuem correlação com as emoções e a subjetividadedo indivíduo. A pele é vista aqui como um dos mais importantes órgãos de

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Marisa Campio Müller et al.

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manifestação das emoções. As ligações que existem com o sistema nervosotornam a pele altamente sensível às emoções, independentemente da nossaconsciência. A pele expressa os nossos sentimentos mesmo quando nãoestamos cientes deles.

Segundo Montagu (1988, p. 30), a nossa pele recebe não só os sinaisque nos chegam desde o ambiente, transmitindo-os aos centros do sistemanervoso para a etapa de decifração, como ainda capta sinais de nosso mundointerno. Todos eles são, em seguida, traduzidos em termos quantificáveis. “Apele é o espelho do funcionamento do organismo: sua cor, textura, umidade,secura e cada um de seus demais aspectos refletem nosso estado de ser,psicológico e também fisiológico”. O autor ressalta ainda, as correlaçõesfisiopsiquícas envolvidas no contato pele-a-pele, ressaltando a importânciado toque para o desenvolvimento sadio do ser humano.

Para Grossbart (apud Golemam; Gurin, 1997), nossa pele pode sercomparada a uma roupa que jamais tiramos, mas como tudo o mais quevestimos muda, conforme o humor e a ocasião. Praticamente, todos os atosde amor e de raiva envolvem intercâmbio dinâmico da pele. Portanto, nãodeve ser surpresa que seja ela a primeira a manifestar os problemas quandoas aflições emocionais vazam do coração e da mente.

A pele também envolve o papel simbólico de proteção, o que é um fatora mais a ressaltar na vinculação entre distúrbios emocionais e as doenças depele. Tal vínculo não data de hoje, antigamente já se utilizava a expressãoneurodermite para demonstrar alguns tipos de eczema, querendo destacar asua origem nervosa.

É provável, portanto, que a pele também possa refletir problemas emo-cionais ou doenças que são causadas por muitos fatores que, em grandeparte, às vezes, agem em conjunto, até como fatores genéticos, hormonais eagentes infecciosos (Grossbart, 1997). Os fatores emocionais podem apre-sentar-se como decorrência, ou seja, conseqüência de transtornos físicos,mas que, por vezes, podem ser a causa desencadeante de muitos problemasfísicos.

A doença também pode ter uma representação simbólica, que podemanifestar-se pelo local ou sintoma escolhido. Para Moffaert (1992), a maiorou menor consciência da escolha de uma particular área do corpo, em razãode algum valor simbólico, constitui um item distinto na psicodermatologia.

Também para Azulay e Azulay (1997), a doença pode estar representan-do emoções não resolvidas que se apresentam, então, como manifestaçõesorgânicas. O sintoma vem como manifestação simbólica, como linguagem doque permaneceu oculto, excluído de poder apresentar-se.

A doença como um símbolo de aspectos reprimidos foi trazida porGroddeck (1989) e Jung (1985). Assim compreendida, a doença obriga ne-cessariamente a ver o paciente no seu todo, um organismo psique/corpo queadoece.

Portanto, os pacientes, em seus processos psicoterapêuticos, são esti-

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mulados a tomar consciência desta correlação existente entre sua emoçõese a doença resultante no seu soma.

Ao longo do desenvolvimento deste trabalho, por intermédio da expe-riência observada e de pesquisas realizadas nesses 2 anos de atendimento ede residência de psicologia em dermatologia sanitária, podemos salientar al-guns aspectos que chamam a nossa atenção. Os pacientes acompanhadoscom psicoterapia concomitante ao tratamento médico tendem a apresentarmelhora na sua qualidade de vida, no nível de ansiedade e, conseqüente-mente, a melhora clínica de sua pele, o que se verifica pelos instrumentosque avaliam a qualidade de vida, o inventário de ansiedade traço-estado e osrelatos feitos durante o processo psicoterapêutico.

Como ilustração desses resultados, podemos citar a pesquisa de douto-rado realizada no ADS em 2000 (Müller, 2001) com os pacientes portadoresde vitiligo. Nesta pesquisa, verificou-se a repigmentação de até 80% da peledos pacientes após o período de 6 meses de psicoterapia e tratamento médi-co, enquanto que, para os pacientes que receberam apenas tratamento médi-co, o índice máximo de repigmentação foi de 30%. Como se ressalta na tese,é necessário que os profissionais da área da saúde compreendam que a do-ença pode transformar-se numa oportunidade de crescimento e deressignificação da vida, de viver, assim como ocorreu com as pacientes estu-dadas. Esses resultados demonstraram a importância de um trabalho inte-grado médico-psicológico em pacientes com problemas dermatológicos.

Salienta-se também a importância do trabalho conjunto, multidisciplinare interdisciplinar, como forma de abarcar a dimensão psicossomática e histó-rico-social do paciente, alcançando uma maior abrangência de si mesmo emcada pessoa.

Apesar da residência de psicologia em dermatologia ser recente e deestar ainda em estruturação, podemos considerar as influências positivas queo tratamento psicoterápico aliado ao tratamento médico vem trazendo aospacientes com problemas dermatológicos, melhorando sua qualidade de vida,no mínimo pelo auto-conhecimento que a psicoterapia proporciona. Para ocampo da psicologia, essa área também é nova. Não pensamos em umanova especialidade, mas no ingresso profissionalizado da psicologia nas equi-pes de saúde em dermatologia sanitária.

La Residencia Integrada en Salud: Dermatología Sanitaria – unaexperiencia interdisciplinar vista por el enfoque de la Psicología

Resumen: El presente artículo discurre sobre el Programa de Residencia Inte-grada en Salud de la Escola de Saúde Pública/RS. Instituida por la Portaría nº 16/99de la Secretaria da Saúde en 1º de octubre de 1999, integra tres áreas de énfasis:Atención Básica en Salud Colectiva, Salud Mental Colectiva y DermatologíaSanitaria. Se destaca esta última institución, donde se integran residentes de tres

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Marisa Campio Müller et al.

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diferentes profesiones: medicina, enfermería y psicología. Especificamente, laresidencia de psicología divide su actuación en tres sectores: el Ambulatorio dePsicodermatosis, el Centro de Test y Aconsejamiento em VIH y el Ambulatorio deHanseniasis. Por medio del trabajo realizado por la psicología, se verifica laimportancia del trabajo integrado interdisciplinar entre los profesionales del área dela salud, traendo más beneficio para los usuarios, que son considerados en sutotalidad.

Palabras Clave: Residencia Integrada en Salud; Salud Colectiva; Psicología;Educación en salud colectiva; Residencia multiprofesional; Memoria institucional.

The integrated residence in health: sanitary dermatology: aninterdisciplinary experience seen through the perspective of Psychology

Abstract: The present article talks about the Program of Integrated Residencein Health of the Escola de Saúde Pública of the State of Rio Grande do Sul. Institutedby the Entrance nº 16/99 of the Secretaria da Saúde on October 1st, 1999, itintegrates three areas of emphasis: Basic Attention in Collective Health, CollectiveMental Health and Sanitary Dermatology. The last institution stands out, where thereare residents of three different professions: medicine, nursing and psychology.Specifically, the psychology residence focuses its attention in three sections: theClinic of Psycho-dermatosis, the Center of Testing and Guidance in HIV and the Clinicof Hansen’s disease. Through the work accomplished by the psychology area, it isconfirmed the importance of the integrated interdisciplinary work among theprofessionals of the area of health, creating greater benefits for the users, who areconsidered in their totality.

Key-words: Integrated residence in health; Collective health; Psychology;Education in collective health; Multi-professional residence; Institutional memory.

Referências

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Nossos saberes, nossos fazeres – Atenção Integral versus Vigilância à Saúde: aftosa ...

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Nossos saberes, nossos fazeres –Atenção Integral versus Vigilância àSaúde: aftosa e saúde mental em Jóia

Maria Luíza Raminelli de Almeida1

Resumo: Experiência vivida no município de Jóia, no Rio Grande do Sul, du-rante o aparecimento e combate da Febre Aftosa na região noroeste do estado. Aatenção à saúde mental para a população foi conseqüência do surgimento do sofri-mento psíquico manifestado ante as perdas com as quais as pessoas estavam sedeparando, tais como perdas materiais, afetivas e de liberdade de trânsito. A açãoem saúde mental somou-se às múltiplas ações que já se realizavam em Jóia, em umtrabalho intersetorial, buscando vencer o grande desafio de combate à doença que,além de infectar animais (ovinos, bovinos e suínos), trazia consigo muitos prejuízos.

Palavras-Chave: Aftosa; Jóia; Saúde Mental.

Setembro de 2000

É montada em Jóia, município da região noroeste do estado do RioGrande do Sul, uma força-tarefa, na qual uma grande equipe, constituída poresforço intersetorial (Secretaria da Agricultura, Secretaria da Saúde, DefesaCivil e Brigada Militar), realiza ações de combate à Febre Aftosa – doençaque infecta ovinos, bovinos e suínos – e de Atenção interdisciplinar às suasconseqüências.

Após alguns dias do início deste trabalho emergencial, chega à Coorde-nação da Política de Atenção Integral à Saúde Mental - CPAIS Mental - daSecretaria Estadual da Saúde (SES/RS) a solicitação de ações de proteção àSaúde Mental naquele contexto, pois estavam surgindo situações de efetivosofrimento psiquíco nas pessoas daquela população.

Farei referência à primeira família visitada, que foi a principaldesencadeadora da demanda de cuidado psicológico naquele contexto.

Havia um “pequeno produtor”, um menino de aproximadamente dezanos que, além da escola, ocupava-se em cuidar de seus animais, plantava e

1 Psicóloga e Assessora Técnica da Coordenação da Política de Atenção Integral à SaúdeMental – SES/RS. e-mail: [email protected]

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Maria Luíza Raminelli de Almeida

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colhia na propriedade da família. Com algum dinheiro seu e a ajuda do paicomprou mais alguns animais. Sempre que ganhava algum dinheiro, por seutrabalho ou de presente, investia na compra de filhotes. Além de cuidá-los,dava a eles nomes, cuidados pessoais e, evidentemente, carinho.

Ao contar-nos de como se despedira dos seus animais levados para oabate, o menino e seus pais não continham a emoção. Não se tratava de umprejuízo econônico, choravam intensas perdas afetivas. De certa maneira,eles expressavam o estado emocional em que aquela população se encon-trava. Um genuíno sentimento do desamparo se instaurava frente à situaçãoque se instalava e avolumava.

Dessa força-tarefa não podia ficar excluido o cuidado psicossocial, poisnão se tratava de uma ação de vigilância epidemiológica, ambiental ou sanitá-ria. Estava em questão, para o setor da saúde, o cuidado psíquico e a prote-ção de condições para a atenção integral à saúde. A equipe de saúde optoupor um programa de visitação domiciliar em que um profissional da psicologiae um profissional da medicina veterinária buscariam uma escuta dos proces-sos subjetivos mobilizados em cada grupo domiciliar. Procurou-se realizarum trabalho de esclarecimento epidemiológico-sanitário que resultasse emganhos à autonomia individual e coletiva no enfrentamento de uma condiçãoda vida cultural, subjetiva e econômica-social.

Em geral, visitávamos as propriedades onde os animais já tinham sidoretirados e abatidos, com uma equipe composta por psicólogo e médico vete-rinário.

Buscava-se, por meio da visita, a oportunidade de uma escuta psicológi-ca e a oferta de informações técnicas sobre a febre aftosa, bem como o es-clarecimento acerca dos procedimentos adotados pelo Departamento de Pro-dução Animal, da Secretaria Estadual da Agricultura - DPA, no combate àdoença. Esperava-se amenizar o sofrimento experimentado e gerar novosestados psicoafetivos para a proteção social.

As perdas não se restringiam aos animais abatidos, pois a vida dessaspessoas sofria grande alteração. O impedimento do livre trânsito, para evitara transmissão da doença, resultava no afastamento do convívio e encontrocom os familiares. Quem estava dentro da área tecnicamente delimitada decontrole não poderia visitar familiares ou amigos em outras propriedades,evitando levar consigo o vírus da Aftosa e a propagação da doença paraoutros animais.

Da mesma forma, crianças deixavam de freqüentar a escola. Aquelasda área de controle não podiam freqüentar a escola e aquelas de fora quefreqüentavam uma escola instalada na área restrita, também não podiamfazê-lo. Os deslocamentos, sempre que possíveis, eram providenciados ecrianças e jovens eram mandados para a casa de familiares e amigos, demodo a diminuir os prejuízos com a ausência às aulas, seja nas escolas ouuniversidade, ausência em cursos ou no trabalho, ou mesmo, para evitar aconvivência com a dor imediata em cada domicílio.

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O mais danoso de tudo foi o surgimento do preconceito e da rejeiçãomanifestados sobre a população, não só por parte dos municípios vizinhos,mas também pela produção de uma generalizada imagem refletida para omundo. Para os cidadãos de Jóia, não estava nada fácil reconquistar acredibilidade sobre a sanidade animal e a confiança do mercado para os seusprodutos, mesmo fora da área contaminada na cidade. Jóia ficava estigmati-zada, a população singularizada em cada indivíduo, adulto, jovem criança ouidoso, vivia a experiência do estigma pela “segurança sanitária”.

Quanto à nossa abordagem nas visitas domiciliares, constatamos famí-lias muito receptivas. Apenas um produtor se negou a receber-nos, fato que,naquela situação, nos foi perfeitamente possível compreender. A reação àexperiência que estavam vivenciando, sem dúvida, se refletia no rechaço aosrepresentantes da imposição da “segurança sanitária”. Os pais deste produ-tor, que também eram seus vizinhos, chamaram-nos para conversar, propon-do-se de modo reverso a resistir pela expressão do desconforto e assimila-ção do sofrimento por sua exposição compartilhada.

Essas reações retratam a singularidade com que cada pessoa ou cadafamília reagiu frente às perdas, fossem elas materiais ou afetivas, apenasconfirmando o quanto somos singulares em nossas vivências. Sabemos quea forma de conduzir o luto é diferente para cada pessoa, cada subjetividadetem sua produção em territórios afetivos distintos.

Frente às perdas, podemos manifestar diferentes reações para nos pro-tegermos, e estas reações podem ser a negação dos fatos, a depressão e ossentimentos de revolta, de raiva e até de euforia. Uma mesma pessoa podepassar por todos esses sentimentos, mas, perante uma mesma situação,diferentes atitudes são desencadeadas, implicadas que estão em motivosinternos e vivências singulares.

Com o passar do tempo, os processos psíquicos vão engendrando no-vas subjetividades, novas autonomias, novas cidadanias.

A nossa abordagem, por meio das “visitas domiciliares”, prestou-se aacolher as manifestações subjetivas que cada pessoa daquelas famílias atin-gidas podia expressar naquele momento.

Apareciam dúvidas e inseguranças de alguns com relação ao futuro,uma vez que sentiam sua sobrevivência ameaçada com a impossibilidade decomercializar o leite e derivados, o que acarretava dificuldades financeiraspara manter despesas diárias. Para outros, a situação representavadesestímulo à idéia de recomeçar, inclusive pelo que representavam os ani-mais em suas vidas. Alguns, por considerarem-se velhos, apontavam a im-possibilidade de atingir novamente a pureza de uma raça de gado, conformejá haviam alcançado após vários anos de trabalho. Alguns falavam em mudarde atividade, revelando a desilusão por que passavam. Mulheres referiamque as crianças não suportavam mais escutar os “tiros” das armas que abati-am o gado. Nós entendíamos que cada queixa era o jeito que encontravampara dizer que não agüentavam mais ouvir os disparos, ou seja, cada motivo

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Maria Luíza Raminelli de Almeida

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pessoal utilizado como motivo coletivo.O estado emocional da população era traduzido por esses questiona-

mentos e pelo vazio que surgia em suas vidas, tanto pela ausência dos ani-mais no campo, quanto pela “falta do que fazer com as horas” que a restriçãosanitária impunha.

Havia solidariedade entre as famílias, que visitavam-se e consolavam-se, em geral, na roda do chimarrão. Havia, também, forte atitude de humani-dade, pois mesmo depois dos animais estarem avaliados e destinados aoabate, não cessavam os cuidados. Eram ordenhados para não apresentaremfebre. O leite era enterrado, ou servia de alimento para outros animais como ogato e o cachorro.

Nessas atitudes, percebia-se o afeto com os animais, a vã esperança deuma reversão da situação, um adiamento das horas vazias que estavam porvir e que já era realidade em parte da cidade. Começamos por visitar asfamílias cujos animais foram abatidos, mas logo fomos redirecionados paraas situações mais peculiares indicadas por colegas de outras tarefas, os quaisnos apontavam situações de maior vulnerabilidade e fragilidade afetiva.

Fazíamos, em média, três visitas por turno, sem rigidez de tempo (nãoolhávamos para o relógio), sendo cada visita tão singular quanto as pessoascom quem estávamos. Percebíamos que o estado de ânimo de muitas delasmelhorava significativamente, podendo se atribuir esta melhora às informa-ções que recebiam e à possibilidade de traduzirem em palavras, ou de darsignificação ao que estava acontecendo, fosse pela expressão das lágrimas,das queixas de insônia, de falta de apetite ou de falta de interesse para fazerplanos para o futuro. Enfim, poder falar do sofrimento era um jeito de aliviar ador. Os sorrisos se esboçavam no momento em que nos acompanhavam ouquando nos despedíamos. A minoração do desamparo restaurava o confortoafetivo.

Novembro de 2001

Como continuidade da atenção integral à saúde à população de Jóia,conjuntamente, a Prefeitura do Município e as secretarias da agricultura e dasaúde encaminham ao Ministério da Saúde um projeto de “Atendimento Inte-gral às Famílias que Perderam os Animais em Conseqüência da Febre Aftosae às Famílias que Residem nas Proximidades dos Focos”. A busca de recur-sos que viabilizem uma atenção à saúde diferenciada se evidenciou pelocontato afetivo do Sistema de Saúde com a população. A experiência de vida,a história psicossocial ou as vivências singulares diante da realidade sanitáriasão objeto de um Sistema de Saúde que se pauta pela Atenção Integral àSaúde e não apenas pela Vigilância à Saúde, individual ou coletiva. Cabe aoSUS acolher histórias de vida e não eventos sanitários, circunstancialmenteenvolvendo as vidas humanas.

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Nossos saberes, nossos fazeres – Atenção Integral versus Vigilância à Saúde: aftosa ...

Bol. da Saúde, v. 15, n. 1, 2001 v 145

Nuestros saberes, nuestros haceres - Atención Integral versus Vigilanciaa la Salud: aftosa y salud mental en Jóia

Resumen: Experiencia vivida en el municipio de Jóia, en el Rio Grande do Sul,durante el aparecimiento y combate de la Fiebre Aftosa en la región noroeste delestado. La atención a la salud mental para la población fue consecuencia del sufri-miento psíquico manifestado ante las pérdidas con las cuales estaban deparándose,tales como pérdidas materiales, afectivas y de libertad de tránsito. La acción ensalud mental se somó a las múltiplas acciones que ya se realizaban en Jóia, en untrabajo intersectorial, buscando vencer el gran desafío de combate a la enfermedadque, además de infectar animales (ovinos, bovinos y porcinos), traía consigo muchosperjuicios.

Palabras Clave: Aftosa; Jóia; Salud mental.

Ours knowledge, ours actions - Integral Attention versus Surveillance toHealth: Foot-and-mouth disease and mental health in Jóia

Abstract: Experience lived in the municipal district of Jóia, state of Rio Grandedo Sul, during the emergence and combat of the Foot-and-mouth disease in thenorthwest area of the state. The attention to the mental health of the population wasa consequence of the appearance of the psychic suffering manifested before thelosses with which they were coming across, such as material, affectionate and freetraffic losses. The action in mental health added to the multiple actions that hadalready been taking place in Jóia, in an inter-sectors work, seeking to win the greatchallenge of combating the disease that, besides infecting animals (ovine, bovineand swine), brought with it many damages.

Key-words: Foot-and-mouth disease; Jóia; Mental health.

Referências

FREUD, Sigmund. Luto e Melancolia. In:______. Obras completas da edição standardbrasileira. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1980. 420 p. v. 14.LACAN, Jacques. Observações Sobre o Relatório de Daniel Lagache: psicanálise eestrutura de personalidade. In:______. Escritos. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1998.937 p. Tradução de: Écrits.MARTINS, Waldemar V. Dicionário de psicologia. São Paulo: Ed. Loyola, 1982. 555p. v. 3.

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ResumoResumoResumoResumoResumo

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Processo de territorialização: vivências de uma equipe

Bol. da Saúde, v. 15, n. 1, 2001 v 149

Processo de territorialização: vivênciasde uma equipe

5º Congresso Brasileiro de Medicina de Família e Comunidade / 3º EncontroParanaense de Saúde da Família, de 15 a 17 novembro 2001, Curitiba, PR.

A. A. Poitevin1; A. A.Torres1; S. C. Scariote1; L. V. Miranda1;C. Oliveira1; C. P. Piva1; R. F. D. Oliveira1; L.Teixeira1; P. Barros1;

V. Mello1; A. Volkmer1; C. Rocha1; K. L. Pegas1; J. O. Lacerda1;L. K. Amakawa1; M. Colisse1; M. Tavares1; E. Farias1

Resumo: O processo de territorialização permite conhecer melhor a área deatuação de uma Unidade Básica de Saúde (UBS) e, assim, facilitar a implementaçãodas diretrizes do Sistema Único de Saúde (SUS) no âmbito da chamada atençãoprimária. Esse conhecimento proporciona a identificação da população e o planeja-mento local de ações de saúde com novas formas de interação do serviço com apopulação. Essa estratégia faz parte das aprendizagens no Programa de ResidênciaIntegrada em Saúde: Atenção Básica em Saúde Coletiva da Escola de Saúde Públi-ca/RS, desenvolvido no Centro de Saúde-Escola Murialdo. O objetivo deste relato écompartilhar a experiência da equipe da Unidade Básica de Saúde “Saldanha daGama” (UBS 3), localizada na Av. Saldanha da Gama, com o processo deterritorialização na Vigilância da Saúde. Foram realizados encontros com os profis-sionais pertencentes à UBS 3 sobre a estratégia, utilizado-se dados cartográficos ede amostragem domiciliar do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE/1996. O processo de territorialização iniciou em janeiro de 2000 e encontra-se emandamento. A definição do território de responsabilidade da UBS, mais que a sim-ples descrição de uma população, permitiu uma melhor inserção dos residentes deprimeiro e segundo ano nas propostas do programa de Residência Integrada emSaúde e o aprimoramento do trabalho em equipe, ampliando o conhecimento daárea e de sua população e proporcionando uma melhor integração equipe-popula-ção.

Palavras-Chave: Atenção primária de saúde; Residência Integrada em Saúde.

1 Residência Integrada em Saúde. Centro de Saúde Escola Murialdo – Unidade Básica deSaúde 3. e-mail: [email protected]

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Desafio da promoção de saúde com adolescentes: uma abordagem interdisciplinar

Bol. da Saúde, v. 15, n. 1, 2001 v 151

Desafio da promoção de saúde comadolescentes: uma abordageminterdisciplinar

5º Congresso Brasileiro de Medicina de Família e Comunidade / 3o EncontroParanaense de Saúde da Família, de 15 a 17 de novembro 2001, Curitiba, PR.Unidade Básica de Saúde VII – Centro de Saúde Escola Murialdo – CSEM /Escola de Saúde Pública – ESP/RS

Beatriz Mallmann1; Cláudia Sá Freire1; Débora Drehmer1;Eduardo Albuquerque D’Elia1; Fabiana Aguiar Guimarães1

Resumo: O trabalho relatado foi desenvolvido com adolescentes de uma es-cola estadual localizada no município de Porto Alegre/RS, tem caráter interdisciplinare tem como intuito promover a saúde, construindo o conhecimento por meio de trocade experiências entre os participantes do grupo. Os encontros foram planejados apartir das demandas dos adolescentes, suas vivências, histórias de vida, inquieta-ções, desejos e interesses em comum. Foram abordados assuntos como corpo hu-mano, anticoncepção, DST e Aids, drogas e violência. O grupo é fechado e cadaturma (2ª e 4ª séries) se reuniu quinzenalmente, com duração de 1h30min cadareunião. O grupo de alunos apresentava idade entre 9 e 16 anos. As atividadesforam desenvolvidas sob a forma de oficina, utilizando-se para isso diversas técni-cas, principalmente as dinâmicas de grupo e os vídeos educativos. Percebemos queeste trabalho tem sido valorizado pelos alunos, pois eles demonstram interesse eparticipação em todas as atividades propostas. Em vários relatos foi evidenciada adesmitificação de preconceitos e mitos experimentados pelos colegas, muitas vezespor absoluta desinformação. Esses adolescentes, estimulados a questionar e pen-sar, tornam-se multiplicadores de uma nova concepção de saúde, voltada para osprocessos de vida individual e coletiva. Vemos nesta proposta um desafio de pen-sarmos e aprendermos novas formas de educar, onde, além de educadores em saú-de, também somos educandos. Neste sentido, a interdisciplinaridade é norteadoradesse trabalho, que necessita melhor qualidade de escuta aos processos de vidaindividual e coletiva e necessita promover a saúde entre os adolescentes e não ape-nas repassar regras e conceitos.

Palavras-Chave: Saúde do adolescente; Saúde e educação; Promoção dasaúde.

1 Residência Integrada em Saúde. Centro de Saúde – Escola Murialdo – Unidade Básica 7. e-mail: [email protected]

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A Interdisciplinaridade: um novo fazer na saúde da família e da comunidade

Bol. da Saúde, v. 15, n. 1, 2001 v 153

A Interdisciplinaridade: um novo fazerna saúde da família e da comunidade

5º Congresso Brasileiro de Medicina de Família e Comunidade / 3º EncontroParanaense de Saúde da Família, de 15 a 17 de novembro 2001, Curitiba, PR.

Beatriz Mallmann1; Oswaldina Lopes1; Ruth Mincaroni1; Carla PatríciaPaiva2; Fabiana Aguiar Guimarães2; Gláucia Regina Siqueira Franco2

Resumo: Este trabalho tem como objetivo o diálogo sobre o nosso entendi-mento a respeito da interdisciplinaridade nas equipes de saúde da atenção básica. Aexperiência relatada acontece na Residência Integrada em Saúde: Atenção Básicaem Saúde Coletiva, da Escola de Saúde Pública/RS, sediada no Centro de Saúde-Escola Murialdo – CSEM, localizado em Porto Alegre/RS e composta pelas áreas deServiço Social, Enfermagem, Medicina, Nutrição, Odontologia e Psicologia. A orga-nização da residência integrada proporciona aos profissionais intervirem em equipede saúde. O Serviço Social tem o compromisso ético-político de facilitar à equipeesta integração (noção de ação grupal) e o entendimento da realidade como organi-zação dinâmica. Neste sentido, os “pacientes” não são seres isolados do contextoem que vivem. Há inscrições de pertencimento como a família, a localidade de mora-dia e a sociedade (cultura, classe, hábitos). Eles não são fragmentados como naclínica tradicional. A base deste novo agir está na clínica ampliada da saúde coleti-va, que busca compreender as relações saúde, doença, cuidado e cura. O processode trabalho envolve, entre outras ações de promoção de saúde, intervenções desaúde nas escolas, creches, usinas de reciclagem de lixo seco e outras instituições.A interdisciplinaridade é uma categoria central para avançarmos nesta práxis quesupera a visão de paciente para o de ser integral. Neste cenário, o Assistente Socialtem o papel de mediador, favorecendo o exercício da cidadania no âmbito da aten-ção primária à saúde, pois consideramos que as equipes que compõem uma Unida-de Básica de Saúde (UBS) são também responsáveis pela construção de uma cons-ciência coletiva de participação popular, tanto em âmbito de micro quanto dasmacrorrelações sociais. Sendo assim, todas as ações que envolvem profissionais desaúde, serviços públicos e populações exigem acolher e desenvolver compromissoscom a intersetorialidade no âmbito da saúde pública e práticas interdisciplinares.

Palavras-Chave: Saúde coletiva; Assistente social; Residência Integrada emSaúde.

1 Assistente Social – Supervisora do CSEM. e-mail: [email protected] Residente de Serviço Social do Programa de Saúde Coletiva do CSEM. e-mail:[email protected]

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A observação da Unidade Básica de Saúde 5 do Centro de Saúde – Escola Murialdo

Bol. da Saúde, v. 15, n. 1, 2001 v 155

A observação da Unidade Básica deSaúde 5 do Centro de Saúde – EscolaMurialdo

5º Congresso Brasileiro de Medicina de Família e Comunidade / 3º EncontroParanaense de Saúde da Família, de 15 a 17 de novembro 2001, Curitiba, PR.

Cláudia da Silva Chitollina1; Daniela Michelin Letti1; DéboraTomatis Pacheco1; Sandra Oscham Medvedovsky1

Resumo: O curso de Medicina da Universidade Luterana do Brasil visa formarprofissionais com conhecimentos de acordo com as necessidade e preocupaçõesda população, englobando a família e a comunidade. Diante disso, na disciplina desaúde pública e coletiva, foi realizado um estudo de observação e análise de umaUnidade Básica de Saúde (UBS) do Centro de Saúde-Escola Murialdo (CSEM). Como objetivo de conhecer o serviço e sua inserção no Sistema Único de Saúde (SUS),identificando os motivos mais comuns de busca da população ao serviço, assimcomo as características desses usuários, empreendeu-se uma observação com du-ração de três semanas, no mês de maio de 2001. Desenvolvemos um trabalho deobservação na Unidade Básica de Saúde “Ceres” (UBS-5), do Centro de Saúde-Escola Murialdo (CSEM), localizada na Av. Ceres. O processo de trabalho em Unida-de Básica foi observado pelo grupo, desde o sistema de registro dos usuários até oprocesso decisório da equipe de saúde, abrangendo todos os aspectos que devemreger o funcionamento de um serviço do SUS. Identificamos um total de 438 usuári-os atendidos consecutivamente, caracterizando-os quanto à idade, ao sexo e aomotivo de atendimento. Durante o período, 71% dos usuários eram do sexo femininoe a faixa etária mais freqüente era de pessoas acima de 60 anos (31%). Houve muitadispersão pelas quais se buscou o serviço. Em primeiro lugar ficou a administraçãode medicamentos com uma freqüência maior de 10% dos motivos de atendimento(14,2%).

Palavras-Chave: Saúde coletiva; Serviços de saúde.

1 Aluna do curso de Medicina da Universidade Luterana do Brasil (Ulbra) – Canoas/RS.

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Acadêmicos de medicina e a atenção primária à saúde

Bol. da Saúde, v. 15, n. 1, 2001 v 157

Acadêmicos de medicina e a atençãoprimária à saúde

5º Congresso Brasileiro de Medicina de Família e Comunidade / 3º EncontroParanaense de Saúde da Família, de 15 a 17 de novembro 2001, Curitiba, PR.

Cristina Lunardi Munaretti1; PatríciaCaspary2; Rita Cristina C. Sotelo2

Resumo: A prática desenvolvida pelos acadêmicos de medicina pode propor-cionar uma maior compreensão da população que se beneficia da atenção primáriaà saúde, bem como da organização dos serviços de saúde, devido à sua presençana comunicação com os usuários das ações e serviços públicos de saúde e nãoapenas o exercício da assistência. Este trabalho pretende divulgar a experiência deestudantes de medicina em serviços de atenção primária à saúde e descrever ascaracterísticas do atendimento em uma Unidade Básica de Saúde (UBS). O traba-lho foi desenvolvido no período de março a outubro de 2001, na disciplina de SaúdePública e Coletiva, por alunos do curso de medicina da Universidade Luterana doBrasil. O trabalho foi realizado por meio da observação e avaliação da Unidade Bá-sica de Saúde 6 “Aparício Borges” (UBS 6) do Centro de Saúde-Escola Murialdo,localizada no bairro Aparício Borges, região leste da cidade de Porto Alegre. O estu-do foi realizado com informações obtidas em planilhas de atendimentos consecuti-vos e prontuários de uma semana, no mês de maio de 2001. Foram avaliados osseguintes dados: sexo, idade, motivo de atendimento, diagnóstico, setor residencialinterno ao bairro e potencial de resolutividade. Prevaleceram consultas do sexo fe-minino (66%); a faixa etária dos 0 aos 5 anos foi a que mais procurou a UBS e omotivo mais freqüente de atendimento foi afecção de vias aéreas superiores. Osprincipais motivos de procura, por faixa etária, foram: revisão, para a população deaté um ano de idade, seguido por sintomas de vias aéreas superiores; de 01 a 05anos, sintomas de vias aéreas superiores; de 6 a 10 anos, febre; de 11 a 20 anos,sintomas de vias aéreas superiores, seguido por consulta pré-natal; de 21 a 40 anos,consultas de pré-natal; de 41 a 60 anos, dor e, para a população de maiores de 60anos, mostrar exames. A resolutividade da equipe, medida pela solução do motivode busca ao serviço sem necessidade de encaminhamento, corresponde a 90% dosatendimentos.

Palavras-Chave: Atenção primária; Serviços de saúde.

1 Aluna do curso de medicina da Universidade Luterana do Brasil (ULBRA) – Canoas/RS.

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Mortalidade em crianças de cinco a nove anos, Porto Alegre, 1988 a 2000

Bol. da Saúde, v. 15, n. 1, 2001 v 159

Mortalidade em crianças de cinco a noveanos, Porto Alegre, 1988 a 2000

5º Congresso Brasileiro de Medicina de Família e Comunidade / 3º EncontroParanaense de Saúde da Família, de 15 a 17 de novembro 2001, Curitiba, PR.

Fernanda Rocha1; Carolina Neis1;Eliana Restellato1; Elson Romeu Farias2

Resumo: Tem sido relatada a importância da diversificação dos cenários paraa aprendizagem médica e a necessidade de formar um profissional voltado para asnecessidades da população. O objetivo deste trabalho é discutir um componentedessas necessidades, sintetizado pela mortalidade infantil, isto é, a prioridade aopré-natal e à puericultura. Buscamos então conhecer as causas de morte de crian-ças de cinco a nove anos de idade, residentes em Porto Alegre/RS, no período de1988 a 2000, e identificar os programas para essa faixa etária desenvolvidos pelasSecretarias de Saúde Municipal e Estadual e pelo Ministério da Saúde. Em agostode 2001, foram coletados os dados no Sistema de Informações sobre Mortalidade/DATASUS, por residência em Porto Alegre, segundo causa, na faixa etária de 05 a09 anos, no período de 1988 a 2000. Escolheu-se as cinco principais causas demorte para o estudo. O principal grupo de causas foi Causas Externas; as Neoplasiasficaram em segundo lugar; as Doenças do Aparelho Respiratório em terceiro; asDoenças do Sistema Nervoso em quarto e as Anomalias Congênitas em quinto. En-tre os programas municipais e estaduais, encontramos para as Doenças do Apare-lho Respiratório o Respire Aliviado, da Secretaria Municipal de Saúde, que equipa eamplia o atendimento de centros e unidades de referência nos períodos do ano emque cresce a incidência de afecções de vias aéreas e o Programa de Atendimento àCriança com Asma; para as causas externas encontramos a Campanha de Preven-ção de Trauma à Infância, Um Olhar Sobre a Violência e a Intoxicação Infatil. Foiinteressante aos estudantes de medicina entrar em contato com esse tipo de infor-mação e tecnologia, mostrando que as estratégias que os gestores da saúde, tantomunicipais como estaduais, vêm desenvolvendo decorrem da interpretaçãoepidemiológica e do alcance das ações estratégicas. Dois programas correspondema problemas passíveis de abordagem coletiva: atendimento às Doenças do Apare-lho Respiratório e prevenção e proteção quanto às Causas Externas.

Palavras-chave: Mortalidade infantil; Rio Grande do Sul; Doenças Respirató-rias.

1 Acadêmica de Medicina da Ulbra.2 Professor de Saúde Pública e Coletiva do Curso de Medicina da Ulbra. e-mail:[email protected]

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Atos Normativos

Atos Normativos

Atos Normativos

Atos Normativos

Atos Normativos

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Portaria Nº 183/2001

Bol. da Saúde, v. 15, n. 1, 2001 v 163

Portaria Nº 183/2001

A SECRETÁRIA DE ESTADO DA SAÚDE, no uso das atribuições que lhesconferem a constituição Estadual e a Lei Federal nº 8080, de 19 de setembro de1990 e

CONSIDERANDO QUE:

Há necessidade de contribuir para a adoção e aprofundamento de condutas epadrões éticos, por parte de todos os que pesquisam ou conduzem processos deprodução de conhecimento ou desenvolvimento técnico-científico no âmbito da saú-de;

A Resolução nº 196/96, de 10 de outubro de 1996, do Conselho Nacional deSaúde, aprova diretrizes e normas regulamentadoras de pesquisas, envolvendo se-res humanos e determina a constituição de um ou mais Comitês de Ética em Pesqui-sa – CEP, conforme as necessidades de cada instituição;

A observância às determinações nacionais no campo da ciência e da técnicana saúde requer a revisão ética e metodológica do desenvolvimento e incorporaçãocientífica e tecnológica compatível com o desenvolvimento sócio-cultural local, re-gional e nacional;

A Escola de Saúde Pública é órgão de ensino e pesquisa e desenvolvimentotécnico-científico, envolvendo seres humanos, ações e serviços de saúde,

RESOLVE:

Artigo 1º – Constituir Comitê de Ética na Pesquisa em Saúde na Escola deSaúde Pública, órgão consultivo, deliberativo, educativo e normativo corresponden-te ao Comitê de Ética em Pesquisa – CEP, previsto na Resolução nº 196/96, doConselho Nacional de Saúde, composto pelos seguintes membros:

Nara Regina Moura de Castilhos – Escola de Saúde Pública, como PresidenteCizino Risso Rocha – Escola de Saúde Pública, como Vice-PresidenteÁlvaro Roberto Crespo Merlo – Centro de Documentação e Pesquisa em Saú-

de e Trabalho da Universidade Federal do Rio Grande do Sul – CEDOP/UFRGSCeres Gomes Victora – Núcleo de Pesquisa em Antropologia do Corpo e da

Saúde da Universidade Federal do Rio Grande do Sul – NUPACS/UFRGSFlávio Lewgoy – Conselho Estadual de Saúde – como representante dos usu-

áriosIsabel Bet Viegas – Divisão de Vigilância SanitáriaKarin Fiori Hagemann – Centro de Saúde Escola Murialdo, pertencente à Es-

cola de Saúde PúblicaRenan Rangel Bonamigo – Ambulatório de Dermatologia SanitáriaSérgio Luiz Bassanesi – Hospital Sanatório Partenon e Universidade Federal

do Rio Grande do Sul/Medicina Social – DMS/FAMED/UFRGS

Artigo 2º – Designar, como Secretário Oeracional do CEP/ESP/RS, atendendo

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Portaria Nº 183/2001

164 v Bol. da Saúde, v. 15, n. 1, 2001

às determinações operacionais de sua presidência, o servidor Gilmar NorbertoBasso – Escola de Saúde Pública.

Artigo 3º – Esta Portaria entrará em vigor na data de sua publicação, revogan-do-se as disposições em contrário.

Porto Alegre, em 15 de fevereiro de 2001.

MARIA LUIZA JAEGERSecretária de Estado da Saúde

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Resolução Nº 23/2001 – CES/RS

Bol. da Saúde, v. 15, n. 1, 2001 v 165

Resolução Nº 23/2001 – CES/RS

O Conselho Estadual de Saúde do Rio Grande do Sul – CES/RS, em sua Reu-nião Plenária Ordinária realizada no dia 20 de dezembro do ano de 2001, no uso dasatribuições que lhe confere a Lei Federal 8142/90 e a Lei Estadual 10.097/94, e

Considerando o disposto nos Incisos III e V do Artigo 200 da ConstituiçãoFederal;

Considerando o disposto nos Incisos V e VI do Artigo 243 da ConstituiçãoEstadual;

Considerando o disposto no Inciso III, do Artigo 6º, nos Incisos IX e XIX doArtigo 14, no Artigo 15, no Inciso I e Parágrafo Único do Artigo 27 e no parágrafo 5ºdo Artigo 32 da Lei Federal 8.080, de 19 de setembro de 1990;

Considerando o disposto no Inciso XIII do Artigo 24 da Lei Federal 8.666/93,com redação dada pela Lei Federal 8.833/94, no Inciso II do Artigo 25 e nos IncisosII, III e IV do Parágrafo Único do Artigo 26, com redação dada pela Lei Federal 9.648/98, e no Artigo 13 da Lei Federal 8.666/93, com redação dada ao inciso III pela LeiFederal 8.883/94;

Considerando a Resolução 287/98, do Conselho Nacional de Saúde, que de-finiu a relação de profissões de saúde para fins de elaboração das diretrizes políti-cas da gestão em saúde;

Considerando o disposto na Lei Estadual 11.607, de 23 de abril de 2001, prin-cipalmente, em seus Incisos I e III do Artigo 2º:

Considerando que a consolidação e a implementação do Sistema Único deSaúde (SUS) requer a formalização e a execução de uma política de formação edesenvolvimento dos recursos humanos da saúde como responsabilidade comparti-lhada entre os órgãos gestores e os órgãos formadores;

Considerando que o ordenamento da formação de recursos humanos na áreada saúde, previsto no Inciso III, do Artigo 200, da Constituição Federal, é competên-cia do SUS e se faz com políticas de regulação, de apoio e de fomento;

Considerando que o fomento à pesquisa, ao ensino, ao aprimoramento cien-tífico-tecnológico e ao desenvolvimento de recursos humanos da área da saúde,como previsto na Constituição Estadual, Artigo 243, Inciso V, traduz-se, objetiva-mente, no financiamento da execução e na cooperação técnica, financeira eoperacional;

Considerando que a atribuição dos Estados, ao participarem na formulação ena execução da política de formação e desenvolvimento de recursos humanos paraa saúde e na realização de pesquisas e estudos na área da saúde, previstas na LeiFederal 8.080/90, Artigo 15, deve ser acompanhada de cooperação técnica, finan-ceira e operacional com as instituições de ensino, pesquisa, produção científico-tecnológica e de educação popular;

Considerando que a destinação de recursos financeiros transferidos às insti-tuições de ensino, pesquisa, produção científico-tecnológica e de educação populardeverá assegurar a organização de um sistema de formação de pessoal para o SUSem todos os níveis de ensino, inclusive de pós-graduação, além da elaboração deprogramas de permanente aperfeiçoamento profissional e constituição de camposde prática para o ensino e pesquisa nos serviços que integram o SUS, em conjunto

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Resolução Nº 23/2001 – CES/RS

166 v Bol. da Saúde, v. 15, n. 1, 2001

com o sistema educacional, como previsto na Lei Federal 8.080/90, Artigo 27,Considerando o que dispõe a Emenda Constitucional Federal nº 29 e a Emen-

da Constitucional Estadual nº 25, que tratam do percentual a ser gasto em ações eserviços públicos de saúde;

RESOLVE:

Artigo 1º – Aprovar a Política de Formação e Desenvolvimento de RecursosHumanos em Saúde para o SUS – Formação Solidária, da Secretaria da Saúde doEstado do Rio Grande do Sul.

Artigo 2º – Autorizar a SES/RS a firmar convênios com as Instituições de Ensi-no Superior com cursos na área da saúde e participantes do Pólo Estadual de Edu-cação em Saúde Coletiva e com as Associações Profissionais da Área da Saúdepara o desenvolvimento de atividades conjuntas de formação e desenvolvimento depessoal para o SUS.

Parágrafo único – Para a implementação das disposições do caput deste Arti-go, fica a SES/RS autorizada a utilizar recursos financeiros do orçamento de 2001no valor de R$ 3.900.000,00 (três milhões e novecentos mil reais).

Artigo 3º – Autorizar a SES/RS a firmar convênios com entidades sindicais epopulares para a realização de atividades conjuntas de capacitação de pessoal parao SUS, incluindo Conselheiros de Saúde, conselheiros do Orçamento ParticipativoEstadual e lideranças populares, com o objetivo de fortalecer o Controle Social parao acompanhamento das políticas de saúde.

Parágrafo único – Para a implementação das disposições do caput deste Ar-tigo, fica a SES/RS autorizada a utilizar recursos financeiros do orçamento de 2001no valor de R$ 1.500.000,00 (um milhão e quinhentos mil reais).

Artigo 4º – A realização das atividades de capacitação de conselheiros previs-tas nesta Resolução serão acompanhadas diretamente pela Comissão de Forma-ção de Conselheiros do CES/RS.

Artigo 5º – A SES/RS deverá apresentar ao CES/RS, por meio do Relatório deGestão do SUS no RS, dados consolidados e análises dos impactos produzidos naimplementação desta Resolução.

Artigo 6º – Esta Resolução entra em vigor na data de sua publicação.

Porto Alegre, 20 de dezembro de 2001.

ADALGIZA BALSEMÃO ARAÚJOPresidente do Conselho Estadual de Saúde/RS

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Resolução Nº 23/2001 – CES/RS

Bol. da Saúde, v. 15, n. 1, 2001 v 167

HOMOLOGAÇÃO

A Secretária da Saúde do Estado do Rio Grande do Sul, na qualidade deGestor Estadual do Sistema Único de Saúde e de acordo com os preceitos do Pará-grafo Único, do Artigo 5º, da Lei Estadual nº 10.097, de 31 de janeiro de 1994, homo-loga a Resolução CES/RS nº23/2001, de 20 de dezembro de 2001, do ConselhoEstadual de Saúde.

Porto Alegre, 20 de dezembro de 2001.

MARIA LUIZA JAEGERSecretária de Estado de Saúde

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Atenção montadora página 168 é branca

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Normas EditoriaisNormas EditoriaisNormas EditoriaisNormas EditoriaisNormas Editoriais

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Atenção montadora página 170 é branca

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Política e Normas Editoriais

Bol. da Saúde, v. 15, n. 1, 2001 v 171

BOLETIM DA SAÚDEPOLÍTICA E NORMAS EDITORIAIS

POLÍTICA EDITORIAL

1 Identificação

Com início em 1969, o Boletim da Saúde é um periódico de divulgação, inicial-mente publicado pela Secretaria de Estado dos Negócios da Saúde do Rio Grandedo Sul. De 1974 até 1980, sua publicação realizou-se em convênio com a FundaçãoSESP- Serviço Especial de Saúde Pública. Desde 1981, a Escola de Saúde Públicada Secretaria da Saúde e do Meio Ambiente do Rio Grande do Sul – SSMA, passoua ser responsável pela revista. Em 1986 foi interrompida a publicação do Boletim daSaúde. Após longo intervalo, o periódico está sendo republicado com nova apresen-tação e nova política editorial, enfatizando a informação técnico-científica, e com aexpectativa de continuidade editorial efetiva ao longo do tempo.

O Boletim da Saúde está registrado no Instituto Brasileiro de Informação emCiência e Tecnologia – IBICT, sob o International Standard Serial Number – ISSN0102-1001.

2 Objetivos

O Boletim da Saúde visa a difusão do conhecimento em saúde coletiva desdea produção, disseminação e uso deste conhecimento a partir da pesquisa, do estu-do, da práxis, além do desenvolvimento e debate na área. O periódico pretende tertambém um caráter regionalizado, recebendo contribuições das universidades públi-cas e comunitárias integradas ao objetivo comum de reflexão teórico/prática em saú-de coletiva.

3 Distribuição

A responsabilidade pela distribuição do Boletim da Saúde será do Centro deInformação e Documentação em Saúde – Ceids, com a contribuição da Assessoriade Comunicação Social da SES/RS e colaboradores interessados.

4 Abrangência dos trabalhos

Os diversos setores da SES-RS e Políticas da Secretaria estão estimulados econvidados a apresentar originais.

A proposta é que se tenha, por meio dos trabalhos apresentados, uma interfaceda recomposição da memória institucional e a necessidade constante de atualiza-ção, educação continuada, pesquisa, estudo e debate em saúde coletiva.

Todas as matérias serão submetidas ao julgamento de pareceristas – Comis-são Editorial e do Conselho Editorial.

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Política e Normas Editoriais

172 v Bol. da Saúde, v. 15, n. 1, 2001

5 Periodicidade

Revista semestral.

6 Tiragem

Inicial de 2000 exemplares.

NORMAS EDITORIAIS

1 Informações aos colaboradores

As matérias a serem elaboradas devem ter como eixo temático os princípiosorientadores da atual gestão da saúde pública no Estado, estruturados em:

1. artigos de periódico – originais, inéditos ou de revisão;2. ensaios e reflexões;3. relatos de experiências;4. exposição de enfoque gerencial e das políticas;5. estudo de caso;6. notícias de projetos de pesquisa ou de ação, sob forma de notas ou resu-

mo;7. resenhas (resumos de textos lidos e importantes para divulgação);8. trabalhos apresentados em eventos;9. textos formulados para estudo nas equipes ou para ensino;

10. trabalhos de alunos ou textos de professores e convidados;11. memória;12. atos normativos.

Também apresenta seções de:1. cartas ao editor: comentários dos leitores sobre trabalhos publicados,

expressando concordância ou discordância, explicando as razões;2. editorial.

2 Definição das estruturas

• Artigo de Periódicos – Texto com autoria declarada, que apresente e discutaidéias, métodos, técnicas, processos e resultados nas diversas áreas do conheci-mento. O artigo pode ser:

a) original, quando apresenta temas ou abordagens próprias;b) de revisão, quando resume, analisa e discute informações já publicadas.

• Ensaios e Reflexões – Textos analíticos resultantes de estudos, pesquisas erevisões .

• Relatos de Experiências – Apresentação de experiência profissional, base-ada no estudos de casos de interesse, acompanhados de comentários sucintos,

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Política e Normas Editoriais

Bol. da Saúde, v. 15, n. 1, 2001 v 173

úteis para a atuação de outros profissionais na área.

• Exposição de enfoque gerencial e das políticas

• Estudo de caso – Um estudo de caso refere-se a uma análise intensiva deuma situação particular. É uma inquirição empírica que investiga um fenômeno con-temporâneo dentro de um contexto da vida real.

• Notícias de projetos de pesquisa ou de ação – Em formato de resumo.

• Resenhas – De maneira genérica, a recensão ou resenha designa um tipode trabalho de síntese, análise resumida ou arrolamento de produções científicas,ou ainda, exposição sintética de assuntos tratados em uma obra. A recensão críticaanalisa em profundidade o assunto, conferindo apreciação do valor informativo daobra. Geralmente é elaborada por especialistas da área em questão.

• Resumos – Apresentação concisa dos pontos relevantes de um texto. Resu-mo Informativo – Informa suficientemente ao leitor, para que este possa decidir so-bre a conveniência da leitura do texto inteiro. Expõe finalidades, metodologia, resul-tados e conclusões.

• Memória e História – Resgate histórico da memória da Secretaria de Estadoda Saúde através de colunas fixas que relatam o antes (a história), e como estãohoje as principais instituições.

• Atos Normativos – Textos legais de importância para o desempenho deações didático-pedagógicas da Escola de Saúde Pública, ou outras julgadas impor-tantes.

3 Orientações gerais para apresentação dos originais

Todos os trabalhos devem ser enviados em duas cópias impressas em papel eem disquete no editor de textos Word for Windows, em espaço duplo, com margemesquerda de 3 cm e margem direita de 2 cm, margem superior 2,5 cm e inferior 1,5cm, fonte Times New Roman 12, com no máximo 20 páginas.

A primeira página (folha de rosto) deverá conter apenas o título do trabalho,versão em inglês do título, nome(s) completo(s) do(s) autor(es), indicando o respon-sável pela correspondência, nome e endereço(s) da instituição a que está vincula-do, além de breve currículo do(s) autor(es).

Recomenda-se que os trabalhos sigam a seguinte estrutura:• título (em letras minúsculas, somente a primeira letra em maiúscula);• autoria;• resumo (em português);• palavras-chave (em português);• texto (introdução, métodos, resultados, discussão e conclusões), podendo

haver subtítulos. Os elementos de apoio ( notas, tabelas, quadros, fórmulas e ilustra-ções) deverão estar inseridos dentro do texto;

• referências;

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Política e Normas Editoriais

174 v Bol. da Saúde, v. 15, n. 1, 2001

• anexos;• tradução do resumo em inglês.

Os originais serão publicados em língua portuguesa. Os trabalhos devem se-guir, rigorosamente, as normas da Associação Brasileira de Normas Técnicas –ABNT.

– Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE – Normas deapresentação tabular.

OBS: Todas as normas citadas estão à disposição no Ceids.

3.1 Título Termo ou expressão que indica o conteúdo do artigo.

3.2 AutoriaNome completo de cada um dos autores, titulação mais importante de cada

autor, instituição ao qual está vinculado, endereço eletrônico e telefone para contato.

3.3 ResumoResumo informativo, conforme NBR 6028, em português, destacando objeti-

vos pretendidos, metodologia empregada, resultados mais importantes e principaisconclusões. A extensão deve ser de até 250 palavras.

3.4 Palavras-chave ou descritoresIndicar de três a seis palavras-chave, que são termos ou expressões

indicativas do conteúdo do trabalho. Pode-se empregar termos integrantes da listapublicada pelo Centro Latino-Americano e do Caribe de Informação em Ciências daSaúde – Bireme, disponível no endereço eletrônico: http://decs.bvs.br/.

3.5 TextoOs artigos de investigação científica poderão ser organizados segundo a es-

trutura formal: Introdução, material e método, resultados, discussão e conclusões.Contudo, metodologias de caráter qualitativo, pesquisa-ação, etc. podem apresen-tar-se em formas compatíveis com estes métodos.

3.5.1 Elementos de apoioNotas, citações, gráficos, tabelas, figuras, fotografias, ilustrações, quadros, etc,

devem limitar-se ao mínimo indispensável e aparecer o mais próximo possível dotexto a que se referem.

Gráficos e tabelas devem ser construídos segundo as Normas de Apresenta-ção Tabular do IBGE, com um título e legendas explicativas .

Fotografias apresentadas devem conter título explicativo.

3.6 AgradecimentosBreves e objetivos, somente para contribuições significativas para o trabalho.

Devem ser mencionados apoio financeiro e material recebidos. As pessoas listadasnos agradecimentos endossam os dados e as conclusões e precisam dar seu con-sentimento para serem incluídas na lista de agradecimentos.

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Política e Normas Editoriais

Bol. da Saúde, v. 15, n. 1, 2001 v 175

3.7 ReferênciasDevem aparecer listadas em ordem alfabética ou numérica para facilitar a cita-

ção do trabalho. A exatidão das mesmas é de responsabilidade do(s) autor(es). Suaelaboração segue a Norma da ABNT.

3.8 AnexosDocumentos, nem sempre do autor do artigo, que serve de fundamentação,

comprovação ou ilustração.

3.9 Tradução do resumoA apresentação do resumo (summary) em inglês e (Resumen) em espanhol

deverá ser uma versão exata do resumo em português.

3.10 Key-words e palabras claveApresentação das palavras-chave em inglês e espanhol.

4 Ética

Todos os trabalhos que tratem com experimentos em seres humanos ou ani-mais, serão previamente encaminhados ao Comitê de Ética da Escola de SaúdePública para apreciação.

O comitê orientará quanto a critérios específicos.

5 Responsabilidade

As opiniões emitidas nos trabalhos, bem como a exatidão, adequação e proce-dência das referências e citações bibliográficas, são de exclusiva responsabilidadedos autores.

6 Abreviaturas

Devem ser evitadas, pois prejudicam a leitura confortável do texto. Quandoforem usadas, devem ser escritas por extenso ao serem mencionadas pela primeiravez no texto.

7 Seleção dos trabalhos

Os trabalhos recebidos para publicação no “Boletim da Saúde”, serão encami-nhados para o Grupo de Pareceristas, para análise, respeitando o anonimato.

8 Trabalhos já publicados

Serão aceitos trabalhos já publicados em outros periódicos, desde que autori-zados pelo Conselho Editorial do periódico onde o artigo tenha sido originalmentepublicado.

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Política e Normas Editoriais

176 v Bol. da Saúde, v. 15, n. 1, 2001

9 Envio do artigo

Os trabalhos para a apreciação do Conselho Editorial devem ser enviadospara o Centro de Informação e Documentação em Saúde – Ceids, Av. Ipiranga 6311– Bairro Partenon, CEP 90610-001, e-mail: [email protected] .

Telefones: 3384-5290 e 3384-3148 – Fax: 3384-1419