Estrategística - Maximizando o Sucesso da Logística pela Estratégia

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Artigo publicado na edição 09 www.revistamundologistica.com.br março/abril de 2009 Assine a revista através do nosso site

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Primeiro artigo sobre Estrategística escrito em 2008 e publicado em março/abril de 2009. Formatação cortesia da MundoLogística.

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Artigo publicado na edição 09

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Rodrigo Guerra, PMP ([email protected]):é formado em Engenharia Mecânica e Física com pós-graduação em Gerenciamento de Projetos pela George Washington University e MBA em Finanças pela FIA, é diretor geral da São Paulo Distribuição e Logística (SPDL) e membro do conselho consultivo da In-Haus. Rodrigo possui mais de 15 anos de experiência em Logística, TI, Gestão e Estratégia de Negócios, já tendo atuado em várias empresas no Brasil e nos EUA.

empre achei que minhas melhores idéias surgiam no chuveiro. Quando as compartilhava com meus colegas de trabalho, muitos

sugeriam que parasse de tomar banho, mesmo com todas as conse-quências adversas que isso poderia trazer. Foi após uma destas “chuveiradas” que conversei por e-mail com o Marco (editor da MundoLogística) sobre um novo artigo que gostaria de escrever. Minha sugestão era começarmos 2009 de forma mais leve e um pouco mais contemplativa. Não sabíamos como a eminente cri-se financeira afetaria a produção das empresas e tampouco seus investimentos, mas acreditávamos que novos tempos viriam e, com o possível aperto de caixa e redução de custos, a necessidade de fazer logística de forma mais eficaz e efi-ciente. Mas isso não era tudo. Até então a luta dos logísticos sempre foi essa. Acontece que aparentemente ainda faltava algo. A “logística” ainda precisava ser incorporada definitivamente na definição mais profunda da grande estratégia das empresas. Somente assim, estaríamos preparados para lidar com as quebras de paradigma que esta “nova ordem mundial” pintava para este ano. O tema ain-da estava meio “frouxo”, afinal, o tópico não era especifico e, muito menos, téc-nico como a maioria dos demais artigos da revista. De qualquer forma, o Marco me encorajou. Ambos acreditávamos que os leitores poderiam se beneficiar com artigos que tratassem de logística de forma mais ampla, abordando estratégia e outros assuntos relacionados. Pois bem, aqui estamos.

EstrategísticaMaximizando o sucesso da logística pela estratégia

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Capa • Estrategística

“Estratégia” vem da palavra grega “stratēgos”, que por sua vez deriva de duas outras palavras gregas, “stratos” que significa “exército” e “ago” que sig-nifica “liderar”. Já a palavra “logística” tem a mesma raiz que “lógica”. Ambas derivam da também grega “logos”, que significa “cálculo, razão, argumen-to, pensamento, princípio, idéia”. O fato de não ser filólogo (sujeito que estuda a origem das palavras) me dá alguma liberdade para fazer traduções romantizadas. Foi justamente daí que surgiu o termo “estrategística”, ou seja, a união da estratégia com a logística, ou de forma poética, “liderar o exército pelo cálculo, razão e argumento”. Não vou dizer que este termo é meu. Afinal, o Google já tem algumas incidências desta “palavra” tanto em português como em inglês, e na internet existe até mesmo um site de planejamento energético com este nome. De toda forma, não “googuei” nenhum concei-to apropriado para o que imaginava ser a verdadeira essência da “estrate-gística”, portanto, usarei o meu.Mas e daí? Por que criar uma palavra nova? Apenas para inferir que deva existir alguma área de interseção entre estratégia e logística? Isso não parece óbvio? A princípio parece. Mas não é.

Entendendo a Ciência da Logística

Antes de atacar as perguntas anteriores, vamos introduzir um novo assunto: “Complexidade”. “Ah... Esse termo é um velho conhecido dos brasileiros”, alguém poderia dizer. Afinal quem já não ouviu “nem mexe nisso que a coisa é complexa”, ou “não consigo entender minha mulher; uma hora quer uma coisa, outra hora quer outra”, no qual o amigo responde: “Liga não, mulher é assim mesmo, êta bicho complexo.”1 Mas não é bem por aí. Complexidade é também um termo téc-nico e possui dezenas, senão centenas, de aplicações nos mais diversos campos. Para fim deste artigo, vamos explorar brevemente complexidade no que tange a Teoria da Complexidade Computacional (TCC).

A TCC nada mais é do que uma ramificação da Teoria da Computação, da dis-ciplina da Ciência da Computação, e trata de investigar problemas relacionados à quantidade de recursos necessários para a execução de um algoritmo, e a dificul-dade inerente em criar algoritmos eficientes para problemas computacionais es-pecíficos. Em outras palavras, dado um problema, “quanto de máquina” e “quanto de tempo” serão necessários para resolvê-lo e se “existe uma solução ótima para ele”. Embora o leitor possa desconhecer sobre o assunto, ele é extremamente re-levante para boa parte de nossas operações logísticas do dia-dia e está presente em quase todo software que porventura utilizamos.

Uma das características da TCC é dividir os problemas em seus tipos, ou mais especificamente, nas classes de algoritmos que irão resolvê-los. Atualmente exis-tem centenas de classes de algoritmos e inúmeras relações entre elas, mas as mais conhecidas são a P, a NP, a NP-completo e a PSPACE.2

1. Minha esposa diz que os homens são idênticos às mulheres neste quesito. A julgar pelos amigos que tenho, tomo isso como verdade absoluta.

2. O diagrama apresentado na figura 2 foi adaptado da revista Scientific American Brasil de abril de 2008, página 61, artigo “Os Limites do Computador Quântico”, escrito por Scott Aaronson, professor assistente de

engenharia elétrica e de ciências da computação do Massachusetts Institute of Technology. Obs.: este artigo apresenta uma breve definição das três primeiras classes. A PSPACE aparece no gráfico apenas para demons-

trar os tipos de problema que a ela pertencem e sua relação com as demais, mas não é explorada ao longo do texto. Para mais informações, veja www.complexityzoo.com.

Neste ano que inicia, com a formação de uma possível nova or-dem econômica mundial, é fundamental que paremos para analisar o modo como “fazemos logística” e a importância da incorporação do pensamento estratégico em nosso dia-a-dia. Desta forma, esta-remos muito mais preparados para as adversidades que enfrentare-mos no futuro. Pense “estrategisticamente”!

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Figura 1. Principais classes de algoritmos e exemplos de problemas.

Problemas da classe P, como o próprio nome indica, são os que podem ser resolvidos em “tempo polinomial”. Ou seja, a quantidade de tempo necessária para resolver o problema aumenta a uma potencia fixa, como, por exemplo, n2 ou n3, conforme cresce n. Problemas de programação linear, como, por exemplo: a) colocar uma lista de nomes em ordem alfabética e b) encontrar o maior divisor comum entre dois números, e problemas de análise combinatória, tais como, c) dada uma lista de operadores de empilhadeira seniores e operadores juniores, se é possível formar pares de mentor-mentorado de cada júnior com o sênior dese-jado, são exemplos de problemas da classe P.

Problemas da classe NP, ou “tempo não polinomial”, são muito mais comple-xos e também muito mais abrangentes. Problemas deste tipo, onde o tempo para resolução não aumenta a uma potencia fixa, englobam grande parte dos proble-mas mais simples de logística. Problemas de acondicionamento de caixas em um caminhão e de roteirização, por exemplo, são da classe NP.3

Como e possível ver no diagrama da figura 1, existe uma subclasse de NP chamada NP-completo. Problemas desta classe têm duas características bastante particulares. Primeiro, dada uma solução, ela pode ser validada em tempo polino-mial. Segundo, se o problema puder ser verificado em tempo polinomial, então o algoritmo de resolução do problema pode ser utilizado para resolver qualquer outro tipo de problema da classe NP. Calma! Não vamos muito mais longe do que isso. Os próximos parágrafos explicam exatamente o que são problemas do tipo NP-completo.

Para nossa sorte, os cientistas da computação já trabalharam muito neste campo e identificaram quase todos os problemas deste tipo. Além do mais, estes problemas são tão conhecidos, que para facilitar a compreensão têm até nome pró-prio. Entre eles, três dos mais conhecidos são o Problema da Mochila, o Problema do Caixeiro-Viajante e o Problema da Cobertura de Vértices. Veja que estes proble-mas têm inúmeras aplicações de ordem prática. O primeiro deles é análogo a um velho conhecido nosso, o de alocar caixas dentro de um caminhão. Neste caso, ma-ximizando o valor total da carga, para que apenas um caminhão necessite de escol-ta, enquanto os demais da mesma rota possam ir desacompanhados. O segundo é um problema de roteirização clássico. No mundo de distribuição de jornais, em que trabalho, esse tipo de problema é uma constante. Estamos sempre desenvolven-

3. Apenas como exemplo para os mais curiosos, o Problema do Caixeiro Viajante que veremos a

seguir é resolvido na razão de tempo n22n em que n é o número de cidades visitadas.

do e analisando as melhores rotas de nossos entregadores. Existem também inúmeras outras aplicações para este problema na área de distribuição urba-na, tais como a distribuição de bebidas e de cigarros. O terceiro problema, o da Cobertura de Vértices, por sua vez tem aplicação direta em casos de localiza-ção de Centros de Distribuição. No caso da distribuição de jornais, por exemplo, no qual são feitas milhares e milhares de entregas todas as madrugadas, sa-ber quantos e onde localizar os CDs dos jornais é extremamente importante.

Até então tudo bem, mas porque um profissional da logística precisa entender estes conceitos? Por que precisamos conhecer sobre Comple-xidade? Conforme disse há pouco, os cientistas da computação já trabalha-ram muito por nós e provaram que se qualquer problema da classe NPC for resolvido por um algoritmo de tem-po polinomial, então todos os demais também serão resolvidos pelo mesmo algoritmo! Isso é uma notícia maravi-lhosa para nós, logísticos. Acontece que “nem tudo são rosas”. Infelizmente ainda não foi encontrado tal algoritmo e, portanto, todos os problemas da classe NP ainda precisam ser resolvi-dos em tempo não-polinomial.

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Exemplos de problemas

Xadrez Go

PSPACE

Mai

s C

omp

licad

os

NP-completo

NP

P

Problema da MochilaProblema do Caixeiro ViajanteProblema da Coberura de Vértices

Isomorfismo Gráfico

Teste de Números primos União de Duplas

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Veja que cada caixa possui um valor e um peso. O problema da mochila consiste em maximizar o valor dentro da mochila respeitando o peso má-ximo. Este problema, originalmente proposto por Richard Karp, é da classe NP-completo. Para mais informações, consulte “Problema da Mochi-la” em pt.wikipedia.org ou “Knapsack Problem” em en.wikipedia.org.

Se um caixeiro inicia do ponto A, e se as distân-cias entre cada par de pontos é conhecida, qual é o menor caminho que visita todos os pontos e retor-na ao ponto A? Este é o segundo exemplo de um problema da classe NP-completo. Foi originalmen-te analisado pelo matemático irlandês Sir William Hamilton nos anos 1800. Para mais informações, consulte “Problema do Caixeiro Viajante” em pt.wikipedia.org ou “Travelling Salesman Problem” em en.wikipedia.org.

“Cobertura” é um termo matemático utilizado para descrever um grupo de vértices (em verme-lho), a partir dos quais podem ser traçados arcos (em azul) que representam o conjunto completo das interações entre os vértices. Veja que com os dois pontos assinalados em vermelho, todos os ar-cos são demarcados ao menos uma vez. Outra solu-ção de cobertura do gráfico ao lado seria marcar em vermelho só três vértices da coluna do meio. Para mais informações, veja “Vertex Cover Problem” em en.wikipedia.org.

Problema da Mochila: 4

Problema do Caixeiro Viajante: Problema da Cobertura de Vértices:

4 Os gráficos e as explicações básicas podem ser encontrados em www.wikipedia.org sob seus respectivos verbetes.

5. TMS é a sigla em inglês para Transportation Management System, ou Sistema de Gestão de Transportes.

Tudo bem, mas e daí? Daí a dura realidade que varia de caso a caso. Para alguns, o TMS pode levar horas para rodar.5 Para outros, os computadores passarão a noite mastigando dados para criar um roteiro de entrega minimamente acei-tável para o dia seguinte. No meu, uma simples constatação. Identificar qual a solução mais eficiente de todas para entre-ga de jornais, levando em consideração a melhor localização dos centros de distribuição, os melhores roteiros, os melhores veículos, e os volumes perfeitos, levaria em torno de, diga-mos, um bilhão de anos. Neste tempo, os assinantes já teriam “virado pó”. Inclusive eu, pela quantidade de “sopapos” que teria levado dos acionistas da empresa.

Em outras palavras, a “logística” que conhecemos hoje não é nem de perto tão simples e nem tão linear quanto parece. “Fazer logística”, em muitos casos, não significa ne-

cessariamente “ser o mais eficiente” e nem “ser o mais efi-caz”. Significa sim, encontrar uma solução minimamente apropriada para a maioria dos problemas que tratamos no dia-a-dia. É justamente nesta constatação que estamos inte-ressados, pois é dela que derivam todas as perguntas mais difíceis de serem respondidas e que, em última instância, resumem-se da seguinte forma: “Vale a pena mudar a forma como estamos fazendo para tentar fazer melhor?”

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Conhecendo a Arte da Estratégia

Da mesma forma que a ciência da logística não é tão linear quanto parece, o outro lado da “estrategística”, a arte da estratégia, também não é tão assimétri-ca quanto em geral se acredita.

Em um de seus relatos para Florença sobre como lidar com rebeldes em Val di Chiana, Maquiavel escreveu: “Especial-mente para príncipes, a história é um manual de instruções em como agir... Seres humanos sempre tiveram as mes-mas paixões e se portaram da mesma forma... Sempre existiram os que coman-daram e os que obedeceram, alguns de bom grado e outros nem tanto...” Difi-cilmente este trecho por si só pode ser encarado como uma grande pérola de sabedoria.6 Qualquer gestor do mundo atual com um mínino de estrada sabe disso. Maquiavel retratou algo de forma simples e clara, mas que intrinsecamen-te é um tanto óbvio. Mas então o que faz de Maquiavel, Maquiavel? Não seria sim-plesmente a arte de interpretar e aplicar com imensa inteligência e incontestável destreza a essência da sabedoria mun-dana?

Partindo deste princípio, que gran-des estrategistas na verdade são apenas pessoas com uma imensa capacidade de assimilar, processar e aplicar a essên-cia das ações humanas na sua interação com seus semelhantes e com o meio, avaliemos alguns tratados conhecidos buscando entender um pouco suas li-nhas de pensamento estratégico. Veja-mos o clássico A Arte da Guerra de Sun-Tzu.7 O livro tem 13 capítulos, cada um tratando de uma característica particular da arte da guerra. O texto e a linguagem utilizada são tão antigos, que nem mes-mo os tradutores concordam nos nomes dos capítulos. Mas em termos gerais eis do que tratam os mais importantes.8

Capítulo 1: Avaliação. Explora os cinco elementos-chave que definem a posição competitiva (missão, clima,

6. Tanto a citação como a frase que segue (parafraseada), vem da página 31 do livro Machiavelli in 90 minutes de Paul Strathern.

7. Escrito em algum momento entre 400 A.C. e 200 A.C., A Arte da Guerra é um dos mais antigos tratados sobre estratégia militar. Apenas como curiosidade, os histo-

riadores até hoje divergem se Sun-Tzu realmente existiu ou se é apenas uma figura folclórica.

8. Os títulos dos capítulos em português vêm da tradução de Caio Fernando Abreu e Mirian Paglia Costa. As descrições são adaptações do verbete “The Art of War” em

en.wikipedia.org.

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terreno, liderança e métodos) e como avaliar suas vantagens competitivas contra as de seu inimigo.

Capítulo 2: Conduzindo a Guerra. Explica como entender a natureza econômica da Guerra e como o sucesso requer a jogada vitoriosa, que por sua vez requer limitar os custos do conflito.

Capítulo 3: Planejando o Ataque. Define a fonte da força como a união, não como tamanho, e os cinco ingredientes necessários para ser bem-sucedido em qualquer situação de competição.

Capítulo 4: Posições Estratégicas. Explica a importância de defender uma posi-ção atual até se poder avançar e como é preciso reconhecer oportunidades ao invés de tentar criá-las.

Capítulo 5: Vantagem Estratégica. Explica como utilizar criatividade e ter uma correta noção de tempo para construir aos poucos o impulso para a vitória.

Capítulo 6: Pontos Fracos e Pontos Fortes. Explica como as oportunidades vêm dos espaços abertos deixados pelos competidores em uma determinada área.

Capítulo 7: Manobras. Explica os perigos dos confrontos diretos e como vencer tais confrontos quando estes forem forçados sobre você.

Capítulo 8: As Nove Contingências. Foca na necessidade de ser flexível nas res-postas e em como responder com sucesso às mudanças de circunstâncias.

Capítulo 13: O Uso de Espiões. Foca na importância de desenvolver boas fontes de informação e em como gerenciá-las.Perceba que o tratado de Sun-Tzu detalha especificamente estratégia militar

e não estratégia corporativa. De toda maneira, com todo o “hype” que atualmente existe ao redor deste livro, é um tanto difícil não compará-lo com o mundo em-presarial. Mas com todo o respeito devido ao grande clássico, não seria boa parte do conteúdo um tanto óbvio? Veja: Capítulo 1: Avaliação. Qual gestor de empresa que não conhece sua concorrên-

cia? Capítulo 2: Conduzindo a Guerra. Quem não planeja quanto irá gastar para pro-

mover seus produtos/serviços? Capítulo 3: Planejando o Ataque. Qual gestor não coordena os esforços das dife-

rentes áreas da empresa na hora de lançar um produto/serviço, buscando maxi-mizar seus ganhos?

Capítulo 4: Posições Estratégicas. Qual gestor não defende “com unhas e dentes” o seu market share?

Capítulo 5: Vantagem Estratégica. Qual gestor não avalia o timing do lançamen-to de seus produtos/serviços no mercado?

Capítulo 6: Pontos Fracos e Pontos Fortes. Qual gestor não avalia os pontos fortes e fracos de suas empresas e de seus produtos/serviços?

Capítulo 7: Manobras. Qual gestor nunca se deparou com uma situação de con-corrência feroz e criou estratégias para deslocar os competidores e ganhar um contrato?

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9. É claro que estou simplificando, mas o ponto aqui não é destrinchar a fundo a obra de Sun-Tzu, e sim fazer com que o leitor perceba que

embora os ensinamentos sejam intrinsecamente simples, a prática deles no dia-a-dia certamente não é.

10. O Arthashastra é um clássico (e extenso) tratado político da Índia, escrito em Sânscrito entre os anos 321 e 300 A.C. pelo estadista e filósofo

indiano Chanakya, também conhecido como Kautilya ou Vishnugupta. Para mais informações, veja www.wikipedia.org.

11. Purohita é um sacerdote da família real. A origem da palavra é Hindu.

Agora, mais uma pergunta. Qual gestor pratica tudo isso com a constância que deveria?9

Da China antiga para a Índia, em Arthashastra, o autor divide o dia do Raja-rishi, ou “rei”, em oito períodos de 90 minutos, sendo que:10

Neste Horário... O rei deve...

Primeiros 90 minutos após o nascer do sol (de 06:00 a 07:29)

Receber relatórios sobre defesa, receitas e despesas

Segundos 90 minutos apos o nascer do sol (de 07:30 a 08:59)

Conduzir audiências públicas para ouvir petições de pessoas da cidade e do campo

Terceiros 90 minutos após o nascer do sol (09:00 a 10:29) e últimos 90 minutos antes do meio-dia (10:30 a 11:59)

Receber receitas e tributos; apontar ministros e outros oficiais de alta patente e distribuir tarefas para cada um deles

Primeiros 90 minutos após o meio-dia (de 12:00 a 13:29)

Escrever cartas e comunicados; debater com conse-lheiros; receber informações secretas dos espiões

Segundos 90 minutos após o meio-dia (de 13:30 a 14:59)

Utilizar como tempo pessoal para recreação e medi-tação

Terceiros 90 minutos após o meio-dia (de 15:00 a 16:29) e últimos 90 minutos antes do pôr-do-sol (de 16:30 a 17:59)

Inspecionar as forças; consultar com o ministro da defesa

Primeiros 90 minutos após o pôr-do-sol (de 18:00 a 19:29)

Conduzir entrevistas com agentes secretos

Segundos 90 minutos após o pôr-do-sol (de 19:30 a 20:59)

Tomar banho, jantar e estudar

Terceiros 90 minutos após o pôr-do-sol (de 21:00 a 22:29, últimos 90 minutos antes da meia noite (de 22:30 a 23:59) e primeiros 90 minutos após a meia noite (de 24:00 a 01:29)

Retirar-se aos aposentos ao som de música, dormir

Segundos 90 minutos após a meia noite (de 01:30 a 02:59)

Após caminhar ao som de música, meditar sobre as-suntos políticos e sobre o trabalho a ser feito

Terceiros 90 minutos após a meia noite (de 03:00 a 04:29)

Consultar conselheiros e enviar espiões

Últimos 90 minutos antes do nascer do sol (de 04:30 a 05:59)

Executar tarefas religiosas, domésticas e pessoais; encontrar com seu professor, conselheiro de rituais, purohitas11, médico particular, chefs de cozinha e as-trólogo

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Capítulo 8: As Nove Contingências. Qual gestor nunca flexibilizou suas posições após entender que as circunstâncias haviam mudado?

Capítulo 13: O Uso de Espiões. Qual gestor não busca informações sobre seus concorrentes de mercado?

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12. Esta citação está presente em quase tudo o que é escrito sobre o Arthashastra. Veja “Arthashastra” em en.wikipedia.org.

13. Talvez a única coisa que as empresas não façam hoje em dia é consultar os astrólogos. Para isso temos analistas de mercado.

14. Da Guerra é um livro muito mais denso que os demais livros citados. Até a própria forma de escrever de Clausewitz faz com que a leitura se torne extremamente difícil. Mas para os que se interessarem, um bom

lugar para começar é no endereço www.clausewitz.com.

Incorporando a Essência da “Estrategística”

Mas, então, todos estes tratados sobre estratégia são iguais? Certamente não, no entanto em vários momentos eles compartilham idéias e filosofias bem simi-lares. Os conceitos de Sun-Tzu reaparecem em Greene, que por sua vez também estão presentes em Da Guerra, de Clausewitz. As idéias de Musashi sobre a forta-leza do espírito, determinação, garra e gana de vencer também permeiam as de Odebrecht, e por aí vai, cada um em seu tempo.

Uma das características do Ar-thashastra é a constante condenação da preguiça. “Se o rei for energético, seus súditos serão igualmente ener-géticos. Se ele for frouxo (e pregui-çoso em cumprir seus deveres), seus súditos também serão frouxos e de-vorarão sua riqueza. Além disso, um rei preguiçoso cairá facilmente nas mãos de seus inimigos.” 12Veja a seme-lhança do texto com o mundo atual. “Receber relatórios de receita e des-pesa” não é o mesmo que fazer reuni-ões de acompanhamento de resulta-do? “Escrever cartas e comunicados” não seria enviar e-mails? “Inspecionar as forças” não é exatamente visitar a operação no chão de fábrica? “Medi-tar sobre assuntos políticos” e “deba-ter com conselheiros” não são aná-logos às reuniões de conselho para discutir as estratégias da empresa?13 A preguiça real condenada pelo Ar-thashastra hoje em dia é vista como a falta de processos empresariais. E o contrário dela, “a arte da disciplina” é o que é tão pregado pelas gestões modernas.

Da Índia ao Japão, no Livro dos Cinco Anéis, outro clássico sobre es-tratégia militar, logo na introdução do capítulo “Livro da Água”, Miyamo-to Musashi apresenta uma brilhan-te definição de estratégia. “Tendo a água por base, o espírito se torna semelhante à água. A água adota a forma do recipiente que a contém, às vezes, goteja e, às vezes, é mar bravio. O estrategista transforma pequenas coisas em grandes coisas, como cons-truir um grande Buda a partir de uma pegada. O princípio da estratégia é, tendo-se um elemento, saber dez mil. De forma similar, um gestor vive tal ensinamento quase todos os dias de sua vida empresarial. Quem espera saber todos os detalhes de um as-sunto antes de tomar uma decisão ou mesmo planejar uma ação?

Do Japão à Alemanha, talvez o mais estudado tratado sobre guerra e estra-tégia do mundo moderno seja o Da Guerra, de Carl Von Clausewitz.14 Embora a frase que tenha imortalizado o mestre seja “a guerra nada mais é do que a con-tinuação da política”, a síntese de seu trabalho é muito mais profunda. Aceite três princípios, prega Clausewitz. Primeiro que, violência primordial, ódio e ini-mizade devem ser encarados como uma brutal força primordial. Segundo que sempre haverá a “chance para” e a “probabilidade de” o espírito criativo vagar. Terceiro que, um dos elementos da guerra é a subordinação, que por sua vez é um elemento político e que, portanto, está sujeito a razão. Pergunte-se agora se não é exatamente assim que funciona o mundo corporativo. Quantas vezes não ouvimos que “a concorrência é brutal”? Que sempre existe alguém “bus-cando inventar uma maneira de contornar uma regra”? Que numa concorrên-cia, por pressão do próprio cliente, empresas sujeitam-se a abaixar seus preços a patamares onde terão prejuízos, apenas para se manterem no contrato, para depois tentarem reerguer suas margens de lucro?

Da Alemanha aos Estados Unidos da América, em As 48 Leis do Poder, Ro-bert Greene não poupa palavras para escrever verdades das mais absolutamen-te brutais, que até então muitos sabiam, mas que poucos ousaram publicar. “Use a honestidade e a generosidade seletivas para desarmar a sua vítima. Um gesto sincero e honesto encobrirá dezenas de outros desonestos (Lei 12)”, pre-ga Greene. Ou que tal “Banque o amigo, aja como espião (Lei 14)”, “Faça os ou-tros trabalharem por você, mas sempre fique com o crédito (Lei 7) “ e “Mantenha os outros em um estado latente de terror: cultive uma atmosfera de imprevisi-bilidade. (Lei 17)”. Absolutamente, politicamente incorreto, não? Mas errado? Ineficiente, talvez? Certamente não. Estratégia muitas vezes é exatamente isso. Você não acredita que a melhor estratégia é sempre ser bonzinho, acredita?

Dos EUA ao Brasil, também temos nossos pensadores estratégicos. Talvez um dos mais profundos que já tenha lido seja Norberto Odebrecht. Seu livro, Sobreviver, Crescer e Perpetuar é uma pérola da estratégia corporativa moder-na, mais do que isso até, para muitos, uma filosofia de vida. O livro aborda prin-cípios fundamentais da vida empresarial, que dizem respeito ao ser humano, à comunicação, à produtividade, à criatividade e à educação pelo trabalho, entre outros. Os conceitos são práticos e simples, e não é à toa que inúmeras orga-nizações seguem boa parte de seus ensinamentos. Eles realmente trazem uma forte vantagem competitiva.

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15. Página 19 do volume 1 da quinta edição de Sobreviver, Crescer e Perpetuar.

16. Extratos do capítulo “Livro da Água” de O Livro dos Cinco Anéis.

“A meu ver, todo empresário tem garra, deter-minação, disposição para viver intensamente a vida, compromisso permanente com o sucesso, dis-posição para converter problemas em oportunida-des e, com a maturidade, adquire a capacidade de promover o equilíbrio dinâmico entre o intuitivo e o racional.” 15

Norberto Odebrecht

Mas, a final de contas, o que os logísticos devem aprender sobre estraté-gia, e como incorporar a logística nesta equação?

Antes de tudo, é preciso entender que não existe fórmula mágica. Cada qual absorverá conhecimento da sua maneira, identificar-se-á com um estilo mais do que com outro e aplicará o que aprendeu nas mais diversas situações possíveis. A incorporação do pensamento estratégico na logística vem com o tempo e com um esforço consciente, dedicado e constante que matura ao longo dos anos.

Para os interessados, como gestor de empresa de logística, apreciador dos mestres estrategistas do passado e eterno estudante do assunto, o que posso sugerir é: Primeiro: Estude muito. Por mais que muitas das lições estratégicas sejam

óbvias, o conjunto delas não é. Sempre que se relê um destes textos, tem-se um novo enfoque e aprende-se algo novo.

Segundo: Pratique pensar estrategicamente. Isso certamente não vem naturalmente. Uma idéia pode revolucionar uma empresa, mas também pode ser morta no nascedouro se não for propriamente desenvolvida.

Essa é a essência da “estrategística”.Que 2009 seja um ano de muita

paz, sucesso e conquistas para todos, e que nossas iniciativas “estrategísticas” dêem os frutos que merecem.

: : Referências

• Aaronson, Scott. Os Limites do Computa-dor Quântico. Scientific American Brasil. Abril 2008.

• Clausewitz, Claus Von. Da Guerra. www.clausewitz.com

• Green, Robert. As 48 Leis do Poder. Edito-ra Rocco. Rio de Janeiro, 2000.

• Musashi, Miyamoto. O Livro dos Cinco Anéis. www.musashi.pro.br

• Odebrecht, Norberto. Sobreviver, Crescer e Perpetuar. Tecnologia Empresarial Ode-brecht. Fundação Odebrecht. 5ª Edição. Salvador, 2004.

• Strathern, Paul. Machiavelli in 90 Minutes. Ivan R. Dee Publisher. Chicago, 1998.

• Sun-Tzu. A Arte da Guerra. Tradução Caio Fernando Abreu e Mirian Paglia Costa. Cultura Editores Associados. 5ª. Edição. São Paulo, 1998.

“Adote uma postura de cabeça erguida, nem curvada para baixo, nem voltada para os céus, nem virada para o lado. Em todas as formas de estratégia, é importante que a postura de combate se mante-nha na vida cotidiana e que se faça da postura diária a sua postura de combate... O olhar deve ser aber-to e amplo. Na estratégia, é importante ver coisas distantes como se estivessem próximas... Quando pegar uma espada, é indispensável que você sinta necessidade e vontade de abater o inimigo.” 16

Miyamoto Musashi

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Terceiro: Forme um acervo estra-tégico. Conheça a fundo as idéias e princípios com os quais você mais se identifica. Viva-os diaria-mente.

Quarto: Conheça as limitações técnicas das soluções logísticas. Reconheça que elas não estão nem próximas da perfeição, pois em última instância, todas de-pendem do fator humano.

Quinto: Incorpore o pensamento estratégico na solução logística. Isso maximizará suas chances de sucesso.

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