ESTUDO EM GRUPO NA FORMAÇÃO INICIAL COM ÊNFASE NA PRÁXIS COTIDIANA DA EDUCAÇÃO FÍSICA...

7

Click here to load reader

Transcript of ESTUDO EM GRUPO NA FORMAÇÃO INICIAL COM ÊNFASE NA PRÁXIS COTIDIANA DA EDUCAÇÃO FÍSICA...

Page 1: ESTUDO EM GRUPO NA FORMAÇÃO INICIAL COM ÊNFASE NA PRÁXIS  COTIDIANA DA EDUCAÇÃO FÍSICA ESCOLAR

1

ESTUDO EM GRUPO NA FORMAÇÃO INICIAL COM ÊNFASE NA PRÁXIS

COTIDIANA DA EDUCAÇÃO FÍSICA ESCOLAR1

Camila Pimentel Bottoni/GOE-FSV

Dayana Manenti Trancoso/GOE-FSV

David Gomes Martins/GOE-FSV

Desiree Rodrigues Barroso/GOE-FSV

Diego Nivaldo Ribeiro da Silva/GOE-FSV

Josué Sousa Samora/GOE-FSV

Erineusa Maria da Silva/GOE-FSV e Práxis-UFES

Lígia Ribeiro e Silva Gomes/GOE-FSV e Práxis-UFES

Luciano Faria da Silva/GOE-FSV

Victor José Machado de Oliveira/GOE-FSV

Resumo: este projeto se vincula ao Grupo Orientado de Estudos do Curso de Educação Física da

Faculdade Salesiana de Vitória (GOE/FSV) visando discussões, reflexões e intervenções a partir de

análises sobre a formação inicial focando a práxis cotidiana da educação física escolar. A metodologia

baseia-se em pesquisas bibliográficas e incentivo a pesquisa na formação inicial, pensando as

intervenções que os integrantes do grupo realizam em projetos sociais ligados à área oferecidos na

instituição. Esta iniciativa pode contribuir para a discussão sobre a relação teoria-prática na/da

Educação Física, estimulando a formação de professores crítico- reflexivos.

Apresentação

O GOE surgiu a partir dos interesses comuns da coordenação do curso de

Educação Física da FSV e de graduandos que viam a necessidade de formação de um

grupo de estudos para estimular acadêmicos a refletirem sobre as produções científicas

da área, em especial, sobre a questão da práxis na/da Educação Física escolar; e

também, de estimular a iniciação científica promovendo aproximação aos debates que

vem sendo realizados em âmbito acadêmico.

Inicialmente foi feita uma reunião entre a coordenação de curso e alunos

interessados em participar do grupo de estudos. Ali foram discutidos os temas de

interesse de cada acadêmico e as possibilidades de aprofundamento dos mesmos.

Devido aos muitos interesses, ficou decidido que seriam formados dois grupos que se

encontrariam quinzenalmente: um para tratar da temática do cotidiano das aulas de

Educação Física e outro da diversidade humana e processos inclusivos. Depois de dois

1 Trabalho apresentado no IX Congresso Espírito-santense de Educação Física, Vitória, ES, 2009.

Page 2: ESTUDO EM GRUPO NA FORMAÇÃO INICIAL COM ÊNFASE NA PRÁXIS  COTIDIANA DA EDUCAÇÃO FÍSICA ESCOLAR

2

encontros, entendeu-se necessário realizar reuniões semanais; além disso, percebeu-se

que a temática práxis possibilitava discutir também sobre a diversidade humana.

Decidiu-se trabalhar com um único grupo denominado Grupo Orientado de Estudos do

Curso de Educação Física da Faculdade Salesiana de Vitória (GOE/FSV) que tem por

objetivo estudar a formação inicial com ênfase na práxis cotidiana da Educação Física

escolar. Essa iniciativa possibilitaria a todos ampliar os conhecimentos que são

abordados na área escolar, buscando através de leituras, discussões, reflexões e

intervenções, o enriquecimento dos conhecimentos científico-acadêmicos na formação

inicial. O Grupo estabeleceu como objetivos: a) pesquisar o significado da temática

Práxis; b) buscar a apropriação de elementos da práxis na Educação Física Escolar; c)

realizar aproximação com o mundo acadêmico da área, enfatizando a produção teórica e

o constante debate, viabilizando espaços de discussão e formação; d) intervir em escolas

do sistema público de ensino a partir do conhecimento apreendido no cotidiano das

aulas de Educação Física e dos estudos realizados no GOE, por meio de projetos de

extensão.

Ao longo do texto abordaremos os temas que estudamos entre os meses de

março a junho de 2009 para pensar como se caracteriza a construção da identidade

profissional conectadas aos princípios ligados a Práxis na/da Educação Física, e sobre a

sua importância para o conhecimento produzido na área da Educação Física a partir da

formação inicial numa perspectiva crítico-reflexiva.

O que é a práxis da educação física?

“Toda a teoria deve ser feita para poder ser posta

em prática, e toda a prática deve obedecer a uma

teoria. Só os espíritos superficiais desligam a

teoria da prática, não olhando a que a teoria não

é senão uma teoria da prática, a prática não é

senão a prática de uma teoria”.

(Fernando Pessoa)

O termo práxis denomina a dinâmica relação teoria-prática. Baseando-se numa

perspectiva dialética e apropriando-se das leis desta, Gamboa (2007) diferencia a

relação teoria-prática tomada a partir de um ponto de vista dialógico da visão que

presume a existência de união entre a teoria e prática, afirmando que a relação teoria-

prática “não resulta de uma teoria posta em prática, nem de uma prática que se torna

teoria [...]” (p.3), mas de uma relação de constante tensão, confronto e contradição entre

ambas, o que faz gerar um movimento dinâmico e contínuo de superação. De forma que

Page 3: ESTUDO EM GRUPO NA FORMAÇÃO INICIAL COM ÊNFASE NA PRÁXIS  COTIDIANA DA EDUCAÇÃO FÍSICA ESCOLAR

3

“A teoria transforma-se na negação da prática porque a tenciona: a prática coloca em

xeque a teoria, porque em vez de se ajustar a ela, transforma-se em seu contrário”.

(GAMBOA, 2007, p.3).

A concepção dialética exposta por Gamboa (2007) concebe a relação teoria-

prática não como uma intenção de ajuste de uma a outra, mas, da relação conflituosa e

contraditória entre ambas. Por isso, que a teoria na prática é mesmo outra e ainda bem

que assim o seja já que não é possível fazer a aplicação pura e simples de uma teoria na

prática tendo em vista que há sujeitos na materialização dessa prática o que não permite

uma mera reprodução das mesmas a partir de modelos preditos (BRACHT &

CAPARROZ, 2007, p. 26-27).

Assim, a categoria Práxis na Educação Física começa a aparecer nas aulas dos

professores preocupados com o mito de uma “matéria prática”, somente dada ao

“fazer”. Desmitificando essa realidade, muitos autores têm produzido novas formas de

se ver e fazer a Educação Física escolar. Se não dá para separar o ser do pensar,

concluímos que mesmo quando se fala nas aulas práticas de Educação Física há uma

teoria iluminando/referenciando essa prática, pois acreditamos que as ações são frutos

de reflexões mesmo que não se tenha noção do processo analítico que há a partir das

ações, essa tensão, provem novas formas de pensar, agir, e de mudar essa mesma teoria

através da prática, o que Paulo Freire chamará de ação-reflexão-ação (FREIRE, 1996).

A práxis da educação física como campo de saber

Optamos pela práxis por se tratar de um tema abrangente e de extrema

profundidade, no que diz respeito à intervenção do educador. E esta intervenção tem o

dever de se tornar cada vez mais eficaz, transformadora e inclusiva, tendo em vista as

necessidades do contexto educacional brasileiro, que é de ampla diversidade. Essas

noções nos levam a compreender os diferentes processos relacionados à profissão

docente, pois é visto que a sociedade deposita no educador a árdua tarefa de promover a

elevação cultural dos educandos, formar opiniões e fomentar a transformação do

pensamento das presentes e futuras gerações. Assim, é imperativo que estes agreguem

conhecimentos à altura da sua responsabilidade; tais conhecimentos não devem se

bastar numa consciência prática, mas avançar para uma consciência da prática, como

afirma Carvalho (2009).

Sendo a Educação Física uma área ampla e com diversidade no seu campo de

atuação é fundamental discutir como atuar, articulando as duas dimensões prática e

Page 4: ESTUDO EM GRUPO NA FORMAÇÃO INICIAL COM ÊNFASE NA PRÁXIS  COTIDIANA DA EDUCAÇÃO FÍSICA ESCOLAR

4

teoria. Essa certamente foi/é umas das grandes preocupações importantes para a

existência e manutenção do grupo de estudos. Diante disso, o GOE contribui através de

leituras, discussões e vivências em campo, com pretensão de orientar a construção da

práxis que certamente será fator prioritário na construção da identidade profissional dos

acadêmicos em seu processo de formação inicial. Assim, os integrantes do GOE se

percebem como estudantes em formação, entendendo a necessidade de se colocar

sempre em processo, possibilitando assumir postura de investigador do cotidiano

escolar e de sua própria atuação profissional.

A práxis da educação física na formação inicial

A formação inicial/acadêmica não pode prescindir da construção de

competências que trarão ao futuro profissional a fundamentação necessária à formação

de sua identidade profissional, possibilitando-o a contextualizar e historicizar sua ação

docente. Seguindo essa linha de pensamento, o GOE trata a respeito da práxis e sua

importância no universo acadêmico, que se traduz em um embate antagônico do “saber-

fazer”, tendo em vista que “O ser não pode ser separado do pensar, o homem da

natureza, a atividade da matéria, o sujeito do objeto” (Gramsci apud GAMBOA, 2007,

p. 9). Muitos profissionais da Educação Física atuam sem embasamento pedagógico-

filosófico, sem ter clara a sua concepção educacional e de sujeito que quer formar. Sem

dúvida que a formação acrítica resulta em ações irrefletidas no campo da Educação

Física, o que o GOE busca superar. O grupo percebe a importância da busca do

conhecimento através das leituras, embates nas reuniões e pela própria intervenção, que

em alguns casos já vem sendo realizada para a comunidade do entorno da Faculdade

Salesiana de Vitória que freqüenta os projetos sociais2 oferecidos por esta instituição.

Nestes projetos de extensão busca qualificar mais ainda sua formação. O GOE tem

consciência que aprende para exercer a práxis, mas também aprende pela ação da práxis

na formação inicial/acadêmica.

A práxis da educação física: aspectos históricos

Souza Jr. (1999) comenta o estudo de Manacorda, no qual o autor alerta para

analisarmos “acerca da relação ou não-relação da educação dos homens das palavras

(ensino do saber) com a educação dos homens e das ações (ensino do fazer)” (p. 118).

2 A FSV mantém projetos de extensão com o Município de Vitória e com o CESAM (Centro Salesiano do

adolescente aprendiz).

Page 5: ESTUDO EM GRUPO NA FORMAÇÃO INICIAL COM ÊNFASE NA PRÁXIS  COTIDIANA DA EDUCAÇÃO FÍSICA ESCOLAR

5

Estes princípios necessariamente precisam ser amadurecidos para entendermos os

processos intrínsecos a formação e ação profissional docente.

Para melhor compreender o que foi dito, faremos um breve recorte histórico

sobre a idéia de processo formativo (conhecimento) relacionado ao mundo do trabalho e

suas relações duais.

De forma simplificada podemos dizer que no antigo Egito havia separação clara

entre instrução e trabalho, mostrando a dicotomia existente na relação do saber e do

fazer. Na educação Grega percebe-se o surgimento de uma escola, destinada aos

cidadãos livres – classe privilegiada daquela civilização– e este espaço se conectava ao

“dizer e o fazer” ligados aos interesses da polis (cidade). Roma ao dominar militarmente

a Grécia, traz para si a essência da educação grega, exemplo a ser seguido, contribuindo

com todos os povos do império romano. Neste contexto ainda não se podia se referir a

Educação Física, como se configura atualmente, pois a atividade física era voltada para

a formação do corpo heróico do guerreiro-militar.

Dando um salto no tempo, no início da modernidade, verificou-se no

pensamento cartesiano3 a dicotomia entre corpo e mente, sendo que a mente era o bem

maior do homem, ligando-se a dimensão suprema, enquanto o corpo era algo a ser

desprezado, pois este carregava o emblema de sua materialidade, situando-se na

dimensão dos prazeres e do pecado que era próprio da dimensão corpórea. Nessa época

de muitos avanços científicos, havia a necessidade de não mais acreditar em explicações

que viessem do senso comum, abrindo espaço para os grandes “investimentos”

científicos. Essas foram viradas epistemológicas que marcaram o início da modernidade

que avança até a atualidade. Com os avanços tecnológicos surge a necessidade de uma

instrução universal, e é no século XVIII que surge efetivamente a escola pública e as

fábricas; sendo que a educação física assume o papel de regenerar e revigorar o corpo

debilitado pelo trabalho na fábrica. No século XIX avança o processo de laicização e

estatização da instrução. A escola passa então a abordar conteúdos advindos do trabalho

produtivo (da fábrica) – a instrução técnico-científica. É nesse século que a Educação

Física renasce, não com a obrigatoriedade do trabalho físico, mas com respeito aos

cuidados com o corpo – saúde corporal – onde a resolução dos problemas científicos

pelos alunos agora se dava pelo critério de que se devia aprender fazendo.

3 Estes aspectos não serão aprofundados, mas servem como pano de fundo para compreender a história e

suas concepções dos opostos na tradição ocidental.

Page 6: ESTUDO EM GRUPO NA FORMAÇÃO INICIAL COM ÊNFASE NA PRÁXIS  COTIDIANA DA EDUCAÇÃO FÍSICA ESCOLAR

6

A Educação Física no início do século XX, além da prescrição médico-higienista

passa então a receber os jogos, a ginástica e o esporte, para além das questões voltadas a

aptidão física e saúde.

Outro momento importante a ser mencionado apresenta-se com as mudanças

ocorridas no contexto educacional brasileiro na década de 1980. Nesse período de

redemocratização da sociedade brasileira surgiram propostas pedagógicas no âmbito da

Educação Física que buscavam legitimar o papel pedagógico dessa área no domínio

escolar. Estas propostas estabeleceram um diálogo com as ciências humanas

proporcionando assim uma visão diferenciada em relação ao ser humano no que tange

ao trato corporal. Ou seja, elas ampliaram a visão estritamente biologizante que

perdurava na Educação Física, propondo que outras dimensões fossem contempladas

nas propostas pedagógicas, mais especificamente, os aspectos sócio-culturais e políticos

inerentes às relações humanas (BRACHT, 1999).

Em meio a investimentos e avanços tecnológicos é necessário entender que a

nossa compreensão de mundo e das coisas que nele se encontram são fragmentos

herdados de tradições dicotômicas opostas, pois desde a antiguidade a relação da

essência do “ser” e do mundo se constituía através de tensões – homem/mulher,

quente/frio, corpo/mente, saber/fazer. Essas são impressões que nos levam a melhor

compreensão da necessidade de romper com as oposições binárias, principalmente

quando ancoradas na relação teoria-prática, que aqui se torna nosso objeto de estudo por

excelência.

Considerações finais

As idéias expostas até aqui foram tratadas a partir das nossas primeiras

impressões sobre a relação teoria-prática estudadas em nossos encontros. Com esses

primeiros investimentos, tentando compreender os processos inerentes à ação docente,

entendemos que muito trabalho há de ser feito, pois a relação teoria-prática não ocorre

de forma tranqüila e linear, e sabemos da necessidade de maiores esforços para

chegarmos à investigação propriamente dita (a partir da intervenção).

Pesquisar é o ato de buscar respostas em dado contexto para determinadas ações.

E é neste sentido que pleiteamos ações pautadas no professor crítico-reflexivo que

acredita em alçar esses vôos para alcançarmos a educação para a transformação e

emancipação humana.

Page 7: ESTUDO EM GRUPO NA FORMAÇÃO INICIAL COM ÊNFASE NA PRÁXIS  COTIDIANA DA EDUCAÇÃO FÍSICA ESCOLAR

7

Referências

BRACHT, V. Identidade e Crise da Educação Física: um enfoque epistemológico. In:

BRACHT, V. CRISORIO, R. (Coords.) Educação Física no Brasil e na Argentina:

identidades, desafios e perspectivas. São Paulo: Autores Associados, 1999, p.13-30.

CARVALHO Marlene Araújo de. A formação de professores e os fundamentos da

ação docente. Capturado em: http://www.ufpi.br/mesteduc/eventos/iiencontro/GT-

1/GT-01-04.htm. Acesso em: 15/01/2009.

FREIRE, Paulo. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa. São

Paulo: Paz e Terra, 1996.

GAMBOA, Sílvio Sánchez. Epistemologia da educação Física: as inter-relações

necessárias. Maceió: EDUFAL, 2007. Disponível em:

http://www.geocities.com/grupoepisteduc/arquivos/EP732epistemologiaedfisica.doc.

Acesso: março de 2009.

SOUZA JR., Marcílio. O Saber e o fazer pedagógicos: a educação física como

componente curricular __? isso é história! Recife: EDUPE, 1999.