Estudos-Gramaticais
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Estudos Gramaticais
Florianpolis - 2011
Edair GrskiHeronides Moura2
Perodo
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Governo FederalPresidncia da RepblicaMinistrio de EducaoSecretaria de Ensino a DistnciaCoordenao Nacional da Universidade Aberta do Brasil
Universidade Federal de Santa CatarinaReitor: Alvaro Toubes PrataVice-Reitor: Carlos Alberto Justo da SilvaSecretrio de Educao a Distncia: Ccero BarbosaPr-Reitora de Ensino de Graduao: Yara Maria Rauh MllerPr-Reitora de Pesquisa e Extenso: Dbora Peres MenezesPr-Reitor de Ps-Graduao: Maria Lcia de Barros CamargoPr-Reitor de Desenvolvimento Humano e Social: Luiz Henrique Vieira da SilvaPr-Reitor de Infra-Estrutura: Joo Batista FurtuosoPr-Reitor de Assuntos Estudantis: Cludio Jos AmanteDiretor do Centro de Cincias da Educao: Wilson Schmidt
Curso de Licenciatura Letras-Portugus na Modalidade a DistnciaDiretor Unidade de Ensino: Felcio Wessling MarguttiChefe do Departamento: Izabel Christine SearaCoordenadoras de Curso: Roberta Pires de Oliveira e Sandra QuarezeminCoordenador de Tutoria: Renato Miguel BassoCoordenao Pedaggica: LANTEC/CEDCoordenao de Ambiente Virtual de Ensino e Aprendizagem: Hiperlab/CCE
Comisso EditorialTnia Regina Oliveira RamosMary Elizabeth Cerutti Rizzati
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Equipe de Desenvolvimento de Materiais
Laboratrio de Novas Tecnologias - LANTEC/CEDCoordenao Geral: Andrea LapaCoordenao Pedaggica: Roseli Zen Cerny
Produo Grfica e HipermdiaDesign Grfico e Editorial: Ana Clara Miranda Gern; Kelly Cristine SuzukiCoordenao: Thiago Rocha Oliveira, Laura Martins RodriguesAdaptao do Projeto Grfico: Laura Martins Rodrigues, Thiago Rocha OliveiraDiagramao: Pedro Augusto Gamba & Raquel Darelli MichelonFiguras: Pedro Augusto Gamba & Raquel Darelli Michelon Capa: Raquel Darelli MichelonTratamento de Imagem: Pedro Augusto Gamba & Raquel Darelli Michelon Reviso gramatical: Evillyn Kjellin
Design InstrucionalCoordenao: Vanessa Gonzaga NunesDesigner Instrucional: Maria Luiza Rosa Barbosa
Copyright 2011, Universidade Federal de Santa Catarina/LLV/CCE/UFSCNenhuma parte deste material poder ser reproduzida, transmitida e gravada, por qualquer meio eletrnico, por fotocpia e outros, sem a prvia autorizao, por escrito, da Coordena-o Acadmica do Curso de Licenciatura em Letras-Portugus na Modalidade a Distncia.
Catalogao na fonte elaborada na DECTI da Biblioteca Universitria da Universidade Federal de Santa Catarina.
Ficha Catalogrfica
G674e Grski, Edair Maria Estudos gramaticais / Edair Maria Grski, Heronides Moura.
Florianpolis : LLV/CCE/UFSC, 2011. 142p. : il.
ISBN: 978-85-61482-40-4Inclui bibliografia.UFSC. Licenciatura em Letras Portugus na Modalidade a Distncia
1. Linguistica. 2. Gramtica comparada e geral.3. Linguagem. I. Mou-ra, Heronides. II. Ttulo.
CDU: 801
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Sumrio
Apresentao ...................................................................................... 7
Unidade A - Uma breve histria da linguagem e da noo de
gramtica .................................................................... 9
1 A pr-histria da linguagem ....................................................................11
2 A linguagem como expresso do pensamento:
o perodo greco-latino ................................................................................15
3 Lngua universal e lnguas particulares: da Idade Mdia
ao sculo XVIII ................................................................................................23
4 As lnguas como produtos da histria: a poca
do Romantismo .............................................................................................27
5 A busca da origem: do Romantismo ao Mtodo
Comparativo ...................................................................................................31
Unidade B - A lingustica como estudo cientfico
da lngua(gem) .......................................................35
6 Concepes de lngua(gem) ....................................................................37
7 Propriedades das lnguas naturais .........................................................43
7.1 Flexibilidade e adaptabilidade .....................................................................43
7.2 Arbitrariedade ...................................................................................................44
7.3 Dupla articulao .............................................................................................46
7.4 Produtividade .....................................................................................................48
7.5 Heterogeneidade ..............................................................................................50
8 O que um estudo cientfico? .................................................................53
Unidade C - Gramtica e norma ................................................57
9 Concepes de gramtica .........................................................................59
9.1 Gramtica Universal e gramticas de lnguas particulares ................59
9.2 Gramtica prescritiva versus gramtica descritiva e explicativa .....63
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10 A norma lingustica ...................................................................................73
10.1 Concepes de norma ..................................................................................73
10.2 Variedades da lngua e lngua padro do Brasil ..................................79
10.3 A questo do erro e suas implicaes sociais ....................................85
Unidade D - Descrio gramatical .............................................89
11 Princpios e mtodos do estudo de gramtica ...............................91
12 Nveis de anlise ........................................................................................95
12.1 Nvel fontico-fonolgico ..........................................................................95
12.2 Nvel morfolgico ........................................................................................101
12.3 Nvel sinttico ................................................................................................118
12.4 Nvel semntico-pragmtico ...................................................................123
Leia Mais! ......................................................................................... 134
Referncias ...................................................................................... 135
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Apresentao
C aros alunos: Este livro-texto trata de dois grandes temas:
Fundamentos histricos e filosficos das noes de linguagem e de gramtica.
Iniciao aos conceitos e mtodos da descrio gramatical segundo
as abordagens da Lingustica Moderna.
Esses assuntos esto organizados em quatro unidades. Na Unidade A tratare-
mos do primeiro tema acima. Faremos uma viagem no tempo para mostrar
como a linguagem surgiu e como tem sido analisada ao longo da histria. Ve-
remos que o modo de conceber a linguagem e a gramtica est associado aos
fundamentos histricos e filosficos de cada perodo da civilizao ocidental
(no abordaremos os estudos de outras tradies, restringindo-nos cultura
do Ocidente). A nossa anlise histrica vai at o sculo XIX. A Lingustica
Moderna ser estudada nas demais unidades, que tratam do segundo tema
acima destacado.
Na Unidade B focalizaremos a Lingustica como estudo cientfico da
lngua(gem). Na Unidade C trataremos de diferentes concepes de gramtica
e de norma, de variedades lingusticas e da noo de erro e suas implicaes
sociais. Na Unidade D trabalharemos com princpios e mtodos de descrio
lingustica, aplicando-os aos diferentes nveis gramaticais. Em cada unidade
apresentamos uma exposio dos contedos, levantamos pontos para reflexo
e discusso, e sugerimos leituras complementares.
Em relao ao segundo tema (Unidades B, C e D), a palavra-chave descrio
gramatical. Para dar conta dessa proposta, vamos buscar conceitos e mtodos
na Lingustica Moderna. Munidos desse instrumental terico-metodolgico
e, sobretudo, acionando a nossa intuio de falantes nativos do portugus, va-
mos examinar dados lingusticos e confront-los com definies gramaticais.
Com tal procedimento de anlise, podemos avaliar o grau de adequao das
definies aos dados. Essa tarefa requer certas habilidades que caracterizam o
perfil do pesquisador: capacidade de reflexo, de discernimento e de anlise
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criteriosa, aliada a um esprito crtico. Voc vai perceber que, ao longo das
Unidades, apresentamos a voc diversas situaes-problema, como desafios
que vo colocar prova essas habilidades que acabamos de mencionar.
Convidamos voc a assumir o papel de investigador lingustico e nos acompa-
nhar nessa viagem exploratria pelos domnios da linguagem... Desejamos que
voc se saia muito bem nesse papel!
Edair GrskiHeronides Moura
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Unidade AUma breve histria da linguagem e da noo de gramtica
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Objetivos desta Unidade:
Mostrar que a linguagem humana tem sido um tpico de interesse desde a
Antiguidade Clssica;
Associar o modo de conceber a linguagem e a gramtica aos fundamentos
histricos e filosficos de cada perodo da civilizao ocidental;
Traar um panorama amplo dos estudos lingusticos ao longo da histria, destacando as principais teorias e os autores fundamentais.No captulo 1 (A pr-histria da linguagem), vamos ver que a lingua-
gem fruto de uma evoluo de dezenas de milhares de anos, e que deve ter surgido
com os ancestrais de nossa espcie. O desenvolvimento da linguagem est associado
realizao de atividades sociais complexas. Veremos tambm que a linguagem hu-
mana moderna j devia estar plenamente desenvolvida h pelo menos 35.000 anos.
No captulo 2 (A linguagem como expresso do pensamento: o perodo greco-
latino), veremos como houve, na poca clssica da Grcia e de Roma, um enorme
interesse pela linguagem e pela gramtica. Estudaremos em especial duas correntes
filosficas desse perodo: a platnica e a estoica.
No captulo 3 (Lngua universal e lnguas particulares: da Idade Mdia ao sculo
XVIII), veremos que ocorreu, na Europa, uma exploso de gramticas de diferentes
idiomas, depois do predomnio do grego e do latim. Estudaremos como a existncia
dessa multiplicidade de idiomas afetou as concepes de lngua e gramtica desse
perodo.
No captulo 4 (As lnguas como produtos da histria: a poca do Romantismo),
vamos estudar alguns dos fundamentos filosficos do Romantismo, que moldaram a
concepo de gramtica e de lngua nesse perodo. Veremos que as lnguas passam a
serem vistas como produtos das circunstncias histricas, e so associadas aos povos
e s naes que as utilizam.
No captulo 5 (A busca da origem: do Romantismo ao Mtodo Comparativo),
vamos estudar como a busca da origem da linguagem e das circunstncias histri-
cas do desenvolvimento das diferentes lnguas levou criao do Mtodo Compa-
rativo, que visava comparar diferentes idiomas, a , a fim de estabelecer, de forma
cientfica, relaes de parentesco entre eles.
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Captulo 01A pr-histria da linguagem
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1 A pr-histria da linguagemA linguagem humana tem uma histria muito longa. Um instru-
mento de comunicao to complexo e eficaz no pode ter surgido de um momento para outro. Deve ter surgido e se desenvolvido aos poucos, durante centenas de milhares de anos. Provavelmente, evoluiu a partir de gestos e palavras isoladas. As frases e a sintaxe organizada surgiram muito tempo depois.
A origem da linguagem humana deve ter ocorrido com o desen-volvimento cognitivo dos ancestrais do homem moderno, o Homo sapiens, espcie qual ns todos pertencemos. O surgimento das pri-meiras palavras e de estruturas lingusticas elementares, que formam o que alguns linguistas chamam de protolinguagem (cf. DEVLIN, 2006), est certamente associado a atividades sociais complexas, realizadas por grupos de homindeos. E isso ocorreu muito tempo atrs. Por exemplo, o Homo erectus, h quase um milho de anos, j se deslocara da frica, em direo sia, numa expedio complexa e arriscada. Isso mostra que essa espcie de homindeos era capaz de planejamento de atividades em conjunto, que exige processos mentais complexos, e como tal algum tipo de linguagem (cf. FISCHER, 2009, p. 49). No entanto, a linguagem usada pelo Homo erectus no devia ser igual nossa; essa espcie no conseguia controlar a respirao de maneira to fina como ns fazemos, o que nos permite articulaes vocais muito ricas e variadas (pense na enormidade de sons da fala e de variaes de tom de que somos capazes; tudo isso depende do controle da respirao).
H tambm o caso interessante dos neandertais (Homo neander-thalensis), que chegaram a conviver com os humanos modernos na Eu-ropa, e que s desapareceram h cerca de 30.000 anos. Segundo os espe-cialistas, os neandertais muito provavelmente dispunham de algum tipo de linguagem verbal articulada. Eles fabricavam ferramentas, enterra-vam os mortos, usavam adornos corporais... Eles tinham um aparato articulatrio (laringe, lngua, controle da respirao) adaptado a uma linguagem vocal parecida com a nossa. Enfim, ao contrrio da imagem tradicional, os neandertais no eram to broncos, sendo na verdade pa-recidos conosco. Eram como primos um pouco diferentes.
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possvel mesmo imaginar que os neandertais tenham convivido de forma intensa com os humanos, com as duas espcies interagindo num tipo de bilinguismo (cf. FISCHER, 2009, p. 66). Pesquisas recentes mostram que provavelmente houve reproduo entre as espcies. Ima-gine s, um humano seduzindo uma neandertal... Que linguagem ele usou?
O que isso tudo mostra que a linguagem humana tem uma ori-gem muito antiga, e que uma linguagem articulada foi surgindo lenta-mente nos diferentes ramos de homindeos (erectus, neanderthalensis e sapiens).
Figura 1 Do Australopithecus ao Homo sapiens sapiens.
Sabemos, porm, que essa linguagem inicial era elementar, com pa-lavras isoladas e sintaxe simplificada. A linguagem efetivamente moder-na s surgiu muito depois, com o Homo Sapiens moderno (cf. PINKER, 2004, p. 454). Como essa espcie tem mais de 150.000 anos, razovel supor que a linguagem moderna e altamente evoluda de que dispomos surgiu nesse lapso de tempo. O fato que, h cerca de 30.000 anos, o Homo Sapiens desfrutou de uma exploso cultural que s imaginvel
Estudos Gramaticais
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Captulo 01com uma linguagem j evoluda. A maravilhosa arte rupestre, os arte-fatos, o simbolismo da cultura do Homem de Cro Magnon sugerem que essa populao (os mais antigos Homo sapiens modernos encontrados na Europa) j era muito parecida conosco, e usava uma lngua que era o antepassado das lnguas que hoje existem no globo. Durante essa explo-so cultural, o Homo sapiens moderno criou as bases de nossa cultura, com a inveno dos smbolos, da arte e do pensamento abstrato. Tudo isso s foi possvel com uma linguagem complexa que servisse como meio de cooperao social e de articulao do pensamento. Estava cria-do o pensar desconectado, que no depende de estmulos exteriores, e que est na base da linguagem, do sentido do tempo, da capacidade de formular e seguir planos complexos e da simbolizao (cf. DEVLIN, 2003, p. 211).
Mas podemos afirmar que as lnguas modernas derivam direta-mente dessa linguagem falada h cerca de 30.000 anos? Infelizmente, no possvel retraar o percurso da transformao e ramificao das diferentes lnguas hoje existentes, a partir de uma data to distante no tempo. As protolnguas, hoje extintas, das famlias lingusticas moder-nas existiram no mximo h 10.000 anos. Por exemplo, o portugus veio do latim, que por sua vez deriva da protolngua indo-europeia. A pro-tolngua indo-europeia, que os linguistas conseguiram reconstruir sem nunca ter visto um texto escrito nela, por sua vez deriva de uma lngua ainda mais antiga, que j se perdeu na bruma do tempo. Portanto, as descries das milhares de lnguas modernas, pelos mtodos atuais de pesquisa, podem contar a histria da evoluo das lnguas at um certo ponto do passado. No possvel, portanto, reencontrar a lngua ori-ginal que deu origem a todas as lnguas existentes; mas sabemos, no entanto, que todas as lnguas faladas hoje derivam do tipo de linguagem moderna desenvolvida ao longo de centenas de milhares de anos, e que j chegara ao auge h cerca de 30.000 anos.
Pesquise sobre a chamada exploso cultural da poca de Cro Mag-
non, e por que a linguagem deve ter sido um elemento vital.
A pr-histria da linguagem
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A famosa caverna de Lascaux, na Frana, rene uma amostra significativa de pinturas rupestres. Voc pode obter mais informaes e fazer uma visita virtual caverna acessando: .
ProtolnguasEm sntese, as lnguas-me de lnguas apa-rentadas. Trask (2004, p. 242, grifos do autor) define protolngua como O antepassado hipottico de uma famlia de lnguas.
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Estudos Gramaticais
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Discuta o assunto com seus colegas.
Resumindo o tpico: vimos que a linguagem humana fruto de uma evoluo de centenas de milhares de anos, e que ela deve ter sur-gido com os ancestrais de nossa espcie. O desenvolvimento da lingua-gem est associado realizao de atividades sociais complexas, que ca-racterizam diferentes homindeos, e em especial a nossa espcie (Homo Sapiens). Inicialmente, houve uma protolinguagem, com sintaxe simpli-ficada. No entanto, vimos tambm que a linguagem humana moderna j devia estar plenamente desenvolvida, em toda sua complexidade, h pelo menos 30.000 anos
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Captulo 02A linguagem como expresso do pensamento: o perodo greco-latino
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2 A linguagem como expresso do pensamento: o perodo greco-latino
Os gregos, e depois os romanos, dedicaram muito esforo para compreender como funciona a nossa linguagem. Foram os primeiros, na civilizao ocidental, a especular, de maneira sistemtica, sobre a na-tureza das palavras e da gramtica.
H duas linhas de pensamento importantes sobre a linguagem na Antiguidade, que iremos abordar aqui: os platnicos e os estoicos. Ape-sar dos enfoques diferentes dessas duas escolas, ambas visavam com-preender a linguagem como uma ferramenta que permite entender a realidade na qual vivemos (cf. WEEDWOOD, 2002). A linguagem era percebida como expresso do pensamento.
Plato (c. 428-347 a.C.) e sua escola de pensamento exerceram um imenso fascnio sobre toda a cultura ocidental Aquele que conside-rado o texto fundador dos estudos sobre a linguagem da autoria de Plato: o Crtilo (citaremos aqui a edio brasileira de 2004).
Figura 2- Academia de Plato - Mosaico da Vila de Siminius Stephanys em Pompeia (sculo I).
Plato props a diviso da sentena gramatical em dois elementos: noma (nome) e rhema (ver-bo), o que corresponde diviso, que fazemos at hoje, entre sujeito e predicado. Aristteles e os estoicos refinaram poste-riormente o conceito de sentena, que os gregos chamavam de logos
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Estudos Gramaticais
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Hoje em dia, uma experincia surpreendente, como se entrs-semos num tnel do tempo e cassemos em plena praa pblica da Ate-nas antiga; sentimos plenamente que as indagaes refletem o contexto da Grcia Clssica.
- Faam a seguinte experincia: leiam o dilogo em voz alta, com
colegas e/ou alunos, cada um representando um dos personagens
do debate, ou seja, Crtilo, Hermgenes e Scrates. Vocs vo sen-
tir como esse debate vivo e natural (embora Scrates fale demais
e os outros muito pouco!).
- Scrates tinha fascnio pela etimologia, mas a maior parte das
etimologias propostas por ele estava errada. Procure exemplos
atuais (a internet est cheia deles) das chamadas etimologias po-
pulares, que propem origens para as palavras, sem base cien-
tfica. Depois consulte dicionrios etimolgicos, para pesquisar
as origens verdadeiras. Ex. de etimologia popular: forr viria do
ingls for all.
As ideias de Scrates podem s vezes parecer estranhas para um leitor moderno. Na realidade, s parecem estranhas quando compara-das com o que sabemos hoje sobre a linguagem; naquele contexto, fa-ziam todo o sentido.
O debate principal do dilogo a oposio entre naturalismo e convencionalismo no uso das palavras. Conforme observa Weedwood (2002, p. 25), [...] os gregos se perguntavam se a conexo entre as pa-lavras e aquilo que denotavam provinha da natureza, physei, ou era im-posta pela conveno, thesei. Ou seja, a questo de fundo era se a lin-guagem fazia parte da natureza ou da cultura.
A palavra uma juno de som e sentido. Os naturalistas acha-vam que deve existir uma relao entre a forma da palavra e o sentido que ela expressa. Onomatopeias so assim: au-au designa o som que um cachorro faz e tenta-se reproduzir esse som na prpria palavra. Ono-matopeias so representaes naturais dos significados que as palavras expressam. A teoria dos naturalistas que todas as palavras devem ter essa relao natural entre som e sentido.
O Crtilo um dos dilogos platnicos.
Foi escrito por Plato (nascido em Atenas, entre 428/427 a.C., e falecido tambm em
Atenas, entre 348/347 a.C.) e apresenta como personagem principal
o filsofo Scrates, que havia sido professor
de Plato. Os dilogos platnicos so uma forma interessante
de fazer filosofia. Os temas so discutidos
informalmente por S-crates e seus amigos e discpulos. No caso do dilogo Crtilo, o tema a natureza social ou natural da linguagem
humana.
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Captulo 02A linguagem como expresso do pensamento: o perodo greco-latino
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Os convencionalistas, por seu turno, defendem que o som de uma palavra nada tem a ver com o sentido que ela designa; as onomatopeias so apenas excees a esse princpio. Note-se que o convencionalismo, conhecido modernamente como o princpio da arbitrariedade do signo hoje aceito como um princpio bsico da lingustica, e essa uma das razes que nos levam a estranhar os argumentos defendidos no Crtilo.
Scrates defende o naturalismo, assim como Crtilo; Hermgenes, por sua vez, defende o convencionalismo. verdade que, no final do dilogo, Scrates relativiza sua posio e ataca o naturalismo radical, admitindo alguma forma de conveno no uso lingustico, pois de outra forma a palavra, de to semelhante coisa que designa, poderia ser um substituto da coisa em si, o que para ele inadmissvel.
Alguns comentadores desse dilogo platnico chegam a dizer que ao cabo Scrates se mostra convencionalista, mas parece mais razovel afirmar que ele fundamentalmente um naturalista (refletindo nesse caso a posio de Plato) (cf. SEUREN, 1998; SEDLEY, 2006).
O naturalismo de Plato e Scrates, por absurdo que possa parecer aos olhos modernos exemplo, quando ele diz que corpo (soma, em grego) vem de sepultura (sema, em grego) est ligado a uma srie de crenas e ideias do platonismo. Entre elas, podemos citar:
1) As coisas e seres, segundo Plato, tm uma essncia permanen-te. Nada mais natural que cada palavra, visando representar as coisas, tente caracterizar pelo menos uma das propriedades da coisa ou ser por ela representada. Portanto, a ligao mais na-tural no exatamente entre som e sentido, mas entre o sentido da palavra e a essncia atribuda coisa que a palavra designa. O som apenas ajuda a chegar a esse sentido que leva essn-cia. No exemplo citado, se corpo (soma) est ligado sepultura (sema), porque o corpo a sepultura da alma. O corpo es-sencialmente mortal e encerra nele a alma. Note-se que essa explicao quase potica, produto de afinidades de sentidos e sons; mas o que importa para Scrates investigar o que um conceito, como corpo ou justia, realmente significa. O som (soma-sema) pode ser uma pista nessa investigao das essncias.
Voc vai saber mais sobre a arbitrariedade do signo no captulo 7 da Unidade B.
Aristteles, ao contrrio de Plato, era um con-vencionalista. Para ele, a ligao entre som e sentido de uma palavra era arbitrria.
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Estudos Gramaticais
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2) A verdade sobre as essncias das coisas absoluta e no varia de acordo com a crena de cada pessoa. O relativismo era de-fendido pelos sofistas, que Scrates e Plato combatiam. Uma frase famosa de um sofista, Protgoras, citada no Crtilo (p. 148): O homem a medida de todas as coisas, e por isso, con-forme me parecerem as coisas, tais sero elas, realmente, para mim, como sero para ti conforme te parecerem. Scrates se insurgia contra esse tipo de afirmao e argumentava que as palavras devem representar necessariamente a essncia das coisas. A relao somsentido no pode ser arbitrria ou con-vencional, pois dessa forma cada pessoa teria uma apreenso diferente da essncia das coisas, o que equivaleria a recair no relativismo sofstico. Como diz Scrates (p. 149): [...] (as coi-sas) no esto em relao conosco, nem na nossa dependn-cia, nem podem ser deslocadas em todos os sentidos por nossa fantasia, porm, existem por si mesmas, de acordo com sua essncia natural. E nomear as coisas design-las de acordo com sua essncia: convir nomear as coisas pelo modo natural de nome-las e serem nomeadas, e pelo meio adequado, no como imaginamos que devemos faz-lo (p. 151).
O dilogo do Crtilo aborda a questo da identidade, que havia sido
colocada pela filosofia de Herclito. De acordo com este filsofo, o
mundo est em constante mudana. Nada permanece o mesmo no
fluxo do tempo ( desse filsofo a conhecida afirmao de que nin-
gum se banha duas vezes no mesmo rio). Mas se assim, como
podemos dar nome a uma coisa? Se uma coisa muda sempre, como
podemos dar nome a ela? Aparentemente, o uso da linguagem
pressupe a identidade das coisas ao longo do tempo. nesse con-
texto, e em oposio a Herclito, que Scrates busca uma essncia
imutvel das coisas, que as palavras se encarregariam de designar.
3) Segundo a opinio de Scrates e Plato, a verdade e a es- sncia das coisas devem ser estabelecidas pelas pessoas mais justas e mais razoveis de uma comunidade. Essa a ideia que
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Captulo 02A linguagem como expresso do pensamento: o perodo greco-latino
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est por trs da Repblica ideal de Plato, que seria governada por um conselho de sbios, com todos os poderes para legis-lar (na prtica, uma ditadura de sbios). Para esses filsofos, os sbios sabem com justeza o que as palavras devem signifi-car, a fim de representar da melhor maneira possvel as coisas que designam (por exemplo, a relao entre corpo e sepultura (soma e sema, em grego, j citada acima).
Assim, os sbios devem buscar e definir qual a relao natural entre som, sentido e coisa representada. A conveno seria um artifcio, justifi-cando qualquer relao arbitrria. Plato sustenta que os sbios definem o sentido original das palavras. Esse um dos pontos que causam mais es-tranheza na leitura do Crtilo. Scrates reafirma vrias vezes que h legis-ladores sbios que cunharam, em algum momento da histria, a relao somsentido das palavras de uma lngua. Essa a explicao platnica para a criao da linguagem: os homens sbios se reuniram e definiram a forma e o significado das palavras. Por mais estranho que nos parea hoje em dia, essa posio era moderna e ousada no tempo dos gregos, opondo-se, implicitamente, ideia religiosa da criao da linguagem, segundo a qual a linguagem era um dom oferecido ao homem por Deus.
No mundo grego da poca clssica, a linguagem no era mais vista como assunto dos deuses, mas como negcio dos homens. Quer dizer, no de todos os homens, mas em especial dos sbios (todos do sexo mas-culino, pois Scrates no tinha uma opinio muito boa sobre as mulheres, como se pode perceber no Crtilo).
Agora vamos falar um pouco dos estoicos (sec. III-II a.C.). Eles deram contribuies muito importantes ao estudo da linguagem. Foram eles que desenvolveram a noo de sentena como unidade significativa, o conceito de classes gramaticais e tambm de signo lingustico.
Sextus Empiricus (Sc. II de nossa era) apresenta a seguinte definio
de signo: O significante, o significado e o referente so todos os trs
conectados. O significante o som vocal, como no nome Alcebades.
O significado o contedo do pensamento expresso pelo som
Esses filsofos passaram a ser chamados de estoicos quando Zeno de Ctio e outros comearam a discutir filosofia debaixo do Stoa Poikile, o prtico pintado, uma colunata que ficava na gora, a grande praa de Atenas.
Saussure, no Curso de Lingustica Geral (1916), definiu o signo como a unidade lingustica que une um significado a um significante. Para ele, os dois elementos do signo so de natureza mental e o referente seria exterior ao signo. Esse conceito ser retomado na seo 7.
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Estudos Gramaticais
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vocal, tal como ns o entendemos quando ele se apresenta ao nos-
so esprito, ao passo que aqueles que no falam nossa lngua no o
compreendem at mesmo se escutam o som. Quanto ao referente,
o objeto correspondente exterior, o prprio Alcebades. Desses trs
elementos, dois so fsicos, o som e o referente, mas o terceiro no
fsico, ou seja, o contedo do pensamento (Sextus Empiricus apud
Seuren, 1998, p. 14. Traduo de Heronides Moura, com pequenos
ajustes). Essa definio de Sextus Empiricus soa incrivelmente atual.
Para os estoicos, a sentena era a expresso de uma representao mental de um estado de coisas no mundo (SEUREN, 1998, p. 10). Note que nessa definio h trs elementos vitais da linguagem: a sentena um signo de um pensamento. Esse pensamento corresponde ao sentido do que dito; e finalmente, o estado de coisas o referente da sentena. Podemos assim dizer que os estoicos foram os primeiros a perceber os trs elementos (signo, sentido e referente) que do forma ao processo de significao lingustica. Esses trs elementos correspondem ao fa-moso tringulo semitico proposto por Ogden e Richards, em 1923! A sentena era entendida pelos estoicos como um enunciado significa-tivo, que eles chamavam de logos (cf. WEEDWOOD, 2002, p. 28). Eles faziam uma distino entre forma e logos: uma palavra isolada tem uma forma (por exemplo, a palavra dia), mas no expressa um logos, pois no compe um enunciado completo. J dia seria, por sua vez, um logos. Assim, os estoicos perceberam que h, na linguagem, formas; a palavra dia tem forma, um signo que respeita as regras do portugus, mas uma palavra como cmtpll no uma forma do portugus. Note que eles perceberam, tambm, que o significado (o logos) resulta de uma combinao de formas.
Os estoicos ajudaram igualmente a formular a noo de classe de palavras, tambm chamadas de partes do discurso. Se o logos expressa um pensamento e composto de formas, ento cada uma dessas formas deve apresentar uma contribuio especfica para a formao do pensa-mento, por meio da sentena gramatical. Foram sendo definidas assim
Charles Kay Ogden (1889-1957) era filsofo, tambm ingls. Ivor Richards (1893-
1979) foi um importante retrico e crtico literrio ingls. Ambos propuse-
ram o tringulo semitico, formado pelo smbolo, o
pensamento e o referente.
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Captulo 02A linguagem como expresso do pensamento: o perodo greco-latino
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as classes de palavras, como substantivos, adjetivos, verbos, conjunes, etc. cada uma cumprindo uma funo na expresso do pensamento.
Essas classes de palavras foram definidas em termos de seu signifi-cado, embora aspectos formais tambm fossem considerados, em me-nor grau. Essas definies das classes de palavras, oriundas da tradio greco-latina, perduram at hoje nas gramticas escolares que voc estu-dou na escola! Vejam a fora da especulao desses filsofos e gramti-cos da Antiguidade!
As gramticas da poca clssica tinham muitas vezes um interesse pedaggico e normativo, com o objetivo de ilustrar a elite, por meio do ensino das boas construes, extradas de obras literrias. Mas a preocu-pao com a estrutura da linguagem tambm estava presente. Dionsio, o Trcio, por exemplo, em sua obra intitulada Arte da Gramtica, estuda as classes de palavras com base na flexo, em especial a flexo de caso, adotando assim uma abordagem formal da estrutura lingustica (cf. Ne-ves, 2001, p. 39).
Resumindo o tpico: podemos dizer que para os gregos e romanos da poca clssica o estudo da linguagem e da gramtica era um meio de entender o pensamento e a realidade. Eles queriam tambm definir se a linguagem fazia parte da natureza ou da cultura. Scrates era um naturalista, rejeitando a ideia de que a linguagem fosse uma conveno e como tal fizesse parte da cultura. As teorias do perodo clssico deram origem a muitas especulaes filosficas, mas tambm contriburam para a formao de conceitos fundamentais dos estudos gramaticais, como os conceitos de sentena, de classes gramaticais e de formas lin-gusticas.
Voc vai estudar mais sobre aspectos norma-tivos das gramticas na Unidade C
Os casos gramaticais so desinncias (afixos) flexio-nais que servem para mar-car a funo sinttica da palavra qual se juntam. Como exemplo, podemos citar os casos nominativo (que marca o sujeito da sentena) e acusativo (que marca o objeto direto). O grego e o latim apresen-tavam casos. O portugus no contm marcao de casos gramaticais.
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Captulo 03Lngua universal e lnguas particulares: da Idade Mdia ao sculo XVIII
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3 Lngua universal e lnguas particulares: da Idade Mdia ao sculo XVIII
Depois da dissoluo do Imprio Romano, a Europa passou a viver uma situao de intenso plurilinguismo. Os vernculos comearam a surgir e a se desenvolver, como ocorreu com o portugus. Por volta do ano mil da era crist, j havia um leque de lnguas nacionais disputando espao com o latim, que tinha se tornado a lngua internacional da cul-tura no Ocidente, desde a poca do Imprio Romano. O grego j perde-ra sua fora. Havia uma verdadeira situao de Torre de Babel por volta do ano mil, com lnguas germnicas convivendo com lnguas neolatinas (como o portugus e o italiano, entre muitas outras), e lnguas isoladas, como o basco. Como afirma Umberto Eco (2001, p. 38), [...] a Europa apresenta-se como uma Babel de lnguas novas, e s em seguida como um mosaico de naes.
Os filsofos e gramticos tinham agora de lidar com essa enorme diversidade de lnguas, e no podiam mais se limitar descrio dos idiomas de maior prestgio, como o latim e o grego.
As respostas que os estudiosos apresentaram a essa nova situao so muito variadas. Uma primeira alternativa foi deixar de lado a espe-culao sobre a natureza da linguagem humana universal e se dedicar descrio de lnguas particulares . Com isso, elaboraram-se gramticas descritivas de diferentes vernculos. Um exemplo a gramtica do pro-venal, que era uma lngua culturalmente importante, falada no sul da Frana, e que exercia uma grande influncia em outras regies, como a Itlia e a Catalunha.
A razo dessa disseminao cultural do provenal que se tratava da lngua dos poetas trovadores, que gozavam de muito prestgio na Idade Mdia. Uma obra que une gramtica e potica provenal o tra-tado denominado Leys dAmors, publicado em 1336.
VernculoLnguas nativas de uma populao. Trask (2004, p. 304, grifos do autor) define vernculo como A fala corrente, do dia-a-dia, numa deter-minada comunidade. Este termo emprega-do em contraste com a lngua padro.
Essa oposio lngua universal versus lngua particular voltar a ser estudada na seo 9.1 da Unidade C.
No sculo XVI, surgiram muitas gramticas do por-tugus. A primeira delas foi a de Ferno de Oliveira (Grammatica da linguagem portuguesa), publicada em 1536.
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Estudos Gramaticais
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O preconceito contra os vernculos era muito forte no fim da Idade Mdia e ao longo do Renascimento. As lnguas clssicas (grego e latim) eram consideradas as nicas verdadeiras; as outras, como italiano, cata-lo, provenal, ingls, portugus, alemo, etc., eram vistas como dialetos ou como lnguas precrias e sem gramtica. A descrio desses idio-mas foi, contudo, sendo feita aos poucos, por meio de vrias gramticas descritivas. Leon Battista Alberti, por exemplo, escreveu, em 1450, uma gramtica do italiano [...] com o propsito manifesto de mostrar que o italiano tambm tinha regras (WEEDWOOD, 2002, p. 72).
Outra vertente era a redao de gramticas latinas com funes pedaggicas. Como o latim clssico deixara h muito de ser falado nas ruas, os intelectuais lutaram para a sua preservao como lngua de cul-tura, a ser usada nas universidades e nas igrejas. Um exemplo disso, j em pleno Renascimento, a gramtica latina escrita pelo ingls Thomas Linacre (1460-1524). Essa gramtica funde caractersticas descritivas, com elementos especulativos sobre a natureza da linguagem humana em geral.
Mas, parte essa descrio de lnguas particulares, havia outra resposta Torre de Babel europeia. Comearam a aparecer propostas de representao do que seria uma lngua perfeita, que tivesse validade universal. Umberto Eco (2001) argumenta que a Europa nasceu sob o signo da dissoluo do latim como lngua universal; a confuso lingus-tica estava instalada, e alguns pensadores saram em busca de uma ln-gua perfeita que pusesse ordem no caos.
Na verdade, a ideia de que existia uma lngua universal j vinha desde a Idade Mdia, com os modistas (no eram estilistas de moda; eles falavam dos modos de significao e ficaram conhecidos como os modistas...). No tratado De modis, Bocio de Dcia (sc. XIII) afirma que, de cada idioma, possvel deduzir as regras de uma gramtica uni-versal (apud ECO, 2001, p. 66). Essa gramtica universal seria a lngua perfeita, que nos daria acesso verdade e essncia das coisas. Mas essa lngua perfeita havia se perdido no tempo, e o que restava era a Babel das lnguas reais. O grande poeta italiano Dante, que escreveu o poema a Divina Comdia no vernculo de sua terra natal, percebia os vern-culos como lnguas imperfeitas, pois a lngua ideal havia se perdido.
Muitas vezes, a eli-
te de um pas usava
uma lngua de maior
prestgio para se co-
municar em momen-
tos mais formais. Por
exemplo, na regio
que hoje a Alema-
nha, a elite falava
francs no sculo
XVIII, e o alemo era
considerado a lngua
das classes baixas.
Isso s mudou com
o Romantismo, no
sculo XIX, quando o
alemo passou a ser
valorizado.
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Captulo 03Lngua universal e lnguas particulares: da Idade Mdia ao sculo XVIII
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Na verdade, apesar dessa busca de uma lngua internacional artificial (busca que chega at nossos dias com o esperanto), o que temos mesmo so as diferentes lnguas reais, com as possveis imperfeies e dificul-dades que apresentem. A lngua perfeita (seja o que isso for) apenas uma utopia.
Alm dessas duas alternativas que j examinamos (descrio de lnguas particulares e busca de uma lngua perfeita), uma outra res-posta multiplicidade de idiomas foi o racionalismo. A ideia era que as diferentes lnguas reais poderiam ser descritas a partir de princpios comuns a todas elas. No se trata de buscar a lngua ideal, mas sim de identificar as propriedades das lnguas que podem ser inferidas a partir de princpios descritivos bem definidos. Um dos maiores exemplos de gramtica racionalista a Gramtica de Port-Royal, escrita por Arnauld e Lancelot e publicada em 1670. Os gramticos de Port-Royal tentaram [...] demonstrar que a estrutura da lngua um produto da razo e que as diferentes lnguas so apenas variedades de um sistema lgico e ra-cional mais geral (LYONS, 1979, p. 17).
Os autores argumentam que h, na mente humana, trs operaes bsicas: conceber, julgar e raciocinar. Essas operaes esto na base da constituio da gramtica de qualquer lngua. Weedwood (2002, p. 99) observa que
[...] as operaes mentais foram transformadas na base das distines
gramaticais: as trs operaes primrias formar um conceito como
redondo, fazer um julgamento como a terra redonda, e raciocinar
forneciam um arcabouo para distinguir as vrias partes do discurso
e para o estudo da sintaxe. Como essas operaes e as suas consequn-
cias lingusticas so universais, elas podem ser exemplificadas por meio
de qualquer lngua, e o francs e o latim oferecem a maioria dos exem-
plos. Dessa maneira, a clebre anlise da orao Deus invisvel criou o
mundo visvel mostra simplesmente como trs proposies mentais
distintas que Deus invisvel, que Ele criou o mundo, e que o mundo
visvel esto includas nesta nica proposio verbal.
A ideia desses gramticos que a estrutura gramatical reflete uma estrutura lgica subjacente. Essa lgica corresponde articulao dos pensamentos. No exemplo citado, se Deus invisvel e o mundo visvel, e se Deus criou o mundo, ento o Deus invisvel criou o mundo visvel.
Port-Royal era um monas-trio jansenista situado em Paris, que abrigava religiosos e eruditos.
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Estudos Gramaticais
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A percepo da linguagem humana como fruto da razo exerceu uma forte influncia nos estudos lingusticos, que se fazem sentir at hoje em dia. Autores como Leibniz, no sculo XVIII, Frege, no sculo XIX, e Chomsky, no sculo XX, entre muitos outros, deram continuida-de a essa tradio racionalista, criando modelos lgicos e/ou gramati-cais sofisticados que tentam reproduzir o sistema de regras que produ-zem as sentenas gramaticais das lnguas humanas.
Sugerimos que voc pesquise sobre como lnguas que so hoje im-
portantes foram se afirmando como lnguas nacionais a partir da Idade
Mdia (por exemplo, o portugus, o francs, o italiano, o ingls, etc.).
Resumindo este tpico: no sculo XI da era crist, a Europa havia se convertido num grande caldeiro de lnguas, com enorme variedade de idiomas, falados por diferentes populaes. Isso influenciou o tipo de teoria gramatical que se elaborou desde essa poca, at o sculo XVIII. Desde o final da Idade Mdia, e em especial no Renascimento, houve uma exploso de gramticas de lnguas nacionais da Europa. A primeira gramtica do portugus, por exemplo, de 1536. Por outro lado, com o fim do domnio do latim, alguns autores especularam sobre a existncia de uma lngua perfeita, que pudesse dar ordem ao caos lingustico euro-peu. Finalmente, a partir do Renascimento, comearam a surgir gram-ticas com fundamentos racionalistas, que tentavam buscar os princpios universais que esto por trs de todas as lnguas humanas. Um bom exemplo desse tipo de estudo a Gramtica de Port-Royal.
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Captulo 04As lnguas como produtos da histria: a poca do Romantismo
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4 As lnguas como produtos da histria: a poca do Romantismo
A partir da segunda metade do sculo XVIII, e em especial na pri-meira metade do sculo XIX, houve um grande movimento de ideias, denominado de Romantismo, que significou uma reao ao racionalis-mo. O racionalismo sustentava que a linguagem era fruto de princpios racionais universais. Como tal, o racionalismo se opunha ao empirismo e ao historicismo. Para os empiristas, a aquisio do saber se d atravs dos sentidos, que organizam e esquematizam os dados de nossa expe-rincia. Para os historicistas, por sua vez, os sistemas simblicos huma-nos, como lngua e cultura, mudam profundamente ao longo do tempo, no refletindo apenas princpios racionais universais e imutveis.
Os autores romnticos sustentavam que as lnguas humanas so o produto das circunstncias histricas de uma civilizao, e como tal sofrem enorme variao em funo da historicidade. Alm disso, esses autores pensavam que a lngua no exprime apenas princpios racionais, mas est ligada aos sentidos e imaginao dos seres humanos.
O movimento romntico ser-viu tambm para fortalecer a ideia de cultura nacional, na medida em que os vernculos eram entendidos como expresso da alma de um povo. Com isso, houve a valorizao, em especial a partir do sculo XIX, de lnguas como o alemo e o italiano, entre outras. A Torre de Babel no era vista mais como algo necessariamente negativo, pois a expresso cultural s podia dar-se por meio da diversidade das lnguas nacio-nais.
Vamos citar aqui a obra de trs autores importantes que ajudaram a constituir a ideologia romntica: Vico, Rousseau e Humboldt.
Figura 3 - A Torre de Babel, de Peter Brueghel, o velho (1563).
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Estudos Gramaticais
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Para o filsofo italiano Vico (1668-1744), a viso racionalista e car-tesiana da cincia no se aplicava ao saber sobre o homem. Lnguas, smbolos e culturas devem ser descritas no a partir de princpios gerais abstratos, mas a partir de uma descrio detalhada de como essas reali-dades simblicas foram construdas ao longo do tempo. A realidade hu-mana, psicolgica ou social, no se enquadrava, como objeto de saber, na viso da cincia cartesiana.
Vico defendia que a linguagem surgiu e foi evoluindo conforme as necessidades dos seres humanos, e associa a cada poca da sociedade certa forma de linguagem. Ele descreve o ciclo da histria com o que ele chama de trs idades: a primeira, a idade dos deuses, em que a linguagem do homem era potica, servindo para descrever os fenmenos naturais e as aes cotidianas; a segunda, a idade dos heris, em que a fantasia ainda prevalecia sobre a reflexo e a imaginao se confundia com a re-alidade (por exemplo, a linguagem de Ilada e do Antigo Testamento); e a terceira, a idade dos homens, corresponde cultura europeia da poca de Vico, e est ancorada na literatura filosfico-cientfica de base con-ceitual e no mais imaginativa.
Para Vico, imaginao e reflexo so os dois lados da atividade sim-blica do homem. As estruturas simblicas so dotadas de um valor es-pecfico, e no universal. Esse sentimento da histria ajudava a entender a enorme variao das lnguas e das culturas, que se manifestou forte-mente no sculo XIX, quando o Romantismo atingiu o seu auge. Serviu tambm para valorizar a lngua e a cultura populares:
[...] o gnio popular o criador da verdadeira poesia, que no seria pro-
duto de civilizaes altamente desenvolvidas, mas obra do instinto e
da imaginao livres, sendo mais espontnea e genuna nos perodos
primitivos. Em tais perodos, o instinto, a imaginao e a tradio oral
eram mais fortes que a razo e a reflexo, fazendo da poesia a lngua na-
tural dos homens. (HERDER, Johann Gottfried; GOETHE, Wolfgang apud
FICKER, 1994.).
Outro precursor do Romantismo foi o filsofo francs Rousseau (1712-1778). Em seu Ensaio sobre a origem das lnguas, Rousseau argu-menta que as paixes, e no as necessidades humanas, foram o motor do desenvolvimento de nossa faculdade de linguagem. Ele associa o desen-
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Captulo 04As lnguas como produtos da histria: a poca do Romantismo
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volvimento da linguagem verbal a uma maior expresso das emoes humanas no meio social. Afirma, ainda, que os homens primitivos satis-faziam plenamente suas necessidades prticas sem o recurso da lingua-gem, comunicando-se apenas por gestos e sons inarticulados.
A linguagem articulada serviu, segundo ele, para tirar o homem primitivo de seu isolamento fsico e espiritual. O efeito da linguagem sobre os homens foi duplo: em primeiro lugar, ofereceu a eles uma per-cepo melhor da realidade dos outros. A linguagem deu-lhes a ima-ginao e [...] quem no imagina no sente mais do que a si mesmo: encontra-se s no meio do gnero humano (ROUSSEAU, 1987, p. 175). Em segundo lugar, a linguagem deu ao ser humano a capacidade de conhecer-se a si mesmo, de voltar-se para seu interior, com uma expres-so mais desenvolvida de suas emoes.
Contrariando o senso comum de que Rousseau pregava um retor-no ao mundo primitivo e no civilizado, essas ideias sobre a linguagem mostram que ele no desprezava a importncia da civilizao; o estado social deu ao homem uma [...] ampliao dos horizontes intelectuais, enobrecimento dos sentimentos e elevao total da alma (ARBOUSSE-BASTIDE; MACHADO, 1987, p. 14).
Para Rousseau, assim como para Vico, as lnguas esto sujeitas a uma grande variao ao longo da histria, e a estrutura da gramtica de uma lngua reflete a sociedade e a imaginao de uma dada poca. Isso se ope, por certo, ao racionalismo preconizado pela Gramtica de Port-Royal.
Outro nome importante associado ao romantismo o de Humboldt (1767-1835). Ele argumentava que o destino interno de uma nao que determina o tipo de linguagem que essa nao vai criar. Mas no se trata apenas de razo ou conceitos, pois uma lngua exprime tam-bm emoes, atitudes e imaginao. Enfim, Humboldt, ao contrrio dos racionalistas, via a lngua como a emanao do esprito integral de um povo.
Como outros precursores do romantismo, entre eles Herder e Vico, Humboldt tinha um enorme interesse pela questo da origem da linguagem, e argumentava, juntamente com aqueles autores, que essa
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Estudos Gramaticais
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origem era potica e imaginativa, e no racional. Origem e finalidade se completavam: a arte era o destino maior da linguagem, pensava Hum-boldt. Ele tambm defendia que uma lngua era uma atividade (ener-geia) e no um produto (ergon), o que implica que uma lngua envolve um intercmbio dinmico entre estrutura, pensamento e cultura.
Resumindo este tpico: desde a segunda metade do sculo XVIII, e durante todo o sculo XIX, os estudos gramaticais foram influencia-dos pelas ideias do romantismo. Essa linha de pensamento favoreceu o estudo histrico sobre as lnguas e sobre a relao delas com as dife-rentes etapas de uma civilizao. As lnguas nacionais passaram a ser valorizadas, e comeam a adquirir o prestgio intelectual antes atribudo a apenas algumas lnguas internacionais, como o latim e o francs. Fa-tores psicolgicos e culturais passaram a ser considerados importantes no estudo da linguagem.
A questo da origem da linguagem estava na moda desde a segunda metade do sculo XVIII.
Em 1769, a Academia de Berlin instituiu um prmio
para a melhor disserta-o sobre o tema. Quem
ganhou foi Herder.
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Captulo 05A busca da origem: do Romantismo ao Mtodo Comparativo
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5 A busca da origem: do Romantismo ao Mtodo Comparativo
O Romantismo, com sua obsesso pela origem da linguagem e a valorizao das diferenas culturais, terminou criando um ambiente propcio para o desenvolvimento do Mtodo Comparativo, que buscava estabelecer famlias de lnguas a partir da comparao de palavras e es-truturas de diferentes idiomas.
Se um grupo de lnguas apresentava uma srie de palavras seme-lhantes no som e no sentido, ento se podia estabelecer com segurana um parentesco entre elas. As variaes de sons entre os radicais dos vo-cbulos de lnguas de uma mesma famlia no eram casuais, mas defi-nidas por regras fonticas bem estabelecidas. Dessa forma, foram es-tabelecidas correlaes entre lnguas muito distantes geograficamente. Descobriu-se, por exemplo, que lnguas to diferentes quanto o sns-crito (lngua clssica e religiosa da ndia), o persa, o armnio, o grego, o latim, o antigo germnico, o romani (lngua dos ciganos), entre outras lnguas, derivavam de uma lngua ancestral comum, o indo-europeu, cuja existncia no pode ser atestada diretamente, mas inferida a partir da comparao entre as lnguas derivadas dessa lngua-me mais antiga. Assim, cada famlia de lnguas derivaria de uma me especfica mais antiga. De uma maneira mais cientfica e objetiva, satisfazia-se o desejo de recuperar a origem das diferentes lnguas, e, por tabela, a cultura que cada uma carrega.
A descoberta inicial mais importante e extraordinria foi a do in-gls Sir William Jones, que fora indicado juiz da Suprema Corte de Jus-tia em Calcut, na ndia. Neste pas, na poca colnia da Inglaterra, ele se aperfeioou nos estudos do snscrito, a lngua sagrada da ndia. Numa famosa palestra, em 1786, ele afirmou o seguinte:
O snscrito, seja qual for sua antiguidade, tem uma estrutura maravilho-
sa; mais perfeito que o grego, mais copioso que o latim, e mais primo-
rosamente refinado que ambos, embora mantenha com eles tamanha
afinidade, tanto nas razes dos verbos como nas formas da gramtica,
que impossvel pensar que isso se deu por acidente; a afinidade de
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Estudos Gramaticais
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fato to forte que nenhum fillogo poderia examinar as trs lnguas sem
pensar que elas tenham brotado de alguma fonte comum que, talvez,
no mais exista. (JONES apud PINKER, 2004, p. 321).
Essa fonte comum seria o indo-europeu, extinto h muito tempo, uma lngua-me (tambm chamada de protolngua) que devia ser fala-da inicialmente na sia, talvez na atual Turquia, cujos falantes migra-ram, em parte para a ndia, em parte para a Europa. Eis a razo pela qual as lnguas se diversificam: as migraes humanas. Quando membros de um agrupamento humano, que inicialmente falam uma mesma lngua, deslocam-se para uma regio distante, ao longo do tempo, introduzem mudanas inconscientes na sua lngua de origem, ao ponto de criarem lnguas bem distintas, como so o grego e o snscrito. Mas um exame acurado mostra identidades lexicais e estruturais importantes, e o pa-rentesco pode ser estabelecido.
O mtodo comparativo representou uma metodologia de traba-lho emprico que pde satisfazer a necessidade de se encontrar a lngua original da qual teriam advindo as lnguas modernas. Assim, podia-se realizar o sonho que esteve no auge durante o Romantismo: investigar a origem da linguagem, agora em bases concretas, sem depender apenas da intuio e da especulao.
Essa nfase na histria favoreceu o estudo de lnguas exticas, como as lnguas asiticas. No entanto, paralelamente, a comparao en-tre lnguas de famlias distantes podia conduzir a novos preconceitos. Humboldt, por exemplo, defendia a superioridade das lnguas europeias em relao s lnguas da sia (cf. SEUREN, 1998). Hoje sabemos, to-davia, que no h lnguas superiores a outras, e diferenas gramaticais no podem ser interpretadas como diferenas de qualidade da estrutura lingustica.
O interesse pela histria comandou as descobertas do mtodo comparativo. Na verdade, muitos comparatistas acreditavam, no incio, que o ariano, a lngua-me da famlia indo-europeia, seria a lngua ori-ginal da raa humana, tendo existido h cerca de 6.000 anos. Mas isso logo se mostrou falso, pois existem outras famlias de lnguas to ou mais antigas. Como vimos aqui, hoje se sabe que a origem da lingua-
Tambm chamado de filologia comparativa ou
comparativismo.
Um comparatista im-portante, o francs
Ernest Renan, defendeu teorias equivocadas ao comparar lnguas. Para
ele, as lnguas analticas (como o francs) so
mais evoludas que ln-guas como o chins. Ele sustentava tambm que lnguas semticas (como
o hebraico) tinham certas limitaes, difi-
cultando, por exemplo, o raciocnio abstrato
nessas lnguas!
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Captulo 05A busca da origem: do Romantismo ao Mtodo Comparativo
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gem deve ter ocorrido h cerca de 100.000 anos. O mistrio da origem da linguagem continua.
Pesquise sobre a obra de autores importantes do Mtodo Comparativo
e sobre as contribuies que eles deram.
Resumindo o tpico: o ambiente romntico, voltado para a hist-ria das lnguas, favoreceu o desenvolvimento do mtodo comparativo, que visa comparar lnguas diferentes, a fim de estabelecer relaes de parentesco entre elas. A comparao entre idiomas de diferentes conti-nentes estimula a descrio de lnguas pouco estudadas antes, mas mui-tas vezes os comparatistas continuaram a defender preconceitos sem ne-nhuma base cientfica, como o de que as lnguas europeias so melhores que as asiticas.
Fechando a Unidade
Esperamos que esse passeio no tempo tenha ajudado voc a perce-ber como o estudo da linguagem sempre foi um tpico de muito inte-resse, e que os fundamentos filsofos e histricos so importantes para se entender como os estudos gramaticais foram se desenvolvendo nas diferentes etapas da civilizao ocidental. Paramos a nossa viagem no sculo XIX, pois a partir da comea a chamada lingustica moderna, cujos fundamentos voc vai estudar nas unidades seguintes.
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Unidade BA lingustica como estudo cientfico da lngua(gem)
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Objetivos desta Unidade:
Apresentar diferentes concepes de lngua(gem);
Identificar propriedades caracterizadoras das lnguas naturais;
Perceber o carter de cientificidade da Lingustica Moderna versus a Gramtica Tradicional.
Nesta segunda Unidade, apresentamos a voc a Lingustica
como estudo cientfico da lngua(gem). Veremos, inicialmente, dife-
rentes concepes de lngua(gem), baseadas ora numa funo cog-
nitiva ora numa funo social; em seguida, passaremos s principais
propriedades que caracterizam as lnguas naturais; fechando a Uni-
dade B, traremos baila a questo da cientificidade nos estudos da
lngua(gem).
A depender da perspec-tiva terica assumida,
alguns autores no fazem distino entre lingua-
gem e lngua. Por isso a opo de representar am-bas as noes numa nica
palavra: lngua(gem).
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Captulo 06Concepes de lngua(gem)
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Concepes de lngua(gem)
Vamos introduzir este captulo com a seguinte passagem extrada de uma entrevista com o professor Ataliba Castilho, no livro Conversas com lingistas: virtudes e controvrsias da lingustica:
Que lingstica?
Bom, eu, quando dou aula na graduao, costumo dizer para os alu-
nos: se voc quer entender o que lingstica e o que seu objeto,
voc precisa pensar um pouco na fbula dos trs cegos apalpando o
elefante. Cada um apalpava um pedao do elefante e definia o elefante
por aquele pedao. Ento, o que pegava a perna do
elefante dizia o elefante assim um cilindro muito
duro, rgido, um animal com formato de cilindro e
que esttico, parece que esse animal no se mexe
e um animal que ocupa posio vertical no espa-
o. O outro que mexia l na tromba, naturalmente
discordava, no s quanto disposio no espao,
quanto rigidez ao tato, tanto quanto falta de
mobilidade. Imagino at que algum desses cegos,
tocando em outros lugares, concebeu a idia de ca-
tegoria vazia. Ento, a lngua e a lingstica no so;
elas so o que para cada um de ns parecem ser.
(CASTILHO, 2003, p. 55).
Esse trecho apresenta de forma bem-humorada o tpico central da Unidade B. da definio de lingustica e de seu objeto que vamos tra-tar agora, contrapondo, brevemente, a Lingustica Moderna Gramti-ca Tradicional no que diz respeito ao carter cientfico de ambas.
pergunta: Que lingustica?, costumamos encontrar a seguinte resposta: A lingustica o estudo cientfico da lngua(gem) humana.
Mas essa resposta nos coloca outras indagaes:
O que a lngua(gem)?
O que um estudo cientfico?
Vamos tratar dessas questes a seguir.
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Figura 4 - Ilustrao Elefante e cegos
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Estudos Gramaticais
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As definies de lngua(gem) so diversas, variando conforme o ponto de vista adotado pelo autor. Vejamos algumas:
(1) Linguagem a capacidade especfica espcie
humana de comunicar por meio de um sistema de
signos vocais (ou lngua), que coloca em jogo uma
tcnica corporal complexa e supe a existncia de
uma funo simblica e de centros nervosos gene-
ticamente especializados. Esse sistema de signos
vocais utilizado por um grupo social (ou comuni-
dade lingstica) determinado constitui uma lngua
particular (DUBOIS et al., 1973, p. 387).
(2) O termo [linguagem] se aplica quela aptido
humana para associar uma cadeia sonora (voz)
produzida pelo chamado aparelho fonador a um
contedo significativo e utilizar o resultado dessa
associao para a interao social uma vez que tal
aptido consiste no apenas em produzir e enviar, mas ainda em rece-
ber e reagir comunicao. Compreendida dessa maneira, a linguagem
aparece como o mais difundido e o mais eficaz instrumento natural de
comunicao disposio do homem (BORBA, 1991, p. 9-10, grifos do
autor).
(3) [A lngua] no se confunde com a linguagem; somente uma par-
te determinada, essencial dela, indubitavelmente. , ao mesmo tem-
po, um produto social da faculdade de linguagem e um conjunto de
convenes necessrias, adotada pelo corpo social para
permitir o exerccio dessa faculdade nos indivduos. [...]
A lngua de natureza homognea, e constitui-se num
sistema de signos (SAUSSURE, 1971, p. 17, 23).
(4) A faculdade de linguagem uma estrutura cognitiva
inata, humana e universal, e faz parte da herana gen-
tica de cada membro da espcie humana, do mesmo
modo que a viso parte dessa herana. Essa estrutu-
ra, no que tange linguagem, o estado mental inicial
[chamado de Gramtica Universal ou GU]. Passando por
estgios sucessivos, esse estado inicial se desenvolve,
seguindo um processo de maturao que sofre a influ-
ncia do meio e das experincias pessoais, do mesmo
modo como a viso, at atingir um estgio estvel (LOBATO, 1986, p. 38).
Figura 5 Ilustrao O crebro humano
Figura 6 Ilustrao Linguagem como ao interindividual
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Captulo 06Concepes de lngua(gem)
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(5) A linguagem [ vista] como atividade, como forma de ao, ao
interindividual finalisticamente orientada; como lugar de interao que
possibilita aos membros de uma sociedade a prtica dos mais diversos
tipos de atos, que vo exigir dos semelhantes reaes e/ou comporta-
mentos, levando ao estabelecimento de vnculos e compromissos ante-
riormente inexistentes (KOCH, 1992, p. 9-10, grifos da autora).
Os trechos apresentados anteriormente evidenciam duas diferentes
concepes de linguagem/lngua:
uma centrada na funo comunicativa/social, que v a lingua-
gem/lngua como instrumento de comunicao e forma de
interao;
e outra centrada na funo cognitiva/biolgica da linguagem.
Leia novamente as cinco definies apresentadas atentando para
essa diferenciao.
No nosso propsito, neste momento, aprofundar uma discusso sobre concepes de linguagem/lngua, e sim apenas chamar a ateno para o fato de que diferentes pontos de vista criam diferentes objetos, ou, nos termos de Saussure, de que o ponto de vista que cria o objeto (1971, p. 15). Assim, vamos reter por ora que a lingustica se ocupa da linguagem/lngua em qualquer das acepes mostradas acima, o que vai se refletir, naturalmente, em diferentes abordagens tericas do fenmeno lingustico. O mesmo objeto pode ser analisado sob diferentes ngulos, a partir de dife-rentes pressupostos que podem ser complementares ou conflitantes. (Lem-bra da fbula dos cegos apalpando o elefante na introduo desta unidade?)
Ao longo do curso de Letras, voc ter oportunidade de estudar diferentes abordagens tericas. Vai ver que existem teorias formais e teorias funcionais da lngua; que existem abordagens essencialmente lingusticas e abordagens interdisciplinares, como, por exemplo, a so-ciolingustica (que se ocupa da relao entre linguagem e sociedade), a psicolingustica (que se ocupa das questes de processamento e aqui-sio da linguagem), a etnolingustica (que se ocupa da relao entre linguagem e cultura), e assim por diante.
Ferdinand Saussu-
re um linguista
suo a quem se
credita a atribuio
de estatuto cientfi-
co lingustica, no
incio do sculo XX.
Pode-se dizer que
Saussure, com sua
obra Curso de lin-
gustica geral, inau-
gurou a Lingustica
Moderna. a partir
de Saussure que
os estudos lingus-
ticos passam a ad-
quirir um carter
mais sistemtico e
abstrato, e a lngua
estudada sincro-
nicamente, desvin-
culada de sua his-
tria. A ele se deve
o incio de uma
corrente lingustica
denominada es-
truturalismo.
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Estudos Gramaticais
40
At agora focamos nossa ateno em duas diferentes concepes de lngua(gem): comunicativa ou cognitiva. Vamos atentar agora para certas diferenas entre linguagem e lngua. Observe a distino estabe-lecida no excerto a seguir.
Com relao ao objeto de estudo da lingstica, deve-se dizer que esta
cincia lida tanto com lnguas particulares, isto , entidades individuais,
como com a natureza geral destas mesmas lnguas particulares, tentan-
do responder a dois tipos de pergunta: (a) o que as diferentes lnguas
tm em comum e o que as diferencia entre si?; (b) o que h nas lnguas
humanas que lhes atribui carter nico e as distingue dos demais sis-
temas de comunicao? Considerando que a linguagem ser definida
como o que h de comum s diferentes lnguas, conclui-se que a lin-
gstica tem um duplo objeto: o estudo da linguagem em geral e o
estudo das diferentes lnguas (ou, mais especificamente ainda, da gra-
mtica das diferentes lnguas). (LOBATO, 1986, p. 34).
Para refletir
1) Tente responder, conforme sua intuio de falante, as questes a) e b) apresentadas no excerto de Lobato (1986).
2) Identifique a concepo de linguagem/lngua (como funo comunicativa/social ou cognitiva/biolgica) pre-sente nas seguintes definies extradas dos Parmetros Curriculares Nacionais PCN (BRASIL, 1998b, p. 20):
Linguagem: ao interindividual
orientada por uma finalidade espe-
cfica, um processo de interlocuo
que se realiza nas prticas sociais
existentes nos diferentes grupos de
uma sociedade, nos distintos mo-
mentos de sua histria.
Lngua: sistema de signos especfi-
co, histrico e social, que possibilita
a homens e mulheres significar o
mundo e a sociedade.
Figura 7 Capa dos PCNs de Lngua Portuguesa.
Os Parmetros Curri-
culares Nacionais so
documentos oficiais
do MEC que orientam
o planejamento pe-
daggico nas escolas
brasileiras
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Captulo 06Concepes de lngua(gem)
41
Resumindo este tpico: A lingustica o estudo cientfico da lngua(gem) humana. Existem diferentes concepes de linguagem e/ou de lngua: uma centrada na sua funo comunicativa/social como instrumento de comunicao e modo de interao; e outra na funo cognitiva/biolgica como representao do pensamento. Cada uma dessas concepes vai se refletir em diferentes abordagens tericas do fenmeno lingustico. Nesse sentido, podemos dizer que o ponto de vista que cria o objeto.
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Captulo 07Propriedades das lnguas naturais
43
7 Propriedades das lnguas naturais
As lnguas naturais so lnguas humanas que se opem s lnguas formais construdas por matemticos e lgicos, e s lnguas artificiais como o esperanto. So exemplos de lnguas naturais: o portugus, o italiano, o ingls, a Lngua Brasileira de Sinais (LIBRAS). Vale lem-brar, ainda, que a lingustica se ocupa das lnguas naturais. As pro-priedades descritas a seguir caracterizam e particularizam as lnguas naturais.
7.1 Flexibilidade e adaptabilidade
Ns podemos usar a lngua para produzir inmeros atos de fala: externar nossos pensamentos e sentimentos, fazer perguntas ou decla-raes, fazer pedidos ou dar ordens, fazer ameaas ou promessas etc. Assim, a linguagem humana pode desempenhar inmeras funes, de natureza cognitiva ou comunicativa.
Considerando-se quem fala, de que se fala e com quem se fala, te-mos trs funes: uma que procura traduzir a atitude do falante naquilo que ele est transmitindo (funo emotiva), outra centrada no contexto ou no contedo transmitido (funo referencial), e uma terceira centra-da no ouvinte (funo conativa). Como ampliao dessas funes bsi-cas, temos ainda: uma que focaliza a prpria mensagem dando-lhe rele-vo (funo potica), outra que checa o canal pelo qual falante e ouvinte entram em contato (funo ftica) e uma ltima que se centra no cdigo, ou seja, na prpria lngua, usando-se a lngua para falar sobre a prpria lngua (funo metalingustica).
Essas seis funes foram propostas por Jakobson, considerando a natureza social da linguagem. No quadro a seguir podemos visuali-zar melhor e relao entre as funes da linguagem e os elementos que constituem a comunicao:
O esperanto uma ln-gua criada pelo mdico polons Ludwig Lazar Zamenhof, por volta de 1887, para ser lngua de comunicao internacio-nal. Possui uma gramtica regular e utiliza razes latinas e gregas, alm de razes das lnguas euro-peias mais faladas.
Ato de fala uma ativi-dade comunicativa que considera as intenes do falante e os efeitos que consegue provocar no ouvinte.
Voc poder saber mais sobre as funes da lin-guagem lendo o captulo A comunicao humana, de Diana P. de Barros. In: FIORIN, J. L. et al. (Orgs.). Introduo lingstica. I. Objetos tericos. So Paulo: Contexto, 2002. p. 32-41.
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Estudos Gramaticais
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importante observar que cada texto no tem apenas uma funo, mas vrias delas. O que ocorre que existe uma ou outra que predo-mina. Por exemplo, no texto publicitrio predomina a funo conativa, centrada no interlocutor (ouvinte/leitor). So formas lingusticas tpicas da funo conativa: pronome de segunda pessoa, verbo no modo impe-rativo, perguntas para produzir o efeito de persuaso. Outro exemplo: nas definies do dicionrio predomina a funo metalingustica. Veja a definio da palavra metalinguagem no dicionrio Houaiss: lingua-gem (natural ou formalizada) que serve para descrever ou falar sobre uma outra linguagem, natural ou artificial. Como exemplo de funo ftica, temos o estabelecimento de contato social por meio do uso de expresses como bom dia! al!.
A propriedade de flexibilidade e adaptabilidade da lngua, alm de (i) servir para produzirmos diferentes atos de fala, permite (ii) nos re-portar no tempo: ao passado, ao presente e ao futuro, (iii) nos referir a coisas que no existem no mundo real; e assim por diante.
7.2 Arbitrariedade
A lngua no um conjunto de rtulos, ou uma nomenclatura, que se aplica a uma realidade preexistente. A realidade s passa a ter existn-cia para os homens quando nomeada, de modo que s percebemos no
Roman Jakobson um dos mais im-portantes represen-tantes da Escola de Praga, movimento lingustico que sur-giu na dcada de 1920. No Crculo Lingustico de Pra-ga comearam a germinar as ideias que vieram a cons-tituir a corrente de-nominada funcio-nalismo.
Contexto/contedo/referenteFuno referencial
Remetente/falante Mensagem Destinatrio/ouvinteFuno emotiva Funo potica Funo conativa
Contato/canalFuno ftica
CdigoFuno metalingustica
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Captulo 07Propriedades das lnguas naturais
45
mundo o que nossa lngua nomeia. A realidade apreendida e nomeada atravs de signos lingusticos.
No existe um vnculo natural entre a forma das palavras (seja a ca-deia fnica, seja a representao escrita) e o seu sentido ou significado. O vnculo - Releia a seo 2 da Unidade A, que trata dessa questo sob o ponto de vista histrico - convencional ou arbitrrio e estabelecido social e culturalmente. uma espcie de acordo coletivo entre os falan-tes. O signo lingustico , portanto, arbitrrio e cultural. Por exemplo, nada h que determine que a ideia que temos de lar e moradia seja representada pela palavra casa. O que ocorre um processo de simbo-lizao, que constitui uma espcie de filtro da realidade. A linguagem categoriza a realidade, ou seja, classifica-a em categorias na medida em que representa essa realidade. Em outras palavras:
A atividade lingstica uma atividade simblica, o que significa que
as palavras criam conceitos e esses conceitos ordenam a realidade, ca-
tegorizam o mundo. Por exemplo, criamos o conceito de pr-do-sol.
Sabemos que, do ponto de vista cientfico, no existe pr-do-sol, uma
vez que a Terra que gira em torno do Sol. No entanto, esse conceito
criado pela lngua determina uma realidade que encanta a todos ns.
Uma nova realidade, uma nova inveno, uma nova idia exigem novas
palavras, mas sua denominao que lhes confere existncia. Apagar
uma coisa no computador uma atividade diferente de apagar o que
foi escrito a lpis, mquina ou caneta. Por isso, surge uma nova pala-
vra para designar essa nova realidade, deletar. No entanto, se essa nova
palavra no existisse, no se perceberia a atividade de apagar no com-
putador como uma coisa diferente. (FIORIN, 2002, p.56).
Por outro lado, a relao entre a forma da palavra (o significante) e o seu valor ou contedo (o significado), embora arbitrria, necess-ria e no depende da livre escolha do falante. Veja-se, por exemplo, o dicionrio. A significao ou os valores atribudos a cada palavra esto registrados como diferentes acepes de uso. Qualquer novo significado que a palavra venha a receber s vai ser dicionarizado aps se regulari-zar no uso dos falantes, ou seja, de um grupo social. O carter necessrio do vnculo entre significante e significado se deve a, pelo menos, dois motivos:
Signo lingustico um objeto lingustico dota-do simultaneamente de forma e sentido. A forma chamada por Saussure de significante; e o sen-tido, de significado. Por exemplo, a palavra cina-momo tem uma forma particular constituda de uma sequncia de oito fonemas (sons da fala re-presentados graficamente por letras), e tambm de um sentido particular (um tipo especfico de rvore). Os dois juntos formam um signo lingustico. Assim, o signo constitudo de significante + significado.
Voc poder saber mais sobre esse assunto len-do o captulo Teria dos signos, de J. L. Fiorin. In: FIORIN, J. L. et al. (Orgs.). Introduo lingstica. I. Objetos tericos. So Paulo: Contexto, 2002. p. 55-65.
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Estudos Gramaticais
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a) o significante sem o significado (e vice-versa) no tem valor lingustico;
b) uma vez estabelecido um vnculo convencional entre um sig-nificante e um significado, esse valor passa a ser repetido pelos falantes e se regulariza na lngua. Se ficarmos inventando li-vremente novos sentidos para palavras j conhecidas da lngua portuguesa, corremos o risco de no sermos entendidos pelos nossos interlocutores.
7.3 Dupla articulao
Em Lingustica, o termo articulao usado no sentido de seg-mentao, subdiviso de palavras em partes, que podem se recombinar em outros contextos. A lngua pode ser decomposta em unidades mni-mas de duas ordens: os morfemas unidades mnimas significativas; e os fonemas unidades mnimas no significativas. Essas unidades po-dem se combinar e recombinar indefinidamente.
Dupla articulao da linguagem
Morfemas: unidades da primeira articulao com contedo se-
mntico.
Fonemas: unidades da segunda articulao sem contedo se-mntico.
Por exemplo, a palavra refazer pode ser segmentada em quatro morfemas: re/faz/e/r. Esses morfemas significam, respectivamente:
duplicao (prefixo re),
realizar (radical faz),
2a conjugao (vogal temtica e),
infinitivo (desinncia modo-temporal r).
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Captulo 07Propriedades das lnguas naturais
47
Os morfemas aparecem em novas combinaes como em:
re/ler, re/contar, re/plantar,
faz/ia, faz/endo, faz/edor,
canta/r, faze/r, sorri/r.
A mesma palavra refazer constituda por sete fonemas: r/e/f/a/z/e/r.
Os fonemas tambm aparecem em novas combinaes, como em:
r/e/z/a/r, f/e/z, r/e/f/a/z.
Assim:
numa primeira etapa de anlise, isolamos unidades significa-tivas de natureza mrfica ou morfolgica (1a articulao). Os morfemas so unidades significativas porque cada segmento da palavra apresenta um determinado valor: radical, vogal te-mtica (1, 2 ou 3 conjugao dos verbos), marca de gnero (masculino ou feminino) ou de nmero (singular ou plural), desinncia verbal nmero-pessoal ou modo-temporal etc.;
numa segunda etapa de anlise, identificamos unidades distin-tivas de natureza fnica ou fonolgica (2a articulao). Os fo-nemas so unidades distintivas, embora no dotadas de signi-ficao, porque funcionam para distinguir palavras, como por exemplo: /pala/ versus /bala/ versus /mala/.
A articulao da linguagem facilitada pelo carter linear do sig-nificante; ou seja, o significante se desenvolve numa dimenso temporal (como numa linha), no caso da fala, ou espacial, no caso da escrita. Por linearidade, entende-se a disposio dos signos, uns depois dos outros, sem que se possa produzir mais de um elemento lingustico de cada vez.
Para refletir
Por que se diz que a dupla articulao da linguagem um fator de
economia lingustica?
Discuta essa questo com seus colegas.
Voc poder saber mais sobre a dupla articulao da linguagem lendo o captulo A lngua como objeto da Lingstica, de Antonio V. Pietroforte. In: FIORIN, J.L. et al. (Orgs.). Introduo lingstica. I. Objetos tericos. So Paulo: Contexto, 2002. p. 91-92.
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Estudos Gramaticais
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7.4 Produtividade
A produtividade uma propriedade da lngua que permite que uma dada regra seja estendida a novos casos. Assim, a partir de um n-mero reduzido de regras combinatrias, podemos produzir um nmero ilimitado de novas palavras e enunciados. A noo de produtividade se aplica tanto no mbito da formao de palavras (combinao de mor-femas), como na construo de frases (combinao de palavras). Por exemplo:
Na formao de palavras: o sufixo -idade, formador de substanti-vos, bastante produtivo, pois aparece num nmero bastante significa-tivo de palavras no portugus (facilidade, dificuldade, seriedade, familia-ridade, legalidade). J o sufixo -ura menos produtivo na formao de substantivos (quentura, largura, espessura).
A regra subjacente aos casos ilustrados acima a de formao de substantivos a partir de adjetivos:
[adjetivo + -idade/-ura = substantivo (fcil + -idade = facilidade; quente + -ura = quentura)].
Um determinado afixo (prefixo ou sufixo) pode ser produtivo numa certa poca e no em outra. Por exemplo: o prefixo disque-, prprio para formar substantivos, nem sequer existia antes dos anos 1980, mas hoje prodigiosamente produtivo em portugus do Brasil: disque-pizza, disque-remdio, disque-denncia. (TRASK, R.L. 2004, p. 241)
Vale lembrar que a aplicao de afixos no se d de maneira aleat-ria: existem certas condies gramaticais que precisam ser respeitadas. Assim, o prefixo re- pode se aplicar a bases verbais ou substantivas sem alterar a classe da nova palavra (re + contar = recontar; re + impresso = reimpresso). J os processos de sufixao geralmente alteram a classe da palavra. Por exemplo, -ismo se aplica tanto a adjetivo (timo) como a substantivo (Marx) formando substantivo (otimismo, marxismo).
Na construo de frases ou constituintes de frases: a combinao de N (nome) + V (verbo) pode gerar: Pedro saiu; crianas brincam etc. A com-binao de Art (artigo) + N (nome) + Adj (adjetivo) pode gerar: a menina bonita; os rapazes inteligentes; uma ma madura etc. E assim por diante.
Voc poder saber mais sobre a produtividade na
formao de palavras len-do A morfologia deriva-
cional. In: ILARI, R.; BASSO, R.M. O portugus da gente:
a lngua que estudamos, a lngua que falamos. So Paulo: Contexto, 2006. p.
103-108.
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Captulo 07Propriedades das lnguas naturais
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Curiosidades
No incio da dcada de 1990, o ento Ministro do Trabalho Antnio
Rogrio Magri foi alvo de piadas porque, de modo criativo, aprovei-
tando-se do estoque de morfemas disponveis em nossa lngua,
mencionou que O Plano imexvel, referindo-se ao famigerado
Plano Collor. Toda imprensa registrou o episdio, condenando o
ministro, tendo em vista que, poca, no havia registro do termo
imexvel nos dicionrios de lngua portuguesa.
O terreno futebolstico altamente criativo tambm. Leia os comen-
trios a seguir e observe como ficou marcado na memria de muitas
pessoas (principalmente de jornalistas) o episdio com o ministro
relatado acima.
Para refletir
- Usando sua intuio de falante do portugus, como voc explicaria
essa nova palavra (imexvel) criada pelo ento ministro Magri?
- Consulte dicionrios (de preferncia, Aurlio e Houaiss) e verifique se
hoje j existe o registro dessa palavra.
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Estudos Gramaticais
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7.5 Heterogeneidade
Uma outra propriedade das lnguas naturais que elas no so ho-mogneas. Pelo contrrio, as lnguas variam e mudam ao longo do tem-po. Essa variao/mudana ocorre nas dimenses geogrfica, social e estilstica. Vamos retomar este ponto na terceira unidade.
Como vimos, as lnguas naturais apresentam propriedades que as caracterizam e as particularizam.
Para refletir
Observe o dilogo travado entre Alice e Humpty Dumpty (persona-
gens de Aventuras de Alice, de Lewis Carrol), e tente descobrir que pro-
priedade das lnguas naturais est envolvida nesse dilogo.
Reflita sobre os problemas da decorrentes e discuta com seus cole-
gas.
Figura 9 - Alice e Humpty (personagens de Aventuras de Alice, de Lewis Carrol)
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Captulo 07Propriedades das lnguas naturais
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Resumindo este tpico: As principais propriedades das lnguas naturais so: (i) flexibilidade e adaptabilidade a linguagem humana pode expressar vrias funes (emotiva, referencial, conativa, potica, ftica e metalingustica) e permite que nos reportemos no tempo e que possamos nos referir a coisas que no existem no mundo real; (ii) arbi-trariedade a relao entre as palavras e o seu sentido convencional e estabelecida socioculturalmente; (iii) dupla articulao a linguagem humana duplamente articulada, sendo decomposta em unidades m-nimas significativas (morfemas) e em unidades mnimas no-significa-tivas (fonemas); (iv) produtividade a partir de um nmero reduzido de regras combinatrias, podemos produzir um nmero ilimitado de novas palavras e frases; (v) heterogeneidade as lnguas variam e mu-dam ao longo do tempo.
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Captulo 08O que um estudo cientfico?
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8 O que um estudo cientfico?Vamos tratar agora da questo da cientificidade dos estudos lingus-
ticos. Como vimos na Unidade A, as preocupaes com a linguagem so muito antigas, mas apenas no incio do sculo XX que a Lingustica Moderna ganha autonomia e reconhecida como estudo cientfico, a partir dos trabalhos de Ferdinand Saussure publicados no livro Curso de lingstica geral.
A lingustica atende a critrios de cientificidade ao apresentar as ca-ractersticas listadas abaixo, entre outras. Essas caractersticas a opem chamada gramtica tradicional. Assim, pode-se afirmar que lingustica:
emprica: lida com dados verificveis por meio da observao e da experincia; ou seja, as hipteses tericas podem ser ates-tadas pelos dados. A lingustica no tem carter especulativo ou metafsico. J as gramticas tradicionais, por serem parte da filosofia geral, tinham carter especulativo medida que pre-tendiam propor anlises que respondessem a indagaes sobre o universo.
objetiva: tem carter no preconceituoso, no emite julgamen-tos de valor a respeito da lngua do tipo certo vs. errado, feio vs. bonito, superior vs. inferior, primitivo vs. evoludo. A lingustica, por ser descritiva (e no prescritiva), opera com a noo de adequao. Por exemplo, no falamos da mesma maneira quando nos dirigimos a nossos familiares e amigos em situaes mais ntimas, e quando nos dirigimos ao nosso chefe, ao padre, ao prefeito etc. A linguagem se ajusta a novas situaes comunicativas que envolvam mudana de papis so-ciais dos interlocutores. J os juzos de valor so caractersticos da abordagem tradicional, baseada na escrita literria clssica. medida que impe julgamentos, a gramtica tradicional se constitui numa doutrina: a doutrina gramatical.
tem carter explcito: apresenta definio clara, coerente e deta-lhada dos pressupostos tericos da anlise; utiliza uma termi-nologia especializada; lida com critrios explcitos e objetivos.
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Estudos Gramaticais
54
Em outras palavras, tem um construto terico como base ex-planatria, ou explicativa, para os dados. Diferentemente, as gramticas tradicionais apresentam, muitas vezes, definies vagas e imprecisas, com mistura de critrios. Alm do mais, a maioria dessas gramticas limita-se a repetir os mesmos con-ceitos e classificaes ao longo dos anos.
Um aspecto importante a ser mencionado que, com o advento da Lingustica Moderna, a lngua escrita deixa de ser considerada como mais importante que a falada. Admite-se que a lngua est sujeita a va-riaes e mudanas e que mudana lingustica no significa deturpao ou decadncia da lngua. Para a lingustica qualquer variedade de uma lngua pode ser objeto de estudo. Enfim, rompe-se com a postura tradi-cional de que s a variedade culta escrita deve ser objeto da gramtica. Separa-se, assim, a gramtica prescritiva da gramtica descritiva. Reto-maremos esse ponto na Unidade C.
Em relao ao carter cientfico da lingustica, cabe mencionarmos ainda a questo do mtodo. O estudo sistemtico da lngua envolve, ge-ralmente, os seguintes passos:
observao;
problematizao;
formulao e testagem de hipteses;
checagem do modelo terico;
generalizao.
Entretanto, como a lingustica um conjunto de saberes dos quais resultam modelos tericos diversos, cada modelo vai requerer um apa-rato metodolgico que seja compatvel com suas especificidades. O im-portante que as hipteses sejam coerentemente testadas e sustentadas empiricamente dentro de modelos tericos.
Perini (2006, p.35) coloca nestes termos o objetivo do linguista: fazer uma descrio da estrutura da lngua: o conjunto de regras, ele-mentos, classes e princpios que governam as associaes dos diversos elementos da lngua e seu significado. Dizendo de outro modo: cabe ao
Lembre-se de que a gra-mtica tradicional prioriza
a lngua escrita literria, tomando-a como modelo de como escrever correta-
mente.
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Captulo 08O que um estudo cientfico?
55
linguista descrever e explicar o funcionamento da lngua, isto , a rela-o que existe entre os significados e as formas dessa lngua.
O trabalho cientfico implica, basicamente, a observao e descrio
de fatos lingusticos a partir de certos pressupostos tericos formu-
lados no mbito da teoria lingustica ou lingustica geral. Cabe lin-
gustica geral fornecer conceitos e categorias que serviro de base
para o estudo das lnguas particulares. Cabe lingustica descritiva
fornecer dados que validem ou refutem as hipteses tericas for-
muladas pelo linguista geral. O linguista descritivo, no entanto, no
est limitado a oferecer evidncias empricas para as formulaes da
lingustica geral; ele pode estar interessado em produzir gramticas
de referncia ou dicionrios. Esses dois ramos da lingustica (geral e
descritiva) no so estanques, e sim interdependentes.
No Brasil, temos importantes estudos descritivos, como os trabalhos
de Mattoso Camara Jr., de Mrio Perini, de Maria Helena Moura Ne-
ves, bem como os volumes de Gramtica do Portugus Falado, pro-
duzidos pelos pesquisadores do projeto coordenado pelo professor
Ataliba de Castilho, entre muitos outros. Como os referenciais teri-
cos podem ser diversificados, um mesmo fenmeno pode receber
diferentes descries e explicaes.
Para refletir
Leia a passagem abaixo extrada da gramtica de Cunha e Cintra, con-
siderando a diferena de ponto de vista entre linguistas e gramticos
normativos.
Discuta essa questo com seus colegas.
justamente para chegarem a um conceito mais preciso de
correo em cada idioma que os lingistas atuais vm tentando
estabelecer mtodos que possibilitem a descrio minuciosa de
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Estudos Gramaticais
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suas variedades cultas, seja na forma falada, seja na escrita. Sem
investigaes pacientes, sem mtodos descritivos aperfeioados
nunca alcanaremos determinar o que, no domnio da nossa
lngua ou de uma rea dela, de emprego obrigatrio, o que
facultativo, o que tolervel, o que grosseiro, o que inad-
missvel; ou, em termos radicais, o que e o que no correto
(CUNHA; CINTRA, 1985, p. 8).
Resumindo este tpico: Alguns critrios de cientificidade opem a Lingustica Moderna Gramtica Tradicional: empiria, objetividade e carter explicativo presentes na primeira, mas no na segunda. A lingustica se ocupa do estudo sistemtico da lngua, em qualquer varie-dade lingustica, seguindo os seguintes passos metodolgicos: observa-o, problematizao, formulao e testagem de hipteses, checagem