EXCELENTÍSSIMA SENHORA DOUTORA … · à presença de Vossa Excelência, interpor RECURSO DE...

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EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR PRIMEIRO VICE- PRESIDENTE DO EGRÉGIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA. O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DA BAHIA, por intermédio da Procuradora-Geral de Justiça Adjunta e do Promotor de Justiça in fine assinados, inconformado com a r. decisão proferida nos autos do Pedido de Suspensão de Liminar tombado sob o n.º 0000072- 16.2016.8.05.0000, vem, respeitosa e tempestivamente, contra tal decisão, à presença de Vossa Excelência, interpor RECURSO DE AGRAVO INTERNO, amparado no artigo 12, § 1º, da Lei Federal n.º 7.347/1985. Requer, de logo, que a intimação pessoal dos signatários seja efetuada mediante a remessa dos autos, com vista, ao NARJCível/COER – Núcleo de Acompanhamento de Recursos Judiciais Cíveis e de Direitos Difusos e Coletivos da Coordenadoria Especializada em Recursos -, situado na 5ª Avenida do CAB, nº 750, prédio do Ministério Público do Estado da Bahia, 2º andar, sala 212, CEP 41.745-004, Salvador-BA. Salvador, 28 de janeiro de 2016. GERVÁSIO LOPES DA SILVA JÚNIOR Promotor de Justiça (Portaria n.º 1.622/2014, publicada no DJe de 21/10/2014) SARA MANDRA MORAES RUSCIOLELLI SOUZA Procuradora-Geral de Justiça Adjunta

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EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR PRIMEIRO VICE-

PRESIDENTE DO EGRÉGIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DA

BAHIA.

O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DA BAHIA, por

intermédio da Procuradora-Geral de Justiça Adjunta e do Promotor de Justiça

in fine assinados, inconformado com a r. decisão proferida nos autos do

Pedido de Suspensão de Liminar tombado sob o n.º 0000072-

16.2016.8.05.0000, vem, respeitosa e tempestivamente, contra tal decisão,

à presença de Vossa Excelência, interpor RECURSO DE AGRAVO

INTERNO, amparado no artigo 12, § 1º, da Lei Federal n.º 7.347/1985.

Requer, de logo, que a intimação pessoal dos signatários seja

efetuada mediante a remessa dos autos, com vista, ao NARJCível/COER –

Núcleo de Acompanhamento de Recursos Judiciais Cíveis e de Direitos Difusos

e Coletivos da Coordenadoria Especializada em Recursos -, situado na 5ª

Avenida do CAB, nº 750, prédio do Ministério Público do Estado da Bahia, 2º

andar, sala 212, CEP 41.745-004, Salvador-BA.

Salvador, 28 de janeiro de 2016.

GERVÁSIO LOPES DA SILVA JÚNIOR Promotor de Justiça

(Portaria n.º 1.622/2014, publicada no DJe de 21/10/2014)

SARA MANDRA MORAES RUSCIOLELLI SOUZA

Procuradora-Geral de Justiça Adjunta

PROCESSO N.º 0000072-16.2016.8.05.0000

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RECURSO DE AGRAVO INTERNO EM PEDIDO DE SUSPENSÃO DE

LIMINAR N.° 0000072-16.2016.8.05.0000

AGRAVANTE: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DA BAHIA

AGRAVADOS: MUNICÍPIO DE JEQUIÉ E TÂNIA CORREIA LEITE DE

BRITTO

RAZÕES DO AGRAVO

EMINENTES DESEMBARGADORES,

1 DO RELATO

O Ministério Público do Estado da Bahia ingressou com ação

civil pública em face de Tânia Diniz Correia Leite de Brito e João Magno

Chaves, Prefeita e Secretário de Educação de Jequié, respectivamente,

imputando-lhes ato de improbidade administrativa consistente no

retardamento injustificado do ano letivo de 2015, para alunos integrantes de

77 (setenta e sete) turmas da rede municipal de ensino, pelo que se verifica

da peça de fls. 44 usque 75.

PROCESSO N.º 0000072-16.2016.8.05.0000

3

Na vestibular, foram requeridos, com base no art. 20, parágrafo

único, da Lei Federal n.° 8.429/92, os afastamentos dos Acionados dos

aludidos cargos públicos, o que foi deferido pelo Juízo da 2ª Vara de Feitos de

Relações de Consumo, Cíveis e Comerciais da comarca de Jequié-(BA),

conforme decisum de fls. 35 usque 42.

Diante disso, o Município de Jequié e a gestora afastada do

cargo público ingressaram com o presente Pedido de Suspensão de Liminar,

que foi deferido, às fls. 324/330, pelo i. Desembargador Primeiro Vice-

Presidente desse Tribunal de Justiça1, que determinou o retorno da Prefeita às

suas atividades.

Contra tal decisão, vem o Ministério Público do Estado da Bahia

interpor o presente AGRAVO INTERNO, com espeque no art. 12, § 1°, da

Lei Federal n.° 7.347/1985.

2 DA TEMPESTIVIDADE DESTE RECURSO

É tempestivo o presente recurso de agravo, considerando que

os autos vieram com vista para o Parquet no dia 26 de janeiro de 2016,

conforme termo de fl. 345.

No que concerne aos prazos para o Ministério Público recorrer,

mostram-se límpidos os dispositivos da legislação pertinente. Contam-se em

dobro, a partir da intimação pessoal do órgão ministerial, mediante entrega

dos autos com vista. É o que deflui dos artigos 188, 236, § 2º, e 240, todos do

1 Em face da suspeição, por motivo de foro íntimo, declarada pelo nobre Presidente dessa Corte de Justiça (fl.

323).

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CPC, c/c o art. 41, IV, da Lei Federal n.º 8.625/93.

É exatamente esse o entendimento do Superior Tribunal de

Justiça acerca do tema, pelo que se verifica do seguinte aresto:

PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE BUSCA E APREENSÃO.AGRAVO DE INSTRUMENTO. INTEMPESTIVIDADE. 1. O Ministério Público e a Defensoria Pública possuem a prerrogativa de intimação pessoal das decisões em qualquer processo ou grau de jurisdição, sendo que o prazo de recurso deve ser contado a partir do recebimento dos autos com vista. 2. A partir do julgamento do HC 83.255-5/SP, pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal, ficou consolidado o entendimento de que a contagem dos prazos para a interposição de recursos pelo Ministério Público ou pela Defensoria Pública começa a fluir da data do recebimento dos autos com vista no respectivo órgão, e não da ciência de seu membro no processo. 3. Recurso especial não provido.2

Dessarte, fica evidente a tempestividade do presente

RECURSO DE AGRAVO, pois, sendo o prazo de 10 (dez) dias, a teor do

artigo 12, § 1º, da Lei Federal n.º 7.347/1985 c/c o art. 188 do Código de

Processo Civil, o termo ad quem é a data 11 de fevereiro de 20153.

3 DO CABIMENTO DESTE RECURSO

Conforme expressamente estabelece o art. 12, § 1º, da Lei

Federal n.º 7.347/1985, o instrumento processual cabível para promover o

2 REsp 1278239/RJ, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 23/10/2012, DJe

29/10/2012. Sem negritos no original. 3 Primeiro dia útil após a efetiva expiração prazal (art. 184, § 1º, do Código de Processo Civil), a ocorrer em 05

de fevereiro de 2016, tendo em vista a suspensão do expediente forense na aludida data, bem como nos dias

8, 9 e 10 do mesmo mês, conforme Decreto Judiciário n.° 033, de 22 de janeiro de 2016.

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combate da decisão de presidente de tribunal que suspende execução de

liminar em ação submetida à sua égide é o AGRAVO. Transcreve-se o

dispositivo:

Art. 12. Poderá o juiz conceder mandado liminar, com ou sem justificação prévia, em decisão sujeita a agravo. § 1º A requerimento de pessoa jurídica de direito público interessada, e para evitar grave lesão à ordem, à saúde, à segurança e à economia pública, poderá o Presidente do Tribunal a que competir o conhecimento do respectivo recurso suspender a execução da liminar, em decisão fundamentada, da qual caberá agravo para uma das turmas julgadoras, no prazo de 5 (cinco) dias a partir da publicação do ato.

4 DAS RAZÕES DO PEDIDO DE REFORMA

4.1 DA INIDONEIDADE DO PEDIDO DE SUSPENSÃO DE

LIMINAR PARA DISCUTIR O MÉRITO DA DECISÃO, EQUÍVOCO EM

QUE SE INCORREU NO DECISUM ORA ATACADO

O pedido de suspensão de liminar, previsto no art. 12, § 1º, da

Lei da Ação Civil Pública, trata-se de ferramenta posta à disposição do Poder

Público para a obtenção da sustação de decisão judicial capaz de ocasionar

grave lesão à ordem, à saúde, à segurança ou à economia públicas. Tal

instrumento processual não visa à reforma da decisão impugnada, buscando,

tão-somente, a suspensão da sua eficácia, nas estritas hipóteses previstas em

lei, razão pela qual não se tem dúvidas de que não possui caráter recursal.

Com efeito, buscando, apenas, a proteção dos mencionados

bens jurídicos, o pedido de suspensão não tem como escopo a correção de

eventual antijuridicidade da liminar. Isso significa que o mérito da decisão

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alvejada se constitui em matéria absolutamente estranha ao âmbito

de cognição do órgão judicial competente para a apreciação da

postulação em abordagem, que pode ser deferida, até mesmo, quando a

decisão é juridicamente acertada, desde que esta se mostre capaz de ameaçar

a ordem, a saúde, a economia ou a segurança públicas.

Sobre o tema, oportunas são as lições de Marcelo Abelha

Rodrigues, in verbis:

O que justifica, pois, a suspensão da execução da decisão não é a sua injuridicidade, ainda que tal possa ocorrer, porque, repito e repiso, o objeto de julgamento desse incidente é verificar se há o risco potencial de grave lesão entre a decisão proferida e os interesses públicos tutelados pelo incidente. Não fosse assim, o presidente do tribunal, ao conceder ou não a suspensão da execução de uma liminar com base na sua injuridicidade, por exemplo, estaria de certa forma corrigindo, por via transversa, a convicção do juiz, que, com base num juízo de probabilidade, entendeu ser o caso de conceder a medida, talvez até mesmo com material cognitivo superior ao que possuía o presidente do tribunal, quando no julgamento do incidente. [...] As razões que justificam o pedido de suspensão de execução de pronunciamento judicial não se associam à juridicidade ou antijuridicidade da decisão prolatada, isto é, não são consequência de uma suposta legalidade ou ilegalidade do pronunciamento cuja eficácia se pretende suspender. Bem pelo contrário, as razões e motivos da suspensão são para evitar grave lesão à ordem, à saúde e à economias públicas, independentemente do acerto ou desacerto da decisão que terá sua eficácia suspensa. A licitude ou ilicitude da decisão deverão ser atacadas pela via própria recursal que terá o condão, pois, de apreciar as razões jurídicas da decisão, para só então reforma-la ou cassá-la.4

4 RODRIGUES, Marcelo Abelha. Suspensão de Segurança : Sustação da eficácia de decisão judicial proferida

contra o Poder Público. 3ª edição. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2010, pp. 158/159. Grifos não-

originais.

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7

As questões de fundo da liminar, portanto, permanecem sob o

crivo das superiores instâncias, não pela via do pedido de suspensão, mas por

intermédio de agravo, recurso cabível contra tal decisão, conforme

expressamente prevê o caput do art. 12 da Lei Federal n.º 7.347/85.

O Tribunal da Cidadania, como não poderia deixar de ser,

posiciona-se pela impossibilidade de utilização dessa via para atacar as

questões centrais, de fato ou de direito, que embasam a decisão liminar,

consoante se vê dos seguintes arestos:

ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. ACÓRDÃO EM PEDIDO DE SUSPENSÃO DE LIMINAR. DECISÃO COM NATUREZA POLÍTICA. NÃO CABIMENTO DO APELO EXTREMO. 1 A suspensão de liminar e de sentença limita-se a averiguar a possibilidade de grave lesão à ordem, à segurança, à saúde e às economias públicas. Não se examinam, no pedido de contracautela, os temas de mérito da demanda principal. Agravo regimental improvido.5 AGRAVO REGIMENTAL. SUSPENSÃO DE SEGURANÇA. ISS. SERVIÇOS NOTARIAIS. CARTÓRIO DE NOTAS E DE PROTESTOS. - Na linha da jurisprudência da Corte Especial, os temas de mérito da demanda principal não podem ser examinados na presente via, que não substitui o recurso próprio. A suspensão de liminar e de segurança limita-se a averiguar a possibilidade de grave lesão à ordem, à segurança, à saúde e à economia públicas.6 [...] Agravo regimental improvido. AGRAVO REGIMENTAL. SUSPENSÃO DE SEGURANÇA. CONCURSO PÚBLICO. OFICIAL DA POLÍCIA MILITAR.

5 AgRg no REsp 1207495/RJ, Rel. Ministro HUMBERTO MARTINS, SEGUNDA TURMA, julgado em

14/04/2011, DJe 26/04/2011. Sem negritos no original. 6 STJ. AgRg na SS 2308. Relator: CESAR ASFOR ROCHA. Corte Especial. DJe 12/05/2010. Sem negritos no

original.

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- O exame da legalidade da decisão em debate, relacionado com os temas jurídicos de mérito, como é cediço, ultrapassa os limites estabelecidos para a suspensão de liminar ou de segurança, cujo propósito é, apenas, obstar a possibilidade de grave lesão à ordem, à saúde, à segurança e à economia públicas. [...] Agravo regimental improvido.7

No mesmo sentido é a jurisprudência do Supremo Tribunal

Federal, ipsis litteris:

AGRAVO REGIMENTAL. SUSPENSÃO DE SEGURANÇA. REFINARIA. PETRÓLEO. ICMS. REGIME TRIBUTÁRIO DIFERENCIADO. LESÃO À ORDEM E À ECONOMIA PÚBLICAS. [...] 3. Na suspensão de segurança não se aprecia, em princípio, o mérito do processo principal, mas tão-somente a ocorrência dos aspectos relacionados à potencialidade lesiva do ato decisório em face dos interesses públicos relevantes consagrados em lei, quais sejam, a ordem, a saúde, a segurança e a economia públicas. 4. Agravo regimental improvido.8

Firmada essa premissa, passa-se à análise do ato judicial que

ora se combate.

O e. Prolator da decisão monocrática ora guerreada, a despeito

do seu notável saber jurídico, determinou a suspensão dos efeitos da medida

de afastamento do cargo deferida na Ação Civil Pública, sob o fundamento de

que o Magistrado de Primeiro Grau, no decisum que concedeu a questionada

tutela de urgência, teria deixado de indicar, objetivamente, “de que forma

estaria a Requerente se valendo do cargo para tumultuar a instrução do

7 AgRg na SS 2257. Relator: CESAR ASFOR ROCHA. Corte Especial. DJe 17/12/2009. Sem negritos no

original. 8 STF. SS 3273 AgR. Rel.: ELLEN GRACIE. DJe 20/06/2008. Sem negritos no original.

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processo”. Disse, ainda, que os fundamentos usados na ordem de afastamento

“revelam-se insuficientes”. Transcreve-se excerto da decisão:

É sabido que a perda da função pública só se efetiva com o trânsito em julgado da sentença condenatória. Entretanto, quando “a medida se fizer necessária à instrução processual”, a autoridade judicial poderá determinar o afastamento do agente público do exercício do cargo, como, de fato, prevê o dispositivo invocado pelo Juízo a quo. Impõe-se, todavia, a demonstração de que o gestor esteja obstruindo, impedindo, embaraçando a instrução processual, não bastando a simples possibilidade que tem o agente público de dificultar a instrução processual em razão do cargo que ocupa. Há que existir, pelo menos, indícios de que assim esteja fazendo, ou poderá vir a fazê-lo. Por se tratar de medida extrema, o referido dispositivo (parágrafo único do art. 20 da Lei nº 8.429/92) há de ter uma interpretação restritiva, evitando-se que sejam violadas as garantias do devido processo legal e da presunção de inocência. Com efeito, o afastamento do gestor público deve ser sempre a exceção, sendo essencial, para tanto, a presença de elementos concretos, configuradores de sua conduta obstativa das investigações, pressuposto legal, cujo escopo é impedir o administrador investigado de destruir provas, obstruir o acesso a elas ou coagir testemunhas. [...] Da análise dos autos, especialmente da liminar cuja suspensão se requer, vê-se que as razões erigidas pelo Magistrado, para fundamentar a ordem de afastamento, revelam-se insuficientes. Por certo, nenhum dos fundamentos elencados pelo julgador de primeiro grau indica, de forma objetiva, de que forma estaria a Requerente se valendo do cargo para tumultuar a instrução do processo. Outrossim, de ato concreto praticado pela edil, a decisão se limita a indicar que a Prefeita e os demais acionados “sequer responderam aos ofícios ministeriais, deixando transcorrer o ano sem que os alunos municipais tivessem acesso à rede de ensino e sem no entanto, prestarem conta de tal descalabro aos órgãos competentes.” que, indubitavelmente, não caracteriza embaraço a instrução processual. [...]

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10

Assim, evidencia-se que a decisão hostilizada, no que se refere ao afastamento da Requerente, TÂNIA DINIZ CORREIA LEITE DE BRITTO, adotado com base em elementos meramente indiciários, de fato, ofende à ordem pública, porquanto gera instabilidade na comuna, com a alternância de poder.9

Nota-se que o juízo efetuado pelo Primeiro Vice-Presidente

desse Tribunal de Justiça na decisão ora agravada foi exclusivamente jurídico.

Censurou-se o entendimento do Magistrado de Primeiro Grau, efetuando-se,

dessa maneira, verdadeira reforma da tutela de urgência. Em outras palavras,

o nobre Desembargador considerou desacertada a decisão proferida pelo

Juízo de 1º grau, que entendeu legítimo e necessário o afastamento da

Agravada do exercício do mandato de Prefeita de Jequié.

Assim, resta claro que o julgamento proferido no Pedido

de Suspensão de Liminar não observou os limites estabelecidos na

Lei Federal n.° 7.347/85. O Primeiro Vice-Presidente dessa colenda Corte

de Justiça enfrentou o mérito da decisão que afastou a ora Agravada do cargo,

usando como fundamento, ao invés de lesão à ordem, à saúde, à segurança

ou à economia públicas – inexistente no presente caso –, suposta

desconformidade da tutela de urgência, no caso concreto, com o dispositivo

legal que, em tese, viabiliza a sua concessão, qual seja o artigo 20, parágrafo

único, da Lei Federal n.º 8.429/92. Este, aliás, foi expressamente citado na

decisão ora hostilizada, para justificar a pretendida suspensão da eficácia da

liminar, conforme se constata de um dos trechos acima transcritos.

O caso em análise, portanto, revela indiscutível

inobservância dos limites cognitivos impostos pelo legislador ao órgão

9 Fls. 327/328 e 330. Grifos não-originais.

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jurisdicional competente para o julgamento de incidentes processuais como o

que ora se apresenta.

4.3 DA INEXISTÊNCIA DE VIOLAÇÃO À ORDEM PÚBLICA OU

A QUALQUER OUTRO BEM PROTEGIDO PELO ART. 12, § 1°, DA LEI

FEDERAL N.° 7.347/85, EM DECORRÊNCIA DO DEFERIMENTO DA

LIMINAR PELO JUÍZO DE PRIMEIRO GRAU

É verdade que, após ter esposado tese jurídica em relação ao

art. 20, parágrafo único, da Lei Federal n.º 8.429/1992, afirmando,

equivocadamente, que as “razões erigidas pelo Magistrado, para fundamentar

a ordem de afastamento, revelam-se insuficientes”, o nobre Primeiro Vice-

Presidente dessa Corte formulou a seguinte conclusão:

Assim, evidencia-se que a decisão hostilizada, no que se refere ao afastamento do Requerente, TÂNIA DINIZ CORREIA LEITE DE BRITTO, adotado com base em elementos meramente indiciários, de fato, ofende à ordem pública, porquanto gera instabilidade na comuna, com a alternância de poder.10

Este foi o único momento em que se fez referência, na

decisão ora invectivada, ao que realmente interessa em pedidos

como o que ora se apresenta. Contudo, percebe-se facilmente do excerto

em comento que o Desembargador Primeiro Vice-Presidente assim procedeu,

tão-somente, para dar aparência de juízo político – que é aquele que muitos

dizem que se faz no pedido de suspensão de liminar - ao fundamento que

realmente embasou a suspensão dos efeitos da tutela de urgência, qual seja a

10

Fl. 330. Grifos não originais.

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suposta desconformidade desta com a norma que se extrai do art. 20,

parágrafo único, da Lei Federal nº. 8.429/1992.

Deveras, ele aparentemente asseverou que a cogitada afronta à

ordem pública teria sido gerada pelo fato de a liminar haver sido

supostamente deferida “com base em elementos meramente indiciários”.

Disse, também, que a ofensa ao bem jurídico sob enfoque decorreria de

“instabilidade na comuna, com a alternância de poder”.

A alegada inaptidão dos elementos indiciários para o

embasamento da decisão cujos efeitos foram posteriormente sustados diz

respeito, apenas, à juridicidade e, pois, ao mérito da tutela de urgência,

nenhuma relação possuindo com a invocada ordem pública.

Neste ponto, é oportuno esclarecer que, apesar de o conceito

de ordem pública ser indeterminado, estando sujeito, como bem diz Elton

Venturi “ao natural dinamismo das concepções políticas, ideológicas,

temporais e espaciais de cada ordenamento” - o que, muitas vezes, dificulta a

sua compreensão -, doutrina e jurisprudência têm entendido que, ao associar

tal expressão ao pedido de suspensão, o legislador teve em mira a chamada

“ordem pública administrativa”. Isso significa que a ferramenta processual

em questão busca, na realidade, a proteção das “essenciais atividades estatais

constitucional e legalmente estabelecidas”11.

Sobre o tema, elucidativo é o seguinte aresto do Supremo

Tribunal Federal:

11

VENTURI, Elton. Suspensão de Liminares e Sentenças Contrárias ao Poder Público. 2ª edição. São Paulo:

Editora Revista dos Tribunais, 2010, p. 140.

PROCESSO N.º 0000072-16.2016.8.05.0000

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PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO OPOSTOS À DECISÃO DO RELATOR. CONVERSÃO EM AGRAVO REGIMENTAL. SUSPENSÃO DE TUTELA ANTECIPADA. DECISÃO QUE IMPEDE A ADMINISTRAÇÃO DE IMPLEMENTAR A REFORMA AGRÁRIA. EXISTÊNCIA DE GRAVE LESÃO À ORDEM PÚBLICA. ARTIGOS 184 A 191 DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA. 1. Embargos de declaração opostos à decisão singular do relator. Conversão dos embargos em agravo regimental. 2. Art. 1º da Lei 9.494/97, c/c art. 4º, § 4º, da Lei 8.437/92: configuração de grave lesão à ordem pública. Pedido de suspensão de tutela antecipada deferido em parte. 3. A decisão impugnada no presente pedido de suspensão concedeu antecipação de tutela para sobrestar o processo administrativo de desapropriação, até que se providenciasse a exclusão das áreas destacadas do imóvel expropriando e transferidas para outras matrículas. 4. Existência de grave lesão à ordem pública, considerada em termos de ordem administrativa, dado que a decisão impugnada no presente pedido de suspensão impede a Administração de executar uma política pública, qual seja, a implementação da reforma agrária. 5. Inexistência de contradição entre os fundamentos da decisão ora agravada e a sua conclusão. 6. Descabimento, em suspensão, da fixação das áreas destacadas do imóvel desapropriado, que não se sujeitariam à imissão na posse. 7. Embargos de declaração recebidos como agravo regimental, ao qual se nega provimento.12

E, ainda que se considere possível extrair, para fins de

suspensão de liminar, outros enfoques da expressão “ordem pública”, já se

sabe que ela não engloba a chamada “ordem jurídica”. Esta interessa, apenas

e tão-somente, às irresignações processuais voltadas para o exame do mérito

da decisão atacada, que não é o caso da medida em tela. Eis o que acerca do

assunto ensina o já citado Elton Venturi:

De outro lado, a grave lesão à ordem pública não poderia jamais ser confundida com grave violação da ordem jurídica, da

12

STA 85 ED, Relator(a): Min. ELLEN GRACIE, Tribunal Pleno, julgado em 12/09/2007, DJe-121 DIVULG

10-10-2007 PUBLIC 11-10-2007 DJ 11-10-2007 PP-00038 EMENT VOL-02293-01 PP-00001. Grifos não

originais.

PROCESSO N.º 0000072-16.2016.8.05.0000

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ordem constitucional ou da ordem processual, como algumas vezes pretendem os postulantes de pedidos de suspensão. Ainda que se revele manifestamente equivocada a concessão da medida liminar ou a decisão da procedência da ação movida contra o Poder Público, sob o ponto de vista de seus eventuais errores in procedendo ou errores in judicando, se não decorrer de suas execuções lesão concreta a algum dos interesses públicos tutelados pelo incidente de suspensão, não há guarida para a pretensão cautelar analisada.13

Por isso, não se pode defender a tese de que eventual ausência

de elementos para a concessão da liminar tenha aptidão para caracterizar

contexto de risco à ordem pública. Pode, no máximo, configurar situação de

afronta à ordem jurídica, que, pelo que se viu, não é o objeto do pedido de

suspensão, mas, sim, dos meios de impugnação através dos quais se permite

o exame do mérito da decisão impugnada.

Frise-se, ainda, que a aventada “instabilidade na comuna, com

a alternância de poder” também não constitui motivação suficiente para

justificar a suspensão concedida. É que a “alternância de poder” é

inevitável em todo e qualquer afastamento de prefeito, restando

claro que, se a sua presença, por si só, justificasse decisões como a

que ora se combate, o art. 20, parágrafo único, da Lei de

Improbidade Administrativa estaria fadado ao desuso.

Ademais, a cogitada “instabilidade na comuna” se encaixa,

perfeitamente, na hipótese normativa prevista no art. 489, § 1°, inciso III, do

Código de Processo Civil que vigorará a partir do próximo mês de março,

segundo a qual não se considera fundamentado qualquer decisum que se

limita a “invocar motivos que se prestariam a justificar qualquer outra decisão

13

VENTURI, Elton. Suspensão de Liminares e Sentenças Contrárias ao Poder Público. 2ª edição. São Paulo:

Editora Revista dos Tribunais, 2010, p. 142.

PROCESSO N.º 0000072-16.2016.8.05.0000

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judicial”. Realmente, a relação que se estabelece entre suposto contexto de

instabilidade e risco à ordem pública é intuitiva. Sempre que se diz que um ato

judicial é capaz de gerar instabilidade, está-se a afirmar ser ele ofensivo à

ordem pública. Por isso, mais importante que dizer que dada tutela de

urgência é capaz de gerar instabilidade é precisar como e de que

maneira o considerado ato judicial teria o condão de ocasioná-la.

Nada disso, entretanto, fez-se na decisão agravada. Cingiu-se o

Primeiro Vice-Presidente dessa Corte, repita-se, a dizer que a liminar

sobrestada atenta contra a ordem pública simplesmente porque gera

instabilidade e alternância de poder, descuidando-se de apontar os

elementos concretos que o levaram a tal conclusão. Note-se que o

nobre Desembargador cometeu exatamente o mesmo equívoco em que ele

alega haver incorrido o Juiz de 1º grau, ou seja, absteve-se de laborar

com o mundo fático.

Lembre-se, aqui, mais uma vez, que, para que ocorra a

suspensão de decisão contrária ao Poder Público, é preciso que se verifique a

real possibilidade de lesão a um dos interesses previstos na norma -

ordem, saúde, segurança ou economia públicas -, não sendo suficientes meras

suposições ou argumentos retóricos. Necessária a cabal demonstração da

ameaça que sobre esses interesses paira. E, em momento algum na decisão

agravada, fez-se referência a qualquer fato que indique risco a um de tais

bens jurídicos.

Aliás, isso aconteceu, pois os Agravados, na proemial, não

foram capazes de demonstrar a possibilidade de o questionado afastamento

dar ensejo a qualquer risco de lesão aos interesses públicos protegidos pela

norma de regência.

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De fato, na aludida peça, limitaram-se a seguir o mesmo

caminho do nobre Desembargador, com a defesa de tese segundo a qual a

simples alternância de poder ensejaria “solução de continuidade das Políticas

Públicas Municipais”14, sobretudo nas áreas da saúde, educação, assistência

social, limpeza pública e transporte urbano. Restariam prejudicadas, segundo

os Agravados, as execuções do calendário escolar relativo ao ano findo, de um

plano estratégico visando à minimização dos casos de Zika, Chikungunya e

Dengue e de um programa de melhoramento do aterro sanitário local e da

limpeza de canais.

Ocorre que, conforme acima se esclareceu, a alternância de

poder, por se tratar de efeito decorrente de toda e qualquer aplicação

da regra prevista no art. 20, parágrafo único, da Lei de Improbidade

Administrativa, não pode, por si só, fundamentar decisões como a que ora

se hostiliza. É necessário que se demonstre, com base em circunstâncias

concretas, de que maneira a troca de gestor estaria apta impedir a

continuidade da rotina administrativa, tarefa da qual os Agravados não se

incumbiram.

Sobre a imprescindibilidade de se demonstrar cabalmente que a

decisão cuja execução se pretende suspender é capaz de causar danos a um

dos mencionados bens jurídicos, vale citar a doutrina de Cassio Scarpinella

Bueno sobre suspensão de segurança, instituto processual semelhante àquele

que ora se discute:

Para que a sentença do mandado de segurança seja suspensa, imperioso que haja pedido da pessoa de direito público interessada e que haja demonstração (robusta e documental, nunca meramente argumentativa) de que

14

Fl. 04.

PROCESSO N.º 0000072-16.2016.8.05.0000

17

os efeitos da sentença causarão grave lesão à ordem, à saúde, à segurança e à economia pública.15

No particular, convém trazer à baila, também, os ensinamentos

de Jorge Tadeo Goffi Flaquer Scartezzini, ainda sobre a suspensão de

segurança:

Precisa é a lição de Lucia Valle Figueiredo: “Portanto, verifica-se que, para suspensão da liminar ou da sentença, o pedido deverá ser feito com a prova inequívoca de que esses valores encontram-se fortemente ameaçados. Não bastará, como é obvio a mera alegação. Far-se-á mister, sem sombra de qualquer dúvida, a demonstração cabal da possível violação a esses valores”. Nessa mesma linha, Pedro Santos Barcelos salienta que é preciso demonstrar e provar ao presidente do tribunal o que será afetado, porque será danoso, qual prejuízo que acarretará caso a execução da medida liminar venha a ser concedida. O prejuízo, também é oportuno observar, não só deverá estar comprovado de plano, como também deverá ser de magnitude expressiva, ou seja, capaz de causar a grave lesão mencionada na lei, caso contrário não será suficiente para justificar o deferimento da suspensão.”16

No mesmo sentido, agora tratando especificamente da

suspensão de liminar em ação civil pública, ausculte-se o pensamento de

Nelson Nery Junior e Rosa Maria de Andrade Nery:

O interesse processual no pedido de suspensão de liminar está na demonstração de que, caso seja cumprida, a liminar ocasionará grave lesão à ordem, à saúde, à segurança e à economia públicas competindo ao requerente da suspensão o ônus da prova.17

15

BUENO, Cassio Scarpinella. Mandado de Segurança. São Paulo: Saraiva, 2002, p. 121, sem negritos no

original. 16

SCARTEZZINI, Jorge Tadeo Goffi Flaquer. Suspensão de Segurança. São Paulo: Editora Revista dos

Tribunais, 2010, pp. 81/82. 17

NERY JUNIOR, Nelson e NERY, Rosa Maria de Andrade. Código de Processo Civil Comentado e

Legislação Extravagante. 7ª ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2003, p. 1.342, nota 14.

PROCESSO N.º 0000072-16.2016.8.05.0000

18

Tal posicionamento doutrinário é adotado pelo Egrégio Superior

Tribunal de Justiça, como denotam os arestos abaixo colacionados:

AGRAVO REGIMENTAL. SUSPENSÃO DE LIMINAR. LESÃO À ORDEM E ECONOMIA PÚBLICAS NÃO DEMONSTRADA. - O potencial lesivo à ordem pública e econômica deve ser demonstrado de forma inequívoca. Precedentes. - Não se admite suspensão louvada apenas em suposta ameaça de grave lesão à ordem jurídica. Precedentes.18 PROCESSUAL CIVIL. SUSPENSÃO DE SEGURANÇA. AGRAVO REGIMENTAL. DEMISSÃO. LIMINAR QUE AUTORIZA REINTEGRAÇÃO DO SERVIDOR E PAGAMENTO DOS VENCIMENTOS. LESÃO À ORDEM E ECONOMIA PÚBLICAS. NÃO OCORRÊNCIA. LEI 4.348/64, ART. 4º. UTILIZAÇÃO DA SUSPENSÃO COMO SUCEDÂNEO RECURSAL. IMPOSSIBILIDADE. 1. Para a concessão da ordem se faz necessária a demonstração inequívoca de risco de grave lesão a um dos bens tutelados pela Lei 4.348/64: ordem, segurança, saúde e economia públicas. [...] 4. Agravo Regimental não provido.19 AGRAVO REGIMENTAL. SUSPENSÃO DE SEGURANÇA. ICMS. NÃO INCIDÊNCIA SOBRE A "RESERVA DE DEMANDA DE ENERGIA ELÉTRICA CONTRATADA". – Os temas diretamente relacionados com o mérito da demanda principal não podem ser examinados na presente via, que não substitui o recurso próprio. A suspensão de liminar, de sentença e de segurança, como cediço, limita-se a averiguar a possibilidade de grave lesão à ordem, à segurança, à saúde e à economia públicas. – Ausência de efetiva demonstração de grave lesão aos bens juridicamente tutelados pela lei de regência. Agravo regimental improvido.20

18

STJ. AgRg na SLS 845 / PE. Ministro HUMBERTO GOMES DE BARROS. CORTE ESPECIAL.

29/05/2008). Sem negritos no original. 19

AgRg na SUSPENSÃO DE SEGURANÇA Nº 1.473 - AC. DJ: 19/09/2005. Sem negritos no original. 20

STJ. AgRg na SS 2367 / RN. Ministro PRESIDENTE DO STJ. CORTE ESPECIAL. DJe 14/09/2010. Sem

negritos no original.

PROCESSO N.º 0000072-16.2016.8.05.0000

19

AGRAVO REGIMENTAL. PEDIDO DE SUSPENSÃO DE LIMINAR. DECISÃO JUDICIAL QUE SUSPENDE EFEITOS DE PORTARIA MUNICIPAL. GRAVE LESÃO AO INTERESSE PÚBLICO NÃO DEMONSTRADA. RECURSO IMPROVIDO.

A suspensão de liminar, por expressa disposição legal, está adstrita às hipóteses de grave risco de lesão à ordem, à saúde, à segurança ou à economia públicas, não se prestando à apreciação de ofensa à ordem jurídica. Como medida de natureza excepcional, somente deve ser deferida diante da demonstração inequívoca de que o cumprimento da decisão impugnada constitui grave potencial ofensivo aos bens jurídicos protegidos pelo art. 4º da Lei n. 8.437/1992, o que não ocorreu no caso concreto. Agravo regimental improvido.21

Assim, ante a falta de comprovação, no caso concreto, de grave

lesão à ordem, à saúde, à segurança ou à economia pública, deve ser

restabelecido o afastamento da ora Agravada do cargo que ocupa.

4.4 DO EFETIVO ACERTO DA DECISÃO QUE DETERMINOU O

AFASTAMENTO DA ORA AGRAVADA DO EXERCÍCIO DO CARGO DE

PREFEITO

Embora, como dito alhures, não seja este o instrumento

processual adequado para a discussão dos aspectos meritórios da decisão de

Primeiro Grau, parece prudente, por mera cautela, demonstrar que o

afastamento da Agravada foi medida de todo acertada.

Nessa senda, cumpre analisar o que dispõe a legislação acerca

da possibilidade de afastamento do cargo do agente apontado como autor de

21

STJ. AgRg na SLS 941 / MA. Ministro CESAR ASFOR ROCHA. CORTE ESPECIAL. DJe 05/02/2009.

Sem negritos no original.

PROCESSO N.º 0000072-16.2016.8.05.0000

20

ato de improbidade administrativa, especificamente o art. 20, parágrafo único,

da Lei Federal n.º 8.429/92:

Art. 20. A perda da função pública e a suspensão dos direitos políticos só se efetivam com o trânsito em julgado da sentença condenatória. Parágrafo único. A autoridade judicial ou administrativa competente poderá determinar o afastamento do agente público do exercício do cargo, emprego ou função, sem prejuízo da remuneração, quando a medida se fizer necessária à instrução processual.

Depreende-se do dispositivo normativo em questão não ser

necessário, para o afastamento do agente dito ímprobo, prova cabal da

ocorrência de conduta reveladora da sua intenção de causar prejuízo à

instrução do feito. É que o momento processual em que tal medida

normalmente é adotada antecede a fase instrutória, na qual se permite às

partes a produção das provas necessárias à completa comprovação dos fatos

alegados. Por isso, ao contrário do que parece pensar o ilustre Desembargador

Primeiro Vice-Presidente, bastam indícios para que se lance mão da medida

cautelar em apreço.

Sobre o tema, importantes são as lições de Rogério Pacheco

Alves, in verbis:

Por tratar-se de medida cautelar, deverão estar presentes o risco de dano irreparável à instrução processual (periculum in mora), bem assim a plausibilidade da pretensão de mérito veiculada pelo autor (fumus boni iuris). Nesta linha, embora não possa o afastamento provisório arrimar-se em “meras conjecturas”, não tem sentido exigir a prova cabal, exauriente, de que o agente, mantido no exercício da função, acarretará prejuízo ao descobrimento da verdade. Indícios já serão suficientes à decretação da medida, o que em nada infirma o seu caráter excepcional. Como sinteticamente exposto por

PROCESSO N.º 0000072-16.2016.8.05.0000

21

Galeno Lacerda, “se o dano ainda não ocorreu, não se requer prova exaustiva do risco. Basta a probabilidade ´seria e razoável, para justificar a medida”. Segundo pensamos, a análise judicial quanto à presença de “probabilidade séria e razoável” de risco para a instrução processual passa, necessariamente, pelas denominadas “regras de experiência comum” (“máximas de experiência”), “subministradas pela observação do que ordinariamente acontece” (art. 335 do CPC). Este, a nosso ver, o único caminho possível ao ingresso de

presunções no campo de análise do periculum in mora.22

Pois bem, a decisão de 1º grau, diferentemente do que afirma

o Primeiro Vice-Presidente desse Tribunal de Justiça, encontra-se alicerçada

em elementos que, sem dúvidas, justificam o afastamento cautelar da

Prefeita.

De fato, constata-se, da vestibular da Ação Civil Pública, que

ela, assim como o Secretário de Educação, sonegou informações

imprescindíveis para a comprovação dos atos ímprobos em questão,

dificultando o bom desenvolvimento do procedimento investigatório

ministerial. Eis o que, no particular, restou consignado em diversas passagens

da aludida peça processual:

12 – A oitiva dos Acionados (fls. 40/41 e 76/77) na Promotoria de Justiça evidenciou o verdadeiro caos criado pelos mesmos. Os acionados continuaram a sonegar informações ao Ministério Público, declarando desconhecer a extensão do problema, deixando, mais uma vez, de quantificar escolas e alunos prejudicados pela irresponsabilidade dessa Administração e de esclarecer como se dará (ou daria) a reposição das aulas; Outra não pode ser a conclusão, visto que à Prefeita não é dado o direito de desconhecer e permanecer alheia a problema de tamanha extensão, como se fosse possível a delegação

total de sua resolução para o Secretário da pasta.23

22

GARCIA, Emerson e ALVES, Rogério Pacheco. Improbidade Administrativa. 6ª edição. Rio de Janeiro:

Lumen Juris, 2011, pp. 900/901. Sem negritos no original. 23

Fls. 55/56.

PROCESSO N.º 0000072-16.2016.8.05.0000

22

26 – Os acionados, ainda, negaram publicidade aos atos de ofício. Além de o acionado não responder aos questionamentos feitos pelo Ministério Público por ofícios que lhe foram dirigidos, ao serem ouvidos, ambos continuaram a sonegar informações ao Ministério Público, declarando desconhecer a extensão do problema e deixando, mais uma vez, de quantificar escolas e alunos prejudicados pela irresponsabilidade dessa Administração e de esclarecer como se dará (ou daria) a reposição das aulas. [...] 26.2 – É de se ver que a negativa de informações claras e precisas ao Ministério Público, além de dificultar a resolução do problema criado pela grave omissão dos acionados, evidencia o dolo com que ambos vêm agindo, restando claro o interesse de menoscabar os direitos educacionais de centenas de estudantes da educação básica.24 33 - Deveras, como fartamente demonstrado pela documentação que acompanha esta inicial, os acionados vem sonegando dados imprescindíveis à fiscalização dos atos relacionados à educação pública do Município de Jequié, colocando em risco a efetividade das medidas judiciais que podem vir a ser adotadas na presente ação. Preenchido, destarte, o fummus boni iuris.25 34.1 – Ressalta-se mais uma vez que os Acionados tentaram obstaculizar a instrução do procedimento ministerial, deixando de fornecer informações imprescindíveis à propositura desta ação, evidenciando dessa forma o risco de também dificultarem a instrução processual.26

Tal contexto foi considerado pelo Magistrado que deferiu a

liminar em questão. Confira-se:

A vasta documentação acostada aos autos traz a verossimilhança das acusações apresentadas pelo Parquet como infratoras dos artigos 9, 10 e 11 da Lei de Improbidade. Vejamos:

24

Fls. 63/64. 25

Fl. 72. 26

Fl. 73.

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23

O alcaide Municipal, assim como os demais acionados, sequer responderam aos ofícios ministeriais, deixando transcorrer o ano sem que os alunos municipais tivessem acesso à rede de ensino e sem no entanto, prestarem conta de tal descalabro aos órgãos competentes. Como se não bastasse um afronta deste quinhão, maculou-se o ano letivo dos alunos da rede pública municipal que amargaram um ano letivo tortuoso e nulo no que concerne ao acesso às escolas e aos professores. Percebe-se dos ofícios de fls 65 e 66 as reiteradas requisições do Ministério Público objetivando informações sobre o início das aulas no município. A Prefeita Municipal, em depoimento na promotoria não soube informar detalhes dos alunos prejudicados. O Sr Secretário Municipal, em depoimento ‘as fls. 108 do autos em 27-10-2015, NÃO SOUBE INFORMAR O NÚMERO DE ALUNOS E QUAIS ESCOLAS FORAM PREJUDICADAS PELO ATRASO NO INÍCIO DAS AULAS. Trata-se de absoluta omissão de informações com o objetivo de enganar o órgão investigador. Todas as respostas de ofício formuladas pela administração foram genéricas e confusas, sem conteúdo informativo, com o claro objetivo de desestimular a investigação.27

Isso revela a possibilidade de a Gestora Pública, valendo-se da

indiscutível facilidade que o cargo lhe propicia sobre o acervo documental do

Município, dificultar a colheita da prova no curso da instrução processual.

Frise-se que não se está a afirmar haver ela praticado, desde a propositura da

Ação Civil Pública, qualquer ato concreto visando à ocultação ou a destruição

de documentos. O que se está a asseverar é que, nas palavras de Rogério

Pacheco Alves, “regras de experiência comum” indicam a “probabilidade séria

e razoável” de que isso venha a ocorrer. É o que basta para a adoção da

cautela.

27

Fl. 39.

PROCESSO N.º 0000072-16.2016.8.05.0000

24

Neste ponto, importantes são as seguintes lições de Fábio

Medina Osório:

Não se demonstra imprescindível que o agente público tenha, concretamente, ameaçado testemunhas ou alterado documentos, mas basta que, pela quantidade de fatos, pela complexidade da demanda, pela notória necessidade de dilação probante, se faça necessário, em tese, o afastamento compulsório e liminar do agente público do exercício de seu cargo, sem prejuízo de seus vencimentos, enquanto persistir a importância da coleta de elementos informativos ao processo.28

Assim, a decisão liminar de afastamento da Agravada do cargo

público foi correta, devendo seus efeitos ser revigorados, a fim de se

resguardar o bom andamento da instrução relativa à Ação Civil Pública n.°

0501990-94.2015.8.05.0141, em curso na 2ª Vara Cível de Feitos de Relações

de Consumo, Cíveis e Comerciais da comarca de Jequié.

5 DO PREQUESTIONAMENTO

Neste ponto, provoca o prequestionamento, para fins de

recurso especial, se preciso for, dos artigos 20, parágrafo único, da Lei Federal

n.º 8.429/1992, e 12, § 1º, da Lei Federal n.º 7.347/1985.

6 DAS POSTULAÇÕES MINISTERIAIS

Ex positis, requer o Ministério Público as intimações dos

Agravados para, querendo, oferecerem suas razões de contrariedade, pedindo

que, ao final, seja reformada a r. decisão do ilustre Desembargador Primeiro

28

OSÓRIO, Fábio Medina apud RIZZARDO, Arnaldo. Ação Civil Pública e Ação de Improbidade

Administrativa. Rio de Janeiro: GZ, 2012. p. 420

PROCESSO N.º 0000072-16.2016.8.05.0000

25

Vice-Presidente desse Tribunal, que deferiu o pedido de suspensão dos efeitos

da medida liminar concedida nos autos da Ação Civil Pública n.º 0501990-

94.2015.8.05.0141, para que a decisão proferida pelo Juízo de 1º Grau volte a

produzir os seus efeitos.

Salvador, 28 de janeiro de 2016.

GERVÁSIO LOPES DA SILVA JÚNIOR Promotor de Justiça

(Portaria n.º 1.622/2014, publicada no DJe de 21/10/2014)

SARA MANDRA MORAES RUSCIOLELLI SOUZA Procuradora-Geral de Justiça Adjunta