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MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE Excelentíssimo Senhor Doutor Juiz de Direito da Vara da Fazenda Pública de Parnamirim Ação Civil Pública Processo: 124.06.004377-9 (0004377-91.2006.8.20.0124) Autor: Ministério Público do Estado do Rio Grande do Norte Réus: Brasil Empreendimentos Imobiliários e Serviços Ltda Instituto de Desenvolvimento Econômico e Meio Ambiente do Rio Grande do Norte - IDEMA (atual Instituto de Desenvolvimento Sustentável e Meio Ambiente do RN) O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE, pelas Promotoras de Justiça que ao final subscrevem, no uso de suas atribuições constitucionais e legais, nos termos do art. 513 e segs. do CPC, vem interpor a presente APELAÇÃO COM PEDIDO DE RECEBIMENTO NO EFEITO SUSPENSIVO contra r. sentença de fls. 4312/4324 dos autos. O recurso é tempestivo, tendo em vista que o Ministério Público foi intimado pessoalmente (nos termos do 41, inciso IV, da Lei n.º 8.625/93 - Lei Orgânica Nacional do Ministério Público) no dia 21 de outubro de 2010. Conforme dispõe o art. 188 do CPC (que diz que se computa em

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MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE

Excelentíssimo Senhor Doutor Juiz de Direito da Vara da Fazenda Pública de Parnamirim

Ação Civil PúblicaProcesso: 124.06.004377-9 (0004377-91.2006.8.20.0124)Autor: Ministério Público do Estado do Rio Grande do NorteRéus: Brasil Empreendimentos Imobiliários e Serviços Ltda

Instituto de Desenvolvimento Econômico e Meio Ambiente do Rio Grande do Norte - IDEMA

(atual Instituto de Desenvolvimento Sustentável e Meio Ambiente do RN)

O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE, pelas Promotoras de Justiça que ao final subscrevem, no uso de suas atribuições constitucionais e legais, nos termos do art. 513 e segs. do CPC, vem interpor a presente

APELAÇÃO COM PEDIDO DE RECEBIMENTO NO EFEITO SUSPENSIVO

contra r. sentença de fls. 4312/4324 dos autos.

O recurso é tempestivo, tendo em vista que o Ministério Público foi intimado pessoalmente (nos termos do 41, inciso IV, da Lei n.º 8.625/93 - Lei Orgânica Nacional do Ministério Público) no dia 21 de outubro de 2010. Conforme dispõe o art. 188 do CPC (que diz que se computa em

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dobro o prazo para recorrer quando a parte for o Ministério Público), o prazo termina no dia 22/11/2010.

O Ministério Público requer que a presente apelação seja recebida em seu efeito suspensivo com base nas seguintes razões de fato e de direito:

RAZÕES DE FATO QUE JUSTIFICAM A POSSIBILIDADE DE DANO IRREPARÁVEL AO MEIO AMBIENTE E À SAÚDE DA POPULAÇÃO:

A r. sentença julgou totalmente improcedentes os pedidos do Ministério Público e cassou os efeitos da tutela antecipada deferida pelo Egrégio Tribunal de Justiça do RN que impediu construções relativas ao empreendimento da empresa ora apelada, denominado Condomínio Buena Vista, localizado em Nova Parnamirim, às margens da BR-101, nas proximidades do Km 100 e do Rio Pitimbu no município de Parnamirim, RN.

A mencionada localização é de grande fragilidade e, conforme conclusão registrada no laudo pericial realizado pelo IBAMA/Brasília, que encaminhou técnicos específicos para a realização do estudo, os documentos referentes aos estudos geológicos realizados na área do empreendimento do Condomínio Buena Vista indicam que o terreno em questão localiza-se em área de dunas (...) Por estar localizada em área de duna, descaracterizada em parte, a área do empreendimento ‘Condomínio Buena Vista’ constitui-se Área de Preservação Permanente, nos moldes da legislação ambiental vigente (cf. fl. 3651). A perícia ainda advertiu que com a caracterização de três fatores condicionantes de erosão presentes na área de influência do empreendimento ‘Condomínio Buena Vista’, é possível concluir que se trata de uma região suscetível a processos erosivos” (cf. fl. 3653).

A própria Magistrada reconheceu na r. sentença prolatou que a área do empreendimento é dunar, tendo asseverado que “da leitura das conclusões técnicas acima transcritas, tem-se que a área do empreendimento versado está situada em área dunar” (fl. 4321). A despeito dessa convicção, a MM Juíza julgou improcedentes os pedidos do Ministério

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Público por entender que a legislação urbanística do Município de Parnamirim não proíbe construções no local.

O recurso agora interposto traz algumas questões processuais que não foram observadas durante o trâmite do processo e, no mérito, traz à lume os preceitos constitucionais e legais que demonstram que a matéria em foco é ambiental e não urbanística; que existe uma hierarquia de normas ambientais traçada pela Constituição Federal e que a legislação federal que considera “DUNA” como Área de Preservação Permanente – APP, onde não se pode construir, é imperativa de ser obedecida. No caso, também ficou comprovado que o empreendimento também se encontra dentro da Faixa de Proteção Ambiental do Rio Pitimbu, estabelecida pela Lei 8.426/2003.

Ocorre que a revisão da sentença demanda um curso processual que é demorado, principalmente porque existem duas partes apeladas, uma inclusive com prazo privilegiado. A preocupação atual do Ministério Público, portanto, consiste no perigo iminente do aumento dos danos que podem ser ocasionados em decorrência das construções que podem ser realizadas nesse ecossistema reconhecidamente frágil.

As atividades que já foram realizadas no local - tais como as relativas ao desmatamento, à terraplenagem e à compactação do terreno - conforme laudo pericial de fls. 3655/3656 já causaram pelo menos 14 impactos ambientais negativos, atingindo o Rio Pitimbu, que abastece em torno de 390.000 (trezentos e noventa mil) habitantes da cidade de Natal, RN1, além da população da cidade de Parnamirim.

É importante ressaltar que a perícia mencionou que os impactos causados no local até o momento são permanentes, mas não irreversíveis. Os permanentes continuam com a permanência das obras existentes, mas podem ser reversíveis de acordo com um Projeto de Recuperação de Área Degradada, PRAD: “A recuperação de áreas degradadas, desde que empregados métodos adequados para este fim, é possível e deve ser realizada de forma a evitar maiores danos ao meio ambiente e, conseqüentemente, ao ser humano. Ao agente causador de dano comprovado ao meio ambiente, deve ser requerida a apresentação do Programa de Recuperação de Área Degradada – PRAD, que, depois de 1 Conforme informações da Companhia de Águas e Esgotos do Rio Grande do Norte

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analisado e aprovado, pelo órgão competente, deverá ser executado pelo empreendedor” (fl. 3654)

A r. sentença possibilita a retomada das obras no local, com a construção nos 113 lotes e do restante das instalações (tais como sistema de drenagem, de esgotamento sanitário, etc) correspondentes ao Condomínio. Essas novas construções podem aumentar os danos ocasionados ao ecossistema dunar – onde o empreendimento encontra-se localizado – e pode tornar os danos ambientais já comprovados pericialmente como irreversíveis para o meio ambiente e, consequentemente, para a saúde da população que depende da quantidade e da qualidade da água do Rio Pitimbu. A quantidade da água do Rio pode ser diminuída em razão dos constantes desmoronamentos de dunas no entorno do empreendimento e do lançamento da areia para o Rio, assoreando-o. A poluição que porventura emanar dos sistemas de drenagem e de esgotamento do Condomínio pode afetar os padrões da potabilidade exigidos pelo Ministério da Saúde para o abastecimento humano de água.

Sob a ótica do próprio Direito Processual, a manutenção da sentença guerreada afeta o Princípio da Segurança, uma vez pode produzir efeitos na pendência de recurso que pode revertê-la.

RAZÕES DE DIREITO QUE JUSTIFICAM O PEDIDO DE SUSPENSIVIDADE DO RECURSO:

O pleito encontra amparo no art. 14 da Lei 7.347/85, que disciplina a ação civil pública de responsabilidade por danos causados ao meio ambiente, dispõe que:

Art. 14. O juiz poderá conferir efeito suspensivo aos recursos para evitar dano irreparável à parte.

Os §§1º e 9º do art. 4º da Lei 8.437/92 também respaldam o pedido do Ministério Público, como se extrai do seu teor abaixo transcrito:

Art. 4º. Compete ao presidente do tribunal, ao qual couber o conhecimento do respectivo recurso, suspender,

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em despacho fundamentado, a execução da liminar nas ações movidas contra o Poder Público ou seus agentes, a requerimento do Ministério Público ou da pessoa jurídica de direito público interessada, em caso de manifesto interesse público ou de flagrante ilegitimidade, e para evitar grave lesão à ordem, à saúde, à segurança e à economia públicas. §1º Aplica-se o disposto neste artigo à sentença proferida em processo de ação cautelar inominada, no processo de ação popular e na ação civil pública, enquanto não transitada em julgado.(...)§9º A suspensão deferida pelo Presidente do Tribunal vigorará até o trânsito em julgado da decisão de mérito na ação principal.

Com essas considerações, o Ministério Público requer que a presente apelação seja recebida em seu efeito suspensivo para que não seja permitida nenhuma construção no local do empreendimento Condomínio Buena Vista até o julgamento do presente recurso e o trânsito em julgado da demanda.

Requer, outrossim, a intimação dos apelados, para querendo, oferecerem contra-razoes à apelação e, após o devido processamento, que o presente recurso de apelação seja encaminhado ao Egrégio Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte.

Termos em que, pede deferimento.

Parnamirim, 09 de novembro de 2010.

GILKA DA MATA DIAS 45ª Promotora de Justiça de Defesa do Meio Ambiente

BEATRIZ AZEVEDO DE OLIVEIRAPromotora de Justiça Substituta

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RESUMO DAS RAZÕES DE APELAÇÃO ARROLADAS PELO MINISTÉRIO PÚBLICO ESTADUAL.

1. Do ilegal julgamento antecipado da lide (em razão interrupção do curso da produção da prova pericial já iniciada); 2. Da importância da produção da prova e dos Princípios Constitucionais sobre “prova” não respeitados pela sentença; 3. Do cerceamento de defesa; 4. Da ilegalidade da sentença que indeferiu pedido do Ministério Público e do IDEMA de nulidade da segunda perícia realizada por empresa de consultoria que produziu documentos técnicos e estudos para a empresa ré na ação original; 5. Da ilegalidade da sentença que indeferiu o pedido de anulação da segunda perícia realizada sem a ciência das partes sobre o local do início dos trabalhos, contrariando o art. 431-A do CPC (precedentes do TJ/RN nesse sentido); 6. Da desconsideração na sentença da ilegalidade do licenciamento ambiental do “Condomínio Buena Vista”; 7. Da desconsideração na sentença a quo dos 14 impactos negativos já causados pelo empreendimento e detalhadamente descritos pela perícia realizada pelos peritos do IBAMA/Brasília; 7. Da desconsideração na sentença a quo dos impactos negativos causados pelo empreendimento e detalhadamente descritos pela perícia realizada pelo perito do IBAMA/Brasília; 8. Da inobservância da sentença às regras constitucionais e infraconstitucionais relativos à responsabilidade civil por danos causados ao meio ambiente; 9. Do reconhecimento na sentença de que a área objeto da lide é “DUNA” e do desrespeito à legislação específica que protege área de duna como Área de Preserevação Permanente – APP; 10. Da inobservância pela MM. Juíza a quo da confirmação de que a área do empreendimento está na área de proteção ambiental do Rio Pitimbu nos termos do art. 3º, II da Lei Estadual 8.426 (dentro da cota de 40m); 11. Do desrespeito da sentença à hierarquia das Leis Ambientais; 12. Do prequestionamento da matéria Federal e Constitucional

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EGRÉGIO TRIBUNALCOLÊNDA CÂMARA

Apelante:: Ministério Público do Estado do Rio Grande do NorteApelados: Brasil Empreendimentos Imobiliários e Serviços Ltda

Instituto de Desenvolvimento Econômico e Meio Ambiente do Rio Grande do Norte - IDEMA (atual Instituto de Desenvolvimento Sustentável e Meio Ambiente do RN)

O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE, pelas Promotoras de Justiça ao final subscrevem, no uso de suas atribuições constitucionais e legais, com base no art. 513 e segs do Código de Processo Civil, vem apresentar e requerer o recebimento das presentes

RAZÕES DE APELAÇÃO

pelos fundamentos de fato e de direito relatadas a seguir:

O Ministério Público ajuizou uma ação civil pública contra a empresa acima nominada e contra o IDEMA, com vistas a obter providências judiciais para garantir uma efetiva proteção do Rio Pitimbu e de seu ecossistema dunar adjacente, uma vez que a preservação desse mosaico ambiental é de interesse vital para assegurar a quantidade e a potabilidade da água de abastecimento público da população da grande Natal.

Através de uma Licença de Instalação expedida pelo IDEMA, a empresa ora demandada iniciou a construção de um empreendimento de uso residencial denominado Condomínio Buena Vista, localizado em Nova Parnamirim, às margens da BR-101, nas

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proximidades do Km 100, no município de Parnamirim/RN, com 113 (cento e treze) lotes, inserido na Bacia Hidrográfica do Pitimbu.

Foram apontadas pelo Ministério Público falhas gritantes que acabaram por atingir a legalidade das licenças expedidas, tornando-as viciadas; portanto anuláveis de pleno direito. As provas levadas nas investigações extrajudiciais e as realizadas no curso do processo demonstraram que o empreendimento encontra-se situado em área de duna, tida tanto pela legislação federal, quanto pela legislação estadual como Área de Preservação Permanente, APP, onde não se é permitido construir.

A MM. Magistrada reconheceu em sua sentença que as conclusões técnicas existentes nos autos demonstram que a área do empreendimento versado está situada em área dunar descaracterizada pela expansão urbana. Todavia, entendeu que a construção do empreendimento seria possível porque não há no Plano Diretor do Município de Parnamirim qualquer vedação à construção na área onde se situa o empreendimento (fl. 4321). A Magistrada não considerou, portanto, a legislação federal que versa sobre a proteção de área de duna, em especial a Lei Federal 4.771/65, que institui o Código Florestal e a Resolução 303/02 do Conselho Nacional do Meio Ambiente.

Não foram consideradas também as informações técnicas e periciais de fls. 4053 e 4163 que demonstraram que o empreendimento encontra-se dentro da cota de 40 metros, portanto, inserido na Faixa de Proteção Ambiental do Rio Pitimbu, nos termos do art. 3º, II da Lei Estadual 8.426/03, onde não se é possível construir.

De modo resumido, os pedidos do Ministério Público objetivam a anulação das Licenças concedidas e a proibição de se conceder qualquer licença para se construir no local e a realização de um Plano de Recuperação da Área Degradada – PRAD para se restabelecer as características e as funções das dunas desmontadas e desmatadas na área do empreendimento.

Na r. sentença de fls 4312/4324, a MM. Juíza ANA CAROLINA MARANHÃO, embora no curso da fase de instrução processual e com prova pericial já iniciada, procedeu ao julgamento antecipado da lide, e julgou totalmente improcedente a pretensão autoral, cassando os efeitos da r.

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decisão proferida pelo Egrégio Tribunal de Justiça do RN, que impediu construções no local (fls. 3932/3938)

Os vícios da sentença encontram-se detalhados nos tópicos a seguir:

I- FUNDAMENTOS DE FATO E DE DIREITO

1- DO ILEGAL JULGAMENTO ANTECIPADO DA LIDE

A MM. Juíza ANA CAROLINA MARANHÃO, julgou antecipadamente a pretensão, com base no inciso I do art. 330 do CPC.

A primeira e essencial alegação que precisa ser destacada é que a questão dos autos não é unicamente de direito. Trata-se, portanto de questão de direito e de fato, com pontos controvertidos estabelecidos pela própria Magistrada (à fl. 396). Foram realizadas duas perícias e as partes requereram, mas foram impedidas de receber esclarecimentos dos peritos em audiência (cf. pedidos de fls. 3702nas petições de fls. 3702/3746 e 4141/4142). A Magistrada, simplesmente interrompeu uma instrução que já havia sido iniciada e foi repentinamente interrompida de maneira inacabada!

Ora, com todo respeito, o julgamento antecipado da lide violou importantes normas do Processo Civil, tendo em vista que haviam fatos controvertidos relevantes que precisavam ser exauridos na fase probatória da lide, com direito ao contraditório. Como bem assevera RUI PORTANOVA: “Não se pode, por causa da pressa, passar por cima de consagradas conquistas universais”2

O Juízo a quo chegou a determinar uma primeira perícia e,

mesmo considerando a validade dessa primeira perícia, entendeu que ainda existiam cinco pontos controvertidos a esclarecer e determinou a realização de uma segunda perícia que foi produzida por uma empresa de consultoria que tem em seus quadros o engenheiro responsável por realizar a terraplenagem, drenagem, pavimentação, plantas e outras considerações acerca dos

2 PORTANOVA, Rui. Princípios do Processo Civil. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 1995, f. 173

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equipamentos e obras de compactação do empreendimento impugnado na ação originária.

Tanto o Ministério Público, quando o IDEMA requereram a anulação da segunda perícia realizada, todavia a MM. Juíza, no corpo da sentença, rejeitou indevidamente os pedidos.

Além da vinculação da empresa do perito nomeado à empresa demandada na ação original, nessa segunda perícia realizada também foram detectadas impropriedades técnicas insuperáveis, uma vez que a empresa do segundo perito utilizou escala diversa da indicada na Lei Estadual 8.426/03 para caracterização da faixa de proteção ambiental do Rio Pitimbu. Em razão dessa e de outras impropriedades, o Ministério Público requereu a anulação da perícia e, em caso de indeferimento do pleito, realizou um rol contendo 7 (sete) questões para serem esclarecidas pelo perito em audiência de instrução, nos termos do art. 435 do CPC (cf. fl. 4141/4142).

Ao invés de designar a audiência ou de anular a segunda

perícia, conforme requerido pelo Ministério Público e pelo IDEMA, a MM. Juíza “simplesmente” encerrou indevidamente o processo, cerceando, por completo a elucidação de todos os pontos que precisariam ser esclarecidos diretamente pela equipe que realizou o segundo laudo. Não é demais mencionar que “a garantia para os cidadãos de uma sentença justa, em termos de prova, reside no princípio da avaliação da prova e na oralidade que obriga a presença física do juiz na audiência (princípio da imediatidade) e da concentração dos atos probatórios”3.

O quadro abaixo contém os marcos relativos à produção das provas que foi injusta, abrupta e surpreendentemente interrompida:

25/02/2008 (fls. 1687/1689)

o Ministério Público pugnou especificamente pela designação de perícia

10/03/2008 (fl. 1691) a MM. Juíza ANA CAROLINA MARANHÃO requisitou ao Ministério do Meio Ambiente em Brasília a indicação de um perito

15/09/2008 (fl. 3411) a MM. Juiza SUIANE DE CASTRO FONSECA MEDEIROS, requisitou a indicação de perito à UFRN, tendo em vista a demora na resposta do

3 PORTANOVA, Rui. Princípios do Processo Civil. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 1995, f.. 198

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Ministério do Meio Ambiente, em Brasília.03/11/2008 (fl. 3564) O Ministério Público ratificou a importância da

perícia e requereu que fosse imposta toda a celeridade para que a diligência fosse realizada no mais breve tempo possível

25/11/2008 (fls. 3600/3601)

A MM. Juíza ANA CAROLINA MARANHÃO registrou que, por indicação do Ministério do Meio Ambiente em Brasília, a perícia seria realizada pelo IBAMA de Brasília e aprazou o início da perícia para o dia 01/12/2008, às 14h, determinando a intimação das partes para acompanharem o Perito JORGE LUIZ BRITO CUNHA REIS, analista ambiental do IBAMA/BRASÍLIA

28/11/2008 (fls. 3606/3607)

Apresentação dos quesitos pelo Ministério Público

01/12/2008 (fls. 3608/3616)

Apresentação dos quesitos pela empresa Brasil Empreendimentos Imobiliários e serviços ltda e outros

20/02/2010 (fls. 3641/3664)

Apresentação da perícia técnica por perito do IBAMA/Brasília. O resultado da perícia foi categórico em afirmar que o empreendimento Buena Vista situa-se em área de duna, portanto em Área de Preservação Permanente – APP. A perícia registrou ainda que o Condomínio Buena Vista produz pelo menos 14 (quatorze) impactos negativos de caráter permanente (permanentes não significam irreversíveis, mas contrapõem aos impactos temporários) e contribui negativamente para o processo de erosão detectado no local e para o equilíbrio ambiental da região. (fls. 3642/3664).

10/03/2009 (fl. 3665) MM. Juíza determinou a intimação das partes para manifestarem-se sobre o laudo pericial apresentado

06/04/2009 (fls. 3702/3746)

Empresa apresentou manifestação sobre o laudo e requereu a anulação do mesmo. Requereu, outrossim, a designação de audiência de instrução e julgamento, para que sejam

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ouvidos o perito, os assistentes técnicos e, sobretudo, os técnicos do IDEMA.

09/06/2009 (fls. 3961/3963)

MM. Juíza ANA CAROLINA MARANHÃO indeferiu o pedido feito pela empresa de anular o laudo pericial, validando, portanto a perícia realizada. A despeito disso determinou a realização de uma segunda perícia para colher esclarecimentos complementares. Arrolou 5 (cinco) pontos que considerou controvertidos. Para tanto determinou a intimação de três pessoas para que consignassem o interesse na realização da perícia complementar. Os três nomes foram: ROBERTO CURIOSO, ALDO DA FONSECA TINOCO FILHO e NADJA NOBRE DE FARIAS.

30/06/2009 (fl. 3963) O Ministério Público tomou ciência da decisão em 30/06/2009, sem, contudo, ter conhecimento de quem iria, realmente realizar a perícia

03/08/2009 (fl. 3978) MM. Juíza ANA CAROLINA MARANHÃO nomeou ROBERTO LUIZ CURIOSO DA SILVA para exercer a função de perito no feito. (A nomeação judicial referiu-se à pessoa e não à empresa de consultoria do perito)

21/08/2009 (fls. 3981/3988)

IDEMA ofereceu quesitos e indicou assistente técnico

24/08/2010 (fls. 4001/4010)

Empresa ofereceu quesitos e indicou assistente técnico

28/09/2009 (fls. 2016/4018)

Ministério Público ofereceu quesitos e indicou assistente técnico.

!!!!!!As partes não foram intimadas do início da perícia, nos termos do art. 431-A do CPC que determina que “as partes terão ciência da data e local designados pelo juiz ou indicados pelo perito para ter início a produção de prova”

16/12/2009 (fls. 4024/4119)

Perito entregou laudo pericial e esclareceu que o trabalho foi realizado pela sua empresa CURIOSO – Estudos Geológicos e Ambientais www. curioso.srv.br. Na apresentação do perito de fl. 4026, consta expressamente que: “Para

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atender a intimação da Senhora Juíza de Direito Ana Carolina Maranhão, foi utilizado a estrutura da empresa Curioso – Estudos geológicos e ambientais, cujo perfil descreveremos a seguir (...) Seu quadro de pessoal se constitui de técnicos altamente qualificados dentre os quais: especialistas, mestres e doutores, com grande conhecimento em assuntos específicos na nossa área de atuação e gerencial, preparados para compreender e empreender as necessidades de cada empreendimento.

07/01/2010 (fl. 4120) Despacho da MM Juíza determinou a intimação das partes para manifestarem-se sobre o segundo laudo pericial apresentado pela empresa do perito nomeado

08/02/2010 (fls. 4122/4143)

Ministério Público tomou ciência e constatou que o laudo foi realizado pela empresa de consultoria do perito. Manifestação do Ministério Público requerendo a nulidade da perícia, tendo em vista, entre outros argumentos: 1) que o laudo pericial não foi realizado por um perito e sim pela equipe da empresa do perito nomeado, que por sua vez, contém como integrante o engenheiro FERNANDO CESAR DE OLIVEIRA FURTADO, responsável pelo Projeto de Terraplenagem, drenagem, pavimentação, plantas do empreendimento e considerações acerca dos equipamentos e obras de compactação do empreendimento; 2) falta de intimação do Ministério Público da data e local indicado pelo perito para ter início a produção de prova.

Em sua manifestação, o Ministério Público arrolou várias impropriedades técnicas da perícia e requereu, nos termos do art. 435 do CPC, em caso de não ser acatada a alegação de nulidade da perícia, a intimação do perito para esclarecer 7 quesitos elaborados a partir do laudo

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pericial apresentado. 01/03/2010(fls. 4185/4206)

Manifestação da empresa sobre o laudo pericial, alegando a intempestividade sobre a manifestação sobre o laudo pericial e sobre a argüição de suspeição do perito.

10/03/2010(fls. 4220/4226)

Manifestação do IDEMA sobre o laudo, requerendo a nulidade da perícia, em razão das seguintes razões: 1) impedimento e suspeição do perito nomeado pelo Juízo para realização da segunda perícia, tendo em vista que o perito não poderia nomear, por sua própria conta, equipe multidisciplinar, sem informar nos autos; 2) pelo fato do IDEMA não ter sido informado da data e local da perícia, que foi realizada sem o acompanhamento do órgão ambiental;

21/10/2010 (fls. 4312/4324)

Sentença judicial interrompendo o curso normal da instrução criminal e julgando “totalmente improcedente a pretensão autoral”.

Diante do detalhamento dos atos realizados até a presente fase processual, torna-se muito fácil a conclusão de que a etapa de produção de prova foi abruptamente interrompida pela MM. Magistrada a quo, que encerrou o processo.

Conforme bem ensina LUIZ GUILHERME MARINONI,

o procedimento probatório pode ser dividido em quatro fases: 1) o requerimento; 2) a admissão; 3) a produção; 4) a valoração da prova.

O requerimento é fase inicial, em que se pleiteia ao órgão judiciário a produção de determinada prova, a fim de influir no convencimento do juiz. A admissão refere-se à fase em que o juízo decide a respeito da admissão ou não da prova requerida, devendo mencionar o tipo de prova a ser produzida, sua determinação e sua finalidade. Admitida a prova, deverá ela ser ‘produzida’. Em geral, as provas são produzidas na audiência de instrução e julgamento (art. 336, CPC). (...) Uma vez produzida a prova, será ela valorada pelo juiz4.

4 NERY JÚNIOR, Nelson. Princípios do processo civil na Constituição Federal, 3ª Ed. Editora Revista dos Tribunais, 1996. fl. 288/290

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A MM Juíza encerrou o processo no curso da produção da prova pericial, que é regulada pelo arts. 420 e segs do CPC.

2- DA IMPORTÂNCIA DA PRODUÇÃO DA PROVA E DOS PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS SOBRE “PROVA” NÃO RESPEITADOS PELA SENTENÇA.

Dita o Código de Processo Civil que:

Art. 322. Todos os meios legais, bem como os moralmente legítimos, ainda que não especificados neste Código, são hábeis para provar a verdade dos fatos, em que se funda a ação ou a defesa.

Ora, no processo de conhecimento, o conjunto probatório produzido é de singular importância, uma vez que forma uma unidade e precisa ser considerada como um todo. A avaliação da prova pela MM. Magistrada a quo, portanto, foi parcial. Ela recusou-se a ouvir, em audiência requerida pelo Ministério Público, e até mesmo pela empresa demandada na ação original os esclarecimentos técnicos dos peritos, indispensáveis para o entendimento completo da matéria.

Considerando que laudo pericial apresentado pela empresa do perito ROBERTO LUIZ CURIOSO DA SILVA apresentou grandes impropriedades técnicas e utilizou carta topográfica diversa da exigida pela Lei 8.426/03, o Ministério Público, às fls. 4141/4142, requereu que, em caso de não ser declarada a nulidade da perícia, que fosse designada audiência para que o perito, pessoalmente prestasse esclarecimentos técnicos imprescindíveis para elucidação da verdade dos fatos, que foram arrolados detalhadamente em forma de quesitos5. A audiência nesse caso tornou-se essencial, uma vez que

5 1) Por que o perito não utilizou a carta básica na escala de 1:100.000 elaborada pela SUDENE/Diretoria do Serviço Geográfico do Exército, e as cartas básicas na escala 1:2000 da SEPLAN/RN, conforme determina a Lei Estadual 8.426/03, que dispõe sobre a Faixa de Proteção Ambiental do Rio Pitimbu? 2) Por que a área do empreendimento não se caracteriza como duna? 3) Com base na utilização da carta topográfica na escala 1:2000 da SEPLAN/RN, que é a referência

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todas as impropriedades apontadas na segunda perícia poderiam ser esclarecidas através dos debates com as partes e os assistentes técnicos das partes.

Ocorre que a Magistrada desprezou por completo o pleito, desprezando, por conseguinte, a função prioritária do processo que é a busca da verdade substancial.

Como bem ensina LUIZ GUILHERME MARINONI:

“Ninguém duvida de que a função do real (e, portanto, da prova) no processo é absolutamente essencial, razão mesmo para que a investigação dos fatos, no processo de conhecimento, ocupe quase do procedimento e das regras que disciplinam o tema nos diversos códigos processuais que se aplicam no direito brasileiro”(...)Nada mais natural do que eleger, como um dos princípios essenciais do processo – senão a função principal do processo de conhecimento - , a busca da verdade substancial.6

Na questão atinente à prova, a sentença também desprezou a importância do debate em audiência e do Princípio do contraditório. No dizer de Humberto Theodoro Jr: Não se pode pensar em garantia do devido processo legal sem imaginar um contraditório entre os litigantes, que tenha como escopo maior a busca da verdade real, por meio de debate amplo e irrestrita liberdade de alegações e provas”7.

da Lei Estadual 8.426/03, a área do empreendimento encontra-se inserida na Faixa de Proteção Ambiental do Rio Pitimbu, caracterizada como Trecho II do art. 3º da referida Lei Estadual, delimitada no Mapa da Lei, ou seja abaixo da cota de 40metros? 4) O empreendimento não causou nenhum impacto ambiental no que se refere aos aspectos relativos ao escoamento superficial das águas, à infiltração, à qualidade das águas superficiais e subterrâneas? 5) Se o empreendimento não causou nenhum dano ambiental, como o Perito justifica a existência dos autos de infração lavrados pela SERHID (às fls. 3219/3220) e pelo IDEMA ( 100, 136, 3455)? 6) A retirada da vegetação, a construção do muro do empreendimento, as obras de compactação e outras alterações das características naturais do local podem ter contribuído para o processo erosivo que existe no entorno do empreendimento? 7) O lançamento de efluentes decorrentes do sistema de esgotamento sanitário está de acordo com o enquadramento das águas subterrâneas do empreendimento?6 MARINONI, Luiz Guilherme. Manual do processo de conhecimento. 4ª Ed. SP: Editora Revista dos Tribunais 2005, fl. 248/2487 In PORTANOVA, Rui. Princípios do Processo Civil. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 1995, f.. 200

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A sentença ora guerreada, realmente, contrariou o Princípio do Contraditório, que se encontra enfatizado no art. 5º LV da Constituição, com o seguinte enunciado:

“aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes”.

NELSON NERY JÚNIOR explica:

por contraditório deve entender-se, de um lado, a necessidade de dar-se conhecimento da existência da ação e de todos os atos do processo às partes, e, de outro, a possibilidade de as partes têm direito de deduzir suas pretensões e defesas, realizarem as provas que requereram para demonstrar a existência de seu direito, em suma, direito de serem ouvidos paritariamente no processo em todos os seus termos8.

Ademais, a sentença contrariou o art. 331§3º do CPC que determina ao Julgador o saneamento do processo e a produção da prova.

3- DO CERCEAMENTO DE DEFESA

Diante do que já foi exposto, não resta dúvida que houve, por parte do Juízo a quo, um evidente cerceamento do direito de produção de prova ao Ministério Público, com violação ao princípio do devido processo legal. Ressalte-se, por oportuno, que no momento processual adequado, no caso na petição inicial, o Ministério Público requereu a produção de todas as provas admissíveis e que a audiência para esclarecimentos do perito e para oitiva dos assistentes técnicos do Ministério Público foi expressamente requerida e justificada a sua necessidade.

Sobre essa questão, vem decidindo o Superior Tribunal de Justiça que:

8NERY JÚNIOR, Nelson. Princípios do processo civil na Constituição Federal, 3ª Ed. Editora Revista dos Tribunais, 1996. fl. 133

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PROCESSUAL CIVIL – JULGAMENTO ANTECIPADO DA LIDE – CERCEAMENTO DE DEFESA – REQUERIMENTO DE PROVAS PELA AUTORA.Caracteriza-se o cerceamento de defesa quando a parte pugna pela produção de prova necessária ao deslinde da controvérsia, mas o julgador antecipa o julgamento da lide e julga improcedente um dos pedidos da inicial, ao fundamento de ausência de comprovação dos fatos alegados.Recurso especial provido(STJ – Resp 184472/SP – Rel. Min. CASTRO FILHO – 3ª Turma, DJ 02.02.2004 – p. 332)

PROCESSUAL - PROVA - INDEFERIMENTO IMPLÍCITO - JULGAMENTO CONTRA QUEM NÃO PÔDE PRODUZIR PROVAS – NULIDADE.I - Se o autor requereu, na inicial, a produção de provas, não é lícito ao juiz desprezar tal pedido. Impõe-se-lhe decidir expressamente, deferindo ou denegando o pedido. Não se admite indeferimento implícito.II - Não pode o juiz, após indeferir a produção de provas requeridas pelo autor, alegar insuficiência da prova, para declarar improcedente a ação.(STJ - REsp 199970 / DF – Rel. Min. GARCIA VIEIRA 1ª Turma, DJ 14.06.1999 p. 131 RSTJ vol. 127 p. 107)

4- DA ILEGALIDADE DA SENTENÇA QUE INDEFERIU O PEDIDO DE ANULAÇÃO DA SEGUNDA PERÍCIA REALIZADA POR EMPRESA DE CONSULTORIA QUE PRODUZIU DOCUMENTOS TÉCNICOS E ESTUDOS PARA A EMPRESA RÉ NA AÇÃO ORIGINAL

Em sua sentença, a MM. Magistrada NÃO acatou a nulidade da segunda perícia levantada tanto pelo Ministério Público (fl. 4122/4143, quanto pelo IDEMA (fl. 4220/4226). A segunda perícia foi impugnada, principalmente, pelo fato de ter sido realizada por empresa de

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consultoria parcial, que produziu trabalhos relativos ao empreendimento objeto da lide e pelo fato do Juízo a quo não ter dado ciência às partes da data e local indicado pelo perito para ter início à produção da prova, nos termos do art. 431-A, o que impediu o acompanhamento do Ministério Público e do órgão ambiental aos atos praticados pela empresa do perito.

Sustentou que se o ‘Parquet’ tinha alguma objeção ao nome do perito nomeado por este Juízo deveria, na primeira oportunidade em que se manifestou nos autos, ou seja, quando da apresentação dos quesitos, ter também manejado a exceção de suspeição do ‘expert’. Silenciando naquele momento quanto a este fato, operou-se quanto a este ponto a preclusão.

Com a máxima vênia, o argumento da MM. Juíza não pode ser considerado correto nem sob o ponto de vista da estrita legalidade, nem sob o prisma da Teoria do Direito e dos princípios constitucionais que norteiam a produção de provas

Com efeito, em 30/06/2009 (cf. fl. 3963), quando o Ministério Público tomou ciência da nomeação do perito, não teve ciência de que a perícia iria ser realizada pelo quadro de profissionais da empresa de consultoria do perito, uma vez que essa não foi a determinação judicial. Como o Ministério Público também não foi intimado para ter ciência do início dos trabalhos pelo perito, só tomou ciência dos verdadeiros autores do trabalho pericial quando o laudo estava pronto em 07/01/2010. Logo que tomou ciência de que o trabalho pericial foi realizado pela equipe de consultores da empresa, o Ministério Público requereu a nulidade da perícia.

É importante realçar que logo na apresentação do parecer técnico pericial, o perito indicado judicialmente registrou que utilizou a estrutura de sua empresa, inclusive seu quadro de pessoal pra para a confecção do laudo pericial, como se observa à fl. 4026:

Para atender a intimação da Senhora Juíza de Direito Ana Carolina Maranhão, foi utilizado a estrutura da empresa Curioso – Estudos Geológicos e Ambientais, cujo perfil descreveremos a seguir. (...) Seu quadro de pessoal se constitui de técnicos altamente qualificados dentre os quais: especialistas, mestres e doutores, com

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grande conhecimento em assuntos específicos na nossa área de atuação e gerencial, preparados para compreender e empreender as necessidades de cada empreendimento.

Ora, muitos documentos técnicos que foram entregues pela empresa demandada na ação original relativos ao Condomínio Buena Vista, ora impugnado, foram realizados por profissional integrante da empresa de consultoria do perito. Como se constata à fl. 4177, o engenheiro FERNANDO CESAR DE OLIVEIRA FURTADO, que integra o quadro de pessoal da empresa do perito foi responsável pelo Projeto de Terraplenagem, drenagem, pavimentação e plantas do empreendimento (fls. 172/266 e 272 e segs, com registro da ART à fl. 752). O engenheiro foi também subscritor das considerações acerca dos equipamentos e obras de compactação do empreendimento (fls. 3441/3443).

A empresa que realizou a segunda perícia, portanto, é a mesma que realizou estudos para o empreendimento da parte demandada na ação civil pública original. Na primeira oportunidade que o Ministério Público tomou ciência desse fato, ofertou a sua impugnação . O IDEMA também só tomou ciência do fato por ocasião de sua ciência da apresentação do laudo e também apresentou sua impugnação.

Com essas considerações, tem-se que a argüição de impedimento e suspeição do perito (ou seja, da empresa de consultoria do perito), nos termos do art. 138, II c/c art. 135, V do CPC, foi ofertada tempestivamente.

Cabe salientar que a nomeação do perito é um ato exclusivo do Magistrado. Em caso de perícia complexa, o Magistrado, nos termos do art. 431-B, pode nomear mais de um perito, mas o próprio perito não pode nomear spont própria os auxiliares que bem entender. Todos os que participam de um laudo pericial precisam ser peritos nomeados pelo Juízo!

Tem-se, portanto, que o pedido de anulação da segunda perícia pelo Ministério Público e do IDEMA encontra-se legalmente amparada.

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Sob outro enfoque, a sentença contrariou também o Princípio da prova imaculada, que abrange tanto a formalidade, quanto à legalidade da prova e o Princípio da proibição da prova ilícita, que se encontra estabelecido expressamente no art. 5º , XII do Texto Constitucional, nos seguintes termos:

“São inadmissíveis, no processo, as provas obtidas por meios ilícitos”.

NELSON NERY JÚNIOR assevera que a prova por ser ilícita tanto em sentido material, quanto em sentido forma. A ilicitude material ocorre quando a prova seria de um ato contrário ao direito e pelo qual se consegue um dado probatório (tal com invasão domiciliar, violação de sigilo epistolar, ete). A ilicitude formal ocorre quando a prova decorre de forma ilegítima se produz. No caso dos autos, a sentença é nula porque fundamentada em prova ilícita.

Em sua sentença, a MM. Magistrada, além de ter impedido o contraditório, acatou prova produzida de forma ilícita, por empresa de consultoria parcial, que produziu documentos para a empresa ré.

5. DA ILEGALIDADE DA SENTENÇA QUE INDEFERIU O PEDIDO DE ANULAÇÃO DA SEGUNDA PERÍCIA REALIZADA SEM A CIÊNCIA DAS PARTES SOBRE O LOCAL DO INÍCIO DOS TRABALHOS, CONTRARIANDO O ART. 431-a DO CPC

Na petição de fls. 4122/4143, o Ministério Publico também requereu a anulação da perícia em razão da falta de ciência do Ministério Público da data e local indicado pelo perito para ter início à produção de prova nos termos do art. 431-A do CPC.

O art. 431-A determina que a perícia tenha início com a intimação prévia das partes da data e do local em que os trabalhos serão iniciados, como se constata:

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Art. 431-A. As partes terão ciência da data e local designados pelo juiz ou indicados pelo perito para ter início a produção da prova.

Como bem assevera Luiz Guilherme Marinoni:

A medida tem o objetivo evidente de permitir a adequada participação das partes (e dos assistentes técnicos) no desenvolvimento da prova pericial9.

No caso em apreço, o Ministério Público sequer foi informado da data e local do início da produção de provas. Note-se que na primeira perícia – considerada válida judicialmente - tanto as partes, quanto os assistentes técnicos das partes compareceram no local do empreendimento, juntamente com o perito nomeado, para o início da produção da prova. Toda a visita do perito no local e no entorno do empreendimento foi acompanhada de perto pelas partes e seus assistentes.

No caso da segunda perícia, o Ministério Público sequer foi informado da data da ida do perito (ou melhor, da equipe da empresa do perito) no local do empreendimento e não pôde acompanhar a perícia pessoalmente e através dos seus assistentes técnicos. Não se sabe sequer se o próprio perito foi ao local, ou qual foi a equipe que foi ao local.

O Eg. Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Norte já enfrentou situação similar e decidiu pela nulidade da perícia, pela falta do cumprimento do art. 431-A do CPC, como se observa:

EMENTA: AMBIENTAL, CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. CONSTRUÇÃO EM ÁREA CONSIDERADA DE PRESERVAÇÃO AMBIENTAL. PLEITO QUE BUSCA A REGULARIZAÇÃO URBANÍSTICA DO IMÓVEL. PRELIMINAR DE CONHECIMENTO DE AGRAVO RETIDO, SUSCITADA PELO APELANTE. PERÍCIA REALIZADA SEM INTIMAÇÃO DAS PARTES QUANTO AO DIA E LOCAL DE REALIZAÇÃO DA PROVA. INFRINGÊNCIA AO ARTIGO 431-A DO CPC.

9 In Manual do processo de conhecimento. 4ª ed. São Paulo, RT, 2006, p. 374

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NULIDADE QUE SE IMPÕE. ACOLHIMENTO DA PRELIMINAR. AGRAVO RETIDO CONHECIDO E PROVIDO. - É nula a perícia produzida sem intimação das partes quanto ao dia e local de realização da prova. (Apelação Cível n° 2007.007063-7. Origem: 1ª Vara Cível da Comarca de Natal. Apelante: Móteis Caribe Ltda. Advogado: Dr. André Augusto de Castro. Apelado: Ministério Público. Relator: Juiz Convocado Cícero de Macedo Filho)

A matéria também tem sido enfrentada no STJ, como se

observa no Relatório do Ministro JORGE SCARTEZZINI, relativo ao Recurso Especial 655.747 – MG (2004/0053092).

Conquanto não esteja o Juiz adstrito ao laudo pericial, podendo se utilizar de outros elementos para formar seu convencimento (art. 436 CPC), a prova pericial possui especial relevância na cognição do feito, razão pela qual deve se revestir das formalidades previstas em lei. Nessa esteira, a interpretação teleológica do art. 421 do CPC dá conta de que o Juízo deve observar a qualificação técnica do expert, sobre quem se aplicam, inclusive, as disposições atinentes ao impedimento e suspeição, nos termos do art. 423 do CPC. Devem ser respeitados, assim, os pressupostos legais que regem a matéria, dentre eles a total independência do Juízo na escolha do perito oficial, restando às partes, como decorrência do direito de participarem da produção da prova, e do princípio do contraditório, a indicação de assistentes técnicos e a formulação de quesitos, nos termos do art. 421 do CPC.

Na primeira perícia realizada (às fls. 3641/3664), o perito veio de Brasília para o RN realizar a perícia. Mesmo assim, a MM. Juíza deu ciência das partes do início dos trabalhos realizados e todas as partes, com os seus assistentes técnicos, acompanharam a visita do perito no local do

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empreendimento, observaram os documentos que o perito utilizava, foram em todos os locais visitados, etc.

Essa diligência essencial de intimar as partes para acompanharem o início da perícia não foi realizada na segunda perícia determinada pela Magistrada e realizada pela empresa de consultoria que também realizou trabalhos para empresa demandada na ação original. Por que as partes não foram cientificadas???

A falta da ciência do Ministério Público acabou por macular toda a perícia. Para se ter idéia, o perito utilizou mapa em escala inadequada e diversa da indicada pela Lei Estadual 8.426/03 para caracterização da faixa de proteção ambiental do Rio Pitimbu, o que caracteriza como falha grave da perícia. Essa falha poderia ter sido evitada se o Ministério Público, o órgão ambiental e os seus respectivos assistentes técnicos tivessem acompanhado a perícia.

Vale destacar que pela Lei, cada milímetro do mapa equivale a 2 metros do terreno. Pela escala do perito, cada milímetro do mapa equivale a 60 metros do terreno. Uma diferença gritante que altera o verdadeiro entendimento do meio físico do empreendimento!

A MM Juíza, em sua decisão afirmou que o Ministério Público não demonstrou qualquer prejuízo pelo fato de a empresa da qual faz parte o perito nomeado contar entre seus consultores técnicos com um dos engenheiros do empreendimento imobiliário objeto da presente lido”.

Ora, o Ministério Público (às fls. 4122/4143) ressaltou todos os prejuízos advindos do laudo equivocado. A questão é de interesse público e tem reflexo direto na saúde da população difusamente considerada que depende da qualidade e da recarca do Rio Pitimbu para o abastecimento de água potável de toda a população da zonas sul, leste e oeste da cidade de Natal e da população residente na Grande Natal! O Ministério Público chegou, inclusive, a arrolar 7 (sete) pontos contendo as impropriedades do laudo para serem esclarecidos em audiência. O prejuízo ficou patente!!!!!

6- DA DESCONSIDERAÇÃO NA SENTENÇA DA ILEGALIDADE DO LICENCIAMENTO AMBIENTAL DO CONDOMÍNIO BUENA VISTA

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A MM. Juíza não reconheceu em sua decisão que o processo de licenciamento ambiental do empreendimento Buena Vista foi maculado e justificou que a área do empreendimento é inferior aos 100 ha e que nesse caso não havia necessidade de realização do Estudo de Impacto Ambiental/ Relatório de Impacto Ambiental – EIA/RIMA.

Vale esclarecer que a exigência do Estudo de Impacto Ambiental- EIA não se dá apenas em razão da área do empreendimento. Por sinal, a área do empreendimento sequer foi ponto de divergência entre as partes!

O EIA, que é amparado no art. 225, §1º, IV da Constituição Federal como exigência obrigatória a ser imposta pelo Poder Púbico - no caso o órgão ambiental - aos responsáveis por obras ou atividades potencialmente causadoras de significativa degradação do meio ambiente encontra-se detalhado na Resolução 01/86 do Conselho Nacional do Meio Ambiente – CONAMA. No rol exemplificativo de atividades que precisam submeter-se ao EIA consta a instalação de projetos urbanísticos acima de 100ha ou em áreas consideradas de relevante interesse ambiental, como se observa:

Art. 2º Dependerá de elaboração de estudo de impacto ambiental e respectivo relatório de impacto ambiental - RIMA, a serem submetidos à aprovação do órgão estadual competente, e da Secretaria Especial do Meio Ambiente - SEMA157 em caráter supletivo, o licenciamento de atividades modificadoras do meio ambiente, tais como:(...)XV - Projetos urbanísticos, acima de 100 ha ou em áreas consideradas de relevante interesse ambiental a critério da SEMA e dos órgãos municipais e estaduais competentes estaduais ou municipais

Como visto, as atividades realizadas em locais considerados de relevante interesse ambiental precisam submeter-se ao EIA.RIMA. No caso, o órgão ambiental deveria ter exigido a apresentação

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pelo empreendedor de um Estudo de Impacto Ambiental, EIA/RIMA, tendo em vista que a área do empreendimento é inserida na Bacia Hidrográfica do Pitimbu, considerada como de relevante interesse ambiental pelo próprio Estado do Rio Grande do Norte, que tem realizado, através da Secretaria Estadual de Recursos Hídricos, SERHID e Instituto de Gestão da Águas do Rio Grande do Norte e do IGARN um grande trabalho de recuperação da área da Bacia, inclusive, com celebração de convênio com o Fundo Nacional de Meio Ambiente para efetivação de ações de proteção. A proteção da área é alvo até mesmo de uma Lei Estadual específica: Lei Estadual 8.426 de 14 de novembro de 2003, como se observa às fls. 4172/4176.

Destaca-se, ainda, que o rio Rio Pitimbu, que fica vizinho ao empreendimento, é o manancial de água superficial que alimenta a Lagoa do Jiqui e que é responsável pelo abastecimento de água potável da população que reside nas zonas sul, leste e oeste da cidade de Natal. Também abastece a cidade de Parnamirim. A relevância ambiental do Rio Pitimbu é de conhecimento público e a qualidade e quantidade de suas águas estão diretamente relacionadas com a saúde da população.

Sobre a Lagoa do Jiqui, que fica a aproximadamente 2,8km do terreno do empreendimento, segundo informação d fl. 621, o Relatório diz:

A Lagoa do Jiqui é o exutório do rio Pitimbu, na qual a Companhia de Águas e Egotos do Rio Grande do Norte – CAERN faz, desde o ano de 1960, a captação de águas para abastecimento público de parte da população da cidade de Natal - 130.000 habitantes residentes nas zonas leste, oeste e sul, cerca de 30% da população dessas regiões.

Conforme informa a Companhia de Águas e Esgotos do Rio Grande do Norte (CAERN), empresa concessionária do serviço de abastecimento de água na cidade da Grande Natal, o manancial de água do Rio Pitimbu/Lagoa do Jiqui abastece uma população em torno de 390.000 (trezentos e noventa mil) habitantes residentes nas Zonas Sul, Leste e Oeste da Capital.

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Nos documentos dos autos , ainda consta que:

• O rio Pitimbu e a lagoa do Jiqui desempenham papel importante na disponibilização de água doce superficial para a cidade do Natal/RN, pois cerca de 35% da população é servida com águas oriundas das Lagoas do Jiqui e Extremoz;

• 25% da área do município do Natal, que se localiza ao sul do rio Potengi (zonas oeste, leste e sul) é atendida pela lagoa do Jiqui;

• as águas da Lagoa do Jiqui contribuem para a diluição das águas subterrâneas cujo teor de nitrato tem ultrapassado teores permitidos pela legislação em vigor em vários poços que abastecem a capital.

• a sub-bacia hidrográfica do rio Pitimbu tem sido palco de intervenções que estão provocando sua degradação ambiental, podendo, inclusive, culminar com o colapso do abastecimento público d’água da Capital.

Também merece destaque a informação técnica de que o

Rio Pitimbu é alimentado por água de ressurgência de águas subterrâneas e que em Parnamirim a expansão urbana desordenada é apontada como uma das ações impactantes ao rio.

Nenhuma dessas informações fornecidas pelo próprio Governo do Estado do Rio Grande do Norte, através da SERHID e IGARN foram consideradas pela MM Juíza para considerar necessário o Estudo de Impacto Ambiental do empreendimento em apreço.

A situação dramática do abastecimento de água potável na cidade é de conhecimento público e já foi divulgado até mesmo na imprensa nacional.

Com efeito, a maioria da água que chega nas residências dos moradores de Natal é extraída do subsolo (do aqüífero que está contaminado por Nitrato), através de poços perfurados pela CAERN. Dos 134 poços em atividade, 69 apresentam contaminação por nitrato. Há poços, por

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exemplo, que chegam a apresentar 30mg/l de nitrato (três vezes a mais do que o padrão admitido pela Portaria 518/04 MS)

Muitos bairros da cidade estão recebendo água contaminada por NITRATO! O nitrato é um composto químico decorrente da biodegradação de excrementos humanos (principalmente da urina) e liberados pelas fossas existentes na nossa cidade. O nitrato é muito persistente e se avança rapidamente pelo aqüífero. Pela Portaria 518/04 do Ministério da Saúde, o teor máximo de NITRATO permitido para a água ser considerada potável é de 10mg/L. O nitrato é associado ao risco de duas doenças graves: a metemoglobinemia, conhecida como síndrome do bebê azul e o câncer gástrico. O site do Instituto do Câncer e estudos da literatura médica alertam que a ingestão de água proveniente de poços que contêm uma alta concentração de nitrato está relacionada com a incidência do câncer de estômago.

O Rio Pitimbu abastece a Lagoa do Jiqui e a água dessa lagoa é utilizada pela empresa que presta serviço de abastecimento de água (CAERN) para realizar a diluição do nitrato da água captada do aqüífero, através de poços tubulares.

Outras ilegalidades do licenciamento ambiental

É importante esclarecer, ainda, que as ilegalidades do licenciamento ambiental suscitadas pelo Ministério Público não foram restritas à inexistência do EIA/RIMA.

O Ministério Público sustentou em sua peça inicial que o IDEMA concedeu indevidamente uma Licença ambiental de Instalação (LI) para a construção de um empreendimento de uso residencial denominado Condomínio Buena Vista, na área de influência da Bacia Hidrográfica do Rio Pitimbu, sem exigir estudos ambientais da área e com base apenas em um simples “Memorial Descritivo”.

O mais aberrante é que onde o IDEMA deveria pedir “o mais” (que seria no caso a realização de EIA/RIMA), sequer pediu “o menos” (qualquer outro estudo ambiental): o IDEMA não pediu estudo ambiental algum para deferir a licença prévia e a licença de instalação!

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O órgão ambiental concedeu a Licença Prévia sem sequer exigir a topografia do terreno do empreendimento, documento básico e prioritário, principalmente em se tratando de área contigua ao Rio Pitimbu.

O próprio representante do IDEMA - que foi um dos subscritores do parecer técnico que subsidiou a expedição da Licença Prévia - em audiência realizada perante o Ministério Público (à fl. 620) afirmou que:

realmente, o estudo de topografia deveria ser exigido previamente à expedição da licença prévia

Nos autos do licenciamento também não constou qualquer tipo de autorização para desmatamento da vegetação existente no local. O IDEMA teria que, necessariamente, condicionar o desmate realizado pelo empreendedor à prévia autorização.

Pelas fotografias de fls. 53/62, o desmate ocorreu em 21 de abril de 2006. Por requisição do Ministério Público, o IBAMA realizou uma vistoria no local nos dias 06 e 08/06/06. Foi consignado no Relatório de Vistoria de fl. 65, que:

constatamos que a área foi totalmente desmatada com serviços feitos através de operação mecânica (tratores e esteira) e com serviços e terraplanagem e nivelamento do terreno. Há fragmentos de vegetação nativa e plantada com raízes (...) usando os parâmetros de comparação, observamos que a vegetação suprimida se caracterizava como de tabuleiro costeiro. (...)Não foi apresentada Autorização de Desmate da área licenciada.

Na fotografia aérea constante à fl. 393 do anexo II, também é possível verificar a vegetação que existia no local.

É bom lembrar que a vegetação fixadora de duna é considerada como área de preservação permanente nos termos do Código Florestal (Lei 4.771/65, art. 2º, I, f).

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No documento de fl. 363/364, o IDEMA chegou a reconhecer a inexistência de estudo técnico-ambiental da área e em especial do aqüífero do local e chegou a celebrar um Termo de Compromisso com o empreendedor estipulando um compensação ambiental pela implantação do empreendimento!

Não caberia ao órgão ambiental realizar uma compensação ambiental pela falta de estudos. Caberia, sim, suspender a licença ambiental concedida, que é um ato administrativo sujeito à revisão, para cobrar todos os estudos faltantes.

Outra falha insuperável do IDEMA foi a de ter licenciado o empreendimento para construir em área de dunas, situação que foi comprovada nos próprios autos, através do Projeto de Terraplenagem do Empreendimento (fl. 174), através do Teste de Sondagem (planta de fl. 159), realizado pelo próprio empreendedor e pelo parecer técnico apresentado pelo Laboratório de Estudos Geoambientais do Departamento de Geologia da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, UFRN (fl. 644) e confirmado categoricamente na perícia de fl. 3655/3656.

Mas o IDEMA, mesmo constatando essas graves falhas, permitiu a continuidade das obras que acabaram por causar diversos impactos negativos no local e a sentença a quo também não reconheceu essas graves ilegalidades cometidas pelo órgão ambiental e permitiu a continuidade das obras no local.

7- DA DESCONSIDERAÇÃO NA SENTENÇA A QUO DOS IMPACTOS CAUSADOS PELO EMPREENDIMENTO E DETALHADAMENTE DESCRITOS PELA PERÍCIA REALIZADA PELO PERITO DO IBAMA/BRASÍLIA

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Novembro de 2006 Setembro de 2008Início da construção do empreendimento Destruição do entorno

A pedido do Ministério Público (à fl. 1687/1689) e do próprio órgão ambiental licenciador (IDEMA), a MM. Juíza da Comarca de Parnamirim determinou a realização de uma perícia no local para aferir se a área do empreendimento era de duna.

A perícia realizada por peritos da Diretoria de Licenciamento Ambiental do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (IBAMA) de Brasília, DF (fls. 3642/3664) registrou que o Condomínio Buena Vista produz pelo menos 14 (quatorze) impactos negativos de caráter permanente (permanentes não significam irreversíveis, mas contrapõem aos impactos temporários) e contribui negativamente para o processo de erosão detectado no local e para o equilíbrio ambiental da região.

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A perícia realizada pelos técnicos do IBAMA de Brasília demonstrou que o Condomínio Buena Vista contribui para o processo de erosão detectado no local e para o equilíbrio ambiental da região (fl. 3653).

“Com a caracterização de três fatores condicionantes de erosão presentes na área de influência do empreendimento ‘Condomínio Buena Vista’, é possível concluir que se trata de uma região suscetível a processos erosivos”.

“ é possível que a remoção de vegetação tenha comprometido o equilíbrio ambiental da região” .

“Por isso, pode-se afirmar que os problemas de erosão detectados no entorno do empreendimento decorrem da interação de diversos fatores, dentre os quais se destacam a remoção de cobertura vegetal no local e, possivelmente, as obras de infra-estrutura associadas ao empreendimento ‘Condomínio Buena Vista’ – terraplanagem e aumento do escoamento superficial do terreno”.

A perícia também consignou que a vegetação da área do Condomínio Buena Vista era fixadora de duna:

“(...) no local do empreendimento a cobertura vegetal, antes da supressão, caracterizava-se por ser fixadora de

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duna, típica de tabuleiro costeiro, como a encontrada na área adjacente pertencente à União e administrada pela Aeronáutica, onde toda a parte da Duna que limita o Rio Pitimbu encontra-se preservada”.

Ficou consignado pela perícia que as obras de implantação do Condomínio Buena Vista estão correlacionadas com a degradação da área de proteção do Rio Pitimbu:

“É possível correlacionar as obras de implantação do Condomínio Buena Vista com a degradação observada na área de proteção ambiental do Rio Pitimbu”.

“A exposição do solo pela remoção da cobertura vegetal aliada às obras de infra-esrutura para implantação do ‘Condomínio Buena Vista’ (terraplanagem, compactação do solo, dimensionamento do sistema de drenagem) têm impacto direto nas adjacências do empreendimento e, pela vistoria realizada e análise dos documentos e registros dos moradores da região, podem ter causado as rachaduras em residências e provocado as erosões no entorno do empreendimento”.

A perícia mencionou que existem pelo menos 14 (quatorze) Impactos Ambientais Negativos e Permanentes decorrentes do “Condomínio Buena Vista”.

Os peritos classificaram os impactos decorrentes do Condomínio em P – Permanentes e T – Temporários (que cessam com o término da implantação). Os impactos negativos permanentes decorrentes do empreendimento em questão são gravíssimos, como se observa:

“Considerando-se as possíveis alterações listadas acima e as constatações decorrentes de vistoria técnica ao empreendimento, entende-se como impactos ambientais negativos associados à implantação do “Condomínio Buena Vista”, os seguintes:a. Meio Físico – Solo: diminuição das taxas permeáveis do terreno (P); processos erosivos decorrentes das obras

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de terraplanagem e compactação do solo (P); descaracterização do relevo característico de cordão de dunas (aplainamento) (P); ocorrência de erosão em dunas e assoreamento do Rio Pitimbu (P);b. Meio Físico – Clima/Acústica: poluição do ar provocada pela movimentação de máquinas e equipamentos (T); sensação de aumento na temperatura provocada pela remoção de cobertura vegetal (P); poluição sonora provocada pela momvimentação de máquinas e equipamentos (T)c. Meio Físico – Água: qualidade das águas superficiais alterada em decorrência dos sedimentos carreados do terreno e das erosões provocadas pelas obras de implantação do condomínio (P); aumento no escoamento superficial, que levou ao colapso do sistema de drenagem urbano da região (P); redução da recarga de aqüíferos, decorrente da diminuição da taxas permeáveis do terreno (P); interferência em APP – erosão em dunas e assoreamento do Rio Pitimbu (P);d. Meio Biótico: soterramento de indivíduos arbustvos e arbóreos na Mata Ciliar do Rio Pitimbu, em decorrência dos processos erosivos intensificados na região (P); remoção de cobertura vegetal, fixadora de duna (P); modificação da dinâmica de ecossistemas locais (P);e. Meio Antrópico – População: as obras de implantação do empreendimento provocaram danos nas estruturas das residências adjacentes à área do condomínio (P);f. Meio Antrópico – Infra-estrutura: comprometimento do sistema de abastecimento de água dos municípios, uma vez que o Rio Pitimbu abastece a Lagoa do Jiqui, que é um importante reservatório no qual são captadas as águas para o abastecimento público d’água no município de Natal (P)g. Meio Antrópico – Trabalhadores: sem identificação neste momento”

É importante ressaltar que a perícia menciona impacto permanente e não impacto irreversível. Os permanentes continuam com a

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permanência das obras existentes, mas podem ser reversíveis de acordo com um projeto de recuperação específico.

Sobre a possibilidade de recuperação das áreas degradadas, a perícia mencionou a necessidade de se realizar um Programa de Recuperação de Área Degradada, PRAD:

“A recuperação de áreas degradadas, desde que empregados métodos adequados para este fim, é possível e deve ser realizada de forma a evitar maiores danos ao meio ambiente e, conseqüentemente, ao ser humano. Ao agente causador de dano comprovado ao meio ambiente, deve ser requerida a apresentação do Programa de Recuperação de Área Degradada – PRAD, que, depois de analisado e aprovado, pelo órgão competente, deverá ser executado pelo empreendedor” (fl. 3654)

Os assistentes técnicos do Ministério Público resumiram, com preocupação, os impactos do empreendimento, como se observa à fl 4169:

Quanto ao escoamento superficial, a intensificação da magnitude do processo de erosão na face íngreme da duna (crista de arrasto) está relacionada à modificação imposta à sua face reversa (depressões interdunares e a rampa suavizada em direção à bacia de deflação) pela progressiva ocupação daquele espaço pela expansão urbana. A área de destino final de partea água

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proveniente do escoamento superficial sobre a Rodovia BR-101 e do escoamento das demais áreas do entorno até o seu divisor de águas (interflúvio) era o terreno sobre o qual está situado o condomínio, cujas depressões funcionavam como uma bacia receptora de parte dessas águas do escoamento superficial (runoff). A partir da conclusão das obras do empreendimento (terraplenagem e muro, em sua fase atual) estas águas foram forçadas a escoar em uma seção menor e, consequentemente, aumentou o seu poder erosivo.

O aumento no volume das águas superficiais despejadas diretamente no rio Pitimbu também potencializa os efeitos de poluição e contaminação de suas águas. Portanto, faz-se necessária a adoção de medidas urgentes a fim de promover a retenção da carga poluidora / contaminante dessas águas (através implantação de reservatórios de primeira chuva e encaminhamento dos resíduos para uma ETE) visando garantir a qualidade das águas da lagoa do Jiqui (captadas para consumo humano), aonde desemboca. Ressaltamos que esta é uma medida que envolve todos os usuários da bacia hidrográfica do Pitimbu.

O projeto de esgotamento sanitário mostra-se adequado ao tratamento dos efluentes. No entanto, é importante ressaltar que não foram identificadas medidas emergenciais para o caso de a estação de tratamento venha a apresentar problemas operacionais. Com relação a infiltração dos efluentes tratados, não foi apresentado plano específico e o programa de monitoramento, conforme exigido pela Resolução CONAMA 396/2008.).

Conforme consta no relatório pericial, a área já estava sujeita à ocupação (atividade rural), o que havia iniciado o processo de descaracterização do meio natural. Entretanto, a sua utilização como área condominial poderá trazer impactos à Bacia do Pitimbu e

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ecossistemas associados (por: escoamento superficial concentrado, efluentes e resíduos sólidos, poluição sonora, etc.) e o comprometimento dos recursos hídricos associados à esta bacia hidrográfica. Ressaltamos, novamente, que a preocupação com este aspecto deve ser estendida a outros potenciais poluidores desta Bacia (rodovias, demais empreendimentos residenciais, agrícolas e industriais).

8- DA INOBSERVÂNCIA DA SENTENÇA DAS REGRAS CONSTITUCIONAIS E INFRACONSTITUCIONAIS RELATIVAS À RESPONSABILIDADE CIVIL POR DANOS CAUSADOS AO MEIO AMBIENTE

A decisão ora guerreada fere o princípio elementar da responsabilidade civil por danos ambientais.

Sobre a matéria, a Constituição Federal estabelece que:

Art. 225§ 3º. As condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais e administrativas, independentemente da obrigação de reparar os danos causados.

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A Lei 6938/81, também dispõe sobre a matéria deixando claro que a responsabilidade civil por danos ao meio ambiente é objetiva, como se observa:

Art. 14§1º. Sem prejuízo das penas administrativas previstas nos incisos do artigo, o poluidor é obrigado independentemente de culpa, a indenizar ou reparar os danos causados ao meio ambiente e a terceiro, afetados por sua atividade.

Ao julgar totalmente improcedente a pretensão autoral, a MM Juíza impediu que a empresa apelada realizasse o Plano de Recuperação – PRAD de todos os danos que causou ao ambiente do entorno do empreendimento e ao Rio Pitimbu. A sentença a quo desrespeitou a Constituição e as normas infraconstitucionais já mencionadas sobre a responsabilidade ambiental e inovou com um precedente perigoso que prega a IRRESPONSABILIDADE AMBIENTAL pelos danos causados ao meio ambiente.

9- RECONHECIMENTO NA SENTENÇA DE QUE A ÁREA OBJETO DA LIDE É “DUNA” E DESRESPEITO DA SENTENÇA À LEGISLAÇÃO ESPECÍFICA QUE PROTEGE ÁREA DE DUNA – ÁREA DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE - APP

O laudo da perícia realizada pela equipe da Diretoria de Licenciamento Ambiental do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (IBAMA) de Brasília, DF foi categórico em afirmar que o empreendimento situa-se em área de duna, portanto em Área de Preservação Permanente- APP, como se observa:

Do exposto, conclui-se que os documentos referentes aos estudos geológicos realizados na área do empreendimento do Condomínio Buena Vista indicam que o terreno em questão localiza-se em área de dunas. Com as constatações técnicas realizadas na área é possível afirmar que se trata de região inserida em corpo dunar em

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forma de cordões, que se encontra, contudo, descaracterizada em decorrência, principalmente, do processo de urbanização por que passam os municípios de Natal e Parnamirim (estrutura viária e expansão urbana, por exemplo)(...)Por estar localizada em área de duna, descaracterizada em parte, a área do empreendimento “Condomínio Buena Vista” constitui-se Área de Preservação Permanente, nos moldes da legislação ambiental vigente”. (fl. 3651)

Em sua sentença, a MM. Juíza chega a realizar algumas transcrições com o registro dos peritos de que a área do empreendimento corresponde à área de duna e conclui que, realmente, da leitura das conclusões técnicas transcritas, tem-se que a área do empreendimento versado é dunar (fl. 4321 da sentença).

A despeito desse reconhecimento, com base nas constatações das perícias, a Juíza destacou em sua sentença que não há no Plano Diretor do Município de Parnamirim qualquer vedação à construção na área onde se situa o empreendimento discutido.

A MM Juíza, de forma equivocada, sobrelevou a legislação urbanística do Município de Parnamirim, e desconsiderou a legislação ambiental de âmbito federal que considera DUNA com Área de Preservação Permanente – APP, onde só se admite construções em raras exceções relativas a casos de utilidade pública ou de interesse social, que não se coaduna com o empreendimento impugnado.

Ora, a legislação federal protege considera DUNA, seja ou não coberta ou não por vegetação nativa como Área de Preservação Permanente, (APP).

Com efeito, o art. 1º, § 1º, II da Lei 4.771/65 define Área de Preservação Permanente - APP nos seguintes termos:

Art. 1º (...)

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§1º (...)II- Área de preservação permanente: área protegida nos termos dos arts. 2º e 3º desta Lei, coberta ou não por vegetação nativa, com a função ambiental de preservar os recursos hídricos, a paisagem, a estabilidade geológica, a biodiversidade, o fluxo gênico e fauna e flora, proteger o solo e assegurar o bem-estar das populações humanas.

O Código Florestal refere-se à proteção das DUNAS tanto no art. 2º, “f” quanto no art. 3º, “b”.

O art. 2º, “f” tem a seguinte redação:

“Art. 2º. Consideram-se de preservação permanente, pelo só efeito desta Lei, as florestas e demais formas de vegetação natural situadas:(...)f) nas restingas, como fixadoras de dunas ou estabilizadoras de mangues.

O art. 3º, “b” possui a seguinte redação:

Art. 3º. Consideram-se, ainda, de preservação permanentes, quando assim declaradas por ato do Poder Público, as florestas e demais formas de vegetação natural destinadas:(...)b) a fixar dunas

No uso das competências conferidas pela Lei 6.938/81, do Decreto 99.274/90 e diante do disposto nas Leis 4.771/65 e 9.433/97, o Conselho Nacional do Meio Ambiente (CONAMA) na Resolução 303/2002, ao regulamentar os arts. 2º e 3º da Lei 4.771/65, no que concerne às Áreas de Preservação Permanente, deixou bem claro que a DUNA é Área de Preservação Permanente:

Art. 3º. Constitui Área de Preservação Permanente a área situada:(...)

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XI- em duna.

A importância das funções ecológicas realizadas pelas DUNAS foi reconhecida legalmente.

A própria Resolução 303/2002 do Conselho Nacional do Meio Ambiente (CONAMA) foi alterada pela Resolução CONAMA 241/2003 para incluir em seus consideranda o registro da importância das funções ambientais das DUNAS. A redação final ficou consignada nos seguintes termos:

Considerando a necessidade de regulamentar o art. 2o da Lei nº 4.771, de 15 de setembro de 1965, no que concerne às Áreas de Preservação Permanente;Considerando as responsabilidades assumidas pelo Brasil por força da Convenção da Biodiversidade, de 1992, da Convenção Ramsar, de 1971 e da Convenção de Washington, de 1940, bem como os compromissos derivados da Declaração do Rio de Janeiro, de 1992;Considerando a conveniência de regulamentar os arts. 2o e 3o da Lei no 4.771, de 15 de setembro de 1965, no que concerne às Áreas de Preservação Permanente; (considerando acrescentado pela Resolução n° 341/03)Considerando ser dever do Poder Público e dos particulares preservar a biodiversidade, notadamente a fl ora, a fauna, os recursos hídricos, as belezas naturais e o equilíbrio ecológico, evitando a poluição das águas, solo e ar, pressuposto intrínseco ao reconhecimento e exercício do direito de propriedade, nos termos dos arts. 5o , caput (direito à vida) e inciso XXIII (função social da propriedade), 170, VI, 186, II, e 225, todos da Constituição Federal, bem como do art. 1.299, do Código Civil, que obriga o proprietário e posseiro a respeitarem os regulamentos administrativos; (considerando acrescentado pela Resoluçãon° 341/03)Considerando a função fundamental das dunas na dinâmica da zona costeira, no controle dos processos

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erosivos e na formação e recarga de aqüíferos; (considerando acrescentado pela Resolução n° 341/03)Considerando a excepcional beleza cênica e paisagística das dunas, e a importância da manutenção dos seus atributos para o turismo sustentável; (considerando acrescentado pela Resolução n° 341/03)Considerando que as Áreas de Preservação Permanente e outros espaços territoriais especialmente protegidos, como instrumentos de relevante interesse ambiental, integram o desenvolvimento sustentável, objetivo das presentes e futuras gerações (...)

Não há o que tergiversar. A proteção das DUNAS é amplamente amparada pela legislação federal vigente. Necessário sobressair que a proteção estabelecida pelo Código Florestal não se restringe apenas à vegetação natural. O Código protege a DUNA independentemente de ser ou não vegetada. O art. 1º, § 1º, II da Lei 4.771/65, que define Área de Preservação Permanente como “área protegida nos termos dos arts. 2º e 3º desta Lei, coberta ou não por vegetação nativa” não pode ser simplesmente desprezado.

Tem-se, portanto, que independentemente de qualquer informação por parte da perícia sobre a existência prévia de vegetação fixadora de duna na área do empreendimento, o fato da área do empreendimento ser DUNA, por si só, significa dizer que é Área de Preservação Permanente (APP) nos termos do art. art. 1º, § 1º, II e dos arts. 2º, “f” e 3º “b” da Lei 4.771/65. Esse fato também, por si, impede qualquer tipo de construção no local, com raras exceções relativas a casos de utilidade pública ou de interesse social, que não se aplicam à situação em análise.

Vale destacar ainda que os elementos constantes nos autos originais demonstram que a área era vegetada. Constam nos autos, inclusive, fotografias realizadas por populares e encaminhadas ao Ministério Público, que registram a ocasião do desmatamento da área (fls. 53/62).

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Consta também nos autos um Relatório de Fiscalização do IBAMA, realizado pela Coordenadoria de Fiscalização Ambiental do Rio Grande do Norte (fl. 65) que constata que:

a área foi totalmente desmatada com os serviços feitos através de operação mecânica (tratores de esteira) e com os serviços de terraplanagem e nivelamento do terreno. Há fragmentos de vegetação nativa e plantadas com raízes. (...)(...)A área do empreendimento Buena Vista apresenta uma área desmatada de 10,8469 Ha e já com serviços de terraplanagem e início dos trabalhos de nivelamento dos lotes e com posto de venda o qual apresenta característica de vegetação litorânea e com solo latossolo amarelo distrófico, porem com as licenças acima identificadas.

É importante ressaltar que qualquer desmatamento da área teria de ser precedido de uma prévia autorização. O órgão ambiental estadual (IDEMA) concedeu a licença ambiental para instalação do empreendimento sem a prévia exigência da apresentação por parte do empreendedor da autorização de desmate. No Relatório de Fiscalização conta que “não foi apresentada autorização de desmate da área licenciada”

O empreendedor não poderia ter desmatado a área do empreendimento sem prévia autorização do órgão ambiental competente.

Também não poderia ser desconsiderado pela MM. Juíza que as DUNAS integram os ecossistemas típicos da Zona Costeira, considerada como Patrimônio Nacional pela Constituição Federal de 1988 (art. 225, § 4º).

A Lei 7.661/88, em seu art. 3º, I determina que os usos e atividades na Zona Costeira devem dar prioridade à conservação e proteção entre outros, dos seguintes bens:

recursos naturais, renováveis e não renováveis; recifes, parcéis e bancos de algas; ilhas costeiras e oceânicas; sistemas fluviais, estuarinos e lagunares, baías e

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enseadas; praias; promontórios, costões e grutas marinhas; restingas e dunas; florestas litorâneas, manguezais e pradarias submersas;

Além da proteção da legislação federal para a área de DUNA, a Lei Estadual 8.426/2003 também reconhece a importância das dunas (fl. 526), considerando-as, em seu art. 4º, IV como Áreas de Preservação Permanente (APP).

Na decisão nos autos do processo 2009/0051712-6, ajuizada pelo Ministério Público Federal para suspender o prosseguimento das obras do empreendimento imobiliário Residencial Casas do Morro, em São Luiz do Maranhão, situado em área de preservação permanente, na forma do art. 2º, “e” da Lei 4.771/65 (Código Florestal), o Ministro Cesar Asfor Rocha, Presidente, ao deferir o pedido enfatizou, com propriedade, o entendimento do STJ, favorável ao meio ambiente nessas questões:

“Observo que, em situações semelhantes, o Superior Tribunal de Justiça e o Supremo Tribunal Federal têm buscado proteger o meio ambiente em detrimento de interesses meramente particulares, vinculados ao livre exercício da atividade econômica. Confira-se do STJ o AgRg na SS n. 693/DF, publicado em 20.9.1999, Corte Especial, da relatoria do em. Ministro Antônio de Pádua Ribeiro, e do STF o AgRg na STA b, 112-7/OR, publicado em 4.4.2008, e o AgRg na STA n. 118-6/RJ, publicado em 2118-6/RJ, publicado em 29.2.2008, ambos da relatoria da E. Ministra Ellen Gracie”

10- DA INOBSERVÂNCIA PELA MM JUÍZA A QUO DA CONFIRMAÇÃO DE QUE A ÁREA DO EMPREENDIMENTO ESTÁ NA ÁREA DE PROTEÇÃO AMBIENTAL DO RIO PITIMBU NOS TERMOS DO ART. 3º, II DA LEI ESTADUAL 8.426/03 ( DENTRO DA COTA 40 M).

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Além da área do empreendimento ser DUNA, o Condomínio está inserido na faixa de proteção ambiental estabelecida pela legislação estadual para o Rio Pitimbu, onde a construção é vedada.

O art. 3º da referida Lei estabelece uma Faixa de Proteção Ambiental do Rio Pitimbu, nos seguintes termos:

Art. 3º Fica estabelecida a Faixa de Proteção Ambiental do Rio Pitimbu, de suas nascentes e de seus afluentes, compreendendo as margens direita e esquerda, conforme Mapa (Anexo I) subdividida nos trechos abaixo:I- Trecho I: tem origem na nascente do Rio Pitimbu referenciada no P-1 de coordenadas UTM aproximadas E= 23.745m e N=9.341.578m, seguindo daí uma faixa ao longo de cada margem de dimensão de 300 (trezentos) metros, medidos horizontalmente, a partir do leito maior sazonal, percorrendo todo o trecho do rio, seus afluentes e o entorno das nascentes, até chegada ao p-2 de coordenadas E=240.333m e N=9.343.559m. II- Trecho II: tem origem no já mencionado ponto P- 2, delimitando-se por suas faixas de larguras variáveis ao longo das duas margens do Rio Pitimbu, definidas pela cota de 40 metros, identificada na carta básica da escala de 1100.000 elaborada ela SUDENE/Diretoria do Serviço Geográfico do Exército, Folha Natal SB 25-V-C-V e as cartas básicas na escala 12000 da SEPLAN/RN, folhas 16-68-18 e 24m 16-76-05/06/10/11/15/16 e 22, 16/69/13 a 15/19 a 21, 16-77-01 a 04/09 e 10/16 18/23 e 24, 16/85/05 e 06/11 e 12, 16-86-01 e 07.§1º As duas faixas descritas no inciso II deste artigo se estendem, à direita, até o ponto P-3 de coordenadas E=254.449m e N= 9.343.900 e, à esquerda, até o ponto P-4 de coordenadas E=259.336m e N= 9.344.886m. §2º Fica estabelecida a largura mínima de 300 (trezentos) metros, para cada margem, medidos horizontalmente, a partir do leito maior sazonal, para as faixas de que trata o inciso II deste artigo.

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Sobre as Áreas de Preservação Permanente, APPs, a Lei Estadual 8.426/2003 discorreu no art. 4º, como se observa:

Art. 4º Para efeito desta Lei, a Faixa de que trata o art. 3º subdivide-se nas seguintes áreas:I. Áreas de Preservação PermanenteII. Áreas Passíveis de Uso e Ocupação

§1º As Áreas de Preservação Permanente destinam-se, prioritariamente, à criação de unidade de conservação e aos usos estabelecidos em plano de manejo, compreendendo:I- a vegetação ciliar, considerando-se uma faixa

mínima de 100 (cem ) metros para cada margem,II- as áreas inundáveis situadas nas margens direita e

esquerda do Rio Pitimbu em toda a sua extensão;III- os remanescentes da Mata Atlântica e dos seus

ecossistemas associados;IV- as dunas e demais unidades ambientais previstas

na legislação em vigor.

Com base na utilização da carta topográfica na escala 1:2000 da SEPLAN/RN, que é a referência da Lei Estadual 8.426/03, a área do empreendimento, além de ser caracterizada como dunar, encontra-se inserida na Faixa de Proteção Ambiental do Rio Pitimbu, caracterizada como Trecho II do art. 3º da referida Lei Estadual, delimitada no Mapa da Lei, ou seja abaixo da cota de 40metros, como se observa na resposta do assistente do Ministério Público ao questionamento da MM. Juíza:

3) A área do empreendimento está ou não dentro da área de proteção ambiental do Rio Pitimbu, nos termos do artigo 3º da Lei Estadual 8.426/2003?R) SIM. O empreendimento situa-se em área de dunas, conforme análise fundamentada apresentada no tópico III. Desta forma, esta área está classificada como área de preservação permanente, nos termos Lei Estadual no. 8.426/2003, que estabelece em seu Artigo 4º, parágrafo 1º, inciso IV “as dunas como área de preservação permanente na Faixa de Proteção

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Ambiental do rio Pitimbu”, combinado com o Artigo 3º, inciso II (abaixo da cota de 40m) e Artigo 3º, inciso II, parágrafo 2º (faixa mínima de 300m).

Vale salientar que os assistentes do Ministério Público especificaram todas as cotas da área de influência do empreendimento, como se observa na figura 4B de fl. 4152 do trabalho dos assistentes. Explicaram ainda que:

Na área do empreendimento e seu entorno a carta topográfica expressa um relevo balizado a sudeste pela depressão à qual se associa o rio Pitimbu, cujo leito menor acha-se inserido abaixo da curva de nível de 8 metros; o leito maior (sazonal) não está nítido nesta escala, porém obrigatoriamente encontra-se abaixo da curva de nível de 10 metros, tendo em vista que a partir daí as curvas de nível denotam a grande declividade associada à elevação arenosa que margeia este rio ao longo de todo o trecho.(...)O ângulo máximo que essa declividade assume corresponde a uma pendente de: 1 1 (ou seja, em 1 metro horizontal tem-se um desnível de 1 metro). No segmento que margeia o rio, a partir da curva de nível de 30 metros, alternam-se elevações (de 38,6 a 42,6 metros) e depressões fechadas ovaladas (com cotas entre 20,8 a 25,6 metros). Essas depressões estão caracterizadas no interior da gleba e alternam-se a elevações, tanto a sudeste – sudoeste (fora da área do condomínio) quanto na porção nordeste (no interior do condomínio).

Nas proximidades da rodovia BR-101, essa topografia foi modificada pelas obras de cortes e aterros durante a fase de sua implementação desde a via antiga (pista de mão dupla), sendo que distribuição das curvas de nível refletem a condição similar à atual (visto que a pista dupla foi implementada no início da década de 1970). No segmento a oeste da rodovia o padrão de cristas e vales se repete. A partir da porção centro-leste da carta, balizado pela curva de nível de 36 metros (aproximadamente), o

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relevo é suavizado (pendentes da ordem de 10:1 ou inferiores).

As variações topográficas descritas acima serão integradas às informações obtidas da análise dos produtos de sensores remotos disponíveis e às observações de campo; desta forma, uma análise geomorfológica conclusiva será contemplada em tópico subsequente (b.2.4).

A empresa que realizou a segunda perícia, ao responder a questão número 3 da MM. Juíza, omitiu em seu laudo (fls. 4034/4035) a constatação de que o empreendimento situa-se dentro da Faixa de Proteção Ambiental do Rio Pitimbu (Trecho II) nos termos do art. 3º, II da Lei 8.426/2003.

Na resposta à MM. Juíza, o Perito sequer mencionou as cotas do empreendimento. Ocorre que as COTAS SÃO ESENCIAIS PARA MEDIÇÃO DA FAIXA DE PROTEÇÃO AMBIENTAL DO RIO PITIMBU, que não diz respeito apenas à metragem da distância do Rio.

Todavia, mesmo sem realizar a referência das COTAS do empreendimento na questão mencionada, na figura de fl. 4053, o próprio Perito demonstrou que a única área do empreendimento que está com a cota acima de 40 é a Estação 600. Tem-se, portanto, que o próprio perito demonstrou que o empreendimento encontra-se na Faixa de Proteção do Rio Pitimbu!

Desse modo, encontra-se extremamente comprovado que a área do empreendimento situa-se tanto dentro do Trecho II do art. 3º da Lei 8.426/03, ou seja dentro da cota 40, quanto em área de duna, razão pela qual a aera do empreendimento é Área de Preservação Permanente, nos termos, também, do art. 4º, IV da referida Lei.

Com essas considerações não tem como se negar que o empreendimento Buena Vista encontra-se inserido na Faixa de Proteção do Rio Pitimbu, onde não se admite construção.

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11- DO DESRESPEITO DA SENTENÇA À HIERARQUIA DAS LEIS AMBIENTAIS

Em sua sentença, a MM. Magistrada transcreve trechos das perícias realizadas e reconhece que as conclusões técnicas demonstram que a área do empreendimento é de duna, como se observa:

“E, da leitura das conclusões técnicas acima transcritas, tem-se que a área do empreendimento versado está situado em área dunar descaracterizada pela expansão urbana” (fl. 4321).

Apesar do reconhecimento de que a área do empreendimento é de DUNA, a MM Juíza ressalta que não há no Plano Diretor do Município de Parnamirim qualquer vedação à construção na área onde se situa o empreendimento discutido. Embora o Município de Parnamirim não tenha autorizado nenhuma construção no local ( existe até mesmo um movimento no Município contrário à construção do Condomínio, como se observa (às fls. 72 e 102) esse equivocado argumento serviu para que os pedidos da ação civil pública fossem julgados improcedentes.

No caso, a sentença desconsiderou as regras de competência ambiental determinada pela Constituição Federal, que impede que o Município legisle de forma incompatível com as normas de proteção ambiental estabelecidas pela União Federal. Assim, as regras do Plano Diretor do Município de Parnamirim não podem ser consideradas superiores às normas mínimas de proteção ambiental - que incluem a proteção integral das DUNAS – estabelecidas pelas normas federais.

Com efeito, a Constituição Federal, estabelecendo o princípio federativo, adotou a repartição vertical de competência e prescreveu em seu art 24:

Art. 24. Compete à União, aos Estados e ao Distrito Federal legislar concorrentemente sobre:I- direito tributário, financeiro, penitenciário, econômico e urbanístico;(...)

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VI- florestas, caça, pesca, fauna, conservação da natureza, defesa do solo e dos recursos naturais, proteção do meio ambiente e controle da poluição;VII- proteção ao patrimônio histórico, cultural, artístico, turístico e paisagístico§1º No âmbito da legislação concorrente, a competência da União limitar-se-á a estabelecer normas gerais. (...)

A Constituição foi muito clara, não deixando margem a qualquer dúvida doutrinária de que em matéria de conservação da natureza, a União é a responsável por estabelecer normas gerais.

O art. 30 da Constituição Federal assim preceitua:

Art. 30. Compete aos Municípios:I- legislar sobre assuntos de interesse local;(...)VIII promover, no que couber, adequado ordenamento territorial, mediante planejamento e controle do uso, do parcelamento e da ocupação do solo urbano.

Considerando a redação do dispositivo constitucional, que não dispôs, expressamente, que o Município pode legislar sobre Meio Ambiente, muitas dúvidas doutrinárias surgiram acerca dessa possibilidade. Alguns doutrinadores chegaram a defender que o Município não tinha competência para legislar sobre meio ambiente10.

Atualmente, há, aparentemente, um consenso no sentido de que o Município pode legislar sobre matéria ambiental11; contanto que sejam atendidas as normas editadas pela União e pelos Estados. Nesse sentido o Ministro JOSÉ AUGUSTO DELGADO esclarece:

no âmbito da legislação concorrente (ou vertical) há uma hierarquia de normas: a lei federal tem

10 nesse sentido: MANOEL GONÇALVES FERREIRA FILHO; ELLEN DE CASTRO QUINTANILHA, LEONARDO GRECO.11 nesse sentido: PAULO AFFONSO LEME MACHADO, JOSÉ NILO DE CASTRO, TOSHIO MUKAI, ELIVAL DA SILVA RAMOS, FERNANDA DIAS MENEZES DE ALMEIDA, JOSÉ AUGUSTO DELGADO

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prevalência sobre a estadual e municipal, e a estadual sobre a municipal12

Uma lei municipal não pode diminuir a proteção de uma lei federal ou estadual, quando a matéria é de competência da União ou do Estado. Deve haver, portanto, uma coerência e compatibilidade entre as leis municipais e estaduais e federais em matéria de competência comum. Nesse sentido, afirmou PONTES DE MIRANDA13:

Na esfera da técnica de repartição vertical, invertem-se, pois, os termos da equação do federalismo clássico: a relação entre lei federal e lei estadual deixa de ser uma questão de competência, que, em tese, é comum à União e aos Estados, para deduzir-se a uma questão de hierarquia de normas.

Com essas considerações, tem-se que o Município pode legislar sobre matéria ambiental, desde que não altere ou diminua a proteção da legislação federal ou estadual. O Município pode até legislar para garantir a proteção maior do que estabelecido na lei ambiental de hierarquia superior.

No que diz respeito à promoção do adequado ordenamento territorial, mencionado no art. 30, VIII, deve ser levado em conta, ainda o art. 182 da Constituição Federal que assim estabelece:

Art. 182. A política de desenvolvimento urbano, executada pelo Poder Público municipal, conforme diretrizes gerais fixadas em lei, tem por objetivo ordenar o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e garantir o bem-estar de seus habitantes.

A Lei que fixa as diretrizes gerais do desenvolvimento urbano, mencionada no preceito constitucional acima, é a Lei Federal 10.257/2001, que regulamenta os arts. 182 e 183 da Constituição Federal e

12 citação realizada por Vladimir Passos de Freitas in A Constituição Federal e a efetividades das Normas Ambientais, 3ª ed, ver., atual. e ampl. – SP: Editora Revista dos Tribunais, 2005, p. 62.13 citado por TOSHIO MUKAI em sua obra Direito Ambiental Sistematizado, 4ª ed. RJ; Forense Universitária, 2002, p. 17

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estabelece diretrizes gerais da Política Urbana. Referida Lei é denominada, em seu art. 1º como Estatuto da Cidade.

O Estatuto da Cidade arrola, em seu art. 2º, as diretrizes gerais da política urbana e no art. 4º os instrumentos que devem ser utilizados para o desenvolvimento da política urbana. Entre as diretrizes e instrumentos, merecem ser transcritos os seguintes preceitos:

Art. 2º. A política urbana tem por objetivo ordenar o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e da propriedade urbana, mediante as seguintes diretrizes gerais:(...)

VI- ordenação e controle do uso do solo, de forma a evitar:

a) a utilização inadequada dos imóveis urbanos;b) a proximidade de usos incompatíveis ou

inconvenientes ou inconvenientes;c) o parcelamento do solo, a edificação ou o uso

excessivos ou inadequados em relação à infra-estrutura urbana;

d) a instalação de empreendimentos ou atividades que possam funcionar como pólos geradores de tráfego, sem a previsão da infra-estrutura correspondente;

e) a retenção especulativa de imóvel urbano, que resulte na sua subutilização ou não utilização;

f) a deterioração das áreas urbanizadas;g) a poluição e a degradação ambiental.(...)

XII- proteção, preservação e recuperação do meio ambiente natural e construído, do patrimônio cultural, histórico, artístico, paisagístico e arqueológico.(...).

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Como se pode constatar, a questão ambiental é inseparável da questão urbanística. Esta não pode ser vista de modo isolado, estanque. O Estatuto da Cidade, reconhecendo e valorizando essa confluência entre as matérias, estabeleceu que a proteção do meio ambiente é uma diretriz da política urbana.

Não se pode descurar, outrossim, o que diz o art. 23 da Constituição Federal, que assim dispõe sobre a competência comum, nos seguintes termos:

Art. 23. É competência comum da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios: (...)III- proteger os documentos, as obras e outros bens de valor histórico, artístico e cultural, os monumentos, as paisagens naturais notáveis e os sítios arqueológicos;(...)VI- proteger o meio ambiente e combater a poluição em qualquer de suas formas.

A competência do art. 23, conforme transcrito, não diz respeito à competência legislativa e sim à instrumental para aplicação das leis ambientais existentes. As atribuições são, portanto, de natureza administrativa e, em regra, revelam-se através dos aos administrativos, o que reforça o argumento de que o Município de Parnamirim também tem o dever de proteger o meio ambiente.

Impera registrar que o Município de Parnamirim NÃO concedeu nenhuma licença ou autorização para construir no local. A sentença antecipou uma possibilidade calcada no ordenamento urbanístico do Município que sequer foi aventada nos autos. Ao contrário, conforme se observa às fls. 76 e 102, há um movimento grande no Município de Parnamirim, que foi encampada pela Câmara Municipal, contra a construção do empreendimento!

12- DO PREQUESTIONAMENTO DA MATÉRIA FEDERAL E CONSTITUCIONAL

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Com vistas a firmar o prequestionamento para necessidade de um eventual recurso especial e extraordinário, registra-se que a lide em apreço versa também sobre matéria da legislação federal e constitucional.

Assim, o não acolhimento da pretensão formulada no presente recurso de apelação contraria os seguintes dispositivos da Constituição Federal e da Legislação Federal:

1) os preceitos de proteção ambiental assegurados na Constituição Federal de 1988, em especial os arts. 225 caput, e seus § 1º, I, III e IV; § 3º e § 4º;

2) os preceitos da CF que determinam a atuação do Município em matéria ambiental, especialmente, os arts. 24, VI, §1º e o art. 23, III e VI;

3) o preceito do art. 5º LV da CF, tendo em vista que não foi assegurado ao Ministério Público, na condição de litigante o direito de produção de provas no processo judicial e art. 5º, XII, que proíbe prova ilícita;

4) a Lei Federal 6.938/81, que dispõe sobre a Política Nacional do Meio Ambiente, em especial os seus art. 9º, III e art. 14

5) a Lei Federal 4.771/65, que dispõe sobre o Código Florestal, principalmente o seu art. 1º, § 1º, II que define como Área de Preservação Permanente a “área protegida nos termos dos arts. 2º e 3º desta Lei, coberta ou não por vegetação nativa, com a função ambiental de preservar os recursos hídricos, a paisagem, a estabilidade geológica, a biodiversidade, o fluxo gênico de fauna e flora, proteger o solo e assegurar o bem-estar das populações humanas”, além do art. 2º, “f” e do art. 3º, “b”;

6) a Resolução do CONAMA 303/2002, que dispõe sobre as definições e limites das áreas de preservação permanente e regulamenta os arts. 2º e 3º da Lei 4.771/65 e que no art. 3º, XI diz que constitui Área de Preservação Permanente a área situada em duna;

7) o art. 2º, XV da Resolução do CONAMA 01/86, que trata da realização do Estudo de Impacto Ambiental – EIA;

8) a Lei Federal 7.661/88, que dispõe sobre o Plano de Gerenciamento Costeiro e que em seu art. 3º, I inclui as dunas como recursos naturais pertencentes à Zona Costeira e em seu art. 7º estabelece que

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a degradação dos ecossistemas, do patrimônio e dos recursos naturais da Zona Costeira implicará ao agente a obrigação de reparar o dano causado e a sujeição às penalidades previstas no art. 14 da Lei 6.938/81;

9) Decreto 5.300/2004, que regulamenta a Lei de Gerenciamento Costeiro, define município costeiro, e, em seu at. 5º, IX, estabelece como princípios fundamentais da gestão da zona costeira, além daqueles estabelecidos na Política Nacional de Meio Ambiente, na Política Nacional para os Recursos do Mar e na Política Nacional de Recursos Hídricos, a preservação, conservação e controle de áreas que sejam representativas dos ecossistemas da zona costeira, com recuperação e reabilitação das áreas degradadas ou descaracterizadas;

10) os arts. 331, §3º, art. 332, 420 e 431-B do Código de Processo Civil, que dizem respeito à produção de prova e também à perícia, bem como os julgados do STJ, nos termos do art. 105, III, “c” da CF.

II- DOS PEDIDOS

Com essas considerações, requer o Ministério Público o provimento do presente recurso para determinar:

Ao IDEMA que:

1. anule as Licenças concedidas para o empreendimento Condomínio Residencial Buena Vista, em nome da empresa Brasil Empreendimentos Imobiliários e Serviços Ltda;

2. abstenha-se de conceder qualquer licença ambiental para a construção do empreendimento Condomínio Buena Vista ou para outra construção ou atividade no local - em Nova Parnamirim, às margens da BR -101, nas proximidades do Km 100, no Município de Parnamirim (área definida no memorial descritivo de fl. 567 dos autos).

3. que nos pedidos de licenciamento para construções ou para a realização de atividades potencialmente poluidoras em áreas inseridas na Bacia Hidrográfica do Rio Pitimbu, passíveis de uso e ocupação nos termos do §2º do art. 4º da Lei Estadual 8.426/2003, seja exigida do empreendedor a apresentação de Estudo Prévio de Impacto Ambiental e seja dada ampla publicidade ao referido EIA/RIMA;

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4. no prazo de 15 dias, levando em consideração os impactos negativos arrolados na perícia realizada pela equipe de peritos do IBAMA/Brasília (fls. 3642/3664), realizar um Plano de Recuperação de Área Degradada, PRAD para ser executado pelo empreendedor ora demandado, através de um Termo de Referência, com vistas a restabelecer as características e as funções das dunas desmontadas e desmatadas na área do empreendimento em questão.

À empresa apelada que: 1. realize a recuperação das áreas degradadas, de modo a recuperar todos os

impactos negativos arrolados na perícia realizada pela equipe de peritos do IBAMA/Brasília (de fls. 3642/3664), realizando todas as obrigações constantes no Termo de Referência impostas pelo IDEMA relativas ao Plano de Recuperação de Área Degradada;

2. abstenha-se de realizar qualquer construção ou atividade em Área de Preservação Permanente ou Faixa de Proteção Ambiental do Rio Pitimbu, definida nos termos do art. 4º da Lei Estadual 8.426/2003, em especial, na área localizada em Nova Parnamirim, às margens da BR -101, nas proximidades do Km 100, no Município de Parnamirim (área definida no memorial descritivo de fl. 567 dos autos).

Em caso de não atendimento dos pedidos acima arrolados, que seja anulada a r. sentença de fls. 4312/ 4324 para que o processo retorne ao juízo de primeira instância com vistas a dar prosseguimento à fase de instrução com a designação de audiência de instrução e julgamento. Neste caso, como antecipação da tutela da pretensão recursal: que seja determinado aos apelados a proibição de autorizar e/ou de realizar quaisquer obras e/ ou outras edificações no local do empreendimento “Buena Vista” até o julgamento em definitivo da ação civil pública originária.

Termos em que, pede procedência. Parnamirim, 09 de novembro de 2010.

GILKA DA MATA DIAS BEATRIZ AZEVEDO DE OLIVEIRA 45ª Promotora de Justiça Promotora Substituta

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