EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ DE DIREITO DA...

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EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ DE DIREITO DA VARA CÍVEL DA COMARCA DE CAMPO MOURÃO – PR O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO PARANÁ, por intermédio de seu agente, que esta subscreve, com fundamento nos artigos 37, caput e parágrafo 4º, 127 e129, inciso III, da Constituição Federal; no artigo 1º, inciso IV da Lei Federal nº 7.347/85; no artigo 25, inciso IV, alínea “a” e “b” da Lei nº 8.625/93; e na Lei nº 8.429/92, além de outros dispositivos legais aplicáveis à espécie, vem, perante este r. Juízo, propor Ação Civil Pública De Responsabilidade Pela Prática De Atos De Improbidade Administrativa C/C. Ação De Declaração De Nulidade De Ato Administrativo, CUMULADO COM PEDIDO LIMINAR DE AFASTAMENTO DO CARGO, sob o rito da Lei 8.429/92 c/c Lei 7.347/85 e subsidiariamente o rito comum em face de: CARLOS AUGUSTO GARCIA, brasileiro, casado, coordenador geral de governo do Município de Campo Mourão, portador da cédula de identidade RG nº 3373919-2, inscrito no CPF nº 490.568.329-67, residente e domiciliado na Rua Bonifácio Paes Carneiro, nº 129, jardim Capricórnio, Campo Mourão/PR. REGINA MASSARETTO BRONZEL DUBAY, brasileira, casada, Prefeita do Município de Campo Mourão, portadora da cédula de identidade RG nº 3.159.994-6/SSP-PR, inscrita no CPF nº 027.030.269-78, residente e domiciliada na Avenida Irmãos Pereira, nº 1750, em Campo Mourão/PR.

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EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ DE DIREITO DA VARA CÍVEL

DA COMARCA DE CAMPO MOURÃO – PR

O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO PARANÁ, por

intermédio de seu agente, que esta subscreve, com fundamento nos artigos 37,

caput e parágrafo 4º, 127 e129, inciso III, da Constituição Federal; no artigo 1º,

inciso IV da Lei Federal nº 7.347/85; no artigo 25, inciso IV, alínea “a” e “b” da

Lei nº 8.625/93; e na Lei nº 8.429/92, além de outros dispositivos legais

aplicáveis à espécie, vem, perante este r. Juízo, propor

Ação Civil Pública De Responsabilidade Pela Prática

De Atos De Improbidade Administrativa C/C. Ação De Declaração De

Nulidade De Ato Administrativo, CUMULADO COM PEDIDO LIMINAR DE

AFASTAMENTO DO CARGO, sob o rito da Lei 8.429/92 c/c Lei 7.347/85 e

subsidiariamente o rito comum em face de:

CARLOS AUGUSTO GARCIA, brasileiro, casado,

coordenador geral de governo do Município de Campo Mourão, portador da

cédula de identidade RG nº 3373919-2, inscrito no CPF nº 490.568.329-67,

residente e domiciliado na Rua Bonifácio Paes Carneiro, nº 129, jardim

Capricórnio, Campo Mourão/PR.

REGINA MASSARETTO BRONZEL DUBAY, brasileira,

casada, Prefeita do Município de Campo Mourão, portadora da cédula de

identidade RG nº 3.159.994-6/SSP-PR, inscrita no CPF nº 027.030.269-78,

residente e domiciliada na Avenida Irmãos Pereira, nº 1750, em Campo

Mourão/PR.

MUNICÍPIO DE CAMPO MOURÃO, pessoa jurídica de

direito público interno, sediado na Prefeitura, Rua Brasil, 1487, Campo

Mourão/PR, representado legalmente pela Sra. Prefeita Regina Massareto

Bronzel Dubay.

I – DOS FATOS

No mês de abril de 2015, Marton Ávila Tezelli e Caroline

Tonet Tezelli, sócios da empresa BNY Maringá Administradora De Imóveis Ltda

Me, foram surpreendidos com a noticia advinda de maneira informal por

terceiros de que todas as suas propriedades foram objeto de decretos de

declaração de utilidade pública, para fins de desapropriação, por parte da

Prefeitura Municipal de Campo Mourão.

Em 17 de abril de 2015, em consulta ao diário oficial do

município, edição 1811, constataram de fato que haviam sido declarados como

utilidade pública três imóveis da empresa BNY. Essas declarações constaram

nos Decretos nº 6577, nº 6578, e nº 6579.

A empresa BNY visando tomar ciência dos detalhes das

referidas desapropriações, em 28 de abril de 2015, protocolizou na prefeitura

os pedidos de informação nº 3696/2015, 3697/2015 e 3698/2015. No entanto,

os pedidos permaneceram parados sem qualquer análise na Coordenação

Geral (COGEG) por aproximadamente quatro meses1.

Diante disso, é possível concluir que os decretos de

utilidade pública foram instituídos tão somente para criar dificuldades e

constrangimentos à empresa e seus familiares.

Isto se evidencia em razão de diversos motivos.

1 O que infringe a Lei Orgânica do Município e a Lei da Transparência, conforme protocolo de

fls. 132/133/134.

Primeiro, a rivalidade política entre a atual gestora do

Município, Regina Dubay e o coordenador Geral Carlos Garcia em face de

Tauillo Tezelli, ex-prefeito deste Município. A empresa BNY é de propriedade de

familiares do ex-prefeito Tauillo Tezelli, nora e filho, o qual disputou a última

eleição contra a atual prefeita. Além disso faz movimento de oposição a ela.

Os familiares do ex-prefeito, ainda, são proprietários do

site de notícias CRN (www.crn1.com.br), e das Rádios Colméia AM e Rádio T

FM, que jornalisticamente noticiam fatos a respeito da atual gestão municipal,

em desagrado a Prefeita. Como inclusive o recente “caso do mensalinho”, pelo

qual a atual Prefeita responde ação de improbidade, e alguns de seus

servidores foram presos em flagrante pelo GAECO.

Em segundo lugar, foram colhidos depoimentos nesta

Promotoria de Justiça, que demonstram claramente a motivação de

perseguição como fundamento para a confecção dos referidos decretos.

A testemunha Romullo Aguiar (fls.168) relatou que o atual

Procurador geral do Município, Márcio Berbet, questionou-o se os amigos dele

– referindo-se aos filhos do ex-prefeito – estariam muito bravos com eles

(gestores da Prefeitura). Romullo disse que não sabia de nada. Em seguida

questionou o motivo da pergunta. Márcio disse que era em razão do decreto e

futura desapropriação dos terrenos da família, e ainda afirmou que as

declarações de utilidade pública foram uma maneira de retaliação pelo

conteúdo jornalístico publicado pelo site . Disse ainda que a avaliação sobre os

bens quem tinha feito foi o próprio Município e que assim os familiares do ex-

prefeito receberiam, em caso de desapropriação, um valor a menor do que o de

mercado.

Outrossim, o jornalista Aldery Ribeiro (fls. 170) também

prestou depoimento no mesmo sentido. Disse ter notado o caráter de

perseguição política e pessoal quanto a confecção dos decretos.

Também foi ouvido na Promotoria o agricultor Renanceses

Salvadori (fls. 172), o qual disse que Laércio Dubay, marido da atual Prefeita,

lhe disse algo a respeito dos decretos em tom de ironia.

Em terceiro lugar e o mais grave: as três declarações de

utilidade pública foram feitas de uma só vez, relacionadas a imóveis situados

em locais distantes uns dos outros, para finalidades aparentemente diversas,

mas coincidentemente recaindo sobre os mesmos proprietários. Ainda, no

procedimento a motivação da declaração só apareceu no decreto de

declaração de utilidade pública. No decorrer do procedimento não houve

qualquer apontamento sobre a necessidade dos imóveis, tão pouco menção

por qualquer órgão da Prefeitura de Projetos em andamento que justificariam a

desapropriação. Sem levar em conta que o Município possui inúmeros imóveis

disponíveis em areais institucionais de loteamentos nos últimos anos

aprovados. (fls. 173/174);

Chama atenção, que em seu depoimento na Promotoria de

Justiça o Coordenador-Geral do Município Carlos Garcia (fls. 173/174) disse

que foi pessoalmente escolher os terrenos. Este comportamento não pode ser

considerado normal em uma Prefeitura de Município com aproximadamente

100 mil habitantes. O próprio Coordenador Geral sair em campo procurando

terrenos para desapropriar. O mais adequado, com certeza, seria designar uma

equipe técnica para tal escolha, baseando-se na real necessidade da

desapropriação do terreno para o Município. Estranha-se, muito que para todos

os projetos alegados para quais os terrenos seriam utilizados, estes até o

momento foram os únicos que foram declarados de utilidade pública.

Os três decretos foram expedidos no dia 15 de abril de

2015, na mesma data, como se evidencia pela cópia do diário oficial publicado

no dia 17 de abril de 2015 (05-06). Ou seja, três decretos desapropriatórios

com motivos distintos mas que recaíram sobre propriedade de uma mesma

pessoa. Pergunta-se por que só esses três?

E mais, em nenhum desses casos foi efetuada

comunicação prévia aos proprietários dos terrenos desapropriados. Veja-se

que, nos casos aqui narrados o nome dos proprietários não constaram nos

decretos de declaração de utilidade pública, como o Município normalmente

faz. Como demonstra o decreto 6671/2015, que menciona o proprietário.2

Mas não é só: a edição do diário oficial em que os decretos

foram publicados, estranhamente, não se encontrava disponível para consulta

no site da prefeitura, ao contrário também das demais edições, que podiam ser

acessados normalmente. Isso conforme comprova Escritura Pública De Ata

Notarial em anexo, lavrada em cartório da Comarca de Campo Mourão – PR,

Distrito de Piquirivaí em 28/04/2015 e registrada no livro 134-N, às folhas

117/119.

Ademais, importante ressaltar que as três propriedades

não são vizinhas, nem sequer próximas. Elas se encontram a quilômetros de

distância umas das outras: uma está localizada na saída para Maringá, outra

na saída para Goioerê e a terceira na saída para Iretama. O único ponto em

comum entre elas é serem de propriedade de familiares do ex-prefeito.

Em que pese haver divergência política, jamais pode-se se

aceitar, em um Estado Democrático de Direito, a utilização da máquina pública

2 Art. 1o Fica declarado de utilidade pública, para fins de desapropriação, para prolongamentoda Rua Uirapu, o Lote no 17-B, localizado na quadra no 11 da Vila Teixeira, Município eComarca de Campo Mourão, Estado do Paraná, com área de 564,77 m2 , de propriedade deMarcos Roberto Flores Betini, com os limites e confrontações constantes da Matrícula no32.706, do Registro de Imóveis 2o Ofício de Campo Mourão.

e prerrogativas inerentes de cargos públicos para perseguição particular e

política.

A Prefeita Regina Dubay assinou os decretos, tomando

ciência de todo o procedimento, e não tomou qualquer providência para evitar a

ilegalidade. Pelo contrário, mesmo sabendo do seu conteúdo e o desiderato de

Carlos Garcia, coordenador geral do Município quanto a desapropriação,

chancelou o ato de perseguição.

Portanto, os requeridos Carlos Augusto Garcia e Regina

Massaretto Bronzel Dubay em conluio, aproveitando-se das atribuições

inerentes aos seus cargos, cometeram atos de improbidade administrativa que

importaram em ofensa aos princípios que regem a Administração Pública, pois

agiram sem autorização e em desacordo com determinação legal e

regulamentar, como se verá adiante.

II – DA FUNDAMENTAÇÃO JURÍDICA

1. DA IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA

A Administração Pública, seja ela municipal, estadual ou

federal, é regida por um sistema jurídico diferenciado, o qual encontra-se

fundado e estruturado por princípios constitucionais e infraconstitucionais que

lhe inferem um caráter peculiar.

Destaca-se, dentre outros, o princípio da moralidade, da

legalidade, da impessoalidade, razoabilidade, da finalidade e da eficiência, que

devem ser primados e obedecidos, obrigatoriamente, pelos agentes que se

encontram às rédeas da Administração Pública.

Não só os princípios constitucionais estabelecem as regras de

conduta dos agentes públicos. Consoante com estes, diversas são as regras e

leis que estabelecem o procedere do administrador público no exercício do seu

poder delegado pelo povo.

O desrespeito e o descumprimento dos princípios que norteiam

a Administração, bem como das regras estabelecidas pela lei brasileira

constitui em grave violação ao tênue equilíbrio legal que separa a finalidade

pública da finalidade particular.

Tais atos, quando verificados, implicam na ocorrência da

improbidade administrativa, ou seja, a execução de ato contrário às regras de

probidade sujeitas aos princípios próprios da administração pública, bem como

das regras destas derivadas.

A Constituição Federal, amparada da legislação pátria,

estabelece em seu artigo 37, § 4º, que "os atos de improbidade administrativa

importarão a suspensão dos direitos políticos, da perda da função pública, a

indisponibilidade dos bens e o ressarcimento ao erário, na forma e gradação

previstas em lei, sem prejuízo da ação penal cabível".

Todavia, como o citado preceito constitucional é norma de

eficácia limitada, só passou a produzir efeitos, ter aplicabilidade plena, com o

surgimento da Lei nº 8429/92, que definiu os atos de improbidade

administrativa, classificando-os em três espécies-atos que importam

enriquecimento ilícito (artigo 9º), atos que causam prejuízo ao erário público

(artigo 10) e atos que atentam contra os Princípios da Administração Pública

(artigo 11), e estabeleceu sanções, previstas no artigo 12, incisos I, II, III,

correspondentes, respectivamente àquelas três espécies.

Juntamente com as penalidades, o legislador reforçou a

obrigação de reparar o dano causado ao patrimônio público, o que já era

possível com base no artigo 129, inciso III, da Carta Magna, no artigo 159 do

Código Civil de 1916 e no artigo 1º da Lei 7437/85, previsão que ganhou

reforço com o artigo 25, inciso IV, a, da Lei n º 8625/93.

Embora a Lei 8.429/92, em seus artigos 9º, 10o e 11o conceitue

e traga rol exemplificativo de atos de improbidade administrativa, o resultado

lesivo e a transgressão à norma deverão ser verificados junto com a violação

dos princípios norteadores da Administração.

Preliminarmente, faz-se mister verificar que as condutas dos

requeridos, Carlos Augusto Garcia e Regina Massaretto Bronzel Dubay

violaram os princípios fundamentais da Administração Pública, em especial, a

legalidade, moralidade, a impessoalidade e razoabilidade.

2. DOS ATOS DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA

QUE ATENTARAM CONTRA OS PRINCÍPIOS DA ADMINISTRAÇÂO

PÚBLICA

Os princípios da Administração Pública estão dispostos na

Constituição da República, em seu artigo 37, aos quais estão submetidos todos

os agentes públicos, em qualquer esfera de Poder, sujeitando o seu infrator nas

sanções de suspensão dos direitos políticos, a perda da função pública, a

indisponibilidade dos bens e o ressarcimento ao erário, na forma e gradação

previstas em lei, sem prejuízo da ação penal cabível.

Reforça a Constituição, ainda, a Lei 8429/92 (Lei de

Improbidade Administrativa), ao prescrever, claramente:

“Art.11. Constitui ato de improbidade administrativa queatenta contra os princípios da administração públicaqualquer ação ou omissão que viole os deveres dehonestidade, imparcialidade, legalidade, e lealdade àsinstituições.”

Como se vê, os requeridos com as condutas já descritas

infringiram os princípios elementares da Administração Pública, sujeitando-se

as sanções pertinentes.

No dizer do jurista Paulo Bonavides:

“As regras vigem, os princípios valem; o valor que nelesse insere se exprime em graus distintos. Os princípios,enquanto valores fundamentais, governam aConstituição, o regímen, a ordem jurídica. Não sãoapenas a lei, mas O Direito em toda a sua extensão,substancialidade, plenitude e abrangência” ( in Curso deDireito Constitucional, Malheiros, 5ª edição, 1994, pág.260)

Para Celso Antônio Bandeira De Mello, na obra Curso de

Direito Administrativo, Malheiros, 5ª edição, 1994, p.451:

“Violar um princípio é muito mais grave que transgrediruma norma qualquer. A desatenção ao princípio implicaofensa não apenas a um específico mandamentoobrigatório, mas a todo o sistema de comandos. É a maisgrave forma de ilegalidade ou de inconstitucionalidade,conforme o escalão do princípio atingido, porquerepresenta insurgência contra todo o sistema, subversãode seus valores fundamentais, contumélia irremissível aseu arcabouço lógico e corrosão de sua estrutura mestra.Isso porque, com ofendê-lo abatem as vigas que osustêm e alui-se toda a estrutura nelas esforçada.”

Nesse sentindo, insta elencar em seguida os princípios da

Administração Pública violados pelos requeridos, na qualidade de Agentes

Públicos. A violação a estes princípios caracteriza a prática de atos de

improbidade, nos termos do artigo 11 da Lei 8429/92.

2.1 Da violação ao princípio da legalidade

A Administração Pública é regida pelo princípio da

legalidade, o qual significa, em relação à Administração Pública, que o

administrador só pode fazer o que a lei autorizar. Desta forma, a conduta da

administração deve seguir procedimentos previamente definidos e autorizados

por lei, e estar de acordo com os princípios que regem sua atuação.

Apesar de o ente público ter o dever de realizar suas

condutas vinculadas à lei, a própria lei abre exceções em que a Administração

possui uma pequena liberdade para agir. Essa pequena liberdade é

representada por uma margem de escolha conferida ao agente público, para

que este possa decidir, de acordo com critérios de conveniência e

oportunidade, qual a melhor conduta a ser realizada no caso concreto. Este é o

poder discricionário da Administração Pública.

Quando a Administração exerce seu poder discricionário,

ela está se utilizando de questões de mérito, chamado de mérito administrativo.

Em regra esse mérito administrativo não pode ser discutido pelo Poder

Judiciário, pois isso representaria uma violação ao princípio da separação dos

poderes. Mas excepcionalmente o Judiciário pode discutir o mérito, quando ele

possuir algum vício de validade, no caso da Administração Pública, uma ofensa

grave a algum de seus princípios.

Tal vício é justamente o que ocorreu na situação em tela.

O procedimento de desapropriação é dividido em duas fases, a fase

declaratória e a fase executória. A fase declaratória, objeto da presente ação,

tem como objetivo final a declaração da utilidade pública. Em que se pese

aparentemente os decretos, por si, de declaração no caso em tela, os de 6577,

6578 e 6579, obedeceram as formalidade legais, em sua forma, o

procedimento que o formou é completamente ilegal.

O procedimento antes da feitura do ato deve obedecer as

diretrizes principiológicas da administração pública. A procedimentalização para

a confecção de um ato administrativo serve como controle da sua legalidade.

Neste sentido, a lição de Marçal Justen Filho3:

Em suma, o processo é instrumento de grande relevânciapara o controle do poder estatal. Tomando-se aexpressão controle no sentido de fiscalização, o processopermite a verificação da regularidade dos atos decisórios.É possível determinar se a decisão foi precedida dasformalidades indispensáveis, com observância dosprincípios jurídicos pertinentes. A infração aoprocedimento acarreta, como regra, presunção deinvalidade da decisão anotada. Os terceiros ou a própriaautoridade que emitiu o ato dispõem da possibilidade dereconstrução histórica da formação e exteriorização davontade decisória.

Portanto percebe-se a importância de haver um

procedimento prévio a qualquer ato administrativo, sobretudo quando este

redundar na restrição de um direito.

Quando há interesse da Administração em realizar

alguma obra, ou algum serviço, é necessário que haja um planejamento, que

ela busque sempre as melhores propostas, as melhores opções, pois ela deve

sempre ter como finalidade o interesse público.

Portanto é evidente que diante do interesse em se

encontrar terrenos para que sejam realizadas determinadas obras, não cabe à

Administração simplesmente escolher certo terreno arbitrariamente, mas sim

levantar a relação de terrenos disponíveis no Município para que, após uma

análise de cada um, possa selecionar aquele que trará melhor custo-benefício

aos cofres públicos.

3 JUSTEN FILHO, Marçal. Curso de direito administrativo. 9 ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2013, p. 340.

Logicamente, alguns atos podem ser realizados de forma

mais célere, porém há atos que exigem um procedimento mais demorado,

como no caso da desapropriação. A desapropriação adentra no direito de

propriedade dos particulares, por isso mesmo pressupõe um procedimento

mais detalhado, exigindo que o administrador apresente a motivação para a

realização de tal ato, que demonstre que a Administração realizou a busca pelo

terreno de melhor custo-benefício e principalmente que comunique o

administrado que será desapropriado.

Esta última formalidade, decorrente dos princípios

constitucionais do contraditório e da ampla defesa, se encontra claramente

violada neste caso. Em momento algum a Administração, por meio dos

requeridos, comunicou os proprietários dos terrenos a respeito do interesse em

desapropriar tais terrenos, impedindo qualquer tipo de manifestação.

Celso Antônio Bandeira de Mello4 bem explica como o

princípio do contraditório e da ampla defesa decorre dos incisos LIV e LV, do

artigo 5º, da Constituição Federal:

Estão aí consagrados, pois, a exigência de um processoregular para que sejam atingidas a liberdade e apropriedade de quem quer que seja e a necessidade deque a Administração Pública, antes de tomardecisões gravosas a um dado sujeito, ofereça-lheoportunidade de contraditório e de defesa ampla, noque se inclui o direito a recorrer das decisões tomadas.(grifo nosso)

No caso em tela, estar-se sem dúvida diante de uma

decisão gravosa a respeito da propriedade, como menciona Celso Antônio

Bandeira de Mello. Logo, no mínimo os proprietários dos terrenos deveriam ter

sido comunicados a respeito do procedimento de declaração de utilidade

pública.

4 MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de direito administrativo. 19 ed. rev. e atual. São Paulo: Editora Malheiros, 2005, p. 103.

Demonstrou-se ainda no procedimento um descompasso

entre o fim visado e os atos praticados em seu bojo.

Pelo que se infere dos documentos e declarações

colhidos no inquérito civil nº MPPR-0024.15.000616-1, não houve procura por

terrenos disponíveis no Município de Campo Mourão. Inicialmente foram feitas

apenas solicitações de avaliações dos imóveis: à fl. 19 há a solicitação de

avaliação do imóvel objeto do decreto nº 6579; à fl. 66 há a solicitação de

avaliação do imóvel objeto do decreto nº 6578; e à fl. 91 há a solicitação de

avaliação do imóvel objeto do decreto nº 6577.

É de se notar que nos pedidos de avaliação não há

nenhuma motivação, restando a dúvida: por quê o interesse de avaliar tais

terrenos para possível desapropriação? Em nenhum momento, antes da

publicação dos decretos, a Administração manifestou interesse em abrir ruas,

implantar projetos habitacionais ou instalar um parque tecnológico. Espera-se

que o administrador público busque sempre a melhor opção dentre as

disponíveis, isso pressupõe que haja uma procura.

Ora, de acordo com os documentos fornecidos pelo

Município de Campo Mourão, percebe-se que não houve nenhuma busca por

terrenos disponíveis no Município, o que houve foi simplesmente uma decisão

arbitrária de quais terrenos seriam desapropriados. A Administração deve

coletar todas as informações necessárias antes de realizar determinado ato,

neste sentido cita-se novamente Marçal Justen Filho5:

Por isso, a produção de ato regulamentar depende daobservância de formalidades prévias que assegurem àautoridade administrativa um processo de formação devontade completo, perfeito, informado por todos oselementos necessários e pertinentes. A ausência deobservância de um procedimento previamentedeterminado propicia a presunção de que a autoridadeadministrativa deixou de analisar adequadamente todas

5 Op. cit., p. 361.

as alternativas disponíveis e que a sua escolha resultoude juízos arbitrários. Enfim, a ausência de respeito aodevido procedimento configura exercício arbitrário dacompetência, infringindo o limite dadiscricionariedade. (grifo nosso)

Neste caso não houve respeito ao devido procedimento,

houve uma decisão arbitrária do próprio coordenador geral de governo, como

ele mesmo declarou perante esta Promotoria às fls. 173-174. Nesta mesma

declaração, o Sr. Carlos Garcia ainda afirmou que não sabia que os terrenos

desapropriados eram pertencentes à família Tezelli. Ora, as escrituras públicas

dos terrenos foram juntadas nas solicitações de avaliação, ou seja, pelas

escrituras ele saberia que tais imóveis pertenciam àquelas pessoas.

Além disso, como já mencionado alhures, os três decretos

foram expedidos no dia 15 de abril de 2015, na mesma data, como se

evidencia pela cópia do diário oficial publicado do dia 17 de abril de 2015 (fls.

05-06). Três decretos desapropriatórios com motivos distintos mas que

recaíram sobre propriedades de uma mesma pessoa.

É claro que não foi apenas coincidência. Os Requeridos

tinham ciência de quem eram os proprietários de tais terrenos, já que as

escrituras públicas estavam presentes no procedimento administrativo de

desapropriação. A finalidade buscada pelos Requeridos não era o interesse

público, era o interesse privado, o interesse de perseguir politicamente a família

Tezelli.

Quando a Administração Pública não tem o interesse

público como fim, ocorre o desvio de finalidade ou desvio de poder, uma das

espécies de abuso de poder.

José dos Santos Carvalho Filho6 ensina que o desvio de

poder “é conduta mais visível nos atos discricionários. Decorre desse fato a6 CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de direito administrativo. 26 ed. rev., ampl. e atual.

São Paulo: Atlas, 2013, p. 49.

dificuldade na obtenção da prova efetiva do desvio, sobretudo porque a

ilegitimidade vem dissimulada sob a aparência da perfeita legalidade”.

É justamente o que vemos no caso em tela. Os decretos

de desapropriação aparentemente encontram-se de acordo com a lei, porém a

motivação deles é viciada, pois o motivo como visto era perseguir particulares.

Os Administradores se aproveitaram da discricionariedade do procedimento

prévio à expedição do decreto, não apresentando motivação, nem procedendo

a buscas por outros terrenos.

Para se comprovar o desvio de poder deve-se buscar os

sintomas que denunciam o desvio de finalidade por parte do agente, melhor

explicado nas palavras de José Cretella Junior, em sua obra Anulação do Ato

Administrativo por Desvio de Poder7:

Denominamos “sintoma” do desvio de poder qualquertraço, interno ou externo, direto, indireto ou circunstancialque revele a “distorção” da vontade do agente público aoeditar o ato, praticando-o não por motivo ou interesse“público”, mas por motivo “privado.

No presente caso pode-se perceber os sintomas

mencionados por Cretella Junior. Primeiro pela forma como foi realizado o

procedimento prévio à expedição dos decretos, ou seja, sem busca por outros

terrenos disponíveis ou sem explicar os motivos dos pedidos de suas

avaliações. Segundo o fato da expedição dos três decretos no mesmo dia,

sendo que possuíam finalidades distintas. E por fim, as declarações das

testemunhas colhidas no inquérito civil nº MPPR-0024.15.000616-1 que

deixaram claro a perseguição política.

O desvio de finalidade é um sintoma que demonstra também

um vício da motivação dos atos, conforme a teoria dos Motivos Determinantes.

7 CRETELLA JUNIOR, José. Anulação do Ato Administrativo por Desvio de Poder. 1 ed. Rio de Janeiro: Forense, 1978, p. 106.

Segundo esta teoria, se os motivos que ensejaram a realização

de um ato são inexistentes, o ato será nulo. Ensina, neste sentido Hely Lopes

Meirelles8, “tais motivos é que determinam e justificam a realização do ato, e,

por isso mesmo, deve haver perfeita correspondência entre eles e a realidade”.

Portanto, considerando que o motivo dos decretos que

declararam a utilidade pública dos terrenos não foi o interesse público, e sim

particular, tais decretos violaram frontalmente a legalidade, e devem ser

declarados nulos.

2.2 Da violação ao princípio da moralidade

O direito, como bem define o ilustre filósofo Miguel Reale, é

fato, valor e norma. A teoria tridimensional do direito, mais completa e bem

embasada teoria dedicada a contextualizar o direito, impede que seu intérprete

afaste qualquer um de seus elementos fundamentais, pois, a cada análise

concreta, observa-se, conforme a ótica, um de seus conteúdos em evidência.

Assim, o legislador constituinte, atento, positivou a moralidade

como princípio constitucional a ser rigorosamente obedecido pelo

Administrador Público. Não ao acaso, eis que o valor inerente ao direito se

aproxima muito do campo da moral.

Atender a moral, para o direito, significa aplicar e obedecer

valores que são bem recebidos, apreciados e estimulados pela sociedade.

Destaca-se a lição do professor José Dos Santos Carvalho Filho, na obra

“Manual de Direito Administrativo”, 9ª edição, RT, pág. 15:

“O princípio da moralidade impõe que o administradorpúblico não dispense os preceitos éticos que devem estarpresentes em sua conduta. Deve não só averiguar oscritérios de conveniência, oportunidade e justiça em suas

8 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. 32ª ed. São Paulo: Editora Malheiros,2006, p. 197.

ações, mas também distinguir o que é honesto oudesonesto.”

Assim, a moral tem por objeto o comportamento humano regido

por regras e valores morais, que se encontram gravado em nossas

consciências, e não apenas nos códigos.

Sobre o conteúdo jurídico do princípio da moralidade nos

explica Lúcia Valle Figueiredo, in “Curso de Direito Administrativo”. São Paulo;

Malheiros Editores.1994.pag.45:

“O princípio da moralidade vai corresponder ao conjuntode regras de conduta da Administração que, emdeterminado ordenamento jurídico são considerados osstandards comportamentais que a sociedade deseja eespera”.

Desta forma, não pode o agente público desprezar o elemento

ético de sua conduta. Ao revés, deve repudiar a prática de atos desonestos ou

imorais, mesmo que amparados por lei, sob pena de incorrer em violação de

um princípio constitucional que rege a Administração Pública, e via de

consequência, ficar sujeito às penas pela prática de ato de improbidade

administrativa.

Evidentemente não é moral, não é honesto, não está de acordo

com as regras de conduta da Administração, e não corresponde aos padrões

comportamentais que a sociedade deseja e espera ver agentes públicos

auferindo qualquer tipo de vantagem indevida visando unicamente a satisfazer

interesses privados em razão do exercício de cargo.

Destarte, os requeridos em momento algum harmonizaram

seus atos com princípio da moralidade, pelo contrário, dotado de má-fé, com

único objetivo de satisfazer o seu ego, praticaram atos administrativos com o

fito de prejudicar seu adversário.

2.2 Da violação ao princípio da Razoabilidade

O princípio da razoabilidade está relacionado com a

proporcionalidade do ato, dá a ideia de a Administração Pública utilizar-se dos

meios adequados, de forma razoável, para se chegar aos fins. Segundo Hely

Lopes Meirelles9 o princípio da razoabilidade “objetiva aferir a compatibilidade

entre os meios e os fins, de modo a evitar restrições desnecessárias ou

abusivas por parte da Administração Pública”. São justamente essas restrições

abusivas que estão ocorrendo no presente caso.

Por mais que seja permitido à Administração realizar

desapropriações, parece estranho, e nada razoável, que a Administração

realize três desapropriações sobre terrenos da mesma família, principalmente

ocorrendo as elas no mesmo dia. É uma medida que recai em excesso sobre

determinado particular, sendo que existem outros terrenos disponíveis no

Município.

Fica claro que a Administração utilizou-se de seu poder

discricionário para agir de forma desarrazoada. Celso Antônio Bandeira de

Mello10 traz boa explanação acerca da falta de razoabilidade da Administração

no exercício de seu poder discricionário:

“Com efeito, o fato de a lei conferir ao administrador certaliberdade (margem de discrição) significa que lhe deferiuo encargo de adotar, ante a diversidade de situações aserem enfrentadas, a providência mais adequada a cadaqual delas. Não significa, como é evidente, que lhe hajaoutorgado o poder de agir ao sabor exclusivo de seulíbito, de seus humores, paixões pessoais,excentricidades ou critérios personalíssimos, e muitomenos significa que liberou a Administração para

9 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. 32ª ed. São Paulo: Editora Malheiros, 2006, p.93.

10 Op. cit., p. 97.

manipular a regra de Direito de maneira a sacar delaefeitos não pretendidos nem assumidos pela lei aplicada”.

Percebe-se que este caso em questão se amolda aos

ensinamentos de Celso Antônio Bandeira de Mello. Pautados por motivos

pessoais, os Requeridos procederam à desapropriação de três terrenos que

pertenciam à família Tezelli. Três decretos com motivações diferentes

expedidos no mesmo dia.

2.2 Da violação ao princípio da impessoalidade

O princípio da impessoalidade, expressão sinônima de princípio

da finalidade, é aquele que impõe ao administrador público apenas a prática de

atos para o seu fim legal. A finalidade, portanto, terá sempre o objetivo certo e

inafastável de qualquer ato administrativo: o interesse público.

Ao dissertar sobre o princípio da impessoalidade a professora

Maria Sylvia Zanello Di Pietro, na obra “Direito Administrativo”, 5ª edição, Atlas,

pág. 64, ensina que:

“Significa que a Administração Pública não podeatuar com vistas a prejudicar ou beneficiar pessoasdeterminadas, uma vez que é sempre o interessepúblico que tem que nortear o seu comportamento”.

Nesse sentido, importante frisar que o atributo da

impessoalidade é consequência do dever de imparcialidade, ou seja, exige-se

que os atos administrativos sejam atribuídos ao ente administrativo, não à

pessoa do administrador, o qual é mero instrumento utilizado para implemento

das finalidades próprias do Estado.

O professor José dos Santos Carvalho Filho ensina que:

“A referência a esse princípio no texto constitucional, noque toca ao termo impessoalidade, constituiu uma

surpresa para os estudiosos, que não o empregavam emseus trabalhos. Impessoal é ‘o que não pertence parauma pessoa em especial’, ou seja, aquilo que não podeser voltado especialmente a determinadas pessoas. Oprincípio objetiva a igualdade de tratamento que aAdministração deve dispensar aos administrados que seencontrem em idêntica situação jurídica. Nesse ponto,representa uma faceta do principio da isonomia. Por outrolado, para que haja verdadeira impessoalidade, deve aAdministração voltar-se exclusivamente para o interesse

público, e não para o privado”. 11

Destarte, é defeso que a administração pública seja utilizada

para benefício particular. Percebe-se, portanto, o claro desvio de finalidade do

interesse público nos atos praticados em prol do benefício particular dos

requeridos, visto que, houve uma grande irregularidade, ou seja, interesse

particular ao contrário do interesse público.

Em outras palavras, não padece de dúvidas a afronta ao

princípio da impessoalidade, onde as condutas dos requeridos usaram critérios

subjetivos apenas com o intuito de prejudicar os sócios da empresa BNY, pois

devem ser obedecidos os critérios objetivos. O administrador fica impedido de

buscar outro objetivo ou praticar ato de interesse próprio ou de terceiros.

O que o princípio veda é a prática de ato administrativo sem

interesse público, visando unicamente a satisfazer interesses privados, por

favoritismos ou perseguição dos agentes governamentais, conforme pode-se

constatar no termo de declaração do Sr. Rômulo Luis Sonsin De Oliveira Aguiar

de fls. 168.12 11 CARVALHO FILHO, José dos Santos, Manual de Direito Administrativo, 26. – São Paulo: Atlas,

201312 “Que o declarante confirma o teor da informação de fls. 135 dos autos de ProcedimentoPreparatório n. MPPR-024.15.000616-1, que há aproximadamente quatro meses, por volta das11 horas da manhã, em uma conversa informal com o Sr. Marcio Berbet, este perguntou aodeclarante se os seus amigos, filhos de Tauillo Tezelli, estariam bravos com ele; que MarcioBerbet lhe informou que Marton Tezelli estaria pedindo na Prefeitura de Campo Mourão osdocumentos relativos à desapropriação de terrenos de sua família; que Marcio Berbet disseque as declarações de utilidade pública da desapropriação foram maneira de retaliar a famíliaTezelli, porque através da imprensa estariam retaliando a prefeita, Regina Dubay; que MarcioBerbet ainda falou que a Prefeitura havia avaliado os imóveis por muito menos em relação aovalor de mercado, e assim, os familiares de Tauillo receberiam o valor a menor Nada mais

Destarte, por disposição expressa da Lei de Improbidade

Administrativa (artigo 4º), é dever de todos os agentes públicos, de qualquer

nível e esfera hierárquica, exercer as suas funções com observância dos

princípios da moralidade, impessoalidade e razoabilidade, tendo em vista

sempre o interesse público e o bem estar social.

Portanto, descreve a Lei 8.429/92 como ato de improbidade

administrativa aqueles que atentam contra os princípios da administração

pública, nos termos do artigo 11 da Lei 8.429/92.

III – DA NULIDADE DOS DECRETOS DE DESAPROPRIAÇÃO

Como visto no tópico 2.1, a conduta da Administração

Pública no presente caso foi de encontro aos princípios que regem sua

atuação. No mesmo sentido, as condutas da Administração que ferem seus

princípios norteadores são consideradas como ilegais, ensejando assim a

nulidade de tais atos.

Considerando que os procedimentos administrativos

prévios às desapropriações se encontram viciados por ofenderem os princípios

administrativos apresentados, os decretos desapropriatórios também se

encontram contaminados por esse vício, devendo ser anulados. Neste sentido,

é perfeitamente cabível o entendimento dos “frutos da árvore envenenada”,

teoria adotada no direito processual, referente, em sua origem, à legalidade

das provas obtidas por meio ilícito.

Como é que um procedimento viciado, isto é, com sua

origem manifestadamente ilícita, em outras palavras, envenenada, pode vir a

“prosperar e render bons frutos”?

declarou”.

Pelo conjunto fático descrito, bem como dos argumentos

de direito expostos, verifica-se que os requeridos praticaram atos de

improbidade administrativa, por violação dos princípios da administração

pública.

Tanto Regina Massareto Bronzel Dubay quanto Carlos

Augusto Garcia possuem cargos que determinam as diretrizes gerais do

Município de Campo Mourão/PR.

O Requerido Carlos Garcia claramente agiu com desvio

de finalidade, praticando atos de perseguição, conforme demonstrado pelos

documentos e provas testemunha. Empenhou-se pessoalmente para os atos

declaração de utilidade pública , aproveitando-se do seu cargo de Coordenador

Geral do Município.

Por sua vez, a Requerida Regina Dubay, Prefeita do

Município de Campo Mourão, acompanhou todo o proceder do Sr. Carlos

Garcia dando o seu aval a todos os atos praticados por ele. Em suas

declarações (fls. 173-174) Carlos Garcia deixou bem claro que a Requerida

tinha conhecimento de suas condutas, e assinou os decretos de

desapropriação quando estes chegaram a ela.

Por tal razão, deve o ato produzido pelo Município de

Campo Mourão ser considerado nulo, não devendo produzir efeitos jurídicos.

V – PEDIDO LIMINAR DE AFASTAMENTO DE CARLOS GARCIA

Pelos fatos expostos até o momento, tudo indica que há

grande probabilidade de que Carlos Garcia esteja realizando perseguição

política à família Tezelli.

Em função do cargo ocupado por ele na Prefeitura de

Campo Mourão e por suas prerrogativas, há grande chance de que ele obste a

instrução processual, de modo a ocultar ou manipular provas, podendo, por

exemplo, manipular os procedimentos prévios às desapropriações. Nesses

termos traz a Lei n. 8429/92:

Art. 20. (…)Parágrafo único. A autoridade judicial ou administrativacompetente poderá determinar o afastamento do agentepúblico do exercício do cargo, emprego ou função, semprejuízo da remuneração, quando a medida se fizernecessária à instrução processual.

O dispositivo supracitado é um instrumento que facilita a

busca pela verdade real pelo magistrado, de modo que poderá garantir a

verossimilhança das alegações no decorrer do processo. Como se vê na lição

de Emerson Garcia e Rogério Pacheco Alves13:

Por intermédio do afastamento provisório do agente,busca o legislador fornecer ao juiz um importantíssimoinstrumento com vistas à busca da verdade real,garantindo a verossimilhança da instrução processual demodo a evitar que a dolosa atuação do agente,ameaçando testemunhas, destruindo documentos,dificultando a realização de perícias etc., deturpe oudificulte a produção a produção dos elementosnecessários à formação do convencimento judicial.Busca-se, enfim, propiciar um clima de franco e irrestritoacesso ao material probatório, afastando possíveis óbicesque a continuidade do agente no exercício do cargo,emprego, função ou mandato eletivo poderiaproporcionar.

Como já explicado, os atos de desvio de poder,

representados no presente caso pela perseguição política, disfarçada de

desapropriação, imprescindem da prova testemunhal, como aquela já colhida

através do depoimento de declarantes que compareceram nesta 3ª Promotoria.

13 GARCIA, Emerson; ALVES, Rogério Pacheco. Improbidade Administrativa. 8 ed. São Paulo: Saraiva, 2014, p. 1039.

Considerando que as testemunhas que prestaram

declarações são conhecidas pelo Requerido Carlos Garcia, este poderia

utilizar-se de seu cargo para realizar perseguição também contra tais

testemunhas, de forma a intimidá-las, frustrando os seus depoimentos em

juízo. Aliás, este parece ser o comportamento comum do requerido, como se

demonstra nesta ação: a perseguição.

Constata-se que estão presentes os critérios do risco de

dano irreparável à instrução processual e a plausibilidade da pretensão de

mérito.

Visualiza-se este entendimento no seguinte Acórdão:

AGRAVO DE INSTRUMENTO - AÇÃO CIVIL PÚBLICA -MEDIDA CAUTELAR DE AFASTAMENTO DO CARGOPOR 180 DIAS – ART. 20, PARÁGRAFO ÚNICO, DA LEI8.429/92 - RISCO À INSTRUÇÃO PROCESSUAL -DEMONSTRAÇÃO DO FUMUS BONI IURIS E DOPERICULUM IN MORA - COAÇÃO DE TESTEMUNHAS -MANIPULAÇÃO DE PROVAS - ACERTO DA DECISÃO -TÉRMINO DO MANDATO - PERDA DO OBJETO. 1. Oart. 20, parágrafo único, da Lei n. 8.429/92, possibilita oafastamento do agente público do exercício do cargo,emprego ou função, sem prejuízo da remuneração,quando a medida se fizer necessária à instruçãoprocessual. 2. Presença do fumus boni iuris bem comodo periculum in mora, a justificar o afastamentoliminar do agravante do exercício do cargo dePrefeito do Município de Vazante, a fim garantir aadequada instrução da ação civil pública. 3.Constatação de que o então Prefeito, por meio de suaassessoria jurídica, intimidou testemunhas dos fatosinvestigados, em flagrante manipulação de provasimprescindíveis ao regular deslinde do processo. 4.Término do mandato, e assunção do novo Prefeito aocargo de Chefe do Executivo. 5. Recurso prejudicadopela perda do seu objeto. (TJ-MG - AI10710120009497002 MG, Rel. Desembargadora ÁuresBrasil, julgamento em 17/01/2013, 5ª Câmara Cível, datada publicação 22/01/2013). (grifo nosso)

Portanto faz-se mister a necessidade do afastamento

liminar do Coordenador Geral de Governo do Município de Campo Mourão/PR,

Carlos Augusto Garcia, o qual, caso permaneça em seu cargo, poderá frustrar

a instrução processual através da intimidação ou perseguição de testemunhas.

IV – DOS PEDIDOS

Face os fundamentos acima mencionados, requer o

Ministério Público do Estado do Paraná:

I) Sejam os requeridos notificados para, querendo, ofertar

defesa preliminar, nos termos do que dispõe o parágrafo 7º, do artigo 17, da Lei

n. 8.429/92 (acrescido pela Medida Provisória n. 2.225, de 04.09.01).

II) Após a suplantação dessa fase, com ou sem defesa

preliminar, seja recebida a inicial, determinando-se a citação dos requeridos

para que, querendo, contestem a presente, sob pena de revelia.

III) A procedência do pedido de provimento jurisdicional

para o fim de que:

a) Sejam declarados inválidos os decretos de números

6577, 6578 e 6579;

b) Sejam os requeridos Carlos Augusto Garcia e Regina

Massaretto Bronzel Dubay condenados nas penas estipuladas no artigo 12, in-

ciso III, da Lei n. 8.429/92, em razão da prática de atos de improbidade admi-

nistrativa que violaram os princípios da Administração Pública, capitulados no

artigo 11, caput e inciso I;

c) Seja o requerido Carlos Augusto Garcia afastado do

cargo de coordenador geral de governo do Município de Campo Mourão/PR,

nos termos do artigo 20, parágrafo único da Lei 8.8429/92.

Protesta pela produção de provas, consistentes, principal-

mente, no depoimento pessoal dos requeridos, na oitiva de testemunhas, cujo

rol será oportunamente apresentado, em prova pericial e na juntada de docu-

mentos que se fizerem necessários, além daqueles que embasam a presente

ação.

V – VALOR DA CAUSA

Dá-se a causa o valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais)

Termos em que,

Pede deferimento.

Campo Mourão, 16 de Outubro de 2015.

MARCOS JOSÉ PORTO SOARES

PROMOTOR DE JUSTIÇA