Exercícios de ser criança

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8/15/2019 Exercícios de ser criança http://slidepdf.com/reader/full/exercicios-de-ser-crianca 1/56 Motrivivência Ano XIX, Nº 29, P. 141-196 Dez./2007 RESUMO Este texto tem como objetivo central “subsidiar o debate junto ao E X P E R I M E N T A N D O “EXERCÍCIOS DE SER CRIANÇA” 1 : Corpo em movimento e a cultura lúdica nos tempos-espaços na Educação Infantil da Rede Municipal de Florianópolis 2  ou “Por que toda criança precisa brincar (muito)?” 3 1 Título do livro de Manoel de Barros (1999) . O poeta Manoel de Barros, no seu melhor estilo, extraindo poesia daquilo que é supostamente vazio: compondo os seus milagres estéticos com o carinho de quem pinta uma obra de arte; bordando a palavra com a mesma devoção que a família Diniz Dumont elabora imagens do livro. Através de duas histórias – O menino que carregava água na peneira e A menina avoada-, eles mergulham no imaginário infantil e nos revelam toda a poesia e lirismo que estão por trás daquilo que os adultos costumam chamar de ingenuidade (Orelha do livro). 2 Agradecimentos I: Agradeço a todos e todas componentes do “Grupo de Estudos Independentes de Educação Física na Educação Infantil”, cujos debates, durante o Projeto de Extensão com o Centro de Desportos, muito contribuíram para que eu me debruçasse nas questões relativas ao corpo em movimento na educação infantil.  Agradecimentos II – Agradeço às colegas Luciana Maria Espíndola dos Santos, Gisele Day, Carol Costa que, com suas presenças e produções cientícas, durante o Curso de Formação Continuada da Rede Municipal de Educação “Corpo e Movimento na Educação Infantil”, contribuíram e elevaram o nível dos debates, trazendo relevantes ensinamentos através de suas dissertações de Mestrado, suas experiências de vida e presenças humanas. 3 Título do poema escrito por Gilka Girardello, cujas estrofes abrem o texto e serão paulatinamente apresentadas no início de cada item do texto, culminando com a metáfora do título do poema “Por que as crianças devem brincar (muito)”. Maurício Roberto da Silva “Exercises of being children”: Body in motion and the playing cultu- re in the space-time in Children Education at the network education of Florianópolis or “Why does every child need to play (so much)? ABSTRACT This text has as a central point “to subsidize the discussion with the In-

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Motrivivência Ano XIX, Nº 29, P. 141-196 Dez./2007

RESUMOEste texto tem como objetivo

central “subsidiar o debate junto ao

E X P E R I M E N T A N D O

“EXERCÍCIOS DE SER CRIANÇA” 1: Corpoem movimento e a cultura lúdica nos

tempos-espaços na Educação Infantil daRede Municipal de Florianópolis2 ou “Porque toda criança precisa brincar (muito)?” 3

1 Título do livro de Manoel de Barros (1999) . O poeta Manoel de Barros, no seu melhor estilo, extraindopoesia daquilo que é supostamente vazio: compondo os seus milagres estéticos com o carinho de quempinta uma obra de arte; bordando a palavra com a mesma devoção que a família Diniz Dumont elaboraimagens do livro. Através de duas histórias – O menino que carregava água na peneira e A meninaavoada-, eles mergulham no imaginário infantil e nos revelam toda a poesia e lirismo que estão por trás

daquilo que os adultos costumam chamar de ingenuidade (Orelha do livro).2 Agradecimentos I: Agradeço a todos e todas componentes do “Grupo de Estudos Independentes

de Educação Física na Educação Infantil”, cujos debates, durante o Projeto de Extensão com oCentro de Desportos, muito contribuíram para que eu me debruçasse nas questões relativas aocorpo em movimento na educação infantil.

  Agradecimentos II – Agradeço às colegas Luciana Maria Espíndola dos Santos, Gisele Day, CarolCosta que, com suas presenças e produções cientícas, durante o Curso de Formação Continuadada Rede Municipal de Educação “Corpo e Movimento na Educação Infantil”, contribuíram eelevaram o nível dos debates, trazendo relevantes ensinamentos através de suas dissertações deMestrado, suas experiências de vida e presenças humanas.

3 Título do poema escrito por Gilka Girardello, cujas estrofes abrem o texto e serão paulatinamenteapresentadas no início de cada item do texto, culminando com a metáfora do título do poema “Porque as crianças devem brincar (muito)”.

Maurício Roberto da Silva

“Exercises of being children”: Body in motion and the playing cultu-re in the space-time in Children Education at the network educationof Florianópolis or “Why does every child need to play (so much)?

ABSTRACTThis text has as a central point “tosubsidize the discussion with the In-

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Grupo de Estudos Independente deEducação Física na Educação Infantilda Rede Municipal de Educação de

Florianópolis, a partir dos “temas/ problemas” da vida cotidiana dos

ambientes educativos das creches,tais como: corpo, movimento, tempo,

espaço, conteúdos/conhecimentos/ linguagens e outros.Trata-se deuma pesquisa bibliográca, na

qual as questões supracitadas sãoprovisoriamente problematizas, tendo

como eixo teórico-metodológico ométodo dialético.

Palavras Chave: Educação Infantil:Educação Física:;movimento; cultura

corporal; lúdico; tempo e espaço.

dependent Group Physical Educationin the Children Education at the ne-

twork education of Florianópolis, be-

ginning from the “subjects/ problems”of daily life in nursery’s educationenvironments, such as: body , mo-

tion, time, space, content / knowledge / language and others. It is a literaturesearch, in which the subjects aboveare provisionally problematised, andhas as main theoretical and methodo-

logical axis the dialectical method.Key-words: Physical Education;Children Education; Movement; BodyCulture; Playing Culture, Time; Space.

1. O corpo das crianças entra

em movimento nas creches...“Por que toda criança precisa

brincar (muito)”? 

Brincando, elas

aprendem a escolher: uni-duni-tê.

aprendem a imaginar: esta poça

d’água vai ser o mar.

aprendem a perseverar: caiu o

castelo, vou fazer de novo.

aprendem a imitar: eu era o moto-

rista -brrrrrrum.

aprendem a criar: dou um nó

aqui, outro aqui e

tá pronto o circo.

aprendem a descobrir: misturei

amarelo e azul, olha o que deu.

aprendem a conar em si: olha o

que eu consegui fazer.

aprendem novos conhecimentos:28, 29, 30, lá vou eu!

aprendem a fantasiar:daí a gente voava.

aprendem novas habilidades: voufazer o cabelo da

minha fada cacheado.aprendem a partilhar: tira,

bota, deixa car.aprendem a inventar: essa tampi-

nha de garrafa vai ser o

 pratinho deles.aprendem a pensar logicamente:

 joga a bola pra ele!

Este texto traz em suasentrelinhas as reflexões contidasdurante a Conferência de Aberturado Curso de Formação Continuada“Corpo e Movimento na EducaçãoInfantil da Rede Municipal de Flo-

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rianópolis”. As ideias nele contidassão, por um lado, frutos da minhainquietação como pesquisador quelida com a problemática “infância,trabalho e educação”, especica-

mente, acerca da idiossincrasia dosistema capitalista: a destruição dasforças produtivas, principalmente, aperversão da exploração do trabalhoinfantil3; por outro lado são repre-

sentam os problemas e questões daEducação Infantil da Rede Municipalde Educação de Florianópolis.

Assim, a imersão no uni-verso das crianças oriundas daclasse trabalhadora empobrecida,de cujo processo investigativoemergiram as categorias empírico-teóricas “corpo produtivo” e “cor-

po brincante”(SILVA, 2003) e ocotidiano da Educação Física naEducação Infantil, desaaram-me areetir sobre as questões que dizemrespeito ao “corpo em movimento”nos tempos e espaços “lúdicos”4 

da Educação Infantil; ambientesnos quais, salvo raras exceções,o corpo, por meio das “rotinas”,

da regulamentação do tempo, es-paço e dos movimentos da vidacotidiana, são treinados, moldadose marcados pelo disciplinamento

dos corpos das crianças. (SAYÃO,2004 p.129-130). Quanto a esserespeito, saliento que este processo,provavelmente, não está dissociadoda dimensão do “tempo histórico”,enquanto “irreversibilidade dosacontecimentos sociais” da vidacotidiana (HELLER, 1992), no qualo “corpo social”, incluindo o corpodos adultos trabalhadores (as) estáem movimento e “desenvolve his-toricamente a humanidade”. Istosignica dizer que o corpo em mo-

vimento das crianças nas creches,possui, objetivamente, uma relaçãoentre humanidade e os indivíduos,tornando possível a instituição e aatualização de valores muito alémdo “horizonte imediato restritivo

dos próprios indivíduos particula-res” (MÉSZAROS, 2007 p.34-35).

Além desse meu envolvi-mento investigativo com as crian-

ças da cana-de-açúcar, tambémmenciono as memórias da minhaexperiência como professor deEducação Física na Educação, cujaprática pedagógica, há trinta anos,

incluía, ainda que sem embasamen-to teórico, a preocupação com ocorpo em movimento de criançaspequenas do “pré-escolar” e do

3 Rero-me a minha experiência de pesquisa nos “eventos-campos” com a problemática do “tempolivre” das crianças para usufruto da “cultura lúdica” das crianças da Zona da Mata Canavieirapernambucana.

4 Coloco aspas no lúdico, inspirando-me no texto de Leila Mirtes de Magalhães (1992), intitulado “ARecreação/lazer no “jogo” da Educação Física e dos Esportes”. A autora se refere ao “jogo” lúdicoe o “jogo” de manobras.

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maternal. Naquele tempo, ocupava-me com os conteúdos e linguagenssimbólicas de caráter sonoro-musi-cal (brincadeiras de roda), cênico(jogos dramáticos5  e simbólicos6,como, por exemplo, as chamadas“contação/narração de histórias”7,entre outras.

Destaco, portanto, a mi-nha inserção na Educação Infantil,através da Educação Física, en-

quanto educador sempre atentoàs questões que dizem respeito aocorpo e ao movimento das criançasem espaços e tempos formais einformais. Assim, estes argumentospretendem justicar as minhas in-

quietações e dilemas ontológicos eepistemológicos, acerca das proble-

máticas que envolvem o “corpo emmovimento” das crianças pequenas,

os quais estão presentes numa gamade investigadores e investigadorasque lidam com as questões político-pedagógicas da Educação infantil.Também saliento que essas ree-

xões introdutórias sobre o corpo emmovimento na Educação Infantil,estão diretamente articuladas aos

temas/problemas8  pungentes, re-

levantes e perenes (SAYÃO, 2004),subjacentes aos projetos político-pedagógicos das diversas unidades9 

de Educação Infantil da Rede Muni-cipal de Educação de Florianópolis.Nesta linha de pensamento, quandose trata dos temas/problemas espe-

cícos das “rotinas” do cotidianodas creches, convém lembrar que,para além dessas questões mais es-

pecícas, há outras de caráter maisamplo, complexo e universais, que

5 Ver Spolim (2000) e Boal (1996).6 Ver Sarmento 2006.7 Quanto a esse respeito ver o Projeto de Qualicação de Mestrado em andamento de Caroline

Machado Costa (2008) “Relações entre narração de histórias, infância e criança em parcela dapesquisa educacional”, Centro de Ciências da eEducação/UFSC, 2008, mimeo.

8 Esses “temas”, convertidos em “problemas” (GAMBOA, 2007 p. 103-105), podem ser vistos nostextos publicados na primeira parte desta revista, publicados pelo GRUPO DE ESTUDOS INDE-

PENDENTE DE EDUCAÇÃO FÍSICA INFANTIL DA REDE MUNICIPAL DE EDUCAÇÃO e serãoposteriormente publicados em livro. Os temas/problemas são foram construídos a partir da seguin-te “Pergunta-Síntese”(GAMBOA, 2007 p. 104):: “Quais os temas/problemas que estão subjacentesno cotidiano das práticas pedagógicas e na produção do conhecimento acerca da problemática daEducação Física no âmbito da Educação Infantil, (que precisam ser investigados, concretamente,em seus “limites”e “possibilidades”)?”

9 O projeto político-pedagógico pressupõe a relação dialética entre política e pedagogia. Nestesentido, (...) todo o projeto educacional precisa atuar contra a desigualdade, reconhecendo asdiferenças. Assim, no âmbito da educação Infantil, torna-se imprescindível, considerar a dimensãopolítica do projeto pedagógico na medida em que (...) todo o projeto de educação infantil devearmar a igualdade, entendendo que as crianças – também de zero a seis anos – são cidadãos dedireitos, têm diferenças que precisam ser reconhecidas e pertencem a “diversas classes sociais, vi -vendo na maioria das vezes uma situação de desigualdade que precisa ser superada”(grifo meus). (KRAMER, p.54-55).

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envolvem a “dimensão pedagógicado projeto político pedagógico”,sobretudo, na escola pública, taiscomo: alfabetização, educar ecuidar 10, organização do trabalhopedagógico e coletivo da escolaem sua totalidade, concepções deeducação, homem e sociedade,tratos teórico-metodológicos paracom o currículo, organizaçãodas disciplinas, tempos, espaços econteúdos-linguagens (KRAMER,2006, VEIGA, 2001).

Diante de tais inquieta-

ções, o texto tem como objetivocentral “problematizar”, trazer al-gumas possíveis reexões sobre o“Corpo em movimento nas “rotinas”da Educação Infantil”, buscando, na

medida do possível, uma aproxima-ção com os problemas concretosdo “educar e cuidar” do corpo em

movimento no ambiente educativodas creches. Estas reexões procu-

ram levar em conta a “produçãocultural das crianças” (PERROTTI,1995), as “crianças como cons-

trutoras de cultura” (SARMENTO,2007 p. 159), enm, as “culturasinfantis”(FERNANDES, 1961). Nestesentido, o conceito de “ culturasinfantis”11  é pensado a partir dapesquisa de Florestan Fernandes12 

(“As trocinhas do Bom Retiro”), naqual o autor arma que os gruposinfantis criam cultura própria, viva,transmitida boca a boca e que mes-mo que muitas vezes busque seuselementos na outra cultura mais

genérica do mundo dos adultos, em-

bora re-elaborem, de acordo com

suas necessidades, especicidades eimaginários, ressignicando, assim,as culturas infantis e emprestando a

10 Cuidado e Educação deve ser compreendido a partir da consideração da criança como pontode partida para a formulação das propostas pedagógicas para as políticas públicas (KUHLMANN JR., 2003). Assim, os nexos dessas funções: “Cuidar e educar” na educação infantil, deve levarem conta a especicidade das crianças de 0 a 6 anos, suas demandas, necessidades, produçãocultural etc, a partir da mediação pedagógica, cultural e social dos adultos (educadores , família,professores (as) e outros).

11 Segundo Sarmento (2007 p. 159) (...) A pluralização do conceito signica que as formas e conteú-

dos das culturas infantis são produzidas numa relação de interdependência com culturas societaisatravessadas por “reações de classe, gênero e de proveniência étnica” (grifos meus) que impedemdenitivamente a xação de um sistema coerente e único dos modos de signicação e ação in -fantil. Não obstante, a “ marca” da geração torna-se patente em todas as culturas infantis comodenominador comum, traço distintivo que se inscreve nos elementos simbólicos e materiais paraalém de toda heterogeneidade, assinalando o lugar da infância na produção cultural.

12 Florestan Fernandes (1961), um dos precursores a construção do debate sobre a cultura da in-

fância no Brasil, publicou, na década de 40, pesquisa intitulada “As ‘trocinhas’ do Bom Retiro”,na qual ele registrou os elementos constitutivos da cultura infantil local (Bairro do Bom Retiro). Apesquisa foi construída a partir de uma etnograa, realizada nos grupos de crianças de um bairrode operários em São Paulo. O autor, clássico da Sociologia Brasileira, conseguiu captar o processode socialização das crianças, o modo como estas constroem seus espaços de sociabilidade e quaisas características do que chamou de “culturas infantis”.

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estas um caráter próprio e diferenteda cultura dos adultos que serviramcomo referência e inspiração (Per-rotti, 1995 p. 22-23; SILVA, 2000).Portanto, Florestan Fernandes reco-

nhece a cultura infantil como umacultura constituída de elementosculturais especícos das crianças ecaracterizados por sua natureza lúdi-ca, fato este que rearma a ideia dacriança como “criadora de cultura” enão ser culturalmente passivo.

Deste modo, criança criacultura, ainda que seu trabalho nãoseja reconhecido pelos adultos, umavez que, na sociedade capitalista,somente os que “produzem” e “re-

produzem” o sistema econômicosão passíveis de reconhecimento, de

identicação (PERROTTI, 1995 p. 22-23). Neste sentido, os desaos éticosdaqueles/daquelas que educam ecuidam das crianças pequenas, de-vem resistir aos rumos impostos pelocapital, visando a construção deuma educação numa sociedade paraalém da barbárie, e, eu diria,“paraalém do capital”(MÉSZÁROS, 2005:

SILVA, 2003, KRAMER, 1999). Estesdesafios utópicos implicam umaética, na qual esteja implícita a ideiade uma formação cultural e humanaque assegure às crianças uma dimen-

são da experiência crítica e criativa(PINTO, 2000/2001: SILVA, 2003).

De fato, as crianças comsua cultura, ou seja, seus jogos, ges-tualidades e linguagens, mediadas

pela cultura dos adultos e, muitasvezes, para além desta, nos deixamimportantes legados sócio-culturais,éticos e estéticos, sinalizando comelementos ontológicos simbólico-reais para a construção de outromodelo de sociedade.

Diante disso, a EducaçãoInfantil deve aproximar-se das“especicidades”das crianças, ga-

rantindo, assim, a participação dascrianças, criatividade e autonomia,cujo desao de alteridade poderáser a compreensão da cultura infan-til como forma de ser, agir, sentiretc. Portanto, signica dizer que,a criança constrói/gera cultura nasformas “especícas” com que ex-plora o meio ambiente, estabelece

relações afetivas com outras crian-ças e com os adultos, comunica ecompreende sentimentos, valores,atitudes, ressignica objetos entreoutros; expressando-se através dediferentes conteúdos/linguagensculturais, tais como: palavras, ges-tos, olhares, choro, riso, silêncio,imitação(PINTO, 2000/2001 p.140). Em síntese, as crianças rea-

lizam processos de signicação eestabelecem modos especícos egenuínos de monitoração de suasações para além do senso-comume da expressão vulgar dos adultossobre a cultura infantil, que a en-tende apenas como um “mundoda fantasia” e não como modos deconstrução de significados pelas

crianças (Sarmento, 2007 p. 115).

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Ao abordar o corpo na Edu-cação Física e na Educação Infantilem geral, tendo em vista minhaspreocupações de caráter ontológicoe teórico-metodológico, lanço mãodo conceito de “cultura corporal”elaborada pelo Coletivo de Autores(1992) e suas possíveis articulações erelações dialéticas às reexões acercadas diversas dimensões do tempo,espaço, conteúdos/linguagens , “lúdi-co”, enm, do corpo em movimentono cotidiano das práticas pedagógicasda Educação Infantil. Esta relação dacultura corporal com essas dimensõesda vida cotidiana das crianças peque-nas, são de suma relevância, conside-rando que, no âmbito da sociedadecapitalista (pós-moderna)13, há uma

grande tendência a uma “fetichiza-ção” e “mercadorização” do corpo,das práticas pedagógicas (conteúdos/ linguagens), dos tempos, espaços edo lúdico em diversas instâncias daeducação formal e informal, pensadasna perspectiva do neoliberalismo(SILVA, 2001: SILVA, 2003). Nestalinha de reexão, cumpre lembrar

que “o culto ao corpo já não se

encontra em contradição com aalma: sucede-lhe e herda sua funçãoideológica (BAUDRILLARD apudGUIRALDELLI, 1996). Ou seja, háum duplo movimento que se traduzda seguinte forma o sujeito se reduzao corpo e a consumidor, e o própriocorpo se transforma em objeto deconsumo e consome coisas “próprias

do corpo de criança”(brinquedos,aparatos, roupas etc.) de maneirasque, no limite, o sujeito se tornaobjeto, se torna corpo mercadore corpo mercadoria. O sujeito é,então, este estranho elemento:corpo-que-consome-corpo (GHI-RALDELLI, 1996). Todavia, todo esteimbróglio, não se dá de forma tãomonolítica assim, pois há, também,em contrapartida, os sinais de ressig-

nicação, transgressão e resistência,anunciados nas produções culturaisdas crianças, através das possíveismediações críticas dos adultos e deseus imaginários e das possíveis “crí -ticas sociais” contidas nos “sonhosde criança”, com base nos “sonhosdesejados14 (SILVA, 2003).

13 Segundo Duarte (2004 p. 219-221) o pensamento pós-moderno fetichiza a individualidade aotransformar em condição humana o ceticismo, a fragmentação, o solipsismo, o subjetivismo e airracionalidade., Nestes temos, o pós-modernismo é a expressão teórica das profundas formas dealienação às quais estão submetidos os indivíduos na sociedade capitalista contemporânea. Assim,o pós-modernismo não se constitui numa crítica ao “fetichismo da individualidade”, mas sim aradicalização do fetichismo.

14 Para construir a ideia de sonho-desejado, levei em consideração a armação de Martins (1996),que arma: “o imaginário da criança não é um mero acervo de fantasias, mas a realidade peloavesso”. Isto signica dizer que “quando a cção possui nuanças reais e a concretude matizes ctí -cias, então, privilegia-se concomitantemente a “crítica social”(grifos meus) que os sonhos contéme a relidade social que os contém”.

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 Neste sentido, os sonhosdas crianças devem ser pensadosno limiar da exigência política eda ética que implica juntar, conse-

quentemente, a energia sucientepara confrontar o sonho, a vigília eo agir sobre o real, a partir da forçada imaginação individual e coleti-va. (BENJAMIN apud GAGNEBIN,1994 p.90), Estou me referindo,fundamentalmente, ao imaginárioinfantil, principalmente, aos jogosde papéis ou ‘faz-de-conta “(po-

lícia, e ladrão, médico, vendinhaetc.); brincadeiras essas que sãocaracterísticas das crianças que jásabem falar e que já são capazesde representar simbolicamente e

de se envolver numa situação ima-

ginária, de cujo processo poderãoemergir elementos ontológicos eteórico-metodológicos, de nature-za ético-estética, os quais poderãocontribuir para repensar o modelo

de sociedade no qual estamos inse-

ridos (REGO, 1995: SILVA, 2003).

Neste texto, privilegio aexpressão “cultura corporal”15, cujoselementos epistemológicos e ontoló-gicos estão fundamentados no mate-rialismo histórico-dialético e abarcao vasto campo de expressões corpo-rais e de signicativas formas de mo-vimento humano. Abarca, portanto,“o amplo e riquíssimo campo dacultura que abrange a produção de

práticas expressivo-comunicativas,essencialmente, subjetivas que,como tal, externalizam-se pelaexpressão corporal “(ESCOBAR,1995)”. Neste sentido, apesar daopção por este conceito, convémdestacar a existência nas pesquisasda Educação Física o de “cultura demovimento” que emerge da teoriado “se-movimentar humano”16 pro-

posta por Kunz (1994), com basena fenomenologia, bem como do“brincar e se-movimentar” defendi-da por Santos (2007). Além destes, oconceitos de “educação do corpo”proposto por Vaz e Richter (2005),com base na Escola de Frankfurt.17.

15 Utilizo este conceito, apesar das críticas de Kunz (1994 p. 19), que alega que os autores utilizam-se

deste conceito para denir uma “área de conhecimentos especícos da Educação Física”, fato esteque culmina por signicar que estes autores estariam reforçando o velho dualismo entre corpo emente e a redução do termo a uma “cultura” eminente “corporal”.

16 Esta teoria procura dar ênfase especial ao “ser-sujeito que se-movimenta”, enm o “homem quese-movimenta” na perspectiva de prática educacional “crítico-emancipatória”, que tem como umdos pontos centrais a “reexão do movimento enquanto “diálogo entre Homem e Mundo”. Destemodo, deve-se ampliar a concepção do “se-movimentar” enquanto acontecimento fenomenológi-co relacional, ou seja, como uma relação intencional de cores signicativas (KUNZ, 1994 p.74).

17 De acordo com esta teoria “os temas da “infância”, do “corpo” e da “educação” cruzam-se emum mosaico paradoxal, cuja tensão, aponta para a reexão de a infância e o corpo são observadoscomo “ outros da razão” , ou melhor, “como experiências que, em sua integridade, podem resistiraos imperativos da razão instrumental porque são lugares e tempos que afrontam o logocentrismoe o fonocentrismo” (RICHTER e VAZ, 2005 p. 81).

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Esses conceitos trazem suas contri-buições epistemológicas e ontológi-cas para reetir acerca das diversasdimensões do corpo em movimentodas crianças pequenas nas práticaspedagógicas da Educação Físicainserida na Educação Infantil.

Quando se trata da rela-

ção entre o corpo em movimentoe o jogo, há uma imbricada relaçãoentre imaginação, movimento e opapel do brinquedo no desenvolvi-mento infantil, conforme nos lembraVygotsky (1994): “a criação de umasituação imaginária não é algo fortui-to na vida da criança, pelo contrário,é a manifestação da emancipaçãoda criança em relação às restriçõessituacionais.” Neste sentido, tanto a

metáfora “exercício de ser criança”do poeta Manoel de Barros e a belaepígrafe de Gilka Girardello “Por quetoda criança precisa brincar (muito)”,pretendem emprestar ao texto a ideia

da “poesia como método”, pressu-

posto defendido por Roger Bastide(1983), ou seja, a poética comomais uma possibilidade de reexão

e análise sociológica crítica.

2. Sobre o corpo em Movi-mento na Educação Infantil:a cultura corporal e os con-teúdos/linguagens

Por que toda criança precisa

brincar (muito)?

aprendem a pensarnarrativamente: vou te contar.

aprendem a interagir: posso

brincar com vocês? 

aprendem a cooperar: dá a

mão que eu te ajudo.

aprendem a questionar: será

que é assim mesmo? 

aprendem a memorizar: vamos

ver quem pula corda até cem? aprendem a conhecer suas forças:

deixa que eu defendo.

aprendem a conhecer seus

limites: tô com medo.

aprendem a encorajar:

vem que eu te seguro.

aprendem a fazer julgamentos:

assim não vale.

aprendem a analisar: os grandesaqui, os pequenos ali.

aprendem a devanear: hã? 

2.1 O corpo em movimentona Educação Infantil

As preocupações sobre ocorpo vêm se tornando de forma

cada vez mais crescente e se carac-terizando, na atualidade, como umaimportante problemática multidisci-plinar e objeto de investigação nasCiências Sociais e Humanas (so-

ciologia, pedagogia, antropologia eoutras) (CRESPO, l980; LE BRETON,2007, SILVA, 2003: SILVA, 2001),cujas diversas abordagens o vêemcomo um o condutor para a com-

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preensão do corpo social. Assimé que as epistemologias sobre oshorizontes teóricos do corpo visam,primordialmente, compreender oseu signicado losóco, social,cultural, biológico, econômico,político e histórico, frente aos seusmúltiplos modelos de condutas eexpressão do corpo em movimen-

to, tais como: gestos, hábitos, ritos,enm, práticas corporais (SILVA,2001; SILVA, 2003; SANT’ANNA,l995). Esta muldimensionalidadedos “estudos sobre o corpo” soma-se aos chamados “estudos da crian-

ça” que, devido à complexidadedos conceitos de infância e criança,possuem diferentes enfoques para-

digmáticos advindos de diversasabordagens cientícas, tais como:losoa, sociologia, antropologia,psicologia, pedagogia e outras.

Na atualidade, há umagrande ênfase nos cuidados e estu-

dos sobre o corpo, provavelmente,pela emergência de um projeto delibertação deste, principalmente,considerando-se a sua utilizaçãocomo instrumento privilegiadode controle, opressão e censuradas condutas humanas, como porexemplo, no mundo do trabalho,educação, lazer, saúde e em outrasinstâncias da vida cotidiana. Há,simultânea e contraditoriamente, aidéia do corpo como portador de re-

pressões sociais e da mais profundaservidão e exploração humana en-

gendrados pelo capitalismo, comopor exemplo, o “corpo produtivo”,que opera através da mediação en-

tre o social e o biológico sob a égidedo trabalho socialmente necessário(trabalho produtivo) (MARX, 1980),cujo fim único é trabalhar para

manter-se e satisfazer as necessida-des básicas e, consequentemente,produzir/trabalhar para tornar maisrentável o capital. Nestes meandros,o corpo se transforma em mercado-

ria para atender às exigências dodesenvolvimento da ciência e dastecnologias, à expansão do mercadode produtos e serviços para o corpo,

à substituição da higiene pelo pra-zer, à identicação da personalida-

de com a aparência. O corpo, destamaneira, “adquire um novo valor econstitui, juntamente com a ciênciae o mercado, um novo arquétipo defelicidade” (SILVA, 2001). Medianteestes argumentos, o desafio doseducadores (as) e pesquisadores(as),que atuam nos ambientes educati-vos das creches, é pensar o corpoem movimento das crianças e dasociedade em geral, detendo-sesobre o corpo, “elaborando umacrítica contundente aos modos comos quais ele vem sendo concebidoe tratado, devolvendo-o à história,para que, neste movimento, seja

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possível ajudar a pensar não só aespécie humana, mas a sobrevivên-

cia do planeta. ” (SILVA, 2001).Emcontrapartida, é esse mesmo corposocial que, contraditoriamente,se insurge como emissário de ex-

pressão, utopia, liberdade, luta eresistência: o “corpo brincante”18

(SILVA, 2003). Dito de outra forma

e parafraseando a canção popular“o mesmo pé que dança o samba– vai a luta...”

Muitos estudos sobre ocorpo e, particularmente, a sociolo-

gia aplicada ao corpo, dedicam-seao inventário e à compreensão daslógicas sociais, culturais, políticase econômicas que envolvem o

corpo do homem em movimento(LE BRETON, 2007: SILVA, 2001:SILVA, 2003), tornando os estudossobre o corpo uma tarefa crítica ede caráter multi e interdisciplinar.Em vista disso, pensar o corpo e,

particularmente, o corpo das crian-ças pequenas, requer que, paracompreender as contradições queenvolvem o fenômeno da “condi-ção corporal” ou os “usos sociaisdo corpo”, ampliemos nosso olharpara as políticas do corpo, de formamacro e micro-social e num dado

tempo-espaço histórico. Neste

sentido, pode ser vislumbrada achamada “sociologia implícita docorpo”, na qual o pensamento so-

ciológico dedica-se, principalmen-

te, aos estudos “críticos” acerca da“degenerescência” das populaçõesempobrecidas oriundas da condi-

ção operária, de acordo com osestudos de Marx e Engels, como,

por exemplo, “A Situação da ClasseTrabalhadora na Inglaterra”.19 

O corpo contém contor-nos multidimensionais pertencentes

a uma determinada sociedade, querseja na história do trabalho huma-

18 De acordo com Silva (2003) O “corpo brincante” é o corpo da festividade, da celebração dos rituaisdo tambor que batem no coração, da criatividade, da ginga, do jogo, do carnaval, da infração doscódigos sociais monótonos contidos no cotidiano, da fantasia social que contém mistério e queproduz política e utopia, em suma, é aquele que se manifesta enquanto construtor de signos sociaissubversivos e resistentes à ordem alienante do capital. Trata-se, por conseguinte, do corpo portadorde outras subjetividades e que é produtor de outros tipos de riqueza da condição humana: a estética,os afetos, os desejos, os jogos, as danças, a contemplação, enm, a cultura(COX,1974:25-31).Ocorpo brincante é o corpo lúdico, ou seja, aquele que pensa, sonha, cria mundos e é capaz deassumir todas as responsabilidades de viver com liberdade: (...) o corpo lúdico nunca será reduzidoa objeto lúdico.Isso acontece na sociedade do trabalho produtivo. Corpo lúdico é o da criança que“faz coisas não-produtivas” (SANTIN, l994: 89).

19 Ver ainda os estudos de Villermé, G.Simmel, M.Mauss, M.Halbwachs, G.Friedmann e outros (LEBRETON, 2007).

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no, das gestualidades carregadas desofrimento, dor, desprazer, sacrifício,tortura, dominação e exploração ouainda, nas expressões corporais liga-

das ao prazer, ao estético, ao sensível,ao gozo, à festa, à cultura. Dito de

outro modo, ele é uma superfície naqual estão inscritos, tanto os desígniosda dominação e da mais degradanteservidão humana, o sacrifício, osestigmas do passado, os conitos, asrepressões, a dor, a alienação; quantoos desejos, os afetos, a alegria, os so-

nhos, o prazer, a luta, a transgressão,a resistência.O corpo é um suportede signos sociais (RODRIGUES, l980:62-64) e nele está inscrita a “cosmo-

logia da própria sociedade” (grifosmeus), estão marcadas todas as regras

e normas, os valores e a cultura deuma determinada sociedade. Comefeito, o corpo em movimento dascrianças pequenas, produz conteú-

dos/linguagens durante o processode desenvolvimento infantil, os quaisnão estão dissociados das possíveismediações com as políticas do corpodos adultos, da família, da mídia e

da sociedade como um todo. Aliás,quanto à mídia, há uma estreita rela-ção entre este fenômeno e o corpodas crianças em ambientes educati-vos. Neste sentido, Wiggers (2008)traz relevantes contribuições em seutexto “Infância e Mídia: crianças dese-

nham novas corporeidades?”. A auto-

ra discorre sobre as noções de corpoque emergem da cultura midiática

contemporânea, a partir dos desenhosrealizados pelas crianças na “EscolaParque de Brasília”; questiona os mo-

delos de “corpos em evidência” e aforma como a mídia e a escola veema corporeidade infantil, discutindoas representações construídas pelascrianças e sugerindo que o espaçoda arte possibilite “desenhar outrascorporeidades”.

Diante dessa questão, pen-

so que, no corpo das crianças, nascreches ou fora delas, no âmbitodas diferentes classes sociais, dealgum modo, está reverberada a‘cosmologia”, os valores, as marcas,as práticas sociais, enm, o ethosda sociedade na qual vivemos. Háinúmeros exemplos acerca da ideia

de que, na infância, as marcas sociaiscam impressas e estampadas, in-

dependentemente, da classe social,nas subjetividades dos corpos dosseres sociais na sociedade capitalis-

ta. Posso exemplicar aqui, usandoas metáforas já referenciadas deEduardo Galeano (1996), ao dizerque: “as crianças pobres são tratadas

como lixo, as da classe média atadasàs patas da televisão e as ricas comose fossem dinheiro”. Nesta linha deraciocínio, refiro-me aos dilemase “múltiplos constrangimentos”(SILVA, 2003) a que são submetidasas crianças empobrecidas, explo-

radas pelo trabalho infantil e pelaprostituição infantil; as chamadas“crianças-agenda” das classes médias

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e, por m, as ricas que vivem “apri-sionadas” nas ilhas de opulência eostentação: os condomínios fecha-dos. Em todas essas classes, estãoimpressas as marcas da educaçãoimplacável do corpo engendradaspelo capitalismo. Contudo, em meioa esta barbárie social, as tatuagenshistóricas que mais se destacamsão as marcas do “envelhecimentoprecoce” no corpo das criançastrabalhadoras, cunhadas a ferro ebrasa pela exploração capitalista.Diante dessas evidências, pergunto,a título de indagação, às leitoras eaos leitores que atuam na EducaçãoInfantil e aos educadores em geral:O que tem a ver todas essas ques-tões com o corpo em movimento

das crianças nas rotinas das crechesda rede Municipal de Educação deFlorianópolis?

Feitas essas consideraçõesiniciais acerca da relação corpo e so-ciedade, faz-se necessário voltarmoso olhar para as “especicidades” docorpo das crianças pequenas nas“rotinas” que envolvem o corpo eo movimento em ambientes de cre-

che (SAYÃO, 2004)”. Porém, antesmesmo de adentrar nesse ambienteeducativo, urge não esquecer os di-versos fenômenos sociais, culturais,políticos, culturais e econômicos

que engendram, retratam e, acimade tudo, maltratam, cotidianamen-te, as crianças de diferentes classessociais, além de raça/etnia, cultura,gênero etc., principalmente, asoriundas da classe trabalhadoraempobrecida que estão, sobretudo,nas creches públicas. Refiro-meà exploração do trabalho infantil,meninos e meninas “na” rua e “emsituação de rua”, prostituição infan-til, violência generalizada contracrianças, pedolia, maus-tratos físi-cos e psicológicos, tráco de bebês,as chamadas “crianças de agenda”,as crianças-alunos (as) do ensinofundamental, as crianças modelose artistas mirins do circo e da tele-visão (MELRO, 2007), as crianças

imersas no mundo da esportivi-zação precoce (CHAVES, 2005),das crianças pequenas da ginásticaartística e de outros esportes, enm,em tantas outras manifestaçõesartístico-culturais em geral.

2.2 O corpo em movimento, acultura corporal e os “conteúdos/conhecimentos/linguagens”20 naEducação infantil.

A cultura corporal pode

ser compreendida como o objetode estudo que abarca o acervo de

20 Faço esta junção entre “conteúdo” , “conhecimento”e “linguagem” por entender que a expressão“conteúdos” com base na cultura corporal, representa a materialização dos conhecimentos eexperiências culturais e sociais ligadas ao corpo em movimento. Produzidos ao longo da históriapela humanidade

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formas de representação do mundoque o homem tem produzido nodecorrer da história, constituindo-se em um vasto campo de expres-sões corporais e de signicativasformas de movimento humano,exteriorizadas pela expressão cor-poral, que se manifestam atravésdos jogos, danças, lutas, exercíciosginásticos, esportes, malabarismo,contorcionismo, mímica e outrosque podem ser identicados comoformas de representação simbólicasde realidades vividas pelo homem,historicamente criadas e cultural esocialmente desenvolvidas (COLE-

TIVO DE AUTORES, 1992, p. 38).A cultura corporal se constitui em

um amplo e rico campo da cultura

que abrange a produção de práticasexpressivo-comunicativas, essen-

cialmente, subjetivas que, comotal, externaliza-se pela expressãocorporal (ESCOBAR, 1995). Estaexpressão corporal se manifestaatravés do movimento criativo e crí -tico, constituindo-se num elementoprimordial que contribui para o pen-

samento da criança, “contrapondo-se ao movimento considerado ape-nas como manifestação mecânicae neurológica” (WALLON, 1968).Para este autor:

O corpo e o movimento,ou seja, o corpo em movimento,é de natureza social, cultural,biológica, e histórica, pois é porintermédio desta simbiose dialé-

tica que é construído o desenvol-vimento das crianças pequenas,que se dá, portanto, na dimensãoespaço-temporal e histórico social.O desenvolvimento ocorre numprocesso contínuo e descontínuo,provocando e detonando a com-plexa maturação do sistema nervosoda criança, tendo em vista o seuacabamento e formação individual,tendo como função um misto dasrelações e correlações entre ação ea sua representação. Neste limiar, omovimento que é a abstração pen-

sada e o pensamento é o resultadodas relações entre o biológico e osocial (GALVÃO, 1995).

Na Educação Infantil, a

cultura corporal, com base na “con-

cepção dialética do desenvolvimen-to infantil defendida por Wallon(1968),  há uma intrínseca relaçãoentre o corpo-sujeito-criança, o

 jogo, a imaginação e a “motricida-

de expressiva”. Na perspectiva das“dimensões do movimento” wallo-

niana, o ato motor, o mundo físicoou “motricidade de realização” e

o mundo do movimento têm umpapel fundamental na afetividadee também na cognição. Nestaperspectiva teórica, há uma ênfasena “motricidade expressiva”, ou“expressão corporal” (COLETIVODE AUTORES, 1992) que se vericana dimensão afetiva do movimento.De acordo com Wallon (1968), asdiversas dimensões do movimento

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da criança possuem uma enormediversidade de signicados, levandoem conta o corpo em movimentoou o “deslocamento do corpo (de

segmentos ou do todo) no espaço,cuja dinâmica se dá através dasseguintes funções; a) a “função ci-nética”, que regula o estiramento eencurtamento das bras muscularesque, por sua vez, é responsável pelomovimento propriamente dito: b) a“função postural ou tônica” que temcomo atribuição regular a variaçãodo grau de tensão (tônus) da muscu-

latura (WALLON ,1968 ; GALVÃO,1995). Este processo acontece daseguinte maneira: antes de agirdiretamente sobre o meio físico,sobre o espaço, o movimento atua

sobre o meio humano, mobilizandoas crianças nos primeiros anos devida, por meio da imaginação eda expressão, isto é, da dimensãoafetivo-córporea (WALLON, 1968;GALVÃO, 1995). Porém, aproxima-

damente, no nal do primeiro anode vida, com o desenvolvimentodas “praxias” (gestos de pegar, em-

purrar, abrir ou fechar), é que seintensicam as possibilidades domovimento como “instrumento deexploração” (grifos meus) do mundofísico, voltando à ação da criançapara a adaptação à realidade obje-

tiva. Nesta perspectiva, o corpo dacriança pequena, em movimento,vai, dialeticamente, articulando asdimensões corpórea, afetiva, ex-

pressiva, emocional e cognitiva.Este processo vai se reali-

zando, paulatinamente, através do“controle do movimento”, no qualhá uma redução da motricidadeexterior e o ajustamento progressi-vo do movimento ao mundo físico.Deste modo, iniciam-se as situaçõese possibilidades de “controle volun-

tário do ato motor”21. Neste contex-

to, a “ação sobre o mundo físico”não acontece de forma etapista,mas cíclica e a partir da dimensãotempo-espaço. Neste sentido, odesenvolvimento da dimensão

cognitiva do movimento sem, ne-cessariamente, separar-se das outrasdimensões, vai tornando a criançamais autônoma para agir sobre arealidade exterior, diminuindo, as-sim, a dependência do adulto queantes “intermediava” (grifos meus)a ação da criança pequena sobreo mundo físico (WALLON, 1968;

GALVÃO, 1995 ).Falar   do corpo em mo-vimento das crianças nas crechese em seus diversos conteúdos/ linguagens implica levar em consi-deração alguns princípios político-

21 Wallon denomina esse aspecto de “disciplinas mentais” ou “capacidade de controle do sujeito

sobre as suas próprias ações” (GALVÃO, 1995 p.75).

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pedagógicos que, a meu ver, estãona dimensão ético-estética, princi-palmente, quando se trata de umaeducação de natureza histórico-cul-tural. Quanto a esse respeito, Rocha(2008), conforme texto publicadoneste livro22, traz para o debate aquestão “princípios estéticos dasensibilidade, da criatividade, dolúdico e da diversidade de mani-festações artísticas e culturais” noâmbito dos conteúdos de ação pe-

dagógica. De acordo com a autora,antes de tudo, é preciso rearmar “oreconhecimento da especicidadeda educação infantil como primei-ra etapa da educação básica, cujafunção sustenta-se no respeito aosdireitos fundamentais das crianças

e na garantia de uma formação in-tegral orientada para as diferentesdimensões humanas (lingüística,intelectual, expressiva, emocional,corporal, social e cultural)”.

Isto posto, o esforço daEducação Infantil seria, então, reali-zar ações educacionais intencionais,orientadas de maneira a contemplar

cada uma destas dimensões comonúcleos da ação pedagógica ou

campos de experiência educativa,para além dos chamados “conte-

údos” estanques e pensando em“conteúdos de ação”23. A partir deuma denição dos “núcleos de açãopedagógica”, os conteúdos de ação,(Linguagem: gestual, corporal, oral,sonoro-musical24, plástica, escrita e,eu acrescentaria, cênica25) devem,portanto, orientar os objetivos geraisde cada âmbito e suas consequênciaspara a prática docente (ROCHA,2008). Neste sentido, os conteúdosde ação, para além de uma “pedago-

gia da infância anti-escolar”, tambémpodem ser compreendidos como

produção humana, que articula,dialeticamente, conteúdo, conhe-

cimento e linguagem, rearmando,

assim, a necessidade de valorizar oensino, sobretudo, no âmbito dasinstituições públicas de EducaçãoInfantil, nas quais conteúdos, co-nhecimentos e linguagens devemser democratizados a partir da inter-

venção/mediação crítica e criativa doprofessor ou da professora.

Em outra perspectiva teóri-

co-metodológica, Ódena (1995), emseu livro “Infancia y Escuela de 0 a 3

22 Rero-me ao texto “Diretrizes Educacionais – Pedagogia para a Educação Infantil” (2008).23 “Conteúdo da ação” denido aqui com o objetivo de detalhar os âmbitos de experiência en -

volvidos na ação pedagógica, diferente do conteúdo do currículo da escola elementar, por nãoconstituir-se num programa por disciplinas, com base em processos transmissivos com ns determinalidade única e conclusiva.

24 Sugiro a obra musical de Paulo Tati “A palavra cantada” entre outras.25 Rero-me à “Contação de Histórias”; ver o livro Stela F. Battaglia “Metamorfoses em histórias in-

fantis: A magia da palavra e do corpo em Movimento” e aos jogos dramáticos nos livros de ViolaSpolim (2000) e Augusto Boal(1996).

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años”, referindo-se às “atividades”enão às “linguagens”, adverte-nosque é muito difícil responder à per-gunta “qué actividades para niñospequeños? Para ela, isto se dá,considerando-se que se trata de umaquestão complexa e vasta, uma vezque {...} las actividades y juegos po-sibles en estas edades son muchos yvariados, como son las variacionesintroduce el talante y la experienciade cada maestra, el entorno “culturaly social’ (grifos meus)26 de los niñosy las circunstancias en que realizan(1995). Apesar de não ser possívelenquadrar os conteúdos/linguagensnum rol de experiências corporais ede movimento, tendo em vista a suadiversidade e os diversos contextos

sociais, culturais, políticos e peda-gógicos das creches, onde estãoinseridas as crianças, apresento, aseguir, algumas experiências ou“atividades que envolvem o corpona Educação Infantil”, com vistasa reexão e ressignicação destaspráticas pedagógicas cotidiana dascreches da Rede Municipal de Edu-cação de Florianópolis, a partir dasideias da autora supracitada:

a) Actividades de “movimien-

to”, todas las que implican la

acción integral del cuerpo (in-dividualmente o em grupo, condesplazamiento o salto, colum-

piándo-se o bailando...);b) b) “actividades de conoci-miento y de observación de larealidad”, que implican bási-camente un trabajo del pen-

samiento (la naturaleza y sus

denômenos, las ciencias y suaplicación concreta em la vidadel nino...);c) “actividades de lenguage”,como aquisición de la palabray como enriquecimiento pro-

gresivo de su uso: como ins-

trumento de conocimiento de

la realidad y de comunicacióncom los otros (cuentos, cancio-

nes, imágenes, etc.);d) “Juegos de manipulación”, to-

dos aquellos en los que se utilizanbásicamente las manos (construc-

ciones, plástica, juegos sensoria-

les, juegos didácticos, etc.);e) “Juegos de tema” o reprodu-

ción de la realidad por imitaci-ón o simbolización;

f) “Actividades de expressióncorporal y dramatización”;g) “Salidas al exterior”:

26 Os grifos são para chamar atenção para os fatores que podem inuenciar a cultura corporalinfantil e as linguagens corporais e de movimento das crianças. Penso que, para além dos aspectossociais e culturais, quando se fala das creches da Rede Municipal de Florianópolis, é necessárionão omitir o caráter de classe das crianças e suas famílias. Dito isto, há também aspectos políticose econômicos – articulados com os sociais e os culturais, os quais poderão resultar numa dimensãoético-estética sobre a cultura corporal das crianças.

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h) “Fiestas populares;i) “Actividades que educan loshábitos de autonomia e convi-vencia.

Esses conteúdos/conheci-mentos/linguagens têm um papelcentral nos núcleos de desenvolvi-mento de ação, considerando querepresenta a base para o estabeleci-

mento das relações culturais no âm-

bito das relações dialéticas sociaise dialéticas de alteridade a partirda mediação entre adulto-criança,criança-criança e criança-entornosocial (comunidade). Cumpre, en-

tretanto, também lembrar professo-ras e professores tanto de “sala deaula” quanto de Educação Física eoutras matérias de ensino, que não

se trata de uma “prescrição” de“atividades”- mas eixos que possampensar o corpo em movimentodas crianças pequenas (culturacorporal), sem se constituir numreceituário estanque de atividadese conteúdos meramente “didáti-cos”, normalmente, propostos semnenhuma contextualização com as

condições objetivas das crianças,professores e professoras, família,enm, do próprio projeto políticopedagógico das creches.

Os conteúdos/conheci-mentos/linguagens expressivo-mo-

trizes: cênicas (jogos dramáticos

e simbólicos), gestuais, corporais,oral, sonoro-musical27, plástica eescrita, envolvem comunicação,imaginação, processos de criação eo domínio dos sistemas simbólicos

 já organizados na cultura, enm, nasculturas infantis. A diversicaçãodesses conteúdos/conhecimentos/-linguagens objetiva: a) a expressão eas manifestações das culturas infantisem relação com o universo culturalque lhe envolve; b) o domínio designos, símbolos e materiais; c) aapreciação e a experiência literáriae estética com a música (na escutae produção de sons, ritmos e melo-

dias), com as artes plásticas e visuais(na observação, exploração e cria-

ção, no desenho, na escultura, na

pintura, e outras formas visuais comoa fotograa, o cinema, etc.); d) com alinguagem escrita, no sentido de umagradual apropriação desta represen-

tação (no momento, com ênfase nacompreensão de sua função social esuas estruturas convencionais em si-tuações reais) em que se privilegie anarrativa, as histórias, a conversação,

apoiadas na diversicação do acessoa um repertório literário e poético(ROCHA, 2008). 

Quando advogo a ideia decultura corporal e suas articulaçõescom o que chamei anteriormentede “conteúdos/conhecimentos/-

27 Quanto aos conteúdos/linguagens sonoro-musicais sugiro o livro/CD “Operêtanimal: de autoriade Guerra Filho (2007).

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linguagens”28

, estou me referindoaos diversos conhecimentos re-

pletos de conteúdos e linguagenscorporais, tais como: dança29, luta,esportes, jogos, artes plásticas, cê-

nicas, circences e outras formas de“conteúdos culturais”, isto é, mani-festação das expressões corporaise de produção da vida materiale imaterial. Assim, considerandoesses argumentos, penso que con-

teúdo e linguagem se amalgamampara dar sentido à vida dos seressociais. Os “conteúdos culturais”30,constituem-se num patrimônio deconhecimentos, políticas do corpo,arte e estética produzidos ao longoda história pela humanidade. Por-tanto, esses conteúdos não existem

de forma abstrata, fora da realidadeda vida cotidiana. Neste sentido,há uma mútua relação de determi-nação, ou seja: a mesma realidadesocial que determina a apropriação

ou mesmo a criação de conteúdosculturais é por eles também determi-nada. Os conteúdos culturais e suasdiversas linguagens sócio-culturaise políticas, podem, de um lado,reproduzir as relações de controle,dominação e disciplina existentesna sociedade; de outro lado, adepender dos signicados e senti-dos que estão subjacentes a estesconteúdos, podem constituir-se emmanifestações de resistência e rup-

tura à essas relações. Sendo assim,pode-se concluir que, a realidadesocial produz “conteúdos culturais”,constituindo-se em construções his-tóricas e que, por serem históricas,são, simultaneamente, passíveis demudanças: sociais, culturais, políti-

cas e econômicas (VAGO, 1995 p.27-2931; SILVA, 2003).

Os conteúdos culturais, nomeu entender, devem ser pensados apartir do encontro do comportamen-

28 Também chamados de “conteúdos/saberes” na perspectiva da Educação Infantil de 0 a 6 anos, quenão são concebidos, divididos em disciplinas pré-xadas por um currículo nacional, conforme oReferencial Curricular Nacional para a Educação Infantil de 1998.

29 Ver a esse respeito a Dissertação de Mestrado , produzida por Elaine Cristina Pereira Lima, intitu -lada “Que dança faz dançar a criança? Investigando as possibilidades da improvisação na Educa-ção Física”, Programa de Pós-Graduação em Educação Física, Março/2009.

30 Essa expressão encontra-se nas pesquisas e publicações do grande teórico da Sociologia do Lazer, Joffre Dumazedier, como por exemplo o livro “Valores e Conteúdos culturais do lazer”. De acordocom esse autor os conteúdos culturais abarcam os chamados “interesses do lazer” (físicos, artísti-cos, intelectuais, práticos e sociais) (DUMAZEDIER, 1980 p. 111-175) Contudo, essa ideia, no âm-

bito do usufruto desses interesses do lazer, é criticada por Marcellino (2001 p.122), uma vez que,segundo ele “os interesses compõem um todo interligado e não formado por partes estanques”.

31 Considero pertinente as ideias deste autor, sobretudo, na sua defesa do ambiente escolar e, nestecaso, também da Educação Infantil, enquanto espaço-tempo das experiências dos valores e conte -údos culturais do lazer, principalmente, se for de forma crítica e criativa aos valores mercantis dachamada “Sociedade do espetáculo”(DEBORD, 19970

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to “práticos-morais, éticos,32

 estéticose políticos (ex: valores ético-políticosdo corpo) e de uma idéia de rela-

ções sociais de alteridade do pontode vista de classe, geração, gênero,raça/etnia e cultura, os quais devempossibilitar que adultos e crianças,através das diferentes formas deexperiência humana ou formas decomportamento humano, possamapropriar-se da produção materiale espiritual, dos conhecimentoscientícos e artísticos e básicos dacultura corporal. E isso só é possívelquando se leva em conta a noçãode uma alteridade ampliada em di-

álogo com a ética, que se baseia nadiversidade de relações dos homensentre si: econômicas, políticas, jurí -

dicas, morais etc. (VÁSQUEZ, 2008p. 88). Assim. todas essas formasde produção material e imaterial,de acordo com o tipo de “atos

humanos”(arte, religião, política,moral) nesta ou naquela sociedadeou numa época determinada, estãointimamente relacionadas.

Quanto à estética, sou da

opinião que, quando está em debateo corpo em movimento e a culturacorporal das crianças das creches pú-

blicas, quando se trata de formaçãohumana de educadores (as) que me-

deiam as práticas pedagógicas nosambientes das creches, necessáriose faz um outro entendimento sobreos fenômenos estéticos, articuladoscom as dimensões éticas e axiológi-cas (valores) da condição humana.Neste caso, penso que o objeto daestética, compreendida em suasdimensões objetivas e subjetivas,gerais e particulares, deve ser arti-culado com os conceitos críticos deinfância e criança, assim como coma materialidade dos problemas pe-renes da Educação Infantil (rotinas,tempo, espaço, formação humana elúdico) já mencionados por Sayão(2004). Nestes meandros, destaca-

se: a divisão social dos produtosestéticos, como por exemplo, a artepopular e arte erudita, o objeto daestética, baseando-se na análise daarte e dos conteúdos culturais (con-

teúdos/linguagens: dança, música, jogos etc.), enquanto fenômenos econstruções histórico-culturais. Nes-te sentido, a educação estética pode

ser compreendida como uma formade interpretação da arte e da buscade sua essência durante o processo

32 Segundo Vasquez (2008) a ética é um campo de estudo que é constituído por “um tipo de ‘atoshumanos’(grifos meus): os atos conscientes e voluntários dos indivíduos que afetam outrosindivíduos, determinados grupos sociais ou a sociedade no seu conjunto”. Para o autor, o problemaprático-moral refere-se ao que fazer em cada situação concreta. Em contrapartida, “denir o que ébom não é um problema moral cuja solução caiba ao indivíduo em cada caso particular, mas umproblema geral de caráter teórico, de competência do investigador da moral, ou seja, do ético”.

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de  formação do “sujeito estético”(NETTO e FERNANDES, 1992 p.191), ou seja, do sujeito-ético-políti-co-estético-criança produtor de cul-tura e história. Este argumento trazconsigo a ideia da relação recíprocaentre arte e sociedade, arte e huma-nidade, cujos pressupostos ontoló-gicos e epistemológicos podem serpensados a partir “da especicidadeda relação estética do homem com arealidade”, ou seja, a comunicaçãodo homem com os objetos estéticos,obras de arte, produtos do “design”,as outras pessoas e a natureza, bemcomo, a especicidade da atividadeestética humana orientada para atransformação da natureza, do ho-mem e da sociedade.

Em suma, a estética mate-rialista histórico-dialética, procuraabarcar as características e as leismais gerais do “desenvolvimentoda relação estética do homem coma realidade” (grifos meus), isto é, asdiversas formas de comunicação e daatividade estética.(OVSIÁNNIKOV,1978 p8). Sob esta ótica, pode-seconcluir que, a estética capitalistadeve ser superada para além do va-lor estético mercantil, que expressaaspirações individuais e liberais de

prestígio de seus proprietários e queconrmam o seu “status”social”. Istosignica, construir uma experiênciaestética, verdadeiramente cientíca,que ponha em destaque a naturezados fenômenos estéticos, incluindoa arte e sua imbricada articulaçãocom a vida social e as necessidades,demandas e interesses dos diversosgrupos sociais e a “educação estética”dos trabalhadores(OVSIÁNNIKOV,1978 p8), como por exemplo, o teatropopular de Berthold Brecht e o “teatrodo oprimido”de Augusto Boal.

Pensando desta maneira, acultura corporal poderá possibilitarao sujeito-criança, ao mesmo tempo,aprender com a história, com os li-vros, com o cinema, com a música,

com a dança, com o teatro, enm,com as diferentes linguagens daarte, com a cultura local e universalconstruída pela humanidade.33 Sig-nica dizer que, na escola básica,essas experiências e produções seconstituem num vetor de formação eprodução cultural humana – impres-cindíveis para enfrentar os desaosimpostos pela lógica reicada, nostempos e espaços, nos quais ascrianças teimam em fazer “exercíciosde ser criança” (BARROS, 1999) à

33 Este desao implica, se levarmos em consideração a multidimensionalidade dos chamados “Estudosda Criança”, realização do entrecruzamento de diferentes áreas, tais como: educação, psicologia,antropologia, sociologia, história, saúde, serviço social, educação física, lingüística, arquitetura,artes e letras; visando abordar a criança em sua totalidade, na qual a brincadeira, as interações eas diferentes linguagens são o eixo do trabalho pedagógico da Educação Infantil.(SOUZA NETOe HUNGER, 2006 p.276).

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revelia da lógica engendrada pelosistema capitalista (KRAMER, 1998;PERROTTI, 1990; SIVA, 2003).

Nestes termos, os desa-

fios e o papel da escola básicasão promover a formação cultural,ético-estética e política, a partirdos valores ético-estético-políticosdo corpo, não só das crianças pe-

quenas, mas dos jovens, adultos evelhos trabalhadores que constroema escola pública, em particular,as creches públicas. O desao éarticular as políticas do corpo emmovimento e a arte como resistên-cia às mercadorias da indústria doentretenimento e da “sociedade do

espetáculo (DEBORD, 1997), ten-

do como eixo crítico e criativo as

políticas culturais e educacionais,tais como: a literatura, o teatro, ocinema, a poesia, a música, enm,as conquistas da mídia e da infor-mática, enquanto instrumentos deemancipação e resistência à bar-bárie social, cultural, econômica epolítica. Esta luta civilizatória visaconstruir como seres humanos críti-

cos, criativos e políticos – uma outraética e estética – capazes de, nessemovimento de subversão, superar as“desigualdades sociais” (diferençasde classe) e as “diferenças” (diferen-

ças de gênero, geração, raça/etnia ecultura)34 que, de algum modo, se

reverberam nas creches, nas esco-las em geral, nas universidades, nafamília, na mídia e na sociedade emgeral (KRAMER, 1998; SILVA, 2003).Aliás, quanto a esse respeito, pensoser imprescindível, saber separar o

 joio do trigo, pois a “desigualdadesocial” têm como pressuposto onto-

lógico e ideológico a categoria classe

social, enquanto que a “diferença”,diz respeito às diversas dimensõesda condição humana, a saber: raça/ etnia, cultura, geração, gênero e ou-

tras, podendo, entretanto, articular-se com classe social. Sendo assim,quando se pensa nas crianças, aalteridade, na esfera societal do capi-talismo neoliberal, assume caminhos

ontológicos multidimensionais paraalém do pensamento “politicamentecorreto” que fetichiza a “celebraçãoda diferença” e da “inclusão social”(SILVA, 2003) e, ainda, da alteridade,compreendida, enquanto, meramen-

te, geracional e intergeracional, pos-to que “a diculdade, dentro da óticaneoliberal, é trabalhar a dimensão da

alteridade. Alteridade é ser capaz deapreender o outro na plenitude da

sua dignidade, dos seus direitos e,sobretudo, da sua diferença. Quantomenos alteridade existe nas relaçõespessoais e sociais, mais conflitosexistem” (FREI BETTO, 2000).

34 Estas questões estão, parcialmente, presentes em Freitas (2006).

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3. Cultura corporal e o tem-po do lúdico na Educaçãoinfantil

Por que toda criança

 precisa brincar (muito)?

aprendem a fazer analogias:

aquela nuvem não parece

um cavalo?aprendem a organizar: ó que legal

a minha la de

carrinhos.

aprendem a fazer cultura:

vamos brincar de

inventar piada?

aprendem a compartilhar: pega

essa boneca que eu

 pego aquela.aprendem a perdoar:

tudo bem, já passou.

aprendem a desbravar: vamos ver

o que tem lá?

aprendem a construir: era uma

vez uma cidade assim.

aprendem a destruir: vamos

desmanchar pra

fazer outro.aprendem a sentir: quei com o

olho cheio d’água.

aprendem a rir: ra-ra-rá, lembra

aquela hora?

Antes de iniciar as

reexões em torno da relação entreo tempo do lúdico das crianças,considero ser essencial fazer alguns

lembretes sobre o uso da palavralúdico de forma indiscriminada naeducação. Quanto a esse respeito,Nelson Carvalho Marcellino, nolivro organizado por ele “Lúdi-co, Educação e Educação Física”(1999), chama a atenção pelos usose abusos da palavra lúdico. O autorchama a atenção ao fato de quegrande parte da literatura que trazem seu bojo o verbete “lúdico”, ofaz a partir de jogos de palavras e,sobretudo, a partir da restrição danatureza do lúdico ligada à esferade uma atividade determinada. Eledestaca algumas considerações queterminam por caracterizar o lúdicocomo jogo, brincadeira e brinque-

do ou, ainda, como uma palavra

eivada de subjetividade e às vezesde pouca problematização sobreos seus sentidos e signicados: fatoeste que culmina pela compreensãodo lúdico, enquanto uma entidadeabstrata e auto-explicativa. Umadas considerações reside no fatodo lúdico trazer consigo uma fortecarga subjetiva com base em abor-

dagens idealistas, essencialistas,funcionalistas e utilitaristas. Porm, Marcellino (1999) desconstróiessas abordagens do lúdico “em simesmo” ou, de forma isolada, nessaou naquela atividade (brinquedo,festa, jogo, brincadeira, etc.), op-

tando pela concepção do lúdico“enquanto um componente da cul-tura (entendida em sentido amplo)

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historicamente situada”. Em outrolivro seu, Marcellino (1990) forja aideia de “furto do lúdico”, critican-

do a restrição do tempo e espaçopara a criança, cuja consequênciaé a redução da cultura infantil,basicamente, ao consumo de bensculturais, não produzidos “por ela”,mas “para ela”. Essa produção dacultura lúdica é pensada segundoo critério dos adultos, fato este quecontribui para a transformação dobrinquedo em mercadoria e para ocomprometimento da “evasão doreal”, que possibilita a imaginaçãode novas realidades.

Feitas essas considerações,vamos ao “tempo do lúdico”. Otempo do lúdico, aqui compreen-

dido, traz consigo uma concepçãode infância a partir e para além dehorizontes emancipatórios geracio-nais, considerando-se que, brincarnão é só inerente às crianças – mastambém aos adultos; anal, “brincaré uma maneira de ser do homem”(SCHILLER, apud MARCUSE, 1969).Neste contexto ontológico, o lúdico

deve levar em conta os direitos dascrianças e de seus pares (os adultos)a partir da produção cultural queelaboram,ensejando intervir ativa-

mente no processo sócio-culturale político de construção crítica ecriativa da cidadania. Essa reexãoé de tamanha importância, principal-mente, pelo fato de estarem inseridasnuma sociedade, cuja lógica societal

opera atr avés da cultura da acumu-lação, do lucro a qualquer custo, davelocidade, da competição e não dalentidão, do acuramento dos senti-dos e da qualidade das ações sócio-culturais. Pensando deste modo, olúdico passa a ter uma dimensão desubversão aos valores mercantis enão na perspectiva da diversão ou

entretenimento estéril e utilitarista ,valores estes ainda muito impregna-

dos na Educação das crianças. Emoutras palavras:

(...) O tempo de produção, as-sociado com o tempo de circu-

lação da troca, forma o concei-to de tempo de giro do capital.

Este também é de uma magni-tude de importância extrema.Quanto mais rápida a recupera-

ção do capital posto em circula-

ção, tanto maior o lucro obtido.As denições de organizaçãoespacial eciente e de tempode giro socialmente necessáriosão formas fundamentais queservem de medida à busca do

lucro – e ambas sujeitas à mu-dança (Harvey, l998: 209).

Como se pode observarnas diversas instâncias da vidacotidiana (econômica, cultural,política e social), a racionalida-

de capitalista interessa-se apenas

pelo tempo de produção, o tempodescartável, fragmentado, mercan-

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tilizável/mercantilizado, como porexemplo, o tempo do “produtivismoneoliberal” na chamada “universi-dade operacional” (CHAUÍ, 2000),cujos pressupostos ideológicos eeconômicos são reproduzidos pelas

universidades brasileiras, atravésdas políticas cientícas da CAPES edo CNPq. Tempo este que, aliadoà perspectiva do espaço, passou ase constituir, salvo exceções, comoinstâncias departamentalizadas eherméticas de produção do conhe-

cimento em série (“papers”), semgrande relevância social e granderelevância meramente “acadêmica”eem série (“papers”). Toda esta dinâ-

mica perversa se verica a luz docontrole dos tempos e movimentos

que se mescla ou é sobreposta natentativa de apropriação da subjeti-vidade do trabalhador(professores,servidores-técnico-administrativos,estudantes) pela lógica empresarialdo capital sob a égide de uma infamecompetitividade e da “meritocra-

cia”, com o m único de perpetuaro capital (LINHART, 2007; SILVA,

2006: CHAUÍ, 2000). Estas reexõescríticas, de caráter “radical”, visam,essencialmente, não cindir a forma-

ção “prossional” e supostamente“humana” engendrada pela universi-dade, com o processo de “formaçãocontinuada” de professores e pro-

fessoras que atuam nos ambientesda Educação Infantil, uma vez que,pelo que mostram as aparências e

evidências empíricas, há reprodu-ções e semelhanças com a lógicaneoliberal das universidades.

Como se pode intuir, a ra-

cionalidade capitalista, impregnadanas instâncias e práticas educativasdas instituições, despreza por com-pleto o tempo dos homens; o temposocial, qualitativo; tempo subjetivoe agente de criação, história e cultu-

ra; tempo total, integral, simultâneo,passado, presente-futuro fundidosem instantes de plenitude; tempode repetição criativa dos jogosinfantis, tempo de lentidão, da con-templação; tempo do lúdico; tempoda “formação humana” e não umtempo para adaptação passiva dosindivíduos às exigências do capital

e na sua consequente perpetuação,oriunda das políticas educacionaiscentradas no treinamento de indi-víduos a serviço da organizaçãodo mercado (MARTINS, 2007 p.53-55) ; tempo do “corpo brincan-

te”, lento, preguiçoso, não alienadopelo “prazer fetichizado” – mas ocorpo construtor do prazer qualita-

tivo, enquanto resistência à lógica“produtiva”; corpo que subverteo fetiche do dinheiro e da merca-

doria; enm, o tempo “kairós”. Adesumanização da racionalidadecapitalista despreza completamente

o sangue que palpita nas veias dohomem que trabalha seus desejos,seus sonhos, substituindo-os pelostempos burocratizados, agendados

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e institucionalizados; pela relaçãotempo-volume, pela quantidade,pela velocidade do tempo amalga-

mada em dinheiro, em lucro; tempode “formação prossional”, tempodo “trabalho produtivo”, tempo docorpo produtivo, tempo “chronos”(PERROTTI, l990; GARCIA, 2007;SILVA, 2003). Essas reexões sobreo tempo social como dimensão

construtiva histórico-social, baseia-se na “bi-dimensionalidade  do

tempo” como o melhor recurso teó-

rico-metodológico para conceber otempo social e suas formas no limiardo “espaço social”. Todo esse traje-

to pretende decifrar o tempo na suadimensão social e histórica, sempreduplicado em pares dialéticos, que

informam: a escala e a repetição, atransformação e a permanência, oinstante e a duração, o kronos e okairós, articulando-se dialeticamen-te (GARCIA, 2007).

Perante o exposto, o quese pode concluir é que, a racio-

nalidade produtiva inviabiliza o“tempo do lúdico” cuja lógica

não é regulável, mensurável, ob- jetivável, lucrativa. Assim é queao tentar subordiná-lo e atrelá-lo

ao tempo de produção ocorre suadescaracterização, sua mutilação,sua morte (PERROTTI, l990: 20). Eo que acontece com o “lazer”, nãoé isso? Não é a deformação do lúdi-co, banalizado, fetichizado, morto,massicado, sem criatividade, semliberdade, sem sentido, uma vezque está atrelado aos esquemasdo tempo-mercadoria gerador devalor de troca. Neste sentido, háuma íntima relação entre o lazercapitalista e o “lúdico”. Este últimoé, normalmente, compreendidopelo senso-comum como abstraçãoque se amalgama apenas na relaçãoentre lazer e atividade, entre lazere recreação e muito pouco na rela-

ção imbricada e inseparável entre

trabalho e capital, trabalho produ-tivo e “tempo livre”, entre trabalhoescolar e o tempo efetivamentelivre das crianças. Assim sendo,percebe-se nas propostas educativasditas “lúdicas”, uma forte tendênciaideológica liberal em transferir aresponsabilidade para os sujeitos,35

numa espécie de “fetichismo da in-

dividualidade”, que surge em nomeda “liberdade individual”, como éo caso das correntes pedagógicas

35 Cf. GIROUX. Henri. Escola Crítica e Política Cultural. São Paulo: Cotez/Autores Associados, 1987.O autor discorre a respeito do “discurso liberal e a prática educacional”, sobretudo, o sub-ítemque da “teoria liberal e a pedagogia centrada na criança”.Nesta perspectiva o discurso educacionalliberal, traduz-se na experiência e na cultura do aluno ou “aprendizagem autodirigida” difundidapor Carl Rogers, que tem como foco de análise “a criança como um sujeito único” , a qual ,a partirdas práticas pedagógicas enfatizadas e estruturadas, deve ser encorajada à expressão “saudável”eàs “relações harmoniosas”(p. 73-74).

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que advogam que a educação devesubmeter-se ao desenvolvimentoespontâneo de cada pessoa, re-

sultando na negação da liberdade(DUARTE, 2004 p. 11-12). Assim,quando está em jogo o tempo parao usufruto do lúdico dos adultos, oque se percebe é uma tendência li-beral de “culpabilização da vítima”,que se caracteriza pela incompetên-

cia em não saber “administrar” otempo “livre”, consequentemente,não “apostar no lúdico”36  (SILVA,2003). Dito isto, penso que o papele desao da creche é, de um lado,desconstruir a banalização do lú-

dico e dos tempos e espaços paraa construção deste nas rotinas; deoutro lado; não perder de vista a

metáfora lançada no título do poe-ma de Gilka Girardello “por que ascrianças tem que brincar (muito)”.

Como já vimos, o lúdiconão está associado, unicamente,ao “prazer” e ao “lazer” mitica-

dos na dimensão da “felicidadeimaginada”37, miticada e abstrata.Ele é construído nas contradições

cotidianas, na luta individual ecoletiva que os sujeitos forjam nointerior da sociedade capitalista

na tensão permanente entre capi-

tal e trabalho. O lúdico pode ser

síntese de opressão e alienação,como por exemplo, no mundo do“consumismo”e do “caráter fetichi-chista das mercadorias” que provémdo “caráter social do trabalho queproduz mercadorias”, cujo processoresulta numa relação social denida,estabelecida entre os homens, assu-mindo uma forma fantasmagóricade uma relação entre coisas (MARX,1988 p. 71-81). Por outro lado,ele pode signicar emancipação,devido ao seu caráter contraditóriode resistência à ordem do capital.Nesta perspectiva, ele é cada vezmais banido da lógica “produtivista”e, portanto, discriminado nas searasdiscriminadas dos “improdutivos”,dos criativos, dos lentos, dos trans-

gressores, dos  revolucionários,enm, dos que não se entregaram àideologia pós-moderna que advogao suposto “m da história”. Na searada lógica da “produtividade”, o lúdi-co, contraditoriamente, se constituia negação desta e a prova incontestede sua incompatibilidade com o

sistema produtor de mercadorias.

Assim é que, ao invés do lúdico,coloca-se em seu lugar o simulacrode criação, sentimento, “entreteni-mento” e festa; coloca-se em seulugar o lazer reicado e fetichizado,

36 Cf. Folha de São Paulo, Caderno Folha equilíbrio, 31 de agosto de 2000.37 De acordo com Cunha (1987) , a “Felicidade Imaginada”é uma utopia,, que diz respeito a relação

dialética entre lazer e trabalho, na qual o lazer não seria uma mera negação do trabalho, mas abusca permanente do prazer (lazer) no mundo do trabalho.

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o não-trabalho, que na verdade écompletamente diverso do lúdico,pois este se identica com o jogo,com a brincadeira, com a “pregui-ça como uma virtude e não comoum pecado capital”, com a criaçãocontínua, ininterrupta, intrínseca àprodução (LAFARGUE, 1980, PER-ROTI, l990: l8-27).

Essas reflexões são, nomeu entender, essenciais para su-

perar o “fetiche do lúdico” (VIELA,2007) centrado exclusivamente noprazer imaginado e idílico comoúnico fim das relações sociais,sobretudo, quando se trata daEducação Infantil. Neste sentido,é preciso compreender o lúdicoou a “recreação”38  para além da

dimensão utilitarista e funcionalista,pensando-o enquanto um jogo so-

cial – ligado a diversas dimensõesda vida cotidiana infantil, a saber:ética, estética, cultural, econômicae política. Em síntese, o lúdico (jogoou brinquedo) não é uma entidadedivina na qual o sujeito criançaentrega-se para compensar ou gastar

energias ou para sempre alcançar oNirvana, o Eldorado – enm, o pa-raíso idílico, conforme já mencionei

no parágrafo anterior.Apesar do que já foi dito,o lúdico não é sempre festa, prazer,alegria, relaxamento, criatividade eliberdade, considerando que estesaspectos nunca são vividos plena-

mente na sociedade capitalista. Porisso, apoio-me em Vygotsky (1994p. 121), para o qual a associação dobrinquedo, lúdico ou jogo com a ca-

tegoria do “prazer” é incorreto porduas razões: em primeiro lugar, por-que muitas atividades dão ‘à criançaexperiências de prazer muito maisintensas do que o brinquedo ou olúdico (exemplo: chupar chupeta).Em segundo lugar, porque existem

 jogos nos quais a própria atividadenão gera prazer, não é agradável.

Exemplos disso são os jogos nom da idade pré-escolar, ou seja,

 jogos que só dão prazer à criançase ela considera o resultado interes-sante. Além desses jogos, existemos jogos esportivos (não apenas os

 jogos atléticos) e aqueles jogos quepodem ser ganhos ou perdidos, osquais, em regra geral, são acompa-

nhados de “desprazer”39

 – quandoo resultado vai de encontro aosinteresses das crianças. Nesta mes-

38 Rero-me a uma vertente da recreação, aquela derivada da “escola nova”, cuja característica é o“espontaneísmo”, que advoga a brincadeira livre, onde a criança decide o que fazer, sem que hajaa mediação sistematizada do educador ( SILVA, 1994/1995; HUPPERTZ, 1991).

39 De acordo com Vázquez (2008 p. 161)O desprazer é diferente do chamado “hedonismo ético”(de “hedoné: em grego, prazer). O desprazer é o oposto do prazer, portanto, um “mal prazer” quese diferencia do “bom prazer”, ou seja, a ideia de que “todo prazer ou gozo é intrinsecamente

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ma trilha teórica Wallon(1968, p.77), também salienta que, no jogo,assim como em outras atividadesda vida humana, há diculdades,esforço e desprazer. O jogo teriauma “nalidade sem m”, isto é,uma realização que não tende arealizar nada para além de si mes-ma. Assim sendo, se a atividade setorna utilitária e se subordina comomeio a um m, perde o atrativo e ocaráter do jogo  (WALLON, 1968,p. 77).. Aqui não se trata de negaro jogo na Educação Infantil – o queestá mesmo em “jogo” é a compre-ensão do caráter “pedagógico” esuas relações dialéticas com o jogo“livre”. Mais ainda, trata-se de, tal-vez, amenizar as críticas ao caráter

instrumental do jogo pedagógico,dito de “repasse dos conteúdos”40,Aliado a isso, talvez seja essencial,admitir o caráter “fetichista”do cha-mado jogo lúdico.

O lúdico, aqui compreen-dido como produção simbólico-realda vida cotidiana, pode ser perce-bido como um processo dialético,como um “exer cício de ser criança”,uma aprendizagem social, cultural

e política – exercício esse que éconstruído pelas contradições quea própria vida cotidiana engendrae que, apesar de ser próprio dainfância, extrapola os limites gera-cionais e etários; constituindo-se,também, numa linguagem humanados jovens, adultos e velhos, me-diados pelo tempo-espaço social dotrabalho, tempo de lazer (“tempolivre”), a educação, a cultura e aeconomia.- constituindo-se numcontinuum na vida cotidiana. Nestesentido – a vida cotidiana não é feitade episódios e experiências mono-líticas – pelo contrário, se seguir-mos as trilhas de Lefebvre (1958), poderemos intuir que a vida coti-diana não é constituída apenas de

alegrias, encontros, sorrisos, prazer,relaxamento, divertimento, fantasia,transgressões, resistências, emanci-pação, aproximação, encantamentoetc.; mas é feita, também, do movi-mento que engendra o contraditóriodo desprazer, tristezas, decepções,desencontros, alienações, tensões,lágrimas, estresse, conformismos,opressões, desencantamento, estra-

nhamento etc. Seguindo a idéia de

bom”. Tal tese está fundamentada no fato psicológico de que os homens desejam o prazer comom. Todavia, de acordo com uma crítica do subjetivismo axiológico, “uma coisa não pode serboa somente porque é desejada. Inclusive, embora se aceite que o prazer é intrínsecamente bom,por ser desejável ou preferível à dor, a bondade moral de um ato agradável não pode ser isoladadas suas consequências. Neste sentido, podemos mencionar “o prazer da vingança”, pois, quemleva a efeito uma calculada e pérda vingança pode experimentar um “prazer total”, no entanto,impregnado moralmente das consequências e da natureza negativa do ato.

40 De acordo com Futami (2001), muitas vezes o jogo é “instrumentalzado” com com o m único de“repassar conteúdos”, afastando-se cada vez mais da “esfera lúdica” (grifos meus).

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que vivem, tornando-se impossívelarrancar a criança desse mundo ide-

alizado, em que se pasteuriza e seescamoteia às diferenças de classee, aí, pode se dizer que:

A brincadeira passa a ser o

escudo contra a falta de prazer quetraz a escolarização e um antídotoao assassinato da “espontaneidade”causada por esta. Evita-se, assim, amonotonia do exagero de atividadesacadêmicas estéreis de criatividadee liberdade. Lúdico passa a gurarcomo sinônimo de prazer. Os pro-gramas de educação infantil devemsempre respeitar o caráter lúdico eprazeroso das atividades para quepossam realizar um amplo atendi-

mento às necessidades de ações es-

pontâneas das crianças (ARCE, 2007p. 159). Esta posição traz em suasentrelinhas o discurso ideológico do“aprender a aprender”, cujas basesdidático-pedagógicos são oriundasdas idéias pedagógicas escolano-

vistas. Isto faz com que se desloqueo eixo do processo educativo doaspecto lógico para o psicológico;

dos conteúdos para os métodos; doprofessor para o aluno; do esforçopara o interesse; da disciplina paraa espontaneidade. Sendo assim,configura-se uma teoria/práticapedagógica, cuja idéia, atualmentedifundida, em que o mais impor-tante não é ensinar e nem mesmoaprender algo, ou seja, assimilar de-terminados conhecimentos. Neste

sentido, o importante é “aprendera aprender”, quer dizer, aprendera estudar, a buscar conhecimen-tos, a lidar com situações novas.Deste modo, o papel do professordeixa de ser o daquele que ensina,ou seja, daquele que medeia, deforma crítica e criativa, o processoensino-aprendizagem: passandoa assumir o papel daquele queapenas “auxilia”o aluno em seupróprio processo de aprendizagem(SAVIANI, 2008 p. 431). Nesta linhade raciocínio, as práticas pedagó-gicas, supostamente, lúdicas e queentendem a relação entre jogo eeducação, calcada na ideia do jogomeramente “livre”, advogando olema “deixar as crianças brincarem

em paz”(HORTÉLIO, 1987: HOR-TÉLIO, 1982)), inculcando, assim, aideia de um lúdico abstrato, român-tico e do “aprender a aprender”nopróprio jogo “livre”.

De fato, nunca o papelda mediação político-pedagógicados professores e professoras queatuam no ensino fundamental, foitão importante, em tempos de idéias

“neo-escolanovistas”. Tais idéias,assentam-se no pressuposto onto-lógico e ideológico do “aprender aaprender”(SAVIANI, 2008), sobretu-do, se levarmos em conta as deman-das das crianças e jovens oriundasda classe trabalhadora empobrecida.Neste sentido, -me sinto impelidoa trazer para este debate a seguinte

reexão de Arroyo (2004, p. 124):

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{...} Tem sido e continuarásendo responsabilidade prossional,ao menos tem sido muito cômodo

“deixar por conta dos próprios alu-

nos, crianças e jovens, aprenderemas difíceis artes de lidar com os cor-pos, entender seu desenvolvimento,interpretar suas surpresas, construiridentidades de g6enero, raça, classee idade em convívios sociais escola-

res carregados de preconceitos aracom os corpos.

Com efeito, compreendera brincadeira, o jogo ou brinquedoapenas como sinônimo de prazer,constitui-se em um reducionismo e

num processo de naturalização, poisse o signicado da brincadeira naformação da criança está centrada,

unicamente, na questão do prazer, opróprio signicado social e históricoda brincadeira é secundarizado, tor-nando-se desnecessário explicar deforma cientíca em que a brincadeiraconsiste e qual é a sua especicidadecomo atividade humana e porqueela é necessária ao desenvolvimentoinfantil (ARCE, 2007 p. 159).

As críticas ao fetiche dolúdico e na crença deste como únicoprincípio e eixo da prática pedagógi-ca de 0 a 6 anos são pertinentes, emface das contradições já acentuadasanteriormente no texto. Contudo,não se deve esquecer que em qual-quer prática social, pelo menosnuma lógica dialética do concreto(KOSIK, 1976), os fenômenos sociais

e humanos não podem ser visto semque se faça uma ruptura com a rup-tura das “aparências, ou seja, como mundo da “pseudoconcretidade”.Posta esta posição epistemológica,penso que o lúdico deve ser vistoem sua positividade e negatividade,isto é, a consideração de que, se deum lado existe essa crença no lúdicoque culmina por idealizar a ideia

de criança, infância e de EducaçãoInfantil, de outro lado, o lúdico,aqui considerado como os jogos, asbrincadeiras e os diversos conteú-dos/linguagens da cultura corporalinfantil, não pode ser negligenciadona Educação de crianças pequenas,uma vez que, como já mencioneianteriormente, a cultura lúdica se

constitui num contributo que ascrianças produzem ao longo da his-tória da humanidade na dimensão,a partir de uma alteridade com basena relação dialética entre indivíduo esociedade, que exige uma constantemediação da cultura infantil com acultura e o mundo dos educadorese adultos em geral.

 Feitas estas considerações

acerca da positividade-negatividadedo lúdico, saliento que o tempo dolúdico das crianças pode ser pensa-do a partir da “repetição”, conformeWalter Benjamin. Para ele, os jogosdas crianças são “experiências”signicativas que estão centradosnuma espécie de “repetição criati-va” em busca da perfeição: “tudocorreria como perfeição, se se pu-

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desse fazer duas vezes as coisas: acriança age segundo este pequenoverso de Goethe. Para ela, porém,não basta duas vezes, mas sim “sem-

pre de novo” (grifos meus), centenase milhares de vezes. Nestes, temosa dimensão lúdica do tempo dolúdico que pode ser assim traduzi-da (...) A essência do brincar não éum ‘fazer como se”, mas um “fazersempre de novo”, transformaçãoda experiência mais comovente emhábito (BENJAMIN, 1984 p. 75).Esta visão benjaminiana do brincarda criança parte, primordialmente,da relação imbricada entre tempo,experiência e da lei fundamentalque, antes de todas as regras e leisparticulares, rege a totalidade do

mundo do brinquedo: “a lei da re-petição”. Para a criança, a repetiçãoé “alma do jogo” e nada a alegramais do que o “mais uma vez”(BENJAMIN, 1984 p. 74).

4. Sobre o corpo em movimentono tempo-espaço das “rotinas”em ambientes de creche42

Por que toda criança

 precisa brincar (muito)?

 aprendem a fazer analogias:

aquela nuvem não parece

um cavalo?aprendem a organizar:

ó que legal a minha fla

de carrinhos.

aprendem a fazer cultura: vamos

brincar de inventar piada?

aprendem a compartilhar: pega essa

boneca que eu

 pego aquela.

aprendem a perdoar:

tudo bem, já passou.

aprendem a desbravar: vamos

ver o que tem lá?

aprendem a construir: era uma vez

uma cidade assim.

aprendem a destruir:

vamos desmanchar

 pra fazer outro.

aprendem a sentir: fquei

com o olho cheio d’água.aprendem a rir: ra-ra-rá, lembra

àquela hora?

Grosso modo, pode-sedizer quer, quando se trata de umaperspectiva dialética, em tornodo debate acerca das dinâmicasespaço e tempo (espaço-temporal),

está subentendida a articulação enexos entre essas duas categoriaslosócas e multidisciplinares, quepodem ser compreendidas a par-tir das transformações recíprocasNeste meandro, tempo e espaçose misturam, sendo, às vezes, di-

42 Procurei me basear nos dados empírico-teóricos do texto escrito por Deborah Sayão “Rotinas” queenvolvem o Corpo e o Movimento em Ambientes de Creche (2004).

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fícil encontrar regras para denire diferenciá-los, pois “a dignidadedos espaços resulta de uma espéciede criação ritmada, a aptidão emfazer coexistir que subentende, porassim dizer, toda extensão, sendofunção de uma aptidão a perdurar“o espaço não se concebe indepen-dentemente do tempo” (GRANETapud REYNAUD, 1986 p. 8-9). Essalógica também pode ser transposta,quando está em jogo o corpo dascrianças em movimento no tempoe espaço das creches.

Em grande parte das cre-ches da Rede Municipal de Floria-

nópolis, conforme já mencionadono início deste texto, o corpo emmovimento da cultura das crianças,

salvo raras exceções, é concebidocomo meras “atividades” e nãocomo conteúdos/linguagens. As“atividades”, ou melhor, os con-teúdos/linguagens são, salvo rarasexceções, compreendidos como“rotinas”, visando cumprir, possivel-mente, o que reza a “organizaçãodo espaço e do tempo”, contidas

no PPP-Projeto Político Pedagógicono que tange à regulamentação dotempo, espaço e dos movimentos davida cotidiana infantil. Deste modo,os sujeitos são treinados, moldadose marcados pelo disciplinamento

dos corpos das crianças em tem-

pos e espaços lineares, contínuose unidimensionais (SAYÃO, 2004p.129-130; SILVA, 2003). Em con-

trapartida, os espaços para a expres-são das experiências corporais e demovimento poderiam se constituir,como já acontece em algumaspoucas iniciativas, em espaçoscoletivos, onde crianças possamsocializar-se com outras crianças eadultos, possibilitando a ampliaçãode seus conhecimentos e linguagensem inúmeras dimensões, tais como:ética, estética, corporal, sensível,oral, escrita, artística, rítmica, entreoutras, que se expressam nos mo-

mentos em que as crianças brincame se-movimentam sozinhas ou emgrupos (VAZ, SAYÃO e PINTO,2002, p. 50-51: SAYÃO, 2004).

A “organização do espaçoe do tempo” nas creches termina

por formatar os lugares e os tempos,impedindo que as crianças possamdescobrir novas possibilidades deexperenciar o mundo, as formas eas direções, embotando, assim, aimaginação e a experiência criativa.Em contrapartida, o “espaço-lugar”ocupado pela dimensão lúdica domovimento poderia ampliar a ideia

de espaço-lugar onde o “jogo”“permite tudo”. Nesta perspectiva,os objetos têm vida própria e po-

dem ser re-signicados enquantoespaços de conhecimento, aven-

tura e imaginação, sendo, assim,permanentemente construídos ereconstruídos sem que haja formasxas de sua ocupação e usufruto,nem exigências imperiosas de espa-

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ços estandartizados (PINTO, 1992;SILVA, 2003). Em relação à relaçãotempo-espaço na infância, percebe-se ainda que quando se trata dochamado “tempo do lúdico”, é aatividade que determina o tempoe não o contrário (SAYÃO, 2004),como já foi mencionado a partir doprincípio da “repetição criativa” emBenjamin no que tange aos jogosdas crianças.

De fato, o tempo para olúdico está, dialeticamente, conec-

tado com o “espaço para o lúdico”.Quanto a esse respeito, se obser-varmos os espaços das creches emgeral, parece que, assim como otempo, os espaços são delimitadosem termos de uso, como se fossem

um “lugar sagrado, como por exem-plo: o templo, a arena, o palco, atela, o campo de tênis, a mesa de

 jogo, o círculo mágico (HUIZINGA,1980 p. 13)”. Tudo conspira paraque os espaços da Educação Infantilsejam concebidos como “lugaresproibidos” (HUIZINGA, 1980 p.13) de fruição e de uma ética e es-

tética da imaginação e da criação;tudo parece conspirar para que os

lugares e, consequentemente, ostempos, sejam compreendidos, res-pectivamente, não como “espaçosde utopia” (HARVEY, 2004 p. 181;LEFEBVRE, 1999 ) 43 e “tempo de lú-

dico” (PERROTI, 1995, 20). A idéiade “espaços de utopia” propostapor Harvey (2004), no âmbito dosespaços urbanos, poderia servir deinspiração para as políticas públicasresponsáveis pelos projetos arquite-

tônicos das nossas creches. Entre-

tanto, a questão dos espaços nãoestá restrita ao caráter meramente“espacial”, mas ao modo como osseres sociais vivem, moram, traba-

lham, amam, se divertem, se ali-mentam, dormem etc. Nos “espaçosde utopias”, não haveria lugar para a

exploração do homem/mulher, nempara a mercadorização do trabalho,tempo livre, ciência, educação, saú-de, sexualidade, arte e outras formasde sociabilidade etc.

Nestes espaços, as crian-

ças poderiam junto com as outrascrianças, jovens, adultos e velhos,mesmo considerando as diferenças

intra-geracionais, confabularem econstruírem a cidade para além do

43 O autor trata do conceito de “espaços de utopia” em seu livro “Espaços de Esperança”, no qualpropõe uma “Geograa da Esperança” ao fazer uma crítica ao ambiente urbano das grandes cidadesamericanas e do mundo. Assim, alimenta o argumento de que devemos usar a forca da imaginaçãoutópica “contra todos que alegam não existir alternativa de mudança. Destaca, ainda, um novotipo de pensamento utópico chamado de “utopismo dialético”, chamando a nossa atenção paraoutros e possíveis cenários para que o mundo do trabalho (desemprego e trabalho precário) e dasrelações com a natureza seja mais equitativo para além do que Lefebvre chamou de “A cidade docapital”(1999).

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fetiche do dinheiro, do lucro e damercadoria (LEFEBVRE, 1999); paraalém da divisão abissal e desigual declasses sociais. Seria um lugar ondeas crianças e jovens pudessem con-tribuir com seu imaginário para coma política, a ética e a estética, tantona dimensão espaço temporal dascreches, quanto na cidade, enquantotambém espaço impregnado pelacultura infantil, imaginário, especi-cidades, demandas e representações“das” crianças, conforme investigouatravés dos desenhos infantis a ar-quiteta Mayumi Sousa Lima (1989).Nesta mesma direção, as crechestambém poderiam se constituir em“espaços de utopia”, se a Educa-ção em geral e, particularmente,

o “cuidado” de crianças pequenasnão fosse desvalorizado e tão malremunerado; se os espaços e temposdas creches e das escolas como umtodo não fossem concebidos comoum templo de disciplinamento docorpo em movimento e da lógica eracionalidade capitalista. Seria umtempo-espaço onde sem contradizeros conceitos freudianos “a culturaestética, sensual, na qual a razãoe a sensualidade se dão as mãos”,conforme nos disse Marcuse citandoSchiller no seu livro “A respeito da“Educação Estética do homem” 44.

Não obstante, os tempose espaços ainda são  tidos como

instâncias reicadas e reicantes,que engendram nas instituições aracionalidade e a lógica do tempoprodutivo, da educação implacáveldo corpo produtivo. Assim, temosque repensar os tempos nas crechescomo possibilidade qualitativa denegação ao tempo cronológico eprodutivista do capitalismo. Nestamesma direção, os espaços nãopodem ser “proibidos de...”, isola-dos, fechados, fragmentados, enm,sagrados para ns e “rituais” especí -cos (HUIZINGA, 1980 p. 13). Naeducação infantil, tal concepçãoespaço-temporal tem consequên-cias drásticas sobre o processo dedesenvolvimento e formação hu-mana das crianças.

Como se pode perceber,há uma lógica inculcada pelas ins-tituições, professores e professorasdas diversas disciplinas escolares,que culmina por instituir os temposxos em “hora de...” e os espaçoscomo “locais de ou para...” (exem-plos: dormir, comer, brincar, contarhistórias, fazer tarefas escolaresetc.). Esta forma utilitária de per-cepção e usufruto do tempo e doespaço nas creches traz sérias limi-tações para o desenvolvimento dascrianças, considerando seus jogos emovimentos nestes espaços/ temposeducativos, “não tem sentido paraas crianças pequenas que pensam,

44 “Über de Ästhetische des Menschens”.

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casa – o que é permitido nacreche, exceto nos dias nosquais não há permissão paratal – e colocavam-no debai-xo do lençol para poderembrincar enquanto a professoranão via.c) Sobre o usufruto dos espa-ços para brincar livremente: opátio e outros espaços:

(...) De uma primeira ob-

servação das crianças, foi possíveldepreender que a necessidade dese movimentar constantementecontrastava com as normas e regrasque procuravam manter os corposinertes por longos espaços detempo. Aos pequenininhos/as doberçário, por exemplo, e que tanto

precisavam da convivência em es-paços amplos, era vedado o direitode frequentarem o pátio. Pois, comolevar 16 crianças para lá, já que mui-tas não caminham sozinhas e as que

 já andam precisam de proteção, e sóhavia dois adultos para atendê-las?No que se refere ao “direito de semovimentar e brincar” livremente

nos espaços institucionais, as crian-ças também apresentam estratégiasde resistência através dos seguintessinais: “Nos grupos de crianças umpouco maiores, o contraste entreas necessidades de movimento demeninos e meninas e as ordens de

contenção dos corpos era burladopor eles/elas de várias maneiras.As sucessivas idas ao banheiro, a

disponibilidade para ajudar a levaras sobras do almoço para a cozinha,as fugidinhas até o parque, parecemser subterfúgios que as criançasutilizam para se movimentar quan-

do todos dizem para elas pararem

quietas (SAYÃO, 2004 p. 137).Diante dessas evidências

empíricas, a autora, na sua pesquisade campo, buscando um espaçopara o corpo em movimento na“rotina rotineira”, anuncia umaexperiência organizada de pintu-

ra, para que diferentes grupos decrianças pudessem interagir uns/ascom os/as outros/as no pátio, pin-

tando os espaços das paredes e dopiso, sem se importar com o efeitoestético ou o resultado das pinturas.

Diante disso,  a autora chegou àsseguintes reexões conclusivas epropositivas:

(...) O interessante destaproposta é que apesar de termosespaço restrito do pátio para onúmero de crianças envolvidas,não havia necessidade de burlara carência de condições espaciais

para o movimento, porque era per-mitido pintar de várias maneiras, emdiferentes lugares e havia ainda adisponibilidade de correr para aque-

les/as que se desinteressassem pelasituação. “Nosso registro em vídeodemonstra, no entanto, que todasas crianças participaram ativamentee não precisavam fugir de vez emquando” (grifos meus).

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(...) Partindo de uma rotinafechada e baseada na perspectivados adultos, olhando as manifesta-

ções das crianças e tendo-as comosujeitos de direitos, foi possível ne-

gociar mudanças que, num primeiromomento, eram simplesmente “alte-rações de rotina” (grifos meus). Noentanto, uma análise mais profundado projeto desenvolvido, evidenciaque, na verdade, o que estava emquestão era uma “concepção decriança e Educação Infantil”  (gri-fos meus) que tentava “cuidar” oupreservar o espaço do corpo e domovimento, encarando-os comoconstitutivos dos seres humanose como constitutivos da cultura(SAYÃO, 2004, 138).

Perante o que foi dito eobservado em torno da organi-zação extremamente rígida dostempos e espaços pedagógicos nascreches, o que ca para reexão éo fato de que, apesar da ingerênciados adultos no controle dos corpos

infantis, estes não conseguem con-

trolar as crianças, pois elas criam

espaços de “transgressão” e “resis-tência” que raramente são percebi-dos pelos adultos em sua volta e,além disso, inventam esconderijospara esconderem-se do olhar doadulto como, por exemplo, umcanto debaixo da escrivaninha da

professora onde é possível brin-car sem ser chateado. Há ainda,como exemplo, as brincadeiras nahora do almoço com os talherestransformados em seres imagi-nários mesmo quando solicitadopelas professoras que as criançasquem em silêncio esperando oalimento... (ROSA BATISTA apudSAYÃO, 2004 p. 132). Outrapesquisadora (DE PAULA, 2007)observou em suas conclusões queas relações entre adultos e crian-

ças são hierárquicas e marcadaspor imposições, ao passo que, asrelações entre os pares (crianças),revelaram um certo grau de cumpli-cidade, sobretudo, na formulaçãode estratégias de transgressão para

“burlar” algumas regras a elas im-postas pelo poder dos adultos e o

PPP da instituição.“As “rotinas” que envol-

vem o corpo em movimento emambientes de creche” podem serpensadas também à luz da pesquisade Mestrado defendida, recente-

mente, por Gisele Day, intitulada

“A produção de desenhos na pro-posta pedagógica para a Educa-ção infantil: Que lugar ocupamas crianças”45. Nesta pesquisa, aautora, com base em Bakhtin eoutros autores, traz a reexão sobreo desenho enquanto linguagem

45 Pesquisa defendida em Maio/2008 sob a orientação do professor Doutor Josué da Silva Filho/ NUPEIN/CED/UFSC.

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simbólica das crianças, buscandocompreender “quando”(tempo) e“onde”(espaços) e “como” (par-ticipação), as crianças produzemseus desenhos numa determinadacreche de Florianópolis46. Ela tam-bém percebeu na sua pesquisa decampo, algumas práticas signi-cativas do desenho e outras aindaeivadas de uma compreensão uti-litarista do desenho. O desenho,enquanto linguagem simbólica daEducação infantil, além da ‘brinca-deira no parque”, projeto políticopedagógico, projeto arquitetônico,reuniões pedagógicas, interaçõesentre adultos e crianças, entre ospares, construções, desconstru-ções, parecem ser ainda problemas

perenes marcados por tensões,dúvidas, limites e possibilidades(DAY, 2008).

No que concerne, especi-camente, ao desenho nos espaçose tempos das creches, há muitasvezes idéias e práticas pedagógicasinteressantes e criativas construídaspelas professoras, o que já é umavanço – se formos considerar a

forma como o desenho é percebidoe praticado na maioria das crechesem Florianópolis e talvez, pelo Bra-sil afora. Pelo que se pode concluirdo trabalho acadêmico de GiseleDay, realizado numa creche priva-da, é que os saberes na educaçãoinfantil estão organizados dentro deum espaço-tempo e podem adqui-rir a exibilidade que o professorproporcionar, mas seu aspectobasal é decidido pela estruturahierárquica e normativa que regulao funcionamento das instituições.Grosso modo, o que se percebe éuma tendência a não problematizara rotina, cuja função do professorresulta em cumprir “listagens” e“horários” para as “atividades”. Em

vez disso, poderia em vez de ape-nas observar o seu grupo de crian-ças e, a partir dessas observações,organizar o cotidiano de acordotambém com o planejamento quevise os interesses, necessidades eespecicidades das crianças (DAY,2008). De acordo com a autora, sepor um lado o desenho nas crechesainda está longe da visão “qualitati-

46 Do ponto de vista dos resultados encontrados, a pesquisa trouxe à discussão a importância doadulto no processo de organização do ato de desenhar e alguns questionamentos foram realizadosquanto à utilização do desenho como “prestação de contas” do processo de ensino-aprendizagemaos pais; a importância vista pelas professoras na aquisição da forma no grasmo da criança;a importância de propor desenhos num coletivo que garanta a interação entre as crianças, nosentido de troca de experiências e repertórios, ampliando possibilidades. Outro fator decisivo paracompreender a importância pedagógica da proposta de desenho foi a pouca participação efetivadas crianças nas entrelinhas das propostas, o que acaba denindo-as mais como “executoras” doque como “criadoras”, remetendo a certa compreensão restritiva de criança e de Educação Infantilpor parte das professoras.

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va” de tempo social ou “kairós” dosgregos; por outro lado , nem tudoestá perdido, pois, pelo menos nacreche investigada, há pequenossinais de avanço, no que se refere àdimensão qualitativa da linguagemdo desenho na problemática docorpo em movimento nos tempose espaços da creche. Um exemplodisso pôde ser percebido na horado lanche, quando a professoraaproveitava o ato de passar o mel nopão, simulando possíveis imagens,guras e desenhos proporcionadospelo mel, incentivando, assim, oimaginário das crianças.

Atuar no tempo e no es-

paço com base nos pressupostosontológicos do Kairós, significa

“perceber o movimento existenteem cada situação, buscar o momen-

to certo em relação ao processo,dando ênfase ao evento único quese faz presente na existência”. Istoimplica dizer que, a compreensão

do tempo Kairós no cotidiano daEducação Infantil, deve ser visua-

lizada a partir de uma rotina que

leve em conta o tempo qualitativoexperenciado pelas crianças. Essetempo que deve levar em conta opoder da imaginação das criançase mais baseado nos interesses e

envolvimento das crianças do queos ponteiros da rotina cronológicado tempo “chronos”, considerandoque o poder da imaginação resideno fato de nutrir de imagens novas,

e para a criança o mundo está cheiodessas imagens que são apresenta-

das por outrem. O tempo do kairósdeve superar a cronologia do tempolinear e em seu lugar poderia brotarnão uma nova cronologia, mas um“tempo histórico” e social, uma“mudança qualitativa” ou uma “revolução qualitativa” do tempo– uma “cairologia”(AMGABEM,2005, p.127-128).

Desta maneira, quando sefala de desenho enquanto lingua-

gem simbólica e outras linguagens,em que o corpo das crianças estáem movimento, necessário se fazcompreender que, para o desen-

volvimento das crianças fantasiare imaginar faz parte do processo

de materialização e constituição/ construção do desenho, dos di-versos conteúdos/linguagens emgeral (DAY, 2008; WIGERS, 2008),como por exemplo, a “contação dehistórias “das” e “para as crianças”(COSTA, 2008).

Para que as rotinas sejam“desrotinizadas” (SAYÃO, 2004),

transformando-se num “cotidiano”mais rico em experiências espaço-temporais (DAY, 2008) de fato, épreciso que a concepção de criançaseja compreendida como sujeitode direitos e a infância como umaconstrução social, não tão somen-

te, mas também cultural, políticae econômica, cujo pano de fundoontológico se dá na perspectiva

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das categorias de classe, raça/etnia,geração, cultura, gênero e outras. Acriança, sobretudo, a criança peque-

na, para além de ser um “ator social”– é, fundamentalmente, um sujeitode direitos, que constrói história ecultura na mediação criativa e críticacom o mundo dos adultos (PERROT-

TI, 1990: SILVA, 2003) com suas de-

mandas, vicissitudes, necessidadese, acima de tudo, “especicidades”.No entanto, essas especicidadestêm diretamente a ver com a cate-

goria de classe social em articulaçãocom as outras supramencionadas.Deste modo, pode-se dizer que asespecicidades (micro-sociais) dascrianças, enquanto dimensão parti-cular da vida cotidiana delas – tem

diretamente a ver com as questõesmais amplas de natureza universal,ou seja, questões políticas de carátermacro-social, econômico e conjun-

tural (políticas públicas).O desao é, de um lado,

dar voz às crianças e, na EducaçãoInfantil, buscar possibilidades dealteridade das crianças nas relações

sociais com os adultos (professores,professoras e equipe técnica dascreches) e das crianças entre si. Deoutro lado, a meu ver, deve-se nãomiticar e nem fetichizar a infânciaem si ou a criança em si (VIELA,2008), buscando valorizar, de forma

crítica, a mediação dos adultos noprocesso educativo. Esta mediaçãotem a ver diretamente com umconceito de educação que abarqueem sua relação de prática pedagó-

gica que concebe o ato de educar,sobretudo, na infância, como umtempo-espaço privilegiado paraaprendizagens sociais dos valoresrelativos à transformação social e aemancipação humana; tempo-espa-

ço em que as crianças crescem, paraalém da idéia de um “organismo emformação”; para além dos “temposda vida” e das visões etapistas eevolucionistas que fragmentam oser social em categorias de idade(infância, juventude e velhice) (AR-

ROYO, 2204 p.274-279); para além

da fragmentação da criança emáreas e setores de desenvolvimentoquais sejam: cognitivo, afetivo, so-cial, motor, linguístico...Portanto,para além dessas concepções dedesenvolvimento infantil, infânciae criança – urge compreender acriança como sujeito “na” e “da”história (JOBIM e SOUZA, 1996 p.

44); como sujeito, cujo crescimen-to e produção cultural se dá emrelação constante com o ambientesócio-cultural (PERROTTI, 1986:PERROTTI, 1990) e eu diria, sócio-cultural, político e econômico47.Diante dessas ideias, pode-se dizer

47 Segundo Perrotti (l990: 26): (...) a produção cultural para crianças, enquanto substituição ajusta-se auma necessidade: à necessidade do sistema econômico em se reproduzir, ainda que seja à custa

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que a infância não é apenas umaquestão cronológica – mas sim umacondição de experiência (KOHAN,2007 p. 86).

O que se pode abstrairde tudo isso, é que as noções detempo e espaço nos ambientes dascreches podem estar impregnadasde conceitos universalizantes eabordagens teleológicas, que cul-minam por demarcar a natureza e o

lugar social dos sujeitos, de acordocom os “estágios ou etapas unidi-mensionais de desenvolvimento”ou segundo a idade cronológica.Sendo assim, a concepção de tempolinear, cumulativo, homogêneo evazio indica sempre para o desen-

volvimento inexorável no futuro,

parecendo se constituir no alicerceideológico mais importantes paraas concepções baseadas nos prin-cípios ditos ontogenéticos. Nestaforma de entendimento, “a infânciapressupõe um tempo de mudançase de instabilidade em contraste com

um tempo de estabilidade e matu-

ridade, além de um mero estado

de passagem, precário e efêmero,que caminha, gradativamente, paraa sua resolução posterior na idadeadulta, por meio da acumulação deexperiências e conhecimento”. Estavisão de “linearidade” do tempo

cronológico culmina por inculcaruma concepção que lhe atribuiuma “qualidade de menoridade” e,consecutivamente, sua relativa des-qualicação como estado transitó-

rio, inacabado e imperfeito (JOBIMe SOUZA, 1996 p. 44). Reetindonoutra direção, a infância é umacondição do ser criança, a partirdo “exercício de ser criança”, numasociedade onde grande parte dosadultos procura inculcar e impor os

valores da lógica e da racionalidadedo sistema capitalista, mesmo queno plano ético-estético e político, ascrianças tenham sua contribuiçãopara repensar a lógica do lucro, daexploração e do individualismo.

Pensando desta forma e

recuperando a idéia de “espaços deutopia”, tanto nos espaços urbanosdestinados às crianças pequenas,quanto nas “rotinas” do cotidianodas creches, poder-se-ia pensar emtempos lúdicos, nos quais a artepudesse ser compreendida como

“fruição lúdica”48, cujo processoético-estético amalgama-se em

“espaços estéticos”ou “espaçoslúdicos”(ALMEIDA, 1987). Essesespaços lúdicos seriam alternativosà arte comemorativa e contemplati-va, destinada normalmente às clas-ses sociais que podem frequentar

da morte do lúdico, do prazer, da criação. Ainda que seja à custa da morte da aventura, do sonho, doencontro. E isso, continuará acontecendo enquanto os valores de troca regularem a vida das pessoas.

48 Cf. Augusto Boal (1996 p.33).

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museus e galerias. Neste sentido,seriam espaços onde a arte é públi-ca! Signica dizer que as políticaspúblicas nos níveis formal, informale não-formal, em espaços fechados eabertos, deveriam priorizar os luga-

res onde os grupos diversos de crian-ças e jovens que, tradicionalmente,não têm acesso ao lazer e à forma-

ção artístico-cultural, {...} pudessem

exercitar o corpo criativamente, comalegria e imaginação, estabelecen-

do um diálogo entre si através domundo das artes visuais (ALMEIDA,1987). Tal maneira de conceber oespaço e o lúdico se justica, ten-

do em vista que, a brincadeira e o jogo, enquanto “expressão lúdica”,sempre estiveram presentes em to-

dos os tempos, na poesia na dança,no culto e no próprio cotidiano. Aexpressão lúdica, sobretudo, “para”e “com” as crianças, pode ser com-preendida como um “ato de movi-mento” e fruição transformadores enão simplesmente uma “atividadefísica”ou de puro “entretenimento”(ALMEIDA, 1987).

5. Concluindo para continuarcom o corpo em movimentonas creches...

Por que toda criançaprecisa brincar (muito)?

aprendem a olhar: acho que

 aquela graminha ali é um

gafanhoto.aprendem a ver: você tá triste?

Entre outras razões,

 porque brincar.

é o principal jeito de

as crianças aprenderem.

Mais que um jeito de aprender,

brincar é o jeito de

as crianças serem. Não é uma

coisa que possa

ser substituída, reembolsada

amanhã, ou uma

 preparação para o futuro..

De tudo o que foi ditoneste texto, cam algumas tentativasde sínteses e reexões provisórias,algumas debatidas durante o Cursode Formação Continuada “Corpo

e Movimento” e outras que se tra-duzem em problemas “perenes”da Educação Infantil, conformearmaram as professoras e profes-

sores do curso e as pesquisas deSayão (2004). Quando se pensanas “rotinas que envolvem o corpoem movimento em ambientes decreche” e, simultaneamente, no

processo de formação continuadade professoras e professoras que atu-

am na Rede Municipal de Educaçãode Florianópolis, se faz necessário, primeiramente, considerar oslimites institucionais que, muitasvezes, obstaculizam as mudançasde caráter político-pedagógico sub-

 jacentes às políticas públicas. Esteentrave, entretanto, não deve obs-

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tacular o enfrentamento para comas questões perenes da EducaçãoInfantil, entre elas, a mudança deconcepção de educação, pedago-

gia, criança e infância, concepçõesessas que, salvo exceções, perma-

necem eivadas de senso-comum ede fetiche. Nesta mesma direção,penso que, para além da problema-

tização e mudança desses conceitose, consequentemente, das práticaspedagógicas concretas, é precisotambém um enfrentamento, porparte dos professores e professorasque atuam nas creches e das equi-pes pedagógicas, em termos deum posicionamento mais crítico eefetivo sobre o PPP-Projeto PolíticoPedagógico, as condições materiais

para o funcionamento das unida-des (tempo pedagógico, espaçosarquitetônicos, equipamentos emateriais); além de um debate per-manente sobre as condições obje-

tivas dos professores e professoras,tais como: valorização do trabalhopedagógico com crianças pequenas,outra política de “formação conti-

nuada”, jornadas de trabalho, cam-panha salarial, saúde, organizaçãopolítica (sindical), defesa do ensinopúblico (em todos os níveis, mas,sobretudo, no ensino fundamental).Em segundo lugar e, articulado comas questões mencionadas, acreditoser importante, ao problematizar ocorpo em movimento das criançasnas creches, considerar também, o

corpo produtivo em movimento dosprofessores e professoras no cotidia-

no dos ambientes educativos dascreches.. Corpos estes que expres-

sam, sobretudo, os das professoras,as marcas dos preconceitos contra

aquelas/aqueles que atuam comcrianças pequenas e a desvaloriza-ção deste ofício, as longas jornadasde trabalho e até duplas jornadasde trabalho (trabalho na creche eo trabalho doméstico), as doençasdo mundo do trabalho (estresse,síndrome do pânico, depressão eoutras), os salários píos, além deoutros constrangimentos

No que concerne aos pro-

blemas perenes da Educação In-

fantil, urge destacar que não basta

implementar concepções mais críti-cas e criativas em relação ao corpo,movimento, lúdico, tempo e espaçopara o “exercício de ser criança” noprocesso ensino-aprendizagem dosconteúdos/ linguagens: corporais,gestuais, cênicas, escritas, imagé-

ticas, sonoro-musicais, plásticas eoutras. Além do mais, penso ser

imprescindível pensar a infâncianão só como uma construção sociale histórica, mas também política eeconômica, não linear e cronológi-ca, cujo conceito e práticas sociais(pedagógicas) estão intimamenteligados ao modo como as classessociais produzem a vida. Nestesentido, há distintos entendimen-tos sobre os conceitos de infância,

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criança e corpo, que traduzem osconstantes “movimento” das mu-danças que se vericam no camposocial, político, cultural, econômicoda sociedade. Aliado a estes fatores,pode-se inferir que a história dascrianças e da infância revela asmarcas, as ideias, as práticas sociais,as políticas públicas que cada socie-dade produz no sentido de “cuidar”e “educar” suas crianças. Por estemotivo, penso ser imprescindível,em primeiro lugar, tentar olhar àscrianças “com olhos de crianças”(SAYÃO, 2004), compreendendo omodo como elas constroem históriae cultura no presente (PERROTTI,1990); olhá-las ,essencialmente,como “preparação para o futuro”

como indica um verso da epígrafede Gilka Girardello neste texto,mas fazendo o “saudável exercíciode olhar para trás” (DEL PRIORE,1999), ou seja, para a história dopassado mais recente e longínquo.

Antes mesmo de terminar,trago para a reexão a questão da

“transgressão” e da “resistência”49

das crianças, levando-se em contaa problemática do corpo em mo-vimento nas rotinas e no tempo-espaço e do lúdico nos ambientesdas creches. Senão vejamos: nasleituras que tenho feito sobre o

 jogo (brinquedo ou brincadeiras),tenho percebido um grande númerode pesquisadores que destacam a“transgressão”ou “resistência”dascrianças no limiar da produçãocultural (lúdica) das crianças atravésde seus jogos, brinquedo, conte-údos/linguagens, gestualidades emovimentos em tempos e espa-ços formais(escola) e informais50.Tais reexões , muitas vezes, sãocarregadas de um otimismo exa-

gerado quase fetichizado sobreo modo como as crianças forjamas suas “artes de fazer” com “tá-ticas de resistência” no processode “invenção do cotidiano”(DECERTEAU,1994). Talvez isto sedeva ao fato de que, incontestavel-mente, a cultura corporal e lúdica

49 Os termos transgressão tem sido frequentemente utilizados como sinônimos. No entanto, a meuver, “transgressão assemelha-se a uma espécie de “metamorfose “(questão da forma), enquantoque “resistência” (forma e conteúdo das lutas políticas mais amplas), possui um caráter maisprofundo, político e sócio-cultural. Ver a esse respeito as críticas de McLaren (2007) ao chamado“Pós-modernismo lúdico e de resistência”

50 Rero-me às pesquisas realizadas por SILVA, 2003 (sobre o lúdico como resistência na explora-ção do trabalho infantil); FANTIN, 2000 (sobre a resistência das crianças nos jogos e brincadei -ras|); PERROTTI, 1995(sobre a resistência da produção cultural das crianças); GRACIANI, 1999(a resistência dos meninos e meninas de rua através de suas táticas de jogo e brincadeira comoforma de sobrevivência nas ruas); SAYÃO, 2004 (nos espaços e tempos das creches: na hora de...comer, dormir...etc) nas creches): DAY, 2007 ( resistências nos tempos e espaços para o desenhono desenho infantil numa creche privada); DE PAULA, 2007 (transgressão das crianças à disciplinados adultos e outros).

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das crianças(movimentos, jogos,brinquedos e brincadeiras), dotadade riquíssimo imaginário que, possi-velmente, poderá se constituir numdos caminhos para as possíveis mu-

danças sociais, a partir da mediaçãocom os adultos no processo ensino-aprendizagem das creches. Trata-sede compreender as crianças comoseres sociais que produzem comsuas sociabilidades, imagináriose representações, os contributosessenciais para dar “movimento”e signicados à história, cultura,ética, estética e, porque não dizer,à política. Contudo, penso quedeveríamos tentar evitar a miti-

cação e fetiche da “transgressão”e da “resistência” “em si”, apenas

durante os jogos e brincadeiras, re-duzindo-as “apenas” aos contextossócio-culturais crianças. Dito isto,sou da opinião que se deva valorizaros limites e possibilidades da parti-

cipação das crianças no processode construção da cidadania, não deforma isolada, mas articulada às di-versas instâncias simbólicas e reais,

das produções materiais e imateriaisda vida cotidiana.Com efeito, penso que

poderíamos compreender de formamais amiúde, ampla e crítica, as

idéias de transgressão e resistência,construídas a partir das culturas in-

fantis e, assim, extrapolar às dimen-

sões apenas sócio-culturais. Nestestermos, a expressão “transgredir”pode ser compreendida como

um “ato ou efeito de transgredir,desobedecer, infringir ou violar;ao passo que “resistir”51 pode ser

vista, como uma “oposição oureação a uma força opressora ouainda como uma força que se opõea um movimento de um sistema”.Com base nisso, encerro este texto,concordando com a maioria dosautores que defendem os direitosdas crianças e os contextos sócio-culturais nos quais elas produzemtransgressões e resistência. Neste

sentido, deixo algumas metáforasque poderão servir para repensar aspráticas pedagógicas e as condiçõesobjetivas (tempo, espaço e lúdico),que dizem respeito aos tratos paracom as políticas do corpo em movi-mento e seus/conteúdos/linguagensnos ambientes das creches:

 “Tudo o que vejo dá para

brincar...52

” “Tudo o que não invento éfalso” (Manoel de Barros) “Brincar é uma maneira deser do homem” (Schiller)

51 Cf. O Aurélio (1999).52 Frase proferida por um artista circense nas aulas da disciplina Recreação e Lazer no Centro de

Desportos sob a minha coordenação (2002).

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O trabalho como brinca-deira ou jogo, e este comoprincipal contexto da vida,deverá ser festejado e deter-minado como o modo mais

digno e, portanto, o expoentede uma existência humana(Platão citado por Marcuseem seu livro “ O Fim da

Utopia”(1969). Por que toda criança temque brincar (muito)? 

 As crianças precisam

Brincar hoje e todos os dias de

sua infância. Todas

as crianças, no mundo inteiro,

têm o direito

de aprender essas coisas e de ser plenamente

assim. Se não brincarem – muito

– quando crianças,

não conseguirão aprender 

 (nem ser) direito

depois. E todos os adultos do

mundo precisam

aprender melhor o que as

crianças, mesmosem perceber, têm pra nos ensinar 

(Gilka Girardello).

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