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FACULDADE MERIDIONAL – IMED DIREITO LEONEL JOÃO VIECILI IMPOSTO SOBRE GRANDES FORTUNAS: Uma análise sob a ótica da Justiça Fiscal Passo Fundo 2016

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FACULDADE MERIDIONAL – IMED

DIREITO

LEONEL JOÃO VIECILI

IMPOSTO SOBRE GRANDES FORTUNAS:

Uma análise sob a ótica da Justiça Fiscal

Passo Fundo

2016

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LEONEL JOÃO VIECILI

IMPOSTO SOBRE GRANDES FORTUNAS:

Uma análise sob a ótica da Justiça Fiscal

O presente Trabalho de Conclusão de Curso tem como objetivo a aprovação na disciplina de Monografia do Curso de Direito da Faculdade IMED.

Prof. Me. Rafael Mafacioli Marin

Passo Fundo

2016

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RESUMO

O presente trabalho possui como assunto principal o estudo da instrumentalização do Imposto sobre Grandes Fortunas como meio de ampliação da justiça social. Através da aplicação dos princípios constitucionais que preveem a tributação baseado na capacidade contributiva de cada cidadão é que poderá ser alcançada a justiça fiscal. Para tanto, buscou-se levantar alguns conceitos importantes e muito discutidos no decorrer dos séculos, por grandes filósofos, como é o caso da justiça, a qual é parte integrante e fundamental para concretização dos princípios constitucionais formadores e balizadores de nosso ordenamento jurídico. Também com relação à tributação, buscou-se analisar os tipos de tributos para um melhor entendimento do Sistema Tributário Nacional. A partir dessa classificação, pode-se observar o peso da carga tributária em nosso país e quais seriam as consequências da implementação do Imposto sobre Grandes Fortunas, pois alguns países já tiveram essa experiência e muitos deles acabaram por desistir deste tributo, visto que as consequências foram desastrosas. Por fim, buscou-se analisar a possibilidade de uma progressividade de alíquotas do Imposto de Renda mais eficiente, ao invés da criação de um novo imposto, como forma de ampliação da redistribuição de riquezas e consequentemente da justiça fiscal.

Palavras-chave: Grandes Fortunas. Justiça. Tributação

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ABSTRACT This work has as main subject the study of the exploitation of the wealth tax as a mean of expanding the Social Justice. Through the application of constitutional principles that are provided for taxation based on the ability to pay of every citizen is where the Tax Justice can be reached. Therefore, we sought to raise some important concepts and discussed over the centuries by great philosophers, such as Justice, which is an integral and fundamental to achieving the constitutional principles trainers and benchmarks of our legal system. Also with regard to taxation, it was sought to analyze the types of taxes for a better understanding of the national tax system. Based on this classification, we can observe the weight of the tax burden in our country and what the consequences of the implementation of wealth tax, as some countries have had this experience and many of them eventually give up this taxing system , since the consequences were disastrous. Finally, we sought to examine the possibility of a progressive income tax rates of more efficient, instead of creating a new tax as a way of expanding the redistribution of wealth and consequently the Tax Justice. Kei words: Wealth Tax. Justice. Taxation.

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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO.......................................................................................5

2 JUSTIÇA: UMA ANÁLISE CONCEITUAL............................................7

2.1 Justiça fiscal......................................................................................................11

2.2 O Estado de direito e a solidariedade social..................................................16

2.3 Estado fiscal e solidariedade social................................................................19

3 TRIBUTO E SUAS CARACTERÍSTICAS...........................................24

3.1 Princípios do sistema tributário nacional.......................................................26

3.2 Espécies de tributo...........................................................................................36

4 IMPOSTO SOBRE GRANDES FORTUNAS.......................................41

4.1 Noções básicas sobre o Imposto de Renda...................................................46

4.2 Imposto sobre Grandes Fortunas e solidariedade social.............................52

5 CONCLUSÃO......................................................................................55

BIBLIOGRAFIA......................................................................................58

ANEXO...................................................................................................60

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1 INTRODUÇÃO

O objetivo geral da pesquisa busca analisar os aspectos gerais e conceituais

sobre o Imposto sobre Grandes Fortunas como instrumento de justiça social. O

presente trabalho tem como problema de pesquisa analisar se o Imposto Sobre

Grandes Fortunas auxiliaria a concretização e implementação de uma justiça fiscal

no que respeita a tributação sobre o patrimônio e renda.

O método de pesquisa utilizado é o dedutivo onde foram analisados os

impactos gerais da implementação do Imposto sobre Grandes Fortunas como meio

de correção das desigualdades sociais. Além disso, buscou-se levantar os impactos

positivos e negativos da regulamentação do referido imposto, observando suas

vantagens e desvantagens diante da atual situação econômica de nosso país.

Inicialmente, no segundo capítulo, buscou-se evidenciar alguns conceitos de

justiça levantados por grandes filósofos e pensadores a fim de obter um panorama

geral e satisfatório. O que se observou foi uma grande dificuldade em encontrar uma

definição única e concisa sobre justiça, por se tratar de um termo bastante amplo e

com muitas interpretações diferentes.

Em seguida, buscou-se o entendimento sobre a justiça fiscal a partir de

definições criadas por alguns doutrinadores, os quais preconizam o equilíbrio e a

neutralidade fiscal como meio de ampliação da justiça fiscal, preservando assim, um

tratamento equitativo e proporcional da tributação, de acordo com as possibilidades

de cada contribuinte.

O Estado de direito e a solidariedade social também foram assunto desta

parte inicial, onde juntamente com a justiça formam um conjunto de instrumentos no

processo evolutivo de uma sociedade democrática de direitos, os quais, cada vez

mais, tornam-se necessários para construção de uma sociedade organizada e justa,

onde o cidadão contribuinte deve participar proporcionalmente a sua capacidade

contributiva, cabendo ao Estado utilizar destes recursos para implementação de

políticas públicas eficientes que possam atender as necessidades primordiais do

cidadão.

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No terceiro capítulo, buscou-se analisar o conceito de tributo e suas

características de acordo com o que preconiza o Código Tributário Nacional e a

nossa Constituição Federal, onde também se frisou algumas definições doutrinárias

sobre Direito Tributário, para, na sequencia, aprimorar o entendimento dos princípios

balizadores do Sistema Tributário Nacional, os quais determinam os limites e os

direitos e deveres dos sujeitos participantes do sistema.

A partir das definições principiológicas do Direito Tributário analisou-se as

espécies de tributos e suas características com intuito de um entendimento mais

detalhado de como está disposta essa classificação tributária em nosso

ordenamento jurídico pátrio.

O Imposto Sobre Grandes Fortunas será o assunto do capítulo 4, onde

procurar-se-á fazer uma breve análise sobre o Projeto de Lei Complementar do

Senado, o qual visa regulamentar o referido imposto. Este projeto é o único que foi

recebido pela Casa Legislativa, mas até então nunca foi votado, encontrando-se

atualmente em tramitação.

Na sequencia apresentar-se-á algumas noções básicas sobre o Imposto de

Renda, como instrumento de redução das desigualdades sociais, a partir de

alíquotas progressivas mais eficientes e efetivas que observem a capacidade

contributiva do cidadão e a pessoalidade do imposto, de acordo com o que

determina a Carta Maior de 1988.

Por fim, buscou-se analisar o Imposto sobre Grandes Fortunas como

instrumento de Solidariedade Fiscal a partir de uma concepção mais justa de

tributação, demonstrando suas vantagens e desvantagens e alcançando ao final, um

posicionamento sobre a regulamentação do referido imposto.

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2 JUSTIÇA: UMA ANÁLISE CONCEITUAL

A justiça sempre foi e sempre será o principal objetivo almejado por todos,

pois juntamente com a igualdade e a solidariedade, formam um tripé basilar para o

desenvolvimento equilibrado e próspero de uma sociedade. Mas o grande desafio é

conceituar a palavra justiça, pois o que é justo para uns pode não ser para outros. E,

por isso, buscar uma definição justa pode não ser tão simples, sem ao menos levar

como base, os conceitos de justiça levantados pelos grandes filósofos e pensadores.

Para que se possa entender melhor e chegar num possível conceito de

justiça, o qual provavelmente não será absoluto, precisar-se-á considerar a teoria da

justiça paralelamente à teoria do direito, que é absoluta, as quais juntas podem

defender os interesses e direitos de uma sociedade.

Hans Kelsen defende que a justiça está relacionada com a conduta social,

sendo que o justo pode ser justo para uns e injusto para outros, mas que, através da

conduta do ser humano é que o ideal de justiça pode estar interiorizado dentro de

cada um.

Desta forma, ele conceitua (KELSEN, 1998, p. 4):

A justiça é, portanto, a qualidade da conduta humana específica, de uma conduta que consiste no tratamento dado entre os homens. O juízo segundo a qual uma tal conduta é justa ou injusta representa uma apreciação, uma valoração da conduta.

A conduta do ser humano pode ser considerada valiosa ou desvaliosa,

dependendo de qual valor é dado à justiça. Kelsen (1998) afirma que somente um

fato de ordem do ser, quando confrontado com uma norma é que pode ter um valor

positivo ou negativo, ser mais valioso ou desvalioso, e desta forma, paralelamente,

uma norma de justiça e uma norma do direito positivo devem ser válidas e, portanto,

transmitirem a realidade de uma conduta justa em conjunto com os fatos.

Assim, pode-se afirmar que a justiça se completa a partir do momento que

temos um cenário de normas de justiça válidas associadas a normas de direito

positivas também válidas. Se uma delas contrariar seu conceito ou estiver em

direção inversa, não teremos justiça e tampouco os direitos alcançados na sua

plenitude, podendo ser considerados inválidos.

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O grande jurista e filósofo também destaca que a justiça e a norma devem

ser consideradas justas ou injustas, não pode uma contradizer a outra, conforme o

trecho a seguir proposto (KELSEN, 1998, p. 11):

Seria um contra senso presumir que o direito positivo pode ser justo mas não pode ser injusto. Se o direito positivo não pode ser injusto, também não pode ser justo. Ele apenas pode ser justo ou injusto, ou nem justo nem injusto. Abstrair da validade de toda e qualquer norma de justiça, tanto da validade daquela que está em contradição com uma norma jurídica positiva como daquela que está em harmonia com uma norma jurídica positiva, ou seja, admitir que a validade de uma norma do direito positivo é independente da validade de uma norma de justiça – o que significa que as duas normas não são consideradas como simultaneamente válidas – é justamente o princípio do positivismo jurídico.

Sendo assim, dificilmente poderá se chegar num consenso do que é certo ou

errado ou do que é justo ou injusto. As opiniões divergem e por isso há muitos ideais

de justiça diferentes uns dos outros e contraditórios entre si e com valores distintos

entre cada ser humano.

Pode-se observar também que a justiça juntamente com a verdade são as

primeiras e principais virtudes do ser humano. Assim como a verdade deve ser

absoluta, não permitindo meia verdade ou que esta seja relativa, a justiça também

procura nortear os mesmos fundamentos.

John Rawls redige em sua obra que a justiça não pode ter menos valor

quando uma minoria abre mão de interesses próprios para permitir que uma maioria

tenha vantagem e possa usufruir de maneira geral dos interesses que até então

eram apenas de uma minoria. Assim ele comenta em um trecho de sua obra

(RAWLS, 2000, p. 4):

Cada pessoa possui uma inviolabilidade fundada na justiça que nem mesmo o bem estar da sociedade como um todo pode ignorar. Por essa razão, a justiça nega que a perda de liberdade de alguns se justifique por um bem maior partilhado por outros.

Por essa razão é que podemos observar os diferentes conceitos e opiniões

sobre justiça em uma sociedade, onde sempre há divergência de opiniões sobre o

que é justo ou injusto e o que é certo ou errado. Mas na maioria das vezes, o

conjunto de princípios está acima desta disputa e leva a um consenso sobre a

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distribuição adequada de benefícios e encargos sociais, tornando assim uma

associação organizada em prol de uma sociedade justa.

Conforme Rawls (2000), uma sociedade justa possui liberdades de

cidadania iguais e invioláveis não permitindo que sacrifícios experimentados por

poucos tenham menos valor que as vantagens experimentadas por muitos. Portanto,

só se pode aceitar uma injustiça a partir do momento que podemos corrigir ou evitar

outra injustiça ainda maior.

Ele também ressalta a difícil convivência dos indivíduos quando não há uma

ideia de consenso, do que é justo e do que é injusto. A ausência desse consenso faz

com que surjam as desconfianças e ressentimentos que desestabilizam o indivíduo e

fazem com que esse aja de forma diferente e muitas vezes sem uma razão

específica definida.

Essa instabilidade traz como consequência a falta de coordenação e

eficiência para entender o papel e as concepções básicas de direitos e deveres de

justiça os quais devem estar distribuídos e sempre presentes na razão de ser de

cada cidadão. Assim o autor coloca em sua obra (RAWLS, 2000, p. 7):

Precisamos levar em conta suas conexões mais amplas; pois embora a justiça tenha uma certa prioridade, sendo a virtude mais importante das instituições, ainda é verdade que, em condições iguais, uma concepção da justiça é preferível a outra quando suas consequências mais amplas são mais desejáveis.

A justiça social, objeto principal a ser discutido, é fundamentada por Rawls

(2000), baseada nos direitos e deveres fundamentais distribuídos na sociedade e

que estão alicerçadas nas instituições sociais definidas em nosso ordenamento

jurídico, dentre elas a proteção legal de pensamento e de consciência, a livre

iniciativa e competitividade dos mercados e a propriedade particular. Estes formam a

estrutura básica de uma sociedade que definem limites e influenciam nos projetos de

cada cidadão onde estão instituídos e irão influenciar no que cada um poderá vir a

ser ou almejar para o futuro.

A ideia principal de justiça levantada por Rawls (2000) é que as pessoas

devem definir o que é justo e o que é injusto, a partir de um consenso. Isto vai levar

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as pessoas a alcançar o objetivo que é o da justiça equitativa, pois ninguém pode

prever como será sua posição na sociedade, sua inteligência, distribuição de dotes

ou habilidades naturais, não sabe se vai ser do bem ou do mal e nem conhece suas

propensões psicológicas.

Assim, ele descreve sobre os princípios da justiça (RAWLS, 2000, p. 13):

Os princípios da justiça são escolhidos sob um véu de ignorância. Isso garante que ninguém é favorecido ou desfavorecido na escolha dos princípios pelo resultado do acaso natural ou pela contingência de circunstâncias sociais. Uma vez que todos estão numa situação semelhante e ninguém pode designar princípios para favorecer sua condição particular, os princípios da justiça são o resultado de um consenso ou ajuste equitativo.

Um ponto bastante relevante é com relação às injustiças causadas pelas

grandes desigualdades sociais e que acabam por “inflamar o espírito” conforme

Amartya Sen (2009) comenta em sua obra. As principais causas que revelam essas

injustiças estão relacionadas a profundas divisões sociais, ligadas a divisões de

classe, religião, sexo, cor, que acabam por impedir o desenvolvimento adequado das

sociedades.

Nesse contexto o autor aborda em sua obra (AMARTYA SEN, 2009, [S/P]):

É necessária uma argumentação racional pública, em lugar a uma rejeição sumária das opiniões contrárias, por mais implausíveis que estas possam parecer à primeira vista e por mais verborrágicos que possam parecer os protestos crus e grosseiros. Um engajamento aberto na argumentação racional pública é absolutamente fundamental na busca da justiça.

Outra questão também muito importante e que foi levantada por esse autor é

sobre a necessidade que a sociedade tem de ver que a justiça foi feita. Esse na

verdade deveria ser um dos princípios presentes em todo o ser humano, como já

citado também por John Rawls. A justiça deveria ser perseguida por todos sem que

precise ser demonstrada de fato. A sociedade é muito carente desse princípio e por

isso há uma grande dificuldade em chegar a um consenso sobre o que é justo ou

injusto demandando apenas que se faça justiça, independentemente se ela é justa

ou não, se é certa ou errada (RAWLS, 2000).

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A teoria da justiça deve acomodar uma gama variada de objetos de valor

para que seja significativa, sendo que paralelamente devem levar em consideração

também outras propostas que são importantes como as diferentes espécies de

igualdade ou liberdade. Por isso, o senso de justiça deve ser exercido utilizando-se

vários tipos de razões e considerações. Se observarmos opiniões de dois indivíduos

quaisquer, estes terão ideias e razões opostas para argumentar o seu ponto de vista

sobre determinado assunto, não necessariamente que um esteja certo e outro

errado, mas são pontos de vista diferentes que devem ser observados para que se

consiga atingir a plenitude de um senso de justiça.

Portanto, conforme Rawls argumenta em sua obra, é necessário enfrentar o

problema da justiça com equidade. Esta sim levará em consideração as diversas

razões e pontos de vista para alcançar um senso de justiça equilibrado, perfazendo

um conceito mais amplo e claro da teoria da justiça.

2.1 Justiça fiscal

A busca por uma compreensão mais ampla sobre o tema da justiça fiscal

requer alguns estudos mais aprofundados sobre alguns fatores, os quais são

extremamente importantes para sua aplicabilidade. Dentre eles estão à eficiência,

eficácia e efetividade, que formam um conjunto de fatores que devem ser

observados pelo Estado na contraprestação e distribuição dos serviços a sociedade,

a partir do momento em que há uma arrecadação de tributos. Somente a partir deste

entendimento é que podemos fundamentar melhor o tema justiça fiscal e sua

aplicação.

Segundo Caliendo (2009), a eficiência significa a realização de alguns

processos com o máximo aproveitamento de resultados e com um mínimo de

utilização de meios. Já a eficácia seria a produção de resultados com o máximo de

efeitos produzidos por estes. A efetividade seria então a maior produção de efeitos

num determinado tempo.

Aplicando estes conceitos a teoria da justiça fiscal, poderíamos dizer que a

arrecadação de tributos deveria ser devolvida a sociedade na forma de prestação de

serviços, ou seja, o Estado arrecada tributos e consequentemente deve dar uma

contraprestação ao cidadão, de forma que esta contraprestação seja eficiente,

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trazendo resultados para toda a sociedade, com um mínimo de recursos aplicados.

Essa contraprestação do Estado para com a sociedade irá gerar maior satisfação ao

cidadão e consequentemente maior geração de riquezas, tornando a economia mais

eficaz. Posteriormente gerará prosperidade ao Estado mostrando que houve

efetividade nas interferências deste poder de cobrar tributos, mas, em contrapartida,

fornecendo a toda sociedade os direitos fundamentais de amparo, liberdade e

igualdade.

Caliendo (2009) também cita que a eficiência possui uma medida diferente

para cada cidadão, dentre elas a utilidade, o dinheiro, a riqueza humana e a

felicidade. Cada indivíduo irá medir seu grau de contentamento baseado em algum

destes critérios que diferenciam o entendimento da eficiência e dos resultados

obtidos.

Desta forma, podemos concluir que não existe justiça sem eficiência, a qual

está ligada a conceitos de prosperidade e maximização de resultados, juntamente

com as ideias de eficácia e efetividade.

A justiça fiscal está diretamente relacionada com sociedade e Estado, onde

o primeiro tem o dever de participar proporcionalmente a sua capacidade, podendo

exigir direitos e garantias fundamentais de cidadania. Já o segundo possui o poder

para exigir do cidadão suas obrigações, mas deve respeitar as diferenças e

possibilidades para que não haja distorções e disparidades entre os critérios de

aplicação das normas observando sempre os limites ao poder de tributar.

Para isso, Caliendo nos apresenta três soluções para corrigir esta possível

disparidade nos meios de aplicação das normas tributárias e uma possível solução

para o sistema jurídico (CALIENDO, 2009, p. 175):

[...] 1) exigir o mesmo tratamento dado ás demais atividades econômicas, considerando-as como partes do todo (justiça comutativa); 2) exigir um tratamento diferenciado, considerando que esta atividade possui uma diferença substantiva em relação às demais atividades econômicas (justiça distributiva); ou 3) exigir um tratamento adequado ao bem comum, ou seja, em correta correlação entre o privado e a contribuição que este deve realizar à manutenção de uma esfera de liberdade e igualdade.

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Mas segundo ele, o tema da justiça fiscal não pode caminhar sozinho. É

necessário traçar um paralelo com a questão da neutralidade fiscal, os quais, para

Caliendo (2009), são princípios básicos e essenciais para uma sociedade, e devem

andar juntos para que haja garantia de ordem (consistência) e unidade (coerência)

do Sistema Jurídico Tributário.

O princípio da justiça fiscal, portanto, traz o conceito de como o cidadão

deve participar como contribuinte para a esfera pública e a correta aplicação desta

contribuição para a manutenção da prestação do serviço por parte do Estado.

Já o princípio da neutralidade fiscal relaciona a correta aplicação do tributo

com a prosperidade, alcançada através da eficiência, ou seja, como o cidadão vê a

contra prestação que o Estado lhe oferece mediante a contribuição recolhida.

Mas nem sempre a justiça fiscal irá nos levar a um equilíbrio da aplicação

das normas tributárias com maior equidade e eficiência ao sistema econômico.

Muitas vezes, justiça e eficiência não estão no mesmo patamar de entendimento e

aplicação, o que pode trazer frustrações do ponto de vista do sistema econômico.

Assim sendo, á ideia de neutralidade fiscal mostra-se num cenário mais

equilibrado e estabelece um padrão de contribuição melhor elaborado que vem a

tornar o sistema econômico mais efetivo e eficiente, sem onerar de maneira

indiscriminada a sociedade e consequentemente seus contribuintes.

A neutralidade fiscal pode ser definida da seguinte forma, conforme dispõe o

renomado Jurista (BARROSO, 2009, p. 288):

A ideia de neutralidade do Estado, das leis e de seus intérpretes, divulgada pela doutrina liberal normativista, toma por base o status quo. Neutra é a decisão ou a atitude que não afeta nem subverte as distribuições de poder e riqueza existentes na sociedade, relativamente à propriedade, renda, acesso às informações, à educação, às oportunidades etc. Ora bem: tais distribuições, isto é, o status quo - não são fruto do frequentemente, nada têm de justas. A ordem social vigente é fruto de fatalidades, disfunções e mesmo perversidades históricas. Usá-la como referência do que seja neutro é evidentemente indesejável, porque instrumento de perenização da injustiça. Veja-se que o problema não está só na neutralidade em si, mas em qual ponto de referência do que seja neutro. O status quo vigente nas sociedades desiguais – e poucas não o são – certamente não pode fundar-se no status quo não significa que não haja lugar para ela. Idealmente, o intérprete, o aplicador do direito, o juiz, deve ser neutro. [...]

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O princípio da neutralidade fiscal vem disposto na Constituição Federal de

1988, no art. 150, II, o qual veda ao Poder Público o tratamento desigual entre

contribuintes que se encontrem em situação equivalente, o que amplia e positiva a

ideia de concorrência e limita o poder de tributar do Estado.

Analisando o referido dispositivo constitucional, observa-se que o princípio

da neutralidade ou isonomia fiscal está explícito em nosso ordenamento jurídico,

sendo que um dos grandes dilemas a ser discutido é com relação à aplicabilidade

destas normas e seu mau entendimento, sua compreensão e real validade.

O Estado, conforme previsto no ordenamento jurídico, possui o poder de

tributar, sendo este poder, considerado por muitos como inquestionável e

autojustificável, bastando apenas à criação de uma norma tributária ligada a uma

breve justificativa para que se tenha um novo tributo, do qual não se verifica grandes

questionamentos e a real legitimidade desta nova norma tributária.

Neste cenário de poucos questionamentos sobre o real poder de tributar,

Caliendo (2009) apresenta algumas visões diferentes que demonstram esta

problemática.

A primeira delas, trás o pensamento conceitual, que é aquele entendido que

o poder de tributar é fruto de um poder soberano, sendo compulsório com o objetivo

de transferir riquezas do contribuinte para o Estado. Este pensamento está

entranhado na sociedade e parte de uma concepção moral de que o Estado possui o

poder absoluto ou de uma concepção do próprio indivíduo que o considera “mau”

perante ele mesmo.

A segunda visão apresentada por Caliendo (2009) é com relação ao

pensamento normativista, o qual descreve que o poder de tributar é uma

competência que está prevista no ordenamento jurídico, sendo que, só será válida

se estiver em conformidade com o sistema jurídico. Nesse entendimento, ele

demonstra que os questionamentos sobre a poder de tributar são irrelevantes, pois

se a norma prevê a aplicação, não há meios para que seja discutida a sua real

aplicabilidade ou justificação, sendo mera discussão moral e política.

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Como uma terceira visão está o pensamento sistemático que é onde está o

poder de tributar para a concretização de um valor, onde a contribuição fornece

recursos para o Estado promover políticas públicas de liberdade e igualdade.

Algumas ideias acabaram surgindo nos debates jurídicos com o

objetivo de ampliar o entendimento e a legitimidade do discurso jurídico sobre a

justiça, conforme ele aponta em sua obra (CALIENDO, 2009, p. 89):

Três ideias irão transparecer de modo imediato: i) a justiça como critério de validade do sistema jurídico e das normas particulares (direito porque justo); ii) o direito como critério e identificação da justiça (justo porque legal) e iii) o direito como instrumento de realização da justiça (direito para justiça).

Dentre estas três ideias apontadas, a terceira não é consenso de todos os

doutrinadores, pois nem sempre o direito é justo, e nem por isso deixará de existir a

norma jurídica prevendo o direito. A justiça, como já citado anteriormente, às vezes é

considerada injusta para uns e justa para outros, mas o direito, mesmo sendo

injusto, não irá retirar seu caráter jurídico, pois está positivado nas normas

constitucionais e infraconstitucionais.

Analisando alguns possíveis conceitos sobre a justiça fiscal, podemos

observar que chegar ao ponto máximo deste conceito e colocá-lo em prática

depende não apenas da vontade do Estado, mas sim, do cidadão entender que só

haverá meios para manutenção dos direitos fundamentais e necessários se o Estado

possuir recursos para estes fins.

As políticas fiscais precisam e muito ser modificadas para que não haja tanta

discrepância na obrigação de contribuir daqueles que auferem menores rendas

perante aos que deveriam contribuir mais, proporcionalmente a sua renda. Isso

demonstra que o princípio da capacidade contributiva deve ser sempre levado em

consideração para que o Estado possa impor seu poder de tributar, e não impor o

dever, penalizando alguns e privilegiando outros.

A contribuição é um dos poucos deveres exigidos do cidadão, e por isso,

este não deve encarar o tributo como uma mera imposição compulsória em que o

Estado lhe obriga a prestar. Deve sim, contribuir buscando ampliar e fortalecer o

princípio da solidariedade, que está diretamente ligado à justiça fiscal.

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Da mesma forma, o Estado precisa realinhar a aplicabilidade das normas

tributárias, visto que ela está cada vez mais carregada o que torna o contribuinte

cada vez mais insatisfeito e receoso em cumprir suas obrigações. Precisa-se sim,

que a princípio da neutralidade fiscal seja colocado em prática, juntamente com a

eficiência para alcançarmos a justiça fiscal tão necessária para o desenvolvimento

da solidariedade social.

Assim, a neutralidade fiscal pode ser melhor entendida, conforme o

renomado jurista proclama (CALIENDO, 2009, p. 113):

O princípio da neutralidade fiscal estabelece um valor ou fim, qual seja, diminuir legitimamente os efeitos da tributação sobre a decisão dos agentes econômicos, evitando distorções e consequente ineficiências no sistema econômico. A busca de um sistema tributário ótimo, ou seja, que realize as suas funções de financiamento de políticas públicas, promoção dos critérios fundamentais, evitando ao máximo interferências nas decisões econômicas é o grande desiderato do Direito Tributário.

Portanto, não podemos atingir uma sociedade solidária sem políticas

públicas eficientes. Da mesma forma não será possível obter políticas eficientes sem

que haja arrecadação para tal. Por isso, tanto o Estado como o cidadão devem

cumprir seu papel no enfrentamento das disparidades e de uma política fiscal justa,

eficiente e com poder de preservar ainda mais os direitos fundamentais dispostos no

ordenamento jurídico brasileiro.

2.2 O Estado de direito e a solidariedade social

O Estado abarca diversas responsabilidades e obrigações para com a

sociedade. Sem ele, a sociedade seria dispersa e sem rumo, sem limites e sem

direitos para serem exigidos mediante a contraprestação que esse é obrigado para

com o Estado revestido de poder.

Essa contraprestação compulsória é exigida a partir dos tributos, os quais

são de extrema necessidade para que políticas sociais sejam desenvolvidas a fim de

proporcionar meios eficientes a aquela fatia da sociedade mais necessitada. A

redução das disparidades sociais também é forma de desenvolvimento social, da

qual o Estado é o ator principal. É ele que regula o mercado, para que haja o

máximo de equidade entre os componentes de uma sociedade.

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Mas todo esse processo de desenvolvimento da sociedade e Estado

demandou de uma evolução constante desta relação, onde se criou, a partir desse

desenvolvimento, um sistema jurídico que regulamentou a relação sociedade-

Estado, criando direitos e deveres para o cidadão. O Estado, para tanto, foi revestido

de poder e também de limites, para que sua influência nas relações de mercado

encontre barreiras, as quais possam limitar sua interferência.

Essa evolução do Estado e sociedade ocorreu a partir de três estádios, onde

se definiram as bases do sistema jurídico, conforme o autor descreve em sua obra

(STRECK, 2006, p. 30):

A – o estado de natureza, como hipótese lógica negativa, reflete como seria o homem e seu convívio fora do contexto social; B – o contrato, instrumento de emancipação em face do estado de natureza e de legitimação do poder político e; C – o estado civil, portanto, surge como uma criação racional, sustentado no consenso dos indivíduos.

De acordo com Streck (2006), o estado de natureza trás uma sociedade

onde não há limites. Existem direitos, mas estes não são positivados. Há muitos

conflitos, quase uma sociedade em guerra. Cada indivíduo busca defender seus

próprios interesses e com isso não há desenvolvimento social. O Estado está

presente, mas não procura desenvolver políticas que venham a mediar os conflitos.

O contrato então, segundo o renomado autor, veio para mediar esta relação

sociedade-Estado com intuito de garantir os direitos fundamentais, os quais já eram

previstos no estado de natureza, mas que até então não estavam positivados. A

partir desse contrato, é que também podemos observar que o Estado impôs suas

regras e obrigações para que a sociedade consiga se desenvolver amparada por

este ente. O poder do Estado também foi limitado para que não influencie em

demasia nas relações de mercado.

A partir desse contrato firmado é que o Estado Civil surge com o objetivo de

desenvolver programas sociais e políticas públicas, sempre buscando ampliar os

direitos fundamentais da sociedade, mas também exigindo maiores deveres, a partir

do poder de que é revestido, fazendo cumprir tudo o que é seu por direito e que está

positivado, a partir desse contrato.

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Para Paulo Bonavides (2000), a sociedade é a mediadora das relações do

Estado e indivíduo, intermediando uma relação, regulando conflitos, sendo superior

ao Estado, mas inferior ao indivíduo. Ele ainda levanta um conceito desenvolvido por

Bobbio que a sociedade é “... o conjunto de relações humanas intersubjetivas,

anteriores, exteriores e contrárias ao Estado ou sujeitas a este”. (1957 apud

BONAVIDES, 2000, s.p.).

Já o Estado é quem possui o poder de limitar e regular a sociedade, mais

ainda, os componentes desta sociedade, que são os indivíduos. Conforme o

conceito de sociedade levantado por Bonavides (2000), o Estado é quem impõe as

condições para esta relação, sendo que a sociedade deve segui-las ou deve

contrariá-las.

Na mesma sintonia, este mesmo autor busca descrever em sua obra vários

conceitos de Estado criados por vários filósofos e pensadores. O conceito levantado

por Duguit apresenta elementos que demonstram e reconhecem-no melhor dentro

de uma teoria política constitutiva. Este conceito é constituído por elementos de

ordem formal e de ordem material, conforme exposto em sua obra (1923 apud

BONAVIDES, 2000, s.p.):

De ordem formal, há o poder político na Sociedade, que, segundo Duguit, surge do domínio dos mais fortes sobre os mais fracos. E de ordem material, o elemento humano, que se qualifica em graus distintos, como a população, povo e nação, é, em termos demográficos, jurídicos e culturais, bem como o elemento território, compreendidos estes... como “grupo humano fixado num determinado território”.

Mas Bonavides ainda persegue outro conceito e afirma que este abarca

melhor a ideia de Estado como um todo e melhor traduz a real definição desse ente

revestido de poder. Esta definição foi proposta por Jellinek e transcrito em sua obra,

definindo um conceito completo do que é Estado: “[...] é a corporação de um povo,

assentada num determinado território e dotada de um poder originário de mando”.

(1914 apud BONAVIDES, 2000, s.p.).

A partir dessas definições podemos concluir que o Estado detém poderes

para bem dirigir uma sociedade, da forma que melhor satisfaça suas reais

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necessidades políticas. Esses poderes foram constituídos pela própria sociedade, a

partir das constituintes.

Mas da mesma forma como foram constituídos poderes ao Estado também

foram dispostos deveres e limites, para que não houvesse contracensos ou

disparidades excessivas para com a sociedade. Para isso, os direitos fundamentais

e as garantias constitucionais também foram constituídos aos cidadãos para

servirem de barreiras para que não haja demasiada interferência do Estado, e sim,

que este haja de forma equilibrada, impondo seu poder e obrigações, sempre

respeitando os direitos sociais e fundamentais da sociedade, fazendo, dessa forma,

o Estado Civil positivado.

2.3 Estado Fiscal e solidariedade social

A evolução das políticas sociais e a necessidade cada vez maior de ampliar

os direitos fundamentais geraram diversas mudanças nas relações de Estado e

sociedade como um todo. Novas concepções de Estado foram surgindo com o

intuito de mudar a visão estatal política para uma visão mais cidadã, onde a

sociedade passou a ser o foco principal de atuação do Estado.

Essas mudanças foram surgindo no decorrer das novas concepções

amparadas pela constituição. O Estado passou a dedicar maiores investimentos nas

áreas sociais, para garantir melhores condições de vida ao cidadão.

Em contra partida, este mesmo Estado passou a exigir um pouco mais do

cidadão, através da imposição de novos tributos que lhe tornaram a vida um pouco

mais onerosa. Esse cidadão, por sinal, passou a ter nova denominação passando a

ser chamado de contribuinte, o qual, compulsoriamente deve pagar tributos ao

Estado. Em contrapartida, esse mesmo Estado tem o dever de lhe contraprestar em

serviços sociais, amparar os mais necessitados e garantir os direitos básicos e

fundamentais previstos no ordenamento jurídico.

Muitas dessas mudanças ocorreram a partir da promulgação da Constituição

Federal de 1988, a qual implantou novas ideias e pensamentos sobre a real

finalidade da captação de recursos, por parte do Estado, através da tributação. Não

que as constituições anteriores não previssem direitos e obrigações sociais, mas o

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foco principal era outro, principalmente o de manter uma estrutura de proteção

governamental forte, sem muitos investimentos nas políticas sociais que pudessem

melhorar a vida do cidadão.

Ao realizar um breve histórico da Constituição Federal promulgada em 1967,

pode-se observar que ela visava como principal objetivo, disciplinar a Organização

Nacional, onde a preocupação principal era o aparato estatal. Os direitos

fundamentais da sociedade somente apareciam após todos os objetivos estruturais

do governo, mostrando que a preocupação e o objetivo principal era com o Estado e

sua devida proteção.

Já a Constituição Federal de 1988 passou de uma Constituição de Estado

Brasileiro para uma Constituição da Sociedade Brasileira, onde o foco deixou de ser

o poder do Estado passando então para a dignidade da pessoa humana,

contemplado por várias cláusulas pétreas de proteção aos direitos fundamentais,

livre iniciativa, dignidade e valores sociais, formando assim o Estado Democrático de

Direito.

Desta forma, o debate tributário também sofreu modificações ao longo dos

anos e da evolução de nosso ordenamento jurídico. A solidariedade social passou a

ser muito mais debatida, paralelamente a tributação, trazendo como forma de

justificação alguns argumentos para a ampliação e aplicação do sistema tributário,

em três momentos distintos, conforme Greco (2005) expõe em sua obra.

O primeiro momento é o da justificação da exigência do tributo, o qual diz

que é dever fundamental de todo cidadão contribuir para o custeio do Estado, na

medida de sua capacidade contributiva. Ainda procura demonstrar a

responsabilidade do Estado em atingir os objetivos constitucionais, com principal

ênfase na aplicação dos recursos, oriundos da tributação, objetivando um debate

mais profundo sobre a justiça dos fins.

Num segundo momento, está o critério da congruência da legislação

tributária, a qual serve para identificar distorções e limitar o abuso de poder de

legislar do Estado, procurando criar barreiras para que o cidadão contribuinte não

seja penalizado, além de evitar desvios de leis tributárias que não tenham um fim

específico de amparo e prestação de serviços à sociedade.

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Como terceiro momento está o critério de interpretação das normas

positivadas, visando ampliar o debate sobre o princípio da capacidade contributiva,

definindo limites ao poder de tributar por parte do Estado.

Dessa forma, pode-se apresentar um novo cenário totalmente diverso dos

anteriores, através da Constituição Federal de 1988, a partir de novas concepções

de Estado e todas as modificações e transformações, conforme ele expõe em sua

obra (GRECO, 2005, p. 172):

A CF/88 assume feição nítida de uma solução de compromisso entre concepções distintas de Estado; compromisso que implica não haver prevalências genéricas de nenhum dos dois conjuntos de elementos (nem do Estado de Direito nem do Social), mas reconhece a necessidade de proceder a constantes ponderações de valores que podem levar episodicamente e diante de determinados casos concretos à prevalência de uns ou de outros.

Sendo assim, podemos observar que a própria Constituição Federal

descreve seu objetivo e qual o fim que suas leis devem perseguir, buscando

alcançar uma sociedade livre, justa e solidária.

Para isso, todo o ordenamento jurídico deve seguir para um mesmo caminho

e respeitar o que proclama a norma constitucional. Conforme estabelece o art. 3º da

Constituição Federal de 1988, o objetivo fundamental da República é construir uma

sociedade solidária. Para tanto, podemos visualizar que todo o arcabouço de

normas infraconstitucionais deve respeitar e seguir na mesma linha de entendimento

dos objetivos constitucionais. Assim, Greco descreve em sua obra (GRECO, 2005,

P. 176):

Esta ideia de solidariedade social e de caminhar sem retrocesso em direção aos objetivos constitucionais informa plenamente debates que tem sido postos no âmbito tributário e dela decorrem desdobramentos importantes, pois na medida em que o foco constitucional mudou, o sentido das funções desempenhadas pelo Poder Público também mudou. Portanto, a interpretação de figuras normativas existentes em subordenamentos sofre reflexos dessa nova perspectiva fundamental.

Toda esta evolução ocorrida através das novas concepções propostas e

alcançadas pelas novas ideias constitucionais trouxeram também novos conceitos

para a busca de uma sociedade equilibrada, onde o Estado deve ser o propulsor na

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positivação e efetivação dos direitos fundamentais aos indivíduos e em

contrapartida, para sua sustentação financeira, depende da captação de recursos

através da cobrança de tributos, surgindo então o conceito de Estado Fiscal.

O Estado Fiscal teve sua denominação levantada por Lorenz Von Stein e

segundo ele, pode ser conceituado como um Estado Constitucional, que divide

competências fiscais, determinando como ele deve ser financiado e também

expondo os limites ao poder de tributar.

Alguns autores, dentre eles Keynes, defende que a busca pelo pleno

emprego e a justa distribuição de rendas depende da efetivação das normas

impostas pelo Estado Fiscal, o qual passa a ser denominado também de Estado

Social, por perseguir esse equilíbrio de mercado e também uma equidade na

promoção dos direitos sociais.

Desta forma, somente através dos recursos custeados pelos contribuintes é

que se pode ter a possibilidade de vislumbrar um Estado Social, onde os tributos

deixam de ter apenas a finalidade financeira passando a abarcar novas concepções

e finalidades extrafiscais, como a redistribuição de rendas, conforme Caliendo (2009)

expõe em sua obra.

Nesta linha de pensamento, o renomado autor descreve (CALIENDO, 2009,

p.147):

O Estado Fiscal pode tanto receber a forma de um Estado Liberal, como de Estado Social. No Estado Liberal o financiamento do Estado realiza-se por meio de impostos, respeitando-se, principalmente, o princípio da neutralidade econômica em busca de uma eficiência econômica da nação. Por outra parte, em uma crítica explícita desse descompromisso liberal o Estado Social busca por meio da intervenção econômica a promoção da justiça social.

Assim sendo, podemos observar que o Estado Social, apresentando um

leque de argumentos para a imposição de novos tributos, passa a ser questionado e,

não tendo uma efetividade tão maciça, onde o pacote de boas intenções do Estado

Social em exigir cada vez mais tributos do contribuinte, com o fim de promover a

justiça fiscal, acaba por lesar alguns interesses da sociedade desencadeando assim,

uma crise fiscal, através da estagnação das receitas tributárias.

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Caliendo (2009) defende a ideia de um Estado Tributário o qual seria um

Estado financiado por meio de tributos vinculados, ou seja, aqueles tributos

contraprestacionais ou denominados causais, os quais são vinculados a uma

atuação estatal, transformando os recursos em fornecimento de bens, serviços ou

utilidades públicas.

Com essa concepção de Estado Tributário, haverá uma grande mudança na

evolução do Estado Fiscal, onde os recursos arrecadados passam a ter um fim

diverso daquele apenas estatal, passando a ter um fim de proteção e promoção dos

direitos sociais, sendo que o problema passa a ser também do cidadão contribuinte

e não apenas do ente estatal.

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3 TRIBUTO E SUAS CARACTERÍSTICAS

O Sistema Tributário Brasileiro possui vários tipos de tributos. Inicialmente

precisamos entender como estão definidos em nosso ordenamento jurídico, com

base em leis e diretrizes impostas pelo Estado. Se tributário é o direito,

precisamos entender sua definição, visto que é ele que redireciona para a correta

definição e entendimento do que é tributação.

Segundo a definição dada por Meirelles (2002, p. 35):

O Direito, objetivamente considerado, é o conjunto de regras de conduta coativamente impostas pelo Estado. Na clássica conceituação de Ihering, é o complexo das condições existenciais da sociedade, asseguradas pelo Poder Público. Em última análise, o Direito se traduz em princípios de conduta social, tendentes a realizar Justiça.

Conforme Meirelles (2002), o Direito tem a finalidade e objetivo principal de

fazer justiça, ou seja, através de normas impostas pelo Estado, criar meios para que

a sociedade em geral possa ser amparada e também seguir determinada linha de

conduta social, para que possa conviver em harmonia. Desta forma, a definição de

Direito nos remete a refletir sobre sociedade solidária e seu bem estar, que está

diretamente positivado em nosso ordenamento jurídico.

A Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, em seu artigo 1º,

definiu alguns fundamentos que os tornam como base para o conceito de Direito,

visto que a sociedade está amparada por princípios fundamentais que devem ser o

alicerce de uma sociedade organizada. A soberania, a cidadania, a dignidade da

pessoa humana, os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa e o pluralismo

político, são fundamentos essenciais que definem o Direito e principalmente,

legitimam e orientam o amparo que o Estado deve dar e prestar a sociedade.

Mas de que maneira o Estado pode amparar a sociedade sem obter uma

contrapartida do cidadão? Como o Estado consegue manter uma boa prestação de

serviços e pode alcança-los ao povo de maneira justa e equilibrada?

É aí que surge esta contraprestação advinda do contribuinte, que é chamada

de tributo. Este é o meio que o Estado possui para arrecadar recursos e revertê-los

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em serviços ao cidadão e também para legitimar aquelas garantias constitucionais,

que de uma forma ou de outra, só podem ser disponibilizados, se o Estado possuir

recursos para tanto. De outra forma, seria mera formalidade ter-se os princípios

fundamentais e garantias constitucionais expressos em nosso ordenamento jurídico

sem que pudessem ser cumpridos e prestados pelo Estado.

Desta forma, conforme Meirelles (2002), tributário é o Direito que nos

orienta. O Direito, por sua vez, é o conjunto de normas que regulam e orientam a

sociedade.

Sendo assim, pode-se definir o Direito Tributário da seguinte forma

(CARVALHO, 2007, p. 15):

[..] o Direito Tributário é o ramo didaticamente autônomo do Direito, integrado pelo conjunto de proposições jurídico-normativas, que correspondam, direta ou indiretamente, à instituição, arrecadação e fiscalização de tributos.

Desta forma, Souza (1975) conceitua o Direito Tributário como o ramo do

Direito público que rege as relações jurídicas entre o Estado e os particulares,

decorrentes da atividade financeira do Estado no que se refere à obtenção de

receitas que correspondam ao conceito de tributo.

A partir de tais definições sobre o Direito Tributário, Sabbag (SABBAG,

2012, p. 41) resume alguns dos conceitos e define-o sucintamente da seguinte

forma: “o Direito Tributário é o conjunto de normas que regula o comportamento das

pessoas de levar dinheiro aos cofres públicos”.

Visto que buscamos uma definição de Direito e também de Direito Tributário,

basta agora encontrarmos uma definição efetiva para Tributo.

De acordo com o Sistema Tributário Brasileiro, expresso no Código

Tributário Nacional, instituído pela lei nº 5.172, de 25 de outubro de 1966, em seu

artigo 3º, o tributo pode ser definido assim:

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Art. 3º - Tributo é toda prestação pecuniária compulsória, em moeda ou cujo valor nela se possa exprimir, que não constitua sanção de ato ilícito, instituída em lei e cobrada mediante atividade administrativa plenamente vinculada.

Conforme a definição expressa em nosso ordenamento jurídico entende-se

que o tributo é a uma prestação exigida e definida em lei, imposta pelo Estado, ao

contribuinte, de forma a custear os serviços disponibilizados a sociedade em geral,

além de garantir ao cidadão os direitos mínimos, básicos e fundamentais, que estão

definidos em nossa carta maior. Portanto, podemos dizer que tributo é uma ação

estatal, exigida pelo Estado, para custear as despesas originadas pela prestação

dos serviços básicos alicerçadas nos fundamentos de cidadania, soberania e

dignidade humana.

Algumas críticas surgiram sobre o conceito de tributo previsto no artigo 3º do

Código Tributário Nacional, o qual fala em prestação pecuniária, em moeda ou cujo

valor nela se possa exprimir. A prestação pecuniária propriamente dita já traduz que

o pagamento deve ser em moeda, eliminando qualquer outra possibilidade diversa

como pagamento em prestação de serviços ou qualquer outra espécie que não seja

em moeda corrente. Portanto, este conceito de tributo, segundo Sabbag (2012),

deixa margem para outras interpretações, quando fala que a prestação pecuniária

pode ser em moeda ou valor que se possa exprimir.

Para tanto, pode-se definir e conceituar o tributo da seguinte forma, segundo

Luciano Amaro: “Tributo é a prestação pecuniária não sancionatória de ato ilícito,

instituída em lei e devida ao Estado ou a entidades não estatais de fins de interesse

público”. (AMARO, 2006, p. 25)

A partir deste conceito, podemos começar a esmiuçar a palavra tributo e

buscar os fundamentos principiológicos do nosso sistema tributário.

3.1 Princípios do Sistema Tributário Nacional

Dentre as Constituições Federais promulgadas ao longo dos anos no Brasil,

as quais tiveram sua evolução calcada em princípios que norteiam o ordenamento

jurídico brasileiro, pode-se dizer que a Constituição Federal de 1969 foi a que mais

arrolou princípios, muitos desses já oriundos das constituições anteriores e editados

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para acompanhar a evolução constante dos direitos e deveres, principalmente no

que concerne aos limites ao poder de tributar do Estado.

Os princípios do Sistema Tributário Nacional vêm sendo dispostos em nossa

carta maior há várias décadas, mas foi a partir da Constituição Federal de 1946 que

se tornaram mais efetivos, sendo que nenhuma outra constituição superava a carta

maior brasileira em termos de limitações expressas e disposições jurídicas

norteadas nos princípios constitucionais tributários.

Segundo Baleeiro (2005), o sistema tributário movimenta-se sob complexa

aparelhagem de freios e amortecedores, através de seus princípios, que além de

nortearem a edição e aplicação das leis exigindo deveres e norteando os direitos

para os cidadãos, também limitam poderes atribuídos ao Estado, evitando assim

excessos que poderiam interferir demasiadamente na economia e principalmente na

preservação dos direitos individuais.

Por isso, os princípios tributários são tão importantes em nosso

ordenamento jurídico, pois sem eles estaríamos diante de um Estado autoritário e

sem limitações. Assim, a opção pelo positivismo jurídico de que os princípios

constitucionais tributários devem ser o alicerce central para as reformas tributárias e

fiscais tornaram nossa Constituição Federal uma das mais completas e limitadoras

do poder, formando assim, um Estado Democrático de Direito, onde a igualdade, a

justiça, a solidariedade e o desenvolvimento são metas prioritárias para alcançar os

objetivos constitucionais que positivam nosso ordenamento jurídico brasileiro.

Dentre as evoluções alcançadas pela Constituição Federal de 1988 e que

tornaram o cidadão brasileiro melhor amparado e com um conjunto de direitos mais

disponíveis, está à democracia. Esta por sua vez, trouxe além dos direitos, a

liberdade de expressão e de voto, para que pudesse desta forma, alcançar o Estado

Democrático de Direito.

Mas o que tornou a atual carta maior um marco para o ordenamento jurídico

foi o conjunto de princípios e imunidades, os quais formaram juntamente com

aqueles direitos e garantias individuais de liberdade, igualdade, irretroatividade e

capacidade contributiva, uma estrutura central que limita o poder de tributação do

Estado.

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Aliomar Baleeiro define princípios e imunidades em conceitos diferentes,

mas que estão literalmente expressos em nosso ordenamento constitucional, sendo

que alguns dos princípios podem inspirar imunidades, como ele expõe em sua obra

(BALEEIRO, 2005, p. 16):

[...] os princípios, ao ditarem o sentido e a inteligibilidade do sistema, tanto podem inspirar uma imunidade, como, ao contrário, uma regra confirmatória de poder tributário, assim como marcar as condições ou os requisitos para o bom exercício da competência tributária, limitando ou expandindo o poder de tributar.

Desta forma, os princípios e imunidades não podem ser confundidos.

Somente àqueles servem de alicerce para a criação de normas e também regulam o

Sistema Tributário Nacional. Assim, o conjunto de princípios constitucionais,

juntamente com os direitos fundamentais componentes do ordenamento pátrio,

acabam por inspirar outros limites como é o caso da imunidade.

Esta por sua vez, está literalmente disposta no ordenamento constitucional

de 1988 trazendo um rol de imunidades, a partir do art. 150, seção II intitulado “Das

Limitações do Poder de Tributar”. Mas nem todo o princípio jurídico leva a uma

imunidade. Apenas condicionam o exercício de competência para tributar, como por

exemplo, a legalidade, a anterioridade e a irretroatividade, os quais são princípios

que norteiam a criação de normas jurídicas.

Como forma de limitação, as imunidades executam seu papel fundamental e

estão expressamente dispostas em nossa carta maior, como citado acima. Sendo

assim, Aliomar Baleeiro define imunidade (BALEEIRO, 2005, p. 16):

Podemos conceituar as imunidades como regra expressa da Constituição (ou implicitamente necessária), que estabelece a nãocompetência das pessoas políticas da Federação para tributarem certos fatos e situações, de forma amplamente determinada, delimitando negativamente, por meio de redução parcial, a norma de atribuição de poder tributário.

As imunidades, portanto, executam um papel muito importante e de extrema

funcionalidade em nosso ordenamento jurídico, pois é através delas que

contribuintes, entidades, instituições, etc... usufruem de um benefício, ficando

protegidos do excesso de poder de tributação do Estado. Estes beneficiados

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possuem esta imunidade, na maioria das vezes, por cumprirem um papel social, ou

desempenharem atividade pública, ou para servir de benefício para certa categoria

específica.

As constituições Federais anteriores a de 1988 previam muitas imunidades,

sendo que várias delas estavam implicitamente dispostas no ordenamento. Já na

carta maior atual, essas imunidades tornaram-se expressas ampliando seu leque.

Sendo assim, ela só pode beneficiar alguém se estiver previsto em lei, não podendo

ser aplicada se não estiver expressamente disposta no ordenamento jurídico.

Como já falamos anteriormente, as imunidades não podem ser confundidas

com princípios. Esses sim formam a base para a criação de leis e diretrizes. É

através dos princípios constitucionais que a legislação tributária encontra seu norte.

Dentre esses princípios, podemos citar aqueles que estão dispostos no art. 150 da

Constituição Federal, que são: legalidade, igualdade, capacidade tributária,

irretroatividade e anterioridade.

Além destes princípios constitucionais citados, existem outros que também

são utilizados para complementar e formar o conjunto de normas tributárias, sendo

que alguns deles se encontram implícitos, mas contribuem para inspirar o sistema

tributário nacional, conforme Baleeiro cita em sua obra (BALEEIRO, 2005, p. 784):

a) a destinação pública dos tributos, deduzido dos art. 145 a 162, 150 I, II, III, 165 e 194-195 da Constituição Federal; b) a praticidade, princípio esparso por detrás das normas constitucionais, que inspirou de perto as normas dos art. 170, § 7º e 155, XIII da Constituição Federal; c) a inviolabilidade da intimidade e de dados (art. 5º, X e XII).

Entre esses princípios constitucionais que alicerçam toda a legislação

tributária e que serviram de ancora para o desenvolvimento de nosso Sistema

Tributário Nacional e que será objeto de um estudo mais aprofundado no presente

trabalho, podemos citar a legalidade, a igualdade e a capacidade contributiva. Estes

possuem importância maior, pois determinam a aplicabilidade do Imposto sobre

Grandes Fortunas. Trataremos de cada um deles a seguir.

O princípio da legalidade, conforme levantamento histórico estudado por

Aliomar Baleeiro (2005) derivou do corporativismo medieval. Por volta do século XI,

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antes ainda da Constituição Inglesa, o princípio da legalidade era denominado de

princípio da autotributação, onde os encargos tributários eram consentidos por

aqueles que os suportassem, dando origem, logo em seguida ao princípio da

anualidade. Conforme o autor, a legalidade tributária deu origem a outros princípios

que até hoje norteiam nosso ordenamento jurídico.

O princípio da anualidade surgiu num primeiro momento como meio de

autorização orçamentária, tornando-se posteriormente um mecanismo de

periodização de impostos e de planejamento de alterações legislativo-tributárias. Já

na evolução tributária brasileira surgiu o princípio da anterioridade buscando evitar

então as violações na ordem dos fatos os quais culminaram para a criação deste

princípio.

Nesse contexto, Baleeiro (2005) leciona que o princípio da legalidade não

pode ser estudado separado dos princípios da anualidade e da anterioridade, pois

ambos abarcam relações importantes, os quais tem o condão de completá-lo. Assim,

tratando os três princípios de forma associada é que se percebem algumas

consequências de grande relevância, que transmitem o espírito das disposições

expressas em nosso texto constitucional.

Ele nos mostra ainda que é preciso manter associados estes princípios para

que a legislação seja aplicada e norteada de forma correta, alcançando assim os

objetivos constitucionais dispostos em nosso ordenamento jurídico. Assim, o autor

descreve a associação entre o princípio da legalidade e da anterioridade

(BALEEIRO, 2005, p. 49):

A legalidade, associada a anterioridade, permite entender que, tendo vigência imediata as medidas provisórias, mesmo antes de convertidas em lei, e podendo ser editadas somente em caso de urgência e relevância pelo Presidente da República, desencadeiam em antecipação de efeitos a existência da própria lei por força do art. 62 da CF. Já o princípio da anterioridade que está ligado indissociavelmente ao da legalidade tributária no art. 150, III, b, adia a eficácia e a aplicação da lei tributária já existente para o exercício financeiro subsequente ao de sua publicação, o que torna incompatível o procedimento das medidas provisórias com a criação e majoração de tributos.

Na mesma linha de raciocínio, Baleeiro (2005), também demonstra um

estudo comparativo de atuação do princípio da legalidade com o da anualidade, o

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qual este último, determina a periodização dos impostos em um ciclo anual

obrigatório (BALEEIRO, 2005, p. 49):

Anualidade, associada a legalidade, permite deduzir as regras da periodização dos impostos incidentes sobre a renda e o patrimônio, reflete toda a visão estatal e econômico-social do País, a partir da Constituição. Para certo ano, a lei orçamentária estima as despesas e as receitas a serem arrecadadas; no exercício financeiro anual se executam as leis tributárias (e orçamentárias) e, anualmente, se prestam contas dessa execução. Nesse ciclo anual obrigatório, tanto no âmbito federal, como no estadual e municipal, não é livre o legislador ordinário para reduzir o exercício anual em período menor.

O princípio da legalidade, disposto nos art. 5º da Constituição Federal e art.

150, I do Código Tributário Nacional determinam que os entes federados só poderão

exigir ou aumentar o tributo do contribuinte, mediante lei que o estabeleça,

demandando esta associação com os demais princípios dispostos anteriormente.

Além dessas ligações citadas, Baleeiro (2005) ainda leciona que a associação

desses três princípios também abarca o princípio da irretroatividade, para o qual as

normas devem estar previamente dispostas. Também essa inter-relação dos

princípios conduz a necessidade de planejamento dos tributos, juntamente com as

despesas, para a correta ordenação e racionalização da Administração Pública.

Assim, percebe-se que o princípio da legalidade juntamente com outros que

são regrados em nossa carta maior, como a separação de poderes, a

indelegabilidade de funções, a república democrática e o federalismo, formam um

conjunto de princípios considerados como salvaguardas de um regime de respeito à

pessoa humana em toda sua dimensão, limitando o poder do Estado, evitando desta

forma prováveis abusos aos direitos fundamentais do cidadão.

Contanto, pode-se observar que na Constituição Federal existem algumas

restrições a exceções ao princípio da legalidade e anterioridade, as quais limitam a

possibilidade de variação nas alíquotas ou base de cálculos dos impostos, a fim de

ajustá-los de acordo com os objetivos da política econômica vigente, manobra essa

considerada abusiva, que na Constituição Federal de 1988 passou a ser um pouco

mais restrita.

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Assim como os demais princípios citados anteriormente e que fazem parte

de um conjunto, que busca definir e orientar o Sistema Tributário Nacional, o

princípio da igualdade também tem esse intuito. Na carta maior de 1988 ele deixou

de estar implícito, passando a denotar sua importância na literalidade das leis

tributárias de nosso país. Existe uma relação muito próxima entre os princípios da

igualdade, pessoalidade e capacidade contributiva que os tornam próximos, pois um

estabelece o limite do outro, estando assim ambos, relacionados e interligados no

que concerne a sua aplicação e exigibilidade dos tributos.

O princípio da igualdade também pode ser evidenciado como a preservação

integra da justiça. Desde outros tempos, Platão e Aristóteles já defendiam que

justiça e igualdade eram virtudes e que a justiça distributiva seria vista como a

igualdade da distribuição de riquezas, honras e outros bens entre os cidadãos, onde

o injusto é o desigual, e o justo é o igual.

Mas para que possamos ter uma dimensão desse princípio, deve-se traçar

uma relação proporcional onde através da comparação é que podemos visualizar a

igualdade material, entre a felicidade e a tristeza, a riqueza e a miséria, ambos

relacionados e comparados a outras situações. Sendo assim, tratar de forma igual

aqueles proporcionalmente iguais e de forma desigual aqueles proporcionalmente

desiguais é buscar a igualdade formal, defendida em sociedades capitalistas,

contrário ao sistema normativo constitucional moderno.

A igualdade econômica material passa a ser disposta como a base para o

constitucionalismo moderno, a qual busca os fatos para a ampliação de ideias

socialistas, levando a redução das desigualdades sócio econômicas e ampliação da

redistribuição de renda, fortalecendo o Estado Democrático de Direito sem afastar a

ideia de igualdade formal, onde deve-se tratar igualmente aqueles

proporcionalmente iguais e desigualmente aqueles proporcionalmente desiguais.

Desta forma, a igualdade tem o condão de limitar os poderes e garantir que

não haja abuso na aplicação das normas, distinguindo de maneira abusiva os

cidadãos e principalmente os contribuintes. Essa distinção deverá ocorrer sim, mas

de forma ordeira, para que não haja uma norma que venha a uniformizar, e sim,

aplicar a legislação de acordo com a capacidade daquela categoria ou grupo

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econômico, buscando assim, um melhor equilíbrio na aplicação das leis, ampliando

os ideais de segurança e igualdade.

Nesse entendimento, Baleeiro leciona em sua obra (BALEEIRO, 2005, p.

532):

Na verdade, no Estado Democrático de Direito, a correta aplicação da lei assegura mais. Assegura que não se distinga onde o legislador não pode e efetivamente não distinguiu e que se distinga onde o legislador, devendo, de fato distinguiu. Mas assegura ainda que o juiz afaste a lei infringente da igualdade, que discriminou arbitrariamente ou que ignorou a diferença juridicamente relevante. A correta aplicação da lei, no constitucionalismo moderno, deve ser tomada em sentido material, na acepção de correta aplicação da norma válida, à vista dos requisitos formais e substanciais da Constituição Federal.

Essa busca pelo princípio da igualdade, nos mostra que a legislação

tributária nacional deve ser guiada por normas imparciais, uniformes e de

regularidade na aplicação, trazendo para tanto, um tratamento igual para os casos

iguais e um tratamento desigual para casos desiguais. Esta sim é a igualdade formal

que se busca e que pode ser discutida de modo diferente para os casos específicos,

em que as normas gerais não cabem. Desta forma pode se alcançar os objetivos de

um Estado Democrático de Direito, evitando as disparidades na aplicação das leis e

positivando a ideia de que os seres de uma mesma categoria essencial devem ser

tratados da mesma maneira e modo.

Nosso texto constitucional comunga duas espécies de deveres que são

advindos do princípio da igualdade. São eles, o dever de não distinguir e o dever de

discriminar; os quais se interpenetram e conjugam-se, segundo Baleeiro (2005).

Assim, o texto constitucional traça normas de isonomia quando proíbe a União de

instituir tributo desuniforme entre os Estados, evitando o privilegio de alguns e

benefícios de outros. Também a legislação constitucional tributária proíbe a distinção

entre iguais, aqueles contribuintes de mesma capacidade econômica, além das

pessoas políticas da Federação, União, Estados, Distrito Federal e Municípios.

A própria Constituição Federal de 1988, em seu art. 145, §1º, enfatiza que

sempre que possível, os impostos devem ter caráter pessoal e devem ser aplicados

segundo a capacidade econômica do contribuinte. Como o próprio texto

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constitucional dispõe, somente os impostos podem ter esse caráter pessoal,

diferente do que ocorre com as taxas, contribuições e demais tributos, os quais

procuram estabelecer uma regra geral, não observando a capacidade econômica do

contribuinte para sua aplicação.

A doutrina em geral sempre considerou a capacidade econômica tributária

como a matriz dos princípios da igualdade, proporcionalidade e do não confisco,

considerado por muitos como um critério mais preciso para a medição dos impostos.

Desta forma, Baleeiro define um conceito de capacidade econômica (BALEEIRO,

2005, p. 537):

A capacidade econômica de contribuir às despesas do Estado é aquela que se define após a dedução dos gastos necessários á aquisição, produção e manutenção de renda e do patrimônio, assim como do mínimo indispensável a uma existência digna para o contribuinte e sua família. Tais parcelas, correspondentes a tal passivo, não configuram capacidade econômica, assim como o seu ferimento pelo tributo terá efeito confiscatório da renda e do patrimônio.

Observar que a legislação deve seguir o trilho da proporcionalidade entre os

princípios da igualdade e da capacidade econômica é o meio para estabelecer um

equilíbrio na aplicação das normas tributárias, restringindo as desigualdades. Já a

capacidade econômica busca extrair, através da pessoalidade do imposto, até onde

o Estado pode exigir do contribuinte suas obrigações, evitando assim que alguns

sejam beneficiados e outros prejudicados pela aplicação da legislação vigente e

aquela que vier a ser implementada.

Assim como os demais princípios citados anteriormente e que fazem parte

de um conjunto de reservas constitucionais que limitam o poder de tributar do

Estado, o princípio da capacidade tributária também tem este condão de proteger o

cidadão contribuinte e evitar a violação dos direitos e garantias fundamentais. Ele

está disposto em nosso texto constitucional, no art. 145, §1º da seguinte forma

(CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988):

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Art. 145 [...] §1º Sempre que possível, os impostos terão caráter pessoal e serão graduados segundo a capacidade econômica do contribuinte, facultado a administração tributária, especialmente para conferir efetividade a esse objetivo, identificar, respeitados os direitos individuais e os termos da lei, o patrimônio, os rendimentos e as atividades econômicas do contribuinte.

Conforme se observa, a capacidade tributária é o princípio que concretiza os

direitos fundamentais individuais de igualdade, de direito a propriedade e da

vedação ao confisco, os quais não devem ser considerados apenas na aplicação ou

criação das normas, mas sim em toda a interpretação e aplicação da lei tributária,

conforme a sua essência, evitando a violação das garantias através da criação de

barreiras que venham a proteger e diferenciar aqueles contribuintes

proporcionalmente iguais daqueles proporcionalmente desiguais.

Com a aplicação desse princípio, o legislador constitucional busca a

personalização do contribuinte sempre que possível, como o próprio texto diz. Não

haverá possibilidade de personalizar o imposto quando estivermos falando em

tributação de produtos industrializados e importados, sobre operação e circulação de

mercadorias, além de outros, pois fica muito difícil mensurar a capacidade

econômica tributária deste consumidor que adquire produtos e serviços, os quais

possuem tributações diversas já embutidas em seus preços. Nesse campo de

tributação de produtos e serviços a Constituição Federal estabeleceu como melhor

aplicação o princípio da seletividade, mas que não é objeto de estudo do presente

trabalho.

Nessa linha, Baleeiro leciona em sua obra (BALEEIRO, 2005, p. 697 e 698):

É, entretanto, errôneo pretender reduzir a justiça tributária ao princípio da capacidade contributiva. Nem a igualdade, nem a justiça tributária se reduzem aos limites da capacidade contributiva. Nem assim o sistema tributário. Fenômenos como a extrafiscalidade (em que a necessidade e o mérito são os critérios de comparação a informar o princípio da igualdade, havendo, nos incentivos, benefícios a contribuintes dotados de grande capacidade contributiva), a praticidade, a comodidade e o combate à evasão fiscal informam o sistema e atenuam o relevante papel cumprido pela capacidade econômica de contribuir.

Portanto, é por essas e outras colocações do referido autor que se observa

grandes distorções na aplicação da legislação tributária em nosso país. A

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capacidade contributiva de alguns que acaba sendo desprezada pelo Estado.

Através de benefícios fiscais mal direcionados, acaba por onerar demasiadamente

aqueles contribuintes com baixa capacidade contributiva. O Estado opta por tributar

indiretamente através da alta tributação aplicada nos produtos e serviços os quais

são utilizados, sem distinção e diferenciação pela população em geral, ao invés de

criar alíquotas que venham a tributar progressivamente de acordo com as

possibilidades econômicas de cada contribuinte.

Nosso ordenamento constitucional já previu todas estas possibilidades,

através de seus princípios, que estão explicitamente dispostos e que deveriam ser

aplicados genericamente, ao contrário do que se observa na atualidade.

Baleeiro (2005) conclui e analisa em sua obra, a possibilidade e as

consequências de uma política tributária baseada na ampliação dos impostos

pessoais, buscando assim a justiça fiscal, através da personalização dos impostos,

onerando menos os produtos e serviços e ampliando a tributação de acordo com a

renda, através de alíquotas progressivas, efetivando assim o princípio da

capacidade tributária e alcançando o objetivo final que é a justiça fiscal.

3.2 Espécies de tributo

Para a definição de quais os tipos de tributos formadores do Sistema

Tributário Nacional é de extrema importância o entendimento de como a tributação é

aplicada em nosso ordenamento jurídico. Sabe-se que o Brasil possui uma das

maiores cargas tributárias do mundo, sendo que a cada dia novos tributos e

alíquotas são criadas ou alteradas, a fim de aumentar a arrecadação por parte do

Estado.

Segundo entendimento doutrinário, o tributo possui uma divisão

pentapartida, tornando estes cinco diferentes tipos de tributos os componentes do

Sistema Tributário Nacional.

O art. 145 da Constituição Federal, classifica os tributos em apenas 3 (três)

subdivisões ou espécies tributárias, dentre elas as taxas, os impostos e as

contribuições de melhoria, deixando um tanto confusa a sua interpretação, conforme

expressa o artigo citado:

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Art.145 (CF). A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios poderão instituir os seguintes tributos: I – impostos; II – taxas, em razão do exercício do poder de polícia ou pela utilização, efetiva ou potencial, de serviços públicos específicos e divisíveis, prestados ao contribuinte ou postos a sua disposição; III – contribuição de melhoria, decorrente de obras públicas.

O Código Tributário Nacional também define da mesma forma a composição

do tributo, perfazendo uma divisão tripartida. Observe o dispositivo: “Art. 5º Os

tributos são impostos, taxas e contribuição de melhoria”.

De acordo com entendimento de Amaro (2006), a constituição simplesmente

se preocupou em arrolar as espécies de tributos e não as classificou nem definiu de

maneira clara. Ele encontrou 10 subdivisões para a composição do tributo, as quais

possuem competências diversas para o destino dos recursos arrecadados, sendo

estas denominadas de impostos, taxas, contribuições de melhoria, pedágio,

empréstimos compulsórios, contribuições sociais, contribuições de intervenção no

domínio econômico, contribuições de interesse das categorias profissionais ou

econômicas, contribuição para custeio do regime previdenciário e contribuição para

custeio do serviço de iluminação pública.

Mas dentre essas 10 (dez) subespécies, prevalece para o referido autor à

classificação pentapartida, a qual é chancelada por grande parte da doutrina e

também é o entendimento atual do STF. Assim, o referido autor faz uma breve

análise dos critérios que podem ser utilizados para a correta classificação dos

tributos (AMARO, 2006, p. 69):

“Em suma os critérios de classificação dos tributos não são certos ou errados. São mais adequados, menos adequados, ou inadequados (a) no plano da teoria do direito tributário, ou (b) no nível do direito tributário positivo, como instrumento que permita (ou facilite) a identificação das características que devem compor cada espécie de tributo [...]”.

Sendo assim, prevalece a classificação pentapartida onde os tributos devem

ser divididos em: impostos, taxas, contribuições de melhoria, empréstimos

compulsórios e contribuições. A partir de então, precisa-se entender qual o

fundamento de cada uma destas classificações e qual a sua origem, conforme a

seguir será exposto.

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Segundo o Código Tributário Nacional, em seu artigo 16, o imposto é

definido da seguinte forma: “Art. 16 - Imposto é o tributo cuja obrigação tem por fato

gerador uma situação independente de qualquer atividade estatal específica, relativa

ao contribuinte”.

Conforme prescreve a doutrina de Amaro (2006), se o fato gerador do

imposto não é um ato do Estado, ele deve configurar uma situação a qual o

contribuinte se vincula, ou seja, para exigir imposto sobre o contribuinte não

necessita que o Estado lhe preste algo determinado. Portanto, o imposto é uma

obrigação do cidadão, observando sempre, a sua capacidade contributiva.

A segunda classificação dos tributos é a taxa, a qual tem seu conceito e

fundamento diferente do imposto. A taxa demanda sempre de uma contrapartida do

Estado, ou seja, está sempre atrelada ao Estado, visto que este deve prestar o

serviço para poder impor ao contribuinte o tributo, devendo haver sempre a atuação

do Estado para que se tenha a efetividade desse tributo. Assim se conceitua a taxa

(AMARO, 2006, p. 30):

As taxas são tributos cujo fato gerador é configurado por uma atuação estatal específica, referível ao contribuinte, que pode consistir: a) no exercício regular do poder de polícia; ou b) na prestação ao contribuinte, ou colocação à disposição deste, de serviço público específico e divisível.

A contribuição de melhoria, a qual compõe a classificação dos tributos, é

instituída ao proprietário de imóvel que tiver uma valorização de seu bem, através de

melhorias que lhe foram proporcionadas pelo Estado. Segundo doutrina, podemos

definir a contribuição de melhoria da seguinte forma (MACHADO, 2010, p. 459):

[...] a contribuição de melhoria é a espécie de tributo cujo fato gerador é a valorização de imóvel do contribuinte, decorrente de obra pública, e tem por finalidade a justa distribuição dos encargos públicos, fazendo retornar ao Tesouro Público o valor despendido com a realização de obras públicas, na medida em que destas decorra valorização de imóveis.

Os empréstimos compulsórios, por sua vez, estão definidos no Código

Tributário Nacional, em seu artigo 15, da seguinte forma:

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Art. 15 Somente a União, nos seguintes casos excepcionais, pode instituir empréstimos compulsórios: I – guerra externa e sua iminência; II – calamidade pública que exija auxílio federal impossível de atender com os recursos orçamentários disponíveis; III – conjuntura que exija absorção temporária de poder aquisitivo. (...)

Ainda, a Constituição Federal, em seu artigo 148, também define que os

empréstimos compulsórios somente poderão ser instituídos mediante lei

complementar. Observe o dispositivo:

Art. 148. A União, mediante lei complementar, poderá instituir empréstimos compulsórios: I - para atender a despesas extraordinárias, decorrentes de calamidade pública, de guerra externa ou sua iminência; II - no caso de investimento público de caráter urgente e de relevante interesse nacional, observado o disposto no art. 150, III, b. Parágrafo único. A aplicação dos recursos provenientes de empréstimo compulsório será vinculada à despesa que fundamentou sua instituição.

Por fim as contribuições, que fazem parte da classificação pentapartida dos

tributos, defendida pela grande maioria da doutrina e também pelo STF, e que,

segundo Amaro (2006), diferenciasse de imposto e pode ser entendido como a

circunstância de as contribuições terem destinação específica, diferenciando-as dos

impostos, enquadrando-as como tributos afetados à execução de uma atividade

estatal ou paraestatal específica, que pode aproveitar ou não ao contribuinte.

Sendo assim, através dos conceitos de direito o qual regulamenta e dá

suporte para o tributo, podemos entender melhor e buscar uma fundamentação mais

clara e precisa sobre essa imposição que está prevista em nosso ordenamento

jurídico, que é o tributo. Além do mais, podemos ter um melhor entendimento sobre

suas diferentes espécies e encontrar uma fundamentação referente ao Imposto

Sobre Grandes Fortunas, que é o objetivo do presente trabalho e que a partir de

agora iremos tratar.

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4 IMPOSTO SOBRE GRANDES FORTUNAS

Vimos anteriormente que o ordenamento jurídico brasileiro é composto de

um conjunto de princípios que compõe a estrutura de direitos e garantias previstos

em nossa Constituição Federal. Dentre estes princípios observamos e que alguns

possuem o condão de proteger o cidadão contra o abuso excessivo de poder estatal,

está à tributação, o qual o Estado possui legitimidade e está revestido de poder para

exigi-lo por parte do cidadão, como uma contrapartida a ele devida.

Além dos princípios constitucionais, também estão presentes alguns

critérios, os quais podem ser considerados imprescindíveis para a diminuição das

desigualdades sociais, dentre eles a pessoalidade e a capacidade contributiva, os

quais através da sua instrumentalização em nosso ordenamento jurídico podem

tornar a tributação mais justa, estabelecendo um equilíbrio econômico entre as

diversas classes sociais.

Estes critérios de pessoalidade e capacidade contributiva já estão previsto

em nosso ordenamento jurídico desde a Constituição Federal de 1988 e poderiam

ser melhor utilizados na legislação tributária brasileira. Atualmente, esses critérios

estão implementados em apenas um imposto que é o caso do Imposto de Renda.

Há também o Imposto sobre Grandes Fortunas que é o assunto principal do

presente trabalho, o qual nunca entrou em vigor, pela falta de uma lei complementar

que possa regulamentar sua aplicação. Assim, observa-se que a justiça social está

longe de ser alcançada, visto que não estão sendo utilizados estes instrumentos

previamente dispostos em nosso ordenamento jurídico, os quais serviriam para

corrigir problemas sociais, principalmente com relação ao desequilíbrio econômico

da sociedade.

O Imposto sobre Grandes Fortunas está previsto desde a promulgação da

Constituição Federal de 1988, sendo de competência da União, instituir esse tributo.

O Art. 153, inciso VII prevê essa tributação a todo cidadão que possuir grandes

riquezas. O dispositivo fala o seguinte:

Art. 153 Compete a União instituir impostos sobre: [...] VII – grandes fortunas, nos termos de lei complementar. [...]

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Como podemos observar, a legislação foi muito sucinta ao instituir o referido

tributo, sem ao menos definir os parâmetros que devem ser considerados como

grandes fortunas.

Desde então, os parlamentares brasileiros vêm sugerindo alguns projetos de

lei que objetivam criar alíquotas para taxar as grandes fortunas, mas, passados mais

de 25 anos da última promulgação, esse tributo ainda não possui efetividade, pois

depende de uma lei complementar para regulamentar a Imposto sobre as Grandes

Fortunas.

Diversos doutrinadores criticam a inércia da lei e dos parlamentares, pois a

maioria de nossos representantes políticos seriam taxados por essa tributação. Para

Machado (2010), os Impostos sobre Grandes Fortunas ainda não foram instituídos

devido ao grande peso da classe política, a qual grande parte está investida ou

exerce influência no poder, dos quais grande parte deverá ser afetada pela

implementação desta lei tributária. Haverá também uma grande dificuldade em

mensurar os bens e seus valores, os quais venham a integrar esta grande fortuna,

conforme ele traduz em sua doutrina (MACHADO, 2010, p. 366):

Há quem aponte dificuldades técnicas para a tributação das grandes fortunas. Seriam problemáticas a identificação e a avaliação dos bens. O argumento é inconsistente. Os bens que integram as grandes fortunas são os mesmos cuja transmissão de propriedade é tributada. Se a titulo oneroso, pelo Município. Se a titulo gratuito, ou em virtude de sucessão por causa da morte, pelo Estado. E ninguém sustentou a inviabilidade do imposto de transmissão causa mortis e doação, de que trata o art. 155, inciso I, nem do imposto de transmissão intervivos, de que trata o art. 156, inciso II, da Constituição Federal.

Observa-se que muitos defendem a não regulamentação desse tributo, visto

que seria injusto tributar sobre as riquezas construídas, por exemplo, por um grande

empresário bem sucedido, ao longo de sua vida. Outros defendem que as riquezas

oriundas de herança, deveriam ser taxadas, além de serem criadas novas alíquotas

sobre o Imposto de Renda, o qual poderia ser muito mais efetivo e agregador.

Segundo Costa (2014), o Imposto sobre Grandes Fortunas não é uma

exclusividade brasileira. Pesquisa realizada pela EY (Ernst & Young) presente hoje

em 21 países, há a taxação das grandes fortunas em seis deles, dentre os quais a

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Argentina, Espanha, França, Índia, Noruega e Suíça. Em outros três países, este

imposto já existiu, mas atualmente não está em vigor, dentre eles a Alemanha que

extinguiu em 1997, Luxemburgo em 2006 e Suécia em 2007. Na Espanha o Imposto

sobre Grandes Fortunas deixou de existir em 2008, mas em 2011 voltou a ser

cobrado.

Assim resume Leandro Souza, gerente sênior de imposto e capital humano

da EY (COSTA, 2014, s.p): “[...] o que vemos é que alguns países lançam mão

desse tipo de imposto em alguns momentos como um mecanismo de equilibrar as

contas públicas e, conforme elas melhoram, eles abolem o imposto”.

Outra questão levantada por Leandro Souza é a fuga de capitais, onde o

cidadão, possuidor de grandes riquezas, acabaria por direcionar seus bens para

outros países, em paraísos fiscais, onde seria menos tributado (COSTA, 2014). Este

foi um dos principais motivos que muitos países deixaram de tributar as grandes

fortunas.

Para Sérgio Ricardo Ferreira Mota, interesses políticos são um dos

principais motivos de ainda não estar regulamentada a lei complementar sobre as

grandes fortunas. Mas, a grande justificativa para implementação desse imposto

seria sim a justiça social, levando-se em consideração a capacidade contributiva do

cidadão. Dessa forma ele fala em sua doutrina (MOTA, 2010, p. 164):

"[…] repete-se a defesa no sentido de que o Imposto sobre Grandes Fortunas pode vir a constituir instrumento de alcance da justiça tributária no Brasil, uma vez que permitiria, em tese, não só uma justa distribuição da carga tributária entre os contribuintes, mas também, maior distribuição de renda e riqueza nacionais, o que permitiria, também, em tese, a redução das enormes desigualdades sociais verificadas no país e, por consequência, a pobreza de grande parte da população”.

Outros doutrinadores defendem que o Imposto sobre Grandes Fortunas

deveria permanecer como está, sem regulamentação e sem efetividade. Para Ives

Gandra da Silva Martins, outros países são o exemplo de que esse imposto não

deve vigorar no Brasil, pois estaríamos correndo o risco de desestímulo na aquisição

de patrimônio e também da possibilidade de desconcentração da renda (MARTINS,

2008, s.p.):

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As vantagens do tributo são duvidosas: a de que promoveria a distribuição de riquezas é atalhada pelo fato de que poucos países que o adotaram e terminaram por abandoná-lo ou reduzi-lo a sua expressão nenhuma; a de que desencorajaria a acumulação de renda, induzindo a aplicação de riqueza na produção, que seria isenta de tributo, leva a ferir o princípio da igualdade, possibilitando que os grandes empresários estivessem a salvo da imposição; a de que aumentaria a arrecadação do Estado não leva em conta a possibilidade de acelerar o processo inflacionário por excesso de demanda.

Como podemos observar nas colocações de Martins (2008), uma das

grandes justificativas para a não regulamentação do Imposto sobre Grandes

Fortunas seria o desestimulo no acúmulo de capital, o que seria desastroso para o

Estado devido a menor geração de emprego e renda que possíveis empresários

poderiam deixar de gerar por terem seus investimentos e riquezas limitados por

impostos que viessem a onerar ainda mais a tributação brasileira.

Muitos foram os projetos de lei sugeridos com várias emendas para

regulamentação do referido imposto, mas até então nenhum deles conseguiu

argumentos suficientes para convencer boa parte dos parlamentares nas diversas

casas legislativas, para votarem a favor da referida lei prevista no art. 153, VII da

Constituição Federal de 1988.

A primeira iniciativa em regulamentar o Imposto Sobre Grandes Fortunas foi

do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, na época como senador, em 1989,

através do projeto de lei do senado nº 162/89. Mas a Comissão de Tributação e

Orçamento da Câmara acabou rejeitando e depois de várias tentativas e emendas

com o intuito de regulamentar esta lei complementar, em 09 de fevereiro do ano de

2007 o projeto foi arquivado. Outros projetos de lei foram apresentados no decorrer

destes últimos 25 anos, mas a maioria não prosseguiu.

Um dos projetos de lei para regulamentação do Imposto sobre Grandes

Fortunas foi de autoria do senador Antônio Carlos Valadares. Este Projeto de lei

complementar do senado, Nº 534/2011 (em anexo), está aguardando apreciação na

mesa do senado, desde o dia 19 de maio de 2015, quando foi proposta sua

aprovação com algumas emendas.

O PLS nº 534/2011 institui que serão contribuintes do Imposto sobre

Grandes Fortunas todas as pessoas físicas de nacionalidade brasileira, em relação

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aos bens situados em qualquer país, o espólio e o estrangeiro domiciliado no Brasil,

em relação aos bens localizados neste país.

O imposto tem por fato gerador a titularidade em 31 de dezembro de cada

ano civil, do patrimônio em valor superior a R$ 2.500.000,00 (dois milhões e

quinhentos mil reais), sendo que alguns bens são excluídos da tributação, dentre

eles a residência do contribuinte com valor até R$ 1.000.000,00, os bens de

produção e instalações utilizados para obtenção de rendimentos com valor até R$

1.500.000,00 além de outras exclusões que estão sugeridos no aguardado projeto.

Também está previsto, em seu artigo 5º, as formas de como serão

mensurados os valores de cada bem do contribuinte, através de avaliação que serão

levados em consideração alguns índices para padronizar a forma de avaliação dos

bens.

Haverá uma tabela progressiva de cobrança do imposto de acordo com o

valor do patrimônio, o qual será da seguinte forma: até R$ 2.500.000,00 o

contribuinte será isento, acima de R$ 2.500.000,00 até R$ 5.000.000,00 a alíquota

será de 0,5% podendo chegar a 2,5% para os contribuintes que possuem patrimônio

superior a R$ 40.000.000,00.

O projeto de lei também prevê multa que pode variar de 1% até 150% do

valor do imposto apurado, para aquele contribuinte que atrasar a entrega da

declaração, subavaliar ou omitir os bens e fraudar ou ocultar o verdadeiro titular do

bem.

Um dos pontos mais importantes e que vem expresso neste projeto é com

relação à destinação dos recursos oriundos da tributação das grandes Fortunas. O

artigo 10 do projeto de lei complementar Nº 534/2011 define que, prioritariamente, os

recursos auferidos desta tributação deverão ter como destino as ações na área da

saúde. Se assim for, será um grande avanço nos investimentos nesta área que

sempre foi muito prejudicada pela falta de recursos, e deveria ser um dos melhores

serviços prestados pelo Estado ao cidadão brasileiro.

A justificativa principal do Imposto sobre Grandes Fortunas é garantir uma

redistribuição mais justa das riquezas, visando cobrar maiores impostos daqueles

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que auferem maiores rendas, para poder contribuir com prestações de serviços ao

cidadão, garantindo aqueles objetivos fundamentais, previsto na Constituição

Federal de 1988, em seu art. 3º, que é construir uma sociedade livre, justa e

solidária, bem como erradicar a pobreza e a marginalização além de reduzir as

desigualdades sociais e regionais.

A redistribuição das riquezas é o grande instrumento que fundamenta o

Sistema Tributário Brasileiro. É através do princípio da capacidade contributiva que

vem estruturado pelo princípio da justiça, na qual a Constituição Federal de 1988,

em seu artigo 145, parágrafo 1º o positiva e da norte, para que a solidariedade social

seja o objetivo final da tributação. Observe o dispositivo (CONSTITUIÇÃO

FEDERAL, 1988):

Art. 145 [...] § 1º Sempre que possível, os impostos terão caráter pessoal e serão graduados segundo a capacidade econômica do contribuinte, facultado a administração tributária, especialmente para conferir efetividade a esses objetivos, identificar, respeitados os direitos individuais e nos termos da lei, o patrimônio, os rendimentos e as atividades econômicas do contribuinte. [...]

O Estado, por sua vez, cria tributos com alíquotas diversas, que oneram toda

a sociedade. Mas somente com impostos que possuem caráter pessoal é que se

poderá alcançar a solidariedade social, tributando aqueles com maior capacidade

contributiva de maneira diferenciada, podendo financiar, através destes recursos, os

serviços prestados aqueles contribuintes menos favorecidos e com maior

necessidade assistencial.

É através do Imposto sobre Grandes Fortunas e do Imposto de Renda que o

Estado pode tributar de maneira diferenciada os mais afortunados, ao invés de

tributar os produtos e serviços que são necessários e disponibilizados a toda a

população, o que não trás diferenciação sobre a capacidade contributiva do

contribuinte.

Segundo Marciano Seabra de Godoi (GRECO, 2005), existem três maneiras

de fundamentar e justificar a capacidade contributiva do cidadão. A primeira adotada

pela economia materialista de Adam Smith, o qual diz que os mais ricos devem arcar

preferencialmente com o financiamento do Estado, preservando sua propriedade e

garantindo o acúmulo de riqueza.

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A segunda possibilidade seria baseada na “teoria do sacrifício igual”, onde o

cidadão contribui com base proporcional ao que aufere de ganhos. Isso afasta a

tributação fixa e demanda uma tributação proporcional, necessitando portanto de

alíquotas progressivas para uma melhor equidade dos tributos.

Uma terceira possibilidade seria baseada no princípio da solidariedade

social, visto que é dever constitucional da sociedade contribuir para o financiamento

dos gastos públicos. Desta forma, afirma José Casalta Nabais (GRECO, 2005, p.

157):

“[...] como dever fundamental, o imposto não pode ser encarado nem como um mero poder para o Estado, nem como um mero sacrifício para os cidadãos, constituindo antes o contributo indispensável e uma vida organizada em Estado fiscal”.

Sendo assim, poderíamos refletir melhor sobre os impostos incidentes. Será

que não seria um dever fundamental contribuir com o pagamento de tributos ao

Estado e este por si, deveria exigir o tributo, valendo-se do seu poder de tributar?

Observa-se que há sim, a cobrança de impostos como justificativa para poder

prestar melhores serviços à sociedade, utilizando a solidariedade como desculpa

para a exigência indiscriminada de tributos dos contribuintes.

Portanto, observa-se que o Estado é legítimo para cobrar impostos e deve

exigi-lo de maneira equilibrada e equitativa, ou seja, taxando menos produtos e

serviços, observando melhor a capacidade contributiva do cidadão, para que dessa

forma, possa-se alcançar a justiça fiscal em nosso ordenamento jurídico.

4.1 Noções básicas sobre o Imposto de Renda

O ordenamento jurídico brasileiro prevê apenas um imposto de caráter

pessoal e que atualmente é utilizado como ferramenta de justiça fiscal, que é o

Imposto de Renda, o qual é o assunto principal do presente subcapítulo. É através

deste imposto que o legislador procurou aplicar critérios que possam tributar cada

cidadão conforme sua capacidade econômica, assegurando um tratamento mais

equilibrado às diversas classes econômicas, através da progressividade de suas

alíquotas, as quais são consideradas de baixa eficácia.

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Conforme dispõe nosso ordenamento constitucional vigente, o Imposto de

Renda deve respeitar o princípio da capacidade contributiva, evitando desta forma, o

confisco. Está legitimado no art. 153, III da Constituição Federal e também no art. 43

do Código Tributário Nacional, que é competência da União instituir impostos sobre

a renda e proventos de qualquer natureza, comumente chamado de Imposto de

Renda – IR.

O art. 153, §2º da Constituição Federal completa que o Imposto de Renda

deve ser sempre informado sobre os critérios da generalidade, da universalidade e

da progressividade, levando-se em conta a legislação vigente e a totalidade dos

resultados das atividades do contribuinte, não sendo permitindo a tributação em

operações isoladas.

O tributarista Hugo de Brito Machado (2010) leciona que estes três critérios

correspondem a princípios e devem ser interpretados em conjunto, estabelecendo

um equilíbrio entre eles. Ele conceitua esses critérios da seguinte forma

(MACHADO, 2010, p. 337):

Pelo critério da generalidade podemos entender que o imposto deve ser igual para todas as situações, atingindo igualmente a todos os contribuintes. Pelo critério da universalidade podemos entender que o imposto deve ser estabelecido considerando-se todos os elementos do patrimônio do qual o acréscimo é tributável, sem qualquer distinção [...]. Pelo critério da progressividade podemos entender que a alíquota do imposto deve ser maior na medida que seja maior o montante da renda tributável – vale dizer, a base de cálculo do imposto.

Observa-se no texto constitucional que uma das principais características do

Imposto de Renda é a pessoalidade, o que não é observado quando se fala no

imposto retido na fonte. A essa retenção de imposto na fonte, é aplicada uma

tributação baseada no faturamento bruto da operação jurídica, a qual apresenta

distorções no que se refere aos critérios constitucionais de tributação do referido

imposto, conforme leciona Ricardo Mariz de Oliveira (2008). Ele ensina que a base

de cálculo do imposto sobre a renda deve levar em conta a totalidade dos resultados

alcançados pelo contribuinte em cada período de apuração, contrariando o que

determina o dispositivo constitucional, de que o Imposto de Renda deve incidir sobre

a renda ou pelo acréscimo patrimonial em um determinado período.

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O Imposto de Renda retido na fonte acaba por ferir o princípio da isonomia,

levando a aplicação de carga fiscal diversa entre os contribuintes, visto que tributa

todo o faturamento, e não exatamente a renda ou ganho patrimonial do contribuinte.

O critério da pessoalidade também faz parte do conjunto de características

do Imposto de Renda. Este por sinal deve ser obrigatório, pois é a maneira que o

legislador constitucional tributário encontrou para a busca da justiça fiscal, tributando

de forma justa de acordo com a capacidade contributiva. A pessoalidade do Imposto

de Renda legitimada no art. 145, §1º da Constituição Federal, está disposto da

seguinte forma (CONSTITUIÇÃO FEDERAL 1988):

Art. 145 [...] §1º Sempre que possível, os impostos terão caráter pessoal e serão graduados segundo a capacidade econômica do contribuinte, facultado a administração tributária, especialmente para conferir efetividade a seus objetivos, identificar, respeitados os direitos individuais e nos termos da lei, o patrimônio, os rendimentos e as atividades econômicas do contribuinte.

Assim, o critério da pessoalidade tem o objetivo de tributar com alíquotas

diferentes os contribuintes que possuem rendas diferentes, e que de acordo com a

sua capacidade contributiva, consigam contribuir sem prejudicar o seu sustento e de

sua família. É através desta progressividade das alíquotas que se busca a correta

redistribuição da renda e a justiça fiscal.

Em se tratando de alíquotas, o Imposto de Renda possui categorias

diversas, de acordo com o seu regime jurídico. Para as pessoas jurídicas existem

três bases de cálculo com alíquotas diferentes, as quais levam em conta o lucro real,

o lucro presumido e o lucro arbitrado. Ambos não serão aprofundados no presente

trabalho, devido sua complexidade e por entender que a pessoalidade e capacidade

tributária não fazem parte da tributação das pessoas jurídicas.

Já o Imposto de Renda pessoa física, possui alíquotas proporcionais à renda

do contribuinte. Estudando-se um pouco da história do Imposto de Renda anterior a

Constituição Federal de 1988, observou-se que a tabela de alíquotas era bem mais

progressiva que a atual, pois variavam de 3 a 55%. Esta progressividade tinha como

objetivo tributar com alíquotas menores as rendas provenientes do trabalho e,

considerando a soma dos rendimentos líquidos que formava a renda bruta, onde

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eram abatidos os gastos do contribuinte que não possuíssem relação com a fonte

pagadora dos rendimentos. Já as alíquotas maiores eram aplicadas aos rendimentos

obtidos através dos ganhos de capital, onde o contribuinte pagava

proporcionalmente, tornando assim a tributação da renda e do capital mais justa e

proporcional, aplicando a progressividade e observando a capacidade contributiva e

a pessoalidade como critérios para a tributação.

A partir da promulgação da Constituição Federal de 1988, as alíquotas do

Imposto de Renda deixaram de ter a progressividade efetiva e passaram a ser mais

restritas. Inicialmente passou-se a ter apenas duas alíquotas, as quais eram de 15%

e 27,5%. Em 2008 foram criadas mais duas alíquotas intermediárias do Imposto de

Renda pessoa física, 7,5% e 22,5%, passando então para um total de quatro

alíquotas na suposta progressividade do referido imposto.

Com estas quatro alíquotas, 7,5%, 15%, 22,5% e 27,5% passou-se a

distribuir melhor a tributação, perdendo consideravelmente a progressividade que

havia anteriormente a carta maior de 1988, prejudicando demasiadamente aqueles

contribuintes de baixa renda, que foram e continuam sendo a categoria mais afetada

por essa progressividade de alíquotas aplicada.

O Imposto de Renda pessoa física pode ser considerado e utilizado como

uma ferramenta extremamente eficiente para a obtenção da justiça fiscal,

alcançando com maior êxito o objetivo que é o da redistribuição da renda. Mas não é

o que se observa atualmente. A atual progressividade das alíquotas do Imposto de

Renda vigente não é suficiente para solucionar as desigualdades sociais, que é o

grande objetivo deste imposto. As altas tributações impostas sobre o consumo de

bens e serviços e a atual progressividade de alíquotas acabam por transformar o

Imposto de Renda muito mais onerosa àqueles que auferem menores rendas,

podendo-se dizer que ao invés de progressividade, estamos diante de uma tabela

regressiva, conforme posicionamento de grande parte dos doutrinadores. Isso

porque, ao consumirem bens e serviços todos são indiretamente tributados,

devendo, portanto, que as alíquotas tivessem uma progressividade diferenciada que

taxasse menos as classes mais necessitadas.

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Os impostos indiretos que carregam demasiadamente bens de consumo e

serviços acabam sendo adquiridos pela população em geral, tanto de baixa como de

alta renda, ocasionando uma desproporcionalidade na arrecadação dos impostos,

comparado com a renda do contribuinte. Nesta carga de impostos indiretos não há

critérios de pessoalidade e não se observa a capacidade contributiva do cidadão.

Como forma de demonstrar a baixa efetividade do Imposto de Renda das

pessoas físicas, Sabbag aponta alguns dados interessantes em sua obra,

comparando a tributação da renda no Brasil com países desenvolvidos (SABBAG, p.

1136):

No Brasil de hoje, o imposto sobre a renda, conquanto se revele um importante gravame para a arrecadação federal, aponta dados curiosos: estudos econômicos demonstram que a participação da tributação da renda na carga tributária brasileira é baixa, atingindo pouco mais de 20%, enquanto, em países desenvolvidos, essa participação representa cerca de 70%. Aliás, insta frisar que há sobre o patrimônio, de um modo geral, uma tímida expressividade da participação da tributação na carga tributária brasileira.

Assim, para que a legislação constitucional tributária vigente consiga atingir

os objetivos proporcionados ao Imposto de Renda Pessoa Física, que é a justiça

fiscal, através da redistribuição da renda, precisa-se tornar efetivamente progressivo

o referido imposto. Para isso, é extremamente importante que a legislação sobre o

Imposto de Renda leve em conta algumas medidas concretas que irão viabilizar e

tornar mais justo o referido imposto, conforme V. Costa expõe em seu

posicionamento (V. COSTA, 2003, p. 28):

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(1) consideração precisa das condições pessoais dos contribuintes (pessoas físicas ou jurídicas) e a prudente fixação de um “mínimo vital”, compatível com a realidade: o art. 6º da Carta Magna arrola, como direitos sociais, a educação, a saúde, o trabalho, a moradia, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância e a assistência aos desamparados. Há de se buscar a efetividade na proteção de tais valores, aqui prestigiados, à luz da tributação progressiva do imposto sobre a renda; (2) estipulação de um expressivo número de deduções para o IR devido, adequando a exigência fiscal ao perfil do contribuinte: a dedutibilidade deve ser ampla, englobando todas as despesas necessárias à manutenção do indivíduo e de sua família, sem limitações arbitrárias, as quais, por amor à lógica e à justiça, não podem integrar o conceito de “renda”. Há de haver uma política “de inclusão” de despesas dedutíveis – e não o contrário! , alcançando-se, quiçá, os medicamentos e o material escolar, diversamente do que atualmente presenciamos; (3) estabelecimento de um expressivo grau de progressividade de alíquotas, em função da quantidade de renda auferida: há que se imprimir maior progressividade às alíquotas, de modo a cumprir, efetivamente, o desígnio constitucional.

Portanto, observa-se que somente através de medidas concretas que

tornem a tributação mais efetiva observando os critérios de pessoalidade e

capacidade econômica, é que se pode alcançar a justiça fiscal. Esse é o

entendimento da legislação tributária aplicada na maioria dos países desenvolvidos

e que vem dando certo. Alguns países chegam a tributar a renda em quase 60%,

observando sempre as deduções fiscais de cada contribuinte, tributando menos os

produtos e serviços que são de necessidade básica dos cidadãos, explorando mais

a progressividade das alíquotas do Imposto de Renda.

Já aqui no Brasil o que se observa é um cenário totalmente diverso e que

retrata a regressividade das alíquotas do Imposto de Renda, contrariando o que a

própria carta magna propõe em seu texto Constitucional. O Art. 153, §2ª, I da

Constituição Federal dispõe que a progressividade é um dos critérios primordiais

para o referido imposto. Este é um instrumento normativo que busca uma sociedade

mais justa, livre e solidária, onde há a elevação de alíquotas na medida em que

aumente a capacidade econômica do contribuinte e consequentemente sua riqueza.

Portanto, a partir das colocações postas no decorrer do texto e dos

instrumentos que estão positivados em nossa carta maior, nosso ordenamento

jurídico tributário está muito bem calçado de normas que visam ampliar a

redistribuição da renda em busca da justiça social. Assim, entende-se que somente

a partir da implementação destes instrumentos e ferramentas, que já estão previstos

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em nossa legislação, é que teremos um Estado Democrático de Direito calcado na

justiça, na liberdade e na solidariedade.

4.2 Imposto sobre Grandes Fortunas e solidariedade fiscal

A solidariedade fiscal é um grande passo a ser alcançado para a diminuição

das desigualdades sociais. É através da tributação que podem ser corrigidas as

grandes disparidades econômicas que assolam a população mundial e assim,

através da intervenção e do poder do Estado, este pode tributar o contribuinte,

atingindo seu patrimônio privado, para buscar recursos proporcionalmente à

capacidade econômica de cada contribuinte.

Como já comentado anteriormente, o ordenamento jurídico brasileiro dispõe

dessas ferramentas, as quais já estão positivadas desde a promulgação de nossa

carta maior, mas devido ao desinteresse por parte do legislador ainda não foi

implementado em nosso país. É o caso do Imposto sobre Grandes Fortunas, o qual

é um instrumento de justiça fiscal, que poderia ser utilizado para angariar maiores

recursos para ampliação de programas sociais, voltados àquelas classes mais

necessitadas da sociedade, as quais desfrutam de baixa capacidade econômica e

que não seriam afetadas por esta tributação, ao contrário, são dependentes de

programas sociais e da estrutura do Estado para viver com dignidade.

Assim, o Imposto sobre Grandes Fortunas, a partir de sua implementação,

poderia ser uma importante forma de arrecadação para o Estado poder utilizá-lo na

ampliação de sua estrutura a aquelas classes mais necessitadas, seja em

programas sociais, de moradia, saúde, educação, etc. Mas, antes de tudo, algumas

observações importantes precisam ser discutidas, pois este imposto tanto poderá ser

um meio eficaz de tributação como também objeto de retração da economia, visto

que a exemplo de outros países que também tributaram as grandes fortunas, houve

uma grande fuga de capitais para outros países e também a diminuição considerável

dos investimentos por parte dos grandes empresários, o que acabou por influenciar

consideravelemnte na geração de empregos, diminuindo as vagas de trabalho e

consequentemente a geração de renda a classe trabalhadora.

Além disso, outro grande impasse com relação ao Imposto sobre Grandes

Fortunas está em mensurar o que pode ser considerado uma grande fortuna, pois

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muitas delas foram construídas pelo esforço e suor dos grandes empreendedores,

devido ao trabalho árduo e a dedicação de vários anos de trabalho. Outros

receberam patrimônios por meio de heranças e não possuem a mínima ideia de

como podem administrar estes bens que acabam por onerar seus custos de vida, os

quais geram tributos no decorrer dos exercícios fiscais. Esta quantificação de qual o

valor poderia ser considerado uma grande fortuna é um dos principais impasses que

acabam por contribuir para a falta de interesse na implementação deste importante

instrumento de justiça social. E mais, os legisladores, aqueles que poderiam coloca-

lo em prática seriam os mais afetados, pois a grande maioria possui capital

suficiente para ser enquadrado como uma grande fortuna, o que torna este

instrumento de justiça fiscal um tributo de extrema funcionalidade e legitimidade,

mas que por falta de interesse daqueles que seriam os mais afetados, acaba por

torná-lo ineficaz.

Desta forma, observa-se que a discussão do Imposto sobre Grandes

Fortunas não pode ficar apenas na ideia de quanto será a arrecadação ou qual o

montante que o Estado está deixando de arrecadar pela não implementação deste

importante tributo. Deve-se levar em conta sim os efeitos contrários desta tributação,

pois não basta que se crie meios de aumentar a arrecadação. Precisa-se de

ferramentas que além de arrecadar possibilitem que aqueles empresários, que são

os grandes contribuintes e que compõem a grande parte dos recursos auferidos pelo

Estado, possam gerar mais empregos, mais oportunidades e através disso, façam

com que a economia torne-se mais sustentável.

Nossos legisladores precisam levar em conta que o montante de tributos

arrecadados, sendo ele maior ou menor, depende sempre da uma economia sólida

ou não. Cargas tributárias altas não demonstram economia forte e muito menos

arrecadação alta por parte do Estado. Ao contrário, economia forte se dá por

tributações equilibradas que visem não apenas a subtração de recursos de uns para

aplicação em outros. Precisa-se e muito de empreendedores que possam gerar mais

empregos e desta forma sim, melhorando a renda per capita da sociedade, para que

as classes menos favorecidas possam evoluir e aos poucos tornarem-se menos

dependentes do amparo estatal.

Assim, entende-se que a implementação do Imposto sobre Grandes

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Fortunas não seria a melhor forma de alcançarmos maior justiça social. Precisa-se

sim de uma progressividade de alíquotas mais equilibrada sobre a tributação da

renda, que é o grande instrumento de justiça fiscal, diminuindo a tributação dos

menos favorecidos e ampliando as alíquotas para aqueles que proporcionalmente,

poderiam contribuir um pouco mais, objetivando e concretizando os conceitos de

solidariedade social.

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5 CONCLUSÃO

Durante o presente trabalho buscou-se ampliar os conhecimentos e

principalmente pesquisar sobre o Imposto sobre Grandes Fortunas, com intuito de

angariar fundamentos que justifiquem ou não a implementação do referido imposto e

que possam responder a hipótese da pesquisa: “A Constituição Federal de 1988

prevê em seu ordenamento jurídico o Imposto sobre Grandes Fortunas, o qual,

desde a promulgação de nossa lei maior, está dependendo de uma lei

complementar para sua regulamentação para tornar-se um tributo efetivo. Esse

imposto tem como foco taxar os contribuintes possuidores de maiores riquezas,

observando o princípio da capacidade contributiva e principalmente as riquezas

consideradas como grandes fortunas e acumuladas pelo contribuinte. O objetivo da

taxação é ampliar a prestação de serviços e a redistribuição da renda aqueles

contribuintes mais necessitados, objetivando equalizar e melhorar os direitos e

garantias fundamentais dos cidadãos, através da justiça fiscal”.

Para isso utilizou-se de conceitos extremamente importantes para o

entendimento do assunto, dentre eles os conceitos de justiça social e justiça fiscal

muito discutido por vários autores e doutrinadores que os consideram como

principais características para formação das garantias individuais de um Estado

Democrático de Direito.

A partir de uma análise mais aprofundada de nossa legislação constitucional,

observa-se que existem muitas falhas que acabam por comprometer parte dessas

garantias, prejudicando algumas classes da sociedade, que acabam por ser muito

mais penalizadas que outras, afastando o princípio da equidade na aplicação da

legislação vigente.

Observa-se ainda, que nesta complexidade de normas, muitas delas

acabam não sendo efetivadas pela falta de legislação complementar, como é o caso

do Imposto sobre Grandes Fortunas. Portanto, tem-se uma norma que permite a

criação de tal tributo e que visa à diminuição das disparidades econômicas das

classes sociais, mas ela não é efetivada. Da mesma forma, a progressividade do

Imposto de Renda, o qual está explícito no ordenamento constitucional, mas é pouco

explorado pelo Estado, não alcançando a justiça social tão vislumbrada nos tempos

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atuais.

Com relação ao Imposto sobre Grandes Fortunas, acredita-se que este não

seria o meio mais efetivo de ampliar a redistribuição de renda e garantir a justiça

social, visto que teríamos os mesmos problemas e dificuldades que outros países

tiveram no decorrer das experiências de implementação do referido imposto.

Considera-se que as grandes fortunas, na maioria das vezes, foram construídas com

muito trabalho e dedicação de grandes empresários e trabalhadores, sendo

considerada injusta sua tributação excessiva através da implementação do referido

imposto. Além do mais, poderiam ocorrer muitos desvios e transferências de capitais

da pessoa física para a pessoa jurídica ou até mesmo, a fuga destes para o exterior,

o que já acontece muito atualmente e foi um dos grandes empecilhos observados

em outros países que já experimentaram esta tributação.

Já o Imposto de Renda, considera-se a forma mais justa de tributação,

desde que se tenha uma progressividade adequada à realidade de nosso país.

Atualmente o que se observa é uma regressividade nas alíquotas, não possibilitando

a evolução econômica das classes menos favorecidas, pois são estas as mais

penalizadas com a atual progressão de alíquotas vigente.

Portanto, somente a partir de uma progressividade mais justa do Imposto de

Renda observando a pessoalidade e a capacidade econômica do contribuinte é que

poderá haver justiça fiscal. Acredita-se que esse é o ponto principal para o Brasil

diminuir as desigualdades sociais.

Nossos governos demonstram interesse na diminuição das desigualdades,

mas o que se observa é que as políticas públicas atualmente aplicadas não

permitem a evolução dessas classes menos favorecidas, pois elas são as mais

prejudicadas, visto que o Estado utiliza-se de meios indiretos de tributação, muito

mais do que prevê o próprio ordenamento jurídico constitucional.

Assim entende-se que a legislação atual vigente está repleta de

instrumentos que poderiam ser explorados de uma forma mais justa, mas que,

devido ao despreparo ou mesmo a falta de interesse de nossos governantes e

legisladores, não são utilizados de forma plena.

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Portanto, espera-se que ocorra uma análise mais aprofundada de nossa

legislação tributária, não com intuito de criar novos tributos, mas sim, de um melhor

aproveitamento e utilização dos instrumentos legislativos vigentes, a fim de permitir

que o cidadão brasileiro possa evoluir economicamente, através de políticas públicas

efetivas que visem diminuir as disparidades sociais e ampliar os conceitos de justiça

social, que é um dos principais objetivos do Estado Democrático de Direito.

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MARTINS, Ives Gandra da Silva. O Imposto sobre Grandes Fortunas. Revista Jus Navigandi, Teresina, ano 13, n. 1697, 23 fev. 2008. Disponível em: <http://jus.com.br/artigos/10977>. Acesso em: 31 maio 2015. MEIRELES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. 27º Ed. São Paulo: Malheiros, 2002. MOTA, Sérgio Ricardo Ferreira. Imposto sobre Grandes Fortunas. São Paulo: MP Editora, 2010. OLIVEIRA, Ricardo Mariz. Fundamentos do Imposto de Renda. São Paulo: Quartier Latin, 2008. RAWLS, John. Uma teoria da Justiça. São Paulo: Martins Fontes, 2000. REALE, Miguel. Teoria do Direito e do Estado. 5º Ed. São Paulo: Saraiva, 2000. SABBAG, Eduardo. Manual de Direito Tributário. 4º Ed. São Paulo: Saraiva, 2012. SEN, Amartya. A ideia de Justiça. São Paulo: Editora Schwarcz, 2009. SOUZA, Rubens Gomes de. Compêndio de Legislação Tributária. 2º Ed. Rio de Janeiro: Edições Financeiras, 1954. STRECK, Lenio L.; MORAIS, José L. B. Ciência Política & Teoria do Estado. 5º Ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2006. V.COSTA, Regina Helena. Conferência proferida no “Seminário sobre a Reforma Tributária”, realizado pelo Centro de Estudos Judiciários. Fortaleza: Revista CEJ, 2003.

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ANEXO

PROJETO DE LEI DO SENADO Nº 534, DE 2011

(Complementar)

Regulamenta o inciso VII do art. 153 da Constituição Federal, para dispor sobre a tributação de grandes fortunas

O CONGRESSSO NACIONAL decreta:

Art. 1º Esta Lei institui o Imposto sobre Grandes Fortunas (IGF) de que trata o art. 153, inciso VII, da Constituição Federal.

Art. 2º São contribuintes do imposto: I – as pessoas físicas de naturalidade brasileira, em relação aos bens

situados em qualquer país; II – o espólio; III – os estrangeiros domiciliados no Brasil, em relação aos bens

localizados no Brasil.

Art. 3º O imposto tem por fato gerador a titularidade, em 31 de dezembro de cada ano civil, do patrimônio definido no art. 4º, em valor superior a R$ 2.500.000,00 (dois milhões e quinhentos mil reais).

Art. 4º Considera-se patrimônio tributável, para efeitos desta Lei, o conjunto de todos os bens e direitos, de qualquer natureza e qualquer que seja seu emprego, situados no País ou no exterior, excluídos:

I – o imóvel de residência do contribuinte, até o valor de R$ 1.000.000,00 (um milhão de reais);

II – os bens de produção e instalações utilizados para obtenção de rendimentos de trabalho autônomo, até o limite de R$ 1.500.000,00 (um milhão e quinhentos mil reais);

III – os bens objeto de tombamento ou de declaração de utilidade pública pelo Poder Público e os gravados por reserva legal ou voluntária para fins de utilização social ou de preservação ambiental;

IV – os bens dados em usufruto a entidades culturais, educacionais, filantrópicas, religiosas e sindicais, ou reconhecidas como de utilidade pública, enquanto durar a dação;

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V – os bens cujo uso esteja interditado por posse, invasão ou esbulho possessório, assim reconhecido por sentença judicial e enquanto durar a interdição;

VI – os bens consumíveis não destinados à alienação; VII – os bens guardados por cláusula de inalienabilidade.

§ 1º Na constância da sociedade conjugal, cada cônjuge será tributado em relação aos bens e direitos particulares e à metade do valor dos bens comuns.

§ 2º O patrimônio dos filhos menores será tributado juntamente com o de seus pais.

Art. 5º A base de cálculo do imposto é o valor do conjunto dos bens e direitos que compõem o patrimônio tributável, diminuído das obrigações pecuniárias do contribuinte, exceto as contraídas para a aquisição de bens excluídos nos termos dos incisos do caput do art. 4º.

§ 1º Os bens serão avaliados: I - os imóveis, pela base de cálculo do imposto territorial ou predial,

rural ou urbano, ou se situado no exterior, pelo custo de aquisição; II - os créditos pecuniários sujeitos a correção monetária ou cambial,

pelo valor atualizado, excluído o valor dos considerados, nos termos da lei, de realização improvável;

III - os demais, pelo custo de sua aquisição pelo contribuinte.

§ 2° Considera-se custo de aquisição: I - dos bens adquiridos por doação, o valor do declarado pelo doador

ou, na falta de declaração, o valor de mercado na data da aquisição; II - dos bens havidos por herança ou legado, o valor que tiver servido

de base para a partilha; III - dos bens adquiridos por permuta, o custo de aquisição dos bens

dados em permuta, atualizado monetariamente; IV - dos bens adquiridos em liquidação de pessoa jurídica ou de valor

mobiliário, o custo de aquisição das participações ou valores liquidados, atualizado monetariamente.

§ 3º A Administração Fiscal poderá utilizar a declaração instituída em legislação de outro tributo, seja para fins de cálculo do crédito tributário, seja para fins de cruzamento de informações e controle.

Art. 6º O imposto será cobrado de acordo com a seguinte tabela progressiva:

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Classe de valor do patrimônio Alíquota

Até R$ 2.500.000,00 Isento

Mais de R$ 2.500.000,00

até R$ 5.000.000,00 0,5%

Mais de R$ 5.000.000,00

até R$ 10.000.000,00 1%

Mais de R$ 10.000,00

até R$ 20.000.000,00 1,5%

Mais de R$ 20.000.000,00

até R$ 40.000.000,00 2%

Mais de R$ 40.000.000,00 2,5%

§ 1º O montante do imposto devido será a soma das parcelas determinadas mediante aplicação da alíquota sobre o valor compreendido em cada classe.

§ 2º Poderão ser abatidas do valor do imposto:

I – as importâncias efetivamente pagas, no exercício anterior, desde que incidentes sobre bens constantes da declaração utilizados na apuração da base de cálculo, a título de:

a) Imposto Territorial Rural (ITR): b) Imposto sobre a Propriedade Predial e Territorial Urbana (IPTU); c) Imposto sobre a Propriedade de Veículos Automotores (IPVA); d) Imposto sobre a Transmissão de Bens Inter-vivos (ITBI); e) Imposto sobre a Transmissão causa mortis e Doação (ITCMD); II – as importâncias efetivamente despendidas na manutenção e na

administração dos bens constantes da declaração utilizados na apuração da base de cálculo, conforme dispuser o Regulamento.

Art. 7º Na forma e nos prazos dispostos em Regulamento, o contribuinte fará a declaração anual do patrimônio e do cálculo do imposto e antecipará o pagamento, sem prejuízo do lançamento posterior pela autoridade fiscal.

§ 1º O imposto apurado será pago até o último dia do mês fixado para a entrega da declaração.

§ 2º À opção do contribuinte, e desde que o valor do imposto a pagar seja maior que R$ 1.000,00 (um mil reais), o saldo do imposto a pagar poderá ser parcelado em até 8 (oito) quotas iguais, mensais e sucessivas, observado o seguinte:

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I – nenhuma quota será inferior a R$ 200,00 (duzentos reais); II – a primeira quota deverá ser paga no mês fixado para a entrega da

declaração; III – as demais quotas, acrescidas de juros equivalentes à taxa

referencial do Sistema Especial de Liquidação e de Custódia – SELIC para títulos federais, acumulada mensalmente, calculados a partir da data prevista para a entrega da declaração de rendimentos até o mês anterior ao do pagamento e de 1% no mês do pagamento, vencerão no último dia útil de cada mês.

Art. 8º Os valores constantes do art. 3º, dos incisos I e II do 4º e do art. 6º terão a expressão monetária atualizada anualmente com base em índice que traduza a variação do poder aquisitivo da moeda nacional.

Art. 9º Serão aplicadas as seguintes penalidades: I – multa de 1% (um por cento) do valor do imposto devido, por mês de

atraso na entrega da declaração de que trata o art. 7º; II – multa de 50% (cinqüenta por cento) do valor do imposto apurado,

na hipótese de subavaliação de bem declarado; III – multa de 100% (cem por cento) do valor do imposto apurado, na

hipótese de omissão de bem na declaração; IV – multa de 150% (cento e cinqüenta por cento) do valor do imposto

apurado, na hipótese de simulação, fraude ou conluio que vise ocultar o verdadeiro titular do bem ou de seu valor.

Parágrafo único. Qualquer pessoa física ou jurídica será solidariamente responsável pelo pagamento do imposto e das penalidades cabíveis, sempre que houver comprovação da ocorrência da hipótese descrita no inciso IV do caput.

Art. 10. O Governo Federal assegurará que a destinação final dos recursos obtidos pela cobrança do Imposto sobre Grandes Fortunas será feita, prioritariamente, a ações na área de saúde.

Art. 11. Esta lei entra em vigor na data de sua publicação.

JUSTIFICAÇÃO

O Imposto Sobre Grandes Fortunas está previsto na Constituição Federal de 1988, em seu artigo 153, VII, sendo sua instituição condicionada a sua regulamentação por lei complementar de competência da União.

O art. 3º da Constituição Federal elenca, entre os objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil construir uma sociedade livre, justa e solidária, bem como erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais.

O Brasil é um país de grande concentração de riqueza e o objetivo do IGF é, justamente, aumentar a tributação sobre as camadas mais ricas da população. O sistema tributário é o instrumento primordial da redistribuição de riquezas. Ele deve ser estruturado de acordo com um princípio de justiça que pode ser traduzido como princípio da capacidade contributiva. Esse princípio foi insculpido

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pelo constituinte de 1988 no § 1º do art. 145, nos seguintes termos: “sempre que possível, os impostos terão caráter pessoal e serão graduados segundo a capacidade econômica do contribuinte...” Portanto, é exigindo mais daqueles que possuem mais recursos, que o Governo poderá investir em favor dos que têm as maiores necessidades.

É verdade que o aumento dos gastos sociais nos últimos anos contribuiu para reduzir significativamente a desigualdade de renda no Brasil. Segundo o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA), “em 2003, o índice de Gini, que mede o nível de desigualdade entre ricos e pobres, era 0,548 quando somado às rendas das famílias os valores per capita aplicados na saúde e educação públicas. Com o aumento de benefícios previdenciários e assistenciais e o volume maior de recursos aplicados na saúde e na educação, esse índice caiu para 0,496 [tendo por referência o ano de 2009]. Quanto mais próximo de 1 estiver o Gini, mais desigual é um país.”

Deve-se observar que impostos como ICMS, PIS/COFINS e IPI oneram o consumo sem distinção de poder aquisitivo, enquanto que impostos diretos, como o Imposto de Renda – e o Imposto sobre Grandes Fortunas –, pesam mais para aqueles que têm renda maior. “Os pobres gastam 30% da renda com impostos indiretos, os ricos 12%, mas o sistema tributário é estruturado dessa maneira porque os indiretos, sobre o consumo, são mais fáceis de ser cobrados”, segundo Fernando Gaiger, técnico do Ipea (http://www.ipea.gov.br, último acesso em 30/08/2011).

Para além de assegurar a redistribuição de renda, buscamos garantir que os recursos arrecadados pelo IGF possam ser destinados, prioritariamente, a ações na área de saúde. Considerando que a vinculação estrita de tais recursos à saúde poderia ensejar questionamentos jurídicos, propomos que o Governo Federal assegure essa destinação prioritária, pois não há dúvidas de que, atualmente, o Brasil vive uma grande necessidade de recursos para financiar ações nessa área.

Entendendo que este projeto trará uma contribuição relevante para fazer avançar a construção de uma sociedade mais justa e solidária, contamos com o apoio dos nobres senadores e senadoras para seu aprimoramento e aprovação.

Sala das Sessões,

1 Senador ANTONIO CARLOS VALADARES