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FACULDADE MERIDIONAL – IMED Escola de Psicologia Gustavo Marques AS CONTRIBUIÇÕES DA ANÁLISE DO COMPORTAMENTO PARA A PSICOLOGIA Passo Fundo 2013

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FACULDADE MERIDIONAL – IMED Escola de Psicologia

Gustavo Marques

AS CONTRIBUIÇÕES DA ANÁLISE DO COMPORTAMENTO PARA A PSICOLOGIA

Passo Fundo 2013

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Gustavo Marques

AS CONTRIBUIÇÕES DA ANÁLISE DO COMPORTAMENTO PARA A PSICOLOGIA

Banca examinadora:

Profa. Dra. Márcia Fortes Wagner – Orientadora

Prof. Dr. Vinícius Renato Thomé Ferreira

Profa. Me. Maríndia Bradtner

Passo Fundo 2013

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AS CONTRIBUIÇÕES DA ANÁLISE DO COMPORTAMENTO PARA A PSICOLOGIA

Gustavo Marques

1. INTRODUÇÃO

O presente trabalho tem por objetivo fazer uma contextualização histórica da

psicologia, de como ela nasce como ciência com Fechner e Wundt, e como o Behaviorismo

surge e evolui, rompendo com esta “psicologia da consciência”. Com esta distinção, mostrou-

se uma alternativa mais fidedigna para o desenvolvimento da ciência psicológica.

Nesse contexto, torna-se fundamental a compreensão do Behaviorismo Radical, que

nasce da perspectiva de superar as limitações impostas pela metodologia do antigo

Behaviorismo. Serão analisados seus fundamentos filosóficos, sua concepção de homem e

noção de causalidade, bem como, introduzidos os princípios básicos da Análise do

Comportamento.

Este estudo tratará da aplicação dos princípios básicos em técnicas da Análise do

Comportamento e como elas podem ser aplicadas num contexto de clínica psicológica,

através da sal ferramenta fundamental: a análise funcional. Esta ciência, apesar do

desconhecimento de muitos profissionais, vem mantendo-se forte e revelando grandes

avanços.

Este projeto de pesquisa apresenta relevância pelo fato de que a Análise do

Comportamento (o que incluiu o Behaviorismo Radical) são temas ainda pouco conhecidos

no estado do Rio Grande do Sul. Da mesma forma, contribuem para a formação clínica do

psicólogo, visto que sua aplicação tem demonstrado alta eficácia no tratamento de diversos

transtornos psicológicos.

2. RESUMO

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O presente trabalho tem como objetivo contextualizar o início da psicologia como ciência e como o comportamento se mostra o objeto de estudo mais fidedigno para esta nova ciência. O comportamento, como objeto de estudo, será analisado dentro da proposta filosófica fundada por B. F. Skinner, o Behaviorismo Radical, enquanto filosofia de ciência, com uma concepção de homem e com a noção de causalidade. Posteriormente, será abordado o desenvolvimento da ciência chamada Análise do Comportamento, a qual, baseada nessa filosofia, traz seus princípios básicos para aplicação no contexto da clínica psicológica, através da análise funcional da Terapia Analítico-Comportamental. Mostra-se que essa ciência, apesar do desconhecimento de muitos profissionais, vem-se mantendo forte e revelando grandes avanços. A relevância deste trabalho reside nas contribuições que a Análise do Comportamento pode trazer na formação do profissional psicólogo, haja vista que sua aplicação tem demonstrado alta eficácia no tratamento de diversos transtornos psicológicos. Palavras-chave: Análise do Comportamento. Análise Funcional. Behaviorismo Radical. B. F.

Skinner.

ABSTRACT

The present paper aims to contextualize the beginning of psychology as a science and how behavior was more adjusted object of study for this new psychological science. The behavior, as object of research, will be examined within the philosophical proposal founded by B. F. Skinner, Radical Behaviorism as a philosophy of science, with a conception of man and the notion of causality. Subsequently, it will address the development of science called Behavioral Analysis, which, based on this philosophy, brings his basic principles, for application in the context of clinical psychology using the functional analysis of Analytic-Behavioral Therapy. Is demonstrated that science, despite the lack of many professionals, has remained strong and showing great progress. The relevance of this study is given by the contributions that behavior analysis can provide to the training of the professional of psychology, since your application has demonstrated high efficacy in the treatment of various psychological disorders. Keywords: Behavior Analysis. Clinical Psychology. Functional Analysis. Radical

behaviorism. Skinner.

3. MÉTODO

3.1. Delineamento

Este estudo caracteriza-se por ser uma pesquisa de cunho bibliográfico.

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3.2. Procedimentos

Foi realizada uma busca bibliográfica a partir de materiais publicados: livros, artigos,

periódicos, vídeos e materiais atualizado disponibilizados na internet. Foram selecionados os

materiais voltados à Análise Comportamental / Behavior Analysis.

3.3. Critérios de inclusão

Foram utilizadas referências bibliográficas pesquisadas nas bases de dados Scielo,

PsycInfo, Web of Science, livros e revistas, no período de 2003 a 2013, além de livros/artigos

clássicos, de língua portuguesa e inglesa.

3.4. Considerações Éticas

Este projeto não foi submetido ao Comitê de Ética em Pesquisa da IMED porque trata-

se de um estudo de revisão bibliográfica.

4. A psicologia como ciência

Fazer ciência é estar em busca de ordem, uniformidade e relações ordenadas entre

fenômenos da natureza, se isto não fosse possível, não haveria ciência. Os resultados tangíveis

e imediatos da ciência são os únicos que sofrem progressos acumulativos, sendo mais

facilmente avaliados que outras formas de descrever a realidade, como a Filosofia, Artes ou

Teologia. (SKINNER, 2003).

O cientista deve tratar, preferencialmente, os fatos e aceita-los e não sobre o que pode

ser dito sobre estes. (SKINNER, 2003). Com a psicologia não é diferente. Assim, os estudos

no final do século XIX, de Gustav Fechner e Wilhelm Wundt, foram os responsáveis por

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constituir a psicologia como uma ciência independente, o que ocasionou a fundação do

primeiro laboratório de psicologia experimental em 1879, na Alemanha. (KELLER, 1974).

Para ficar clara a importância desse fato, naquele momento, a psicologia seria tratada

como ciência, ou seja, deveria definir seu objeto de estudo e o seu método, essencial para o

seu surgimento e seu desenvolvimento. Dessa forma, os fundadores desse laboratório

definiram a consciência como o objeto de estudo da psicologia e a introspecção experimental

como o método eleito. (MOREIRA; HANNA, 2012).

Mas algumas décadas depois, em 1913, John Watson argumenta que o método da

introspecção experimental falhou em estabelecer e em desenvolver a psicologia como ciência

natural, que lida com fenômenos que ocupam lugar no tempo e no espaço. Este afirmou que

as falhas estavam nos instrumentos e nos métodos utilizados nos experimentos, e que a

psicologia dever-se-ia aproximar dos exemplos das ciências já estabelecidas, como a Química

e a Física. (KELLER, 1974; CHIESA, 2006; MOREIRA; HANNA, 2012).

Assim, Watson dá mais um passo para a constituição da ciência psicológica, com o seu

artigo intitulado “A psicologia tal como a vê um behaviorista”. Este trabalho não propunha

uma nova ciência, mas que a psicologia tivesse como foco o estudo do comportamento,

sistematizando o que foi chamado posteriormente de Behaviorismo Metodológico.

(SKINNER, 1974). Essa proposta estava embasada nas concepções das ciências físicas,

sobretudo a mecânica newtoniana e a filosofia do reflexo. (MICHELETTO, 2001;

SCHULTZ; SCHULTZ, 2006; CHIESA, 2006).

Como referência a essas propostas iniciais de behaviorismo, rótulos como

“mecanicista”, “simplista”, “reducionista”, “psicologia estímulo-resposta” foram e são

utilizadas até hoje. Estes são justificados apenas ao Behaviorismo Metodológico, pois, este

assume uma concepção mecanicista de comportamento, no sentido de que a causa é

necessariamente um evento que antecede o que ele produz, ou seja, um efeito. Além disso, a

concepção dualista da natureza humana mantém-se na psicologia, isto é, existiriam processos

internos (subjetivos) de natureza diferente dos processos comportamentais (objetivos), em que

os primeiros não poderiam ser analisados cientificamente. (CHIESA, 2006).

Não demorou muito para que, insatisfeitos com essa proposta, outros cientistas

iniciassem outros estudos. Tolman e Hull, expoentes da área à época, colocaram mediadores

entre o ambiente e o comportamento (“mente” e neurofisiologia, respectivamente), sendo

chamados, mais tarde, de behavioristas mediacionais. Estas concepções mantiveram o

dualismo mente-corpo/subjetivo-objetivo, e mais tarde deram origem às Terapias Cognitivas-

Comportamentais. (COSTA, 2002).

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Outro caminho para a superação das limitações do Behaviorismo Metodológico foi

desenvolvido por Skinner, o qual inicia o desenvolvimento de uma nova proposta de

psicologia científica, o Behaviorismo Radical. Este critica o modo de fazer ciência do

Behaviorismo Metodológico, afirmando que a “verdade por concordância”, que mantém a

dualidade mente/corpo, limitou a psicologia ao analisar apenas os eventos públicos, que são

observáveis por mais de uma pessoa. Nesta nova proposta, os eventos privados também

poderiam ser investigados, pois são da mesma natureza. Portanto, uma máquina de escrever é

tão física quando uma “dor de dente”, apesar desta última não ser pública, é possível analisar

os processos pelos quais os vocabulários descritivos de estados internos são adquiridos e

mantidos pelo indivíduo. (SKINNER, 1969).

Com as concepções apresentadas até aqui, não é difícil de perceber até onde os críticos

do Behaviorismo Radical (hoje, tido como “O Behaviorismo”) chegaram em suas leituras.

Para os seres humanos, não existe melhor assunto que se possa falar, que não seja o

comportamento. Apesar de existirem milhares de fatos sobre o comportamento, esta

proximidade é quase uma desvantagem, pois, muito certamente, sem a análise de uma ciência,

tem-se chegado à conclusões equivocadas a respeito deste. A dificuldade de se analisar o

comportamento está na sua complexidade, por ser um processo que é mutável, fluído e

evanescente, o que com a engenhosidade e energia do cientista é superada. (SKINNER,

2003).

Neste sentido, a ciência é responsável por apontar e complementar as experiências dos

indivíduos, demonstrando cada vez mais as relações entre acontecimentos e possibilitando o

seu aprimoramento. Inicialmente padrões mais básicos são encontrados e descritos, criando

“regras” que acumulados, em um estágio posterior, avançam em um arranjo sistemático de

leis mais amplos, criando um sistema científico. Desta forma, a análise científica do

comportamento fez progressos dramáticos, indo além das limitações do behaviorismo inicial,

sendo, agora, estas, apenas de interesse histórico. Mas as críticas não mudaram muito, devido

ao desconhecimento e incompreensões apresentadas pelo público em geral. Devendo-se isto,

primeiramente, à delicadeza de se tratar do comportamento humano, pois uma concepção

behaviorista radical exige mudanças perturbadoras no modo com que os seres humanos veem

a si próprios. (SKINNER, 1974; 2003).

E a segunda razão das críticas é que a ciência é, por si mesma, mal compreendida.

(SKINNER, 1974). Esta má compreensão inclui alguns psicólogos, que não sentem a

necessidade de ter padrões e critérios de prova característicos de uma ciência e relutam em

aceitar as conclusões que tais fatos inevitavelmente apontam. Ressalta-se que as técnicas

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experimentais e matemáticas usadas para a descoberta e expressão das uniformidades são

propriedades das ciências em geral, e não apenas um recurso da análise científica do

comportamento. (SKINNER, 2003).

5. Análise do comportamento

As ideias centrais do Behaviorismo Radical foram articuladas em 1938 no artigo

“Análise operacional dos termos psicológicos”, de Burhhus Frederick Skinner, onde afirma

que os conceitos psicológicos devem ser analisados pelo que eles são: comportamentos

verbais do cientista. A análise buscaria nos antecedentes e nos consequentes o motivo do uso

de tal termo psicológico, isto é, fazer a análise funcional de como o uso de determinado termo

se instala e se mantém em uso. (SCHULTZ; SCHULTZ, 2006).

Esta expressão “radical”, que compõe o termo, não se refere a qualquer intransigência

do analista do comportamento com as contribuições de outras teorias, mas um pressuposto

desta ciência. Nela, o comportamento é a raiz (do latim radix, que também dá origem à

palavra “radical”), que deve ser tratada como unidade de análise que permite compreender as

interações humanas no seu contexto, ou seja, o acesso, a descrição e a explicação das

atividades humanas nas suas relações com o ambiente. (CARRARA, 2008).

Entretanto, atualmente, é utilizada uma nova classificação, na qual esses

conhecimentos behavioristas de tradição skinneriana sejam chamados simplesmente de

Análise do Comportamento. Esse sistema cultural é divido em três subáreas: Behaviorismo

Radical (sistematização conceitual e de reflexão sobre a extensão do projeto científico);

Análise Experimental do Comportamento (produção empírica; pesquisa básica); e Análise

Aplicada do Comportamento (pesquisa aplicada; responsável pela criação e pela

administração de tecnologias de intervenção social, p. ex.: método ABA de intervenção com

indivíduos com espectro autista). Essas subáreas coexistem num processo de alimentação

contínua e recíproca, não sendo possível existirem de forma isolada (SKINNER, 1974;

TOURINHO, 1999; MICHELETTO, 2001; CARMO; BATISTA, 2003; CHIESA, 2006;

CARVALHO NETO, 2002).

As diferenças entre a pesquisa básica e a pesquisa aplicada não se refere àquilo que é

“descoberto” e posteriormente é “aplicado”, afinal, as duas indagam o que controla o

comportamento em análise. A pesquisa básica contempla qualquer comportamento e qualquer

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variável que possa estar relacionada a este, na maioria das vezes realizada em laboratório. É

uma opção metodológica com objetivos claros, que parte do simples com o objetivo de chegar

ao complexo, ou seja, amplia o número de variáveis estudadas e de forma a entender como se

dá a interação entre o maior número possível de eventos estudados, pois o comportamento é

um sistema complexo e precisa ser compreendido enquanto tal. Apesar de uma esmagadora

quantidade de variáveis a se considerar, ainda assim é possível identificar regularidades na

complexidade. Já a pesquisa aplicada tem como foco a análise de variáveis que possam ser

eficazes na melhoria de um dado comportamento socialmente relevante, sendo realizado,

geralmente, em ambientes extralaboratório (BAER; WOLF; RISLEY, 1968).

Assim, a Análise Aplicada do Comportamento (o que inclui a terapia) é um tanto

diferente daquela realizada em laboratório, mas deve ter o estudo aplicado (interesse que a

sociedade demonstra aos problemas estudados), comportamental (o que é possível ao

indivíduo fazer com eficiência), analítico (demonstrar confiavelmente os eventos que podem

ser responsáveis pela ocorrência ou não de tal comportamento), tecnológico (as técnicas

utilizadas devem estar completamente identificadas e descritas), conceitualmente sistemático

(relacionar o tecnológico com os conceitos básicos já desenvolvidos), eficaz (alterar o

comportamento suficientemente para tornar-se socialmente importante) e demonstrar certa

generalidade (deve demonstrar durabilidade de mudança de comportamento através do tempo

e alterações em uma grande variabilidade de comportamentos relacionados). Os autores

concluem que, em uma intervenção realizada nessas condições, é possível perceber a

importância do comportamento alterado e suas características quantitativas, as manipulações

experimentais utilizadas (possibilitam perceber o que foi responsável pela mudança), a

descrição tecnológica precisa de todos os procedimentos que contribuíram para esta mudança,

a eficácia dos procedimentos e a generalização (BAER; WOLF; RISLEY, 1968).

Dessa forma, o presente estudo busca definir os principais conceitos desta importante

área da psicologia, buscando instrumentalizar os profissionais da área da saúde mental no

conhecimento teórico e na aplicação prática desses princípios.

5.1. Fundamentos filosóficos

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A Análise do Comportamento é uma ciência monista e materialista, ou seja, adota um

mundo físico de dimensão natural única. Dessa forma, a problemática dualista mente-corpo

não existe nessa concepção filosófica. (CARRARA, 2008; BAUM, 2008). Ou seja, as

mesmas leis, nos comportamentos públicos (comer, correr, escrever, falar, etc.) que

descrevem as relações funcionais (relação “se... então...”, em que um evento afeta a

ocorrência de outro) também as descrevem nos comportamentos privados (pensar, sonhar,

imaginar, raciocinar, etc.), a diferença é que esses últimos estão acessíveis apenas para o

próprio indivíduo que se comporta. Assim, a metafísica torna-se dispensável, pois entidades

como “aparelho psíquico”, “cognição” ou “mente” não são utilizados para a explicação dos

comportamentos, pois é o organismo, na sua integralidade, que faz parte do mundo e interage

com este. (MARÇAL, 2010).

Esta ciência adota o pragmatismo, cujo foco da investigação científica não está na

busca da verdade sobre como o universo funciona, mas naquilo se pode fazer com este. Nessa

concepção, o critério de verdade está mais como um poder explicativo, ou seja, a explicação

que trouxer compreensão ou descrição mais coerente de determinado comportamento dentro

de um único mundo natural com vistas a alterá-lo. Por exemplo, se alguém afirma que “Um

homem está correndo na rua”, a topografia descrita do comportamento pode indicar que

aquele homem está fazendo exercícios ou até mesmo fugindo da polícia. O que prevalece para

um pragmatista são as razões pelas quais aquele homem corre. Uma descrição que inclua a

funcionalidade do comportamento é mais apropriada, por exemplo, “Aquele homem está

correndo na rua como parte de seu treinamento para ir às Olimpíadas”, pois descreve as

razões do comportamento e as suas funções. (BAUM, 2008, p. 43).

A Análise do Comportamento também adota o determinismo, pois, a partir da

concepção do mundo natural, de que apenas se explica o presente a partir do passado, surge a

ideia de que a natureza é determinada. O determinismo coloca o ser humano ao mesmo nível

do resto da natureza, pois este é parte integrante dela, e, assim, os comportamentos não

acontecem ao acaso, mas são determinados pelos ambientes (descritos abaixo). Dessa forma,

pode-se afirmar que sentimentos, pensamentos e intenções (respostas) também não acontecem

ao acaso, mas são determinados por eventos anteriores (estímulos antecedentes). (BAUM,

2008).

É o que ocorre no caso da “ansiedade”, que é sentida em situações em que a

apresentação de um estímulo aversivo é iminente. Por exemplo, pode acontecer em uma

situação de paquera, em que há possibilidade de rejeição, pois, em outros momentos durante a

vida, em contextos semelhantes, a rejeição já aconteceu. Existe a ideia equivocada de que o

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ser humano não escolheria, não decidiria nem determinaria o seu futuro. A explicação mais

correta é de que esses comportamentos (respostas) (p. ex. escolher, decidir e determinar)

também são explicáveis a partir de experiências passadas e não ocorrem ao acaso ou em

relação ao futuro (BAUM, 2008; MARÇAL, 2010).

Assim, sendo todos os eventos determinados, existe controle, que deve ser entendido

como influência, ou seja, variáveis ambientais influenciam (controlam) a ocorrência de certo

comportamento, aumentando ou diminuindo a probabilidade da sua ocorrência. (MOREIRA;

HANNA, 2012). A ciência comportamental aprimorou e ampliou a possibilidade de prever o

comportamento e tornou explícitas as uniformidades. E é por essa regularidade que se torna

possível a previsão e a manipulação do comportamento, que é um evento influenciado por

outros eventos ambientais. (SKINNER, 2003).

Observando as diferentes áreas da ciência psicológica nota-se que o que as caracteriza

é a ênfase dada às alguma das diversas interações do organismo com o ambiente. Assim, te-se

a divisão do ambiente em ambiente externo (físico e social) e ambiente interno (biológico e

histórico). O ambiente externo divide-se em físico e social. O ambiente externo físico refere-

se às ações mecânicas (princípios geométricos e mecânicos), com propriedades que se

relacionam, quase sempre, de forma simples, com os efeitos produzidos (p. ex. apertar um

botão e receber café no copo). O ambiente externo social, diferentemente, tem suas

consequências mediadas por outro indivíduo, envolvendo uma série complexa de

acontecimentos entre o falante e o ouvinte (p. ex. fazer o pedido de um prato ao garçom de

um restaurante). Nesse caso, as consequências de tal comportamento de “pedir um prato”

surgem por intermédio de uma diversidade de eventos não menos físicos ou inevitáveis que as

ações mecânicas, mas, com certeza e apenas, maior dificuldade de descrever. (TODOROV,

2007).

Da mesma forma, o ambiente interno, seja o biológico ou o histórico, também sempre

está presente nas interações organismo-ambiente. A compreensão do ambiente interno

biológico não é muito diferente da de cem anos atrás, quando Freud desenvolveu sua teoria ou

Skinner, em 1930, a sua, apesar dos progressos dos últimos anos. (TODOROV, 2007).

Sobre o ambiente interno histórico, é fato dado que o indivíduo age agora não apenas

em função de um ambiente externo presente e que este carrega os resultados de interações

passadas. E, pela conclusão do autor, existe a dificuldade em se explicar as relações do

organismo com o ambiente, seja interno ou externo, físico ou social, biológico ou histórico, e

esta talvez seja a responsável pelo desenvolvimento de várias escolas em psicologia, criando

diferentes conceitos e princípios, a partir de diferentes ênfases na relação que os organismos

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têm com os seus ambientes. De qualquer forma, os quatro aspectos apresentados para o

ambiente são indissociáveis, pois estudar apenas as partes levaria a um conhecimento

incompleto, não inter-relacionado com as demais partes para o entendimento, já que o todo

não decomposto é ininteligível. É a estes ambientes que o analista de comportamento refere-

se ao se fazer uma análise comportamental. (TODOROV, 2007).

Em outras palavras, a Análise do Comportamento não se limita ao método: seu critério

de verdade é a efetividade (e não o consenso de mais de uma pessoa); compreende que os

eventos públicos (p. ex. correr, escrever, caminhar etc.) e privados (p. ex. sentimentos,

pensamento, memória etc.) são da mesma natureza material. Assim considera que esses

eventos privados também são passíveis de estudo, resgatando a introspecção e o estudo da

consciência como comportamentos verbais a serem analisados. (SKINNER, 1974;

TOURINHO, 1999; TODOROV; MOREIRA, 2008; MOREIRA; HANNA, 2012).

5.2. O modelo de seleção por consequências

Em 1981, Skinner publicou, na Science, uma das mais influentes e importantes

revistas científicas do mundo, o artigo “Seleção por Consequências”, e apesar das ideias ali

apresentadas já estarem em outros trabalhos, foi neste artigo que se formalizou o modelo

explicativo da Análise do Comportamento: o modelo de seleção pelas consequências. Nesse

modelo, estão a seleção natural (filogênese), a seleção operante (ontogênese) e a seleção

cultural (esta última é exclusiva dos humanos e possibilita o surgimento e a transmissão das

práticas culturais) (MOREIRA; HANNA, 2012). Para o autor, a compreensão, a previsão e o

controle dos comportamentos acontecem pela análise destas três seleções, que são tipos de

contingências, que agem mutuamente na multideterminação do comportamento do indivíduo:

(...) a) contingências de sobrevivência responsáveis pela seleção natural das espécies, e b) contingências de reforçamento responsáveis pelos repertórios adquiridos por seus membros, incluindo c) contingências especiais mantidas por um ambiente cultural evoluído. (Em última análise, obviamente, tudo isso é uma questão de seleção natural, uma vez que o condicionamento operante é um processo evoluído, do qual as práticas culturais são aplicações especiais) (SKINNER, 1981).

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Estas contingências, que explicam as causas do comportamento para esta ciência, são

“regras que descrevem dependências entre antecedentes ambientais, respostas do organismo e

suas consequências, dando ênfase à relação funcional entre esses elementos”. (SILVA; DE-

FARIAS, 2010, p. 231). Em outras palavras, são relações entre eventos antecedentes, resposta

e consequência (contingência de três termos), que alteram a probabilidade de ocorrência de

determinados comportamentos (p. ex.: em privação de afeto → dizer palavras de amor →

ganhar um beijo, assim, em ocasiões semelhantes futuras esta resposta tende a ocorrer

novamente). Assim, um comportamento é adquirido e mantido devido à sua funcionalidade,

ou seja, pelas consequências da resposta.

O primeiro nível de seleção por consequências é a filogênese, descrito por Charles

Darwin como o processo de seleção natural, a qual explica a existência das diferentes

espécies, como também explica parte dos comportamentos dos organismos. (SKINNER,

1981; MOREIRA; HANNA, 2012). Se for realizada uma observação mais acurada dos

organismos, será possível perceber uma diversidade de comportamentos que estes emitem

sem que seja necessária uma aprendizagem ou uma experiência anterior.

Estes comportamentos são chamados de comportamentos respondentes/reflexos, e,

como não necessitam de aprendizagem, são qualificados como inatos/incondicionados. É

importante frisar que, para acontecer esse tipo de comportamento, sempre há uma alteração

ambiental antecedente (estímulo antecedente) que elicia uma alteração no organismo

(resposta), cujo reflexo é essa relação fidedigna, não apenas a resposta. Como exemplo,

alguns comportamentos respondentes inatos: quando uma superfície muito quente estiver

próxima da mão, a resposta é a retirada da mão; a presença de alimento da boca, a resposta é

salivar; se ocorre um barulho estridente, a resposta é um sobressalto; se uma luz forte é

direcionada aos olhos, a resposta é a pupila retrair. (MOREIRA; MEDEIROS, 2007;

MARTONE; TODOROV, 2007).

Em um comportamento respondente, uma explicação suficiente da resposta é a

descrição do estímulo antecedente, pois contingências filogenéticas atuam sobre o organismo.

Mas, como explicar a salivação de um bebê ao apenas ouvir a palavra “doce”, por exemplo?

O que ocorre, nesse caso, é o condicionamento respondente (reflexo, pavloviano ou clássico),

em que um estímulo neutro (a pronunciação “doce”) com o pareamento (apresentação

anterior, quase simultânea) do estímulo incondicionado (o próprio doce) adquire funções do

estímulo incondicionado de salivação. Inicialmente, apenas a pronunciação “doce” não

eliciaria a resposta de salivar da criança, mas, com apresentações contingentes e sistemáticas

do doce (estímulo incondicionado) com a pronunciação “doce” (estímulo neutro), este

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segundo passa a ser um estímulo condicionado, sendo agora possível eliciar a salivação como

resposta condicionada. (HOLLAND; SKINNER, 1974). A importância deste fato é que

através do condicionamento respondente, respostas selecionadas previamente pela seleção

natural podem ficar sob controle de novos estímulos.

O comportamento operante é o segundo tipo de seleção por consequências

(ontogênese), que descreve a história de aprendizagem de cada indivíduo. Este é possível pois

em algum momento da evolução das espécies o comportamento dos organismos tornou-se

suscetível aos acontecimentos que ocorrem após a resposta emitida. Nesse nível, variações

comportamentais são selecionadas (“reforçadas”) pelas consequências que produzem. Ou seja,

conclui-se que respostas foram reforçadas pelas consequências que produzem, se,

posteriormente, aumentam a probabilidade de ocorrência dos comportamentos da classe de

resposta (respostas que resultam em certo reforçador) selecionada (p. ex. trabalhar, nas mais

diversas profissões, é reforçado pelo dinheiro que se obtém). Após isso, o comportamento

operante instala-se e fica sob controle das consequências que se seguem.

E são essas variações e seleções que possibilitam a descrição do processo de

surgimento de características individuais que dão singularidade às respostas de um indivíduo,

possibilitando o estabelecimento de repertórios comportamentais individuais únicos, inclusive

as diferentes formas de sentir e nomear emoções. (TEIXEIRA JÚNIOR; SOUZA, 2006;

ROSE, 2001; MOREIRA; MEDEIROS, 2007). Ou seja, comportamento operante é assim

chamado porque opera e não “reage” sobre o ambiente. A crítica de que na Análise do

Comportamento o ser humano é um ser passivo não poderia ser mais equivocada, já que se

estudam exatamente as interações entre organismo e ambiente, através do comportamento.

(CARRARA, 2008). Os indivíduos estão em constante construção da sua história, e não

reagem ao mundo, mas agem sobre este e o modificam e por ele são modificados, ou seja,

trata-se de uma concepção interacionista. (SKINNER, 1957). Inclusive, são esses

comportamentos que constituem a maior parte das atitudes dos seres humanos, inclusive o que

se denomina pensamento. (ROSE, 2001).

A analogia entre seleção natural e seleção operante é direta. A seleção natural de

Darwin é responsável pelas diferenças entre as espécies, que ocorrem há milhões de anos, e a

seleção operante é responsável pelas diferenças comportamentais individuais durante a vida

dos indivíduos. (MOREIRA; HANNA, 2012). Resultante disso, na espécie humana, a

musculatura vocal ficando sob controle operante, tornando esta muito mais social. Assim, não

houve a necessidade de uma nova susceptibilidade ao reforçamento, pois as consequências do

comportamento verbal diferenciam-se das demais pelo fato de que são mediadas por outros

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indivíduos. Desta forma, o comportamento verbal aumentou muito a importância do terceiro

nível de seleção pelas consequências (seleção cultural), sendo o efeito sobre o grupo e não as

consequências reforçadoras individuais o responsável pela evolução da cultura. (SKINNER,

1981).

O entrelaçamento entre os comportamentos dos indivíduos e os seus efeitos também

se tornaram determinantes no comportamento destes. Os ambientes sociais, inevitavelmente

se iniciam em nível de indivíduo, por exemplo, quando este desenvolve uma melhor

ferramenta de trabalho, de acumular alimentos ou de ensinar ajudantes. Assim, com a seleção

cultural, o conhecimento começou a ser acumulado ao longo das gerações, possibilitando o

desenvolvimento de repertórios comportamentais que ultrapassam a própria vida do indivíduo

(p. ex. atitudes ecologicamente sustentáveis). (MARTONE; TODOROV, 2007). Por essas

razões, é isso que evolui uma cultura, a consequência reforçadora que o produto desses

comportamentos tem sobre o grupo, na solução dos seus problemas grupais, como nos

exemplos anteriores: a ferramenta, os alimentos e um ajudante útil. (SKINNER, 1981).

6. Terapia analítico-comportamental

A Terapia Analítico-Comportamental (TAC) é uma das diversas formas de se fazer

psicoterapia para o enfrentamento dos problemas humanos. Desenvolvida por brasileiros, tem

uma forte base experimental, com direção filosófica e conceitual do Behaviorismo Radical,

pautada historicamente nos princípios da aprendizagem. É uma das formas da Análise

Aplicada do Comportamento. A seleção por consequências é o modelo explicativo para as

análises e para as técnicas e a análise de contingências é a ferramenta interpretativa.

(BORGES; CASSAS, 2012).

Nessa proposta terapêutica, as estratégias de intervenção estão voltadas para a prática

psicológica, com ênfase na relação terapeuta-cliente, na análise do comportamento operante e

na análise dos eventos privados. (MARÇAL, 2010).

De forma geral, alguns aspectos da psicoterapia analítico-funcional são fundamentais e

norteiam as intervenções do terapeuta:

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a) Rejeição do modelo médico (causa patológica mental e sintomas

comportamentais), tratando o comportamento por ele mesmo, não sendo substrato

de conteúdo mental;

b) A intervenção acontece na modificação das variáveis ambientais responsáveis

(contingências), em contraposição à tentativa de mudar causas “mentais”;

c) Abordagem idiográfica (cada comportamento tem determinantes individuais) em

contraposição à nomotética (generalização em psicodiagnóstico e intervenções

tecnicistas);

d) Rejeição da classificação de comportamento normal e anormal (patológico), pois

sua distinção é meramente social;

e) Ênfase no comportamento aprendido relevante clinicamente, sem esquecer-se da

genética e cultura;

f) Considera a historicidade do comportamento, mas a intervenção é centrada nas

contingências mantenedoras atuais. (ALVES; MARINHO, 2010, p. 68).

Na Terapia Analítico-Comportamental, como em qualquer outra abordagem

psicoterápica, as pessoas buscam psicoterapia por diversos motivos e todos eles refletem

situações ligadas a contingências aversivas. Disso decorre a importância de estabelecer e criar

o vínculo terapêutico, como potencial reforçador positivo, pois não é fácil para cliente

procurar ajuda, pois tal atitude já revela que a sua vida não vai bem e que não consegue mais

resolver seus problemas sozinho. Então, cabe ao terapeuta realizar uma escuta não punitiva,

ou seja, criar o ambiente em que o cliente possa emitir seus comportamentos que, antes

punidos, agora estão sob necessário acolhimento e consequenciado sem punições. (DELITTI;

GROBERMAN, 2005; KOHLENBERG; TSAI, 2006).

Da mesma, é importante ressaltar que as verbalizações das queixas também se

apresentam-se como em qualquer outra psicoterapia, por exemplo, queixas de “ansiedade”, de

“medo”, de “angústia”, de “aflição”, de “desespero”. Mas, a terapia analítico-comportamental

não concebe os sentimentos como fenômenos mentais, de natureza diferente do

comportamento, mas como manifestações físicas do organismo, como “ações sensoriais”,

perceptíveis apenas àquela pessoa. (SKINNER, 1989). Conclui-se, assim, que sentimentos

(eventos privados) também são produtos (e não causas) de contingências, não se podendo

alterar os sentimentos diretamente, mas as suas contingências.

O caminho para tratar esses sentimentos desconfortáveis e comportamentos-alvo que

compõem a queixa, é investigar as variáveis das quais o comportamento é função. Assim,

inicialmente, buscam-se informações do que está ocorrendo com o cliente e como está ocorre,

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relacionadas à queixa do cliente, o que o levou a procurar terapia, sendo que, em geral, os

problemas iniciais são excessos comportamentais (p. ex. brigas frequentes com o cônjuge),

déficits comportamentais (p. ex. falta de habilidade em iniciar e manter um relacionamento

amoroso) e comportamentos interferentes (p. ex. dificuldade de manter interação social

devido ao desconforto de ficar em grandes públicos). Em todos esses casos, os sentimentos

que acompanham os relatos também são consequências, nunca a causa dos problemas.

(LEONARDI; BORGES; CASSAS, 2012).

Neste processo, a função do terapeuta para o cliente é de auxiliá-lo a: a) responder

visando às consequências necessárias, ao mesmo tempo eliminando ou pelo menos

diminuindo a aversividade experienciada na situação; b) alterar a forma de como o cliente

responde às situações, alterando, assim, o comportamento (relação); e c) melhorar suas

relações com terceiros (ambiente). (OLIVEIRA; BORGES, 2007).

Para que o terapeuta possa realizar esta tarefa, a análise funcional é a ferramenta que

permite a compreensão do caso do cliente e que norteia as tomadas de decisões por parte do

terapeuta analítico-comportamental. Esta é realizada através da identificação das relações de

dependência entre as respostas do cliente, a situação em que essas ocorrem e as operações

motivadoras (evento que altera o valor reforçador da consequência e ao mesmo tempo altera a

probabilidade de ocorrência dos comportamentos relacionados ao estímulo, p. ex. privação de

relação sexual) em vigor.

Resumidamente, os objetivos da análise funcional utilizada pelo terapeuta são: “1)

identificar o comportamento-alvo e as condições ambientais que o mantém; 2) determinar a

intervenção apropriada; 3) monitorar o progresso da intervenção; 4) auxiliar na medida do

grau de eficácia e efetividade da intervenção.”. (FOLLETTE; NAUGLE; LINNEROOTH

apud BORGES; CASSAS, 2012). Em outras palavras, a avaliação funcional tem por objetivo

entender quais os comportamentos-alvo que compõem a queixa, que contingências estão

envolvidas, que tipo de processo comportamental ocorre e a história de reforçamento desse

comportamento.

Assim, parte-se da queixa, descreve-se em que condições antecedentes acontece, as

consequências que produz e a frequência atual e histórica. Possibilitando ao terapeuta

interpretar a dinâmica de funcionamento do cliente, e nortear a intervenção mais apropriada

para alterar as relações comportamentais que o cliente tem com os seus diversos contextos.

Essas histórias pessoais analisadas são únicas, consequentemente, possuem inúmeras

possibilidades interpretativas e desfavorecem pacotes generalizados de tratamento. Dessa

forma, dois clientes, com o mesmo quadro clínico, poderão necessitar de diferentes

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intervenções. (LEONARDI; BORGES; CASSAS, 2012; CARRARA, 2008).

Neste contexto, o comportamento verbal é uma complementação para a identificação

de comportamentos-alvo ou clinicamente relevantes na relação terapêutica. Nesse modelo de

terapia, a análise dos episódios verbais (interação entre ouvinte e falante) é uma importante

ferramenta, pois possibilita ao terapeuta (ouvinte) entrar em contato com as experiências às

quais apenas o cliente (falante) tem acesso, ou seja, comportamentos privados e

comportamentos públicos ocorridos extrassessão. No comportamento verbal, que sempre é

mediado pela comunidade e nem sempre vocal, existem alguns tipos de operantes, dos quais o

tato é a forma de descrever o mundo para o ouvinte. Para Skinner (1957), é o mais importante

deles, devido ao controle único exercido pela estimulação anterior (p. ex. “Me sentindo

aliviada, agora que falei dos meus sonhos.”; “Hoje sai de casa e me senti muito bem.”).

(KOHLENBERG; TSAI, 2006).

Em um segundo momento, o terapeuta inicia a formulação de hipóteses, a partir dos

eventos relatados em atendimento e também dos observados de forma direta na relação

terapêutica (LEONARDI; BORGES; CASSAS, 2012). Essas hipóteses relacionam-se aos

processos comportamentais que estão envolvidos nos comportamentos-alvo que compõem a

queixa, que podem ser referentes a condições antecedentes (discriminação, operação

motivadora, equivalência de estímulos etc.) e consequentes (reforçamento, punição, extinção

etc.).

Para auxiliar na formulação de hipóteses, alguns exemplos de perguntas que ajudam

no levantamento de informações: 1) A respeito dos estímulos antecedentes da contingência:

“Quando você se comporta assim?”; “O que você acha que te leva a pensar assim?”; “Como

você estava se sentindo antes de fazer isso?”; 2) Já estas podem auxiliar nos estímulos

consequentes que são produtos da resposta: “Se você não o fizesse, o que aconteceria?”;

“Como você se sente depois que age dessa maneira?”; “O que acontece quando você faz

isso?”. (LEONARDI; BORGES; CASSAS, 2012).

Este procedimento auxilia também no planejamento da intervenção, onde o terapeuta

deve identificar, dentro do comportamento que ocorre, em que parte da contingência é

necessário intervir: nos antecedentes, nas respostas ou nas consequências. (FOLLETTE;

NAUGLE; LINNEROOTH, 1999). E, muitas vezes, pode ser necessária a intervenção em

mais de uma dessas partes da contingência, seja um comportamento respondente ou um

comportamento operante (BORGES, 2009; DEL PRETTE; ALMEIDA, 2012).

Na análise funcional, o terapeuta analítico-comportamental deve identificar

regularidades nos diversos eventos experienciados e relatados pelo cliente e na relação

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terapêutica, e, sempre que possível, essas relações funcionais identificadas devem ser testadas,

confirmando ou não as suas existências. Assim, o terapeuta analisa como as relações entre o

cliente e seu ambiente se constituíram e se mantém. Dessa forma, o profissional compreende

os comportamentos-alvo sem fazer julgamentos de valor e sem recorrer a explicações

metafísicas, pois entende que esses comportamentos foram selecionados na história de vida

do cliente. (LEONARDI; BORGES; CASSAS, 2012).

Além disso, para que se possa fazer um planejamento mais apropriado, é importante

que se tenha o máximo de informações sobre o cliente. Assim sendo, a avaliação funcional

não deve apenas considerar as contingências mantenedoras do comportamento-alvo, mas que

o terapeuta identifique, na história do cliente, as formas de como este tem enfrentado seus

problemas, assim conhecerá os repertórios comportamentais que poderão ser utilizados na

intervenção. Cabe, então, ao terapeuta, usar diferentes estratégicas para obter as informações

para a formulação do caso, conhecendo os aspectos filosóficos, teóricos e empíricos da

Análise do Comportamento, pois são esses que norteiam a formulação de perguntas, a criação

de hipóteses e a elaboração de uma intervenção bem-sucedida. (LEONARDI; BORGES;

CASSAS, 2012; BORGES, 2009).

A dimensão da análise é igualmente importante para o planejamento da intervenção.

Logo, a análise funcional deve compreender os comportamentos dentro de uma visão molar e

molecular. A visão molecular pode ser entendida como a análise da tríplice contingência

(pode-se utilizar contingências até cinco termos), ou seja, dos antecedentes, das respostas e

das consequências. Essas análises moleculares terão foco nas consequências “imediatas” e

“diretas” da contingência. Mas, é evidente que comportamentos também têm outras

consequências, ditas colaterais ou secundárias. Dessa forma, deve-se fazer uma análise molar

dos comportamentos. (BORGES, 2009).

A visão molar é mais ampla, inclui questões como estas: “De que forma as pessoas

reagem aos comportamentos do cliente, atualmente?”, “Com estes novos comportamentos, o

cliente receberá consequências reforçadoras em seu ambiente cotidiano?”. Essa visão avalia o

impacto que determinado comportamento está tendo no funcionamento global do cliente,

além de antecipar alguns problemas que podem ocorrer na mudança desse comportamento,

pois todos os sistemas aos quais o indivíduo interage são afetados na alteração de uma única

classe de respostas. (BORGES, 2009). Por isso é importante o terapeuta estar atento aos

efeitos das mudanças propostas nesses ambientes.

Após realizar a avaliação inicial, com a análise funcional e com o planejamento da

intervenção, chega o momento de iniciar a intervenção, quando o terapeuta ajudará o cliente a

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identificar e a aperfeiçoar suas relações com os seus ambientes para que este tenha maior

possibilidade de receber reforçadores e diminuir as relações de controle aversivo.

(OLIVEIRA; BORGES, 2007).

A intervenção se dá pelas técnicas, que são a “sistematização de intervenções com

vistas a determinados resultados diante de situações específicas” e afirmam que técnicas têm

função de estímulo antecedentes (são regras ou modelos) para uma determinada classe de

respostas do terapeuta de responder sob controle delas e de produzir consequências

semelhantes àquelas descritas. Essas explicam que o uso da palavra “sistematização” se dá em

razão de as técnicas terem resultados efetivos, empiricamente comprovados, e por terem uma

descrição suficientemente padronizada e precisa, para facilitar o treino e a aplicação por

outrem. (DEL PRETTE; ALMEIDA, 2012, p. 78).

O terapeuta deve estar atento para o relato sobre os respondentes (muitas vezes

nomeados como raiva, culpa, ansiedade, medo) e sua manifestação na sessão de atendimento,

pois esses podem também dar material para a avaliação funcional, por exemplo, quando um

relato de “raiva” acontece, sugere uma contingência de estimulação aversiva produzida por

outra pessoa ou de privação de evento reforçador positivo (punição negativa). (DEL

PRETTE; ALMEIDA, 2012; CATANIA, 2008). Da mesma forma, muitas vezes esses

respondentes são relatados pelos clientes como a causa do sofrimento, podendo alterar o

comportamento operante, suprimindo ou exacerbando a resposta ou levando a uma tentativa

de controle, o que muitas vezes só piora a condição (p. ex. um homem, para não se sentir

“ansioso” e com medo de “perder o controle” nas frequentes reuniões da empresa, pede

demissão).

Nos respondentes, podem ser usadas técnicas como Dessensibilização Sistemática e

Exposição como forma de intervenção no estímulo (S→R) e Relaxamento Muscular

Progressivo de Jacobson e Treino de Respiração na resposta (S→R). A importância desse tipo

de intervenção reside na redução de respostas de esquiva e no enfrentamento de estimulação

aversiva, o que possibilita o desenvolvimento do repertório comportamental mais apropriado.

(DEL PRETTE; ALMEIDA, 2012).

Neste nível de intervenção, deve-se realizar uma cuidadosa análise sobre a relação

entre estes e os operantes, pois um tem influência sobre o outro. Por exemplo, um indivíduo

que tem respondentes de “medo” na presença de cães e este se coloca nesta situação aversiva,

se alguém intervém em sua defesa, isto pode trazer implicações para o operante “falar da

fobia de cães” e este ficar sob controle da atenção social obtida. Dessa forma, se for

implementada uma intervenção respondente na diminuição do “medo”, as consequências

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dessa diminuição do respondente influenciaria diretamente na diminuição da atenção social,

consequenciado pelo operante, o que poderia “sabotar” o processo terapêutico. Intervenções

sobre o comportamento operante enfatizam alterações com foco no antecedente, na resposta

ou na consequência. Algumas das técnicas do antecedente estão baseadas na alteração do

comportamento verbal, ou seja, na mudança de regras e autorregras, autoconhecimento e

autocontrole. (DEL PRETTE; ALMEIDA, 2012).

Na Análise do Comportamento, regras são antecedentes verbais que descrevem uma

contingência (relações do tipo “se... então”) e que podem exercer controle sobre uma resposta.

Ou seja, regra é uma afirmação (ordem, dica, conselho, instrução, sugestão, etc.) de que, em

um determinado contexto, uma determinada resposta é emitida ela terá determinadas

consequências, sejam punitivas ou reforçadoras. (MARTIN; PEAR, 2009).

A distinção entre regras e autorregras está na origem dos antecedentes verbais. Assim,

a primeira refere-se à formulação realizada por outras pessoas ou agências controladoras e a

segunda à formulação da própria pessoa que a segue. (DEL PRETTE; ALMEIDA, 2012).

A concepção das regras e das autorregras está estreitamente ligada ao que se entende

por “autoconhecimento”, que é definido como um repertório comportamental de auto-

observação e de autodescrição (sobre o próprio comportamento, incluindo as contingências

que o controlam). Esse pode ser chamado também de uma “relação fazer-dizer”, isto é, o que

se diz sobre aquilo que se faz. (DEL PRETTE; ALMEIDA, 2012). Ou seja, entender a função

de cada comportamento, saber como e por que ocorre, ajuda na tomada de decisão, no

planejamento de longo e médio prazo e no estabelecimento de metas e propósitos. (JONAS

apud SILVA; DE-FARIAS, 2010).

Com este objetivo, de desenvolver o autoconhecimento do cliente, o comportamento

verbal do terapeuta de emitir regras é uma importante fonte de controle para este fim. Este

utiliza duas classes verbais durante a terapia: a) “interpretação”, pela qual o terapeuta expõe

algo de forma afirmativa, interrogativa ou pela afirmação com pergunta de confirmação (p.

ex. “Percebo que, quando você se relaciona com seus namorados, não existe um envolvimento

emocional.”); b) “solicitação de reflexão”, em que o terapeuta faz perguntas fechadas ou

perguntas abertas, afirmações imperativas ou apresenta “dicas”, afirmações ou comentários

para reflexão (p. ex. “Se você não gosta de estudar Direito, o que te mantém ainda

frequentando as aulas?”). Esses operantes levam o cliente a relatar autorregras, também

ampliando o seu autoconhecimento. (ZAMIGNANI, 2007).

Assim, o indivíduo tem consciência do que faz quando pode descrever a topografia do

comportamento (p. ex. “Nos sábados sempre vou até o quarto e pego um cobertor para me

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cobrir deitado no sofá da sala.”), mas este apenas é consciente das razões do comportamento

se puder descrever os aspectos importantes e variáveis relevantes do contexto ou do

reforçamento, ou seja, analisar funcionalmente as relações que existem entre a resposta

emitida e o ambiente (p. ex. “Nos sábados, eu sinto a falta da minha mulher [falecida], então

vou até o quarto dela e pego uma coberta que ela gostava muito... e me deito no sofá da sala

pensando nela.”). Nesse caso, na privação da presença da esposa (operação motivadora)

sozinho em casa (antecedente), ele foi até o quarto e pegou um objeto que estava associado

afetivamente à sua esposa e foi até a sala (resposta) e lá deitou no sofá pensando nela

(consequência reforçadora). (SKINNER, 1969).

O cliente, ao descrever funcionalmente os motivos do seu comportamento, percebe a

origem do controle e assim pode intervir neste. Mas esse tipo de relato só ocorre por meio de

perguntas que lhe foram feitas pela comunidade verbal (família, amigos, terapeuta), desde a

mais tenra idade. Assim, existem pessoas que têm o repertório de emitir autotatos (resposta

controlada por estímulos discriminativos, p. ex. sensações corporais) mais desenvolvidos que

outros e cabe ao terapeuta auxiliar o cliente na emissão desse tipo de comportamento através

de perguntas.

Fazendo isto, o indivíduo deixa de ser objeto e se torna sujeito pois se torna capaz de

planejar e de se autogovernar, por meio do autoconhecimento que é sinônimo de consciência.

(MICHELETO; SÉRIO, 1993). Assim, com o autoconhecimento, o sujeito é capaz de

construir suas autorregras que, por sua vez, também possibilitam o autocontrole. O

autocontrole possibilita ao indivíduo decidir sobre os seus determinantes, suas autorregras e

segui-las ou não. (SKINNER, 1977). Por exemplo, um indivíduo fumante, através da sua

família conhece os malefícios do cigarro (conhecimento) e também percebe que toda vez que

tem dificuldades no trabalho, sai para dar uma caminhada e fumar (autoconhecimento). Dessa

forma, ele tem evitado sair por qualquer motivo da empresa e, com isso, diminuiu o consumo

de cigarros por dia (de certa forma isso é um autocontrole). Essa é uma “relação dizer-fazer”,

ou seja, a emissão de uma resposta controladora (p. ex. “Não vou sair agora, vou resolver

isso, pois sei que fumarei lá fora”) altera a emissão da resposta controlada (p. ex. sair para

fumar), em que a primeira é necessária para colocar o segundo para responder sob controle de

consequências a longo prazo, produzindo menos consequências aversivas (p. ex. praticar

esportes sem problemas respiratórios). (DEL PRETTE; ALMEIDA, 2012).

Pode-se, assim, ter o ledo engano de que a Análise do Comportamento e as Terapias

Cognitivas seriam conciliáveis quando se tratar do entendimento de regras (o que inclui

“crenças”). A noção de regras sugere uma probabilidade de ação, que também é resultado da

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história de vida dos indivíduos, expostos às contingências, instauradas quando aumenta a

probabilidade da ação através do reforçamento do comportamento. (SKINNER, 1969). Ou

seja, regras e autorregras são descrições de contingências e não alteram a probabilidade de

comportamento, apenas sinalizam a possibilidade de reforçamento.

Para a Análise do Comportamento uma crença não é um agente interno e tampouco

um determinante do comportamento; ela existe somente enquanto possibilidade de

comportamento ou relato verbal, seja público ou privado (pensamento), de uma dada

probabilidade. (COSTA, 2002). Dessa forma, esta ciência liberta o indivíduo das explicações

mecanicistas do comportamento, que explicam as ações pautadas na cognição ou dos simples

reflexos. (BORGES, 2009).

Percebe-se, assim, que a compatibilidade, a complementaridade e/ou a integração

entre essas duas teorias constitui uma incoerência teórica, explicada, talvez, pelo

desconhecimento dos pressupostos de uma ou de outra orientação. (COSTA, 2002). Isso

porque, enquanto a Análise do Comportamento tem como foco a intervenção em

comportamentos públicos com o uso da análise funcional (intervenção externalista), as

Terapias Cognitivo-Comportamentais têm como foco a intervenção sobre estruturas e

conteúdos cognitivos (intervenção internalista). Assim, a tentativa de integração entre

orientações behavioristas e cognitivistas, considerando os pressupostos behavioristas, tem

melhor caracterização como um ecletismo técnico e teórico. Afirma-se ainda, que as “crenças

irracionais” do cognitivismo são autorregras instaladas e mantidas pela comunidade verbal à

qual os indivíduos estão submetidos e que estão em conflito com as contingências

correspondentes. Considerando isso, as intervenções e os sistemas cognitivos podem ser

incluídos, no corpo teórico behaviorista, como “análises e programas para alterar as regras

que governam o comportamento”. (POPEEN apud COSTA, 2002 p. 341).

Em relação às intervenções relacionadas à modificação de consequências, o

reforçamento de repertórios comportamentais e modelagem direta são centrais na terapia

analítico-comportamental. No sentido genérico e técnico, o reforçamento refere-se a todas as

consequências que aumentam a probabilidade de o comportamento acontecer; é um processo.

Da mesma forma, é importante ressaltar que o reforçamento não é, na maioria das vezes, um

processo consciente (possibilidade de discriminar as variáveis que controlam algum

comportamento), pois muito dos comportamentos foi modelado por reforçamento mesmo

antes de se aprender a falar. Por exemplo, quando um bebê no berço chora pela falta da mãe e

esta se aproxima e o toca com delicadeza, o bebê sentirá certo prazer, independentemente de

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saber do processo de reforçamento. Assim, de maneira alguma a consciência dos sentimentos

e dos pensamentos que acompanham o reforçamento é necessária para que o comportamento

seja fortalecido. (KOHLENBERG; TSAI, 2006).

Para realizar o reforçamento de comportamentos, em primeiro lugar, estes devem ser

especificamente identificados, ou seja, se for escolhida uma classe geral de comportamentos

(p. ex. ser mais amistoso no trabalho), o terapeuta deve especificar que comportamentos que

caracterizam esta classe (p. ex. dar bom dia, oferecer café ao colega, sorrir). Agindo dessa

forma, o paciente melhora a percepção dos seus comportamentos e aumenta a frequência

deles, devido às consequências advindas dos seus colegas.

Mas, se esses comportamentos nunca ocorrem, ou ocorrem com pouca frequência, não

é possível aumentar a sua frequência apenas esperando que ele ocorra e depois o reforçando.

Para esses casos, o procedimento que pode ser utilizado é a modelagem, que pode instalar um

comportamento nunca antes emitido pelo indivíduo. Esse procedimento pode ser definido

como “o desenvolvimento de um novo comportamento por meio do reforçamento sucessivo

de respostas cada vez mais próximas ao comportamento final desejado e da extinção das

respostas anteriormente emitidas”. (MARTIN; PEAR, 2009, p. 145).

Até aqui, sabe-se, que o terapeuta intervém no antecedente e/ou na consequência, e,

dessa forma, seria difícil descrever intervenções que alterariam diretamente a resposta, já que

toda a resposta tem função no ambiente. Mesmo assim, é importante destacar o role-play e a

modelação, que são intervenções que visam ao manejo direto da topografia da resposta, mas

são estreitamente ligadas ao antecedente (“Em que situação é interessante responder assim?”)

e à consequência (“Que efeito terá esta nova topografia de resposta sobre o seu ambiente

social?). (DEL PRETTE; ALMEIDA, 2012, p. 156).

O role-playing, ou ensaio comportamental, é uma técnica criada no psicodrama mas

utilizada por terapeutas nas mais diversas abordagens teóricas. Nessa prática, o terapeuta e o

cliente podem interpretar diversos papéis, trazendo variáveis extrassessão, não se limitando ao

relato verbal sobre elas, podendo manejar direta e imediatamente tais condições, dando

suplementação verbal da contingência, auxiliando na dessensibilização de respondentes,

associados à interação proposta e diminuindo sua ocorrência. O role-playing inclusive facilita

a observação e a descrição, por parte do cliente, do seu próprio comportamento, sendo capaz

de descrever sob que função estava seu responder naquele momento. Já na técnica de

modelação, o terapeuta apresenta um modelo antecedente, o cliente apresenta a resposta de

imitar e se espera que este obtenha consequências semelhantes às apresentadas no modelo.

Por exemplo, um indivíduo que quer evitar beber por pressão dos amigos vê o modelo de

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resposta dado pelo terapeuta frente à situação de oferta de bebida, e este repete quando estiver

no contexto em que ocorre esta situação. (DEL PRETTE; ALMEIDA, 2012).

A etapa seguinte é a avaliação de resultados, divisão também puramente didática, pois

a deve ser realizada constantemente durante a própria intervenção. Assim, a avaliação ocorre

em paralelo à intervenção, durante todo o processo terapêutico. (BORGES, 2009).

Na etapa do processo terapêutico chamada de “desligamento”, “encerramento”, ou

“follow-up”, o terapeuta prepara o cliente para o fim do processo terapêutico. O profissional

verificará se os comportamentos implementados (“novos comportamentos”) manter-se-ão sem

a terapia, através dos reforçadores que se encontram nos ambientes do cliente, fora do

consultório. (BORGES, 2009).

7. Considerações finais

Muitas pessoas ainda veem os terapeutas analítico-comportamentais como

“controladores”. O que ocorre é que esses terapeutas entendem que o controle é um fato da

natureza, e, portanto, deve ser investigado e descrito, pois é uma característica do mundo.

Existem constatações de regularidade nas diversas ciências, da mesma forma que existem na

ciência do comportamento, que coloca como objetivo a descoberta e o esclarecimento das

regularidades encontradas nas relações do indivíduo-ambiente. O controle existiria mesmo se

não houvesse analistas do comportamento para denunciá-lo, este é o fato. Pelo contrário, os

analistas do comportamento deveriam ser conhecidos como “libertários”, pois anunciam a

possibilidade da liberdade, ou seja, um indivíduo é livre na medida em que conhece e pode

controlar as condições que o controlam.

A Análise do Comportamento, desde seus princípios filosóficos até a aplicação na

prática clínica, enfrenta o senso comum da dualidade mente-corpo, dando ênfase à relação do

indivíduo com os seus ambientes citados neste trabalho. Assim, o indivíduo abstrato,

concebido em outras abordagens, que independe dos contextos físico, social, histórico e

cultural, que tem “cognições” independentemente do mundo material, está longe da

concepção behaviorista de ser humano. Essas cognições ignoram a relação do ser humano

com o mundo, abordando fenômenos psicológicos como eventos internos. Dessa forma, são

menores as chances de promover alterações nas relações que possibilitam condições mais

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saudáveis ou produtivas para a vida dos indivíduos. (TOURINHO, 1999). A posição

behaviorista não é agradável à cultura ocidental, por estar em desacordo com a concepção

fundamentalmente individualista do homem, que trata o homem pelo “subjetivo” e

“individual”. (SKINNER, 2003).

O indivíduo é resultado do processo de seleção por consequências (filogênese,

ontogênese e cultural), a qual explica o surgimento, a manutenção, a extinção ou a mudança

dos comportamentos. Assim, sendo o objetivo da intervenção analítico comportamental

intervir nesses aspectos, é preciso atuar sobre a interação entre variação (comportamental) e

seleção, o que permite, em certo grau, prever e controlar um determinado repertório

comportamental.

Conclui-se que o terapeuta deve, dessa forma, conjuntamente com o cliente, analisar

as relações que este sente, pensa ou faz e intervir nas contingências envolvidas nos

comportamentos a serem aprimorados.

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