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    JORGE TRIN EL ivr e -doc en te em P sico log ia Jurd ica (2 000 ), D out o r em P si co logi a , (1 998 ) e M es tre em D ese nvo lv im ento Com unit rio(19 96) . Gr aduado em Di reit o e P sico log ia . P rocurador de Jus ti a inati vo . Ad vog ado e P siclo go . Espe ci ali s ta em Psi co logi aC l n ic a e em P sico log ia Jurd ic a . P ro fes sor T itu la r da Un ive rsida de Lu ter ana do Br asi l. Pr o fesso r-F und ado r da E sco laSuperior do M in is t rio P b lico. P rof e ssor do C ur so de E specia liza o em D ire ito da C riana e do A dolescen te (FM P IRS ) edo Cu rso de E sp ecia liza o do Ins ti tu to Supe rior do M in istrio P b lico do R io de Jan e iro. Pr o fes so r do C urso de M est rad oem C rim ina l a gia da Un ive rs id ade de Aco nca gu a (A rgent in a). Pr o fesso r do Cu rs o L ivr e de P sico log ia Jur d ic a (IDTP ).Ass oc ia do do Co lgi o O fi c ia l de P sic logo s da Esp anha e da In tem a t ianal Aca dem y o t La w and M ent al He al th . Rece beu oP rm io Hen riq ue Be r ta so (19 94 ). Pr e si dente da Soc iedad e B ras ile ira de P si co lo g i a J ur d ic a (S BP Jl e Vi ce-Presiden te de IaAsociacin ta no am er c a n a de Mag istrados , Funcio narias , P rofesional es, Ope radore s de N iiiez , A do lesc en c ia y F amil ia .

    a n u a l d e P s i c o lo g i a u r d ic aP A R A O P E R AD O R E S O IR ITO

    QUARTA EDIOrevista, atualizada e ampliada

    Porto Alegre, 2010

    ~ ~ II

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    Ainda que alguns autores identifiquem a psicologia jurdica com a psicologiajudicial, forense ou legal (Mufoz Sabat, 1980; Garzn, 199 0),13 14na trajetria dapsicologia e do direito, foi historicamente relevante diferenciar essas modalidadesde atuao. A psicologia jurdica trata dos fundamentos psicolgicos da justia e dodireito, enquanto a psicologia judicial aparece como a aplicao dos processos psico-lgicos prtica do jurista, sendo inaugurada com a psicologia criminal.A palavra forense , do latimjorensis parece remeter a uma situao geogrfi-ca, limitando a ideia da psicologia jurdica quilo que acontece no espao do rumaquele local onde se reunia a assembleia romana para tratar de assuntos judiciais.

    Forense tudo aquilo que relativo ao foro, cortes ou tribunais e, nesse sentido,traz consigo conotao de pblico. Da mesma maneira, a expresso legal parecerestringir quilo que est contido apenas na lei, na norma formulada, e no no di-reito, representando apenas uma parcela dentro de um leque de possibilidades quea Psicologia Jurdica oferece ..Por essas razes, em vez das expresses PsicologiaForense e Psicologia Legal, preferimos a denominao Psicologia Jurdica, que forne-ce uma noo mais ampla, incluindo tanto aquilo que acontece no espao dos fruns edos tribunais, como no mbito da lei. Ademais, PsicologiaJurdica a expresso que,entre ns, j se encontra consagrada desde a obra de Mira y Lpez (l932)Y

    importante salientar que a psicologia jurdica e a psicologia judicial, emboracom origens histricas distintas, so realmente inseparveis. Ademais, hoje em dia,parece no haver mais razo para essa distino terminolgica. Mesmo assim, im-portante referir que no universo do direito tem sido mais frequente a utilizao dotermo psicologia jurdica enquanto a expresso psicologia judicial tem sido maiscomum no mbito dos psiclogos (Muioz Sabat, 1980 ).A propsito, Garzn 1990) mostra os aspectos diferenciais que definiram a

    psicologia jurdica e a psicologia judicial ou forense.Viso clssica: .j

    F u n d a m e n t a o p s i c o l g i c a e s o c ia l d o D ir e i to :O r ig e m d o D ir e i to , S e n t im e n to J u r d i c o ,E v o l u o d a s L e is .

    P r t ic a P r o f i s s i o n a l d o D i r e i toP s c o p a t o l o g a F o re n s e e C i n c i a s N a tu ra is

    P s i c o lo g ia In di v i d u a lP s i c o l o g ia A p l ic a d aC o m p o n e n t e s P s ic o l g i c o s d a p r t ic a ju d ic i a l :P s ic o lo g ia C r im i n a lP s i c o l o g ia d o T e s te m u n h oP s i c o l o g a d o s p r o fi s si o n a is d a le i .

    13MUNOZ SABA T, L. et al i. Introduccin a Ia psicologia jurdica. Mxico: Editorial Trillas, 1980.14 GARZN, A. Psicologia y justieia. Valencia: Promolibro, 1990.15 MIRA Y LPEZ, Emlio. Manual de Psicologia}urdica. A Primeira ediro foi a espanhola, el~l 1932, sendo que,em 1955, saiu a primeira edio em portugus. No mesmo sentido, SABATE, Lluis Muiioz; BAYES, Ramn; MUN-N, Fredereic. Introduccin a Ia psicologia jurdica Editorial Trillas, Mxico, 1980. Aclotando a mesma edenomina-o, GULOTIA, Guglielmo, com seu tradicional e clssico Elementi di Psicologia Giuridica e di diritto psicolgico.Milo: Giuffr Editore, 2002. Na mesma linha, GARRIDO, Eugenio; MAS P, Jaume; HERRERO, Maria Carmen(Coord). Psicologajurdica. Madrid: Pearson Educacin, 2006. .Manual de Psicologia JurdicaP AR A O PE RA D O R E S D O D IR E IT O 3

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    cionadas pelo legislador. Em outras palavras, no se juridicizam, isto , permanecemdestitudas de incidncia normativa e constituem a grande maioria de nossos com-portamentos sociais.

    Ademais, por vrias razes, algumas explcitas, outras implcitas, a PsicologiaJurdica apresenta vulnerabilidades, que somente sero superadas com o seu desen-volvimento e sua consolidao como disciplina de interlocuo.No seu atual estgio de disciplina ainda em construo, algumas deficinciasou pontos fracos decorrem de resistncias no movimento de sincronizar as reas deinterseco entre direito e psicologia na busca de uma transcendncia que efetive adefinio de um novo territrio, que denominamos psicojurdico.Alguns termos, conceitos e princpios tm a especificidade prpria da lei, dodireito e dajustia,enquanto outros parecem possuir um sentido exclusivo no campoda psicologia. Esses termos nem sempre so bem compreendidos quando se cruzamna Psicologia Jurdica. A seguir, apresentamos um quadro que mostra, comparativa-mente, algumas dessas caractersticas especficas.

    F o r m a l i s m o : r it o s e p r o c e d i m e n t o s In f o r m a lR a c i o n a l i s t a E m p i r i s taIn te r p e s s o a l id a d e In t r a p e s s o a l id a d eA x i o l g i c o e v a l o ra t i v o U u lg a m e nto ) C o m p r e e n s iv aS u b j e t i v is m o = > O b j e ti v is m o O b je t i v i s m o = > S u b je t iv i s m oV e r d a d e P ro c e s s u a l V e rd a de C i e n t fic aH i e r a r q u i a F le x i b i l i d a d eIg u a l d a d e : A p o d e s e r ig u a l a B . I g u a l d a d e r e a l : s o m en te A ~ u a f a A .P o d e r : ju r i s d i o u r is d i c t i o , v e r e d i t o v e r e d ic tu m S u b m i s s oL g i c a d is c u rs i v a , p e r s u a s i v a , r e t ri c a e d i s s u a s r i a L g i c a d a i m p l ic a o c a s u i s t ic ao t o do h e rm t ic o o to d o d i f e re n te d a s o m a d a s p a rt e sP r i n c ip i o d a F in a l id a d e (d e v e r - s e r ] P r i n c i p io d a C a u sa lid a de ( se r)E n u n c ia d o ti p o : S e A , p o d e / d e v e s e r B E n u n c i a d o d o t i p o : S e A , e n t o BC a r te r S a n c io n a t r io ( im p u t a c io n a l e a tr i b u t iv o ) A u s n c i a d e S a n oC u lp a , c u l p a c o n s c ie n t e e d o l o C u l p a c o n s c ie n t e e in c o n s c i e n t eIn s t n c ia s : d iv e r s o s g r a u s I n s t n c ia n ic aM u n d o e x t e rn o M u n d o e x t e m o e in te m oD e s c o n s i d e ra o d a f a n t a s i a , im a g i n a o e d es e jo F a n t a s i a , im a g in a o e d e s e j o' .U n g u a g em : d iv e r s o s s e nt id o s ( p lu r iv o c a ) L i n g u a g e m : s e n t i d o n ic o ( u n v o c a )I n t e r r o g a t r io e d ep oim e n to E n t r e v is t a e t e s t a g e m

    Manual de Psicologia JurdicaPARA O PERA DO R ES DO D IRE I TO 33

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    I I R _

    Alm disso, existem questes de base que ainda entravam a aproximao entreDireito e Psicologia. A seguir, oferecemos alguns exemplos:

    T e n d n c i a h e g e m o n i a c P r t ic a a in d a e m b u s c a d e i d e n t i d a d e' . , D e s c o n h e c i m e n to d o s p r i n c p i o s b s ic o s d o f u nc io n a m e n t o D e s c o n h e c im e n t o d o s p ri n c p io s j u r d i c o s e d o s f u n d a m e n to sd a m e n te d o d i re i t oD if i c u l d a d e d e c om p a r t i l h a m e n t o e d e a c e it a o d e c r t i c a P r o c e d im e n to s n o s u f i c i e n t e m e n te s e d im e n t a d o s e c r t i c a sp o u c o c o n s is t e n t e s

    ~ ~ : ~ i ~ ~ ~ ~ O ri g id a e p o u c o p e rm e v e l a o u t ro s r a m os d o c o - C o m p r o va o c ie n t fi c a e m f a s e d e a fi r m a o

    D o g m a t is m o R e f a t iv i s m o

    T r a d i o m i l e n a r ( d i r e i t o r o m a n o ) P r o d u t o d o s c . X X

    No obstante as dificuldades existentes, nossa crena central de que a PsicologiaJurdica .importante no somente ao Direito, mas principalmente essencial Justia.Na verdade, para se chegar Justia, precisa-se d direito e da psicologia, amboscompartilhando o mesmo objeto, que o homem e seu bem-estar,, No necessrio recorrer a argumentos ad terrorem mas razovel e conse-,quente considerar que o desconhecimento da psicologia, nomeadamente da psicolo-gia jurdica, insere-se entre as causas do erro judicial.

    A psicologia, de um modo geral, pode permitir ao homem conhecer melhor o(mundo, os outros e a si prprio. A Psicologia Jurdica, em particular, pode auxiliara compreender o hommo juridicus e a melhor-lo, mas tambm pode ajudar a com-preender as leis e as suas conflitualidades, principalmente as instituies jurdicas, e

    melhor-Ias tambm.A aproximao entre direito e psicologia, bem como a criao de um territriotransdisciplinar, uma verdadeira questo de Justia.Como sntese deste captulo, o que se pretende sublinhar que a psicologiajurdica, mesmo gozando de maior popularidade nos ltimos anos, continua a seruma disciplina ainda por fazer. De nascimento experimental, a psicologia, inclusivea jurdica, tem resistido ao discurso jurdico, enquanto o direito, preso a uma hege-mania epistemolgica, tem dificuldades em aceit-Ia, fazen:do 'apenas concesso parauma disciplina auxliar. Assim, a Psicologia Jurdica restringiu-se psicologiapara odireito, permanecendo longe de qualquer interferncia no processo dos fundamentosdo direito, ou seja, da psicologia da direito, bem como afastada das questes psico-lgicas que intrinsecamente compem o mundo normativo, ou seja, da psicologia na

    direito.I Il'1 -I '

    I,

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    - ,Irl

    A Psicologia do DireitoPode parecer um tanto estranho este Manual de Psicologia Jurdica dedicarum captulo inteiro par tratar especificamente do problema da psicologia do direito.

    Esse tema tem sido conscientemente evitado tanto por psiclogos quanto por juristas.Pelos psiclogos, sob a argumentao de que a psicologia do direito constitui umamera teorizao acerca do direito (Mufioz Sabat, 19 80)20 e, como tal, escapa danoo de uma verdadeira psicologia aplicada ao jurdico, sendo rechaada de planoe, porquanto, fora da proposta metodolgica da psicologia cientfica de cunho taxa-tivamente experimental. Pelos juristas, porque histrica e tradicionalmente a questodos fundamentos do direito sempre mereceu uma reflexo contributiva da filosofia,especialmente da filosofia do direito. -A verdade que a psicologia do direito nunca foi bem recebida (Muoz Sabat,

    198 0)21 pela tradio jurdica, alis, como tambm no foi a sociologia jurdica. Nessecampo, a filosofia sempre foi mais pretensiosa, porquanto, possuindo um objeto queparece ilimitado, coloca-se como uma espcie de cincia universal, situada acima de to-das as cincias. O filsofo inclina-se para o universal e, num certo sentido, ao perene.Assim, somente uma disciplina arquitetnica que se preocupa em discernir asestruturas fundamentais do universo poderia estar autorizada a trazer ao direito essecomplemento indispensvel discusso de seus fins e de seus fundamentos (Villey,

    - 197 7).22 A filosofia se coloca no lugar de desempenhar um papel de pastor da multi-do das cincias, apta a colocar cada uma em seu lugar, aregulamentar entre elas osconflitos das fronteiras, a distinguir entre suas fontes de respectivos conhecimentos,a:assinalar-lhes os limites.Em contrapartida, a psicologia do direito apresenta os perigos do utilitarismodestitudo de fins, os riscos do determinismo sobre as decises judiciais e sobre osfins mesmos da justia, pois a cincia no tem competncia sobre o dever-ser. Emoutras palavras, as respostas fundamentais acerca dos fins da cincia no e a cinciaque pode dar. .Combatida pelos juristas e desacolhida pelos psiclogos, a psicologia do direitoteve vos fugidios, logo abatidos pela especificidade dos fins do direito, como se elano possusse nenhuma qualidade ou atributo capaz de cooperar na misso de fazer odireito alcanar a justia. Sua ,tarefa n~o tem a profundidade nem a extenso da filo-

    20 MuNOZ SABAT, L. et ali. lntroduccin a Ia psicologia jurdica. Mxico: Editorial Trillas, 1980.21 Ide m .22 VILLEY, M. Filosofia do direito. So Paulo : Atlas, 1977.Manual de Psicologia JurdicaP A R A O 'P E R AD O 'R E S D O ' D IR E IT O 5

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    sofia do direito, mas, juntamente com a sociologia do direito, poderia somar esforosno sentido de transformar a justia, em humaniz-la e aproxim-Ia dos sentimentosdo povo. .

    Resta, pois, a psicologia para o direito como a psicologia jurdica daspossibi-lidades atuais.A psicologia jurdica a psicologia que ajuda o direito a atingir seus fins. Trata-sede uma cincia auxiliar do' direito, e no aquela que o questiona, nem aquela capazde o interrogar. Bem se poderia dizer que sua funo no esfngica. Por isso, a psi-. cologia jurdica, a psicologia para o direito, tem-se mantido afastada da questo dosfundamentos e da essncia do direito. A verdade que a psicologia jurdica no estautorizada a pensar o direito, ou no apropriada para esse fim. Ela deve ater-se norma e to somente norma, descabendo-Ihe qualquer exame acerca de sua justia .ou injustia.Sendo assim, a psicologia jurdica tem se mantido fundamentalmente comouma psicologia para o direito. O modelo estratificado em que o direito s pelo direitopode ser pensado autoriza apenas essa condio de auxiliarpara o direito. Dessa for-ma, o problema da justia parece estar confiado filosofia do direito, compreendidano mbito jurdico, considerando a prpria psicologia do direito como uma vertente,de menor significncia da mesma, representada basicamente pela escola do psicolo-gismo jurdico, o realismo americano e escandinavo.Nesse contexto, a psicologia para o direito passou a ser simplesmente deno-minada psicologia jurdica. Ela, de longe, no toda a psicologia jurdica, nem, porcerto, a parcela mais nobre da reflexo psicojurdica. Entretanto, no momento e noestgio atual de seu desenvolvimento, a psicologia para o direito a nica psicologiajurdica possvel. Nessa dimenso bem restrita, prope apanhar as principais reas de

    informao psicolgica e seus instrumentos de maior utilidade com o fito de auxiliaro direito a atingir .os seus fins, apresentando esses contedos, por isso mesmo, semuma preocupao metodolgica maior.Entretanto, a psicologia jurdica; mesmo assim considerada, no apenas umasimples justaposio da psicologia com o direito. Assim como duas figuras pretas nofazem uma branca, a psicologia jurdica no a soma de dois ramos diferentes do co-nhecimento unidos por um objeto comum, mas um espao complexo, um produto datransdisciplinaridade. Mais do que uma nova disciplina um territrio no qual quasetudo est por ser explorado.Das ideiastrazidas at aqui resultam muitas controvrsias, mas parece .inques-tionvel a necessidade de algumas convergncias, sem asquais no se poder vislum-brar, num futuro prximo, a possibilidade de a psicologiajurdica cumprir seus mais

    importantes papis no mundo jurdico, vindo a ser, tambm, uma psicologia jurdicano direito e, sobretudo, do direito. Estas, sem dvida alguma, as suas duas contribui-es mais nobres, capazes de, em ltima instncia, fazer a psicologia participar dasquestes dos fundamentos do direito, sem a qual ela corre o risco de srias crticasem sua prpria Iegitimao.Como asseverou Laborinho Lcio, a psicologia at pode ser exterior ao direito,mas no exterior Justia (Sani, 2002, p. 15).23

    23SANI, A. L As crianas e a violncia. Coimbra; Quarteto, 2002, p. 15.

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    Mesmo em se admitindo que a psicologia nada tivesse a oferecer para o direito,ainda assim, muito .teria a contribuir para a Justia. Afinal de contas, a histria dohomem e de suas instituies constitui um caminhar para o infinito, loeus noumnicoonde a metfora autoriza o encontro com a verdade.Assim sendo, a aproximao do direito e da psicologia, bem como a criao deum territrio transdisciplinar, como resultado de convergncias-divergncias capa-zes de instaurar um novo estatuto epistemolgico, configura uma verdadeira questoessencial de Justia.Podemos sintetizar esse Captulo, relembrando alguns itens relevantes paramostrar a importncia da Psicologia Jurdica para os profissionais do direito:1. Parece no haver dvida de que o sistema de justia tem se aperfeioado emr todos os sentidos ao longo do tempo. Isso fruto do-esforo de doutrinado-res, legisiadores, professores, magistrados e estudiosos, no s do Direito,

    mas tambm da Psicologia e de outros ramos do conhecimento.2. Entretanto, razovel estimar que uma parte dos erros judiciais est associadaao desconhecimento de assuntos psicolgicos essenciais.3. Se pretendemos aprimorar a Justia e as Instituies, devemos conhecer osmecanismos psicolgicos do comportamento humano.4. Isso comea por instrumentalizar os advogados, que so sempre o primeirojuiz da causa (Spott, 1985 ),2 4 e os promotores de justia, que lidam a todoinstante com os conflitos individuais e sociais, e os juzes, que tm a missode resolver esses conflitos.5. Como acontece na medicina, onde um grande nmero de consultas se deve busca de solues para problemas psicolgicos, tambm muitos conflitosjurdicos so decorrentes, motivados ou mantidos, por questes de natureza

    emocional e psicolgica.6. A contribuio da Psicologia Jurdica , portanto, fundamental:6.1. nas questes de famlia: separao; divrcio, regulamentao de visitas,guarda e a adoo. H um manancial de problemas emocionais, tais como a 'raiva, o cime e o medo, o dio, a retaliao ou a vingana de um cnjuge.contra o outro. A Sndrome de Alienao Parental (SAP) um excelenteexemplo disso;6.2. no direito penal: a comear pelo crime e suas motivaes. Todo crime oresultado grave de uma alterao do comportamento humano (conduta). Ohomicdio, por exemplo, ,uma expresso emocional na conduta que expri-me o comportamento criminoso 'carregado de sentimentos conflituosos. Noparricdio, matricdio, parenticdio, uxoricdio e no filicdio essas caracte-rsticas podem ser mais visveis ainda; ,6.3. nos delitos sexuais nas personalidades perversas, na pedofilia, nos crimesperpetrados por sdicos e masoquistas, no abuso sexual infantil;6.4. nas questes de inimputabilidade e na responsabilidade diminuda de quetrata o artigo 26, eaput e pargrafo nico, do Cdigo Penal;

    24 SPOTA. G. A o Juiz. o advogado e a formao do direito atravs da jurisprudncia. Traduo Jorge Trindade.Porto Alegre: Sergio Fabris. 1985.Manual de Psicologia JurdicaP AR A O P ER AD O RE S D O D IR EIT O 37

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    6.5. na medida de segurana e no procedimento de Declarao do Incidente deInsanidade Mental;6.6.na vitimologia onde determinados tipos psicolgicos so mais suscetveisde serem vtimas de crime do que outros, e aspectos conscientes e incons-cientes podem levar ao lugar da vtima, numa estranha linguagem commensagens que vtima e criminoso estabelecem entre si. A Sndrome de Es-tocolmoexemplifica bem essa condio. Almdisso, a Psicologia Jurdicadesempenha um importante papel na compreenso do doloroso processo derevitimirao (Primria, Secundria e Terciria), a segunda agresso quepode representar a m conduo de um procedimento policial ou judicial,capaz de fazer a pessoaj vitimada a reviver omomento traumtico comoum.novo insulto;

    6.7. lia realizao do depoimento com reduo de dano (RS);256.8. no Direito Penitencirio. Afastado pelo direito da sociedade que feriu, oapenado dever ser reintegrado e ressocializado;6.9. no Direito da Criana e do Adolescente e no modelo da Proteo Integralproposta pelo Estatuto da Criana e do Adolescente, no qual se destaa attulo de exemplificao:

    - o direito famlia natural;- o direito famlia saudvel, livre de drogas e outras dependncias;- o direito escola e ao processo de aprendizado formal exitoso;- o direito sade, que a OMS refere no apenas como bem-estar fsico,mas tambm emocional e social.

    6.10. no Direito do Idoso daquelas pessoas que trabalharam, produziram, vi- 'veram antes dens, e merecem cuidados especiais, e, por isso mesmo,esmerada ateno psicolgica;6.1 L nos delitos de trnsito especialidade que hoje se denomina Direito do

    Trnsito ou Automobilstico cujas aes tramitam nas Varas Especializa-das de Acidentes de Trnsito, eno estudo das causas da' sinistralidade, ena tarefa de seleo acompanhamento e reabilitao de motoristas;6.12. no mbito do Direito Civil quando, por exemplo, trata da capacidade daspessoas, do agente da compra-venda ou da doao e, mais especificamen-te, da interdio, mormente quando a causa doena mental oupsicol-gica;6.13. no Processo Penal nos procedimentos de oitiva de testemunhas na ve-

    racidade dos depoimentos no interrogatrio do ru e nas estratgias deconvencimento dos jurados, aspectos que, por si s, autorizam falar deuma verdadeira Psicologia do Jri;6.14. no Direito do Consumidor nas prestaes de servios mdicos, hospita-lares,de sade em geral, e nas intervenes em casos de tratamento desade mental, por exemplo;

    25 Entre ns, destaca-se o trabalho realizado pelos Juzes da Infncia e Juventude de Porto Alegre, Jos Antnio Dal-to Cezar, Breno Beutler Jnior e Leoberto Brancher, que tem servido de modelo para outras comarcas.

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    i.,6.15. na avaliao de Toxidependentes na Psicologia dos usurios de drogas

    quase sempre vtimas de uma outra psicologia, aquela que anima a menteinescrupulosa dos traficantes;6.16. na Justia Teraputica j implementada em muitos pases desenvolvidos(USA, Canad) e emalguns estados brasileiros;6.17. no Direito do Trabalho nas condies emocionais do sujeito trabalhador eespecialmente no trabalhador desempregado, do dano moral e psicolgico(Psicologia no Direito do Trabalho enos DireitosSociais);6.18. no Direito d Funcionrio Publico que ficou enfermo pela rotina do tra-balho ou pelo excesso de responsabilidade ou de risco, como o professorou o policial- civil ou militar - que expe sua prpria vida e nem sempre condizentemente remunerado, assim como em matria dos concursospblicose na seleo e recrutamento de recursos humanos;6.19. do Direito da Mulher Violentada ou gredido s vezes dentro do prpriolar. A Lei Maria da Penha configura um exemplo atual;6.20. no estudo particular da personalidade do ru da testemunha e dojurado;6.21. no importante auxlio que a Psicologia Jurdica pode oferecer ao prprio

    advogado como pessoa humana, 'ao Membro do Ministrio Pblico, pro-motor e procurador de justia encarregado de representar os interessessociais indisponveis, e, sobretudo; o que a Psicologia pode informarquanto produo das decises judiciais: a psicossociologia (sociopsi-cologia) das decises judiciais e a formao dos magistrados (psicologiados magistrados);6.22. na tarefa policial e na investigao criminal;6.23. nas teorias criminolgicas de explicao da delinquncia, da violncia eda guerra, do direito dos expatriados e dos grupos minoritrios, na psico-logia criminal e poltica.Como fcil constatar, os exemplos listados mostram que a enciclopdia jur-dica tambm a enciclopdia da psicologia jurdica. Como insistentemente ressalta-mos, Direito e Psicologia so duas disciplinas irms que nascem com o mesmo fim ecompartem o mesmo objeto de estudo: o homem e seu comportamento. Ambas estodestinadas a servir o homem ea sociedade, bem como a promover um mundo maisjusto e melhor.A seguir, mostramos ainda algumas das atividades ou atribuies prprias dopsiclogo jurdico. O Conselho Americano de Psicologia Forense, criado nos EstadosUnidos (1978) para centralizar as competncias da Psicologia na rea jurdica, houve

    por bem enumerar as atividades gerais dos psiclogos forenses, elencando, comomostram Javier Urra Portillo, ex-Defensor do Povo de Madri, e Vsquez Mezquita(1993),26 as seguintes atribuies: '.1) Atender todas consultas dos advogados, procuradores e estudantes de direi-to.2) Responder todas consultas dos juristas.

    26URRA PORTLLO; 1.; VZQUEZ MESQUITA, B. Manual de Psicologia Forense Editora Siglo XXI, Madrid,1993.Manual de Psicologia JurdicaP A RA O P ER A DO R ES D O D IR E IT O 9

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    JORGE TRINDADE .

    3) Servir aos amics curie (do Tribunal).4) Atender todas consultas da Justia Criminal e dos sistemas correcionais.5) Responder todas consultas do Sistema de Sade Mental Americano.6) Atender todas consultas do pessoal executor das leis (polcias e outros).7) Diagnosticar, prognosticar e tratar a populao carcerriae criminal .

    . 8) Diagnosticar, prognosticare fazer recomendaes em toda matria que serelacione com o estado mental das pessoas.9)Analisar todos os problemas e formular recomendaes pertinentes em mat-ria de responsabilidade, sade mental e periculosidade.

    10) Conduzir, realizar estudos e anlises para subsidiar os advogados em todos osatos que se relacionem com a questo psicolgica no mbito dos processos.11) Servir como perito, mediante solicitao da Administrao; em todos os ca-. sos que envolvam questes psicolgicas em demandas de natureza civil ecriminal. .

    12) Avaliar e tratar as pessoas da Administrao da Justia envolvidas com qual-quer tipo de processo.13) Servir como especialista em qualquer Tribunal Judicial ou dministrativo.14) Mediar entre diferentes servios judiciais matria de conflitos psicolgicosque surjam no terreno legal.15) Investigar as cincias da conduta para entender os comportamentos legais dosujeito.16) Formar e capacitar, em todos os programas da Polcia, os sujeitos que tenhamqualquer tipo de relao com processos legais.17) Ensinar e supervisionar outros psiclogos forenses.No demasiado insistir, de modo figurativo, porm expressivo, que Direitoe Psicologia esto condenados a dar as mos; que a Psicologia fundamental aoDireito e,mais que isso, essencial para a Justia.Ento, j no mais preciso recorrer a argumentos ad terrorem para mostrarque uma grande parte dos erros judiciais pode decorrer da falta de conhecimentosobre a Psicologia Jurdica.Por qualquer lado que se olhe o vasto panorama jurdico, fica estampada a im-portncia da Psicologia Jurdica para os operadores do direito. Os exemplos aquicolacionados servem para demonstrar, da lei aos costumes, da doutrina jurisprudn-cia, como a Psicologia Jurdica permeia todos os ramos do direito, do cvel ao crime,

    do administrativo ao trabalhista, do direito material ao processual.

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