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    CORRELAO DE FORAS E SERVIO SOCIAL

    Vicente de Paula Faleiros 1

    Palavras Chave: Empoderamento-Foras Sociais-Estrutura

    A questo central deste trabalho se articula em torno da relao entre poder e servio

    social. Na viso funcionalista da profisso predominam as questes da adaptao do

    sujeito a seu meio, a suas condies, aos valores dominantes, ou da melhora da

    satisfao consigo mesmo. Nesse sentido Northen (1984) considera que o objetivo geral

    dos servios sociais diretos o de fortalecer o funcionamento psicossocial, dentro da

    proposta sistmica, visando maximizar as potencialidades das pessoas. A seu ver,

    mesmo a preveno pressupe a correo do mau funcionamento social. Bartlett (1979)

    muito clara ao adotar o enfoque do funcionamento social, centrado na noo de

    equilbrio/interao entre as pessoas e o meio, com orientao para as pessoas com

    problema.

    Essa interao entre pessoas e o meio na busca do funcionamento ou do equilbrio num

    processo de ajuda pressupe que o sistema seja normal, que o assistente social faa uma

    reequilibrao por meio de motivao, do esforo e da mudana de arranjos institucionais.

    Na verdade, como o mostra Vasconcelos ( 2002:209),em pesquisa com assistentes

    sociais da Sade, no Rio de Janeiro, so 47% os assistentes sociais que s realizam

    suas aes por meio de entrevista, e 53% trabalham com grupos, mas com grupos

    fechados (54%) ou com grupos em sala de espera (41%), buscando que haja melhor

    atendimento, que os problemas sejam resolvidos e que o usurio saia satisfeito (p.234),

    ou seja as prticas da maioria (27%) se conformam ao disposto nas instituies e

    teorizao proposta por Bartlett de:a)melhorar a satisfao do sujeito;b)resolver o

    problema posto;c)melhorar o atendimento.Esta atuao pode ser caracterizada como

    fechada, micro-orientada, voltada para problemas individuais ou para os objetivos

    institucionais.

    No entanto, 23% tambm buscam melhorar a qualidade de vida, conscientizar a

    populao, mudar a relao familiar, numa viso mais contextualizada. A este grupo

    podemos agregar 7%,que visam propiciar populao uma reflexo sobre sade/doena.

    A teorizao de Northen e Bartlett, apenas para citar duas importantes autoras, mostra

    uma consonncia com a prtica dominante nas instituies .

    1 Vicente de Paula Faleiros, assistente social, doutor em sociologia. Universidade Catlica de Braslia-DF e-mail: [email protected]

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    O paradigma terico da correlao de foras, elaborado por Faleiros (1981) estabelece

    uma ruptura crtica com essa viso dominante de uma prtica terica que justifica o

    prprio sistema. Em primeiro lugar explicita os pressupostos dessa concepo ao

    salientar que, para o funcionalismo, o indivduo, e no a sociedade, o fundamento

    dessa perspectiva, como alis aparece na definio operacional do servio social de 1958

    nos Estados Unidos (conforme Bartellet, 1979:284).Parte-se do indivduo para se olhar a

    sociedade, esquecendo-se que so as relaes que constituem o sujeito. Em segundo

    lugar, trata-se de uma viso que justifica a ordem dominante, com o pressuposto de que

    as agncias existentes resolvem problemas sociais ou esto aptas a resolv-los e de que

    a ajuda um instrumento capaz de resolver ou minimizar problemas de desequilbrio do

    indivduo com o meio.

    Atribui-se ao Servio Social, portanto, um poder independente das instituies, das

    agncias com base em um conhecimento tcnico/cientfico e um conjunto de valores que

    identificam a vida boa. Outro pressuposto dessa viso de que a prtica funciona por

    consenso, no que denominamos modelo consensual da interveno, que implica em que

    as pessoas e o assistente social estejam assumindo valores comuns compartilhados. No

    entanto essa viso no leva em conta os valores dominantes e os dominados e nem as

    desigualdades sociais.

    Nesse sentido a funo profissional para Germain e Gitterman (1995) mesmo numa

    perspectiva que chamam de ecolgica, de que os membros da famlia vo ser

    chamados a dar prioridade entre os estressores a serem trabalhados imediatamente.O

    trabalhador social vai buscar as foras pessoais, familiares e ambientais. Na mediao

    das trocas entre a populao e seu meio os trabalhadores sociais encontram diariamente

    a falta de adaptao (fit) entre as necessidades da populao e seu meio.(p.28). Ao

    mesmo tempo, para os autores, os valores do servio social constituem um conjunto de

    crenas que definem o que a profisso considera ser desejvel e bom. (p.29)

    O paradigma da correlao de foras, parte de pressupostos completamente distintos

    desse paradigma de relaes interpessoais, centrado no desequilbrio, no indivduo e em

    suas motivaes, nos valores dominantes, na lgica das instituies, na adaptao e no

    consenso. Esse paradigma se configurou no processo de reconceituao do servio

    social, com a teoria e prtica do prprio autor (Faleiros, 2005). Com efeito, foi na anlise

    da realidade da desigualdade social, da excluso, do processo de explorao e de

    dominao que se foi articulando a construo desse paradigma. Esse paradigma

    articula-se a uma viso crtica e politizada do servio social, a uma ruptura com o

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    paradigma das relaes interpessoais, entendendo a sociedade numa relao conflituosa

    de classes, grupos, movimentos, valores, enfim numa relao de poder e de poderes

    (Faleiros, 1983, 1985, 2001).

    A relao de poder perpassa os processos econmicos, sociais e polticos em diferentes

    formas de explorao e de dominao, configurando tanto a hegemonia como a contra-

    hegemonia de classes e grupos e tambm nas organizaes. O servio social visto

    numa perspectiva relacional e no instrumental, no desenvolvimento do capitalismo

    dependente. Nesse contexto, constata-se o aprofundamento da desigualdade, dos

    deslocamentos, da desafiliao e da excluso, com novas formas da acumulao:

    financeira (juros e ganhos financeiros) e privatizaes (dividendos), com maior peso das

    injunes externas sobre os Estados nacionais. Nesse processo de mundializao do

    capital h um contrato imposto pelo prprio capital multinacional que consiste em tornar o

    indivduo menos seguro, menos protegido, mais competitivo no mercado, com menos ou

    nenhuma garantia de direitos.

    Coloca-se, para o servio social o desafio de olhar no s poder pessoal, mas o poder

    mais global de articulao das polticas sociais ao mercado, diante de uma populao

    precarizada e endividada, forada a inserir-se em mnimos sociais numa sociedade de

    precarizao. As polticas sociais operacionalizam projetos isolados em parcerias

    fragmentadas, num contexto neoliberal, de reduo do estado e de responsabilizao do

    indivduo pela sua sorte.Nesse contexto pressupe-se uma prtica de enfrentamento de

    uma correlao de foras global adversa para a defesa e implementao dos direitos

    sociais. Ao mesmo tempo, ainda existe nos pases latinoamericanos prticas clientelistas

    de intermediao pessoal e de favor.

    A questo que surge nessa anlise, de se possvel aprofundar a ruptura com o

    modelo contratualista consensual, centrado na psicologizao dos problemas ou

    centrado nas interaes interpessoais e de proviso de recursos e encaminhamentos

    imediatos, ou mesmo na questo ideolgica da satisfao.O paradigma da correlao de

    foras, parte dos seguintes pressupostos, aqui colocados de forma extremamente

    resumida:

    A sociedade e a estrutura so relaes, portanto em ruptura com as perspectivas

    substancialista, individualista e reducionista, sendo o sujeito, como o define Marx, um

    conjunto de relaes.

    A crtica pressuposto da ao, na busca de fundamentos, nas mediaes da

    negatividade contraditria em movimento versus prtica mimtica.

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    As relaes de poder se estruturam e expressam em processos de hegemonia e de

    contra-hegemonia, conforme a expresso de Gramsci.

    Os seres humanos so sujeitos histricos, cujo movimento est condicionado, ao

    mesmo tempo, pela economia, pela poltica, pela produo e pela re-produo da

    vida, num processo de reproduzir-se e representar-se (Faleiros, 1989) A histria scio-

    econmica-poltica se inscreve num processo de perecibilidade , conforme a

    correlao de foras em presena, a conjuntura e a estrutura. A estrutura da

    acumulao capitalista desigual, excludente e opressora.

    O institudo politizado pelo instituinte, com re-organizao, re-presentao e re-

    composio do poder e dos poderes (enjeux) em jogo de interesses e valores em

    campos diversificados que se entrecruzam.

    H uma relao dinmica entre Estado/sociedade/acumulao da

    riqueza/territrio/cultura e de legitimao/guerra. As determinaes no constituem

    inevitabilidades. As condies so estruturantes e estruturadas.

    O conhecimento e valores so processos complexos e contraditrios enquanto

    saberes distintos, diferentes,em uma dinmica de identidades e diferenas.

    A construo de categorias de pensar o real implica relao entre

    abstrato/concreto/abstrato

    A articulao dos sujeitos, sua resistncia e contra-hegemonia, tem efeitos de poder

    na distribuio micro/macro de dispositivos, recursos, organizao. Os efeitos de

    poder esto articulados s condies historicamente dadas pelas exigncias dos

    processos dominantes em suas contradies e conflitos.

    O conflito organiza as relaes, os consensos as desmontam, palavreando-se

    acordos, pactos, trocas que podem ser de curta, mdia ou longa durao, pela fora

    ou pela aceitao.

    Em cada situao h uma particularidade que implica a generalidade das relaes,

    mas com especificidade de cada campo.

    O silenciamento e a resistncia dos oprimidos podem ter processos e estratgias de

    ruptura com a ordem dominante (emancipatrias) e de articulao instituinte/institudo.

    A relao do servio social, como forma de poder, implica articular foras para defesa

    dos dominados, dos excludos

    A relao sujeito-estrutura se d em base na afirmao de Marx, em a Ideologia

    Alem de que: Onde existe uma relao, ela existe para mim, ou seja, numa

    articulao da conscincia do sujeito relao e a relao conscincia do sujeito.

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    O processo de conscientizao relacional, no vertical, de cima para baixo, no

    sentido de que vou conscientizar o povo, na linha do vanguardismo.

    A formao da subjetividade na sociedade se articula aos processos de riscos

    prprios da vida no capitalismo como a precarizao, o medo e o desemprego, em

    forma relacional.

    plausvel resistir s formas de dominao pela de incluso precria (excluso) e

    represso, com um processo de organizao poltica, social, legal e profissional

    vivel responder s urgncias da precarizao e articular aes estruturantes de

    mudana da relao de foras.

    O poder das tecnologias pode ser descontrudo num processo de tecncotica, de

    colocao da tecnologia, das informaes, dos encaminhamentos a servio do poder

    das pessoas e da populao, numa perspectiva emancipatria, fortalecendo

    interesses estratgicos dos dominados.

    A emancipao pressupe integrar cultura e territrio na ao em redes, com ruptura

    da fragmentao, da deslocao, valorizando-se a dimenso local, de redes e de

    proximidade articulada ao questionamento mundial.

    O empoderamento pressupe aprofundar a democracia participativa e a cidadania

    coletiva num contexto individualista liberal e descentrar decises.

    O empoderamento articula o servio social com os movimentos sociais presentes em

    seu pblico, fortalecendo-os.

    A estratgia de correlao de foras visa produzir conhecimentos crticos versus

    relao de produtividade (desempenho, resultados).

    O trabalho implica ressignificar identidades numa sociedade meditica do poder

    branco,hedonista, consumista, competitivo.

    Implica ainda:

    articular foras num lugar de subalternidade;

    estabelecer mediaes complexas numa cadeia de intermediaes;

    articular bio-vias com desconstruo e construo de poderes;

    atender necessidades criticando a categorizao dos pobres e o focalismo;

    defender o pblico e sobreviver no emprego (centros de defesa);

    articular o fortalecimento do pblico na vida e nas organizaes;

    re-interpretar as demandas (ideolgico) e produzir conhecimento crtico;

    fortalecer a auto-gesto e a deciso sobre si, num contexto de vulnerabilizao;

    capacitar-se permanentemente num contexto de corte de oramentos;

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    combinar benefcios e prestaes sociais com o processo de autonomia e

    independncia do sujeito, na perspectiva de um imaginrio de contrato e de

    solidariedade;

    politizar a ao num momento de descartabilidade da poltica;

    construir novos indicadores do trabalho de fortalecimento do pblico no contexto

    dos indicadores de produtividade;

    articular a presso do pblico num contexto de represso (negociao poltica)

    promover o protagonsimo do pblico em trabalho de rede num contexto de

    fragmentao;

    trabalhar o processo criativo de comunicao com o pblico num contexto de

    burocratizao;

    articular redes, territrio, cultura, informao e protagonismo do pblico na

    dinmica da democracia e da cidadania;

    denunciar as situaes num contexto de represso.

    O trabalho social na correlao de foras est centrado na relao de poder dos coletivos,

    das classes, dos grupos, do sujeito, da intersubjetividade, em uma articulao das

    relaes estruturais e estruturantes e das relaes inter-subjetivas nas conjunturas e

    situaes particulares para fortalecer as trajetrias scio-pessoais de mudana do poder

    em favor dos dominados e fragilizados nas relaes de poder, pelos dispositivos,

    capitais, patrimnios, recursos,oportunidades direitos, leis e capacidades nas conjunturas

    complexas e nas situaes particulares no contexto da democracia e da cidadania.

    Assim, as mediaes so configuradas no como processo da intermediao de recursos

    e de servios. No consiste, pois, no encaminhamento. Trata-se de um processo

    epistemolgico-poltico-real de relao entre o imediato e o aprofundamento das

    relaes singulares, particulares e gerais da sociedade em sua complexidade/totalidade

    para decifrar as demandas, os projetos e as foras em jogo na comunicao entre

    pessoas, em seu lugar de poder e fala.. pressupe-se uma anlise do contexto mais

    profundo e geral, como das condies de vida no territrio, da cultura, das estruturas

    institucionais e das condies sociais e econmicas dos usurios, de sua

    excluso/insero, ou seja de seus capitais disponveis, inclusive de suas capacidades,

    como um processo complexo e no como responsabilizao dos sujeitos. O paradigma da

    correlao foras prope fortalecer o sujeito em um contexto de excluso, com a anlise

    das contradies, dos conflitos e dos processos de poder de forma relacional, articulando

    sujeito/dispositivos em seu favor na relao social conjuntural e situacional.

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    Ao mesmo tempo, prope uma anlise do poder burocrtico/profissional ao estabelecer

    formas de aliana com os sujeitos e colaboradores.Tambm coloca o trabalhador social

    em uma relao de proximidade com o sujeito e suas demandas na estrutura institucional.

    O poder institucional se configura dinmico, numa relao em que a estabilidade e

    instabilidade devem ser consideradas, conformando-se o poder numa relao com os

    tcnicos, a burocracia, os profissionais e a populao. Diante desse poder os usurios

    dispem de dispositivos, demandas e recursos que precisam ser decifrados.O

    deciframento implica em levar em conta o sujeito, assim como dar-se conta da situao e

    dar conta das relaes existentes e das exigncias e dos processos de trabalho.Esse

    paradigma se inscreve num processo em que as demandas se tornam questes

    disputadas por foras que atuam no sentido da desmobilizao, da represso, da

    fragmentao e de foras que defendem a articulao em favor do usurio. No quadro

    abaixo observa-se um processo em que as questes em disputa se situam num territrio

    e se apresentam como demandas em torno das quais se buscam estratgias de

    identidade, autonomia e cidadania nas trajetrias scio-individuais pela articulao de

    projetos num contexto de dispositivos e recursos e poderes. Esses recursos, dispositivos

    e poderes constituem capitais ou patrimnios que dependem do campo em que so

    disputados. PROCESSO DA CORRELAO DE FORAS

    QUESTES EM DISPUTA

    TERRITRIO

    DEMANDAS

    IDENTIDADE ESTRATGIAS

    AUTONOMIA MEDIAES

    CIDADANIA

    FORAS

    PROJETOS

    TRAJETRIAS SOCIO-INDIVIDUAIS

    CONTEXTO SOCIAL/EC Dispositivos PODERES CAPITAIS

    Recursos Assim, para ser estratgico em Servio Social preciso situar-se numa relao complexa

    e contraditria de saber e poder, contextualizada na relao desigual da sociedade e

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    das instituies. No se trata de reequilibrar uma interao, mas de articular foras para

    mudar os recursos, o poder e o deciframento das questes em jogo.

    Nessa relao que o assistente social pode dispor de estratgias e poder para trabalhar

    com os sujeitos as foras em presena. O fundamental, no entanto que se trabalhe a

    relao e no apenas a obteno de recursos, pois os recursos implicam relaes.

    A relao profissional/usurio vai se processar nas condies em que se manifesta a

    demanda e o trabalho.Vamos destacar o fortalecimento das relaes polticas, das

    relaes econmicas, culturais, afetivas.

    Nas relaes polticas fundamental que haja uma dinmica de fortalecimento dos

    direitos e da cidadania, implicando: garantia dos direitos estabelecidos; informao e

    providncias de documentao; articulao das demandas na instituio; mudana de

    itinerrios institucionais; questionamento da autoridade e das regras que oprimem o

    usurio; articulao de grupos e coletivos na defesa de direitos e de auto expresso;

    contribuio para a expresso da crtica das relaes sociais; desburocratizao;

    conhecimento da mquina administrativa e seu uso a favor do usurio; denncia das

    condies de opresso; anlise do poder institucional e do saber profissional.

    Nas relaes econmicas dos usurios e das pessoas fundamental articular: apoio e

    insero nos direitos a subsdios e auxlios; recursos no interesse dos usurios; buscar a

    formao para o trabalho e a vida em sociedade; explorar as possibilidades de

    solidariedade, de gerao de renda; analisar o mercado de trabalho em suas

    contradies; articular passos para enfrentamento do no trabalho; questionar a relao

    pobreza/riqueza; analisar os processos de produo da riqueza e da pobreza.

    analisar as possibilidades de insero no contexto excludente.

    Nas relaes culturais o empoderamento implica, dentre outras estratgias, trabalhar as

    diferenas e a identidade; valorizar a cultura (incluindo a linguagem e a lngua) do usurio;

    abrir espaos para sua expresso e construo e sua identidade; elucidar e decifrar as

    diferenas culturais; analisar os medos e as discriminaes;trabalhar a ressignificao

    das perdas culturais, rejeies de discriminaes;trabalhar as biografias, os nomes

    prprios, os conhecimentos, as informaes; trabalhar as aspiraes e os projetos do

    sujeito; ressignificar os direitos e dispositivos no contexto do usurio; relacionar a

    identidade prescrita, a identidade desejada e a identidade conquistada; questionar o

    machismo, o patriarcalismo, o racismo, o sexismo; analisar a trajetria de

    insero/excluso escolar; expressar as habilidades pessoais (artes, artesanato,

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    culinria...); rearticular o poder sobre si mesmo; desrotular o usurio das categorias com

    avaliado na instituio e na sociedade.

    Na relao com subjetividade fundamental que a histria do sujeito seja articulada

    histria social, buscando-se: expressar a histria familiar (genograma) e

    repeties/mudanas- com questionamento; expressar e ressignificar as relaes

    afetivas e amorosas com sucessos e fracassos; expressar seu sofrimento de violncias;

    expressar os sentimentos e as emoes de orgulho, vergonha, vaidade, esperanas;

    expressar e questionar o passado, o presente e o futuro; trabalhar a revelao dos

    medos, dos traumas, e da violncia; revelar e mudar a relao com a casa; revelar e

    mediar conflitos familiares e poderes familiares.

    Na relao com os patrimnios ou capitais simblicos as estratgias de fortalecimento

    pressupem: fazer expressar as representaes do mundo; expressar as vivncias

    corporais (por ex. exerccios, vivncias); fazer expressar as religies e os seres

    imaginrios (bem e mal); fazer expressar as representaes da vida e da morte e a

    construo de projetos; expressar a relao com a autoridade e seu

    enfrentamento;trabalhar a desculpaliizao do indivduo e o enfrentamento das condies

    de vida.

    Nas relaes de poder com a sociedade e as instituies o trabalho social crtico de

    empoderamento implica: articular as redes de relaes; explicitar os conflitos sociais mais

    amplos;informar sobre as redes, amizades, os vizinhos, a ajuda; reconhecer o territrio

    conhecido e abrir horizontes do desconhecido; saber usar os poderes e o conflito de

    poderes; estabelecer a autonomia e satisfao de necessidades bsicas; mobilizar a

    sociedade em favor do usurio;trabalhar as trocas sociais, a convivncia e a troca de

    experincias entre os usurios.

    Nas relaes e patrimnios ecolgicos fundamental que haja um deciframento do

    espao de vida e de dignidade do usurio; uma anlise das foras que destroem e das

    defendem o uso adequado do territrio; a discusso dos estresses da vida cotidiana como

    transporte, acesso, e falta de condies de vida digna ; a formao para o meio

    ambiente.

    Nas relaes e patrimnios de conhecimento um trabalho estratgico de empoderamento

    busca: desfocar a viso do problema da instituio para as relaes do sujeito com

    instituio, a sociedade, a famlia; usar a pesquisa em favor do usurio ;informar o usurio

    dos resultados das pesquisas; articular dados sobre o usurio para pensar o contexto;

    refazer os processos, dossis e pronturios na tica do usurio; refazer as tcnicas de

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    trabalho em funo do usurio; repensar as bases tericas e prticas s e em coletivos;

    analisar os projetos ideolgicos em confronto na sociedade e suas relaes com o poder,

    a economia e os interesses dos grupos hegemnicos e contra-hegemnicos na dmarche

    institucional; analisar os impactos do processo de globalizao/mundializao do capital

    no processo institucional; fortalecer os patrimnios relacionais dos usurios como

    aprendizado, cultura, vida familiar, condies de vida.

    Nos procedimentos institucionais/profissionais as relaes de poder implicam uma

    dinmica de aliana entre profissional e usurio que pressupem; analisar a demanda

    num contexto territorial e cultural e de redes; analisar as foras em presena, e

    principalmente as foras dos usurios; entrar em relao com o outro e no fazer para o

    outro ; estabelecer um processo, uma dinmica e no prever resultados rgidos e formais

    conforme as normas; ver os interesses do usurio no contexto de seu grupo e sua classe

    social; abrir espaos para a expresso do usurio; relacionar a singularidade, a

    particularidade e o geral na histria pessoal e social; elaborar uma compreenso

    inteligente da situao e da ao que convm na perspectiva emancipatria; considerar

    os riscos e ameaas para o outro e para si; considerar as foras e fragilidades disponveis

    no contexto, na situao e no outro; promover a possibilidade de o dominado controlar o

    processo (inflexionar o poder); ter toda a informao disponvel dos adversrios, do

    campo, do ritmo de ao e dos dispositivos (dados pessoais, vcios, virtudes) para passa-

    las ao usurio; fazer com o usurio expresse sua motivao e suas dificuldades, com a

    vontade de mudar em acordo com as possibilidades individuais e coletivas;ver a

    credibilidade das aes; antecipar as reaes e dificuldades para enfrent-las;

    estabelecer a urgncia da interveno; relacionar os fins com os meios, os desejos com a

    realidade;reduzir os custos para os usurios articulados aos custos exigidos; estabelecer

    um feed-back permanente; ver os aliados e os inimigos dos usurios;avaliar

    permanentemente a ao; articular diferentes nveis de interveno; saber avanar, saber

    esperar, saber contornar (astcia) e saber recuar nas propostas de forma coordenada e

    ritmada; saber envolver e exigir de si e do outro nos seus limites e possibilidades; saber

    manobrar e manipular adversrios e recursos; saber perder e saber se confrontar no

    prprio campo e no campo do adversrio nas condies mais favorveis; saber que o

    usurio sabe; saber cooperar no conflito e conflituar na cooperao; trabalhar em redes

    no sistema.

    Essa perspectiva estratgica se situa num contexto crtico do poder dominante e do

    capitalismo como forma de vida excludente para muitos. A crtica no se faz de forma

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    maniquesta, mas justamente com a anlise das foras em presena, dos riscos da ao

    e das contradies da sociedade contempornea..

    A ao social pressupe o conflito e este se desenvolve em processos complexos, pois

    o conflito que se apresenta ao assistente social, no cotidiano, o da sobrevivncia

    cotidiana, da sustentabilidade do sujeito em suas relaes. H tambm os conflitos da

    violncia, do desemprego, da transio de idades, da migrao, da moradia, da sade.

    Esses conflitos tm dinmicas diversas que se expressam em trajetrias de perdas e

    ganhos de recursos, mas tambm de perdas e ganhos de foras.O contexto da

    democracia participativa favorece a articulao de foras na defesa dos interesses dos

    usurios, assim como o contexto da cidadania possibilita um processo de garantia de

    direitos, mas no se faz sem presso, e portanto, sem fora. Que por sua vez, implica

    organizao e poder. Esse poder passa pela denncia, pela associao, pela

    solidariedade, pela luta poltica no processo de resistncia e de contra-hegemonia, com

    os mecanismos de presso por direitos. Assim, o requerimento, a ao judicial bem como

    instrumentos como a entrevista e a reunio se articulam a uma estratgia de poder,

    deixando de ser considerados fins em si mesmos.

    No quadro seguinte pode-se observar a complexidade dessas mediaes.

    Processo de fortalecimento da identidade, da autonomia e da cidadania

    Identidade Autonomia Cidadania

    Proteo/Acolhida Reconhecimento e

    ressignificao

    Palavra, narrativa

    Informao

    Direitos e garantias

    Redes. Acesso

    Enfrentamento da

    Burocracia

    Facilidade

    Mapas das redes

    Possibilidades e

    capitais. Servios s

    necessidades

    Articulao de poder

    institucional em favor do

    usurio

    Promoo da

    Participao

    Redes pessoais Grupos e movimentos e

    participao na rede

    Controle social democrtico

    Desenvolvimento da

    Comunicao

    Decifrar as demandas e

    questes gerais

    Desenvolver a os

    grupos e as lutas

    Meios de comunicao

    como denncia e

    transparncia

    Articulao de redes e

    cultura no

    territrio

    Apoio e contra-

    transferncia.

    Identidade grupal

    Garantia da vida digna,

    reduo da

    desigualdade

    Direitos civis, polticos e

    sociais

    A articulao da poder dos usurios para a cidadania, a identidade e a autonomia

    pressupe mudar a relao de tutela e de favor para a promoo de direitos no combate

    ao clientelismo, assim como atender as demandas numa relao politicamente elaborada,

    para que se rompa com a dominao e a sujeio das pessoas, desenvolvendo-se o

    respeito ao outro, a sua diversidade num contexto de igualdade e de dignidade comum,

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    levando em conta os interesses, capitais, possibilidades de articulao do particular e do

    geral, num processo de trabalho de aliana com o pblico-alvo, visando seu protagonismo

    em contextos complexos, que superem os papis de ajuda, controle, inscrevendo-se

    numa perspectiva tcnico-cientfica e poltica. Nesse sentido, levar-se- em conta a

    articulao entre estrutura, conjuntura e situao com o processo de mediaes

    complexas. As mediaes das relaes sociais, implicam anlise das foras articuladas a

    recursos, advocacy, gesto, informao,organizao, identidade, cidadania e autonomia

    do pblico, em estratgias diversificadas para fortalecer os dominados nos seus direitos e

    na garantia dos mesmos pelas polticas sociais e nas relaes sociais. Numa sociedade

    desigual, prope-se a articulao do cuidado com a defesa de direitos, tendo em conta e

    levando em conta as pessoas, para dar conta das exigncias institucionais e das

    mudanas sociais no processo complexo das condies existentes e das foras em

    presena.

    Referncias bibliogrficas

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