Falta Manutencao Obras Publicas

2
http://www.sinaencope.com.br/edicao78/artigo.htm A (FALTA DE) MANUTENÇÃO DAS OBRAS PÚBLICAS A falta de políticas e estratégias voltadas para a manutenção das obras públicas está se transformando em um grande problema para o País pelo abrangente espectro das suas repercussões, que vão desde a interferência no funcionamento da cadeia produtiva até ao risco imediato à integridade física dos cidadãos. É fato notório que a cultura dominante nos órgãos responsáveis pelas obras públicas de infra-estrutura, nos níveis municipais, estaduais e federal, faz com que sejam priorizadas apenas as ações voltadas para a execução, não havendo maiores preocupações com as questões relacionadas à manutenção, em especial a preventiva. A manutenção corretiva por sua vez, na maioria dos casos, só é realizada quando a obra já está atingindo (ou já atingiu), o seu estado limite de utilização. Não é difícil demonstrar que quanto maior a demora em iniciar o processo de manutenção de uma obra, maiores e mais onerosos também serão os reparos necessários para que ela tenha as suas condições ideais de uso restabelecidas. A Lei de evolução dos custos (conhecida como Lei de Sitter) demonstra que os custos de correção crescem segundo uma progressão geométrica de razão cinco. Ou seja, para cada unidade monetária que deixa de ser aplicada durante a fase de projeto ou no início da construção para tornar a obra mais eficiente e durável, serão necessárias 125 unidades na situação limite da manutenção corretiva. Isso significa que a manutenção preventiva precisa ser vista como um processo que se inicia com um bom projeto, continua com uma boa construção e se consolida através de procedimentos sistemáticos nos campos técnico, administrativo e financeiro voltados para a garantia, a segurança e maior vida útil dos empreendimentos. Exemplos bastante atuais mostram que o Brasil ainda está muito longe de atingir um estágio aceitável no que se refere às preocupações e ações voltadas para a manutenção de obras que são fundamentais para o seu desenvolvimento, muitas delas tão alardeadas nos discursos dos políticos. Basta lembrar que mais de 50% da malha rodoviária brasileira encontra-se com pavimento em estado deficiente, ruim ou péssimo e que os 440 milhões de reais que hoje estão sendo gastos para realizar “tapa-buracos”, que resistirão no máximo seis meses, de acordo com o IPT-SP, poderiam ser economizados caso houvesse sido realizadas manutenções preventivas nas rodovias ao longo dos últimos 30 anos. Mais grave ainda são as perdas de vidas humanas e os prejuízos materiais decorrentes de acidentes causados pelas deficiências das estradas. Percentual semelhante de pontes e viadutos que compõem os sistemas viários também apresentam estágio avançado de deterioração estrutural, cuja evolução poderá, em breve, acarretar na ruína de parte dessas obras, a exemplo do que aconteceu com a ponte sobre a represa do Capivari, na rodovia Regis Bitencourt (BR-116-PR), cujo desabamento foi causado pela ruptura do aterro de uma das cabeceiras que tinha cerca de 40 anos e não recebia manutenção. Este acidente se tornou nacionalmente conhecido pelo fato de ter ocorrido com uma obra de grande porte e ter interrompido por vários dias uma das rodovias mais importantes do País, porém inúmeros outros acidentes estruturais de menor gravidade, envolvendo pontes e viadutos, continuam a acontecer sem que se tomem as devidas providências para evitá-los. Mesmo as barragens que, pelas suas peculiaridades, não admitem qualquer risco quanto à estabilidade, também estão passando por problemas relacionados à falta de manutenção, conforme levantamento do Ministério da Integração Nacional, divulgado em novembro de 2005, que identificou 20 dessas obras correndo o risco de ruptura, pelo fato de há quase duas décadas não receberem qualquer tipo de reparo. A gravidade da situação das obras de infra-estrutura motivou o Sinaenco-PE a realizar estudos sobre o tema que

Transcript of Falta Manutencao Obras Publicas

  • http://www.sinaencope.com.br/edicao78/artigo.htm

    A (FALTA DE) MANUTENO DAS OBRAS PBLICAS

    A falta de polticas e estratgias voltadas para a manuteno das obras pblicas est se transformando em um grande problema para o Pas pelo abrangente espectro das suas repercusses, que vo desde a interferncia no funcionamento da cadeia produtiva at ao risco imediato integridade fsica dos cidados.

    fato notrio que a cultura dominante nos rgos responsveis pelas obras pblicas de infra-estrutura, nos nveis municipais, estaduais e federal, faz com que sejam priorizadas apenas as aes voltadas para a execuo, no havendo maiores preocupaes com as questes relacionadas manuteno, em especial a preventiva. A manuteno corretiva por sua vez, na maioria dos casos, s realizada quando a obra j est atingindo (ou j atingiu), o seu estado limite de utilizao.

    No difcil demonstrar que quanto maior a demora em iniciar o processo de manuteno de uma obra, maiores e mais onerosos tambm sero os reparos necessrios para que ela tenha as suas condies ideais de uso restabelecidas.

    A Lei de evoluo dos custos (conhecida como Lei de Sitter) demonstra que os custos de correo crescem segundo uma progresso geomtrica de razo cinco. Ou seja, para cada unidade monetria que deixa de ser aplicada durante a fase de projeto ou no incio da construo para tornar a obra mais eficiente e durvel, sero necessrias 125 unidades na situao limite da manuteno corretiva. Isso significa que a manuteno preventiva precisa ser vista como um processo que se inicia com um bom projeto, continua com uma boa construo e se consolida atravs de procedimentos sistemticos nos campos tcnico, administrativo e financeiro voltados para a garantia, a segurana e maior vida til dos empreendimentos.

    Exemplos bastante atuais mostram que o Brasil ainda est muito longe de atingir um estgio aceitvel no que se refere s preocupaes e aes voltadas para a manuteno de obras que so fundamentais para o seu desenvolvimento, muitas delas to alardeadas nos discursos dos polticos. Basta lembrar que mais de 50% da malha rodoviria brasileira encontra-se com pavimento em estado deficiente, ruim ou pssimo e que os 440 milhes de reais que hoje esto sendo gastos para realizar tapa-buracos, que resistiro no mximo seis meses, de acordo com o IPT-SP, poderiam ser economizados caso houvesse sido realizadas manutenes preventivas nas rodovias ao longo dos ltimos 30 anos. Mais grave ainda so as perdas de vidas humanas e os prejuzos materiais decorrentes de acidentes causados pelas deficincias das estradas.

    Percentual semelhante de pontes e viadutos que compem os sistemas virios tambm apresentam estgio avanado de deteriorao estrutural, cuja evoluo poder, em breve, acarretar na runa de parte dessas obras, a exemplo do que aconteceu com a ponte sobre a represa do Capivari, na rodovia Regis Bitencourt (BR-116-PR), cujo desabamento foi causado pela ruptura do aterro de uma das cabeceiras que tinha cerca de 40 anos e no recebia manuteno. Este acidente se tornou nacionalmente conhecido pelo fato de ter ocorrido com uma obra de grande porte e ter interrompido por vrios dias uma das rodovias mais importantes do Pas, porm inmeros outros acidentes estruturais de menor gravidade, envolvendo pontes e viadutos, continuam a acontecer sem que se tomem as devidas providncias para evit-los.

    Mesmo as barragens que, pelas suas peculiaridades, no admitem qualquer risco quanto estabilidade, tambm esto passando por problemas relacionados falta de manuteno, conforme levantamento do Ministrio da Integrao Nacional, divulgado em novembro de 2005, que identificou 20 dessas obras correndo o risco de ruptura, pelo fato de h quase duas dcadas no receberem qualquer tipo de reparo.

    A gravidade da situao das obras de infra-estrutura motivou o Sinaenco-PE a realizar estudos sobre o tema que

  • http://www.sinaencope.com.br/edicao78/artigo.htm

    A gravidade da situao das obras de infra-estrutura motivou o Sinaenco-PE a realizar estudos sobre o tema que foram apresentados e discutidos por ocasio do VII Enaenco, ocorrido no Recife entre 28 e 30 de setembro de 2005. A partir de levantamentos efetuados no Recife e Regio Metropolitana, foram identificadas obras virias (pavimentao, pontes e viadutos) e obras do sistema de drenagem (canais urbanos e galerias), cuja falta de manuteno esto acarretando problemas de utilizao em diversas escalas de gravidade. O relatrio final foi amplamente divulgado pela mdia e apresentado aos gestores pblicos responsveis pelas obras; alguns deles at participaram dos debates.

    Passados seis meses do evento, constata-se que nada (ou quase nada), foi feito para restabelecer as condies apropriadas de uso daquelas obras. Mesmo os servios que no necessitam de grandes recursos, de mo-de-obra especializada e de equipamentos sofisticados, no foram realizados, como o exemplo do Viaduto do Cabanga cuja vegetao de grande porte nos aparelhos de apoio foi mostrada na televiso como um exemplo da total falta de manuteno.

    Outros exemplos de obras constantes do relatrio, que at agora no foram objeto de providncias, so os das pontes sobre o rio Igarassu e sobre o rio Botafogo na BR-101 Norte, que continuam pondo em risco a integridade dos usurios pelo avanado estado de degradao das suas estruturas.

    Mesmo diante deste quadro, entendemos ser possvel reverter essa situao de descaso a partir de parcerias conjuntas entre as entidades de engenharia, instituies de pesquisas, setores do governo e organismos da sociedade (a quem, em ltima anlise, cabe pagar a conta). Talvez assim seja possvel estabelecer metas de manuteno baseadas em alternativas viveis, tcnica e financeiramente, que tenham como principal objetivo a garantia da qualidade e segurana para os usurios das obras pblicas.

    AFONSO VITRIO engenheiro civil especialista em estruturas e diretor do SINAENCO-PE