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Brasil, 2003 Subsídio de Formação nº 7 Associação Nacional dos Leigos Amigos de Murialdo - ANALAM Família: Lugar de Construção

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Brasil, 2003

Subsídio de Formação nº 7

Associação Nacional dos Leigos Amigosde Murialdo - ANALAM

Família:Lugar de Construção

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Sumário

Apresentação .......................................................................................... 33

1. A FAMÍLIA NO CONTEXTO ATUAL .................................................. 35

1.1. Os Conceitos ......................................................................... 35

1.2. Luzes e Sombras Dentro de Casa ........................................... 37

1.3. O Serviço à Vida num Sistema de Morte ................................... 39

1.4. A família, um Valor Permanente .............................................. 40

2. A FAMÍLIA E O PENSAMENTO CRISTÃO .......................................... 422.1. A Família no Plano de Deus .................................................... 43

2.2. Vaticano II e a Família ............................................................ 44

2.3. João Paulo II e a Família ......................................................... 44

2.4. Medellín, Puebla e Santo Domingo .......................................... 46

2.5. A CNBB e a Família ............................................................... 48

2.6. Murialdo e a Família ............................................................... 50

3. A FAMÍLIA E A PROMOÇÃO DA VIDA HUMANA ................................. 51

3.1. Construindo Vida de Família .................................................... 51

3.2. Família: Construção da Esperança e da Vida ............................ 53

3.3. Ética Familiar na Defesa do Amor ............................................ 54

3.4. Porque eles têm Famílias Empobrecidas ................................. 56

3.5. Pedagogia da Família – Limites com o Coração ........................ 58

Conclusão ............................................................................................... 61

Bibliografia ............................................................................................... 63

História de uma Família .......................................................................... 64

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Apresentação

Este é mais um subsídio da Analam que chega atévocê, nosso associado, para compor o seu kit de formação.Ele traz um tema que é de muita importância para todos: AFamília. Este tema vem a um longo tempo sendo solicitadopelos nossos núcleos para ser aprofundado. Neste bemelaborado trabalho do Conselho Formativo poderemos,finalmente, chegar ao nosso objetivo que é aprofundar nossavisão sobre a família e, principalmente, conseguirmos elementos para construirmosnossas famílias.

Gostaria de agradecer ao trabalho incansável do Conselho Formativo daAnalam pelo belo trabalho que estamos recebendo, bem como, pela forma quetrabalha pela Associação, sempre disponível e preocupado com o que é necessáriopara que possamos crescer e nos fortificar na caminhada.

Através deste trabalho que ora lhe chega às mãos vamos verificar quesomente no momento em que estivermos com nossas famílias bem estruturadase construídas no alicerce do amor é que poderemos ser um farol sinalizador quevai auxiliar aquelas famílias, que na maioria das vezes, destruídas, daquelesque nos chegam para ser atendidos.

Na família deve ser encontrada uma fonte inspiradora de uma novaesperança. Esperança de uma nova sociedade, uma nova relação com osnecessitados e com aqueles que se aproximam das nossas famílias. Esperançade construção de um amor e um respeito que nasce dentro desta família e porser tão grande não cabe dentro dela e espalha-se no lugar onde esta famíliaestá inserida. Assim, a família não é lugar onde as pessoas convivem juntas,mas o lugar de construção de uma relação marcada muito mais pelos laços doamor, do que pelos laços de sangue.

Nesta construção que se gera dentro da família está a criação de pessoashumanas livres e seguras, muito mais preocupadas com a felicidade do outro doque com a sua própria. Esta preocupação gera um comprometimento entretodos e, por conseqüência, a construção geral da felicidade. Sendo assim,podemos chamar de pessoas maravilhosas aquelas que estão no seio destafamília.

Com isso vemos que é na família que vamos construir a vida. Nela estaremossinalizando a esperança de que o mundo pode e será melhor. Para tanto, afamília é o horizonte para onde devemos caminhar.

Leonel dos ReisPresidente

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1. A FAMÍLIA NO CONTEXTO ATUAL

Olhando a Realidade

Sempre se disse que a família é o centrodas relações sociais; que ela é o fundamentoda sociedade, sua célula básica. Também secostuma dizer que é na família que aspessoas aprendem as noções mais básicassobre a vida. Bem como, que ela é o lugar daconstrução da identidade e da auto-estima.

Como vai a família? Tudo o que se disseou o que se diz sobre a família encontra umquadro quotidiano de referências que nemsempre corresponde aos discursos que se faz sobre ela. A família parece passarpor uma série de pressões, desestruturações e insatisfações de seus membros.Observa-se, por outro lado, a existência de pessoas felizes ao viverem o espaçofamiliar como fundamental para suas existências.

Essa primeira parte do presente subsídio quer fazer exatamente isso: darum mergulho na realidade para encontrar-se com as famílias. Trata-se de ir embusca de descobrir a situação atual em que se encontra a família. Então, apartir da iluminação desta mesma realidade será possível construirmos algonovo, ou investirmos em novas possibilidades para as nossas famílias.

1.1 Os Conceitos

Houve uma época em que, na escola, nas igrejas, nos grupos e movimentos,mesmo na imprensa, exaltava-se a família como aquilo que de mais importanteexistia entre as várias instituições. A definição mais expressiva para a mesmaera aquela que a identificava como “célula da sociedade”.

Apoiada em diversas correntes de pensamento moderno, influenciadaspelas várias mudanças que vieram acontecendo num mundo globalizado, surgeuma nova teoria que questiona os valores nos quais se fundamenta a família,sua constituição, seus membros e, até mesmo, a necessidade dela.

Mas o que é mesmo a família? Então, como podemos defini-la?

Enquanto um fenômeno social, a família se apresenta, antes de tudo,como uma comunidade de sangue. Porém, esta forma de defini-la acaba

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limitando-a demais.

Outra forma de definir a família é a partir de sua função mediadora. Elasocializa as pessoas enquanto aí acontece a primeira experiência de relações.A família se apresenta como a primeira comunidade. Nela a pessoa desenvolvesua personalidade, toma consciência de si mesmo e do outro e se educa. Ela éuma comunidade mais humana que a vida da sociedade em si. Nela acontece oprimeiro encontro dialogal com o tu, com o outro; e isto faz com que alguém setorne pessoa. É por isso que a psicologia tem acentuado a importância dorelacionamento familiar para o desenvolvimento do indivíduo. Descobriu-se queuma criança que se encontra num ambiente familiar sadio é alguém que possuiidentidade e auto-estima. É neste sentido que a família pode ser definida comouma comunidade humana de base.

Uma terceira visão sobre família é aquela que define a família comocomunidade incorporada. Isto é, ela está marcada pela cultura, pelas condiçõessocioeconômicas e, portanto, em contínuastransformações. Esta definição conclui que afamília é mais influenciada pelo contextosocial do que consegue influenciá-lo.

Outra definição é aquela que percebe afamília como um grupo de pessoas ligadasentre si por laços estruturais horizontais(cônjuges) e verticais (ascendentes edescendentes). Na família a pessoa inicia suavida física e tem suas experiênciasemocionais. É na família que a pessoa adquireconsciência de que tem um lugar no mundo.Esta definição enfatiza o caráter comunitárioda família e acentua a construção daidentidade das pessoas.

É importante lembrar que o ano de 1994 foi declarado pela ONU como oAno Internacional da Família. Mesmo com tantas transformações sociais,econômicas, culturais, éticas, inclusive no comportamento humano, permaneceum consenso em torno da família: ela é um espaço privilegiado para a prática devalores comunitários e aprofundamento das relações de solidariedade. Afirma-se ainda a permanência de suas funções, consideradas insubstituíveis quanto àassistência, promoção de valores, educação, proteção aos seus membros e,sobretudo, lugar de encontro de gêneros e gerações.

Neste sentido, uma última definição para família parece ser conveniente. Afamília é o espaço indispensável para a garantia da sobrevivência, do

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desenvolvimento e da proteção integral dos filhos e demais membros,independentemente do arranjo ou da forma como vem se estruturando. É elaque propicia os aportes afetivos e, sobretudo, materiais necessários aodesenvolvimento e bem-estar dos seus componentes. A família desempenhapapel importante e decisivo na educação formal e informal, é lugar onde sãoabsorvidos os valores éticos e humanitários, e onde se aprofundam os laços desolidariedade (Cfr. UNICEF. Família Brasileira, a Base de Tudo. Ed. Cortez, SãoPaulo, 1994, p 11-12...).

1.2 Luzes e Sombras dentro de Casa

Estamos assistindo a um momento de verdadeira crise da família brasileira.Conforme o Censo Demográfico do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística– IBGE, de 2002, o país possui 48 milhões de famílias, numa população decerca de 180 milhões de habitantes. O mesmo Censo constatou ainda queexistem 53 milhões de brasileiros que estão em situação de pobreza e de misériaabsoluta.

Existem cerca de 22 milhões de famílias cujos rendimentos variam dezero a três salários mínimos. A maior crise que se abateu sobre estas famíliasdecorre da falta de condições materiais para cumprir as suas funções.

Assim, ao analisarmos a crise que envolve as famílias, é preciso distinguiras formas, ao menos, em dois grupos: as da classe média, e as famílias pobres.

Essas últimas amargam seus dias no indigesto sabor da luta pelasobrevivência. Amanhecer sem saber se vai haver comida para pôr em casa nãotem chance para pensar em qualquer outra coisa. No peso da necessidadesurge a corrida desesperada por saídas. Impaciência, crimes, baixa-estima,desespero, prostituição... Meninos de oito anos são contratados pelosnarcotraficantes como “sinaleiros” (avisam da chegada de policiais) e “mulas”(transportadores de drogas). Meninas na primeira adolescência são levadas paraa prostituição com o objetivo de trazer dinheiro para casa; jovens de quinze anostornam-se “soldados” dos bandos que aterrorizam a população.

Tais famílias, morando em habitações precárias, lugares insalubres eperigosos, esgotos a céu aberto, são um conjunto de uma população aterrorizadapela violência dos bandos que controlam o tráfico e prostituição. A ousadia doscriminosos chega ao ponto de decretar fechamento de comércio, de escolas.Como pensar na responsabilidade das famílias em garantir o plenodesenvolvimento dos seus filhos?

A propaganda consumista gera uma compulsão e tamanho fascínio queparece não conseguir distinguir as reais possibilidades econômicas das classes

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sociais. Vem a frustração de muitos e com ela a provocação de atos dedelinqüência ou prostituição.

Das famílias da classe média, cerca de 20 a 25 milhões têm suas crisesoriginadas não por fatores econômicos. As causas são outras. A primeira criseé ocasionada pela obsessão de não perder seu “status social”. Esse descer éprofundamente humilhante numa sociedade em que o conceito de pobreza éextremamente negativo.

O consumismo é outra razão da crise das famílias de classe média. Oconsumismo é uma obsessão que torna insaciável o desejo de adquirir coisasou sensações. Acaba sendo gerada uma tensão psicológica que se alia àfrustração e doenças que afetam pais e filhos, bem como conflitos que provocamo desgaste da unidade familiar.

A insegurança é ainda outra marca destas famílias. Existe insegurançanas relações dos cônjuges, nas relações entre pais e filhos, na relação comterceiros. A função educativa da família sofre suas conseqüências. Enquanto asgerações antigas estavam carregadas demais de certezas, as gerações atuaisse debatem em dúvidas e perplexidades.

A crise das famílias de classe média é acentuada também pelo excessivoaumento das separações de casais, da aceitação de uniões não matrimoniais(“casamentos livres”, “amizades coloridas”); da “maternidade independente”; dasuniões homossexuais. Contata-se ainda a opção de alguns casais por não teremfilhos ou, por gerarem, por exemplo, apenas um, e “não tão cedo” para não“estragar a tranqüilidade” e afim de melhor “aproveitar a vida”. Estas situaçõesdenotam perda do conhecimento e das funções da família.

As famílias da classe média se fecharam, também é verdade, para relaçõescom a sociedade. É um grande número de famílias que não se interessa peloque acontece ao seu lado, no seu país, no mundo. Não se interessam pelosmovimentos sociais e políticos, muito menos por mutirões de solidariedade.Isso acarreta em prejuízos a própria família que não consegue olhar a não serpara os próprios problemas.

Nos mais variados desafios que a família enfrenta, geralmente o pai é omaior problema. Nos casos de violência doméstica, de desestruturação familiar,de abandono do lar o homem é quase sempre o responsável primeiro. A falta detrabalho é outro motivo de desespero e de conflitos ou abandonos. Homensfogem por puro desespero, porque têm vergonha. É comum mulheres procuraremoutro homem.

Na classe média também é comum o pai perder com facilidade a autoridadeem casa. Em muitos casos, quando os filhos começam a crescer, para conseguira paz, o pai submete-se ao desejo dos filhos.

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Quando o pai falta a família não está perdida.São inúmeras (mais de 30%) as famílias dirigidas pelamãe.

A sociedade oferece poucas alternativas aosadolescentes e jovens. Os filhos convivem com a faltade perspectiva, a desesperança, a perda daidentidade... Alguns se tornam vítimas das drogas oude grupos anti-sociais. A maioria busca um trabalho,um serviço ou um biscate para ajudar a família. Alguns,inclusive, sustentam a família porque o pai falhou.Muitas meninas se tornam empregadas domésticase, quase sempre, o pagamento das mesmas é aquele

necessário para sobreviver.

Com o crescimento da insegurança e da miséria, um peso muito grandecai sobre o ombro das mulheres. E para salvar a família, muitas vezes aceitamas piores humilhações. Lutam e conseguem. Mas, às vezes, o preço é muitoalto.

A casa ainda é outro grande desafio na cidade. A casa é o lugar da família,ela lhe dá segurança. Muitas famílias vivem pagando aluguel, outras moram emmiseráveis barracos, ou em logradouros públicos. Quando alguém ajuda umafamília a construir a sua casa, está ajudando esta família a sobreviver. Umafamília pode agüentar muitas privações, mas não pode resistir à falta de umacasa para morar. Diz, com razão, o ditado popular: “Quem casa, quer casa.”

1.3 O Serviço à Vida num Sistema de Morte

Tendo sua definição mais original ligada à idéia da proteção e do cuidadoda prole, este conceito de família é vítima de uma série de pressões. Tem-se aidéia de que a família foi “criada” especialmente como aquele espaço privilegiadode preservação e cuidado com a vida.

Mas sabemos que a família não é uma ilha. Ela está inserida num quadrosocial bem mais amplo e está sujeita à pressão das estruturas poderosas comoa economia, o estado, os Meios de Comunicação Social... Deste universo surgemos fatores mais determinantes da crise familiar.

Parece mais evidente que, com relação às famílias pobres, a pobreza éum fator determinante de crise. O país possui uma economia desumana, anti-evangélica que concentra a riqueza e a renda. Sem alterações profundas nestaestrutura fica muito difícil superar as crises das famílias pobres.

Já, nas famílias de classe média a economia capitalista, com sua constante

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oferta de novidades reduziu a vida ao imediatismo. Os reflexos são oempobrecimento intelectual, a perda da auto-estima dos trabalhadores que nãoconseguem consumir no mesmo ritmo das ofertas. O uso da robótica aumentouainda mais o grau de alienação.

O modelo social capitalista, reforçado pelo neoliberalismo, acrescentouas mediações da competitividade e do individualismo às relações humanas. Asrelações pessoais se tornaram superficiais, com medo de compromissos,inclusive, entre os sexos. Entrou, de forma contundente, a cultura narcisista,isto é, pessoas voltam-se para si mesmas, seus sentimentos, suas angústias,perplexidades. Criou-se uma ideologia que visa substituir a culpa moral peladoença e a personalidade das pessoas se ajusta a essa sociedade temerosa deenfrentar seus problemas. Cria-se nas pessoas uma personalidade narcisistaque tem como características a superficialidade protetora, o medo docompromisso, o abandono dos princípios, o desejo de deixar sempre váriasopções em aberto, o desgosto por depender dos outros, a incapacidade para alealdade e a gratidão, o puro individualismo.

Por outro lado, não é menos verdade que as exigências do mercado detrabalho, relacionadas ao bom desempenho profissional, tem acarretado, muitasvezes, dificuldades de conviver com a própria família. As exigências do trabalhoe a necessidade de manter o emprego fazem com que a família pague o altopreço de ser deixado para o segundo plano no estabelecimento das prioridadespessoais dos cônjuges. Então pais e mães acabam se tornando ausênciasconstantes da convivência e construção da vida na família.

Essa cultura causa forte impacto sobre a família. As pessoas criadas emfamílias assim nascem com tendência ao vazio existencial e ao isolamento.

A família está em crise também porque ela sofre um ataque ideológicoprogramado. Ela vem sendo apresentada como repressora do indivíduo. Novelas,filmes e propagandas não discutem mais o sexo como exercício e expressão deamor no casamento. Simplesmente apresentam o sexo liberado como modelode vida excitante e desejável por todos. O outro é apresentado de forma odiosa.Existe um ataque sutil e devastador.

1.4 A Família, um Valor Permanente

É inegável e muito se tem dito e escrito sobre a importância da famíliapara o desenvolvimento de crianças e adolescentes.

Existe uma série de documentos internacionais, convenções, declaraçõesnum respeitável consenso sobre a família como lugar privilegiado e adequadopara o desenvolvimento humano.

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A Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos da Criança (20.11.1989),em seu preâmbulo, leva os Estados Partes a se declararem “convencidos deque a família, como elemento básico da sociedade e meio natural para ocrescimento e bem-estar de todos os seus membros, e em particular das crianças,deve receber a proteção e assistência necessárias para poder assumir plenamentesuas responsabilidades na comunidade. Reconhecem que “a criança, para opleno desenvolvimento de sua personalidade, deve crescer no seio da família,em um ambiente de felicidade, amor e compreensão”.

O artigo 5° desta Convenção apresenta os pais, a família e a comunidadecomo responsáveis por garantir os direitos reconhecidos pela mesma Convenção.Em seu artigo 7° apresenta a criança com o direito, entre outros, de, na medidado possível, conhecer seus pais e ser cuidada por eles. E no artigo 8° os Estadossignatários se comprometem a assegurar o direito da criança a uma identidade,incluídos a nacionalidade, o nome e as relações familiares.

No Brasil, a Constituição Federal (1988), em seu artigo 227 elenca umasérie de direitos que devem ser garantidos às crianças e adolescentes. Entreeles, cita o da convivência familiar e comunitária.

Por sua vez, o Estatuto da Criança e do Adolescente, em seu artigo 19,afirma que toda a criança ou adolescente têm direito a ser criado e educado noseio da sua família e, excepcionalmente, em família substituta.

Desta forma, precisamos destacar que a legislação, de um modo geral,aponta para as orientações de que a criança deve ser criada e educada pela suafamília. Por outro lado, trazem exigência de proteção e assistência às famíliaspara garantir o pleno exercício destas suas funções. Nossa Constituição, emseu artigo 226, afirma que“a família, base da sociedade, tem especial proteçãodo Estado”.

Também é verdade que o Estatuto da Criança e do Adolescente prevê asuspensão ou perda do pátrio poder nos casos em que os pais, injustificadamente,deixarem de cumprir seus deveres de sustentar, terem sob sua guarda e educaros filhos.

Apesar de toda a importância atribuída à família, pode-se perceber queela veio perdendo várias de suas funções tradicionais: econômica, política,educativa, religiosa... Isto não significa, porém, que perdeu seu grau de importânciapara a dignidade das pessoas.

Se a tendência foi a de se chegar à constituição da família monocelular,isto é, aquela reduzida a um pequeno grupo de pessoas; ainda persistem asfamílias tipo “patriarcal” também chamadas de “nucleares”, com grupos grandesde pessoas que se encontram e reencontram com freqüência. Nesta última éonde ainda reside o espaço de confiança; é para onde as pessoas recorrem

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quando há discórdias entre pais e filhos, entre os casais, quando aparece umadoença, quando há falta de dinheiro ou comida.

Mas o valor da família manifesta-se quando percebemos os desastresque acontecem quando ela falha. Quando a família se desintegra por completo,parece que está tudo perdido. Aí aparecem os meninos e meninas em situaçãode rua, a prostituição e o trabalho infantil, os moradores de rua, o tráfico e o usode drogas e as mais diferentes formas de atos infracionais. E, fora da família ousem ela, não há muita perspectiva de restaurar a auto-estima e a dignidadedessas crianças e adolescentes ou adultos tão profundamente abaladas. Tambéma experiência tem demonstrado que não existe outra instituição, por mais perfeitaque seja nela mesma, capaz de substituir a família. Além disso, a substituiçãodo papel específico da família tem custado investimentos materiais, afetivos eeducativos enormes.

2. A FAMÍLIA E O PENSAMENTO CRISTÃO

Julgando a Realidade

A família parece se revestir de umcuidado especial e merecer importânciafundamental por parte da Igreja. São muitosos escritos, as mensagens, sínodos econferências que trataram deste tema.Torna-se, para o objetivo deste subsídio,impossível abordar tantos materiais.

Nossa intenção é a de buscar osentido do matrimônio e da família atravésda fonte inspiradora que é a fé. Tanto aPalavra de Deus, quanto a palavra dospastores têm significação especial para esteestudo. Vamos realizar uma rápida viagempelo interior da Igreja, através de alguns dosseus documentos. Mesmo assim

acreditamos que isto poderá enriquecer a visão deste contexto.

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2.1 A Família no Plano de Deus

É preciso lembrar que o ambiente em que vivia o povo de Israel estavaimbuído de uma mentalidade sacral para a sexualidade. Viam o mundo doshomens como uma imitação do mundo dos deuses. Assim, a sexualidadehumana provinha da sexualidade divina. Desta forma, a sexualidade humanaestá posta numa dimensão alheia àquela do amor, da fecundidade e docasamento.

Com o povo de Israel acontece um rompimento revolucionário com relaçãoà concepção de sexualidade dos seus povos vizinhos. Javé é único, isto é, nãopossui esposa, nem amante, nem filhos. Assim, em Israel a sexualidade édessacralizada. Ela é boa, positiva em si mesma, não por referência ao divino.

Através das passagens do Antigo Testamento vamos percebendo que ocasamento é monogâmico (Gn 2,18-25), igualdade e mesma dignidade do homeme da mulher (Gn 2,18.24), missão procriativa (Gn 1,27), missão de transformar aterra pelo trabalho e humanizar o mundo (Gn 1,28; 2,20).

É verdade que a Bíblia apresenta a família com muito realismo. Desde oinício, descreve desavenças e cumplicidades (Gn 3), o desejo de dominaçãoque existe no casal humano (Gn 3,16), o conflito entre pais e filhos (Gn 9,18), arivalidade entre irmãos gerada pela inveja e interesse (Gn 9,18-29), o sofrimentoda infecundidade (Gn 15, 2-3), desentendimentos mesmo em casamentosrealizados por amor (Jz 14,1-4), graves desgraças produzidas pela poligamia(1Rs 11, 1-4). A Bíblia faz perceber que a família é algo frágil e distante do idealoriginal (Gn 2).

No Novo Testamento, o matrimônio é introduzido na novidade do Reino(Mt 19,3-10). Ele deverá ser vivido numa nova mentalidade. Poligamia e divórciosão decorrência da dureza dos corações e devem ser eliminados (Mt 19,1-9), ouadultério (1Cor 6,12-20). O matrimônio necessita dos fatores da fidelidade eindissolubilidade. Ele é um projeto para toda a vida. Sua natureza é a do amor enão a do legalismo.

O apóstolo Paulo vai inserir a família nos mistérios de Cristo e do seucorpo – a Igreja. O protótipo do amor conjugal de dois cristãos é o amor pascalde Cristo (Ef 5,21-33), que consiste em “entregar-se todo” (Ef 5,25). Isto é,colocar a vida a serviço do outro para recuperá-la em plenitude.

Através da Bíblia pode-se concluir que o matrimônio, princípio da formaçãoda família, não tem mais como princípio aquele da dominação do homem, maso amor onde homem e mulher se entregam mutuamente, em suas totalidades,amando-se como Cristo ama sua Igreja.

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2.2 Vaticano II e a Família

O Concílio Vaticano II é um marco da história da Igreja. Iniciou-se com odiscurso de abertura do Papa João XXIII, em 11 de outubro de 1963 e encerradacom a homilia do Papa Paulo VI em 7 de dezembro de 1965.

Existem três documentos do Concílio Vaticano II que apresentam umavisão sobre o matrimônio:

Lumem Gentium (LG) – descreve o matrimônio cristão.Gaudium et Epes (GS) – trata do matrimônio na problemática do mundo

atual e indica linhas gerais de pastoral.Apostolicam Actuositatem (AA) – refere-se mais especificamente da

missão apostólica da família.A constituição pastoral Gaudium et Spes é, porém, quem mais delineia a

doutrina sobre o matrimônio. Define o mesmo como instituição humana, confirmadapor lei divina. Define também os fins do matrimônio acentuando a aproximaçãoentre eles. De um lado existe o amor entre os esposos, com o chamado para aprocriação e educação dos filhos e, de outro, tal amor se integra ao plano deDeus e exige à fidelidade dos cônjuges (n° 48).

Este documento apresenta ainda o matrimônio como comunidade,“comunidade de amor”, “comunidade de vida e de amor” (GS n° 47). É vistocomo doação mútua dos esposos cuja finalidade se relaciona com a “própriaperfeição e santificação” (GS nº 48). O amor é colocado como o fundamento domatrimônio e este é descrito como “imagem e participação da aliança de amorde Cristo e da Igreja” (GS n° 48). Desta forma, o matrimônio não resulta desimples atração instintiva, inclinação erótica, nem mero sentimento ou paixão,mas compreende um “afeto da vontade” (GS n° 49). Liga-se a essa idéia deresponsabilizar-se pela felicidade do outro. A sexualidade é situada como dimensãodo amor conjugal, ou seja, “elemento e sinal específico da amizade conjugal”(GS n° 49).

Uma conclusão importante da Gaudium et Spes é esta de que a unidadee a indissolubilidade não são apenas condições do contrato, mas exigências doamor (GS n° 48).

Já na Apostolicam Actuositatem, o vaticano II trata da família como sujeitode evangelização e, como tal, comprometida com a promoção da justiça e dasobras de solidariedade com todos os que padecem necessidades (AA n° 11).

2.3 João Paulo II e a Família

Em 22 de novembro de 1981, preocupado com a situação das famílias,postas em questão a partir das rápidas transformações da sociedade e da cultura,

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o Papa João Paulo II escreve a exortação apostólica “Familiaris Consortio”. Nelao Papa afirma que o “matrimônio e a família constituem um dos bens maispreciosos da humanidade e da Igreja” (FC n° 1).

João Paulo II, ao analisar o contexto em que se encontram as famílias,afirma que na raiz dos fenômenos negativos sobre a família está a idéia corrompidade liberdade, resultante da busca de um bem estar egoístico. Chama a atençãopara os países de Terceiro Mundo, onde muitas famílias se encontram emsituações difíceis pois faltam-lhes os meios fundamentais para a sobrevivência,como alimento, trabalho, habitação, medicamentos... (FC n° 6).

Para o Papa a dignidade da mulherprecisa ser respeitada para a constituiçãosaudável da família (FC n° 24); o homem échamado ao dever de esposo e de pai (FCn° 25) e as crianças têm direitos de receber“estima profunda pela sua dignidadepessoal como também um grande respeitoe um generoso serviço pelos seus direitos”(FC n° 26). “O acolhimento, o amor, aestima, o serviço multíplice e unitário –material, afetivo, educativo, espiritual – acada criança que vem a este mundodeverão constituir sempre uma notadistintiva irrenunciável dos cristãos, emparticular das famílias cristãs” (FC n° 26).

Esta exortação apresenta aPastoral Familiar como uma forma deacompanhamento da Igreja às famílias,

descrevendo suas etapas, estruturas, responsabilidades e alternativas para oscasos mais difíceis, tais como: matrimônios mistos, separações, divórcios, ossem-família...

“Christifideles Laici” é uma exortação apostólica do Papa João Paulo II,datada de 30 de dezembro de 1988 que trata da vocação e missão dos fiéisleigos (Christifideles laici) na Igreja.

Nesta exortação o papa define a família, junto com o casal, como a primeiraexpressão da dimensão social da pessoa. Afirma que “Deus não criou o homempara deixar sozinho; desde o princípio homem e mulher os criou”. Para ele “ocasal e a família constituem o primeiro espaço para o empenho social dos fiéisleigos” (CL n° 40). Chamando-a novamente de “célula fundamental da sociedade”,o Papa apresenta como uma ação urgente a ser desenvolvida junto à cultura,

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aos meios econômicos e legislativos aquela de “assegurar à família a sua funçãode ser o lugar primário da humanização da pessoa e da sociedade” (Ibidem).

João Paulo II lembra que a civilização e a solidez dos povos dependem,sobretudo, da qualidade humana das próprias famílias. Daí a importância de serealizar ações apostólicas junto às famílias, uma vez que “o futuro da humanidadepassa pela família” (Ibidem).

2.4 Medellín, Puebla e Santo Domingo

O episcopado latino-americano realizou a sua primeira conferência em1955, no Rio de Janeiro, através de convocação do Papa Pio XII. Deste encontrosurge a necessidade da criação do Conselho Episcopal latino-americano(CELAM). O CELAM depois fará mais três Conferências Episcopais. Vamosvoltar agora nosso olhar sobre estas e suas preocupações com a família.

Conferência Episcopal Latino-americana de Medellín – 1968.

Esta Conferência partiu da constatação de que o continente latino-americanose encontra numa situação de miséria, como fato coletivo, constituindo umasituação de injustiça que brada aos céus. Existem muitas tensões com origemnos colonialismos interno e externo. De um lado as diversas formas demarginalidade, de exclusão social, desigualdades de classes, opressões, deoutro, as distorções do comércio internacional, as fugas de capital e evasões dedivisas no monopólio internacional do capitalismo selvagem.

Ao tratar da família o documento desta conferência constata que a idéiade família assume realidades sociológicas bem diversas. Constata que existemquatro fenômenos que marcam a família latino-americana:

a) Transição de uma sociedade rural a uma sociedade urbana. Aponta osurgimento da família do tipo conjugal;

b) O desenvolvimento econômico não beneficia todas as famílias. Ao ladode famílias ricas, existem as que se encontram em insegurança e marginalidade;

c) O rápido crescimento demográfico traz consigo problemas econômicos,éticos e religiosos;

d) Novo processo de socialização que transfere para a sociedade váriospapéis importantes que eram da família.

Designa o papel da família como: formadora de pessoas, educadora da fée promotora do desenvolvimento. Desta forma, sublinha como papel essencialda família: a evangelização e sua função social. A família é vista como umainstituição aberta e socialmente responsável. Adota expressões que fazemperceber a família como fator determinante para a vida e composição dasociedade; isto é, a sociedade é produto da família. A família é “escola de virtudes

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sociais”, “primeira experiência de uma sociedade humana sadia”, “escola domais rico humanismo”.

Faz uma recomendação final no sentido de que todas as famílias, abram-se às outras famílias, sobretudo as mais marginalizadas ou em processo dedesintegração, com abertura para a sociedade e a vida da Igreja.

Conferência Episcopal Latino-americana de Puebla – 1979.

O encontro dos bispos em Puebla teve como finalidade estudar aevangelização “no presente e no futuro da América Latina”. Os bispos percebemque os males de que a família latino-americana padece são conseqüência dosistema de pecado (o capitalismo liberal) que domina o continente. Para auxiliara família é preciso transformar tal estrutura opressora.

A família é considerada como primeiro centro de comunhão eevangelização; ela é sujeito e objeto da evangelização. É nela que se deveiniciar o processo de evangelização. Este documento ficou marcado também aodefinir a família como “igreja doméstica”. Nesse sentido ele dá uma importânciafundamental para a necessidade do surgimento da pastoral da família.

O documento chega a conclusões bem interessantes, como:a) Na personalidade do latino-americano existe muito apreço pelo vínculo

familiar. Ele valoriza o parentesco, a família, a amizade, a acolhida, a caridade eo desprendimento entre tais grupos;

b) Rápida transformação da civilização agrária em urbana e o crescimentodemográfico acabam desestruturando a vidadas pessoas e, inclusive, da família. Tambéma secularização urbana condiciona a práticareligiosa;

c) O desrespeito aos direitos humanospolíticos e sociais atinge a família. Os regimesditatoriais que se instalam no continente fazemda família uma vítima com tantos desa-parecidos, torturados, exilados, violações delares...;

d) O processo educacional, papel dafamília e da escola, sofre a influência deconceitos novos de consumo criando culturade individualismo, prazer e lucro e prestígio.

O documento de Puebla apresenta afamília como imagem de Deus, pois é umacomunhão de pessoas. Também é nela que a

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pessoa deve fazer sua primeira experiência de Igreja, isto é, “de comunhão nafé, no amor e no serviço ao próximo” (DP n° 487).

Conferência Episcopal Latino-americana de Santo Domingo – 1992.

Os bispos, neste encontro, percebem que a família vem sendo alvo deataques, como expressão de força da morte. Existem mudanças histórico-culturais que causam impacto na imagem tradicional da família. Há uma novamentalidade que leva a quebrantar os encantos, “os valores morais e éticos dafamília; famílias incompletas, casais em situação irregular e o crescentematrimônio civil sem celebração sacramental e uniões consensuais”. Existe umnúmero crescente de famílias em “situação de miséria e fome, em razão dedesemprego, da carência de vida digna, de serviços educativos e sanitários, desalários baixos, a partir do abandono dos idosos e crescente número de mãessolteiras”. Demonstram-se preocupações sérias com “distribuição massiva deanticoncepcionais, em sua grande maioria abortivos. Imensos setores demulheres são vítimas de programas de esterilizações massivas. Também oshomens sucumbem a estas ameaças!” (DSD n° 217).

Porém, o documento volta a definir a família como “igreja doméstica, esantuário da vida” (DSD n° 297)., célula primeira e vital da sociedade” (DSD n°64). É uma instituição de origem divina. Homens e mulheres “são chamados aviver no matrimônio o mistério da comunhão e relação trinitária”. Eles “sãochamados ao amor na totalidade de seu corpo e espírito” (DSD n° 212).

Os bispos voltam a insistir na idéia de que é preciso fazer da pastoralfamiliar uma prioridade básica, sentida, real e atuante.

A missão da família: cuidar, revelar e comunicar o amor e a vida, atravésde quatro metas fundamentais (DSD 214):

a) Viver, crescer e aperfeiçoar-se como comunidade de pessoas. É lugarprivilegiado para a realização pessoal junto com os seres amados.

b) Ser como “santuário da vida”, serva da vida; trata-se tanto da procriaçãocomo exigência de transmissão e educação de valores humanos e cristãos.

c) Ser “célula primeira e vital da sociedade”; isto é, promotora dodesenvolvimento, protagonista de uma autêntica política familiar.

d) Ser “Igreja doméstica”, que acolhe, vive, celebra e anuncia a Palavra deDeus.

2.5 A CNBB e a Família

A Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) constantementetem manifestado sua preocupação quanto aos rumos que a família vem tomando

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no país.

Na XIII Assembléia Geral da CNBB, aprovou-se um documento intitulado:“A Família – Mudanças e Caminhos” (Estudos da CNBB, n° 7). Este estadocoloca a família dentro da crise do mundo e as dificuldades com o trabalho, aeducação, a moradia, a alimentação e os Meios de Comunicação Social. Taismudanças trazem uma família nova, ou uma família em processo evolutivo comredefinição dos papéis do homem e da mulher, da igreja, da sociedade e doEstado. Manifesta preocupação com a “alarmante porcentagem de criançasnascidas em lares formados ao acaso, sem amparo legal, religioso, civil, ousimplesmente humano” (Ibidem, n° 94).

Já em sua XIV Assembléia Geral, em 1974, preocupada com o avanço dopensamento divorcista, assim resumia a tríplice missão da família: formadora depessoas, evangelizadora e construtora da sociedade (Doc.3, n° 2).

Os Bispos do Brasil reafirmam que se a Igreja defende a perenidade daunião conjugal, alicerce da estabilidade da família, é porque recebeu estemandamento do Senhor que, no Evangelho, inculca a indissolubilidade domatrimônio (Ibidem, n° 31-32). Também se perguntam: “Os filhos ou os pais?” Eafirma que se o amor é a capacidade de encontrar felicidade no serviço ao outro,é por aí que tem início a morte do amor. Os filhos são vítimas do egoísmo dospais (Ibidem, n° 27).

No “13° Plano Bienal de Atividades do Secretariado Nacional” a CNBB,referindo-se ao “Setor Pastoral Familiar”, afirma considerar a família como“fronteira decisiva da nova evangelização, Igreja doméstica, santuário da vida,célula vital da sociedade e da Igreja, primeiro espaço de evangelização eengajamento social, coração da civilização do amor” (pg 177). Lembra a afirmaçãode João Paulo II de que “o futuro da humanidade passa pela família” e que esta,portanto, deve ser a grande prioridade pastoral. A intenção é de intensificar apastoral junto às famílias.

O Documento 61 da CNBB “Diretrizes Gerais da Ação Evangelizadora daIgreja no Brasil 1999-2002”, traz dados totalmente novos para suas manifestações:diminui o número de crianças e cresce o número de idosos na populaçãobrasileira, acentua-se a diminuição da natalidade que se associa com a quedade fecundidade da mulher brasileira, passando de 4,4 filhos em 1980 para 2,2filhos por mulher em 1991. Percebe também que o empobrecimento exerce umapressão que faz aumentar, nas famílias pobres ou de classe média baixa, onúmero das pessoas que trabalham; aumenta especialmente a mão de obrafeminina e é expressivo o número de crianças e adolescentes no mercado detrabalho. Faz referência explícita aos casos de violência doméstica contracrianças e mulheres, fato que gera, inclusive os “meninos de rua” e a formação

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de “gangues de adolescentes (pg 73ss).

Neste último documento aparece a necessidade de valorizar as diversasdimensões da pessoa humana e da família. A Igreja se dá conta de que muitasfamílias não sabem ou não querem propiciar a educação na fé.

2.6 Murialdo e a Família

São Leonardo Murialdo nasceu (Turim - Itália, 26 de outubro de 1828) emuma família extremamente religiosa. Seu pai Leonardo e sua mãe Tereza criaramos oito filhos num clima de amor, segurança, compreensão e fé em Deus.

Foi em sua família que Murialdo experimentou, desde sua mais tenraidade, as virtudes do amor, do respeito e da solidariedade.

Murialdo costumava repetir também que “devemos formar uma bem unidafamília”. Ele quis dar uma estrutura tipicamente familiar às instituições. Costumavausar também expressões e atitudes próprias da vida familiar junto às suas criançase adolescentes empobrecidos: “Só tenho uma ambição, a de amá-los comofilhos, e a de ser amado por vocês como pai”. Apresentava também como modelopara a vida em família a “Família de Nazaré”.

Este santo tinha uma metodologia de ação pedagógica que se aproximavamuito do jeito familiar de cuidar do outro. O educador deveria ser para cadamenino tal qual “amigo, irmão e pai”. A preocupação com a educação das criançase adolescentes que viviam em situação de abandono estava relacionada com ofator social que vinha desmantelando as famílias. Percebia ainda que não erasuficiente dar-lhes uma casa, precisava oferecer-lhes uma família.

Atento aos sinais de seu tempo, Murialdo afirmava: “Não há no mundoalgo mais belo do que a família, uma família na perfeição do seu conceito. Famílianão é só um agregado de pais e filhos, mas de pais e filhos que convivam paraum amor mútuo que os une; amor que leva à convivência e que, mesmo quando

esta não é mais possível, aindaunem os pais aos filhos e os filhosaos pais”. Estava convencido,inclusive, que num ambiente ondeexiste a familiaridade, a alegria ea sinceridade, cria-se tambémsenso de liberdade, deresponsabilidade, de confiança ede colaboração. Afirma que oamor é um verdadeiro princípiopedagógico, gerador de confiançaentre os membros de uma família.

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3. A FAMÍLIA E A PROMOÇÃO DA VIDA HUMANA

Transformando a Realidade

Crianças e adolescentes, quandointerrogados sobre pessoas significativas parasuas existências, dificilmente deixam de citar, emprimeiro lugar, seus pais e seus irmãos.

Vimos que a família se encontra numquadro que parece agravar ainda mais a dificuldadede pertencer a um núcleo de promoção da própriaidentidade, a construção da auto-estima e umponto de referência para a própria existência.Também vimos que a Igreja, a Bíblia e São Leonardo Murialdo insistem comveemência sobre a importância da família e a recuperação do seu significadopara as pessoas e a sociedade.

A realidade que às vezes se apresenta em trevas é a mesma realidadeque acende luzes para tantas possibilidades. Existe o novo, o diferente, o espaçodaqueles que, armados da coragem, se arriscam pelos caminhos inusitados doamor. Existem ainda os que acreditam que o amor verdadeiro, cristalino, o amorque nasce e se nutre no encanto enamorado de pessoas é real. Que contradizemtodas as teorias e defesas que afirmam que a família ficou no passado. E quenão fazem isto com discursos ou livros, mas que vão escrevendo suas páginasde história real no dia a dia de suas convivências. É verdade que contem algunsdissabores, mas que tem tudo da alegria e do prazer de amar e de se sentiramado na família.

3.1 Construindo Vida de Família

A família é, entre todos os grupos humanos, aquela que desempenha umpapel primordial na transmissão da cultura. Vemos que as tradições espirituais,a manutenção dos ritos e costumes, a conservação das técnicas e do patrimôniosão disputas de grupos sociais. Porém, cabe à família a primeira educação, arepressão dos instintos, a aquisição da língua...

Os filhos, quando convivem com pais capazes de viver a dimensão doperdão na alegria e na mais completa comunhão, gostam de estar em casa,sonham também em ter uma família, crescem seguros de si, carregados deauto-estima e compreendendo o significado do amor conjugal.

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A família tem grande influência sobre o modelo a ser seguido pelo sujeitono desempenho de seu papel social e das normas e valores que controlam talpapel. A menina, por exemplo, terá forte exemplo em sua mãe de como comportar-se como mulher e o que se espera dela na sociedade. Assim acontece tambémcom o menino e sua relação com o pai.

Já observamos que a atual família passa por terrenos confusos econtraditórios. Para fugir do modelo tradicional de família, muitos radicalizarama liberdade concedida aos filhos. Enfraqueceu-se a figura da autoridade.

Quando falamos em família também é importante lembrar que dentro dela,na forma de concebê-la como ideal, vivem homens e mulheres. A mesma deveser, assim sendo, analisada através da ótica das relações de gênero. Aí se tornaimportante a construção de um novo relacionamento entre mulheres e homens,fundado no amor e no companheirismo. Trata-se da importância da abertura desi para outro, que é feita com firmeza, com segurança, sim, mas também commuito amor entre as pessoas.

O conjunto das relações que acontecem entre os membros da família nãofica restrito às paredes da casa . Abre-se para o mundo. Aí é também verdadeque essa abertura ao mundo das relações mais amplas, que extrapola a intimidadeda família, que dinamiza e sustenta essa sua intimidade.

As atividades profissionais e pastorais, o voluntariado e a participaçãopolítica, a educação de todos filhos alargam o compromisso com a prática dajustiça, da solidariedade e da partilha. Tais atitudes abrem a família para o mundo,inserem os filhos num novo paradigma de convivência e relações humanas. Nasceuma nova ética que possui uma “regra de ouro”, pela qual as pessoas devemtratar as outras da mesma forma que gostariam que fossem tratadas (Cfr. Mt7,12; Rm 13,8-10).

O desenvolvimento dacapacidade de perdão mútuo é outroexercício quotidiano no amor familiar.Basta lembrar que existe umcomponente primordial do amor paraser levado em consideração: “Quemama perdoa”. A capacidade de perdoar,e perdoar sempre, sem reservas, é umaexpressão de amor incomensurável,porque se realiza na mais profundagratuidade. Não admite cobranças. Épreciso, inclusive, lembrar que perdoarnão significa esquecer, não dar valor ao

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acontecimento ou anular-se frente aos outros. É lembrar, sim, não para se vingardepois, mas para compreender, superar e amar mais.

3.2 Família: Construção da Esperança e da Vida

É bem verdade que estamos assistindo a uma desagregação da família.Mas já não é mais suficiente acomodar-se nesta constatação. Trata-se danecessidade de atuar na formação das pessoas, dos casais e dos jovens. Ocrescimento da consciência dos valores da convivência familiar se multiplica aoredor de tantas experiências humanas desastrosas de pessoas que tiveramsuas famílias perdidas neste emaranhado de mudanças sociais.

Outro fator importante de luta é aquele da criação de condiçõeseconômicas e sociais de que a família necessita. Fica muito difícil esperar famíliasestáveis e equilibradas quando não existe lar, não existe emprego, saúde ouescola para os filhos.

Também é verdade que a família brasileira vem sendo moldada de forapara dentro, através dos Meios de Comunicação Social. Especialmente a televisãovem apresentando padrões comportamentais totalmente contrários aos valorestradicionais da família vividos pelo povo. Eles acabam impondo valores e culturasexternas aos jovens sem nenhum discernimento quanto à fundamentação doamor. Um novo padrão comportamental, baseado no imediatismo do prazer quese alia ao egoísmo, entra de forma muito sutil no coração dos adolescentes ejovens.

A maneira de viver o amor na sociedade atual expõe casais, cada vez emmaior freqüência, ao fracasso conjugal. E a sociedade, que criou o problema,achou também a solução: o divórcio. Mas não resolveu problemas sérios.Dissolveu um vínculo anterior existente, mas não ofereceu carinho, aconchego ecuidado para os filhos. Isto tornou-se não tão importante como é aquela novachance ”de ser feliz” para os dois componentes do casal. Estudos e a experiênciatêm demonstrado que pais que não conseguem um equilíbrio harmonioso emsuas relações terão filhos com dificuldades nas suas relações sociais. Ou seja,é bem verdade que o testemunho arrasta e convence mais que muitas palavras.Quando o ambiente familiar se nutre do respeito, da confiança e da harmonia,filhos se convencem de que esta forma de viver vale a pena e que ela é possível.Que é isto que se quer construir. O que dizer então da dificuldade que encontrarãoos filhos de pais divorciados em seus círculos de relações amorosas?

Também é verdade que muitos casamentos, segundo o próprio ensinamentoda Igreja, são possíveis de nulidade uma vez que sua realidade interior não estásuficientemente constituída. Condições humanas, psíquicas e religiosas ondese expressou o consentimento matrimonial podem ter sido insuficientes para

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sua validade. Mas tudo isso só tem demonstrado uma urgente necessidade depreparação e consciência das pessoas a respeito do matrimônio.

Um outro tema, bastante carregado de polêmicas, tem sido aquele doplanejamento familiar. Planejamento familiar não é atitude antinatalista. A Igrejao reconhece como necessário. “O critério fundamental é a atitude de amor. Todoo amor é fecundo. Os pais devem planejar ter os filhos que seu amor é capaz dechamar à vida e educar como adultos sadios e conscientes” (Queiroz, D. AntônioCelso de. In:“Família: Fonte de Esperança e de Vida”. Vida Pastoral, n° 174, p3.). A Igreja costuma pôr a grande força de seu ensinamento na generosidadedo amor.

A vida é um dom precioso. A família está a serviço da vida e toda a vida ésagrada. A busca do prazer a qualquer custo, a propaganda e o mercado doscontraceptivos que ferem a dignidade do ser humano fazem também com quemuitos católicos se coloquem contra os ensinamentos da Igreja. É preciso lembrarque por de trás dos ensinamentos da Igreja está a vontade de salvar a dignidadedas pessoas humanas e não banalizar a vida.

A família é sempre uma fonte de esperança porque é fonte de vida. Valelembrar que o Filho de Deus quis nascer numa família para começar a redençãodo mundo. Se isto aconteceu é porque ele reconhecia na família o primeiroveículo da graça que pode salvar.

3.3 Ética Familiar na Defesa do Amor

Ao se falar de família, também falamos em matrimônio e deslocamosnosso olhar para o coração das pessoas, onde mora o amor. Não podemosdeixar de lado o amor conjugal. Está correta a afirmação de que o amor é um só.Como também está certo afirmar que existem várias expressões de amor: oamor paterno, amor materno, filial, misericordioso, infinito, pessoal, terno, atual...Contudo, existem alguns modos de amar comuns, chamados também devocações ou estados de vida, como o matrimônio e a vida religiosa. Aqui queremostratar do amor conjugal. E o matrimônio é a dimensão oficial, jurídica, pública e,inclusive, religiosa do amor conjugal.

O amor conjugal nem sempre foi suficiente para sustentar um matrimônio.Acabou-se o período em que o matrimônio era considerado um “contrato”, ondese oficializa a chefia do homem sobre a mulher. Enfraqueceu-se a pressão socialque “obrigava” esposo e esposa manterem-se fiéis um ao outro “até que a morteos separe.” A mulher já não aceita tal submissão; aparecendo dificuldades derelacionamento muda-se de parceiro(a). As relações são fundamentadas emamizade, companheirismo... algo parecido com o amor; mas não é amor. O que

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mesmo vem a ser o “amor conjugal”?

“O amor conjugal é aquela forma de amor na qual um homem e umamulher se entregam um ao outro de modo total, fiel, definitivo e exclusivo. Esteamor não é domínio, mas entrega e acolhida totais: corpo, sexo, tempo, espaço,habilidades, gostos, inteligência, vontade, essências, projetos, qualidades edefeitos” (Conto, Hildo. “O Amor Conjugal”. In: Mundo Jovem. Ano XI, Nº 327,Junho de 2002, p 11). Quando duas pessoas se amam verdadeiramente elasdesejam que este amor não se acabe. Quem ama também quer ser todo dapessoa amada. Compreende-se, a partir destas afirmações, que não é asociedade, ou a Igreja, que impõem a fidelidade do amor. Também não é quemama. Quem impõe a fidelidade é o próprio amor. É da essência do amor afidelidade, bem como, a exclusividade: no amor conjugal um é para o outroalguém único e insubstituível, centro de atenções e de dedicações. Se o amorconjugal é exclusivo, não significa que ele é excludente. A nova unidade que secompõe pelo amor conjugal se expande e se irradia em várias direções. Esseamor se alarga formando a família, que por sua vez se estende à sociedade.

O amor conjugal une pessoas sem confundi-las. Formar unidade nãosignifica compor uniformidade. Porque o amor se enriquece com as diferenças.É isto que favorece nas partes seu crescimento, sua identidade, a verdade sobrecada um e a própria liberdade. Sem temer as diferenças o amor conjugal passaa admirá-las. Elas são, muitas vezes, a razão do encantamento e maiorenamoramento. Pode entender, desta forma, que o amor conjugal não é fecundosó quando gera um filho, mas também quando é motivo de crescimento humano.

É claro que o amor conjugal é um projeto de risco. Mas não é loteriacomo costuma-se defini-lo. Revelar-se e entregar-se totalmente ao outro é umaforma de expor-se e fragilizar-se. Este amor libera a verdade. Entrar nas verdadede si e do outro é correr riscos. A verdade às vezes é carregada do riso, daternura, da carícia, do prazer, do maravilhoso. Outras vezes se reveste do perverso,da crise. Mas a crise será possível de superação por causa da clareza do projetoconjugal. Seu fundamento não é o coleguismo, a amizade, o companheirismo; éo amor. Existe um sonho comum que vem sendo perseguido há algum tempo.No quotidiano o perdão e a fidelidade serão transparentes. A fidelidade seráesse persistir no caminho do conjugal que faz com que o amor seja a tona daconvivência. Não existirão cobranças, nem satisfações necessárias. O egoísmodesaparece e o serviço ao outro dá a tônica das atenções. Então o que é maisimportante passa a ser a grandiosidade do sonho a ser construído juntos do queas dificuldades que aparecem.

Então a vida conjugal é um processo de libertação mútua. Amar é ajudaro outro a ser verdadeiro, autêntico e livre. É por isso que o amor conjugal não éalgo que se improvisa. Surge de discernimento, de decisões conjuntas, de saber

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onde se está, o que se quer e onde se pode chegar. É um processo que se fazem etapas. Quando uma ou outra etapa são queimadas compromete-se o projetotodo. Crer num projeto assim é amá-lo e o amor é possível. Existe esperança narelação entre o homem e a mulher por causa deste amor.

3.4. Porque Eles têm Famílias Empobrecidas...

O Brasil vem vivendo umverdadeiro “apartheid” entre ricose pobres. Ele é sutil mas notórioespecialmente nas grandescidades brasileiras. Ali grandeparte da população vive confinadaem cortiços, favelas e casasprecárias das periferias,excluídos do acesso a bens eserviços, como também dosequipamentos da própria cidade.

Barracos, cômodos doscortiços, viadutos ou pontes... osbairros das periferias, tambémchamados de favelas, não garantem nenhuma privacidade, quase sempre acabamdesfazendo os vínculos familiares. O mesmo se pode dizer da condição deconfinamento da pobreza em que vivem essas famílias. As políticas de saúde,de educação ou mesmo de lazer quase sempre acabam reproduzindo o quadrosocial aí presente. Cumprem apenas uma presença compensatória e não depromoção. Tais serviços são pauperizados, de pouca qualidade, realizados deforma muito fria, desanimadora. Os profissionais que se deslocam para essasregiões são subalternizados em sua categoria e sofrem do mesmo mal que apopulação que atendem. Forma-se um quadro de alienação e desânimo queencontram “consolo” em atos infracionais, na bebida, na cola de sapateiro ounas drogas para as crianças e adolescentes...

Entre os pobres se consegue manter a convivência familiar somente aduras penas. Mas esta ainda é uma estratégia indispensável para a sobrevivênciafísica e afetiva. Na maioria das vezes se forma uma rede de conterrâneos eparentes que exercitam a solidariedade entre si. É outra condição para asobrevivência de famílias em situação de pobreza e discriminação.

Essa mesma solidariedade se expressa através de empréstimos parapagar prestações, conta de luz e de água, compra de remédios para alguém queestá doente, cuidar das crianças dos outros em situações emergenciais. São

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situações a que todos estão sujeitos e a única forma de enfrentá-los é com asolidariedade.

Esses grupos familiares extensos, com agregados de parentes ouconterrâneos, como também as pequenas comunidades rurais, criam vínculos esistemas próprios de auto-defesa e sobrevivência que vão garantindo acontinuidade de sua gente. Por outro lado, também estas famílias vêmassimilando valores e padrões de reprodução social: geração de menos filhos,mulher entrando no mercado de trabalho...

Aqui também é comum encontrarmos casos de solidariedade apadrinhada.Trata-se daquela situação em que um membro da família mantém laços maispróximos com alguém da classe média ou alta, geralmente com quem trabalha,por exemplo: empregado doméstico, porteiro de prédio, jardineiro, varredor darua. Esse vínculo acaba assegurando um canal de doação de roupas, remédios,eletrodomésticos, material escolar... coisas que são fundamentais na composiçãodo orçamento doméstico de quem está em situação de pobreza.

Outra forma de se fazer presente através da solidariedade junto às famíliaspobres é aquela da missionariedade das igrejas. A Igreja é sempre uma portaque acalenta a esperança. Costuma oferecer, através de seus programas pastoraisum suporte espiritual, afetivo, emocional e material. Oferece desde cestasbásicas, até recursos para remédios, viagens, auxilia na vaga da escola para acriança, na organização para a conquista de benefícios e políticas públicas.Para esta população é a instituição que ainda detém a maior credibilidade. É ocanal da providência, dos serviços assistenciais organizados e de defesa dajustiça. Outras vezes, as obras da Igreja, se tornam o veículo de cumplicidadecom a pobreza, amortecedores de revolta e indignação com a injustiçainstitucionalizada. Por isso se torna importante a criação de rede de serviçoscomunitários como apoio às famílias.

As famílias têm sido ilustres desconhecidas das políticas públicas dopaís. Salvo algumas raras exceções que acontecem em alguns municípios,como o programa “Renda Mínima” as atenções prestadas são ainda muitoconservadoras e fruto de uma cultura em que o Estado é tutelar e dominante.Costuma-se preferir a ajuda através de cesta alimentar, vale gás, ticket leite,etc... Um exemplo ainda mais típico é aquele de se abrigar em “orfanatos” oucasas-abrigo crianças vítimas de maus-tratos, abandonadas ou em risco deabandono.

Neste sentido um programa que tem dado excelentes resultados em outrospaíses é aquele da guarda de crianças em famílias substitutas dentro da própriacomunidade. Esta opção torna-se mais recomendável para a criança e menosonerosa para o Estado. Se é mais eficiente e mais barato, por que não se faz?

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Por mais justificativas que se busque encontrar esquece-se do acompanhamentoe mesmo, do papel normatizador, de assessoria e controle do Estado.

Outra alternativa de demonstração de promoção e solidariedade paracom as famílias pobres é aquela do auxílio para a proteção integral de seusfilhos. Aí aparecem programas oficiais de governos que apresentam alternativasde lazer, recreação aprendizagem profissional. Mas é no setor não governamentalque se tem colhido os melhores resultados. Muitas vezes a preocupação maiortem sido aquela de oferecer alternativas ocupacionais ao pouco que sobra parao turno contrário ao da escola. Com os mais diversos programas são milharesde crianças e adolescentes atendidos. A participação governamental é sempreirrisória. Recursos financeiros oriundos dos Fundos Municipais ou estaduaisdos Direitos da Criança e do Adolescente são também sempre muito escassos.Estas instituições, na maioria das vezes, atuam com o financiamento de institutosreligiosos e Igrejas, com a responsabilidade social de algumas empresas, oumesmo, com recursos do exterior.

É também bastante comum encontrar a participação de voluntários ou degrupos de apoio, como os “Leigos Amigos de Murialdo”. Esta participação não-governamental na complementariedade das políticas públicas, que muitas vezesse apresenta como substitutiva delas tem também se voltado para as famílias. Afamília passou a ser vista como horizonte de possibilidades novas no cuidado eeducação dos filhos. Tornou-se concepção bastante comum a afirmativa de quese torna quase impossível um trabalho de promoção de crianças e adolescentessem o envolvimento da família ou daquilo que ainda possa ter restado do grupofamiliar. Bem como, que é muito difícil ou impossível mesmo para qualquerinstituição conseguir substituir o grupo familiar. Que, aliás, este não seria seupapel.

3.5 Pedagogia de Família – Limites com o Coração

Assim como a escola tem seu projetopedagógico e trabalha de acordo com uma visãode futuro, a família é chamada a ter clareza doambiente que deseja criar para a convivência deseus membros. Mas isto ainda não seriasuficiente. É importante também definir seusdesejos que estarão sendo alimentadosconstantemente pelos mais diversos estímulosinternos e externos. São eles que trarão semprepresente a visão de futuro, ou seja, onde se querchegar com a constituição do grupo.

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Família: Lugar de Construção

É bem verdade que a inteligência utilitarista ganhou muito espaço nasreferências sociais das pessoas humanas. Essa inteligência se define,especialmente, como a concentração de todas as energias ao redor da eficiênciaprodutiva, da capacidade de produzir bens e motiva as pessoas ao seu consumo.Ela atua de acordo com uma metodologia competitiva e de valorização pessoala partir da eficiência da lógica do mercado. Contam aquelas pessoas que têmmaior poder de consumo. Não se pode negar que a racionalidade técnico-científicatrouxe grande progresso material no último século de história. Mas foi ela tambémque acabou formando alguns governos fortes com a promoção de guerras locaise mundiais e com o uso de um poderoso arsenal nuclear. Foi graças a elatambém que vimos aumentar a destruição da natureza, o número de miseráveise famintos, o consumo de drogas, a violência... Ela acabou confundindo valores,liberdades e limites.

Aí poderíamos nos perguntar: mas o que isto tudo tem a ver com a vida dafamília, com as suas relações e a educação dos filhos? E o pior é que tem muitoa ver com ela. As pessoas vivem continuamente fazendo escolhas. Estas escolhasenvolvem decisões e as decisões dependem do uso da liberdade. Para fazeruma escolha acaba-se afirmando algo, enquanto se nega um outro. Neste sentidoé que a liberdade tem contraponto no limite. Limite é saber até onde se pode ir,o que se pode ou não fazer. E isto não é tolher a liberdade. É dar-lhe valor esignificado.

A vida vem apresentando às crianças e adolescentes, bem como aosjovens, que o limite para os comportamentos a ser regulado pelo consenso oupela regra máxima do “todo mundo age assim”. A família é um grande espaçode educação para as escolhas e a manutenção de uma autonomia para asmesmas. O ambiente familiar é chamado a ser espaço de educação para aautonomia de pensamento e de ação, enquanto também é capaz de serquestionador das escolhas. Os pais não podem ser chamados a resolver osproblemas dos filhos, ou a substituí-los em suas tensões. O apoio não podesignificar protecionismo.

Aqui também entra a dimensão dos limites. Os pais precisam demonstrarque os limites fazem parte das escolhas. Apresentar limites para as escolhas écontrolar a permissividade, diferente da liberdade. Os limites, não a permissividadesimples, é que dão aos filhos a sensação de segurança. Filhos e filhas quenunca encontraram, por parte dos pais, resistências para suas escolhas corremriscos sérios de não se sentirem amados, de não sentirem respeito e admiraçãopara com os mesmos.

É bem verdade que muitos pais, em nome daquela inteligência utilitaristase desligam de compromissos afetivos com o ambiente familiar. Entendendoque o trabalho, os negócios, ou o bem-estar da família (construído a partir de

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bens materiais) era aquilo que havia de mais importante para suasresponsabilidades, muitos pais acabam perdendo seus filhos. A paciência, aternura, a constância e a persistência não conseguem espaço nos ambientesonde o coração se apagou.

Quando o lugar da família não consegue oferecer vínculos familiares deafeto, de confiança e cumplicidade desde a primeira infância fica muito difícilpara os filhos quererem ficar em casa. Os diálogos, a percepção da presença epartilha dos desafios, dos sonhos e alegrias são o constante convite para apermanência entre os seus. Isto não significa que o mundo externo deva serisolado. Este proceder aponta para a segurança e a busca de repostas paraangústias e aflições. Estas influências são bem mais positivas do que aquelasque podem ocorrer devido às constantes saídas noturnas dos filhos que nemsempre avisam onde estão, quando voltam e estão sujeitos a vários incômodosvitais.

Neste sentido é que se afirma uma pedagogia familiar. Ela se faz deforma consciente, com um projeto de educação dentro da família que apontapara uma visão de futuro onde os membros desta família são cidadãos livres,atentos aos seus deveres, solidários e promotores da justiça. O projetopedagógico da família com fundamentado na educação do coração é essemovimento de ida até o coração do outro (pais e filhos) como relação circulantedo amor. Suas expressõesaparecem nas pequenascoisas feitas em família,mas que fazem um bemenorme ao coração detodos. São exemplos ascomemorações deaniversários, celebraçõesde conquistas dos pais oudos filhos, festas sociais,lazer, passeios... Lembrara importância do quartoque foi arrumado, o denteescovado, o tênis lavado,a roupa suja posta no cesto, sem que tenham recebido recomendações, o abraçocarinhoso, coração a coração, que acontece pela simples vontade de abraçar.Assim, afeto e amor, na família, nunca devem ser economizados.

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Família: Lugar de Construção

Conclusão

Existem algumas pessoas que são maravilhosas. Elas sabem cativar;estão atentas e aparecem na hora certa. Não lhes custa ajudar. Servir lhes dáprazer. Existem muitas pessoas que gostam de estar bem próximos dessaspessoas maravilhosas. E acabam se contagiando por elas. Acabam se tornandotambém maravilhosas. Outras pessoas gostam de se aproximar delas, conviver,partilhar, aprender. E também acabam se tornando pessoas maravilhosas. Eisso parece que vai gerando um círculo que se amplia cada vez mais. Possívelde existir - em construção.

A família é isso mesmo. É essa construção da vida. É o lugar da construçãode pessoas maravilhosas. Por isso ela precisa de pais maravilhosos que criarãofilhos maravilhosos que terão outros amigos maravilhosos porque aqueles tambémtêm pais maravilhosos.

Não, não é a família que se encontra em crise. Está em crise o significadodo viver. Perdeu-se o sentido da vida. Viver para quê? Para consumir? Paratrabalhar? Para ser feliz? Sozinho? Estão em crise as pessoas que perderamsuas referências pessoais, que se encontram sem projeto de vida; pessoascuja escala de valores confundiu-se e inverteu-se para colocar o próprio “eu”como a única razão de viver. Então o “nós” que é próprio do amor desapareceue deixou pessoas em crises muito sérias.

Não, não é a família que está em crise. Estão em crise tantos filhos queperderam suas famílias. Estão em crise filhos que não conseguem atenção,carinho, amizade ou aconchego na própria casa. O cuidado e a compaixãopassaram a ser conquistas possíveis em espaços bem distantes da própriacasa. E, quase sempre, mais se tornaram ameaças do que cuidados ecompaixões. É verdade, estão em crise tantos filhos que tiveram seus paisdiscutindo a necessidade de serem felizes, de construírem seus próprioscaminhos, sem interferências, “premiados” pela necessidade moderna do divórcio.Que pena! Não encontram o caminho da felicidade, e perdem os filhos.

Não, não é família que está em crise. Está em crise a sociedade queperdeu a sua instituição mais segura e firme de construção de cidadania e depessoas humanas livres e seguras. Mas tem culpa essa sociedade porque elaafirmou que a liberdade, o prazer, o poder e o ter são as primeiras e únicasnecessidades que precisam realmente ser satisfeitas. E matou a singeleza doamor. Esfacelou muitas famílias.

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É por isso que agora todos nós, pais, filhos, sociedade começamos anos dar conta de que a família é o horizonte. É para lá que precisamos caminhar.Arriscando tudo no amor. Porque ele ainda é o fundamento de suas relações.

Ainda é possível acalentar sonhos de crianças e adolescentes, reavivardesejos e promessas de pais porque existem muitas pessoas com vontade deviver. É necessário criar um novo jeito de viver, de acreditar em novaspossibilidades... É necessário recriar pessoas que sejam maravilhosas. É preciso,mais do que nunca, insistir na idéia de que o amor existe e que é um dom, umpresente que se plenifica enquanto capacidade de fazer o outro feliz. É nestesentido que continuamos acreditando ainda mais na família identificando-a comolugar de construção.

Oração da Família

Senhor, nós vos louvamos pela nossa família e agradecemos a vossapresença em nosso lar. Iluminai-nos para que sejamos capazes de assumirnosso compromisso de fé na igreja e de participar da vida de nossacomunidade. Ensinai-nos a viver a vossa palavra e o novo mandamentodo amor. Concedei-nos a capacidade de reconhecer nossas diferenças deidade, de sexo e de raça para nos ajudarmos mutuamente, perdoarmosas fraquezas, compreendermos nossos erros e vivermos em harmonia.

Dai-nos, Senhor, saúde, trabalho com salário justo e um lar ondepossamos viver felizes. Ensinai-nos a tratar bem os mais necessitados epobres e dai-nos a graça de aceitar com fé a doença e a morte quandose aproximarem de nossa família. Ajudai-nos a respeitar e a incentivar avocação de cada um e também daqueles que Deus chamar a seu serviço.

Que em nossa família reine a confiança, a fidelidade, o respeitomútuo e que o amor nos una cada vez mais.

Permanecei em nossa família, Senhor, e abençoai nosso lar, hoje e

sempre.

Amém.

São Leonardo Murialdo.

Rogai por nós e por nossas famílias!

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Família: Lugar de Construção

Bibliografia

KALOUSTIAN, Sílvio Manoug (Org). Família Brasileira a Base de Tudo.Cortez Editora, Unicef, Brasília – DF, 1994.

MINUCHIN, Patrícia. COLAPINTO, Jorge. MINUCHIN, Salvador.Trabalhando com famílias Pobres. Editora Armed, São Paulo,1998.

SANTOS, B. Beni dos. Família – Libertação Fundamentos de Pastoralda Família. Edições Paulinas, São Paulo, 1978.

TELES, Sá. Pedagogia Familiar. Edições Ianamá

WAGNER, Adriana (Coord). Família em Cena – Tramas, Dramas eTransformações. Ed. Vozes, Petrópolis, 2002.

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História de uma Família

Esta história é sobre um soldado que finalmente estava voltando para casa

depois de ter lutado no Vietnã. Ele ligou para seus pais em São Francisco e disse:

Mãe, pai, eu estou voltando para casa, mas eu tenho um favor a pedir: gostaria de

levar um amigo comigo.

- Claro! Nós adoraremos conhecê-lo!!!

- Há algo que vocês precisam saber. Ele foi terrivelmente ferido na luta, pisou em

uma mina e perdeu um braço e uma perna. Ele não tem nenhum lugar para ir, eu

quero que ele vá morar conosco.

- Eu sinto muito em ouvir isso, filho, nós talvez possamos ajudá-lo a encontrar um

lugar para ele morar:

- Não, mamãe e papai, eu quero que ele more conosco.

- Filho, você não sabe o que está pedindo! Alguém com tanta dificuldade não seria

bom para nós. Nós temos nossas próprias vidas e não podemos deixar que uma

coisa assim interfira em nosso modo de viver. Acho que você deveria voltar para

casa e esquecer este rapaz. Ele encontrará uma maneira de viver por si mesmo.

Neste momento o filho desligou o telefone. Os pais não ouviram mais

nenhuma palavra dele.

Alguns dias depois, no entanto, eles receberam um telefonema da polícia.

O filho deles havia morrido depois de ter caído de um prédio. A polícia acreditava

em suicídio. Os pais, angustiados, voaram para o local e foram levados para o

necrotério a fim de identificar o corpo do filho. Eles o reconheceram, mas para o

horror deles, descobriram que o filho tinha apenas um braço e uma perna.

Os pais, nesta história, são como muitos de nós. Achamos fácil amar aqueles

que são bonitos ou que nos incomodam ou nos fazem sentir desconfortáveis. Ficamos

longe dessas pessoas e de outras que não são saudáveis, bonitas ou espertas.

Precisamos aceitar as pessoas como elas são e ajudar a todos a compreender

aquelas que são diferentes de nós.

Há um milagre chamado amizade, que mora em nosso coração. Você não

sabe como ele acontece ou quando surge. Mas, você sabe que este sentimento

especial aflora e percebe que a amizade é um dos presentes mais preciosos de

Deus.

Amigos são como jóias raras. Eles nos fazem sorrir e nos encorajam para

o sucesso. Eles nos emprestam um ouvido, compartilham uma palavra de incentivo

e estão sempre com o coração aberto.Autor desconhecido

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