Filosofia Da Imagem
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A Utilizao da Imagem para discutir questes complexas de Filosofia: Representao, Crise da
Representao e Desconstruo
A Utilizao da Imagem para discutir questes complexas de
Filosofia: Representao, Crise da Representao e
Desconstruo
Dirce Eleonora Nigro Solis1
Resumo: Este texto, originalmente apresentado na II Jornada sobre Filosofia
e Ensino- LLPEFIL-UERJ, trata de algumas possibilidades de utilizao de
imagens para a abordagem de temticas filosficas. Partindo da discusso
sobre a representao em filosofia e a possibilidade de uma analogia com
imagens, passa a analisar pelo vis da desconstruo, a crise da
representao e os deslocamentos com relao aos pares binrios metafsicos
e logocntricos do pensamento ocidental, tomando como exemplo a
desconstruo em arquitetura e o projeto da Love/ House de Lars Lerup.
Palavras-Chave: Imagem Representao. Crise da representao.
Desconstruo. Arquitetura.
Abstract: This text, originally presented at the II Journey of Philosophy and
Teaching LLPEFIL UERJ -, deals with some possibilities for using images for the approach of philosophical thematic. From the discussion of the
representation in philosophy and the possibility of an analogy with images,
now analyze the bias in the deconstruction of the representation crisis, and
displacements in relation to metaphysical and logocentric binary pairs of
Westem thought, taking the example of the deconstruction in architecture and
design of the Love/House by Lars Lerup.
Keywords: Image. Representation. Crisis of Representation. Deconstruction .Architecture.
A questo do ensino de filosofia em nvel mdio ou na graduao sempre foi colocada
como desafio instigante para aqueles que se dedicam tarefa de professor. Na relao
ensino de filosofia e arte, a preocupao de muitos profissionais consiste muitas vezes
em como possvel associar a discusso to complexa da filosofia com as imagens, seja
a imagem em movimento, seja a imagem cristalizada em fotografia, desenho etc.
1 Doutora em Filosofia pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (2002). Atualmente professora
adjunta da Universidade do Estado do Rio de Janeiro. Atuando principalmente nos seguintes temas:
Desconstruo, Filosofia Francesa Contempornea e no Pensamento de Jacques Derrida. coordenadora
do Laboratrio de Licenciatura e Pesquisa sobre o Ensino de Filosofia- LLPEFIL na Universidade do
Estado do Rio de Janeiro.
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SOLIS, Dirce Eleonora Nigro. Ensaios Filosficos, Volume I1 - outubro/2010
Muitos pensadores reconhecidos, no entanto, j se serviram de imagens provenientes
das mais diversas fontes, tais como fotografia, escultura, pintura, cinema, para discutir
questes filosficas importantes. Iremos citar um ou dois exemplos, j bastante
familiares para quem trabalha com filosofia, utilizados por pensadores tais como
Foucault ou Deleuze. Nosso intuito aqui, entretanto, apresentar algumas imagens
tomadas da desconstruo em arquitetura (derridiana ou no) e o muito especial desenho
da Love/House de Lars Lerup, que nos permitem a referncia ao trabalho de
pensadores, tais como, Derrida, Roland Barthes e Gaston Bachelard.
Antes de abordar a temtica principal da desconstruo, vale lembrar que Michel
Foucault em As Palavras e as Coisas (1999) vai nos trazer o quadro de Velasquez, Las
Meninas (cujo ttulo remete descendncia portuguesa do pintor espanhol), para falar
de todo o ciclo da representao. No preciso, entretanto, repetir em detalhes toda a
riqueza da abordagem deste autor. (Focault,1999, 3-21).
Fig 1
A questo da representao fundamental para a compreenso do conhecimento no
campo filosfico. Na filosofia, mas tambm nas chamadas cincias da cognio, a
discusso do contexto da representao veio sendo objeto de amplo debate ao longo da
histria do pensamento e mais especificamente da teoria do conhecimento.
Preocupao dos filsofos desde o incio da filosofia sistematizada, o problema da
representao foi trabalhado por inmeros filsofos da tradio e no poderamos deixar
de mencionar Aristteles, Francis Bacon, Descartes, David Hume, Bergson, Merleau
Ponty, Rorty, mas tambm Deleuze e Derrida. A questo da representao foi abordada
de modo interessante por Michel Foucault em sua obra acima citada onde ele discute,
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A Utilizao da Imagem para discutir questes complexas de Filosofia: Representao, Crise da
Representao e Desconstruo
e aqui s posso falar disso de modo muito sucinto, a questo da semelhana, passando
pela representao clssica propriamente dita at chegar a apontar os limites da
representao.
Embora isto no caracterize nenhuma novidade para os lingistas, todas as
representaes, classicamente, ligam-se entre si como signos, formando uma imensa
rede. Toda anlise de signos imediatamente decifrao do que eles significam. Assim,
em As Palavras e as Coisas, Foucault aponta, por exemplo, que semiologia e
hermenutica se sobrepem na epistm clssica, no sculo XVII, mas de forma distinta
do que ocorria no sculo XVI. No h mais semelhana. Ligam-se no poder prprio da
representao, aquele de representar a si mesma.(Foucault,1999, 90-91).
Na idade clssica, diz Foucault, a cincia pura dos signos vale como discurso imediato
do significado(1999,p.92).Da podermos dizer com Descartes: Ser=Pensar=Representar.
Re-presentar classicamente significa apresentar de novo. Trazer presena novamente,
s que no pensamento clssico moderno como Idia, dobra do pensamento sobre si
mesmo.
O peso da concepo clssica para o pensamento moderno e apontado por Foucault
como chegando at ns que a teoria binria dos signos, a que funda, desde o sculo
XVII, toda a cincia geral do signo, est ligada, segundo uma relao fundamental, a
uma teoria geral da representao.(Foucault,1999,92). Somente pela representao
podemos estabelecer que o signo pura e simples ligao de um significado a um
significante. Classicamente significante e significado s so ligados na medida em que
um e outro so (ou foram ou podem ser) representados e que um representa atualmente
o outro. (Foucault,1999, 92).
No entanto, podemos utilizar as diversas citaes ( uma srie de 58 quadros) que Pablo
Picasso faz de Las Meninas de Velasquez para discutir a questo da representao da
representao, como j havia pensado Foucault com relao ao Las Meninas, onde h a
representao de um quadro dentro do quadro de Velasquez. Ou seja, o pintor (o prprio
Velasquez) representado dentro da cena pintando um quadro onde ele supostamente
representa o rei e a rainha da corte espanhola (Felipe IV e D. Mariana), refletidos num
espelho; estratgia, alis, utilizada por muitos artistas, pintores, escritores do ps
renascimento ou do perodo designado como barroco. J os quadros As Meninas de
Picasso podem ser motivaes para a discusso, no s da representao da
representao ou da questo da eliso do sujeito (esta ltima j presente tambm,
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SOLIS, Dirce Eleonora Nigro. Ensaios Filosficos, Volume I1 - outubro/2010
seguindo a anlise de Foucault, no quadro original de Velasquez), mas ainda para
discutir a desconstruo deste mesmo ciclo da representao e o ultrapassamento de
seus limites.
Nos dois quadros As Meninas, abaixo exemplificados, temos os mesmos elementos
presentes nos quadros de Velasquez, mas com a assinatura muito particular de Pablo
Picasso: as formas, a perspectiva , a hierarquia figura e fundo desconstrudas ; o quadro
original, de Velasquez como viso singular de Picasso, e que nos introduzem no
universo da representao como interpretao.
Fig 2
Fig 3
Assim, seguindo a idia de Foucault, podemos utilizar o quadro Las Meninas de
Velasquez para discutir todo o ciclo da representao que culmina na modernidade,
mas podemos ao mesmo tempo tomar as vrias interpretaes de Las Meninas por
Pablo Picasso para mostrar a desconstruo da idia de representao, o significado da
interpretao, a desconstruo da idia de signo e do binmio significante/ significado, a
questo do referente.
Podemos tambm, trazer um outro exemplo, um quadro de El Greco - O Enterro do
Conde DOrgaz- para discutir o significado do conceito de dobra a partir de dois
planos desdobrados na figura, o alto e o baixo na estrutura e na interpretao barroca.
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Fig 4
Lembramos ainda, o exemplo utilizado por Deleuze em A Dobra. Leibniz e o Barroco
(1991) para discutir o conceito de dobra, o alto e o baixo na Igreja Barroca, ou ento a
alegoria da casa para a discusso do fora/dentro, avesso/direito etc. O exemplo abaixo,
a Igreja Barroca de 1653 projetada por Borromini, a Igreja de Santa Inez (Fig 5) na
Praa Navona em Roma, pode ser associado ao que Deleuze, na obra citada acima,
chamou de A Casa Barroca (Deleuze, 1991, 15) e relao que este autor faz do andar
de baixo com a matria, as foras elsticas, molas e o andar superior com a alma
racional, inspirado na obra de Leibniz. Com um simples desenho ( Fig 6) , Deleuze
(1991,15) discute, entre outros, o significado do compartimento sem janelas - a mnada
leibniziana-, a analogia de algumas questes da Monadologia com o barroco. Discute
tambm questes da esttica barroca, dentre elas a luz barroca, a dobra que vai ao
infinito, o alto e o baixo, o dentro e o fora, a textura no barroco.
Fig 5 Fig 6
J a discusso contempornea da desconstruo pertence a um momento do pensamento
que implica na elucidao do que ficou conhecido como a morte da representao. Os
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SOLIS, Dirce Eleonora Nigro. Ensaios Filosficos, Volume I1 - outubro/2010
exemplos que tomaremos aqui so aqueles da arquitetura, entendida no em sua
caracterstica exclusivamente tcnica, mas em sua dimenso artstica. Iremos destacar,
portanto, alguns objetos que nos preenchem os olhos, a sensao e a percepo, os
objetos arquitetnicos.
So imagens de edificaes que em sua maioria, implicam numa elucidao da questo
do signo e o tratamento a ele dado pela desconstruo. Para darmos conta desta questo,
entretanto, lembremos rapidamente Saussure. A compreenso do signo para a
concepo clssica moderna ir possibilitar o projeto de uma semiologia geral em
Saussure cujo propsito desenvolver uma Teoria Geral dos Signos e que pode ser
compreendida tambm, como um ramo da psicologia social. A lngua a base de
compreenso dos problemas semiolgicos e a inteno de Saussure retirar da
mesma, as leis gerais de significao e aquelas da comunicao que tenham a
possibilidade de aplicao nos diversos campos da cultura. A palavra signo tem
como objetivo exprimir idias atribudas a qualquer coisa, mas de forma arbitrria.
Um signo, ento, sinaliza ( sinais de trnsito, palavras, equaes, diagramas,
pinturas, edificaes so signos). O signo social por natureza e uma das
caractersticas internas da lngua tambm ser social. Da a semiologia: preciso,
pois, conceber uma cincia que estuda a vida dos signos no seio da vida social (...); ns
a denominaremos semiologia (Saussure, 1967,60). E a lngua, como fenmeno
semiolgico, no existir fora do fato social para Saussure. s classes de sons e sentidos
que constituem a lngua, Saussure as nomeia respectivamente de significante e
significado.
O signo definido, ento, como a associao de um significante a um significado, como
o nexo entre o conceito (significado) e a imagem acstica (significante), tendo por
funo representar a coisa durante a sua ausncia. Entretanto, para que o signo
funcione, o que pode estar ausente no o significado, mas sim o referente. Significante
e significado, indissociveis no signo, representam o referente em sua ausncia, mas
dele no se separam inteiramente.
A concepo de Saussure estar na mira crtica da desconstruo. Derrida reconhece
que Saussure tentou libertar a lingstica das concepes metafsicas ou teolgicas
presentes na idia clssica de representao. No entanto, principalmente pelo fato de
ter utilizado o conceito de signo, concebido como associao de um significado
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A Utilizao da Imagem para discutir questes complexas de Filosofia: Representao, Crise da
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(conceito) a um significante ( imagem acstica) que Saussure ainda no se desliga da
tradio metafsica que trata da representao.
Derrida ir criticar em Saussure caractersticas metafsicas implcitas na Teoria dos
Signos, tais como o primado do psquico, do som, da voz, da presena. A arbitrariedade
do signo e a linearidade do significante, o contexto de diferena em Saussure, tudo isso
ser alvo das crticas da desconstruo derridiana. No caso da diferena, que
fundamental para o contexto no representacional da desconstruo, o que Derrida
critica em Saussure o fato dele no se desligar do campo ontolgico ao afirmar que
na lngua no h mais que diferenas (Saussure,1968, 200). O que Derrida busca o
contexto da diferena que possibilite ultrapassar a dimenso da diferena como
diferena ontolgica. Um outro aspecto da diferena buscado por Derrida: a
diffrance, ou melhor, aquilo que na diferena difere uma outra diferena.
A desconstruo ir postular a crtica mmesis e de certo modo denuncia o momento
atual como o momento crtico da idia de representao. E neste sentido que
desconstruo e representao classicamente considerada no se afinam mais.
A desconstruo postula- se como diferente de um simples estilo ou tendncia.
Tampouco movimento. A filosofia, a partir de Derrida, utiliza o termo desconstruo,
ampliando possibilidades de compreenso e abrindo um campo novo para o
desenvolvimento do pensamento. No se caracterizando nunca como um estilo esttico
entre outros, nem tampouco como tendncia nas artes em geral, a desconstruo se
imps como sendo da ordem do acontecimento, ou melhor, aquilo que acontece no
pensamento e nas artes em qualquer momento histrico. Ela teve origem na crtica
literria e acabou por qualificar certo pensamento filosfico, tico-poltico, artstico
contemporneo, mas como j falamos, ela no para Derrida nem anlise, nem crtica,
nem mtodo de interpretao literria. No bula de leitura, mas mesmo assim, no h
como descartar a possibilidade desconstrutora como procedimental.
Inspirados na fenomenologia, Derrida e outros filsofos franceses atuaram no sentido
de, considerando as questes propostas por ela, inverter, ampliar o problema do
sentido, do corpo e dos fenmenos trabalhados pelas filosofias tradicionais ainda como
questes ontolgico-estticas. Foi colocada em xeque por eles, a filosofia da
conscincia, ou como entende Derrida foi desconstruda a por ele denominada
metafsica da presena . Segundo Derrida a histria da cultura ocidental englobaria as
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formas de manifestao da presena sendo que a hegemonia de uma dessas formas iria
caracterizar os diferentes perodos histricos. Da Derrida falar em metafsica da
presena: presena da coisa ao olhar como eidos, presena como
substncia/essncia/existncia (ousia), presena temporal como ponta (stigm) do agora
ou do instante (nyn), presena a si do cogito, conscincia, subjetividade, co-presena do
outro e de si, intersubjetividade como fenmeno intencional do ego etc (Derrida, 1973,
23).
Apenas compreendendo a fora do pensamento fenomenolgico na filosofia francesa
das dcadas de 40 a 60 que podemos entender Derrida e seu pensamento.
fenomenologia e suas questes, Derrida dedica muitos de seus ensaios que poderamos
chamar desconstrutores de tudo o que representou para o pensamento ocidental a
metafsica da presena. Entre eles A Voz e o Fenmeno ( 1967),O Poo e a Pirmide, A
Mitologia Branca (Marges de la Philosophie, 1972), A Palavra Soprada (LEcriture et
la Diffrence, 1967) , La Dissmination (1972) e tantos outros que evidenciam uma
filosofia que busca inspirao no ser sensvel.
Mostrando a utilizao metafrica na composio metafsica da filosofia desde Plato,
as diversas utilizaes heliotrpicas da filosofia, as metforas para a luz, a sombra, uma
espcie de fotologos platnico, em A Mitologia Branca (Derrida,1972 (b)), a presena
do ser traduzida pela linguagem filosfica em geral e para o campo mais especfico de
nosso interesse, pela linguagem esttica. A metfora como exercendo um papel
fundamental nas filosofias situa a questo do ser e da linguagem como fenmeno
esttico. A metfora segundo Derrida possibilita o deslocamento desconstrutor do ser
sobre os entes e o encetamento da histria pela filosofia. Considerando a metfora em
Force et Signification (Derrida, LEcriture et la Diffrence, (1967(b)) , a desconstruo
quer afastar toda e qualquer preocupao com a origem, presente nas filosofias do
fundamento e da transcendncia.
Inverter e deslocar o sentido, desestabilizar a esttica ainda presa ao contexto
ontolgico, tal a tarefa desconstrutora. Em Margens da Filosofia (Derrida, (s.d), 11 )
Derrida utiliza a expresso timpanizar a filosofia, isto , servir-se da condio de
metaforicidade do texto filosfico, considerando o contexto do jogo de diferenas
(diffrance), como maneira de deslocar o sentido j sempre determinado em funo da
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Representao e Desconstruo
presena. Esse exerccio desconstrutor estar presente em toda a considerao da
criao artstica e mais especificamente na criao do objeto arquitetnico.
Arquitetura da desconstruo e desconstruo em arquitetura
A partir dessas consideraes, irei apresentar o que podemos designar como uma
espcie de arquitetura da desconstruo e como esta questo da desconstruo foi
desenvolvida, chamando a ateno para o seu campo esttico. O exemplo que escolhi
foi o dos objetos arquitetnicos. Uma arquitetura da desconstruo significa explorar de
forma analgica como erigido o edifcio da desconstruo a partir de Jacques Derrida,
e de um ponto de vista crtico desconstruo como este mesmo edifcio pode ser
deslocado ou desmontado.
Devemos sempre insistir que desconstruo diferente de destruio ou demolio. A
arquitetura da desconstruo revela que ela possui um vis de fragilidade produzido pela
ambivalncia e pela aporia que, entretanto, constituir-se- em sua fora. A
desconstruo afirmativa e um acontecimento que desloca certezas, desloca o
logocentrismo, desloca o fundamento, sempre presentes na tradio do pensamento
ocidental, desloca em direo a algo que ainda no decisrio e no se coloca como
dado, pronto e acabado. A desconstruo possibilita o desestabilizar de noes como
verdade, identidade, sentido, valores tradicionais vinculados questo da existncia e
tambm noes como fundao, suporte, estrutura, com relao ao objeto arquitetnico.
A proposta de uma arquitetura da desconstruo pode parecer um paradoxo, se
arquitetnica estiver sempre ligada ao ordenamento, hierarquizao, sistematizao
de pares binrios do pensamento. Entretanto, o que busco enfatizar que h toda uma
arquitetura da desconstruo presente a partir da crtica ao logocentrismo, teoria dos
signos saussureana, com a colocao por Derrida dos operadores da desconstruo para
falar de seu procedimento de inverso ou deslocamento: escritura, diffrance com a ,
rastro, hmen etc. So quase- conceitos na viso de Derrida , na medida em que
conceitos representam a metafsica da presena e a hierarquizao tradicional.
Ressaltamos que sob este prisma, h ento, Modelos e Figuras Arquiteturais que
anteriormente desconstruo j estariam presentes no texto filosfico desde as
primeiras pocas. Podemos lembrar as inmeras referncias na filosofia a formas
arquiteturais e a metforas arquiteturais. Por exemplo, logos, ark e ratio so todos
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maneiras de localizar o solo (Grund) , o solo estvel e seguro. Em Plato, no Timeu h a
referncia ao edifcio csmico. A arquitetura do cosmos e o demiurgo exercendo o papel
de primeiro arquiteto do universo. Em Descartes, o edifcio da razo ou da filosofia; Em
Kant, a edificao da razo e do conhecimento na Crtica da Razo Pura. Em Heidegger,
a referncia construo do edifcio da metafsica ocidental e a sua desconstruo
(Destruktion). A metafsica , dir Wigley , torna-se a partir de Heidegger uma espcie
de construo inadequada, um pensamento inadequado sobre a edificao (Wigley,
1997, 39).
Heidegger o percebeu, mas apenas a desconstruo de Derrida ir mostrar, que a
subverso das hierarquias estruturais originais, evidencia que no h solo estvel. O
Grund dando lugar ao Abgrund. E a fenda, aquilo que quebra e pode levar runa um
edifcio, se revela , ento, no como fraqueza, mas como fora estrutural.
Para delimitar o campo da discusso em que os textos da desconstruo os de Derrida,
podem estar articulados com a Arquitetura enquanto arte, consideramos, ento, a noo
de solo inseguro, instvel, o solo da desconstruo. Pensamos em como possvel a
desconstruo no trabalho da Arquitetura.
A exposio realizada no MOMA de Nova York em 1988, denominada
impropriamente desconstrutivista , num primeiro momento foi caracterizada como
oposio ao construtivismo russo na arte e na arquitetura. Foi organizada por Phillip
Johnson e Mark Wigley recebendo primeiro o nome de Violated Perfection (Perfeio
Violada). Esta exposio deu visibilidade s obras de arquitetos que discutiam a questo
da forma e as possibilidades de sua transformao em arquitetura e indiretamente
apenas tinham aspectos da desconstruo proposta por Jacques Derrida, mas no
havia uma transposio direta. Ali foram expostos projetos de sete autores: A casa de
Santa Monica de Frank Gehry; Borda Urbana de Daniel Libeskind, de Eisenman o
projeto do Biocentro da Universidade de Frankfurt; Rem Koolhaas, dois projetos; Zaha
Hadid- The Peak- Hong Kong, o escritrio Coop Himmelblau com 03 projetos; e
Bernard Tschumi com o La Villette.
A casa de Gehry construda por ele em Santa Mnica (Fig. 7), arquiteto que segundo
sua prpria fala gosta de brincar beira do desastre, desconstri o binmio
significante/significado, as noes de frente e fundos, figura e fundo,desconstri a
forma e as partes com relao funo.Exemplo de desconstruo no derridiana, no
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entanto, ela no consegue deslocar a noo de habitabilidade e de conforto. No
desconstri a idia de lugar. Mas ao olhar do passante parece um eterno canteiro de
obras. Isto a ponto dos vizinhos do condomnio de alto luxo em que ela est situada,
quererem se mudar para que seus imveis no desvalorizassem.
Fig 7
Idealizado pelo arquiteto Vlado Milunic em cooperao com Frank Gehry, o edifcio
Nationale-Nederlanden em Praga foi construdo entre 1994 e 96, num espao vazio no
qual havia um antigo prdio destrudo em 1945 durante o bombardeio da cidade. Foi
pensado para ser um centro cultural. No entanto, o que ele passa a abrigar um conjunto
de escritrios de firmas multinacionais. Conhecido como Casa Danante e apelidado de
Ginger and Fred (Fig 8), homenagem a Ginger Rogers e Fred Astaire, nele podemos
observar uma desconstruo da forma , mas sem destruir, entretanto, a idia de
fundao. A solidez do edifcio bem cuidada e impede que ele desabe. H elementos
desconstrudos nele, mas isto tambm no caracteriza a desconstruo tal como
concebida em Derrida.
Fig 8
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SOLIS, Dirce Eleonora Nigro. Ensaios Filosficos, Volume I1 - outubro/2010
As figuras 9 e 10 so respectivamente o conjunto habitacional projetado para Hong
Kong pela arquiteta de origem iraquiana Zaha Hadid e as sandlias Melissa que
acompanham o movimento de suas obras arquitetnicas . E embora no tivessem sido
inspirados diretamente em Derrida, h elementos desconstrudos em ambos os projetos.
Fig 9 Fig 10
Um escritrio de arquitetura em Viena, uma cooperativa de arquitetos, o Coop
Himmelblau apresentou trs projetos por ocasio da exposio Arquitetura
Descostrutivista em 1988. Ele j trazia a experincia da reforma de um telhado para
um escritrio na Falkstrasse 6, em Viena, datado de 1985 (Fig 11) , onde podemos
perceber uma srie formas e elementos arquiteturais desconstrudos.
Fig 11
Os projetos que compreendem as figuras 7 a 11 so exemplos de desconstruo em
arquitetura, mas que so distintas da desconstruo derridiana. O que foi denominado
impropriamente de arquitetura desconstrutivista, inclusive com justificativas de
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tentativas de uma nova resposta ao construtivismo russo, no so obras diretamente
inspiradas em Derrida. Mas todas elas desestabilizam os pares conceituais binrios que
caracterizam ainda um arquitetura ligada metafsica da presena: figura/fundo;
forma/contedo; forma /funo; interior/exterior;dentro/fora. H um deslocamento
constante em todas as obras apresentadas na exposio do MOMA de 1988, da idia de
representao e da relao significante/significado. Ento podemos falar, mesmo no
sendo desconstruo derridiana, em esttica da desconstruo no que diz respeito a
essas obras.
O que elas tm em comum com a desconstruo, alm da des-hierarquizao dos pares
binrios caros ao pensamento clssico ocidental em geral, a quebra das relaes
familiares como a noo de abrigo associada imediatamente acolhimento, proteo ,
cuidado. H toda uma fragmentao da forma presente nestes objetos arquitetnicos e
este um vis da desconstruo. Derrida aponta que estes pares sempre presentes no
pensamento ocidental aparecem em determinados momentos des- hierarquizados tal
como os pares da metafsica ocidental ser/aparncia; essncia/aparncia; significante/
significado com relao aos signos.
A proposta que mais se aproxima da desconstruo derridiana, entretanto, a de
Bernard Tschumi, de origem suia, seguida de uma experincia do arquiteto de origem
canadense Peter Eisenman (Projeto da Guardiola House (1988), em Santa Maria del
Mar, perto de Cadix na costa espanhola) e com quem Derrida, a convite de Tschumi,
estabeleceu uma parceria para pensar um projeto de jardim para o Parque de La
Villette em Paris (1982). Inspirado no Timeu de Plato e em seu conceito de khora ,
Derrida escreve Khra (Derrida,1993) , o que possibilitou o escrito Chora L Works
para o parque na parceria com Eisenman e a discusso de alguns elementos
arquitetnicos que se encaixavam nas questes propostas pela desconstruo.
Khra
Khra um texto de Jacques Derrida que ir apontar uma significativa aporia no Timeu
de Plato . Derrida analisa principalmente o texto platnico enquanto apresenta a
questo do espao de configurao do cosmos, do espaamento, dos lugares polticos e
de uma poltica dos lugares.
Timeu, em Plato, possivelmente um pitagrico proveniente de Locres (Itlia) e que
desenvolver o tema da physis em toda a sua extenso. O Timeu, dilogo, nomeia Khra
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SOLIS, Dirce Eleonora Nigro. Ensaios Filosficos, Volume I1 - outubro/2010
() a uma espcie de receptculo sensvel, falando muito impropriamente, mas que
preexiste ao cosmos. Khra, trton genos, nem masculino, nem feminino, seria
aproximativamente a espacialidade em Plato.
Para responder questo: Como possvel que as idias inteligveis ajam sobre Khra,
para que do Caos surja o Cosmos?, Plato introduz a existncia de um deus artfice, uma
espcie de arquiteto do universo, o Demiurgo, que ao mesmo tempo em que pensa e
quer (projeta), capaz de instituir um jogo (ele brinca, travesso) com o intuito de
plasmar o Cosmos. Inspirando-se nos modelos perfeitos do Mundo das Idias, o
Demiurgo ir fazer gerar, tomando como referencial Khra, o cosmo fsico. A imagem
mtica seria que o Demiurgo torceria vrias vezes os braos de Khi (), constituindo-se,
ento, os crculos concntricos do universo. Khra a espacialidade possvel para que
o Demiurgo possa modelar e ordenar a matria semelhana das formas e dos nmeros,
tendo, portanto, como funo principal separar, dispersar, distinguir, e com isto
multiplicar tudo o que existe no mundo sensvel.
Os arquitetos da desconstruo iro analisar o texto Khra de Derrida e inspirados nele,
iro pensar a des-hierarquizao dos principais binmios arquiteturais: forma / funo;
contedo / forma; estrutura / ornamento; figura / abstrao; virtual / real; interior /
exterior; aberto / fechado; pblico / ; etc. e tambm, a relao significante/significado e
a desconstruo da funo tradicional de habitao, moradia, abrigo, na edificao. O
texto Khra inspira os arquitetos a pensarem a desconstruo, mas principalmente a
repensar dois elementos-base da construo arquitetnica e do projeto urbanstico;
fundao (ou fundamento) e o espao.
O que est em questo em arquitetura a modificao de um modo fundamental ou
padro de ver e compreender a arquitetura. Noes como simetria, proporo, harmonia,
sntese sero tambm desestabilizadas. O sentido ser deslocado ao serem des-
hieraquizados os pares binrios ligados composio arquitetural. Para os arquitetos da
desconstruo trata-se da possibilidade de trabalhar com extensa gama de significantes
(arquiteturais) que remetem a outros significantes. Neste sentido h uma apropriao da
discusso derridiana sobre o significante e a textualidade.
A famosa mxima de Vitrvio, estabelecendo que em arquitetura devem ser
considerados dois aspectos: aquilo que significado e aquilo que significa, frmula da
representao arquitetnica, ser desconstruda: a arquitetura possui uma dimenso
simblica e que at as concepes arquitetnicas recentes, jamais havia sido
questionada em seus propsitos logocntricos. Com a desconstruo, esta mesma
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Representao e Desconstruo
dimenso v-se pela primeira vez abalada. A desconstruo em arquitetura no
consegue suprimir a significao ou a funo. Ela apenas mostra que a relao
significante / significado, forma / funo aparece num primeiro momento invertida e
num segundo momento (quase concomitantemente), deslocada.
A partir da leitura de Khra, o livro de Derrida, os arquitetos, principalmente Bernard
Tschumi e Peter Eisenman, iniciam uma histria de colaborao entre filosofia e
arquitetura, os Chora L Works, que tratam da relao entre textos filosficos e projetos
arquitetnicos.
Derrida e Peter Eisenman desenvolvem, ento, Khra como uma espacializao, noo
to ou mais ambgua que pharmakon (droga, remdio, veneno, cosmtico) segundo
Eisenman. Outros significantes tambm esto presentes: Khra, Chora lembra
choral (coral ou msica) e mesmo coreografia. Com o L, choral torna-se mais
lquido ou mais areo, no dizer de Derrida (1991 (a), 9). O trabalho se torna musical,
vocal, coreogrfico, uma arquitetura para muitas vozes, um presente to precioso
quanto aquele petrificado, o coral do mar (corail) (1991 (a), 9).
A partir da, as aporias do abrigo e da hospitalidade, envolvendo o familiar (heimlich)
e ao mesmo tempo estranho (umheimlich) , o acolhimento do hspede e a hostilidade
(hospes e hostis/hostilis, com o mesmo radical), o decidvel e o indecidvel, a
desconstrutibilidade e a indesconstrutibilidade e outros temas caros desconstruo e
presentes na arquitetura, puderam ser considerados no trabalho da dupla Derrida e
Eisenman .
Outro aspecto relevante apontado por Derrida que a desconstruo no sendo um
estilo nas artes em geral e muito menos na arquitetura, aquilo que acontece, um
acontecimento como processo de desestabilizao dos cones slidos do pensamento
ocidental tradicional e como processo de inverso dos pares binrios hierarquizados
quanto ao seu valor ( o que vale mais para a tradio o belo em oposio ao feio, o
bom em oposio ao mal, o verdadeiro em relao ao falso e ao simulacro). Derrida ir
apontar que o acontecimento desconstruo evidencia a inverso, mesmo que
momentnea, desses valores seja na literatura, na filosofia ou nas artes em geral e no
caso especfico de nosso exemplo, na arquitetura. O outro momento da desconstruo,
mas que pode ser simultaneidade o deslocamento, deslocamento para algo novo,
inusitado, inesperado, um por vir que no indica um futuro, mas algo que se impe
como possibilidade do possvel. Derrida em seu trabalho ir gradativamente abandonar
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este procedimento como dois momentos, sem neg-los, entretanto, mas isso
irrelevante para o contexto da esttica arquitetnica onde ele cabe muito bem ainda.
importante ressaltar tambm que o que a desconstruo discute o texto ou a
textualidade de cada expresso de pensamento seja ela artstica, filosfica ou cultural.
Assim, interessa a Derrida o texto arquitetnico, por exemplo, como um objeto artstico,
vivo, em pulsao. Interessa a ele o texto da psicanlise de Freud, o texto da filosofia
hegeliana, o texto heideggeriano, o texto mallarmeano e assim por diante. No caso do
objeto arquitetnico, ele pode ser estudado como um texto, mas no pode ser reduzido a
um texto, pois h vrios campos do saber em jogo, a sustentabilidade da edificao, a
tcnica empregada, a questo artstica, os elementos sociolgicos e polticos envolvidos,
e simultaneamente texto, textualidade, acontecimento, discurso. Portanto, a conhecida
acusao a Derrida, a partir de sua famosa afirmao na Gramatologia (Derrida, 1973,
119) de que no h nada fora do texto, no deve ser entendida como s existem
textos, ou ento como expulso do sentido, pois s restariam significantes que
remetem a outros significantes... Derrida se defende desta acusao dizendo que cada
texto nele mesmo um contexto e ento que ele poderia tambm admitir que s existem
contextos e tudo voltaria estaca inicial: no h texto sem contexto ou vice- versa. Esta,
no entanto, uma longa discusso que no h como desenvolver aqui.
A idia de um trton genos (terceiro gnero), tal como Khra de Plato, possibilita
desconstruo no s a inverso e o deslocamento dos pares binrios tradicionais caros
arquitetura, mas tambm a exposio de dobras, fissuras, rachaduras que podem
exploradas como forma e como texto. As funes so reversveis e podem ser
substitudas. Vide as Folies de Tschumi (Fig 12 e 13) que no Parque de La Villete
podem servir de mirantes, restaurantes, ambulatrios, sanitrios, escolinha de
jardinagem etc. Derrida observa que Tschumi no diz a loucura, mas sim loucuras,
folies, folias, lembrando muito mais delrios e diverso. Pontos de referncia atravs do
La Villette, as Folies, pensadas dentro do contexto do acontecimento, so pontos de
desconstruo no projeto do parque. Ilustram a disjuno e a dissociao entre usos,
formas e valores sociais. Possuindo todas elas a mesma dimenso (10x10x10 m), pontos
colocados na grelha (grid/grille) num sistema de 120 metros de intervalo e revestidas de
esmalte cor vermelho vivo, so cubos que podem ser desconstrudos, rearranjados de
modo diferente, pela adio de outros elementos (um ou dois volumes cilndricos ou
triangulares, degraus, rampas etc) denotando uma possibilidade imensa de
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diversificao. Uma possibilidade esttica de transarquitetura. So pontos de
ancoramento.
O Projeto do Parc de La Villette o exemplo de desconstruo mais prximo das idias
de Derrida. As Folies de Tschumi no parque , as 26 folies, constituem experimentos
desconstrutivos (tentativa de desconstruo do construtivismo russo) que desafiam as
relaes binrias com seus prticos, jardins, escadas, varandas etc. H tambm um
projeto parceria de Eisenman e Derrida, um projeto de jardim no La Villette (ao todo
so 11 jardins temticos), uma espacializao que desdobra as idias contidas em Khra
de Derrida, o seu texto sobre Timeu de Plato. um projeto de um jardim sem
vegetao, apenas com pedras e gua. O projeto era to inusitado, sem falar no fato de
ser extremamente caro, que levou algum do ministrio da cultura francs a afirmar que
Derrida e Eisenman queriam sim, mas era escrever um livro. No texto de Derrida,
inserido em Chora L Works, Por que Peter Eisenman escreve livros to bons
(Derrida,1991(c)), parfrase ao ttulo de Nietzsche sobre Wagner, Derrida ir
considerar Eisenman como arquiteto anti wagneriano, e ir discutir os significados
das palavras para um arquiteto e suas possibilidades desconstrutoras .
Fig 12 Fig 13
Como desconstruo difere de demolio, podemos tomar como exemplo a integrao
da Folie de Tschumi ( Fig 14) com o prdio tradicional j existente no local.
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SOLIS, Dirce Eleonora Nigro. Ensaios Filosficos, Volume I1 - outubro/2010
Fig 14
A forma foi contaminada, dir Wigley (1997, 52). A desconstruo modifica as
relaes entre a forma e o seu contexto e entre o dentro e o fora possibilitando
mudanas conceituais em todos os elementos arquitetnicos. As formas aparecem,
ento, partidas, dobradas, rasgadas. So deslocados e no destrudos todos os
condicionantes projetuais com a flexibilizao do par forma/ funo. A declarao
clssica de Tschumi, a forma segue a fantasia (Tschumi,1976) serve para os
propsitos exploratrios estticos da desconstruo e um deslocamento do famoso
princpio do modernismo em arquitetura a forma segue a funo, o que j havia sido
contestado pelo ps modernismo na afirmativa de Peter Blake a forma segue o
fiasco. Os ideais clssicos e modernos de beleza e funcionalidade se vem abalados
com a desconstruo. A fundao deslocada, mas no destruda. A estrutura, o
contexto, a forma so desestabilizados em sua noo tradicional, a funo segue a
deflexo.
A partir do desenho de Derrida em carta enviada a Eisenman em maio de1986, dando a
idia de uma grelha (grille/grid) ou um crivo (Fig. 15), surge a tentativa de aproximar os
escritos derridianos e a desconstruo em arquitetura . Na parceria com Eisenman para o
jardim do La Villette, Derrida prope a forma de um objeto metlico dourado, pois h a
referncia ao ouro no Timeu de Plato quando este fala de khora. Alm disso , poderia
ser pensado um objeto/lugar semelhante a um instrumento musical de cordas tal como
um piano, harpa ou lira e possibilitando abrigar um coral, da o Choral Works, projeto
para o jardim.O trabalho de Derrida com Eisenman consiste numa espacializao das
idias do livro Khora de Derrida e chamado por eles de Chora L, o L indicando uma
sonoridade mais lquida e mais rea, o L indicando na arquitetura o espao mais fludo e
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menos estvel. Nisto se resume a parceria do filsofo e do arquiteto para o parque. O
projeto de Tschumi para o La Villette, no entanto, no significa uma transposio tal e
qual das idias de Derrida, apenas algumas aproximaes e analogias muitas vezes
longnquas.
Fig15
Considere-se ainda que o projeto do Parque La Villette, uma vez que desconstruo no
destruio, conserva vrios elementos e edificaes que j estavam anteriormente no
local (prdios do antigo matadouro de Paris), alm de atividades culturais, cientficas e
artsticas tradicionais de dois plos culturais ocidentais universais, a cidade das cincias
e da indstria e a cidade da msica. O La Villette termina por incorporar uma srie
manifestaes hierrquicas do logocentrismo, o que o avesso da desconstruo.
O exemplo da Love/ House
Fig 16
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Love /House (Fig 16) um dos cinco projetos do arquiteto californiano Lars Lerup
contido no conhecido Assaults on the single-family house, um trabalho inspirado no
livro Fragmentos de um discurso amoroso (1977) de Roland Barthes. O arquiteto
brasileiro Fernando Fuo possui belssimo trabalho a respeito da Love/ House (1988)
que intercala a discusso tcnica da Arquitetura com a dimenso filosfica da
desconstruo. Neste projeto podemos observar elementos desconstrudos e crticos da
idia de representao. Mas pode-se fazer um paralelo, tambm, com as questes
levantadas por Barthes sobre o discurso amoroso e com a casa da Potica do Espao
em Bachelard. Lars Lerup, ele prprio, desconstri o texto dos Fragmentos de Barthes e
utiliza as metforas amorosas deste autor para estabelecer relaes com o espao e as
conexes arquitetnicas . Os textos fragmentados do discurso amoroso, a escritura, tal
como a entende Derrida, convertida em fragmento figura ou fragmento-arquitetura.
Mais ou menos como diz Barthes, o que se faz com a linguagem, no se faz com o
corpo, ou ento o que se oculta atravs da linguagem, dito pelo corpo. Os signos
verbais calam, mascaram, trocam gato por lebre (Barthes, 1977,54).
A Love/House deveria estar situada- mas jamais foi construda- no fundo de um
quarteiro em Paris, num ptio ao final de uma srie de ptios . Teria sido encomendada
a Lars Lerup por uma senhora como uma ampliao de sua prpria casa ( her house)
com o intuito de receber o seu amante quando este viesse visit-la. Lerup a concebeu,
ento , como um outro corpo, o corpo do amante. A casa dele ( his house) seria a casa
do prazer e da espera pelo amante, a casa do encontro noturno.
O lugar da espera se converte no lugar da prtica dos encontros corporais. Lerup recria
a casa dele, a partir da sombra do corpo da casa dela - inverso e deslocamento ali se
manifestam num processo de des-hierarqiuizao to caro desconstruo. Ela
tambm a casa do desejo, aquela que constitui a relao consciente e inconsciente,
separados que esto pelo corte, por uma pequena distncia necessria projeo ( uma
espcie de cenografia da espera).
Com a figura da Love/ House podemos discutir tambm a anlise potica de Bachelard
sobre a casa na Potica do Espao. Como cita Fuo ( 1992, La Love House): Se
tivssemos de ser o arquiteto da casa onrica hesitaramos entre a casa de trs e a de
quatro pisos. A casa de trs, a mais simples com referncia altura essencial, tem um
poro, um pavimento trreo e o sto. A casa de quatro pisos tem um andar entre o
pavimento trreo e o sto. Um andar a mais, um segundo andar, e os sonhos se
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confundem. Na casa onrica, a topoanlise s sabe contar at trs ou
quatro(Bachelard,(s d),35).
Ainda seguindo a inspirao bachelardiana, Fuo acrescenta em seu trabalho que a
Love/ House, imaginada por Lerup como um corpo vertical disposto em torno de uma
centralidade , tem a verticalidade assegurada pelas polaridades do sto e do poro
(Bachelard (s d),30). Ope-se a racionalidade sempre clara do telhado, irracionalidade
do poro, o ser obscuro da casa, que participa das potncias subterrneas. No sto
lugar dos ratos, e camundongos que fogem quando o dono da casa chega, h a
experincia do dia apagando os medos da noite, racionaliza-se mais facilmente os
medos. No poro, lugar dos seres mais lentos, mais misteriosos, diz Bachelard,
lembrando Jung, h escurido dia e noite ( Bachelard,(s d),31 ). O arquiteto Fernando
Fuo, lembra , ento, que a Love /House recria os arqutipos junguianos do poro e do
sto. Lerup os faz inabitveis do ponto de vista do cotidiano.
O que acabamos de ilustrar denota, ento, que no apenas as reas de saber como a arte
e a arquitetura se apropriam constantemente de noes e temticas filosficas para
melhor esclarecer o seu trabalho , como tambm podemos explorar mltiplas
possibilidades de utilizar imagens para discutir temticas e problemas filosficos.
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www.efe.blogspot.com/2006/10/barroco-3.html (acesso em 3/09/2010) Fig 5
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Representao e Desconstruo
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www.ignezferraz.com.br/mainpotfolio04.asp?pg (acesso em 04/01/2010)- Fig 8 www.archinect.com/news/article.php?id+38215_0_24_0_C -(aces.04/01/2010)-Fig 9
www.coutorture.com/date/2008/07/09- (acesso em 04/01/2010)- Fig 10
www.vizarch.blospot.com/2006/10/falkerstrasse.coop -(acesso em 04/01/2010)-Fig 11
www.villette.com/fr/parc_villette- (acesso em 04/01/2010)- Figs 12,13, 15
www.hydra.humanities.uci.edu/Derrida/coll.html- (acesso em 04/01/2010)-Fig 14
www.bampfa.berkeley.edu/exhibition/76 -(acesso em 3/09/2010)- Fig16.