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    R. bras. Est. Pop., So Paulo, v. 22, n. 2, p. 257-275, jul./dez. 2005

    O papel dos organismos internacionais na

    evoluo dos estudos populacionais no Brasil:notas preliminares

    George Martine*

    O artigo analisa a influncia das agncias internacionais na evoluo dosestudos populacionais no Brasil. O notvel crescimento da rea de demografia

    no pas foi impulsionado, em parte, pela preocupao internacional com ocrescimento populacional e pelos recursos colocados nossa disposio. Osorganismos internacionais que queriam influenciar a questo populacional noBrasil optaram por um de dois caminhos. A Usaid e o FNUAP (at a Confernciado Cairo) aliaram-se principalmente s entidades que promoviam o planejamentofamiliar e, por esse caminho, a reduo da fecundidade. A Fundao Ford, aOrganizao Pan-Americana de Sade, o Population Council e a FundaoRockefeller adotaram uma estratgia menos direta, que acabou sendo mais

    proveitosa para o Brasil: estimularam a formao de uma massa crtica capaz deassumir a iniciativa do pensamento poltico na rea populacional. Direta ouindiretamente, isto acabou beneficiando os pesquisadores e as diversas

    instituies de ensino e pesquisa agora existentes no pas. O doador internacionalcom maior influncia ao longo do tempo tem sido a Fundao Ford. A FundaoMacArthur imprimiu uma nova abordagem ao financiamento de estudos

    populacionais, antevendo a viso do Cairo. Hoje, o FNUAP, na sua verso ps-Cairo, praticamente o nico doador que continua apoiando esse campo doconhecimento, o que exigir dos pesquisadores maior criatividade para continuarexpandindo a influncia dos estudos populacionais no futuro.

    Palavras-chave:Agncias internacionais de financiamento de estudos. Avanosda demografia. Polticas demogrficas. Brasil.

    Introduo

    A oportunidade de participar da reuniobianual da Abep em 2004, depois de algunsanos de ausncia, foi para mim motivo demuita alegria. Entre outras coisas, pudepresenciar o enorme crescimento da nossa

    Associao, assim como sua maturidade,apesar de ela ainda no ter completado 30anos de vida. A profuso de caras novasna reunio, a diversidade de temas, bem

    como o perfil profissional mais diversificadodos participantes, deram-me uma sensaomuito viva no somente de ebulio, mastambm de evoluo na nossa Abep.

    Por outro lado, junto com a impressode estar vendo tanta gente nova, foi muitomarcante para mim a ausncia de algumas

    figuras tradicionais, fundadoras da nossaAssociao e presena obrigatria tanto nas

    * Consultor independente e presidente da Associao Brasileira de Estudos Populacionais (Abep), gesto 2005/2006.

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    assemblias como nos debates intermi-nveis na borda da piscina. Deu-me asensao de que estava ocorrendo umarpida substituio e troca da guarda. Esta,por sua vez, provocou-me uma reao quedeve ser pavloviana em todos ns queestamos ficando mais velhinhos. Pensei:Puxa, algum teria de contar para eles anossa histria. Garanto que a grandemaioria dos que esto aqui hoje no tem amnima idia do que foram as nossasorigens como associao ou como campode estudos. Ns mesmos estamos arris-cados a esquecer nossa trajetria e nossasbelas conquistas!. Foi nesse exato mo-mento que chegou a Bete Bilac, entoeditora desta revista, com uma proposta queme pareceu sensacional: montar umnmero especial da Rebep que buscaria,

    justamente, fazer um retrospecto de todo oprocesso de constituio do campo dademografia no Brasil. Feliz coincidncia ebrilhante idia!

    Segundo a diviso de trabalho

    proposta pela Rebep, caberia a mim fazeruma retrospectiva da participao dosorganismos internacionais na evoluo dosestudos populacionais no Brasil. Topei aparada (ainda se usa essa expresso dosmeus bons tempos?), enfim, aceitei odesafio! No porque tenho informaes pri-vilegiadas a respeito, e muito menos porquetenho uma memria prodigiosa naverdade, o meu disco duro j apresentatantas falhas que parece queijo suo , mas

    sim porque acho imprescindvel algumtentar cobrir esse aspecto importanteda nossa histria. Embora no tenha o

    pedigree necessrio para ser historiador(fora a idade avanada!), eu me disponhoa dar um primeiro passo nesse sentido.Tenho a esperana de que este esforoservir para que outras pessoas possamaperfeioar, corrigir, enfim, melhorar essepequeno relato preliminar. Como o leitor j

    ter observado, para escrever este ensaioabandonei o estilo formal clssico detrabalhos profissionais. Trata-se de umaviso pessoal, baseada parcialmente emrelatos pessoais, e no vejo razo paradissimular essas vivncias subjetivas compseudo-academicismos. Vrias pessoascontriburam com depoimentos orais ouescritos a este pequeno ensaio histrico.1

    O neomalthusianismo e a exploso dosestudos demogrficos

    Embora os estudos de populao e ademografia sejam relativamente antigos,eles eram, at pouco tempo, propriedadede um grupo relativamente restrito deespecialistas, geralmente aturios eestatsticos. Na dcada de 40, comeou aprimar o interesse acadmico pela teoriada transio demogrfica. Esta teoriaenfatizava a importncia de mudanasestruturais como precondio paramudanas no comportamento reprodutivo

    e nos nveis de fecundidade. Na dcada de50, a percepo de que uma explosodemogrfica global estava por ocorrer,devido aos nveis de crescimento dos pasespobres, gerou um sbito interesse pblicopelos temas populacionais. notvel como,nesse momento, a viso da transiodemogrfica lenta e gradual foi rapidamentesubstituda por uma atitude positivistadirigida a controlar o crescimento demo-grfico iminente que estava sendo

    projetado pelos especialistas.De fato, nessa poca, os estudos deNotestein, Davis, Hauser, da Escola dePrinceton e muitos outros apontavam paraum provvel aumento acelerado docrescimento populacional e analisavam osperigos que este representava (Szreter,1993; Hodgson, 1991). Esses autoresderam legitimidade a esforos bilaterais emultinacionais para controlar a fecundidade

    1 Para preparar este ensaio, procurei,inter alia, as seguintes pessoas: Elza Berqu, Jos Alberto M. de Carvalho, ValdecirLopes, Carmen Barroso, Hlio Moura, Tom Merrick, Axel Mundigo, Charles Wood, Mary Kritz, Oscar Harkavy, Leo

    Morris, Joe Potter, Guaraci Adeodato Alves de Souza, Neide Patarra, Srgio Nadalin, Jos Miguel Guzman e Guiomar

    Bay. A grande maioria dessas pessoas disps generosamente de seu tempo e alguns at mandaram textos escritos,

    citados na bibliografia ao final deste trabalho. Agradeo, de forma particular, os apoios e as informaes gentilmente

    fornecidos por Elza Berqu e as sugestes de Jos Alberto M. de Carvalho.

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    dos pases pobres. Lograram convencer aopinio pblica de que no convinhaesperar as lentas e complexas transfor-maes econmicas e culturais que,segundo a teoria da transio demogrfica,teriam que preceder uma reduosignificativa da fecundidade. Campanhasmassivas de planejamento familiar, anterior-mente menosprezadas como um quick fixineficaz, passaram ento a ser amplamentepreconizadas. Imediatamente, comearama surgir recursos, fundaes, institutos eorganismos internacionais dedicados,explicitamente, cada qual sua maneira, acombater a ameaa do rpido crescimentodemogrfico.

    A formulao clssica daquilo que viriaa ser chamado de neomalthusianismoencontra-se no trabalho de Coale e Hoover,do final da dcada de 50. Em seguida, vriosoutros argumentos da mesma naturezaforam sendo elaborados, condenando aalta fecundidade. Embora tenham apare-cido, imediatamente, slidos argumentos

    econmicos que relativizavam as ameaaspreconizadas pelo neomalthusianismo inclusive o famoso livro das Naes Unidas,Determinantes e conseqncias dastendncias populacionais (United Nations,1953) , esta segunda linha de argu-mentao nunca conseguiu neutralizar asimplicidade atraente da tese controlista.No obstante, interessante constatar que,depois de suas primeiras incurses noneomalthusianismo, a maioria dos dem-

    grafos e cientistas sociais passou logo aadotar, na dcada de 60, posturas maiscautelosas (Wilmoth e Ball, 1992). Apesardisso, o caudal dos controlistas foi sendoengrossado por gente poderosa como JohnD. Rockefeller. Como os cientistas sociaisde sua prpria Fundao relutavam contraa idia de envolver-se em atividadespragmticas na rea populacional, foicriado, por iniciativa de Rockefeller, o

    Population Council.2 Rockefeller foiacompanhado, nessa preocupao, porvrias outras entidades, inclusive aFundao Ford. Entretanto, o evento maisimportante na cruzada contra o crescimentodemogrfico foi a estria da United States

    Agency for In ternat iona l Deve lopment(Usaid) no campo populacional, no ano de1965. Depois de muita relutncia, a Usaidestava entrando definitivamente em ao,com uma estratgia simplificada deplanejamento familiar que deixava deconsiderar todas as sutilezas das dis-cusses ocorridas nas duas dcadasanteriores (Demeny, 1994, p. 7). Essaentrada em cena da Usaid deu uma novaagressividade a todos os esforoscontrolistas. Mais tarde, em 1969, foi criadoo Fundo de Populao das Naes Unidas(FNUAP), que em 1971 passou a ser oorganismo das Naes Unidas responsvelpor programas de populao.

    No plano intelectual, no parece sercoincidncia o fato de que foram os bilogos

    e os ecologistas que tomaram a bandeiraneomalthusiana a partir de meados dadcada de 60. Desde esse momento, elestm mantido aceso o debate a respeito dosimpactos do crescimento demogrfico.Seguiram incursionando sem temor nemremorso em temas sociopopulacionaiscomplicados, alguns dos quais os prprioscientistas sociais evitavam tocar, ou tratavamcom muito cuidado. Inclusive divertido verque, no prlogo de seu penltimo livro, Paul

    Ehrlich comenta, com muito orgulho, queele tinha conseguido uma transio fcil doestudo das populaes de mariposas (suaespecialidade) ao estudo das populaeshumanas! (Ehrlich et al., 1995,prefcio).

    O fato de que a viso neomalthusianaera muito simples e atraente, tanto para opblico como para os polticos dos pasesdesenvolvidos, acabou gerando umacruzada global a favor da reduo da

    2 In 1952, the world was awakening to the rapid growth in population that was occurring around the globe. Impressed by thecomplexities of population issues, convinced of their fundamental significance for human well-being, and undeterred by the sensitivitythen associated with birth control, John D. Rockefeller 3rd convened a group of scientists to discuss the implications of the dramaticdemographic change. They met in Williamsburg, Virginia, under the auspices of the National Academy of Sciences, and after twoand a half days, agreed on the need for a new institution (the Population Council) that could provide solid science to guidegovernments and individuals in addressing population questions. Population Briefs, Population Council, v. 9, n. 2, June 2003.

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    3 A Fundao Interamericana, agncia independente do governo norte-americano que financiava estudos e projetos no Brasil,chegou a ser expulsa do pas em 1977, presumivelmente por seu ardor controlista na poca.

    fecundidade. A maioria dos pasessubdesenvolvidos do mundo inteiro foiinstada a formular polticas de populao,entendidas,basicamente, como polticas deplanejamento familiar que levariam reduo da fecundidade. Para ajudara convencer o pblico e os polticos danecessidade de tais polticas, e paraimplement-las eficazmente, foram direcio-nados recursos vultosos para a formao derecursos humanos em demografia e temasconexos, assim como para a gerao dedados e a anlise dos mesmos. Tambmforam inventados e apresentados,

    adnauseam,vrios modelinhos destinados ademonstrar ao mundo inteiro a desgraa queocorreria se os pases pobres no conse-guissem reduzir rapidamente seu crescimento.

    O que tem tudo isso a ver com o de-senvolvimento dos estudos populacionais noBrasil? Muito! Tudo! De alguma maneira, amaioria de ns que trabalhamos na rea depopulao somos produto e beneficirios dapreocupao (quase parania) nascida em

    torno exploso demogrfica. De fato, essapreocupao neomalthusiana est naorigem da rpida expanso dos estudos depopulao no mundo inteiro, a partir dadcada de 60. Apesar de a ateno da reapopulacional estar centrada, naquela poca,nas formas de reduzir a fecundidade, criou-se, paralelamente, um espao privilegiadode estudos, pesquisas, conferncias epublicaes em torno do tema populacionallato sensu. Isso estimulou uma expanso

    muito rpida da demografia. O apoio que osestudos de populao recebeu, em com-parao com as outras reas sociais, bastante privilegiado, particularmente noperodo 1965-95. Ao longo das ltimasdcadas foram disponibilizados muito maisrecursos fceis para trabalhar questes depopulao do que para analisar outros temassociais igualmente importantes comonutrio, delinqncia, marginalidade,analfabetismo etc.

    No Brasil, especificamente, notvelo crescimento da rea de demografia.Em 1960, o pas ainda tinha poucos

    profissionais com formao na rea depopulao. Quinze anos depois, o cres-cimento desse grupo havia sido to rpidoque possibilitou a formao da Abep, coma participao de amplos setores daacademia, associao que hoje renecentenas de pessoas interessadas nostemas relacionados populao. No creioque haja outra disciplina, pelo menos nascincias sociais, que possa competir comesse crescimento. Queiramos ou no, esteavano foi impulsionado, em parte, pelapreocupao internacional com o cresci-

    mento populacional e pelos recursoscolocados nossa disposio.Isto, obviamente, no quer dizer que

    todos ns que estudamos demografia, tantona dcada de 60 como posteriormente,sejamos neomalthusianos. Muito pelocontrrio! Quando o neomalthusianismochegou com fora no Brasil, a partir demeados da dcada de 60, ele j enfrentouuma predisposio crescente da inte-lectualidade a rejeitar toda forma de

    imperialismo inclusive essa tentativa,vinda do exterior, de influenciar os padresde reproduo da populao brasileira.Nesse particular, interessante observarque a questo populacional era um dospoucos temas no qual direita e esquerdase encontravam. A maioria dos militares eseus amigos conservadores ciosos dasoberania nacional, desconfiados dasintenes controlistas alheias e ainda con-fiantes na fora do nmero de braos ,

    conjuntamente com os antiimperialistas deesquerda,opunham-se a qualquer iniciativaestrangeira que pudesse influenciar o ritmode crescimento demogrfico do pas.

    Esse sentimento de que tudo o quecheirava demografia e estudos popu-lacionais teria laos com o imperialismo tevediversas conseqncias no incio dos es-tudos populacionais, tanto brasileiros comolatino-americanos. Por um lado, o patru-lhamento ideolgico, inclusive dos colegas,

    estava sempre a um passo dos pioneiros edos doadores na demografia brasileira.3

    Essa envoltura ideolgica contribuiu, inter

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    alia, para retardar o reconhecimento de quemilhes de mulheres brasileiras buscavamdesesperadamente acesso a servios desade reprodutiva desde a dcada de 60.

    O significado real do planejamento familiarpara os indivduos e famlias de baixa renda que carregavam o nus da responsabili-dade pelas rpidas taxas de reproduo no foi objeto de discusso explcita napoca, em vista da reao extremamentenegativa s presses internacionais e dapredominncia de atitudes de laissez-fairecom respeito ao assunto. (Martine e Faria,1986, p. 7).

    Por outro lado, os organismos interna-cionais que queriam influenciar a questopopulacional no Brasil tiveram de optar porum de dois caminhos. AUsaid e o FNUAP(at a poca do Cairo) terminaram se alian-do quase exclusivamente s entidades quese dedicavam a promover o planejamentofamiliar e, por esse caminho, a reduo dafecundidade. Outros, como a Fundao Ford,a Organizao Pan-Americana de Sade(Opas), o Population Council e a Fundao

    Rockefeller, adotaram uma estratgiamenos direta, que acabou sendo mais pro-veitosa para o Brasil. Resolveram estimulara formao de uma massa crtica debrasileiras e brasileiros capazes de assumir

    a iniciativa do pensamento poltico na reapopulacional. Para tanto, promoveram acapacitao de recursos humanos e aatividade cientfica, deixando que o melhorconhecimento da dinmica demogrfica e no a postura neomalthusiana levasse devida considerao dos fatores de-mogrficos no planejamento nacional.

    A seguir, passo a relatar alguns lances ehistrias de iniciativas que, como pequenosrios, se juntaram para formar o caudal dosestudos populacionais no Brasil.

    Os principais atores internacionais nosestudos populacionais no Brasil

    Sem fazer uma pesquisa mais apro-fundada difcil atrever-se a listar ouclassificar as contribuies das diversasentidades que apoiaram, de uma forma oude outra, o desenvolvimento dos estudospopulacionais no Brasil. Vou fazer, pois, umrelato das informaes que consegui colher,com a esperana de que isso sirva para

    que outras pessoas, com melhores dados,possam ir corrigindo e ampliando o quesegue. Primeiro, trao rapidamente a evo-luo do ensino da demografia no Brasil e,depois, analiso o papel das entidades e

    Quem diria? A influncia estrangeira na demografia brasileira tambm tem razes no fascismo europeu!

    Pois , um dos primeiros e maiores demgrafos no Brasil foi um judeu italiano, Giorgio Mortara, o qualj tinha mostrado

    toda sua clarividncia e sua capacidade de fazer projees ao fugir do fascismo no final da dcada de 30. Mortara

    chegou ao Brasil, aos 54 anos de idade, em 19 de janeiro de 1939. Como tantos outros intelectuais, tivera de deixar sua

    terra natal para escapar da desenfreada perseguio racial com que as feras do fascismo e nazismo mancharam devergonha a velha Europa [...] Contam os fatos que sua deciso de escolha do nosso pas para imigrar, entre outros tantos

    motivos de foro ntimo, que s lhe pertenciam, deve ter sido determinada pelo convite formulado por autoridades

    brasileiras para que viesse colaborar na preparao do recenseamento geral de 1940. (Berqu e Bercovich, 1985, p.

    21-22).

    Logo em seguida, Mortara criou escola. Nas palavras de Valdecir Lopes, um dos pioneiros do IBGE: O ilustre professor

    Giorgio Mortara, nascido na Itlia e vindo para o Brasil em razo da II Grande Guerra, encontrou a melhor acolhida no

    IBGE. Ali o professor Mortara, como era conhecido, encontrou campo frtil para criar seuLaboratrio de Estatstica,

    para onde atraiu jovens ibgeanos com certa formao matemtica, e os encaminhou no trato com a demografia,

    usando a simplicidade que lhe era peculiar para salvar a falta de dados primrios existentes no pas e utilizar, muitas

    vezes, mtodos alternativos ou no convencionais em seus estudos. (Lopes, 2004, p. 1).

    Embora seja difcil dizer exatamente quantos trabalhos Mortara legou ao Brasil, a lista de suas obras chega casa de 973

    publicaes, versando sobre os mais diferentes temas. Mesmo considerando que muitas delas versam sobre o mesmo

    tema,apresentado em revistas diferentes, ainda assim, trata-se de uma volumosa bibliografia, que testemunha sua

    grande e contnua capacidade de trabalho. [...] vale a pena salientar que a despeito do relativo vazio de informaes [...]

    a grande capacidade tcnica e a experincia acumulada por Mortara no trato dos fenmenos demogrficos [...] aliada

    extrema sensibilidade, conferiu-lhe a arte de intuir ou conjeturar [...] Por outro lado, a carncia encontrada permitiu a

    Mortara desenvolver mtodos e tcnicas originais que desde logo passaram a beneficiar outros pases sofrendo da mesma

    falta de estatsticas do estado civil oucensos incompletos e pouco fidedignos. (Berqu e Bercovich, 1985, p. 22 e 24).

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    doadores internacionais na promoo dosestudos demogrficos no pas.

    O ensino da demografia e o apoiointernacional

    Celade

    A primeira instituio latino-americanaa oferecer cursos de demografia de formaregular foi o Centro Latino-Americano deDemografia (Celade). Estabelecido por umconvnio entre as Naes Unidas e oGoverno do Chile, o Celade iniciou suas

    atividades em agosto de 1957, sob acompetente direo de Carmen Mir,reunindo um reduzido grupo de demgrafoscom experincia internacional. Seusobjetivos eram ento:

    1. organizar cursos sobre tcnicas deanlise demogrfica para estudantes depases latino-americanos e fomentar oestabelecimento de cursos semelhantesem seus pases;

    2. promover estudos sobre problemas

    demogrficos, com base nas fontes deinformao existentes ou em estudos decampo;

    3. atuar como rgo de consulta sobreproblemas demogrficos dos governosde pases latino-americanos ou de seus

    organismos. (pgina Web,Celade)

    A importncia do Celade ressaltadano seguintedepoimento de Valdecir Lopes:

    Cabe ao Centro Latino-Americano deDemografia um papel de destaque, por suas

    atividades multiplicadoras em prol dademografia e dos estudos de populao,no s no Brasil, mas em toda a AmricaLatina. [...] Alm dos cursos realizados emsuas sedes de Santiago do Chile e de SanJos da Costa Rica, o Centro promoveucursos intensivos em associao comentidades de ensino superior, como aPontifcia Universidade Catlica do Rio deJaneiro, entre outras, de onde saram muitosdos atuais demgrafos que atuam no pas.

    [...]

    No menos importante foi a influncia doCelade em pesquisas inovadoras, realizadasnas dcadas de 60 e 70, em busca desoluo para os problemas das projeesdemogrficas em pases com estatsticasincompletas, como era o caso do Brasil e demuitos pases da regio. Assim que, em

    1961, realizou-se, em carter experimental, aPesquisa da Guanabara, mediante oprocedimento de visitas sucessivas

    populao estudada, com a assistnciatcnica do Centro, em colaborao com oIBGE. No deixaram, tambm, de repre-sentar uma contribuio as projees depopulao elaboradas pelo Celade e osvrios estudos comparados, abrangendopases da regio. Entre estes, destacam-seas anlises realizadas a partir das amostrasdos censos demogrficos da dcada de1970, reunidas no Banco de Dados doCentro. Pode-se afirmar, portanto, que a atualdemografia brasileira, que ocupa posio derelevo no continente, muito deve

    contribuio recebida de ilustres demgrafosnacionais e de outros, vinculados a orga-nismos internacionais, como o Centro Latino-Americano de Demografia, dirigido, napoca, por Carmen A. Mir, uma das maisbrilhantes figuras da Amrica Latina nessarea de atividade. (Lopes, 2004, p. 2)

    A isto va le agregar que o Celaderealizou cursos, estudos e pesquisas decampo no Brasil. As pesquisas Pecfal-Urbana e Pecfal-Rural geraram dadosimportantes para o estudo da dinmicabrasileira, alm de introduzir inovaesmetodolgicas. Alm do ensino a vrios

    jovens demgrafos brasileiros, o Centrotambm promoveu cursos de iniciao aosestudos demogrficos no Brasil. Pelarelao fornecida pelo prprio Celade, 70brasileiros teriam feito cursos promovidospela instituio seja no Brasil, seja no Chile.Pelos nomes citados, observa-se quemuitos deles so abepianos que iniciaram

    seus estudos demogrficos via Celade.Cedip

    Diante da necessidade de dotar o pasde centros universitrios de pesquisa eensino voltados para o estudo das questespopulacionais, Elza Berqu, ento respon-svel pelo Departamento de Estatstica

    Aplicada da Faculdade de Sade Pblicada Universidade de So Paulo, contatou aOrganizao Pan-Americana de Sade

    (Opas) a fim de buscar apoio para viabilizartal iniciativa. Em 1965, a Opas propiciou avinda a So Paulo da consultora dra. IreneTaueber, da Universidade de Princeton,ento uma das mais destacadas dem-grafas em mbito mundial e com particular

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    interesse na rea da sade. De um trabalhoconjunto entre a dra. Taueber e Elza Berqumaterializou-se a idia de criar o Centro deEstudos da Dinmica Populacional (Cedip),anexo ao Departamento de Estatstica

    Aplicada da Faculdade de Sade Pblicada USP.

    A Opas aprovou recursos para financiara criao e o funcionamento do Cedip porum perodo de cinco anos, aps os quais ocompromisso seria assumido pela Facul-dade de Sade Pblica. Alm disso,financiou tambm os estudos de cincoprofissionais, oriundos de vrias disciplinas.

    Assim, Paul Singer, economista, foi fazer umdoutorado na Universidade de Princeton;Neide Patarra, sociloga, foi para a Univer-sidade de Chicago; Joo Yunes, mdico, foipara a Universidade de Michigan; Jair LcioFerreira Santos, estatstico, para Chicago (eposteriormente, Berkeley), e CndidoProcpio Ferreira de Camargo, socilogo denotrio saber, recebeu financiamento paravisitas a diversos centros de populao no

    mundo mais desenvolvido. Elza Berqu foia primeira diretora do Cedip, que passou afuncionar em 1967, oferecendo um curso emdemografia e iniciando algumas pesquisas.

    Entretanto, o Cedip foi seriamente afe-tado pelo AI-5, que afastou Elza Berqu ePaul Singer da USP. Com a sada de Berqu,Cndido Procpio Ferreira de Camargoassumiu a direo do Centro, mas a iniciativafoi perdendo mpeto. Alm do mais, a USPno honrou o compromisso de financiamento

    do Cedip depois dos primeiros cinco anosde funcionamento. As atividades de pesquisae ensino em demografia na USP passaram,ento, a ser exercidas, durante alguns anos,sob a liderana de Neide Patarra, no Progra-ma de Estudos em Demografia e Urbaniza-o (Prodeur), dentro da Faculdade de

    Arquitetura e Urbanismo. Por outro lado, umadoao da Fundao Ford permitiu a criaodo Centro Brasileiro de Anlise e Planeja-mento (Cebrap) em 1969, no qual se abrigou

    parte do ncleo original do Cedip. A partirdessa migrao, o Cebrappassou a ser umdos principais esteios dos estudos popula-cionais no Brasil.

    O Cedip e o Cebrap foram, portanto, asprimeiras entidades no-governamentais a

    desenvolver estudos demogrficos de modosistemtico no Brasil. A incursode jovenspesquisadores, j reconhecidos na acade-mia e politicamente progressistas, nessetema fez muito para legitim-lo perante acomunidade intelectual e poltica. Naspalavras de Martine e Faria (1986, p. 11):

    Os estigmas de intervencionismo estran-geiro e de imperialismo que pesavam, deforma difusa, sobre os estudos populacio-nais foram se desfazendo gradativamente, medida que intelectuais de prestgio,perseguidos abertamente pelo regime,passaram a se dedicar aos estudos popu-

    lacionais e contriburam de maneira estra-tgica para a concepo de abordagensoriginais sobre a questo populacional naAmrica Lat ina. Essas cont ribu iesindependentes ajudaram a legitimar edifundir ainda mais o interesse pela rea.

    Cedeplar

    A trajetr ia do Centro de Desen-volvimento e Planejamento Regional(Cedeplar), da Universidade Federal deMinas Gerais, tambm deve muito ao apoiointernacional recebido, conforme descritona pgina Webda instituio:

    Desde sua criao, o Cedeplar vemmantendo estreitos laos de relacio-namento com instituies nacionais einternacionais, sejam acadmicas ou deoutra natureza, que lhe garantiramconsidervel ajuda para sua criao econsolidao institucional. Assim que, emseus primeiros anos de existncia,instituies como BNDES, Ipea, FundaoFord, USP, Institute of Social Studies deHaia tiveram importncia decisiva naformao dos [seus] quadros acadmicoe administrativo, seja por meio de apoiotcnico-cientfico, seja por meio definanciamentos de suas atividades.

    [...]

    Posteriormente, outras instituies, comorgos federais e estaduais da administraopblica (os diversos ministrios, a FIBGEetc.), Fundaes Rockefeller, Hewlett, asNaes Unidas, atravs do FNUAP,

    desempenharam papel importante noesforo de ampliao e consolidao dasatividades do Centro.

    As primeiras aulas de demografia naUFMG foram dadas no Programa de

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    Mestrado de Economia Regional, em 1969.Conforme o depoimento de Elza Berqu:

    [a Ford] contribuiu para que fossem abertoscursos com o fim de aglutinar economistasinteressados nessa especializao. Parale-lamente, com suas bolsas de doutoramento,tornou possvel o treinamento, em renomadoscentros do exterior, de um grupo deeconomistas-demgrafos. De volta ao pas,iniciaram eles, em 1974, um importanteprograma de Demografia com a introduode uma rea de concentrao nessadisciplina no mestrado em economia.(Berqu, 1992, p. 170)

    Um dos jovens economistas bene-ficiados com uma bolsa da Ford foi JosAlberto Magno de Carvalho, que partiu parafazer seu doutorado na London School ofEconomics em 1970, de l regressando nofinal de 1973 com seu Ph.D. na mo.Posteriormente, Jos Alberto viria a ser oprimeiro presidente eleito da Abep e, anosmais tarde, presidente da Unio Internacio-nal para o Estudo Cientfico da Populao(IUSSP).

    Entre 1970 e 1979, a Fundao Fordapoiou a vinda ao Cedeplar de professoresvisitantes para dar maior consistncia ecarter internacional ao ensino da demo-grafia. O Cedeplar inaugurou seu programade mestrado em demografia em 1976 e seudoutorado em 1985. Para tanto, recebeucontribuies importantes tanto da Fun-dao Rockefeller como da FundaoHewlett.

    NepoDe acordo com a sua pgina Web, o

    Ncleo de Estudos de Populao (Nepo)

    uma unidade de pesquisa interdisciplinare multidisciplinar na rea de Demografia eEstudos de Populao da UniversidadeEstadual de Campinas (Unicamp). Criadopela Portaria GR 28, de 25 de maio de 1982,consolidou-se com a Deliberao do Conse-lho Universitrio (Consu) de 27 de novembrode 1991. O Nepo est vinculado Coordena-

    doria de Centros e Ncleos (Cocen) e Coordenadoria Geral da Unicamp.

    Embora os Ncleos da Unicamp nosejam unidades docentes, o Nepo participaativamente do Programa de Ps-Graduao

    em Demografia do Instituto de Filosofia eCincias Humanas.

    A trajetria do Nepo difere daquela doCedeplar, no sentido de que a instituiono recebeu aportes especficos estrangei-ros para a implementao e realizao doseu programa bsico. Nesse particular,foram mais importantes os auxlios finan-ceiros recebidos da Finep e do CNPq. En-tretanto, na realizao dos seus trabalhosde pesquisa e de cursos especializados, oNepo recebeu apoios significativos daFundao Ford, do FNUAP e de outros,

    conforme relacionado no Quadro 1 emanexo. Vale mencionar, especialmente, oapoio da Ford para o Programa de SadeReprodutiva e Sexualidade (1990-2004) epara o Programa Interinstitucional de Trei-namento em Metodologia de Pesquisa emGnero, Sexualidade e Sade Reprodutiva(1994-2004), assim como o apoio doFNUAP para o Programa Interinstitucionalde Avaliao e Acompanhamento dasMigraes Internacionais no Brasil.

    Outras instituies de ensino

    A Universidade Federal do Paran, emCuritiba, tem oferecido cursos de mestradoe doutoramento em demografia histrica.De acordo com um dos seus professoresmais ilustres, Srgio Nadalin, estes cursosno tiveram apoio internacional. Em seudepoimento, por e-mail, Nadalin informa:

    Gostaria de lhe dar algo substantivo, mas

    em verdade tudo o que nosso programa deps-graduao conseguiu realizar foi muitomais em funo da presena de Altiva eCeclia, naqueles tempos, nos nossosorganismos financiadores pelo que eu melembro, Capes e CNPq. Foi dessa maneiraque trouxemos vrios franceses, inclusiveLouis Henry e Jacques Dupquier, paraCuritiba.

    Em compensao, o Centro de Re-cursos Humanos (CRH) da UniversidadeFederal da Bahia, apesar de no ter recebido

    apoio sistemtico de nenhuma entidadeinternacional especfica, conseguiu, desdeo incio da dcada de 70, um grande nmerode apoios para eventos e pesquisas. Alista dessas contribuies, gentilmentepreparada pelo CRH, por intermdio de

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    Guaraci Adeodato Alves de Souza, inclui27 financiamentos para pesquisas e10 bolsas oriundas de organismosinternacionais. O Quadro 2 (em anexo)revela a grande variedade de fontesde financiamento obtidas pelo CRH,desde 1970, para trabalhos e estudosna rea de populao.

    Depois dessa rpida incurso nomundo do ensino, passo agora a examinara contribuio de alguns organismos efinanciadores internacionais.

    Organismos e financiadores internacionaisdos estudos populacionais

    Fundao Ford

    A julgar pelas informaes disponveis,o doador internacional com mais influncianos estudos populacionais no Brasil, aolongo do tempo, tem sido a Fundao Ford.Por esse motivo, e pelo fato de que umartigo da professora Elza Berqu j nos trazuma valiosa fonte de informaes histricas

    a respeito da atuao da Ford no Brasil,este vai ser o maior captulo desta minhanovela.

    Os primeiros tempos de atuao daFord no campo populacional no Brasil noforam registrados, mas fica claro que essafundao j tinha uma estratgia bemarticulada desde meados da dcada de 60.No mbito dos pases industrializados, apartir do momento em que McGeorge Bundyassumiu a presidncia da Ford, em 1966, aFundao seguiu uma orientao clara-mente neomalthusiana. Esta ideologiainstitucional somente viria a ser reformuladana dcada de 80. Entretanto, todos osescritrios regionais e nacionais da Fordlocalizados nos pases em desenvolvimentotinham plena autonomia na utilizao dosrecursos sabendo, claro, que o tema tinhaprioridade na agenda do presidente daFundao (Harkavy, 1995, p. 38-39). Esta

    poltica descentralizada permitiu aoescritrio da Ford no Brasil fazer uma leituramais correta da sensibilidade polticada questo populacional no pas e,conseqentemente, propor medidas maisapropriadas a esse contexto.

    Conforme Berqu (1992, p. 167),

    na esfera de preparao de recursos

    humanos no mbito acadmico dos estudospopulacionais, a Fundao Ford iniciou suasatividades em nosso pas na segundametade da dcada de 1960, principalmentepor meio de bolsas de estudos no exterior.

    A inteno clara da Ford (seguida pos-teriormente por outros como o PopulationCouncil, a Fundao Rockefeller e, maisrecentemente, a Fundao Hewlett) erafortalecer a capacidade nacional paraanalisar as questes demogrficas bra-sileiras. O primeiro oficial de programa daFord para assuntos populacionais no pasde que se tem conhecimento foi JosHernandez, um jovem demgrafo porto-riquenho simptico e de bem com a vida.Em 1969, o escritrio brasileiro da Fordrecebeu uma misso de consultores edemgrafos americanos, liderados por

    Ansley Coale, que, aparentemente, teriasido fundamental na definio da estratgiada Fundao para o pas. Logo depois,Robert McLaughlin chegou ao Brasil paraassumir a funo de oficial de programapara assuntos de populao e plane-

    jamento familiar.Paralelamente, conforme j mencio-

    nado, a Ford teve um papel decisivo naestruturao do Centro Brasileiro de Anlisee Planejamento (Cebrap), organismo queacolheu os professores da USP demitidospelo AI-5 em 1969.

    Com recursos institucionais da Ford e,

    especficos para pesquisa, do InternationalDevelopment Research Center (IDRC), doCanad, o Cebrap conduziu, em meadosda dcada de 1970, a Pesquisa Nacionalsobre Reproduo Humana. Essa pesquisa,dado seu escopo, trouxe considerveissubsdios para a elucidao de questesbsicas da problemtica populacional,mediados pelo papel das instituies.(Berqu, 1992, p. 70)

    Aps o regresso dos bolsistas da Fordao Brasil, em 1973-74, a Fundao lanou

    mo de uma outra iniciativa destinada afortalecer o ensino da demografia no pas.

    Com a dupla finalidade de ofereceroportunidade e condies de trabalho deinvestigao a seus bolsistas, quando doregresso ao pas, e atrair para a pesquisa

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    em populao professores e investigadorescom treinamento em campos afins, a Fun-dao Ford criou, em 1972, um Programa

    de Bolsas de Pesquisa. [...] o Programaconcedeu em apenas seis anos um total de68 bolsas para investigao. (Berqu, 1992,p. 169)

    A Ford tambm teve um papel im-portante no desenvolvimento do ensinoacadmico da demografia dentro do Brasil.

    At o final dos anos 60, as nicas entidadesacadmicas na regio latino-americanacom cursos de ps-graduao emdemografia eram o Celade e El Colgio

    de Mxico. Em 1970, a Fundao Fordapoiou a vinda de professores visitantespara dar cursos de demografia noMestrado de Economia do Cedeplar. Em1972, o Population Council enviou umconsultor, Axel Mundigo, para sondar asperspectivas institucionais para ofortalecimento do ensino da demografia noBrasil. Aps visitar vrias instituiesacadmicas brasileiras, juntamente comMcLaughlin (da Ford), Mundigo concluiu

    que, naquele momento, o Cedeplar era oprograma em melhores condies parapromover o avano do estudo acadmicoda demografia no pas (Mundigo, 2004).

    Para apoiar os novos demgrafos queretornavam ao Cedeplar, a Ford financiou avinda de um demgrafo norte-americano,Tom Merrick, contratado como professoradjunto no Cedeplar. Enquanto perma-neceu nesse posto, entre 1970 e 1974,Merrick foi um ator fundamental, junto comMcLaughlin, no posicionamento da Ford e,conseqentemente, na promoo dos es-tudos populacionais no Brasil. Seu sucessor,Charles Wood, continuou exercendo o mes-mo papel de apoio, no Cedeplar e na Ford,de 1974 a 1979.

    Em 1976, Axel Mundigo voltou ao Brasilpara substituir Robert McLaughlin comooficial de programa da Ford. Juntamentecom Merrick e Wood, Mundigo teve um

    papel destacado na formao da prpriaAbep. A inteno da Ford, naquele mo-mento, era transferir a coordenao deestudos demogrficos para uma entidadebrasileira de carter associativo (Berqu,1992, p. 171). Observando o rpido cresci-

    mento dos estudos demogrficos no pas,eles se articularam com algumas figurasmais representativas da demografiabrasileira nascente Joo Lyra Madeira,Elza Berqu, Jos Alberto M. de Carvalho,Manoel Costa, Helio Moura,inter alia parapropor uma primeira reunio nacional sobreo progresso dos estudos populacionaisbrasileiros. Esta foi realizada em 1976.Carmen Mir, Ansley Coale e IsaacKerztenestsky estavam entre os ilustresconvidados a esse evento e, segundo suasprprias palavras, estiveram muitoimpressionados com a capacidade depesquisa que estava sendo mostradanaquela reunio.

    Os resultados da reunio forampublicados na forma de alguns livros, dosquais tive a honra de editar um chamado,singelamente, Migraes internas (Martine,1977). No prefcio desse livro leio:

    O Simpsio sobre o Progresso da PesquisaDemogrfica no Brasil foi realizado no Riode Janeiro, em junho de 1976, sob os

    auspcios da Fundao Ford, com o objetivode estabelecer uma maior comunicaoentre os cientistas interessados emdemografia. Pesquisadores de todo o pase do exterior reuniram-se para apresentarresultados e concluses de seus trabalhose debater a atual e futura situao dosestudos populacionais no Brasil.

    Axel Mundigo, referindo-se a esseevento, recorda que muitas das pesquisasapresentadas no simpsio haviam sidofinanciadas pela Ford.

    Entretanto, o resultado mais importantedo simpsio foi, sem dvida, a criao da

    Abep. Mundigo (2004, p. 2) relata:

    Em conversas com o professor LyraMadeira, o reconhecido decano dos es-tudos populacionais no Brasil dessa poca,e com Elza Berqu, surgiu a idia de usara reunio do Sheraton para apresentar Assemblia a possibilidade de criar umaassociao de populao no Brasil. Namedida em que essa idia foi circulando narede de pessoas interessadas, a reao foimuito positiva.

    Um pequeno comit, apoiado na sualogstica pela Ford, foi criado para redigiros estatutos da nova associao, cujasituao foi institucionalizada legalmente

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    em fevereiro de 1978. O primeiro Encontroda Abep, para o qual o apoio da Ford foinovamente fundamental, foi realizado emCampos do Jordo (SP), durante o ms deoutubro de 1978. Posteriormente, a Fordcontinuou financiando vrias reuniestcnicas menores da Abep.

    A partir de 1979, cortes nos recursosoramentrios da Ford para o seu escritrioregional fizeram com que o Brasil deixassede ter um oficial de programa na rea depopulao. A Abep assumiu ento aadministrao do Concurso de Bolsas de

    Pesquisa.Nos dez anos que se seguiram, concursosanuais foram realizados, totalizando aproxi-madamente uma centena de projetos depesquisa [...] cobrindo os mais variados te-mas no mbito dos estudos populacionais[...] Com a retirada do suporte financeiroda Fundao Ford, em 1989, o programa interrompido (Berqu, 1992, p. 171 e 173).

    A prpria Revista Brasileira de EstudosPopulacionais (Rebep), fundada em 1982

    (e cujo primeiro nmero apareceu em1984), contou com o apoio decisivo da Fordpara cobrir os custos de sua edio.

    De 1985 a 1990 a Abep contou com ex-pressivas e contnuas dotaes para aexecuo de seu amplo programa editorial,que alm da revista inclui tambm um bo-letim informativo trimestral, anais deencontros bianuais e publicaes avulsasde seminrios temticos. Infelizmente, oapoio foi interrompido a partir de 1990.(Berqu, 1992, p. 174).

    Finalmente, a Ford beneficiou a Abepcom um endowment de valor equivalenteao dobro da contraparte brasileira. Estepermitiu Associao gerar uma rendapequena, mas estvel, para financiar partede suas atividades. Com mais estainiciativa, a Ford pretendia dar Abep umabase financeira suficiente para poderenfrentar seus compromissos tcnico-administrativos.

    Fundao Rockefeller, PopulationCouncil, Fundao Hewlett e IDRC

    Conforme observado anteriormente, oPopulation Council foi fundado em 1952como o brao mais operacional da Fun-dao Rockefeller na rea de populao.4

    Entretanto, o Council recebeu recursos demuitas outras fontes, inclusive US$ 88milhes da Fundao Ford, entre 1957 e1993 (Harkavy, 1995, p. 13). Vale a penacontar algo aqui sobre a histria brasileirada Rockefeller e do Population Council,inclusive porque suas polticas no Brasil

    foram muito parecidas com aquelas apli-cadas pela Ford. De fato, Harkavy relata que,no mbito de suas respectivas sedes, astrs instituies compartiam estratgiasexplicitamente e colaboravam freqen-temente no desenho e execuo de projetos(idem, p. 44-45).

    De acordo com as informaes obtidas,a primeira colaborao de um organismointernacional aos estudos populacionaisbrasileiros teria sido feita pela Fundao

    Rockefeller, em 1959. O beneficirio desseapoio foi a Fundao Joaquim Nabuco, deRecife. De acordo com Mary Kritz, oficial deprograma da Rockefeller nas dcadas de 70e 80 e atual secretria-geral da IUSSP,tratava-se de um recurso relativamentepequeno, que se destinava a avaliar asconseqncias do crescimento demogrficono Nordeste. Em 1973, a Rockefeller tambmapoiou um estudo da Universidade Federalda Bahia sobre emprego e subemprego no

    Nordeste. Tambm naquela poca, financiouum estudo realizado pela UniversidadeFederal do Cear. A Abep recebeu uma scontribuio da Rockefeller, no valor deUS$ 3,5 mil, em 1977. O Cebrap foi o bene-ficirio de um apoio de US$ 88,5 mil pararealizar uma pesquisa, coordenada por PaulSinger, sobre os determinantes demo-grficos da participao na fora de trabalho.

    Entretanto, a maior contribuio daRockefeller aos estudos populacionais no

    4 [...] Rockefeller philanthropies gave early support to demography and reproductive biology research and even to Kinseys workin sexual behavior. But the Rockefeller Foundations leaders began to have misgivings as to involvement in sensitive populationmatters, leading a frustrated John D. Rockefeller 3rd to establish the Population Council in 1952. (Harkavy, 1995, p. 2).

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    Brasil foi, sem dvida, seu apoio aoCedeplar. De acordo com o depoimento deMary Kritz, a Rockefeller fez uma primeiradoao ao Cedeplar, em 1976, de US$ 150mil. Esse grant foi renovado, com valoresdiferentes, a cada trs anos, at 1995. ARockefeller, ao contrrio da Ford, no tinhauma estrutura autnoma local e esse tipode grantno se coadunava muito com aspolticas da sede. Conseqentemente,segundo Kritz, cada novo grant requeriauma longa negociao na sede da prpriaRockefeller, para convencer os diretores daFundao da importncia do Brasil e dopapel crtico de uma instituio como oCedeplar.

    De certa forma, a Rockefeller tambmcopiou a estratgia da Ford ao enviarprofissionais americanos para fortalecer ocorpo tcnico do Cedeplar. Porm, em vezde demgrafos j mais experientes, aRockefeller enviou jovens recm-formadospara que aprendessem algo a respeito dospases em desenvolvimento. Em si, esta

    estratgia de usar o Cedeplar para capa-citar jovens norte-americanos demonstraque o ensino da instituio brasileira jestava sendo reconhecido como estandoem outro patamar de qualidade no final dadcada de 70. Desta forma vieram para oBrasil os jovens Steve Vosti e Frank Goza,entre outros. Os recursos da Rockefellertambm permitiram a vinda de bolsistasafricanos de lngua portuguesa durantevrios anos.

    Adicionalmente, a Rockefeller forneceuUS$ 1 milho para a rea de biologiareprodutiva. Os principais beneficiriosdestes recursos foram oCentro de Pesqui-sas de Doenas da Unicamp (Cemicamp),cuja figura central era Anbal Faundes, e aUniversidade Federal da Bahia, no centrocoordenado por Elzimar Coutinho.

    Segundo Kritz, a Fundao Hewlettassociou-se iniciativa da Rockefeller embenefcio do Cedeplar. Anne Murray era a

    oficial de programa da Hewlett, umafundao nova e pequena, que foiinfluenciada pela Rockefeller no sentido detambm apoiar o Cedeplar. A intenodestas contribuies era, claramente,desenvolver instituies fortes capazes deoferecer um ensino de boa qualidade e derealizar pesquisas no Brasil, em vez demandar estudantes brasileiros parainstituies acadmicas nos pasesdesenvolvidos. A Hewlett tambm deu umapoio importante aos estudos popula-cionais brasileiros de forma indireta, aofinanciar um programa de populao naUniversidade de Austin, Texas. Esteprograma, coordenado pelo conhecido

    brazil ianist Joe Potter, recebeu vriosbolsistas e professores brasileiros e atinstituiu um prmio em honra aVilmar Faria,destinado a profissionais brasileiros.

    Conforme j mencionado anteriormen-te, o International Development ResearchCenter (IDRC), organismo de assistnciabilateral do governo canadense, j tinha

    apoiado, inter alia , a Pesquisa Nacionalsobre Reproduo Humana realizada peloCebrap. Juntamente com a Ford, aRockefeller e o Population Council, o IDRCapoiou a criao, em 1973, de um pro-grama latino-americano o Pispal e,atravs deste, vrias pesquisas no Brasil.O objetivo deste programa era gerar uminteresse maior pelos temas populacionaisna regio, por intermdio de pesquisasrealizadas por uma grande variedade de

    instituies.5

    Esse programa durou at1985, momento em que os doadorescomearam a canalizar seus recursosdiretamente para as ONGs. No total,estima-se que o IDRC dispensou recursosno valor de aproximadamente US$ 1,5milho ao Pispal.

    Em suma, esses diversos doadorestiveram um papel importante no desen-volvimento dos estudos populacionais noBrasil. Seguindo a trilha marcada pela

    5 The objectives of the first two phases of this project included: stimulating interest in research on population and developmentinteractions relevant to policy formulation, encouraging advances in conceptualization and methodology, assessing priorities, andencouraging research on them. The objectives of phase III are to study the relationship between population dynamics and social-economic change and to develop methodologies for conducting research in this area. Disponvel em: .

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    Fundao Ford, eles apoiaram estudos epesquisas em diversos mbitos.

    Fundao MacArthurA trajetria da Fundao MacArthur no

    campo populacional no Brasil diverge detodas as contribuies anteriores de vriasmaneiras. As especificidades da trajetriada MacArthur tm seu incio na nomeaode uma cientista social brasileira, CarmenBarroso, para o posto de diretora da recm-criada Diviso de Populao da Fundao,em 1989. Conhecida por seus trabalhos e

    sua militncia, particularmente nas ques-tes relacionadas com a sade da mulhere gnero, Barroso imprimiu, atravs daMacArthur, uma nova orientao ao fi-nanciamento dos temas populacionais.Com o apoio da comunidade brasileira, oPrograma da MacArthur foi, de certa forma,antevendo a viso mais ampla do Cairosobre a questo populacional.

    Em vez de trabalhar em todos ospases, a MacArthur decidiu concentrar

    seus recursos em apenas quatro grandespases em desenvolvimento, entre os quaiso Brasil. Em cada um destes pases aFundao comeou seu trabalho com umamplo diagnstico da questo populacional.Esse diagnstico foi elaborado por umpainel representativo de vrios setores dasociedade, e no apenas com especialistasna rea de populao (Martine, 1991).Tratava tambm de temas muito maisabrangentes, enfatizando questes como

    a promoo da igualdade, o repdio aocontrole populacional e, vrios anos antesdo Cairo, j abordava questes de sadesexual e reprodutiva.

    Em suma, fundamentada na visoprogressista e socialmente comprometidade Barroso, a MacArthur foi precursora deuma concepo mais abrangente dostemas populacionais; com isto a Fundaose distanciava claramente das outras

    entidades internacionais, e dilatava a com-preenso do conceito de estudos popula-cionais. O modus operandi da Fundaotambm discrepava dos outros doadores nosetor. Em vez de financiar pesquisas ouformao acadmica, a MacArthur decidiuabrir um concurso para jovens profissionaiscom o intuito de selecionar, anualmente,oito profissionais ou ativistas que seriamagraciados, cada um, com uma bolsa detrs anos. Os concursos eram abertos a umagrande variedade de profissionais e temas,incluindo jornalistas e artistas. Pretendia-se que, com estes recursos, os bolsistastivessem a tranqilidade financeira paradesenvolver pesquisas, trabalhos, estudos,publicaes, aes etc. que requeriam umhorizonte de tempo mais extenso. Por outrolado, a MacArthur propiciava encontros eapoio tcnico aos bolsistas e, eventualmen-te, viagens de estudo e reconhecimento.

    Esta modalidade de apoio, aplicada noBrasil por doze anos, permitiu a um nmerosignificativo de profissionais talentosos

    desenvolver suas capacidades e, aomesmo tempo, realizar atividades de aoe/ou pesquisa em prol do desenvolvimentobrasileiro. Indiretamente, essas atividadestambm serviram para ampliar a viso dosestudiosos de populao no Brasil, dandomaior destaque a questes de gnero,sade reprodutiva, comunicao, meioambiente e outros.

    Com a mesma filosofia, a MacArthurtambm apoiou um grande nmero de

    entidades brasileiras destacadas tanto porseus compromissos ativistas como por suaexcelncia tcnica, incluindo a Abep. importante constatar que os primeiros GTsda Abep (Meio Ambiente e Gnero) tambmdevem seus incios a uma dotao daMacArthur. Um total de 73 entidades solistadas no relatrio final do programa daFundao no Brasil (MacArthur, 2003) comotendo recebido seu apoio.6 Embora o Brasil

    6Os grupos beneficiados incluem,inter alia: Associao Brasileira Interdisciplinar de AIDS (Abia); Casa de Cultura da Mulher Negra;Catlicas pelo Direito de Decidir Brasil; Centro Brasileiro de Anlise e Planejamento (Cebrap); Centro Feminista de Estudos eAssessoria (CFEMEA); Cidadania, Estudo, Pesquisa, Informao e Ao (Cepia); Comunicao e Cultura Instituto de Sade eDesenvolvimento Social (ISDS); Instituto Sociedade, Populao e Natureza (ISPN); Cunh Coletivo Feminista; Ecos Comunicao em Sexualidade; Fala Preta Organizao de Mulheres Negras; Grupo de Trabalho e Pesquisa em OrientaoSexual (GTPOS); Ipas; Programa de Apoio ao Pai (Papai); Rede Nacional Feminista de Sade e Direitos Reprodutivos; SOS-Corpo Gnero e Cidadania; Themis Assessoria Jurdica e Estudos de Gnero; Transas do Corpo.

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    j no conste como um dos quatro pasescom tratamento preferencial, um endowmentda MacArthur permite a continuao deapoios especficos.

    Usaid

    O papel da United States Agency forInternational Development (Usaid) nocampo populacional muito conhecido nasreas de planejamento familiar e controledemogrfico, nas quais passou a ser umdos principais atores mundiais a partir de1965.7 Menos conhecido o seu papel nocampo da informao e da pesquisa

    demogrfica. Na verdade, a Usaid foi umdos lderes mundiais na implementao deprogramas internacionais para o apri-moramento das fontes de dados bsicos.8

    No Brasil, deu uma assistncia tcnicaconsidervel ao IBGE durante a dcada de60. Sua influncia foi particularmentemarcante na origem das PNADs, que foramgestadas e desenvolvidas dentro daconcepo de pesquisas contnuas domi-ciliares proposta para as Amricas pelo USBureau of the Census.9 Como resultadodessa iniciativa, as PNADs foram implan-tadas num momento estratgico. De fato,at aquela data, as fontes de informaesbsicas limitavam-se, essencialmente, aoscensos decenais. Pior: o Censo Demogr-fico de 1960 havia afundado num marasmode dificuldades operacionais e ningum eracapaz de prever se, ou quando, estasinformaes poderiam aparecer.

    A idia original dessa colaborao era

    [...] criar um sistema relativamente fcil demanter, que investigasse algumas dezenasde milhares de domiclios de cada vez,permitindo, a nvel agregado, [...] umacompanhamento sistemtico do quadrosocioeconmico do Pas. (US Bureau of theCensus, 1969, s/p.)

    Para tanto, o Plano Atlntida desen-volvia, detalhadamente, todos os aspectosde uma pesquisa contnua em basedomiciliar: objetivos, contedo e desenhodos questionrios, plano de amostragem,princpios de expanso da amostra,organizao dos trabalhos de campo,manuais para entrevistadores etc. Osdocumentos do Plano Atlntida erambaseados na prpria experincia do USBureau of the Census, mas tambm incor-poravam explicitamente as recomendaesda ONU e dos acordos interamericanos.

    Calcadas nas sugestes do PlanoAtlntida, as PNADs foram implantadas nosegundo trimestre de 1967, com periodi-cidade trimestral e cobertura geogrficaparcial. No contexto sociopoltico daquelemomento, o Brasil iniciava a era de ouro doplanejamento tecnocrtico. Comeavatambm o perodo de grande generosidadedos emprstimos externos para financiar osprogramas e projetos colossais de infra-estrutura e outros empreendimentos promo-

    vidos pelogoverno militar (hoje conhecidoscomo dvida externa). A ausncia deinformaes confiveis em setores bsicosera um empecilho importante a esse avanoda tecnocracia. As informaes geradas pelaPNAD eram uma promessa de que taislacunas poderiam ser preenchidas.

    At meados da dcada de 70, a PNADconstitua, praticamente, a nica fonteconfivel, abrangente e contnua de dadossobre emprego e renda. Outras fontes foram

    surgindo e a PNAD foi incorporando outrostemas. Embora tenham sido interrompidasdurante alguns anos, as PNADs foramganhando em substncia, periodicidade ecobertura geogrfica at se transformarem,

    j na dcada de 80, na principal fonte deinformao socioeconmica corrente no

    7 USAID support for family planning and reproductive health (FP/RH) in Brazil continued for more than thirty years, from the late1960s until the program was officially closed in September 2000. USAID was the pioneer donor in providing family planningassistance in Brazil and, remarkably, remained the largest donor until 2000. (Merrick, Liljestrand e Pielemeier, 2000, p. 6).8A discusso que segue baseada em Martineet al. (1988).9 Durante a dcada de 60, a United States Agency for International Development (Usaid) e o Inter-American Statistical Institute(IASI) se empenharam em levar os pases latino-americanos a implantar e desenvolver um sistema de inquritos contnuosdomiciliares, visando no somente proporcionar informaes de interesse de cada pas, mas tambm prover o continente deestatsticas populacionais que fossem comparveis. O Brasil, com a ajuda da Usaid, consistiu em uma destas experincias deimplantao, havendo-se adaptado s idias contidas no documento de treinamento inicial, que serviu como ponto de partidapara a elaborao da pesquisa, o Plano Atlntida. (US Bureau of the Census, 1969).

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    pas. A contribuio da Usaid a esseaspecto dos estudos populacionais inegvel. Entretanto, durante a dcada de70, a Usaid restringiu seu apoio rea decontrole populacional e, com isso, ficourelegada a um papel inexpressivo nocenrio brasileiro.

    Posteriormente, conforme sabido atpelas geraes mais jovens, a Usaid foi oprincipal financiador das pesquisas dereproduo humana, as DemographicHealth Surveys (DHS). Neste levantamento,feito por amostragem, coletam-se dadossobre fecundidade, nupcialidade, planeja-mento familiar, mortalidade infanto-juvenile sade materno-infantil, a partir de entre-vistas domiciliares. A populao alvo dapesquisa composta por todasas mulheresde 15 a 44 anos de idade, independen-temente do estado civil, e residentes nosdomiclios visitados. No Brasil, essapesquisa foi realizada em nvel nacional em1986 e 1991 e no mbito apenas doNordeste em 1996.

    FNUAPConforme meno anterior, o Fundo de

    Populao das Naes Unidas (FNUAP) foicriado em 1969, tornando-se, em 1971, oorganismo das Naes Unidas responsvelpor programas de populao. A histriado FNUAP no Brasil pode ser dividida emdois perodos bem marcados, os quaiscorrespondem a duas eras diferentes natrajetria do prprio Fundo.

    No seu primeiro quarto de sculo devida, o FNUAP era claramente parte doelenco de instituies internacionais criadaspara propagar o planejamento familiar e,desta forma, estabilizar o crescimentopopulacional. Entretanto, esse objetivocentral era mais diludo no Fundo que emoutras instituies do gnero, pelo fato deque sua orientao e seu trabalho de-pendiam de um Conselho Executivo, noqual eram representadas as vises muito

    heterogneas dos pases integrantes daONU sobre a questo populacional. De fato,pelo menos duas grandes regies, frica e

    Amrica Latina, questionavam sistematica-mente a soluo do desenvolvimento viareduo do ritmo de crescimento do

    denominador. Por causa destas discre-pncias, o FNUAP foi obrigado a adotar, nasua atuao em diferentes pases, umapostura mais poltica e cautelosa, emrelao ao controle populacional, que outrasentidades doadoras. Para atender sdemandas dos pases em desenvolvimentoe, ao mesmo tempo, escapar s acusaesde controlista, o FNUAP apoiou, na maioriados pases, uma programao bastanteampla na qual o apoio ao planejamentofamiliar era balanceado com atividades depesquisas, bolsas de estudos, gerao oumelhoria de fontes de dados etc. Impli-citamente, esperava-se que tais atividadeslevariam os diferentes pases a formularpolticas de populao, entendidas es-sencialmente como polticas de reduoda fecundidade. Nesse contexto, inte-ressante observar que no Brasil, pas noqual a oposio ao controlismo era das maisintensas, essa abordagem mais equilibradae diversificada custou muito a ser adotadapelo escritrio local. De fato, at o perodo

    preparatrio Conferncia Internacional dePopulao e Desenvolvimento (CIPD) doCairo, em 1994, a maior parte dos recursosdo FNUAP aplicados no Brasil foi destinadas atividades e entidades de planejamentofamiliar. Tal discrepncia pode ser explica-da, pelo menos em parte, pela organizaodescentralizada do Fundo, cujos re-presentantes locais acabavam tendo muitaautonomia no manejo dos recursos ins-titucionais, e pela postura da prpria

    comunidade demogrfica brasileira, queevitava demandar seus recursos, porentender ser o Fundo um agente do con-trolismo populacional.

    Diversos fatores acabaram levando auma mudana radical de postura do FNUAPa partir da Conferncia do Cairo. Por umlado, continuavam as divergncias entre ospases a respeito da eficcia do controlepopulacional. Por outro, a ronda de censosde 1990 indicava claramente que a fecun-

    didade estava caindo a ritmos inesperadose que o espectro da exploso demogrficaestava definitivamente afastado, exceto emalguns pases mais pobres. No entanto,o fator mais importante foi provavelmentea crescente oposio dos movimentos

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    sociais, particularmente do movimento demulheres, ao que se considerava umaatitude controlista do FNUAP e de outrasentidades na rea populacional. Asdiferentes PrepComs que antecederam aCIPD catalisaram essa oposio eobrigaram o Fundo a dar uma guinada de180 graus na sua interpretao da questopopulacional, sem a qual seu apoio polticopoderia ser irremediavelmente abalado.

    Os avanos proporcionados pelaConferncia do Cairo so sobejamenteconhecidos e no valem a pena serdiscutidos aqui. O importante, para a nossafinalidade, observar a virada que esteevento deu na atuao do FNUAP no Brasil.J no perodo preparatrio ao Cairo, oescritrio local tratava de dar maior apoioaos estudos populacionais e Abep. Noperodo posterior CIPD, e com umaliderana mais progressista na Divisopara Amrica Latina e o Caribe, o Fundopassou a entender melhor a problemticabrasileira e a apoiar uma srie de

    atividades ligadas a gnero, populao edesenvolvimento, e ensino, alm de sadereprodutiva.

    Embora os recursos financeirosdisponveis para o programa do Fundo noBrasil estejam mais minguados, o impactodesse programa hoje bastante maissignificativo. De fato, tem havido umarelao cada vez mais sinrgica entre oFNUAP e a comunidade de estudospopulacionais. Por um lado, o apoio do

    Fundo tem sido absolutamente crtico narealizao das atividades da ComissoNacional de Populao e Desenvolvimento(CNPD) e da prpria Abep. Por outro, aCNPD e a Abep tm propiciado uma maiorvisibilidade e legitimidade ao FNUAP,participando ativamente da formulao doseu programa e na realizao de atividadesde promoo do Fundo.

    Concluso

    Malgrado as bvias limitaes dasinformaes apresentadas neste ensaio, opapel central dos organismos e fundaesinternacionais nos estudos populacionaisbrasileiros fica bastante claro. Na formaoprofissional, na gerao de dados, na reali-zao de estudos e atividades de ensino,na formao de redes, a influncia externaaparece como forte, quase imprescindvel.

    Apesar disso, os intelectuais da demografiabrasileira sempre se comportaram com muitaindependncia e desprendimento, tanto noaspecto acadmico como no ideolgico. Defato, nasceram daqui muitas das contestaesao controlismo que acabaram encontrandoressonncia e uma maior difuso na CIPD.

    O grande desafio, nessa poca em queos recursos internacionais para atividadesna rea de populao esto minguando, garantir a sustentabilidade dos estudos depopulao no contexto brasileiro. O fatoconcreto que nos encontramos nummomento de inflexo no que se refere aofinanciamento dos estudos de populao. preocupante a falta de auto-suficincia,tendo em vista a retirada dos recursosprivilegiados que a rea de populaorecebia para capacitao e pesquisa. Istotudo nos obriga a pensar em novasestratgias de renovao para manter vivoo interesse nos temas populacionais e paragarantir que eles conservem e mesmoaumentem sua relevncia nas agendas

    nacionais. De outra forma, inevitvel queo esforo feito na rea de populaodurante os ltimos 40 anos definhe.Portanto, temos a um grande desafio: comosobreviver e crescer em tempos de recursosexternos declinantes? Certamente, acriatividade da nossa juventude, apoiadapela sabedoria dos mais experientes,ser capaz de gerar solues adequadas.

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    Anexo

    QUADRO 1

    Projetos do Nepo com recursos internacionais

    QUADRO 2Apoios internacionais recebidos pelo CRH-UFBA para pesquisas e bolsas

    Fonte: Lista preparada pelo CRH-UFBA, por intermdio de Guaraci Adeodato Alves de Souza.

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    Abstract

    The role of international organisms in the evolution of population studies in Brazil: preliminarynotes

    This article analyzes the influence of international donor agencies on the evolution of populationstudies in Brazil. The exceptional growth of demography in this country was generated, in part,by international concern with population growth and by the resources made available to us.International agencies that wished to influence population issues in Brazil had two choices.Until the Cairo Conference, USAID and UNFPA operated primarily through alliances withorganizations that promoted family planning, related to fertility reduction. The Ford Foundation,the Pan-American Health Organization, the Population Council, and the Rockefeller Foundationchose a less direct strategy, which was more useful for Brazil. They encouraged the formationof a critical mass capable of taking the initiative for political thought in the domain of population.

    Directly or indirectly, this approach ended up benefiting researchers as well as the variouslearning and research institutions now existing in Brazil. The international donor with thegreatest long-term influence in Brazil was the Ford Foundation. The MacArthur Foundationadopted a new approach to the financing of population studies, anticipating the vision drawnup in Cairo. Today, the post Cairo version of UNFPA is practically the only donor that continuesto support us systematically, a situation that forces us to find new approaches in order tocontinue expanding the influence of population studies in the future.

    Key words: International research funding agencies. Progress in demographic studies.Demographic policies. Brazil.

    Recebido para publicao em 25/01/2005.Aceito para publicao em 24/06/2005.

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