FONOAUDIOLOGIA, NEUROCIÊNCIA E APRENDIZAGEM

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FONOAUDIOLOGIA NEUROCIÊNCIA E APRENDIZAGEM Carla Marcela Faedda* *Fonoaudióloga, psicopedagoga, Esp. Neurociência da aprendizagem. Junho de 2012. A neurociência reúne as disciplinas biológicas que estudam o sistema nervoso, normal e patológico. É o estudo da realização física do processo de informação no sistema nervoso humano. O estudo da neurociência engloba três áreas principais: a Neurofisiologia (estudo das funções do Sistema nervoso), a Neuroanatomia (estudo da estrutura do Sistema Nervoso) e Neuropsicologia (estudo da relação entre as Funções Neurais e Psicológicas). O último século veio revolucionar o modo como hoje entendemos as funções e (disfunções) do sistema nervoso. Os progressos observados nas áreas de neuroimagem e da neurofisiologia permitiram, então, melhor correlacionar localização e função, resultando na identificação e diagnóstico de grande parte dos distúrbios que agora sabemos reconhecer. Com a descoberta dos raios-X a marcar a virada do século XIX, 1912 assinalou a descoberta incidental da pneumoencefalografia, após um traumatismo craniano. A década

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FONOAUDIOLOGIA NEUROCIÊNCIA E APRENDIZAGEM

Carla Marcela Faedda*

*Fonoaudióloga, psicopedagoga, Esp. Neurociência da

aprendizagem. Junho de 2012.

A neurociência reúne as disciplinas biológicas que estudam o

sistema nervoso, normal e patológico. É o estudo da realização física do

processo de informação no sistema nervoso humano. O estudo da

neurociência engloba três áreas principais: a Neurofisiologia (estudo das

funções do Sistema nervoso), a Neuroanatomia (estudo da estrutura do

Sistema Nervoso) e Neuropsicologia (estudo da relação entre as Funções

Neurais e Psicológicas).

O último século veio revolucionar o modo como hoje entendemos

as funções e (disfunções) do sistema nervoso. Os progressos observados

nas áreas de neuroimagem e da neurofisiologia permitiram, então,

melhor correlacionar localização e função, resultando na identificação e

diagnóstico de grande parte dos distúrbios que agora sabemos

reconhecer.

Com a descoberta dos raios-X a marcar a virada do século XIX,

1912 assinalou a descoberta incidental da pneumoencefalografia, após

um traumatismo craniano. A década de 20 viria ainda nascer a

angiografia cerebral, pela mão de Egas Morniz, começando a vislumbrar-

se relações entre certas alterações do líquor e determinados estados

mórbidos neurológicos. E nos anos 40 foi introduzida a imagem por

ultrassonografia.

À expectativa de que os avanços científicos na área das

neurociências pudessem permitir a melhor prevenção, alívio ou cura de

muitas afecções neurológicas, o governo americano e, mais tarde, a

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União Européia vieram a declarar a década de 90 como a “Década do

Cérebro”, mobilizando mais de 1 bilhão de dólares para fins de

investigação e pesquisas.

Com o avanço da área de neurociências e através de observações

de atividade cerebral, bem como do emprego de técnicas avançadas de

neuroimagem, no século XXI, permitiram-se importantes evoluções a

respeito do conhecimento de circuitos cerebrais, responsáveis por

distintas operações da cognição humana, identificação anatômica de

algumas desordens mentais, aspectos bioquímicos e moleculares.

Também a abrangência de técnicas da neuroimagem possibilita

visualizar a estrutura e o funcionamento cerebral como fluxo sanguíneo,

metabolismo, composição química e densidade de receptores cerebrais

em seres vivos, identificação de déficits funcionais em vias neurais

definidas ou desequilíbrios em suas múltiplas interações, para melhor

explicação dos sintomas positivos e negativos do transtorno, além de

fornecerem elementos para a confirmação da base biológica dos

distúrbios.

Neurociência é um termo ainda recente, que indica a ciência que

estuda o sistema nervoso. A Fonoaudiologia faz parte do grupo de

ciências que estudam as funções cognitivas, dentre estas, a Linguagem,

que estuda o processo de comunicação oral e escrita1. Apesar de ser um

termo novo, o estudo do encéfalo é tão antigo quanto a própria ciência.

Vasconcelos et al (2009), publicou um estudo sobre o crescimento

das publicações relacionadas a Fonoaudiologia e a neurociência e

comprovou um aumento crescente de publicações em Linguagem e em

Neurociências nos últimos cinco anos. Contudo, o número de

publicações em determinados temas como a Dislexia, a Doença de

Alzheimer e o Transtorno do Déficit de Atenção / Hiperatividade ainda

mostra-se resumido.

1 Conselhos Federal e Regionais de Fonoaudiologia. Lei 6965/81. Código de Ética da Fonoaudiologia. 2004; 44p.

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O cérebro tem aproximadamente 100 mil milhões de neurônios;

cada neurônio se liga a 10.000 outros neurônios. Conhecer como o

cérebro funciona não é a mesma coisa do que saber qual é a melhor

maneira de ajudar os alunos a aprender e principalmente aqueles alunos

que tem mais dificuldades em reter conteúdos. A aprendizagem e a

educação estão intimamente ligadas ao desenvolvimento do cérebro, o

qual é moldável aos estímulos do ambiente.

Os estímulos do ambiente levam os neurônios a formar novas

sinapses. Assim, a aprendizagem é o processo pelo qual o cérebro reage

aos estímulos do ambiente, ativando sinapses, tornado-as mais

“intensas”. Como conseqüência, estas se constituem em circuitos que

processam as informações, com capacidade de armazenamento

molecular.

O estudo da aprendizagem une a educação com a neurociência. A

neurociência investiga o processo de como o cérebro aprende e lembra

dentre outros fenômenos do cérebro, desde o nível molecular e celular

até as áreas corticais. A formação de padrões de atividade neural

considera-se que correspondam a determinados “estados e

representações mentais”. Existem estudos em psicologia cognitiva que

abordam a “metacognição”2 como estratégia para melhorar a

aprendizagem.

O ensino bem sucedido provocando alteração na taxa de conexão

sináptica, afeta a função cerebral. Por certo, isto também depende da

natureza do currículo, da capacidade do professor, do método de ensino,

do contexto da sala de aula e da família e comunidade, pois tudo

depende do “meio de inserção” desse indivíduo, pois todos aprendemos,

porém, porque uns aprendem mais que os outros?

Todos estes fatores interagem com as características do cérebro

dos indivíduos.

2 A metacognição é a capacidade do ser humano de monitorar e auto-regular os processos cognitivos (STERNBERG, 2000).

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A alimentação afeta o cérebro da criança em idade escolar. Se a

dieta é de baixa qualidade, o aluno não responde adequadamente a

excelência do ensino fornecido e aí por diante.

Sabemos o quanto é importante para a criança os primeiros anos

de desenvolvimento e também a importância de uma convivência

afetiva com a família, mas principalmente com os pais, na aprendizagem

infantil. As descobertas atuais são o coroamento e reconhecimento da

importância do diligente cuidado maternal, exercido de forma instintiva

por séculos. Os pais sempre souberam de maneira intuitiva, que recém

nascidos e crianças pequenas precisam de afeição e carinho. O que é

fascinante sobre a nova compreensão do desenvolvimento do cérebro, é

o que este órgão frágil e complexo, nos revela sobre como boa nutrição

e cuidados com a saúde na fase pré-natal e nos primeiros anos, criam as

fundações para as etapas posteriores (Papalia & Olds, 2000; Slater &

Lewis, 2002).

Naturalmente o estímulo durante o desenvolvimento biológico

pode ser de qualidade ou deletério. Por exemplo, no primeiro trimestre

do desenvolvimento embrionário o feto é particularmente afetado por

neurotoxinas como fumo, chumbo, alumínio e mercúrio. Já a estimulação

proveniente de um lar violento, afetado pelo consumo descabido de

bebidas alcoólicas, agressões e intimidações, gera seqüelas no

desenvolvimento cerebral das crianças.

A síndrome alcoólica fetal, entre outros danos, “queima”

neurônios, e provoca déficits comportamentais e de função cognitiva.

Por sua vez, a subnutrição da gestante gera crianças com cérebro

menor.

Especificamente a carência de ferro na alimentação produz profundos

efeitos nas funções motoras e cognitivas. O ion Fe++ indiretamente

participa da síntese de neurotransmissores, mielinização das fibras

nervosas e dos processos de codificação da memória no hipocampo

(Moura, 1994, Nathanielsz, 1999).

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Os bebês nascem com a capacidade sensorial básica que se

desenvolve durante a infância. Já nos primeiros dias aprendem a

reconhecer o rosto de suas mães (Field, et al., 1984). Prestam atenção

mais tempo para a voz da mãe do que a de estranhos, e há indicações

de que reconhecem a voz da mãe já ao nascer, por se habituarem a este

som ainda na fase uterina 12 (DeCasper & Fifer, 1980). A compreensão

das emoções, desejos e o que os outros acreditam, desempenha

importante papel na interação social. Muito precocemente os recém

nascidos distinguem as expressões faciais básicas de alegria, tristeza e

raiva. Em torno dos 18 meses de vida os bebês sabem os princípios

elementares de que as outras pessoas podem ter diferentes “pontos de

vista”, desejos e emoções do que eles mesmos (Rapacholi & Gopnik,

1997).

Ainda nesta faixa de idade as crianças se divertem com atividades

do “fazer de conta”.

Isto demanda saber o que é real e o que não é, um dos primeiros

passos para a criatividade. Ao redor dos 3 anos de idade começam a

falar o que pensam (acham), por exemplo eu acho que o doce está no

armário! Somente aos 4-5 anos de idade as crianças começam a

perceber que, o que elas “acham” é diferente do que as outras pessoas

pensam, como se propõem na teoria da mente (Meltzoff, 1999; Jou &

Sperb, 1999; Meltzoff & Decety, 2003).

Para se beneficiar da educação formal as crianças devem ter uma

apreensão, ainda que rudimentar, de como se aprende. Ter ciência do

que não sabe, é pré-requisito para que a instrução sistemática que a

criança recebe na escola seja bem sucedida. Pelos 5 anos de idade, com

um bom grau de amadurecimento dos circuitos neuronais e

aperfeiçoamento das conexões e atividades de regiões do córtex,

capacita as crianças a receberem a instrução pré-escolar.

A neurociência cognitiva sugere o que parece ser “períodos

críticos“ do desenvolvimento da criança.

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Estimulação sensorial positiva, como carinho da mãe, fortalece e

aumenta a longevidade sináptica. Esta condição, presume-se, reflete no

desenvolvimento cognitivo acelerado, emoções equilibradas, apego e

capacidade de responder positivamente a novas experiências.

Na negligência extremada quando a criança é privada de qualquer

afeto e atenção da mãe, reduzem-se as chances da criança vir a ter bom

desempenho na escola, e na futura vida afetiva. Contudo, intervenção

precoce eficiente reverte o quadro. A maioria destas habilidades se

extinguem ou ficam esmaecidas em torno dos 6 anos, como

argumentam os arautos da prevenção de perda de sinapses (“poda”

sináptica). No entanto, não há estudos que comprovem esta afirmativa.

Muitos educadores citam pesquisa científica sobre o

desenvolvimento do cérebro para advogar práticas educacionais o mais

precoce possível (Caine & Caine,1990; Rice et al.,1996; Ramos, 2002).

Alegam que as crianças devem começar a estudar uma segunda

língua, aritmética, música clássica o quanto antes para não ficarem

defasados. A alfabetização científica deve iniciar já na pré-escola (jardim

I, II) e primeira & segunda séries do ensino fundamental,

particularmente com relação ao cérebro humano recomenda-se salientar

que os “órgãos dos sentidos nos alertam sobre perigos”, “que o cérebro

envia mensagens para fazer o corpo trabalhar”, “que o pensamento

ocorre no cérebro” (Foy, et al. 2006). Contudo, a comunidade científica

salienta que não se sabe o suficiente sobre desenvolvimento cerebral

para relacionar diretamente com instrução e educação e que a

neurociência cognitiva (interface entre biologia & comportamento)

poderia fazer a contribuição mais expressiva, (Bruer, 1998; 1999; 2002;

2006).

O processo de proliferação sináptica é diferente nas diversas áreas

do cérebro e diferentes tipos de neurônios mesmo na mesma região

cerebral perdem e formam novas sinapses à taxas diferentes. Por

exemplo, no córtex frontal humano, área responsável pelo

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planejamento, integração da informação e tomada de decisão, a

formação de sinapses continua ao longo da adolescência, só se

estabilizando em torno dos 18-21 anos (Goldman-Rakic, 1987;

Huttenlocker, 1990; Rakic, 1995).

O objetivo mais importante da educação é desenvolver uma

capacidade de aprender mais adequada a cada indivíduo, de acordo

com os períodos receptivos para a aquisição das funções cognitivas. O

progresso da neurociência cognitiva está conduzindo a novas

descobertas. As funções cerebrais humanas estão localizadas em várias

áreas funcionais. E cada área funcional terá um período receptivo

diferente devido a plasticidade das redes neurais.

Uma das subdivisões do estudo da neurociência é a neurociência

cognitiva que aborda os campos de pensamento, aprendizado e

memória. O estudo do planejamento, do uso da linguagem e das

diferenças entre a memória para eventos específicos, e a memória para

a execução de habilidades motoras, são exemplos da análise ao nível

cognitivo.

Os métodos empregados na neurociência cognitiva incluem

paradigmas experimentais de psicofísica e da psicologia cognitiva,

neuroimagem funcional, genômica cognitiva, genética comportamental,

assim também como estudos eletrofisiológicos de sistemas neurais.

Estudos clínicos de psicopatologia em pacientes com déficit cognitivo,

constitui um aspecto importante da neurociência cognitiva.

Para Kandel, ganhador do Prêmio Nobel em Fisiologia e Medicina

em 2000, a neurociência atual é a neurociência cognitiva, um misto de

neurofisiologia, anatomia, biologia desenvolvimentista, biologia celular e

molecular e psicologia cognitiva.

A Neurociência Cognitiva procura estabelecer correlações entre

propriedades de estímulos apresentados ao Sistema Nervoso Central;

Medidas da atividade cerebral, por meio de diversas tecnologias;

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Propriedades mentais, reportadas por meio de relatos verbais ou não-

verbais.

A motivação é fundamental para o processo de aprendizagem,

através dela, podemos trabalhar diversos componentes favorecedores,

como o encorajamento, retorno positivo; apresentando estímulos, com

uma dificuldade adequada à faixa etária e grau de desempenho; a

motivação permite que a criança se empenhe na prática, ou seja, se

dedique de fato a aprender algo. A Antecipação do resultado positivo

nos leva a ação.

  Os tipos de Processos Mentais Estudados pela neurociência

cognitiva são a aprendizagem e a memória; a atenção; a motivação e as

emoções; a sensação e a percepção; Identidade pessoal (o “Eu”); O

pensamento e as funções executivas; a linguagem e a interpretação; a

motricidade e o planejamento motor.

Esta abordagem permitirá o diagnóstico precoce de transtornos de

aprendizagem. Este fato exigirá métodos de educação especial, ao

mesmo tempo a identificação de estilos individuais de aprendizagem e a

descoberta da melhor maneira de introduzir informação nova no

contexto escolar.

Investigações focalizadas no cérebro averiguando aspectos de

atenção, memória, linguagem, leitura, matemática, sono e emoção e

cognição, estão trazendo valiosas contribuições para a educação.

Pesquisadores em educação têm uma postura otimista de que as

descobertas em neurociências contribuam para a teoria e práticas

educacionais. Destarte, uma avalanche de artigos leigos em jornais

diários e revistas de divulgação e mesmo periódicos científicos, têm

exagerando os benefícios desta contribuição, variando daqueles

totalmente especulativos àqueles incompreensíveis e esotéricos.

Desenvolver currículos escolares “sob medida”, para atender esse

ou aquele aluno é uma informação infundada do que a neurociência

pode oferecer à educação.

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A pesquisa em neurociência por si só não introduz novas

estratégias educacionais. Contudo fornece razões importantes e

concretas, não especulativas, porque certas abordagens e estratégias

educativas são mais eficientes que outras.

É fundamental que educadores conheçam as estruturas cerebrais

como “interfaces” da aprendizagem para a ininterrupção do

desenvolvimento também biológico, e, para isto, os estudos da

neurobiologia vêm contribuindo para as práxis em sala de aula, na

compreensão das dimensões cognitivas, motoras, afetivas e sociais, no

redimensionamento do sujeito aprendente e nas suas formas de

interferir nos ambientes pelos quais perpassa. (RELVAS,2009).

Existem algumas primícias sobre a contribuição da neurociência

para aprendizagem escolar que são muito relevantes e fazem parte de

estudos científicos sérios e tem sua comprovação científica como, a

aprendizagem fazendo parte de atividades sociais dos indivíduos, que

facilitam a estes, expor seus sentimentos, visto que, a aprendizagem,

memória e emoções estão ativados pelo processo de interrelação.

Outra contribuição importante é que sabemos que o cérebro se

modifica aos poucos tanto fisiológica quanto estruturalmente como

resultado das experiências, quanto mais práticas as aulas, quanto mais

ativamente os estudantes estiverem participando desse processo, mais

eles vão reter o que aprenderam.

O cérebro mostra períodos ótimos (períodos sensíveis) para certos

tipos de aprendizagem, que não se esgotam mesmo na idade adulta.

Ajuste de expectativas e padrões de desempenho às características

etárias específicas dos alunos, uso de unidades temáticas integradoras

facilitam o processo.

O cérebro mostra plasticidade neuronal (sinaptogênese), mas

maior densidade sináptica não prevê maior capacidade generalizada de

aprender. Os Estudantes precisam sentir-se “detentores” das atividades

e temas que são relevantes para suas vidas. Atividades pré-selecionadas

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com possibilidade de escolha das tarefas, aumenta a responsabilidade

do aluno no seu aprendizado.

Inúmeras áreas do córtex cerebral são simultaneamente ativadas

no transcurso de nova experiência de aprendizagem. Situações que

reflitam o contexto da vida real, de forma que a informação nova se

“ancore” na compreensão anterior.

O cérebro foi evolutivamente concebido para perceber e gerar

padrões quando testa hipóteses. Promover situações em que se aceite

tentativas e aproximações ao gerar hipóteses e apresentação de

evidências. Uso de resolução de “casos” e simulações oferece ao

cérebro a capacidade de estabelecer critérios que podem ser utilizados

posteriormente de diversas formas, estimulando a famosa

“reversibilidade”. A melhor maneira de estudar é aliar a atenção, uma

memória estimulada e um ambiente o menos distrator possível.

Cognição é sinônimo de “ato ou processo de conhecimento”, ou

algo que é conhecido através dele, e, funções cognitivas seriam os

processos mentais que nos permitem pensar, raciocinar e resolver

problemas. É a partir da relação entre todas as principais funções

cognitivas citadas anteriormente que entendemos a grande maioria dos

comportamentos, desde os mais simples até as situações de maior

complexidade, exigindo atividades cerebrais mais elaboradas.

Fonseca (2007) comenta que, a educação cognitiva torna-se

crucial para a escola regular, a sua sobrevivência como sistema de

formação de recursos humanos em qualquer grau ou nível requer um

currículo cognitivo enfocado para o desenvolvimento de funções que

estão na origem de processos de aprendizagem simbólicos e superiores,

pois ele não só melhora a cognição, como melhora a motivação para

aprender.

Com base no exposto pelo autor, podemos concluir que aprender,

portanto, envolve a simultaneidade da integridade neurobiológica e a

presença de um contexto social facilitador, portanto, o ensino de

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competências cognitivas ou o seu enriquecimento não deve continuar a

ser ignorado pelo sistema de ensino, ora assumindo que tais

competências não podem ser ensinadas ou ora assumindo que elas não

precisam ser ensinadas. Ambas as assunções estão profundamente

erradas: primeiro porque as funções cognitivas de nível superior podem

ser melhoradas e treinadas e, segundo, porque não se deve assumir que

elas emergem automaticamente por maturação, ou simplesmente por

desenvolvimento neuropsicológico.

A capacidade de pensar ou de raciocinar não é inata, as funções

cognitivas não se desenvolvem se não for objeto de treino sistemático e

de mediatização contínua desde a educação infantil até a universidade.

A gênese do insucesso escolar talvez tenha a sua razão nesta

assunção (FONSECA, 2007).

O processo educativo, em qualquer grau ou finalidade que seja

encarado, envolve sempre a potencialização das funções ou

capacidades cognitivas, pois são elas no seu todo que vão permitir ao

indivíduo resolver problemas e equacionar as suas soluções adaptativas.

Para Fonseca (2007), desenvolver o potencial de aprendizagem

com programas de enriquecimento cognitivo não é uma futilidade, na

medida em que o potencial não se desenvolve no vazio, nem apenas por

instrução convencional; para que ele se desenvolva é preciso que seja

estimulado e treinado intencionalmente.

A escola do futuro deve privilegiar no treino cognitivo não só

formas de pensamento analítico, dedutivo, rigoroso, convergente, formal

e crítico, como formas de pensamento sintético, indutivo, expansivo,

divergente, concreto e criativo, interligando-os de forma harmoniosa. A

escola deve e pode, portanto, ensinar funções cognitivas que estão na

base de todas as aprendizagens, simbólicas ou não.

Com ensino mediatizado, com prática e treino, as funções ou

competências cognitivas de qualquer aluno podem ser melhoradas,

aperfeiçoadas, uma vez que todos possuem um potencial de

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aprendizagem para se desenvolver de forma mais eficaz do que

efetivamente tem feito.

O cérebro responde, devido à herança primitiva, às gravuras,

imagens e símbolos. Propiciar ocasiões para alunos expressarem

conhecimento através das artes visuais, música e dramatizações,

propiciando a formação de esquemas mentais, métodos minemônicos

são de grande importância para a subcorticalização das experiências.

A neurociência oferece um grande potencial para nortear a

pesquisa educacional e futura aplicação em sala de aula. Pouco se

publicou para análise retrospectiva. Contudo, faz-se necessário construir

pontes entre a fonoaudiologia a neurociência e a prática educacional,

através de estudos e pesquisas sérias e bem fundamentadas.

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