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ii

FRANCO, FERNANDO LEME

I. COPPE/UFRJ II. Título (série)

FRANCO, FERNANDO LEME

Prospectiva Estratégica: uma metodologia

para a construção do futuro [Rio de Janeiro]

2007

X, 167p. 29,7cm (COPPE/UFRJ, D.Sc.,

Engenharia de Produção, 2007)

Tese – Universidade Federal do Rio de

Janeiro, COPPE

1. Prospectiva Estratégica

I. COPPE/UFRJ II. Título (série)

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Dedico esta tese a todos aqueles que acreditam que o

futuro não é uma simples manifestação do acaso.

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Agradeço

a Deus, que, em sua infinita bondade, concedeu-

me a graça de chegar até este ponto;

à minha família, à minha esposa, Patrícia,

companheira inseparável, por sua dedicação e apoio, a

meus filhos Pedro e João, pela compreensão nas horas

em que fomos privados da companhia mútua;

aos meus orientadores, prof. Alberto Gabbay

Canen e prof. Nélio Domingues Pizzolato, pela

orientação segura e pela paciência durante todo o curso;

aos amigos da Brainstorming, em especial o

prof. Raul Grumbach, que me apresentou os conceitos

de prospectiva; Rodrigo Grumbach, que, com muita

dedicação, implementou os diversos algoritmos

desenvolvidos; e Sergio Maia, que forneceu a maioria

dos dados do Projeto Mauatur;

ao Alte. Lauro Reis Salgado, pelo apoio e

incentivo no início deste curso.

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Resumo da Tese apresentada à COPPE/UFRJ como parte dos requisitos

necessários para a obtenção do grau de Doutor em Ciências (D.Sc.)

PROSPECTIVA ESTRATÉGICA:

UMA METODOLOGIA PARA A CONSTRUÇÃO DO FUTURO

Fernando Leme Franco

Fevereiro/2007

Orientadores: Alberto Gabbay Canen

Nélio Domingues Pizzolato

Programa: Engenharia de Produção

Este estudo visa desenvolver uma metodologia de identificação de um

cenário normativo desejado, aceitável e exeqüível, com base em cenários

prospectivos. A metodologia integra conceitos de planejamento estratégico,

cenários prospectivos e interações estratégicas. São apresentados, também, dois

softwares que informatizam a metodologia e duas aplicações práticas. As

conclusões mostram que a metodologia pode fornecer respostas consistentes a

problemas complexos e que o planejamento estratégico agregado a uma correta

visão dos futuros possíveis, com o emprego de análise de interações estratégicas,

consiste numa poderosa ferramenta para a construção de um futuro melhor.

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Abstract of the Thesis presented to COPPE/UFRJ as a partial fulfillment of the

requirement for the degree of Doctor of Science (D.Sc.).

STRATEGIC PROSPECTIVE:

A METHODOLOGY FOR THE CONSTRUCTION OF THE FUTURE

Fernando Leme Franco

February /2007

Advisors: Alberto Gabbay Canen

Nélio Domingues Pizzolato

Department: Production Engineering

The main objective of this study is to develop a methodology in order to

identify a normative, acceptable and achievable scenario, among prospective ones.

The methodology integrates the concepts of strategic planning, scenarios and

interaction. Also, it presents two softwares which computerize the methodology,

and two practical applications. The conclusion shows that the methodology could

present good and consistent results for complex problems. The strategic planning,

together with a correct vision of the possible futures, using the strategic

interaction analysis, is a powerful tool to build a better future.

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ÍNDICE DE TEXTO

1. INTRODUÇÃO ...................................................................................................... 1

1.1 DEFINIÇÃO DO PROBLEMA ............................................................................... 2

1.2 OBJETIVOS ...................................................................................................... 4

1.2.1 OBJETIVO GERAL .......................................................................................... 4

1.2.2 OBJETIVOS ESPECÍFICOS............................................................................... 5

1.3 CONTRIBUIÇÃO DA TESE .................................................................................. 5

1.4 ORGANIZAÇÃO DO TRABALHO........................................................................... 8

2. PROSPECTIVA ESTRATÉGICA: CENÁRIOS ........................................................ 11

2.1 DIMENSÃO POLÍTICA...................................................................................... 13

2.2 DIMENSÃO TÉCNICA....................................................................................... 17

2.3 CONSTRUÇÃO DO FUTURO ............................................................................. 18

2.4 ANÁLISE DE SENSIBILIDADE............................................................................ 21

3. REFERENCIAL TEÓRICO ................................................................................... 24

3.1 PLANEJAMENTO ESTRATÉGICO ....................................................................... 27

3.2 CENÁRIOS PROSPECTIVOS .............................................................................. 29

3.3 INTERAÇÕES ESTRATÉGICAS ........................................................................... 34

3.4 PESQUISA POR PALAVRAS-CHAVE ................................................................... 37

4. METODOLOGIA ................................................................................................. 40

4.1 DEFINIÇÃO DAS QUESTÕES ESTRATÉGICAS ...................................................... 42

4.2 CONSULTA A PERITOS – O MÉTODO DELPHI ................................................... 46

4.3 CONSTRUÇÃO DA MATRIZ DE CENÁRIOS .......................................................... 48

4.5 INTERAÇÕES ESTRATÉGICAS ........................................................................... 53

4.6 SIMULAÇÃO CONDICIONAL ............................................................................. 68

4.7 SELEÇÃO DO CENÁRIO NORMATIVO................................................................. 68

4.8 ACOMPANHAMENTO E CORREÇÕES................................................................. 70

5. DESENVOLVIMENTO DE SOFTWARE................................................................. 71

6. APLICAÇÕES DA METODOLOGIA...................................................................... 75

6.1 PROJETO BRASIL 3 TEMPOS ........................................................................... 75

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6.1.1 Identificação do sistema....................................................................... 766.1.2 Diagnóstico estratégico ........................................................................ 766.1.3 Análise prospectiva .............................................................................. 766.1.4 Avaliação das ações ............................................................................. 81

6.2 PROJETO MAUATUR ...................................................................................... 826.2.1 Identificação do sistema....................................................................... 836.2.2 Diagnóstico estratégico ........................................................................ 856.2.3 Análise prospectiva .............................................................................. 896.2.4.6 Avaliação das ações ........................................................................ 101

7. CONCLUSÕES .................................................................................................. 102

8. SUGESTÕES PARA FUTURAS PESQUISAS.......................................................... 105

9. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS .................................................................... 107

10. ANEXO 1 - PROJETO BRASIL 3 TEMPOS – TEXTOS SUBMETIDOS À CONSULTA

DELPHI ……………………………………………………………………...…..116

11. ANEXO 2- PROJETO MAUATUR – TEXTOS SUBMETIDOS À CONSULTA DELPHI

…………………………………………………………………………………..162

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ÍNDICE DE FIGURAS

Figura 2.1 – Cenários – Abordagem projetiva ....................................................... 19Figura 2.2 – Cenários – Abordagem prospectiva................................................... 20Figura 2.3 – Tipologia dos cenários ....................................................................... 21Figura 2.4 – Cenário normativo ............................................................................. 22Figura 2.5 – Construção de futuro – Abordagem projetiva ................................... 22Figura 2.6 – Construção de futuro – Abordagem prospectiva ............................... 23Figura 4.1 – Gestão estratégica .............................................................................. 41Figura 4.2 – Definição de evento ........................................................................... 44Figura 4.3 – Evento X Tendência .......................................................................... 45Figura 4.4 – Certeza X Probabilidade .................................................................... 48Figura 4.5 – Cenário mais provável ....................................................................... 56Figura 4.6 – Cenário normativo ............................................................................. 56Figura 4.7 – Parceria estratégica ............................................................................ 57Figura 4.8 – Motricidade X Dependência .............................................................. 61Figura 4.9 – Influência X Impacto ......................................................................... 64Figura 5.1 – Fases e etapas informatizadas no software Puma .............................. 72Figura 5.2 – Etapa informatizada no software Lince ............................................. 73Figura 6.1 – Atividades da Mauatur....................................................................... 84Figura 6.2 – Mauatur: Mapa de probabilidades ..................................................... 90Figura 6.3 – Mauatur: Motricidade x Dependência ............................................... 91Figura 6.4 – Mauatur – Geração de cenários ......................................................... 92Figura 6.5 – Mauatur – Influência de atores sobre eventos ................................... 94Figura 6.6 – Mauatur – Impacto de eventos sobre atores ...................................... 94Figura 6.7 – Mauatur – Matriz Influência x Impacto............................................. 95Figura 6.8 – Mauatur – Cenário normativo............................................................ 97Figura 6.9 – Mauatur – Cenários defensivos ......................................................... 97Figura 6.10 – Mauatur – Simulação com três ocorrências condicionais................ 98Figura 6.11 – Mauatur – Simulação ocorrências condicionais .............................. 99Figura 6.12 – Mauatur – Análise de exeqüibilidade ............................................ 100

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ÍNDICE DE TABELAS

Tabela 3.1 – Artigos publicados............................................................................. 38Tabela 3.2 – Teses defendidas – Capes.................................................................. 39Tabela 4.1 – Matriz de cenários ............................................................................. 51Tabela 4.2 – M1 – Matriz de probabilidades ......................................................... 59Tabela 4.3 – M2 – Matriz de impacto de evento sobre ator................................... 62Tabela 4.4 – M3 – Matriz de impacto de ator sobre evento................................... 63Tabela 4.5 – M4 – Matriz de impacto de ator sobre ator ....................................... 65Tabela 6.1 – Respostas da consulta Delphi ............................................................ 77Tabela 6.2 – Análise de cenários............................................................................ 96

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Toda forma de predição do futuro é umaimpostura; o futuro não está escrito e, pelocontrário, é necessário construí-lo. O futuro émúltiplo, indeterminado e aberto a uma grandevariedade de futuros possíveis. O que se vai passaramanhã depende menos de tendências passadasque se imporiam fatalmente aos homens do quedas políticas levadas a cabo por estes face a essastendências.

Godet et al. (2000a, p. 13)

1. INTRODUÇÃO

Desde os tempos pré-históricos, o homem identifica uma relação de

causalidade entre fatos passados e futuros. Em seus primórdios, o trovão, que

segue o relâmpago, deve ter despertado a curiosidade humana. Entender as

relações de causa e efeito entre passado e futuro logo saiu da esfera da curiosidade

para entrar na esfera da sobrevivência. Pensar no futuro implicava aumentar as

chances de sobrevivência.

Ainda na pré-história, o homem compreendeu também que suas

experiências passadas serviam como base, nem sempre como guia, para a tomada

de decisão sobre o futuro. Esse mesmo homem concluiu que suas experiências

eram sobre o passado, porém suas decisões eram sobre o futuro; não um futuro,

mas vários futuros possíveis.

O elo entre o passado e o futuro é o presente. Este é real, enquanto o

passado não aceita alterações e o futuro está por ser construído. Decisões somente

podem ser tomadas no presente, e são estas que irão moldar o futuro. A história da

humanidade, como a conhecida, pode ser descrita como um somatório das

resoluções assumidas por todas as pessoas que viveram no planeta, desde os

primórdios da civilização até os dias atuais, cujos impactos foram ampliados ou

reduzidos, pela ocorrência de eventos naturais totalmente fora de sua esfera de

competência.

Segundo Glenn (1994, p. 4), “as forças naturais, sociais, políticas,

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científicas e tecnológicas determinam fortemente o futuro. Todavia, com a

crescente capacidade humana de envolvimento, são nossas escolhas que modelam

o futuro”. Ainda de acordo o mesmo autor, “a sociedade não pode controlar o

futuro, mas pode influenciar o curso da história”.

Chiavenato (2004, apud CANEN & CANEN, 2005), destaca seis fases na

história das organizações, sendo que a atual (a partir da década de 1980) é a da

globalização, marcada pela Terceira Revolução Industrial (Revolução Digital) e

caracterizada por automação, incerteza e imprevisibilidade quanto ao futuro.

Na área empresarial, segundo Kotler (1999), existem dois tipos de

organizações: aquelas que mudam e aquelas que desaparecem. Esta afirmativa,

válida para horizontes temporais de médio e longo prazo, leva a uma indagação

fundamental: Como identificar a direção correta da mudança em um mundo cada

vez mais globalizado e em constante transformação?

O início do século XXI vem sendo marcado por uma sucessão de ataques

terroristas, guerras, epidemias, surgimento de novas tecnologias e mudanças

geopolíticas, mostrando que o futuro está cada vez mais incerto. Todavia, para

alguns, a incerteza é uma justificativa para não pensar no futuro; para outros, é a

fonte de oportunidades.

Nessa última hipótese, a incerteza deve estar orientada para os seguintes

pontos: (i) aproveitamento das oportunidades; (ii) defesa contra as ameaças e (iii)

construção de um futuro melhor para a organização (MARCIAL & GRUMBACH,

2004).

O terceiro ponto supera os demais: a construção do futuro é o único meio

eficaz de reduzir as ameaças e aumentar as oportunidades em um mundo em

constante mutação.

1.1 DEFINIÇÃO DO PROBLEMA

A construção do futuro está ligada ao conceito de prospectiva estratégica,

que preconiza a necessidade do surgimento de fatos novos, capazes de provocar

uma ruptura de tendência e, portanto, gerar um outro futuro.

Um fato novo pode ser obtido pela alteração das forças que modelam o

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futuro, o que pode ocorrer pela inserção de uma força nova, pela alteração da

intensidade de uma força já atuante ou ainda pela alteração do sentido de uma

força já existente.

A compreensão dessas forças, a identificação da melhor forma de

atuação, bem como a decisão de alterá-las, são as bases da prospectiva estratégica.

Esta utiliza, como ferramenta de visualização de futuro, a técnica de construção de

cenários. O propósito, segundo Glenn (1994, p. 5), “é entender o conjunto de

decisões estratégicas que maximizam o benefício em face das incertezas e

mudanças impostas pelo ambiente externo”.

Börjeson et al. (2005, p. 20) utilizam a nomenclatura de cenários

estratégicos como aqueles que incorporam medidas políticas, com o propósito de

avaliar as possíveis conseqüências das decisões estratégicas. “O objetivo é

identificar variáveis-chave, testar políticas e avaliar seus impactos nessas

variáveis”, pontuam.

A construção do futuro, com base na análise dos cenários estratégicos,

está pautada na escolha de um cenário futuro, desejado e exeqüível, chamado de

cenário normativo. Segundo Buarque (2003, p. 23), o cenário normativo

representa um futuro desejado. No entanto, o autor argumenta que,

embora se trate de ajustar o futuro aos desejos, para ser um cenário, adescrição deve ser plausível e viável, e não apenas a representação deuma vontade ou de uma esperança. Desse ponto de vista, pode-se dizerque o cenário normativo ou desejado é uma utopia plausível, capaz deser efetivamente construída e, portanto, demonstrada – técnica elogicamente – como viável.

Ainda de acordo com Buarque (idem), o cenário normativo “pode exercer

um papel importante na orientação da ação dos atores para intervir e transformar o

futuro provável no desejado, expressando o espaço da construção da liberdade

dentro das circunstâncias”.

A avaliação das forças motoras, que podem transformar o cenário

normativo em um cenário provável, deve incluir uma análise das estratégias do

atores, pois, segundo Godet et al. (2000a, p. 14),

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após um quarto de século de reflexões e estudos prospectivos sobre osterritórios, as empresas e os grandes desafios das sociedadesmodernas, chegamos a uma constatação bem conhecida e, no entanto,geralmente ignorada: são sempre os homens e as organizações quefazem a diferença.

Os cenários fornecem a visão de futuro, são como um farol iluminando o

caminho a ser trilhado; contudo, é a postura estratégica dos atores, em relação ao

futuro, que define o caminhar.

1.2 OBJETIVOS

O objetivo desta tese é desenvolver uma metodologia para a identificação

de um cenário normativo obtido de um conjunto de cenários prospectivos,

incluindo a análise das interações estratégicas dos principais atores.

A expressão “cenários prospectivos”, utilizada no plural, faz um

contraponto à visão projetiva, em que o futuro é visto como uma continuação das

tendências passadas e analisado como único e certo.

Na abordagem prospectiva, por outro lado, são examinadas, além das

tendências do passado, possíveis rupturas. O futuro real será único, contudo, os

futuros possíveis são vistos como múltiplos e incertos.

A escolha de um cenário normativo, foco principal deste estudo, tem

como propósito responder às seguintes perguntas:

• Como selecionar um cenário normativo que seja exeqüível?

• Como incorporar interações estratégias na análise dos cenários?

• Como identificar os eventos principais?

• Como priorizar as ações?

1.2.1 OBJETIVO GERAL

Desenvolver uma metodologia de identificação de um cenário normativo

aceitável e exeqüível, baseado em um conjunto de cenários prospectivos.

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1.2.2 OBJETIVOS ESPECÍFICOS

1.2.2.1 Apresentar, de forma consolidada, uma metodologia para a

geração de cenários prospectivos, utilizando diversas ferramentas de pesquisa

operacional.

1.2.2.2 Ampliar a análise do cenário normativo para incluir a interação

estratégica de atores.

1.2.2.3 Definir a margem de negociação de cada ator com base em um

futuro de referência, obtido do conjunto de cenários prospectivos gerados.

1.2.2.4 Analisar o processo de negociação política, do ponto de vista das

forças que irão modelar o futuro.

1.2.2.5 Utilizar a técnica de simulação condicional de ocorrência de

eventos para definir os pontos nos quais deverão ser concentrados os esforços de

construção do futuro, bem como sua prioridade.

1.3 CONTRIBUIÇÃO DA TESE

Gordon & Glenn (2004) apresentaram uma discussão sobre as fronteiras

da pesquisa do futuro. O artigo faz uma comparação dos métodos existentes e

conclui com a sugestão pela integração de dois ou mais métodos como única

forma de melhorar os resultados obtidos. No mesmo artigo, todavia, os autores

fazem as seguintes ressalvas:

• A exatidão e a precisão são dois conceitos distintos. Estes conceitos

são similares aos de intervalo de confiança e nível de certeza, em que, para um

mesmo conjunto de dados, o aumento de um conduz a uma redução do outro.

• As projeções de dados históricos que não considerarem as quebras de

tendências apresentam resultados equivocados em projeções de médio prazo.

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• As previsões são incompletas, pois não incluem fatos que ainda não

ocorreram.

• O planejamento deve ser dinâmico. Como as previsões são imprecisas

e incompletas, qualquer planejamento de médio prazo deve ser revisto em função

de novos acontecimentos.

• O dinamismo do planejamento implica a necessidade de uma constante

avaliação das possibilidades de futuro.

• As conseqüências de certos eventos podem parecer de pouca

importância, porém, em razão do inter-relacionamento com outros eventos, podem

tornar-se fatores dominantes.

• As previsões de certos valores embutem em maior ou menor grau as

crenças das pessoas, afetando tanto a pergunta quanto a resposta.

• A precisão em sistemas complexos e não-lineares pode ser impossível.

• A visualização do futuro pode alterá-lo. A identificação de uma

possível ameaça ou oportunidade gera ações que podem alterar o futuro, anulando

a ameaça ou ampliando a oportunidade.

No referido artigo, são analisados 25 métodos de prospecção de futuro.

Cada um deles pode ser usado individualmente; contudo, “o uso dos métodos

combinados sempre fornece eficiência e gera previsões mais robustas” (GORDON

& GLENN, 2004, p. 108).

A combinação de métodos proposta nesta tese vai além das sugeridas

pelos dois autores; estes se referem apenas aos métodos de prospecção de futuro,

não incluindo a análise das interações estratégicas dos atores. O exame foi

viabilizado com a definição de um nível de referência em relação ao qual é

possível avaliar a margem de negociação dos atores envolvidos. Tal nível de

referência é o cenário com maior probabilidade de ocorrer. Assim, este cenário

será chamado de cenário mais provável.

O emprego de simulação com ocorrência condicional de eventos para a

identificação das variáveis-chave na construção do futuro é outro ponto que

agrega valor ao processo. Em situações reais, dificilmente haverá tempo e

recursos disponíveis para uma atuação exaustiva sobre todos os pontos que podem

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levar ao futuro normativo. A simulação mostra os pontos de maior impacto e a

melhor seqüência de atuação.

A última ressalva apresentada por Gordon & Glenn (2004, p. 108), de

que “a previsão do futuro altera o futuro”, é utilizada como linha-mestra em toda a

metodologia. O propósito não é acertar na previsão do futuro, e sim prospectar o

futuro no sentido de auxiliar a tomada de decisão, com vistas a reduzir ou

neutralizar as ameaças e aproveitar e ampliar as oportunidades.

O outro ponto em que a metodologia proposta extrapola os métodos

citados é quanto ao dinamismo do planejamento. O monitoramento de fatos

relevantes pode sinalizar desvios em relação ao futuro vislumbrado. Este ponto

considera que a construção do futuro não se resume a um plano; é um processo

que deve ser continuamente monitorado e gerido.

O planejamento estratégico da organização deve ser baseado no futuro

mais provável; contudo, o esforço de construção de futuro é normativo. Este é

outro ponto em que a proposta apresentada ultrapassa os métodos tradicionais. As

ações de planejamento estratégico são orientadas pelo cenário mais provável,

aquele que possui a maior probabilidade de ocorrência. Os esforços de construção

do futuro, por outro lado, são orientados para o cenário normativo. As diferenças

entre os dois cenários indicam as rupturas de tendências que serão necessárias

para construir o futuro.

O dinamismo do planejamento estratégico fica evidente nesse processo

de construção do futuro, pois, caso a organização obtenha sucesso em seus

esforços, o cenário mais provável converge para o cenário normativo. O

planejamento estratégico, que está centrado no cenário mais provável, deve

acompanhar a mudança.

O monitoramento constante e a simulação de futuros podem indicar,

ainda, uma divergência entre o cenário mais provável e o cenário normativo,

ocasionada por quebras de tendências não previstas inicialmente. Tal situação

indica a necessidade de uma revisão detalhada das premissas utilizadas na geração

dos cenários e das informações de interações estratégicas.

A modelagem matemática desenvolvida pelo autor da tese, e a

implementação das soluções de programação, culminaram com o aperfeiçoamento

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do software Puma e o desenvolvimento de um software inovador, o Lince. Este

último foi utilizado no Projeto “Brasil 3 Tempos”. Segundo o Núcleo de Assuntos

Estratégicos da Presidência da República (2005, p. 19), “os softwares disponíveis

no mercado mundial não permitiam a geração de uma família de cenários

prospectivos com a amplitude requerida” e não havia disponibilidade, no mesmo

mercado, de “processos de modelagem de cenários prospectivos que

considerassem a identificação, a priorização e a mensuração de eventos com

características especiais”.

1.4 ORGANIZAÇÃO DO TRABALHO

O presente trabalho está organizado em nove capítulos, sendo que o

primeiro é uma síntese da tese, incluindo a apresentação do problema e os

objetivos a serem alcançados.

O segundo capítulo, intitulado “Prospectiva estratégica”, apresenta os

conceitos de cenários prospectivos, fazendo um contraponto ao conceito de

cenário projetivo. O capítulo propõe a abordagem de construção de futuro em

duas dimensões: a primeira, chamada de dimensão política, está relacionada aos

atores que influenciam o processo, enquanto a segunda, chamada de dimensão

técnica, está relacionada aos aspectos econômicos, tecnológicos e temporais, entre

outros.

O terceiro capítulo apresenta uma revisão bibliográfica dos temas

centrais abordados pela metodologia: planejamento estratégico, cenários

prospectivos e interações estratégicas. O capítulo apresenta, também, uma breve

retrospectiva histórica da tomada de decisão com visão de futuro. O propósito da

retrospectiva é mostrar que, muito embora os conceitos básicos sejam antigos, seu

arcabouço teórico é recente. Ademais, a abordagem conjunta dos temas aparece de

forma esporádica e muito restrita, indicando a relevância da tese.

O quarto capítulo apresenta a metodologia e está subdividido nos

principais passos necessários à definição do cenário normativo e à sua gestão.

O primeiro passo é a identificação do sistema, com suas principais

características e seus objetivos.

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O segundo passo, chamado de “diagnóstico estratégico”, confronta as

características do sistema com as do ambiente em que ele está inserido. O

resultado é um conjunto de medidas com foco no presente, além de um conjunto

de questões estratégicas com foco no futuro. As questões estratégicas,

transformadas em variáveis binárias, são chamadas de “eventos” e formam os

ingredientes básicos para a geração do mapa de cenários prospectivos.

Dando continuidade, o terceiro passo, chamado de “análise prospectiva”,

integra o mapa de cenários, e as possíveis interações estratégicas dos atores

principais. Nesse passo, identifica-se o cenário mais provável e seleciona-se um

cenário normativo. Para cada um deles, é determinado um conjunto de medidas –

no primeiro caso, para o aproveitamento das oportunidades e a proteção contra as

ameaças e, no segundo, para aumentar a probabilidade de ocorrência do cenário

normativo.

O quarto passo consiste em confrontar o conjunto de medidas

identificadas nos passos anteriores com os valores que permeiam a organização,

além de uma análise da adequabilidade e da exeqüibilidade das medidas.

O quinto e último passo é o monitoramento de fatos relevantes que

podem ratificar ou retificar as decisões estratégicas.

O Capítulo 5 apresenta dois softwares que foram desenvolvidos para a

aplicação da metodologia. O primeiro, chamado de Puma,1 está focado no

planejamento estratégico com base no cenário mais provável, ao passo que o

segundo, chamado de Lince, está focado no cenário normativo. A origem do Puma

está nos estudos de prospectiva, efetuados por Raul Grumbach, que criou o

método Grumbach. Já o Lince foi desenvolvido quando da solicitação do Núcleo

de Assuntos Estratégicos da Presidência da República para a geração de um

software que integrasse os conceitos de cenários prospectivos e interações

estratégicas, a ser empregado no Projeto “Brasil 3 Tempos”.

Os trabalhos de pesquisa para o desenvolvimento do Lince mostraram a

necessidade de alterações em alguns algoritmos utilizados no Puma; contudo, os

dois softwares, por razões diversas, estão referidos ao método Grumbach.

1 Os softwares Puma e Lince são comercializados pela Brainstorming Ltda.

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O Capítulo 6 apresenta duas aplicações da metodologia. A primeira é o

Projeto “Brasil 3 Tempos”, do Núcleo de Assuntos Estratégicos da Presidência da

República (NAE), sendo que, para evitar a publicação de possíveis dados

confidenciais, estão citados apenas aqueles que foram publicados na Internet. A

segunda é um projeto de planejamento estratégico para a região de Visconde de

Mauá.

Os dois casos apresentam similaridades no que concerne à análise das

interações estratégicas do atores principais. No Projeto “Brasil 3 Tempos”, a

análise da vontade política dos principais atores envolvidos na condução de

políticas de Estado é o fator principal da efetividade das mesmas.

O caso de Visconde de Mauá é similar. A região engloba a chamada

Microbacia do Alto Rio Preto, que está situada nos estados do Rio de Janeiro e de

Minas Gerais, em três municípios: Resende, Itatiaia e Bocaina de Minas, sendo

que a maior parte da região está dentro da Área de Proteção Ambiental (APA) da

Mantiqueira, sob a supervisão do governo federal.

O Capítulo 7 apresenta as conclusões relativas à presente tese, mostrando

que o emprego conjunto dos conceitos de planejamento estratégico, cenários

prospectivos e interações estratégicas são ferramentas valiosas para a construção

do futuro de qualquer tipo de organização.

O Capítulo 8 apresenta sugestões de pesquisa que podem contribuir para

o aperfeiçoamento da metodologia e dos respectivos softwares.

O Capítulo 9 apresenta as referências bibliográficas citadas no texto.

Para encerrar, os Anexos 1 e 2 apresentam os textos submetidos à

consulta Delphi, o primeiro dentro do projeto Brasil 3 Tempos, e o segundo dentro

do projeto Mauatur.

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O futuro não é somente o que pode acontecer, ouaquilo que tem as maiores chances de suceder. Eleé, também, em uma proporção que não pára decrescer, aquilo que nós gostaríamos que ele fosse.Prever uma catástrofe é condicional, pois significaprever algo que aconteceria se nada fosse feitopara alterar o curso das coisas, e não aquilo queacontecerá de qualquer maneira.

Berger (2004, p. 317)

2. PROSPECTIVA ESTRATÉGICA: CENÁRIOS

Segundo Godet et al. (2000a, p. 19), “um cenário é um conjunto formado

pela descrição de uma situação futura e do encaminhamento dos acontecimentos

que permitem passar da situação de origem a essa situação futura”.

Porter (1989, apud BUARQUE, 2003, p. 22), a seu turno, afirma que um

cenário é uma “visão internamente consistente da realidade futura, baseada em um

conjunto de suposições plausíveis sobre as incertezas importantes que podem

influenciar o objeto”. Para Glenn (1994, p. 4), “um cenário é uma estória que

conecta a descrição de um futuro específico com a realidade presente, em uma

série de ligações causais, que ilustram as decisões e as conseqüências”. Os

cenários não são, portanto, ferramentas destinadas a reduzir as incertezas do

futuro, tampouco a predizê-lo.

De acordo com Wright (2005), a construção de cenários é uma

abordagem de pensamento estratégico que reconhece a imprevisibilidade do

futuro, devendo ser utilizados como ferramenta para delimitar os caminhos

possíveis de evolução do presente.

Cenários, dessa forma, devem ser vistos como uma ferramenta

administrativa, e não como uma previsão. O propósito não é acertar o futuro, e

sim orientar a tomada de decisões estratégicas.

Os cenários podem ser de cunho exploratório ou normativo. Segundo

Buarque (2003, p. 22), “os cenários exploratórios têm um conteúdo

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essencialmente técnico, decorrem de um tratamento racional das probabilidades e

procuram intencionalmente excluir as vontades e os desejos dos formuladores no

desenho e na descrição dos futuros”.

O propósito dos cenários exploratórios é identificar o sentido em que

caminha o ambiente, fornecendo suporte para a tomada de decisão, no presente,

em face dos futuros possíveis. Os cenários podem, ainda, ter dois tipos de

abordagem: projetiva ou prospectiva.

Os cenários projetivos são obtidos pela extrapolação dos fatos passados e

consideram que as forças que moldaram o passado e construíram o presente

continuarão a atuar e modelar o futuro.

Os cenários prospectivos, por outro lado, ampliam as possibilidades do

futuro, analisam diversas tendências e consideram que o futuro pode ser

completamente diferente do passado.

Para Börjeson et al. (2005), o cenário projetivo mostra o que irá ocorrer,

o cenário prospectivo expõe o que pode ocorrer, enquanto o cenário normativo

indica como atingir um objetivo específico.

O cenário normativo representa um futuro desejado, mas não

necessariamente o ideal. Conforme argumenta Buarque (2003, p. 23), o cenário

normativo deve ser exeqüível, sua descrição “deve ser plausível e viável e não

apenas a representação de uma vontade ou de uma esperança”. Argumenta ainda o

referido autor que, “desse ponto de vista, pode-se dizer que o cenário normativo

ou desejado é uma utopia plausível, capaz de ser efetivamente construída e,

portanto, demonstrada – técnica e logicamente – como viável”.

Ainda segundo Buarque (ibidem), o cenário normativo “pode exercer um

papel importante na orientação das ações dos atores para intervir e transformar o

futuro provável no desejado, expressando o espaço da construção da liberdade

dentro das circunstâncias”.

Godet (2000b, p. 4) considera o cenário normativo dentro de uma

abordagem de prospectiva estratégica, enfatizando a importância do planejamento

de longo prazo e de pensamentos alternativos no processo de tomada de decisão.

Segundo o autor, a prospectiva estratégica “não é somente uma abordagem

exploratória (antecipação estratégica), mas também uma abordagem normativa”.

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Cristo (2002, p. 1) apresenta a prospectiva estratégica como uma

ferramenta apoiada em “técnicas específicas, como o Delphi, a construção de

cenários, a matriz de impactos cruzados e outras, possibilitando ‘visões de futuro’

que permitirão a elaboração de políticas públicas visando à construção de um

futuro desejável”.

Por sua vez, Godet et al. (2000a, p. 28) salientam que o método de

cenários, tal como concebido há mais de trinta anos, tem o grande mérito de impor

rigor intelectual e integrar os conceitos de “análise qualitativa e quantitativa das

tendências passadas; análise retrospectiva; análise dos jogos de atores;

evidenciando os germes da mudança, das tensões e dos conflitos, e, por fim,

construção de cenários coerentes e completos”. O referido autor (GODET,

2000b), por outro lado, enfatiza que existe uma distinção importante a ser feita

entre os cenários e a estratégia dos atores.

O objetivo principal desta tese é desenvolver uma metodologia de

identificação de um cenário normativo aceitável e exeqüível. O propósito é a

construção do futuro, transformando este cenário em uma realidade.

A construção do futuro exige ações de naturezas diversas, que podem ser

divididas em duas dimensões: a primeira, relacionada com a vontade política,

envolve os atores2 que podem influenciar o processo; a segunda diz respeito aos

recursos econômicos e tecnológicos, entre outros, bem como ao tempo disponível.

2.1 DIMENSÃO POLÍTICA

A dimensão política é analisada com base no conceito de interações

estratégicas. Segundo Bennett & Tait (1993), interações estratégicas ocorrem

quando nenhum dos atores tem controle total sobre os eventos, devendo, neste

caso, considerar as possíveis ações tomadas pelos outros. A decisão, tomada por

2 O conceito de atores segue a definição de Hatem (1993, apud Perestelo, 1999, p. 6), referindo-sea um “grupo de indivíduos organizados, com certo número de projetos em comum, dispondo decapacidades de reação comum, cujos objetivos estão ligados a esses projetos”. Sua principalcaracterística é a homogeneidade.

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um determinado ator, interage com as decisões adotadas pelos demais, mesmo que

tomadas separadamente.

Segundo Huxham & MacDonald (1992), esta é uma situação de “conflito

parcial, e não antagonismo total, em que ameaças mútuas, trapaças e blefe

convivem com uma atitude cooperativa em busca de vantagem colaborativa”. Para

Lex & Sebenius (1986, apud BENNETT & TAIT, 1993, p. 2), “quando os

objetivos divergem parcialmente, conflito e cooperação são inseparáveis”.

Em um contexto de interação estratégica, a percepção dos atores com

relação ao futuro determina os objetivos individuais, e estes podem alterar o

próprio futuro. A percepção do futuro direciona os atores, conforme Berger (2004,

p. 315) afirma: “A prospectiva deve se dedicar a uma análise em profundidade,

pesquisando os fatores verdadeiramente determinantes e as tendências que levam

os homens a certas direções, direções que não são sempre bem percebidas”.

A prospectiva estratégica considera que os futuros possíveis são

múltiplos e incertos (GODET, 2000b); todavia, o futuro real é visto como único,

assim como é o presente e como foi o passado, o que leva à conclusão de que

exista um futuro mais provável. A previsão do futuro, por outro lado, segundo

Godet et al. (2000a), deve ser vista como uma impostura, pois o futuro ainda não

existe, sendo necessário construí-lo.

O esforço de construção do futuro, olhado do ponto de vista individual de

cada ator, será no sentido de construir seu cenário ideal. Todavia, alguns atores se

equivocam em acreditar que o futuro ideal será o futuro real. Esta abordagem

restringe a margem de negociação, não abrindo espaço para a construção de

valores. A construção de futuro tende a caminhar para um jogo de soma zero, no

qual o que um ator ganha o outro perde.

O futuro real não existe, está em construção; todavia, a prospectiva pode

indicar o mais provável de ocorrer. A percepção do futuro mais provável abre

espaço para a construção de um futuro melhor. A solução ótima, do ponto de vista

individual de cada ator, continuará a ser a transformação de seu futuro ideal no

mais provável. Contudo, o futuro real será único e, como os objetivos dos atores

nem sempre são convergentes, o conflito caminha para uma situação de interações

estratégicas, como definido por Bennett & Tait (1993) e apresentado no início

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15

desta seção.

A distância entre o futuro mais provável e o futuro ideal abre espaço para

negociações. O confronto entre ambos deve determinar a margem de negociação

de cada ator, conforme é possível visualizar na Figura 4.5. Essa margem fica mais

restritiva à medida que esses futuros se aproximam, podendo chegar a zero

quando a percepção do futuro mais provável coincide com o próprio futuro ideal.

A construção do futuro, do ponto de vista de interações estratégicas, não será

transformar o futuro ideal de nenhum ator no mais provável, mas construir um

futuro melhor, aceitável e exeqüível. Esse futuro, chamado de “normativo”,

deverá situar-se entre o ideal e o mais provável.

O futuro, por outro lado, será um equilíbrio de forças, assim como é o

presente e como foi o passado. Esse equilíbrio, segundo o European Committee

for Social Cohesion (2004), não é estático, e muda constantemente de ponto a

ponto para se adaptar às mudanças do ambiente social e econômico, da tecnologia

e dos sistemas políticos nacionais e internacionais A construção do futuro,

olhando sob esse prisma, consiste em alterar o equilíbrio de forças do ponto mais

provável para o ponto normativo.

A metodologia proposta identifica dois possíveis pontos de equilíbrio. O

primeiro, correspondendo ao cenário mais provável, é definido como um ponto de

equilíbrio não-cooperativo. O segundo, correspondendo ao cenário normativo, é

definido por Marini & Currarini (2002) como um ponto de equilíbrio cooperativo

conjuntural.

A cooperação entre atores cria uma coalizão, “um superator”, capaz de

alterar o equilíbrio de forças, quebrar tendências e conduzir o processo de

construção do futuro. Esta, portanto, deve ser vista como uma parceria estratégica

de atores, cujo propósito é construir um futuro melhor.

Segundo Wood et al. (apud CANEN & CANEN, 2005), são 12 caminhos

que devem ser trilhados para parcerias estratégicas de sucesso, com destaque para

os seguintes:

• A parceria deve envolver os atores no processo, uma vez que são os

atores que fazem as parcerias.

• Todos os atores devem ter a mesma expectativa em relação aos

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resultados da parceria, neste caso o cenário normativo.

• Deve haver um clima de interesse e confiança mútua.

• Cada parceiro deve obter alguma vantagem. O benefício mútuo é vital,

significando que todos devem desistir de algo.

• Deve haver o reconhecimento de que problemas são inevitáveis, o que

implica a necessidade de flexibilidade.

O ponto fraco em equilíbrios cooperativos é a deserção. A negociação da

coalizão deve criar condições que evitem deserções, que, em geral, ocorrem no

último instante, visando maximizar o lucro do desertor.

Segundo o Naval War College (2006), três condições são fundamentais

para evitar deserções:

• O final deve ser mantido em aberto, sem que haja uma última rodada de

negociações. Ainda que seja possível resolver o assunto atual, haverá mais

assuntos envolvendo os parceiros no futuro.

• As vantagens futuras, frutos de uma cooperação contínua, devem ser

suficientemente elevadas para compensar a gratificação imediata da deserção.

• Não deve haver comparação de ganhos. A vantagem obtida com uma

parceria não está diretamente relacionada com ganhos ou perdas dos outros

parceiros.

O ganho para cada parceiro da coalizão pode ser obtido de duas formas:

(i) pelo aumento dos recursos da coalizão, ou (ii) pela utilização de valores

assimétricos. O primeiro é obtido pela melhoria no compartilhamento dos

recursos, ao passo que o segundo está relacionado à assimetria de valores.

A existência de valores assimétricos em uma negociação significa que

um participante pode conceder num tema de pouca importância para ele, em troca

de uma concessão em outro tema que ele tem em alta conta.

Os valores assimétricos são obtidos pelo cálculo do valor do cenário

como um todo, conforme será mostrado no Capítulo 4. A negociação das parcerias

estratégicas deve estar focada no cenário, evitando a negociação de cada questão

estratégica em separado.

A existência de vontade política é o fator fundamental para a construção

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de um futuro melhor; todavia, não é suficiente. A vontade deve gerar ações, e,

estas, exigem recursos.

2.2 DIMENSÃO TÉCNICA

A coalizão deve executar ações concretas no presente, a fim de alterar

forças e quebrar as tendências. Essas ações têm um custo e levam algum tempo

para produzir o efeito desejado sobre o ambiente.

A análise da dimensão técnica consiste em confrontar os recursos da

coalizão com o custo e o tempo necessários para transformar o cenário normativo

no cenário mais provável. A dimensão técnica envolve os aspectos econômicos,

tecnológicos e temporais, entre outros.

A construção do futuro tem como propósito o aumento da probabilidade

de ocorrência do cenário normativo. A coalizão deve priorizar ações sobre

algumas questões estratégicas, tendo em vista que, em geral, não existem recursos

nem tempo disponível para uma atuação ampla, sobre todas as questões. Segundo

o Núcleo de Assuntos Estratégicos da Presidência da República (2004, p. 21),

trata-se da “aplicação do poder disponível (vontade e meios) no local, na forma e

no momento certo, para contribuir, no presente, com a construção do futuro e

garantir a conquista dos objetivos estratégicos pretendidos”. O propósito dessas

ações é aumentar ou reduzir a probabilidade de ocorrência de alguns eventos,

alterando, dessa forma, a probabilidade de ocorrência dos futuros, como um todo.

A evolução do presente, em direção ao futuro, é visualizada, na

modelagem de cenários, por uma seqüência de eventos. Segundo Kahn & Wierner

(1967, p. 262), “cenários são seqüências hipotéticas de eventos, construídos com o

propósito de focar a atenção no processo causal e nos pontos de tomada de

decisão”. Para Godet (2000b, p. 11), “um cenário é formado por um conjunto de

situações futuras e do curso dos eventos que permitem caminhar da situação

original para a situação futura”. Portanto, não existe um único caminho

conectando o futuro normativo ao presente; há diversos caminhos, cada qual

correspondendo a uma seqüência específica de ocorrência de eventos.

A construção do futuro, do ponto de vista técnico, consiste em priorizar

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os eventos sobre os quais recairá o esforço principal da coalizão. A seleção dos

eventos prioritários deve recair sobre aqueles que podem transformar o futuro

normativo no mais provável, desde que a coalizão reúna os recursos necessários

para alterar sua probabilidade de ocorrência.

2.3 CONSTRUÇÃO DO FUTURO

O conceito de “construção” agrega os passos necessários para

transformar o futuro desejado no provável. Fazendo um paralelo com a construção

de um edifício, a construção do futuro necessita da visão do que será construído,

como um desenho ou uma maquete, de planos detalhados, e a seqüência de

construção, começando pelas fundações e terminando no acabamento, além do

trabalho de homens e mulheres que vão efetivamente construir o edifício, ou o

futuro.

O conceito de construção de futuro é mais amplo que o de Foresight,

que, conforme Santos & Santos (2003), é um “processo de desenvolvimento de

visões de possíveis caminhos nos quais o futuro pode ser construído, entendendo

que as ações do presente contribuirão com a construção da melhor possibilidade

do amanhã”. Por outro lado, Alsan & Oner (2003, p. 1) argumentam que

“foresight não é planejamento, porém uma pré-fase deste, em qualquer nível do

gerenciamento, agregando valor e definindo prioridades”.

A construção do futuro está centrada nas forças que moldam os

acontecimentos e modelam o futuro. Todavia, deve-se fazer uma distinção entre a

abordagem projetiva e a prospectiva. A primeira considera que as forças que

modelaram o passado continuarão a modelar o futuro, conforme mostrado na

Figura 2.1. Este, portanto, poderá ser previsto, e será único.

O cenário projetivo, também chamado de cenário de tendência, será

obtido, então, pela extrapolação do comportamento de cada variável.

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19

Figura 2.1 – Cenários – Abordagem projetiva

A abordagem prospectiva, por outro lado, considera que, além das forças

que modelaram o passado, poderão surgir outras forças que desempenharão papel

relevante na definição do futuro.

A incerteza em relação à intensidade e ao sentido dessas forças faz com

que a melhor representação do futuro seja um cone, conforme mostrado na Figura

2.2. O vértice do cone está colocado no presente, pois a descrição de um cenário

deverá manter conexão com o presente, identificando o caminho pelo qual o

futuro será derivado do presente (GLENN, 1994).

O centro da base do cone representa o cenário mais provável, e foi

escolhido porque apresenta maior probabilidade de permanecer dentro do cone,

em caso de variação das forças atuantes. O cenário mais provável, portanto, não é

o cenário previsto, mas sim o cenário com maior probabilidade de ocorrer no

futuro, dentro de um grande número de cenários possíveis. O cenário mais

provável, em muitos casos, pode não coincidir com o cenário de tendência,

conforme visto na Figura 2.2.

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20

Adaptado de Glenn, 1994.

Figura 2.2 – Cenários – Abordagem prospectiva

Segundo Höjer (2000, apud BÖRJESON et al., 2005), a construção de

um futuro melhor necessita de fatos novos capazes de gerar rupturas de

tendências. Os fatos novos são obtidos pela alteração nas forças que modelam o

futuro.

No caso de uma análise projetiva, a ruptura de tendências conduzirá a

outro cenário, diverso do primeiro, porém igualmente único e definido, conforme

mostrado na Figura 2.5.

No caso da abordagem prospectiva, por outro lado, a alteração de forças

desloca o cone como um todo. Tal deslocamento altera o futuro mais provável,

mantendo a conexão com o presente, de acordo com a Figura 2.6.

O esforço de construção do futuro será no sentido de deslocar o centro do

cone em direção ao cenário normativo. A ação executada sobre um determinado

evento altera o futuro com um todo, e não apenas o evento selecionado. O

propósito da alteração de forças é aumentar a probabilidade de ocorrência de um

futuro melhor; todavia, ao deslocar o cone como um todo, há o risco de aumentar,

também, a probabilidade de ocorrência de cenários indesejados.

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2.4 ANÁLISE DE SENSIBILIDADE

Uma categoria especial de cenários, chamada de “What-if”, é obtida pela

ocorrência condicional de um ou mais eventos. Segundo Börjeson et al. (2005),

cada ocorrência de evento é vista como um ponto de bifurcação na evolução dos

cenários.

Os referidos autores consideram esses cenários como um subgrupo dos

cenários projetivos, conforme mostrado na Figura 2.3. Todavia, em função da

modelagem matemática adotada, é possível colocá-los, também, como um

subgrupo dos cenários normativos de transformação, ou de preservação, conforme

mostrado na Figura 2.4.

Fonte: Börjeson et al. (2005, p. 14)

Figura 2.3 – Tipologia dos cenários

Os cenários obtidos pela ocorrência condicional, derivados dos

normativos de transformação, são os mais comuns. Um caso especial pode ocorrer

quando o cenário mais provável coincide com o cenário ideal; neste caso, a

ocorrência condicional será no sentido de preservar este cenário.

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Adaptado de Börjeson et al. (2005, p. 14)

Figura 2.4 – Cenário normativo

A ocorrência condicional de alguns eventos pode redirecionar o futuro.

Na visão projetiva, tal ocorrência levará a um novo cenário de tendência,

conforme mostrado na Figura 2.5. Na abordagem prospectiva, ela altera todo o

cone de futuros, conduzindo a um novo cenário mais provável, como visto na

Figura 2.6.

Figura 2.5 – Construção de futuro – Abordagem projetiva

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Figura 2.6 – Construção de futuro – Abordagem prospectiva

A modelagem de cenários de transformação é a mais adequada para

avaliar a construção do futuro, pois, segundo Höjer (2000, apud BÖRJESON et

al., 2005, p. 22), estes “focam em alvos que parecem não ser possíveis de atingir

se houver uma continuidade do desenvolvimento atual”. Neste caso, segundo o

mesmo autor, “um ajuste marginal do desenvolvimento atual não é suficiente, e

uma quebra de tendência é necessária para atingir o alvo”.

A simulação condicional da ocorrência de eventos permite definir e testar

diversas linhas de ações. Dentro da metodologia proposta, este é um dos critérios

básicos para que um cenário normativo seja considerado exeqüível. A simulação

condicional mapeia os caminhos que levam do presente ao futuro normativo.

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3. REFERENCIAL TEÓRICO

A metodologia empregada nesta tese se baseia em três conceitos básicos:

planejamento estratégico, cenários prospectivos e interações estratégicas. O

propósito deste capítulo é mostrar que os três conceitos são tão antigos quanto a

própria humanidade. Por outro lado, a construção de referenciais teóricos somente

ocorreu no século XX, principalmente na segunda metade, sendo que uma

primeira proposta de integração entre os conceitos de planejamento estratégico e

os cenários prospectivos ocorreu na década de 1980.

A revisão bibliográfica mostra também que, muito embora os três

conceitos estejam intimamente conectados, poucos artigos fazem uma abordagem

conjunta, o que torna o presente trabalho extremamente relevante.

A história mostra que o desejo e a necessidade de visualizar o futuro, e

assumir sua gestão, não mudaram ao longo dos últimos milênios.

Na Antigüidade, segundo Jaguaribe (2001), a previsão do futuro estava a

cargo de oráculos e sacerdotes especializados que faziam revelações divinas de

forma críptica. No mundo helenístico, o mais famoso era o oráculo de Delphos.

Na Roma republicana, segundo Jaguaribe (2001, p. 419), “qualquer decisão

importante era precedida (e adotada ou não, conforme os resultados) pela consulta

sobre a vontade dos deuses, mediante cinco tipos de auspicia”.

Na Idade Média, em especial na Europa, a visão do futuro não se alterou

substancialmente. O homem continuou com uma visão mística do mundo e do

futuro; sua prioridade era a vida eterna, e o futuro dependia da vontade de Deus.

No início do século XII, contudo, um acontecimento de pouca

importância na época alteraria substancialmente essa visão. Em 1202, Leonardo

de Pisa, mais conhecido como o filho de Bonacci (Fibonacci), publicou um livro

intitulado Liber Abaci, que introduziu o sistema decimal hindu-árabe na Europa.

Um dos pontos mais significativos da nova numeração foi o conceito do zero. O

sistema indo-arábico simplificou os cálculos e abriu caminho para a investigação

de um mundo probabilístico.

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25

Segundo Bernstein (1997), foi em 1494 que Luca Pacioli propôs o

chamado “problema dos pontos”, cujo propósito era definir uma metodologia para

dividir o prêmio de um jogo encerrado antes do fim. O problema somente foi

resolvido 150 anos depois, pelos franceses Blaise Pascal e Pierre de Fermat, que,

ao apresentarem a solução, criaram as bases do que hoje chamamos de estudo de

probabilidades.

No século seguinte, o suíço Daniel Bernoulli incorporou o conceito de

risco associado à probabilidade. Bernoulli não se concentrou nos eventos em si,

mas nos seres humanos, que desejam ou temem certos resultados em maior ou

menor grau.

O século XIX viu surgirem outros estudiosos que continuaram o

desenvolvimento dos modelos matemáticos. Carl Friedrich Gauss aplicou seus

estudos geodésicos e astronômicos à distribuição normal, e Francis Galton

formulou o conceito de regressão à média, ao estudar várias gerações de ervilhas.

O avanço no estudo de modelos matemáticos criou a expectativa de que o

futuro pudesse ser descrito pela extrapolação do passado. Todavia, segundo

Ansoff & McDonnel (1993, p. 87), “as incertezas do século XX mostraram que

métodos de previsão com base em extrapolações são inadequados e incorretos

para ambientes turbulentos e em rápida evolução”. Para Cristo (2002, p. 2), os

modelos de prospecção do futuro baseados em tendências passadas somente são

válidos para ciclos evolutivos lentos, com mudanças tecnológicas distantes

cronologicamente. Ainda segundo o autor (op. cit., p. 2), no século XX “as

tecnologias de informação e de comunicação tornam os ciclos muito curtos e a

previsão do futuro incerta”. O futuro deixou de ser previsto, passando a ser

provável.

Voltando a Ansoff & McDonnel (op. cit., p. 87), no século XX foram

desenvolvidas outras técnicas de modelagem para identificar tendências,

variáveis, ou eventos futuros significativos, com o propósito de levar “à

construção de um modelo da realidade que pudesse ser manipulado pelo

planejador, para produzir futuros diferentes mediante a alteração de entradas e

relações entre variáveis dentro do modelo”.

Cristo (op. cit., p. 2) argumenta que a elevada capacidade de destruição

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adquirida pela humanidade, demonstrada em duas guerras mundiais e

principalmente durante a guerra fria, obrigou o desenvolvimento de instrumentos

de planejamento menos determinísticos e mais probabilísticos, com o propósito de

evitar catástrofes.

O início do século XXI – com uma sucessão de ataques terroristas,

guerras, epidemias, novas tecnologias e mudanças geopolíticas – mostra que as

incertezas do futuro estão cada vez mais presentes.

Conforme Cristo (ibidem), “lidar com esta incerteza e reduzi-la,

antecipando os processos de ruptura, ou de inovação, é o objetivo principal dos

estudos de prospectiva”, sendo que esta não é uma previsão, e sim uma “vigília

permanente em direção ao futuro”.

As técnicas de prospecção de futuro, segundo Makridakis et al. (1983),

são divididas em métodos quantitativos e qualitativos.

Os métodos quantitativos são aplicados quando: (i) existe informação

suficiente sobre o passado, (ii) a informação pode ser quantificada em forma de

dados numéricos, e (iii) pode-se assumir que alguns aspectos dos padrões do

passado continuarão no futuro. Esta última condição, chamada de “pressuposto da

continuidade”, aparece em todos os modelos quantitativos e em alguns modelos

qualitativos (MAKRIDAKIS et al., 1983).

De acordo com os referidos autores, os métodos qualitativos, por outro

lado, não necessitam de informações do passado, pois podem ser aplicados com

reduzida quantidade de dados numéricos, requerendo, contudo, um razoável nível

de conhecimento sobre o assunto em análise.

Os métodos qualitativos são subdivididos em exploratórios e normativos

(MAKRIDAKIS et al., 1983; GODET et al., 2000a). Os métodos exploratórios

utilizam como pontos de partida fatos passados e presentes, e movem-se para o

futuro, analisando todas as possibilidades decorrentes. Os métodos normativos,

por outro lado, começam no futuro, pela determinação dos objetivos e metas;

então, olham para o presente para identificar como alcançá-los, em função das

restrições, dos recursos e das tecnologias disponíveis (Makridakis et al., 1983).

Gordon & Glenn (2004) identificam 25 métodos de prospecção, cujo

propósito é “sistematicamente explorar, criar e testar tanto os futuros possíveis

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quanto os desejados, a fim de melhorar a tomada de decisão” (GLEEN, 1994,

p. 4).

Os métodos são analisados quanto aos aspectos quantitativos,

qualitativos, normativos e exploratórios. Dos modelos listados, apenas cenários e

índices de estados de futuro são indicados quando os quatro aspectos estão

presentes simultaneamente, o que ocorre em um processo de construção de futuro.

3.1 PLANEJAMENTO ESTRATÉGICO

Segundo Houaiss (2005), a palavra “planejamento” significa

determinação de um conjunto de procedimentos, de ações (por uma empresa, um

órgão do governo etc.) visando à realização de determinado projeto.

Pereira (2002, p. 28) associa a palavra planejamento a “pensar, criar,

moldar ou mesmo tentar controlar o futuro da organização dentro um horizonte

estratégico”. Planejamento, ainda segundo o mesmo autor, “é o processo

formalizado para gerar resultados a partir de um sistema integrado de decisões”.

Ansoff & McDonnel (1993) dividem o planejamento em dois grupos: o

planejamento de longo prazo e o planejamento estratégico. O primeiro grupo parte

do pressuposto de que o futuro pode ser previsto a partir da extrapolação do

passado. No segundo, não se espera que o futuro represente uma continuação do

passado.

Segundo Shimizu et al. (2006), os conceitos de estratégia nasceram nas

campanhas militares. Os grandes comandantes e suas estratégias aparecem em

passagens bíblicas, textos gregos e romanos, entre outros. A origem da palavra

“estratégia”, segundo Steiner & Miner (1981, apud CAMARGO & DIAS, 2003),

está na Grécia Antiga, significando, inicialmente, “arte do geral”, e adquirindo

posteriormente uma conotação militar, “a arte do general” (strategos), ou a arte de

conduzir exército. Ainda segundo Camargo & Dias (2003), na época de

Alexandre, o conceito foi expandido para incluir a habilidade de vencer um

oponente e criar um sistema unificado de governança global.

O primeiro texto a tratar de forma sistemática a estratégia, de acordo com

Shimizu et al. (2006), foi A arte da guerra, escrito por Sun Tzu no século IV. O

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livro somente chegou ao Ocidente no século XVIII, e teve influência marcante

sobre diversos autores do final do século XX, em especial os da chamada escola

do posicionamento.

As bases conceituais de estratégia militar foram estabelecidas no século

XIX por Antoine Henri-Jomini e Karl von Clausewitz, e transpostas para o mundo

dos negócios na segunda metade do século XX, com os mesmos conceitos e

terminologia (SHIMIZU et al., 2006).

O principal evento que motivou as empresas a utilizarem os conceitos de

estratégia no campo empresarial foi, segundo Ghemawat (2002), a Segunda

Revolução Industrial, que introduziu o conceito de distribuição em larga escala

associado ao emprego de grandes volumes de capital. Os conglomerados

industriais, surgidos nesse período, adquiriram uma enorme capacidade de

influência mútua, fazendo com que decisões tomadas por uns influíssem no

desempenho de outros.

Segundo Ansoff & McDonnel (1993), até a década de 1950, as grandes

mudanças no ambiente empresarial foram provocadas por empresas pioneiras e

agressivas, que determinaram o ritmo do progresso. Essas empresas, com razão,

acreditavam que controlavam o próprio negócio.

A partir de 1950, houve a transição de um mundo familiar e previsível,

em termos de produção e marketing, para outro, desconhecido, com níveis

crescentes de mudanças em tecnologia, concorrência, consumo e controle social.

O mundo globalizado levou a um questionamento sobre o papel da empresa na

sociedade, com a aceleração e a acumulação de eventos que começaram a alterar

as fronteiras, a estrutura e a dinâmica do ambiente empresarial.

Ghemawat (2002) atribui a Alfred Sloan a introdução dos conceitos de

estratégia no mundo corporativo, sendo que, para esse executivo da General

Motors, a estratégia baseia-se na percepção da força e da fraqueza de seus

competidores.

Segundo Terence (2002), a primeira publicação influente sobre

estratégia, aplicada à atividade empresarial, foi o livro Corporate Strategy, de Igor

Ansoff, em 1977, e, desde então, o tema vem sendo explorado de forma crescente

tanto no campo acadêmico como no empresarial.

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Conforme Ansoff & McDonnel (1993), a estratégia deve ser vista como

“um conjunto de regras de tomada de decisão para orientação do comportamento

de uma organização”.

Camargo & Dias (2003, p. 29) enfatizam que as palavras-chave

relacionadas à estratégia empresarial são “mudanças, competitividade,

desempenho, posicionamento, missão, objetivos, resultados, integração e

adequação organizacional”.

Oliveira (2001, apud PEREIRA, 2002) sintetiza as principais

características de um planejamento estratégico, enfatizando sua relação com o

futuro. Segundo o autor, o planejamento estratégico

• está relacionado às implicações futuras de decisões presentes;

• é um processo composto de ações inter-relacionadas e interdependentes

visando alcançar objetivos previamente estabelecidos;

• pode agregar mais valor do que seu produto final;

• necessita de uma visualização do futuro;

• avalia as ações alternativas em relação aos estados futuros;

• escolhe ações alternativas.

Para Pereira (2002), o planejamento tem um caráter abrangente, holístico

e temporal, sendo que esse último aspecto está relacionado ao horizonte temporal

para o qual o planejamento será válido.

O planejamento estratégico, segundo os autores citados, necessita,

portanto, de uma visão de futuro que ilumine os caminhos e oriente a tomada de

decisão.

3.2 CENÁRIOS PROSPECTIVOS

Segundo Bradfield (2004), o conceito de cenário surgiu pela primeira vez

no diálogo A república (Politéia), escrito por Platão no século IV a.C., no qual é

descrita uma república idealizada. Ainda segundo o mesmo autor, a utilização de

cenários como uma ferramenta de planejamento estratégico remonta ao

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desenvolvimento da estratégia militar do início do século XIX, com os militares

prussianos von Clausewitz e von Moltke.

A utilização sistemática de técnicas de cenários prospectivos, segundo

Buarque (2003), se deu entre os militares dos Estados Unidos durante a Segunda

Guerra Mundial, como um mecanismo de apoio à formulação de estratégias

bélicas. Porém, as modernas técnicas de análise prospectiva, conforme os escritos

de Börjeson et al. (2005), seguiram caminhos diferentes nos Estados Unidos e na

Europa. A tradição européia continha elementos democráticos e uma ambição de

mudanças radicais na sociedade. Nos Estados Unidos, por outro lado, a tradição

de previsão na área tecnológica, iniciada na Segunda Guerra Mundial, prosseguiu

no pós-guerra.

Glenn (1994) argumenta que o surgimento dos computadores, no final da

década de 1940, propiciou um terreno fértil para o desenvolvimento da técnica de

construção de cenários. Na década de 1950, Herman Kahn, da Rand Corporation,

começou a desenvolver cenários para o sistema de defesa dos Estados Unidos.

Seguindo a narrativa de Börjeson et al. (2005), o Departamento de Defesa dos

Estados Unidos estava com um problema complexo de tomada de decisão para o

desenvolvimento de novos armamentos. A origem da questão se situava na

complexidade dos novos sistemas de armas, no longo tempo necessário para o seu

desenvolvimento, na incerteza quanto à sua eficácia e quanto ao real inimigo a ser

combatido.

Desse modo, os estudos de novas ferramentas para auxiliar o processo de

tomada de decisão culminaram em duas metodologias distintas. A primeira,

destinada a compilar a opinião de um grande grupo de peritos, deu origem ao

método Delphi. A segunda, um modelo de simulação para analisar as

conseqüências da implementação de políticas alternativas, deu origem a uma das

técnicas de construção de cenários prospectivos (BRADFIELD, 2004).

Segundo Cornish (1977, apud BÖRJESON et al., 2005), os

conhecimentos obtidos na área militar foram transferidos para outras áreas quando

o projeto RAND (Research And Development) se transformou na Rand

Corporation, e seu propósito mudou de estudos alternativos de armas para estudos

exploratórios de políticas nacionais.

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31

Na Europa, no mesmo período, surgiu o conceito de prospectiva.

Segundo Marcial & Grumbach (2004), a palavra foi usada pela primeira vez por

Gaston Berger com o propósito de fazer oposição à palavra “retrospectiva”. De

acordo com Berger (2004, p. 313), prospectiva, “formada da mesma maneira que

retrospectiva, a ela se opõe, pois olhamos para frente e não para trás. Um estudo

retrospectivo examina o passado, enquanto uma pesquisa prospectiva se dedica a

estudar o futuro”. No mesmo artigo, Berger enfatiza a necessidade de uma atitude

prospectiva:

A atitude prospectiva não nos volta somente para o futuro. É precisoacrescentar que ela nos faz olhar longe. Em uma época na qual ascausas engendram seus efeitos a uma velocidade que não cessa decrescer, não é mais possível considerar simplesmente os resultadosimediatos das ações em curso. Nossa civilização é comparável a umcarro que anda cada vez mais rápido em uma estrada desconhecida nomeio da noite. Nesse caso, se quisermos evitar uma catástrofe, épreciso que os faróis do carro iluminem cada vez mais longe. Assim, aprospectiva é, essencialmente, o estudo do futuro distante.

Na década de 1960, a equipe da Rand Corporation, capitaneada por

Theodore Gordon e Olaf Hemer, desenvolveu duas técnicas formais de estudos

prospectivos: o método Delphi e o método dos impactos cruzados.

O propósito do primeiro, segundo Gordon (1994a, p. 3), é “remover os

impedimentos que ocorrem em uma sala de conferências quando se busca um

consenso entre especialistas”; o segundo, de acordo com o mesmo autor (1994a, p.

1), procurava “responder a uma pergunta simples: A previsão pode ser baseada na

percepção de como os eventos futuros interagem?”.

Kahn & Wiener (1967) deram um enorme impulso na análise

prospectiva. Na obra citada, os autores definem “cenários como uma tentativa de

descrever, em algum detalhe, uma hipotética seqüência de eventos que pode

tornar-se plausível em uma situação visualizada”. O livro, segundo Glenn (1994),

foi o primeiro a utilizar o termo “cenário” dentro do planejamento empresarial.

Na década seguinte, os estudos e técnicas de cenários foram

impulsionados pelos trabalhos de Pierre Wack, da Shell International Petroleum

Company. Segundo Bradfield (2004), foi o estudo conduzido por Wack, em 1967,

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que despertou o interesse empresarial em modelagem de cenários. Esse estudo

concluiu que o crescimento contínuo do setor petrolífero não iria além de 1985, o

que, de certa forma, antecipou a enorme flutuação dos preços do petróleo na crise

de 1973 (GLENN, 1994).

No mesmo período, surgiram os estudos de planejamento normativo, que,

segundo Börjeson et al. (2005, p. 7), consistiram numa “resposta à demanda por

estudos de futuro abordando situações em que um ator queria investigar como

certos objetivos poderiam ser atingidos, mesmo que os métodos de previsão

indicassem que o objetivo não poderia ser atingido”.

Na década de 1980, o francês Michael Godet, dando seguimento à

tradição iniciada por Gaston Berger, formalizou no livro Cenários e a

administração estratégica a metodologia francesa de prospectiva (MARCIAL &

GRUMBACH, 2004).

Bradfield (2004) divide as metodologias de construção de cenários em

três escolas básicas: (i) a escola de lógica intuitiva, cujas bases foram os estudos

de Pierre Wack, em 1967, para a Shell; (ii) a escola probabilística, cujas bases são

os trabalhos de Gordon & Helmer, na Rand Corporation, na década de 1950, e

que incorpora os modelos de análise de impacto de tendências e análise de

impactos cruzados; e (iii) a escola francesa, que teve início com os trabalhos de

Gaston Berger na década de 1950, sendo largamente ampliada com os trabalhos

de Michael Godet, a partir de 1970.

No Brasil, segundo Buarque (2003), as primeiras empresas a adotarem a

prática de construção e utilização de cenários foram o BNDES, a Eletrobrás, a

Petrobras e a Eletronorte, na década de 1980. O documento “Cenário para a

economia brasileira”, do BNDES, pode ser considerado um dos primeiros

experimentos nessa área (COSTA, 2004).

Em 1987, foi elaborado pelo BNDES o cenário da Integração

Competitiva, concluindo que o país estava bem preparado para competir

internacionalmente, desde que fossem resolvidas algumas condições relativas à

competitividade da indústria. Este cenário inspirou a abertura econômica

posterior. Outros estudos importantes realizados no Brasil foram: CNPq em 1989,

Finep em 1992, Seplan-PR, com o Projeto Aridas em 1994, e IPEA em 1997, com

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o estudo “O Brasil na virada do século: trajetória do crescimento e desafios do

desenvolvimento” (BUARQUE, 2003).

Um dos pioneiros no emprego de métodos da escola probabilística de

construção de cenários, no Brasil, foi Raul Grumbach, que em 1997 escreveu

Prospectiva: a chave para o planejamento estratégico, no qual apresenta os

conceitos de forma consolidada. A metodologia de Grumbach foi informatizada

no software Puma e tem sido usada em diversos estudos desde então.

No âmbito do governo federal, dois estudos de cenários prospectivos,

conduzidos como bases para o planejamento de longo prazo, merecem destaque

por sua relevância e igual profundidade.

A Secretaria de Assuntos Estratégicos (SAE) da Presidência da

República realizou, em 1997, um estudo de cenários exploratórios para o Brasil

com horizonte temporal em 2020. O trabalho foi ampliado no ano seguinte com o

levantamento dos cenários desejados para o Brasil. O projeto “Brasil 2020”

consistiu num estudo de cenários normativos abordando os aspectos “econômico,

ambiental, social, de informação e conhecimento e político-institucional,

caracterizando situações factíveis (ainda que desafiantes) se as medidas

necessárias forem implementadas no horizonte temporal estipulado”

(MINISTÉRIO DO PLANEJAMENTO, ORÇAMENTO E GESTÃO, 1997, p. 1).

Dessa forma, segundo a mesma fonte, o projeto tinha uma dimensão

estratégica com o sentido normativo de direcionar os atores influentes nos

processos de decisão voltados a uma postura proativa em relação aos objetivos a

serem alcançados no futuro.

O Núcleo de Assuntos Estratégicos da Presidência da República (NAE,

2004) iniciou o estudo “Brasil 3 Tempos” com objetivos semelhantes; todavia,

direcionou esforços não somente para a definição do cenário normativo, mas

também para a interação estratégica entre os atores, de forma a possibilitar a

construção de um futuro negociado. O estudo “Brasil 3 Tempos” está apresentado

no Capítulo 6.

Passados quase dez anos da conclusão do Projeto “Brasil 2020”, é

possível concluir que um bom cenário normativo não garante sua implementação.

Mesmo em projetos dessa magnitude, a tendência de cada ator é manter o foco em

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seu cenário ideal, restringindo as margens de negociação. A execução de um

planejamento de longo prazo passa necessariamente por um convencimento

político, e a construção do futuro depende de interações estratégicas negociadas.

3.3 INTERAÇÕES ESTRATÉGICAS

Segundo Bennett & Tait (1993), interações estratégicas ocorrem quando

nenhum dos atores tem controle total sobre os eventos, o que faz com que eles

estejam parcialmente dentro da esfera de atuação de cada um.

No ambiente interativo, a cada ação tomada por um dos atores, surge

uma nova ação adotada pelos demais. A melhor ação, vista de forma isolada, pode

não ser eficaz quando considerada em conjunto com as decisões tomadas pelos

outros atores. O resultado final será sempre um somatório de ações e reações. As

ações podem começar em um movimento de crescimento, porém inevitavelmente

tendem ao amortecimento, até criar um fato consumado.

Interações estratégicas são encontradas ao longo de toda a história da

humanidade, sendo que algumas soluções culminaram em parcerias estratégicas

de sucesso. Segundo Canen & Canen (2005, p. 16), os fenícios foram os primeiros

povos a adotar com sucesso a prática:

As companhias de Jerusalém e de Tiro formaram uma parceria cujasoperações objetivaram abrir um novo mercado para além do MarVermelho e, se possível, do Oceano Índico. As frotas de Salomão e dorei Hiram importaram ouro, prata e pedras preciosas da Arábia,Somália e Índia. Tal parceria também permitiu, aos fenícios, acesso arotas terrestres, tais como o acesso ao leste do rio Jordão, que ligava aArábia à Mesopotâmia, bem como a outras rotas das caravanas decamelos que passavam pelo Negev, ao sul de Israel.

Existem diversas ferramentas de modelagem matemáticas utilizadas no

estudo de interações estratégicas; a principal, segundo Azevedo et al. (2002), é a

teoria dos jogos.

De modo similar aos conceitos anteriores, aplicações de teoria dos jogos

podem ser rastreadas até os primórdios da civilização.

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Segundo Walke (2006), uma das primeiras aplicações pode ser

encontrada no Talmud, uma compilação de leis e tradições judaicas, escrito por

volta de 500 a.C. O Talmud, aparentemente, fornece recomendações contraditórias

para o chamado problema do contrato de casamento.

O caso apresentado é o de um homem casado com três esposas, cujo

contrato de casamento estabelece que, em caso de morte, cada esposa receberá

100, 200 e 300, respectivamente, e cuja herança seja inferior a 600. O Talmud

recomenda que, caso o homem deixe apenas 100, a herança seja dividida

igualmente entre as três esposas. Caso a herança seja de 200, a divisão deverá ser

50, 75, 75, e, caso a herança seja de 300, a divisão deverá ser 50, 100, 150.

Durante mais de 2.500 anos, as recomendações foram encaradas como um

mistério; porém, em 1985, Aumann & Maschler (1985) provaram que a solução

apresentada pelo Talmud é uma antecipação da moderna teoria de jogos

cooperativos. Cada solução corresponde ao núcleo de um jogo definido

apropriadamente, e a solução está coerente com a teoria apresentada por John C.

Harsanyi.

Segundo Fiani (2004), o estudo formal da teoria dos jogos está contido

no trabalho do húngaro Jonh von Neumann (Zur Theorie der Gesellschaftsspiele),

publicado em 1928. No referido estudo, demonstrou-se que a solução de jogos de

soma zero pode ser determinada por técnicas matemáticas. A continuação do

trabalho de von Newmann somente ocorreu em 1944, quando o autor publicou,

juntamente com Morgenstern, o livro The Theory of Games and Economic

Behavior, no qual analisam os jogos de soma zero e definem um modelo de

representação de jogos em forma extensiva.

A partir de 1950, Jonh F. Nash e Reinhard Selton desenvolveram

ferramentas teóricas que permitiram analisar uma maior variedade de modelos de

interação estratégica. O artigo de Nash, “Non-Cooperative Games”, de 1951,

apresentou uma noção de equilíbrio que não se restringia aos jogos de soma zero.

Esta noção, que ficou conhecida como “Equilíbrio de Nash”, estabelece que “uma

combinação de estratégias constitui um equilíbrio de Nash quando cada estratégia

é a melhor resposta possível às estratégias dos demais jogadores, e isso é verdade

para todos os jogadores” (Fiani, 2004).

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Segundo Holt & Hoth (2004, p. 4002), a noção de equilíbrio de Nash

“tem sido modificada, generalizada e refinada, mas a análise básica do equilíbrio

tem sido colocada no início (e, algumas vezes, no final) de análises de interações

estratégicas, não somente em economia, mas também em lei, políticas etc.”.

Outras contribuições, citadas pelo mesmo autor, são as de Harsanyi,

Aumann e Shapley, entre os grandes nomes que deram forma à teoria dos jogos.

Ainda segundo Holt & Roth (2004), foram os matemáticos Melvin

Dreshre e Merril Flood que conduziram, na Rand Corparation, um estudo para

demonstrar que o equilíbrio de Nash poderia não ser um bom modelo para a

previsão de comportamento. O estudo, posteriormente transformado no dilema

dos prisioneiros, foi o início de uma modelagem chamada de dilemas sociais.

Hardin (1968) publicou um artigo sobre dilemas sociais, intitulado “A

tragédia dos comuns”. O texto descreve um conflito entre o interesse pessoal e o

interesse do grupo, recorrendo a um antigo exemplo de uso de uma pastagem

coletiva à qual a comunidade local tinha acesso irrestrito. A conclusão, do ponto

de vista de cada ator, era colocar a maior quantidade possível de gado na

pastagem coletiva, mesmo sabendo que, se todos fizessem o mesmo, o pasto

coletivo ficaria exaurido e, portanto, inutilizado.

Os dilemas sociais estudam as situações em que a racionalidade

individual conduz a uma irracionalidade coletiva. Nessas situações, cada

indivíduo recebe uma recompensa maior por não cooperar com os demais;

contudo, se todos os indivíduos fizerem a mesma escolha, o resultado será pior do

que aquele que seria obtido por cooperação coletiva. Segundo Kollock (1998, p.

183), “muitos dos problemas mais desafiadores enfrentados, desde

relacionamentos interpessoais até conflitos internacionais, são enquadrados nesta

categoria”.

No início da década de 1990, a equipe liderada por Michel Godet

desenvolveu o método MACTOR (Matriz de Alianças e Conflitos: Táticas,

Objetivos e Recomendações), cujo objetivo, segundo Godet (2000b), era analisar

a correlação de forças entre atores e estudar suas convergências e divergências

relativamente a certo número de desafios e de objetivo associados, a fim de

auxiliar a implementação de alianças e de conflitos.

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3.4 PESQUISA POR PALAVRAS-CHAVE

Segundo Oliveira (2001, apud PEREIRA, 2002), o planejamento

estratégico tem um caráter holístico e temporal, necessitando de uma visualização

de futuro para avaliar e escolher as alternativas em relação a este. No mesmo

sentido, Godet et al. (2000a, p. 8) argumentam que a definição de planejamento

proposta por Igor Ackoff de “conceber um futuro desejado, bem como os meios

reais para lá chegar, é a mesma proposta da prospectiva”.

Segundo Cristo (2002, p. 3), “a prospectiva é o insumo básico do

planejamento estratégico. Por meio da construção de cenários exploratórios, são

identificados os desafios do futuro e, após um processo de decisão estratégica,

obtidos cenários prescriptores que indicarão o futuro desejado”.

Godet et al. (2000a, p. 19) defende que a “prospectiva, com as suas

tendências e riscos de ruptura, subverte o presente e interpela a estratégia. Por seu

lado, a estratégia interroga-se sobre as escolhas possíveis e os riscos

irreversíveis”.

Nas palavras de Kahn & Wiener (1967, apud MIEG, 2002, p. 1), “a

prospectiva deve identificar precisamente como uma situação hipotética ocorre

passo a passo, e, em cada passo, quais alternativas existem para cada ator, no

sentido de prevenir, desviar ou facilitar o processo”. A existência de alternativas

também é chave no planejamento estratégico, que, segundo Ansoff & McDonnel

(1993), deve ser vista como um conjunto de regras de tomada de decisão.

Por outro lado, segundo Turocy & Stengel (2001, p. 4), a teoria dos

jogos é um estudo formal de conflito e cooperação, sendo que seus “conceitos

fornecem uma linguagem para formular, estruturar, analisar e entender cenários

estratégicos”.

Para Godet et al. (2000a, p. 9), “a prospectiva é freqüentemente

estratégica, senão pelas suas conseqüências, ao menos pelas suas intenções, e a

estratégia apela à prospectiva, quanto mais não seja para iluminar as escolhas que

comprometem o futuro”.

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A interligação e a complementaridade entre os conceitos são bastante

claras; contudo, o resultado da pesquisa por palavras-chave, mostrado na Tabela

3.1, aponta para um número reduzido de trabalhos e integração. A Tabela 3.2

mostra, ainda, que as teses defendidas no Brasil seguem o mesmo caminho, com

apenas uma tese abordando os três conceitos.

A pesquisa foi direcionada para artigos publicados em inglês e teses

defendidas no Brasil. Para a pesquisa de artigos, foram utilizadas três bases de

dados: Emerald, Proquest, Web of Science. Para teses, foi utilizada a base de

dados da CAPES.

Tabela 3.1 – Artigos publicados

EMERALD PROQUEST WEB OFSCIENCE

Prospective Scenarios 1 1 8

Strategic Planning 4268 17195 2692

Strategic Interactions 19 338 290

Prospective Scenarios, StrategicPlanning

1 0 0

Prospective Scenarios, StrategicInteractions

0 1 2

Strategic Planning, StrategicInteractions,

1 0 0

Prospective Scenarios, StrategicPlanning, Strategic Interactions

0 0 0

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39

Tabela 3.2 – Teses defendidas – Capes

CAPES

Cenários prospectivos. 20

Planejamento estratégico. 106

Interações estratégicas. 12

Cenários prospectivos, planejamento estratégico. 2

Cenários prospectivos, interações estratégicas. 2

Planejamento estratégico, interações estratégicas. 4

Cenários prospectivos, planejamento estratégico,interações estratégicas.

1

A tabela 3.1 mostra que, nas bases de dados consultadas, não foram

encontrados artigos abordando os três conceitos. Um dos artigos que se aproxima

de uma análise conjunta, Godet et al (1994), apresenta o método MACTOR, sendo

que o mesmo autor argumenta em Godet (2000) que este era o único método

operacional conhecido.

Apenas uma tese trata dos conceitos em uma abordagem conjunta

(Tobias, 2000). O trabalho, “Modelo de planejamento integrado da organização

espacial, do desenvolvimento regional e dos transportes para uma região em

expansão de fronteiras: O caso da região oeste do Pará” aplica os conceitos a um

problema específico, culminando com a elaboração de três alternativas de

cenários: “extrapolação de tendências, inserção regional na economia mundial e

desenvolvimento sustentável”.

A pesquisa por palavras chaves mostrou que uma abordagem conjunta

dos conceitos de planejamento estratégico, cenários prospectivos e interações

estratégicas, permanece como um vasto campo a ser explorado.

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40

4. METODOLOGIA

A metodologia proposta no processo de construção do futuro agrega os

conceitos de cenários prospectivos e interações estratégicas, dentro de um

conceito mais amplo de planejamento estratégico, chamado por Ansoff &

McDonnel (1993) de “gestão estratégica”.

A construção de cenários prospectivos emprega as técnicas de pesquisa

Delphi, impactos cruzados e simulação Monte Carlo, enquanto a análise de

interações estratégicas utiliza conceitos da teoria dos jogos, cujo propósito é

modelar a forma de atuação dos atores.

Segundo Godet et al. (2000a), a prospectiva estratégica se dedica a

responder às seguintes questões:

• O que pode acontecer no futuro?

• O que posso fazer?

• O que vou fazer?

• Como vou fazê-lo?

E uma questão prévia e essencial:

• Quem sou eu?

A construção de cenários prospectivos responde à primeira questão, os

decisores estratégicos devem responder à segunda, o processo de planejamento

estratégico às duas seguintes. A resposta à quinta questão será fornecida pelo

próprio planejamento estratégico.

A gestão estratégica, como se disse, emprega os conceitos propostos por

Ansoff & McDonnel (1993). Esses conceitos, integrados aos de construção de

cenários prospectivos e de análise das interações estratégicas, são sintetizados em

cinco fases, como mostrado na Figura 4.1:

1. Identificação do sistema;

2. Diagnóstico estratégico;

3. Análise prospectiva;

4. Avaliação das ações; e

5. Monitoramento.

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41

Figura 4.1 – Gestão estratégica

A primeira fase, chamada de “identificação do sistema”, define os

parâmetros básicos de todo o estudo. Nessa fase, são identificadas as

características da organização, bem como do ambiente em que está inserida. Uma

organização, nesse contexto, deve ser entendida como a sociedade, um órgão

governamental ou uma empresa.

A segunda fase, “diagnóstico estratégico”, confronta as características da

organização com o ambiente. O propósito, segundo Ansoff & McDonnel (1993), é

responder às seguintes questões:

• Quem é a organização?

• Em que ambiente a organização está inserida?

• Aonde a organização deseja chegar?

A presente tese está concentrada nas fases 3 e 5. Na fase 3, análise

prospectiva, o foco é a identificação do cenário normativo e as medidas

necessárias para atingi-lo (em cinza na Figura 4.1).

As medidas são subdivididas em dois tipos: medidas relacionadas à

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42

dimensão política (interações estratégicas) e medidas relacionadas à dimensão

técnica (construção de futuro).

A eficácia das medidas é avaliada pela fase 5, monitoramento. Nessa

fase, verificam-se e analisam-se fatos concretos, cujo propósito é ratificar ou

retificar as medidas adotadas. O monitoramento deve ser visto como um ponto de

realimentação do sistema.

Voltando à fase 3 (análise prospectiva), vislumbramos que ela é

subdividida em cinco etapas:

• Definição das questões estratégicas;

• Construção da matriz de cenários;

• Análise de interações estratégicas;

• Seleção do cenário normativo; e

• Definição das ações.

4.1 DEFINIÇÃO DAS QUESTÕES ESTRATÉGICAS

Questões estratégicas são as variáveis do ambiente, os aspectos de maior

impacto sobre a organização. Segundo Ansoff & McDonnel (1993, p. 53), a

matéria-prima para a definição das questões estratégicas é um “diagnóstico

estratégico, que determina a natureza do problema estratégico da organização”.

Segundo Marcial & Grumbach (2004), as questões estratégicas são

identificadas pela análise conjunta das características da organização e do

ambiente. Entende-se por características da organização seus pontos fortes ou

fracos e, as do ambiente, as oportunidades ou ameaças. Cada uma dessas

características não é intrinsecamente um ponto forte, fraco, oportunidade ou

ameaça. Um ponto fraco poderá se transformar em ponto forte, e vice-versa,

quando do confronto com as características do ambiente e das estratégias adotadas

pelos demais atores.

As questões estratégicas são obtidas pela técnica de brainstorming, com

base nos chamados “fatos portadores de futuro”, derivados de pontos fortes e

fracos, oportunidades e ameaças. Os fatos portadores de futuro são fatos

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43

concretos, atuais ou passados, sinalizadores de uma possível realidade que irá se

formar no futuro. No pensamento de Marcial & Grumbach (2004), são “sinais

ínfimos por suas dimensões presentes, mas imensos por suas conseqüências e

potencialidades virtuais”.

A técnica de brainstorming, de acordo com Stenmark (2000), foi

proposta por Alex Osborn, em 1953, no livro Applied Imagination, como uma

metodologia de geração de idéias.

A construção dos cenários prospectivos utiliza variáveis binárias

(variáveis de Bernoulli) para modelar as questões estratégicas. Tais questões,

chamadas de eventos, são definidas como fenômenos que podem ou não ocorrer

no futuro.

As variáveis de Bernoulli, neste caso, podem assumir dois valores

(ocorre ou não ocorre) definidos pelo parâmetro “p”, que representa a

probabilidade de que o evento ocorra (a probabilidade de que o evento não-ocorra

é “1-p”).

Desse ponto em diante, uma questão estratégica será chamada de evento,

sendo definida como uma variável de Bernoulli, que poderá ocorrer, com

probabilidade “p”, ou não ocorrer, com probabilidade “q”, onde q = (1-p).

As questões estratégicas representam variáveis do ambiente, que em

geral são contínuas ou discretas, raramente binárias. A transformação em uma

variável de Bernoulli ocorre na definição do evento, que agregam, além do

comportamento da variável, um nível de referência relativo ao ponto de tomada de

decisão estratégica da organização, conforme mostrado na Figura 4.2.

A organização deverá definir um nível característico para a tomada de

decisão. Tal nível identifica uma ruptura de comportamento estratégico, um

patamar que, uma vez ultrapassado, conduzirá a outro cenário e, portanto, do

ponto de vista da organização, a outro futuro.

Outro dado abordado é o fato de o nível de referência estar pautado na

própria definição de estratégia. Em termos empresariais, segundo Ansoff &

McDonnel (1993, p. 70,) “estratégia é um conjunto de regras de tomada de

decisão para orientação do comportamento de uma organização”. O nível de

referência é o ponto que, uma vez ultrapassado, altera o comportamento da

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44

organização. A definição desse nível deve levar em consideração fatores relativos

à natureza do negócio, aos pontos fortes e fracos, concorrentes etc. Como o nível

de referência muda de organização para organização, o mesmo comportamento de

uma variável pode conduzir a cenários diferentes, quando analisado pela ótica de

uma ou de outra organização.

Assim, os eventos podem representar variáveis contínuas ou discretas,

com ou sem indicadores. Todavia, mesmo no caso de eventos associados a

indicadores, não há uma relação direta entre a tendência dos indicadores e a

tendência dos eventos.

A Figura 4.2 ilustra a definição de um evento, para uma mesma variável,

em relação a três níveis de referência possíveis. A figura mostra o comportamento

observado da variável no passado e os comportamentos possíveis no futuro.

Figura 4.2 – Definição de evento

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45

O evento será descrito pela probabilidade de que a variável ultrapasse o

nível de referência, dentro do horizonte temporal considerado. A probabilidade

“p”, conforme pode ser observada na Figura 4.2, depende do nível de referência.

Se a referência for o nível “a”, a probabilidade será muito baixa; se for o “b”, será

próxima de 50%, e se for o “c”, a probabilidade será muito alta.

A transformação da variável “crescimento econômico” de um país, em

variável de Bernoulli, pode exemplificar o conceito. Uma organização, sediada em

um país com crescimento econômico médio na faixa de 4% ao ano, pode definir o

seu nível de referência nos patamares de 6%, 4%, ou 2%. No primeiro caso a

probabilidade “p” (crescimento médio anual superior a 6% ao ano, nos próximos

anos) deverá ser baixa, no segundo deverá ser próxima de 50%, e no terceiro

deverá ser alta.

A Figura 4.3 mostra a diferença entre tendência da variável e

probabilidade do evento. A figura representa a curva de acompanhamento de uma

variável nos últimos dez períodos, bem como sua tendência por extrapolação

linear para os próximos dez períodos. A tendência, ao final do décimo período

futuro, é de que a variável atinja o valor de 6,5. O evento, a probabilidade de que

o valor da variável seja superior a 8, deve ficar abaixo de 50%. A distribuição de

probabilidades representada é uma Normal; todavia, o conceito é similar para

outras distribuições.

Figura 4.3 – Evento X Tendência

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46

4.2 CONSULTA A PERITOS – O MÉTODO DELPHI

A estimativa da probabilidade de ocorrência do evento é efetuada pela

técnica da consulta Delphi. Tal técnica, como já abordada anteriormente, foi

desenvolvida para remover os impedimentos comuns de consultas feitas em uma

sala de conferências (GORDON, 1994a).

A aplicação da técnica consiste em consultas sucessivas a um grupo de

especialistas (peritos) sobre a probabilidade de ocorrência de eventos futuros.

Trata-se, portanto, da estimativa do parâmetro “p”, de uma variável de Bernoulli.

A cada consulta, oferece-se ao perito a oportunidade de alterar sua opinião, com

base na média da opinião de todos os peritos. O propósito é obter uma

convergência de opiniões que represente um consenso sobre a questão em análise.

A consulta pode ser efetuada por cartas, e-mail ou entrevistas individuais.

“O anonimato e o fato de não haver uma reunião física reduzem a influência de

fatores psicológicos como, por exemplo, os efeitos da capacidade de persuasão, a

relutância em abandonar posições assumidas e a dominância de grupos

majoritários”, escrevem Wright & Giovinazzo (2000, p. 55).

Os eventos podem representar variáveis contínuas ou discretas, com ou

sem indicadores. A inexistência de indicadores faz com que o método Delphi seja

o mais indicado para estimar o parâmetro “p”. Ainda segundo os mesmos autores,

o método é “especialmente recomendado quando não se dispõe de dados

quantitativos, ou estes não podem ser projetados para o futuro com segurança, em

face das expectativas de mudanças estruturais nos fatores determinantes das

tendências futuras”.

A geração da matriz de cenários prospectivos, conforme se detalha no

capítulo seguinte, utiliza também o método de impactos cruzados. Tal método é

uma revisão das probabilidades estimadas a priori, em função do impacto que a

suposta ocorrência de um evento causa na probabilidade de ocorrência dos

demais. O impacto é estimado, dentro da consulta Delphi, pela probabilidade

condicional de ocorrência de cada evento, em face da ocorrência de cada um dos

demais.

A quantidade de informação necessária para estimar todas as

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47

probabilidades condicionais, em todos os cenários possíveis, tornaria a aplicação

do método Delphi impraticável. Segundo Turoff (2002, p. 338), o número é da

ordem de !ne× , quando “n” tende para infinito, onde “n” é o número de eventos

no cenário.

A necessidade de limitar a quantidade de perguntas propostas aos peritos

a números razoáveis obriga que estas sejam formuladas do ponto de vista de

causalidade. Em condições tais, as probabilidades refletem uma relação de causa e

efeito, das quais serão extraídos coeficientes de correlação. Estes coeficientes

fornecem uma medida relativa do grau do impacto que a ocorrência de um evento

provoca na probabilidade de ocorrência dos outros. Todavia, segundo Turoff

(2002), o termo “probabilidade condicional” tem sido largamente usado. A

aplicação dessa solução limita o número de perguntas a n2, onde “n” é a

quantidade de eventos no cenário.

O método original da pesquisa Delphi considera pesos iguais para as

opiniões dos especialistas; todavia, em função da diversidade de assuntos que

compõem um cenário, será utilizada a ponderação da opinião dos especialistas. A

atribuição de um peso diferenciado à opinião de cada participante, obtido por uma

auto-avaliação para cada questão, é chamada de “técnica de convergência de

opiniões”. Segundo Cristo (2002), a técnica foi desenvolvida e operacionalizada

por Bilich, na década de 1970.

A transformação das questões estratégicas em variáveis de Bernoulli

agrega em um mesmo número (o parâmetro “p”) os conceitos de probabilidade de

ocorrência dos eventos e grau de certeza, conforme mostrado na Figura 4.4. A

relação entre probabilidade e certeza pode não ser linear, contudo, a curva deve

passar pelos três pontos mostrados na figura, indicado que 0% de probabilidade de

ocorrência corresponde a 100% de certeza de que o evento não ocorra, que 50%

de probabilidade corresponde a 0% de certeza, e que 100% de probabilidade de

ocorrência corresponde a 100% de certeza de que o evento ocorra. Desta forma,

“p” igual a 0,7, ou 70%, corresponde a um evento que os peritos acreditam que

ocorrerá no futuro, contudo com razoável grau de incerteza.

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48

Figura 4.4 – Certeza X Probabilidade

4.3 CONSTRUÇÃO DA MATRIZ DE CENÁRIOS

O propósito da construção da matriz de cenários prospectivos é calcular a

probabilidade de ocorrência de cada cenário, em função das probabilidades de

ocorrência dos eventos.

A probabilidade de ocorrência de cada um dos cenários é obtida por

simulação Monte Carlo. Cada simulação representa um futuro possível obtido em

uma seqüência específica de ocorrências (ou não) dos eventos. O algoritmo da

simulação Monte Carlo recalcula a cada simulação e a cada ocorrência de evento a

probabilidade de ocorrência dos outros eventos, em função do impacto que a

ocorrência desse evento causa na probabilidade de ocorrência dos demais

(impactos cruzados).

O impacto de um evento sobre os outros está associado ao conceito de

chances. A chance é a razão entre a quantidade de ocorrências favoráveis e a

quantidade de ocorrências desfavoráveis. Dessa forma, uma variável de

Bernouilli, cuja probabilidade de ocorrência é de 0,3, terá um chance de 0,428 de

ocorrer, correspondendo à razão =− p

p

1

7,0

3,0.

O cálculo do valor do impacto que a ocorrência de um evento causa sobre

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49

a probabilidade de ocorrência de outro (IA/B) é obtido pela razão entre as chances

de ocorrência do evento “A” a priori e a posteriori, conforme mostrado na

Equação 4.2 (GORDON, 1994c).

( )( )

( )( )BAP

BAPI

AP

APB

A /1

/

1 −=×

( )( )

( )( )AP

AP

BAP

BAPI

BA

−∗

−=

1

/1

/

A probabilidade causal P(A/B) pode ser calculada pela Equação 4.3.

( )( )

( ) ( )B

A

BA

IAPAP

IAPBAP

∗+−

∗=1

/

Onde P(A) é a probabilidade de ocorrência do evento “A” (probabilidade

a priori), P(A/B) é a probabilidade de ocorrência do evento “A”, dado que o

evento “B” ocorreu (probabilidade a posteriori) e IA/B é o impacto que a

ocorrência do evento “B” causa na probabilidade de ocorrência do evento “A”.

A consistência do valor da probabilidade causal P(A/B) é verificada pela

Equação 4.7 (GORDON, 1994c), deduzida a partir da fórmula de Bayes, Equação

4.4 (ROSS, 1997, p. 12).

( ) ( ))()()()()( BPAPBPAPAP ∩+∩=

( ) ( ))()()()()(B

APBPBAPBPAP ∗+∗=

( ) ( )( ))()(1)()()(B

APBPBAPBPAP ∗−+∗=

Os valores de P(A), P(B) e P(A/B) são estimados pelos peritos; todavia, o

valor de )(B

AP , probabilidade de ocorrência do evento “A”, dado que o evento

(4.1)

(4.2)

(4.3)

(4.4)

(4.5)

(4.6)

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50

“B” não-ocorre, fica implícito. A consistência do valor da probabilidade

de )( BAP é verificada pelos limites impostos à probabilidade de )(

BAP , ou seja,

1)(0 ≤≤B

AP . Resolvendo a equação para os dois limites, teremos:

( ) ( )( )

( ) ( )( )BP

APBAP

BP

BPAP≤≤

−+/

1

A Equação 4.7 estabelece os limites para a probabilidade condicional,

causal ou a posteriori P(A/B). A equação indica que, quanto menor a

probabilidade do evento impactante P(B), mais amplos são os limites para a

probabilidade condicional P(A/B).

A Equação 4.7 representa um fenômeno conhecido, ou seja, somente

eventos com baixa probabilidade de ocorrência podem alterar significativamente a

probabilidade de ocorrência de outros eventos.

O cálculo do valor da probabilidade condicional pela equação 4.2 e a

análise de consistência pela equação 4.7 mostram como é possível obter um futuro

diferente da tendência. Um evento (variável que representa uma questão

estratégica) não tem a capacidade de alterar a própria tendência. A quebra de

tendência é provocada pelo impacto da ocorrência de outro evento.

Eventos de baixa probabilidade de ocorrência e alto impacto são

candidatos potenciais a causar quebras de tendências. Cenários gerados pela

ocorrência de um evento desse tipo podem ser substancialmente diferentes do

chamado “cenário mais provável”. Caso esse novo cenário tenha sérias

implicações para a organização, é chamado de “cenário curinga” (wild cards

scenarios). A simulação de cenários curingas é um importante subsídio para a

análise de risco em tomada de decisão estratégica.

4.4 MATRIZ DE CENÁRIOS

A matriz de cenários prospectivos é gerada mediante a técnica de

simulação Monte Carlo, que utiliza números aleatórios para simular os valores das

(4.7)

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51

variáveis independentes. A técnica, desenvolvida na Segunda Guerra Mundial

para o projeto Manhattan, é largamente empregada em problemas de difícil

caracterização por meio de equações matemáticas (MAKRIDAKIS et al., 1983).

Os cálculos envolvidos na definição dos cenários e na análise de

interações estratégicas utilizam diversas matrizes e vetores. Para garantir uma

uniformização de índices, serão utilizadas as seguintes letras:

• “i” para cenário;

• “j” para evento; e

• “k” para ator.

O resultado final da simulação Monte Carlo é a probabilidade de

ocorrência de cada cenário P(i), associado a uma matriz de cenários prospectivos.

Esta, por sua vez, cuja notação será jie , , indica a ocorrência, ou não, de cada

evento em cada cenário.

Nessa notação, um determinado cenário “i” é representado pelo vetor ej

(onde j = 1, 2, 3, …n), sendo que “e” pode assumir os valores “-1”, representando

a não-ocorrência do evento “j”, ou “1” representando sua ocorrência. O cenário

com maior probabilidade de ocorrência será chamado de “cenário mais provável”.

A Tabela 4.1 mostra a representação matricial de um cenário composto

por três eventos. O cenário 1 é representado pelo vetor (1,1,1), indicando que

nesse cenário todos os eventos ocorrem.

Tabela 4.1 – Matriz de cenários

EventosCenários 1 2 3

1 1 1 12 1 1 -13 1 -1 14 -1 1 15 -1 -1 16 -1 1 -17 1 -1 -18 -1 -1 -1

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52

Na matriz, está destacado o valor de 2,3e = -1, indicando que, no cenário

3, o evento 2 não ocorre. O cenário 3 é composto pela ocorrência dos eventos 1 e

3, e pela não-ocorrência do evento 2.

O número máximo de cenários gerados é igual a 2n, onde “n” é o número

de eventos.

O algoritmo gera, a cada simulação, um possível cenário, em uma

seqüência específica de ocorrência de eventos. A simulação é repetida diversas

vezes. A probabilidade de ocorrência de cada cenário é a razão entre o número de

vezes que aquele cenário aparece pelo número total de cenários gerados. A

simulação é repetida, até que a probabilidade de ocorrência do cenário mais

provável se mantenha dentro de um intervalo de confiança predefinido. Nos

softwares Puma e Lince, apresentados no Capítulo 5, o número mínimo de

simulações é de 150 mil, e o intervalo de confiança preestabelecido e de um erro

máximo é de 5%, com 90% de certeza, de acordo com o algoritmo proposto em

(LAW & KELTON, 1991, p. 539). O algoritmo pode ser sintetizado em quatro

passos (MAKRIDAKIS et al., 1983; GORDON, 1994b):

1. Seleciona-se aleatoriamente um evento;

2. Seleciona-se aleatoriamente um número de 0 a 100;

3. Compara-se a probabilidade de ocorrência do evento selecionado no

passo “1” com o número obtido em “2”;

3.1 Se a probabilidade for menor que o número aleatório, o evento é

considerado como não-ocorrendo;

3.2 Se a probabilidade for maior ou igual ao número aleatório, o

evento é considerado como ocorrendo. Nesse caso, a probabilidade de ocorrência

de cada um dos outros eventos é recalculada com base no impacto IA/B , de acordo

com a equação 4.3;

4. Retorna-se ao passo “1”, até que todos os eventos tenham sido

selecionados.

O conjunto de cenários prospectivos gerados é uma partição, o que

garante que a ocorrência de um determinado cenário impede a ocorrência de

qualquer outro. Isso equivale a dizer que o futuro, seja ele qual for, será único.

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A utilização de variáveis de Bernoulli na construção de cenários

prospectivos possui as seguintes vantagens:

• gera um número finito de cenários;

• permite a análise conjunta de diversas variáveis (eventos);

• permite analisar a dependência entre variáveis (impactos cruzados);

• permite o acompanhamento de (eventos) relacionado a mais de uma

variável.

4.5 INTERAÇÕES ESTRATÉGICAS

A etapa de interações estratégicas tem como propósito a seleção de um

cenário normativo. A análise está fundamentada em conceitos da teoria dos jogos,

com o propósito de modelar as diferentes formas de agir, e o posicionamento dos

atores face aos cenários prospectivos.

A aplicação de conceitos da teoria dos jogos aos cenários prospectivos

parte do pressuposto de que, se não houver qualquer ação coordenada dos atores,

o futuro que os aguarda será o cenário mais provável, conforme está mostrado na

Figura 4.5. O pressuposto se baseia na hipótese de que, sem coordenação, cada

ator usará sua capacidade de influenciar a ocorrência dos eventos no sentido de

atingir o futuro ideal (cenário ideal). Portanto, cada ator deverá executar ações

para que o futuro caminhe em direção a seu cenário ideal. Esta é a estratégia

inicial de cada ator.

O cenário mais provável é visto como um ponto de equilíbrio. Este existe

porque qualquer ator que abandone sua estratégia inicial fará com que ocorra um

cenário mais distante de seu cenário ideal. Tal noção é a mesma de equilíbrio de

Nash em jogos não-cooperativos, em que nenhum dos atores terá interesse em se

desviar unilateralmente de sua estratégia.

A construção do futuro se baseia em uma mudança de foco, de jogos não-

cooperativos para jogos cooperativos. Segundo Fiani (2004), jogos cooperativos

são aqueles em que os atores podem comunicar-se e estabelecer compromissos

que possuam garantias efetivas.

A estruturação de um jogo cooperativo com vários jogadores está

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54

baseada em sua função característica. Para Winston (1994), a função característica

representa o valor que os atores receberão se agirem juntos e formarem uma

coalizão. Ainda de acordo com o referido autor, para que a coalizão seja viável, o

valor recebido por ela deve ser superior àquele que seria obtido com uma atuação

independente dos atores. Do ponto de vista de cada ator, somente é vantajoso

participar da coalizão caso o valor recebido seja superior ao valor que seria obtido

com uma atuação independente.

A montagem de uma coalizão que vise alterar o futuro em direção ao

futuro normativo deverá, portanto, garantir um ganho para todos os seus

membros. Este também é um pressuposto básico para parcerias estratégicas,

conforme citado na Seção 2.1.1.

Assim, o propósito de montagem da coalizão é transformar o cenário

normativo no cenário mais provável. O ganho de cada membro da coalizão será a

diferença entre o valor do cenário mais provável e o valor do cenário normativo.

O primeiro deve ser visto como um cenário de referência para o cálculo dos

ganhos individuais.

Já o segundo cenário será escolhido por um processo iterativo, pois,

conforme visto anteriormente, os cenários não são equiprováveis, o que

inviabiliza a adoção de soluções clássicas da teoria de jogos cooperativos. A

coalizão, ao escolher um cenário normativo, assume o risco de que ele não ocorra.

Sabe-se que o risco associado ao cenário é inversamente proporcional à sua

probabilidade de ocorrência.

A construção do futuro baseada em conceitos de jogos cooperativos

permite afirmar que a coalizão pode obter um resultado melhor do que o cenário

mais provável, conforme representado na Figura 4.7, a qual mostra uma coalizão

dos atores “A” e “C”, cujo propósito é direcionar o futuro para o cenário 9,

escolhido como normativo. Este cenário, por estar mais próximo do cenário ideal

de ambos, é uma solução melhor do que o cenário 11, avaliado como mais

provável.

A Figura 4.5 mostra também os limites das margens de negociação dos

atores. Do ponto de vista do ator “A”, é possível escolher como cenários

normativos os de números 1, 2, 3, 5, 6, 7, 9 e 10. Os cenários negociáveis são

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55

aqueles situados na intersecção da margem de negociação de dois ou mais atores.

Ainda do ponto de vista do ator “A”, é possível negociar os cenários 3 e 7,

montando uma parceria com o ator “B”, ou 9 e 10, com o ator “C”.

A montagem da coalizão deve alterar o equilíbrio de forças preexistente.

O equilíbrio de Nash original (cenário mais provável), obtido pela atuação

individual dos atores, será transferido para um outro ponto de equilíbrio (cenário

normativo), conforme mostrado na Figura 4.7. O cenário normativo, definido

dessa forma, é outro ponto de equilíbrio de Nash, pois qualquer ator que se afaste

unilateralmente de sua nova estratégia direcionará o futuro para um ponto mais

distante de seu cenário ideal. Segundo Marini & Currarini (2002), este é um ponto

de equilíbrio cooperativo conjuntural, em que a coalizão atua como um

“superator” e os demais atores procedem de forma isolada, oferecendo suas

melhores respostas possíveis às ações da coalizão.

A alteração de um equilíbrio de forças, de acordo com a modelagem

adotada, poderá ocorrer de três formas básicas: (i) pela inserção de uma força

nova, (ii) pela alteração da intensidade de uma força já atuante, ou (iii) pela

alteração no sentido de atuação de uma força já atuante.

A montagem de uma coalizão atende ao terceiro tópico. Os membros

devem direcionar seus esforços para um cenário normativo comum, e não mais

para o cenário ideal de cada um, conforme mostrado na Figura 4.7. A alteração da

intensidade de uma força já atuante é obtida com o emprego do poder de

dissuasão e a inserção de uma força nova ocorre quando do aparecimento de um

novo ator.

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56

Figura 4.5 – Cenário mais provável

Figura 4.6 – Cenário normativo

Margem de negociaçãodo ator “A”

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57

Figura 4.7 – Parceria estratégica

Teoricamente, é possível encontrar cenários-solução. Um cenário

candidato à solução é aquele que garante ganhos para todos os atores, tanto do

ponto de vista individual quanto do coletivo. Segundo Winston (1994), esta é uma

das condições necessárias para que exista uma solução em jogos cooperativos, e,

do ponto de vista da construção do futuro, é o caso ideal, em que a coalizão

engloba todos os atores. A existência de um cenário candidato à solução não o

torna automaticamente a solução. O passo seguinte consiste na verificação de sua

probabilidade de ocorrência, bem como da existência de recursos e tempo

disponível para transformá-lo em cenário mais provável.

O caso mais comum, conforme está mostrado na Figura 4.7, cria uma

coalizão parcial, em que seus membros atuam em bloco, ao passo que os demais

continuam a oferecer suas melhores respostas possíveis às ações dos demais,

inclusive da coalizão. Olhando de um ponto de vista externo, o jogo continua

sendo não-colaborativo; contudo, para os membros da coalizão, valem as

condições básicas de jogos colaborativos.

A alteração do equilíbrio de forças – condição necessária para promover

quebras de tendências e redirecionar o futuro – ocorre quando todos os membros

da coalizão passam a considerar o cenário normativo como o novo cenário ideal.

A possível existência de uma coalizão não garante a exeqüibilidade do

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58

cenário normativo. A coalizão deve ter força suficiente para alterar a

probabilidade de ocorrência de alguns eventos e transformar o cenário normativo

no cenário mais provável. Como mencionado na Seção 2.1.2, a coalizão deve

priorizar ações sobre alguns eventos, sobre os quais possua força suficiente para

agir.

A seleção do cenário normativo, dos membros da coalizão, dos eventos

sobre os quais recairá o esforço de construção do futuro, as análises de força, do

custo e do tempo disponível são processos iterativos, conforme mostrado na

Figura 4.1.

Um cenário normativo exeqüível garante a existência de força política,

mas não de vontade política. A análise de exeqüibilidade considera que todos os

atores que ganham com a ocorrência do cenário normativo participam da coalizão;

no entanto, a confirmação somente poderá ocorrer após um processo de

negociação. Tal processo deve garantir a existência de vontade política para

atingir o cenário normativo; tal vontade é o ponto mais importante para viabilizar

a ocorrência do cenário normativo, e, no entanto, não é suficiente.

A questão seguinte a ser analisada é a questão técnica. Este exame,

abordando aspectos financeiros, tecnológicos e temporais, entre outros, deverá

verificar a viabilidade da ocorrência ou não de cada um dos eventos selecionados.

A análise de exeqüibilidade está pautada em uma confrontação de forças.

As envolvidas, bem como o sentido em que serão aplicadas, são calculadas com

base nos dados da consulta Delphi e em outros, obtidos pela inteligência

competitiva. Os algoritmos de cálculo utilizam as seguintes matrizes de dados:

• Matriz de probabilidades (M1);

• Matriz de impactos de eventos sobre atores (M2);

• Matriz de influência de atores sobre eventos (M3);

• Matriz de influência de atores sobre atores (M4).

A matriz M1 representa a probabilidade de ocorrência dos eventos. A

representação matemática M1= aj,j* é a probabilidade de ocorrência do evento “j”,

dados que o evento “j*” ocorreu, ou seja, P(j/j*). O valor de aj,j*, para j = j*,

representa a probabilidade de ocorrência, a priori, do evento “j”, ou seja, P(j).

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59

A matriz M1 deve ser lida como a probabilidade de ocorrência do evento

linha, dada a ocorrência do evento coluna, excerto quando evento linha e coluna

são iguais. A Tabela 4.2 é uma representação da matriz M1 para três eventos: a

probabilidade de ocorrência do evento 1, P(1) é de “0,3”, que corresponde ao

valor de a1,1. A probabilidade de ocorrência do evento 1, dado que o evento 2

tenha ocorrido, P(1/2) é “0,25”, correspondendo ao valor de a1,2, e a probabilidade

de ocorrência do evento 1, dado que o evento 3 tenha ocorrido, P(1/3) é “0,4”, que

corresponde ao valor de a1,3. A probabilidade de ocorrência do evento 2, P(2) é de

“0,85”, que corresponde ao valor de a2,2. A probabilidade de ocorrência do evento

2, dado que o evento 1 tenha ocorrido, P(2/1) é “0,7”, que corresponde ao valor de

a2,1, e assim por diante.

Tabela 4.2 – M1 – Matriz de probabilidades

Eventos 1 2 31 0.3 0.25 0.42 0.7 0.85 0.63 0.45 0.9 0.62

A M1 revela as relações de motricidade e dependência entre os eventos.

A motricidade é definida como a influência que a ocorrência de um evento exerce

sobre a probabilidade de ocorrência dos demais, e a dependência é a influência

sofrida pelo evento em função da ocorrência dos demais.

A motricidade e a dependência são calculadas em função dos impactos

causados pela ocorrência de um evento sobre a probabilidade de ocorrência dos

outros.

O impacto – como visto na Seção 4.4 – está atrelado ao conceito de

chance, que, diferentemente do conceito de probabilidade, é definido como a

razão entre o número de ocorrências favoráveis dividido pelo número de

ocorrências desfavoráveis.

O impacto, conforme pode ser observado na Equação 4.2, indica o

número de vezes pelo qual foi multiplicada, ou dividida, a chance de ocorrência

do evento. Um determinado evento “A”, com 30% de probabilidade de ocorrer,

que sofre um impacto de ordem 2, pela ocorrência de outro evento “B”, ficará

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60

com uma probabilidade condicional P(A/B) = 0,46 , calculada pela Equação 4.3:

( )( )

( ) ( )46,0

3,1

6,0

23,03,01

23,0

1/ ==

∗+−∗

=∗+−

∗=

BA

BA

IAPAP

IAPBAP

A chance de ocorrência do evento passa de 428,07,0

3,0= , para

857,054,0

46,0= .

Para facilitar a análise gráfica da relação “Motricidade X Dependência”,

os valores de impactos são convertidos para uma escala de - ∞ a + ∞ . O valor do

impacto será positivo para P(A/B) ≥ P(A), e negativo para P(A/B) < P(A), de

acordo com a seguinte formulação:

( )( )

( )( )jP

jP

jjP

jjPI

jj

−∗

−=

1

*/1

*/'

*

'1

* jjj II = para j

jj PP ≥

*

, e

*

*

*

1

jjj

j II −= para j

jj PP <

*

A motricidade será calculada pelo somatório do impacto causado pelo

referido evento nos demais:

Motricidade (j) =

∑=

=

1*

*

1* jj

nj

j

I para todo j* ≠ j.

A dependência é calculada de modo similar:

Dependência (j) =

∑=

=

1*

*

1* jj

nj

j

I para todo j ≠ j*.

A Figura 4.8 mostra o gráfico “Motricidade X Dependência”, com o

valor da motricidade no eixo das abscissas e o valor da dependência no eixo das

ordenadas. O gráfico é dividido em quatro quadrantes, representados os eventos

explicativos, autônomos, de ligação e resultado.

Segundo Marcial & Grumbach (2004), no primeiro quadrante estão os

(4.8)

(4.10)

(4.11)

(4.12)

(4.9)

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61

eventos com elevada motricidade e reduzida dependência, chamados de “eventos

explicativos”, pois condicionam o comportamento dos demais. No segundo

quadrante, os chamados eventos de ligação, que conectam os eventos explicativos

e os de resultado. No terceiro, aparecem os eventos autônomos, com pouca

motricidade e pouca dependência. Já no quarto quadrante, os eventos de resultado,

cujo comportamento pode ser explicado pelos eventos explicativos e de ligação.

Adaptado de Marcial & Grumbach (2004).

Figura 4.8 – Motricidade X Dependência

O gráfico “Motricidade x Dependência” fornece uma visão parcial do

comportamento dos eventos no cenário. Cenários formados por grande

concentração de eventos de ligação, com elevada incerteza, são instáveis, ao passo

que os eventos explicativos e de resultado induzem estabilidade aos cenários.

A matriz M2 representa o impacto que a ocorrência de cada evento

exerce sobre cada ator, com duas características: o módulo e a direção. O módulo

indica a importância do evento para o ator, enquanto a direção, o posicionamento

do ator em face da ocorrência do evento (sinais “+” para indicar que a ocorrência

do evento é desejada, sendo que o sinal “-” indica o oposto). O valor zero sinaliza

que o ator é indiferente à ocorrência do evento. A representação matemática

M2 = bk,j é o impacto que a ocorrência do evento “j” exerce sobre o ator “k”.

A Tabela 4.3 é uma representação da matriz M2 para três eventos e

quatro atores. A tabela está em uma escala de “0 a 2”; dessa forma, a ocorrência

do evento 1 é fortemente desejada pelo ator 1, o que corresponde ao valor de

b1,1 = 2, não desejada pelo ator 2, o que corresponde ao valor de b2,1 = -1,

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indiferente para o ator 3, o que corresponde ao valor de b3,1 = 0, e desejada pelo

ator 4, o que corresponde ao valor de b4,1 = 1.

O cenário ideal de cada ator corresponde ao sinal de seu vetor linha.

Desse modo, o cenário ideal do ator 1 é o sinal do vetor jb ,1 = (2,-1,1), ou seja,

je = (1,-1,1), ocorrência dos eventos 1 e 3 e não-ocorrência do evento 2.

Tabela 4.3 – M2 – Matriz de impacto de evento sobre ator

EventosAtores 1 2 3

1 2 -1 12 -1 2 -23 0 1 -14 1 2 0

O cálculo do valor de um cenário é obtido pela seguinte formulação:

( )∑=

×=n

jjijkki ebv

1,,,

Onde ki ,ν representa o valor do cenário “i” para o ator “k”. O valor do

cenário “3” para o ator “1”, calculado em função dos valores da Tabelas 4.1 e 4.3,

será:

( ) ( ) ( ) ( ) 41111123

1,3,11,3

=×+−×−+×=×=∑=j

jj ebv

O valor do ganho é obtido pela diferença entre o valor deste cenário e o

valor do cenário mais provável. O valor do cenário mais provável, como

argumentado anteriormente, é o valor de referência, aquele que será obtido pelo

ator 1 caso mantenha sua estratégia atual. Para exemplificar, suponhamos que o

cenário mais provável seja o cenário “1”; dessa forma, seu valor para o ator “1”

será:

(4.13)

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( ) ( ) ( ) ( ) 21111123

1,1,11,1

=×+×−+×=×=∑=j

jj ebv

A construção do futuro, escolhido o cenário “3” como cenário normativo,

e tendo o cenário “1” como cenário mais provável, representa, para o ator “1”, um

ganho de 21,11,3 =−νν .

O propósito da construção do futuro, do ponto de vista matemático, deve

ser a maximização da função de ganho, assim definida:

( ) ( )kikiki NNg,,, *νν −=

Onde iN representa o cenário normativo e i*, o cenário mais provável.

A matriz M3 denota o grau de influência que cada ator pode exercer

sobre cada evento (para a sua ocorrência ou não). Essa influência é chamada de

“ação direta”, e está relacionada à aplicação de força diretamente sobre o evento.

A representação matemática M3= cj,k é a influência que o ator “k” pode exercer no

evento “j”.

Tabela 4.4 – M3 – Matriz de impacto de ator sobre evento

AtoresEventos 1 2 3 4

1 1 0 1 22 1 1 0 13 2 1 1 0

A Tabela 4.4 é uma representação da matriz M3 para três eventos e

quatro atores. A tabela está em uma escala de “0” a “2”; dessa forma, o ator 1

pode exercer alguma influência sobre a ocorrência do evento 1, o que corresponde

ao valor de c1,1 = 1, o ator 2 não pode exercer qualquer influência sobre a

ocorrência do evento 1, o que equivale ao valor de c1,2 = 0, o ator 3 pode exercer

alguma influência sobre a ocorrência do evento 1, o que corresponde ao valor de

c1,3 = 1, e o ator 4 pode exercer muita influência sobre a ocorrência do evento 1, o

que se correlaciona ao valor de c1,4 = 2.

(4.14)

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64

O gráfico mostrado na Figura 4.9, chamado de matriz “Influência x

Impacto”, permite a análise conjunta das matrizes M2 e M3. O valor da influência

(cj,k) está no eixo das abscissas e o valor do impacto (bj,k), no eixo das ordenadas.

O gráfico pode ser montado evento a evento, ou, de forma holística, pode

considerar o somatório de todas as influências e impactos relativos a cada ator, em

todos os eventos do cenário. O gráfico está dividido em quatro quadrantes: Juízes,

Jogadores, Platéia e Apostadores.

Os juízes são muito influentes, porém pouco impactados pelos eventos,

além de serem normalmente órgãos normativos, cuja participação na coalizão é

pouco comum. O acompanhamento da postura estratégica dos juízes, por outro

lado, é fundamental, pois pode indicar mudanças significativas no ambiente.

Os jogadores são muito influentes e muito impactados pelos eventos.

Estes são os atores prioritários para participar da coalizão, pois, em geral, têm

muito a ganhar ou a perder com a ocorrência dos eventos. Por outro lado, dada a

sua capacidade de atuação sobre a ocorrência, ou não, dos eventos, podem

efetivamente introduzir as rupturas de tendências necessárias para construir o

futuro.

Os outros dois tipos de atores, platéia e apostadores, podem ser incluídos

na coalizão, todavia têm pouco a influir nos eventos. A inclusão dos apostadores é

mais fácil, pois são fortemente impactados pelos eventos:

Adaptado de Godet (1995)

Figura 4.9 – Influência X Impacto

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A matriz M4 representa o grau de influência de um ator sobre outro ator.

Esta influência é chamada de ação indireta, e está relacionada à aplicação do

poder de dissuasão de um ator sobre outro. A representação matemática M4 =

dk1,k2 é a influência que o ator “k1” pode exercer sobre o ator “k2”.

Tabela 4.5 – M4 – Matriz de impacto de ator sobre ator

AtoresAtores 1 2 3 4

1 1 1 22 1 0 13 0 1 04 0 1 1

A Tabela 4.5 é uma representação da matriz M4 para quatro atores. A

tabela está em uma escala de “0 a 2”; dessa forma, o ator 1 não pode exercer

qualquer influência sobre o ator 3, o que corresponde ao valor de d3,1 = 0, ao passo

que o ator 4 pode exercer muita influência sobre o ator 1, o que equivale ao valor

de d1,4 = 2.

Os atores utilizarão sua influência sobre os eventos sempre no sentido de

atingir o cenário ideal, conforme mostrado na Figura 4.5. No cenário ideal de cada

ator, ocorrem todos os eventos desejados (sinal positivo na matriz M2) e não

ocorrem os eventos indesejados (sinal negativo na matriz M2).

O sentido do emprego da influência sobre os eventos (matriz M3), em

tese, será idêntico ao sinal da matriz M2, e o poder de dissuasão (matriz M4)

somente será empregado em casos especiais.

Para facilitar o cálculo da confrontação de forças, foi construída a matriz

M6, representando o sentido final de aplicação de forças. Esta matriz é uma matriz

M3 alterada pelo sinal da matriz M2 e pela aplicação de ação de dissuasão (matriz

M4). A representação matemática M6= fj,k é a influência que o ator “k” irá exercer

sobre o evento “j”. Portanto:

kjkj cf ,, = para 0, >kjb ;

kjkj cf ,, −= para 0, <kjb , e

(4.15)

(4.16)

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66

0, =kjf para 0, =kjb .

A existência de uma coalizão altera o sinal da matriz M2. Todos os atores

da coalizão assumem como cenário ideal o cenário normativo “iN”, e passam a

atuar como um “superator”, conforme mostrado na Figura 4.7, ou seja:

kjkj bb ,*, = para todo k ∈ coalizão onde

ji Ne

, e kjb , tem o mesmo sinal, e

kjkj bb ,*, −= para todo k ∈ coalizão onde

ji Ne

, e kjb , têm sinais contrários.

O valor de *,kjb representa a nova postura estratégica do ator “k” no

evento “j” em função de sua participação na coalizão.

A construção do futuro pelo ator 1 (utilizados os valores das Tabelas 4.1,

4.3 e 4.4), selecionado o cenário 3 como cenário normativo, fará com que a

aplicação de força seja no seguinte sentido:

( )1,1,21, −=jb , ( )1,1,1,3 −=je e ( )2,1,1,1 =jc .

Nesse caso, ( )1,1,2*1, −=jb indica que o ator 1 não mudará sua estratégia

inicial. Este fato ocorre quando o cenário normativo selecionado é o cenário ideal

do ator. O valor da matriz M6, portanto, será: ( )2,1,11, −=jf .

O ator 1, nessa hipótese, empregará pouca influência para a ocorrência do

evento 1 (f1,1 = 1), pouca influência para a não-ocorrência do evento 2 (f2,1 = -1) e

muita influência para a ocorrência do evento 3 (f3,1 = 2).

A construção do futuro pelo ator 4, selecionado o cenário 3 como cenário

normativo, fará com que a aplicação de força seja no seguinte sentido:

( )0,2,14, =jb , ( )1,1,1,3 −=je e ( )0,1,2,4 =jc .

Assim, ( )0,2,1*4, −=jb indica que o ator 4 mudará sua estratégia inicial

(4.17)

(4.18)

(4.19)

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com relação ao evento 2, passando a desejar fortemente que não ocorra. O valor

da matriz M6, portanto, será: ( )0,1,24, −=jf .

O ator 4, desse modo, empregará muita influência para a ocorrência do

evento 1 (f4,1 =2), pouca influência para a não-ocorrência do evento 2 (f4,2 =-1) e

nenhuma influência sobre o evento 3 (f4,3 =0).

A resultante das forças aplicadas a um determinado evento será o

somatório das forças aplicadas por todos os atores, ou seja:

∑=

=m

kkjj fr

1,

Onde jr representa a resultante de forças aplicadas sobre o evento “j”.

Um determinado evento, para ocorrer, deverá ter uma resultante positiva,

e, para não ocorrer, deverá ter uma resultante negativa. Portanto, o evento será

exeqüível, em um determinado cenário “i”, se:

0≥jr , para todo 0, >jie , e

0≤jr , para todo 0, <jie .

A condição ampla para que um cenário normativo seja exeqüível é que a

coalizão tenha força suficiente para garantir a exeqüibilidade a todos os eventos,

neste cenário. Todavia, conforme argumentado na Seção 1.4, em situações reais

dificilmente haverá tempo e recursos disponíveis para uma atuação exaustiva

sobre todos os pontos que podem conduzir ao futuro normativo. Por outro lado, a

atuação exaustiva não é necessária, tendo em vista que os eventos não são

independentes e que os cenários formam uma partição. A ação sobre alguns

eventos pode ser suficiente para transformar o cenário normativo em cenário mais

provável. A simulação condicional é utilizada para definir esses eventos e para

avaliar as conseqüências de suas ocorrências sobre o cenário normativo.

(4.20)

(4.21)

(4.22)

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4.6 SIMULAÇÃO CONDICIONAL

A simulação com ocorrência condicional de eventos utiliza o mesmo

algoritmo da simulação Monte Carlo, apresentado na Seção 4.1. Os eventos que

deverão ocorrer condicionalmente serão designados por eventos normativos “jN”,

sendo que sua probabilidade de ocorrência, na linha ja da matriz M1, será

substituída por “1”, indicando que o evento ocorrerá em 100% das simulações de

futuro.

A condição necessária para que ocorra uma ruptura de tendências em

direção ao cenário normativo, conforme representada na Figura 2.6, é que a

simulação condicional da ocorrência dos eventos selecionados indique que o

cenário normativo é o novo cenário mais provável.

4.7 SELEÇÃO DO CENÁRIO NORMATIVO

A seleção do cenário normativo “iN”, do ponto de vista do ator “k”, pode

ser obtida pela maximização da função de ganho, definida na Seção 4.5,

observando-se as restrições definidas nas Seções 4.5 e 4.6, da seguinte forma:

Max

×−

×= ∑∑

==

n

jjijk

n

jjijkki ebebG

1,,

1,,, *

s.a Njr > 0, para todo NN ji

e, = 1

iiPPN > para qualquer cenário “i”.

A função de maximização garante que o ganho, para a organização que

conduz o estudo, será máximo. A função compara o valor do cenário mais

provável “i*” com os outros cenários “i” candidatos a cenário normativo.

A primeira restrição garante que a coalizão possui força suficiente para

impor a ocorrência dos eventos normativos. Tais eventos produzem as rupturas de

tendências necessárias para transformar o cenário normativo em cenário mais

(4.23)

(4.24)

(4.25)

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provável. Já a segunda restrição garante que o cenário normativo é o novo cenário

mais provável.

Existem outras funções de tomada de decisão além da maximização do

ganho; todavia, as restrições permanecem as mesmas. O Lince, conforme

apresentado no Capítulo 5, pode ordenar os cenários pelos critérios de

maximização do ganho, maximização do número de atores na coalizão e

minimização do risco e custo.

O primeiro utiliza a Equação 4.23. O segundo considera o número de

atores que também ganham com a ocorrência do cenário normativo, e que, em

tese, têm interesse em participar da coalizão. O terceiro critério ordena os cenários

por probabilidade e ocorrência e, portanto, do menor para o maior risco.

O risco e o custo do cenário normativo aumentam com a redução de sua

probabilidade de ocorrência. Dessa maneira, quanto menor a probabilidade de

ocorrência de um cenário, maior a quantidade de ações necessárias para

transformá-lo em cenário mais provável. Cada ação a ser implementada representa

um custo e um risco; logo, quanto maior a quantidade de ações necessárias,

maiores o custo e o risco. Ressalta-se que este último está associado à eficácia das

ações propostas.

A escolha dos eventos normativos “jN” pode seguir, também, outros

critérios quantitativos e qualitativos. No caso do projeto “Brasil 3 Tempos”,

apresentado no Capítulo 6, o Núcleo de Assuntos Estratégicos da Presidência da

República (2006c), além de utilizar ferramentas de Apoio Multicritério à Decisão,

realizou uma consulta pública, dentro do conceito de Foresight, apresentado três

cenários previamente selecionados.

O primeiro, chamado de “Cenário econômico”, priorizou os “temas

relacionados ao desenvolvimento econômico e a seus reflexos no ambiente de

negócios”; o segundo, “Cenário de inclusão social”, enfatizou a “dimensão

humana, tendo o conhecimento como foco estrutural e inovador”; e o terceiro,

“Cenário de expectativa da sociedade”, priorizou os “temas mais importantes e

mais desejados pela própria sociedade”.

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70

4.8 ACOMPANHAMENTO E CORREÇÕES

O resultado das ações adotadas pela coalizão deve ser acompanhado após

a sua implementação. O acompanhamento consiste em observar o ambiente,

verificar a existência de fatos concretos, indicativos de mudanças na probabilidade

de ocorrência dos eventos. A cada fato novo observado, será emitido um

julgamento de valor sobre a probabilidade de ocorrência de cada um dos eventos,

o que altera a matriz de probabilidades M1.

A simulação dos cenários prospectivos, com a nova matriz M1, deverá

indicar um aumento na probabilidade de ocorrência do cenário normativo. Nessa

hipótese, a construção do futuro mostrar-se-á efetiva e, as medidas adotadas,

eficazes. Caso contrário, todo processo de construção do futuro deverá ser revisto,

inclusive a escolha do cenário normativo. Este último caso pode ocorrer não por

deficiência das ações adotadas, mas pela ocorrência de fatos fora da esfera de

atuação da coalizão.

Os fatos poderão indicar, também, uma mudança na estratégia dos atores,

bem como sua capacidade de atuar sobre o ambiente. Esses fatos alteram as

matrizes M2, M3 ou M4. Nesse caso, a exeqüibilidade do cenário normativo deve

ser verificada e validada novamente.

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71

5. DESENVOLVIMENTO DE SOFTWARE

Como resultado dos trabalhos de pesquisa e dos desenvolvidos que

culminaram com esta tese, procedeu-se ao aperfeiçoamento nos algoritmos do

software Puma e desenvolveu-se o software Lince.

Conforme mencionado na seção 1.5, o Puma está focado no

planejamento estratégico com base no cenário mais provável, ao passo que o

Lince está focado do cenário normativo.

O Puma teve sua origem nos estudos de prospectiva, efetuados por Raul

Grumbach, que criou o método Grumbach. O Lince foi desenvolvido quando da

solicitação do Núcleo de Assuntos Estratégicos da Presidência da República para

que fosse desenvolvido um software, integrando os conceitos de cenários

prospectivos e interações estratégicas, a fim de ser empregado no projeto “Brasil 3

Tempos”.

Os trabalhos de pesquisa para o desenvolvimento do Lince mostraram a

necessidade de alterações em alguns algoritmos utilizados no Puma, o que ocorreu

na versão Puma 4.0. No entanto, os dois softwares, por razões diversas, estão

referidos ao método Grumbach.

Os dois softwares: o Puma (Sistema de Planejamento Estratégico e

Cenários Prospectivos) e o Lince (Sistema de Simulação e Gestão de Futuro)

informatizam as seguintes fases da metodologia, de acordo com a Figura 4.1:

1. Identificação do Sistema (Puma);

2. Diagnóstico Estratégico (Puma);

3. Análise Prospectiva:

3.1. Visão de Futuro (Puma) / Simulação e Gestão de Futuro (Lince); e

3.2. Avaliação de Medidas e Gestão de Resistências (Puma);

4. Consolidação (Puma);

5. Monitoramento (Lince).

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72

O software Puma apresenta ainda uma fase chamada de “visão do

presente”, em que são analisadas as médias de curto prazo, frutos do diagnostico

estratégico, e não relacionadas com os cenários prospectivos.

O início de qualquer estudo ocorre no Puma, onde são gerados os

cenários. O Lince acrescenta as informações de inteligência competitiva e permite

a simulação condicional de ocorrência de eventos.

O cenário normativo e as ações necessárias para atingi-lo, obtidos no

Lince, são migrados para o Puma, onde são confrontados com as ações de curto

prazo. Todas as medidas previstas deverão passar por uma fase de análise, onde,

entre outros critérios, residem os valores que norteiam a organização.

A Figura 5.1 mostra as fases informatizadas no Puma, e a Figura 5.2, seu

complemento, informatizadas no Lince.

Figura 5.1 – Fases e etapas informatizadas no software Puma

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73

Figura 5.2 – Etapa informatizada no software Lince

As fases informatizadas no Lince estão subdivididas em cinco passos,

mostrados na Figura 5.2. São eles:

1. Inteligência Competitiva;

2. Dinâmica dos Cenários;

3. Teoria dos Jogos;

4. Cones de Futuros; e

5. Interpretação da Dinâmica dos Cenários.

Cada uma das fases possui os seguintes recursos:

• Inteligência Competitiva – Permite o cadastramento de Eventos, Atores e

das matrizes M1, M2, M3 e M4. Permite também a avaliação de fatos novos e as

alterações das probabilidades de ocorrência de eventos, ou das estratégias de

atores.

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74

• Dinâmica dos Cenários – Recalcula a probabilidade de ocorrência dos

Cenários, em função das eventuais alterações das probabilidades dos Eventos

efetuadas na Fase anterior.

• Teoria dos Jogos – Permite a seleção do cenário normativo, bem como

efetua a análise de exeqüibilidade. Os cenários podem ser ordenados em função

dos critérios de maximização do ganho, maximização do número de atores na

coalizão, ou minimização de risco e custo. A análise de exeqüibilidade verifica a

primeira restrição apresentada na Seção 4.7.

• Cones de Futuros – Permite a simulação da ocorrência condicional de

eventos, cujo propósito é verificar a segunda restrição apresentada na Seção 4.7.

• Interpretação da Dinâmica dos Cenários – Permite verificar a redução das

ameaças e o aumento das oportunidades. Esta condição indica que a construção do

futuro está sendo eficaz.

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75

6. APLICAÇÕES DA METODOLOGIA

Neste capítulo, apresentam-se duas aplicações da metodologia. A

primeira é o projeto “Brasil 3 Tempos”, desenvolvido pelo Núcleo de Assuntos

Estratégicos da Presidência da República, e o segundo, um projeto desenvolvido

para a Mauatur, conduzido pelo Conselho Gestor para a micro bacia hidrográfica

do alto Rio Preto.

A primeira aplicação foi escolhida pela relevância do estudo. Contudo,

estão sendo apresentados apenas os dados disponíveis na Internet, excluindo-se,

dessa forma, qualquer dado considerado confidencial.

A segunda aplicação foi escolhida pela quantidade de dados não-

confidenciais disponíveis, o que permite caminhar por todos os passos da

metodologia.

A metodologia foi aplicada também a um conglomerado de empresas do

sul do Brasil, e está sendo aplicada pelo Estado-Maior do Exército, todavia não

foram selecionadas, em função da quantidade de dados confidenciais.

6.1 PROJETO BRASIL 3 TEMPOS

O Projeto “Brasil 3 Tempos”, de acordo com o Núcleo de Assuntos

Estratégicos da Presidência da República (2004), está centrado na análise das

potencialidades estratégicas do país, buscando identificar áreas e metas a serem

priorizadas e os atores sociais capazes de implementá-las.

O Projeto também utiliza outras metodologias e softwares, além dos

apresentados nesta tese. No caso da consulta Delphi, utilizou software próprio

para consulta via internet; no processo decisório, recorre a diversos conceitos de

foresight e ferramentas de Apoio Multicritério à Decisão.

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76

6.1.1 Identificação do sistema

O sistema, indicado pelo próprio nome do projeto, é o Brasil, em todas as

suas dimensões.

Segundo o Núcleo de Assuntos Estratégicos da Presidência da República

(2004), o horizonte em três “marcos tem o seguinte significado: em 2007, inicia-

se um novo mandato de governo, em 2015 haverá a Conferência Mundial sobre os

Desafios do Milênio e, em 2022, o Brasil comemora seus duzentos anos de

independência”.

6.1.2 Diagnóstico estratégico

O diagnóstico estratégico, envolvendo análises conjunturais,

retrospectivas e prospectivas, foi subdividido nas dimensões institucional,

econômica, sociocultural, territorial, do conhecimento, ambiental e global. O

resultado dessa análise foi um conjunto de mais de 1.300 fatos portadores de

futuro.

O estudo das dimensões foi atribuído aos seguintes grupos acadêmicos:

Instituto de Estudos Avançados, da Universidade de São Paulo (IEA/USP);

Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada, do Ministério do Planejamento

(IPEA/MPOG); Fundação da Escola Superior de Guerra (ESG), no Rio de

Janeiro; Universidade Federal da Bahia (UFBA); Coordenação dos Programas de

Pós-graduação de Engenharia, da Universidade Federal do Rio de Janeiro

(COPPE/UFRJ); Centro de Desenvolvimento Sustentável, da Universidade de

Brasília (CDS/UNB); e Instituto Universitário de Pesquisas do Rio de Janeiro, da

Universidade Cândido Mendes (IUPERJ/UCAM).

6.1.3 Análise prospectiva

A consolidação dos fatos portadores de futuro em temas estratégicos

culminou na seleção dos 50 temas apresentados no Anexo 1. Cada um dos temas

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77

foi transformado em variável binária, de acordo com a Figura 4.2, para os

horizontes temporais de 2015 e 2022.

A consulta foi realizada pela Internet com 50 mil participantes

previamente selecionados, aos quais foram propostas cinco perguntas para cada

tema estratégico, totalizando 250 perguntas (Probabilidade de o evento ocorrer até

2015; probabilidade de ocorrer até 2022; importância do evento para o Brasil;

conhecimento do entrevistado sobre o tema; e desejabilidade do tema).

O propósito da pergunta sobre desejabilidade foi preencher a matriz M2,

conforme definida no Capítulo 5, para o ator “sociedade”. A escala foi, também,

de -2 a +2, conforme mostrado na Tabela 4.3.

Os valores médios das respostas da consulta Delphi estão na Tabela 6.1.

A grande quantidade de eventos com probabilidades de ocorrência próximas de

0,5 (50%) evidencia uma grande incerteza quanto ao futuro, conforme mostrado

na Figura 4.4.

Todos os temas foram considerados importantes para o Brasil. O menor

valor foi 5,42, referente ao tema “ações afirmativas de inclusão social”, e o maior

valor, 8,75 referente ao tema “qualidade do ensino”.

O nível de conhecimento dos respondestes também foi elevado. O menor

valor foi de 4,91 referente ao tema “nanotecnologia”, sendo que o maior foi o

tema “agricultura e pecuária” com 8,07.

Tabela 6.1 – Respostas da consulta Delphi

TemaEstratégico

Qual aprobabilidadedeste eventoocorreraté 2015?( 0% a 100% )

Qual aprobabilidadedeste eventoocorreraté 2022?( 0% a 100%)

Qual aimportânciadeste temapara o Brasil?

( 1 a 9 )

Qual seu nívelde conhecimentosobre este tema?

( 1 a 9)

Para o Brasil,este evento,caso ocorra,será:

( -2 a +2 )

Inclusão Digital 50,53 61,13 7,58 6,93 1,56NormalidadeConstitucional

74,71 78,46 8,37 7,33 1,63

Carga Tributária 36,90 46,59 8,35 6,87 1,72Sistema IndustrialTecnológico e deComércio Exterior

52,72 62,28 8,03 6,37 1,63

Recursos do Mar 46,35 56,78 7,56 5,59 1,48

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78

Sistema Único de Saúde(Sus)

41,67 51,60 8,401 6,58 1,78

Infra-estrutura 46,26 54,63 8,37 6,60 1,76Tecnologias deInformação eComunicação (TICs)

49,48 58,54 7,61 6,19 1,50

Biodiversidade 42,92 53,22 8,09 6,31 1,67Bloco político-econômico da Américado Sul

44,20 54,40 7,20 6,44 1,28

Estrutura Tributária 41,90 52,95 8,34 6,58 1,74Agricultura e Pecuária 54,21 65,40 8,07 8,07 1,68Ações Afirmativas deInclusão Social

30,47 36,16 5,42 6,57 0,57

Uso e Conservação daÁgua Doce

43,83 55,57 7,93 6,40 -0,72

Diversidade CulturalBrasileira

51,61 61,74 6,84 6,09 1,38

Qualidade do Ensino 31,12 40,14 8,75 7,31 1,89Biotecnologia 48,20 59,38 8,10 5,88 1,69Protocolo de Quioto 49,26 58,31 7,20 5,58 1,36Sistema Político-Partidário

34,73 44,36 7,94 6,82 1,60

Bloco Político-Econômico doMercosul

42,00 53,35 7,25 6,61 1,34

Sistema Judiciário 33,49 44,00 8,29 6,49 1,76Brasil, Rússia, Índia eChina

37,00 48,13 7,19 6,17 1,40

Taxa de Investimento 41,77 51,25 8,29 6,26 1,74Sistema Previdenciário 29,94 39,39 8,18 6,66 1,67Contas Públicas 37,65 45,01 8,19 6,36 1,70Violência eCriminalidade

29,76 39,45 8,54 6,95 1,86

Educação Básica 46,35 58,16 8,68 7,07 1,88Nível de Emprego 39,55 48,98 8,48 6,68 1,80Entes Federados 36,32 45,76 6,58 5,58 1,12Amazônia 41,98 53,29 8,21 6,82 1,66Controle da Inflação 60,85 69,35 8,30 6,90 1,75Organização dasNações Unidas (ONU)

43,49 54,30 6,66 6,09 1,18

ProgramasTecnológicos em ÁreasSensíveis

37,92 49,07 7,39 5,78 1,44

Despesas Correntes 36,68 46,21 8,28 6,80 1,71Ensino Superior 41,63 51,45 7,97 7,19 1,62

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79

DesigualdadesRegionais

45,29 45,29 7,81 6,59 1,62

Sistema de DefesaNacional

36,50 45,94 7,09 6,45 1,27

Desigualdade Social 30,60 40,31 8,48 7,15 1,81Nanotecnologia 33,43 43,98 7,15 4,91 1,39Investimentos emCiência, Tecnologia eInovação.

42,79 51,71 8,32 6,60 1,75

Ordenamento MundialEmergente

49,19 62,14 7,04 6,38 0,81

Relações Trabalhistas 50,85 62,54 7,64 6,56 1,29Qualidade da VidaUrbana

30,54 40,74 8,01 6,51 1,66

Bloco Político-Econômico noContinente Americano

35,81 45,28 6,69 6,37 0,86

Ordenamento doTerritório Brasileiro

28,65 37,91 6,22 6,00 0,84

Exportações Brasileiras 58,12 66,79 8,20 6,51 1,73Matriz Brasileira deCombustíveis

53,86 64,49 7,96 6,20 1,61

Mercosul e UniãoEuropéia (EU)

41,74 52,34 7,37 6,27 1,41

Conselho de Segurançadas Nações Unidas(CSNU)

47,85 58,00 6,38 6,54 1,06

Perfil Etário daPopulação

34,50 43,84 8,13 6,39 1,66

Fonte: Núcleo de Assuntos Estratégicos da Presidência da República (2006b)

A estimativa dos valores das probabilidades condicionais de ocorrência

de eventos foi proposta a um grupo selecionado pelo NAE, fora da consulta

Delphi realizada pela Internet. O algoritmo utilizado foi diferente do previsto na

Seção 4.4. A estimativa do impacto que a ocorrência de um evento causa na

probabilidade de ocorrência dos demais foi proposta diretamente para o grupo. A

escala utilizada foi de -5 a +5, com o primeiro valor indicando que a ocorrência de

um evento reduz significativamente a probabilidade de ocorrência do outro, e o

segundo indicando que aumenta muito essa probabilidade. O cálculo da

probabilidade condicional P(A/B) foi feito pela equação 6.1.

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80

( ) ( ) ( ) ( )( )

×−×+=

51/ B

AIAPAPAPBAP

Onde P(A) é a probabilidade de ocorrência do evento “A” (probabilidade

a priori), P(A/B) é a probabilidade de ocorrência do evento “A”, dado que o

evento “B” ocorreu (Probabilidade a posteriori), e IA/B é o impacto que a

ocorrência do evento “B” causa na probabilidade de ocorrência do evento “A”, em

uma escala de +5 a -5.

As duas formulações, Equações 4.3 e 6.1, apresentam resultados

similares para eventos impactantes (“B”) com probabilidade de ocorrência

superior a 30%.

Segundo o Núcleo de Assuntos Estratégicos da Presidência da República

(2006a), o cenário mais provável apresentou uma probabilidade de ocorrência de

apenas 0,12%. Além disso,

todos os demais cenários, que ultrapassam um quatrilhão depossibilidades, também apresentam uma probabilidade de ocorrênciainferior a 0,1%. Portanto, bastarão pequenas alterações na conjuntura,para que as possibilidades de alternância dos outros cenários ocorram.A resultante final será uma permanente incerteza com o futuro que seformará.

A constatação de que o futuro apresenta elevada incerteza abriu caminho

para mudanças. A mudança, em direção ao cenário normativo, foi fundamentada

na definição do cenário ideal, utilizando as informações de grau de importância e

desejabilidade, obtidos na consulta Delphi.

Por sua vez, o cenário normativo, chamado pelo NAE de “cenário-foco”,

foi “definido em função do pragmatismo das ações que devem ser implementadas

em decorrência de critérios priorizados para a sua elaboração” (NÚCLEO DE

ASSUNTOS ESTRATÉGICOS DA PRESIDÊNCIA DA REPÚBLICA, 2006d).

O cenário ideal, com base na consulta Delphi, pelo critério de

desejabilidade, conforme mostrado na Seção 4.4, é obtido pela última coluna da

Tabela 6.1. Nesse cenário, não ocorre o evento conflito pelo “Uso e Conservação

da Água Doce”, e ocorrem todos os demais.

(6.1)

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81

6.1.4 Avaliação das ações

A simulação condicional da ocorrência de dez eventos elevou a

probabilidade de ocorrência do cenário normativo em trezentas vezes, atingindo o

valor de 33%, de acordo com o Núcleo de Assuntos Estratégicos da Presidência

da República (2006a). Este valor torna-se expressivo pela característica de

partição apresentada pelo conjunto dos cenários prospectivos.

Ainda segundo o Núcleo de Assuntos Estratégicos da Presidência da

República (2206d), um dos propósitos alcançados foi a constatação de que

emergiram, ao longo dessas simulações e dentre os cinqüenta temasselecionados como estratégicos, as seguintes questões como cruciaispara o futuro do País: qualidade do ensino, educação básica, violênciae criminalidade, desigualdade social e nível de emprego.

A seleção dos eventos normativos, “jN”, conforme citado na Seção 4.7 e

proposto na Seção 4.6, utilizou ferramentas de Apoio Multicritério à Decisão,

além da consulta pública, efetuada pelo NAE em novembro de 2006. A consulta

propõe três cenários: o Cenário Econômico, o Cenário de Inclusão Social, ou o

Cenário de Expectativa da Sociedade.

O Cenário Econômico, segundo o Núcleo de Assuntos Estratégicos da

Presidência da República (2006c), prioriza os temas relacionados com o

desenvolvimento econômico e seus reflexos no ambiente de negócios. Esta linha

de ação é composta de 11 eventos normativos, associados aos seguintes temas:

Agricultura e pecuária, Carga tributária, Contas públicas, Controle da inflação,

Despesas correntes, Estrutura tributária, Exportações brasileiras, Infra-estrutura,

Relações trabalhistas, Sistema industrial, tecnológico e de comércio exterior e

Taxa de investimento.

O Cenário de Inclusão Social, segundo a mesma fonte, prioriza a

dimensão humana, tendo o conhecimento como foco estrutural e inovador. Esta

linha de ação é composta de 15 eventos normativos, associados aos seguintes

temas: Ações afirmativas de inclusão social, Desigualdade social, Diversidade

cultural brasileira, Educação básica, Ensino superior, Inclusão digital,

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Investimentos em ciência, tecnologia e inovação, Nível de emprego, Perfil etário

da população, Programas tecnológicos em áreas sensíveis, Qualidade da vida

urbana, Qualidade do ensino, Sistema previdenciário, Sistema Único de Saúde

(SUS) e Violência e criminalidade.

O Cenário de Expectativa da Sociedade, segundo a mesma fonte, prioriza

os temas mais importantes e desejados pela própria sociedade. Esta linha de ação

é composta de 22 eventos normativos, associados aos seguintes temas: Amazônia,

Biodiversidade, Biotecnologia, Carga tributária, Contas públicas, Controle da

inflação, Desigualdade social, Despesas correntes, Educação básica, Estrutura

tributária, Exportações brasileiras, Infra-estrutura, Investimentos em C T & I,

Nível de emprego, Normalidade constitucional, Perfil etário da população,

Qualidade do ensino, Sistema judiciário, Sistema previdenciário, Sistema Único

de Saúde (SUS), Taxa de investimento e Violência e criminalidade.

O resultado parcial do projeto “Brasil 3 Tempos”, que está em

andamento, foi a verificação de que a construção do futuro é possível. Segundo o

Núcleo de Assuntos Estratégicos da Presidência da República (2006a),

O principal benefício da seleção de uma alternativa para a construçãode nosso futuro não reside apenas no aumento da sua probabilidade deocorrência, mas também, na redução da incerteza. Entre os mais deum quatrilhão de possibilidades de combinações possíveis, apenas 10cenários possuem mais de 1% de probabilidade de ocorrência, isto é,com pequeno monitoramento da conjuntura, é possível reduzir,significativamente, as incertezas do futuro e permitir ao Brasilconstruir o futuro que mais deseja.

Conforme argumentado na seção1, a utilização da incerteza como a fonte

de oportunidades, abre espaço para a construção de um futuro melhor para o

Brasil, obtido, justamente, pela redução da incerteza.

6.2 PROJETO MAUATUR

Os dados do projeto Mauatur foram fornecidos pelo coordenador

executivo3 do Conselho Gestor para a micro bacia hidrográfica do alto Rio Preto,

3 Sérgio Wright Maia

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83

sendo que alguns estão disponíveis nos sites da Mauatur4 e da Crescente Fértil5.

A Mauatur é uma entidade sem fins lucrativos que tem como principal

objetivo representar os comerciantes da região de Visconde de Mauá perante os

órgãos governamentais, a mídia e outras entidades congêneres.

Considerando a necessidade de estabelecer seu Planejamento

Estratégico, a Mauatur elaborou um Projeto de Desenvolvimento Turístico para a

região de Visconde de Mauá, com base na metodologia descrita nesta tese. Foram

empregados os softwares Puma (Sistema de Planejamento Estratégico e Cenários

Prospectivos) e o Lince (Sistema de Apoio à Decisão).

O Projeto tem como propósito indicar as estratégias da Mauatur para:

• aumentar o rendimento dos estabelecimentos locais, cujas atividades

estão voltadas à exploração da atividade turística, a partir do potencial da região.

• aumentar o fluxo turístico de maior renda, ou de nichos específicos

como os de terceira idade.

• garantir a sustentabilidade do aumento de fluxo, com foco nos aspectos

ambientais e socioeconômicos, de modo que não haja depreciação dos atrativos

turísticos de Visconde de Mauá.

O potencial turístico, que hoje se baseia principalmente no patrimônio

ecológico e na oferta de atrações gastronômicas, deve ser transformado, em

função dos grandes desafios dos próximos 5 anos, permitindo atrair um turismo de

melhor qualidade.

6.2.1 Identificação do sistema

A Mauatur foi fundada em 25 de fevereiro de 1986 a partir da

necessidade dos hoteleiros e comerciantes locais em ter representação junto aos

órgãos municipais, estaduais e federais nas áreas afetas à condição de pólo

turístico, na manutenção do acesso rodoviário e de políticas publicas para a

região.

4 Mauatur - http://www.viscondedemaua.org.br/ ; http://www.mauatur.com.br/5 Crescente Fértil - http://www.crescentefertil.org.br/

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84

Até 1989, a região de Visconde de Mauá situava-se em dois estados (MG

e RJ) e em dois municípios (Resende e Bocaina de Minas). Em 1989, o município

de Itatiaia foi emancipado e desmembrado de Resende. Esse novo município

incluiu a região de Maringá e Maromba, fazendo com que a região passasse a ser

administrada por três municípios. Tal fato aumentou consideravelmente os

problemas e a escassez de políticas públicas já enfrentadas pela região de

Visconde de Mauá, reforçando a necessidade de uma associação representativa na

região.

A Figura 6.1 mostra a interligação das diversas atividades desenvolvidas

pela Mauatur, com ênfase na divulgação da região.

Figura 6.1 – Atividades da Mauatur

6.2.1.1 Dados fundamentais da Mauatur

6.2.1.1.1 Negócio

Desenvolvimento turístico da Região de Visconde de Mauá.

6.2.1.1.2 Missão

Representar e congregar todos os comerciantes da região perante os

órgãos governamentais, a mídia e outras entidades congêneres, por meio de

convênios com entidades privadas e públicas, além de suas próprias ações, com a

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85

finalidade de aumentar o fluxo turístico da região.

6.2.1.1.3 Visão

Contribuir e efetivamente influir para que a região seja reconhecida como

exemplo de preservação ecológica e também por oferecer uma infra-estrutura

turística, primando por um atendimento profissional diferenciado pelo charme e

pela hospitalidade.

6.2.1.1.4 Objetivos estratégicos

• Desenvolvimento sustentado da região, de modo que se firme como

pólo turístico diferenciado, aliando a busca incessante de sua sustentabilidade na

condição de região de patrimônio natural.

• Diálogo com autoridades governamentais: atuação junto às

autoridades, de modo a agilizar e influir em prol dos interesses comuns do setor

turístico da região.

• Divulgação da imagem da região: dar visibilidade à região de

Visconde de Mauá, como destino turístico, em função de suas qualidades

ambientais.

6.2.2 Diagnóstico estratégico

6.2.2.1 Pontos fortes

• Existência de um site da região administrada pela Mauatur: refere-se

à página da Internet mantida pela Mauatur e que apresenta, além das belezas

naturais da região, os hotéis e restaurantes associados.

• Plano de saúde – Acesso aos moradores: a Mauatur mantém um

plano de saúde junto ao Banco Bradesco a custo reduzido. Este serviço oferecido

à comunidade tem grande impacto social e aumenta a visibilidade da Mauatur

junto à sociedade de Visconde de Mauá.

• Existência de um diretor-executivo remunerado: em uma associação

de classe como a Mauatur, a direção é exercida pelos hoteleiros e comerciantes da

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86

região, que estão normalmente ocupados em dirigir ou gerenciar os próprios

negócios.

• Reconhecimento junto aos órgãos de segurança dos dois estados: os

órgãos de segurança no país estão subordinados aos governos estaduais. Tendo em

vista que a região está localizada em dois estados, faz-se necessária uma atuação

junto a esses órgãos de modo a harmonizar as políticas de segurança para a região

de Visconde de Mauá.

• Posto de Informações Turísticas: até o surgimento do posto, um dos

grandes problemas da região no que se refere ao turismo era a inexistência de um

posto local no qual os turistas pudessem se informar quanto aos atrativos da

região, assim como fazer reservas em hotéis.

6.2.2.2 Pontos fracos

• Pequeno número de associados: apesar de o índice de associados da

Mauatur ter crescido nos últimos anos, este número, quando comparado à

totalidade de estabelecimentos hoteleiros e comerciais, ainda é pequeno. Este fato

denota a pouca consciência dos comerciantes da região, que ainda não entenderam

que as ações coletivas têm maior chance de êxito do que as individuais.

• Falta de recursos para ações específicas: em razão do pequeno

número de associados, os recursos oriundos das mensalidades recebidos não são

suficientes para financiar ações específicas da entidade. Dentre essas ações

específicas, incluem-se aquelas necessárias à divulgação e à representação da

associação.

• Falta de divulgação externa da região: conforme apontado

anteriormente, em razão da carência de verbas, a divulgação da região não é feita

de forma sistemática.

• Plano de saúde: o plano de saúde oferecido aos moradores e

administrado pela associação representa um risco de inadimplência, visto que, em

caso de não-pagamento por parte de moradores, a associação atua como devedora

solidária; por tal motivo, este ponto, apesar de, inicialmente, representar um ponto

forte, acaba se constituindo num ponto fraco para a Mauatur.

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87

6.2.2.3 Oportunidades

• O maior atrativo da região é, sem dúvida alguma, sua beleza natural.

Seu clima de montanha, suas trilhas ecológicas e principalmente a água cristalina

e de qualidade do Rio Preto são o grande diferencial da região.

• O potencial de ecoturismo da região ainda não foi explorado,

abrindo espaço para o desenvolvimento de diversos projetos.

• A origem histórica, que remonta aos últimos anos do século XIX,

com a vinda de imigrantes europeus para povoarem o Núcleo-Mauá, é um

potencialmente atrativo da região a ser explorado.

• O modo de vida antigo e especial, traço marcante dos “mineiros”,

que habitam a região desde o início do século XX, é outro atrativo de atração de

turística a ser explorado.

• A Mauatur tem significativa representatividade na área política,

sendo recebida regularmente pelas administrações municipais e estaduais.

• Recentemente, foi criado o Conselho Gestor da Microbacia do Alto

Rio Preto, cujo propósito é a elaboração, a promoção e a implementação do plano

de gestão socioambiental para a Região de Visconde Mauá, além de organizar as

demandas da sociedade em relação a questões sociais, econômicas e ambientais. A

Mauatur pode aumentar a força de suas reivindicações se vier a atuar em parceria

com o Conselho.

• A região apresenta uma grande diversidade cultural, em função do

movimento migratório que ocorreu na segunda metade século XX. Nesse período,

várias pessoas, originárias dos diversos cantos do país, vieram morar e trabalhar

na região.

• Os turistas que freqüentam a região são, em geral, provenientes das

classes média e média alta, das cidades de São Paulo, Rio de Janeiro e Belo

Horizonte. Tendo em vista a população dessas cidades, é grande o potencial de

crescimento do fluxo turístico.

• O retorno financeiro dos turistas que visitam a região está abaixo da

média de regiões similares, o que faz com que exista grande potencial de

crescimento.

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88

• Parte significativa do fluxo turístico da região ocorre em função da

disseminação das belezas e qualidades da região através da propaganda boca a

boca. Esta é uma grande oportunidade de atuação da Mauatur como aglutinadora

de campanhas de marketing.

• A estrutura turística da região se caracteriza por uma grande

pulverização dos estabelecimentos hoteleiros de pequeno porte, provocando uma

grande concorrência comercial. Este aspecto é uma grande oportunidade para a

Mauatur atuar como organização de hoteleiros, impedindo que a concorrência seja

nociva ao setor turístico da região.

• A hotelaria local tem independência para se estruturar

comercialmente. Este aspecto permitirá a implementação do presente plano sem

encontrar resistência de agências de turismo.

6.2.2.4 Ameaças

• A região se situa dentro de uma área de preservação ambiental

permanente, criando uma grande dependência em relação ao Ibama.

• O Ibama não tem pessoal nem recursos para controlar e fiscalizar as

construções e a expansão urbana na região.

• Também por falta de recursos, o Ibama não consegue implementar

um programa de conscientização preventivo, alertando os moradores e turistas

quanto às limitações legais à utilização do meio ambiente.

• O problema ambiental se torna ainda mais flagrante quando

observamos o tratamento dispensado ao lixo urbano. O problema ainda não foi

resolvido de forma sustentável, apesar da consciência ambiental dos moradores.

• A região de Visconde Mauá situa-se em dois estados e três

municípios, sendo que a parte urbana está a uma razoável distância da sede dos

municípios. Como conseqüência, a região enfrenta problemas de falta de

manutenção dos acessos aos pontos turísticos, reduzida quantidade de projetos ou

programas de estímulo a manifestações culturais da região e da qualidade

transportes públicos.

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• Os municípios de Resende e Itatiaia têm planos diretores, contudo,

há grande dificuldade política em sua implementação, o que está criando uma

urbanização caótica.

• A pulverização de responsabilidades do poder público municipal

permite a disseminação da informalidade ou de empresas não-legalizadas que

convivem com outras em situação regular. A ausência do poder público

municipal, também em relação à aplicação das leis ambientais, transfere para o

Ibama quase todo o encargo de zelar pela manutenção do meio ambiente da

região.

• A concentração de turistas de classe média gera problemas de

trânsito e estacionamento, principalmente em Maringá, o que é agravado por uma

sinalização viária insuficiente e sem padronização adequada.

• A reduzida disponibilidade de mão-de-obra local capacitada, ao lado

de uma clientela de classe média e média alta, faz com que boa parte dos

funcionários dos hotéis provenha de outras localidades.

• A Mauatur ainda enfrenta considerável falta de participação dos

empresários da região, além de marcante desunião entre os empresários e a

população.

• O acesso a Visconde de Mauá é efetuado por estrada não-

pavimentada, e com manutenção insuficiente, o que acarreta tráfego precário em

diversos períodos do ano. Este aspecto tem concentrado grande parte do esforço

gerencial da Mauatur, visto que impacta diretamente no fluxo turístico.

6.2.3 Análise prospectiva

A consolidação dos pontos fortes e fracos, ao lado das oportunidades e

ameaças, gerou 13 questões estratégicas, apresentadas no Anexo 2. Cada uma das

questões foi transformada em uma variável binária (evento), de acordo com o que

foi mostrado na Figura 4.2, para o horizonte temporal de cinco anos.

A consulta Delphi foi submetida a moradores e freqüentadores da região

para que estimassem as probabilidades de ocorrência dos eventos, bem como o

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90

impacto que a suposta ocorrência de um evento causa na probabilidade de

ocorrência dos demais.

6.2.4 Construção da matriz de cenários

6.2.4.1 Resultados da Pesquisa Delphi

Os resultados finais da consulta Delphi podem ser visualizados na Figura

6.2, que reproduz uma tela do software Lince, identificando as probabilidades de

ocorrência dos eventos a priori, e de forma condicional. A matriz de cenários

mostra uma grande quantidade de eventos com elevada incerteza (probabilidade

de ocorrência entre 40% e 60%).

A tela é uma visualização da matriz M1= aj,j*, onde os valores

representam a probabilidade condicional do evento linha (j), quando da ocorrência

do evento coluna (j*). No intuito de facilitar a leitura, os valores das

probabilidades de ocorrência dos eventos a priori aj,j* estão mostrados na posição

aj,0.

Figura 6.2 – Mauatur: Mapa de probabilidades

Para o evento 2, por exemplo, a probabilidade de que, até 31 de

dezembro de 2010, a estrada de acesso seja asfaltada pelo governo do estado é de

a2,0 = 49%. A ocorrência do evento 1 – deterioração da qualidade da água do Rio

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Preto a ponto de que este deixe ser uma atração turística para a região – reduz essa

probabilidade para a2,1 = 31%, ao passo que a ocorrência do evento 3 – pleno

funcionamento do Comitê de Gestão Integrada – eleva a referida probabilidade

para a2,3 = 62%, e assim por diante.

A Figura 6.3 mostra o gráfico “Motricidade X Dependência”. A grande

concentração de eventos de ligação permite concluir que se trata de um cenário

com elevada instabilidade. Os eventos 3 (Implantação dos Comitês de Gestão

Integrada), 7 (Entrosamento dos prefeitos em prol da região) e 11 (Consciência

ambiental dos moradores) apresentam as maiores motricidades, e grande

dependência. A atuação sobre esses eventos reduz grandemente a incerteza quanto

ao futuro, conforme será visto na seção seguinte. O evento 5 (crescimento da

economia nacional) aparece como único evento explicativo, o que é razoável em

se tratando de uma região turística.

Figura 6.3 – Mauatur: Motricidade x Dependência

6.2.4.2 Mapa de cenários prospectivos

O mapa de cenários prospectivos, Figura 6.4, é a matriz M5 = ei,j, onde

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para o valor de e = -1 aparece a palavra “NÃO” (não ocorre), e para o valor de e =

1 aparece a palavra “OCORRE”. A matriz está em ordem decrescente de

probabilidade de ocorrência de cenários P(i). O cenário mais provável aparece na

primeira posição.

A última linha da tela mostra a probabilidade total de ocorrência do

evento. Esta probabilidade é a soma da probabilidade de ocorrência de todos os

cenários em que o evento ocorre, ou seja, é a probabilidade de ocorrência do

evento, independentemente do cenário.

Figura 6.4 – Mauatur – Geração de cenários

6.2.4.3 Análise de interações estratégicas

A análise das interações estratégicas utiliza as informações de

inteligência competitiva, incorporando os atores no processo. Os seguintes atores

foram considerados como mais significativos para o desenvolvimento turístico de

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Visconde de Mauá:

1. Mauatur;

2. Turistas;

3. Outros destinos turísticos;

4. Prefeituras de Itatiaia, Resende e Bocaina de Minas;

5. Ibama;

6. Moradores;

7. Governo do Estado do Rio de Janeiro;

8. Prestadores de serviço;

9. Conselho de Gestão Socioambiental;

10. Governo do Estado de Minas Gerais;

11. ONGs que atuam na região.

As informações de inteligência competitiva são cadastradas em diversas

telas do Lince. A Figura 6.5 reproduz a tela de cadastro da influência que cada

ator pode exercer para a ocorrência ou não dos eventos. A tela é uma visualização

da matriz M3= cj,k, mostrando a capacidade de influência que cada ator “k”

(coluna) pode exercer sobre cada evento “j” (linha). Os valores são relativos, e a

escala utilizada foi de 0 a 5. Com relação ao evento 2, por exemplo –

pavimentação da estrada de acesso –, os atores mais influentes são o Ibama e o

governo do Estado do Rio de Janeiro, c2,5, e c2,7, respectivamente, com valor igual

a 5. O governo do Estado de Minas Gerais não é considerado (c2,10, em cinza),

tendo em vista que a estrada está no Estado do Rio de Janeiro.

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94

Figura 6.5 – Mauatur – Influência de atores sobre eventos

A Figura 6.6 reproduz a tela de cadastro de impacto dos eventos sobres

os atores, correspondendo à matriz M2= bk,j. A tela mostra o impacto que a

ocorrência de cada evento “j” (coluna) exerce sobre cada ator “k” (linha).

O vetor linha da matriz M2, conforme abordado na Seção 4.5, indica

também o cenário ideal de cada ator “k”. Dessa forma, o vetor linha do ator 1,

(Mauatur) b1,j = (-5,5,5,4,5,5,5,5,5,3,5,5,5), indica que o cenário ideal é ej = (-

1,1,1,1,1,1,1,1,1,1,1,1,1). A Mauatur não deseja que ocorra o agravamento da

qualidade da água do Rio Preto a ponto de este deixar de ser uma atração turística

para a região, e deseja a ocorrência de todos os outros eventos.

Figura 6.6 – Mauatur – Impacto de eventos sobre atores

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95

A Figura 6.7, chamada de matriz Influência x Impacto, permite a análise

conjunta das matrizes M2 e M3, conforme descrito na Seção 4.5. Na figura, está

selecionada a caixa “considerar todos os eventos”, indicando uma visão holística

do cenário. A interpretação da figura mostra que as três prefeituras, o IBAMA, os

moradores, o conselho de gestão socioambiental e as ONGs são os “jogadores”,

portanto candidatos prioritários à coalizão.

Figura 6.7 – Mauatur – Matriz Influência x Impacto

6.2.4.4 Seleção do cenário normativo

O cenário ideal, definido pelo decisor estratégico (Mauatur), coincide

com o cenário mais provável, conforme mostrado na Tabela 6.2, todavia com a

probabilidade de ocorrência relativamente baixa, de apenas 6,62% (Figura 6.4).

Este caso leva as possíveis ações de construção de futuro para um cenário

normativo de preservação, conforme mostrado na Figura 2.4. O propósito não será

alterar o cone de futuro, mas aumentar a probabilidade de ocorrência do cenário

mais provável.

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96

Tabela 6.2 – Análise de cenários

No Descrição do eventoMais

ProvávelIdeal

1 Degradação da qualidade da água do Rio Preto. N N

2 Pavimentação da estrada de acesso. O O

3 Implantação do comitê de Gestão Integrada. O O

4 Fiscalização Municipal eficiente e atuante. O O

5 Crescimento da econômica nacional. O O

6 Implementação dos planos diretores municipais. O O

7 Entrosamento dos prefeitos em prol da região. O O

8 Solução sustentada para coleta e destinação doLixo urbano.

O O

9 Construção de estações de tratamento de esgoto. O O

10 Funcionamento efetivo das Ongs. O O

11 Consciência ambiental dos moradores. O O

12 Solução de Problemas de transito eestacionamento.

O O

13 Pavimentação das estradas de circulação interna. O O

A Figura 6.8 mostra a tela de ação ofensiva, onde é feita a seleção do

cenário normativo, configurada para ordenar os cenários por maximização de

ganho, conforme a Equação 4.23.

O cenário ideal, por definição, é o que oferece o máximo ganho para a

Mauatur. A maximização da função ganho é relativa ao cenário mais provável,

como, neste caso, o cenário ideal é o mais provável, o ganho máximo é igual à

zero (terceira coluna).

O ponto de máximo da função (Equação 4.23):

×−

×= ∑∑

==

n

jjijk

n

jjijkki ebebG

1,,

1,,, * ocorre para i = i*, com G i,k = 0.

A ocorrência de qualquer outro cenário, que não o mais provável,

acarreta perdas para a Mauatur, conforme pode ser visto na Figura 6.9, que mostra

a tela de cenários defensivos, ordenados por probabilidade de ocorrência.

A escolha do cenário mais provável como normativo atende à primeira

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restrição, tendo em vista que não há necessidade de definir eventos normativos

para transformar o cenário normativo no mais provável.

A escolha atende, também, à segunda restrição, do mesmo conjunto de

equações, ou seja:

iiPPN > para qualquer cenário “i”.

Figura 6.8 – Mauatur – Cenário normativo

Figura 6.9 – Mauatur – Cenários defensivos

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98

A decisão da Mauatur de aumentar a probabilidade de ocorrência do

cenário normativo direciona as ações à construção de um futuro de preservação,

com a definição de eventos normativos. Neste caso, haverá necessidade de uma

verificação da primeira restrição Equação 4.24.

A Figura 6.10 mostra a tela de simulação com a ocorrência condicional

de eventos. A Mauatur selecionou três eventos normativos, dentre os 13 eventos

que compõem o cenário. A simulação mostra que, caso os eventos 3 (Implantação

dos Comitês de Gestão Integrada), 7 (Entrosamento dos prefeitos em prol da

região) e 11 (Consciência ambiental dos moradores) ocorram, o cenário normativo

passa de uma probabilidade de ocorrência de 5,75 % para 33,36 %, sendo este um

valor significativo para uma partição com 1.024 cenários possíveis.

A Mauatur, atuando de forma isolada, não tem capacidade de garantir a

ocorrência dos três eventos; contudo, caso consiga coordenar uma coalizão dos

prefeitos das três cidades, dos moradores, das ONGs e do conselho de gestão

socioambiental, criará um “superator”, capaz de fazê-lo. A ocorrência dos três

eventos, por seu turno, conforme mostram as Figuras 6.3 e 6.10, tem capacidade

para alavancar todo o cenário normativo.

Figura 6.10 – Mauatur – Simulação com três ocorrências condicionais

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99

A Figura 6.11 mostra a simulação com a ocorrência condicional de

quatro eventos normativos, sendo que o evento 5 (Manutenção da inflação sob

controle e um crescimento médio no período acima de 4% ao ano) foi considerado

um pressuposto.

A simulação de pressupostos não considera seqüências ou datas de

ocorrência de eventos, conforme pode ser observado na Figura 6.11, tendo em

vista que a coalizão não possui influência sobre eles. Todavia, a ocorrência do

evento 5 foi considerada um pressuposto válido, em razão das estimativas

propostas pelo governo federal. Neste caso, o cenário normativo passa de uma

probabilidade de ocorrência de 5,75% para 58,75 %, sendo este um valor

significativo para uma partição com 512 cenários possíveis.

Figura 6.11– Mauatur – Simulação ocorrências condicionais

A escolha dos eventos 3, 7 e 11 para serem pactuados com a coalizão, e

do evento 5, como um pressuposto, atende à primeira restrição, Equação 4.24, ou

seja,

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100

Njr > 0, para todo NN ji

e, = 1

Como NN jie

, =1 para jN = 3, 5, 7, e 11, a condição a ser verificada é de

que Njr > 0, para jN = 3, 5, 7, e 11. Esta condição é verificada na tela de análise

de exeqüibilidade, mostrada na Figura 6.12.

Figura 6.12– Mauatur – Análise de exeqüibilidade

A tela mostra os atores como neutros, indicando que este cenário está no

limite da margem de negociação de todos. Este fato ocorre somente com o cenário

mais provável, conforme mostrado na Figura 4.5. Um determinado ator será

neutro a qualquer cenário que cruze sua margem de negociação, tendo em vista

que esses cenários não produzem ganho em relação ao mais provável.

O cenário mais provável, por outro lado, é um ponto de equilíbrio de

Nash e, dessa forma, qualquer ator que abandone sua estratégia poderá levar o

cenário mais provável para um ponto mais distante de seu cenário ideal. Portanto,

nenhum ator tem interesse em abandonar sua estratégia atual.

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101

6.2.4.5 Definição das ações

As linhas de ação a serem adotadas pela Mauatur deverão seguir a

coordenação dos esforços dos principais atores. As medidas que deverão ser

tomadas são muito mais políticas do que técnicas. O fato de que o cenário

normativo pode ser atingido, mesmo em um ambiente não-cooperativo, facilita a

atuação da Mauatur. O aumento da probabilidade de ocorrência do cenário

normativo não deve incluir a mudança de estratégia de nenhum ator. A força da

coalizão será fruto da coordenação dos esforços de seus membros.

6.2.4.6 Avaliação das ações

A avaliação das ações conduz a uma conclusão compatível com as

características da região: localizada dentro de uma área de preservação ambiental,

distribuída por três municípios em dois estados. Todavia, valida a metodologia,

apontando corretamente o que se observa na prática e é o senso comum. A

aplicação da metodologia identificou o tipo de ação prioritária, além de ser uma

excelente ferramenta para garantir o apoio político dos principais atores. Este

último ponto é talvez o mais importante de todo o estudo.

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102

7. CONCLUSÕES

O objetivo principal da tese foi desenvolver uma metodologia de

identificação de um cenário normativo aceitável e exeqüível. O propósito, a

construção do futuro, identifica os caminhos que podem transformar este cenário

em uma realidade.

A informatização da metodologia permite o seu emprego por diversas

organizações. A geração de cenários prospectivos, utilizando diversas equações e

algoritmos de domínio público, foi efetuada com o propósito de facilitar o

emprego dos softwares Puma e Lince. As equações desenvolvidas pelo autor da

tese e apresentadas na seção 4, foram implementadas no Lince, também com o

mesmo propósito. Os softwares, na versão teste, porém com plena funcionalidade,

estão disponíveis no site da empresa Brainstorming6.

A construção do futuro exige ações de naturezas diversas, que foram

divididas em duas dimensões: a primeira, relacionada com a vontade política,

envolve os atores; a segunda relacionada aos recursos econômicos e tecnológicos,

entre outros, bem como ao tempo disponível.

A palavra-chave que orientou todo o trabalho foi “exeqüível”. A

definição do cenário normativo, com base em um conjunto de cenários

prospectivos, garante sua conexão com o presente. A análise de interações

estratégicas, integrada à escolha do cenário normativo, permitiu incluir a chamada

componente política, avaliando a composição de força dos atores e possíveis

parcerias estratégicas.

A inclusão de conceitos da teoria de jogos, evitando a utilização de

soluções matemáticas mais sofisticadas, procurou simplificar o modelo e

apresentar, ao decisor estratégico, diversas soluções possíveis. A existência de

mais de uma solução é condição básica para a tomada de decisão e uma das bases

do planejamento estratégico.

6 http://www.brainstorming.com.br

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103

A inclusão da teoria dos jogos na construção do futuro necessita de um

valor de referência, pois, do ponto de vista de cada ator, somente é vantajoso

mudar de estratégia caso o valor recebido seja superior ao valor que seria obtido

como a manutenção da estratégia anterior. A definição do cenário mais provável,

como aquele que ocorrerá caso todos os atores mantenham suas estratégias atuais,

resolve este problema. Cada ator passa a ter um valor de referência, o que permite

calcular os ganhos individuais em caso de ocorrência do cenário normativo.

A utilização de métodos quantitativos permite realizar simulações com a

ocorrência condicional de eventos. Essas simulações permitem definir o chamado

“evento normativo”, focando a atenção no processo causal e nos pontos de tomada

de decisão. A ocorrência desses eventos mostra como o presente pode evoluir para

um futuro desejado e quais são as questões estratégicas mais importantes para essa

evolução.

A definição das questões estratégicas-chave permite concentrar esforços

nos pontos de maior impacto, quebrando tendências e construindo o futuro. Essas

questões foram claramente identificadas nas duas aplicações apresentadas.

No Projeto “Brasil 3 Tempos” aparecem como questões prioritárias a

qualidade do ensino, a educação básica, a violência e a criminalidade, a

desigualdade social e o nível de emprego. No Projeto Mauatur, aparecem a

implantação dos Comitês de Gestão Integrada, o entrosamento dos prefeitos em

prol da região e a consciência ambiental dos moradores.

Em ambos os casos, não houve surpresas. No Projeto “Brasil 3 Tempos”,

a definição da educação, como questão prioritária do Estado, já era defendida por

diversos setores da sociedade. No caso Mauatur, a integração dos esforços das três

prefeituras e a conscientização ambiental dos moradores são as questões

estratégicas naturais, em uma região espalhada por três municípios e dois estados.

A definição da educação como questão prioritária para um projeto de

Estado se, por um lado, não foi surpresa, por outro agregou força política para

uma coalizão de atores-chave. Essa constatação conduziu a um estudo específico

sobre o tema e a novas definições de políticas de governo sobre educação.

Um dos primeiros desdobramentos do projeto Brasil 3 Tempos ocorreu

em 2006, com um novo projeto do NAE, o projeto de Melhoria da Qualidade da

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Educação Básica. O referido projeto utiliza a mesma metodologia empregada no

projeto “Brasil 3 Tempos”. Os quatro temas, selecionados como prioritários para a

ação do Estado são: a formação de professores (inicial e continuada), a inclusão

digital das escolas públicas (com uso do FUST), a gestão escolar democrática e

um movimento nacional pela qualidade da educação.

No caso da Mauatur, o estudo revela a necessidade da existência de um

órgão de coordenação, sem o qual haverá uma pulverização dos esforços

empreendidos pelos atores, gerando escassez de políticas públicas consistentes.

Nos dois estudos apresentados, foram selecionados cenários normativos

aceitáveis, e de acordo com as informações disponíveis sobre os atores, também

exeqüíveis. Todavia, somente a ocorrência dos eventos futuros poderá ratificar a

afirmativa. Desta forma, o acompanhamento desses eventos, utilizando o software

Lince, e um passo fundamental.

Para encerrar, a aplicação da metodologia mostrou que pode fornecer

respostas consistentes para problemas complexos. De certa forma, a coerência das

soluções valida a metodologia, mostrando que o planejamento estratégico,

agregado a uma correta visão de futuro, com o emprego de análise de interações

estratégicas, consiste numa poderosa ferramenta para a construção de um futuro

melhor.

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105

8. SUGESTÕES PARA FUTURAS PESQUISAS

A integração dos conceitos de prospectiva estratégica e de planejamento

estratégico aparece em diversos trabalhos, notadamente em Michel Godet.

A inclusão de conceitos e interações estratégicas permitiu ampliar o

leque de análises para incluir o comportamento humano. Pelas razões

apresentadas, a metodologia adotada buscou incluir apenas conceitos de interação

estratégica. No entanto, abre espaço para a investigação da aplicação de outras

soluções existentes ou a serem desenvolvidas.

Assinala-se que duas ressalvas apresentadas no texto são importantes: a

primeira diz respeito à probabilidade de ocorrência dos cenários, que introduz

uma componente adicional de risco e custo; a segunda – a recomendação de que

qualquer aplicação seja simples e de fácil compreensão.

O critério de maximização de ganho para a seleção do cenário normativo,

conforme se defende no texto, é um daqueles possíveis. O software Lince inclui

outros dois: a maximização de atores na coalizão e a probabilidade de ocorrência

do cenário normativo. O Núcleo de Assuntos Estratégicos da Presidência da

República utiliza outros conceitos de foresight e ferramentas de Apoio

Multicritério à Decisão.

A sugestão para trabalhos futuros, neste aspecto, é uma investigação de

outros critérios, e a definição de critérios específicos em função das características

do sistema e do ambiente. Contudo, independentemente do critério, as restrições

continuam válidas, ou seja, a coalizão deve possuir os recursos necessários para

alterar a probabilidade de ocorrência dos eventos normativos, e estes devem

possuir motricidade suficiente para transformar o cenário normativo no mais

provável.

O desenvolvimento de uma modelagem específica para avaliação das

informações de inteligência competitiva, abordando aspectos de governança, é

outro ponto em que trabalhos futuros poderão contribuir para o aperfeiçoamento

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106

da metodologia.

O foco deste trabalho foi a seleção de um cenário normativo exeqüível. A

análise de interações estratégicas voltou-se à cooperação; contudo, há espaço para

a análise dos concorrentes.

Conforme abordado no texto, as características do meio ambiente não são

intrinsecamente ameaças ou oportunidades; o que as configura como tais são as

estratégias adotadas por outros atores.

A utilização de indicadores de preparação dos atores para enfrentar as

ameaças ou aproveitar as oportunidades, com vistas ao cenário mais provável,

permite o monitoramento da concorrência. Neste caso, a utilização da técnica de

envoltória de dados poderá fornecer um índice único, indicando o posicionamento

de cada ator, em face das características mais prováveis do meio ambiente futuro.

Pesquisas futuras nesta área abrirão um grande leque para trabalhos com foco em

ambientes concorrência elevada,

Diversos trabalhos acadêmicos foram realizados com o emprego do

software Puma. O software Lince foi lançado comercialmente em 2006, abrindo

espaço para o seu emprego em trabalhos acadêmicos.

A última sugestão é que a comunidade acadêmica utiliza os softwares

Puma e Lince, aproveitando a política da Brainstorming de fornecê-lo

gratuitamente para trabalhos acadêmicos. O emprego conjunto dos dois softwares

permite agregar valor aos trabalhos futuros, além de contribuir para o

aperfeiçoamento da metodologia e dos respectivos softwares.

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116

10. ANEXO 1- Projeto Brasil 3 Tempos

TEXTOS SUBMETIDOS À CONSULTA DELPHI

TEMAS ESTRATÉGICOS, AMBIENTAÇÕES E PERGUNTAS.

Fonte: NÚCLEO DE ASSUNTOS ESTRATÉGICOS DA PRESIDÊNCIA DAREPÚBLICA.Disponível em: <http:// www.nae.gov.br/index_arquivos/doc/sitesaibamaisbr3t.pdf>

Os temas estratégicos apresentados a seguir – bem como as respectivas

ambientações e as perguntas referentes aos eventos futuros – são frutos de

sucessivas rodadas de consolidação, conduzidas pelo NAE-PR e realizadas junto

aos grupos acadêmicos e aos órgãos públicos envolvidos com os assuntos.

Este texto constitui a base para a realização da consulta Delphi do Projeto

BR3T, levada a mais de 50 mil cidadãos em todo o Brasil, via internet. Essa

consulta permitiu prospectar os cenários mais prováveis, desenhados a partir da

combinação da ocorrência – ou não – dos eventos futuros.

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ÍNDICE DE TEMAS ESTRATÉGICOS

1. Normalidade Constitucional.........................................................................1192. Sistema Político-Partidário...........................................................................1193. Sistema Judiciário ........................................................................................1204. Entes federados ............................................................................................1215. Relações trabalhistas ....................................................................................1226. Carga tributária.............................................................................................1227. Estrutura tributária .......................................................................................1238. Taxa de investimento ...................................................................................1249. Controle da inflação .....................................................................................12510. Exportações brasileiras.................................................................................12611. Sistema industrial, tecnológico e de comércio exterior. ..............................12712. Agricultura e pecuária ..................................................................................12913. Contas públicas ............................................................................................13014. Despesas Correntes ......................................................................................13015. Qualidade da vida urbana.............................................................................13116. Desigualdade social......................................................................................13217. Diversidade cultural brasileira .....................................................................13418. Violência e criminalidade ............................................................................13419. Sistema previdenciário .................................................................................13520. Perfil etário da população.............................................................................13621. Sistema Único de Saúde (SUS)....................................................................13722. Ações afirmativas de inclusão social ...........................................................13823. Nível de emprego .........................................................................................13824. Desigualdades regionais...............................................................................13925. Ordenamento do território brasileiro............................................................14026. Recursos do mar...........................................................................................14127. Uso e conservação da água doce..................................................................14228. Amazônia .....................................................................................................14329. Sistema de Defesa Nacional.........................................................................14430. Matriz brasileira de combustíveis ................................................................14531. Infra-estrutura...............................................................................................14632. Qualidade do ensino.....................................................................................14733. Educação básica ...........................................................................................14834. Ensino superior.............................................................................................14935. Inclusão digital .............................................................................................14936. Tecnologias de Informação e Comunicação (TICs).....................................15037. Biotecnologia ...............................................................................................15238. Programas tecnológicos em áreas sensíveis .................................................15239. Nanotecnologia ............................................................................................15440. Investimentos em Ciência, Tecnologia e Inovação......................................15441. Biodiversidade..............................................................................................15542. Protocolo de Quioto .....................................................................................15643. Brasil, Rússia, Índia e China ........................................................................15744. Bloco político-econômico no continente americano....................................158

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45. Bloco político-econômico do Mercosul .......................................................15846. Bloco político-econômico da América do Sul .............................................15947. Mercosul e União Européia (UE).................................................................15948. Organização das Nações Unidas (ONU)......................................................16049. Conselho de Segurança das Nações Unidas (CSNU) ..................................16050. Ordenamento Mundial Emergente ...............................................................161

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119

1. NORMALIDADE CONSTITUCIONAL

A história política brasileira do século XX foi pontilhada de eventos que

caracterizaram rupturas ou ameaças ao quadro de normalidade constitucional.

Como exemplo, podem ser citados: a Guerra do Contestado (1912-1916); a

Revolta do Forte de Copacabana (1922 - Movimento Tenentista); a Revolta

Tenentista de São Paulo (1924); a Revolução de 1930 (início da Era Vargas); a

Revolução Constitucionalista de 1932; a implantação do Estado Novo (1937); e o

Movimento Militar de 1964.

A conjuntura atual tem se caracterizado pela estabilidade conferida pelos

três últimos mandatos presidenciais. Simultaneamente, tem sido observada uma

crescente conscientização da população para as vantagens da democracia, bem

como um incremento da participação da sociedade na formulação, implementação

e fiscalização das políticas públicas. Além disso, é notório o processo de

fortalecimento do sistema eleitoral brasileiro, marcado pela tranqüilidade dos

pleitos e pelo alto índice de comparecimento da população às urnas.

Todavia, alguns analistas registram que uma cultura política, democrática e

republicana ainda não está solidamente enraizada na população brasileira.

A pergunta que se faz é quanto à possibilidade de que o Brasil, em razão da

recente experiência adquirida, mantenha o quadro de normalidade democrática,

em âmbito nacional, sem mudanças abruptas e inconstitucionais.

2. SISTEMA POLÍTICO-PARTIDÁRIO

Um dos aspectos mais salientes do processo de democratização da sociedade

brasileira é o crescimento do associativismo e o aparecimento de novos temas e

novas formas de participação social e política. Das tradicionais associações de

classe à explosão das organizações não-governamentais, passando pela

institucionalização dos movimentos sociais, surgiu um conjunto de novos atores

com concepções e interesses cada vez mais presentes no cenário brasileiro,

capazes de influenciar a formulação de políticas públicas.

Encontra-se em curso, no Congresso Nacional, uma proposta de reforma que

aborda questões consideradas essenciais para o aperfeiçoamento do sistema

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120

político-partidário brasileiro. Esse tema tem sido objeto de debates no âmbito dos

demais poderes da República, bem como da sociedade em geral, a qual demanda

uma representação mais efetiva junto aos legislativos federal, estadual e

municipal.

Os estudos se referem, por exemplo, ao financiamento público de

campanhas, ao voto de legenda em listas partidárias fechadas, ao fim das

coligações nas eleições proporcionais e à valorização da proposta programática

dos partidos. Todavia, ainda persistem reações advindas de importantes segmentos

políticos, dificultando a tramitação da reforma em tela.

Críticos do atual sistema indicam que há um descompasso entre o jogo

partidário eleitoral e o jogo partidário parlamentar, devido, entre outras razões, ao

baixo nível de responsabilização do sistema de representação político-partidário,

agravado pela livre prática de troca de legendas durante o exercício do mandato.

A pergunta que se faz é quanto à possibilidade de que seja realizada uma

reforma do sistema político-partidário que estreite os vínculos entre o eleitor e

seus representantes, fortaleça os partidos políticos e amplie a responsabilidade

parlamentar.

3. SISTEMA JUDICIÁRIO

O sistema judiciário brasileiro é considerado lento e ineficiente em razão de

inúmeros problemas estruturais, decorrentes da obsolescência da nossa legislação

processual, da carência de meios, da deficiência de controle e da falta de

transparência de alguns de seus setores.

A recém-aprovada reforma do Poder Judiciário contém diversos

instrumentos que devem contribuir para o aumento da sua eficiência. Especialistas

consideram, todavia, que estas alterações ainda são insuficientes para lhe dar uma

maior agilidade. Sua deficiência estrutural aumenta significativamente o “custo

Brasil”, dificulta as relações comerciais e afasta da população a possibilidade de

utilização plena do Poder Judiciário para arbitrar suas pendências. O amplo acesso

de todos os cidadãos ao sistema judiciário é condição necessária para a

consolidação da democracia e da cidadania.

Os países de democracia consolidada trocaram seus sistemas de excessivos

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níveis de regulação econômica e trabalhista por um sistema judiciário mais ágil e

facilitador da solução de pendências. Esta agilidade permitiu adequada

desregulamentação das relações econômicas e contribuiu para a redução da

criminalidade e da violência. Um sistema ágil transmite aos seus cidadãos

confiança na Justiça.

A pergunta que se faz é quanto à possibilidade de que seja alcançada efetiva

melhoria no sistema jurídico-institucional brasileiro, tornando a Justiça mais

eficaz e os processos tão ágeis quanto na maioria dos países de democracia

consolidada.

4. ENTES FEDERADOS

Determinadas áreas do território nacional adquirem características

significativamente diferenciadas dos estados e municípios, ensejando a criação de

mecanismos de administração social, política e tributária mais adequados e

efetivos. Há propostas para a criação de novos tipos de entes federados, cujos

mais significativos exemplos poderão ser as regiões metropolitanas e os

consórcios de municípios – regidos por um novo arcabouço legislativo que lhes

conferirá um status especial, em relação aos estados e municípios.

Essas propostas se baseiam na constatação de que os problemas

administrativos e fiscais enfrentados pelos estados e municípios poderiam ser

equacionados por um novo ordenamento institucional, que permitiria um melhor

tratamento de problemas comuns, em áreas limítrofes, de forma consorciada.

As propostas de novos entes federados apontam para a redefinição de

competências tributárias e novas obrigações constitucionais. Essas novas

configurações políticas poderão melhor equilibrar os procedimentos de

arrecadação de recursos e a redistribuição dos encargos públicos, em consonância

com projetos regionais específicos.

A pergunta que se faz é quanto à possibilidade de que venha a ocorrer a

criação de novas formas de articulação entre os entes federados, regidos por um

arcabouço legal que permita a gestão compartilhada de projetos de interesse

regional em áreas com características comuns.

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5. RELAÇÕES TRABALHISTAS

Embora existam importantes setores da sociedade que defendam mudanças

nas leis trabalhistas, tornando-as mais flexíveis e mais contratualistas, algumas

lideranças políticas declaram-se contrárias, refletindo o pensamento de sindicatos

e de parte da opinião pública.

Os defensores das mudanças alegam que a atual legislação trabalhista

representa um desestímulo à geração de empregos formais, gera prejuízos para a

economia e prejudica a competitividade, em razão de cláusulas protecionistas. A

idéia é permitir que os contratos de trabalho específicos para cada caso possam ser

livremente negociados. A expectativa é que uma adequada reforma contribua

significativamente para reduzir as taxas de desemprego, que atingiram cerca de

10,8% da população economicamente ativa, em março de 2005.

Por sua vez, os defensores da atual legislação e críticos da reforma

sustentam que haverá prejuízos para os empregados cujos sindicatos têm pouco

poder de pressão, por correrem o risco de serem subjugados pelo poder econômico

dos patrões.

A pergunta que se faz é quanto à possibilidade de que a legislação

trabalhista venha a ser efetivamente aperfeiçoada, enfatizando o caráter negociado

das relações entre empregadores e empregados, em complemento às relações

reguladas por lei.

6. CARGA TRIBUTÁRIA

O Brasil possui uma elevada carga tributária, combinada com elevados

níveis de sonegação, de perdas e de renúncias de receitas tributárias, quando

comparado com países de mesmo grau de inserção econômica mundial. Além de

outros efeitos indesejáveis, esses fatores atuam não apenas em detrimento dos

setores produtivos internos, mas também provocam a erosão de nossa

competitividade.

O quadro a seguir sugere que a carga tributária brasileira se aproxima da

carga média dos países do chamado G-7 (maiores economias mundiais) – em

torno de 35% – e é maior do que a dos países emergentes, que apresentam

serviços com qualidade semelhante. Determinados analistas advogam a tese de

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123

que as estatísticas coletadas para os anos 1990 e o início desta primeira década do

século XXI, ainda que preliminares e sujeitas a críticas, não rejeitam a hipótese de

que, à medida que os estados aumentam a tributação, a taxa de crescimento

econômico decai.

Carga tributária para países selecionados

País

CargaTributária% sobre o

PIB

PeríodoCarga

Tributária Período PIBFonte CargaTributária Fonte PIB

México 17,50 1992-2002 1995-2004 OCDE CEPALArgentina 21,82 1993-2004 1995-2004 Min.Hacienda CEPALVenezuela 22,14 1993-2001 1995-2004 FMI/IFS CEPALChile 22,96 1993-2002 1995-2004 Min.Hacienda CEPAL

Japão (*)

26,10 2002 1992-2002 OCDE OCDE

EUA (*)

26,70 2002 1992-2002 OCDE OCDECoréia do Sul 30,30 2002 1992-2002 OCDE OCDEBrasil 34,01 2003 1995-2004 IBGE Bc.Central

Inglaterra (*)

35,60 1992-2002 1992-2002 OCDE OCDE

Canadá (*)

36,40 1992-2002 1992-2002 OCDE OCDE

Alemanha (*)

40,90 1992-2002 1992-2002 OCDE OCDE

Itália (*)

41,30 2002 1992-2002 OCDE OCDE

França (*)

43,80 1992-2002 1992-2002 OCDE OCDE

(*) Membros do G-7

Um dos fatores determinantes da excessiva carga tributária está relacionado

ao nível e à composição das despesas públicas. Analistas indicam que a reforma

tributária deve, portanto, ser implementada concomitantemente com um processo

de redução progressiva e seletiva dos gastos públicos, priorizando os destinados a

estimular o processo de desenvolvimento econômico e social do país. Outro fator

importante é o elevado grau de sonegação, pois uma ampliação da base de

tributação decorrente da queda da sonegação permitiria reduzir os tributos pagos

pelo setor formal da economia.

A pergunta que se faz é quanto à possibilidade de que sejam implementadas

mudanças que viabilizem a queda da carga tributária, tornando-a compatível com

a dos países emergentes e estimulando o desenvolvimento econômico.

7. ESTRUTURA TRIBUTÁRIA

Especialistas indicam que a estrutura tributária brasileira é complexa,

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especialmente no que diz respeito aos tributos indiretos da União, dos estados e

dos municípios.

Algumas das principais dificuldades para o aperfeiçoamento do sistema

tributário se situam nos problemas relativos ao equilíbrio federativo, cuja

resolução possibilitaria uma melhor distribuição entre a arrecadação e os encargos

da União, dos estados e dos municípios. Alguns impostos apresentam distorções,

que prejudicam a eficiência da economia brasileira e nossa competitividade

internacional.

Vale ressaltar, todavia, o caráter moderno e eficiente da estrutura de

arrecadação brasileira, a ampla informatização de sua estrutura e o

aperfeiçoamento contínuo dos métodos e processos de gestão tributária. Avanços

adicionais neste sentido, em particular através da maior coordenação entre os

fiscos federal, estadual e municipal e da introdução de sistemas eletrônicos de

emissão de documentos fiscais podem contribuir sobremaneira para a redução da

sonegação e para a integração e simplificação dos tributos indiretos da União, dos

estados e dos municípios.

A pergunta que se faz é quanto à possibilidade de que sejam implementadas

mudanças que viabilizem a simplificação da estrutura tributária do País.

8. TAXA DE INVESTIMENTO

Nos últimos onze anos (1994-2004) o Brasil apresentou uma taxa média

anual de crescimento do PIB de 2,73%, oscilando entre o máximo de 5,85%, em

1994, e o mínimo de 0,13%, em 1998.

Esse crescimento lento e volátil pode ser explicado pela insuficiência de

investimentos. Um grupo de especialistas sugere que a elevação da poupança

pública é condição necessária para interromper essa trajetória de crescimento não

sustentado. Entretanto, há economistas que defendem a tese de que o crescimento

da poupança é conseqüência da expansão dos investimentos e não aceitam que

exista uma restrição de poupança condicionando esse desempenho insatisfatório

da economia brasileira.

De 1973 a 1980, a taxa de investimento a preços constantes esteve na faixa

de 30% do PIB, com a taxa nominal oscilando entre 20 e 25% do PIB.

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Do início da década de 1990 até 2003, tanto a taxa de investimento nominal,

como a taxa de investimento medida a preços constantes, caíram abaixo do

patamar de 20% do PIB.

Assim, parece necessário recuperar a taxa nominal de investimento para,

pelo menos, 25% do PIB, de modo a sustentar taxas de crescimento iguais ou

mesmo um pouco superiores a 5% a.a..

Para se ter uma idéia comparativa, em termos de economia mundial, no

período recente, o Chile tem apresentado taxas de investimento entre 22% e 27%,

na Coréia do Sul esta taxa se aproxima de 30%, no Japão chega a 26%, e a China,

durante o período recente, obteve taxas superiores a 40%.

A pergunta que se faz é quanto à possibilidade de aumentar a taxa de

investimento do Brasil para algo em torno de 25% do PIB, até 2015, e 30%, até

2022, compatíveis com o crescimento desejado para o País.

9. CONTROLE DA INFLAÇÃO

A inflação constituiu, no Brasil, um dos fatores mais poderosos de

concentração de renda e de diminuição da capacidade de planejamento

empresarial, gerando ainda efeitos nocivos na administração das contas públicas e

no crescimento econômico. Para alguns analistas, a manutenção da inflação em

níveis baixos e convergentes para as médias internacionais é essencial para que o

Brasil tenha um ciclo de crescimento sustentado com baixa volatilidade

econômica. Para outros, um ritmo mais lento de queda da inflação permitiria um

crescimento mais acelerado da economia.

A partir do início da década de 1990, estabeleceu-se um quase consenso, na

sociedade, de que a estabilidade de preços era um elemento importante do

processo de normalização da vida econômica no Brasil, transformando o combate

à inflação em uma prioridade. Nos últimos dez anos (1995 a 2004), a média do

Índice de Preços ao Consumidor Ampliado (IPCA) foi de 9,1% ao ano, enquanto

que, nos anos anteriores, de hiperinflação, a mesma chegou a mais de 1000% ao

ano. No último qüinqüênio, a taxa média de inflação dos países desenvolvidos

esteve abaixo de 3% ao ano. No caso dos países emergentes, essa taxa variou

bastante, podendo ser citados, como exemplo, o México, com 8,4%, e a Coréia do

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Sul, com 3,5%. Vale ressaltar, todavia, que alterações conjunturais poderão mudar

esses parâmetros internacionais.

A pergunta que se faz é quanto à possibilidade de que a inflação venha a se

manter sob controle, reduzindo-se dos níveis atuais para taxas compatíveis com a

média internacional dos países desenvolvidos.

10. EXPORTAÇÕES BRASILEIRAS

As exportações brasileiras totalizaram US$ 73,1 bilhões em 2003, e US$

96,5 bilhões em 2004, com crescimento acumulado nesses dois anos de 60%. Isto

permitiu ao Brasil responder por 0,97% das exportações mundiais, em 2003, e

1,05% em 2004, avançando uma posição no ranking internacional, de 26º para 25º

colocado. As importações brasileiras, por sua vez, aumentaram 2%, em 2003,

atingindo US$ 48,3 bilhões. Em 2004 cresceram 30%, alcançando US$ 62,8

bilhões. No ranking de importadores, o Brasil em 2004 veio para a 29ª colocação.

O intercâmbio comercial aumentou de 18% do PIB em 2000, para 26%, em 2004,

conferindo ao País melhores condições de aproveitar suas vantagens competitivas

e, também, maior flexibilidade de manobra nos mercados financeiros

internacionais.

No entanto, os desafios para a manutenção de um crescimento acelerado de

nossas exportações são relevantes. Por um lado, são ainda muito limitadas as

exportações de serviços, com a exceção parcial do turismo e dos serviços de

engenharia. Por outro lado, apesar da proliferação de acordos bilaterais e

multilaterais de comércio, subsídios e barreiras alfandegárias de toda ordem ainda

prejudicam, de forma relevante, nosso comércio exterior. Além disso, é preciso

enfrentar o chamado “custo Brasil”, que reflete deficiências de logística, do atual

arcabouço jurídico, de qualificação da forca de trabalho, do sistema tributário e

ainda o excesso de burocracia, dificultam a competitividade internacional de

nossos produtos.

Outro aspecto relevante a ser considerado refere-se à excessiva dependência

das exportações brasileiras em relação a produtos primários e de baixo conteúdo

tecnológico, os quais estão mais sujeitos às oscilações da economia mundial. Em

uma estratégia de desenvolvimento de longo prazo, torna-se necessário, portanto,

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agregar valor à pauta de exportações brasileiras, inserindo, com maior vigor a

tecnologia e a inovação, em todos os elos das cadeias produtivas direcionadas para

o mercado externo. Enfim, a agregação de valor as exportações brasileiras

possibilitaria a ocupação de mercados mais dinâmicos e relevantes na economia

internacional, o que, por sua vez, ampliaria o potencial de crescimento das

exportações nacionais.

A pergunta que se faz é quanto à possibilidade de que o Brasil passe a

responder, em 2015, por cerca de 1,5% e, em 2022, por cerca de 2% do valor das

exportações mundiais.

11. SISTEMA INDUSTRIAL, TECNOLÓGICO E DE COMÉRCIO EXTERIOR.

No mundo contemporâneo, a capacidade tecnológica de um país é fator

determinante de sua competitividade nos mercados globais. Para tanto, mudança e

inovação são essenciais e devem ocorrer a partir da interação entre criadores e

usuários de conhecimento, concretizada em novos produtos, processos, gestão e

patentes.

Nas últimas décadas, nossas exportações têm aumentado constantemente.

Entretanto, uma análise dos dados do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e

Comércio Exterior (quadro a seguir), indica que, entre as décadas de 1960 e 1980,

a participação dos produtos manufaturados (com alto valor agregado) cresceu de

8,2% para 54,9%, enquanto a dos básicos foi reduzida de 81,6% para 33,3%. A

partir daí a relação entre esses tipos de produtos tem se mantido quase constante,

oscilando entre 25% a 30% para os básicos e 55% a 60% para os manufaturados.

EXPORTAÇÕES BRASILEIRAS POR FATOR AGREGADO

Básicos Semimanufaturados Manufaturados Total Geral (3)

Ano

US$(1)

%(2)

US$(1)

%(2)

US$(1)

%(2)

US$(1)

1965 1.301 81,6 154 9,7 130 8,2 1.595

1975 5.027 58,0 849 9,8 2.585 29,8 8.670

1985 8.538 33,3 2.758 10,8 14.063 54,9 25.639

2000 12.562 22,8 8.499 15,4 32.528 59,0 55.086

2001 15.342 26,4 8.244 14,2 32.901 56,5 58.223

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2002 16.952 28,1 8.964 14,9 33.001 54,7 60.362

2003 21.179 29,0 10.943 15,0 39.654 54,3 73.084

2004 28.518 29,6 13.429 13,9 52.949 54,9 96.475

(1) Milhões de dólares FOB.

(2) Participação, em porcentagem, sobre o total geral.

(3) Inclui as operações especiais, não apresentadas na tabela.

Embora o País esteja se modernizando, a ponto de formar hoje a maior

comunidade científica da América Latina, os indicadores apontam que permanece

a necessidade objetiva de se ter um enfoque adequado em pesquisa industrial, uma

vez que nos encontramos distantes dos melhores padrões internacionais, seja nas

empresas, seja no meio acadêmico. O setor privado investe pouco em pesquisa e

desenvolvimento (P&D) e as instituições públicas têm reduzida autonomia, quase

nenhuma flexibilidade administrativa e baixa orientação para buscar resultados no

mercado. Os produtos agrícolas e minerais, por exemplo, poderiam contribuir de

maneira muito mais efetiva para a nossa balança comercial caso fossem

submetidos a processos progressivos de manufatura, incrementando os valores

agregados.

A conjuntura tem mostrado que as empresas brasileiras sofrem concorrência

de dois tipos: empresas de países de baixa renda, baixos salários e condições

gerais de trabalho relativamente piores, que concorrem com produtos

padronizados de baixo preço; e empresas de países de alta renda e altos salários

que disputam os mercados mais dinâmicos e rentáveis via inovação e

diferenciação de produto.

O desafio consiste em concentrar os limitados recursos financeiros públicos

e canalizá-los para áreas prioritárias; atrair o interesse dos empresários para as

vantagens da pesquisa industrial; sincronizar as atividades da universidade, dos

institutos de pesquisa e da indústria; aumentar e melhorar a qualidade do capital

humano envolvido; e reduzir o ônus da utilização de produtos e processos

patenteados, entre outras medidas. Algumas opções estratégicas já estão sendo

adotadas, particularmente nas áreas de semicondutores, softwares, bens de capital,

fármacos e medicamentos. Também estão recebendo especial atenção atividades

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como biotecnologia, nanotecnologia, biomassa e energias renováveis, tudo com

vistas a proporcionar um efetivo salto para o futuro.

A pergunta que se faz é quanto à possibilidade de que seja implementada

efetiva política industrial, tecnológica e de comércio exterior, que contribua para

aumentar em pelo menos 10%, até 2015, e 15%, até 2022, a participação relativa

da soma de produtos semimanufaturados e manufaturados, na pauta de

exportações brasileiras.

12. AGRICULTURA E PECUÁRIA

O Brasil reúne diversificadas e privilegiadas condições de clima, solo,

energia solar e água doce que lhe proporcionam natural vocação para a

agropecuária e todos os negócios relacionados às suas cadeias produtivas. Além

disso, essas condições indicam efetivo potencial de crescimento, quando

comparado aos dos demais grandes exportadores de alimentos, tais como os

Estados Unidos da América e países da União Européia.

O agronegócio é responsável por 33% do Produto Interno Bruto (PIB), 42%

das exportações totais e 37% dos empregos brasileiros. Nos últimos anos, poucos

países tiveram um crescimento tão expressivo no comércio internacional do

agronegócio quanto o Brasil, levando a Conferência das Nações Unidas para o

Comércio e Desenvolvimento (UNCTAD) a prever que o País será o maior

produtor mundial de alimentos na próxima década.

Existem sérias dificuldades, contudo, para ampliar as exportações nesse

setor. A concorrência internacional tem criado barreiras artificiais aos produtos e

serviços brasileiros, que enfrentam ainda os subsídios concedidos pelos governos

da maioria dos países desenvolvidos aos seus produtores.

Já a agricultura familiar, segundo pesquisa recente da FIPE/USP, representa

10% do PIB, correspondendo a 1/3 da movimentação total do agronegócio e

viabilizando 13 milhões de postos de trabalho. Ela tem grande capacidade de

atender à demanda interna de alimentos, especialmente nas cadeias produtivas de

leite, aves e suínos, além de manter o homem no campo. Contudo, pelas suas

características, a agricultura familiar precisa de forte apoio governamental e

enfrenta sérios problemas relacionados à baixa produtividade, dificuldades de

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comercialização e integração às grandes cadeias produtivas globalizadas.

A pergunta que se faz é quanto à possibilidade de que o Brasil venha a ser o

maior produtor mundial de alimentos.

13. CONTAS PÚBLICAS

O Brasil tem no compromisso com o equilíbrio das contas públicas um dos

principais pilares de sustentação da política econômica. Para a consolidação da

credibilidade na economia brasileira e para a criação de um ambiente favorável às

decisões de investimento, é importante que os agentes econômicos tenham plena

confiança de que o País será capaz de, a qualquer tempo, honrar seus

compromissos de dívida. Além disso, o compromisso com o equilíbrio das contas

públicas reduz a pressão sobre os preços e cria um ambiente favorável à redução

consistente das taxas de juros.

Entre 1994 e 2002 a dívida líquida do setor público cresceu de cerca de 30%

do PIB para mais de 55% do PIB. Desde então, a dívida líquida do setor público

vem se reduzindo, alcançando pouco menos de 52% do PIB em 2004. Um dos

objetivos centrais da gestão da política fiscal é criar condições para a continuidade

da redução da dívida pública como proporção do PIB ao longo dos próximos anos.

A pergunta que se faz é quanto à possibilidade de que seja reduzido o grau

de endividamento como proporção do PIB, de modo a que a dívida líquida do

setor público seja, no mínimo, inferior a 40% do PIB até 2015 e inferior a 30% do

PIB até 2022.

14. DESPESAS CORRENTES

Para manter seu compromisso com o equilíbrio fiscal e estimular o

crescimento econômico, o Brasil deverá enfrentar, ao longo dos próximos anos,

um desafio que consiste em conter a elevação das despesas correntes do setor

público. Para compatibilizar os objetivos de ampliar os investimentos do setor

público e, simultaneamente, a poupança pública, é necessário reduzir a

participação das despesas correntes no Produto Interno Bruto (PIB). Essa redução

poderá viabilizar a queda da dívida pública e abrir espaço para o investimento,

permitindo a diminuição da carga tributária.

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131

Para reduzir a relação “despesas correntes / PIB” não é necessário que

ocorra a redução das despesas em termos reais, mas apenas garantir que

aumentem em proporção menor que o crescimento do PIB.

Especialistas afirmam que, para o bom gerenciamento da política fiscal, não

basta apenas o controle das despesas, sendo também fundamental melhorar sua

qualidade por meio do desenvolvimento de instrumentos para avaliação da

eficácia, eficiência e efetividade do gasto público. A melhoria da qualidade das

despesas públicas permitiria ampliar os recursos governamentais destinados ao

crescimento econômico, bem como àquelas áreas de maior impacto na melhoria

dos indicadores sociais e da qualidade de vida da população, sem prejuízo do

equilíbrio das contas públicas.

A pergunta que se faz é quanto à possibilidade de que os governos federal,

estaduais e municipais consigam melhorar a qualidade do gasto público e reduzir

de forma consistente o volume de despesas correntes em relação ao PIB.

15. QUALIDADE DA VIDA URBANA

O Brasil tem mais de 80% da população nas cidades. Nas metrópoles

brasileiras, entre as quais figuram algumas das maiores concentrações do mundo,

moram 34% da população urbana. Acelerados processos de urbanização,

combinados com a histórica desigualdade social, resultaram em aglomerações que

concentram muitos problemas: favelas, cortiços, enchentes, desmoronamentos,

poluição do ar e das águas, desmatamentos, impermeabilização do solo, infância

abandonada, violência etc.

O processo de crescimento urbano excludente e especulativo expulsa para a

periferia desurbanizada e ilegal – loteamentos irregulares e favelas – grande parte

da população. Os Planos Diretores, bem como o controle sobre o uso e a ocupação

do solo, se restringem a uma parcela da cidade, legal e urbanizada.

Uma cidade menos desigual e ambientalmente sustentável exige, entre

outras condições, a aplicação da função social da propriedade – prevista no

Estatuto da Cidade – e recursos financeiros bem aplicados para infra-estrutura

(saneamento, drenagem, transporte, iluminação, etc), habitação social e

equipamentos coletivos. Para isso, o poder público e a sociedade civil têm

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convergido esforços no sentido de elaborar e implementar efetiva Política

Nacional de Desenvolvimento Urbano, que seja orientadora dos planos,

investimentos e ações no âmbito federal, estadual e municipal.

A pergunta que se faz é quanto à possibilidade de construção de um pacto

federativo, apoiado pela sociedade civil, visando a dar novos rumos para o

crescimento e para a gestão de nossas cidades e metrópoles e reduzindo, pela

metade, os loteamentos irregulares e as favelas, de modo que suas populações

venham a ocupar áreas legais e urbanizadas.

16. DESIGUALDADE SOCIAL

É consensual que a questão da concentração de renda no Brasil é um dos

mais sérios entraves ao desenvolvimento econômico, com repercussões diversas

sobre inúmeros indicadores de bem-estar social. É a chamada “dívida social”, que

precisa ser honrada.

O Brasil ocupa a 72ª posição no ranking do Índice de Desenvolvimento

Humano (IDH) da ONU/PNUD, o que o coloca no grupo de países de

desenvolvimento humano médio.

A combinação média de índices de educação, longevidade e renda – índices

que compõem o IDH – levou o Brasil em 2003 a um IDH de 0,777, conforme

mostra o quadro a seguir, extraído do Relatório de Desenvolvimento Humano

(RDH), do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD), e do

Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

Municípios brasileiros (**)

RDH de 2003 (*)

BrasilMáximo Mínimo Variação

Países ricos Mundo

Longevidade 0,71 0,886 0,512 42,22% 0,89 0,70

Educação 0,90 0,975 0,546 44% 0,96 0,75

Renda 0,72 0,896 0,343 61,72% 0,93 0,72

Média 0,777 ***************************** 0,927 0,723

(*) Dados coletados em 2001. (**) Fonte: IBGE, censo de 2000.

Entretanto, milhões de pessoas ainda vivem na extrema pobreza, seja qual

for o indicador de pobreza e indigência utilizado. Em 2002, os pobres

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133

representavam 30,6% da população (52,3 milhões de pessoas) e os extremamente

pobres 11,6% (20 milhões de pessoas), utilizando-se o salário mínimo como

referência (1/2 e 1/4 do salário mínimo per capita de renda familiar,

respectivamente).

Houve nos últimos anos uma acentuada queda na incidência da pobreza. O

Brasil praticamente cumpriu o primeiro Objetivo de Desenvolvimento do Milênio,

que é “reduzir pela metade, entre 1990 e 2015, a proporção da população com

renda inferior a 1 dólar PPC (paridade do poder de compra) por dia”. De 1990 a

2000, o percentual de brasileiros abaixo dessa linha de pobreza caiu de 8,8 para

4,7%. Ou seja, a meta de 4,4% da população em situação de pobreza em 2015 já

foi praticamente alcançada.

Ainda assim há diversos motivos para preocupação. A partir de 1996, o

patamar de pobres e de extremamente pobres se manteve relativamente estável, o

que representa um indício de que a trajetória de queda pode ter se revertido. Além

disso, a desigualdade de renda permanece como um sério entrave ao

desenvolvimento humano do Brasil. Segundo o relatório de 2004, do Programa

das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD), o índice de Gini(*) do

Brasil é de 0,59, um dos mais elevados do mundo, o que nos coloca em 120º

lugar, entre as 127 nações onde houve a pesquisa. Os melhores índices do mundo

são da Dinamarca, do Japão, da Suécia e da Bélgica (em torno de 0,25). Como

referência, podem ainda ser citados países como a China (0,48 - 84º), Rússia (0,46

- 93º), os Estados Unidos da América (0,41 – 75º), a Itália (0,38 - 52º) e a Índia

(0,32 - 34º).

Alguns setores da sociedade, no entanto, têm se posicionado contra aquilo

que chamam de políticas assistencialistas, ampliando a discussão e a

conscientização sobre os problemas associados à desigualdade e à pobreza.

(*) O índice de Gini mede o grau de desigualdadeexistente na distribuição de indivíduos segundo a rendadomiciliar per capita. Seu valor varia de 0, quando não hádesigualdade (a renda de todos os indivíduos tem o mesmovalor), a 1, quando a desigualdade é máxima (apenas umindivíduo detém toda a renda da sociedade e a renda de todosos outros indivíduos é nula).

A pergunta que se faz é quanto à possibilidade de que seja reduzida a

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desigualdade social no Brasil, aproximando os índices disponíveis dos valores

apresentados pelos países desenvolvidos.

17. DIVERSIDADE CULTURAL BRASILEIRA

O mercado nacional tem sido atravessado, nas últimas décadas, pela mídia

global. A presença de poderosos agentes estrangeiros no âmbito da produção e do

consumo não se traduz apenas em importação da cultura estrangeira, mas abre

espaço também para a exportação de bens e serviços brasileiros, embora seja

pequena a nossa participação nesse mercado internacional. Esse movimento se

acelera com as novas redes midiáticas globais (Internet, TV por satélite) e

dificulta a ingerência do Estado nos fluxos culturais.

A internacionalização realizada sob hegemonia de grandes grupos da mídia

e da indústria de entretenimento reforça a tendência à mercantilização da cultura.

A produção cultural brasileira influencia a de outras nações e é por elas

influenciada, favorecendo o florescimento da nossa diversidade em suas múltiplas

dimensões – inclusive regional e étnica – e possibilitando o incremento da

presença brasileira na cena cultural internacional.

Nossa diversidade cultural, em suas múltiplas dimensões, possui

características que permitem ampliar nossa inserção na cena internacional,

facilitando, inclusive, a captação de recursos externos.

A pergunta que se faz é quanto à possibilidade de que a diversidade cultural

brasileira contribua para aumentar o valor agregado da “marca Brasil” nos bens e

serviços exportados, tornando significativa a presença da cultura na pauta de

exportações.

18. VIOLÊNCIA E CRIMINALIDADE

Os atuais índices de violência e criminalidade no Brasil estão entre os mais

altos do mundo. Expande-se o uso de drogas, com o conseqüente crescimento do

tráfico e de seu poder econômico. O crime organizado intimida e corrompe

instituições públicas e privadas.

Regiões metropolitanas estão afetadas pela criminalidade. Empresas têm se

afastado dos grandes centros por falta de segurança, diminuindo a arrecadação

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tributária local e contribuindo para que sejam ampliadas as demandas sociais,

especialmente nas áreas de baixa renda. Multiplicam-se as empresas privadas de

segurança, suprindo as deficiências do poder público junto às classes mais

favorecidas e às empresas que, em última instância, repassam ao consumidor os

custos da segurança.

Determinadas regiões de fronteira têm sido palco de ilícitos transnacionais,

particularmente relacionados ao tráfico de drogas e ao contrabando, inclusive de

armas, com reflexos no restante do País.

As soluções que se apresentam são tão complexas como a conjuntura que

envolve a temática da criminalidade e da violência. Políticas sociais de caráter

preventivo, como educação, emprego e desconcentração de renda, por exemplo,

são eficazes em longo prazo, enquanto os aparatos repressivos, baseados nos

sistemas judiciário, penitenciário e policial, destinam-se a medidas de efeito

imediato.

A pergunta que se faz é quanto à possibilidade de que as políticas sociais, o

sistema policial e o sistema judiciário sejam fortalecidos e modernizados,

permitindo a redução, pela metade, dos atuais índices de criminalidade e

violência.

19. SISTEMA PREVIDENCIÁRIO

O Estado brasileiro enfrenta uma série de desafios no setor previdenciário.

Primeiramente, o Regime Geral de Previdência Social (RGPS), voltado para

trabalhadores do segmento privado da economia, vem apresentando crescentes

déficits (que foram de R$ 28,6 bilhões em 2003 e de R$ 32,7 bilhões em 2004,

ambos em valores de dezembro do último ano). As propostas para a estabilização

e reversão destas necessidades de financiamento variam: vão desde a migração

para um sistema de capitalização individual (realizada, na América Latina, em

países como Chile e Argentina) até o fortalecimento e a ampliação da base de

contribuintes do atual regime de repartição (no qual as contribuições dos

trabalhadores da ativa financiam os benefícios recebidos pelos que estão,

atualmente, aposentados).

Outra frente é a aproximação das regras que regem os Regimes Próprios de

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Previdência Social (RPPSs, dos servidores públicos) daquelas que regem o

Regime Geral, de maneira a eliminar situações que possam ser entendidas como

privilégio para um grupo socialmente pequeno de trabalhadores. A Reforma

Previdenciária, aprovada no final de 2003, pode ser entendida como um primeiro

passo, certamente não conclusivo, na direção de uma maior convergência das

regras.

Somados, RGPS e RPPSs ainda fornecem uma cobertura baixa aos

trabalhadores brasileiros. Dados do Ministério da Previdência Social indicam que

proteção previdenciária atinge apenas seis em cada dez trabalhadores. Os demais

estão sujeitos aos chamados riscos sociais (como acidente, doença, morte,

envelhecimento etc).

Finalmente, há o desafio de consolidar um marco regulatório seguro e um

aparato de supervisão consistente para uma expansão cada vez maior do mercado

de previdência privada no País. Apenas dessa maneira, o Brasil poderá ter um

segundo pilar de previdência forte, de caráter complementar.

A pergunta que se faz é sobre a possibilidade de que o Brasil consiga

estruturar um sistema previdenciário financeiramente equilibrado, com regras

equânimes para trabalhadores da iniciativa privada e para servidores públicos e

capaz de proporcionar adequada proteção ao trabalhador brasileiro.

20. PERFIL ETÁRIO DA POPULAÇÃO

Estudos com base nos dados da Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e

Estatística (IBGE) indicam que o Brasil deverá ter entre 210 e 220 milhões de

habitantes em 2022, caso a taxa de fecundidade – que em 2000 estava em 2,4

filhos por mulher – decresça para cerca de 1,7, seguindo a tendência atual.

Com relação às crianças, especialistas afirmam que a queda da natalidade

faz com que o número de dependentes (crianças) fique menor do que a População

Economicamente Ativa (PEA). Este fato ocorre desde 1985 e deverá se prolongar

até 2020. Provavelmente, ao final desse período, haverá um ponto de inflexão,

voltando a PEA a ser menor do que o número de dependentes e ensejando um

redirecionamento das políticas públicas, particularmente nas áreas de saúde e

educação.

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No que diz respeito aos idosos, um fator consensual nesses estudos é o

aumento da expectativa de vida. A tendência é que, em 2022, a população com

mais de 60 anos de vida represente, em termos percentuais, o dobro da atual,

requerendo maiores recursos e políticas específicas para a terceira idade,

principalmente nas áreas de saúde e previdência social. Contudo, essas demandas

poderão ser minimizadas pelo progresso da medicina, pela capacitação das

pessoas da terceira idade e pelo aumento da produtividade da mão-de-obra.

As conclusões apontam, assim, para uma PEA menor, em relação às

crianças e aos idosos, que será onerada pelas novas demandas sociais decorrentes.

A pergunta que se faz é quanto à possibilidade de que o Brasil esteja

capacitado a atender às possíveis demandas sociais geradas pelo futuro

crescimento dos dependentes (crianças e idosos).

21. SISTEMA ÚNICO DE SAÚDE (SUS)

A Constituição Federal de 1988 consagrou como dever do Estado e direito

de todos os cidadãos o acesso universal e igualitário às ações e serviços de saúde,

criando o Sistema Único de Saúde (SUS).

Vários foram os avanços proporcionados por esse sistema:

- ampliação do acesso aos cuidados de saúde, com destaque para o

Programa de Agentes Comunitários de Saúde (PACS) e o Programa de Saúde da

Família (PSF);

- ampliação da oferta de consultas com especialistas, inclusive com dentistas

a partir da implantação dos Centros de Especialidades Odontológicas (CEO) e de

exames complementares;

- melhor distribuição de leitos hospitalares com ampliação de leitos de UTI,

reorganização do acesso às urgências e emergências, com destaque para

implantação do Serviço Móvel de Urgência (Samu);

- ampliação do Sistema Nacional de Transplantes e ampliação do acesso aos

medicamentos com destaque para o Programa Farmácia Popular e produção de

genéricos;

- expansão dos gastos com a saúde e criação dos fundos de saúde, que

possibilitaram maior autonomia de estados e municípios; e

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- implementação do Cartão Nacional de Saúde.

Em que pese o grande progresso alcançado, são grandes as dificuldades para

que as ações e serviços de saúde sejam ofertados de modo eficiente, eqüitativo e

com qualidade.

Especialistas indicam que os gastos com saúde efetuados pelas famílias são

o quarto grupo mais volumoso de despesas de consumo, atrás apenas de

habitação, alimentação e transporte. Esses dispêndios têm impacto muito maior

sobre os rendimentos das famílias mais pobres. Os gastos com medicamentos dos

10% mais pobres da população representam, em média, quase 1/4 do rendimento

dessas famílias.

A pergunta que se faz é quanto à possibilidade de ampliar o acesso ao

Sistema Único de Saúde (SUS), melhorando a qualidade dos serviços ofertados.

22. AÇÕES AFIRMATIVAS DE INCLUSÃO SOCIAL

O estabelecimento de cotas raciais para o acesso ao ensino superior, ao

serviço público e a outras atividades tem sido fruto de uma acalorada discussão

por parte da sociedade.

Alguns setores afirmam ser o sistema de cotas o único instrumento capaz de

permitir que os grupos étnico-raciais discriminados possam ter acesso ao sistema

de ensino e ao mercado de trabalho, possibilitando a busca pela equidade e

mobilidade social.

No outro lado, existem os que defendem que o sistema de cotas, em vez de

permitir maior integração racial, poderá se tornar um instrumento que contribuirá

para a segregação racial, podendo gerar sérios conflitos sociais. Acrescentam

ainda, que em alguns países essa política vem sendo questionada, uma vez que a

mesma tem sido insuficiente para promover a equidade sócio-racial.

A pergunta que se faz é quanto à possibilidade de que o sistema de cotas

raciais contribua, efetivamente, para a integração dos grupos étnico-raciais

discriminados e sua mobilidade social, sem gerar segregação racial.

23. NÍVEL DE EMPREGO

A taxa de desemprego é um dos indicadores do mercado de trabalho. A taxa

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de desemprego é fruto da dinâmica de dois outros indicadores relevantes: a taxa

de ocupação, que espelha a demanda por mão-de-obra; e a taxa de participação,

que reflete a oferta de empregos.

Períodos de crescimento econômico podem registrar, ao mesmo tempo,

aumento da ocupação e do desemprego, bastando para isso que o aumento na taxa

de participação (retorno ao mercado daqueles anteriormente desestimulados) seja

superior àquele da taxa de ocupação. Por esta razão, maior ênfase é conferida ao

comportamento da taxa de ocupação, quando se deseja avaliar o andamento do

mercado de trabalho no que se refere à geração de renda para as famílias.

No período anterior ao Plano Real, o mercado de trabalho gerou, em termos

líquidos, cerca de 400 mil postos, entre 1991 e 1993, o que equivale a um

crescimento médio de 0,5% ao ano. Entre 1994 e 1996, foram criados mais de 1

milhão de postos, no mercado urbano. Houve nova estagnação entre 1996 e em

meados de 1999 (0,5% ao ano). Entre o segundo semestre de 1999 e 2000, houve

crescimento acentuado na ocupação. Em 2001 ocorreu nova estagnação (0,6% ao

ano). Em 2004, foram gerados mais de 1,5 milhão de postos de trabalho formais,

representando um aumento de 6,55% em relação ao ano anterior.

A pergunta que se faz é quanto à possibilidade da geração de emprego (taxa

de ocupação) crescer a uma taxa superior a 2% ao ano, vale dizer,

significativamente acima do crescimento anual observado desde 1991, de forma a

absorver, pelo menos, o crescimento vegetativo da população em idade ativa.

24. DESIGUALDADES REGIONAIS

Desde os primórdios do processo de desenvolvimento brasileiro, os modelos

de crescimento econômico têm gerado condições extremas de desigualdades, que

se manifestam: entre as regiões; entre os estados; entre o meio rural e o urbano; e

no interior das metrópoles. Essa disparidade econômica se reflete na qualidade de

vida da população; na distribuição de renda; na expectativa de vida; na

mortalidade infantil; e no analfabetismo, entre outros aspectos.

Governo e sociedade têm elaborado propostas de diminuição dos

desequilíbrios regionais e espaciais, levando em conta as oportunidades

apresentadas pela enorme diversidade brasileira que possui características e

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potencialidades, que podem ser aproveitadas para promover o desenvolvimento de

cada área. Essas propostas têm indicado uma nova concepção para o

desenvolvimento, estruturada sobre objetivos estratégicos que destaquem as

vantagens competitivas locais, estimulando o empreendedorismo e a gestão

pública, com controle social. Além disso, indicam que um novo contrato de

desenvolvimento deverá ser realizado entre os atores sociais locais, suas

organizações e o poder público, considerando uma lógica de distribuição setorial

de recursos que leve em consideração a realidade territorial, que seja

direcionadora de projetos pragmáticos e que aproveite as vantagens locais.

A pergunta que se faz é quanto à possibilidade de que as características e

potencialidades de cada área geográfica venham a ser aproveitadas pelo governo e

pela sociedade, incorporando nova concepção de elaboração de projetos de

desenvolvimento, a ponto de reduzir significativamente as desigualdades

regionais.

25. ORDENAMENTO DO TERRITÓRIO BRASILEIRO

A organização político-espacial do território brasileiro tem sido objeto de

intensos debates face aos novos requerimentos do desenvolvimento em relação

aos territórios, principalmente em termos de ativos físicos, humanos, governança

local e qualidade de vida.

A geografia das desigualdades já não obedece a um traço homogêneo, onde

as Regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste concentravam a maioria dos bolsões

de pobreza e analfabetismo. Nas duas últimas décadas, o mapa da pobreza

transformou-se, mostrando uma crescente dispersão em todo território brasileiro,

sobretudo no interior das regiões metropolitanas. Ao mesmo tempo, surgem novos

pólos dinâmicos de prosperidade e riqueza em áreas outrora atrasadas ou pouco

ocupadas, como é o caso do Centro-Oeste e certas sub-regiões do Nordeste.

A abertura econômica do País e a possibilidade de explorar a sua imensa

diversidade trouxeram novos desafios para a oferta de infra-estruturas. Uma visão

integrada do território nacional, deste com a América do Sul e do subcontinente

com o mercado global passaram a compor a agenda de desenvolvimento.

Do mesmo modo, o papel da construção de uma rede equilibrada de cidades,

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com novos pólos urbanos ao Oeste do Brasil, está em discussão. Numa sociedade

fortemente voltada para serviços, a projeção de uma rede de cidades torna-se o

centro do debate do planejamento territorial do Brasil para os próximos anos.

Diante de uma nova e complexa desigualdade regional, há uma percepção

generalizada de que o combate às assimetrias é cada vez mais um problema

nacional e não mais de áreas isoladas.

Todavia, embora essa conjuntura permita antever a possibilidade de um

reordenamento do território brasileiro, seus críticos alegam que a criação de novos

estados, territórios ou municípios acarretará uma multiplicação de órgãos públicos

(assembléias, secretarias, tribunais etc), ampliando significativamente os custos da

burocracia estatal, em detrimento dos investimentos destinados à infra-estrutura

econômica e ao desenvolvimento social.

A pergunta que se faz é quanto à possibilidade de que ocorra um

reordenamento político-administrativo territorial do Brasil, de modo a contribuir

para a construção de uma federação mais equilibrada em termos sociais, políticos

e econômicos.

26. RECURSOS DO MAR

Os direitos do Estado costeiro abrangem as águas interiores, o mar

territorial, a zona contígua, a zona econômica exclusiva (ZEE) e a plataforma

continental (PC), conforme definido pela Convenção das Nações Unidas sobre

Direito do Mar (CNUDM), assinada em Montego Bay (Jamaica, 1982) e ratificada

pelo Brasil em 1994.

Em seu art. 56 a CNUDM reconhece, na zona econômica exclusiva, que se

estende da linha de base da costa até a 200 milhas marítimas (uma milha marítima

é igual a 1.852 metros), os direitos de soberania do Estado costeiro “para fins de

exploração e aproveitamento, conservação e gestão de recursos naturais, vivos ou

não vivos, das águas sobrejacentes ao leito do mar, do leito do mar e de seu

subsolo, e no que se refere a outras atividades com vista à exploração e

aproveitamento da zona para fins econômicos, como a produção da energia a

partir da água, das correntes e dos ventos”. É reconhecida, ainda, ao Estado

costeiro a jurisdição no que concerne à colocação e utilização de ilhas artificiais,

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instalações e estruturas, investigação científica marinha e proteção e preservação

do meio marinho.

Na plataforma continental, que pode se estender além da ZEE, alcançando

até 350 milhas marítimas da linha de base da costa, é reconhecido o direito de

soberania da utilização dos recursos vivos e dos recursos minerais do leito e do

seu subsolo. Para que o Estado costeiro tenha esse direito é necessário que

apresente à Comissão de Limites da Plataforma Continental da ONU os estudos

realizados que comprovem que a sua plataforma continental se estenda além das

200 milhas marítimas. O Brasil foi um dos primeiros países do mundo a

apresentar a sua proposta em setembro de 2004, delimitando a sua última

fronteira, a fronteira para o leste.

A zona econômica exclusiva (ZEE) mais a plataforma continental (PC)

brasileira somam uma área de quase 4,5 milhões de Km2, que está sendo chamada

de “Amazônia Azul”, por envolver imensos recursos naturais, com destaque para

o petróleo, de onde é extraído quase 90% do total produzido pelo País. Também é

necessário que o Brasil estabeleça os limites de captura sustentável de recursos

vivos, principalmente pescados, da ZEE e que efetivamente seja capaz de explorá-

los, sob pena de ter que ceder seus direitos para terceiros países, o que poderá se

configurar como um potencial foco de futuras crises internacionais.

A pergunta que se faz é quanto à possibilidade de o Brasil vir a ter a

capacidade de gerir sustentavelmente os recursos existentes na zona econômica

exclusiva e na plataforma continental, em conformidade aos acordos

internacionais.

27. USO E CONSERVAÇÃO DA ÁGUA DOCE

A água doce é um bem finito e de fundamental importância para a

sobrevivência do homem. Apesar disso, sua utilização vem ocorrendo de forma

inadequada, aumentando sua escassez em diversas regiões do planeta. Diversas

nascentes e mananciais são, atualmente, objeto de acordos e programas

internacionais, que garantem a repartição eqüitativa desse recurso, evitando que a

água se transforme num objeto gerador de conflitos entre países. O Brasil possui

rios que cruzam fronteiras internacionais e sua maior fonte de água potável – o

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Aqüífero Guarani – se estende sob o território brasileiro, paraguaio, argentino e

uruguaio.

O Brasil tem buscado implementar programas de racionalização e uso

sustentável de seus recursos hídricos. Para isso, formulou e aprovou uma política,

considerada uma das mais avançadas do mundo, por trazer, em seu texto,

instrumentos tradicionais e modernos de gestão dos recursos hídricos. O governo

vem desenvolvendo diversas ações, no sentido de estabelecer uma gestão

descentralizada e participativa desse recurso, cuja materialização começa a

ocorrer por meio das instalações de Comitês de Bacias Hidrográficas.

Observa-se que o desrespeito à legislação ambiental, por parte de diversos

setores usuários dos recursos hídricos (agricultura irrigada, saneamento, indústria,

mineração, transporte, turismo etc.), associado à fragilidade institucional dos

órgãos encarregados do seu monitoramento e fiscalização, têm contribuído para o

agravamento da disponibilidade e da qualidade dos recursos hídricos.

Se, por um lado, é pequena a possibilidade de que o Brasil venha a estar

envolvido em conflito mundial nas próximas décadas, motivado pela posse de

fontes de água doce, por outro, poderá ter de enfrentar contenciosos regionais em

função, por exemplo, da poluição de cursos d’água transfronteiriços e de

aqüíferos. É possível, ainda, que venham a ocorrer disputas internas entre os

diversos setores usuários dos recursos hídricos, em função da escassez de água

e/ou do comprometimento de sua qualidade.

A pergunta que se faz é quanto à possibilidade de que ocorram eventuais

contenciosos que envolvam o Brasil, com relação ao comprometimento da

qualidade e do uso dos recursos hídricos.

28. AMAZÔNIA

O potencial da Região Amazônica, baseado em exuberantes recursos

naturais, é reconhecidamente imenso, assim como seus problemas. O governo

federal, em parceria com os estados e municípios amazônicos, tem buscado

implementar uma série de programas e projetos de desenvolvimento sustentável.

Tais ações visam a preservar os direitos e as culturas dos povos da floresta; apoiar

as experiências de novas formas de produção e uso sustentável dos recursos

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144

naturais; e valorizar os conhecimentos locais.

Recentemente, o Sistema de Proteção da Amazônia (Sipam) – considerado

como um importante passo para o fortalecimento da presença do Estado na região

– iniciou suas operações. Contudo, inúmeros problemas afligem as populações

locais, com reflexos em todo o País: contrabando de armas; tráfico de drogas;

garimpo ilegal; exploração ilícita de madeira; desmatamento acelerado com a

supressão das reservas legais; redução das áreas de preservação permanente;

expropriação da biodiversidade (biopirataria); confrontos entre indígenas,

garimpeiros, proprietários rurais e posseiros; missões religiosas irregulares e a

serviços de terceiros; associação de índios com contrabandistas e estrangeiros;

contrabando de animais silvestres e de recursos naturais; e ameaça de

transbordamento da crise colombiana.

Essa conjuntura não é restrita ao território brasileiro, mas comum, em

muitos aspectos, a todos os países do chamado Arco Amazônico (Bolívia, Brasil,

Colômbia, Equador, Guiana, Peru, Suriname e Venezuela). Esse quadro enseja a

possibilidade de integração desses países na busca de soluções comuns e

pragmáticas, evitando o aumento das pressões de grupos estrangeiros que,

objetivando a exploração comercial das riquezas da Amazônia, defendem a tese

de sua internacionalização.

A pergunta que se faz é quanto à possibilidade de que o Brasil implemente

efetiva política de desenvolvimento sustentável para a Amazônia e estabeleça

processos de cooperação internacional, de sorte a reduzir as pressões externas

sobre a região.

29. SISTEMA DE DEFESA NACIONAL

O fim da Guerra Fria não trouxe a almejada era de paz. Extremismos

étnicos, nacionalistas e religiosos têm gerado novos conflitos e o quadro de

incertezas do mundo atual exige dos governos nacionais o fortalecimento de sua

defesa externa e expressão militar. Conceitos tradicionais como soberania,

autodeterminação e identidade nacional permanecem relevantes, mercê de um

quadro de desigualdade internacional onde algumas nações, por meio do poder

econômico, político e militar, procuram subjugar outros povos, com o propósito

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de manter seu domínio econômico e o acesso privilegiado às fontes de matérias-

primas e mercados.

A América do Sul, embora distante dos grandes focos mundiais de tensão e

constituindo a região mais desmilitarizada do planeta, não está livre de conflitos.

A disputa por recursos minerais, a pesquisa e a industrialização de recursos

advindos da biodiversidade, a posse de grandes mananciais de água doce, a

exploração da plataforma continental e o controle da Amazônia podem tornar-se

focos de tensões no futuro, envolvendo o Brasil e demais países da América do

Sul em conflitos gerados por compromissos assumidos em acordos internacionais

ou em conseqüência de ameaças ao patrimônio e interesses comuns na região.

Os sistemas de defesa das nações da América do Sul poderão continuar

autônomos, como ocorre atualmente, ou se consolidar em um sistema coletivo de

defesa, como ocorre na União Européia.

A pergunta que se faz é quanto à possibilidade de que o Brasil fortaleça sua

capacidade de defesa, isoladamente ou como parte de um sistema coletivo de

defesa com os países vizinhos, para enfrentar novas ameaças e desafios, garantir a

proteção de seu território e respaldar negociações de âmbito internacional.

30. MATRIZ BRASILEIRA DE COMBUSTÍVEIS

A matriz energética mundial esta apoiada no petróleo. Estudos publicados

em 2004 informam que as reservas mundiais de petróleo, se mantido o atual nível

de consumo, giram em torno de 41 anos, e as brasileiras, 18 anos. Novas

prospecções são feitas cotidianamente, permitindo inferir que novos poços

poderão ser encontrados, afastando a possibilidade de escassez imediata do

produto. Faz-se, hoje, um vigoroso esforço para o desenvolvimento de novas

fontes renováveis, limpas e econômicas de energia, que possam gradualmente

substituir os derivados de petróleo – recurso finito e poluente.

Entre as novas fontes de energia, destacam-se os biocombustíveis, como o

etanol, produzido a partir da cana-de-açúcar, e o biodiesel, produzido a partir do

dendê, da mamona, da soja e outras oleaginosas. O Brasil tem marcante vantagem

comparativa na produção de biocombustíveis, pois detém a tecnologia, solo, clima

e água requeridos para a produção em larga escala. A crescente demanda global

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por combustíveis mais limpos ensejam investimentos na indústria de etanol no

Brasil e a possibilidade de incrementar as exportações. O gás natural é outra

importante alternativa ao óleo diesel e à gasolina, graças às recentes descobertas

em solo brasileiro e à construção do gasoduto Brasil-Bolívia.

Atualmente, a composição da matriz brasileira de combustíveis é de 86% de

derivados de petróleo, 2% de gás natural e 12% de biocombustíveis.

Especialistas indicam que, comparada à produção atual, o crescimento da

produção de cana-de-açúcar, para 2015, será da ordem de 33% e, para 2022, 66%.

Com relação à da utilização do gás no transporte, estima-se um crescimento da

ordem de 18% ao ano.

A pergunta que se faz é quanto à possibilidade de que os biocombustíveis e

o gás natural passem a representar, cada um deles, pelo menos 20% da matriz

brasileira de combustíveis, em 2015, e 30%, em 2022.

31. INFRA-ESTRUTURA

A reorganização da infra-estrutura coloca-se no centro do debate do

desenvolvimento, justamente pela forte influência que exerce sobre os demais

setores da economia. A insuficiência de investimentos nesta área tende a levar ao

surgimento de gargalos que poderão inviabilizar um ciclo de crescimento

sustentável.

No que se refere à logística, por exemplo, a deterioração das condições dos

transportes de carga aumenta os custos dos fretes, afetando negativamente a

competitividade das empresas. Já no caso do transporte urbano, os baixos

investimentos pioram a qualidade dos serviços e aumentam o tempo médio de

deslocamentos diários nas grandes cidades, onerando os trabalhadores e

aumentando os custos para os empregadores.

O setor de energia merece especial atenção, por representar condição básica

para o desenvolvimento. Seus projetos normalmente demoram a entrar em

operação, exigem vultosos recursos e demandam longo prazo para retorno dos

investimentos, dificultando as parcerias com o empresariado.

Os recentes esforços no sentido de reorientar os orçamentos públicos e atrair

a iniciativa privada conseguiram elevar o volume de recursos destinados à infra-

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estrutura de 0,5% para 1,7% do PIB, entre 2004 e 2005, segundo instituições

especializadas no setor. Contudo, especialistas indicam que seriam necessários

investimentos anuais na ordem de 3% a 5% do PIB, especialmente em energia e

logística, para manter o Brasil competitivo em relação ao mercado global.

A pergunta que se faz é quanto à possibilidade de que o País eleve os

investimentos totais em infra-estrutura para no mínimo 3,5% do PIB, até 2015, e

5%, até 2022, contribuindo para o desenvolvimento econômico e social.

32. QUALIDADE DO ENSINO

A qualidade do ensino é um dos maiores desafios da área educacional.

Apesar das importantes melhoras dos indicadores quantitativos nos últimos anos,

tais como a universalização do acesso à educação primária, a redução das taxas de

evasão e de repetência e o aumento no número de matrículas, a qualidade da

educação brasileira parece não se alterar. Essa baixa qualificação é também

responsável por piores salários, dificultando e até mesmo impedindo a ascensão

social das classes menos favorecidas.

Avaliações de desempenho dos estudantes brasileiros mostram que o nível

dos alunos continua muito baixo, apesar dos esforços empenhados pelos governos

federal, estaduais e municipais, e muito ainda há que ser feito nesse sentido.

Em pesquisa realizada em 2001, no âmbito do Programa Internacional de

Avaliação de Alunos (Pisa) – desenvolvido e coordenado pela Organização para

Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) – os alunos brasileiros de 15

anos de idade obtiveram, na prova de leitura, a 37ª posição entre os representantes

dos 41 países participantes. Segundo o Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas

Educacionais (Inep), do Ministério da Educação, nas provas de ciências e

matemática o desempenho foi ainda pior, com o Brasil ficando em penúltimo

lugar.

A precária formação dos professores da educação básica, o baixo nível

salarial da categoria, a pouca valorização da profissão e a falta de envolvimento

da comunidade com a escola são algumas das causas apontadas para a baixa

qualidade da educação no Brasil. Há, todavia, uma crescente conscientização da

sociedade para a importância da educação, ensejando a adoção de efetivas

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políticas que possibilitem a melhoria desse quadro, em âmbito nacional.

A pergunta que se faz é quanto à possibilidade de haver uma progressiva

melhora da qualidade do ensino básico no Brasil, de modo a posicioná-lo entre os

20 melhores países, em 2015, e entre os 15 melhores, em 2022.

33. EDUCAÇÃO BÁSICA

No Brasil, tem havido, nos últimos anos, um processo de conscientização da

população frente ao valor e à importância da educação para o desenvolvimento do

país e dos cidadãos brasileiros. Atendendo às crescentes demandas, a União, os

estados e os municípios têm desenvolvido diversos programas educacionais, com

relativo sucesso, embora ainda persistam graves problemas estruturais, tais como

a má qualidade do ensino e o pouco tempo médio de permanência na escola.

O Brasil é signatário da Declaração do Milênio das Nações Unidas, que tem

como segundo objetivo “alcançar o ensino primário universal”, e cuja meta é

“cuidar para que, no ano de 2015, todas as crianças possam terminar um ciclo

completo de ensino primário”. Esse ciclo completo equivale, no Brasil, ao período

da 1ª à 4ª série do ensino fundamental.

Uma das mais importantes metas do Plano Nacional de Educação (PNE) é

"universalizar o acesso ao ensino fundamental (1ª a 8ª série) e garantir a

permanência de todas as crianças de 7 a 14 anos na escola". Atualmente, 8,8% das

crianças nessa faixa etária estão fora da escola. No sexto ano de aplicação do

plano, a oferta obrigatória de ensino fundamental deverá se estender para cada

criança a partir dos 6 anos de idade.

As nações mais desenvolvidas consideram que para preparar o jovem para o

mercado de trabalho no Século XXI é necessário universalizar a educação básica,

que, no Brasil, compreende a educação infantil, o ensino fundamental (1ª a 8ª

séries) e o ensino médio (1ª a 3ª séries), totalizando no mínimo 11 anos de

permanência na escola.

O PNE é mais ambicioso do que as metas da ONU (ensino primário), ao

propor a universalização do ensino fundamental (8 anos), porém, não alcança os

padrões das nações mais desenvolvidas, que é universalizar a educação básica (11

anos).

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149

A pergunta que se faz é quanto à possibilidade de que, na faixa etária

adequada, seja alcançada a universalização da educação básica (educação infantil

+ ensino fundamental + ensino médio), cumprindo não só os Objetivos do Milênio

acordados na ONU, como também ampliando as metas definidas pelo atual Plano

Nacional de Educação.

34. ENSINO SUPERIOR

O Plano Nacional de Educação (PNE), aprovado pela Lei no 10.172, de 9 de

janeiro de 2001, estabelece como metas para a educação superior, entre outras,

“prover, até o final da década (janeiro de 2011), a oferta de educação superior

para, pelo menos, 30% da faixa etária de 18 a 24 anos” e “estabelecer uma política

de expansão que diminua as desigualdades de oferta existentes entre as diferentes

regiões do País”.

Para democratizar o acesso ao ensino superior público e gratuito, o governo

federal vem investindo na expansão e criação de novas instituições e na realização

de concursos públicos para a ampliação de seus quadros docentes e

administrativos.

As dificuldades, todavia, são muitas. Atualmente apenas 9% dos jovens

brasileiros, na citada faixa etária, estão cursando o ensino superior, contra 40%

nos países desenvolvidos, ensejando um efetivo incremento nas ações e a

participação dos mais diversos segmentos da sociedade para alcançar os níveis

desejados.

A pergunta que se faz é quanto à possibilidade de que cerca de 35% da

população brasileira, na faixa etária entre 18 e 24 anos, esteja incluída no sistema

de ensino superior, até 2015, e 40%, em 2022.

35. INCLUSÃO DIGITAL

As novas tecnologias de informação e comunicação têm se tornado

acessíveis a uma parcela crescente da população brasileira, apesar das

desigualdades sociais e regionais. Programas de inclusão digital têm sido

desenvolvidos pelo governo e entidades da sociedade civil, destacando-se a

utilização dos softwares livres como meio para a inclusão de grande número de

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pessoas.

Computadores, internet e telefones celulares tendem a, progressivamente,

ser parte do cotidiano da maior parte da população, inclusive a de baixa renda.

Atualmente, cerca de 15% das residências brasileiras têm computador e cerca de

30% da população, telefone celular. O acesso à internet nas classes A e B chega a

cerca de 80%, aproximando-se do índice observado em países mais ricos, embora

na classe C esse percentual caia para 23% e nas classes D e E seja de apenas 6%.

O acesso a computadores e redes é apenas um aspecto da inclusão. As

tecnologias digitais estão sendo crescentemente incorporadas a serviços públicos

(telemedicina, telebancos, controle e monitoramento de transportes públicos, etc),

garantindo o acesso universal aos benefícios dessas aplicações. O próprio

desenvolvimento da TV Digital poderá combinar as características tradicionais da

televisão com as do computador pessoal, permitindo a comunicação, a partir de

um canal interativo, com um portal de serviços on-line, que poderá universalizar

os benefícios da informação e contribuir para a inclusão digital de parcela

significativa da população.

A pergunta que se faz é quanto à possibilidade de se promover a progressiva

inclusão digital da população brasileira, elevando seu acesso a computadores,

redes de comunicação e serviços digitais a mais de 60%, em 2015, e mais de 80%

em 2022.

36. TECNOLOGIAS DE INFORMAÇÃO E COMUNICAÇÃO (TICS)

A convergência das tecnologias de telecomunicação e de informática,

propiciada pela representação de qualquer conteúdo de comunicação e de

informação na forma digital, foi um dos grandes impulsionadores da economia do

final do século XX. A capacidade de uma nação dominar tais tecnologias é,

reconhecidamente, um fator crítico para o seu desenvolvimento econômico e

social. Entende-se aqui por "capacidade de dominar" a mobilização de todo um

conjunto de ações que se fazem necessárias para gerar conhecimento científico e

técnico nesta área, produzir bens e serviços que empreguem tecnologias de

informação e comunicação (TICs) e utilizar de forma adequada estes bens e

serviços como base para o crescimento e produtividade da economia e para criar

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uma sociedade mais justa e equânime.

O impacto econômico das TICs advém de duas razões principais. A primeira

é que esta revolução tecnológica permeia todos os demais setores, da produção

primária até o setor de serviços, que por sinal, é o principal demandador de TICs.

Embora a questão dos efeitos quantitativos das TICs sobre a produtividade total

da economia de um país ainda seja objeto de discussões, é inegável o impacto, no

mínimo qualitativo, que as TICs têm sobre a organização da produção e na

constituição das redes de valor no mundo globalizado. A segunda razão é o

potencial de mudanças nas cadeias setoriais, seja pela reconfiguração dos papéis,

seja pelo surgimento de novos atores ou ainda pelo desaparecimento de outros,

tragados pela onda de inovações que as TICs carregam.

De qualquer forma, as TICs precisam ser extensiva e intensivamente

incorporadas na economia brasileira de maneira a sustentar o seu crescimento,

tanto no ambiente do comércio internacional quanto na modernização dos setores

tradicionais e no desenvolvimento de novos setores.

A publicação do Banco Mundial, "2004 World Development Indicators",

ainda tomando por base dados de 2002, apontou uma despesa com TICs per capita

no Brasil da ordem de US$ 205, correspondendo ao 37º lugar num ranking de

despesas com TICs per capita, como medida da produção e consumo de bens e

serviços baseados em TICs. Isto é quase 10 vezes menos que o dispêndio dos

EUA (US$ 2.358 – 1º lugar) e 3 a 4 vezes menos que o da República da Coréia

(US$ 645 – 25º lugar) e o dos países da Europa mediterrânea, como Grécia (US$

604 – 26º lugar), Portugal (US$ 697 – 24º lugar), Espanha (US$ 734 – 23º lugar) e

Itália (US$ 898 – 22º lugar). Outros países emergentes apresentaram números

muito variados: China, US$ 58 (45º lugar); Índia, US$ 13 (48º lugar); África do

Sul, US$ 225 (36º lugar). A vizinha Argentina também apresentou um número

baixo, US$ 95 (41º lugar).

Apesar das dificuldades em se medir, de forma acurada, a penetração das

TICs, o índice acima é bastante abrangente quanto à medida do impacto

econômico das TICs, porquanto engloba despesas com produtos e serviços

baseados em TICs adquiridos por residências, empresas, governos; despesas com

desenvolvimento próprio (principalmente software); e despesas com

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telecomunicações e equipamentos de automação de escritório.

A pergunta que se faz é quanto à possibilidade de o Brasil estar entre os 25

países com maior produção e consumo de bens e serviços de TICs per capita, em

2015, e entre os 20, em 2022.

37. BIOTECNOLOGIA

As pesquisas científicas e tecnológicas, associadas à produção industrial,

tendem a impor novos paradigmas com velocidade maior do que o previsto,

confirmando as observações de estudiosos do progresso científico da humanidade

de que a aceleração nas descobertas e inovações não é apenas constante, mas

crescente.

Advogam muitos especialistas que o Século XXI será o Século do

Conhecimento, no qual parte do poder mundial será redirecionado para os países

que dominarem as novas tecnologias capazes de causar impactos inovadores nos

mercados internacionais e na vida cotidiana das nações.

Nesse contexto, a biotecnologia tem sido apontada como uma das mais

promissoras fronteiras do conhecimento, pela possibilidade de agregar valor ao

imenso potencial da biodiversidade presente no território nacional. Todavia, a

competitividade nesse setor é precedida da criação de empregos altamente

especializados, exigindo vultosos investimentos, públicos e privados, na formação

de recursos humanos.

Especialmente no tocante à biotecnologia derivada dos progressos

resultantes do conhecimento genético, descobertas inéditas e complexas têm sido

levadas à opinião pública mundial, ensejando acaloradas discussões sobre a base

ética das pesquisas, bem como sobre o controle regulamentar cabível dos Estados

sobre as mesmas.

A pergunta que se faz é quanto à possibilidade do Brasil acompanhar a

evolução da biotecnologia, de maneira a participar competitivamente no mercado

internacional.

38. PROGRAMAS TECNOLÓGICOS EM ÁREAS SENSÍVEIS

Para acompanhar as fronteiras do conhecimento, o Brasil desenvolve

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diversos programas de alta tecnologia em áreas sensíveis. O potencial nacional

para o setor aeroespacial é promissor, pois a Base de Alcântara, no Maranhão,

situada próxima à linha do Equador, oferece condições geográficas que permitem

uma redução substancial nos custos de lançamentos. Outro exemplo dessas

tecnologias é a construção de um Veículo Lançador de Satélite (VLS). Nossos

cientistas já detêm suficiente conhecimento para participar de projetos de

construção de satélites de comunicações e de sensoriamento remoto.

O País também desenvolve um programa nuclear que compreende os

diferentes aspectos do uso da energia nuclear, seja sob o ponto de vista energético,

tecnológico, ambiental ou de suas aplicações na medicina, agricultura e na

indústria. A energia nuclear representa não apenas uma das alternativas a mais

para se gerar energia, mas todo um sistema tecnológico com diversas aplicações e

opções consideradas estratégicas. O objetivo atual do programa nuclear brasileiro,

com destaque para o Projeto Aramar, é o domínio da tecnologia do ciclo do

combustível nuclear e do projeto de reatores nucleares para geração de energia

elétrica, de forma autônoma, sem a participação de parceiros internacionais.

Recentemente, uma demonstração da capacitação das equipes técnicas nacionais

envolvidas no programa nuclear foi dada através do domínio da tecnologia do

enriquecimento de urânio pelo processo das centrífugas de gás. A tecnologia de

enriquecimento do urânio é dominada por apenas oito países em todo mundo. Na

medicina e na engenharia o uso de radioisótopos é indispensável e permanecerá

para sempre como um dos benefícios que o desenvolvimento da tecnologia

nuclear trouxe para a humanidade, especialmente para o diagnóstico e tratamento

do câncer, de doenças neurológicas e cardíacas. O País tem por meta a auto-

suficiência na produção de radiofármacos na próxima década.

Há crescente conscientização da sociedade sobre a importância do domínio

dessas tecnologias. Contudo, os países mais avançados restringem ao máximo a

transferência dessas tecnologias, afirmando que são de emprego dual, ou seja,

podem ser usadas tanto para fins pacíficos como bélicos. Outro obstáculo para o

sucesso de programas desse tipo tem sido a escassez de verbas e a irregularidade

na sua liberação, uma vez que os bons resultados exigem continuidade e são de

longa maturação.

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A pergunta que se faz é quanto à possibilidade de o Brasil tornar-se um

importante ator internacional no desenvolvimento e comércio de tecnologias

sensíveis, com fins pacíficos.

39. NANOTECNOLOGIA

É crescente a conscientização da sociedade sobre a importância do

desenvolvimento científico e tecnológico para melhorar a competitividade dos

nossos produtos, gerar divisas e aumentar o bem-estar social. A nanotecnologia

desponta como uma nova e promissora fronteira de inovação do conhecimento

que poderá contribuir para a redução do atraso científico-tecnológico do Brasil em

relação aos países desenvolvidos.

O Brasil já possui satisfatório estoque de conhecimento em nanotecnologia,

embora ainda seja inacessível para a maioria da sociedade, em especial os

pequenos e médios empresários, não obstante o impacto esperado dessa tecnologia

no mercado de bens tangíveis. A nanotecnologia permitirá às indústrias

desenvolverem moléculas com características específicas para o produto que se

deseja construir e que não estejam disponíveis em estado natural. Essa

possibilidade terá um impacto avassalador sobre os produtos e sistemas de

produção que não se adaptarem a esta nova realidade científico-tecnológica.

O governo, a comunidade acadêmica e o setor empresarial têm estudado

propostas no sentido de estabelecer uma política de nanotecnologia que aproxime

a pesquisa acadêmica das empresas e também que fomentem a demanda das

indústrias por novos produtos de base nanotecnológica. Contudo, para que essa

nova tecnologia se torne realidade no Brasil são necessários elevados

investimentos de recursos públicos e privados.

A pergunta que se faz é sobre a possibilidade de que o Brasil venha a ser um

importante ator internacional em produtos baseados em nanotecnologia.

40. INVESTIMENTOS EM CIÊNCIA, TECNOLOGIA E INOVAÇÃO

Os investimentos em Ciência, Tecnologia e Inovação (CT&I) têm sido

caracterizados por certa instabilidade no volume dos recursos financeiros. As

aplicações realizadas pelo governo federal no triênio 1998/2000, por exemplo,

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foram inferiores às do período 1994/1997. Destaca-se, ainda, a baixa participação

do setor privado nos investimentos nacionais em Pesquisa e Desenvolvimento

(P&D), estimada em pouco mais de 1/3 do total; e a natureza tímida da concessão

de incentivos fiscais à inovação, sendo que os mecanismos existentes hoje têm

pouco foco na geração de patentes e processos inovadores, concentrando-se em

montagem de equipamentos, como é o caso da Lei de Informática.

O Brasil investe menos de 1% do seu Produto Interno Bruto (PIB) em

atividades de P&D, enquanto os países mais avançados e alguns países de

industrialização recente, como a Coréia do Sul, estão investindo entre 2% e 3%.

Além da menor intensidade do esforço brasileiro e do menor montante absoluto

dos recursos, os países desenvolvidos também dispõem de uma infra-estrutura

mais adequada e, portanto, mais eficiente.

Há uma crescente conscientização da sociedade no que se refere à

importância do desenvolvimento científico e tecnológico para melhorar a

competitividade dos nossos produtos, gerar divisas para o País e aumentar o bem-

estar social. O governo tem procurado ampliar os recursos destinados à P&D, mas

também buscado incentivar as empresas privadas para que aumentem sua

participação no setor de CT&I.

A pergunta que se faz é quanto à possibilidade de que sejam aumentados os

investimentos públicos e privados em Ciência, Tecnologia e Inovação, alcançando

cerca de 2% do PIB em 2015, e 3% do PIB em 2022.

41. BIODIVERSIDADE

A biotecnologia tem sido apontada como uma das mais promissoras

fronteiras do conhecimento. Governos e empresas de todo o mundo têm investido

vultosos recursos em pesquisa e desenvolvimento (P&D) nessa área, com

resultados que já beneficiam a sociedade e proporcionam significativo retorno aos

investidores.

O Brasil dispõe de enorme potencial para a exploração científica e

tecnológica da biodiversidade, mas ressente-se de políticas adequadas para o

desenvolvimento de programas específicos, seja pela carência de recursos

financeiros, seja por não ter o domínio de grande parte das tecnologias

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pertinentes. Existem propostas para a criação de um adequado arcabouço que

garanta a pesquisa e a exploração de nossas riquezas naturais. A pesquisa nacional

de biodiversidade deverá, prioritariamente, permitir a definição do manejo

sustentável dos recursos naturais, preservando as riquezas e a diversidade de

nossos biomas.

As dificuldades, porém, são muitas. A fraca presença estatal em áreas de

inexplorada biodiversidade – como a Amazônia e o Pantanal – facilitam a atuação

de biopiratas. Além disso, países desenvolvidos, como os Estados Unidos, não

aceitam discutir o combate à biopirataria, no âmbito dos fóruns internacionais.

A pergunta que se faz é quanto à possibilidade de o Brasil implementar

políticas que lhe permitam pesquisar e explorar, de forma soberana, os recursos de

sua biodiversidade, evitar as ações danosas da biopirataria e estabelecer o manejo

sustentável de nossos biomas.

42. PROTOCOLO DE QUIOTO

O Protocolo de Quioto foi estabelecido em 1997 para implementar as

decisões acordadas na Convenção das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas.

Seu principal objetivo é que os países industrializados reduzam e passem a

controlar as emissões de gases que causam o efeito estufa. Embora os Estados

Unidos – responsáveis pela emissão de cerca de 25% desses gases – se recusem a

participar, a recente adesão da Rússia foi suficiente para que o Protocolo entrasse

em vigor.

O acordo estipulado prevê uma redução de 5% (considerando-se os registros

de 1990) entre 2008 e 2012, sendo que o período subseqüente será objeto de novas

negociações. Os países industrializados signatários deverão reduzir as suas

emissões em âmbito doméstico e/ou terão a possibilidade de adquirir de outros

países os chamados “créditos de carbono”, aproveitando os "mecanismos

flexíveis", em especial o Mecanismo de Desenvolvimento Limpo (MDL). Por esse

mecanismo, o Brasil poderá ofertar créditos de carbono, desenvolvendo projetos

de redução de emissões ou absorção de carbono.

Estima-se que o mercado mundial de créditos de carbono poderá

movimentar entre US$ 2,5 bilhões e US$ 10 bilhões por ano. O Brasil tem grande

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potencial e significativas vantagens comparativas, uma vez que dispõe de vasto

território, de uma matriz energética “limpa” e de áreas agrícolas em processo

contínuo de produção.

A pergunta que se faz é quanto à possibilidade de o Brasil contar, em 2015,

com cerca de 10% do mercado mundial de créditos de carbono e, em 2022, com

aproximadamente 20% desse mercado.

43. BRASIL, RÚSSIA, ÍNDIA E CHINA

A sigla BRIC (Brasil, Rússia, Índia e China) foi difundida a partir de um

estudo produzido pelo Grupo Goldman Sachs, datado de 1° de outubro de 2003,

que afirma que até o ano de 2050 essas nações poderão estar entre as cinco

maiores economias do mundo, caso façam uso de seus grandes potenciais.

Também chamados de emergentes, esses países têm em comum grandes

territórios, grande população, investimentos crescentes em Ciência, Tecnologia e

Inovação (CT&I), alguns avanços na área social – principalmente em saúde e

educação – e economias que buscam mais acesso aos mercados mundiais. Juntos,

representam significativa parcela do mercado consumidor do planeta, a ponto de

influir decisivamente no comércio internacional. Existe também um espaço

crescente de interação e ação conjunta desses países, ou de parte deles, em fóruns

multilaterais, como no caso da Organização Mundial do Comércio.

Contudo, para que ocorra a integração desse grupo é preciso que sejam

vencidas algumas dificuldades, tais como as grandes distâncias e as profundas

diferenças culturais e religiosas. Além disso, os países desenvolvidos continuam a

manter um quadro restrito de consultas e decisões entre si e no âmbito de

organismos multilaterais. Movimentos recentes no âmbito de organismos como o

G-8 vêm ampliando um pouco esses marcos, com a inclusão tópica, justamente,

dos países do grupo BRIC. Todavia, é patente o interesse na manutenção dos

emergentes, basicamente, como mercados consumidores de produtos de alto valor

agregado e exportadores de produtos primários.

A pergunta que se faz é quanto à possibilidade de que Brasil, Rússia, Índia e

China venham a constituir novo pólo de poder mundial.

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44. BLOCO POLÍTICO-ECONÔMICO NO CONTINENTE AMERICANO

As associações de países em blocos comerciais têm sido a mais viva

expressão do processo de globalização econômica atualmente em curso. São

exemplos disso a União Européia e, no continente americano, o Nafta (o Acordo

de Livre Comércio Norte-Americano) que integra, desde 1994, as economias do

Canadá, do México e dos Estados Unidos. Por iniciativa deste último, vem sendo

discutida a criação da Área de Livre Comércio das Américas (Alca).

O conjunto de 34 países envolvidos na negociação da Alca representa

aproximadamente a metade do comércio exterior e dos investimentos externos no

Brasil. Essa negociação encontra-se praticamente estagnada por divergências em

relação ao escopo e método do processo de integração, principalmente entre os

Estados Unidos e o Brasil.

A pergunta que se faz é quanto à possibilidade de que a Alca se concretize,

num quadro de equilíbrio e considerando os interesses brasileiros.

45. BLOCO POLÍTICO-ECONÔMICO DO MERCOSUL

As associações de países em blocos comerciais têm sido a mais viva

expressão do processo de globalização econômica atualmente em curso. A União

Européia, reunindo antagonismos históricos sob uma moeda única e,

possivelmente, uma constituição única, é exemplo de sucesso mundial como obra

de engenharia política. Na América do Sul, o Mercosul (Mercado Comum do Sul)

reúne Brasil, Argentina, Uruguai e Paraguai e já conta com a adesão, como

membros associados, do Chile, da Bolívia e do Peru, além de ter iniciado as

negociações com outros países, como a Venezuela.

As dificuldades, contudo, são muitas. Há um tácito reconhecimento de que o

Mercosul tem avançado em ritmo muito aquém do desejado, em uma conjuntura

marcada pela necessidade de um fortalecimento regional que proporcione

melhores condições de negociação em âmbito global.

A pergunta que se faz é quanto à possibilidade de que o Mercosul complete

sua integração, instituindo um mercado comum unificado baseado na livre

circulação de bens e serviços.

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46. BLOCO POLÍTICO-ECONÔMICO DA AMÉRICA DO SUL

O Mercosul não é o único projeto de integração em curso no espaço sul-

americano. Recentemente, têm ocorrido negociações para a formação de uma área

de livre comércio reunindo todos os países da América do Sul, a qual, se

concretizada, reservará para o Brasil um importante papel no subcontinente, com

as obrigações econômicas, políticas e de segurança daí decorrentes. Um

importante passo nesse sentido foi o acordo assinado, em 18 de outubro de 2004,

aproximando o Mercosul e a Comunidade Andina de Nações (CAN), instalando

as bases para o processo de integração. A Comunidade Andina de Nações é

formada por Bolívia, Colômbia, Equador, Peru e Venezuela.

As tentativas de integração no continente americano, todavia, têm

encontrado sérias dificuldades. Há um reconhecimento tácito de que o Mercosul

tem avançado em ritmo muito lento, em uma conjuntura marcada pela necessidade

de um fortalecimento regional que proporcione melhores condições de negociação

em âmbito global. E a negociação da Área de Livre Comércio das Américas

(Alca) encontra-se praticamente estagnada por divergências em relação ao escopo

e método do processo de integração, principalmente entre os Estados Unidos e o

Brasil.

A pergunta que se faz é quanto à possibilidade de que venha a existir um

“espaço econômico integrado” na América do Sul, com papel de destaque do

Brasil e as obrigações econômicas, sociais, culturais, políticas e de segurança daí

decorrentes.

47. MERCOSUL E UNIÃO EUROPÉIA (UE)

Estão em curso negociações entre o Mercosul e a UE para o estabelecimento

de um acordo de livre comércio. O potencial de trocas é promissor, uma vez que

as economias entre os dois blocos são, em grande parte, complementares. A

importância política e econômica desse acordo pode ser comparada à da Área de

Livre Comércio das Américas (Alca).

Contudo, a instabilidade do Mercosul e os vultosos subsídios agrícolas

praticados pelos europeus representam expressivos obstáculos à concretização de

um tratado de integração comercial.

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A pergunta que se faz é quanto à possibilidade de que seja efetivado um

acordo de livre comércio entre o Mercosul e a União Européia, incrementando

significativamente o comércio entre as regiões e o intercâmbio cultural entre os

países participantes.

48. ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS (ONU)

A ONU é uma instituição criada no imediato pós II Guerra Mundial e seu

objetivo básico é promover a paz e a segurança mundiais através da cooperação

entre os países membros. Entretanto, a ONU segue sendo uma instituição com

baixa influência no ordenamento da paz e da segurança internacionais. Em 1996,

iniciou-se um programa de reforma, visando dar maior representatividade ao

processo decisório, mais realismo aos seus objetivos e procedimentos e,

conseqüentemente, maior eficácia às suas ações.

Alguns analistas advogam a adoção de um modelo bicameral, semelhante ao

da União Européia, em que as populações sejam proporcionalmente representadas

em uma câmara, e os Estados membros em outra. Outros apontam a necessidade

de corrigir deficiências de gestão e do gerenciamento de crises.

A pergunta que se faz é quanto à possibilidade de que o processo de reforma

da ONU seja efetivado, dando maior representatividade aos países membros e

maior eficiência às suas ações.

49. CONSELHO DE SEGURANÇA DAS NAÇÕES UNIDAS (CSNU)

O Conselho de Segurança das Nações Unidas (CSNU) é um órgão composto

por 15 países, sendo dez eleitos pela Assembléia Geral, por períodos de dois anos,

e cinco permanentes (China, Estados Unidos, França, Inglaterra, e Rússia), com

poder de veto. Conforme a Carta das Nações Unidas, os estados-membros são

obrigados a aceitar e a cumprir as decisões do Conselho, que detém a

responsabilidade primordial de manter a paz e a segurança mundiais.

Após o término da chamada Guerra Fria, os conflitos internacionais têm

sido objeto de intensas gestões diplomáticas junto ao CSNU. Todavia, os

resultados desses conflitos e as novas realidades econômicas, populacionais e

militares do planeta têm gerado uma forte demanda pela reforma desse organismo,

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com vistas a incorporar novos membros permanentes, como a Alemanha, o Japão,

a Índia, o Brasil e a África do Sul.

As disputas regionais e o posicionamento de alguns dos atuais membros

permanentes, contudo, são obstáculos de vulto que tornam complexas as

negociações diplomáticas em torno do assunto.

A pergunta que se faz é quanto à possibilidade de que o Brasil passe a

integrar, como membro permanente, o Conselho de Segurança das Nações Unidas.

50. ORDENAMENTO MUNDIAL EMERGENTE

Os Estados Unidos da América (EUA) são a principal potência econômica e

militar do mundo. Seus investimentos em Ciência, Tecnologia e Inovação

(CT&I), bem como em Pesquisa e Desenvolvimento (P&D), indicam que poderão

continuar por muito tempo nas fronteiras superiores dos mercados de alto valor

agregado. Além disso, sua supremacia militar não tem paralelo na história

moderna.

Vários fatores, contudo, levantam dúvidas quanto à permanência dessa

condição ímpar. Especialistas indicam que existe uma vulnerabilidade externa da

economia norte-americana, caracterizada pelo seu grande déficit comercial. Outro

fator é a ampliação e o fortalecimento da União Européia, que já conta com uma

moeda – o euro, que começa a ocupar maior espaço frente ao dólar, nos fluxos

financeiros internacionais – e se prepara agora para adotar uma política comum de

relações externas e de segurança. Finalmente, a ascensão da China e da Índia

como potências econômicas e militares, bem como a crescente dificuldade para

impedir o desenvolvimento de programas nucleares em países como Irã e a Coréia

do Norte, são aspectos que não devem ser desconsiderados.

A pergunta que se faz é quanto à possibilidade de que venham a surgir

novas potências no cenário mundial que venham a alterar o atual quadro

geopolítico mundial.

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11. ANEXO 2- Projeto Mauatur

TEXTOS SUBMETIDOS À CONSULTA DELPHI

EVENTOS, AMBIENTAÇÕES E PERGUNTAS.

Fonte: Conselho Gestor para a micro bacia hidrográfica do alto Rio Preto.Disponível em:http://www.crescentefertil.org.br/mantiqueiramaua/dados_mauataur.htm

ÍNDICE DE EVENTOS

1. Preservação da qualidade da água do Rio Preto...........................................1632. Pavimentação da estrada de acesso ..............................................................1633. Implantação dos comitês de gestão integrada ..............................................1634. Fiscalização municipal eficiente e atuante...................................................1645. Crescimento da economia nacional..............................................................1646. Implementação dos planos diretores municipais..........................................1657. Entrosamento dos prefeitos em prol da região.............................................1658. Coleta e destinação do lixo urbano ..............................................................1659. Construção de estações de tratamento de esgoto .........................................16610. Funcionamento das ONGs ...........................................................................16611. Consciência ambiental dos moradores .........................................................16612. Problemas de trânsito e estacionamento ......................................................16713. Pavimentação das estradas de circulação interna.........................................167

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1. PRESERVAÇÃO DA QUALIDADE DA ÁGUA DO RIO PRETO

A região de Visconde de Mauá está localizada dentro de uma Área de

Preservação Ambiental (APA) e tem no Rio Preto um de seus principais atrativos

turísticos. Por falta de políticas públicas – a região abrange três municípios e dois

estados, o que dificulta sobremaneira as verbas para o saneamento –, apesar dos

esforços das autoridades (Ibama), boa parte do esgoto doméstico acaba atingindo

o Rio Preto, o que tem tornado suas águas não-potáveis em grande parte do

percurso, principalmente entre a Maromba e a Vila de Mauá.

A questão se refere à probabilidade de que, até 31 de dezembro de 2010,

este problema não seja resolvido de modo satisfatório, agravando a qualidade da

água do Rio Preto a ponto de este deixar de ser uma atração turística para a região.

2. PAVIMENTAÇÃO DA ESTRADA DE ACESSO

A estrada de acesso à Região de Visconde de Mauá é pavimentada em

seus primeiros 15km (até Capelinha ou início da serra). Daí em diante, a estrada é

de terra e, em grande parte do ano, principalmente na época das chuvas, que vão

de outubro a abril, se encontra de maneira precária. Este fato reduz o fluxo

turístico, provocando problemas econômicos para os comerciantes e empresários

locais. Há uma intenção declarada por parte do governo do estado de asfaltar o

restante da estrada, provavelmente até 31 de dezembro de 2010.

A questão se refere à probabilidade de que, até 31 de dezembro de 2010,

esta estrada seja asfaltada.

3. IMPLANTAÇÃO DOS COMITÊS DE GESTÃO INTEGRADA

Com verbas internacionais, a ONG Crescente Fértil está desenvolvendo

um Projeto de Gestão Socioambiental para a microbacia do alto Rio Preto.

Este projeto tem como objetivo apresentar alternativas para a gestão

integrada da região por seus próprios moradores, incentivando os poderes

públicos a atuarem de maneira articulada, possibilitando, com isso, a prosperidade

da região, que sofre com a divisão político-administrativa. Para isso, o projeto

prevê a criação de um comitê-gestor formado por integrantes da sociedade

organizada e membros do poder público nas três esferas que tenham a

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possibilidade de atuar de modo deliberativo, integrando a cadeia de licenciamento

ambiental dos processos relativos ao uso do solo, bem como de aplicação de

futuras políticas públicas, quanto à utilização e à manutenção de recursos hídricos.

A questão se refere à probabilidade de que, até 31 de dezembro de 2010,

tendo sido este projeto concluído, o Comitê de Gestão Integrada esteja em pleno

funcionamento.

4. FISCALIZAÇÃO MUNICIPAL EFICIENTE E ATUANTE

A região está distante dos centros dos três municípios a que pertence, e

este fato impede uma fiscalização mais eficiente das Secretarias de Fazenda

Municipais, impactando severamente nas finanças públicas e criando um clima de

não-compromisso entre as partes: população e autoridades.

É claro que uma base arrecadadora ampliada permitiria um aumento de

recursos da prefeitura que, se aplicados em prol da comunidade, possibilitariam

uma melhor qualidade de vida aos moradores. Igualmente, o controle dos

estabelecimentos, incluindo fiscalização sanitária e de edificações, permitiria o

aumento na qualidade dos serviços prestados aos turistas, bem como do aspecto

paisagístico e urbanístico local.

A questão se refere à probabilidade de que, até 31 de dezembro de 2010,

as prefeituras locais implantem um sistema de fiscalização eficiente.

5. CRESCIMENTO DA ECONOMIA NACIONAL

A economia brasileira cresceu em 2004 mais de 4%. Todavia, o controle

estrito da inflação tem forçado o Banco Central a manter uma política de juros

altos, limitando o crescimento econômico do país.

Apesar de vivermos uma crise política, no momento verificamos que a

economia tem-se mantido saudável, com indicadores positivos, apesar de

modestos. Já existem agentes econômicos apostando num declínio constante da

taxa de juros a partir de setembro de 2005, o que permitiria a manutenção de um

processo de crescimento econômico sustentável.

A questão se refere à probabilidade de que, até 31 de dezembro de 2010,

o país possa manter a inflação sob controle e um crescimento médio no período

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acima de 4% ao ano.

6. IMPLEMENTAÇÃO DOS PLANOS DIRETORES MUNICIPAIS

A região já conta com planos diretores aprovados nos municípios de

Resende e de Itatiaia. O de Bocaina de Minas ainda não existe, visto que, por ter

menos de 20 mil habitantes, não tem obrigação de elaborar um plano diretor.

Apesar de existirem os planos diretores de Resende e Itatiaia, assistimos, de um

lado, à ineficiência das prefeituras em implementar suas diretrizes e controlar sua

efetivação, e, do outro, por parte da população, que deveria denunciar o

crescimento urbano desordenado.

A questão se refere à probabilidade de que, até 31 de dezembro de 2010,

as prefeituras passem a efetivamente controlar e exigir o cumprimento dos planos

diretores existentes.

7. ENTROSAMENTO DOS PREFEITOS EM PROL DA REGIÃO

A região de Visconde de Mauá está situada numa área que envolve três

prefeituras. Estas raramente conseguem se organizar e adotar políticas comuns.

Em março de 2005, os três prefeitos se reuniram na Vila de Mauá e assinaram um

termo de cooperação, visando à gestão integrada e à preservação ecológica da

região.

A questão se refere à probabilidade de que, até 31 de dezembro de 2010,

as prefeituras atuem de forma harmônica, visando à implementação das leis

existentes e futuras, que poderão ser criadas a fim de permitir a gestão integrada

da região.

8. COLETA E DESTINAÇÃO DO LIXO URBANO

Nos últimos dez anos, a Prefeitura de Itatiaia se responsabilizou pela

coleta de lixo em dois municípios: Bocaina e Itatiaia. Resende tem coletado na

Vila de Mauá. O lixo coletado tem sido levado para aterros sanitários em Resende

e Itatiaia. Ultimamente, esta prática tem sido contestada pelo Ministério Público,

pois os aterros estão saturados.

A questão se refere à probabilidade de que, até 31 de dezembro de 2010,

o poder público, junto com a comunidade, tenha encontrado uma solução

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sustentada para a coleta e a destinação do lixo urbano.

9. CONSTRUÇÃO DE ESTAÇÕES DE TRATAMENTO DE ESGOTO

Ultimamente, a SERLA tem noticiado a existência de verba advinda do

Programa de Gerenciamento da Bacia do Rio Paraíba do Sul para um projeto de

construção de estações de tratamento de esgoto (ETE), sendo uma na Maromba,

uma em Maringá e outra no Lote 10. Nas manifestações dos prefeitos locais, tem

restado clara a preocupação com o problema de tratamento de esgoto na região;

como prova disso, o prefeito de Itatiaia informou que pretende construir uma ETE

com verbas federais.

A questão se refere à probabilidade de que, até 31 de dezembro de 2010,

estas estações de tratamento de esgoto estejam funcionando.

10. FUNCIONAMENTO DAS ONGS

A ausência do poder público na região cria uma lacuna que deve ser

preenchida por entidades representativas de seus segmentos. Atualmente, existem

na região poucas dessas entidades, que não conseguem atender às demandas da

sociedade. É necessário um esforço conjunto no sentido de legitimar e apoiar as

organizações que, ultimamente, têm atuado de maneira visível na região. Torna-se

necessária, também, a criação de organizações com propósitos e áreas de atuação

específicas, principalmente as de caráter socioambiental.

A questão se refere à probabilidade de que, até 31 de dezembro de 2010,

as ONGs locais atuem de modo a atender às demandas da sociedade, buscando as

soluções para as questões de caráter socioambiental.

11. CONSCIÊNCIA AMBIENTAL DOS MORADORES

A região de Visconde de Mauá tem sido reconhecida por seu trabalho em

defesa do meio ambiente e da conscientização ambiental de seus moradores. Há

anos vêm sendo implantadas nas escolas locais matérias e atividades relacionadas

com o meio ambiente. Além das escolas, ONGs locais também têm contribuído

com eventos voltados à educação ambiental.

A questão se refere à probabilidade de que, até 31 de dezembro de 2010,

os esforços empreendidos pelas organizações e principalmente pela educação

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ambiental ensinada nas escolas alcancem um resultado significativo, com o

aumento da consciência ambiental dos moradores da região.

12. PROBLEMAS DE TRÂNSITO E ESTACIONAMENTO

A região de Visconde de Mauá se encontra encravada no alto Vale do

Rio Preto, situação geográfica desfavorável à expansão urbana e às vias de

circulação. Por essa razão, com o crescimento do turismo, estes problemas estão

se agravando, o que se tem constatado com a ocorrência de engarrafamentos em

feriados prolongados, que prejudicam a circulação dos turistas.

A questão se refere à probabilidade de que, até 31 de dezembro de 2010,

os governos municipais executem obras estruturais de modo a minimizar os

problemas de trânsito e estacionamento local.

13. PAVIMENTAÇÃO DAS ESTRADAS DE CIRCULAÇÃO INTERNA

A RJ151 é a estrada estadual que liga Rio Preto a Maromba (cerca de 20

km). Esta via é importantíssima para a circulação dos moradores e turistas. Os

primeiros, pela necessidade de se locomoverem de casa para o trabalho, e os

turistas, para poderem apreciar a região como um todo. Esta estrada é

malconservada e não-pavimentada. Este fato dificulta a circulação dos turistas,

impactando diretamente na economia local.

A questão se refere à probabilidade de que, até 31 de dezembro de 2010,

a RJ 151 esteja asfaltada.