Funcionamento adequado dos conselhos previstos no eca e loas

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Funcionamento adequado dos Conselhos previstos no ECA e LOAS: condição indispensável ao repasse de verbas públicas

Murillo José Digiácomo, Promotor de Justiça

A Constituição Federal, em seu art. 204, incisos I e II, estabelece como DIRETRIZES para as ações governamentais na área da assistência social a DESCENTRALIZAÇÃO político-administrativa e a PARTICIPAÇÃO DA POPULAÇÃO, por meio de ORGANIZAÇÕES REPRESENTATIVAS na FORMULAÇÃO DAS POLÍTICAS e no CONTROLE DAS AÇÕES em todos os níveis, o que se materializa através da criação e funcionamento dos CONSELHOS DE ASSISTÊNCIA SOCIAL a nível de União, estados e municípios.

Sistemática IDÊNTICA foi adotada pela Carta Magna para a área da criança e do adolescente, tendo o art.227, §7º da Constituição Federal se reportado às mesmas diretrizes acima referidas, que são melhor explicitadas pelo art.88, incisos I e II do Estatuto da Criança e do Adolescente, que prevê expressamente a MUNICIPALIZAÇÃO do atendimento à criança e ao adolescente, bem como a CRIAÇÃO DE CONSELHOS municipais, estaduais e nacional DOS DIREITOS DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE, como ÓRGÃO DELIBERATIVOS e CONTROLADORES DAS AÇÕES governamentais em todos os níveis, aos quais é ASSEGURADA A PARTICIPAÇÃO POPULAR PARITÁRIA por meio de ORGANIZAÇÕES REPRESENTATIVAS.

O Estatuto da Criança e do Adolescente ainda prevê a criação, EM CADA MUNICÍPIO, de ao menos UM CONSELHO TUTELAR, assim entendido como um órgão INDEPENDENTE, possuidor de PLENA AUTONOMIA FUNCIONAL, composto por (05) CINCO MEMBROS (INVARIAVELMENTE) ESCOLHIDOS PELA POPULAÇÃO local para um mandato de 03 (três) anos (art.132 da Lei nº 8.069/90).

São os Conselhos previstos na Constituição Federal, Lei Orgânica da Assistência Social e Estatuto da Criança e do Adolescentes verdadeiros espaços de DEMOCRACIA PARTICIPATIVA (art.1º, par. único, da Constituição Federal), através dos quais a própria população irá participar diretamente da elaboração e controle das políticas de atendimento aos beneficiários da assistência social, crianças e adolescentes.

E foi justamente pensando na importância da participação popular na elaboração e no não menos importante controle da execução das políticas públicas nas áreas acima referidas, é que tanto a Lei Orgânica da Assistência Social quanto o Estatuto da Criança e do Adolescente estabeleceram a implantação desses órgãos como CONDITIO SINE QUA NOM para o repasse de verbas públicas entre os entes federados.

Com efeito, consoante acima ventilado, dispõe o art.30 da Lei nº 8.742/93:

Art.30. É CONDIÇÃO para o repasse aos Municípios, aos Estados e ao Distrito Federal, dos recursos de que trata esta Lei, a EFETIVA INSTITUIÇÃO E FUNCIONAMENTO DE:

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I - CONSELHO DE ASSISTÊNCIA SOCIAL, de COMPOSIÇÃO PARITÁRIA ENTRE GOVERNO E SOCIEDADE CIVIL;

II - FUNDO DE ASSISTÊNCIA SOCIAL, de composição paritária entre governo e sociedade civil;

III - PLANO DE ASSISTÊNCIA SOCIAL.

(verbis - grifamos).

No mesmo diapasão dispõe a Lei nº 8.069/90, consoante se infere da inteligência de seu art.261, par. único:

Art.261. (...).

Parágrafo único. A União fica autorizada a repassar aos Estados e Municípios, e os Estados aos Municípios, os recursos referentes aos programas e atividades previstos nesta lei, TÃO LOGO ESTEJAM CRIADOS OS CONSELHOS DE DIREITOS DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE NOS SEUS RESPECTIVOS NÍVEIS.

(verbis - grifamos).

Assim sendo, caso o município não tenha implantado um Conselho Municipal de Assistência Social (C.M.A.S.), NÃO PODERÁ RECEBER RECURSOS PÚBLICOS DOS FUNDOS ESTADUAL E NACIONAL DA ASSISTÊNCIA SOCIAL, o mesmo se podendo dizer em relação à não implantação do Conselho Municipal de Direitos da Criança e do Adolescente (C.M.D.C.A.), que IMPOSSIBILITA O RECEBIMENTO, pelo município, DE RECURSOS DOS FUNDOS ESTADUAL E NACIONAL PARA A INFÂNCIA E ADOLESCÊNCIA (os chamados F.I.As.).

É deveras evidente que, quando a lei exige a implantação, também pressupõe o REGULAR FUNCIONAMENTO, não bastando a mera existência da lei que cria o Conselho respectivo e/ou seu funcionamento em total descompasso com os mandamentos legal e constitucional já mencionados.

Destarte, um "Conselho", seja da assistência social, seja de direitos da criança e do adolescente, que deixa de observar a COMPOSIÇÃO PARITÁRIA ENTRE GOVERNO E SOCIEDADE CIVIL ORGANIZADA, como por exemplo nos casos em que todos seus integrantes são nomeados ao talante do prefeito municipal e a ele estão politicamente comprometidos, a rigor sequer pode ser considerado um verdadeiro CONSELHO nos moldes do previsto na Constituição Federal, que como vimos SOMENTE PASSARÁ A EXISTIR E A TER LEGITIMIDADE para agir SE COMPOSTO POR REPRESENTANTES DO PODER PÚBLICO E SOCIEDADE CIVIL ORGANIZADA, em caráter PARITÁRIO.

De igual sorte, se o Conselho não estiver realizando reuniões periódicas, discutindo e DELIBERANDO acerca das políticas municipais para as áreas da assistência social (no caso do C.M.A.S.) e infância e juventude (no caso do C.M.D.C.A.), formulando os

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respectivos PLANOS DE AÇÃO E DE APLICAÇÃO DE RECURSOS para cada uma delas, TAMBÉM NÃO ESTARÁ EM EFETIVO FUNCIONAMENTO, o que igualmente IMPEDIRÁ O REPASSE DE VERBAS PÚBLICAS, ex vi dos dispositivos legais já mencionados.

Claro está, portanto, que a REGULAR COMPOSIÇÃO E FUNCIONAMENTO dos Conselhos Municipais de Assistência Social e de Direito da Criança e do Adolescente é CONDIÇÃO INDISPENSÁVEL ao recebimento, pelo município, de verbas públicas repassadas pelos governos Estadual e Federal, que ocorre normalmente via FUNDOS de Assistência Social e da Infância e Adolescência, que no âmbito estadual são GERIDOS pelos respectivos Conselho Estadual de Assistência Social e de Direitos da Criança e do Adolescente.

Importante também aqui destacar que, de modo a obter a comprovação de que os Conselhos Municipais de Assistência Social e de Direitos da Criança e do Adolescente estão funcionando de forma ADEQUADA aos ditames legal e constitucional já mencionados, os Conselhos ESTADUAIS da Assistência Social e de Direitos da Criança e do Adolescente passaram a exigir que nesse sentido seja firmada DECLARAÇÃO do Promotor OU Juiz de Direito da Comarca.

Em razão disto, é recomendável que estas autoridades públicas se envolvam cada vez mais nas atividades desses Conselhos, de modo a fiscalizar sua composição, inclusive no tocante à INDEPENDÊNCIA de suas alas não governamentais face o Poder Público local, bem como acompanhar suas atividades, seja na parte da ELABORAÇÃO das políticas de atendimento, seja no sentido de garantir a EFETIVA IMPLANTAÇÃO dessas políticas, vendo os planos de ação e de aplicação de recursos se materializando e, ao menos na área da criança e do adolescente, recebendo o tratamento PRIORITÁRIO devido na LEI ORÇAMENTÁRIA (ex vi do disposto no art.227, caput da Constituição Federal e art.4º, par. único, alíneas "c" e "d" da Lei nº 8.069/90).

Espera-se que Ministério Público e Poder Judiciário adotem a mesma postura INTRANSIGENTE no sentido de EXIGIR dos municípios que compõe a comarca a implantação e o regular funcionamento dos Conselhos acima nominados, aí incluindo o Conselho Tutelar (que para ser considerado como tal precisa ser composto INVARIAVELMENTE de CINCO MEMBROS, escolhidos pela população local), notadamente quando procurados por representantes do Poder Público municipal para prestar as declarações acima referidas, que obviamente somente poderão ser fornecidas quando a autoridade declarante tiver a CERTEZA de que os dados nela contidos correspondem à mais absoluta verdade, impedindo assim que um município que, POR LEI, NÃO TEM DIREITO ao recebimento de verbas públicas dos fundos acima mencionados, a elas tenham acesso sem maiores conseqüências e assim continuem a DESCUMPRIR de forma ACINTOSA e INJUSTIFICÁVEL os mandamentos legais e constitucionais que dão suporte e legitimidade aos Conselhos neste artigo referidos, situação que não mais pode perdurar.

Assim agindo, os chefes do Executivo local finalmente compreenderão que, apenas com o cumprimento da lei e da Constituição Federal, via implantação e REGULAR FUNCIONAMENTO (diga-se, autonomia, independência, efetiva elaboração das políticas para as áreas da assistência social e criança/adolescente, controle da implantação dessas mesmas políticas, composição paritária e representativa entre

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governo e sociedade civil para os conselhos da assistência social e direitos da criança e do adolescente, composição de cinco membros para o caso dos Conselhos Tutelares, com estrutura adequada ao exercício de suas atribuições, dentre outros aspectos acima abordados), é que poderão ter acesso às verbas públicas oriundas dos Fundos Nacional e Estadual alhures referidos, o que por certo lhes despertará a "vontade política" para assim o providenciar.

A partir de então restará apenas acompanhar o funcionamento dos Conselhos, cobrando-lhes o exercício de seus misteres legais e constitucionais, com a permanente capacitação de conscientização de todos os conselheiros acerca da importância de seu trabalho para toda população local, da qual se espera sejam legítimos representantes, agindo com a honradez e responsabilidade que seus mandatos populares impõe.