FUNDAMENTOS JURÍDICOS PARA A QUANTIFICAÇÃO DO DANO MORAL

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UNIVESIDADE FEDERAL DE PERNAMBUCO CENTRO DE CIÊNCIAS JURÍDICAS FACULDADE DE DIREITO DO RECIFE PÓS-GRADUAÇÃO EM DIREITO FUNDAMENTOS JURÍDICOS PARA A QUANTIFICAÇÃO DO DANO MORAL Da delimitação de parâmetros fixos para sua quantificação Autor: Kleber Salgado Bandeira Filho Orientador: Raimundo Juliano R. Feitosa Recife, 2003

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UNIVESIDADE FEDERAL DE PERNAMBUCO CENTRO DE CIÊNCIAS JURÍDICAS

FACULDADE DE DIREITO DO RECIFE PÓS-GRADUAÇÃO EM DIREITO

FUNDAMENTOS JURÍDICOS PARA A QUANTIFICAÇÃO DO DANO MORAL Da delimitação de parâmetros fixos para sua quantificação

Autor: Kleber Salgado Bandeira Filho

Orientador: Raimundo Juliano R. Feitosa

Recife, 2003

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Kleber Salgado Bandeira Filho

FUNDAMENTOS JURÍDICOS PARA A QUANTIFICAÇÃO DO DANO MORAL Da delimitação de parâmetros fixos para sua quantificação

Recife, 2003

Dissertação apresentada à Pós-Graduação em Direito da Universidade Federal de Pernambuco como requisito parcial para a obtenção do título de mestre em direito.

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Autor: Kleber Salgado Bandeira Filho.

Título: Fundamentos jurídicos para a quantificação do dano moral: da delimitação de

parâmetros fixos para sua quantificação.

Trabalho Acadêmico: Dissertação final de curso.

Objetivo: Obtenção do título de mestre em direito privado.

IES: UFPE/CCJ/FDR/PÓS-GRADUAÇÃO EM DIREITO

Área de Concentração: Direito Civil

Data de Aprovação: 05 de agosto de 2003

___________________________________

Dr. George Browne do Rego

___________________________________

Dr. Gustavo Ferreira Santos

_____________________________________

Dra. Fabíola S. Albuquerque

3

DEDICATÓRIA

Dedico este trabalho à Kleber Salgado Bandeira e

Maria das Graças Soares de Oliveira Bandeira,

meus queridos pais, que sempre me apoiaram em

todos os momentos de minha vida.

À Lidiane Barbosa Damacena, minha amada noiva,

mas antes de tudo uma amiga fiel e companheira

dedicada.

Aos verdadeiros amigos, que mesmo sem querer me

auxiliaram em muitos momentos difíceis.

À todas as pessoas que amo, que estão convivendo

e que conviveram, mais foram atender ao chamado

divino e que mesmo atravessando a película da

vida, ainda irradiam o calor de suas almas através

de minha memória.

4

AGRADECIMENTOS

Agradeço, primeiramente, a Deus, pois és minha estrela guia; és a

luz que ilumina o meu caminho; és tudo pois sem ti nada disso seria possível.

À toda minha família, por cederem seu apoio incondicional e

fortificarem-me nas infindáveis horas de pranto e cansaço.

Aos meus companheiros de curso: Luismar Dália Filho, João Eduardo

Cardoso Lourenço e José Baptista Neto, que tanto trabalharam, batalharam e

proporcionaram, junto a mim, momentos de descontração nas incontáveis viagens

que fizemos, buscando alcançar unidos a conclusão deste mestrado.

Ao meu orientador, Dr. Raimundo Juliano, exemplo maior de

dedicação ao ensino e estudo do direito, que ensinou-me acima de tudo a ter

paciência e perseverança, pois só assim conseguiria concluir este trabalho.

Enfim, agradeço a todos que estiveram ao meu lado, torcendo,

vibrando, sorrindo e chorando, pois vocês a todo momento não desanimaram e não

deixaram-me desanimar enquanto perfazia o árduo caminho do aperfeiçoamento.

5

RESUMO

Este é um trabalho crítico de pesquisa e análise dogmática dos

fundamentos jurídicos que possam delimitar a quantificação judicial da premissa

constitucional referente ao dano moral.

Tem por objetivo estabelecer elementos norteadores que possam servir

como base para um arbitramento mais eqüitativo do quantum indenizatório nos

casos que envolvem este tipo de dano extrapatrimonial, numa tentativa de eliminar

julgamentos anódinos ou excessivos.

Com esta finalidade, reserva-se à apreciação da literatura jurídica

estrangeira e pátria, ponderando ainda sobre alguns posicionamentos

jurisprudenciais, bem como a evolução do tema em ambas as fontes examinadas.

Apresenta-se, por fim, numa solução subjetiva, a delimitação objetiva dos

parâmetros necessários para uma arbitragem mais justa e fiel aos dogmas

constitucionais estabelecidos na Carta Magna de 88, que é o marco perambular para

os atuais posicionamentos sobre este assunto.

6

ABSTRACT

This is a critic work on the research and dogmatic analysis of the juridical

fundamental basis which can delimitate the judicial a mount of the constitutional

premise referring to the moral damage.

It intends to establish the guide elements that can be used as the basis for a

more equitable arbitrate of the indemnity “quantum” in the cases that include this kind

of extrapatrimonial loss, as an attempt to eliminate excessive or superficial

judgments.

Therefore, the finality of this dissertation is to undertake the appreciation of

the foreign and national juridical literary, still taking in consideration some judicious

positions, as well the evolution the theme in both examined sources.

Finally it presents, together with a subjective solution, the objective

delimitation of the necessary parameters for a more fair and faithful arbitrate for the

constitutional dogmas established by the Brazilian Federal Constitution of 1988 which

is the leading mark statement for the existing positions on this subject.

7

SUMÁRIO

INTRODUÇÃO .............................................................................................................................. 09

CAPÍTULO I

MORAL:

A BASE DE TODA NORMA CONDUTA SOCIAL

1.1 A problemática do estudo atual da moral no ordenamento jurídico................................ 14

1.2 Conceituação de moral ........................................................................................................ 16

1.3 A ética como ciência moral e sua distinção ...................................................................... 17

1.4 A co-relação entre direito e moral ...................................................................................... 20

1.5 Quimerismo moral: uma avaliação da dimensão moral nas ações humanas ................ 22

1.5.1 Aristóteles .............................................................................................…………………..... 23

1.5.2. Kant ………………………………………………………………………...….………………….. 25

1.5.3. Bentham …………………………………………………………………..………………………. 27

1.5.4. Jaspers ............................................................................................................................... 29

1.6. O dano moral: análise inicial e conceito ........................................................................... 33

CAPÍTULO II

FUNDAMENTOS QUANTITATIVOS DO DANO MORAL NAS EXPERIÊNCIAS DA LEGISLAÇÃO ESTRANGEIRA

2.1 Concepções internacionais congêneres relacionadas à natureza jurídica do dano moral ...........................................................................................................................................

36

2.2 Métodos quantitativos do dano moral empregados nos tentames internacionais ....... 39

8

CAPÍTULO III

AS BASES PARA QUANTIFICAÇÃO DO DANO MORAL NO DIREITO BRASILEIRO

3.1 Parâmetros quantitativos do dano moral na legislação pátria ......................................... 45

3.2 O dano moral na ótica doutrinária brasileira...................................................................... 48

3.3 Evolução jurisprudencial sobre o tema .............................................................................. 59

3.4 O hodierno posicionamento jurisprudencial sobre o tema .............................................. 69

CAPÍTULO IV

CRITÉRIOS QUANTITATIVOS PARA MENSURAÇÃO DO DANO MORAL

4.1. A necessidade da inclusão legal de critérios objetivos para a quantificação do dano moral: uma proposta na ótica subjetiva ...................................................................................

74

4.2 Disposição subjetiva sobre a natureza do dano moral ..................................................... 83

V - NOTAS FINAIS ....................................................................................................................... 85

VI – BIBLIOGRAFIA ..................................................................................................................... 87

9

INTRODUÇÃO

O objetivo deste trabalho é demonstrar a existência de elementos

norteadores que possam servir como base jurídica para um arbitramento mais

eqüitativo do quantum indenizatório do dano moral. Para tanto, posicionamo-nos

subjetivamente sobre o tema lançando uma proposta de aperfeiçoamento da

legislação pertinente, com a inclusão de critérios objetivos delimitadores no que

tange à quantificação do dano moral.

Com o advento da Carta Magna de 88 ficou confirmada tão somente a

teoria do dano moral puro, sem reflexos patrimoniais. Culminando o referindo texto

com os avanços jurisprudenciais obteve-se a cobiçada “conciliação e unidade de

rumo”1, ou seja, a aceitação da prerrogativa de que existe o dano moral e este é

indenizável. Entretanto, o texto constitucional não mencionou qualquer critério

objetivo explicativo ou limítrofe a ser seguido para sua mensuração. Nem mesmo as

Leis anteriores ou posteriores à Constituição Federal expuseram ou

complementaram de forma coesa esta falha, deixando ao “prudente”2 arbítrio judicial

a árdua tarefa de utilizar critérios subjetivos para quantificar o montante indene do

dano moral, divergindo assim entre os valores aplicados, mesmo em casos similares

1 SALAZAR, Alcino de Paula. Reparação do dano moral. Rio de Janeiro: Borsoi, 1983. intr., VII. 2 Devemos esclarecer que a palavra “prudente” foi inclusa entre aspas não para satirizar o bom senso judicial, mas para chamar a atenção de que, mesmo sendo o julgador dotado, em tese, de grande saber jurídico, o mesmo ainda é passível de erro e seu julgamento é passível de entendimentos opostos ou variados e possíveis modificações, uma vez que existe a possibilidade desta decisão oscilar entre o valor quantitativo exorbitante e o insignificante.

10

O presente trabalho centra-se na suplementação da carência de

dispositivos limítrofes para a quantificação do dano moral, uma vez que estes, como

foi dito anteriormente e salvo raras exceções, não estão dispostos objetivamente em

nossa legislação. Ante a esta disparidade de critérios, a dificuldade para liquidar o

quantum indenizatório recai unicamente ao arbítrio judicial, em outras palavras, é

apenas ao bom senso do juiz que cabe o ônus da quantificação eqüitativa. A

subjetividade passa a ser praticamente absoluta quando o arbitramento tem que ser

efetivado nos delicados casos em que se envolve a dor moral em face de um ato

ilícito de outrem, havendo uma grande dificuldade e disparidade entre os juristas no

que se refere à mensuração extrapatrimonial. Doutrinadores divergem e julgadores

confundem-se, arbitrando valores conforme melhor juízo sem no entanto poderem

embasar suas sentenças em dispositivos auxiliares específicos, logo, não possuindo

a convicção de que se está procedendo de forma correta ou mesmo se está

alcançando o bem maior pleiteado: a justiça.

Por este fato surgem vários questionamentos sobre o assunto: Será que a

mera subjetividade é suficiente para se obter um valor adequado a este tipo de

situação? Em que deve ou poderia se basear o julgador para arbitrar

eqüitativamente o quantum do dano moral? Quais critérios podem ser relevantes

para tanto? É possível delimitar estes fatores?

É com base nestes questionamentos que surge a relevância do tema

escolhido para este trabalho: informar quais fundamentos acreditamos ser corretos

para um justo arbitramento quantitativo nos casos em que envolvam lesões

imateriais. Trabalhando na hipótese da existência destas bases (elementos

delimitativos) deixamos nossa principal contribuição na forma de uma proposta de

redação para um dispositivo jurídico que trate sobre a matéria, pois, uma vez que

11

pretendemos com o desenvolvimento do trabalho dirimir muitas destas questões

sobre o assunto, acreditamos que a devida utilização das bases posteriormente

mencionadas poderão, realmente, auxiliar e nortear os atos judiciais para uma

decisão mais justa e eqüitativa.

Por tratar-se de uma pesquisa enfática em busca da solução das

conjecturas diversas quanto aos critérios limítrofes da quantificação do dano moral, o

cerne desta dissertação encontra-se delimitado no seio do Direito Privado, uma vez

que viemos realçar uma garantia constitucional e, numa pretensão pessoal, elaborar

um dispositivo de controle para delimitar o arbítrio judicial. Assim, procurando

enlaçar o tema, a radiciação laboral envolveu o ramo do Direito Civil e perfilou a

esfera Processual Civil, numa estreita cumplicidade, com nuances nas esferas Penal

e Constitucional, procurando uma solução harmoniosa ao problema a ser discutido.

Para tanto, optamos pela utilização dos métodos compilativo e científico3,

buscando, através da dogmática jurídica, nacional e estrangeira, bem como,

empiricamente, na jurisprudência, a seleção de critérios objetivos para a efetiva

quantificação do dano moral.

Visando uma melhor compreensão sobre o tema dividimos este trabalho

em quatro capítulos distintos, que retratam de forma coesa e gradativa os pontos

norteadores para a concepção final da obra.

O primeiro capítulo de nosso trabalho, volta-se a fornecer uma sólida base

estrutural para o desenvolvimento do tema, destilando a idéia individual da “moral”. A

devida concepção do valor quantitativo da indenização por danos morais encontram-

3 NUNES. Luiz Antônio Rizzato. Manual da monografia jurídica. 3ª ed., São Paulo: Saraiva. 2001. p. 19-31. Segundo este autor, o método compilativo ou trabalho de compilação consiste na exposição do pensamento dos vários autores que escreveram algo sobre o tema, harmonizando os vários pontos de vista para apresentar um panorama geral sobre seus posicionamentos. O método científico visa tornar o material coletado em algo útil à comunidade científica a qual se dirige, contribuindo para seu desenvolvimento.

12

se diretamente no conhecimento sobre a moral, sua extensão e efeitos, pois esta

rege todo ato e ordenamento jurídico e social. Este capítulo visa estabelecer um

vínculo inicial sobre o tema desta dissertação posteriormente discutido. Explanamos

aqui, seu conceito; análise do comportamento ético; seu relacionamento com o

direito; e como ela deve influenciar nas decisões, uma vez que sua figura muda de

acordo com seu local e época. Exemplificamos estas mudanças, analisando

algumas experiências e posicionamentos de seletos filósofos sobre a matéria. Por

fim, introduzimos a temática propriamente dita analisando a lesão moral.

O segundo capítulo traz à tona experiências internacionais congêneres

para que possam ilustrar ou fundamentar o arbitramento do dano moral em nosso

país. Será discutido a natureza do dano moral; e de que forma é tratada sua

mensuração do dano moral nestes países. Este tópico é necessário, pois relata

alguns exemplos que hipoteticamente poderiam ser adotados, mesmo que por

analogia, em nosso meio jurídico.

No terceiro capítulo o tema amadurece e se desenvolve, trazendo as

principais bases disponíveis e utilizadas em nosso ordenamento jurídico. Aqui

fazemos um aparato inicial sobre a atual legislação, enfatizando dispositivos legais;

demonstrando a gradativa evolução jurisprudencial; analisando e buscando esta

base no posicionamento doutrinário brasileiro; e levando o hodierno posicionamento

jurisprudencial sobre o tema.

Temos ainda, o quarto e último capítulo, onde deixamos transparecer a

necessidade da utilização de critérios objetivos bem como trazemos nossa proposta

de redação legislativa para o que acreditamos serem os parâmetros corretos para a

quantificação do dano moral e nos posicionamos quanto a sua natureza.

13

Finalizamos compilando os principais pontos desta dissertação, buscando

resolver as indagações da problemática que envolve este tema, inicialmente

propostas.

14

CAPÍTULO I

MORAL:

A BASE DE TODA NORMA CONDUTA SOCIAL

Sumário: 1.1 A problemática do estudo atual da moral no ordenamento jurídico. 1.2 Conceituação de moral; 1.3 A ética como ciência moral e sua distinção; 1.4 A co-relação entre direito e moral; 1.5 Quimerismo moral: uma avaliação da dimensão moral nas ações humanas; 1.5.1 Aristóteles; 1.5.2. Kant; 1.5.3. Bentham; 1.5.4. Jaspers; 1.6. O dano moral: análise inicial e conceito.

1.1 A problemática do estudo atual da moral no ordenamento jurídico.

Atualmente, em nosso cotidiano jurídico, uma temática vem ganhando

cada vez mais espaço em nossa esfera: a moral. Não a moral em si, mas a

reparabilidade deste bem quimericamente íntimo e particular que, influenciado pelos

preceitos sociais exteriores, acaba por tornar-se de natureza pública.

Porém, esquecem-se os estudiosos e aplicadores do Direito pátrio que o

problema não está essencialmente na possibilidade de reparação de um dano

abstrato ⎯ pois o acolhimento deste assunto tornou-se pacífico em nosso

ordenamento jurídico ⎯, mas encontra-se na extensão do suposto dano subjetivo

causado a uma determinada pessoa.

Versa o presente estudo sobre este tema deveras discutido, entretanto,

muitas vezes subestimado e rapidamente explanado: a moral e a ética. Desta forma,

buscamos com isso resgatar a base teórica e essencial que há muito tempo vem se

tornando nebulosa na mente dos juristas, uma vez que, em nosso direito positivado

15

e mesmo na prática forense, a moral e a ética são postas de lado em virtude do alto

poder do materialismo.

Inicialmente, é forçoso fazer uma breve relato sobre a moral em si,

engatinhando a partir de seu conceito mais basilar. Assim como as sociedades

sucedem umas as outras, também a moral concreta e efetiva, adapta-se e sucede-

se de acordo com sua época, variando de entre suas respectivas sociedades e seu

respectivo tempo.

A moral é por natureza um fato histórico precisamente porque é o modo de

comportar-se de um ser ⎯ o homem . Ser este cuja característica é a de auto-

aprimoramento, constantemente tentando equilibrar sua natureza dual, ou seja,

natureza voltada para dois planos: o plano de sua existência material, prática; e o

plano de sua vida espiritual, íntegra, incluindo-se nesta a moral.

Por conseguinte, a ética, como ciência da moral, deve ser considerada

como um aspecto da realidade humana, igualmente mutável com o tempo. Embora

seja verdade que o comportamento moral se encontra no homem desde que existe

como tal mesmo em suas sociedades mais primitivas, a moral muda e se desenvolve

com a mudança e o desenvolvimento dos diversos tipos de sociedades existentes. É

o que provam a substituição de certos princípios e de certas normas por outras, de

certos valores morais ou de certas virtudes por outras, bem como a modificação do

conteúdo de uma mesma virtude através do tempo.

Denota-se ainda do presente afã, a sutil diferenciação entre ética e moral,

bem sua estreita relação com o direito. Esses pontos serão melhor discutidos

posteriormente em tópicos distintos, juntamente com a análise sobre os termos

"moral" e "ética", não só do atual ponto de vista dogmático mas observá-lo-emos

ainda do ponto de vista de alguns dos imortais filósofos, retirando abstratamente

16

destes, uma visão geral da sociedade no tempo e espaço de acordo com a mutação

dos preceitos morais.

Buscamos por fim, demonstrar que a moral e a ética, independentemente

da época ou cultura existente, são a essência e o espírito de que se constitui o

Direito em qualquer de suas acepções.

1.2 Conceituação de moral

Numa concepção simples, gramatical, o termo: moral, em seu significado

basilar e genérico, encontrado em vernáculos basilares é identificado como um

"conjunto de regras de conduta ou hábitos julgados válidos, quer de modo absoluto,

quer para grupo ou pessoa determinada."4

Denota desta concepção que a moral, por estar caracterizada como um

conjunto de regras ou hábitos utilizáveis socialmente, é um meio de controle social.

É notório que cada sociedade possui uma estreita concepção sobre

valores morais que variam direta e conjuntamente com a cultura e os costumes

daquele povo ou daquela comunidade.

De acordo com Vázques5, a moral é uma forma de comportamento

humano que se encontra em todos os tempos e em todas as sociedades. A moral é

uma forma específica de comportamento humano, cujos agentes são os indivíduos

concretos, indivíduos, porém, que só agem moralmente quando em sociedade, dado

que a moral existe necessariamente para cumprir uma função social.

4 FONSECA, Eduardo Nunes. Pequeno Dicionário Filosófico. São Paulo: Hemus-Livraria Editora Ltda., 1977. pág. 265-6. 5 VÁZQUES. Adolfo Sanchez. Ética. 16ª ed. São Paulo: Editora Civilização Brasileira, 1996, pág. 14.

17

Portanto, a moral varia em concordância com o tempo e o espaço, de

acordo com o comportamento humano na sociedade em que se vive.

Assim, tendo em vista essas prévias considerações, chegamos a um

conceito próprio, mais estreito com o tema que desenvolvemos, estabelecendo que

moral é uma das espécies de instrumentos de controle social que reúne em seu

conteúdo regras de conduta ou hábitos socialmente julgados válidos, atuando sobre

o comportamento interindividual, encontrando-se sempre em consonância com a

época histórica e com a estrutura política, social e economicamente vigente em

determinada localidade.

1.3 A ética como ciência moral e sua distinção.

Os indivíduos se defrontam com a necessidade de pautar o seu

comportamento por normas que se julgam mais apropriadas ou mais dignas de

serem cumpridas. Estas normas são aceitas intimamente e reconhecidas como

obrigatórias, pois, os indivíduos as compreendem e agem de acordo com os

preceitos e condutas estabelecidas.

A moral encontra-se intimamente relacionada com os atos conscientes e

voluntários dos indivíduos, incidindo diretamente no âmbito social.

As palavras "ética" e "moral" são empregada às vezes indistintamente.

Todavia, o termo "moral" tem comumente um significado mais amplo que a palavra

"ética".

O vocábulo "moral", inicialmente originário do latim, derivando dos termos

"mos" ou "mores", que significa costume, no sentido de conjunto de normas

consuetudinárias de conduta ou regras adquiridas por hábitos socialmente julgados

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válidos. "Ética", por sua vez, vem do termo grego "ethos" que significa analogamente

"modo de ser", ou "caráter" e "costume", assentando-se num modo de

comportamento que não corresponde a uma disposição natural, mas que é adquirido

ou conquistado por hábito.

Esbarramos, pois, na etimologia dos termos moral e ética. Embora não

nos forneça o atual significado de ambos os termos, ao menos nos situa no campo

especificamente humano no qual se torna possível e se funda o comportamento

moral: o humano como o adquirido ou conquistado pelo homem sobre o que há nele

de pura natureza. O comportamento moral pertence somente ao homem na medida

em que, sobre a sua própria natureza, cria esta segunda natureza, da qual faz parte

a sua atividade moral.6

Na ampla esfera das hodiernas culturas existentes, inclusive a nossa, a

moral, em seu sentido mais amplo, está caracterizado pelo abstrato; é tudo aquilo

que se opõe ao mundo físico, e é por isso que as ciências morais compreendem, em

oposição às ciências naturais, tudo o que não é puramente físico no homem, v.g. a

história, a política, a arte, o íntimo (exteriormente), a paz, a estética (interiormente),

ou seja, tudo o que corresponde às produções do espírito subjetivo e até mesmo o

próprio espírito subjetivo.

As ciências tradicionalmente chamadas de morais e políticas são muitas

vezes consideradas análogas às ciências espirituais, por abrangerem os mesmos

objetos e temas, sobretudo quando estas se entendem como ciências do espírito

objetivo e de sua relação com o subjetivo.

Em certas ocasiões, põe-se a moral ao intelectual para indicar aquilo que

corresponde ao sentimento e não à inteligência ou ao intelecto.

6 VÁZQUES. Adolfo Sanchez. Ética. 16ª ed. São Paulo: Editora Civilização Brasileira, 1996, pág. 20.

19

Hegel fez distinção entre a moralidade como moralidade subjetiva e

moralidade objetiva. Enquanto a primeira consiste no cumprimento do dever, pelo

ato de vontade, a segunda é a obediência à lei moral, como fixada pelas normas,

leis e costumes sociais, a qual representa o espírito objetivo. Hegel considera que a

simples boa vontade subjetiva é insuficiente. É mister que a boa vontade subjetiva

não se perca de si mesma ou, se quisermos, não tenha simplesmente a consciência

de que aspira ao bem.7

No caso supra, o subjetivo é simplesmente abstrato. Para que chegue a

ser concreto, é preciso que se integre com o objetivo, que se manifesta moralmente

como moralidade fixada pelas normas, leis e costumes sociais. Esta não é

tampouco, uma ação moral simplesmente mecânica: é a racionalidade da moral

universal concreta que pode dar um conteúdo à moralidade subjetiva da simples

consciência moral.8

O comportamento moral é próprio do homem como ser histórico, social e

prático, isto é, como um ser que transforma conscientemente o mundo que o rodeia;

que faz da natureza externa um mundo à sua medida humana, e que, desta maneira

transforma a sua própria natureza.

Observamos pois, que se a moral é inseparável da atividade prática do

homem ⎯ material e espiritual ⎯ a ética nunca pode deixar de ter como fundamento

a concepção íntegra do homem, dotado discernimento moral próprio, coerente com o

ambiente em que vive, nos dando uma visão total deste como ser social, histórico e

criador.

7 HEGEL. Fenomenologia do espírito. Trad. Henrique de Lima Vaz. “Os Pensadores”. 2ª ed. São Paulo: Abril S.A. Cultural. 1980. 8 Observem que não nos referimos aqui aos tipos de responsabilidades civis elencadas em nosso código, a objetiva e a subjetiva. Neste ponto temos tão somente a transmutação da norma moral em norma jurídica, devidamente positivada.

20

Se existe uma diversidade de morais não só no tempo, mas também no

espaço, e não somente nas sociedades que se inserem num processo histórico

definido, mas inclusive naquelas sociedades hodiernamente desaparecidas que

precederam as sociedades históricas, é preciso que a ética como teoria da moral

tenha presente um comportamento humano que varia e se diversifica no tempo. 9

1.4 A co-relação entre direito e moral.

O Direito, em termos gerais, é uma ordem da conduta humana. Porém,

infrutífera seria a tentativa de aprofundar-se ao conceituar o Direito, devido à

amplitude do termo e diversidade de entendimentos, pois, como dizia Kelsen: “é

impossível conhecermos a natureza do Direito se restringirmos nossa atenção a uma

regra isolada. (...) Apenas com base numa compreensão clara das relações que

constituem a ordem jurídica é que a natureza do Direito pode ser entendida” 10.

Entretanto, analisando essas relações, em certo ponto, a moral e a ética

confundem-se com o próprio conceito de direito analisado como um "complexo de

normas gerais, visando a vida de relação que é a vida dos homens em comum"11,

pelo fato de tratarem-se de instrumentos de controle social. Assim, no ponto de vista

funcional, também o Direito, em sua concepção como norma, é idealizado como a

regra ética, para o fim de obter ordem e paz entre os homens e, por conseguinte,

para reagir contra o perigo suscitado pelo conflito de interesses12.

9 VÁZQUES. Adolfo Sanchez. Ética. 16ª ed. São Paulo: Editora Civilização Brasileira, 1996, pág. 22. 10 KELSEN, Hans. Teoria geral do direito e do estado. São Paulo: Martins Fontes, 1998, pág. 5. 11 RADBUCH. Gustav.. Filosofia do Direito. Coleção Stvdivm, 6ª ed. Coimbra - Portugal: Armênio Amado editor. 1979, pág. 93 12 CARNELUTTI. Fracesco. Teoria geral do direito. São Paulo: Lejus, 2000. Pág. 131.

21

Embora em muito se identifiquem, distinguem-se em alguns pontos nesta

íntima relação entre espécies normativas de cunho social. Nas palavras de

Radbruch:

"Quando, como acontece freqüentemente, colocamos lado a lado o direito e a ética, é fácil verificar que comparamos grandezas de natureza muito diferente. O direito é um conceito cultural, a ética um conceito de valor. Assim como o Verbo da justiça se faz carne no direito, assim o Verbo da 'ética' se faz carne através da moral ⎯ isto é, na realidade psicológica dos factos da consciência ⎯ convertendo-se ambos em realidades culturais. Comparáveis entre si, por tanto, só poderão ser, ou os dois conceitos congéneres de valor: justiça, ética ⎯ ou os dois conceitos culturais também congéneres: direito e moral (costumes)".13

Ao Direito é imputado um caráter de "exterioridade", uma vez que regula a

conduta exterior dos homens, enquanto a moral regula a sua conduta interior,

estando pois caracterizado sua natureza de "interioridade".

Com efeito, a menção supra relacionada talvez seja a que melhor se

deduz da concepção da relação entre direito e moral como conjuntos de preceitos

reguladores da vida dos homens em comum, pois só há vida social quando o

indivíduo entra na sua atividade em relações com outros indivíduos.

Além destas, a experiência jurídica mostra-nos, contudo que existem

muitas outras formas de conduta ou de atitude "interior" que não deixam de ser

juridicamente relevantes, e, por outro lado, como a valoração jurídica não se limita a

incidir apenas sobre a conduta exterior, também muitas vezes a valoração moral não

fica limitada a incidir sobre a atitude interior dos indivíduos.

Desta forma, tanto a conduta exterior é susceptível de ser objeto de

valorações morais, como a interior de ser objeto de valorações jurídicas. Inexiste,

por conseguinte, um único domínio da conduta humana, quer interior, quer exterior,

que não seja susceptível e ao mesmo tempo objeto de apreciações morais e

jurídicas. 13 RADBUCH. Gustav.. Filosofia do Direito. Coleção Stvdivm, 6ª ed. Coimbra - Portugal: Armênio Amado editor. 1979, pág. 98.

22

Conclui-se, pois, que a conduta exterior só interessa à moral na medida

em que exprime uma conduta interior; a conduta interior só interessa ao direito na

medida em que anuncia ou deixa esperar uma conduta exterior, em outras palavras,

quando a conduta de alguém que, movido por sua vontade, direta ou indiretamente,

infringe uma regra moral predeterminada pela cultura em que vive, tal violação ou

ato tende a ser analisado pelo direito.

1.5 Quimerismo moral: uma avaliação da dimensão moral nas ações humanas.

A moral transmuta-se e adapta-se a diferentes épocas, a diferentes

culturas, a diferentes sociedades, como resposta aos problemas básicos

apresentados pelas relações entre os homens, e, em particular, pelo seu

comportamento efetivo.

A ação propriamente humana é uma intervenção ou não-intervenção

"consciente" ou "deliberada" na natureza ou na existência de outrem. A pessoa

engajada em deliberação prática normalmente procura averiguar em primeiro lugar

quais as opções possíveis e abertas para ela nessa situação e nessas

circunstâncias, bem como quais serão as conseqüências dessas opções. Depois

procura averiguar quais dentre essas possibilidades ela poderá efetivamente

realizar. Enfim, avalia essas opções práticas de acordo com as suas convicções

prudenciais ou morais, explícitas ou implícitas.14

Historicamente, houveram verdadeiras formulações a respeito da Moral

vigente. Tais discussões posteriormente influenciaram as atuais atitudes sobre a

14 GILES. Thomas Ransom. Introdução à filosofia. 3ª ed., São Paulo - SP: Editora da Universidade

de São Paulo, 1979, P. 122

23

dimensão moral das ações humanas. Pra melhor ilustrar esta influência, resgatamos

os preceitos morais defendido por quatro grandes pensadores, sob as perspectivas

de suas respectivas épocas: Aristóteles, Kant, Benthan e Jaspers.

1.5.1 Aristóteles.

Para Aristóteles, o problema fundamental da moral é a relação entre o

universo, que é teleológico, que tem finalidade, e o homem, que também tem

finalidade. A moral é portanto necessariamente teleológica no sentido de que a

moralidade das ações humanas é avaliada com referência aos fins ou objetivos a

que servem ou supostamente servem. Mas, uma vez que o fim das ações humanas

é uma situação ideal, que não pode realizar-se plenamente, mas da qual o homem

só pode aproximar-se, é impossível formular máximas rigorosamente precisas.

Segue-se que o método na moral não será rigorosamente científico; ele será

dialético e consistirá em chegar à verdade a partir de um confronto entre as opiniões

dos homens de maior experiência e mais sábios. A moral fundamentar-se-á na

experiência, isto é, nas possibilidades da natureza humana, nas condições da vida

social, para determinar em termos concretos essas exigências visando dar um

conteúdo ao ideal. Sem esse contato com a vida e a experiência, a especulação

moral corre o risco de considerar como se fossem absolutas regras que na realidade

são puramente abstratas, favorecendo assim o fanatismo ou desanimando a boa

vontade.

Essa preocupação empírica, que caracteriza a filosofia moral de

Aristóteles leva-o a afirmar que o objeto da ética é definir o bem do homem, quer

dizer, um bem prático, realizável pelo homem. Aristóteles identifica esse bem a partir

24

da própria função do homem. Ora, a função ou atividade própria do homem só pode

ser a atividade da alma racional, aquela que o distingue do animal. Portanto, a

virtude do homem consiste na aptidão pela vida da razão; é essa aptidão, ou seja,

na própria vida da razão. Pode-se definir a felicidade como a atividade da alma que

age conforme a virtude.15

O objeto da moral sendo o bem soberano e o fim supremo de nossa

atividade a felicidade, Aristóteles procura identificar esse bem em termos concretos

e conclui que esse fim é a virtude que se expressa na vida da razão, em uma

disposição permanente de se comportar conforme a razão.

A virtude na visão aristotélica é tida, pois, como uma disposição de caráter

relacionada com a escolha e consistente numa mediania relativa aos indivíduos, a

qual é determinada por um princípio racional próprio do homem dotado de sabedoria

prática. Essa virtude pode ser definida como a eqüidistância, um meio termo, entre

dois vícios, um por excesso e outro por falta; pois que, enquanto os vícios ou vão

muito longe ou ficam aquém do que é conveniente no tocante às ações e paixões, a

virtude encontra e escolhe o meio-termo.

A virtude em si ainda não é o bem soberano, tendo em vista que este

consiste no exercício da virtude, na vida de razão a que a virtude nos dispõe, e, por

sua vez, a felicidade consiste na prática da virtude, no exercício da atividade racional

todavia há graus nessa atividade.

A mais alta função da alma racional é a contemplação, o saber teórico, a

sabedoria. De todas as atividades da alma, a atividade contemplativa é a mais pura,

que pode exercer-se da maneira mais contínua, que não necessita de ajuda de fora

15 ARISTÓTELES. Ética a Nicômaco. Col. "Os Pensadores". São Paulo: Ed. Abril S. A. Cultural. 1973. - I, 7, 1097b 22 ⎯ 1098a 16.

25

e que tenha a si mesma por fim e objeto, a alegria suprema que proporciona àquele

que a exerce.

1.5.2. Kant.

A ética de Kant, de um ponto de vista pessoal, é a mais perfeita

expressão da ética moderna, preconizando a obrigatoriedade da moral. Ele afirma

que o sujeito, portador de consciência moral, dá a si mesmo sua própria lei. O

homem como sujeito cognoscente ou moral é ativo, criador e está no centro tanto do

conhecimento quanto da moral.

Os conceitos fundamentais da moral kantiana são a liberdade e o dever.

Segundo Kant, a moral "não é propriamente dito a doutrina que nos ensina como

devemos nos tornar felizes, mas como devemos nos tornar dignos da felicidade"16

(grifo nosso). Por isso, a moral kantiana será a moral do dever e da imposição de

normas a si mesmo. Mas, ao impor a si mesmo certas obrigações, certas normas, o

homem que obedece a tais leis encontra também as condições de sua liberdade. E é

a obedecer às leis que a si mesmo propôs que o homem encontra a possibilidade de

sua autonomia, de sua liberdade. Nesse contexto, a virtude será definida como "a

força moral da vontade de um homem no cumprimento do seu dever"17.

Uma conduta seria valiosa no plano moral quando a sua motivação

consistisse apenas no reconhecimento ao bem. Se o agente, contudo, obrou visando

alguma recompensa, já não se poderia qualificar a ação como positiva. A concepção

moral é sintetizada em seu imperativo categórico: "atua de tal modo que a máxima

16 KANT. Emmanuel.. Crítica da Razão Prática. 3ª ed. Trad e prefácio Afonso Bertagnoli. São Paulo, Ed. e Pub. Brasil, 1959., P. 93 17 CHAUÍ. Marilena; et al.. Primeira filosofia: lições introdutórias. 4ª ed., São Paulo-SP: Editora Brasiliense, 1985.P. 76

26

de teus atos possa valer como princípio de uma legislação universal"18. Tal máxima

não chega a expressar uma ideologia ética, pois não orienta o comportamento

teleologicamente.

Para ser moralmente bom, um ato conforma-se objetivamente e

subjetivamente com o dever, embora o desejo de não fazer o que manda o dever

não nulifique a dimensão moral do ato.

A máxima contém a regra prática que determina a razão segundo as

condições do sujeito (em muitos casos, segundo a sua ignorância, ou também

segundo suas inclinações) e, deste modo, é o princípio objetivo válido para todo ser

racional, o princípio segundo o qual deve agir, ou seja, um imperativo no caso da

máxima acima formulada.

Sendo o dever uma necessidade prática incondicionada da ação, válido

para todos os seres racionais, ele é também uma lei para todas as vontades

humanas.

Para Kant, tão certo isto é, que a sublimidade e a dignidade intrínseca da

prescrição expressa em um dever tanto mais avultam quanto menos os motivos

subjetivos o favorecem ou, antes, quanto mais lhe são contrários. Encarar a virtude

em sua verdadeira forma não é mais do que expor a moralidade e senta de toda

mescla de elementos sensíveis e despojada de todo falso ornamento que lhe

provenha do atrativo da recompensa ou do amor próprio. Sobretudo, a moral não

procura estabelecer princípios do que acontece, mas leis daquilo que deve

acontecer. Trata-se da lei objetiva prática, da relação de uma vontade consigo

18 KANT. Emmanuel. Introducción a la Teoría del Derecho. 1ª ed., Centro de Estudios Constitucionales, reimpressão Madrid, P. 102

27

mesma, enquanto determinada a agir unicamente pela razão que só e por si mesma

determina o comportamento.

Por conceber o comportamento moral como pertencente a um sujeito

autônomo e livre, ativo e criador, Kant é o ponto de partida de uma filosofia e de uma

ética na qual o homem se define antes de tudo como ser ativo, produtor e criador.

1.5.3. Bentham

Como a Filosofia moral de Aristóteles, a filosofia do utilitarismo é

teleológica, pois avalia a dimensão moral das ações em termos de uma situação

ideal. Todavia, ela se distingui da filosofia moral de Aristóteles em que ao conceito

da vida feliz, considerada em termos de um sistema complexo de relações dentro e

entre indivíduos, ela substitui um conceito quantitativo de utilidade fundamentado na

comparação entre utilidades pessoais e interpessoais.

Pelo princípio do utilitarismo entende-se aquele que aprova ou desaprova

toda e qualquer ação de acordo com a tendência que possui de aumentar ou

diminuir a felicidade daquele cujos interesses estão em questão.

As bases do utilitarismo encontram-se em nos seguintes termos:

"A natureza coloca a humanidade sob o governo de dois mestres soberanos: a dor e o prazer. Compete somente a eles apontar o que devemos fazer, assim como também determinar o que não devemos fazer. Por um lado o critério do certo e do errado, por outro lado a cadeia de causas e efeitos, estão acorrentados ao seu trono. Eles nos governam em tudo o que fazemos, em tudo o que dizemos, em tudo o que pensamos: todo esforço que fizemos para nos desembaraçar da nossa sujeição só serve para demonstrá-la e confirmá-la. Por palavras um homem pode pretender abjurar o seu império mas na realidade ele lhe permanecerá sujeito. O princípio do utilitarismo reconhece essa sujeição e a assume

28

como fundamento daquele sistema que tem por objeto a edificação da felicidade pelas mãos da razão e da lei. "19

Pela constituição da própria natureza humana, os homens em muitas

ocasiões adotam esse princípio sem refletir sobre ele, tanto para avaliar as suas

próprias ações como para avaliar as ações dos outros.

Bentham assinala quatro fontes de que vêm o prazer e a dor: a física, a

política, a moral e a religiosa e, à medida que os prazeres e as dores que

acompanham cada uma são capazes de dar uma força de obrigação a qualquer lei

ou regra de conduta, todas podem ser consideradas como sanções. Se ocorre na

vida presente e resulta dos processos comuns da natureza, sem quaisquer

modificações causadas pela interposição da vontade de algum agente humano ou

de alguma interposição de um ser superior invisível, a sanção é física. Se vem das

mãos de um indivíduo ou grupo de indivíduos na comunidade, que, sob o nome de

juizes, forem escolhidos com o fim de dispensá-la, conforme a vontade do soberano

ou do poder supremo do Estado, é uma sanção política. Se vier das mãos de

algumas pessoas na comunidade com as quais a pessoa possa por acaso tratar de

acordo com as disposições espontâneas, e não de acordo com alguma regra fixa, a

sanção é moral e popular. Se vier da mão imediata de um ser superior invisível, seja

na vida presente, seja na vida futura, a sanção é religiosa. Os prazeres ou dores que

vem de sanções físicas, políticas ou morais são experimentados na vida presente.

As sanções religiosas, ou nessa vida ou na futura. Quanto a esta última categoria

nada podemos saber. É óbvio que, destas quatro sanções, a sanção física

fundamenta a política e a moral, como também a religiosa, enquanto esta diz

respeito a essa vida.

19 BENTHAM, Jeremy. Uma introdução aos princípios da moral e da legislação. Col. “Os Pensadores”. 2ª ed. Trad. Pablo Ruben Mariconda. São Paulo: Abril Cultural, 1979.

29

Os prazeres e as dores são os instrumentos com os quais trabalhamos. É

necessário, portanto compreender a sua força, isto é, o seu valor. Para a pessoa

considerada por si só, o valor de um prazer ou de uma dor, considerado em si, será

maior ou menor de acordo com as quatro circunstâncias seguintes: a intensidade, a

duração, a certeza (ou incerteza), a proximidade (ou distância). Mas quando o valor

é considerado com a finalidade de saber a tendência do ato que o produz,

considera-se a sua fecundidade ou a possibilidade de ele ser seguido por sanções

parecidas, i.e., por prazeres se for prazer, por dores se for dor) e a pureza, ou a

possibilidade de não ser seguido por sensações do tipo oposto. Essas são

propriedades do ato ou acontecimento que produziu o prazer ou a dor.

Quando se trata de um grupo de pessoas, o prazer ou a dor será mais ou

menos conforme as circunstâncias já citadas, acrescentada a extensão, isto é,

aquelas que por eles forem atingidos.

Posteriormente o princípio de Bentham foi complementado pelo princípio

da justiça, que deve prevalecer sobre o princípio da utilidade.

1.5.4. Jaspers

Para Jaspers a própria verdade é fundamentalmente uma moral da

veracidade e a consciência, em vez de ser uma contemplação, é a ação que se

fundamenta na liberdade, na comunicação e na historicidade. Isto significa que a

pessoa encontra-se contentemente na encruzilhada de antinomias que ela deve

resolver com risco e audácia. A liberdade nasce do conflito entre a regra moral

precisa e fixa e a ação incondicionada. A comunicação nasce da tensão entre

30

formas sociais objetivas e a pessoa individual. A historicidade nasce da tensão entre

o mundo e a existência possível da pessoa. A objetividade exerce suas pressões em

todos os níveis: o dever, a sociedade, o mundo.20

As experiências mais altas e mais raras, onde a existência treme diante da

possibilidade de não ser (não-saber, vertigem, angústia) e aquelas onde ela se

assegura de ser (amor, fé, fantasia) vão além da legalidade, pois o poder de realizar-

se pela liberdade e na liberdade vai além do constrangimento intelectual. Em termos

da existência humana, e, portanto em termos de moral, objetividade e liberdade são

realidades incompatíveis, pois o rigor da objetividade intelectual sufoca a existência.

Quando a escolha que uma pessoa faz de si mesma em sua subjetividade

é autêntica, circula através de todas as suas opções subseqüentes uma fidelidade

que impõem a todas elas uma unidade inimitável. Entretanto, contra a vertigem e a

angústia que acompanha minha escolha fundamental não há meios de proteção,

nem garantias racionais ou sociais. O pior é sempre uma possibilidade. Um sistema

de deveres coerentes e definitivos, que nos dispensasse deste risco radicai nos

tiraria todo o essencial da existência. O que pode ser naufrágio pode também ser o

caminho que leva a existência. Sem a ameaça do desespero possível não há

liberdade

O que dinamiza a ação moral é a fé. Crer em algo significa dedicar-se a

alguma realidade que vai além do empírico, a uma idéia que, por sua vez, só vale

pelas pessoas que a sustentam. Mas quando essa fé se limita a um conteúdo fixo,

se alimenta por um objeto finito, ela degenera. A procura do prazer, das riquezas e

do poder a devoram. Ela se fixa num horizonte fugitivo. É assim que a consciência

20 JASPERS, K. Introdução ao pensamento filosófico. Trad. Leônidas Hegemberg e Octanny Silveira da Mota. São Paulo: Cultix. s.d.

31

se situa além da legalidade, além da região onde se elabora a máxima de toda ação

determinada.

No entanto, a decisão concreta deve atravessar a própria crítica da regra

do dever, que realiza a passagem do querer-viver, com o seu arbítrio, para a decisão

concreta e pessoal. O dever é um momento formal da liberdade transcendental no

caminho da liberdade existencial. Nesse sentido, submete-se à lei já é ser livre. A lei

nos liberta do constrangimento físico e nos faz subir até a necessidade do valor. Na

trajetória que leva à decisão concreta, ela representa a liberdade numa situação

única. Mas, como toda objetividade prática, o dever deve ser assimilado, adotado,

pois se fosse apenas objetivo, seria semelhante às estrelas fixas para o navegador e

a consciência seria dispensada de inventar. É preciso que a exterioridade da

obediência ceda lugar à interioridade do existir, à decisão histórica que é o limite da

regra. A lei é apenas um momento no processo da criação viva da pessoa como

existência.

Jaspers ilustra a relação instável que existe entre a lei universal e a

decisão pessoal pelo exemplo da mentira. É evidente que a lei como tal não pode

admitir qualquer exceção. Toda justificação teórica da mentira, por interesse ou

mesmo por amor, é escandalosa. É com razão que Kant, por exemplo se lhe opôs

por uma recusa radical. A mentira, qualquer que seja, é, enquanto ação, uma

contradição em si e suprime a própria moralidade. Mas Jaspers pergunta se pode

haver uma ação existencial que não tire sua verdade de uma lei geral.

Colocada nesses termos, não é mais possível dar uma resposta segura,

fixa, a essa pergunta. Só podemos tentar formular um esboço frágil aos limites de

toda posição fixa, deixando de lado toda casuística. A menos verídica das pessoas

será aquela que exige que a regra seja absoluta, mas que é incapaz de assumir sem

32

ostentação, todas as suas exigências. Não podemos chamar verídico aquele que

não mentiria por simples respeito à regra, mas que trairia os seus e portaria a sua

veracidade como uma arma virtuosa. A veracidade autentica tem por medida a

coragem de não mentir nem a si nem ao outro, amigo. Entretanto, para o inimigo, a

veracidade talvez consista em consentir ao subterfúgio e às relações superficiais e

mundanas baseadas em semiverdades e silêncios.

Para Jaspers, a veracidade autentica exige o reconhecimento do fato de a

mentira estar universalmente espalhada. A veracidade exige que admitamos a

possibilidade de a mentira poder ser, em certas situações, uma ação verídica sem se

tornar, no entanto, a verdade enquanto lei objetivamente válida.

Ninguém pode decidir a priori, à margem de toda a situação concreta, se a

intransigência e o abrandamento são necessários e se essa necessidade ultrapassa

a regra. Portanto, a consciência moral não é o sentido abstrato da lei, e sim o tato

moral individual, o aguilhão da decisão mais pessoal e concreta. Ela exige que a

pessoa saia da passividade para ir ao encontro do "Acontecimento", que

desemboque na pluralidade dos possíveis que a torne autêntica pela decisão. Não

lhe dá nenhuma garantia, a não ser a certeza de se tornar ela mesma por um

instante, com base na certeza de que não pode agir de outra maneira, pois existe

em situação, no mundo ligado a um conjunto de determinações concretas, que são

experimentadas como a estreiteza da existência. Mas não há situação que me toque

tão de perto que não deixe campo para a minha liberdade, isto é, que não abra

diante de mim a possibilidade de recusá-la ou de assumi-la.

33

1.6. O dano moral: análise inicial e conceito.

Em toda a história do Direito, temas variados foram e ainda são discutidos

retórica e formalmente no eterno ciclo da harmonização sócio-jurídico-cultural. Numa

busca constante pelo Direito puro, ideal e positivo que retrate a cultura que o cerca,

alguns destes temas são constantemente reciclados após originarem-se de uma

situação singular.

Na reciclagem periódica do tema da reparação do dano moral, a presente

fase experimentada pelo atual direito pátrio é de superação das antinomias

anteriores, com sua consagração definitiva, inclusive em texto constitucional e

enunciado sumular que a asseguram.

O instituto atinge agora sua maturidade e afirma a sua relevância,

esmaecida de vez a relutância daqueles juízes e doutrinadores então vinculados ao

equivocado preconceito de não ser possível compensar a dor moral com dinheiro.

Em símile válido, aconteceu com a reparabilidade do dano moral o mesmo

quanto à originária reação contra a teoria da responsabilidade civil subjetiva21;

reação também acabou triunfando em nome de interesses sociais altamente

relevantes, com as múltiplas concessões à responsabilidade objetiva em seus

variados matizes.

Assemelhados os dois institutos em sua gênese pela presença de

elementos informadores comuns, ao tempo em que se assegura uma proteção

integral do ser humano como pessoa, também faz certo que o direito moderno já

não mais se compadece com as filigranas dogmáticas que obstariam à proteção

mais eficaz da pessoa como ser moral por excelência, cada vez mais ameaçada

21 GONSALVES, Carlos Roberto. Responsabilidade Civil. 6.ª ed. São Paulo:Saraiva, 1995. p.17–21.

34

em sua integridade corporal e psíquica, no conflito de interesses que a vida

proporciona.

O texto constitucional de 1988, à época de sua promulgação, já não era

tão dissonante jurisprudencialmente a controvérsia sobre a possibilidade ou não da

reparação por danos morais. Aliás, a doutrina já vinha se orientando no sentido da

reparabilidade do dano moral, discutindo-se ⎯ e discute-se ainda ⎯ sobre a

natureza dessa reparação e, principalmente, quanto a forma de aferição do quantum

a título indenizatório, abandonando a ultrapassada hipótese da reparabilidade

extrapatrimonial, que direta ou indiretamente gerassem reflexos de ordem

econômica para o ofendido. Surpreendentemente a jurisprudência representava o

maior entrave à sua admissão.

Podemos observar que, logicamente, os homens necessitam da moral

como necessitam de outras coisas vitais a sua sobrevivência social. A necessidade

da moral se explica pela função social que ela cumpre, de acordo com a estrutura

social existente. A todo tempo, uma nova moral, que não seja aquela expressão das

relações sociais alienadas, faz-se necessária para regular as relações dos

indivíduos, tanto em vista da transformação da velha sociedade, como em vista de

garantir a unidade e a harmonia entre os membros da atual sociedade.

Está claro que a moral não está vinculada apenas ao íntimo de um

indivíduo, mas à coletânea dos íntimos de cada membro, central ou tangenciado,

que forma o corpo da sociedade, e que ao se exteriorizar impõe subliminarmente

uma norma de conduta na mente de cada indivíduo, fazendo com que este aja de

acordo com os preceitos sociais estabelecidos.

A violação destes preceitos acarreta na rápida reprovação e conseqüente

sanção por parte da sociedade que os impôs. Algumas vezes, por culpa de outrem,

35

esta violação pode afetar individualmente um membro desta sociedade expondo-o a

desgostos ímpares tão intensos que acarreta prejuízos e aflições, degradado seu

patrimônio material (objetos, dinheiro, etc.) ou imaterial (sentimentos, intelecto, etc.),

dificultando assim seu convívio social.

Então, ante o exposto, podemos conceituar o dano moral puro como

sendo a lesão causada por um indivíduo a outrem devido a uma conduta

socialmente reprovável que acarrete condições desfavoráveis em relação ao

convívio ou trato social e que não derive de uma situação exclusivamente material.

Desta forma, por exemplo, nos casos em que o infrator causa à vitima deformações

estéticas visíveis, deve ser responsabilizado por ressarcir-la com o tratamento

médico apropriado (dano material), bem como indeniza-la pela angústia e vergonha

que esta pessoa carregará ao longo da vida ao expor suas deformações no meio

social, angariando com eventuais sentimentos negativos ou excessivamente

“solidários” que dela advém, pois foge do padrão estabelecido pela moral social

(dano moral).

36

CAPÍTULO II

FUNDAMENTOS QUANTITATIVOS DO DANO MORAL NAS

EXPERIÊNCIAS DA LEGISLAÇÃO ESTRANGEIRA

Sumário: 2.1 Concepções internacionais congêneres relacionadas à natureza jurídica do dano moral; 2.2 Métodos quantitativos do dano moral empregados nos tentames internacionais.

A intenção do breve apanhado a seguir é tão-somente a de demonstrar

que as controvérsias e dificuldades a respeito do tema são, virtualmente,

encontradas na maioria dos povos cultos, como visto no capítulo anterior no que

tange á própria moralidade. As diferentes posições são aquelas que

fundamentalmente se encontram na doutrina e na jurisprudência de nosso país, no

qual, como se defende, a Constituição Federal estabelece atualmente a natureza da

sanção ⎯ além da de compensação ⎯ à indenização pelo dano moral puro, não

tendo resolvido, porém, a questão de aferição do quantum indenizatório.

2.1 Concepções internacionais congêneres relacionadas à natureza jurídica do

dano moral

No que tange à natureza do dano moral, doutrinadores de peso, em

países como França e Itália, de há muito mantêm intensa controvérsia. Na França,

por exemplo, a limitação da reparabilidade dos danos morais não está

expressamente consignada em lei, uma vez que depende da interpretação do termo

37

dommage (dano), que deve abranger todo o dano ocasionado num bem. Assim,

como bem comenta Melo da Silva em relação ao discurso do Terrible perante o

Legislativo francês:

“Quando o dano é cometido pela falta de qualquer um, se agente comparar o interesse da infortuna que se sofre com aquele homem culpado ou imprudente que o causa, um grito súbito de justiça se eleva e responde que este dano deve ser reparado pelo seu autor, imputando-lhe a responsabilidade e coibindo-lhe as atitudes que realizara.”22

Mesmo que o entendimento sobre a natureza do dano moral despontasse

na jurisprudência francesa em direção à função compensatório-punitiva, outros

juristas posicionavam-se de forma diversa. Assim é que para Savatier23 a função da

indenização é satisfatório-compensatória; para Bonnard significa simplesmente a

afirmação da existência da tutela jurídica, bastando uma reparação Simbólica;

Demogue defende tratar-se de uma compensação-pena, enquanto para Chironi,

Pessina e Zanardelli a indenização devida não passa de uma pena privada24.

Desse último sentir é Ripert25, para quem a condenação do ofensor visa

não à satisfação da vítima, mas a punição do autor. Acredita que as perdas e danos

não têm o caráter de indenização, mas o caráter exemplar, pois se há delito penal, a

vítima pede que se acrescente alguma coisa a uma pena pública insuficiente ou mal

graduada; se não há delito penal, a vítima denuncia o culpado que soube escapar-se

por entre as malhas da lei penal. Segundo o mesmo, há pena privada, porque tem

que se pronunciar a pena sob o aspecto de reparação.

22 SILVA, Wilson Melo da. O dano e sua reparação. 3ª ed. Rio de Janeiro, Forense, 1983. p. 68 23 SAVATIER. Traité de la responsabilité civile. Paris, 1951. p. 42-54. 24 Apud v. acórdão inserto em Jurisprudência dos Tribunais de Alçada Civil de São Paulo, Lex, 123/157. A decisão, unânime, é relativa à ação de indenização decorrente de atropelamento por um trator da mulher e filha do autor, e faz considerações preciosas sobre o tema da reparação do dano moral. Seu relator é o Desembargador Régis de Oliveira, e data de 12/12/89. 25 RIPERT. Georges, A regra moral nas obrigações civis. tradução da 31ª edição francesa por Osório de Oliveira, Saraiva, São Paulo, 1937, p. 352.

38

Burkardt26: prefere chamar a reparação moral de um instituto sui generis:

“A reparação não é uma pena nem uma reparação, mas qualquer coisa que fique

entre uma e outra.”27. Enfatiza-se, assim, o caráter misto da reparação pelo prejuízo

moral, de um lado a compensar a vítima e, de outro, a punir o ofensor.

Sob esse aspecto, interessante distinção é feita na common law do Direito

anglo-americano, em que se dividem os danos em duas classes: a) os danos

substanciais ou materiais, denominados substancial damages; e b) os danos

nominais ou imateriais, denominados nominal damages. Centremo-nos nestes

últimos. Os danos nominais ocorrem quando o valor em dinheiro pode ser

estabelecido mas não tem equivalência com dimensão quantitativa, ou seja, não se

pode mensurar um “valor de mercado”. Este tipo de dano é símile ao nosso dano de

cunho puramente moral, que aliás, sofre uma dupla denominação: a) compensatory

damages (danos compensataórios); e de punitory damages (danos punitórios,

coercivos) ⎯ também chamados de exemplary damages (danos exemplares). A

primeira denominação, nominal damages, geralmente é aplicada quando a

indenização possui a finalidade de reparar simbolicamente ofensas superficiais,

reconhecendo tão-somente a existência da tutela jurídica; a segunda denominação,

compensatory damages, é aplicada quando exprime a finalidade de compensar a

vítima do mal sofrido, restituindo-a ao estado anterior por meio de soma em dinheiro

fixada de acordo com as peculiaridades do caso concreto; e a terceira denominação,

punitory ou exemplary damages indica, por fim, que a indenização possui a natureza

de punição não apenas para desagravo à vítima, mas também perante a sociedade

26 Apud SALAZAR, Alcino de Paula, Reparação do dano moral. Rio de Janeiro, Borsoi. 1983, p. 145. O próprio tratadista opina no mesmo sentido: “Não afirmaremos que seja exclusivamente penal a natureza da reparação pecuniária do dano moral; mas parece claro que ao instituto não é estranho o elemento penal, o sentido punitivo da sua função” (op. cit., p. 146). 27 Texto original: La reparation n'est ni une peine ni une reparation, mais quelque chose qui tient de l'un et de l'autre

39

em que vive o ofensor, a ponto de lhe ser ordenado, nos Estados Unidos, o

pagamento de um valor a fundos estatais cujos recursos reverterão em prol da

comunidade ⎯ que se considera, em tais casos, diante da gravidade da ofensa,

também atingida, caracterizando nitidamente o caráter de pena pública, e não

apenas privada, ao autor do dano.28

2.2 Métodos quantitativos do dano moral empregados nos tentames

internacionais

As dificuldades não são menores, no Direito comparado, no tocante às

formas de quantificação do dano moral. Algumas legislações oferecem subsídios

28 As definições adiante demonstram com clareza a distinção existente no Direito norte-americano, em que profundamente arraigada a necessidade de reparação de qualquer espécie de dano: 1. “Nominal damages = minimal monetary compensation awarded to an individual in an action where the person has not suffered any substantial injury or loss for which he or she must be recompensed. This kind of damages reflects a legal recognition that a plaintiffs rights have been violated through a defendant's breach of duty or wrongful conduct. The amount awarded is ordinarily trif1ing sum, such as a dollar, which varies according to the circumstances of each case. In certain jurisdictions, the amount of the award might include the costs of the lawsuit” (The guide to american Law, volume 8, West Publishing Company, Nova Iorque, 1984, pp. 49-50); 2. “Compensatory damages = a sum of money awarded in a civil action by a court to indemnify a person for the part1cular loss, detriment, or injury suffered as a result of the unlawful conduct of another. Compensatory damages are intended to provide a plaintiff with the monetary amount necessary to replace what was lost and nothing more. They differ from punitive damages, which punish a defendant for his or her conduct and provide a deterrent to the community against the future commission of such acts. To be awarded compensatory damages, the plaintiff must prove that he or she has suffered a recognizable harm that is compensable by a certain amount of money that can be objectively determined by a judge or jury” (op. cit., volume 3, pp. 119 - 120); 3. “Punitive damages = monetary compensation awarded to an injured party that goes above and beyond that which is necessary to remunerate the individual for losses. The theory underlying punitive damages, also known as smart money or exemplary damages, involves a merger of the interest people injured by the wrongful conduct. This type of damages is not awarded because of any particular merit in the plaintiffs case but rather to serve the purpose of penalizing the wrongdoer and to act as a warning to the offender and others that the community will not tolerate such behavior. Unless otherwise required by statute, the award of punitive damages is based upon the discretion of the tries of fact. A few jurisdictions refuse to award punitive damages in any action. Generally there must be an award of compensatory damages before such damages can be awarded. In some states, an award of nominal damages justifies the granting of punitive damages” (op. cit., volume 8, pp. 355-356). Observe-se que é a própria comunidade que reage contra o ofensor na hipótese dos danos, punitivos ou exemplares, tratando-se aqui de casos particularmente graves, como, por exemplo, a privação ilegal da liberdade de um indivíduo, ou uma denunciação caluniosa que acarrete à vítima uma investigação criminal indevida.

40

importantes para esse fim, mas outras possuem apenas critérios orientados pela

jurisprudência e doutrina, não havendo previsão de formas pelas quais se possa

encontrar a indenização devida.

Citados por R. Limongi França, o italiano Giorgi e o francês Josserand

bem colocam a questão. O primeiro afirma que dada a impossibilidade de

estabelecer uma equivalência perfeita entre o dano moral e a compensação

pecuniária, se procura um método para avençar ou regular e não deixar o dano

moral absolutamente insatisfeito; o segundo afirma peremptoriamente que se

deveria “renunciar, de uma vez por todas, à estulta pretensão de que, mesmo em

face dos simples (danos) materiais comuns, exista uma real eqüipolência entre o

prejuízo sofrido e os reparos.”29

A questão é de tal forma grave que alguns autores estrangeiros que

defenderam, ou defendem, a impossibilidade de reparação do dano moral puro

assim o fazem baseados na falta de equivalência possível, pecuniária, entre o

prejuízo sofrido e a reparação que se busca. Gabba30, além de outros argumentos

contrários a ressarcibilidade do dano moral, coloca ser inadmissível a estimação em

dinheiro de interesses violados por danos morais, por serem o dinheiro e a dor

coisas tão dessemelhantes que seria absurdo tentar qualquer espécie de

equivalência entre elas. Não haveria cifra capaz de corresponder ao sofrimento

causado pela morte de um filho ou ao constrangimento de um pai pela desonra de

sua filha, por exemplo.

Essa impossibilidade de equivalência representa apenas, porém, um

problema de ordem prática, nada tendo a ver com o cabimento, em si, da reparação,

29 GIORGI. Teoria delle obbligazioni, volume 5, nota 238; Josserand, apud SILVA. Wilson Melo da, em Enciclopédia Saraiva do Direito. 30 Apud. DEDA. Artur Oscar de Oliveira. “Dano moral” in Enciclopédia Saraiva de Direito, vol. 22, São Paulo, 1979. p. 87

41

que predominantemente se considera devida em outros paises, em extensões

diversas31, apresentando-se em alguns deles soluções que se caracterizam como

parâmetros objetivos ao juiz na análise do caso concreto.

Na França, por exemplo, tarifa-se o valor devido .de acordo com o tipo de

lesão sofrida. Ensina Montenegro que se trata do “conhecido systéme jurisprudentiel,

valendo mencionar os exemplos de reparação que os tribunais mandam,

corretamente, pagar pela morte de uma mãe de família que nunca exerceu atividade

lucrativa, ou seja: 2 millions au mroi et... 500.000 fr. par enfant”32 (grifos do original).

Nos tribunais italianos foi adotada a prerrogativa de que objetivamente não se pode

encontrar no dinheiro um equivalente, mas que, eqüidade (critério de moderação e

igualdade, ainda que em detrimento do direito objetivo) se pode encontrar,

31 O artigo 1.151 do Código Civil italiano de 1865 previa que “qualunque fatto dell'uomo che arreca danno ad altri, obbliga quello per colpa del quale à avvenuto a risarcire i1 danno”. Com essa disposição, entendia-se, desde que se atribuísse ao termo dano não só a acepção de prejuízo patrimonial mas também a de lesão ou ofensa que o homem sofre no seu corpo, liberdade, honra ou patrimônio. (Código prussiano de 1794), ter-se-ia a reparação do dano moral de forma ampla, oriundos ou não de um delito penal; entretanto, o artigo 2.059 do Código Civil de 1942 estabeleceu que “Il danno non patrimoniale deve essere risarcito solo nei casi determinati dalla legge”; com isso e considerando-se que o artigo 185 do Código Penal da Itália prevê o ressarcimento do dano não patrimonial decorrente de um “reato” ⎯ ou seja, de um crime ⎯, tem-se que, predominantemente, passou-se a considerar a ressarcibilidade dos danos morais, na Itália, apenas quando decorrentes de um delito penalmente previsto. Ao invés e com base na interpretação ampla do artigo 1.151 do antigo Código Civil Italiano, que não restringia os fatos ilícitos passíveis de punição, entendiam alguns autores que, pela generalidade da previsão, referido artigo não se limitava aos danos patrimoniais, como Minozzi,. A lição de Alfredo Minozzi, perante o anterior código italiano, é particularmente expressiva; referido mestre, depois de argumentar que a admissão ou não da reparação do dano moral encontra-se na análise do que venha a ser considerado como bem jurídico diante do Direito italiano, ensina que “il codeice non dice che e un bene nè ciò che fa parte del patrimonio, nè ciò che è valutabi1e in danaro, nè ciò che è obbietto del diritto concreto di proprietà; dice, invece, che tutte le cose, che possono formare oggetto di proprietà, sono beni, affermando cosi la piú larga concezione della parola bene” (MINOZZI. Alfredo. Danno non patrimoniale. Società Editrice Libraria Milano, 1909. p.,131).

32 MONTENEGRO. Antônio L., Ressarcimento de danos. 2ª edição, Âmbito Cultural Edições. Rio de Janeiro, 1984, p. 133. Frise-se que foi a jurisprudência francesa que definiu o cabimento da reparação do dano moral naquele país, por meio de decisão de seu Conselho de Estado de 24/11/61. O cabimento, pelo Direito positivo francês, nunca foi admitido unanimemente por seus civilistas. Já no campo puramente doutrinário, os que admitem a indenização do dano moral baseada em lei fundamentam-se no artigo 1.382 do Código de Napoleão (conforme Mazeaud e Mazeaud, Leçons de Droit Civil, 6ª edição, tomo 2. volume 1, nº 419. p. 936).

42

aproximadamente, um equivalente subjetivo33, No Direito anglo-americano

predominam os julgamentos por equidade, com os juízes arbitrando caso acaso a

indenização pelo dano moral.

O direito Anglo-americano baseia-se no critério eqüitativo e jurisprudencial,

baseando suas decisões em casos símiles, porém nunca deixando de observar e

aplicar a função punitiva da indenização. Curiosa é o critério encontrado neste direito

para que se pague in natura pelo dano moral ocasionado em alguns raros casos.

Isto acontece apenas nos crimes denominados de jactation of mirrage (jactância de

matrimônio), que ocorre quando uma pessoa alega falsamente que é casada com

outra. Esta, por sua vez, pode entrar com uma ação de jactância como parte

ofendida e, provada a falsidade da alegação, à requerimento da parte, o juiz poderá

condena-lo ao silêncio perpétuo. Este é um dos raros casos em que não há a

interferência de dinheiro numa condenação.

Em termos de legislação, porém, dois paises merecem registro, a nosso

ver, por terem seus códigos previsto parâmetros precisos para arbitramento do

quantum debeatur. Veja-se, em primeiro lugar, o Código Civil português, em seus

artigos 484, 494 e 496:

Art. 484 -(ofensa do crédito ou do bom nome)

Quem afirmar ou difundir um fato capaz de prejudicar o crédito ou o bom nome de qualquer pessoa, singular ou coletiva, responde pelos danos causados.

Art. 494 -(limitação da indenização no caso de mera culpa)

Quando a responsabilidade se fundar na mera culpa, poderá a indenização ser fixada, eqüitativamente, em montante inferior ao a que corresponderiam os danos causados, desde que o grau de culpabilidade do agente, a situação econômica deste e do lesado e as demais circunstâncias do caso o justifiquem.

33 SILVA. Américo Luís da. O dano moral e sua reparação civil. São Paulo, Revista dos Tribunais. 1999. p. 104-105.

43

Art. 496- (danos não patrimoniais)

1. Na fixação da indenização deve atender-se aos danos não-patrimoniais que, pela sua gravidade, mereçam a tutela de direito. (grifo nosso) 2. Por morte da vitima, o direito à indenização por danos não-patrimoniais cabe, em conjunto, ao cônjuge não separado judicialmente de pessoas e, bens e aos filhos ou outros descendentes; na falta destes, aos outros ascendentes; e, por ultimo, aos irmãos ou sobrinhos que os representem.

3. O montante da indenização será fixado eqüitativamente pelo tribunal, tendo em atenção, em qualquer caso, as circunstâncias referidas no artigo 494; no caso de morte, podem ser atendidos não só os danos não-patrimoniais sofridos pela vitima, como os sofridos pelas pessoas com direito à indenização nos termos do numero anterior.

Também extremamente claras são as disposições do Código Civil do Peru

de 1984, ao prever, nos artigos 1.984 e 1.985, o quanto segue:

Art. 1.984 -EI daño moral es indemnizado considerando su magnitud y el menoscabo producido a la victima o a su familia

Art. 1.985- La indemnización comprende las consecuencias que deriven de la acción o omisión generadora del daño a la persona y el daño moral, debiendo existir una relación de causalidad adecuada entre el hecho y el daño producido.

El monto de la indemnización devenga intereses legales desde la fecha en que se produjo el daño.

A experiência francesa, bem como a legislação peruana, serão partes de

nosso alicerce nas medidas que em capítulo próprio serão sugeridas. De qualquer

modo, estas breves anotações demonstram as dissensões existentes diante seja da

natureza do prejuízo de ordem moral, seja da maneira de sua quantificação, temas

deste trabalho.

Frise-se apenas que se poderiam citar à exaustão outros tantos juristas

que, no Direito de outros povos, discutem o fundamento jurídico, a natureza e a

finalidade da reparação do dano moral, bem como as dificuldades para se encontrar

o montante indenizatório, mas os exemplos levantados abrangem as diversas

posições a respeito do tema. A título de ilustração, cite-se a excelente matéria da

44

Professora Zulmira Pires, em que se aponta intensamente não só a doutrina

alienígena, como também se faz um pormenorizado levantamento das legislações

do Direito comparado em relação ao dano moral.34

34 LIMA. Zulmira Pires de, "Responsabilidade civil por danos morais", Revista Forense, Rio de Janeiro, volume 83, setembro de 1990.

45

CAPÍTULO III

AS BASES PARA QUANTIFICAÇÃO DO DANO MORAL NO DIREITO

BRASILEIRO

Sumário: 3.1 Parâmetros quantitativos do dano moral na legislação pátria; 3.2 O dano moral na ótica doutrinária brasileira; 3.3 Evolução jurisprudencial sobre o tema; 3.4 O hodierno posicionamento jurisprudencial sobre o tema.

3.1 Parâmetros quantitativos do dano moral na legislação pátria

As dificuldades de nosso tema são demonstráveis, já à primeira vista, pela

imensa variedade de soluções dadas ao problema da quantificação do dano moral

puro, questão não resolvida pela Constituição Federal, como se disse, em sua

previsão genérica da indenização do dano material.

Não há dúvida, porém, de que, no tocante à liquidação das obrigações

resultantes de atos ilícitos, o Código Civil oferece algumas soluções a hipóteses que

especifica e que aparentemente refere-se a danos morais ⎯ e, que, na verdade,

procuram ressarcir as conseqüências patrimoniais decorrentes desses ilícitos. Nesse

sentido, parâmetros diversos são postos nos artigos 944, 945, 946, 948, 949, 950,

953 e 954 do Código Civil; de todos, ver-se-ão que os artigos 944 e 946 é o que se

oferece, hoje, à falta ainda de previsão normativa, à liquidação decorrente dos danos

morais puros.

Assim é que o artigo 948 e seus incisos prevêem o ressarcimento dos

danos, à evidência materiais, relativos às despesas com tratamento da vítima, seu

46

funeral e o luto da família, além da prestação de alimentos aos dependentes do

falecido. O dano moral consubstancia-se exatamente na expressão “luto da família”,

ou seja, no injusto pesar sentido pelos entes mais próximos do falecido. Mesmo

estando expresso em lei, durante tempos este artigo foi interpretado restritivamente,

até mesmo no Supremo Tribunal, fornecendo argumentos aos que defendiam a

inadmissibilidade da reparação dos danos morais decorrentes da morte de quem

não provia, ou ao menos ajudava a prover, a subsistência de seus familiares. Essa

jurisprudência encontrava-se ultrapassada quando da edição do texto constitucional,

mas por muito tempo grassou larga controvérsia a respeito da extensão dos danos

decorrentes de homicídio.

No artigo 952 existe a previsão expressa de ressarcimento da coisa

esbulhada, se impossível sua restituição, “pelo seu preço ordinário e pelo de

afeição”, mas em seguida limita-se o preço afetivo ao valor da própria coisa,

demonstrando-se, assim, que o referencial legal continua sendo o patrimônio

esbulhado, ou, como comenta Moura, a coisa subjetivamente considerada e que foi

perdida. Opina também sobre os reflexos materiais estabelecidos no artigo 953 do

Código Civil, no sentido de que a estimação do dano resultante da injúria ou da

calúnia só pode ser o dano patrimonial, ou não teria o legislador falado em

indenização correspondente ao dano resultante desses delitos; 35 ⎯ no parágrafo

único desse mesmo artigo, o legislador previu indenização compensatória, para a

hipótese de não se poder provar prejuízo material ⎯ o que prova, efetivamente, que

o parâmetro primeiro é o do prejuízo materialmente considerado e que, se não

35 MOURA. Mário Aguiar., “O dano moral na nova Constituição”, Repertório IOB de Jurisprudência, 1.ª quinzena de novembro de 1988, n.º 21/88, p. 328.

47

provado em concreto, será compensado por valor previamente determinado, e que é

aquele previsto nos artigos 138 a 140 do Código Penal.36

Por exclusão, portanto, e feita a ressalva anterior, o Direito positivo

brasileiro ordinário oferece como parâmetro, à liquidação do dano moral, tão-

somente o arbitramento judicial, forma pela qual prevista consoante implicitamente

estabelecido nos artigos 944 e 946 do atual Código Civil Brasileiro.

Perfunctoriamente, já se há de notar que não há limites legais previstos,

ficando à aferição do montante devido, assim, ao arbítrio do julgador em cada caso

concreto, pesadas as circunstâncias e conseqüências do agravo moral ⎯ o que, se

não é por si um vetor negativo, por outro lado gera insegurança e perplexidade às

partes, à falta de previsão normativa desses limites indenizatórios.

É o que se defenderá, como solução ao problema da quantificação do

prejuízo moral: a previsão, em lei ordinária, perfeitamente inserível, organicamente,

no ordenamento jurídico, de parâmetros que delimitem os valores indenizatórios,

considerados o grau de reprovabilidade da conduta do ofensor, as circunstâncias e

conseqüências decorrentes da ofensa e, objetivamente, sua gravidade diante do

bem da vida atingido.

Na defesa dessa proposta, tenha-se presente que o Código Penal

estabelece critérios que devem ser seguidos para a fixação do quantum debeatur

nos casos de injuria e calúnia ⎯ e, não há como se negar, por extensão também às

hipóteses de difamação ⎯, em seus artigos 138 e 140. Essas sanções,

preestabelecidas no dobro da multa no grau máximo da pena criminal respectiva

equivalem, pelo Código Penal, a setecentos e vinte dias-multa, uma vez que o grau

máximo a ser duplicado representa trezentos e sessenta dias-multa, variando o valor 36 Por analogia enquadram-se aqui os demais crimes praticados contra a honra, salvo dispositivo em contrário.

48

unitário dessa multa em virtude das condições econômicas do ofensor. Esta a

exegese que se faz do artigo 49 e seu parágrafo 1º do Código Penal, combinado

com os critérios do artigo 59 e seus incisos da mesma lei.

No entanto, frise-se mais uma vez, que essa estimação, expressamente,

compensa perdas e danos materiais que não tenham sido provocados pela vítima,

não se referindo, pois, ao dano moral puro, desvinculado dos reflexos de ordem

econômica.

Em suma, tanto o Código Civil como o Código Penal não cuidaram de

estabelecer critérios definidos, em termos pecuniários, para a quantificação do dano

moral puro; o que neles foi previsto levou em conta o chamado dano moral indireto,

ou seja, os reflexos patrimoniais da ofensa de caráter moral, não servindo, portanto,

aos propósitos do estabelecido na Constituição Federal ⎯ e havendo necessidade,

em conseqüência, de serem criadas normas específicas para a aferição do dano

moral despido de reflexos econômicos.

3.2 O dano moral na ótica doutrinária brasileira

As dificuldades até aqui apontadas também o são, no mais das vezes,

pelos doutrinadores brasileiros que trataram da matéria. Relembre-se de que, em

nível Legislativo ⎯ do atual Código Civil ⎯, as únicas normas existentes, a embasar

a análise judicial dos danos morais, são os artigos 944 e 946, a de terminar, por

exclusão, o arbitramento como forma de fixação da verba indenizatória devida. Esse

aspecto gera uma evidente flexibilidade no arbitramento do quantum indenizatório,

que muitos vêem como perigosa, pela incerteza de critérios que nortearão, caso a

caso, cada julgador em particular.

49

A respeito do alcance dos danos morais, Bittar37 entende que a par da

reparação específica referida ⎯ no Código e em leis especiais ⎯ comporta também

compensação em pecúnia, prevalecendo a orientação de que o respectivo

dimensionamento ⎯ levado em conta, de regra, diante do modelo do homem

médio38 na sociedade ⎯ deve ser graduado em consonância com o caso concreto,

consideradas, quando presentes, as situações pessoais e objetivas mencionadas

(por exemplo, a exacerbação pela intensidade do dolo, em particular em danos

pessoais e morais). Cabe registrar que, da análise da jurisprudência, resulta nítida a

evolução ocorrida nesse passo, ante à consciência que ora se tem de que a

reparação se confere pelo dano moral em si, e não como reconhecimento de dano

material indireto (ou reflexo), como durante certo tempo prevaleceu. O caráter

reparatório impõe, ademais, como vimos realçando, a atribuição de valor que iniba o

agente de novas investidas (como, por exemplo, a condenação que estipule

pagamento em dobro, ou em triplo, ou em outro referencial, sobre uma base obtida) .

Este entendimento realça, como claramente se observa, a análise da

gravidade do fato concreto diante do dano moral em si considerado, o que deixa ao

juiz a tarefa de se colocar na posição do homem médio e, a partir desse

posicionamento, examinar a dimensão do prejuízo moral havido e,

conseqüentemente, como base na solução alcançada, dimensionar a reparação

pecuniária que se faz necessária para não apenas compensar o ofendido, mas

também para desestimular a prática de atos semelhantes, com o que a indenização

37 BITTAR. Carlos Alberto., Responsabilidade civil ⎯ teoria e prática. Forense Universitária, 1ª ed., São Paulo, 1989, p. 96. Assinala-se a amplitude das hipóteses em que Indenizável o dano moral, na defesa de direitos da personalidade lesados física: intelectual ou moralmente (direitos á vida, à honra, à integridade física etc.). 38 O homem médio é aquele que, em relação à moral e à compreensão de seu ser, não é nem suscetível demais à abalos psicológicos ou muito menos resistente em demasia. O juiz deverá observar, a partir do conceito de moral aplicado à sua sociedade, e verificar por estes padrões a possível extensão do dano no caso concreto.

50

adquire nítido caráter de sanção civil ⎯ com o que, de resto, se concorda

integralmente, perante a previsão constitucional do artigo 5º incisos V e X, já citado.

Sílvio Rodrigues afirma, igualmente, que no caso de danos morais não

especificados em lei (quanto à forma de apuração), “o juiz ordenará que se deve

fixar por arbitramento a indenização”.39 Esta era a expressa aplicação do artigo

1.553 do antigo Código Civil ao caso concreto. Hoje, entretanto, o atual código traz

em seus artigos 944 ao 954, esta prerrogativa implícita, ressaltando simplesmente o

critério inerente ao juiz: a eqüidade para a solução dos danos morais. Alguns outros

autores, a exemplo de Santos40, após ressaltar que nos danos morais, por vezes, na

impossibilidade de restituo in integrum, procurar-se-ia atingir uma situação material

correspondente ⎯ em regra pecuniária ⎯, afirma que grande é o papel do

magistrado na reparação do dano moral, competindo, a seu prudente arbítrio,

examinar cada caso, ponderando os elementos probatórios e medindo as

circunstâncias, preferindo o desagravo direto ou compensação não-econômica à

pecuniária, sempre que possível, ou se não houver risco de danos. Também aí ,fica-

se com a sensibilidade do juiz perante o caso concreto como balizador principal,

senão único, do montante devido pelo ofensor, pois não há, como já se disse, limites

fixados em lei na generalidade dos casos.

De forma precisa, sintetizando a dificuldade decorrente da ausência de

normas sobre o assunto, ensina Limongi França que a impossibilidade da

eqüipolência entre qualquer espécie de dano, inclusive o material, resulta na falta

de caminhos exatos no que tange ao dano extrapatrimonial. Frisa que esse aspecto

39 RODRIGUES. Sílvio., Direito Civil, volume IV, Responsabilidade civil, Saraiva, 6ª ed., São Paulo, 1982, p. 213. 40 SANTOS. Antônio Jeová dos., O dano moral indenizável. 3ª edição, São Paulo, editora Método, 2001. p. 81. Neste mesmo sentido: Adriano de Cupis, El dano ⎯ teoria general de la responsabilidad civil. Tradução de Ágel Martinez Sarrión. Barcelona. Borch. P. 226.

51

não deve, porém, gerar perplexidade, haja vista estar o cotidiano jurídico todo inçado

de standards, que só podem ser resolvidos hic et nunc. Ressalta in fine que o

importante é, a par do princípio da reparabilidade, admitir o da indenizabilidade,

para que, como assinalam outros autores, não fique a lesão moral sem

recomposição, nem impune aquele que por ela é responsável, fatores, ambos, que

seriam de perpetuação de desequilíbrios sócio-jurídicos41. Interessante notar que se

enfatizou justamente o caminho que seria pouco depois trilhado pela Constituição

Federal, que aponta expressamente o dano moral como indenizável, indicando

assim a natureza sancionatória, ao lado da compensatória, do ressarcimento do

dano moral. O mestre paulista adota, como conclusão, no que toca à apuração do

valor de indenização, a citada legislação peruana, segundo o disposto em seus

artigos 1.984 e 1.985 ⎯ e, efetivamente, o balizamento que referida norma fornece

ao julgador é de utilidade flagrante, e muito próximo ao que se tem por sugestão

para a matéria no presente trabalho.

Na mesma linha de argumentação, Mannitt42 pondera que a omissão do

Código em estabelecer o montante indenizatório faz com que se busque todo

elemento possível para encontrar em cada caso o valor mais adequado para a

situação em exame, frisando ser o arbitramento, por isso, o critério de maior uso,

sempre somado ao prudente arbítrio do juiz. Argumenta, porém, com o que se 41 Vários doutrinadores, defendem a necessidade de amadurecimento de critérios básicos para recomposição da lesão moral, lembra os progressos havidos no campo da indenização por acidente de trabalho, considerando-o o adminículo mais expressivo existente em termos legislativos, no Brasil, para a reparação do dano moral.

42 MANNITT. Arnaldo, Perdas e danos, Rio de Janeiro. Aide. 1987, p. 138. Outro aspecto importante destacado pelo citado autor, magistrado carioca, é o de examinar a dosagem da culpa com que se houve o autor das perdas e danos, auscultando a conduta do agente, antes e depois da prática danosa. Sob esse prisma, cita como bom exemplo legislativo, o artigo 84 do Código de Telecomunicações, ao estabelecer que, “na estimação do dano moral, o juiz, terá em conta, notadamente, a posição social ou política do ofensor, a intensidade do ânimo de ofender, a gravidade e a repercussão da ofensa”.

52

concorda, que “mais sensato teria sido o legislador, se tivesse disciplinado a matéria,

prescrevendo uma indenização tarifada, em salários mínimos, atendendo às

peculiaridades de cada caso”. Com isso, afirma, permite-se graduar o valor

indenizatório com a gravidade do prejuízo moral e, inclusive, com o grau de culpa,

no caso de concorrência de culpas.

Veja-se nessa colocação a mesma preocupação de, à maneira francesa,

limitar os valores da indenização devida, tarifando-a. Se é certo que a dor moral não

tem preço (por exemplo, no caso da perda de uma vida humana), não menos certo é

que, no ressarcimento do mal injustamente causado, tanto melhor será para ambas

as partes que haja um balizamento concreto, o que não tira do juiz o dever de

subjetivamente aferir a gravidade do caso concreto, mas lhe impõe a obrigação de

arbitrar a indenização Com base em valores preestabelecidos, que tanto evitam a

fixação de valores irrisórios, como não permitem o locupletamento excessivo do

ofendido à custa do ofensor. A rigor, nenhuma novidade haverá na fixação legislativa

de tais limites, quando se lembra existirem semelhantes disposições no Código Civil,

ainda que se refiram, como já se disse, às conseqüências patrimoniais decorrentes

de ilícitos penais (artigos 944, 945, 946, 948, 949, 950, 953 e 954 da lei civil); ainda

que não haja, nesses dispositivos, variação que permita ao juiz dosar a pena

perante o dano moral considerado em si mesmo, já se prevêem parâmetros que são,

ao menos, seguros à fixação do montante reparatório devido, compensatório das

consequências ou dos reflexos patrimoniais indiretos causados pelo dano moral

havido.

Em que pesem tais colocações, remanesce ainda quem, apesar da

previsão constitucional, negue não só o caráter de pena civil da ressarcibilidade do

dano moral, como afirme inexistir indenização possível fora do campo da

53

responsabilidade patrimonial. Como exemplo desse posicionamento, cite-se o Des.

Moraes, que nega, peremptoriamente, seja dano um conceito extrapatrimonial;

afirma, ao invés, que o que se tem chamado de “dano moral” é não a subtração de

alguma parcela do patrimônio de alguém mas o mal ⎯ ora psíquico, ora somático

(ou ambos), ora propriamente moral ⎯ que o agressor inflige à sua vítima. É, pois,

sempre, um padecimento pessoal. Por causa desse mal, pode o agente ser

obrigado, por força de lei, a pagar ao paciente certa soma. E é a propósito desse

pagamento e deste dinheiro, dito outrora pecunia doloris (o Schmerzensgeld43 dos

alemães), que se fala em “indenização”. Não podia sê-lo, porquanto, com ele, não se

está a recompor patrimônio algum44. Para negar a natureza sancionatória da

reparação moral, apresenta a situação seguinte:

“Certo pai castiga seu filho. Depois, dando-se conta de que o castigo foi injusto (mas já foi aplicado e é irreversível), quer reparar a injustiça agradando-o com um presente. Nada repara, mas a criança sairá contente com a vantagem e poderá mesmo esquecer tal injustiça. É mais ou menos o que se dá na indenização por dano moral: a vítima recebe certa importância em dinheiro e se vai consolada da ofensa padecida. Vantajoso o pagamento, pode ele representar uma satisfação. Mas a contrapartida metálica não corresponde exatamente a uma compensação, porque são valores de distintas dimensões o bem pessoal atingido e o dinheiro recebido. Compensação exige aqui ponderância. A vantagem monetária. no entanto, enquanto satisfação, se não neutraliza o sofrimento da lesão pessoal, pode operar como anestésico do mal impingido. Como visto, o problema da eficácia e da razoabilidade da indenização do dano moral é assunto para psicólogos e não para juristas. Pena civil, tampouco o é essa indenização, já que as penas operam muito mais como medidas repressivas do que como soluções

43 Schmerzensgeld , é o termo alemão para designar a “compensação pelo sofrimento pessoal”. (nota nossa). 44 MORAIS. Walter. Essa inexplicável indenização por dano moral, Repertório IOB de Jurisprudência, 1ª quinzena de dezembro/89, nº 23/89, p. 417. Elucidativo do pensamento do abalizado mestre paulista é o sumário por ele oferecido no referido artigo: “1. Dano e indenização são ‘categorias civis patrimoniais’. 2. O chamado 'dano moral' corresponde a um mal pessoal fora do campo da patrimonialidade. 3. Não há, pois, nem dano nem indenização possível. 4. Dela se distinguem a possível reparação da lesão extrapatrimonial e o ressarcimento do prejuízo causado no patrimônio da vítima pela mesma ação lesiva ainda que de difícil cálculo. 5. Onde se confirma o sobredIto com os exemplos do Código CIvil. 6. Onde se descreve o efeito aparentemente compensatório da pecunia dololis. 7. PrimeIra conseqüência importante da singularidade da indenização pelo dano moral: os casos da lei são exaurientes. 8. A segunda conseqüência: tal indenização não é compatível com um cálculo econômico-matemático. 9. Como avaliar o quantum debeatur.”

54

reparatórias. A indenização de que se trata, se bem possa e deva ter uma expressão dissuasória, busca em essência ser reparatória.”

Ousa-se divergir de tal entendimento, nada obstante a autoridade do

doutrinador. Mesmo defendendo a tese negativista, o próprio autor afirma, em outro

trecho de seu trabalho, que a eficácia da contrapartida pecuniária está na aptidão

para proporcionar tal satisfação em justa medida, de modo que tampouco signifique

enriquecimento despropositado da vítima, mas está também em “produzir no

agressor impacto bastante para persuadi-lo a não perpetrar novo atentado”

(grifo nosso).

Ora, a persuasão para se evitar um novo atentado de ordem moral

significa, fundamentalmente, uma sanção para o ofensor. Embora a pena civil seja

conceituada como aquela decorrente da inadimplência de obrigações pactuadas

como ato de vontade das partes contratantes,45 tem-se aqui, por força do texto

constitucional, caráter indenizatório, a titulo de desagravo, previsto expressamente

no Direito Positivo; se o caráter indenizatório não retira o fato de que o ofensor irá

também compensar, satisfazer a vítima do mal causado, é fato incontestável que

tem por função primordial o desestimulo ⎯ em relação ao ofensor e como exemplo à

sociedade de que este faz parte ⎯ à prática de atos semelhantes, apenado,

portanto, o ofensor, e não apenas reparando o mal causado à vítima ou à sua

família.

45 DE PLÁCIDO E SILVA, em seu Vocabulário jurídico, Forense, 101 ed., Rio de Janeiro, 1987, p. 340, assim conceitua a pena convencional, que assimila à pena civil, colocando-as como termos sinônimos: "Assim se diz de toda pena ou multa Imposta nos contratos, como sanção ou não cumprimento de obrigações que neles se estabelecem. É a mesma pena civil inscrita nas cláusulas penais. A pena convencional, resultando da manifestação da vontade das partes contratantes, não pode, por extensão, ultrapassar os limites traçados pela vontade das partes, em conseqüência do que não pode ser aplicada em hipótese diversa da que se encontra consignada na cláusula em que é instituída" (grifos do original). A pena civil decorrente da violação causadora do dano moral, porém, não resulta de manifestação da vontade, e sim do ilícito, contratual ou aquilino, praticado pelo ofensor, não se restringindo ⎯ no caso do ilícito contratual ⎯ aos limites fixados em eventual cláusula penal estabelecida em contrato.

55

Este o entendimento, também, que se extrai de Pereira,46 para quem a

indenização pelo dano moral representa, ao mesmo tempo, uma punição ao infrator

e uma compensação à vítima, não havendo que se falar em pagamento de um valor

correspectivo ao prejuízo causado, por não ser o dano moral passível de avaliação

em sentido estrito. A partir dessa premissa e defendendo o ilustre civilista que a

liquidação do quantum far-se-á na proporção da lesão sofrida, argumenta com a

necessidade de conter a reparação dentro do razoável., “para que jamais se

converta em fonte de enriquecimento”. Em outras palavras, a dificuldade da

liquidação do valor devido encontra-se na definição do que seja razoável, caso a

caso, à falta, como se tem frisado, de parâmetros legislativos suficientes.

Novamente voltando às posições de Melo da Silva, que esgotou o que se

poderia pesquisar sobre a matéria à época, e defendendo o monografista ser o

arbitramento o critério por excelência para indenizar o dano moral, coloca ainda o

jurista mineiro sua opinião de que “não existe, ainda, a balança exata,

46 PEREIRA. Caio Mário da Silva., Instituições de Direito Civil, volume 11, Teoria geral de obrigações, Forense, 8ª ed., Rio de Janeiro, 1986, pp. 234-236. Precioso é o ensinamento seguinte, após afastar o renomado autor a idéia de que a indenização deva ser simbólica, pela impossibilidade de restabelecimento de valores: “Apagando do ressarcimento do dano moral a influência da indenização, na acepção tradicional, como técnica de afastar ou abolir o prejuízo, o que há de preponderar é um jogo duplo de noções: a) De um lado, a idéia de punição ao infrator, que não pode ofender em vão a esfera jurídica alheia; não se trata de imiscuir na reparação de uma expressão meramente simbólica e, por esta razão, a sua condenação não pode deixar de considerar as condições sociais e econômicas dele, bem como a gravidade da falta cometida, segundo um critério de aferição subjetivo: mas não vai aqui uma confusão entre responsabilidade penal e civil, que bem se diversificam; a punição do ofensor envolve uma sanção de natureza econômica, em beneficio da vitima, à qual se sujeita o que causou dano moral a outrem por um erro de conduta. b) De outro lado, proporcionar à vitima uma compensação pelo dano suportado, pondo-lhe o ofensor nas mãos uma soma que não é o pretium doloris, porém uma ensancha de reparação da afronta; mas reparar pode traduzir, num sentido mais amplo, a substituição por um equivalente, e este, que a quantia em dinheIro proporciona, representa-se pela possibilidade de obtenção de satisfações de toda espécie, como dizem Mazeaud e Mazeaud, tanto materiais quanto intelectuais, e mesmo morais. Em doutrina, conseguintemente, hão de distinguir-se as duas figuras, da indenização por prejuízo material e da reparação do dano moral: a primeira é reintegração pecuniária ou ressarcimento stricto sensu, ao passo que a segunda é sanção civil direta ao ofensor ou reparação da ofensa, e, por isto mesmo, liquida-se na proporção da lesão sofrida”. A ligação não afasta, porém, haja vista a subjetividade do critério de proporcionalidade, a dificuldade de se quantificar o valor devido para se compensar e, simultaneamente, punir o ofensor.

56

cientificamente certa, na qual se pudesse pesar os imponderáveis da justiça e com a

ajuda da qual o cuique tribuire pudesse se materializar sem a interferência do arbítrio

judicial”. A responsabilidade fundamental pela fixação do montante devido é, assim,

do juiz, cujo arbítrio e interferência são vistos com naturalidade pelo autor referido,

que enfatiza a instabilidade do Direito, sua variação e evolução com os fatos sociais,

como preponderante à necessidade de sua revitalização por meio da atuação da

jurisprudência. Tem-se aqui um posicionamento claro de consideração da

jurisprudência como fonte formal do Direito, o que, de resto, se tem como inegável,

não se devendo olvidar o quanto representaram as decisões dos Tribunais para que

o legislador, por fim, trouxesse em nível de princípio constitucional a indenizabilidade

do dano moral.47

Autor que recentemente se ocupou da matéria, Montenegro48 defende

também a fixação de valores preestabelecidos, em lei, para que o juiz aponte a

47 SILVA. Wilson Melo da., O dano moral e sua reparação, Forense, Rio de Janeiro, 1955, p. 399. O abalizado autor critica quem enxerga no arbítrio dos juizes um mal, ao apontar as regras existentes sobre a matéria, limitando essa discricionalidade e defendendo a criação de outras normas sobre a matéria, como fica claro no trecho seguinte: "Regras doutrinárias e legais existem (e outras podem ser criadas) pelas quais facilmente se poderiam impor limitações ou petas ao arbítrio do juiz na determinação dessa modalidade de reparação. Haja vista, por exemplo, o que acontece com o ordenamento contido nas disposições do artigo 1.916 do recente Código Civil mexicano, de 1938, de conformidade com as quais a indenização pelos danos morais jamais ultrapassará de um terço do total a que possa ascender o montante da responsabilidade civil do autor de um dano.

E mais ainda: na hipótese da compensatorio lucri cun damno, ao juiz se tornaria defeso mandar consignar em favor da vitima, qualquer parcela outra, em dinheiro, ou não, a titulo de reparação, além daquela que naturalmente lhe adveio do próprio prejuízo. E em se tratando das injúrias impressas, tem sido norma estatuir-se, numa evidente limitação ao arbítrio do juiz, que a reparação dos danos morais apenas se efetive pela publicação da sentença que reconheça a inocência do caluniado e a culpa do caluniador, tal como se faz, presentemente, no Chile (artigo 415 do Código Penal e artigo 25 do Decreto-lei 425, de março de 1925) ou na Itália", quanto a este último pais reportando-se ao artigo 186 de seu Código Penal. 48 MONTENEGRO. Antônio Lindbergh C. Ressarcimento de danos. Âmbito Cultural, Rio de Janeiro, 1984, p. 134. O sistema defendido pelo autor é derivado, segundo aponta, do relato do Des. Sady Gusmão, no que tange à tese vitoriosa da reparação do dano moral, na III Conferência de Desembargadores do Brasil, de 1965, em que se diz que "o ideal, ou pelo menos, mais seguro e democrático, seria a indenização tarifada de um a dez salários mínimos, tendo em vista as peculiaridades de cada caso concreto, como ocorre nos acidentes de trabalho, embora nesta parte seja a revivescência do vetusto sistema da composição pecuniária". Nosso posicionamento, a seguir defendido, admite a fixação de limites, tarifando-os, também por entender ser este o método mais seguro e objetivo de que se pode valer o juiz na cominação do valor devido ⎯ embora se admita também, alternativamente, que se indenize de forma outra que não a pecuniária.

57

indenização devida, após análise da gravidade de cada caso, indicando como feliz a

fórmula encontrada pelo Código de Telecomunicações (artigo 8º e parágrafo 1º), ao

estimar o dano extrapatrimonial no mínimo de cinco e no máximo de cem salários

mínimos, o que atenderia satisfatoriamente à reparação do dano moral, segundo as

peculiaridades de cada caso concreto.

Aguiar Dias anota igualmente como balizamento "por excelência" do

julgador para aferição do quantum o arbitramento, critério que afirma ser o único

possível, “em face da impossibilidade de avaliar matematicamente o quantitativo

pecuniário que satisfaça o pretium doloris”.

Essa impossibilidade, como se vê, não mais existiria se previstos fossem,

desde logo, os valores passíveis de indenizar a lesão decorrente da ofensa moral.49

Existem ainda os que se filiaram a esta nova corrente doutrinária, por

exemplo Azevedo50, negativista antes da atual Constituição Federal, após a

promulgação desta ensina que se o dano for moral, para que se indenize,

certamente, no Direito Brasileiro, é preciso que agrida direitos da personalidade, com

ou sem reflexos da perda patrimonial. Suponham que um jornalista perpetre,

injustificadamente, verdadeira campanha difamatória contra um determinado político,

fazendo de seu jornal um meio pérfido de vingança privada. Dano, indiscutivelmente,

49 DIAS. José de Aguiar., Da responsabilidade civil, volume II, Forense, 7ª ed.. Rio de Janeiro, 1983, p. 842. Acórdão citado nessa mesma obra. consagrada em nossa doutrina. resume bem a questão de ordem prática perante a ausência de previsão legal para valoração do prejuízo moral: "Protesto indevido de titulo. com abalo de crédito do devedor, acarreta para o credor a obrigação de indenizar, não lhe cabendo alegar, para elidir a ação, o fato de ter sido relegada à execução a apuração dos danos verificados, porque isso não significa inexistência de prejuízo ou ausência do pressuposto do dano essencial à ação de reparação, mas apenas falta de elementos para imediata apuração do quantum” (RTJ, volume 44, p. 677) (op. cit. p. 847). 50 “Se o dano for moral, para que se indenize, no Direito Brasileiro, é preciso que se ocasione prejuízo ao vitimado que se conte pecuniariamente. (...) Como vemos, o dano moral, embora em nosso entender devesse ser, não é indenizável, em nosso direito, a não ser que o determine a lei, nos exatos termos desta” (AZEVEDO. Álvaro Villaça, Curso de Direito Civil ⎯ Teoria geral das obrigações, Revista dos Tribunais, 3ª. ed.. São Paulo, 1981. pp. 269-270).

58

existe, tão-só, por essa conduta. Sem cogitar-se da responsabilidade, no âmbito

penal, do jornalista, será este condenado a indenizar danos patrimoniais e também

morais, na esfera civil, se restar comprovado efetivo prejuízo ao político. Por

exemplo, pode ele, em razão dessa difamação, perder um empréstimo, que

estivesse por obter, junto a determinado Banco, independentemente de ver-se

ofendido em sua honra. Defende ainda que a enumeração dos direitos da

personalidade apontados no inciso X do artigo 5º do texto constitucional não é

taxativa, abrangendo não só a pessoa física como a jurídica, já que esta, tanto

quanto aquela, “tem patrimônio imaterial a preservar”.51

Por fim, não se poderia deixar de citar o posicionamento do Des. Yussef

Cahali, para quem, nos casos de prejuízo moral, a função do dinheiro é meramente

satisfatória, afirmando que a sanção do dano moral não se resolve numa

indenização propriamente, já que indenização significa eliminação do prejuízo e das

suas conseqüências, o que não é possível quando se trata de dano extrapatrimonial;

a sua reparação se faz através de uma compensação e não de um ressarcimento;

impondo ao ofensor a obrigação de pagamento de uma certa quantia em dinheiro

em favor do ofendido, ao mesmo tempo que agrava o patrimônio daquele,

proporciona a este uma reparação satisfativa.52 A lição acima, anterior à

Constituição Federal de 1988, confirma, em senso contrário, o caráter sancionatório

atual, uma vez que, expressamente, a norma constitucional conferiu o caráter de

51 AZEVEDO. Álvaro Villaça. Curso de Direito Civil ⎯ Teoria geral das obrigações, 3ª. ed.. São Paulo, Revista dos Tribunais, 1981 .p. 225-227. 52 CAHALI. Yussef Said.. “O dano moral e sua reparação”, p. 26, apud RJTJ-SP, Lex, volume 124/136, v. acórdão relatado pelo Des. Flávio Pinheiro, de 14/11/89. Essa decisão demonstra bem a dificuldade na liquidação do dano moral, a falta de critérios normativos, pois que, admitindo embora a reparação do prejuízo moral, remeteu as partes à liquidação por artigos, com todas as dificuldades e dispêndio de tempo e dinheiro decorrentes desse tipo de liquidação, que abre todo um contraditório, toda uma nova cognição às partes.

59

indenização à reparação devida pelo ofensor. Defender-se-á, mais adiante, essa

opinião.

3.3 Evolução jurisprudencial sobre o tema

Deve-se também à jurisprudência, como ressaltado, a evolução do

pensamento jurídico do legislador pátrio, hoje tendo previsto na Constituição Federal

de 88 o desagravo ao dano moral. Decisões que enfrentaram interpretações literais

da lei e que, muitas vezes com base em conceitos de equidade, ou com fundamento

nos princípios gerais de direito, inovaram, ousaram e terminaram por solidificar o

entendimento predominante da necessidade de reparação do dano moral.

Isto se deu, porém, de forma gradativa, difícil e lentamente, com avanços

e recuos que só faziam tornar mais discutível e contraditório o tema. Passa-se a

apontar alguns dos mais importantes acórdãos a respeito do tema, tanto anteriores

como contemporâneos à atual Constituição Federal.

Sílvio Rodrigues53 aponta duas decisões do Egrégio Supremo Tribunal

Federal, que bem demonstram a dissensão então existente. O primeiro deles, que se

53 RODRIGUES. Sílvio. Direito Civil, volume IV. Responsabilidade civil, Saraiva, 6ª edição. 1982. pg. 206-210. Ao comentar a evolução do tratamento dado à matéria pela jurisprudência, aponta o mestre consagrado da Universidade de São Paulo que “a tese de reparabilidade de dano moral, sem qualquer ressalva, sem nenhuma divergência e sem entrar em justificativas que implicassem em restrições à sua admissibilidade, foi proclamada por acórdão unânime do Tribunal Pleno, datado de 29/10/70, e relatado pelo ilustre Moacyr Amaral Santos. Essa orientação foi reafirmada em outras decisões do Pretório Excelso”. Em nota de rodapé à última observação, citam-se os arestos contidos em Revista trimestral de Jurisprudência 57/786, julgado em 11/3/71; 62/102, julgado em 8/5/72: e 62/255, julgado em 12/6/72, transcrevendo-se a ementa seguinte concernente ao julgado contido em RTJ 62/102 e relatado pelo então Ministro Antônio Neder: “Se a inicial, em ação por indenização por ato ilícito, pede o ressarcimento de todos os danos, nestes se incluem os danos morais. E se a sentença manda que o responsável pelo ato ilícito indenize o dano moral, não há como se cogitar de julgamento o ultra petita no caso.” Há duas décadas, pois, já se admitia no Egrégio Supremo TrIbunal Federal o ressarcimento do dano moral. Nada obstante, muitas decisões posteriores só admitiram a consideração do dano moral indireto, ou seja, com reflexos patrimoniais, não se indenizando o dano moral considerado em si mesmo (v.g.. o acórdão contido em RT 503/237, também do STF, negando o dano moral, estético, como “reparo especial, porque indenizado o dano material correspondente” ⎯ Relator Ministro Rodrigues de Alckmin. 16/11/76).

60

indica como relatado por Otávio Kelly, in Arquivo Judiciário, 60/230, tem destacado o

trecho seguinte:

“O pai tem, se lhe morre um filho, o direito de haver do causador do dano certa indenização se esta visa compensar-lhe a perda de alimentos dele recebidos, depois de maior. Se o falecimento ocorre antes disso, não se concebe igual direito, porque, até então alimentário é o menor, a quem falta esse dever pelas condições próprias da idade e subordinação às regras de assistência familiar.”

Perceba-se que no aresto acima falta, por completo, a idéia de

ressarcimento do dano moral. Entende-se possível apenas que o dano seja

reparado como forma de compensação a alimentos ⎯ aspecto patrimonial, portanto

⎯ que o filho maior poderia prestar ao pai, negando-se a indenização, porém, na

medida em que o filho passasse a representar apenas fonte de despesas, como

alimentário. Mais adiante cita o civilista paulista ⎯ acórdão inserto na RT 176/229:

De acordo com a tradição de nosso direito, de acordo com o texto expresso da lei, de acordo com a lição dos doutrinadores e torrencial jurisprudência dos Tribunais, nos casos de homicídio a obrigação de alimentos, não sendo devido o ressarcimento da lesão, a título de danos morais (Lacerda de Almeida, Obrigações, p. 328: Lafayette. Direito das coisas, 3ª edição. p. 473; Carvalho de Mendonça. Tratado de Direito Comercial, volume VI, 2ª parte, p. 538; acórdãos que se encontram na RT 73/193, 74/375, 75/66 e 78/543; Revista Forense, 94/477 e 101/79, estes últimos do Supremo Tribunal Federal). Firmando assim que, em nosso direito, o dano moral é irreparável e estabelecida também a impossibilidade de ampliação nos termos do artigo 1.537 (atual art. 948), do Código Civil, impõe-se a improcedência da ação, na parte que visa a decretação da responsabilidade da ré pelos danos morais derivados do desastre. (atualização nossa)

Tinha-se, aqui interpretação literal da lei, restringindo os efeitos do artigo

948 do Código Civil às despesas puramente patrimoniais, referentes a tratamento,

funeral e luto da família, além da prestação de alimentos às pessoas a quem o de

cujos os devia. Essas decisões demonstram o posicionamento predominante de

então, de se negar à reparação do dano moral por ausência de texto expresso que

assim determinasse, afirmando-se ainda ser da tradição de nosso Direito a

61

indenização apenas dos danos patrimoniais negado o mesmo direito àqueles

prejuízos sem expressão de ordem econômica

Contrastando com esse posicionamento e apontado por Sílvio Rodrigues

como verdadeiro leading case (caso inicial) na jurisprudência pátria, tem-se o v.

acórdão54 relatado pelo Des. Aliomar Baleeiro, na qualidade de Ministro do Supremo

Tribunal Federal, no qual ficou assentado, em sua ementa que “o dano moral é

ressarcível. A corrente que lhe restringe a ressarcibilidade é contrária á lei e à lógica

jurídica. A regra geral é a de responsabilidade plena, não havendo como confundir

princípio de liquidação com princípio atinente ao direito de reparação”.

Esse v. acórdão55 e outros de igual porte levaram à formulação da Súmula

491, do Supremo Tribunal Federal, assentando-se ser “indenizável o acidente que

54 Observação: as notas a seguir foram transcritas ipsi literis, de forma que alguns artigos ainda encontram-se registrados no antigo Código Civil. Os artigos 1.537 e 1.547 foram reeditados no novo c´digo sob os nº 948 e 953.

RF 217/67. O voto do Ministro Aliomar Baleeiro foi acompanhado por voto, igualmente brilhante, do sempre lembrado Ministro Pedro Chaves, no qual afirmou na época: “É principalmente na exegese do artigo 1.537 que se funda a opinião daqueles que sustentam ter ficado a indenização nos casos de morte, circunscrita ao pagamento das dessas de tratamento, funeral e luto, e prestação de alimentos a quem o defunto os devia. Data maxima venia a restrição dessa interpretação é contra legem e contra a lógica judicial. Contra a lei porque atenta contra o princípio da responsabilidade amplamente estatuído no artigo 159. Contra a lógica judiciária porque aplica simples preceito regulador de liquidação, em caso específico, como regra restritiva do direito mesmo à indenização, estabelecendo um conflito entre o mandamento geral e o texto peculiar. De tal forma de interpretação restritiva resultaria, a meu ver, o absurdo de um convite imoral àquele que fere, para levar adiante o dano até a morte para diminuir a indenização. E isso resulta de que pela interpretação restritiva do artigo 1.537 a reparação pela morte de quem estivesse sujeito à obrigação de alimentar as despesas únicas de tratamento, funeral e luto, enquanto que pelo ferimento, o débito da responsabilidade seria lançado em várias rubricas, desde o mesmo tratamento até lucros cessantes, multa criminal e pensão. Nem se pode afirmar como verdade absoluta que o Código Civil tenha excluído da reparação o dano moral, quando no artigo 1.547 (que trata do dano moral causado por injúria e calúnia), parágrafo único, na impossibilidade da prova de dano material pela injúria ou pela calúnia, a indenização consistiria no pagamento da multa criminal máxima e em dobro. Não é preciso, a meu ver, apelar para a evolução do direito, para se concluir pela indenização do dano moral, bastando deixar que a jurisprudência caminhe na reapreciação dos textos existentes e os vitalize, valorize, atualize, através de interpretação construtiva, que é a sua missão, dentro dos princípios consagrados pelo mesmo Código. A regra geral é responsabilidade plena. A restrição está amparada inadequadamente num preceito peculiar à liquidação, que não deve ser tido como isolado, mas jungido aos princípios”. Essa memorável decisão abriu as portas para que a indenização por dano moral fosse admitida gradativamente para tantas outras hipóteses, não se restringindo à questão da morte de filho menor. podendo ter a amplitude, hoje conhecida, de abranger quaisquer danos aos dIreitos da personalidade. 55 E encravado no corpo do v. acórdão destaca-se o trecho seguinte: “O homem normal, que constitui família, não obedece apenas ao simples impulso fisiológico do sexo, mas busca satisfações

62

causa a morte de filho menor, ainda que não exerça trabalho remunerado”. Não só o

acidente, como é curial, mas também a morte intencionalmente causada pelo

agente, ou seria premiado o dolo em face de um ato não-proposital. Muito, porém,

ainda se discutiria a respeito do assunto, em hipóteses mais amplas que a da morte

do filho menor.

Assim é que, no mais das vezes, passou a jurisprudência pátria a admitir a

“indenização pelo dano moral somente quando este tivesse repercussões no

patrimônio do ofendido. Em 27 de dezembro de 1929, o Egrégio Tribunal de Justiça

de São Paulo já deixava assentado:

Os danos morais, assim como também os danos físicos, podem ter ou deixar de ter repercussões, no patrimônio da vítima. Se eles têm tal repercussão, ninguém põe em dúvida a sua ressarcibilidade (RT 72/385).

No mesmo sentido:

“Já se tornou triunfante na jurisprudência de nossos tribunais o princípio de que, embora moral, é, todavia indenizável o dano que se refletir no patrimônio da pessoa que o sofreu (v. acórdão do Tribunal de Justiça de Minas Gerais, 26/8/53, RT220/474)”

espirituais e psicológicas, que o lar e os filhos proporcionam ao longo da vida e até pela impressão que se perpetua neles. Não é outra a razão da clientela dos médicos especializados na cura da esterilidade involuntária. Antes e depois do nascimento como disse a sentença de folhas, os filhos são fontes de despesa, em que comprazem os pais, criando-os, tratando-os e educando-os, para o gozo das consolações que lhes trazem e lhes trarão no futuro, não sendo contra o direito e a moral a esperança do amparo na velhice, quer pela assistência afetiva, quer mesmo pela alimentar. Se o responsável pelo homicídio lhes frustra a expectativa e a satisfação atual, deve reparação, ainda que seja a indenização de tudo quando despenderam para um fim lícito malogrado pelo dolo ou culpa do ofensor. Perderam, no mínimo, tudo quanto investiram na criação e educação dos filhos, e que se converteu em pura frustração pela culpa do réu. O patrimônio não si!o apenas coisas concretas, mas o acervo de todos os direitos que o titular dele pode exercitar. (...) Indeniza-se a expectativa razoável, o direito potencial e suscetível de ser reconhecido ou não, como p. ex. o direito potencial e suscetível de seu patrono, que perdeu o prazo, muito embora seja impossível profetizar-se se ganharia ou não, litígio. Por que não o pai que espera dos filhos todas as satisfações lícitas, não apenas alimentares, mas o cuidado e a solicitude nas moléstias e na velhice? Por essas razões, dou provimento ao recurso, para que aos Recorrentes se assegure a indenização que lhes for arbitrada, na forma do artigo 1.553 do Código Civil, levando-se em vista sobretudo quanto, tomadas em consideração suas condições individuais, teriam, razoavelmente, despendido com a criação e educação dos menores, mais honorários e juros compostos desde a data do acidente (Código Civil, artigo 1.544).”

63

A orientação jurisprudencial então dominante restou bem retratada em

ementa de julgado do Excelso Pretório, relativa ao Recurso Extraordinário 11.785,

do ano de 1951, ao se afirmar que não é admissível que os sofrimentos morais

dêem lugar à reparação pecuniária, se deles não decorre nenhum dano material.56

Firmava-se, pois, a orientação negativista de que o dano moral puro não era

indenizável, sendo passível de reparação apenas o prejuízo moral que deixasse

reflexos de ordem patrimonial, ou seja, que trouxesse lesões econômicas à vítima.

Para não se alongar em citações repetitivas da corrente negativista,

socorrer-se-á do v. acórdão encontrado em Jurisprudência dos Tribunais de Alçada

Civil de São Paulo, volume 123. p. 156, relatado pelo ⎯ à ocasião ⎯ Juiz Régis de

Oliveira, em que diversas decisões são apontadas ensinando-se que a

jurisprudência brasileira tem marchado a passos lentos para a admissão ampla da

indenização pelo dano moral. De início a tentativa foi rejeitada. Aos poucos. passou-

se a uma posição moderada, admitindo-se a indenização quando da ocorrência de

repercussão patrimonial. Afinal, mas ainda de modo reservado, admite-se a

indenização do dano moral57. O Desembargador do Egrégio Tribunal de Justiça de

São Paulo mostra em sua pesquisa a evolução do pensamento da jurisprudência 56 No referido acórdão, porém, deixou adeptos o voto vencido do saudoso Ministro Orosimbo Nonato, sempre lembrado, que ensinou: “A noção de dano moral é negativa: é o que incide apenas na personalidade moral da vitima, consiste numa dor que não tem qualquer repercussão no patrimônio do lesado. Deve ser arredado do tablado da discussão o caso do dano que, posto de origem moral, se reflita no patrimônio da vitima porque, do contrário, mesclaremos o efeito pela causa, e em vez de sermos ecléticos, não passaremos de negativistas. Pode-se afirmar, quanto ao dano puramente moral, que a noção de reparabilidade vai lançando raízes e prosperando nas legislações e na doutrina, a que, entretanto, se opõem os julgados de nossos tribunais, ocorrendo, assim, a situação de evidente contradição entre a tendência da doutrina e a resistência obstinada da jurisprudência” (RF 138/452). Aqui se coloca, em uma das primeiras vezes na jurisprudência o que a doutrina já esboçava com rigor científico: o dano moral independe de reflexos patrimoniais por seu caráter autônomo, inconfundível com o prejuízo econômico experimentado pela vitima; dano moral “indireto”, em outras palavras, não passa de dano patrimonial decorrente determinada ofensa, mas não se confunde com o dano decorrente da ofensa em si, despida de conseqüências outras que não a ofensa aos direitos da personalidade do ofendido. 57 (RD. 3/426.56/139-142.52/549: RF 127/397.1.35/183.136/ 492 e RT 219/211); (RTJ 59/92; RF 88/443, 110/207, 138/452, 138/452 e RT72/385 e 198/151); (RF 69/98. 97/698 e RT 167/335, 177/263, 181/312, 224/252 e 379/168).

64

brasileira no sentido de, no início infensa à idéia de se reparar o dano moral, aceitar

após sua reparação diante dos reflexos patrimoniais que pudesse haver ⎯ o que

ainda implica negar a reparação do dano moral puro ⎯ e, por fim, aceitar a

indenizabilidade do referido dano, o que, como se verá, aparece com maior

predominância após o advento da Constituição Federal de 1988.58

Nada obstante os avanços e recuos citados, as decisões de agora,

posteriores à promulgação da Constituição Federal, têm claramente admitido a

indenização do dano moral puro. Venerando acórdão datado de 12 de setembro de

1989, inserto na RJTJ-SP 123, p. 159, determina unanimemente que

estabelecimento bancário que houvera devolvido indevidamente cheque de

correntista indenize o cliente “em vinte vezes o valor atualizado do cheque",

afastando até mesmo a necessidade de liquidação posterior por arbitramento. A 58 Referido acórdão, unânime, é datado de 12/12/89- posterior. Portanto, à promulgação da atual Carta Magna ⎯ e traz valiosas colocações sobre a natureza da verba devida a titulo de ressarcimento do dano moral. Ensina-se: "Duvidas surgem no tocante ao exato fundamento jurídico da reparabllidade do dano moral. Alguns entendem que a função da Indenização seria satisfatório-compensatória (Savatier, Traité de la responsabilité en Droit Français, volume 2, 1939, pp. 526-527). Para outros, seria simplesmente a afirmação da existência da tutela jurídica, bastando uma reparação simbólica (Bonnard, citado por Planiol-Ripert, Tratado, tradução castelhana de Dias Cruz e Brusone, volume IV, Havana, 1946, p. 546). Demogue entende que há uma compensação-pena, o que é divulgado entre nós pelo Prof. PEREIRA. Caio Mário da Silva., Instituições de Direito Civil, volume II, Forense, 1ª edição, p. 176). Para outros, a reparação seria simples pena privada (Chironi, Pessina, Zanardelli). Para se tomar partido na discussão, seria necessária a ponderação de cada argumento expedido em prol de tal ou qual corrente. No entanto, para bem se entender a matéria, basta se dizer que a indenização, no seu aspecto moral, tem, antes de mais nada, um aspecto de compensação, embora se possa admitir , secundariamente, tenha o caráter de pena civil. Dúvida não há que, pela eliminação da vida de um familiar, apenas seria possível amenizar tal amargo, com a compensação financeira, já que meio não se teria de ressuscitar o falecido. Dúvida não há, também, que não se pode assistir à ceifa de uma vida, sem se oferecer àqueles que se sentiram prejudicados, qualquer reparação. E o único meio é a compensação econômica. É assim que decidiu o ordenamento jurídico brasileiro. Já escreveu Gide que: ‘o dinheiro pode substituir qualquer outra riqueza e basta alguém possuí-lo para que se possa proporcionar tudo o que deseja. É a lâmpada de Aladim e temos gênios por servidores’ (Compêndio de economia política, tradução de Contreira Rodrigues, 4ª edição, Porto Alegre, p. 206). Salienta Ripert que a indenização econômica de um dano moral tem papel hedonístico (A regra moral nas obrigações civis, p. 351 da tradução portuguesa de O. Oliveira, nº 181)” (grifo nosso). Fica-se, porém, com a opinião de que a natureza da indenização devida pelo dano moral é compensatória, por um lado, mas inegavelmente punitiva por outro, inibidora de ações semelhantes, como já frisado, como forma de assegurar o respeito aos direitos e garantias fundamentais previstos no elenco do artigo 5º da Constituição Federal. Não se nega o papel hedonístico à vitima, mas seria visão por demais individualista restringir-se a reparação moral ao caráter de vingança privada por parte do lesado ⎯ embora a idéia de vingança privada, para nós, se encontre presente em todo ordenamento jurídico, simplesmente que obtida por meio da atuação do órgão estatal próprio, no caso, o Poder Judiciário.

65

ementa do v. acórdão, relatado pelo eminente Desembargador José Osório,

estabelece:

“INDENIZAÇÃO -Responsabilidade Civil ⎯ Estabelecimento bancário ⎯ Dano Moral ⎯ Ocorrência ⎯ Cheque indevidamente devolvido ⎯ Desnecessidade de comprovação do reflexo material ⎯ Recusa, ademais, em fornecer carta de retratação ⎯ Verba devida artigo 52. inciso X, da Constituição da República ⎯-Recurso provido.” (RJTJ-SP 123, p. 159)

Como se vê, a sentença de Primeiro Grau de Jurisdição houvera negado a

indenização por não comprovado o reflexo patrimonial do alegado dano moral, o que

foi recusado corretamente em grau de recurso. Afirma-se ainda expressamente, no

corpo do aresto, que “em relação ainda ao nosso direito, ressalte-se que a

Constituição Federal pôs fim à controvérsia ao incluir entre os direitos individuais

(artigo 5º. inciso X) o direito à indenização pelo dano material, e moral, decorrente

de violações da intimidade, da vida privada, da honra e da imagem” (grifo do

original). As dificuldades da liquidação não deixaram de ser apontadas, mas optou-

se por solução prática, que ⎯ será citado em seguida ⎯ já tivemos a oportunidade

de seguir, com manutenção do julgado, posteriormente, pelo Egrégio Tribunal de

Justiça de São Paulo.59

A hipótese que apreciamos dizia respeito à noiva que, deixada pelo noivo

às vésperas do casamento, injustificadamente, requeria indenização material por ter

auxiliado,na aquisição de móveis que iriam guarnecer a futura residência do casal ⎯

e moral, pelas conseqüências pessoais causadas pela intempestiva atitude do

nubente que, após dez anos de namoro, resolvera abandonar a noiva uma semana

antes do casamento, após envio de convites, divulgação dos proclamas e até

59 RT 639/58. Ap. 103.247-1, de sentença que preferimos quando do exercício da jurisdição junto à 5ª Vara Cível do Fórum Regional de Santana, no processo 1.739/86. Alhures, cita-se o critério adotado para liquidação do dano moral puro, em que nos escudamos expressamente na equidade, ou seja, na justiça do caso concreto em exame.

66

mesmo recebimento de grande parte dos presentes pelos convidados à cerimônia.

Comprovados ambos os prejuízos ⎯ o material, pela ajuda efetivamente prestada

pela vítima, adquirindo metade dos móveis que possuíam para o futuro lar conjugal,

e o moral, uma vez que esta só houvera sido abandonada porque o noivo se havia

apaixonado por outra, com quem casara três meses após apenas ⎯, optamos por

evitar a liquidação por arbitramento e, determinando a cumulação de ambas às

indenizações devidas, pela autonomia da verba devida a titulo moral; concedemos à

vítima a outra metade do valor dos móveis, modestos por sinal, o que foi mantido em

Superior Grau de Jurisdição, em v. acórdão relatado pelo Desembargador Luiz de

Azevedo, unânime, datado de 1º de novembro de 1988. Pouco posterior à edição da

atual Constituição, referida decisão faz menção expressa a ela, frisando porém que

também a equidade e os princípios gerais do Direito levariam à mesma conclusão.60

Em suma: pode-se afirmar como solidificada, hoje, a jurisprudência que

admite a indenização do dano moral puro, autônomo, independentemente da

existência de danos materiais, que serão cumulativamente considerados, se

60 No corpo do aresto, cita-se lição do Desembargador e mestre da USP, CAHALI. Yussef Said., cuja autoridade na matéria é incontestável, nos termos seguintes: “Ao tratar do tema, com costumeira proficiência, CAHALI. Yussef Said. remete ao Direito francês, e cita Demogue, o qual adverte que a ruptura, sem motivo, da promessa de casamento pode dar lugar a uma indenização, face às suspeitas que ela fará pesar sobre a pessoa abandonada; e Carbonier acrescenta que, se a reparação pode concernir a um prejuízo de ordem material, é mais comum invocar-se o dano moral causado à noiva uma vez que atingida a sua reputação” (Dano e indenização. p. 104). A mesma decisão afirma que o artigo 159 do Código Civil, ao falar simplesmente em prejuízo, já inclui aquele de ordem moral. referindo-se ainda ao Direito constituendo, em que o artigo 185 do anteprojeto de Código Civil ⎯ hoje tomado obsoleto pelo advento da Constituição Federal -previa que “aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que simplesmente moral, comete ato ilícito" (grifo nosso). E mais adiante: “De ressaltar, outrossim, que a atual Constituição prevê expressamente a indenização a titulo de dano moral. Mas, a par da lei, tanto a equidade como os princípios gerais do Direito levam a igual conclusão no concernente à viabilidade de indenização de caráter moral decorrente da ruptura dos esponsais; pois é de se reconhecer que o injustificado rompimento, sucedendo quando já notória a data do casamento, sempre afetará a pessoa da mulher, atingindo de alguma forma a sua honra e decoro. Assim, se possível, em tese, a reparação a titulo de dano moral, há ela também de permanecer na hipótese presente, onde o réu nenhuma explicação trouxe para o seu comportamento”. Expressiva a menção de que, independente da previsão constitucional, a indenIzação teria sido concedida autonomamente de qualquer modo, como fizemos, já que a sentença proferida é anterior à atual Constituição.

67

existirem. A titulo ilustrativo da abrangência de situações em que possível, em tese,

a ocorrência do dano moral, citem-se os seguintes acórdãos:

a) em RT 489/92, relativo à acusação indevida de furto a empregado

posteriormente absolvido, determinada a liquidação por arbitramento, Rel. Des.

Almeida Camargo, TJESP. 29/4/76;

b) na Apelação Cível 401.321/88, vítima morta em acidente ferroviário,

com remissão expressa ao artigo 5º, inciso V, da Constituição Federal, Rel. Juiz

Jacobina Rabello, Primeiro Tribunal de Alçada Civil de São Paulo, 12/10/88;

c) em RJTJ-SP 112/185, ilícito decorrente de exposição de obras de arte

aberta ao público sem consentimento do artista, com remissão aos artigos 25 e 28

da Lei nº 5.988/73, concernente ainda à modificação de texto de critico de arte sem

autorização, com remissão ao inciso V do artigo 25 da lei acima, Rel. Des. Luís de

Macedo; TJESP. 1/12/87;

d) em RJTJ-SP 93/161, divulgação publicitária, sem consentimento da

artista, de fotografias de nudez realizadas durante produção cinematográfica

(afirmando-se expressamente ser a imagem atributo ligado aos direitos da

personalidade), Rel. Des. Arthur de Godoy. TJESP, 13/2/85;

e) em RJTJ-SP 98/84, publicação de obra sem autorização do autor, com

remissão à Lei nº 5.988/73, Rel. Des. Silva Ferreira, TJESP, 18/6/85;

f) em RJTJ-SP 96/345, divulgação de notícia jornalística ofensiva à

dignidade da vítima, Rel. Des. Rangel Dinamarco (designado em Embargos

Infringentes. TJESP. 12/3/85);

g) em RJTJ-SP 110/350, em razão do pagamento de cheques falsificados

e encerramento indevido de conta bancária por insuficiência de fundos, determinada

a liquidação por arbitramento, Rel. Des. Lair Loureiro. TJESP. 17/9/87.

68

A amplitude das situações aqui destacadas defende,mais uma vez que os

danos morais podem ocorrer em virtude da ofensa a qualquer dos chamados direitos

da personalidade (ofensas à vida. à liberdade. à intimidade. à vida privada. à honra

etc.), consoante previsão genérica, e feliz, dos incisos V e X do artigo 5º da

Constituição Federal. É o que a jurisprudência pátria paulatinamente assentou, tudo

concorrendo, agora, para a progressiva pacificação da matéria, também quanto ao

âmbito de incidência das hipóteses moralmente indenizáveis, avultando-se aquelas

que se multiplicam pelo mau uso dos meios de comunicação e no campo do Direito

do Autor.61

Frise-se, outrossim, nosso entendimento de que basta o fato em si para

caracterizar o dano moral e a necessidade de sua reparação. Não é preciso que

tenha sido dada publicidade a esse fato, aspecto que terá influência apenas no valor

devido ⎯ havendo publicidade, maior o valor a ser indenizado, haja vista as

conseqüências mais graves para o ofendido ⎯, mas que não impede a procedência

do pedido inicial.

Nesse sentido:

“Dano moral, à honra e à imagem. É indenizável, mas sempre parcimoniosamente, ao não ter havido a prova da ilicitude que causou a despedida do empregado por justa causa e sobretudo quando a honra atingida não fui além do sofrimento íntimo do próprio lesionado, inexistindo qualquer dano à imagem. Provimento parcial do recurso, para ser reduzida a indenização” (TJ ⎯ 7ª. Câm. Civil; Rel. Des. João Carlos Pestana de Aguiar Silva; Ap. Cível nº 3.868- RJ; j. 18/10/1994; v.u.).

61 BITTAR. Carlos Alberto., O Direito Civil na Constituição de 1988, Revista dos Tribunais, São Paulo, 1990. p, 107, ensinando-se, após se apontar a relevância do Direito do Autor no aspecto moral, que, sob esse ângulo, “o direito moral constitui direito de personalidade, inato no homem, que se manifesta sob diferentes formas, desde a não-criação da obra até a sua retirada de circulação”. Em tópico anterior enfatiza-se o acolhimento pelo Código Civil, e por outras normas, de elementos morais no ressarcimento de danos, para se concluir pela consagração definitiva desse acolhimento com o advento da atual carta constitucional (op. cit, pp, 105-106).

69

Ou ainda, em v. acórdão que entendeu devida a indenização pela só

inserção do nome do autor no Serviço de Proteção ao Crédito, injustificadamente:

“A sensação de ser humilhado, de ser visto como ‘mau pagador’ quando não se é, constitui violação do patrimônio ideal que é a imagem idônea, a dignidade do nome, a virtude de ser honesto” (TJSP ⎯ 15ª. Câm. Civil ⎯ Ap. Cível nº 257.849-2; Rel. Des. Ruy Camilo; j. 19/9/1995; v.u.).

Não é necessário, assim ⎯ como se tem equivocadamente entendido, por

vezes, na jurisprudência ⎯, que haja publicidade a terceiros da ofensa causada à

vítima do dano moral. A indenização será devida pelo só fato da humilhação havida,

pela quebra da auto-estima do ofendido, independentemente da veiculação do fato

na comunidade em que vive, pois o dano moral não existe somente na lesão à

imagem, mas também quando se viole a privacidade, a intimidade, o sentimento de

tranqüilidade e satisfação da pessoa para consigo própria, que se fere no só fato da

ocorrência de uma humilhação injustificada.

3.4 O hodierno posicionamento jurisprudencial sobre o tema

Constatada alhures a evolução da jurisprudência brasileira no que tange à

admissibilidade do ressarcimento do dano moral, questão resolvida pela Constituição

Federal, tem-se porém que a quantificação do valor devido é resolvida de forma

casuística, o que gera insegurança às partes pela falta de balizamentos que

garantam a proporcionalidade do montante arbitrado diante da ofensa sofrida.

Em artigo recente, no qual expõe justamente critérios de cálculo em

indenização por violações à imagem e ao nome de pessoa notória, Bittar, após

demonstrar que o uso não autorizado da imagem faz surgir, para o lesado, o direito à

reparação nos planos moral e patrimonial, afirma que este direito já está assentado,

70

devendo-se fixar a indenização em consonância com a notoriedade da pessoa e o

espectro do uso ilícito, pois o sancionamento deve ser rigoroso, em quantias

razoáveis que desestimulem a novas práticasvioladora, desemcorajando práticas

futuras. E leciona ainda:62

“(...) Deve-se, assim, na fixação da indenização, optar por valores que, a par da satisfação do interesse patrimonial do titular, sancionem a violação ao aspecto pessoal, buscando-se, pois, adicionar à verba usual do mercado o plus correspondente à lesão, à personalidade, e em níveis desincentivados da prática, como medida de plena satisfação ao interesse dd lesado e em perfeita consonância com a teoria da responsabilidade civil (p. 94).”

Efetivamente, ao lado dos vv. acórdãos citados, que apreciaram a matéria

específica tratada no artigo citado, podem-se citar ainda as decisões seguintes,

demonstrativas de critérios diversos de cálculo diante do dano moral:

I. Em RT 602/180: “Dano moral. Reparação. Execução de sentença. No arbitramento do valor do dano moral é preciso ter em conta o grau em que o prejuízo causado terá influído no ânimo, no sentimento daquele que pleiteia a reparação. A intensidade da culpa. a violência, as circunstâncias em que ocorreu o evento danoso poderão informar o critério a ser adotado em tal arbitramento, árduo e delicado, porque entranhado de subjetividade. Sentença confirmada.”63 II. Em RT 613/184: “Embargos infringentes. Reparação de dano. Dano moral. Estimação em dinheiro. Cumulação. O agente é responsável pela reparação do dano a que deu causa. A reparação do dano moral através de uma indenização que não é a reparação do pretium doloris. Ela é uma reparação satisfatória. Menos que um beneficio para o ofendido do que um castigo para quem o ofendeu levianamente. A função satisfatória da indenização deve ser estimada em dinheiro. Um único evento pode

62 BITTAR. Carlos Alberto., “Danos morais: cálculo da Indenização por violações à imagem e ao nome de pessoa notória”, in Jurisprudência dos Tribunais de Alçada Civil de São Paulo, Lex, volume 121/16. Destaca-se no referido trabalho doutrinário a necessidade de sancionamento exacerbado em caso de Insistência do ofensor em ferir a imagem de pessoa notória, utilizando-a sem o seu consentimento expresso. 63 Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, decisão de 6/8/85, ReI. Des. Paulo Pinto. Referido acórdão tece considerações minuciosas sobre os critérios de arbitramento no caso decidido (morte de menor em decorrência de disparo acidental de arma de fogo desfechado por outro menor), frisando a necessidade “de usar de rigorosa moderação, ao apreciar a repercussão que o evento teve sobre o ânimo dos autores, pois cuida-se de investigação de fatores marcantemente subjetivos, por isso mesmo de estimativa, em expressão pecuniária, extremamente difícil”. A fixação de valores em lei auxiliaria fortemente o julgador nessas hipóteses, é o que se defende, justamente pela dificuldade apontada acima.

71

constituir um leque de prejuízos de natureza diversa, a justificar cada um uma verba reparatória, sem margem à ocorrência de reparar duas vezes a mesma perda”.64 III. Em RT 639/58: trata-se do acórdão já citado anteriormente, relativo à quebra intempestiva de promessa de casamento. Confirmou-se em Segundo Grau de Jurisdição o critério que adotamos de, imediatamente, determinar o valor devido a titulo de ressarcimento do dano moral ⎯ equivalente à metade do valor em pecúnia representado por móveis adquiridos conjuntamente pelo casal ⎯, afirmando-se que “finalmente, evitando delongada e difícil liquidação, a sentença fixou com moderação o quantum para o dano mencionado, devendo ser mantido esse mesmo critério”. Observe-se a preocupação presente com a liquidação célere do prejuízo moral e a ênfase à moderação do valor arbitrado, o que reflete a intenção de evitar locupletamento ilícito da ofendida no caso concreto. IV. Em Julgados dos Tribunais de Alçada Civil de São Paulo 108/77 (Revista dos Tribunais): “... Acidente de trânsito. Dano moral. Reconhecimento do trauma psicológico. Indenizatória procedente. Recurso desprovido.“ Determinou-se, aqui, indenização não apenas por seqüelas físicas deixadas à vitima, mas igualmente em face das seqüelas emocionais, de ordem psíquica cumulativamente. No tocante à fixação do quantum debeatur, porém, foi ordenada a liquidação por arbitramento, donde se indagar a dificuldade de aferir ⎯ sem parâmetros legislativos definidos ⎯ o valor, em pecúnia, dessas seqüelas.65

Tornar-se-ia enfadonha, parece-nos, a repetição exaustiva de decisões

que, principalmente após o advento da Carta Magna atual, admitem a indenização

do dano moral puro, admitem sua cumulação com eventuais danos materiais, mas,

nada obstante, determinam invariavelmente a liquidação por arbitramento do

montante devido ⎯ ou até mesmo a liquidação por artigos, como citado em

RJTJESP 124/136 ⎯ onerando as partes, em razão disso, e deixando-as à mercê

de interpretações por demais elásticas e vagas por parte do juiz quanto ao que se

64 Tribunal de Justiça da Bahia, Rel. Des. Ruy Trindade, decisão de 20/6/85. O aresto em foco, relativo a ação penal indevidamente intentada contra pessoa a quem se acusou falsamente de emissão de cheque sem fundo, admitiu a cumulação do prejuízo material ao dano moral, afirmando que os percalços encontrados na aferição do valor indenizatório também o são na avaliação das coisas corpóreas ou materiais, citando ainda copiosa doutrina e jurisprudência sobre a matéria.

65 Primeiro Tribunal de Alçada Civil de São Paulo, ReI. Juiz Guimarães “é Souza, decisão de 5/10/87. Trata-se de reconhecimento expresso do dano estético como ocasionador de conseqüências autônomas, materiais ⎯ resolvidas com o pagamento das cirurgias a que submetida a vitima ⎯ e morais, a serem resolvidas pela verificação da intensidade do trauma psicológico causado ao ofendido.

72

deve pagar para punir o ofensor e compensar a vitima, à falta, já se disse, de

parâmetros objetivos em lei, norteadores dos critérios cabíveis a cada caso concreto.

Nada obstante, o Egrégio Superior Tribunal de Justiça, em sua Súmula 37,

recentemente dirimiu internamente a questão da autonomia de ambas as

indenizações, ao estabelecer que “são cumuláveis as indenizações por dano

material e dano moral oriundos do mesmo fato”. Em todos os vv. acórdãos que

deram origem à citada Súmula (Recursos Especiais 3.604-SP; 4.236-RJ; 3.229-RJ;

10.536-RJ; 11.177-SP; e 1.604-SP), cita-se o arbitramento judicial como a maneira

pela qual se atingirá o quantum debeatur. Por sua expressividade, o trecho seguinte

do Recurso Especial 3.604-SP (Relator o Ministro do Colendo Supremo Tribunal

Federal, Ilmar Galvão) foi adicionado ao estudo, como veremos:

“Na impossibilidade de obter-se uma indenização compensatória, capaz de reconduzir o direito lesado ao status quo ante, nada impede que se estabeleça uma indenização sucedânea ou satisfatória. Tal o caso do dano moral, em que o direito ofendido é irrecuperável. Conquanto inexista modo de aferir-se o seu sucedâneo em dinheiro, nem por isso se deixa de indenizar, proporcionando-se, por essa forma, à vitima, instrumento capaz de amenizar a sua dor e de trazer-lhe alguma alegria”.

Ora, recitando Cunha Gonçalves: “não se trata de suprimir o passado, e

assim de melhorar o futuro”.

A propósito do arbitramento, o prudente arbítrio do juiz é, a cada passo,

preceituado nas leis de todos os países; e encontra-se especialmente consagrado, a

respeito da reparação do dano moral. Se uma indenização fixada por prudente

arbítrio do juiz pode ser relativamente injusta ⎯ conquanto a experiência só prova a

excessiva benevolência e brandura dos juízes para com os autores de inúmeros e

gravíssimos danos ⎯ maior, mais clamorosa injustiça ê negar aos lesados, com tão

fútil pretexto, toda e qualquer reparação, estimulando-se com a impunidade novos

prejuízos, novos acidentes, novas partes. É mil vezes preferível uma solução

imperfeita à permanência da injustiça não reparada.

73

Como se vê, permanece íntegra a questão de como se fixar o valor

devido, embora inafastável que o dano moral se arbitra autônoma e

cumulativamente ao dano patrimonial.66

66 Como, dentre outros, assinalou recente acórdão: “Admissível a indenização, por dano moral e estético, cumulativamente, ainda que derivados do mesmo fato, quando este, embora de regra subsumindo-se naquele, comporte reparação material. Incidência da Súmula nº 37 do STJ. Recurso conhecido e provido” (STJ -31 T; Rec. Esp. no 68.491 - RJ; Rel. Min. Waldemar Zveiter; j. 6/2/1996; v.u.).

74

CAPÍTULO IV

CRITÉRIOS QUANTITATIVOS PARA MENSURAÇÃO DO DANO

MORAL

Sumário: 4.1. A necessidade da inclusão legal de critérios objetivos para a quantificação do dano moral: uma proposta na ótica subjetiva; 4.2 Disposição subjetiva sobre a natureza do dano moral

4.1. A necessidade da inclusão legal de critérios objetivos para a quantificação

do dano moral: uma proposta na ótica subjetiva

Como visto, a liquidação do dano moral puro depende, hoje, no mais das

vezes, de critérios puramente jurisprudenciais. Não há parâmetro legislativo no

Código Civil que não seja, unicamente, o de remeter as partes à liquidação por

arbitramento, com todos os inconvenientes decorrentes dessa solução, como um

maior dispêndio de tempo, acarretando maior onerosidade e gerando insegurança

pela, falta de delimitação de valores em lei que possa nortear o juiz em sua fixação

do quantum debeatur .

Tem-se, assim, que, de lege ferenda, a melhor solução baseia-se em

previsão semelhante à do Código Civil do Peru de 1984, no qual se estabelece que

“...el daño moral es indemnizado considerando su magnitud y el menoscabo

producido a la victima o a su familia..”67 (o dano moral e indenizado considerando

67 Na conclusão de seu artigo intitulado “Reparação do dano moral”, já referido, Limongi França articula da forma seguinte o texto que considera ideal à previsão do ressarcimento de dano moral: “El

75

sua magnitude e o menoscabo produzido à vitima e à sua família) Ainda melhor

será, além da previsão genérica de imposição do valor em virtude da gravidade do

prejuízo à vitima e à sua família, que se apontem critérios relacionados com a figura

do ofensor, pois sua maior ou menor condição cultural, social ou econômica deve

também influenciar na fixação do montante indenizatório.

Dessa forma, o que se preconiza é solução muito semelhante à previsão

do artigo 59 da Parte Geral de nosso Código Penal, ao estabelecer os critérios de

fixação da pena-base, no âmbito criminal, nos termos seguintes:

“Art. 59 -O Juiz, atendendo à culpabilidade, aos antecedentes, à conduta social, à personalidade do agente, aos motivos, às circunstâncias e consequências do crime, bem como ao comportamento da vítima, estabelecerá, conforme seja necessário e suficiente para reprovação e prevenção do crime: I -as penas aplicáveis dentre as cominadas; II -a quantidade de pena aplicável, dentro dos limites previstos; III -o regime inicial de cumprimento da pena privativa de liberdade; IV- a substituição da pena privativa da liberdade aplicada, por outra espécie de pena, se cabível.”

Também o artigo 84 do Código de Telecomunicações oferece

parâmetros úteis, ao estabelecer que, “na estimação do dano moral, o juiz terá em

conta, notadamente, a posição social ou política do ofensor, a intensidade do ânimo

daño moral, por acción o omisión, es reparado considerando su magnitud y el menoscabo producido a Ia victima o a su familia. Quando Ia reparación incluya indemnización, su monto devenga correción monetaria y intereses legales desde Ia fecha en que se produjo el daño.” Esse texto não deixa de ter certa semelhança, a uma, com o artigo 84 do Código de Telecomunicações, citado igualmente neste trabalho; e, a duas, com o artigo 53 e seus incisos da Lei nº 5.250/67 (Lei de Imprensa, ao prever: “No arbitramento da indenização em reparação do dano moral, o juiz terá em conta notadamente: I -a intensidade do sofrimento do ofendido, a gravidade, a natureza e repercussão da ofensa e a posição social e política do ofendido; II -a intensidade do dolo ou o grau de culpa do responsável, sua situação econômica e sua condenação anterior em ação criminal ou cível fundada em abuso no exercício da liberdade de manifestação do pensamento e informação; III -a retratação espontânea e cabal, antes da propositura da ação penal ou cível, a publicação ou transmissão da resposta ou pedido de retIficação, nos prazos previstos na lei e independentemente de intervenção judicial, e a extensão da reparação por esse meio obtido pelo ofendido.” Observe-se que o inciso III supracitado prevê, como forma de atenuação da sanção a sei aplicada, a atitude tomada pelo ofensor antes das medidas judiciais a serem adotadas pelo ofendido, o que pode caracterizar uma maneira eficaz de reparar, ainda que parcialmente, a repercussão da ofensa sofrida; na sugestão legislativa que aqui se apresenta, dá-se ao juiz a possibilidade de fixar outras formas de indenização que não a pecuniária, o que poderia incluir, eventualmente, a retratação, pelos meios de comunicação, do mal causado à vitima.

76

de ofender, a gravidade e a repercussão da ofensa”. Note-se que esta é uma das

poucas disposições legislativas que dizem respeito à avaliação do dano moral puro,

ou seja, em si considerado, sem que haja a preocupação com os danos patrimoniais

reflexos.

Descer-se-á, igualmente, prever os limites de valores, para que o

montante indenizatório se encontrasse sempre dentro dessa delimitação, após a

consideração dos aspectos objetivos e subjetivos concernentes ao fato em si, ao

comportamento do agente e da vítima e as conseqüências geradas da violação

moral sofrida pela vitima.

Não se chega ao ponto, porém, de se defender tabelas para fatos

determinados, como na jurisprudência francesa, por ser inadmissível prever, para

cada caso, o quanto valha, v.g., a morte do cônjuge em relação â morte de um avô

ou irmão ⎯ as circunstâncias concretas do caso poderão provar, por exemplo, que

as conseqüências da morte de um irmão possam ser muito mais graves do que a

morte do cônjuge (v.g., comparando-se as situações da morte de um irmão mais

velho que tenha sido o responsável pela criação e manutenção de um irmão mais

novo, órfão, com a morte de um cônjuge que vivia às turras com seu par, por vezes

em casamento mantido apenas por conveniência social ou econômica).

A titulo de sugestão, ter-se-ia o seguinte texto, que se incorporaria ao

atual Código Civil68, acrescendo aos artigos referentes à indenização:

Comprovado a ocorrência do dano moral puro, o juiz fixará a

indenização devida levando em consideração os motivos, as

circunstâncias e conseqüências da ofensa, em relação à

68 Tramita no Senado Federal, o projeto de lei n.º 150/99, que aborda a quantificação do dano moral de forma semelhante, observando grande parte dos tópicos relacionados nos respectivos parágrafos desta sugestão legislativa.

77

vítima e sua família, bem como a posição sócio-cultural e

econômica do ofensor e da vítima.

§ 1º Avaliada a extensão do dano moral, o juiz arbitrará o

montante indenizatório, entre o mínimo de um e o máximo de

quinhentos salários mínimos. Se julgar adequado ao caso

concreto, poderá cominar prestação de fazer ou não fazer,

isolada ou cumulativamente à pena pecuniária.

§ 2º Em qualquer caso, a pena relativa ao dano moral puro

poderá ser cumulada à indenização eventualmente devida em

razão do dano patrimonial sofrido pela vítima.

§ 3º Falecendo o autor da ação no curso do processo, seus

herdeiros necessários, cônjuges, companheiro em regime de

união estável ou irmãos poderão dar-lhe prosseguimento,

respeitada a ordem de vocação hereditária e equiparado o

companheiro ao cônjuge em todos os efeitos legais.

§ 4º O infrator deverá retratar-se em juízo, expressa ou

verbalmente, pelo ato nocivo que efetuou, para a satisfação e

restituição moral da vítima ou de quem a represente.

Na defesa dessa sugestão, frisam-se os seguintes aspectos:

a) a necessidade de exprimir claramente a natureza indenizatória do dano

moral puro, ou seja, despido da análise dos reflexos indiretos, de caráter patrimonial;

b) ao se afirmar deva o juiz considerar os motivos, circunstâncias e

conseqüências da ofensa, terá o julgador a possibilidade de análise da gravidade

objetiva e subjetiva da lesão moral de forma plena, pois estará examinando não

78

apenas a repercussão da ofensa, como também a situação de fato que a motivou ⎯

com o que se estará examinando também, necessariamente, o grau de culpa com

que agiu o ofensor;

c) fala-se em se considerar o dano moral em relação não só á vítima,

como também á sua família, porque muitas vezes apenas esta terá a possibilidade

⎯ física e jurídica ⎯ de exigir a indenização alegadamente devida, como, por

exemplo, nos casos em que tenha ocorrido o falecimento da vítima: o objetivo da

menção expressa é evitar discussões quanto à legitimidade ativa dos familiares da

vítima para exigir o ressarcimento pelo prejuízo moral;

d) a influência da situação social, cultural e econômica de ofensor e vítima

é fato lembrado em inúmeros julgados. Muitas vezes, ao se buscar tanto quanto

possível a equivalência entre dano e a reparação correspondente, examina o

magistrado tais fatores, enfatizando-os quando da decisão, corretamente, pois por

vezes essa análise é essencial à tentativa de reposição da vítima, ou sua família, à

situação anterior (ao menos à situação econômica anterior,como é mais freqüente);

e) a preocupação de fixarem-se limites ⎯ mínimo e máximo ⎯ justifica-se

para se evitar, de um lado, a cominação de valores irrisórios, que nada signifiquem

economicamente ao ofensor, tornando impune, na prática, o mal injustamente

causado à vítima; e, por outro lado, evitar-se-á o locupletamento excessivo, o

enriquecimento sem causa da vítima ⎯ ou de sua família ⎯ ao eventualmente

receber valores absurdamente desproporcionais à ofensa sofrida;

f) poderão ocorrer casos em que a situação possa ser reposta de forma

diversa, mostrando-se inadequada à sanção pecuniária (por exemplo, ofensa moral

pelos meios de comunicação, em que a pena mais adequada, e suficiente para

desagravar a vítima, possam ser a publicação da sentença, à custa do ofensor, no

79

mesmo veículo em que ocorrida à lesão moral); a essas hipóteses dar-se-á maior

flexibilidade ao juiz, que poderá reputar adequada a cominação de obrigação de

fazer ou não fazer por parte do ofensor, considerando-a suficiente à espécie ou, se

de maior gravidade o caso, cumulando-a a pena pecuniária;

g) a razão do parágrafo 2º de nossa sugestão legislativa é a de tornar

clara a autonomia da indenização pelo dano moral, devida pelo só fato da violação

moral e independentemente de outras verbas por venturas devidas de caráter

patrimonial, consoante a melhor jurisprudência tem entendido e conforme ressaltado

alhures neste trabalho.

h) Uma vez que o ato ilícito gerou uma lesão moral, o acréscimo do

parágrafo 4º visa restituir in natura, ainda que levemente, por meio da formalização

da retratação (pedido de desculpas), a moral lesionada da vítima, uma vez que a

lesão foi ocasionada por um ato ofensivo as normas de conduta, deverão aplicar-se

as mesmas na tentativa de apaziguar a dor infligida.

A observação que se deve fazer em relação ao parágrafo 3º sugerido

exige maior análise a fim de justificar o posicionamento em prol da transmissibilidade

hereditária ⎯ ou mesmo ao companheiro ⎯ da ação de indenização por dano moral.

A questão é polêmica e dentre nós, destaca a opinião de Silva, para quem:

“(...) não existe o jus hereditário relativamente aos danos morais, tal como acontece com os danos puramente patrimoniais. A personalidade morre com o indivíduo arrastando atrás de si todo o seu patrimônio. Só os bens materiais sobrevivem ao seu titular”.69

69 SILVA. Wilson Melo da., O dano moral e sua reparação, Forense, 3ª ed., Rio de Janeiro, 1983, p. 469.

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O que se argumenta, em prol da tese negativista, é que a dor moral e o

sofrimento fisico são personalíssimos, “algo estranhadamente pessoal” e que, por

isso, não se transmitem.

Entende-se, porém, que sofrimento e dor não são os bens que

componham o patrimônio do autor da herança; o que se transmite por direito

hereditário é o direito de acionar o responsável, é a faculdade de perseguir em juízo

o autor do dano, quer material ou moral.

No mesmo sentido, Mazeuad ensina que o herdeiro não sucede no

sofrimento do morto, e sim no direito de ação que o morto, quando vivo, tinha contra

o autor do dano70. A Corte de Cassação francesa coloca a questão nos mesmos

termos, em acórdão citado também por BITTAR e no qual se assentou o seguinte:

“A vítima de um dano, qualquer que seja a sua natureza, tem direito a obter uma indenização daquele que o causou por sua culpa. O direito à reparação de um dano resultante de sofrimento físico suportado pela vítima antes de sua morte, nascido em seu patrimônio, transmite-se aos seus herdeiros.”

Do mesmo modo, o direito à reparação do dano resultante de sofrimento

moral suportado pelo, pai em razão da morte do filho (vítima de um acidente, de

responsabilidade de um terceiro), nascido em seu patrimônio, transmite-se, com a

70 MAZEAUD. Leon. Leçons de Droit Civil. 6ª edição, tomo 2. volume 1, Paris, Montchrestein, 1978, p. 39. A lição do tratadista francês e que nos parece irretorquível é a de que “o herdeiro não sucede no sofrimento da vitima. Não seria razoável admitir-se que o sofrimento do ofendido se estendesse ao herdeiro e este, fazendo seu o sofrimento do morto, acionasse o responsável a fim de indenizar-se da dor alheia. Mas é irrecusável que o herdeiro sucede no direito de ação que o morto, quando vivo ainda, tinha contra o autor do dano. Se o sofrimento é algo pessoal, a ação de indenização é da natureza patrimonial e, como tal, transmite-se aos herdeiros. Sem dúvida a indenização paga ao herdeiro não apaga ou elimina o sofrimento que afligiu a vitima. Mas também é certo que, se a vitima, ela mesma, houvesse recebido uma indenização, não eliminaria igualmente a dor que houvesse padecido. O direito a uma indenização simplesmente ampliou o seu patrimônio. A indenização cumpre a sua final1dade compensatória, antes como depois do falecimento da vitima, com as mesmas dificuldades que resultam da reparação de um prejuízo moral por uma indenização pecuniária. O dano moral, por ser de natureza extrapatrimonial, não comunica essa particularidade à ação de indenização”. Em síntese: o sofrimento é personalíssimo, não a ação destinada a reparar as conseqüências do mal injustamente causado ao morto.

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morte, aos seus herdeiros, os quais podem demandar uma indenização do prejuízo,

mesmo que o pai não tenha promovido uma ação antes de sua morte.71

Por fim, também Aguiar Dias ensina ser transmissível a ação de reparação

do dano moral, sem que nenhum princípio a isso se oponha. Afirma que “a ação de

indenização se transmite como qualquer outra ação ou direito aos sucessores da

vítima. Não se distingue, tampouco, se a ação se funda em dano moral ou

patrimonial.”72

Tem-se que esse posicionamento, no sentido de se defender a

transmissibilidade do direito de ação indenizatória do dano moral, mais ainda se

justifica diante do novo texto constitucional, até porque a natureza dessa ação, hoje,

deve ser entendida não apenas como compensatória ou satisfatória de uma

pretensão da própria vítima, mas também, como já frisado, como sancionatória,

como visando a uma pena civil que desestimule, que iniba práticas semelhantes ⎯

e, sob esse aspecto, nada mais coerente do que se permitir o prosseguimento da

ação que impeça a impunidade do ofensor. Frise-se, por oportuno, que a

constituição Federal garantiu o direito de herança de forma plena, não restringindo a

natureza dos direitos a serem transmitidos por essa via (artigo 5º, inciso XXX), o

que, ao menos, não infirma de nenhum modo a argumentação dos que defendem a

transmissibilidade hereditária ⎯ não do sofrimento ou da dor moral, repita-se, e sim

do direito de ação que visa à indenização do prejuízo moral havido. 71 SANTOS. Antônio Jeová dos, enfatiza comentário de Georges Durry a respeito dessa decisão da Corte de Cassação francesa, em que diz que “a Câmara Mista pôs termo à questão. Aquele que é vítima de um dano, seja qual for a sua natureza, tem direito a uma indenização. Este direito faz parte de seu patrimônio. Por conseguinte, se vem a morrer, seus herdeiros o substituem para efeito de obter uma indenização” (Revue Trimestrielle de Droit Civil, 1978, p. 556). O patrimônio de qualquer indivíduo, tenha-se presente, é formado por bens materiais e imateriais, corpóreos e incorpóreos.

72 DIAS. José de Aguiar., Da responsabilidade civil, volume 2, Forense, 6ª ed., Rio de Janeiro, p. 506, nº 251. Árduo defensor de que nenhum dano, em qualquer circunstância, fique impune, o antigo magistrado e agora advogado carioca mostra-se, aqui, coerente com essa necessidade de reparação plena dos danos de qualquer natureza.

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Já quanto à transmissibilidade desse mesmo direito ao companheiro em

regime de união estável, não se teria a mesma opinião não fosse, novamente, o

texto constitucional, ao estabelecer no artigo 226, parágrafo 3º, a união estável entre

o homem e a mulher como entidade familiar, para efeito da proteção do Estado ⎯ no

que se inclui, defende-se, a proteção do Poder Judiciário para amparo pleno do

companheiro após o reconhecimento da sociedade de fato existente entre o casal.

Nesse sentido ⎯ embora frisando que a previsão constitucional não transferiu a

questão para o âmbito do Direito de Família ⎯, ensina BITTAR, com a precisão de

sempre:

“Outrossim, na sagração de uniões estáveis e na conciliação de interesses de menores, a Carta de 1988 erige em entidades familiares as comunidades formadas por homem e mulher reunidos sem casamento ⎯ apenas para efeito de amparo do Estado, no âmbito do direito assistencial (sistema de seguridade social, artigos 194 e segs.) ⎯ e as constituídas por um genitor e seu filho (ou seus filhos), na proteção devida a esses últimos. Dessa forma, entendemos deva a união estável enquanto tal ser submetida às regras do Direito comum, não merecendo regulamentação no plano do Direito de Família, em consonância aliás, com o Direito comparado (sistemas francês, italiano, português, espanhol, alemão, dentre outros), permanecendo válidas as regras de previdência e outras extravagantes de proteção à companheira, bem como aplicável a jurisprudência ora prevalente de reconhecimento da sociedade de fato, sempre para amparo da mulher nessas uniões.73”

Dentre as regras extravagantes de proteção ao companheiro, se

encontram, com certeza, aquelas que o colocam em plano de igualdade, quanto ao

cônjuge, perante o patrimônio comum do casal, a ponto de poder participar da

partilha dos bens adquiridos na constância da sociedade de fato.74

73 BITTAR. Carlos Alberto., O Direito Civil na Constituição de 1988, Revista dos Tribunais, São Paulo. 1990, p. 63. Destaca-se na obra que foi no Direito de Família e, em especial, no relacionamento familiar, que a Constituição Federal de 1988 introduziu maiores inovações, introduzindo princípios decorrentes das Declarações Internacionais de Direitos do Homem de 1948 e que ora se acham absorvidos pelo Direito dos povos ocidentais de tradição romanística. 74 Súmula nº 380 do Egrégio Supremo Tribunal Federal: “Comprovada a existência de sociedade de fato entre os concubinos, é cabível a sua dissolução judicial, com a partilha do patrimônio adquirido pelo esforço comum.” Esse posicionamento permanece integralmente válido no tocante à divisão dos aqüestos entre os companheiros, mas a edição da Lei nº 9.278/96 deslocou a competência para apreciação dos atos para o Juizo da Família e não mais o Juizo Cível, como até então se entendia,

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E se, como se procurou argumentar, esse patrimônio não se compõe

apenas de bens materiais, mas também imateriais, e se o que se transmite é o mero

direito de prosseguir a ação indenizatória em que se objetiva o ressarcimento do

dano moral causado à vítima, conclui-se que não há motivo algum, lógico ou jurídico,

que impeça o companheiro em regime de união estável de continuar o processo em

busca da procedência da pretensão inicialmente ajuizada pelo de cujus.

Nossa posição, portanto, e em síntese, é a de que o legislador deva

normatizar a forma pela qual se deverá quantificar o dano moral puro, fixando limites

à ação do juiz no arbitramento do quantum debeatur; como meio, que se nos afigura

eficaz, de que o montante judicialmente determinado se mostre ao menos

razoavelmente proporcional gravidade e às repercussões da ofensa perpetrada.

4.2 Disposição subjetiva sobre a natureza do dano moral

Espera-se que já se tenha conseguido esclarecer, no curso deste trabalho,

que consideramos a indenização por dano moral como um misto de compensação à

vítima e de punição ao ofensor. Sua inserção como um direito fundamental, previsto

no elenco do artigo 5º da Constituição Federal, desloca a análise da questão de uma

ótica meramente individualista, em que a única preocupação é com afigura da vítima

ou membros de sua família, para uma ótica publicista, um comando que parte do

Estado não apenas para os indivíduos, ativa e passivamente, mas também como

forma de proteção da comunidade, que é sua essência e razão teleológica da

existência.

predominantemente. Confira-se, a propósito, o julgado seguinte: "Preceitua o novo diploma legal, Lei no 9.278/96, que toda a matéria relativa à união estável é de competência do juizo da Vara de Família, assegurado o segredo de justiça, pois é reconhecida como entidade familiar” (TJSP -Cám. Esp.; Conflito de Competência n° 31.817-0/0 SP; ReI. Des. Lair Loureiro; j. 4/7/ 1996; v.u.; ementa).

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Daí nossa sugestão, endossando tantos outros pronunciamentos

doutrinários e jurisprudenciais, de se considerar a gravidade do dano moral

averiguando-se as condições pessoais do ofensor e da vítima, bem como os

motivos, as conseqüências e as circunstâncias da lesão injustamente causada. A

análise feita dessa forma dará ao julgador a possibilidade de reparar o dano de

forma não só a satisfazer hedonisticamente a vítima, como também desestimulará,

inibirá a prática de atos semelhantes por parte do ofensor, o que reverterá não só

em prol da comunidade, mas também lhe servirá de exemplo do que pode acarretar,

a seus membros, o ato moralmente lesivo.

Em suma, como já houvera anteriormente dito, menos do que um

beneficio à vítima, a indenização devida pelo dano moral, após o advento da

Constituição Federal de 1988, tem caráter punitivo ao ofensor (à maneira dos

punitive damages do Direito norte-americano), visando ao desestimulo de atos

semelhantes, em proteção não apenas à vítima do prejuízo moral, mas ⎯ e

principalmente ⎯ à comunidade como um todo. Indeniza-se, o que significa que se

terá de apagar todas as conseqüências possíveis decorrentes do ato lesivo. Este,

em síntese, nosso posicionamento.

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V - NOTAS FINAIS

Às finalidades do Direito não repugna que se quantifique monetariamente

o dano moral, somente não aceitando a idéia aqueles que, comandados não por

uma visão teleológica do Direito, e sim por conceitos preestabelecidos a partir de

princípios morais subjetivos, que negam, porém a essência da natureza humana,

que clama pela punição de todos que tenham causado mal injusto a outrem. Nesse

sentido, a idéia de que as reparações da dor, da mágoa, da tristeza não passem de

vingança nada tem de abjeta ou repugnante, sendo antes da própria natureza do

Direito, e do homem, vingar o mal injustamente causado; a vingança só repugna

quando não corresponda a uma punição a um dano injusto.

A partir da Constituição Federal promulgada em 5 de outubro de 1988, a

reparabilidade do dano moral, além de inquestionável pelos expressos termos dos

incisos V e X do artigo 5º do texto constitucional, passou a ter natureza indenizatória

e, portanto, não apenas compensatória do prejuízo moral sofrido pela vítima, mas

também, e principalmente, punitivo ao ofensor, a fim de se desestimular a repetição

de casos semelhantes. Em razão da previsão constitucional, negará vigência à

Constituição Federal toda e qualquer decisão judicial que negue a reparabilidade do

dano moral, uma vez demonstrada sua existência.

Todos os direitos da personalidade são passíveis de reparação moral, seja

o dano decorrente de inadimplemento contratual ou conseqüente à indenização pelo

cometimento de ato ilícito judicialmente reconhecido.

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Como demonstrado, não se pode deixar a quantificação do dano moral ao

simples bom senso judicial, sob pena de cominar uma decisão que pode não atingir

adequadamente seu fim: indenizar e punir. Pois, prolatada uma decisão malquista,

esta pode até mesmo acarretar um enriquecimento ilícito da suposta vítima.

Portanto é imprescindível o devido embasamento das decisões judiciais

através da criação de parâmetros objetivos no que tange a quantificação do dano

moral.

Uma vez que a lei tenha fixado critérios objetivos para fixação da

reparação decorrente do dano moral, estes critérios deverão ser rigorosamente

seguidos, pois se foram preestabelecidos pelo legislador como capazes de satisfazer

o ofendido e punir o ofensor.

Embora não haja motivos para se renegar o arbítrio do juiz no momento da

quantificação do dano moral, muito mais seguro será, às partes e ao próprio

julgador, a fixação pelo legislador de valores pecuniários concretos, que variariam

dentro de determinado percentual e que, nessa variação, seriam fixados mediante a

gravidade objetiva do mal causado ao ofendido. Só assim volveriam as partes ao

estado anterior, tornando indene a vítima e fazendo valer, dessa forma, a norma

constitucional que prevê a indenizabilidade do dano moral, nas hipóteses do só fato

da violação dos direitos da personalidade atingidos, independentemente de qualquer

reflexo na esfera patrimonial do ofendido.

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