Gêneros Textuais e Reescrita

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Linguagem em (Dis)curso, Palhoça, SC, v. 10, n. 1, p. 13-42, jan./abr. 2010 GÊNEROS TEXTUAIS E REESCRITA: UMA PROPOSTA DE INTERVENÇÃO PARA O ENSINO DE LÍNGUA MATERNA Adair Vieira Gonçalves * Resumo: Fundamentos do quadro epistemológico do interacionismo sociodiscursivo e dos pressupostos bakhtinianos ressoam neste artigo, cujo objetivo principal é o de averiguar os possíveis benefícios, para o ensino de língua portuguesa, de dois instrumentos pedagógicos: sequência didática e lista de controle/constatações, que são ferramentas exploradas pelos pesquisadores de Didática das Línguas da Universidade de Genebra, como potencializadoras do ensino. Decorrentes deste objetivo, avaliamos as capacidades de ação, discursivas e linguístico-discursivas de uma produção escrita do gênero “resumo acadêmico” e as distintas interações ocorridas durante as intervenções escritas. A análise possibilita a conclusão de que tais ferramentas constituem instrumentos didáticos da mestria de práticas de linguagem (re) configuradas em gêneros textuais. Palavras-chave: sequência didática; lista de controle/constatações; gêneros; interação. 1 INTRODUÇÃO Este trabalho faz parte de uma pesquisa mais ampla (GONÇALVES, 2007) desenvolvida no âmbito da Linguística Aplicada, mais especificamente em relação ao Ensino de Língua Materna, em que pretendemos analisar o impacto de Sequência Didática (daqui para a frente, SD), considerando-a ferramenta teórico-metodológica para o ensino de línguas (SCHNEUWLY; DOLZ, 2004), e sua estreita relação com outra ferramenta, intitulada lista de controle (grille de contrôle) pelo grupo de Genebra. Dadas as peculiaridades deste trabalho em * Professor da Universidade Federal da Grande Dourados. Doutor em Linguística. Email: [email protected].

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  • Linguagem em (Dis)curso, Palhoa, SC, v. 10, n. 1, p. 13-42, jan./abr. 2010

    GNEROS TEXTUAIS E REESCRITA: UMA

    PROPOSTA DE INTERVENO PARA O ENSINO DE LNGUA MATERNA

    Adair Vieira Gonalves*

    Resumo: Fundamentos do quadro epistemolgico do interacionismo sociodiscursivo e dos pressupostos bakhtinianos ressoam neste artigo, cujo objetivo principal o de averiguar os possveis benefcios, para o ensino de lngua portuguesa, de dois instrumentos pedaggicos: sequncia didtica e lista de controle/constataes, que so ferramentas exploradas pelos pesquisadores de Didtica das Lnguas da Universidade de Genebra, como potencializadoras do ensino. Decorrentes deste objetivo, avaliamos as capacidades de ao, discursivas e lingustico-discursivas de uma produo escrita do gnero resumo acadmico e as distintas interaes ocorridas durante as intervenes escritas. A anlise possibilita a concluso de que tais ferramentas constituem instrumentos didticos da mestria de prticas de linguagem (re) configuradas em gneros textuais. Palavras-chave: sequncia didtica; lista de controle/constataes; gneros; interao.

    1 INTRODUO

    Este trabalho faz parte de uma pesquisa mais ampla (GONALVES, 2007) desenvolvida no mbito da Lingustica Aplicada, mais especificamente em relao ao Ensino de Lngua Materna, em que pretendemos analisar o impacto de Sequncia Didtica (daqui para a frente, SD), considerando-a ferramenta terico-metodolgica para o ensino de lnguas (SCHNEUWLY; DOLZ, 2004), e sua estreita relao com outra ferramenta, intitulada lista de controle (grille de contrle) pelo grupo de Genebra. Dadas as peculiaridades deste trabalho em

    * Professor da Universidade Federal da Grande Dourados. Doutor em Lingustica. Email:

    [email protected].

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    relao ao europeu, denominamos tal dispositivo de lista de controle/constataes1.

    A partir das questes acima, neste artigo trataremos da reescrita textual, neste caso especfico, do gnero resumo acadmico. Para atingirmos tais objetivos, o artigo apresenta a seguinte configurao: no primeiro tpico, trataremos sucintamente do dispositivo SD. No segundo, abordaremos as prticas dialgicas de interveno em textos a partir das listas de controle/constataes, que so enunciados sintetizadores das atividades e dos mdulos didticos trabalhados numa SD. Em seguida, analisaremos uma produo escrita e a sua reescrita, alm de dados coletados (antes e depois da SD); finalmente, verificaremos as interaes distintas no momento de reportar-se lista de controle/constataes, quais sejam: interao professor-aluno, do aluno A com aluno B e, por fim, do aluno consigo mesmo. Finalmente, apresentaremos os resultados a que chegamos a partir da anlise efetuada.

    2 O DISPOSITIVO PEDAGGICO SEQUNCIA DIDTICA

    A denominao Sequncia Didtica (SD) surgiu no Brasil a partir da publicao dos Parmetros Curriculares Nacionais (1998). Os documentos oficiais destinados s sries iniciais do Ensino Fundamental (BRASIL, 1998), quando abordam o tratamento didtico dos contedos, exploram, mesmo que timidamente, noes como as de projetos e atividades sequenciadas. Cristovo e Machado (2006) afirmam que, quando surgiu a designao SD, este termo no estava atrelado ao estudo dos gneros, mas a diferentes objetos do conhecimento.

    Uma sequncia didtica, de acordo com Dolz et al. (2004), um conjunto de atividades planejadas, de maneira sistematizada, em torno de um gnero textual oral ou escrito. Para Dolz e Schneuwly (2004, p. 53), as SDs procuram favorecer a mudana e a promoo dos alunos ao

    1 Esta questo j foi discutida por ns a partir de outros gneros, tais como o Artigo Opinativo e a

    Resenha Crtica e at mesmo a partir do gnero Resumo Acadmico (Cf. GONALVES, 2007, 2008, 2009). Nosso objetivo , aqui, o de apresentar resultados das pesquisas anteriormente desenvolvidas.

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    domnio dos gneros e das situaes de comunicao. O ponto de partida para a produo de uma SD deve ser sempre a observao das capacidades evidenciadas pelos alunos numa produo escrita, por exemplo. Segundo esses dois autores (2004), as SDs so organizadas a partir de um projeto de apropriao das dimenses constitutivas de um determinado gnero textual, neste caso, o resumo acadmico. Os objetivos das SDs so: i) proporcionar situaes efetivas de comunicao; ii) favorecer a planificao dos textos; iii) favorecer a produo/leitura/escuta de atividades diversas em relao aos gneros em estudo; iv) desenvolver capacidades acionais, discursivas e lingustico-discursivas. Bronckart (2004) constata que fazer intervenes por meio de SD conduz a importantes transformaes das atitudes pedaggicas e constitui um excelente meio de formao de professores. De maneira sinttica, as capacidades de ao so responsveis pela anlise das representaes do contexto de produo. As capacidades discursivas dizem respeito anlise da infraestrutura geral do texto: estrutura do texto, tipos de discurso e tipos de sequncia. Por fim, as capacidades lingustico-discursivas correspondem, em sntese, anlise dos mecanismos de textualizao (coeso verbal e nominal) e dos mecanismos enunciativos (vozes e modalizao).

    3 PRTICA DIALGICA DE INTERVENO EM TEXTOS

    Diversos pesquisadores j apontaram os benefcios das interaes escritas ou orais nas produes dos estudantes, entre estes Ruiz (2001), Buin (2006, 2007), Gonalves (2007). Com o foco no ensino da escrita e a nfase na reescrita de textos (BAZARIM; GONALVES, 2009), o docente pode lanar mo de diferentes instrumentos para fazer as intervenes nas produes dos estudantes em qualquer nvel de ensino, tais como: bilhetes orientadores, listas de controle, orientaes orais tuteladas. Esses instrumentos sero mais ou menos eficientes dependendo do tipo de articulao entre eles e as prticas desenvolvidas em sala de aula. Isso, de certa forma, amplia a concepo de correo de textos tradicionalmente vista como uma atividade isolada em que o professor apenas marca os erros cometidos pelos alunos em seus textos, para uma rede de atividades organizadas e sistematizadas que

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    utilizam diversos instrumentos em diferentes momentos da cadeia de produo textual (BAZARIM; GONALVES, 2009). Acreditamos que a interveno, independente da modalidade, deve ser interativa. Segundo Bakhtin e Voloshinov (1997), na interao entre interlocutores que reside o princpio fundador da linguagem.

    O sentido do texto e a significao das palavras dependem da relao entre sujeitos, ou seja, constroem-se na produo e na interpretao dos textos; a intersubjetividade anterior subjetividade, pois a relao entre os interlocutores no apenas funda a linguagem e d sentido ao texto, como tambm constri os prprios sujeitos produtores do texto. (BAKHTIN, apud BARROS, 1997, p. 30-31).

    Teberosky (2000, p. 23) afirma que a interveno/correo interativa no s um meio, mas assume a qualidade de um objeto, quando os usurios no s interpretam ou repetem a mensagem, mas tambm a produzem ou a contemplam; ento o ato de escrever assume novas funes. A autora afirma que escrever e escrita melhoram, e o produtor da escrita se v afetado por seus prprios produtos (2000, p. 23). Teberosky ainda sustenta que a materializao da mensagem escrita permite ao estudante ou a qualquer pessoa que escreve objetivar melhor seu pensamento, uma vez que se cria uma distncia entre produtor/produto de sua atividade (resumo acadmico, por exemplo). Assim, devido permanncia temporal da escrita, pode-se voltar ao texto para retoc-lo e transform-lo seja no lxico, no contedo e na organizao da mensagem ou na correo da forma (TEBEROSKY, 2000, p. 23). Por isso, comentrios dialgicos precisos podem trazer grandes contribuies produo e ao processo incessante de construo de sentidos (cf. RUIZ, 2001). Bucheton (1995) afirma que, normalmente, na reescrita de um texto, h maior desenvolvimento da heterogeneidade do discurso. Tal fato se confirma em nossas anlises, uma vez que os estudantes se reportam mais ao texto-base marcando os discursos (seu e do autor) de formas distintas. Ainda que neste texto tal heterogeneidade no seja modelar, h atribuio de aes ao autor emprico, alm de uma tentativa de diferenciao entre o texto de partida (T1) e o texto resumido pelo aluno, ou texto de chegada (T2). GONALVES Gneros textuais e reescrita...

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    Pasquier e Dolz, no declogo para ensinar a escrever (1996, p. 8), afirmam que a reescrita para os jovens estudantes uma espcie de cegueira [...]. Os alunos introduzem algumas modificaes, concentram-se em modificaes, em alguns erros superficiais como a correo de ortografia e a substituio de algumas palavras por outras. Constatam ainda os autores que tal procedimento de reescrita ineficaz, na maioria das vezes. O professor coteja duas verses de um mesmo estudante e as modificaes so mnimas. Pasquier e Dolz asseguram que a reviso (deve ser) parte integrante da escrita: A releitura, a reviso e a reescrita de um texto so atividades que tambm se aprendem (p. 9), opinio compartilhada por ns. Os autores tambm destacam que deve haver, no processo de escrita de um gnero textual, um tempo entre a primeira verso e a segunda. Este tempo necessrio para que os estudantes reflitam sobre sua produo e construam ferramentas lingustico-discursivas para operar melhor sua produo. Para os autores, a reviso constitui um dos momentos fortes da aprendizagem da produo de um texto (PASQUIER; DOLZ, 1996, p. 9). possvel, com as intervenes interativas, auxiliar os estudantes, principalmente na modalidade escrita da lngua, a construir e desconstruir o mundo, os sentidos. Sobretudo, possvel ajud-los cognitivamente na obteno de conhecimentos adequados ao gnero em produo: atribuio de aes ao autor do texto original, retomadas anafricas nominais, etc. Fazemos, pois, emergir a reflexo bakhtiniana a respeito do movimento dialgico. O autor afirma que

    [...] compreender a enunciao de outrem significa orientar-se em relao a ela, encontrar o seu lugar adequado no contexto correspondente. A cada palavra da enunciao que estamos em processo de compreender, fazemos corresponder uma srie de palavras nossas, formando uma rplica [...] A compreenso uma forma de dilogo; ela est para a enunciao assim como uma rplica est para outra no dilogo. Compreender opor palavra do locutor uma contrapalavra (BAKHTIN, 1997 [1977]p. 131-132).

    Rocha (2003) diz que durante a primeira produo de um texto, os estudantes ficam centrados em questes como: o que dizer, como dizer,

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    que palavras usar2. Constata, principalmente, que, na segunda verso do texto, o estudante tem aumentadas as possibilidades de dizer mais, dizer de outro jeito, analisar e/ou corrigir o que foi dito3, tencionando aumentar sua eficcia lingustica escrita, ideia comprovada neste artigo. Ges (1993, p.102), ao tratar do processo de reviso de textos de alunos, menciona que a tendncia que aparece a de limitar a tarefa de revisar, privilegiando mudanas de superfcie, que no afetam o significado dos enunciados [...]. A tese de Ges vai na direo contrria nossa, tendo em vista que, no corpus, os estudantes, mediados pela SD e pela lista de controle/constataes, realizaram mudanas significativas em vrios aspectos: na distribuio das vozes e na utilizao de verbos que distinguem o falar do texto de partida e do texto do estudante.

    A partir das reflexes acima, a lista de controle/constataes, ferramenta dialgica de interveno dialogada ou escrita, pode constituir-se em instrumento poderoso para a interao professor/aluno. Cassany (2000, p.81) assevera que a lista de controle serve de registro e anlise dos erros cometidos em cada produo escrita. Trata-se de uma tcnica minuciosa que oferece vrias possibilidades didticas. Ela serve para estabelecer o progresso realizado por cada estudante, pela classe, e assim por diante, e para registrar os erros que se repetem e os que so superados4.

    Bain e Schneuwly (1993) defendem a ideia de a lista de controle/constatao ser uma sntese das atividades desenvolvidas nos diferentes mdulos de uma SD. Ns acreditamos que ela deve conter as capacidades de ao, discursivas e lingustico-discursivas desenvolvidas ao longo da sequncia e, sobretudo, ser uma retomada das atividades desenvolvidas. Ela pode ser formulada gradativamente, isto , cada item pode ser a sntese de um mdulo, alm de poder ser feita pelos alunos e mediada pelo professor.

    2 Grifos da autora 3 Grifos da autora. 4 No original: la hoja de control sirve de registro y anlisis de los errores cometidos en cada

    escrito. Se trata de una tcnica muy minuciosa [...] y que ofrece varias possibilidades didcticas. Diz ainda que a lista serve para establecer el progreso realizado por cada alumno, por la clase, etc y registrar los errores que se repiten y los que se han superado (Cassany, 2000, p.81. Traduo nossa).

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    Gonalves (2007) verificou a necessidade de se construir tantas listas quantos forem os gneros transpostos didaticamente para a sala de aula. Principalmente, as listas favorecem a retomada dos conceitos-chave desenvolvidos e, sobretudo, criam uma espcie de linguagem comum do gnero em estudo. importante destacar que, antes de construir a SD e a lista, muito importante que o professor conhea o modelo didtico do gnero5.

    4 ASPECTOS METODOLGICOS

    Nesta seo, apresentamos os procedimentos metodolgicos para a anlise posterior. No primeiro quadro, mostramos o nmero/nome do mdulo, a data de sua aplicao e, por fim, o seu objetivo principal. Na segunda, dividimos, esquematicamente, as questes que motivaram a lista de controle/constataes. Em seguida, apresentamos a lista de constatao/controle do gnero em anlise e, por fim, a avaliao das trs capacidades implicadas: de ao, discursivas e lingustico-discursivas6.

    Em sala de aula, depois de aplicadas as SDs e com a primeira produo em mos, tomamos um cuidado adicional, qual seja, o de intervir de trs distintas maneiras nas produes escritas. Na primeira, fizemos a interveno no texto do estudante, (P-A). Na segunda, o prprio aluno, a partir da lista de constataes, faz a reescrita (A-A). Na terceira (A1-A2), em duplas, um estudante faz apontamentos na produo do outro estudante. Portanto, pretendemos averiguar se, mudando-se a forma de interveno, mudam os resultados. Dessa forma, antes de cada anlise, apresentam-se, por meio das siglas, o gnero e a forma de interveno.

    5 A respeito de modelo didtico de gneros, ler Schneuwly & Dolz (2004). 6 Para aprofundamento do leitor a respeito das capacidades de ao, discursivas e lingustico-

    discursiva, remetemo-lo a Schneuwly & Dolz (2004).

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    Gnero: Resumo de artigo opinativo/ Nomes dos mdulos

    N do mdulo7

    Aplicao em sala de aula

    Objetivo do mdulo8

    1 verso do texto - 26/1/20069 Delimitar as capacidades de que os alunos dispem e orientar a SD.

    O Gnero resumo 1 31/1/2006 Apresentar as caractersticas bsicas de um resumo e diferenci-las, em termos qualitativos.

    O Gnero resumo escolar/acadmico e outros gneros

    2 7/2/2006 Mobilizar representaes dos mundos fsico e social (contexto de produo dos textos) e constatar os possveis suportes do gnero.

    Sumarizao: processo essencial para a produo de resumos

    3 7/2/2006 Estudar, por meio de exerccios prticos, um processo essencial para a produo de resumos: a sumarizao.

    A influncia dos objetivos na sumarizao

    4 10/2/2006 Trabalhar a interao, isto , escrever para um interlocutor potencial.

    A compreenso global do texto a ser resumido

    5 10/2/2006 Estudar neste mdulo a compreenso global de um texto a ser resumido

    A localizao e explicitao das relaes entre as ideias mais relevantes do texto

    6 14/2/2006 Estudar os mecanismos de textualizao: conexo e segmentao, ou seja, explicitar as relaes entre as ideias mais relevantes do texto.

    Meno ao autor do texto resumido

    7 14/2/2006 Avaliar a retomada anafrica, ao referir-se ao autor do texto (coeso nominal).

    Atribuio de atos ao autor do texto resumido

    8 17/2/2006 Verificar a atribuio de atos ao autor do texto (processo de gerenciamento de vozes).

    Recapitulao dos procedimentos para a

    9 17/2/2006 Discutir, em conjunto com a turma, caractersticas peculiares

    7 A fim de facilitar o trabalho e uniformizar a nomenclatura, chamamos todas as etapas das SDs de

    mdulos, ao contrrio de Machado (2004), que denomina o mesmo fato de seo. 8 Estes objetivos so atribuies do professor-pesquisador aos atos de linguagem dos autores da

    Sequncia Didtica. 9 As aulas na COEB, Cooperativa de Ensino de Birigui, local onde foi feita a pesquisa, comearam

    no dia 26/1/2006, em virtude da necessidade do cumprimento dos 200 dias letivos. Os nomes das sees foram extrados da SD de Machado, Lousada e Abreu-Tardelli (2004).

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    produo do resumo ao gnero estudado Apresentao e discusso da lista de constataes/controle

    - 20/2/200610 Verificar a aprendizagem do gnero, aps a SD.

    Quadro 1 O movimento/objetivos da SD sobre Resumo de artigo opinativo na sala de aula.

    A fim de facilitar o trabalho de anlise dos dados coletados e seguindo as orientaes terico-prticas do grupo genebrino , a lista de controle/constataes foi dividida em quatro grupos: questes relativas ao contexto de produo; questes relativas organizao geral do resumo; questes referentes textualizao; e questes gramaticais. Das divises efetuadas a seguir, surgiram 10 (dez) questes que comporo nosso guia de anlise das produes escritas.

    Questes relativas ao contexto de produo.

    a) A que questo o autor Marcelo Leite11 responde em seu texto, isto , qual o contedo temtico?; b) Quem o autor? Para qual jornal ele escreve e em que seo? Qual o seu papel social?; c) A quem se enderea o texto?

    Questes relativas organizao geral do resumo.

    a) H uma parte para apresentar a questo discutida?; b) Como so ordenadas as informaes prioritrias para este contexto de produo especfico?; c) O resumo uma unidade de compreenso por si s, isto , possvel compreend-lo sem ter de recorrer ao original?; d) O resumo evita opinies pessoais e est adequado ao professor e, depois, ao jornal escolar com o intuito de apresentar as informaes essenciais a pessoas com pouco tempo de leitura para informar-se?

    Questes relativas textualizao.

    a) O estudante usa verbos de elocuo (ou de dizer) para referir-se ao discurso de outrem?; b) O estudante diferencia sua voz da voz do autor resumido?; c) Utiliza organizadores lgico-discursivos adequadamente?; d) Elimina expresses repetitivas e desnecessrias?

    Questes relativas microestrutura.

    H desvios de acentuao, pontuao, concordncia, ortografia, etc.?

    Quadro 2 As questes motivadoras da Lista de Controle/Constataes.

    A partir das questes do Quadro 2, e, sabendo da necessidade de trabalhar as diferentes capacidades de linguagem (de ao, discursivas e

    10 Neste dia, houve a reescrita de textos em sala de aula. 11 O texto de Marcelo Leite referenciado no final deste artigo serviu-nos como texto de partida para

    a produo dos resumos acadmicos.

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    lingustico-discursivas), apresentamos a Lista que nos serviu como ferramenta de anlise das produes escritas. Ei-la:

    1) Antes de resumir, voc detectou a questo discutida, os argumentos, o ponto-de-vista defendido, o ponto-de-vista rejeitado e a concluso?

    2) Seu resumo apresenta dados como o nome do autor do texto resumido e o ttulo do texto original?

    3)Voc selecionou as informaes prioritrias, de modo que o professor possa avaliar sua compreenso global do texto?

    4) Seu resumo compreensvel por si mesmo, isto , possvel compreend-lo sem ler o texto original?

    5) Evitou emitir suas prprias opinies?

    6) O resumo escolar produzido est adequado ao seu interlocutor-professor e ao suporte escolar?12 Conseguiu transmitir o efeito de sentido desejado?

    7) Voc atribui, a partir da leitura, diferentes aes ao agir do autor do texto original? Procurou traduzir estas aes por verbos adequados? Voc se refere a ele de formas diferentes?

    8) Seu resumo mantm as relaes sinttico-semnticas (explicao, causa, concluso) do texto original?

    9) Voc eliminou expresses facilmente inferidas pelo contexto tais como expresses sinnimas, explicaes ou exemplos?

    10) No existem desvios gramaticais tais como pontuao, frases truncadas/incompletas, erros ortogrficos, etc.?

    Na terceira coluna de cada produo13, dividimos os textos escritos em trs subitens: contexto de produo, planificao e, por fim,

    12 Estamos entendendo como adequado ao professor a produo que atinge, integralmente, a

    consecuo de um resumo acadmico, nos moldes da Lista de Constataes/Controle e da SD utilizada.

    13 As informaes relativas ao contexto de produo, planificao e questes relativas textualizao servem de parmetros para os docentes efetuarem anlises e fazerem suas intervenes pedaggicas. Por isso, a coluna da direita (3) mapeia as capacidades j adquiridas e as capacidades a serem adquiridas posteriormente. Assim, esta coluna no direcionada a

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    mecanismos de textualizao e enunciativos, atendendo constituio do folhado textual de Bronckart (2003)14. Assim, foram avaliadas as seguintes capacidades de linguagem.

    Gnero Objetivos Planificao Coeso e

    mecanismos de conexo

    Vozes Modalizao

    Resumo acad-mico

    a) Enviar texto para destinatrio mltiplo (leitores do jornal15 e professor). b) Fazer o pblico eventual do jornal tomar conhecimento dos aspectos prioritrios do texto-base. (objetivo)

    a) Apresentar uma parte introdutria em que haja a distino do T1 e do T216, alm de apresentao dos contedos das diferentes partes/ momentos do texto-base. b) H coerncia entre informaes resumidas e o texto-base? uma parfrase?

    a) Presena de organizadores lgico-argumentativos como: j que, etc. marcando a funo de segmentao, empacotamento, encaixamento e ligao

    a) Trabalha as diferentes vozes, tais como a do prprio estudante e a do autor emprico do texto-base?

    a) Reconhece e utiliza diversas marcas modais (advrbios, auxiliares, verbos no futuro do pretrito, palavras de valor modal, etc)?

    Quadro 3 Sinopse das capacidades observadas.

    estudantes (no caso especfico desta pesquisa), mas aos docentes, eventuais leitores deste trabalho acadmico.

    14 Para aprofundamento dos mecanismos enunciativos que compem o folhado textual, direcionamos o leitor a Bronckart (2003).

    15 Os destinatrios so diversos e podem ser constitudos por alunos da mesma instituio, professores, diretor de escola, pais; em sntese, no especialistas. Aqui, retomando Bakhtin (2000) e Garcez (1998), quando escrevemos, no temos unicamente um leitor concreto e particular em nossa mente, mas as representaes de leitor/autor com as quais se almeja identificar, como um conjunto de representaes e de ideias difuso e complexo com o qual o agente-produtor pretende contribuir. Esse destinatrio est sempre presente norteando o trabalho do produtor.

    16 O T1 o texto de apoio a partir do qual se gera o T2, produzido, neste caso, pelo estudante.

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    5 ANLISE E RESULTADOS DO CORPUS

    5.1 Anlise das produes escritas

    Nesta seo do artigo, nosso interesse est focado na anlise de um17 exemplar do gnero resumo acadmico. Cada produo, como j alertado, apresenta duas verses: a inicial (antes da aplicao da SD) e a segunda verso (aps a SD). Em seguida, fazemos uma anlise interpretativa das duas verses e, por fim, apresentamos dados qualitativos e quantitativos das dez produes investigadas.

    Primeira Produo: Truculncia na internet

    Lista de constataes Capacidades presentes e no-presentes

    A indstria fonogrfica norte-americana iniciou 261 processos judiciais contra pessoas que baixaram da internet canes protegidas por direitos autorais. Nada parece mais correto do que fazer reverter para o artista o fruto de seu trabalho, mas na vida prtica, todo direito enfrenta limitaes. Nesse caso como processar todos que fazem downloads? uma utopia! A justia no abarcaria tanto processo e isso no reverteria o problema, pois os preos esto exorbitantes. No entanto, Cary Sherman, presidente da Associao da Indstria Fonogrfica dos Estados Unidos disse ao jornal

    1) No detectou tese, argumentos e concluso adequadamente. 2) No apresenta dados como nome do autor, seo e local de publicao. 3) No est adequado a um resumo acadmico; selecionou informaes no-prioritrias, como o ltimo pargrafo. Fez cpia literal do T1. 4) compreensvel por si mesmo. 5) No h opinies. 6) No est adequado. (ver nota de rodap adiante). 7) No h atribuio de aes. No se refere ao autor de formas diversas; ao contrrio, tudo

    Contexto de produo a) No dirige o texto a destinatrios mltiplos. b) O pblico toma conhecimento das informaes, mas, provavelmente perguntar-se-: o que isso? Quanto Planificao a) No h distino entre T1 e T2. As informaes consideradas prioritrias das diversas partes do texto foram apresentadas. O contedo temtico foi desenvolvido na ordem em que apareceram os pargrafos do T1. H informaes no-prioritrias (cpias de alguns trechos do texto) b) H coerncia parcial (cf.anlise abaixo). cpia do original. Quanto textualizao a) Organizadores lgicos, em sua maioria, de encaixamento e de ligao (e, pois, que etc.). Presena de organizadores

    17 Nosso corpus composto por 20 exemplares do gnero resumo acadmico. Em nossa pesquisa de

    2007, analisamos dez dessas produes. Para a constatao de todo o corpus, remetemos o leitor a Gonalves (2007).

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    The New York Times que Ningum gosta de bancar o truculento e ter de recorrer a processos, mas a justia se tornou o nico meio de frear essa atividade ilegal, atacando alguns (os que mais copiam). Contudo, desconsidera que a maioria dos criminosos (os que fazem downloads) faz isso por hobby e no para fins lucrativos. E que faz-se necessrio criar uma nova maneira de coibir os espertinhos.

    escrito como se fosse do estudante. 8) Mantm as relaes lgicas do texto-matriz (pois, no entanto, etc). 9) H expresses desnecessrias, tais como: nada parece mais correto, que poderiam ser substitudas por sinnimas; h pargrafo desnecessrio. 10) H desvios relativos norma padro.

    demarcando fases de sequncia (contudo, no entanto). b) No h distino de vozes. A voz do aluno (expositor) a voz do autor do texto emprico. Traz apenas a voz de Cary Sherman. c) Presena de modalizaes lgicas, por ex., em a justia no abarcaria...; ao levantar a hiptese de a indstria no ser eficiente no combate ao download de msicas da internet. Alm disso, h modalizao dentica em faz-se (sic) necessrio... ao apresentar como do domnio da obrigao social termos de arrumar instrumentos de coibio dos internautas.

    Quadro 4 Produo inicial.

    Reescrita: Truculncia na internet

    Lista de Constataes Capacidades presentes

    Em seu texto Truculncia na internet, Marcelo leite nos informa que a indstria fonogrfica norte-americana iniciou 261 processos judiciais contra pessoas que baixaram da internet canes protegidas por direitos autorais e concorda em fazer reverter para o artista o fruto de seu trabalho, mas lembra que na vida prtica todo direito tem limitaes. E diz que a justia no abarcaria tanto processo e que isso no reverteria o problema, pois os preos dos Cds esto muito altos. Leite cita Cary Sherman, presidente da Associao da Indstria Fonogrfica dos Estados Unidos, quando disse

    1) Tese, argumentos e concluso de acordo com o texto-matriz. 2) O estudante apresenta dados como nome do autor, ttulo do texto. 3) Selecionou as informaes essenciais, demonstrando compreenso global do texto. 4) Compreensvel por si mesmo. 5) No h opinies do estudante. 6) Adequado, completamente, ao interlocutor-pesquisador e ao suporte. 7) H atribuies de aes como: comenta,

    Contexto de Produo

    a) Texto adequado a mltiplos leitores. b) Atinge seu objetivo: informar o prioritrio ao pblico leigo. Quanto Planificao

    a) Distingue T1 e T2 e planifica o contedo temtico da seguinte forma: a tese e a ressalva (direito enfrenta limitaes) aparecem no 1 parg. O 2 parg. argumenta em favor da justia para reparar problemas. O 3 parg. (concluso) afirma ser necessria outra forma de ganhar dinheiro. b) uma parfrase e h

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    ao jornal The New York Times que ningum gosta de bancar o truculento e recorrer a processos, mas a justia o nico meio de frear uma atividade ilegal que est causando prejuzo. O autor tambm comenta a esperteza dos empresrios indo atrs dos que fazem a distribuio das msicas e no dos que fazem a copiazinha domstica. E termina seu texto dizendo que essa prtica de baixar msicas da internet j se tornou mais um vcio do que algo para se lucrar, e impedi-la soa como censura e que fica cada vez mais difcil controlar a cpia e o intercmbio de produtos culturais, tornando-se necessrio uma nova maneira de coibir tais prticas.

    dizendo, controlar. Refere-se ao autor, de formas variadas: Leite, o autor, retomadas por elipse, etc. 8) Relaes sinttico-semnticas de acordo com o original (mas, e), alm de ideias implcitas. 9) No elimina a ideia da verso anterior tida como desnecessria, mas atribui-lhe a voz (presidente da Associao Fonogrfica.) 10) No h desvios de norma padro.

    coerncia com as informaes do T1. Quanto Textualizao a) Prevalecem, como na verso anterior, o encaixamento e a ligao dos organizadores lgicos (e, que, pois, quando, mas) b) H distino, em vrios trechos do texto, das vozes. De um lado, a voz do expositor e de outro a voz do autor emprico. c) H presena de modalizaes lgicas, evidenciadas pelo futuro do pretrito: abarcaria, reverteria, servindo para avaliar o contedo temtico.

    Quadro 5 Produo final.

    No h, na primeira verso, uma explicitao da tese defendida pelo agente-produtor: o reconhecimento dos direitos autorais e a dificuldade extrema de coibir a prtica em tempos de informtica (segundo, terceiro e quarto pargrafos). A segunda verso foi produzida aps a SD. Houve uma distncia temporal de trs semanas entre uma verso e outra. A primeira verso data de 26/1/2006; a segunda, de 20/2/2006. Est evidente, logo no primeiro pargrafo, a tese defendida por Marcelo Leite no artigo original: reverter os direitos autorais, mas como coibir a prtica? Ou seja, possvel compreend-lo, ainda que no tivssemos conhecido o texto-matriz, j que o agente-produtor deixa claro que se trata de um resumo a partir de um texto intitulado Truculncia na Internet, de autoria do articulista da Folha de S. Paulo, Marcelo Leite.

    As ideias, na segunda verso, esto todas no texto-matriz e foram adequadamente reescritas na verso em anlise. As relaes lgico-semnticas tambm esto explcitas nesta verso. Por ex., no segundo pargrafo: [...], mas lembra [...], h outros conectivos como: que, e, GONALVES Gneros textuais e reescrita...

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    pois, alm de pronomes relativos. Outro importante crescimento qualitativo observado refere-se atribuio de aes ao texto resumido. Na segunda verso, o estudante, no primeiro pargrafo, nos diz: [...] Marcelo leite nos informa [...]; [...] e concorda [...]; [...] e diz [...]. No segundo e no terceiro pargrafos h os verbos citar, dizer, comentar. Ou seja, tal item revela a importncia de trabalhar a SD, nos termos de Schneuwly e Dolz (2004). Outro benefcio diz respeito retomada do autor Marcelo Leite. No primeiro pargrafo, h a nomeao do agente-produtor Marcelo Leite e, por diversas vezes, ele retomado por elipse. No segundo pargrafo, continua a retomada de Leite por elipses. No terceiro, h a anfora direta no trecho: O autor tambm comenta [...] e, novamente, retoma-se por elipses. Enfim, trata-se de um exemplar do gnero resumo escolar/acadmico autntico.

    Quanto organizao do contedo temtico, o estudante vai resumindo as informaes de acordo com a ordem de apario, de forma a distribuir os contedos em trs pargrafos. No primeiro, condensa as informaes dos seis primeiros; no segundo, condensa as informaes do stimo pargrafo; na concluso, h condensao dos trs ltimos pargrafos. Outro fator importante a distino das vozes na segunda verso do texto. Atribumos esse fato ao mdulo de nmero 8 da SD, em que se procurou trabalhar a atribuio de aes ao autor emprico do texto. Assim, o estudante domina satisfatoriamente o contexto de produo, a planificao e a textualizao. A SD, atrelada lista, foi responsvel, acreditamos, por essa proficincia qualitativa da verso final. Geraldi (1995) afirma que a linguagem o lugar de constituio das relaes sociais. Desta forma, continua o autor, que os falantes se tornam sujeitos. O texto escrito no tem um sentido nico, ao contrrio, , como diz Geraldi (1995), fundamental e necessrio produo de sentidos. O docente-pesquisador, no caso especfico desta pesquisa, atua preenchendo os espaos em branco da verso anterior da produo.

    5.2 Anlise da ntegra do corpus

    Neste item, procuramos sintetizar a anlise das dez produes escritas do corpus. Em seguida, fazemos uma anlise interpretativa dos resultados. Com relao ao primeiro item da lista de controle/constataes detectou a questo discutida, argumentos e pontos de vista defendidos e rejeitados, houve uma melhoria de 20% nas

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    produes escritas na segunda verso. Creditamos tal melhoria aos mdulos cinco e seis da SD e a retomada deste item na lista de controle. Nesta seo, trabalhamos atividades referentes compreenso global do texto. No mdulo, trabalhou-se a localizao e explicitao das relaes entre as ideias mais relevantes do texto, mdulo este tambm de extrema importncia para o desempenho dos estudantes no item oito da lista. Em se tratando do item relativo a apresentar dados como o nome do autor do texto resumido e ttulo do T1, 90% das produes escritas atenderam a esta solicitao. Tal progresso, cremos, deve-se s atividades desenvolvidas pela SD no mdulo 7, cujo ttulo ilustra adequadamente o item: meno ao autor do texto resumido. Com relao a apresentar uma parte introdutria em que haja distino entre T1 e T2, alm de apresentao dos contedos das diferentes partes do texto-base, tivemos 80% das produes escritas atendendo a esta solicitao18. Referindo-nos ao terceiro item da lista, temos selecionou informaes prioritrias que possam mostrar uma compreenso global do texto,, creditamos a melhoria de 20%, tambm, SD, mais especificamente ao mdulo 3, que se intitula Sumarizao: processo essencial para a produo de resumos.

    A respeito do quarto item da lista, resumo compreensvel por si mesmo, sem a necessidade do texto original, houve, na segunda verso, 100% de aproveitamento nas produes. As atividades desenvolvidas no mdulo 2, relativas ao contexto de produo, podem ter ajudado os estudantes no distanciamento entre o texto de partida e o texto de chegada, tendo em vista a situao de comunicao estabelecida. As atividades da SD envolvendo as capacidades de ao tais como o objetivo do autor do resumo, o veculo de publicao em que iria circular a produo, podem ter ajudado os estudantes a se tornarem mais proficientes no item. O quesito de nmero cinco da lista de controle/constataes refere-se necessidade de no aparecerem opinies pessoais no resumo. Por conseguinte, cremos serem as atividades desenvolvidas no mdulo 1, retomadas pela Lista de Controle posteriormente, os fatores propulsores de tal aprendizagem. Neste item,

    18 O item a que acabamos de fazer referncia coaduna-se com o item dois da lista de controle. Por

    isso, esto analisados conjuntamente. O mesmo ocorrer com os itens fazer o pblico eventual do jornal tomar conhecimento dos aspectos prioritrios do texto-base e presena de organizadores lgicos.

    GONALVES Gneros textuais e reescrita...

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    100% dos estudantes atenderam a ele. Em relao ao tpico de nmero seis, resumo adequado ao interlocutor, trabalhamos tal capacidade nos mdulos 2 e 4 da SD e, dessa forma, pode ser esse o fator responsvel pela proficincia das produes; 50% das produes atenderam solicitao. Com relao ao item sete, aes do autor traduzidas por verbos adequados, tal capacidade, sabemos, negligenciada nas atividades escolares do Brasil. O corpus demonstrou que 100% dos textos referentes ao gnero resumo acadmico atenderam solicitao de reportarem-se ao autor do texto-base por meio de verbos que foram trabalhados na seo oito da SD. Em relao s retomadas anafricas e a fazer meno ao autor do texto resumido, estas foram mais frequentes e diversificadas na segunda verso. Bronckart (2003) afirma, referindo-se s retomadas por meio de anforas nominais, que estas so frequentes em textos de discurso terico, dado confirmado por ns.

    Referindo-nos ao tpico oito da Lista de Controle/Constataes, 100% dos estudantes mantm as relaes sinttico-semnticas do texto original. Na SD, tal quesito foi trabalhado na seo seis. Por outro lado, tal item pertence, dentro do modelo terico desenvolvido por Bronckart em (2003), s capacidades lingustico-discursivas. A nosso ver, esse item mais frequente nas atividades escolares e, por isso, j na primeira verso, 90% dos estudantes o dominavam. Apoiando-nos no modelo de anlise de textos de Bronckart, no corpus investigado houve uma prevalncia de organizadores lgicos em funo de encaixamento e de ligao, seguida por organizadores intitulados de balizamento. No notamos presena de organizadores em funo de segmentao e cremos que tal fato ocorreu devido nfase dada nos organizadores de nvel mais inferior (encaixamento/ligao). Do corpus, dez produes utilizaram organizadores de encaixamento/ligao, oito utilizaram organizadores em funo de balizamento e cinco de empacotamento. Cremos, para as prximas SDs, ser necessrio o trabalho dos organizadores em suas respectivas funes tendo em vista a utilizao nas produes escritas.

    Em relao ao item eliminao de expresses sinnimas, explicaes ou exemplos facilmente inferidos pelo contexto, o trabalho se desenvolveu mais especificamente no mdulo 3 da SD, alm de outros momentos, de forma menos intensa. Houve 30% de melhoria deste item na segunda verso. Em relao ao item dez, tambm se

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    referindo s capacidades lingustico-discursivas, houve melhora de 20% na segunda verso do texto. Convm destacar que no houve mdulos para tratar das questes microestruturais. importante frisar que do declogo de itens da Lista de Controle/Constataes, os itens menos atendidos foram os relativos ao item um (detectar a questo discutida, localizar argumentos e pontos de vista) e o dez (relativo aos desvios microestruturais), hiptese apontada acima. Desse modo, acreditamos ser necessrio ter desenvolvido na SD atividades de compreenso global do texto Truculncia na Internet, utilizado para a produo do resumo, ainda que, na ocasio da aplicao do referido mdulo, tenhamos retomado o texto do autor e, oralmente, estabelecido, em sala de aula, os argumentos, a questo discutida e a concluso a que chega o autor. Para eficcia maior, atividades orais parecem no ter sido suficientes.

    Desse panorama descritivo, podemos concluir que as atividades da SD, atreladas lista de controle/constataes que resume e retoma a SD, foram fatores decisivos no maior domnio do gnero resumo acadmico, j que em todos os aspectos, sejam os relativos ao contexto de produo, sejam os relativos planificao ou mesmo os aspectos concernentes aos mecanismos de textualizao/enunciativos, foram prontamente atendidos. Com relao ao item h coerncia das informaes resumidas e o texto-base e uma parfrase, 100% das produes atenderam a esta solicitao. Cremos ser o contato com o T1, seja na produo inicial, seja na produo final, seja nos momentos de leitura, etc. o fato que favorece o arquivamento das informaes essenciais do T1 e, assim, facilita a coerncia no momento de produo do T2.

    Com relao ao item trabalha as diferentes vozes [...], houve 100% de produes com utilizao de vozes. H dois tipos de vozes: a voz do expositor/aluno e a voz do autor do texto resenhado. Aqui, constatamos que existe uma preocupao (observada na segunda verso do texto produzido pelos estudantes) de marcar as diferentes vozes, ou seja, diferenciar aquilo que do aluno e aquilo que do autor do resumo. So comuns, por conseguinte, expresses como: Segundo Leite, Para Leite, etc., seguidas normalmente de uma parfrase do que foi lido no texto. Os mdulos 2, 7 e 8 contriburam para a utilizao das vozes, sobretudo os dois ltimos, que se referem respectivamente atribuio de aes ao autor do T1 e meno do autor do texto resumido.

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    No que tange ao tpico reconhece e utiliza diversas marcas modais, destacam-se, pela ordem de presena nos textos, as modalizaes lgicas que, para Bronckart (2003), consistem em avaliar elementos do contedo temtico; modalizaes denticas avaliam elementos do contedo temtico, apoiadas nos valores e nas regras do mundo social, equivalentes ao mundo social; as modalizaes apreciativas so ligadas ao mundo das valoraes subjetivas; e, finalmente, as modalizaes pragmticas.

    Nossa pesquisa vai, dessa forma, ao encontro doutros trabalhos acadmicos j desenvolvidos, tais como o de Schneuwly, Rosat e Dolz (1889). Tal trabalho mostra que a variao das condies de produo acarreta repercusses sobre as escolhas feitas pelos produtores, seja na planificao/apresentao do contedo temtico, seja na utilizao dos elementos de conexo. Os autores acreditam que as atividades relativas ao contexto de produo (capacidades de ao) so imprescindveis para o agente-produtor calcular a pertinncia de tal ou qual contedo, dos organizadores textuais (que foram mais frequentes e diversificados na segunda verso), enviar textos para destinatrios mltiplos e, no caso do resumo acadmico, levar o pblico leitor a tomar conhecimento dos aspectos prioritrios da questo tematizada. Vai tambm ao encontro do estudo de Cordeiro e Azevedo (2004), que, analisando narrativas de aventuras de viagens e tendo desenvolvido uma SD para trabalhar com o gnero, chegam a resultados semelhantes aos nossos: diferenciao das vozes, maior organizao da planificao do contedo temtico. As autoras chegam concluso de que a aplicao de SD revela transformaes importantes nas capacidades de linguagem. De nossa parte, acreditamos que a lista de controle/constataes, associada ao desenvolvimento de SDs, serve para ajudar os estudantes a compreenderem ou anteciparem os critrios de apreciao dos textos, alm de favorecer uma linguagem comum, durante e aps a SD, de funcionar como uma espcie de acumulador dos conhecimentos desenvolvidos na SD. No dizer de Bain e Schneuwly (1993), a lista de controle ajuda a estruturar e a modelar a escrita dos estudantes e fazer a autorregulao de sua aprendizagem. Sobretudo, com a lista de controle, entremeada pela SD, possvel a comparao entre o pr-texto e o ps-texto, objeto de investigao desta pesquisa.

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    5.3 Anlise das formas distintas de interao

    Com relao s formas de interveno pedaggica no momento da reescrita, como destacado anteriormente, houve trs distintas formas de interao. Na primeira, o docente-pesquisador analisava as produes, o que foi marcado pela sigla (P-A); na segunda, o aluno A analisava a produo do aluno X, marcado pela forma (A1-A2); por fim, o prprio aluno avaliava a sua produo (A-A). Em termos metodolgicos, como temos um corpus de dez produes, os alunos numerados 1, 3, 9 sero avaliados na interao (P-A). Os estudantes 6, 8 e 10 sero avaliados na interao A1-A2 (um aluno intervm na produo do outro aluno); por fim, os alunos 2, 4, 5 e 7 sero avaliados na interao A-A, aluno consigo mesmo. Abaixo, num primeiro momento, apresentamos os resultados da fase em que o professor avalia a produo escrita dos estudantes pesquisados:

    (R/ P-A) Estudante Enviar texto para

    destinatrio mltiplo (leitores do jornal e professor)

    Fazer o pblico eventual do jornal tomar conhecimento dos aspectos prioritrios do texto-base (objetivo).

    1 - X - X

    3 X X X X

    9 X X X X

    Quadro 6a Resultados da reescrita (Professor-Aluno/P-A).

    (R/ P-A) Estudante Apresentar uma parte introdutria em

    que haja a distino do T1 e do T2, alm de apresentao dos contedos das diferentes partes/momentos do texto-base.

    H coerncia das informaes resumidas e o texto-base? uma parfrase?

    1 - X X X

    3 - X X X

    9 X X X X

    Quadro 6b Resultados da reescrita (Professor-Aluno/P-A).

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    (R/ P-A) Estudante Presena de

    organizadores lgico-argumentativos como j que, marcando a funo de segmentao, empacotamento, encaixamento e ligao.

    Trabalha as diferentes vozes, tais como a do prprio estudante e a do autor emprico do texto-base?

    Reconhece e utiliza diversas marcas modais (advrbios, auxiliares no futuro do pretrito, palavras de valor modal).

    1 X X - X X X 3 X X - X X X 9 X X X X X X

    Quadro 6c Resultados da reescrita (Professor-Aluno/P-A).

    Pela anlise desses trs quadros, podemos observar que os estudantes responderam satisfatoriamente a 100% das questes propostas para reescrita, na interao P-A. Consequentemente, no houve um item em que os estudantes tiveram maior ou menor dificuldade. Ou seja, na interao P-A, as capacidades de ao, capacidades discursivas e lingustico-discursivas foram atingidas igualmente. A seguir, mostramos resultados em que a interveno no texto discente ocorreu de forma em que um estudante, denominado A1, interfere na produo de A2.

    (R/ A1-A2)

    Estudante Enviar texto para destinatrio mltiplo (leitores do jornal e professor).

    Fazer o pblico eventual do jornal tomar conhecimento dos aspectos prioritrios do texto-base (objetivo).

    6 - - X X 8 - X - - 10 - X X X

    Quadro 7a Resultados da reescrita nas interaes A1-A2.

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    (R/A1-A2)

    Estudante Apresentar uma parte introdutria em que haja a distino do T1 e do T2, alm de apresentao dos contedos das diferentes partes/ momentos do texto-base.

    H coerncia das informaes resumidas e o texto-base? uma parfrase?

    6 - - - - 8 - X - X 10 - X - X

    Quadro 7b Resultados da reescrita nas interaes A1-A2.

    (R/A1-A2)

    Estudante Presena de organizadores lgico-argumentativos como: j que, etc. marcando a funo de segmentao, empacotamento, encaixamento e ligao

    Trabalha as diferentes vozes, tais como a do prprio estudante e a do autor emprico do texto-base?

    Reconhece e utiliza diversas marcas modais (advrbios, auxiliares no futuro do pretrito, palavras de valor modal).

    6 X X - - X X 8 X X - X X X 10 X X - X - X

    Quadro 7c Resultados da reescrita nas interaes A1-A2.

    Pelo que se depreende desses resultados, em quase todos os itens pesquisados houve melhora na segunda verso do texto. No item enviar texto para destinatrio mltiplo, em 66,66% das produes escritas o item foi inteiramente atendido. No houve alterao substancial nos itens relativos a fazer o pblico leitor eventual do jornal tomar conhecimento dos aspectos prioritrios do texto-base, tampouco no relativo a apresentar uma parte introdutria em que haja distino do T1 e do T2. Em relao a haver coerncia das informaes resumidas e

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    o texto-base? uma parfrase? 66,66% das produes sofreram alteraes substanciais. E, por fim, houve 100% nos itens: aproveitamento quanto utilizao de organizadores lgicos e utilizao de marcas modais e 66,66% de aproveitamento no quesito de utilizao de diferentes vozes. Por conseguinte, temos 66,66% de aproveitamento nas capacidades de ao e nas capacidades discursivas e 88% de aproveitamento nas capacidades lingustico-discursivas. Com relao interveno em que o prprio estudante rev seu texto, temos:

    (R/ A-A)

    Estudante Enviar texto para destinatrio mltiplo (leitores do jornal e professor)

    Fazer o pblico eventual do jornal tomar conhecimento dos aspectos prioritrios do texto-base (objetivo).

    2 - X - X 4 X X X X 5 - X X X 7 - - X X

    Quadro 8a Resultados das interaes A-A.

    (R/A-A)

    Estudante Apresentar uma parte introdutria em que haja a distino do T1 e do T2, alm de apresentao dos contedos das diferentes partes/ momentos do texto-base.

    H coerncia das informaes resumidas e o texto-base? uma parfrase?

    2 - X X X 4 X X X X 5 - X X X 7 - - X X

    Quadro 8b Resultados das interaes A-A.

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    (R/A-A)

    Estudante Presena de organizadores lgico-argumentativos como: j que, etc. marcando a funo de segmentao, empacotamento, encaixamento e ligao.

    Trabalha as diferentes vozes, tais como a do prprio estudante e a do autor emprico do texto-base?

    Reconhece e utiliza diversas marcas modais (advrbios, auxiliares no futuro do pretrito, palavras de valor modal, etc.)?

    2 X X - X X X 4 X X X X X X 5 X X - X X X 7 X X - - X X

    Quadro 8c Resultados das interaes A-A.

    Pelo exposto, novamente h produes escritas em que a segunda verso apresenta melhora. No item enviar textos para destinatrios diversos, 50% das produes apresentaram melhora em relao ao item fazer o pblico eventual do jornal tomar conhecimento dos aspectos prioritrios do texto-base, isto , houve aproveitamento em 25% dos textos, j que, neste caso especfico e nesta forma de interao, 75% das produes j atendiam ao quesito. Em apresentar parte introdutria [...], houve um aumento de 50% das produes escritas, com o item plenamente atendido. A mesma percentagem ocorreu com o item trabalha as diferentes vozes, tais como a do prprio estudante. Nos demais itens, quais sejam, h coerncia das informaes resumidas e o texto-base?; presena de organizadores lgicos e reconhecer e utilizar diversas marcas modalizadoras [...] 100% das produes atenderam aos quesitos. Consequentemente, houve 87,5% de aproveitamento nas capacidades de ao e nas capacidades discursivas e 91% de aproveitamento nas capacidades lingustico-discursivas. Em termos quantitativos, 80% das produes melhoraram no item enviar texto para mltiplos destinatrios; 90% melhoraram nas atividades relativas a fazer o pblico leitor tomar conhecimento dos aspectos prioritrios do texto-base, configurando estas duas questes o contexto de produo.

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    importante salientar que, na primeira verso do texto, enviar produo escrita para destinatrios mltiplos era a capacidade no dominada pela maioria dos estudantes, juntamente com a capacidade de diferenciar T1 e T2, mas, esta outra, dentro das capacidades discursivas.

    Quanto s questes relativas s capacidades discursivas, apresentar parte introdutria em que haja distino entre T1 e T2 e coerncia das informaes resumidas com o texto-base, 80% e 90% das produes, respectivamente, na segunda verso, mostraram-se mais eficazes. Por fim, com relao presena de organizadores lgico-discursivos, 100% das produes escritas atenderam a este quesito, 80% das produes atenderam necessidade de trabalhar as diferentes vozes e 100% das produes atenderam solicitao de utilizao das marcas modais. Assim, houve progresso semelhante nas trs capacidades supracitadas, o que demonstra a eficcia da SD sobre o gnero resumo no desenvolvimento equitativo nas trs capacidades. A seguir, no quadro (8 d), apresentamos os resultados finais das trs formas distintas de interao.

    Tipos de capacidade Interveno P-A

    Interveno A1-A2

    Interveno A-A

    Capacidades de ao 100% 66,66% 87.5% Capacidades discursivas

    100% 66,66% 87.5%

    Capacidades lingustico-discursivas

    100% 88,88% 91%

    Quadro 8d Resultados das formas interativas de interveno pedaggica.

    De todo o exposto, acreditamos que, adotando esta perspectiva terica de trabalho, fazem-se necessrias correes interativas de textos, por meio de interaes distintas, tais quais as expostas neste trabalho: P-A; A1-A2; A-A. Pela anlise, nas trs formas de interao ocorreram melhorias substanciais, sendo que o item em que o professor interfere na produo a forma com maior quantidade de alteraes realizadas pelos estudantes (P-A), seguida pelas outras formas de interveno, A-A e A1-A2, respectivamente. Assim, outras formas de interveno, que no seja

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    a do professor corrigindo o texto do estudante, podem ser instrumentos favorveis/propiciadores de aprendizagem desde que, a nosso ver, entremeadas por SDs e Listas de Constataes/Controle.

    6 CONSIDERAES FINAIS

    Rosat, Dolz e Schneuwly (1991), quando tambm estudaram processos de reescrita a partir de SD, chegaram concluso de que, em processos tradicionais de interveno pedaggica (cremos, correo indicativa, resolutiva e classificatria), os estudantes fazem apenas correes de natureza microestrutural. Rosat et al. defendem a ideia de que as SD contribuem para favorecer um olhar mais crtico, instrumentalizando-os para uma maior capacidade de reviso e reescrita de textos. Entendemos a primeira produo como uma espcie de andaime por meio do qual os estudantes podem precisar seus pensamentos, afinar os itens da lista de controle para desenvolver a clareza da expresso. Para a equipe genebrina, se preciso for, bom haver atividades complementares de escrita (perodos, pargrafos) antes de solicitar-lhes a produo final.

    Nossa pesquisa retoma/reprisa a teoria bakthiniana (2000), quando esta explicita que todo autor responde, retoma, concorda, refuta enunciados anteriores. Neste trabalho, alunos e professor-pesquisador, com a SD e a lista de controle em mos, foram respondentes dos problemas encontrados na primeira verso dos textos e, dessa forma, determinavam respostas futuras desses mesmos sujeitos pesquisados, das quais, consequentemente, resultaram produes mais eficazes, do ponto de vista do gnero aqui estudado. Portanto, dialogamos com os enunciados anteriores prevendo a continuidade desses enunciados nas atitudes responsivas ativas dos sujeitos investigados. Nosso trabalho dialgico, j que a lista e as SDs so instrumentos de responsividade primeira verso do texto. necessrio retomar aqui que nossa tese central a funo da natureza mediadora do outro na construo dos sentidos, por meio dos instrumentos metodolgicos.

    O trabalho em questo pode ser ampliado por outros docentes, com possibilidades reais de resultados semelhantes, ou at melhores, se,

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    obviamente, a concepo de linguagem adotada for a interacionista. Por fim, reafirmamos, tal como Schneuwly e Dolz (2004) e Leal e Morais (2006), a premente necessidade de se levar escola diferentes propostas de produo de gneros textuais apoiados numa especfica situao de comunicao, o que acarreta a escolha de um gnero textual para um determinado contexto de produo e a consequente utilizao de capacidades discursivas e lingustico-discursivas pertinentes ao gnero escolhido, j que, por pesquisas anteriores, confirmadas por esta, estudantes que vivenciam prticas de escrita reais e no prticas como se tendem a se tornar mais proficientes nos seus escritos.

    Esta pesquisa foi desenvolvida numa instituio cooperada de ensino, COEB (Cooperativa de Ensino de Birigui); portanto, trata-se de uma instituio privada de ensino. Mesmo entre instituies do mesmo segmento, a realidade educacional no seria diferente. Independentemente da instituio, o trabalho com a reescrita faz-se necessrio. A reescrita, a nosso ver, demonstra tambm o real comprometimento do professor em suas atividades docentes, e, tal como confirmado por Garcez (1998), esse empenho muda a atitude do educando. Ele nos v como educador comprometido e no apenas como um mero dador, expositor de aulas, prtica frequente em escolas de Ensino Mdio particulares.

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    Recebido em 16/10/08. Aprovado em 08/03/10.

    Ling (Dis)curso, Palhoa, SC, v. 10, n. 1, p. 13-42, jan./abr. 2010

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    Title: Genres & rewriting: an intervention proposal for L1 teaching Abstract: Fundamentals of the epistemological framework of sociodiscursive interactionism and of Bakhtinian presuppositions rebound in this article, whose main aim is to ascertain the possible benefits, for the teaching of Portuguese, of two pedagogical instruments: didactic sequencing and control/findings list, which are explored, by Language Didactics researchers from the University of Geneva, as teaching enhancers. Consequently, we evaluate the discursive and linguistic-discursive capacities of a written production of the academic genre abstract as t and the distinct interactions which occurred during the written interventions. The analysis enables the conclusion that such tools constitute didactic instruments for the mastery of language practices (re)figured in textual genres. Keywords: didactic sequencing, control/findings list, genres, interaction.

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