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    gerAo Comum / a mania de dizer A GENTE: PortasLgicas e Conexes Perifricas para entender aAmizade como Polarizao da Arte

    Edson de Barros

    : uma construo crtica comum ao sistema de arte que se tecena atividade de diversos coletivos em todo o Brasil na viradado sculo 21

    O Panorama da Arte Brasileira 20011evidencia o espao

    conquistado no circuito da arte contempornea, pelos diversoscoletivos de artistas sediados em Porto Alegre, Rio deJaneiro, Belo Horizonte, Fortaleza, So Paulo, Braslia,Goinia, Recife, Macap; que vive uma fase de tomada deposio pelas Aes e os discursos desses coletivos,revelando o irrompimento de um exerccio da amizade comopoltica que constituindo fora frente ao circuito, resultaem algo que se configura na idia de Antiarte e situa oartista dentro de uma necessidade de comunicaralgo emgrande escalacom a proposio de obras inacabadas2. Grupo,Laranjas, Atrocidades Maravilhosas, Rs do Cho, Beth Vai aGuerra, A.N.T.I.cinema, EmpeZa, Urucum, Formigueiro,Transio Listrada, Ncleo Performtico Subterrnea, Entorno,Camelo, so alguns desses coletivos que, ao dirigir-se paraa sociedade, deslocam a noo de artista, que passa a ser ade um propositor, de um educador; e deslocam tambem a noo

    do publico que deixa de ser a de um espectador passivo daarte e passa a participar livremente da proposioartstica.

    Diluir o artista na sociedade equiparar Arte=vida. Esseseventos so temporrios, essas experincias so de pico: sooperaes extraordinrias de liberao de uma rea detempo, de imaginao, de terra, e se dissolver para serefazer em outro lugar. Outro momento

    3. Nesses grupos h

    1Mostra Coletiva - Curadores: Paulo Reis, Ricardo Basbaum, RicardoResende,Museu de Arte Moderna, So Paulo. 25 de outubro 2001a 6 de janeiro 2002Museu de Arte Moderna, Rio Janeiro. 22 de janeiro a 3 de maro 2002Museu de Arte Moderna, Salvador. 13 de abril a 19 de maio 20022Oiticica, Helio; Aspiro ao Grande Labirinto,Rocco, Rio de Janeiro, 1986;sobre o reaparecimento da antiarte na arte contempornea3H muito a arte no fala mais do vnhamos chamando de arte. a narrativagerada por esse sistema hegemnico, onde uma certa idia de arte mantida por meio de suas instituies (critica, museus, sales) chegou aoseu fim. Testemunhamos j h alguns anos a saturao de uma certa noode obra, de artista, de circulao e distribuio do que possa serconsiderada obra de arte.Na opinio de Cristina Freire, nas experinciascoletivas, o cotidiano e as formas simples so privilegiados. Trata-se de

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    somas e h subtraes, as autorias so hibridizadas dandosurgimento a um outro expandido e precrio.

    Fundamentando-se na consolidao de dezenas de coletivos pipocando pelo Brasil, diluindo a autoria da obra de arte nacoletivizaao dos eventos e problematizando a realidade

    social e cultural da regio em que esto sediados. Apluralidade desses agrupamentos permite a manifestao de unsaos outros enquanto agentes indicadores de uma identidadecoletiva constituindo-se publicamente e representa um papelimportante para o debate sobre o aparecimento de uma artepoltica e de articulao margem do sistema das artes noincio deste sculo.

    :Portas Lgicas e Conexes Perifricas para entender aAmizade como Politizao da Arte

    Tentar tratar as aes desses coletivos por Ao Comum=agir

    comum, considerando com Antonio Negri a noo de comum comoo compromisso cotidiano que se revela como potnciaprodutiva presente

    4, para tentar perceber o agir comum

    como fora prtica e circulao de necessidades singularescuja finalidade se constri na vida sobre a necessidade paraa produo. Tentar traar uma trajetria dessas Aes Comuns dirigir-se mais ao sentido dos movimentos decontracultura do que em direo s vanguardas histricas daarte

    5, para perguntar sobre os deslocamentos e rearranjos de

    poder dentro do Circuito de Arte, que as Aes Comunscolocaram em processo.A percepo do comum como filosofia prtica, da nossa poca,talvez nos ajude a entender esses gestos6 que contm uma

    intencionalidade que sugere a superao da lgica daindividualidade pela lgica do coletivo.

    uma arte que se pauta no processo, mais do que numa obra acabada. Folhade So Paulo, Mais. So Paulo, domingo, 6 de abril de 2003. A exploso doartivismo.

    4Negri, Antonio. Kairs, Alma Vnus, Multitudo.. nove lies ensinadas amim mesmo, Rio de Janeiro, DP&A editora, 20035Apesar de essas vanguardas guardarem desde o impressionismo o trao de`cooperao`entre os participantes e de `reao` grupal aos padresestabelecidos, desde os Sales dos Recusados, essas `criticas coletivas`se deram no plano da pesquisa estilstica e no da poltica (publico). Areao dos fauves (1905) aos impressionistas e a filiao estilstica doFuturismo(1920) ao Cubismo, podem nos orientar para os pontos quenortearam a crtica e a discusso pela substituio de padres dessasvanguardas. As respostas s questes surgidas so todas da esfera dacapacidade individual. O alvo dessas vanguardas a academia e os padresde representao, mesmo que o alvo dos Construtivistas tenha sido asociedade. Mas, o alvo-dad cultura.6Os gestos (contra os sales, as ordens institudas remontam s origensda instituio dos museus e sales no sculo 18) so ainda hojesimblicos, pois h uma intencionalidade que sugere que a lgica daidentidade (individual) superada pela lgica da identificao(coletiva).

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    Nesse inicio dos 2000, o Brasil vive um Esperado momento detransio de sentido do Poder. As tendncias culturais epolticas`a flor da pele

    7, em sintonia com manifestaes em

    Seattle e Genova, seriam o principal motor desta gerao8. A

    articulao entre arte e poltica se d na medida em que

    ns vivemos, nas reas artstica e poltica, uma crisevocabular, uma crise de sentido, uma crise das categoriaslegadas pela tradio. Um tal vazio semntico exige umapostura, uma vontade de insero que est presente nessesgrupos

    9.

    Os Dias de Ao Global Contra o Capitalismo, os movimentosfeministas e anti-raciais, paradas gls, manifestaes-bloqueios dos Sem Terra, dos Sem Teto, do Greenpeace, do Act-up, as festas Reclaims The Strets10e Black Block...H umprocesso de fuso e diluio entre os discursos da arte e dasociedade nas participAes dos coletivos de artistas nosfruns sociais anti-globalizao, dissolvendo as poticas da

    arte em levantes, em eventos coletivos e transitrios,evidenciam novas possibilidades de interao de foras naconstruo do comum. Apostar nas aes diretas, diluir-se nocoletivo e na realidade pelo exerccio de formar opinio emum processo de discusso coletiva/comum/publico/poltico. AAo Direta diz respeito a percepo da realidade, a tomadapor si prprio de uma ao concreta para transforma-la. Dizrespeito ao trabalho coletivo para resolver nossos prpriosproblemas, fazendo o que refletidamente achamos ser a formacorreta de ao, sem considerar o que as vrias autoridades julgam aceitvel. Diz respeito ampliaodas fronteiras do possvel, diz respeito inspirao, aoaumento de potencial. Diz respeito ao pensamento e ao de

    tomar, no de pedir e mendigar11. O que possa significaressa `turbulncia` na sociedade, pode nos ajudar a entender a`recusa` que significou esse `cruzar-os-braos-mas-no-sair-

    7Uma concisa introduo s ideais situacionistas nos possibilitaria umaviso do que foi o ambiente que gerou o Maio de 68 francs. Atravs daanlise dos textos mais amplamente divulgados, traduzidos, distribudos einfluentes da Internacional Situacionista enquanto ela esteve ativa epretendia ser uma organizao poltica que tinha como objetivo a aosubversiva contra o capitalismo.8Juliana Monaquesi, Folha de Sao Paulo, Mais. So Paulo, domingo, 6 deabrail de 2003. a exploso do artivismo.

    9Luis Camilo Osrio. Folha de Sao Paulo, Mais. So Paulo, domingo, 6 deabrail de 2003. a exploso do artivismo.10Reclaim The Streets(RTS) surgido na Inglaterra no inicio dos anos 90

    a partir da luta antiestradas,foi inicialmente o principal impulsionadorna Europa, e tavez no mundo, do mecanismo de coordenacao de movimentossociais chamado Acao Global dos Povos(AGP). Foi tambm um dos grandesimpulsionadores dos primeiros Dias de Ao Global; caracteriza-se por umaautocrtica severa. Essa reflexividade e autocrtica talvez tenha sido omotivo que levou o RTS a compreender a limitao da pratica eprovavelmente o fez reduzir sua iniciativa na organizao e divulgao deDias de Ao Global Contra o Capitalismo11Do texto: A poltica das ruas

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    de dentro`, denunciando o conservadorismo do circuito, almde desmerecer os artistas que se submetiam produomercantilista. Disturbando toda uma ordemestabelecida, esses bandos festivos, representaram uma formade resistncia ao poder e constituiu-se como uma alternativaque dominou a cena cultural e

    produziu os eventos de maior repercusso no alvorecer domilnio.

    Por contracultura entendemos a idia de que a subversofunciona melhor quando misturada com humor inesperado. Essanoo da imaginao como arma desenvolvida pelo Provosantecipou e inspirou os diversos movimentos de contestaojovem nos anos 60, inclusive a esquerda hippienorteamericana e os manifestantes do Maio de 68 francs; e podenos revelar que Antiarte e Contracultura guardam entre sialm do desejo de destruio do imprio da mercadoria, tambma semelhana de utilizar a imaginao e a ironia como contra-arma de resistncia ao poder constitudo.

    A vivncia e a festa enquanto prticas de engajamentopoltico, foram usadas como atitudes de reivindicao, e aomesmo tempo, como resposta a uma estrutura estabelecida. Hum momento em que os artistas param a produo de objetos, ouento de mostr-los como resultado de suas pesquisasplsticas, e comeam a valorizar o jogo, a imaginao, aao, a teatralidade, ao mesmotempo em que se renem aos bandos para cozinhar, deitar narede e ver um vdeo, ou fumar e beber e sorrir. Atividadesque ningum normalmenteinterpretaria como um ato criativo individual, mas que soformas que possibilitam sabotar a cultura mercantilista em

    que toda a produo esttica reduzida pura e simplesmente a mercadoria. K-7s,fotografias, vdeos

    12, impressos, adesivos e panfletos so

    prticas utilizadas de modo performtico por essa nova turma,alm da interveno urbana, para firmar sem regra a priori,novas possibilidades de co-existncia; de jogar e produzir,talvez, rearranjos ticos/estticos dentro do Circuito deArte Brasileira -`recusando-se (o que implica a criaocontinua de possibilidades existenciais e libertarias) econtrapondo-se aos aspectos engessados das instituies e desuas imveis normas de domnio e de perpetuao deprivilgios`.13

    12H uma afinidade do vdeo enquanto meio e essas aes comuns, so

    eventos para serem gravados por acaso e exibidos imediatamente. O vdeo um meio de registrar um evento e o exibir imediatamente, sem um intervaloneutro, um espao e um tempo equilibradores. A exibio imediataintensifica e comprime o evento. Desperta a necessidade de repeti-lo. Omesmo vale para os outros suportes.13Ceclia Cotrin, in dois vrios rios, Ns Contemporneos, NY. 8 de

    janeiro de 2004

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    Um grupo como atividade,agir comum, em devir, visando a suamultiformidade histrica no porvir, o grupo-forma apontandopara o processo de sua auto-constituio. Pretendendoencorajar a experimentao, esses coletivos enfatizaram anoo de programa aberto que semelhante ao conceito deprograma vazio de Foucaut, a renncia a propor qualquer

    programa, pois levaria consigo a normativizao e oprivilgio de determinados modos de existncia, proibindooutras formas de sociabilidade. Esse programa aberto seriapreenchido de acordo com as necessidades de cada individuo.Ora, a possibilidade de concebermos o comum como um processo,no qual os agentes implicados trabalham na sua transformao,na sua inveno no fundo experimentar um `programa aberto`,uma relao ainda por criar valorizando o jogo, a imaginao,a ao, a teatralidade. Um programa aberto capaz de oferecerferramentas para a criao de relaes variveis, preparandoo caminho para formas de vida sem prescrever um nico modo deexistncia como correto. Um novo direito relacionalexprime esse apelo pela criao de novas formas de vida. Uma

    relao ainda por imaginar, aberta, na qual cada indivduodeve formar a sua prpria tica da amizade.

    A Ao Comum no tem nada a ver com comunidade, nem com o que"temos em comum", e sim, com a construo do comum, do agircomum. no sentido de que, somos muito diferentes, queprecisamos construir algo em comum para estarmos juntos, edepois desfaz-lo e construir de novo e assim pordiante...no implica afirmar uma forma de vida em particular,mas as suas mltiplas formas e possibilidades, uma vontade deformaAo, uma vida na qual o importante como se vive. Opoder transgressor da Ao Comum consiste nessa possibilidadeque representa de construir a comunidade e a sociedade ao

    nvel de um tipo de relao livre e no institucionalizada, easpirar criao de um direito relacional amplivel a outrostipos de conflitos sociais: essa faculdade de revelar algumapista para o ser da ao em contraposio a mera existnciacorprea da arte depende de iniciativas para constituir aprpria existncia segundo critrios estticos.

    Podemos tentar orientar a reflexo sobre as Aes Comuns emtorno da imagem do poltico como a mquina de guerra

    14,

    existindo somente por um instante, o tempo de um raio, de umacontecimento, j que, aps sua emergncia, vai serincorporado ao aparelho Estatal. A mquina de guerra -metfora do aberto, da contingncia, do acontecimento, dasmetamorfoses, das transformaes constantes e da amizade - sereconstri permanentemente aps o encontro com o aparelhoEstatal. A mquina de guerra existe somente nas metamorfoses,nesse gozo de esboar uma imagem ou metfora, que vai sertraduzida pelo aparelho estatal em imagens conhecidas einstitucionalizadas. essa imagem sucede uma outra e assimpor diante.

    14Deleuze, Mil Plats.

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    Festas contra o capital: a ao direta de gruposanticapitalistas na luta contra a globalizao dos mercados;festas contra a guerra: a ao niilista dos dadastas; festascontra a esttica: fluxus; festas contra o circuito da arte:as aes comuns dos jovens artistas em todo o Brasil. H na

    Ao Comum, como no Dada, no Fluxus e na Ao Direta dosgrupos contra o capitalismo, a semelhana de estar nolugar, encontrar-se dentro, e de l tentar produzir umcurto-circuito. H tambm o carter de formao de redes e deinternacionalizao. So resistncias anticapitalistas eantiautoritrias acompanhadas da recompensadora alegria quesurge de estar na companhia de semelhantes, de aparecer empublico e agir conjuntamente; de inserir-se no mundo pelaspalavras e pelas aes.

    Dada era um modo de vida compartilhado por indivduos que sediferenciavam em relao idade, ao status e a atividadesocial, conduzidos a relaes intensas que no se assemelham

    a nenhuma relao institucionalizada, culminando em uma ticae uma cultura15. Apesar das leituras tradicionais paraentender o fenmeno Dada ressaltarem o seu carter deruptura, h uma tendncia a voltar ao curso natural dahistoria da arte, amputando este outro percurso dosdesdobramentos Dada enquanto ruptura e ato fundador de umsegmento que desemboca na contracultura. Dada, significa oprimeiro som emitido pela criana e expressa o primitivismo,o comear do zero, o novo em nossa arte, nesse sentido, Dada um estado de esprito

    16fundamental, que se propagou

    rapidamente a outros pases indicando o carter internacionaldo movimento. A idia de estado de esprito internacionalaparece tambm no Fluxus que fazia parte de uma silenciosa

    revoluo conceitual que estava ocorrendo no mundo da arte nofinal dos anos 50 e no comeo dos 60

    17questionando o limite

    entre as obras de arte e o resto das coisas. Esta mesma idiade zeitgeistvai aparecer na referencia as festas contra ocapital: ...eles apareceram em Seattle, Chiapas, PortoAlegre, Praga, Washington, Londres, Quebc, So Paulo, Paris,Gnova e em todos os lugares, incluindo Wall Street e o Valedo Silcio. Organizados nos bate-papos que atravessam aquelesmesmos computadores e da mesma rede que prometiam a Nova

    15 noo de comunidade geralmente pressupe um grupo harmnico e umanoo de consenso, que impossvel de ser pensada sem conotaes defuso e identificao. A prpria etmologia de comunidade,comum(com)defesa(munis), evoca o seu carter fechado e defensivo. Por isso, dizFrancisco Ortega, em para uma Poltica da Amizade, que Derrida enfatizaos trabalhos de Blanchot e Nancy como tentativa de pensar uma novacomunidade como aporia da comunidade, como (im)possibilidade dacomunidade, ou seja,como comunidade inconfessvel (Blanchot), ouinoperante (desouvre- Nancy) o que , na terminologia de Derrida, setorna comunidade dos que nada tem em comum.`16Andr Breton, Dada Manifesto, 1920

    17Artur C Danto, O mundo como Armazm: Fluxus e filosofia. CCBB, Rio de

    Janeiro,

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    Economia e a Nova Ordem...e eles vieram como muitos blocos decarnaval, para estragar a festa do Dinheiro18. Esta mesmarede de computadores na qual jovens artistas em todo oBrasil, que acreditam atacar a maquina da globalizaoneoliberal, contra o desmanche das instituies culturais econtra o canibalismo da produo artstica pelo sistema

    comercial, com postura antiinstitucional e articulao emgrupos, busca por espaos independentes para expor seustrabalhos, produo de vis poltico e crticoessencialmente

    19.

    As Aes Comuns dos coletivos contemporneos e dos movimentosDada e Fluxos, suscitam crticas mais prximas das atuaisAes Diretas Contra o Capitalismo, distanciando-se cada vezmais, dos argumentos tradicionais da crtica formalista daarte, sendo a crtica social mais adequada como instrumentopara um possvel entendimento da atividade dessasiniciativas: Para alm de o que Hannah Hoch, Raoul Hausman,Johannes Baader e Richard Huelsenbeck tentaram fazer com o

    Dada em Berlim est refletido no Fluxus por Henry Flint,George Maciunas e Bem Vautier. O Dada Nova Iorquino - MarcelDuchamp e Man Ray - tem paralelos com George Brecht, Yoko-Onoe Robert Watts etc, e no Dada Parisience de Tristan Tzara,etc, se pode ver paralelos com Dick Higgins, Alison Knowles eLarry Miller, etc20. Marciunas tinha ntidos ideaiscoletivistas. Ele se referia ao fluxus como Neo-Dada, mas eletinha tambm uma certa viso poltica que tem algumasafinidades com alguns movimentos mais radicais do sculo. Asaspiraes fluxus so sociais (no estticas), escreve em1964.

    Em um certo sentido, so todas iniciativas cujos alvos o

    capital e que se desenvolvem produzindo uma esttica doaberto, do imprevisvel, do precrio, do experimental, daconstruo do comum como experincia de liberdade: A AoComum dos coletivos de arte que acredita atacar a maquina daglobalizao neoliberal, contra o desmanche das instituiesculturais e contra o canibalismo da produo artstica pelosistema comercial, com postura anti-institucional earticulao em grupos, buscando espaos independentes(residncias,esquinas, praas, tapumes, pontes, armazns,etc); Dada que revela esse problema na pergunta de TristanTzara: propsito da arte fazer dinheiro e agradar aoamvel burgus?.

    A reao ao capital nota-se tambm na setena:at o fim dosanos 70, atravs da liderana de George Marciunas, O Fluxusteve como determinao rejeitar os valores e o meio quecercava as `Artes Eruditas` e o carter comercial que dominou

    18Ned Ludd(org), Urgncia das Ruas, Conrad editora, So Paulo, 2002.19Folha de So Paulo

    20Jon Hendricks. O que Fluxus, o que no Fluxus. Porque?. CCBB. Rio

    de Janeiro

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    o mercado internacional da arte aps o fim da Segunda GuerraMundial; e na Ao Direta contra o capitalismo globalizado,ao afirmar em comunicado do Black Block Anti-Estadista,Filadlfia,de 9 de outubro de 2000. Em um sistema baseado nabusca do lucro, a Ao mais eficaz quando ataca o bolso dosopressores. A destruio da propriedade, como forma

    estratgica de ao direta, uma estratgia eficaz paraatingir esse objetivo. Isso no uma teoria.... um fato. Aao dos black blocks se inscrevem de fato numa superaodos modos de manifestao poltica tradicionais. Elespraticam uma desobedincia civil ativa e a ao direta,afastando assim a poltica do teatro da mdia e reinserem aao no meio da contestao. Possibilitam assim, um assaltodireto sobre os elementos do sistema que eles rejeitam. OsBlack Blocks se declaram inteiramente a favor da aoofensiva contra as estruturas de poder, tomando ao p daletra o famoso slogan: o capitalismo no se desmoronasozinho. Ajudemo-lo!

    Assim como Dada, Fluxus foi um grande movimento coletivomultimdia de vanguarda, a unir artistas em torno de idiasde transformao da cultura e da sociedade. Hans Arpescreveu: em Zurique, em 1915, tendo perdido o interessepelos matadouros da guerra mundial, voltamos nos para asBelas Artes. Enquanto o troar da artilharia se escutava distncia, colvamos, recitvamos com toda a nossa alma,buscvamos uma arte elementar que, pensvamos, salvasse aespcie humana da loucura desses tempos. Herdeiro dodadasmo, fluxus trouxe para a arte o happeninge oentrecruzamento de linguagens para a arte e a filosofia zen-budista antiarte vida, a natureza. a verdadeirarealidade, o nico e o todo. A chuva antiarte, um espirro

    antiarte...(Marciunas), Fluxus mantm ainda em comum com oDada a Idia de zeitgeist: Fluxus Nasceu de uma necessidadeem 1961

    21.

    O Dada foi um fenmeno de atravessamento que trouxe consigo aoportunidade histrica de abrir virtualidades relacionais eafetivas, inscrevendo diagonais no tecido cultural, quepermitiriam o surgimento dessas virtualidades. Nesse sentido,Dada

    22assume uma ascendncia histrica, por definir-se como

    ruptura e fundar as bases de uma noo de contracultura, comsua rejeio ao militarismo e a adoo de um pensamentoradicalmente livre, incorporando ao instrumental da arte oelemento poltico (pblico) em suas `outras`formas mais

    21Jon Hendricks.Op.cit.

    22Arp: Dada visou destruir as razoveis iluses do homem e recuperar a

    ordem natural e absurda. Dada quis substituir o contra-senso lgico doshomens de hoje pelo ilogicamente desprovido de sentido. por isso quegolpeamos com toda fora no grande tambor de Dad e proclamamos a virtudeda no-razo. Dad deu a Vnus de Milo um enema e permitiu a Laocoonte eseus filhos que se libertassem, aps milhares de anos de luta com a boasalsicha Pyton. As filosofias tem menos valor para Dad do que a velhaescova de dentes, e Dad abandona-as aos grandes lideres mundiais...

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    abertas de manifestaes, e que podemos visualizar revelando-se mais tarde no Fluxus e nos ritos coletivos contra asociedade consumista do Movimento Provos de Amsterdam, noMaio de 68 francs, no movimento hippiee nas recentesmanifestaes-bloqueios e os Dias de Ao Global Contra oCapitalismo. A ao direta coletiva, nascidas de raves, de

    squats

    23

    e infoshopsanarquistas, tem gerado verdadeirasbatalhas nas ruas, constituindo-se em um fator importante dedeslegitimao, seno das instituies capitalistas como umtodo, ao menos do pensamento econmico neoclssico que tempautado de forma absolutista as polticas ditadas pelasinstituies reguladoras do capitalismo global

    24.

    a arte no seria um recinto especial do real, seno umaforma de experimentar qualquer coisa - a chuva, um espirro, ovo de uma borboleta...Maciunas passou a conceber uma sriede festivais com as realizaes mais radicais e menostradicionais de artistas plsticos, msicos e cineastas depases diversos

    25. Festivais fluxos, Soirese matines

    dadatas, havesdos dias de ao global, vivncias festivasda Ao Comum. Festejar uma forma de engajamento polticoque descredita a obra de arte com o cultivo do gesto e dano superioridade do artista como criador. Essa preocupaofundamental do Dada se reflete na idia de licena doFluxus que sugere que qualquer um pode faz-lo. Um conceitoda antiarte, instaurado pelo ready madede Duchamp eutilizado deliberadamente nas Edies Fluxus e que vairefletir tambm na idia de dissoluo do artista nasociedade colocada pela Ao Comum. Uma msica feita portodos que no precise de ensaio, como reivindicou Jonh Cagequando escreveu: finalmente precisamos de uma msica que noestimule a participao do pblico, pois nela a diviso entre

    msicos e pblico no mais existe. Poltica da imaginao,um gosto pela experimentao e a criao de algo diferente,como as vivncias do nicacena e do Rs do Cho, e do AcarInvertido

    26. A poltica entendida como noo da ao em

    liberdade, da ao num mundo despolitizado como resistncia.A identidade agente aparece ento como realizao no espaopblico e no como dada. ento, um processo pblico, eacontece no mundo,nas lutas contra as formas de subjetivao;constituindo-se no mundo compartilhado com outros agentes procura de novas formas de subjetividade e sociabilidade,como a Amizade.

    23Casas ou prdios abandonados, que so transformados em locais de morada

    e centros culturais e sociais.24(BM)Banco Mundial,(OMC) Organizao mundial do Comercio, BID, FMI e a

    OTAN (orgnizao do tratado do atlntico Norte - Ned Ludd in Urgncia dasRuas, Conrad Editora, So Paulo,2002.- (Coleo Baderna)25Jon Hendricks. Op.cit.

    26Quarentenas promovidas pelo Espao Experimental Rs do Chao, RJ, que seconstitui de vivncias com o objetivo de revelar e discutir os sintomasda cultura contempornea; em dimensao menor, os nicacenas sao vivenciasde uma noite

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    Sempre que os indivduos se liguem atravs do discurso e daao: agir comear, experimentar, criar algo. Talvez, umagenealogia das Aes Comuns na qual, a constituio do comumno mundo contemporneo, permita uma reconstruo histrica,remontando assim at as origens Dada(modernas) da Ao Comumna cultura ocidental. Foucault percebe que um mundo em que as

    instituies sociais contribuem para limitar o numeropossvel de relacionamentos decorre do fato de que umasociedade que permitisse o crescimento das relaes possveisseria muito mais difcil de administrar e de controlar. AAo Comum impossibilita o poder de classificar e de se imporao destruir os mecanismos de controle da lgica burguesa daindividuao e classificao. Auto-definindo-se pelairreversibilidade e imprevisibilidade; ou seja, enquantooperao de desclassificao, a Ao Comum, manteriaafinidades com as categorias de entropia e pulsao doconceito do Informedesenvolvido por Rosalind Kraus e Yves-Alain Bois a partir de Bataille.

    Falar do coletivo falar de pluralidade, experimentao,liberdade, desterritorializao; que representando umaalternativa s formas de relacionamento prescritas einstitucionalizadas27. Apresenta, no entanto, uma relao como outro que no tem a forma, nem a unicidade consensual.Trata-se de uma relao que ao mesmo tempo incitaorecproca e luta, tratando-se no tanto de uma oposiofrente a frente quanto de uma provocao permanente. Sorelaes agonsticas, de combates livres que apontam para odesafio e para a incitao recproca e no para a submissoao outro.

    :a mania de dizer A GENTE

    (Se)a Ao Comum aspira criao de um novo direitorelacional, que permita as formas de relaes possveis emvez de impedi-las ou bloque-las. Ressaltar a importncia daamizade enquanto Poltica, experimentando outras formas desociabilidade, com nfase na pluralidade dos participantes,constituiria-se como um exerccio do poltico ante essasociedade que limita e prescreve as formas derelacionamento

    28, e um estmulo crucial para a reflexo sobre

    a identidade e o significado de suas inter-relaes. Semprecisar de suporte institucional, sem vincular o espaopublico ao estado, existem mltiplas possibilidades de aopoltica, mltiplos espaos pblicos que podem ser criados eredefinidos constanteMente; esta nova tica procuraria jogardentro das relaes de poder com um mnimo de dominao ecriar um tipo de relacionamento intenso e mvel que impea

    27Ortega, Para uma poltica da amizade

    28Foucault

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    que as relaes de poder se transformem em estados dedominao.

    Que elementos considerar nas anlises sociolgicas efilosficas do fenmeno da amizade? Que influncia e em queaspectos a prtica crtica da contracultura poderia nos

    servir como ferramenta para entender melhor a atuao dessesgrupos, como continuidade da reavaliao que as idias dopensamento de esquerda passou a partir da ultima dcada dosculo XX? Atravessar a Histria dos Discursos da Amizade,experimentar outras imagens para essa tentativa de pensar asAes Comuns como vontade de agir, de transgredir e superaros limites na procura de outras construes do poltico.Problematizar a Ao Comum como acontecimento, tentandoresponder s perguntas acerca de nossa situao presente,visando as estratgias de resistncia desenvolvidas ante adespolitizao e a massificao da sociedade contempornea.

    Podemos observar nos ltimos anos um crescente interesse na

    filosofia francesa pela amizade e por um novo pensamento decomunidade e sociabilidade. Uma srie de pensadores, entreeles Maurice Blanchot, Michel Foucault, Jaques Derrida,Gilles Deleuze, Felix Guattarri, Jean-Luc Nancy, tm colocadoa questo da amizade e da comunidade no centro de suafilosofia, com freqncia no contexto de uma tentativa derecuperar o poltico para a comunidade, de re-pensar, re-construir, o poltico e a democracia. Ou seja, a amizadesendo deslocada de uma esfera privada, da intimidade, para omundo, a sociabilidade, o pblico. Um estudo histrico dofenmeno da amizade e uma anlise de sua dimensopoltica/tica/esttica permitir-ia investigar a noo decomum nos textos destes e autores afins; e reconstruir a

    partir desses textos, o exerccio da amizade como reinvenodo poltico, uma tica de amizade no contexto de uma possvelatualizao da esttica da existncia, permitindo transcendero quadro da auto-elaborao individual para se colocar numadimenso coletiva, como alternativa ao esvaziamento da esferapblica.

    Uma poltica no centrada no Estado, e sim existencialista,na procura de autenticidade, o que permite fazer uma ponteentre o pensamento de Foucault, Derrida, Deleuze e os deHannah Arendt, como sinaliza Ortega

    29ao defender a tese de

    que todos esses autores, no fundo, visam a uma alternativapoltica que vai alm de uma poltica partidria e que propea recuperao do espao pblico: a poltica compreendida comoatividade de criao e de experimentao. Poltica comodinmica, acontecimento e comeo, como interrupo deprocessos automticos. Nesse sentido, a amizade, representa,um exerccio do poltico, um apelo a experimentar formas desociabilidade e comunidade, procurando alternativas s formastradicionais de relacionamento.

    29Para uma poltica da amizade

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    Este projeto se constitui, portanto, como umaproposioabertaao estudo das articulaes entre a literatura, afilosofia, o direito e os problemas polticos institucionais, para perceber uma outra histria da arte que seconstituiria porpassar por fora daquilo que se inscreve na

    rubrica Arte, e por que no dizer, por passar longe dahistoria do muro30do Museu. A possibilidade de se pensar

    uma outra histria da arte contra essa elite reduzida deexperts que o museu representava para Hlio Oiticica. Umaoutra histria que compreenda esse artista re-situado, quedirecionou o seu alvo da arte para a sociedade, e que aofazer isso dissolveu sua imagem de artista na de outropersonagem.

    30 A histria da arte moderna confunde-se, segundo Rosalind Kraus, com a

    histria da expanso do muro do Museu e a tentativa de pular para olado de dentro desse muro. In Caminhos da Escultura Moderna