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1 GERAÇÃO DE EMISSÕES NEGATIVAS O papel das estratégias de remoção natural e tecnológica de dióxido de carbono Junho de 2018

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GERAÇÃO DE EMISSÕES NEGATIVAS

O papel das estratégias de remoção natural e

tecnológica de dióxido de carbono

Junho de 2018

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Autores Participaram da elaboração do presente relatório Maria Belenky, Peter Graham e Claire Langley, da Climate Advisers, com o apoio de Erika Drazen. A Climate Advisers gostaria de agradecer a Michael Wolosin, da Forest Climate Analytics, pela visão estratégica e assistência na redação deste documento. As opiniões expressas neste relatório são exclusivas dos autores.

A Climate Advisers gostaria de expressar seu agradecimento ao Governo da Noruega pelo apoio prestado a este relatório.

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Sumário

SUMÁRIO EXECUTIVO....................................................................................................................................4

I. INTRODUÇÃO................................................................................................................................................8

II. CDR NATURAL E TECNOLÓGICA: PRINCIPAIS FATORES PARA COMPARAÇÃO.........................11

A. A NATUREZA EM AÇÃO: ABORDAGENS DE CDR NATURAL..............................................................................12Reflorestamentoeflorestamento......................................................................................................................12Manejoflorestalmelhorado..............................................................................................................................14Sequestrodecarbonoorgânicodosolo(SOCS).................................................................................................15

B. INCORPORAÇÃO DA ENGENHARIA: ABORDAGENS DE CDR NATURAL.............................................................16Biocarvão...........................................................................................................................................................16Bioenergiacomcapturaearmazenamentodecarbono(BECCS)......................................................................18Capturadiretadoar(DAC)................................................................................................................................20Aceleraçãodointemperismo(EW)....................................................................................................................22

IV. NÃO DEIXAR PASSAR AS OPORTUNIDADES QUE A NATUREZA JÁ OFERECE..........................24

V. RECOMENDAÇÕES...................................................................................................................................26

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Sumário executivo Existem hoje soluções naturais de remoção de dióxido de carbono abundantes, bem

compreendidas e a nosso alcance, cujo potencial deve ser aproveitado ao máximo, o antes possível.

A comunidade científica e especialistas de diversas áreas acreditam cada vez mais que os países terão que ser proativos na implantação de soluções em escala planetária para remover o dióxido de carbono (CO2) e outros gases de efeito estufa (GEE) da atmosfera, e para descarbonizar a economia industrial mundial com rapidez, a fim de limitar os impactos da mudança do clima. O Acordo de Paris de 2015 reconhece esse duplo desafio. Além de limitar a elevação da temperatura a bem abaixo de 2 ºC (o que se busca é chegar a 1,5 ºC), seus objetivos de longo prazo obrigam os signatários do acordo a atingir um equilíbrio entre o que é emitido nas fontes e o que é absorvido pelos sumidouros, na segunda metade do século.

O que é a remoção de dióxido de carbono (CDR)? CDR (sigla em inglês para “carbon dioxide removal”) é a denominação dada aos métodos naturais e tecnológicos de captura e armazenamento ou uso de CO2.1 Nas abordagens naturais, o CO2 atmosférico é absorvido por meio da fotossíntese e armazenado na biomassa acima do solo e também nas raízes e no próprio solo. Nas abordagens tecnológicas, são adotados métodos artificiais para remover o CO2 de fontes pontuais, como usinas de energia e instalações industriais, bem como diretamente da atmosfera.2 A Tabela ES-1 sintetiza as abordagens de CDR mais difundidas.

Nesta análise, tentamos trazer a CDR para o centro do debate sobre o clima identificando soluções de eficácia comprovada e com boa relação custo-benefício para serem implantadas hoje.

Principais constatações

§ As soluções naturais são as opções de CDR mais acessíveis. A maioria é muito bem compreendida e vem sendo utilizada em larga escala há décadas. As soluções tecnológicas ainda são bastante incipientes – a maioria existe apenas em escala experimental ou demonstrativa.

§ Atualmente, as soluções naturais são uma opção muito mais econômica para capturar o dióxido de carbono – seu custo por tonelada de CO2 capturado é uma ordem de grandeza mais baixo do que as soluções tecnológicas.

§ A CDR natural também oferece inúmeros cobenefícios, inclusive ecossistemas mais resilientes, maior habitat e biodiversidade da vida silvestre, melhoria da qualidade da água e controle da erosão. Com algumas pequenas exceções, a CDR tecnológica seria implantada exclusivamente pelos benefícios em termos de mitigação das mudanças do clima. Isso pode dificultar a adesão de um grupo mais diversificado de atores.

§ A CDR natural pode não ser suficiente para o alcance das metas do Acordo de Paris. Existem fatores limitantes consideráveis que pesam sobre a CDR natural em função dos efeitos da saturação, ou limite natural de carbono que a biomassa pode armazenar, e das restrições de terra disponível, que limitarão o potencial de mitigação de soluções como florestamento/reflorestamento e aumentarão seu custo.

1 Embora algumas metodologias capturem gases que não o CO2, este é o gás que a maioria tem como alvo. É por isso que a sigla “CDR” é usada para todas as soluções que geram emissões negativas líquidas. Usaremos essa sigla ao longo deste artigo. 2 Incluímos nas metodologias tecnológicas soluções como a aceleração do intemperismo (enhanced weathering), que envolveria a interferência humana em larga escala em processos geológicos com o uso de tecnologias como a trituração de rochas ou a extração e dispersão de minerais que capturam CO2 da atmosfera.

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§ É provável que o custo das abordagens tecnológicas diminua ao longo das próximas décadas, enquanto seu potencial de mitigação permanece em grande medida inalterado.

§ Estimular a implantação da CDR em larga escala deveria estar na pauta de todas as agendas de ação climática internacionais e estratégias nacionais de emissões de longo prazo verdadeiramente visionárias, com um forte ênfase inicial na CDR natural nas próximas décadas e depois em pesquisa e desenvolvimento contínuos na área de CDR tecnológica, como uma apólice de seguro para o longo prazo.

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Figura ES-1: Síntese das abordagens de CDR, por fator

Notas: 1. Potencial de mitigação representado como uma faixa de potencial técnico ou máximo em várias fontes da bibliografia (ver texto). As estimativas de potencial técnico não são aditivas entre as metodologias, pois pode haver compensações entre elas. 2. As estimativas de custo são representadas como faixas de custo médio de várias fontes da bibliografia (ver texto), e não se destinam a representar a faixa de estimativas de custos com um potencial de mitigação específico.

Melhoria dos ecossistemas Produtividade do solo Geração de renda Geração de energia

Metodologia Mitigação técnica potencial (GtCO

2/ano)1

Custo médio (US$/tCO

2)2

Prontidão Cobenefícios

Escala:

Natural

Reflorestamento/Florestamento Plantio de árvores onde não existem ou já não existem há décadas.

MADURA

Manejo florestal melhorado Práticas de manejo que aumentam a taxa de captura de CO

2 e a quantidade

armazenada nas florestas.

MADURA

Sequestro de carbono orgânico do solo Aprimoramento do armazenamento de carbono nos solos.

MADURA

Natural + Tecnológica

Biocarvão Conversão de biomassa em carvão resistente à decomposição.

DEMONSTRATIVA

Bioenergia mais captura e armazenamento de carbono Geração de energia a partir de biomassa e armazenamento das emissões de CO

2

resultantes em reservatórios geológicos.

DEMONSTRATIVA

Tecnológica

Captura direta do ar Uso de produtos químicos para absorver CO

2 da atmosfera.

DEMONSTRATIVA

Aceleração do intemperismo Trituração de rochas que absorvem CO

2

naturalmente e dispersão desse produto na terra ou no oceano.

EXPERIMENTAL

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Recomendações

Para enfrentar o desafio das mudanças do clima, é preciso alcançar um equilíbrio entre as fontes e os sumidouros de GEE, o que exigirá a adoção de medidas para reduzir as emissões desses gases e aumentar sua remoção – atentando para o segundo componente dessa equação, que não recebeu a mesma atenção. Nesse sentido, governos, empresas e apoiadores devem:

• Implantar o quanto antes, e na maior extensão possível, soluções naturais plenamente desenvolvidas. Os sumidouros biológicos naturais oferecem a melhor combinação de benefícios para o clima ao menor custo hoje – mas a vegetação precisa de tempo para alcançar seu pleno potencial de sequestro.

• Paralelamente a isso, investir em pesquisa, desenvolvimento e demonstração de opções tecnológicas de CDR, para viabilizar sua adoção até meados do século – as novas tecnologias também precisam de tempo para atingir uma boa relação custo-benefício e escalas comerciais.

• Concentrar-se nas florestas e na terra como uma solução de curto prazo para estimular a ação internacional e gerar objetivos climáticos mais ambiciosos no curto prazo.

Figura ES-2: Cronograma de implantação das soluções naturais e tecnológicas de CDR

Descarbonização

CDR natural: Implantação

CDR tecnológica: Pesquisa e demonstração

CDR tecnológica: Implantação

Curto prazo Até 2030

Médio prazo Meados do

século

Longo prazo Fim do século

Reflorestamento e florestamento Manejo florestal melhorado SOCS

Biocarvão BECCS DAC EW

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I. Introdução No Acordo de Paris de 2015, os países se comprometeram a limitar o aumento da temperatura a bem abaixo de 2 ºC (o que se busca é chegar a 1,5 ºC) e atingir um equilíbrio entre o que é emitido pelas fontes e o que é absorvido pelos sumidouros na segunda metade do século, para limitar os impactos da mudança do clima. É cada vez mais aceito pelos cientistas e especialistas que. para alcançar essas metas, os países precisarão ser proativos na implantação de soluções em escala planetária para remover o dióxido de carbono (CO2) e outros gases de efeito estufa (GEE) da atmosfera. Essa conclusão é corroborada em grande medida pelos modelos climáticos globais. Com efeito, de acordo com as publicações mais séries sobre ação climática, 90% de todas as projeções de emissões em que a temperatura global se manteve abaixo dos 2 ºC lançam mão de alguma tecnologia de remoção de dióxido de carbono (CDR) – e nenhuma conseguiu atingir a meta de 1,5 ºC sem CDR.3

Isso posto, incentivar a implantação da CDR em larga escala deve obrigatoriamente estar pauta de todas as agendas de ação climática internacionais e estratégias nacionais de emissões de longo prazo verdadeiramente visionárias, paralelamente a um rápido e contínuo processo de descarbonização. Este relatório é uma tentativa de trazer a CDR para o centro do planejamento vigente sobre o clima por meio da identificação de soluções poderosas já disponíveis e que oferecem uma boa relação custo-benefício.

Por que a CDR? A CDR – às vezes referida como tecnologias de emissões negativas (NETs, de negative emissions technologies) – compreende métodos naturais e tecnológicos de captura e armazenamento ou uso de CO2.4 Nas abordagens naturais, o CO2 atmosférico é absorvido por meio da fotossíntese e armazenado na biomassa acima do solo, e também nas raízes e no próprio solo. Entre essas abordagens podemos citar o plantio de novas florestas, além da melhoria da capacidade das plantas e dos solos para absorver carbono. Na sua grande maioria, as abordagens naturais são práticas bem dominadas – os seres humanos plantam árvores há milhares de anos – e que apresentam uma boa relação custo-benefício em muitas regiões do mundo.

Nas abordagens tecnológicas, por outro lado, são adotados métodos artificiais de remoção de CO2 de fontes pontuais, como usinas de energia e instalações industriais, bem como da atmosfera. Esses métodos incluem tecnologias já testadas em projetos piloto, como a bioenergia a partir da captura e armazenamento de carbono (BECCS, na sigla em inglês, definida no Quadro 1), e abordagens ainda muito recentes, como a captura direta do ar e a aceleração do intemperismo. Em geral, embora as opções tecnológicas de CDR tenham o potencial de capturar grandes quantidades de CO2, importantes barreiras, inclusive custos proibitivamente altos, continuam a dificultar sua aplicação em larga escala na atualidade. As opções de CDR consideradas neste relatório estão definidas na Tabela 1, abaixo.

3 Banco de dados de cenários do IIASA AR5; todos os cenários correspondem à categoria climática 1. 4 Embora algumas metodologias capturem gases que não o CO2, a maioria tem como alvo o CO2. É por isso que “CDR” é usado como uma sigla para todas as soluções que resultam em emissões negativas líquidas. Usaremos essa sigla ao longo deste artigo.

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Quadro 1. O que significa bioenergia a partir da captura e armazenamento de carbono (BECCS, do inglês “Bio-Energy with Carbon Capture and Storage”)?

É importante entender que a solução BECCS representa um sistema que combina três atividades, naturais e tecnológicas:

1. B = armazenamento de carbono na biomassa por meio da fotossíntese natural. 2. E = conversão dessa biomassa, por meio de combustão, em energia. 3. CCS = captura e armazenamento de carbono das emissões do processo de combustão.

A CDR ocorre apenas no componente natural deste sistema – o crescimento da biomassa –, enquanto o componente de captura e armazenamento de carbono representa apenas a parcela do carbono armazenado que deixou de ser emitida com a conversão para energia.

A tecnologia de captura e armazenamento de carbono também pode ser aplicada em sistemas de energia a base de combustíveis fósseis (usinas térmicas). A eficácia da BECCS depende de que a bioenergia seja usada como substituto das energias de origem fóssil, e não como uma fonte de energia a mais.

Embora a comunidade internacional provavelmente tenha que adotar todas as ferramentas à sua disposição para atender às ambiciosas metas do Acordo de Paris até 2100, os formuladores de políticas não dispõem de recursos infinitos e terão de tomar decisões cruciais em relação às opções de mitigação climática a serem implantadas entre o curto e médio prazo. Essas decisões buscar garantir a implantação das opções de CDR já disponíveis e com boa relação custo-benefício o mais cedo possível e em toda sua extensão, enquanto as metodologias em escala de laboratório e teóricas continuam sendo pesquisadas e desenvolvidas.

O objetivo deste artigo é trazer a remoção de dióxido de carbono em larga escala para o centro do debate sobre o clima, identificando soluções poderosas já disponíveis e que apresentam uma boa relação custo-benefício para serem implantadas no curto prazo. Para isso, o artigo: 1) estrutura as variadas abordagens de CDR em termos de custo, potencial de mitigação, intensidade de recursos e cobenefícios da solução, oferecendo aos formuladores de políticas uma maneira de comparar e programar sua implantação; 2) compara as vantagens relativas das opções naturais e tecnológicas de sequestro de carbono; e 3) traz recomendações sobre como incorporar efetivamente a CDR no planejamento climático nacional de longo prazo e na diplomacia climática internacional.

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Tabela 1. Abordagens de remoção de dióxido de carbono

REMOÇÃO DE DIÓXIDO DE CARBONO (CDR):

Soluções naturais e artificiais de remoção do dióxido de carbono da atmosfera

NATURAL: Uso da fotossíntese para capturar o CO2.

Florestamento/Reflorestamento Consiste no plantio de árvores em áreas onde não há

espécies arbóreas ou onde deixaram de existir há décadas. As árvores capturam CO

2 e o armazenam na biomassa viva.

Manejo florestal melhorado

Práticas de manejo que aumentam a taxa de captura e o volume de CO

2 armazenado nas florestas, inclusive exploração

madeireira de impacto reduzido, ampliação do plantio pós-colheita e melhoria da regeneração pós-queimadas.

Sequestro de carbono orgânico do solo

Melhoria do armazenamento de carbono nos solos por meio de técnicas como plantio direto e rotação de culturas e da adoção de melhores práticas no manejo das pastagens.

NATURAL + TECNOLÓGICA

Biocarvão Conversão de biomassa em carvão resistente à

decomposição. O biocarvão adicionado aos solos é capaz de armazenar carbono durante milhares de anos.

Bioenergia mais captura e armazenamento de carbono (BECCS)

Consiste na geração de energia a partir de biomassa e no armazenamento das emissões de CO

2 resultantes em

formações rochosas geológicas.

TECNOLÓGICA: Uso de tecnologias, produtos químicos ou outros processos na captura do CO2.

Captura direta do ar Consiste no uso de produtos químicos para absorver o CO

2 da

atmosfera. O carbono é depois armazenado em reservatórios ou mineralizado em uma formação sólida.

Aceleração do intemperismo

Consiste em triturar rochas que naturalmente absorvem CO2 e

aplicar esses fragmentos na terra ou no oceano. Dessa forma, consegue-se aumentar sua área de superfície e, assim, aumentar a taxa de absorção do CO

2.

Chamada também de mineralização do CO2 ou carbonatação

mineral.

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ii. CDR natural e tecnológica: Principais fatores para comparação Nos próximos anos, os formuladores de políticas terão que lidar com as implicações para suas trajetórias de emissões nacionais das metas climáticas de longo prazo adotadas em Paris. Essa situação se tornará urgentíssima com a divulgação, em 2018, do relatório do Painel Intergovernamental sobre Mudança do Clima (IPCC) sobre as implicações de um mundo 1,5 ºC mais quente, à medida que nos aproximamos do primeiro período de atualização das Contribuições Nacionalmente Determinadas (CNDs) ou metas nacionais para 2020, e à medida que a comunidade internacional faz um balanço do impacto da sua atuação coletiva, em 2019. Cada vez mais, os países terão que avaliar as opções de mitigação da mudança do clima que reduzem as emissões na multiplicidade de fontes e, ao mesmo tempo, aumentam a remoção de CO2 e outros GEE da atmosfera.

Embora se fale com frequência das soluções de redução de emissões – particularmente sobre o desempenho das opções de sequestro natural em comparação às abordagens tecnológicas, em relação a uma série de critérios –, as soluções de CDR só começaram a atrair ampla atenção recentemente, e os formuladores de políticas ainda têm dificuldade para avaliá-las como um todo. Muitos fatores explicam o porquê disso. Em primeiro lugar, muitos observadores acreditam ser possível reduzir as emissões globais num curto espaço de tempo com as tecnologias existentes, e que isso bastaria para colocar o mundo na trajetória de menos de 2 ºC. Em essência, consideram a CDR, sobretudo a CDR tecnológica, uma opção desnecessária, além de um desperdício de recursos. Além disso, embora algumas soluções de CDR apresentem boa relação custo-benefício, os formuladores de políticas e seus apoiadores continuam a considerar a CDR uma linha de ação climática cara e não comprovada que continuará, em grande medida, fora do seu alcance no futuro próximo. Por fim, devido à grande escala das intervenções necessárias, muitos ambientalistas temem que a remoção de dióxido de carbono tenha consequências incalculáveis para o meio ambiente global. Esse último ponto muitas vezes remete à geoengenharia, um conceito bem mais amplo que vai muito além da remoção de carbono. Falaremos sobre a geoengenharia no Quadro 2.

No intuito de ajudar os formuladores de políticas a pensar onde podem encaixar as diferentes abordagens de CDR nas estratégias de mitigação climática de curto e longo prazos, fizemos uma revisão detalhada das opções de CDR predominantes. Nesta seção, comparamos a CDR natural à CDR tecnológica de acordo com as seguintes dimensões:5

1. Prontidão: Refere-se à atual viabilidade e disponibilidade da metodologia, da fase teórica até a comercialização em escala, passando pelas fases piloto e demonstrativa.

2. Potencial de mitigação: O potencial anual de remoção de emissões, diferenciando entre o potencial teórico/técnico e o potencial econômico.

3. Custo: O custo da tonelada métrica (t) de CO2 equivalente de cada método, considerando como poderá variar no futuro.

4. Intensidade de recursos: Refere-se aos recursos terrestres, hídricos e energéticos necessários para implantar o método.

5. Cobenefícios: Conjunto de benefícios não climáticos oferecidos pela metodologia.

6. Outros: Questões como prazos, perda de armazenamento (o risco de reversão ou não permanência do benefício) e percepção pública.

5 Como várias metodologias representam tecnologias incipientes, há relativamente poucos dados sobre seu custo e possível impacto, e os disponíveis apresentam elevado grau de incerteza. Na análise das soluções de CDR, comentamos questões como disponibilidade de dados e comparabilidade, quando relevantes.

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A finalidade desta análise é trazer a CDR para o centro do debate sobre o clima, identificando soluções poderosas já disponíveis e que oferecem uma boa relação custo-benefício para serem implantadas hoje. Muitas delas não existem só na teoria ou no papel, como pensavam os detratores da CDR no passado, mas constituem opções palpáveis cuja implantação já dominamos. Deixar de fazer isso no curto prazo poderia significar deixar passar uma enorme oportunidade de mitigação climática.

Quadro 2. Geoengenharia

A geoengenharia é a modificação em grande escala de processos ambientais que afetam o clima da Terra com o intuito de mitigar os efeitos da mudança do clima. Apesar de incluir algo de CDR nas suas estratégias, a geoengenharia engloba estratégias mais amplas para modificar o clima, como o manejo da radiação solar, que podem ser aproveitadas para compensar alguns dos efeitos do aumento das emissões de GEE. A geoengenharia em larga escala é altamente controversa uma vez que não são conhecidos os efeitos secundários e de longo prazo de intervenções deliberadas na atmosfera e nos ecossistemas. Além disso, muitas abordagens (como a injeção de aerossóis de sulfato na estratosfera inferior para emular o efeito de erupções vulcânicas ou a instalação de escudos no espaço para desviar da Terra a energia solar) ainda não passam de teoria.

Das várias abordagens de CDR teóricas e em fase piloto que examinamos, não incluímos aquelas muitas vezes definidas como geoengenharia. Uma dessas estratégias é a fertilização oceânica (também conhecida como fertilização com ferro ou semeadura oceânica), que é o processo de introdução de ferro na camada superior do oceano com o propósito de estimular o crescimento do fitoplâncton que absorve o CO2. A fertilização oceânica costuma se enquadrar na concepção popular de geoengenharia porque o cultivo de organismos nessa escala pode ter um impacto ainda desconhecido nos ecossistemas oceânicos.

A. A natureza em ação: abordagens de CDR Natural As soluções naturais são algumas das opções de remoção de carbono mais testadas e de eficácia comprovada. Combinadas, oferecem enorme potencial de sequestro de carbono (cerca de 12 GtCO2 no extremos inferior das faixas disponíveis), necessitando apenas de quantidades modestas de insumos terrestres, hídricos e energéticos em comparação com as soluções tecnológicas (ver Tabela 2). A seguir discutiremos várias das soluções naturais mais promissoras.

Reflorestamento e florestamento

Florestamento e reflorestamento são hoje o método mais difundido de remoção de CO2 da atmosfera. Florestamento refere-se ao plantio de florestas em terras que historicamente nunca as abrigaram, e reflorestamento refere-se ao plantio de florestas em terras que abrigaram florestas no passado, mas que foram convertidas para outros usos. (Para simplificar, no presente documento nos

referiremos a ambos os métodos como “florestamento”.)

Prontidão: O florestamento é a metodologia de CDR mais consolidada e disponível hoje. A humanidade vem plantando árvores há séculos para fins de habitação, combustível, controle de erosão e outros. O Desafio de Bonn, um esforço global que tem como objetivo restaurar pelo menos 150 milhões de hectares de florestas até 2020 e 350 milhões de hectares até 2030, é um exemplo do impulso político que o florestamento ganhou nos dias atuais. Até o momento, 47 países se comprometeram a restaurar 160,2 milhões de hectares como parte do desafio. Os benefícios do florestamento em termos de mitigação

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foram reconhecidos pelo Protocolo de Quioto (o Mecanismo de Desenvolvimento Limpo contempla essa solução) e pelo Acordo de Paris (inclusive no Artigo 5, no âmbito da Redução de Emissões do Desmatamento e Degradação Florestal e aumento dos estoques de carbono florestal, ou REDD+).

Potencial de mitigação: O florestamento é um método em grande medida subutilizado, haja vista seu potencial biológico e sua ampla disponibilidade. Na verdade, mais de dois bilhões de hectares de terras de todo o mundo são adequados para restauração (inclusive com a adoção do florestamento, entre outras atividades de restauração do solo), uma área maior que a América do Sul.6 Estima-se que o potencial não aproveitado de sequestro do florestamento varia de 1,3 a 17,9 GtCO2/ano em nível mundial.7 Essa grande diferença nas estimativas pode ser explicada pelos diferentes pressupostos adotados pelos autores nos seus modelos no tocante a, entre outros, restrições que afetam a disponibilidade de terras, incertezas sobre essa disponibilidade presentes nos pressupostos, incertezas nas taxas de sequestro por hectare, extensão da gama de métodos de florestamento (de práticas consorciadas de agricultura e silvicultura até a regeneração natural e manejo intensivo de plantações) e preços máximos do carbono.

Custo: O custo do florestamento depende de fatores como área plantada, espécies de árvores usadas e condições do local de plantio. As estimativas de custos publicadas na literatura vão de cerca de US$ 7,5 até US$ 29,4 por tonelada de CO2 removido.8 O florestamento normalmente envolve um baixo custo inicial e poucos investimentos de capital. Talvez mais do que em outras abordagens de CDR, há uma estreita correlação entre o potencial de mitigação do florestamento e o seu custo estimado – a elevação do preço do carbono viabiliza economicamente o plantio de árvores em áreas marginais e/ou que teriam sido destinadas a outros usos.9

Demanda de recursos: O florestamento apresenta uma demanda de recursos relativamente baixa em comparação com outras estratégias de CDR. A terra é seu principal recurso, e quanto dela será necessário depende do potencial econômico e biofísico da área e dos objetivos, por exemplo, reflorestar todas as áreas degradadas ou atingir determinada meta de mitigação. O florestamento é uma opção dentro de um conjunto complexo e interligado de soluções climáticas e de uso do solo, mas pode competir pelo recurso terra com a agricultura, o desenvolvimento urbano e outros usos dos recursos naturais. Ademais, embora possa ajudar a atender à demanda crescente por energia de biomassa lenhosa, o florestamento em grande escala pode acabar competindo, ao mesmo tempo, com culturas destinadas à geração de bioenergia (como cânhamo, switchgrass ou o pinhão-manso).

Dependendo do tipo de árvores plantadas, da qualidade do solo e da zona biogeoclimática, uma floresta madura é capaz de armazenar de 165 a 785 tCO2/ha.10 Para contextualizar esses números, a remoção de 1,0 Gt de CO2 demandaria o plantio de algo entre 1,3 a 6,0 milhões de hectares de terra, sendo este último número equivalente ao território da Costa Rica. As árvores precisam de água para crescer e os grandes projetos de florestamento podem interagir de formas complexas com as temperaturas locais e a disponibilidade hídrica. Por exemplo, podem alimentar ou esgotar os lençóis freáticos locais, a depender das espécies de árvores plantadas, e ao mesmo tempo afetar o clima local e regional, diminuindo as temperaturas e os extremos térmicos e promovendo a precipitação no local, em ambos os casos contribuindo para a disponibilidade de água.

6 Bonn Challenge, “What is our global restoration opportunity?” http://www.bonnchallenge.org/what-our-global-restoration-opportunity 7 Smith e Torn 2013, van Vuuren 2013, IPCC AR4 2007, IPCC AR5 2014, Smith et al 2016, Griscom et al 2017 8 Stavins e Richards 2005, IPCC AR5 2014, Smith et al 2016 9 Para manter a comparabilidade do potencial de mitigação e estimativas de custo das NETs naturais em comparação com as tecnológicas, as Tabelas ES-1 e 2 adotam estimativas de potencial técnico para mitigação e estimativas de custos no nível micro, quando disponíveis. 10 Calculado a partir de https://link.springer.com/article/10.1007%2Fs11027-012-9417-z

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O florestamento requer um mínimo de insumos energéticos, associados aos viveiros de mudas, à preparação do terreno, ao transporte de pessoas e materiais para os locais de plantio e ao uso de fertilizantes, quando são aplicados.

Cobenefícios: O florestamento oferece cobenefícios ambientais e socioeconômicos expressivos. Aumentar a área florestada pode ampliar o habitat da fauna/flora silvestre e a biodiversidade, melhorar a quantidade e a qualidade da água, possibilitar o controle da erosão e gerar microclimas mais amenos e úmidos, que são mais propícios para a agricultura. Nas áreas urbanas, o sombreamento e a retenção de água proporcionados pelas árvores podem reduzir os custos com energia e manejo dos recursos hídricos. Ainda, um maior acesso a produtos florestais madeireiros e não-madeireiros pode contribuir para a saúde e a subsistência da população.

Outras questões: Como acontece com quase todas as soluções de mitigação do clima, se a atividade não estiver inserida em um processo de transformação setorial voltado para um novo “cenário tendencial” favorável ao clima, o impacto da mitigação corre o risco inerente de não ser duradouro. No caso do florestamento, isso significa que o CO2 capturado e armazenado na biomassa lenhosa pode acabar sendo emitido novamente para a atmosfera, se a nova floresta for derrubada e suas terras forem convertidas para outros usos. Existe também o risco de o florestamento deslocar para outras áreas as atividades de uso da terra, o que pode resultar na derrubada de florestas existentes.

Manejo florestal melhorado

Aperfeiçoar o manejo de uma floresta existente e migrar para o armazenamento de longo prazo pode incrementar a capacidade de captura de CO2 das florestas sob manejo. As práticas avançadas de manejo florestal incluem a extração madeireira de impacto reduzido, a intensificação do plantio pós-colheita e a aceleração da regeneração pós-queimada.

Prontidão: Assim como o florestamento, o manejo florestal melhorado é uma metodologia madura de CDR. Na verdade, muitas das atividades propostas já vêm sendo realizadas pelos responsáveis por unidades de manejo florestal de todo o mundo todos os dias, com o uso de tecnologias e know-how há muito disponíveis. O manejo florestal melhorado pode ser adotado rapidamente e com baixos custos de implantação.

Potencial de mitigação: O potencial de mitigação do manejo florestal melhorado é considerável se comparado com outras opções naturais de CDR, inclusive o florestamento. Uma revisão da bibliografia recente estimou potenciais técnicos de mitigação de 1,1 a 9,2 GtCO2 em 2030, divididos de forma mais ou menos igual entre as zonas temperada/boreal e tropical/subtropical.11

Custo: Apesar da indisponibilidade de estimativas de custos agregados no nível micro para o aperfeiçoamento de técnicas de manejo florestal, os preços do carbono associados à faixa de mitigação acima são reveladores. Cerca de 60% do potencial técnico poderia ser concretizado (até a faixa de 5,5 a 5,8 GtCO2) a um custo de carbono de até US$ 100/t; cerca de metade disso (até cerca de 2,5 Gt) poderia ser alcançado a um custo abaixo de US$ 10/t.12

11 Griscom et al 2017, Suplemento on-line, Tabela S1, incluindo o manejo florestal natural e a melhoria de plantações, mas excluindo emissões reduzidas com o manejo de queimadas e coleta de lenha evitada. 12 Griscom et al 2017, Suplemento on-line, Tabela S4

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Demanda de recursos: Os requisitos das técnicas melhoradas de manejo florestal em relação aos recursos necessários variam conforme o tipo de atividade. No entanto, pode-se dizer que o consumo de energia e água seria semelhante ao da exploração madeireira convencional. Não há requisitos adicionais de terras para o manejo florestal melhorado porque, por definição, se trata de um conjunto de atividades realizadas em terras onde já se produz madeira.

Cobenefícios: O manejo florestal melhorado tem vários cobenefícios, inclusive em termos de preservação de ecossistemas e de biodiversidade. Atividades individuais também contribuem para a adaptação e o desenvolvimento sustentável.13 A biomassa residual pode contribuir com 12 a 74 EJ/ano para o consumo de energia.14

Outro: Tal como acontece com outras atividades de mitigação terrestres, os benefícios efetivos da mitigação estão sujeitos à variabilidade climática e meteorológica interanual, que tem efeitos nas taxas de crescimento, nas perturbações naturais e nos riscos de não permanência associados.

Sequestro de carbono orgânico do solo (SOCS)

O sequestro de carbono orgânico do solo (SOCS, na sigla em inglês) é o processo de melhoramento da capacidade dos solos de armazenar CO2. O carbono é armazenado principalmente na matéria orgânica do solo, que é formada pela decomposição dos tecidos de plantas e de animais e dos micróbios e carbono associados aos minerais do solo. Assim como no

florestamento, diversas atividades podem dinamizar o SOCS, inclusive plantio direto na palhada, rotação de culturas, cultivo de espécies de cobertura e um melhor manejo das pastagens.

Prontidão: O SOCS é uma estratégia de mitigação madura. Um sólido corpo de evidências científicas corrobora seu potencial de mitigação e já foram desenvolvidas técnicas para potencializar o SOCS. Essas técnicas já podem ser adotadas na agricultura para que os resultados comecem a aparecer.

Potencial de mitigação: Como o SOCS é viável em qualquer lugar com atividade agrícola, seu potencial de mitigação é significativo. Segundo estimativas, melhorar o armazenamento de carbono no solo em nível global pode remover aproximadamente de 6,8 a 12,6 Gt CO2/ano, a depender do tipo de solo e do ecossistema.15

Custo: Como o SOCS pode ser conseguido por meio de um vasto leque de técnicas, é difícil chegar a uma estimativa de custos para essa metodologia. Um estudo levantou a hipótese de que 1,5 GtCO2 poderia ser removido a um preço de US$ 20/tonelada, e que o sequestro de quantidades maiores aumentaria o custo para US$ 100/tonelada ou mais.16 Outro estudo foi mais generoso, sugerindo um custo médio de cerca de US$ 17/tonelada em escala global (com o sequestro de cerca de 13 GtCO2 por ano) para os diferentes tipos de intervenção.17

13 Nabuurs, G.J. et al em: Forestry. In Climate Change 2007: Mitigation. Contribution of Working Group III to the Fourth Assessment Report of the Intergovernmental Panel on Climate https://www.ipcc.ch/pdf/assessment-report/ar4/wg3/ar4-wg3-chapter9.pdf 14 Ibid. 15 Lal 2018, Frank et al 2017, Paustian 2016 16 Chan K Y, A Cowie, G Kelly, Bhupinderpal Singh, P Slavich, 2008: Scoping Paper: Soil Organic Carbon Sequestration Potential for Agriculture in NSW, NSW DPI Science & Research Technical. http://citeseerx.ist.psu.edu/viewdoc/download?doi=10.1.1.513.1014&rep=rep1&type=pdf 17 Calculado com base na Tabela E3, WRI no sequestro de carbono nos solos agrícolas http://documents.worldbank.org/curated/en/751961468336701332/pdf/673950REVISED000CarbonSeq0Web0final.pdf

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Demanda de recursos: Como o SOCS é uma atividade adicional, seu custo de oportunidade é baixo ou inexistente. As terras com lavouras podem ser usadas para capturar carbono adicional por meio de práticas conservacionistas ou da agricultura regenerativa, com o qual suas necessidades adicionais de água e energia são insignificantes.

Cobenefícios: O SOCS traz muitos cobenefícios, em particular para a segurança alimentar. As atividades que aumentam o SOCS também recuperam as terras degradadas, e assim podem ajudar a aumentar a área de terra capaz de viabilizar a produção agrícola sustentável no longo prazo. Da mesma forma, as intervenções à base de SOCS também podem ajudar a formar meios de subsistência resilientes para os agricultores.

Outras questões: Embora as intervenções do SOCS sejam incrivelmente promissoras, questões como permanência (duração limitada do sumidouro de carbono), vazamento (o aumento do carbono nos estoques do solo pode acarretar decréscimos em outros lugares) e adicionalidade (a mitigação com o uso da terra, para além da agricultura tradicional) podem dificultar sua implantação em larga escala. Alguns agricultores também desconfiam que as atividades de SOCS não atingirão a alta produtividade das atuais práticas de monoculturas anuais.

B. Incorporação da engenharia: abordagens de CDR natural Ao contrário das abordagens de CDR natural, as abordagens de CDR tecnológicas não estão tão desenvolvidas e continuam em pequena escala. Embora a implantação em escala comercial tenha o potencial de remover grandes quantidades de dióxido de carbono – cerca de 10 GtCO2 no limite inferior da faixa disponível –, essas tecnologias incipientes precisarão superar barreiras consideráveis, inclusive custos elevados e outras restrições de recursos (ver a Figura 3) para conseguir atingir seu pleno potencial. Os sistemas de captura e armazenamento de carbono (CCS, na sigla em inglês) que utilizam as emissões de GEE provenientes da queima de combustíveis fósseis (para a produção de energia), comprimem o gás e o transferem para os reservatórios geológicos que operam atualmente em escala industrial. Esses sistemas envolvem a remoção do CO2 do ar nos dutos ou nas chaminés das indústrias, evitando assim a emissão de determinadas quantidades de CO2. No entanto, o foco do presente artigo está na avaliação de abordagens e sistemas de CDR que resultem em emissões negativas (ou remoções líquidas). As soluções tecnológicas mais promissoras são analisadas de forma aprofundada a seguir.

Biocarvão

O biocarvão é a biomassa convertida em carvão resistente à decomposição. É criado quando a biomassa é aquecida com pouco ou nenhum oxigênio com a finalidade de retirar os gases voláteis e só deixar o carbono, por meio do processo denominado pirólise. Adicionado aos solos, o biocarvão é capaz de sequestrar carbono durante milhares de anos.

Prontidão: Embora a técnica básica remonte aos amazônidas pré-colombianos, que a empregavam para melhorar a produtividade do solo, a pesquisa científica sobre seu potencial de mitigação climática é relativamente recente. A produção de biocarvão comercial atualmente se encontra em escala demonstrativa, com projetos piloto nos Estados Unidos, Vietnã, Malásia, Uganda e Peru.18

18 Iniciativa Internacional de Biocarvão, Biocarvão nos Países em Desenvolvimento, 2014: http://www.biochar-international.org/developingeconomies

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Figura 1: Processo de criação de biocarvão

Fonte: www.biochar-international.org/technology, cortesia de Johannes Lehmann

Potencial de mitigação: O potencial de mitigação do biocarvão depende do tipo de matéria-prima, da temperatura usada na pirólise, da fertilidade do solo modificado e do tipo de combustível que se busca compensar. Por exemplo, a matéria-prima cultivada explicitamente para a produção de biocarvão (a espécie Panicum virgatum, ou switchgrass em inglês) teria um potencial de mitigação menor do que os resíduos agrícolas sem destinação específica (p. ex., esterco, palha de arroz e a casca lenhosa de certos frutos). O potencial máximo de mitigação biológica é de 6,6 GtCO2e/ano. Contudo, seu potencial econômico é de pouco mais da metade (3,7 GtCO2eq/ano) devido à demanda concomitante por biomassa não residual.19

Custo: O custo do biocarvão varia de acordo com os insumos usados na produção (matéria-prima) e o tipo de pirólise adotado; por ser uma tecnologia relativamente nova, seu custo é altamente incerto. As estimativas de custos encontradas na bibliografia variam de US$ 35 a US$ 300/tCO2, e levam em conta os efeitos da receita adicional proveniente da cogeração de energia. Os custos de produção do biocarvão incluem a coleta da matéria-prima, o processo de pirólise e o transporte e manuseio para aplicação no solo.

Demanda de recursos: A demanda de recursos do biocarvão é variável e ainda não foi bem pesquisada. É altamente dependente do tipo de insumos e do tipo de sistema de produção adotado. O cultivo da matéria-prima demanda terra e água; entretanto, se forem usados apenas subprodutos de outros processos agrícolas, a necessidade de terra se torna irrelevante. As usinas de produção de biocarvão podem ser pequenas e não requerem grandes extensões de terra.

Cobenefícios: O biocarvão é capaz de aumentar o rendimento das culturas e os subprodutos do seu processo de produção (gás de síntese e bio-óleo) podem ser empregados na geração de energia. O biocarvão melhora os solos ao reduzir a lixiviação de nitrogênio nas águas subterrâneas, melhorar a fertilidade do solo, moderar a acidez do solo e aumentar a retenção de água e a microfauna benéfica presente no solo. Ao recuperar a produtividade dos solos degradados e pouco férteis, o biocarvão pode contribuir para garantir os meios de subsistência dos agricultores mais pobres do mundo.

Outras questões: Ainda que o biocarvão tenha um potencial de mitigação do clima promissor, sua implantação esbarra na aquisição de matérias-primas sustentáveis e nos usos concorrentes da biomassa.

19 Woolf et al 2010 em IPCC AR5

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Além disso, se o cultivo da matéria-prima utilizada no biocarvão passar a ocupar terras com valor de carbono mais elevado, como as florestas, a produção de biocarvão poderá na verdade ter um impacto negativo na mitigação climática.

Bioenergia com captura e armazenamento de carbono (BECCS)

A bioenergia com captura e armazenamento de carbono, comumente conhecida pela sigla inglesa BECCS, é uma das soluções de CDR mais abordadas na bibliografia recente. O principal aspecto da BECCS é que ela começa com a

captura e armazenamento de CO2 em árvores, gramíneas e outras biomassas. Essa biomassa, que é queimada para gerar energia, pode provir de plantações exclusivas para a geração de bioenergia, ou ser um subproduto da colheita e do processamento para outros usos. O sistema de CCS de uma usina de BECCS captura as emissões de CO2 produzidas quando a biomassa é queimada. O CO2 em seguida é comprimido e injetado em reservatórios geológicos ou de outros tipos para armazenamento no longo prazo.

O processo de captura e armazenamento de emissões resultantes da geração de energia, a CCS, pode ser combinado com qualquer fonte de combustível intensiva em CO2 para zerar a produção de emissões líquidas. Entretanto, o que torna a BECCS única é que o uso de biomassa para gerar energia permite que mais biomassa seja produzida no seu lugar, removendo ainda mais CO2 da atmosfera. Dessa forma, e diferentemente da combinação de carvão e CCS ou de gás natural e CCS, a BECCS é na verdade uma tecnologia com emissões líquidas negativas: trata-se da remoção de CO2 da atmosfera (na forma de matéria vegetal) e sua transferência para o armazenamento no longo prazo (por meio da CCS), com a geração de energia ao longo do processo. Esse raro trinômio – captura de CO2 atmosférico, armazenamento subterrâneo e geração (em vez de consumo) de energia durante esse processo – fez da BECCS “válvula de segurança” muito atrativa para os modeladores climáticos, quando solicitados a gerar cenários que correspondam às metas de 1,5 ou 2 ºC. Mas a maioria dos modeladores aceita que a presença da BECCS nos seus modelos é tanto um sucedâneo para soluções tecnológicas desconhecidas ou ainda não desenvolvidas como também uma previsão de que a própria BECCS é uma trajetória de mitigação realista.

Prontidão: Embora a tecnologia BECCS ainda não tenha sido implantada em escala, das metodologias de CDR tecnológica é a mais desenvolvida. Atualmente, encontram-se em funcionamento seis projetos – quatro nos Estados Unidos, um no Reino Unido e um no Japão – e outros seis estão previstos.20 Se todos os projetos previstos entrarem em operação conforme planejado, as usinas de BECCS de todo o mundo removerão cerca de seis milhões de toneladas de CO2 da atmosfera por ano. Todavia, essa é apenas uma fração do seu potencial estimado em nível global, e menos de 1,5% da CDR obtida por meio do florestamento só na China em 2005.21

Potencial de mitigação: De acordo com as estimativas de uma amostra de pesquisas publicadas (ver Figura 2 abaixo), a BECCS tem um potencial técnico de mitigação de 10 a 20 GtCO2/ano, até meados do século, a depender do tipo de biomassa e do método de combustão empregado. No entanto, esse potencial provavelmente não seja realista, se levarmos em consideração tanto as restrições de custo

20 Kemper, Jasmin, “Biomass with carbon capture and storage (BECCS/Bio-CCS)”, 2017: http://ieaghg.org/docs/General_Docs/IEAGHG_Presentations/2017-03-10_Bioenergy_lecture_2_Read-Only.pdf 21 Comunicação Nacional da China à CQNUMC, 2012: https://unfccc.int/documents/71515

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como as demandas conflitantes por recursos como terra e água. Seu potencial econômico pode ser muito menor, podendo chegar a um terço do potencial técnico.22

Figura 2: Potencial da BECCS global

Nota: Muitos estudos não indicam se a faixa de mitigação que oferecem reflete o potencial técnico ou econômico. O valor mínimo é explicitamente o potencial econômico em Koornneef (2011) e McLaren (2012).

Custo: As estimativas de custo da BECCS apresentam grande variação, indo de US$ 50 a US$ 250 por tonelada de CO2. Tal como acontece com muitas das tecnologias recém-criadas, esses custos devem cair com o tempo. Contudo, a BECCS se diferencia das demais estratégias em que a trajetória decrescente dos preços, comum entre as tecnologias recém-implantadas, afeta diretamente o aumento dos preços que costuma caracterizar as intervenções que envolvem recursos limitados. Isso significa que, nos níveis superiores de penetração da BECCS, a escassez de terra e de recursos hídricos produzirá o efeito contrário de elevar os preços.

Intensidade de recursos: . Como a BECCS pode utilizar uma ampla variedade de tipos de biomassa, suas necessidades em termos de terra dependerão predominantemente de fatores como a proporção de bioenergia derivada dos resíduos e refugos e a extensão de terras não produtivas em determinado momento que poderá ser usada para cultivo de biomassa. Em geral, os estudos mostram que a intensidade de uso da terra da BECCS é bastante elevada, variando possivelmente de 0,03 a 0,1 hectare por tonelada de CO2-equivalente (ha/tCO2e), no caso de culturas voltadas especificamente para a produção de bioenergia, a 0,3 a 0,5 ha/tCO2e, com o uso de resíduos florestais.23 Posto de outra forma, remover apenas 3Gt de CO2e por ano utilizando culturas com um uso menos intensivo da terra pode demandar cerca de 90 milhões de hectares de terra, o equivalente a mais de um quarto da Amazônia brasileira. A intensidade do uso da terra na bioenergia com CCS provavelmente seria menor do que sem CCS devido à necessidade de as usinas de bioenergia estarem instaladas bem próximas de reservatórios de CCS adequados, e onde haja disponibilidade de matéria-prima dentro dos limites econômicos, em função dos custos de transporte. As políticas que estimularam a demanda por bioenergia são polêmicas, uma vez que podem acarretar mais desmatamento e o aumento do preço dos alimentos por conta da concorrência pelo uso da terra.

22 Ibis. 23 Smith, Pete et al., “Biophysical and economic limits to negative CO2 emissions” http://aura.abdn.ac.uk/bitstream/handle/2164/7937/7955_2_merged_1445366890_1_.pdf?sequence=1

0

5

10

15

20

25

IPCC(2005)

Azar(2010)

Woolf(2010)

Koornneef(2012)

McLaren(2012)

vanVuuren(2013)

Kriegler(2013)

Tavoni &Socolow(2013)

Caldecott(2015)

Smith et al(2016)

Gt C

O2/y

r

Minimum Maximum

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As necessidades hídricas da BECCS variam da mesma forma, mas podem ser expressivas, possivelmente com uma média de 60 quilômetros cúbicos por ano (km3/ano) para remover 1,0 Gt de CO2e.24 Assim, a remoção e armazenamento de 3 GtCO2e pode demandar 180 km3/ano de água. A título de contextualização, os seres humanos consomem cerca de 7.000 km3 de água doce por ano na agricultura.25 Se os sistemas de BECCS capturassem juntos 3,00 GtCO2e por ano, o consumo global de água na agricultura poderia aumentar até 2,6%.

Cobenefícios: A implantação da BECCS como uma solução climática traz uma série de cobenefícios sociais e ambientais. Além do CO2 removido da atmosfera e armazenado por um longo período, a BECCS gera energia, um recurso importante do qual a sociedade moderna depende. O cultivo de biomassa para geração de energia também pode contribuir para o manejo sustentável da terra e surtir efeitos secundários na saúde dos ecossistemas regionais.

Outro: Embora muitos estudos tenham destacado seu potencial de contribuição para a mitigação climática, a BECCS ainda é uma tecnologia polêmica. Entre a opinião pública, uns manifestam um otimismo cauteloso, já outros se opõem veementemente a qualquer sistema de bioenergia em larga escala que possa acabar convertendo paisagens naturais e exacerbando os déficits hídricos. Contudo, ao contrário de muitas abordagens naturais, a BECCS teoricamente é capaz de armazenar CO2 em formações geológicas durante milhares de anos. Embora a possibilidade de vazamentos continue sendo uma preocupação, a liberação de CO2 provavelmente só viria a ocorrer em decorrência de eventos sísmicos ou geológicos, e não de decisões econômicas e políticas.

Captura direta do ar (DAC)

Assim como a CCS, os sistemas de captura direta do ar (DAC, do inglês “Direct Air Capture”) são capazes de extrair e armazenar (ou usar) CO2 para limitar as concentrações atmosféricas de GEE. Diferentemente da CCS, entretanto, as usinas de DAC extraem o gás do ar livre, e não de uma fonte pontual, como no caso do gás de combustão de uma usina de energia. Para

capturar o CO2, a DAC usa produtos químicos que atraem esse gás, mas não outros gases atmosféricos, como oxigênio e nitrogênio. Na sequência, as usinas aplicam energia para isolar o CO2 dos outros produtos químicos e armazená-lo em reservatórios geológicos ou transformá-lo em outros materiais. Os produtos químicos em seguida são reaproveitados para atrair mais CO2.

Prontidão: Diferentemente da CCS, a DAC é uma tecnologia muito mais incipiente. Há alguns projetos demonstrativos em fase de desenvolvimento no Canadá, Europa e Estados Unidos, mas os resultados apresentados ao público são limitados.

Mitigação: Apesar de os sistemas de DAC teoricamente terem um potencial de mitigação ilimitado, o custo e disponibilidade de alguns recursos indispensáveis, como a energia, restringem muito a quantidade de CO2 que pode ser removida da atmosfera de forma realista. Como a DAC foi muito menos estudada que a CCS e a BECCS até o momento, existem apenas algumas estimativas de mitigação na bibliografia publicada. Um estudo estima que os sistemas de DAC são comprovadamente capazes de

24 Calculado a partir de dados de http://aura.abdn.ac.uk/bitstream/handle/2164/7937/7955_2_merged_1445366890_1_.pdf?sequence=1 25 Rogers, Peter, “The Role of Irrigation in Meeting the Global Water Challenge”, Harvard University, http://research.unl.edu/events/futureofwater/ppt/PeterRogers.pdf

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capturar de 3 a 16 GtCO2 por ano.26 Porém, a escalabilidade pode ser um problema. Na Suíça, a empresa Climeworks construiu uma usina piloto que atualmente remove 900 toneladas de CO2 por ano. Para aumentar esse número para 1,0 Gt de CO2 – meta da empresa para as próximas décadas 27 – a Climeworks precisaria construir mais de 1,1 milhão de usinas iguais. A empresa Carbon Engineering, com sede no Canadá, afirmou que sua tecnologia, que possui escala comercial, seria capaz de capturar 1 milhão de toneladas de CO2 por ano. Mesmo nessa escala, a empresa precisaria construir mil usinas para remover uma gigatonelada de poluição carbônica por ano.

Custo: Em comparação com a CCS e outras metodologias de mitigação, o custo dos sistemas de DAC ainda é muito alto. Tendo em vista que a concentração de CO2 no ar é entre 100 e 300 vezes menor do que, por exemplo, o gás de combustão de uma usina de energia, o processo para extrair quantidades equivalentes do gás consome muito mais energia em um sistema DAC. Estudos estimam que a DAC pode custar de US$ 500 até nada menos que US$ 1.000 por tonelada de CO2 capturado.28 É claro que esses custos devem diminuir e a tecnologia poderá ganhar competitividade em termos de custos em relação a outras opções de mitigação, à medida que o mundo for esgotando as soluções mais baratas, possivelmente a partir de meados do século.29

Intensidade de recursos: Embora a DAC necessite de quantidades insignificantes de terra e ínfimas de água – o sistema da Climeworks na verdade extrai a umidade do ar e, assim, se autoabastece –, a tecnologia consome muita energia. A extração de CO2 do ar demanda cerca de 0,49 gigajoule de energia por tonelada de CO2 capturado (GJ/tCO2).30 Essa quantidade de energia é cerca de três vezes maior que a necessária para capturar CO2 do gás de combustão, como no caso da CCS convencional. Processar, transportar e injetar CO2 requer ainda mais energia, podendo intensificar seu consumo por tCO2 para 12,3 GJ. Nesse ritmo, remover 1,0 Gt consumiria 3,417 terawatts/hora de eletricidade por ano, valor equivalente a quase toda a eletricidade gerada nos Estados Unidos em 2017.

Cobenefícios: Diferentemente das abordagens baseadas no recurso terra, as tecnologias de CDR, como a captura direta de ar, não apresentam cobenefícios significativos fora do âmbito climático.

Outro: Tal como no caso da CCS, a DAC em tese é capaz de armazenar dióxido de carbono durante milhares de anos com risco mínimo de vazamento. Entretanto, a tecnologia ainda gera muita polêmica, em parte devido ao custo. Além disso, como seu principal benefício é a mitigação do clima, ela não conta com a ampla base de apoiadores de muitas soluções naturais.

26 Chen, Chen e Massimo Tavoni, “Direct air capture of CO2 and climate stabilization: A model based assessment”, Climate Change, fevereiro de 2013: https://link.springer.com/article/10.1007%2Fs10584-013-0714-7 27 Jacobson, Rory e Noah Deich, “Giant Machine Sucks CO2 Directly from Air!!”, Center for Carbon Removal, junho de 2017: http://www.centerforcarbonremoval.org/blog-posts/2017/6/14/6zoi0196zn1if3apkn6ms3gk6kylfn 28 Mazzotti, Marco et al. “Direct air capture of CO2 with chemicals: Optimization of a two-loop hydroxide carbonate system using a countercurrent air-liquid contactor“, Climactic Change, maio de 2013: https://www.researchgate.net/publication/257548044_Direct_air_capture_of_CO2_with_chemicals_Optimization_of_a_two-loop_hydroxide_carbonate_system_using_a_countercurrent_air-liquid_contactor; APS Physics, “Direct Air Capture of CO2 with Chemicals”, junho de 2011: https://www.aps.org/policy/reports/assessments/upload/dac2011.pdf; “Climate Intervention: Carbon Dioxide Removal and Reliable Sequestration”, National Research Council, 2015: http://www.whoi.edu/fileserver.do?id=202544&pt=10&p=39435 29 Honegger, Matthias and David Reiner, “The political economy of negative emissions technologies: consequences for international policy design”, Climate Policy, novembro de 2017: https://www.tandfonline.com/doi/full/10.1080/14693062.2017.1413322 30 APS Physics, “Direct Air Capture of CO2 with Chemicals”, junho de 2011: https://www.aps.org/policy/reports/assessments/upload/dac2011.pdf

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Aceleração do intemperismo (EW)

O intemperismo, ou decomposição química das rochas, é um processo natural que remove grandes quantidades de CO2 da atmosfera. No entanto, é extremamente lento, tendo como fator limitante a área de superfície das rochas que são capazes de absorver o CO2, como é o caso dos minerais silicatados. A aceleração do intemperismo, por vezes chamada de carbonatação mineral, acelera esse processo empregando a trituração das rochas para aumentar a área de superfície. O pó resultante pode ser aplicado na terra ou no oceano para aumentar a absorção de

CO2.

Prontidão: A aceleração do intemperismo é uma das abordagens de CDR menos desenvolvidas, com apenas algumas iniciativas de pesquisa dedicadas a estudar o processo em todo o mundo. Iniciativas do setor privado, como a Carbonation Mineral International, vêm lutando para avançar sem contar com apoio financeiro para pesquisa dos governos e entidades filantrópicas.

Mitigação: O potencial de mitigação estimado para a aceleração do intemperismo é um pouco menor do que o de outras abordagens de CDR, em geral 1 a 4 GtCO2 por ano, dependendo do mineral empregado e do local onde o produto é aplicado. De acordo com um estudo, por exemplo, a adição de carbonatos e olivina nos oceanos e solos pode remover uma média de 0,7 GtCO2 por ano, até um máximo de 3,7 GtCO2 até 2100.31 De acordo com outro estudo, o potencial terrestre pode passar de 4 GtCO2 por ano, enquanto o potencial oceânico ficaria abaixo de 1,0 GtCO2.32

Custo: A faixa de custos estimados relativos à aceleração do intemperismo é extremamente ampla, variando de US$ 23 até US$ 578 por tonelada de CO2 capturada, além de apresentar alto grau de incerteza.33 Estima-se que o custo de aplicar os fragmentos de rocha na terra seja menor do que no oceano.

Intensidade de recursos: As necessidades da aceleração do intemperismo em termos de terra e água são relativamente mínimas. Embora o processo consista em distribuir fragmentos de rocha triturada em vastas extensões de terra, com cerca de 0,01 ha/tCO2e,34 a intensidade de uso da terra ainda é a segunda menor depois da DAC. Ademais, a aceleração do intemperismo não precisa necessariamente competir com outros usos da terra. Pelo contrário, a dispersão de carbonatos e olivina triturados em solos agrícolas e florestais ácidos pode, na verdade, aumentar seu pH e efetivamente tornar a terra mais produtiva.

Apesar de necessitar de pouca terra e água, a aceleração do intemperismo consome muita energia: 0,08 a 0,2 GJ/tCO2. Assim como ocorre na DAC, o processamento e transporte de quantidades maciças de rochas pode aumentar a intensidade de energia por tCO2, atingindo os 12,5 GJ da DAC.

Cobenefícios: Conforme mencionado anteriormente, a adição de determinados minerais a solos agrícolas ou florestais ácidos tem o potencial de melhorar sua produtividade. Por sua vez, a existência de terras agrícolas mais produtivas pode evitar que mais áreas florestais sejam convertidas em terras agrícolas. Além disso, a reciclagem de resíduos silicatados das atividades de mineração pode reduzir os impactos ambientais das operações de mineração. 31 Smith, Pete et al. “Biophysical and economic limits to negative CO2 emissions”, Nature Climate Change: https://www.nature.com/articles/nclimate2870 32 “Climate Intervention: Carbon Dioxide Removal and Reliable Sequestration”, National Research Council, 2015: http://www.whoi.edu/fileserver.do?id=202544&pt=10&p=39435 33 Ibid; Renforth, Phil, “The potential of enhanced weathering in the UK”, University of Oxford, 2012: http://orca.cf.ac.uk/60892/ 34 Smith, Pete et al. “Biophysical and economic limits to negative CO2 emissions”, Nature Climate Change: https://www.nature.com/articles/nclimate2870

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Outro: Do mesmo modo que as outras soluções tecnológicas, o processo de intemperismo tem o potencial de armazenar carbono durante milhares de anos com mínimo ou nenhum vazamento. Contudo, a tecnologia suscita polêmica por envolver mineração em grande escala e questões relacionadas à segurança alimentar e o uso da terra, além do que muitos questionam se pulverizar rochas em larga escala é a melhor solução para os problemas climáticos, sobretudo havendo outras abordagens disponíveis.

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IV. Não deixar passar as oportunidades que a natureza já oferece Embora as soluções de CDR naturais e tecnológicas possam, em tese, capturar pelo menos 20 Gt de dióxido de carbono até o final do século, nem todas podem ser implantadas ao mesmo tempo – na verdade, podem estar competindo por alguns dos mesmos recursos finitos, principalmente a terra. A fim de incorporar efetivamente a CDR em suas estratégias climáticas nacionais, os formuladores de políticas precisam considerar a situação de prontidão e a relação custo-benefício de cada tecnologia, do curto prazo até meados do século e depois.

Hoje, as soluções naturais são as opções de CDR mais abundantes e mais acessíveis. A maioria delas, inclusive florestamento/reflorestamento, manejo florestal melhorado e alguns métodos de sequestro de carbono orgânico no solo, são incrivelmente bem compreendidos e têm histórico de implantação em grande escala. Além disso, atualmente são uma opção muito mais econômica para capturar o dióxido de carbono, por um custo uma ordem de grandeza mais baixo por tonelada de CO2 capturado do que as soluções tecnológicas. Se deixarem de implantar, no curto prazo e na maior medida possível, as tecnologias de CDR natural testadas e provadas, os formuladores de políticas podem perder a oportunidade de capturar entre 2,7 e 15,8 Gt (ponto médio de 6,1 Gt) de dióxido de carbono por ano até 2030, a menos de US$ 100/tonelada,35 e possivelmente mais (Figura 3). Já as soluções tecnológicas ainda são bastante incipientes e existem, na sua maioria, apenas em escala de laboratório ou demonstrativa.

Além de seu potencial de mitigação climática, a CDR natural oferece numerosos cobenefícios, inclusive ecossistemas mais resilientes, maior habitat e biodiversidade da fauna/flora silvestre, melhoria da qualidade da água, controle da erosão e um microclima mais ameno e úmido, mais favorável para a agricultura. Ar, água e solos mais limpos também podem contribuir para uma melhor saúde. Com algumas pequenas exceções, a maioria das soluções de CDR tecnológicas seria implantada unicamente por seus benefícios de mitigação climática. Isso pode dificultar a obtenção de apoio, adesão e recursos de um grupo diversificado de atores.

No longo prazo, os formuladores de políticas precisarão considerar o conjunto mais completo de opções de CDR. Com o passar do tempo, tanto os efeitos da saturação como o das restrições de terra limitarão o potencial de mitigação de soluções como florestamento/reflorestamento e as tornarão mais caras. Nesse meio tempo, é provável que o custo das abordagens tecnológicas diminua nas próximas décadas, enquanto seu potencial de mitigação fique em grande medida inalterado. A exceção é a BECCS, cujos custos irão cair até atingir determinado nível de sequestro. Para níveis elevados de remoção de CO2, a grande demanda de terra associada à expansão das lavouras para produção de biocombustíveis terá um efeito de alta dos preços.

35 Calculado com base em Griscom et al 2017, Suplemento on-line, Tabela S4 A faixa de Griscom et al 2017 é usada para evitar a dupla contagem entre categorias e usar restrições econômicas comuns em cada abordagem.

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Figura 3: Síntese das abordagens de CDR, por fator

Notas: 1. Potencial de mitigação representado como uma faixa de potencial técnico ou máximo em várias fontes da bibliografia (ver texto). As estimativas de potencial técnico não são aditivas entre as metodologias, pois pode haver compensações entre elas. 2. As estimativas de custo são representadas como faixas de custo médio de várias fontes da bibliografia (ver texto), e não se destinam a representar a faixa de estimativas de custos com um potencial de mitigação específico.

Melhoria dos ecossistemas Produtividade do solo Geração de renda Geração de energia

Metodologia Mitigação técnica potencial (GtCO

2/ano)1

Custo médio (US$/tCO

2)2

Prontidão Cobenefícios

Escala:

Natural

Reflorestamento/Florestamento Plantio de árvores onde não existem ou já não existem há décadas.

MADURA

Manejo florestal melhorado Práticas de manejo que aumentam a taxa de captura de CO

2 e a quantidade

armazenada nas florestas.

MADURA

Sequestro de carbono orgânico do solo Aprimoramento do armazenamento de carbono nos solos.

MADURA

Natural + Tecnológica

Biocarvão Conversão de biomassa em carvão resistente à decomposição.

DEMONSTRATIVA

Bioenergia mais captura e armazenamento de carbono Geração de energia a partir de biomassa e armazenamento das emissões de CO

2

resultantes em reservatórios geológicos.

DEMONSTRATIVA

Tecnológica

Captura direta do ar Uso de produtos químicos para absorver CO

2 da atmosfera.

DEMONSTRATIVA

Aceleração do intemperismo Trituração de rochas que absorvem CO

2

naturalmente e dispersão desse produto na terra ou no oceano.

EXPERIMENTAL

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V. Recomendações • Hoje, os sumidouros biológicos naturais oferecem a melhor combinação de benefícios para o

clima ao menor custo, e devem ser implantados na maior medida possível.

• Tanto as soluções naturais como as tecnológicas requerem tomar providências e fazer investimentos com antecedência.

o A vegetação demora a crescer à deve-se investir nas soluções naturais hoje.

o As novas tecnologias levam tempo para adquirir escala e poder ser comercializadas à deve-se investir em P&D e na implantação de tecnologias em estágio inicial.

• Concentrar os esforços nas estratégias florestais e terrestres como uma solução de curto prazo irá estimular o apoio internacional ao setor e gerar mais ambição no curto prazo.

• Os governos (nacionais e regionais) e a iniciativa privada precisam avaliar quais sistemas de CDR podem e devem ser o foco dos investimentos como parte das estratégias nacionais de mudança do clima.

o Os países com cobertura florestal, sobretudo nas regiões tropicais, terão um potencial considerável para a implantação imediata de sistemas naturais de NET, principalmente o florestamento de terras degradadas e o manejo florestal melhorado, os quais podem ser incorporados nas estratégias de REDD+ nacionais.

o Ao projetar sistemas naturais de NET e BECCS ou de biocarvão, deve-se seguir uma metodologia de manejo da paisagem para evitar impactos ambientais ou sociais negativos.

o As soluções naturais devem procurar maximizar toda a gama de cobenefícios, dos meios de subsistência locais e a segurança alimentar até a resiliência climática e a biodiversidade.

• Para apoiar os países em desenvolvimento nas suas iniciativas de mitigação e adaptação, os países doadores deveriam investir mais em uma agricultura inteligente do ponto de vista das florestas e do clima nos países em desenvolvimento, auxiliando-os também a elaborar planos de desenvolvimento de baixa emissão de carbono de longo prazo para equacionar a economia como um todo.

Figura 4: Cronograma de implantação de soluções naturais e tecnológicas de CDR

Descarbonização

CDR natural: Implantação

CDR tecnológica: Pesquisa e CDR tecnológica:

Curto prazo Pré-2030

Médio prazo Meados do

século

Longo prazo Fim do século

Reflorestamento e florestamento Manejo florestal melhorado SOCS

Biocarvão BECCS DAC EW

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