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CENTRO UNIVERSITÁRIO CURITIBA FACULDADE DE DIREITO DE CURITIBA GERMANO CESAR DE SOUZA ARAÚJO STALKING À LUZ DO ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO ATUAL CURITIBA 2018

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CENTRO UNIVERSITÁRIO CURITIBA

FACULDADE DE DIREITO DE CURITIBA

GERMANO CESAR DE SOUZA ARAÚJO

STALKING À LUZ DO ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO ATUAL

CURITIBA

2018

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GERMANO CESAR DE SOUZA ARAÚJO

STALKING À LUZ DO ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO ATUAL

Monografia apresentada como requisito parcial à obtenção do grau de Bacharel em Direito do Centro Universitário Curitiba.

_________________________ Orientador: Gustavo Scandelari

CURITIBA

2018

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GERMANO CESAR DE SOUZA ARAÚJO

STALKING À LUZ DO ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO ATUAL

Monografia aprovada como requisito parcial para obtenção do grau de Bacharel em Direito do Centro Universitário Curitiba, pela Banca Examinadora formada pelos

professores:

Orientador: Gustavo Scandelari

________________________ Prof. Membro da Banca

CURITIBA

2018

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DEDICATÓRIAS

Dedico este trabalho aos meus pais e minhas irmãs, que foram inspiração em toda a jornada

desta graduação.

Sem seu amor e apoio, este trabalho jamais seria concluído.

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AGRADECIMENTOS

Ao término deste trabalho, uma longa caminhada se fez, muitas pessoas foram contatadas e, neste momento são lembradas

com gratidão.

Agradeço sinceramente ao Professor Gustavo Scandelari pela valiosa orientação a esta pesquisa, e por ter acreditado em

minha escolha, e em minha capacidade para escrever sobre o tema.

Agradeço aos amigos e familiares que compreenderam minha

ausência, e serviram de suporte neste momento.

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“A base da sociedade é a justiça; o julgamento constitui a ordem da sociedade:

ora o julgamento é a aplicação da justiça.” (Aristóteles)

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RESUMO

O presente trabalho de conclusão de curso tem como objetivo geral apresentar a prática de stalking à luz do ordenamento jurídico brasileiro atual, e as eventuais mudanças que versam sobre o tema. Ocorre que o tema tem sido pauta de estudos psicológicos, psiquiatras e até mesmo juristas, uma vez que a conduta tem sido considerada potencialmente perigosa à sociedade. Por meio de uma análise comparada a ordenamentos jurídicos internacionais – que se demonstram avançados, comparados ao Brasil –, pretende-se demonstrar a importância e os reais impactos que esta prática apresenta para a sociedade. Trata-se de prática que, embora consideravelmente antiga, cada vez mais se dissemina pelo mundo, especialmente em decorrência do avanço tecnológico. Inobstante, verifica-se que a sociedade – especialmente a brasileira – pouco compreende sobre o tema. Assim, considerando a ausência de informação que a sociedade possui acerca deste tema, verifica-se a séria consequência de ausência de regulação na legislação brasileira. Nesta senda, o presente trabalho explorará conceitos, questões históricas, psicológicas, e direito comparado para demonstrar a importância do tema ora proposto, e a necessidade de regulação específica para a sociedade brasileira.

Palavras-chave: Stalking. Ordenamento Jurídico Brasileiro. Avanço Tecnológico. Ausência de Regulação. Direito Comparado.

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ABSTRACT

The present work of course conclusion has as general objective to present the practice of stalking in the light of the current Brazilian legal system, and the possible changes that deal with the subject. It happens that the subject has been the subject of psychological studies, psychiatrists and even jurists, since the conduct has been considered potentially dangerous to the society. Through a comparative analysis of international legal systems, which are advanced compared to Brazil, it is intended to demonstrate the importance and the real impacts that this practice presents to society. It is a practice that, although considerably old, is increasingly disseminated throughout the world, especially as a result of technological advances. In spite of this, it is clear that society - especially Brazilian society - has little understanding of the subject. Thus, considering the lack of information that society has on this subject, there is a serious consequence of the absence of regulation in Brazilian legislation. In this way, the present work will explore concepts, historical, psychological, and comparative law to demonstrate the importance of the theme proposed, and the need for specific regulation for Brazilian society.

Keywords: Stalking. Brazilian legal system. Technological progress. Absence of Regulation. Comparative law.

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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ........................................................................................... 13

2 VISÃO GERAL ........................................................................................... 15

3 O QUE É STALKING? ............................................................................... 19

4 NATUREZA JURÍDICA DO STALKING ................................................ 2122

5 O QUE LEVA À PRÁTICA DO STALKING? ............................................. 23

5.1 Causas e Características ...................................................................... 27

5.2 Depressão e Estresse Pós-traumático ................................................ 28

5.3 Breves Casos de Stalking ..................................................................... 29

5.4 Há Desequilíbrio Químico no Comportamento do Stalker? .............. 31

5.5 Genótipos ........................................................................................... 3132

6 STALKING NAS LEGISLAÇÕS INTERNACIONAIS ............................ 3435

6.1 O Stalking na Legislação dos Estados Unidos ............................... 3536

6.1.1. O Stalking no Estado do Texas .................................................... 3638

6.1.2. O Stalking no Estado da Califórnia .............................................. 3940

6.2 O Stalking na Legislação Francesa ................................................. 4547

6.3 O Stalking na Legislação Italiana ..................................................... 4648

7 LEI MARIA DA PENHA E A REFORMA PENAL BRASILEIRA ........... 4850

8 POSICIONAMENTO JURISPRUDENCIAL SOBRE O ASSUNTO ....... 5254

9 CONCLUSÃO ........................................................................................ 5557

REFERÊNCIAS ......................................................................................... 5759

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1 INTRODUÇÃO

O presente trabalho de conclusão de curso tem como propósito apresentar um

tema que, embora recorrente na sociedade, pouco é discutido e profundamente

estudado, especialmente no Brasil.

Cumpre observar que, o objetivo aqui proposto não é esgotar o tema, e as

eventuais consequências, isto, pois como será verificado no presente estudo, o

Stalking não deve ser analisado limitando-se somente à sua prática. São muitas as

vertentes que devem ser analisadas, para só então compreender esta prática que se

instala cada vez mais na sociedade.

O stalking em suma, trata-se de comportamentos de assédio persistente que

tem como objetivo perturbar, atemorizar e alarmar as vítimas. Contudo, mostra-se

imperioso ressaltar, que, em muitos casos, esta prática não se restringe apenas em

infligir o medo à vítima, tendo como consequência final, a morte da mesma.

Ao analisar esta prática, resta evidente que não se trata de uma conduta atual,

ao contrário, o stalking está presente em toda a evolução humana.

Inobstante, com o avanço tecnológico operando cada vez mais na vida das

pessoas, é natural que até mesmo os crimes se adaptem à nova realidade.

Com o stalking não poderia ser diferente, pois aqueles que o praticam, os

chamados stalkers têm se aperfeiçoado cada vez mais para atingir suas vítimas, em

todas as áreas de suas vidas, inclusive, no ambiente digital.

Sob esta ótica, considerando que, atualmente a prática de stalking – diferentemente

de outros países – não é considerada crime no Brasil, o presente trabalho, tem como

objetivo apresentar esta prática, sob a perspectiva do ordenamento jurídico brasileiro,

comparando-a com a perspectiva internacional.

Buscou-se no presente trabalho, demonstrar a importância que esta prática

representa para a sociedade, visto que se trata de interesse comum, uma vez que

qualquer pessoa pode ser assolada pela prática do stalking, independentemente do

sexo, idade, posição social, opção sexual.

Assim, como já mencionado, ante a ausência de legislação específica no

Brasil, e o aumento de casos registrados, combinado com as sérias consequências

desta prática, propõe o presente trabalho um estudo mais aprofundado acerca da

prática de stalking.

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2 VISÃO GERAL

A prática da violência pode ser observada em toda a história da humanidade,

sendo desenvolvida e disseminada de acordo com a evolução da sociedade. No início,

a violência era praticada como uma forma de sobrevivência, pois para sobreviver

frente às adversidades, o homem utilizava-se de sua força.

O stalking, objeto do presente estudo, por exemplo, trata-se de um fenômeno

praticado já na antiguidade, porém estudado de forma mais aprofundada somente há

alguns anos. De acordo com Natália Gomes de Vasconselos e Marconi Neves Macedo

(2015, p.19)1, o termo “stalking” foi inicialmente utilizado em 1980. Vejamos.

O termo Stalking foi utilizado inicialmente nos Estados Unidos, Califórnia, no final da década de 1980 para descrever a perseguição insistente a celebridades pelos seus fãs, tornando-se criminalmente tipificada somente em 1990, abrindo precedentes para os demais países europeus, como por exemplo, na Inglaterra onde, a cada ano, cerca de 600 mil homens e 250 mil mulheres são vitimados.

No tocante a nomenclatura, Mário Luiz Ramidoff e Cesare Triberti (2017, p.

32)2 elucidam que:

A origem do nome está provavelmente ligada a uma terminologia em tema de caça, que remonta ao renascimento inglês e foi transportado das histórias de caça aos animas à caça, agora, do próprio ser humano (to stalk – perseguir um animal).

Sob esta ótica, verifica-se que stalking nada mais é que – através da “caça” –

instigar o medo na vítima, criar incertezas e invadir a intimidade, por meio de coação,

tormentos psicológicos, imposição de presença na vida da vítima. Não são raros os

casos que envolvem grave violência e até morte.

Para Mário Luiz Ramidoff e Cesare Triberti (2017, p. 8)3 , “Essas ações

persecutórias (stalking) apareceram nas relações interpessoais, de forma violenta, e

1 VASCONSELOS, Natália Gomes de. MACEDO, Marconi Neves. Stalking e o novo código penal brasileiro: desmistificando conceitos de uma problemática emergente na sociedade contemporânea. Revista Cultural e Científica do UNIFACEX. 2015, p. 19. 2 RAMIDOFF, Mário Luiz. TRIBETTI, Cesare. Atos persecutórios obsessivos ou insidiosos. 2017. p. 32. 3 RAMIDOFF, Mário Luiz. TRIBETTI, Cesare. Atos persecutórios obsessivos ou insidiosos. 2017. p. 8.

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que, por muito tempo, às vezes anos determinou a perseguição, caça, e toda sorte de

ameaça às vítimas”.

Damásio E. de Jesus4 aclara que,

Não é raro que alguém, por amor ou desamor, por vingança ou inveja ou por outro motivo qualquer, passe a perseguir uma pessoa com habitualidade incansável. Repetidas cartas apaixonadas, e-mails, telegramas, bilhetes, mensagens na secretária eletrônica, recados por interposta pessoa ou por meio de rádio ou jornal tornam um inferno a vida da vítima, causando-lhe, no mínimo, perturbação emocional. A isso dá-se o nome de stalking.

Não obstante, atualmente, a prática de stalking não é criminalizada

“formalmente” no Brasil, diferentemente de outros países.

Contudo, em que pese a ausência de tipo penal específico no ordenamento

brasileiro, a prática de stalking se enquadra na contravenção penal disposta no art. 65

do Decreto-Lei n. 3.688, de 3 de outubro de 1941, comumente chamada de Lei das

Contravenções Penais.

Assim, dispõe o aludido artigo 655 que, “Molestar alguém ou perturbar-lhe a

tranquilidade, por acinte ou por motivo reprovável [...]”, a pena aplicada poderá ser de

prisão de 15 (quinze) dias a 02 (dois) meses, ou aplicação de multa.

Lucinéa Wertz Wertz dos Santos6 apresenta por sua vez que, em que pese o

Código Penal não preveja exclusivamente a prática de stalking, a referida conduta

pode ensejar em inúmeras tipificações previstas no Código, vejamos:

O “Stalking”, dada a já mencionada variedade de condutas que abrange, pode ensejar responsabilizações civis (danos materiais e/ou morais) e penais (crimes ou contravenções). Na seara criminal os casos mais simples podem configurar a contravenção penal de “Perturbação da Tranquilidade” (artigo 65, LCP). Mas, nem sempre, conforme já foi exemplificado, o “stalker” se limita a perturbar a vítima (lotando caixas de mensagens, fazendo ligações telefônicas inoportunas etc.). Muitas vezes extrapola para práticas mais graves que podem configurar crimes de ameaça (artigo 147, CP), constrangimento ilegal (artigo 146, CP), crimes contra a honra (artigos 138 a 140, CP), estupro (artigo 213, CP), lesões corporais (artigo 129, CP) ou até mesmo homicídio (artigo 121, CP). Note-se ainda que em alguns casos, dadas as circunstâncias de tempo, lugar, forma de execução e espécie delitiva, poderá configurar-se crime continuado nos termos do artigo 71, CP. Também não é incomum constatar-se a ocorrência

4 JESUS. Damásio E. de. Stalking. Disponível em https://jus.com.br/artigos/10846/stalking. Acesso em 26/08/2018. 5 BRASIL. Decreto-Lei 3.688, de 3 de outubro de 1941. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Decreto-Lei/Del3688.htm. Acesso em 26/08/2018. 6 SANTOS. Lucinéia Wertz Wertz dos. Assédio por intrusão e/ou Stalking. Disponível em http://temwscausas.blogspot.com/2015/12/assedio-por-intrusao-eou-stalking.html. Acesso em 26/08/2018.

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nesses casos da chamada “progressão criminosa” em que o agente inicia com uma conduta de “Stalking” que configura infração penal menos gravosa, mas vai aos poucos ou mesmo abruptamente tomando atitudes cada vez mais agressivas e invasivas e atingindo bens jurídicos mais e mais relevantes. Em sua obra sobre a violência entre casais, Hirigoyen expõe o fato de que normalmente as violências de gênero são progressivas, iniciando pela coação psicológica até atingir a agressão física que pode chegar não tão raramente na prática de homicídio (HIRIGOYEN, 2006, “passim”).

Neste norte, Mário Luiz Ramidoff e Cesare Triberti (2017, p.196)7 explicam

acerca da proposta de reforma do Código Penal brasileiro,

Em relação à proposta de reforma do Código Penal brasileiro, então, contemplada no Projeto de Lei do Senado n. 236/2012, é possível verificar inúmeras tipificações123 pertinentes a graves ameaças e a violências praticadas através de atos invasivos (intrusivos) e persecutórios obsessivos, então, determinados por frustrações pessoais derivadas da convivencialidade privada e íntima entre o agente (agressor/molestador) e a vítima.

Todavia, considerando-se a atual ausência de tipificação desta prática, na

qualidade de crime, percebe-se que a penalidade disposta na lei de contravenções

penais, se demonstra um tanto quanto desproporcional, se comparada a seriedade da

prática, e a gravidade que os atos podem ocasionar às vítimas. Como já mencionado,

a prática de stalking não é uma novidade, porém, estudos específicos e relevantes

foram realizados somente mais recentemente.

Destarte, historicamente, são inúmeros os casos em que, principalmente

homens, monitoraram, seguiram, estupraram e assassinaram mulheres, sem qualquer

tipo de reprovação.

Até mesmo o mundo literário e a cinematografia já abordaram o tema de

diversas formas. Na cinematografia, por exemplo, alguns filmes como “Dormindo com

o inimigo”, “Pacto sinistro” e “Atração fatal”, garantem uma demonstração da prática

de stalking. Conforme Jamil Melo, com o passar dos anos e a observância deste tipo

de tragédia, os estudiosos da psicologia e da lei começaram a buscar respostas para

o problema.8

Assim, ante a importância do tema ora proposto e ausência de tipificação

adequada no ordenamento jurídico brasileiro, a presente pesquisa adentrará e

7 RAMIDOFF, Mário Luiz. TRIBETTI, Cesare. Atos persecutórios obsessivos ou insidiosos. 2017. p. 196. 8 MELO, Jamil. O crime de stalking e seu reflexo na legislação brasileira. Disponível em: http://emporiododireito.com.br/o-crime-de-stalking-parte-2. Acesso em: 09/09/2017.

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apresentará algumas normas existentes sobre o stalking em alguns Países, bem

como, conjunto à Lei n. 11.340/2006, chamada “Lei Maria da Penha” e na Reforma

Penal.

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3 O QUE É STALKING?

A palavra “stalking” tem sua origem na língua inglesa, embora não haja

tradução adequada ao idioma português, pode-se considerar a tradução literal da

palavra, qual seja, “[...] caçada, espreita ou perseguição”.9

Como já mencionado, trata-se de uma modalidade de violência que se

constitui num verdadeiro cerco psicológico e social realizado de forma reiterada por

um agente contra a sua vítima, servindo-se de diversos mecanismos que variam

desde um simples olhar vingativo até agressões verbais que ofendem a honra do

perseguido.

Nesta esteira, válidas são as palavras do professor Damásio de Jesus as

quais servem de baluarte para uma melhor compreensão do fenômeno, quando assim

o conceitua:

O stalking é uma forma de violência na qual o sujeito ativo invade a esfera de privacidade do sujeito passivo, repetindo incessantemente a mesma ação por maneiras e atos variados, empregando táticas e meios diversos: telefonemas em seu aparelho celular, residencial ou de ocupação, mensagens amorosas, telegramas, ramalhetes de flores, presentes não solicitados, assinaturas de revistas indesejáveis, mensagens em faixas amarradas, pregadas ou fixadas nas proximidades da residência da vítima, permanência na saída de sua escola ou trabalho, espera da sua passagem em determinado lugar, frequência constante no mesmo local de lazer, supermercados, lojas, etc.10

Nos dias atuais, uma modalidade de stalking muito comum é a praticada pelos

chamados paparazzi, vocábulo de origem italiana, e usado para indicar os repórteres

fotográficos que registram imagens de pessoas famosas sem permissão, quer seja

em local aberto ao público ou não, tornando conhecido de todos, após publicar na

imprensa as fotografias obtidas, a vida pessoal das celebridades, invadindo a esfera

de privacidade delas. 11

Há também o cyberstalking, isto é, o stalking realizado pela rede mundial de

computadores. As vítimas desta violência virtual podem ser usuários de bate-papo

9CONRAD, David. Minidicionário escolar de inglês. 24. ed. São Paulo: DCL, 2009. 10 JESUS, Damásio E. de. Stalking. Revista IOB de Direito Penal e Processual Penal. São Paulo, v. 10, n. 56, p. 66-70, jun-jul/2009. 11 Ao discorrer sobre a conduta dos paparazzi, com propriedade Lélio Calhau tece as seguintes ponderações: “Eles não buscam o sofrimento direito da vítima (como no bullying), mas o provocam, inclusive, como meio para atingir seus objetivos. Embora aleguem que estão a trabalho, é patente que as pessoas não podem cometer atos ilícitos a título de ‘estou a trabalho’, e os papparazzi sempre alegam essa justificativa para o seu trabalho”. In: CALHAU, Lélio Braga. Bullying: o que você precisa saber: identificação, prevenção e repressão. 2. ed. Niterói: Impetus, 2010, p. 101.

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molestados por recados ofensivos que lhes são enviados, internautas que veem suas

páginas pessoais de relacionamento invadidas por anônimos, gerando-lhes

desconforto e mal-estar.

Apesar das dificuldades de se punir o cyberstalker em virtude da ocultação da

sua identidade sobrepostas por apelidos e falsos nomes, em outros países já existem

projetos de lei que contêm instrumentos repressivos. Nessa esteira, Antônio Milagre12

exemplifica:

Nos Estados Unidos, um projeto de lei em trâmite no Comitê Judiciário da Assembleia de New Jersey, amparando na clássica “ordem de distância permanente da vítima, prevê como punição aos stalkers que forem condenados “ordem de distância virtual”, ou seja, não mais poderão eles enviar e-mails ao (à) autor (a) da ação. Uma outra proposta sugere a criação de um “cadastro de stalkers.

Noutro norte, no tocante as vítimas dos stalkers, embora o início dos estudos

sobre o tema, tenha identificado as vítimas como pessoas famosas, Natália Gomes

de Vasconcelos e Marconi Neves Macedo (2015, p.21)13 as classificam como:

Quanto às vítimas, em análise mais detalhada, podemos classificá-las tais como: vítimas de ex-parceiros, vítimas de conhecidos ou amigos, vítimas de uma relação profissional, vítimas em contexto laboral, vítimas de desconhecidos, vítimas celebridades e as falsas vítimas, sendo esta última denominada de “subversão de posição”, na qual o Stalker acusa a própria vítima de persegui-lo, impondo o seu domínio e contato com a vítima.

Assim, verifica-se que desde as vítimas às ações caracterizadas

como stalking, há uma diversidade de elementos e diferentes gradações, dificultam a

construção de um conceito abrangente e capaz de esgotar todas as hipóteses e

desdobramentos que tais atos persecutórios incutem no meio social.

Desta forma, o presente estudo abordará na sequência desde estudos

aprofundados em outros países – que já tipificam a conduta como crime – até mesmo

definições e características que permitirão uma maior compreensão acerca do tema.

12 MILAGRE, José Antonio. O stalking na internet. Revista Jurídica Consulex, São Paulo, ano XIII, n. 302, p. 49, ago. 2009. 13 VASCONCELOS, Natália Gomes de. MACEDO, Marconi Neves. Stalking e o novo código penal brasileiro: desmistificando conceitos de uma problemática emergente na sociedade contemporânea. Revista Cultural e Científica do UNIFACEX. 2015, p. 21

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4 NATUREZA JURÍDICA DO STALKING

Como sabido, a legislação penal brasileira é antiquada, haja vista que o

Decreto-Lei que institui o Código Penal Brasileiro é de 1940.

Neste cenário é evidente que a legislação brasileira apresenta déficits ao tentar

acompanhar as constantes evoluções, seja da sociedade, seja dos crimes que a

assombram.

Conforme se verificará no decorrer do presente estudo, a prática de stalking

atualmente, é considerada no Brasil tão somente uma contravenção penal, não sendo,

portanto, considerada crime.

As consequências para tal condição, são extremamente negativas à sociedade,

visto que as penalidades para a prática são extremamente brandas, se comparadas

as consequências que esta conduta pode acarretar na vida das vítimas.

Natália Gomes de Vasconcelos e Marconi Neves Macedo, citados por Bruno

Bottiglieri14 ressaltam que,

Partindo do pressuposto do princípio penalista da proporcionalidade, as penalidades atuais consonantes com a legislação vigente (Lei de Contravenções Penais, Lei Maria da Penha, etc.) se imposta ao Stalker verificam-se inconsistentes e destoantes da função social da pena, devido à tamanha agressão ao direto íntimo e inerente à vítima causada pelo Stalker, visto que são extremamente brandas, não oferecendo a segurança jurídica necessária à dinamicidade na qual se apresenta o Stalking na sociedade.

Sob esta ótica, Bruno Bottiglieri15 complementa que,

Podemos concluir em análise ao instituto que, tendo em vista as contravenções penais serem infrações consideradas de menor potencial ofensivo, pouca foi a importância dispensada ao evento, haja visto, existirem, inúmeras ofertas de medidas despenalizadoras à disposição do contraventor. As vítimas seguem desamparadas pelo ordenamento jurídico penal vigente em território nacional. Trata-se de um verdadeiro descaso legislativo que vem, sucessivamente, incentivando o surgimento de novos casos, afinal, os agentes estão cientes que, às chances de acabarem proporcionalmente punidos pelo mal injusto e grave que causam aos seus perseguidos são ínfimas.

14 BOTTIGLIERI, Bruno. A responsabilidade civil das pessoas que perseguem obsessivamente (stalking). Disponível em <https://brunobottiglieri.jusbrasil.com.br/artigos/514430523/a-responsabilidade-civil-das-pessoas-que-perseguem-obsessivamente-stalking>. Acesso em 09/09/2018. 15 BOTTIGLIERI, loc. cit.

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Para Bruno Martins da Costa Silva16, por sua vez,

Quando não há regra ou costume que estabeleça um tratamento específico ao stalking, os dados sobre ele não são colhidos. Isso dificulta o debate acadêmico e a elaboração de soluções mais adequadas aos conflitos advindos do fenômeno. A ausência de tratamento ao stalking resulta na invisibilidade das vítimas.

Neste sentido, ainda que a prática de stalking seja consideravelmente séria,

podendo ocasionar às vítimas tanto danos psicológicos, como até a morte, atualmente

não há uma penalidade no ordenamento jurídico, que lhe seja proporcional.

Bruno Bottiglieri17 explica que,

Stalking é forma de violência na qual o sujeito ativo invade a esfera de privacidade da vítima, repetindo incessantemente a mesma ação por maneiras e atos variados, empregando táticas e meios diversos, nessa linha, configura-se sucessivos e repetidos abusos de direito por parte dos perseguidores. Juridicamente, abuso de direito pode ser entendido como fato de usar de um poder, de uma faculdade, de um direito ou mesmo de uma coisa, além do que razoavelmente o Direito e a Sociedade permitem.

Importante destacar que, são inúmeras as condutas que caracterizam o

stalking, e, como consequência, são inúmeros os direitos que as vítimas os têm

violados.

Nesta esteira, imperioso se faz alertar que, além de contravenção penal, o

stalker consequentemente pratica atos ilícitos previstos no Código Civil Brasileiro,

passíveis de reparação.

Assim, vejamos o que dispõe os artigos 186 e 187 do aludido Código18:

Artigo 186 - Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito. Artigo 187 – Também comete ato ilícito o titular de um direito que, ao exercê-lo, excede manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes.

16 SILVA, Bruno Martins da Costa. O reconhecimento do stalking no Brasil: Em busca de maior proteção da pessoa vulnerável. Disponível em < http://tede2.pucrs.br/tede2/bitstream/tede/7234/2/DIS_BRUNO_MARTINS_DA_COSTA_SILVA_PARCIAL.pdf> p. 11. Acesso em 09/09/2018. 17 BOTTIGLIERI, Bruno. A responsabilidade civil das pessoas que perseguem obsessivamente (stalking). Disponível em <https://brunobottiglieri.jusbrasil.com.br/artigos/514430523/a-responsabilidade-civil-das-pessoas-que-perseguem-obsessivamente-stalking>. Acesso em 09/09/2018. 18 BRASIL. Lei n. 10.406 de 10 de janeiro de 2002. Disponível em < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/l10406.htm> Acesso em 09/09/2018.

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23

Desta forma, como já mencionado, a prática de stalking de muitas maneiras

viola os direitos de suas vítimas, cometendo os atos ilícitos apresentados nos

dispositivos acima.

Neste sentido, temos que ante a ausência de legislação específica para a

prática de stalking, o instituto da responsabilidade civil é um recurso jurídico que se

pode utilizar para repelir a prática, e buscar a consequente reparação às agressões

realizadas.

Não obstante, importante esclarecer que a responsabilização civil, ainda não

se trata da responsabilização mais compatível e proporcional à prática de stalking,

garantindo-se ainda, a insegurança jurídica às vítimas.

5 O QUE LEVA À PRÁTICA DO STALKING?

Neste tópico, pretende-se demonstrar os aspectos característicos, por

assim dizer, “patológicos”, relacionados ao crime de stalking, ou seja, alguns dos

“fatores preponderantes” que têm a possiblidade de também determinar a prática dos

atos persecutórios, pelo agressor, então, endereçados a suas vítimas.

Vários tipos de comportamentos podem assumir a forma de stalking, em

particular esse comportamento pode ser caracterizado por telefonemas, mensagens

de texto, e-mails, cartas, repetidas tentativas de contatos em locais públicos,

monitoramento (em casa ou no trabalho), envio de flores, presentes, spam, dentre

outros.

De acordo com o site “Levar o Stalking* a Sério – Assédio Persistente”19, cujo

objetivo de sua criação é prestar apoio às vítimas, alguns comportamentos

persistentes mais comuns, se encontram na tabela abaixo, vejamos:

Recolher ou reunir informações sobre a vítima junto

de amigos/familiares, no correio, internet, local de

trabalho, escola, etc.

19 Levar o stalking* a sério – assédio persistente. Comportamentos de stalking/assédios persistentes. Disponível em https://www.apav.pt/stalking/index.php/features. Acesso em 02/09/2018.

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Presentes na totalidade ou

quase totalidade de

situações de assédio

persistente

Enviar repetidamente cartas, e-mails, bilhetes, sms

e /ou efetuar telefonemas de conteúdo inofensivo e

não ameaçador

Tentar persistentemente aproximações físicas e/ou

pedidos para encontros, reuniões, etc.

Deixar bilhetes ou flores junto do carro da vítima

Observar/perseguir e aparecer “coincidentemente”

nos locais frequentados pela vítima

Ficar sentado/a à porta de casa da vítima, no seu

local de trabalho, e/ou estabelecimento de ensino

que frequenta

Esperar a vítima junto ao seu carro no parque de

estacionamento

Espalhar rumores, dar falsas informações ou revelar

segredos da vítima aos seus amigos e/ou familiares

Presentes em cerca de

metade das situações de

assédio persistente

Destruir e/ou danificar os bens pessoais da vítima

e/ou o seu património (ex.: o seu automóvel; a sua

habitação)

Enviar repetidamente cartas, e-mails, bilhetes, SMS

e/ou efetuar telefonemas ameaçadores. As ameaças

podem ser diretas, implícitas ou simbólicas

Deixar provas de que arrombou o carro da vítima

Entrar em casa da vítima enquanto esta não está

Entrar em casa da vítima quando está lá está

Deixar flores/animais mortos ou outras coisas

obscenas em casa ou no carro da vítima

Presentes em cerca de ¼

das situações de assédio

persistente

Agredir fisicamente a vítima

Violar ou tentar violar a vítima

Presentes em menos de 2%

das situações de assédio

persistente

Matar ou tentar matar a vítima

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No tocante as vítimas, na maior parte dos casos, o stalker é um ex-

companheiro (a) da vítima, podendo, no entanto, ser também um colega, um

supervisor, um dependente, um paciente de um profissional (os psiquiatras estão

particularmente em risco, como vítimas de stalking).

O site “Levar o Stalking* a Sério – Assédio Persistente”20, também colabora

informando que qualquer pessoa poderá ser vítima do stalking,

[...] independentemente da sua idade, género, religião, classe social/nível socioeconómico, formação ou estado civil. No entanto, as investigações sobre esta forma de violência têm chegado à conclusão que as mulheres jovens representam um grupo mais vulnerável, apresentando um risco mais elevado do que a restante população.

No entanto, o referido site21 também descreve algumas vítimas quais sejam,

vítimas de ex-parceiros/as, vítimas de conhecidos/as ou amigos/as, vítimas em

contexto da relação profissional – como já mencionado, por exemplo, os psiquiatras –

, vítimas por desconhecidos, celebridades vítimas, e vítimas em contexto laboral.

No tocante as vítimas relacionadas ao contexto laboral, é possível constatar

que cerca de 12% (doze por cento) a 16% (dezesseis por cento) das mulheres são

vítimas de stalking e enquanto somente 4% (quatro por cento) a 7% (sete por cento)

são homens.

Posto isto, em relação aos motivos que levam à prática, J. Reid Meloy, citado

por Cristina Almeida22 , é psicólogo especializado em medicina legal, bem como

professor de psiquiatria da Universidade da Califórnia (San Diego), é autor do livro

"The Psychology of Stalking, Clinical and Forensic Perspectives" ("A psicologia do

stalking, perspectivas clínicas e forenses", sem tradução para o Brasil). O referido

psicólogo compartilha que dirigia um hospital psiquiátrico dentro de uma prisão de

segurança máxima, e já nesta época procurava compreender a razão pela qual uma

pessoa insistia em perseguir outra, mesmo sabendo que esta não o desejava por

perto. Em meados da década de 1980, passou a coletar dados sobre o assunto e

depois de algum tempo concluiu que o stalking poderia ser definido como "um

20 Levar o stalking* a sério – assédio persistente. Comportamentos de stalking/assédios persistentes. Disponível em https://www.apav.pt/stalking/index.php/features. Acesso em 02/09/2018. 21 Levar o stalking* a sério – assédio persistente. Comportamentos de stalking/assédios persistentes. Disponível em https://www.apav.pt/stalking/index.php/features. Acesso em 02/09/2018. 22 ALMEIDA, Cristina. http://cienciaesaude.uol.com.br/ultnot/2009/02/06/ult4477u1332.jhtme. Acesso em: 10/10/2017.

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comportamento anômalo e extravagante, causado por vários distúrbios

psicológicos (narcisismo patológico, pensamentos obsessivos etc), nutridos

por mecanismos inconscientes como raiva, agressividade, solidão e inaptidão

social, podendo ser classificado como patologia do apego". (Grifos)

Neste norte, Damásio de Jesus, citado por Natália Gomes de Vasconcelos e

Marconi Neves Macedo (2015, p.21) 23 , elucidam que o stalker possui condutas

específicas e peculiares, quando da prática do crime, quais sejam: a) invasão de

privacidade da vítima; b) repetição de atos; c) dano a integridade psicológica e

emocional do sujeito passivo; d) lesão à sua reputação; e) alteração do seu modo de

vida; f) restrição à sua liberdade de locomoção.

Natália Gomes de Vasconcelos e Marconi Neves Macedo24 reforçam ainda

que,

[...] para que haja a efetivação do Stalking, antes de qualquer coisa, é necessário que existam primeiro os requisitos supracitados, visto que muitas vezes um ato aparentemente inofensivo e inóxio poderá tomar maiores proporções de acordo com sentimento de saciedade do Stalker e o seu objetivo final, causando danos morais e psicológicos irreversíveis à vítima, que muitas vezes desconhecem a prática do Stalking, e por isso, todo o procedimento que o configura e, consequentemente, os meios de ajuda existentes também; outras pela própria ameaças verbais e físicas que sofre, não compartilha com ninguém a real situação fática, suportando sozinha os dramas, dores e aflições de viver sob o assédio de ser coagida ao indesejado.

Mário Luiz Ramidoff e Cesare Triberti (2017, p. 47)25 esclarecem que,

Os stalkers, assim, julgam-se “especiais” superiores aos outros, revestidos de um carisma de onipotência. No entanto, os stalkers não se dão conta de que, de igual maneira, encontram-se capturados pelos seus próprios “capturados” (vítimas) que personificam, por assim dizer, o “ideal” de seu desejo, relação, controle, perseguição; e, sem os quais (vítimas) esvair-se-ia o “universo (mental) fantástico” do stalker. (Grifos)

Assim, demonstra-se que, de uma forma menos complexa, o stalker tem como

objetivo inicial, “o poder” perante a sua vítima, utilizando-se de várias práticas

abusivas, para chegar ao seu objetivo, qual seja, o controle.

23 VASCONCELOS, Natália Gomes de. MACEDO, Marconi Neves. Stalking e o novo código penal brasileiro: desmistificando conceitos de uma problemática emergente na sociedade contemporânea. Revista Cultural e Científica do UNIFACEX. 2015, p. 21 24 VASCONCELOS, loc.cit. 25 RAMIDOFF, Mário Luiz. TRIBETTI, Cesare. Atos persecutórios obsessivos ou insidiosos. 2017. p. 47.

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5.1 Causas e Características

Embora já existam estudos avançados acerca do tema, as causas desse

desejo de perseguir o outro, ainda não são muito claras. Contudo, existem estudos

empíricos apontando para a incapacidade de lidar com as perdas da infância e da

idade adulta.

O que se sabe é que, diante de uma recusa da parte contrária, ou um desejo

de movido pela proximidade, o stalker pode desenvolver uma habilidade incomparável

para "elaborar estratégias repetidas e indesejáveis só para manter contato: suas

ações são tão exageradas (telefonemas e mensagens numerosas e incansáveis, por

exemplo) que fazem com que a vítima sinta medo e angústia".26

As formas como o perseguidor busca atenção é complexa, e para ele

pouco importa se suas atitudes possam vir a ser molestadoras ou ilícitas. Partindo

dessa complexidade, as manifestações podem até ser consideradas agradáveis para

o senso comum (mandar flores, presentes etc).

Não obstante, novamente J. Reid Meloy, citado por Cristina Almeida27 explica

que, "o limite entre o que é oportuno ou não, desejável ou não, é justamente a

aceitação explícita por parte do destinatário".

Acerca dos comportamentos do stalker, aclaram Mário Luiz Ramidoff e

Cesare Triberti (2017, p.47)28 que:

O diagnóstico dos comportamentos classificáveis como stalking, também, pode ser fundado no critério DSM IV, o qual requer a presença de pelo menos 5 (cinco) dos seguintes 9 (nove) sintomas: 1. Grande satisfação do self ou sensação exagerada da própria importância; 2. É ocupado/a com fantasias de sucesso limitado, de poder, efeito sobre os outros, beleza, ou de amor ideal; 3. Acredita de ser “especial” e único/a e de poder ser compreendido/a somente por pessoas especiais; ou é excessivamente preocupado em procurar vizinhanças/ser associado a pessoas de status (em qualquer âmbito) muito alto; 4. Desde já ou requer uma admiração excessiva em relação ao normal ou ao seu real valor;

26 ALMEIDA, Cristina. http://cienciaesaude.uol.com.br/ultnot/2009/02/06/ult4477u1332.jhtme. Acesso em: 10/10/2017. 27 ALMEIDA, loc. cit. 28 RAMIDOFF, Mário Luiz. TRIBETTI, Cesare. Atos persecutórios obsessivos ou insidiosos. 2017. p. 47.

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5. Há um forte sentimento de próprios direitos e faculdades, é irrealisticamente convencido que outros indivíduos/situações devam satisfazer as suas expectativas; 6. Aproveita-se de outros para obter objetivos e não sente remorso disso; 7. É carente de empatia: não percebe (não reconhece) ou não dá importância aos sentimentos dos outros, não gosta de identificar-se com os seus desejos; 8. Sente muita inveja e geralmente é convencido que os outros têm inveja dele/dela; 9. Modalidade afetiva de tipo predatório (relações de forças desiquilibradas, com pouco esforço pessoal, deseja receber mais do que oferece, que outros sejam afetivamente envolvidos mais de quanto ele/ela o seja).

Para corroborar com o entendimento acima, alguns pesquisadores identificam

cinco padrões comportamentais diferentes, quais sejam, o ressentido ou invejoso, o

carente de afeto, o cortejador incompetente, o rejeitado e o predador. Porém, os

rejeitados (típico amante abandonado) são considerados a categoria mais comum.

5.2 Depressão e Estresse Pós-traumático

Apesar do stalking ter sempre existido, muitos profissionais não sabem como lidar

com essa patologia e para ela ainda não se encontrou uma cura. Para Cristina

Almeida 29 , acompanhamento médico e psicoterapia são indicados, e ações

preventivas tem sido testadas entre adolescentes com reuniões de grupo e

conscientização promovidas por associações europeias.

Contudo, o apoio psicológico não deve se restringir somente ao stalker. Neste

prisma, Ademir da Veiga citado por Natália Gomes de Vasconcelos e Marconi Neves

Macedo (2015, p.21)30, assevera que,

[...] os efeitos potenciais de stalking atingem a saúde mental e emocional da vítima infligindo-lhe uma negação ou dúvida, ou seja, a vítima não acredita o que lhe está acontecendo. Em seguida, ao perceber a gravidade do fato, a vítima é tomada de uma frustração, culpa, vergonha, baixa autoestima, insegurança, choque e confusão, irritabilidade, medo e ansiedade, depressão, raiva, isolamento, perda de interesse, em continuar desenvolvendo suas atividades corriqueiras, sentimentos suicidas, perda de confiança em sua própria percepção, sentimento violento para com o Stalker, habilidade diminuída ao executar o seu trabalho ou escola, ou de realizar tarefas diárias. Isso tudo causa efeitos potenciais da saúde psicológica da

29 ALMEIDA, Cristina. http://cienciaesaude.uol.com.br/ultnot/2009/02/06/ult4477u1332.jhtme. Acesso em: 10/10/2017. 30 VASCONCELOS, Natália Gomes de. MACEDO, Marconi Neves. Stalking e o novo código penal brasileiro: desmistificando conceitos de uma problemática emergente na sociedade contemporânea. Revista Cultural e Científica do UNIFACEX. 2015, p. 21

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vítima de stalking como distúrbios do sono, problemas sexuais e de intimidade, dificuldade de concentração, fadiga, fobias, ataques de pânico, problemas gastrointestinais, flutuação do peso, automedicação e desordem pós-traumática (sic) do estresse [...].

Novamente, o site “Levar o Stalking* a Sério – Assédio Persistente” 31

apresenta informações relevantes, ao descrever os impactos na vítima. Vejamos.

Na saúde física: distúrbios digestivos, alterações de apetite, náuseas, dores de cabeça, insónias, pesadelos, fraqueza, cansaço, exaustão, alterações na aparência física (exemplo: mudar a cor e/ou cortar o cabelo). Em consequência de ferimentos causados pelo/a perpetrador/a podem ocorrer lesões físicas, tais como: hematomas, queimaduras, ferimentos de arma branca, ferimentos de arma de fogo.

Neste sentido, é de suma importância que tanto o stalker – que,

provavelmente sofre de algum transtorno psicológico – e vítima, sejam acompanhados

após os eventos traumáticos, ocasionados pelo stalker.

5.3 Breves Casos de Stalking

Como um exemplo de caso concreto de stalking, mais precisamente no Brasil,

pode-se citar aquele ocorrido com a modelo e apresentadora Ana Hickmann, ocorrido

em 2016.

De acordo coma jornalista Hyndara Freitas32, Rodrigo Augusto de Pádua

(stalker), de 30 anos, invadiu o quarto de hotel da apresentadora (vítima) armado

dizendo ser apaixonado por ela, além de ter ameaçado sua assessora e seu cunhado.

Neste episódio, Rodrigo acabou morto a tiros pelo cunhado da apresentadora.

A matéria informa que, de acordo com a apresentadora e com as

investigações da polícia, Pádua perseguia Ana nas redes sociais e postava inúmeras

declarações de amor a ela. Somente em um dos vários perfis que Rodrigo tinha,

haviam cerca de 64 (sessenta e quatro) mensagens, em maio de 2015, direcionadas

ao perfil de Ana Hickmann. O conteúdo se alternava entre mensagens de amor,

admiração e xingamentos.

31 Levar o stalking* a sério – assédio persistente. Comportamentos de stalking/assédios persistentes. Disponível em https://www.apav.pt/stalking/index.php/features. Acesso em 02/09/2018. 32 FREITAS, Hyndara. Stalking: a perseguição obsessiva que vai muito além das redes sociais. Disponível em http://emais.estadao.com.br/noticias/comportamento,stalking-a-perseguicao-obsessiva-que-vai-muito-alem-das-redes-sociais,10000055196. Acesso em: 09.10.2017.

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Hyndara Freitas continua a matéria informando que o psiquiatra Mario Louzã,

avaliou que a família dele "não tinha noção da gravidade do problema. Ele tinha toda

uma preparação, isso não aconteceu de um dia pro outro, mas a família

aparentemente não se deu conta da gravidade do caso dele". É comum, entre os

perseguidores, que essa linha entre amor e ódio seja muito tênue.

Além da apresentadora, diversos artistas já foram vítimas de stalkers. O caso

mais conhecido é o de John Lennon, que, em 1980, foi morto por Mark Chapman, que

se dizia seu fã. Mark visitava o prédio de Lennon frequentemente para perguntar dele

e o acompanhava nos eventos que participava.33

Segundo Louzã, citado por Hyndara Freitas34 o stalking não está registrado

na classificação internacional de doenças como uma patologia, mas sim como um

comportamento. "Nós consideramos o stalking um comportamente secundário a

alguma coisa, mas não necessariamente a pessoa tem algum problema psiquiátrico

por trás." O maior desafio no diagnóstico do perseguidor é a falta de percepção de

quem está próximo a ele. O médico diz que, em geral, "o stalker é discreto, subliminar".

Por isso, os stalkers raramente recebem ajuda psicológica ou psiquiátrica. "Eles se

envolvem nisso e não consideram um problema." Louzã afirma que não é possível

traçar um perfil dos perseguidores ou explicar as causas do comportamento, mas

acredita que, na maioria das vezes, "aquela pessoa [a vítima] passa a representar

uma espécie de ideal para o stalker, ou um ideal no sentido de alguém onipotente ou

no sentido de amor".

Acima foram apresentados breves casos de stalking ocorridos com

celebridade nacional e internacional. Inobstante, mostra-se imperioso reforçar que

qualquer cidadão está submetido à prática de stalking, isto é, não é um crime que

ocorre exclusivamente com celebridades.

Como já apresentado no decorrer do presente estudo, basta que o stalker se

sinta convencido de que a vítima seja “merecedora” de sua atenção, para que a “caça”

e a perseguição de iniciem.

33 FREITAS, Hyndara. Stalking: a perseguição obsessiva que vai muito além das redes sociais. Disponível em http://emais.estadao.com.br/noticias/comportamento,stalking-a-perseguicao-obsessiva-que-vai-muito-alem-das-redes-sociais,10000055196. Acesso em: 09.10.2017. 34 FREITAS, Hyndara. Stalking: a perseguição obsessiva que vai muito além das redes sociais. Disponível em http://emais.estadao.com.br/noticias/comportamento,stalking-a-perseguicao-obsessiva-que-vai-muito-alem-das-redes-sociais,10000055196. Acesso em: 09.10.2017.

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5.4 Há Desequilíbrio Químico no Comportamento do Stalker?

Inicialmente, para se iniciar o presente tópico, mostra-se fundamental uma

compreensão acerca de desequilíbrio químico comportamental.

Ocorre que, estudiosos afirmam existem indícios de desequilibro químico no

comportamento dos agressores.

Nádia Helena Marciano, citada por Brenda Bellani35,

O excesso da substância química chamada Dopamina influencia desordenadamente a motivação e o desejo; ao passo que a diminuição da Serotonina desencadeia estados de depressão e ansiedade. Mais de 60% deles são deprimidos, vivendo constantes oscilações de humor com sentimento de frustração, rejeição e pensamentos destrutivos.

Por fim, explica36 que “A busca do alívio desses sintomas é a crença ilusória

de que sua “salvação” e satisfação estão no relacionamento com a pessoa escolhida,

a qual preencheria irrestritamente suas necessidades”.

Neste sentido, verifica-se que o estudo ao redor do stalking não deve se limitar

somente na questão da prática propriamente dita. São muitas as vertentes que

influenciam a prática de stalking, como pode-se observar no decorrer do presente

trabalho.

5.5 Genótipos

O gene é considerado pelos estudiosos como outro fator importante, para as

discussões e pesquisas relacionadas ao stalking.

De acordo com Mário Luiz Ramidoff e Cesare Triberti (2017, p.77)37,

Para os geneticistas seria interessante analisar o patrimônio genético de um stalker para apurar se existem alterações na relação ao patrimônio de seus consanguíneos e se eventuais alterações seriam tais a ponte incidir sobre o comportamento de uma pessoa e ou de certo grupo. De fato, para esses cientistas a vasta extensão de comportamentos extremos - como de stalking – também poderia ter uma base biologia e, por isso, não poderia ser somente definida como simples desvio social.

35 BELLANI, Brenda. Psicóloga explica perfil e comportamento de stalkers. Disponível em https://sobrelivrosetraducoes.com.br/psicologa-explica-comportamento-de-stalker/. Acesso em 02/09/2018. 36 BELLANI, loc. cit. 37 RAMIDOFF, Mário Luiz. TRIBETTI, Cesare. Atos persecutórios obsessivos ou insidiosos. 2017, p. 77.

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Neste sentido, a teoria acima apresentada, em suma se baseia na ideia do

evolucionismo genético destes sujeitos. Isto é, os genes negativos, estimulados pelo

egoísmo, violência e necessidade de poder, teriam se desenvolvido mais

rapidamente, em relação ao desenvolvimento da própria sociedade.

Mário Luiz Ramidoff e Cesare Triberti (2017, p.77)38 reforçam o tema ainda,

abordando um exemplo específico, que poderia justificar a teoria acima, vejamos:

Por exemplo, o vândalo de estádio, salvo casos de patologia clínica, para os geneticistas/ biologicistas, seria um ser reprovável, fortemente antissocial em relação a outros sujeitos que não fossem aqueles do próprio grupo de torcedores, inclusive, por tal concepção cientifica, é compreendido como um ser incentivado a comportamentos violentos, ainda que não fosse diretamente ligado a qualquer torcida organizada de futebol, mas, contudo, encontrando neste mote uma suposta justificação para seus comportamentos agressivos.

Desta forma, podemos constatar que muitos são os estudos e áreas

atualmente mobilizados para buscar uma melhor compreensão, acerca da prática de

stalking. Importante observar que, não os estudos e teorias levantadas para a

explicação do stalking não se resumem apenas a esta conduta.

Ocorre que, um dos principais objetivos para a compreensão desta prática, e

dos que a praticam, é a diferenciação desta em relação a outras semelhantes. Como

exemplo, podemos citar as ações praticadas pelo psicopata e pelo bully, isto é, aquele

que pratica o bullying.

Sob esta ótica, percebe-se que as três condutas são muito similares – todas

procuram exercer medo e terror sobre suas vítimas –, mas o que as diferencia são

seus propósitos. Como já mencionado, o stalker tem como propósito instigar o medo

em sua vítima, e influenciar significativamente na vida da mesma. O psicopata por sua

vez, tem ações muito semelhantes ao do stalker, podendo citar como exemplos, a

ausência de empatia e remorso.

Por outro lado, o bully – ainda que exista uma aproximação das práticas

utilizadas pelo stalker – quer somente exercer o medo sobre a sua vítima,

manifestando, entretanto, empatia em relação ao caso, e ausência da busca pelo

domínio da vítima, satisfazendo-se tão somente com o medo empregado.

38 RAMIDOFF, Mário Luiz. TRIBETTI, Cesare. Atos persecutórios obsessivos ou insidiosos. 2017, p. 77.

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33

Para corroborar com o entendimento acima, Mário Luiz Ramidoff e Cesare

Triberti (2017, p.79)39 reforçam que,

O bully (agressor) não quer o domínio da vida da vítima, tem a satisfação com o simples medo imposto agressivamente à vítima, mesmo condicionando física e psicologicamente a vida da vítima, e, por isso mesmo, não pretende obter resultados do tipo “ou comigo ou com ninguém”.

E ainda, os mesmos Autores40 concluem que,

[...] seria possível com base na perspectiva genético-biológica aproximar o stalker do psicopata para fins de imputabilidade penal; inclusive, para tanto, tornando-se desnecessária a discussão sobre a ausência de capacidade de entendimento ou do querer.

Assim, ante o exposto, constata-se que é fundamental uma análise mais

aprofundada do tema aqui proposto, visto que se trata de prática exercida por ser

humano evidentemente complexo, que transcendem as condutas superficialmente

apresentadas pelo praticante, qual seja, o stalker.

39 RAMIDOFF, Mário Luiz. TRIBETTI, Cesare. Atos persecutórios obsessivos ou insidiosos. 2017, p. 79. 40 RAMIDOFF, loc. cit.

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34

6 STALKING NAS LEGISLAÇÕS INTERNACIONAIS

Tendo em vista a gravidade da prática de stalking e as negativas

consequências para a sociedade, bem como a ausência de legislação específica no

Brasil, se demonstra indispensável a análise do tema por meio do Direito

Comparado.

Isto, pois como já mencionado, há países cujo tema tem sido estudado há

anos. Neste sentido, é vital vislumbrar as respostas encontradas pelos legisladores

estrangeiros para lidar com o assunto, as penas cominadas, os núcleos dos tipos,

as similaridades e diferenças entre uma legislação e outra.

Seguindo o caminho iniciado pelo Estado da Califórnia, dos Estados Unidos,

vários países consideram o stalking como crime. A sanção e a construção do tipo

penal variam de um lugar para outro, de acordo com os princípios e modelos de

jurisdição de cada local. Hoje em dia é um fenômeno mundial que se espalha de

forma rápida pelo mundo. Índia, Inglaterra, Austrália, Itália, Canadá, China e Japão,

são apenas alguns exemplos de nações que já possuem o stalking previsto em sua

codificação. Não obstante, é essencial aclarar que tal fenômeno não acontece

apenas nos países que o tipificam diretamente, ao contrário, é um acontecimento

global, reconhecido tanto pela psicologia quanto pelos operadores do direito, que

atinge uma considerável parcela da população mundial nas mais diferentes

localidades.41

Oportuno esclarecer que, o surgimento de leis anti-stalking nesses países

não foi meramente um acaso. Cada país desenvolveu sua análise específica, bem

como aperfeiçoou suas penalidades mediante algum acontecimento específico, que

originou a atenção para a prática. Assim, mediante o pleito da sociedade para

respostas do legislativo, estes países desenvolveram a tipificação específica, e,

conforme estudiosos apresentaram, encontraram nela uma solução.

Neste norte, afirma Jamil Melo42 que,

41 MELO, Jamil. O crime de stalking e seu reflexo na legislação brasileira. Publicação em: 16/06/2016. Disponível em: http://emporiododireito.com.br/o-crime-de-stalking-parte-5. Acesso: 11/11/2017 42 MELO, Jamil. O crime de stalking e seu reflexo na legislação brasileira. Publicação em: 16/06/2016. Disponível em: http://emporiododireito.com.br/o-crime-de-stalking-parte-5. Acesso: 25/08/2018.

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O reconhecimento do stalking como crime pela primeira vez surgiu com as perseguições sofridas pelas celebridades norte-americanas. O maior exemplo é Rebecca Shaeffer, perseguida por seu stalker durante dois anos antes de ser assassinada por ele com vários tiros em frente de sua residência no dia 18 de julho de 1989, foi este ato que levou o Estado da Califórnia a promulgar a primeira lei anti-stalking

Assim, considerando o avanço nos estudos sobre o presente tema, uma vez

comparados ao Brasil, a seguir, o presente estudo apresentará uma análise da

legislação nos Estados Unidos, mais especificamente nos estados do Texas e da

Califórnia, bem como França e Itália. É imprescindível ressaltar que algumas

traduções podem ser incompatíveis com o idioma português, especialmente em

relação aos tipos penais, todavia, para uma melhor compreensão do assunto, deve-

se levar em consideração o escrito no idioma original.

6.1 O Stalking na Legislação dos Estados Unidos

No tocante aos Estados Unidos, cabe inicialmente relembrar que

criminalização varia de acordo com cada Estado, isto é, cada Estado possui uma

tipificação específica em seu Código Penal. Existe a Lei Federal, que regula o crime

em casos interestaduais, por exemplo, mas ela não tem validade dentro dos Estados,

que são analisados separadamente (a lei federal dos Estados Unidos também pune o

crime de stalking). 43

As variações penais nos Estados são diversificadas, não há um padrão com

pequenas modificações, cada Estado faz a sua escolha da maneira que achar mais

adequada.

No caso do stalking por exemplo, algumas leis Estaduais exigem que o autor,

faça uma ameaça direta à vítima para que possa ser qualificado como um stalker,

enquanto outros exigem apenas uma ameaça implícita (de uma forma ou de outra, a

ameaça deve ser plausível, da mesma forma que estão presentes o curso de conduta

e a perseguição, seja de forma explícita ou implícita).

Sob esta ótica, de acordo com Mario Luiz Ramidoff e Cesare Triberti (2017,

p.141)44, o Estado pioneiro a tipificar a conduta foi o da Califórnia, vejamos:

43 MELO, Jamil. O crime de stalking e seu reflexo na legislação brasileira. Visualização em: http://emporiododireito.com.br/o-crime-de-stalking-parte-5. Publicação em: 16/06/2016. Acesso: 11/11/2017. 44 RAMIDOFF, Mário Luiz. TRIBETTI, Cesare. Atos persecutórios obsessivos ou insidiosos. 2017, p. 141.

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Em particular, o primeiro Estado que promulgou uma legislação específica sobre stalking foi o da Califórnia no ano de 1990. Até aquele momento, era impossível para a Polícia agir, uma vez que era necessária a verificação de um real ataque físico à vítima, quando, então, tornava-se possível o enquadramento jurídico-legal numa das hipóteses tipificadas, nos respectivos Códigos, como casos penalmente relevantes que ensejavam responsabilização penal.

Os aludidos autores45 reforçam que, no tocante ao cyberstalking,

Na previsão da legislação californiana não existe nenhuma referência direta aos atos invasivos (intrusivos) e ou persecutórios que se realizavam pelo meio computacional, eletrônico, informático, ou telemático, isto é, ao que se convencionou cyberstalking, mas de qualquer forma, aquela legislação representou um bom ponto de partida para as discussões a respeito do assunto.

Outrossim, relevante informar que o “Instituto Nacional de Justiça Anti-

Stalking” criou um “código modelo” para auxiliar os Estados na elaboração de suas

leis. Para o referido código, não é necessário que os stalkers façam uma ameaça

plausível, a única exigência é que as vítimas sintam um alto nível de medo,

colocação que não foi aceita pela maioria das legislações americanas e pela doutrina

(os autores são unânimes ao considerar o medo como uma questão relevante,

porém não pode ser visto de forma isolada). 46

A seguir, analisaremos individualmente o posicionamento dos estados da

Califórnia e do Texas.

6.1.1. O Stalking no Estado do Texas

Como o tipo penal em ambos os Estados são extensos e extremamente

detalhistas serão analisados parte a parte, para a melhor compreensão do assunto47.

Vejamos inicialmente a previsão do Código Penal Texano.

45 RAMIDOFF, loc.cit. 46 MELO, Jamil. O crime de stalking e seu reflexo na legislação brasileira. Visualização em: http://emporiododireito.com.br/o-crime-de-stalking-parte-5. Publicação em: 16/06/2016. Acesso: 11/11/2017 47 MELO, Jamil. O crime de stalking e seu reflexo na legislação brasileira. Visualização em: http://emporiododireito.com.br/o-crime-de-stalking-parte-5. Publicação em: 16/06/2016. Acesso: 11/11/2017

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Texas Penal Code Sec. 42.072. Stalking. (a) Uma pessoa comete o crime se, em mais de uma ocasião e de acordo com um mesmo esquema ou curso de conduta, que é direcionada especificamente para outra pessoa, intencionalmente se envolve nesta conduta, incluindo seguir esta pessoa, que:(1) O agente sabe ou acredita que ela irá considerar como uma ameaça de:(A) Lesão Corporal ou morte;(B) Lesão Corporal ou Morte para um membro de sua família ou um indivíduo com quem ela tenha uma relação íntima;(C) Que um delito será cometido contra o seu patrimônio.

Como pode-se observar, a primeira parte pontua elementos doutrinários de

grande importância. Quem comete o crime para o Código Penal Texano, tem

consciência do que está fazendo, de modo que a escolha pelo termo

“intencionalmente” afasta a incidência da modalidade culposa e não deixa espaço

para outras interpretações. O curso de conduta aparece de forma direta, o que torna

obrigatório a presença de uma série de atos que causem medo na vítima. Não

suficiente à escolha pelo curso de conduta, o legislador optou por colocar a palavra

“seguir” de forma explícita, como forma de enfatizar a perseguição.

O Código Penal ainda pontua o “tipo da ameaça” causado pelo autor e as

diferentes formas de projetá-la. Pode ser ameaça de lesão corporal ou a ameaça de

morte contra a vítima ou contra seus familiares, e ainda contra o patrimônio (neste

ponto o artigo fala apenas em patrimônio da vítima). Isto é, definitivamente, a ameaça

plausível que os estudiosos do assunto apontam como essencial para a

caracterização do fenômeno.

Em um segundo momento, o Código Penal Texano 48 aborda outras

informações importantes. Vejamos.

(2) Causa a outra pessoa ou a um membro de sua família um medo de sofrer lesões corporais ou morte ou medo de que um delito possa ser cometido contra sua propriedade; (3) Causaria medo a uma pessoa razoável:(A) De Sofrer lesões corporais ou morte; (B) Que um membro de sua família ou um indivíduo com quem esta pessoa tenha uma relação íntima sofra lesões corporais ou morte; ou; (C) Que uma ofensa possa ser cometida contra sua propriedade.

Nesta parte é abordado especificamente o medo, ou seja, o dano

psicológico. O legislador optou por praticamente repetir alguns termos expressos na

primeira parte, trocando o núcleo de “ameaça” para “medo”. Ao escolher esse termo

fica clara a opção em criminalizar não só a ação do stalker, que é o ameaçar,

previsto anteriormente, mas também a reação provocada na vítima, ou seja, o medo.

48 MELO, loc. cit.

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38

Deste modo, o Estado do Texas escolheu um modo peculiar de tipificação,

pois pune não apenas a ameaça em si, mas também o medo causado na vítima, de

forma autônoma ao outro dano. Desta forma, não é necessária a observâncias de

ambas condutas, bastando apenas uma para consumar a tipificação.

Por último, a legislação Texana aponta alguns complementos, como a pena

a ser aplicada e o significado de alguns termos:49

(b) Uma ofensa dentro desta seção é um crime de terceiro grau, exceto se o delito for de segundo grau, caso o autor já tenha sido previamente condenado por este mesmo crime ou se cometeu o delito dentro das seguintes leis que contém elementos similares com os desta seção: (1) As leis de outro estado; (2) As leis de uma tribo indígena, reconhecidas pelo governo federal; (3) As leis de um território dos Estados Unidos; e (4) A lei Federal. (c) Para os fins desta seção, o juiz do fato pode descobrir quais diferentes tipos de condutas descritos na subseção (A), caso aconteçam mais de uma vez, constituem uma conduta que está de acordo com o mesmo esquema ou curso de conduta; (d) Nesta seção, “família”, “membros da família” tem definição no capítulo 71 do código da Família.

Os crimes no referido Estado são divididos em graus, sendo estes o primeiro,

segundo e terceiro grau. No caso do stalking, por exemplo, pode ser caracterizado

como um crime de segundo ou terceiro grau. Os crimes de segundo grau têm sanção

de dois a vinte anos de prisão e multa não superior a dez mil dólares, sendo que os

crimes de terceiro grau são punidos com prisão de dois a dez anos e multa não

superior a mil dólares.

O stalking foi incluído no Código Penal Texano como um crime de terceiro

grau e, caso o ofensor já tenha sido condenado neste mesmo crime – seja dentro ou

fora do Texas –, como um crime de segundo grau. Infere-se que caso o autor seja

condenado, a pena mínima é de dois anos, contudo a variação é muito ampla, já que

o ofensor pode ficar até vinte anos preso (a pena máxima de vinte anos dificilmente

é aplicada).

Mesmo com uma pena máxima intangível, a punição é severa para uma

ofensa que, em determinadas situações (seja a maioria ou minoria), não traz grandes

efeitos para a vítima.

49 MELO, Jamil. O crime de stalking e seu reflexo na legislação brasileira. Visualização em: http://emporiododireito.com.br/o-crime-de-stalking-parte-5. Publicação em: 16/06/2016. Acesso: 11/11/2017

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6.1.2. O Stalking no Estado da Califórnia

No tocante a legislação californiana,50, informam que [...] não existe nenhuma

referência direta nos atos invasivos (intrusivos) e ou persecutórios que se realizavam

pelo meio computacional, eletrônico, informático ou telemático [...]. O Califórnia Penal

Code [ Section 646.9.Stalking. 1990 (Amended 1994)], citado e traduzido por Mario

Luiz Ramidoff e Cesare Triberti (2017, p. 140)51 define o crime de stalking:

Qualquer pessoa que, intencionalmente, maliciosamente e repentinamente, segue ou assedia outra pessoa e, quem pratique uma ameaça crível com a intenção de deixar aquela pessoa com um medo razoável da própria segurança [...] é culpado do crime de stalking.

Por sua vez, o Código Penal da Califórnia52 – como já mencionado, pioneira

na criminalização do stalking – possui uma tipificação mais complexa e longa do que

a do Texas, uma vez que há definições específicas sobre as palavras utilizadas no

caput do tipo, além de abordar outros elementos de forma específica, conforme:

California Penal Code § 646.9. Stalking - Qualquer pessoa que intencionalmente, maliciosamente, e repetidamente seguir ou deliberadamente e maliciosamente assediar outra pessoa e que faz uma ameaça plausível com a intenção de colocar nessa pessoa um medo razoável em sua segurança ou na segurança de sua família é culpado pelo crime de stalking, punido com prisão em cadeia do condado por não mais de um ano, ou por multa não superior a 1.000 dólares, ou multa e prisão, ou prisão em penitenciária estadual.

Assim, o caput do tipo penal discorre que quem comete o crime de stalking

pratica ameaça ou assédio intencional, malicioso e repetido contra outra pessoa,

que contenha força para causar medo na segurança dela ou de sua família. Para

tanto, a pena é de no máximo um ano de prisão ou multa de no máximo mil dólares,

podendo ser aplicada cumulativamente53.

50 RAMIDOFF, Mário Luiz. TRIBETTI, Cesare. Atos persecutórios obsessivos ou insidiosos. p. 140. 51 RAMIDOFF, loc. cit. 52 MELO, Jamil. O crime de stalking e seu reflexo na legislação brasileira. Visualização em: http://emporiododireito.com.br/o-crime-de-stalking-parte-5. Publicação em: 16/06/2016. Acesso: 11/11/2017 53 MELO, Jamil. O crime de stalking e seu reflexo na legislação brasileira. Visualização em: http://emporiododireito.com.br/o-crime-de-stalking-parte-5. Publicação em: 16/06/2016. Acesso: 11/11/2017.

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40

Inobstante, a primeira grande discussão é quanto à sanção imposta. A pena

de no máximo um ano é muito inferior que a imposta pelo Texas, deixando as

diferenças entre as legislações dentro dos Estados Unidos evidentes. Há, também,

uma relação entre a ameaça e o medo, este é decorrência daquele, e são

observados conjuntamente e não separadamente, entendimento novamente

diferente do aplicado no Estado do Texas. 54

Nota-se que o “dolo” é novamente observado no ordenamento jurídico, pelo

Estado Californiano, de modo que as ações de “seguir” e “assediar” devem ser

intencionais.

Alguns elementos que melhor caracterizam o stalking igualmente se

apresentam na tipificação Californiana. A perseguição está evidente nos termos

“seguir” e “assediar”, enquanto a ameaça plausível aparece de forma expressa. O

curso de conduta está caracterizado pelo “repetidamente”, e possui uma definição

própria ao longo do corpo do artigo. O tipo ainda fala do escopo dessa ameaça, que

é causar medo na segurança da vítima ou de seus familiares. Frise-se, novamente,

que o medo aparece como um elemento essencial para a caracterização do delito.

Por oportuno, o California Penal Code citado por Mario Luiz Ramidoff e

Cesare Triberti (2017, p. 140) 55 define o assédio como,

Um comportamento voluntario e consciente direto contra uma pessoa especifica, que a deixe seriamente em alarme, a disturbe, atormente ou aterrorize e que não tenha nenhum motivo legitimo. O comportamento deve ser tal a induzir uma pessoa razoável a sofrer de um notável estresse emotivo e deve efetivamente causar um notável estresse emotivo a pessoa a quem tal comportamento é endereçado.

Os aludidos Autores (2017, p.141)56 reforçam ainda, que em 1993, também

o California Civil Code foi modificado para incluir “remédios cíveis” para as vítimas de

stalking (The California Civil Code [Section 1708.7:Stalking; Tort Action; Damages And

Equitable Remedies. 1993]) com a seguinte formulação:

Uma pessoa é responsável pelo crime de stalking quando o ator (n.d.r.: vítima) prova todos os seguintes elementos do erro: (1) O imputado tinha um modelo de comportamento cuja intenção era aquela de seguir, alarmar ou assediar o ator. (2) Como resultado de tal modelo de comportamento, o ator

54 MELO, loc. cit. 55 RAMIDOFF, Mário Luiz. TRIBETTI, Cesare. Atos persecutórios obsessivos ou insidiosos. 2017, p. 140. 56 Ibidem, p. 141.

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tinha razão de temer pela própria segurança [...]. (3) O imputado, como parte do modelo de comportamento como no início do parágrafo 1, praticou uma ameaça crível com a intenção de incutir no ator um medo razoável da própria segurança [...] e, pelo menos em uma ocasião, o ator pediu em modo claro e definitivo que o acusado cessasse tal comportamento e ele persistiu na sua conduta.

Mario Luiz Ramidoff e Cesare Triberti (2017, p.141)57 explicam ainda que:

O Califórnia Civil Code define o termo “assédio” nos mesmos termos do que restou definido no Califórnia Penal Code, conforme acima já assinalado. A iniciativa do Estado da Califórnia em matéria de stalking teve imediata consequência política e jurídica, pois em muitos outros Estados dos Estados Unidos da América do Norte (EUA), os quais introduziram respectivamente legislações similares, mas não necessariamente idênticas aquela que foi a precursora na regulamentação de tais condutas.

Os aludidos Autores58 reforçam ainda que,

Graças à rápida difusão da internet, no início dos anos 90, os stalkers encontraram uma nova área que oferecia novas ferramentas para atormentar, agredir e molestar suas vítimas. As leis dos Estados norte-americanos eram e ainda são muito inadequadas para regular e solucionar as questões relacionadas ao particular problema do on-line. São poucos Estados norte-americanos, que, hoje, incluem o assédio on-line nas suas respectivas legislações sobre stalking dentre os quais o Estado de Michigan que, em 1993, foi o primeiro a inclui-las em sua legislação estadual.

Continuando a análise do Código Penal Californiano59, o mesmo apresenta

algumas situações que importam em aumento de pena. Vejamos.

(b) Qualquer pessoa que viole a subdivisão (a) quando tiver uma ordem de restrição temporária, liminar, ou qualquer outra ordem judicial em vigor que proíbe o comportamento descrito na subdivisão (a) contra a mesma pessoa, deve ser punido com prisão na penitenciária estadual por dois, três ou quatro anos. (c) (1) Qualquer pessoa que, depois de ser condenado pelo crime descrito na seção 273.5, 273.6 ou 422, cometer uma violação a subdivisão (a) deve ser punido com prisão na cadeia do condado por não mais de um ano, ou por multa não superior a 1.000 dólares, ou por multa e prisão, ou por prisão em penitenciária estadual por dois , três ou cinco anos. (2) Toda pessoa que, depois de ter sido condenada por um delito da subdivisão (a), comete uma violação desta seção, deverá ser punida com prisão em penitenciária estatal por dois, três ou cinco anos.

57 RAMIDOFF, loc. cit. 58 RAMIDOFF, Mário Luiz. TRIBETTI, Cesare. Atos persecutórios obsessivos ou insidiosos. 2017, p. 141. 59 MELO, Jamil. O crime de stalking e seu reflexo na legislação brasileira. Visualização em: http://emporiododireito.com.br/o-crime-de-stalking-parte-5. Publicação em: 16/06/2016. Acesso: 11/11/2017

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42

Nesta hipótese, caso o autor seja reincidente no crime de stalking e incorra

na ofensa contra uma pessoa que possui uma ordem judicial contra ele, ou ainda, já

tenha sido condenado por lesão corporal (seção 273.5), violação de uma ordem de

proteção (seção 273.6) ou por ameaças criminosas (seção 422) contra

cônjuge/companheiro, receberá uma pena mais severa que a prevista no caput do

artigo.

Estas penas consideradas maiores, ao serem transportadas para o direito

brasileiro, podem ser consideradas como as qualificadoras do crime de stalking, visto

que há um aumento na pena descrita diretamente pelo legislador, ou seja, inicia-se o

cálculo da pena base com essas modificações. Não é uma majorante, pois o aumento

não é realizado na terceira fase do cálculo da pena. Da mesma forma não é uma

agravante, já que o limite máximo da pena em abstrato é modificado.

O aludido Código Penal60 apresenta ainda, as seguintes características:

(d) Além das sanções previstas, o tribunal pode condenar a pessoa condenada pelo crime desta seção a registrar-se como um agressor sexual, nos termos da seção 290.006.[20] (e) Para os fins desta seção, “assediar” significa se envolver em um curso de conduta intencional, direcionado a uma pessoa específica que a deixa alarmada, incomodada, atormentada ou aterrorizada, e que não sirva a nenhum propósito legítimo. (f) Para os fins desta seção, “curso de conduta” significa dois ou mais atos ocorridos durante um período de tempo, porém curtos, evidenciando uma continuidade de propósito. Atividades constitucionalmente protegidas não estão inclusas no significado de “curso de conduta”.

O item “d” não merece uma análise mais aprofundada, pois é uma

particularidade do direito da Califórnia, que não possui uma semelhança em outras

legislações sobre o stalking.

Todavia, os itens “e” e “f” são muitos importantes para a compreensão da

estrutura do crime. Isto, pois claramente o legislador optou por explicar taxativamente

o significado do termo “assediar”, que é um dos elementos principais do stalking, haja

vista que o assédio é uma forma de perseguição e está interligado com o curso de

conduta, além de ser um dos causadores de um dano psicológico na vítima. O item

“f”, para complementar o exposto no item “e”, traz o significado de “curso de conduta”,

60 MELO, Jamil. O crime de stalking e seu reflexo na legislação brasileira. Visualização em: http://emporiododireito.com.br/o-crime-de-stalking-parte-5. Publicação em: 16/06/2016. Acesso: 13/11/2017

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43

que é, para esta legislação, a repetição dos atos ocorridos em um curto período de

tempo. É uma definição bastante genérica, porém facilmente passível de

compreensão quando comparada com a definição exposta no item “e”, formando um

sistema.

O item “g” do aludido artigo61, por sua vez, prossegue com as definições e

discorre sobre o sentido de “ameaça plausível”, outro elemento essencial para a

caracterização do stalking:

(g) Para os fins desta seção, “ameaça plausível” significa ameaça verbal ou escrita, incluindo as realizadas através da utilização de um dispositivo de comunicação eletrônica, ou uma ameaça implícita por um padrão de conduta ou a combinação de formas verbais e escritas ou declarações transmitidas por via eletrônica e condutas, feitas com a intenção de causar na vítima um medo razoável pela sua segurança ou pela segurança de seus familiares e realizadas com a capacidade aparente de realizar a ameaça de forma a causar à pessoa que é o alvo da ameaça à razoavelmente temer pela sua segurança ou a segurança da sua família. Não é necessário provar que o acusado tinha a intenção de causar a ameaça. A reclusão atual da pessoa que faz a ameaça não deve ser um obstáculo de acusação dentro desta seção. Atividades constitucionalmente protegidas não estão inclusas no significado de “ameaça plausível” (h) Para os fins desta seção, o termo “dispositivo de comunicação eletrônico” inclui, mas não se limita a telefones, celulares, computadores, câmeras de vídeo, máquinas de fax, ou Pager. “Comunicação eletrônica” tem o mesmo significado que o definido na subseção 12 da seção 2510 do título 18 do Código dos Estados Unidos.

A definição de ameaça plausível interliga-se de forma direta com as

definições supracitadas formando o corpo do tipo penal. O artigo escolheu definir

quais são os tipos de ameaças plausíveis que devem ser levadas em consideração.

Pode ser escrita ou verbal, incluindo as formas eletrônicas, o que engloba

o cyberstalking, de forma a não deixar lacunas nas formas modernas de ameaça

(observa-se que os dispositivos de comunicação eletrônica são elencados de forma

meramente exemplificativa), ameaças implícitas e condutas que funcionam como

ameaças. Novamente, o termo “medo razoável” foi utilizado, ressalta-se que ele deve

ser entendido como o medo que uma pessoa razoável sentiria, excluindo o mero

aborrecimento.

61 MELO, loc.cit.

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O artigo62 ainda apresenta algumas outras especificidades para melhor exemplificar o

assunto.

(i) Esta seção não se aplica à conduta que ocorre durante protestos de trabalho (j) Se for concedida liberdade condicional, ou a execução ou a imposição de uma sentença é suspensa, para qualquer pessoa condenada dentro desta seção, uma condição da liberdade condicional é a de a pessoa participar de programas de orientação, designado pelo tribunal. Entretanto, o tribunal, após uma demonstração de boa causa, pode decidir que a exigência de orientação não deve ser imposta. (k) (1) O tribunal de condenação também deve considerar emitir uma ordem de restrição na qual o réu não pode ter nenhum contato com a vítima, válida por até 10 anos, de acordo com determinação do tribunal. É a intenção da legislação que a duração de qualquer ordem de restrição seja baseada na gravidade dos fatos, a probabilidade de futuras violações e a segurança da vítima e de seus familiares. (2) Esta ordem de proteção pode ser emitida pelo tribunal quer o acusado seja condenado para prisão estadual, do condado, ou se a pena está suspensa e o acusado em liberdade condicional.

O item “i” tem como objetivo diferenciar o stalking de outras situações como

em protestos de trabalho, sendo a maneira encontrada para unicamente evitar

futuras discussões.

Já os itens “j” e “k” trazem importantes conceitos. Para que o acusado seja

solto (em qualquer caso de suspensão da pena), deve comparecer em sessões de

“aconselhamento”. É interessante esta forma de acompanhamento para evitar que o

acusado seja condenado novamente por stalking e também para ajudá-lo a superar

a obsessão, já que o stalking é um fenômeno psicológico. Esta forma de “punição”

é bastante moderna, e busca ajudar não só a vítima, mas também o acusado. Para

saber da efetividade deste acompanhamento é necessário um estudo específico e

profissionais capacitados para lidar com o problema, não sendo este o espaço

adequado para maiores discussões.

O item “k” exclusivamente, assenta a possibilidade de que seja cominada uma

ordem de restrição, a qual o autor não pode entrar em contato com a vítima por até

10 anos. É outra forma de preservar tanto o autor como a vítima, para evitar a prisão

daquele e proteger a liberdade desta, criando uma forma diferente de punição, que,

combinada com o aconselhamento previsto anteriormente, pode ter grande eficácia.

62 MELO, Jamil. O crime de stalking e seu reflexo na legislação brasileira. Visualização em: http://emporiododireito.com.br/o-crime-de-stalking-parte-5. Publicação em: 16/06/2016. Acesso: 12/11/2017

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Para finalizar, o artigo63 explica quem deve ser considerado “família” nestes

casos, além de tratar dos casos de inimputabilidade.

(l) Para os fins desta seção, “família” significa qualquer cônjuge, pai, filho, qualquer pessoa com relação sanguínea ou afinidade, até o segundo grau, ou qualquer outra pessoa que regularmente reside na casa ou dentro de seis meses anteriores residiu na casa da vítima. (m) O tribunal deve considerar se o acusado se beneficiaria do tratamento proposto na seção 2684. Caso o tratamento seja apropriado, o tribunal deve recomentar que o Departamento de correção e reabilitação faça a certificação prevista na seção 2684. Após a certificação, o acusado deve ser avaliado e transferido para o hospital de tratamento apropriado, nos termos da seção 2684.

A seção 2684 abordada na citação do artigo acima, trata especificamente

dos casos em que resta reconhecida a inimputabilidade do ofensor, devendo o

mesmo ser transferido para um estabelecimento apropriado.

Isto, pois como já demonstrado no presente estudo, em muitos casos a

prática de stalking está diretamente ligada a alguma patologia, de modo que o

ordenamento jurídico não poderia desconsiderá-lo.

6.2 O Stalking na Legislação Francesa

A França não tem uma normativa específica contra o stalking, tratando os

assédios sexuais no local de trabalho ou em família com específicas previsões

tipológicas em seu Código Penal, mas, sem, contudo, ter disciplinado organicamente

o fenômeno do stalking, mesmo aderindo as definições a respeito desse novo instituto

jurídico-legal, então oferecidas não só pelos Estados Unidos da América do Norte

(EUA), mas também, através de outras legislações estrangeiras.64

Em 17 de maio de 2010, foi apresentado ao Senado Francês um projeto de

lei que se destinava à regulamentação interno dos atos invasivos, persecutórios,

obsessivos e insistentes. De qualquer modo, a doutrina e a medicina francesas

concordam em delinear as características de um comportamento similar, distinguindo-

se, contudo, das definições já acolhidas por outras nações. É possível, no entanto,

63 MELO, Jamil. O crime de stalking e seu reflexo na legislação brasileira. Visualização em: http://emporiododireito.com.br/o-crime-de-stalking-parte-5. Publicação em: 16/06/2016. Acesso: 11/11/2017 64 RAMIDOFF, Mário Luiz. TRIBETTI, Cesare. Atos persecutórios obsessivos ou insidiosos. 2017, p. 141-142.

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reassumir o pensamento seguido para além dos Alpes, segundo o qual “a perseguição

furtiva” é definível como “a procura persecutória e a pratica de assédios repetidos,

intencionais e danosos de uma pessoa em relação a outra pessoa, em modo tal a

ameaçar a sua segurança”.65

A definição varia segundo os estudos, mas existem semelhanças entre as

várias definições utilizadas: existirá sempre uma vítima e um

agressor/perseguidor/molestador (um stalker), cujas linhas de ação aparecem sob a

forma de instruções repetidas e indesejadas na privacidade e intimidade da vítima;

criando-se, assim, uma sensação de medo e de insegurança para a pessoa vitimada

pelos atos invasivos e ou persecutórios violentos.

6.3 O Stalking na Legislação Italiana

No tocante, a Legislação Italiana, o Decreto Lei n.11, de 23 de fevereiro de

2009, então, convertido na Lei italiana n. 38, de 23 de abril de 2009, previu a prática

de stalking, declarando ser expressamente proibido, e ainda, punindo penalmente o

agressor, conforme o que restou acrescido legalmente no Código Penal,

sucessivamente, no art. 612 que pune “a ameaça”, os acréscimos e as novas figuras

legislativas (arts. 577; 609-ter; 612-bis; e 612-ter.).

De acordo com Mario Luiz Ramidoff e Cesare Triberti (2017, p. 191)66, os atos

persecutórios, no entanto, estão descritos no art. 612-bis do Código Penal, vejamos:

Salvo quando o fato constitua crime mais grave, quem reiteradamente, com qualquer meio, ameaça ou molesta alguém em modo tal a provocar um grave distúrbio psíquico, ou a determinar um medo justificado pela própria segurança pessoal ou de uma pessoa próxima, ou de qualquer modo, a prejudicar em maneira relevante o seu modo de viver é punido, com queixa da pessoa ofendida, com a reclusão de seis meses a quatro anos. A pena é aumentada até dois terços se o fato for cometido por pessoa já condenada pelo delito, como previsto no primeiro parágrafo. A pena é aumentada até metade e se procede de oficio se o fato for cometido em relação a um menor ou se ocorre uma das condições previstas no art. 339. Também se procede de ofício se o fato for cometido com graves ameaças ou nos casos em que o fato for coligado a outro delito para qual é prevista a procedibilidade de ofício.

A pessoa que se julga ofendida por conduta que pode apresentar os elementos do crime, como previsto no art. 612-bis, pode apresentar a

65 GIORGIO, Marie-Théresé. Traque furtive ou stalking: nouvelle forme de harcèlement. 21 jun.2011. Disponível em: https://goo.gl/PJFUYH. Acesso em: 11.11.2017. 66 RAMIDOFF, Mário Luiz. TRIBETTI, Cesare. Atos persecutórios obsessivos ou insidiosos. 2017 p. 191.

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autoridade competente pedido de intimação do autor da mesma. Quando subsistam elementos específicos, em que possa ser considerado fundado o perigo de reiteração do crime, como previsto no art. 612-bis, a Autoridade de Segurança Pública, com a autorização do Ministério Público que procede e intima formalmente o investigado, para não praticar posteriormente atos persecutórios.

A intimação é notificada ao investigado de acordo com as formas previstas

nos arts. 148 e 171 do Código de Processo Penal Italiano.

Não obstante, uma vez realizada de forma regular e válida a intimação formal,

o investigado cometer novos atos persecutórios semelhantes aqueles já

expressamente comunicados à Autoridade Pública, constituir-se em crime punível de

ofício cuja pena detentiva prevista pelo parágrafo primeiro do art. 612-bis do Código

Penal italiano é aumentada em até 6 (seis) anos.

Assim, conclui-se a análise acerca do stalking sob a perspectiva de outros

países, e o avanço em relação aos estudos realizados e as consecutivas penalidades

impostas.

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7 LEI MARIA DA PENHA E A REFORMA PENAL BRASILEIRA

O presente estudo tem como propósito por meio deste capítulo, apresentar

uma breve relação entre stalking e a Lei n. 11.340/2006, sendo esta popularmente

conhecida no Brasil como Lei Maria da Penha.

Inicialmente, cabe esclarecer que a proposta deste tema não é apresentar

uma comparação, visto que se tratam de instituições distintas.

Contudo, é primordial levar-se em conta a realidade da sociedade,

especialmente a brasileira, quando a análise da violência é observada pelo viés da

violência contra a mulher.

Como já mencionado no decorrer do presente trabalho, o stalking pode

ocorrer com qualquer pessoa, seja famosa ou não, e seja homem ou mulher.

Contudo, também já foi apresentado a discrepância entre o número de casos

identificados, em relação as mulheres. Deste modo, as mulheres ainda são os alvos

mais atingidos pelos stalkers.

No tocante a Lei Maria da Penha, especificamente, sabe-se que a

promulgação da mesma adveio de um caso típico de violência doméstica, que

repercutiu nacional e internacionalmente, em decorrência da até então, omissão do

ordenamento jurídico.

Também se sabe que o tema já foi e continua sendo abordado de inúmeras

formas, e que a abordagem no presente trabalho, não esgotaria o tema.

No entanto, mostra-se oportuno relembrar que em 1983, a senhora Maria da

Penha Maia Fernandes, na época com apenas 38 (trinta e oito) anos – levou um tiro

disparado pelo próprio marido – enquanto dormia, e ficou paraplégica. Não satisfeito

com o resultado o marido, Marco Antonio Heredia Viveiros, tentou novamente matá-

la, por meio de eletrochoque e afogamento, durante o banho.

Ocorre que, estes dois episódios foram “apenas” os mais graves que,

culminariam na morte da senhora Maria da Penha. Isto, pois durante todo o período

em que esteve casada, Maria da Penha sofreu inúmeras agressões reiteradas, e

intimidações, sem apresentar reações, e tampouco acionar as autoridades.

Somente após as duas tentativas de assassinato, foi que Maria da Penha

tomou coragem e decidiu fazer uma denúncia pública. Inobstante, Marco Antonio

Heredita foi condenado pela justiça somente em 2001, vindo a ser preso

efetivamente somente em 2002.

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Em suma, foram 20 (vinte) anos de luta em busca de justiça contra um ato

de violência doméstica e familiar, para que a Lei n. 11.340/2006 fosse efetivamente

promulgada, à título de reparação simbólica a vítima deste crime, qual seja a

Senhora Maria da Penha.

Nesta esteira, buscando a relação entre o stalking e a Lei Maria da Penha,

é possível encontrar o stalking de forma “subliminar”, no inciso II, do artigo 7° da Lei

Maria da Penha67. Vejamos.

Art. 7o São formas de violência doméstica e familiar contra a mulher, entre outras: [...] II - a violência psicológica, entendida como qualquer conduta que lhe cause dano emocional e diminuição da auto-estima ou que lhe prejudique e perturbe o pleno desenvolvimento ou que vise degradar ou controlar suas ações, comportamentos, crenças e decisões, mediante ameaça, constrangimento, humilhação, manipulação, isolamento, vigilância constante, perseguição contumaz, insulto, chantagem, ridicularização, exploração e limitação do direito de ir e vir ou qualquer outro meio que lhe cause prejuízo à saúde psicológica e à autodeterminação; (Grifos)

A Lei Maria da Penha, como se nota, não abrange todas as condutas que

podem ser consideradas como stalking, mas, evidentemente, assegura maior

proteção às mulheres. 68

Posto isto, em relação a reforma penal brasileira, cabe apresentar que, dentre

as várias inovações apresentadas pela Comissão de Reforma de Código Penal está

a criminalização (agora expressa) do Stalking.

Por oportuno, aclaram Mario Luiz Ramidoff e Cesare Triberti (2017, p.198)69

que:

Em relação à proposta de reforma do Código Penal brasileiro, então, contemplada no Projeto de Lei do Senado n. 236/2012, é possível verificar inúmeras tipificações123 pertinentes a graves ameaças e a violências praticadas através de atos invasivos (intrusivos) e persecutórios obsessivos, então determinados por frustrações pessoais derivadas da convivencialidade privada e íntima entre o agente (agressor/molestador) e a vítima.

67 BRASIL. Lei n. 11.340/2006. Disponível em http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2004-2006/2006/Lei/L11340.htm. Acesso em 26/08/2018. 68 JESUS, Damásio E. de. Stalking. Revista IOB de Direito Penal e Processual Penal. São Paulo, v. 10, n. 56, p. 67, jun-jul/2009. 69 RAMIDOFF, Mário Luiz. TRIBETTI, Cesare. Atos persecutórios obsessivos ou insidiosos. 2017, p. 198.

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De acordo com a proposta o novo tipo penal constituiria um parágrafo do

artigo 147, do Código Penal, que, uma vez aprovado, poderá sofrer alteração na

previsão do artigo. Assim, vejamos como artigo 147 seria composto:

Art. 147 - Ameaçar alguém, por palavra, escrito ou gesto, ou qualquer outro meio simbólico, de causar-lhe mal injusto e grave: Pena de prisão de seis meses a dois anos. § 1º. Perseguir alguém, de forma reiterada ou continuada, ameaçando-lhe a integridade física ou psicológica, restringindo-lhe a capacidade de locomoção ou, de qualquer forma, invadindo ou perturbando sua esfera de liberdade ou privacidade. Pena – PRISÃO - de dois a seis anos, e multa. (Grifo nosso)

O novo tipo incriminador, se aprovado na íntegra pelas duas casas legislativas

e devidamente promulgado, terá como nomen iuris, “perseguição obsessiva ou

insidiosa”, que nada mais é do que o stalking apresentado no decorrer do presente

trabalho.

Mantida a redação acima, o sujeito passivo será qualquer pessoa, homem ou

mulher, de modo que o que estará sendo protegido é a integridade física e psicológica

da vítima agredida. O tipo também é bastante amplo, pois prevê punição para aquele

que “de qualquer forma” atuar para invadir ou perturbar a liberdade ou privacidade do

ofendido. 70

Assim, caso a reforma fosse aprovada, a prática de stalking, atualmente

reconhecida pelo ordenamento jurídico brasileiro, tão somente como contravenção

penal, passaria a ser reconhecida como crime, cuja penalidade passaria de prisão de

15 (quinze) dias a 2 (dois) meses, ou multa, para prisão de no mínimo 02 (dois) anos

a 06 (seis) anos.

Outrossim, a reforma estabelece ainda que o novo crime de stalking

(Art. 147, § 1º CP) seria processado mediante representação do ofendido, tratando-

se de ação penal pública condicionada à representação.

Tal previsão é salutar, haja vista caber ao destinatário da violência a

ponderação sobre os custos pessoais a serem enfrentados pelo processamento da

demanda, uma vez que, em regra, o agente provocador é pessoa de convívio próximo

da vítima.

70 GOMES, Luiz Flávio. Perseguição Obsessiva. Disponível em: https://professorlfg.jusbrasil.com.br/artigos/121929050/stalking-perseguicao-obsessiva - Acesso em: 11/09/2017.

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8 POSICIONAMENTO JURISPRUDENCIAL SOBRE O ASSUNTO

Muito embora de maneira tímida, o Poder Judiciário brasileiro já tem apreciado

o tema ora proposto.

Assim, serão apresentados alguns julgados para evidenciar o posicionamento

jurisprudencial dos tribunais brasileiros, acerca do stalking.

Nesse sentido, faz-se oportuno compendiar o seguinte aresto da Turma

Recursal do Juizado Especial Criminal do Distrito Federal, da lavra do Juiz João

Timóteo de Oliveira, assim ementado:

CONTRAVENÇÃO PENAL. PERTURBAÇÃO DA TRANQUILIDADE. Comete a contravenção penal de perturbação da tranqüilidade, por acinte, prevista no art. 65 da Lei das Contravenções Penais, o agente que por meio de mensagem telefônica, gravada por secretária eletrônica, exterioriza palavras ameaçadoras, deixando recados ofensivos, fatos que causam perturbação emocional. A condenação de multa imposta ao infrator deve ser mantida. Negado provimento ao recurso para manter a r. sentença. 71

Depreende-se da ementa do acórdão acima transcrito que o stalker deixava

reiteradas mensagens gravadas na secretária eletrônica com conteúdo ofensivo

consistente em ameaças e vilipêndios que causaram abalo psicológico e perturbação

emocional à vítima, retirando-lhe a tranquilidade pelo fundado temor de sofrer algum

mal injusto. Assim, o Juízo recursal confirmou a sentença de origem mantendo sem

reparos a condenação do réu ao pagamento de pena de multa, fixada em 60 dias-

multa, por incidir na infração penal consignada no art. 65 da Lei de Contravenções

Penais.

Igualmente, o Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro72 retrata outra

situação comumente vivenciada pelas vítimas de stalking, consoante ementa a seguir

reproduzida:

71 BRASIL. Turma Recursal dos Juizados Especiais Cíveis e Criminais. Processual Penal. Contravenção Penal. Perturbação de Tranquilidade. Apelação criminal 2000.01.1.024992-5. Apelante: Carlos Alberto Monteiro Magalhães. Apelado: Ministério Público do Distrito Federal e Territórios. Relator: Juiz João Timóteo de Oliveira. Brasília, 03 de outubro de 2000. DJU de 21.11.2000, seção 3, p. 39 72 BRASIL. Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro. Vigésima Câmara Cível. Processual Cível. Civil. Responsabilidade civil. Danos morais. Stalking. Ação indenizatória. Abuso de direito. Assédio moral e psicológico. Apelação cível 2008.001.06440. Apelante: Sérgio Ricardo Coutinho Mello. Apelado: Andrea Sodré Cardoso de Castro e outro. Relator: Des. Marco Antonio Ibrahim. Rio de Janeiro, 04 de junho de 2008. 39/2008 - N. 19 - 23/10/2008 Rev. Direito do T.J.E.R.J., vol 80, p. 304.

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CIVIL. RESPONSABILIDADE CIVIL. DANOS MORAIS. “STALKING”. AÇÃO INDENIZATÓRIA. ABUSO DE DIREITO. ASSÉDIO MORAL E PSICOLÓGICO. ROMPIMENTO DE RELACIONAMENTO AMOROSO. UNIÃO ESTÁVEL. CONSTITUIÇÃO DE NOVO VÍNCULO AFETIVO PELA MULHER. EX-COMPANHEIRO QUE, INCONFORMADO COM O TÉRMINO DO ROMANCE, ENCETA GRAVE ASSÉDIO PSICOLÓGICO À SUA EX-COMPANHEIRA COM ENVIO DE INÚMEROS E-MAILS E DIVERSOS TELEFONEMAS, ALGUNS COM CONTEÚDO AGRESSIVO. PERSEGUIÇÃO NA RESIDÊNCIA E NO LOCAL DE TRABALHO. AMEAÇA DIRETA DE MORTE. CONDUTAS QUE EVIDENCIAM ABUSO DE DIREITO E, PORTANTO, ILÍCITO A TEOR DO DISPOSTO NO ARTIGO 187 DO CÓDIGO CIVIL DE 2002. TIPIFICAÇÃO DA CONDUTA ILÍCITA DO "STALKING”. DANOS MORAIS RECONHECIDOS. INDENIZAÇÃO FIXADA COM PROPORCIONALIDADE E RAZOABILIDADE DIANTE DAS CIRCUNSTÂNCIAS DO CASO CONCRETO. SENTENÇA MANTIDA. RECURSO DESPROVIDO.

No caso retro mencionado, a autora rompeu um relacionamento afetivo com

o réu, que, por sua vez, começou a praticar atos de perseguição no ambiente de

trabalho e na residência da ex-companheira, por meio do envio de mensagens

eletrônicas e ligações telefônicas, contendo ameaça em algumas delas. O ápice da

perseguição consistiu em agressão ao casal e danos patrimoniais. Assim, diante do

robusto conjunto probatório, os Desembargadores acordaram, por unanimidade, em

negar provimento ao recurso.

Neste caminho, ainda em relação ao referido julgado do Tribunal do Rio de

Janeiro 73 , destaca-se o trecho do voto do Desembargador Antônio Ibrahim ao

descrever a verdadeira intenção do stalker por detrás da perseguição insidiosa:

[...] Nem sempre o amante inconformado pretende, se não de forma mediata, o reatamento do vínculo. Muita vez seu objetivo é vingar-se, privando o outro de tranquilidade. Trata-se de técnica de infernização da vida do outro, que se vê, não raro, impedido de retomar seus afazeres cotidianos por medo ou angústia porque, quase sempre, o objetivo do ofensor é o de ocultar sua baixa autoestima, ou sentimento de inferioridade, com a máscara do “último romântico”. [...] Na espécie de que se trata, o assédio praticado pelo ofensor é claro, ainda que as ameaças feitas à vítima tenham vindo ocultadas pelo véu de palavras aparentemente amigáveis ou por atitudes ordinariamente benfazejas, como o envio de flores ou felicitações [...].

Deve-se esclarecer, por último, que não é toda e qualquer tentativa de

reatamento de uma relação amorosa que se traduzirá em stalking.

73 BRASIL. Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro. Vigésima Câmara Cível. Processual Cível. Civil. Responsabilidade civil. Danos morais. Stalking. Ação indenizatória. Abuso de direito. Assédio moral e psicológico. Apelação cível 2008.001.06440. Apelante: Sérgio Ricardo Coutinho Mello. Apelado: Andrea Sodré Cardoso de Castro e outro. Relator: Des. Marco Antonio Ibrahim. Rio de Janeiro, 04 de junho de 2008. 39/2008 - N. 19 - 23/10/2008 Rev. Direito do T.J.E.R.J., vol 80, p. 304.

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Nessa perspectiva, não há qualquer objeção àquele que busca se reconciliar

com a pessoa em relação a quem nutre sentimentos de afeto ou nostalgia. O que não

se revela adequado é exceder os limites do que se tem por razoável e passar a

ofender a higidez moral e psicológica de outrem, transmudando os bons sentimentos

em instrumentos de violência e abuso.

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55

9 CONCLUSÃO

O presente trabalho de conclusão de curso apresentou aspectos e

características da prática de Stalking, em especial sob a ótica do ordenamento jurídico

brasileiro, e sob a ótica das demais legislações internacionais, por meio do Direito

Comparado.

O stalking nada mais é que, instigar o medo na vítima, criar incertezas e

invadir a intimidade, por meio de coação, tormentos psicológicos, imposição de

presença na vida da vítima.

Essas ações persecutórias aparecem nas relações interpessoais, de forma

violenta, e podem determinar ações como a perseguição, caça, e toda sorte de

ameaça às vítimas. Não são raros os casos em que estas ações não se limitam à

interposição de medo, isto é, em muitos casos, o resultado final destas práticas é a

morte da vítima, ocasionada pelo stalker.

Atualmente, no Brasil a prática de stalking é considerada apenas como

contravenção penal, não sendo tipificada como crime. Em decorrência deste

posicionamento, a punição contra esta conduta é consideravelmente mais branda, do

que seria se fosse considerada um crime.

Embora não haja no instituto penal uma responsabilização proporcional ao

agente que pratica o stalking, atualmente é possível buscar uma responsabilização na

esfera cível, por meio dos dispositivos 186 e 187 do Código Civil Brasileiro. O que,

ainda não tem capacidade de repelir e combater proporcionalmente a prática.

Importante observar que, a prática de stalking foi identificada inicialmente nos

Estados Unidos, em casos especificamente contra celebridades. Posteriormente,

percebeu-se que a conduta deveria ser estendida para qualquer pessoa que sofresse

de comportamentos de assédio persistente que tem como objetivo perturbar,

atemorizar e alarmar as vítimas.

Também, imperioso ressalvar que a prática pode ocorrer em qualquer

ambiente, isto é, seja no relacionamento amoroso, no ambiente profissional ou laboral,

seja través de conhecidos, amigos, ou até mesmo, pessoas desconhecidas. Não há

especificamente um padrão, se considerados os ambientes em que podem ocorrer.

O presente estudo tomou como exemplos, os países da Itália, Estados Unidos

e França, que se encontram consideravelmente mais adiantados na penalização

desta prática, se comparados ao Brasil.

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No tocante ao ordenamento jurídico especificamente, além da Lei de

Contravenções Penais – que apresenta condutas típicas de stalking – é possível

observar uma semelhança entre esta conduta e a Lei Maria da Penha.

Isto, pois, na referida Lei é possível identificar, ainda que subliminarmente,

condutas típicas dos stalkers, quais sejam, a violência psicológica, por meio da

diminuição da autoestima, dano emocional, ameaça, constrangimento, humilhação,

manipulação, violência, dentre outras.

Em que pese o ordenamento jurídico, informalmente já preveja e puna a

prática de stalking em leis esparsas, há de se levar em conta que esta conduta deve

ser estudada e punida de forma mais específica.

Nesta esteira, verificou-se no decorrer deste estudo que, não somente a

prática deve ser levada em consideração, como também os motivos – muitas vezes

psicológicos – que desencadeiam essas reações aos stalkers.

Desta forma, não há como utilizar-se da Lei de Contravenções Penais, haja

vista que não apresenta punições proporcionais para a prática de stalking, tampouco

a Lei Maria da Penha, que se restringe a proteção exclusiva da mulher.

Assim, buscou o presente trabalho apresentar a importância e os impactos

que a prática de stalking ocasionam a sociedade, e a necessidade atual de estudos

e aprofundamentos sobre o tema, a fim de que o ordenamento jurídico possa se

basear para aplicar penalidades justas e concretas contra esta prática, que assola

milhares de pessoas.

Por fim, cabe esclarecer que o presente estudo não teve

propósito de esgotar o tema abordado visto que, como já mencionado é característico

por suas peculiaridades, sendo passível de novas pesquisas.

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indenizatória. Abuso de direito. Assédio moral e psicológico. Apelação cível

2008.001.06440. Apelante: Sérgio Ricardo Coutinho Mello.

BRASIL. Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro. Vigésima Câmara Cível.

Processual Cível. Civil. Responsabilidade civil. Danos morais. Stalking. Ação

indenizatória. Abuso de direito. Assédio moral e psicológico. Apelação cível

2008.001.06440. Apelante: Sérgio Ricardo Coutinho Mello. Apelado: Andrea Sodré

Cardoso de Castro e outro. Relator: Des. Marco Antonio Ibrahim. Rio de Janeiro, 04

de junho de 2008. 39/2008 - N. 19 - 23/10/2008 Rev. Direito do T.J.E.R.J., vol 80, p.

304.

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BRASIL. Turma Recursal dos Juizados Especiais Cíveis e Criminais. Processual

Penal. Contravenção Penal. Perturbação de Tranquilidade. Apelação criminal

2000.01.1.024992-5. Apelante: Carlos Alberto Monteiro Magalhães. Apelado:

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Oliveira. Brasília, 03 de outubro de 2000. DJU de 21.11.2000, seção 3, p. 39.

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