Gestão de PESSOAS -...

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Gestão de PESSOAS 2010 Marcelo Antonio Treff

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Gestão dePESSOAS

2010

Marcelo Antonio Treff

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Capa: IESDE Brasil S.A.

Imagem da capa: IESDE Brasil S.A.

T787 Treff, Marcelo Antonio. / Gestão de pessoas. / Marcelo Antonio Treff. — Curitiba : IESDE Brasil S.A. , 2010.

220 p.

ISBN: 978-85-387-1131-5

1. Gestão de pessoas. 2. Gestão de competências. 3. Desen-volvimento profissional. I. Título.

CDD 331.125

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Doutor em Ciências Sociais (Sociologia do Tra-balho) pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP). Mestre em Administração de Empresas pela Universidade Presbiteriana Mackenzie. Especialista em Administração de Recursos Humanos e em Didática do Ensino Superior pela Universidade Presbiteriana Ma-ckenzie. Graduado em Administração pela Uni-versidade da Cidade de São Paulo (UNICID). Atua como professor nas universidades UNICID, PUC-SP, Universidade Salesiana (UNISAL) e Fun-dação Escola de Comércio Alvares Penteado.

Marcelo Antonio Treff

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Evolução da Gestão de Pessoas no Brasil 13

13 | Introdução

13 | Surgimento da área de Recursos Humanos no Brasil

18 | Governo JK e a chegada das multinacionais

19 | O golpe de 64 e o novo regime de exceção

20 | O movimento dos trabalhadores do ABC

21 | Movimento da qualidade total e o envolvimento do RH

22 | A queda das barreiras comerciais na década de 1990

22 | Gestão de Pessoas como coautora das estratégias de negócios

Gestão de competências 31

31 | Introdução

31 | A noção de competências

38 | A complexidade do trabalho e a formação para o trabalho

41 | A Gestão de Pessoas e o modelo da competência

Atração e captação de talentos 55

55 | Introdução

55 | O paradigma tradicional

57 | Recrutamento

65 | Seleção

69 | O paradigma moderno

Remuneração 77

77 | Introdução

77 | Remuneração

79 | A função administrativa da remuneração

81 | Componente da estrutura de compensação

81 | Formas de remuneração

81 | Plano de compensação

83 | Modelo de descrição de cargos

85 | Métodos de avaliação de cargos

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Benefícios 101

101 | Introdução

101 | Benefícios

106 | Valorização dos benefícios

111 | Benefícios mais concedidos pelas empresas

112 | Benefícios flexíveis

Gestão da carreira 121

121 | Introdução

121 | Gestão de carreira

126 | O papel das pessoas

128 | O papel das empresas

130 | Estruturas de carreira

130 | Instrumentos de gestão

131 | Categorias de carreira

132 | Eixos de carreira

Avaliação de desempenho 143

143 | Introdução

143 | Avaliação de desempenho

144 | Objetivos da avaliação de desempenho

145 | Relação com o contrato psicológico: as expectativas

146 | Análise baseada em dimensões

147 | Efeitos de um programa de avaliação de desempenho mal elaborado

149 | Métodos de avaliação de desempenho

153 | Foco da avaliação

154 | Distorções na aplicação dos instrumentos

155 | Avaliação focada em competências

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Treinamento e desenvolvimento 165

165 | Introdução

165 | Treinamento e desenvolvimento

168 | Levantamento de necessidades

170 | Desenho do programa

172 | Implementação e execução

172 | Avaliação do programa

Educação corporativa 183

183 | Introdução

183 | Educação corporativa

187 | Universidades corporativas: definição e características

191 | Ações e programas educacionais e competências críticas

192 | O sistema de gestão do conhecimento

193 | Intensiva utilização da tecnologia aplicada à educação

194 | Forte compromisso da empresa com a cidadania empresarial

195 | Veículo de fortalecimento e disseminação da cultura

195 | Líderes e gestores se responsabilizam pelo sucesso da aprendizagem

196 | Avaliação dos resultados

198 | Formação de parcerias com instituições de Ensino Superior

Cultura estratégica 203

203 | Introdução

203 | Cultura

206 | Cultura organizacional

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Treinamento e desenvolvimento 165

165 | Introdução

165 | Treinamento e desenvolvimento

168 | Levantamento de necessidades

170 | Desenho do programa

172 | Implementação e execução

172 | Avaliação do programa

Educação corporativa 183

183 | Introdução

183 | Educação corporativa

187 | Universidades corporativas: definição e características

191 | Ações e programas educacionais e competências críticas

192 | O sistema de gestão do conhecimento

193 | Intensiva utilização da tecnologia aplicada à educação

194 | Forte compromisso da empresa com a cidadania empresarial

195 | Veículo de fortalecimento e disseminação da cultura

195 | Líderes e gestores se responsabilizam pelo sucesso da aprendizagem

196 | Avaliação dos resultados

198 | Formação de parcerias com instituições de Ensino Superior

Cultura estratégica 203

203 | Introdução

203 | Cultura

206 | Cultura organizacional

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Gestão de P

essoasApresentação

Este livro trata da Gestão de Pessoas sob uma perspectiva estratégica, procurando ultra-passar os limites da visão tradicional de Recur-sos Humanos enquanto área de apoio, dada a pluralidade do tema. Para tanto, utiliza-se não só do olhar da Administração, o qual é de grande importância nesta obra, mas também da visão crítica de outras Ciências Sociais, em especial a Sociologia e a Antropologia.

Optou-se, portanto, num primeiro momen-to, pela discussão sobre a evolução da adminis-tração de Recursos Humanos no Brasil, em virtu-de da grande importância do tema para que se possa compreender várias questões que envol-vem a Gestão de Pessoas atualmente.

A seguir, aborda-se um dos temas mais re-levantes da atualidade em Gestão de Pessoas, dada a sua amplitude de abordagens: a Gestão por Competências. Nesse capítulo, recorre-se aos principais teóricos do assunto, tanto os anglo-americanos como os franceses, por suas importantes contribuições. Discute-se, ainda, o rompimento com o compromisso taylorista- -fordista e apresenta-se uma definição do que se entende por Gestão de Pessoas, a qual norteará os demais capítulos do livro.

Nesta obra entende-se Gestão de Pessoas como a articulação e o planejamento das ativi-dades que envolvem a tomada de decisão sobre atração, captação, compensação (salários e be-nefícios), carreira, avaliação e desenvolvimento de pessoas, alicerçados em políticas e diretrizes claras e integradas às decisões estratégicas da empresa, com o objetivo de interferir no com-portamento das pessoas, alinhando-o aos obje-tivos empresariais.

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Gestão de P

essoasA partir do capítulo 3 até o capítulo 8 apre-

sentam-se os principais subsistemas de Gestão de Pessoas, sempre partindo da necessidade de migração do modelo tradicional para o modelo estratégico. Nesses capítulos aborda-se recruta-mento e seleção de pessoas, remuneração, be-nefícios, gestão da carreira, avaliação de desem-penho, e treinamento e desenvolvimento.

Os capítulos subsequentes abordam temas atuais e de extrema importância no contexto organizacional globalizado. O primeiro deles, no capítulo 9, discute a importância estratégica da educação corporativa, abordando o conceito de universidade corporativa. O capítulo 10 aborda cultura organizacional sob uma perspectiva es-tratégica, dada a relevância desse tema nos dias atuais, sobretudo para as empresas envolvidas em processos de mudança organizacional.

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Evolução da Gestão de Pessoas no Brasil

IntroduçãoNeste capítulo encontra-se a análise da evolução histórica da área de Re-

cursos Humanos no Brasil, determinante para a configuração, articulação e definição das políticas de Gestão de Pessoas como importante ferramenta na busca do estabelecimento/sustentabilidade de vantagem competitiva pelas empresas. Ademais, visa-se demonstrar a influência do contexto histórico no atual cenário de negócios, no qual os gestores enfrentam dificuldades de implementação em virtude das ambiguidades arraigadas nas políticas e práticas de RH.

Surgimento da área de Recursos Humanos no Brasil

A evolução da área de Recursos Humanos no Brasil nos remete a uma re-cuperação histórico-social, visto que, para alguns autores (FLEURY; FISCHER, 1992; ALBUQUERQUE, 1992; AQUINO, 1984; WOOD JÚNIOR., 1995), é muito difícil montar um quadro para o entendimento da administração de Recur-sos Humanos no Brasil sem entender a raiz do surgimento dessa área/função no cerne da ascensão empresarial brasileira. Conforme Kowarick (1994, p. 19), “para compreender a constituição do mercado de mão de obra livre no Brasil, é necessário retroceder no tempo e focalizar alguns parâmetros socio-econômicos e políticos próprios à ordem escravocrata”.

Corroborando esse autor, entende-se que esse retrocesso remete à es-cravidão que, durante longo tempo, mostrou-se atividade vantajosa em termos de acumulação, em virtude da significativa participação na produção de produtos exportáveis, além da comercialização de negros africanos – o

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Evolução da Gestão de Pessoas no Brasil

tráfico negreiro – ser um excelente negócio que, além de empreendimen-to altamente lucrativo, tornou-se poderoso fator de acumulação primitiva (KOWARICK, 1994).

Nesse sentido, afirma Holanda (1997, p. 73),

[...] toda a estrutura de nossa sociedade colonial teve sua base fora dos meios urbanos. É preciso considerar esse fato para se compreender exatamente as condições que, por via direta ou indireta, nos governam até muito depois de proclamada nossa independência política e cujos reflexos não se apagaram ainda hoje.

Portanto, como descrito acima, para que se possa discorrer sobre a ques-tão do papel da administração de Recursos Humanos nas empresas atual-mente e para que se tenha a compreensão sobre as dificuldades de adap-tação às mudanças, em termos de gestão e organização do trabalho, faz-se necessário descrever, mesmo que brevemente, algumas fases históricas mar-cantes da relação capital X trabalho no Brasil, visto que, pelo que se pode inferir, alguns fatos atuais têm causas bastante remotas.

Fim do período escravocrataO fim do período escravocrata, no final do século XIX, se deu sob forte

pressão inglesa que naquela época sustentava o rótulo de nação mais indus-trializada, além de possuir uma poderosa marinha de guerra (Royal Navy). Como era de grande interesse da Inglaterra expandir o seu mercado con-sumidor, em um período de gradativa introdução de um capitalismo em moldes industriais, aumentam as exigências para a extinção de trabalho sem remuneração, por questões óbvias: sem remuneração, sem consumo.

Apesar de um período de resistência das autoridades e, sobretudo, dos maiores interessados na continuidade do processo – os traficantes de escra-vos –, enfim em 1888 é assinado “oficialmente” o fim do trabalho escravo no Brasil, o que traria, à época, profundas mudanças na estruturação dos pro-cessos produtivos vigentes há mais de 300 anos.

Naquele período, o trabalho escravo que, durante séculos, serviu de fonte de acumulação, segundo Kowarick (1994, p. 65), “estava materialmente con-denado após 1850, e politicamente sob crescente pressão a partir de 1880, tornava-se imperioso para o empreendimento cafeeiro encontrar uma fór-mula que substituísse o trabalho cativo, sem que fosse necessário apoiar-se na desacreditada mão de obra nacional”.

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Importação de mão de obra imigranteCom isso, conforme Kowarick (1994, p. 65), “a opção arquitetada pelo

grande fazendeiro do café foi a importação em massa da mão de obra, que, empobrecida na Europa, não tinha outra alternativa senão a de vender, a preços aviltantes, sua força de trabalho”. É importante notar que essa alter-nativa encontrada pelos fazendeiros para continuar obtendo vantagens por meio de exploração/coação de trabalhadores livres – regime escravocrata e/ou semiescravocrata – contou, de forma ampla e irrestrita, com a colabo-ração do governo, sobretudo na figura do senador Vergueiro, descrito por Prado Júnior (1994, p. 187) como “grande proprietário em São Paulo, lavrador de café e figura prestigiosa na política do país”. Segundo o autor, o Nicolau de Campos Vergueiro foi “o ideador do novo sistema”.

Essa importação em massa de mão de obra estrangeira foi fator prepon-derante para o aumento da produtividade, por meio de superexploração diante da abundância de trabalhadores, deteriorando assim os salários. A abundância dessa mão de obra provocou certo excedente, que posterior-mente formaria a massa de trabalhadores empregados na indústria fabril, principalmente nas zonas urbanas, mais especificamente em São Paulo.

Movimento anarcossindicalista e movimentos sociais

Entretanto, vale destacar que esses estrangeiros, europeus em quase sua totalidade, conforme descreve Aquino (1984, p. 64), “trouxeram sua experiência no campo sindical, que foi incorporada ao ambiente de traba-lho, refletindo-se na mentalidade e nas formas de conduta do trabalhador brasileiro”.

O final do século XIX assistiu, portanto, ao processo de formação da classe operária brasileira ainda no bojo da expansão da economia cafeeira (FAUSTO, 1995). Nos setores de serviços ferroviário e portuário, vinculados essencial-mente às atividades de comercialização e exportação do café, foi se forman-do um núcleo de trabalhadores, embrião do proletariado urbano industrial.

Esse movimento operário evoluiu no Brasil entre o final do século XIX e início do século XX e, apesar de um relativo atraso no processo de industria-lização naquela época, com a proibição do tráfico de escravos, por volta de

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Evolução da Gestão de Pessoas no Brasil

1881 o Brasil já contava com cerca de 200 indústrias, aumentando para cerca de 600 em 1889. No início do século XX, o país possuía mais de 300 mil pes-soas trabalhando direta ou indiretamente na produção industrial. A grande maioria desses trabalhadores era composta de imigrantes europeus, já acos-tumados com os conceitos de luta de classes e sindicalismo. Em São Paulo, em 1900, cerca de 90% dos operários eram imigrantes, sendo que apenas entre 1894 e 1903 entraram no Brasil mais de 1,5 milhão de imigrantes, che-gando a superar a população de brasileiros na própria capital paulista e em diversas outras cidades.

Embora, até a primeira década do século XX, o Rio de Janeiro fosse con-siderado centro industrial, já nas décadas de 1920 e 1930 São Paulo assumiu essa posição. É bom que se esclareça que isso ocorreu graças aos recursos obtidos pelo estado com a cafeicultura, principal atividade econômica do Brasil na época.

Com o fim da Primeira Guerra Mundial, o processo de industrialização do país acelerou, sendo que de cerca de 15 000 indústrias que existiam no país na década de 1920, aproximadamente 6 000 haviam sido instaladas durante a guerra para suprir nossa demanda por produtos industrializados, na cha-mada “substituição de importações”. Em sua maioria eram indústrias do setor têxtil e alimentício.

Diante desse contexto e com base em outros estudos (FLEURY; FISCHER, 1990; ALBUQUERQUE, 1992), nota-se que esses imigrantes exerceram im-portante influência na relação capital X trabalho, no início do processo de industrialização, em virtude do elevado grau de instrução, de cultura de rei-vindicações trabalhistas e de politização, evidentemente se comparado aos trabalhadores que aqui estavam.

Cabe ressaltar que as greves ocorridas nas duas primeiras décadas do século XX, incluindo a greve geral de 1917, tiveram suas reivindicações prin-cipais centradas nas condições de trabalho: salário, jornada de trabalho, des-canso semanal, indenização por acidente, limitação do trabalho de mulheres e crianças, melhorias das condições de higiene, exigências com forte influência dos imigrantes que, mais tarde, vieram a ser atendidas por Vargas, de forma astuta e oportunista (AQUINO, 1980).

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Golpe de 30 e o surgimento da legislação trabalhista

O golpe de 1930, pondo fim à hegemonia dos cafeicultores, inaugurou o chamado Estado de Compromisso (FAUSTO, 1995). Esse Estado nasceu da complementaridade básica de interesses entre as várias facções da classe dominante com raízes na própria história do café no século anterior e do fato de nenhuma delas ser capaz de assumir o poder, naquele momento, em caráter exclusivo.

Na chamada Era Vargas (1930-1945) houve um significativo desenvol-vimento industrial nos setores de máquinas e equipamentos, transporte e energia. Nesse período, o conceito de trabalhismo foi amplamente difun-dido e, apesar do surgimento dos chamados “pelegos”, que reproduziam o discurso oficial entre as classes trabalhadoras, esse foi o período de maior avanço nas conquistas trabalhistas.

Em 1931, houve a criação do Ministério do Trabalho, Indústria e Comércio, surgindo as primeiras leis, oficializadas pela Constituição de 1934, que cria-ram, entre outras conquistas: o salário mínimo, o descanso semanal remune-rado, férias remuneradas, jornada de 8 horas, regulamentação do trabalho de mulheres e de menores de 18 anos, proibição do trabalho de menores de 14 anos, previdência social (na época descentralizada), sindicatos controla-dos pelo Estado etc.

Cabe ressaltar que a grande maioria dessas conquistas fazia parte da pauta de exigências dos movimentos sociais abafados pelo governo Vargas. Como consequência disso, Vargas tornou-se famoso por ter atendido aos anseios da classe trabalhadora e se transformou popularmente no Pai dos Trabalhadores e/ou Pai dos Pobres.

No período ditatorial, o Estado passou a intervir diretamente em todas as instâncias da vida política, econômica e social do país, através do Ministério do Trabalho, Indústria e Comércio, e desenvolvendo dispositivos regulamen-tadores das condições de trabalho, da organização sindical e da previdência social. A partir de 1937, firma-se o regime ditatorial de Vargas, consolidando a formalização do papel do Estado como elemento onipresente no cenário

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Evolução da Gestão de Pessoas no Brasil

das relações de trabalho. A organização da Justiça do Trabalho, a Legisla-ção Trabalhista, a legalização e a garantia de subsistência da estrutura sindi-cal atrelada pelo imposto obrigatório à máquina do Estado são alguns dos fortes indicadores desse processo político-institucional.

Intermediação das relações de trabalho e o chefe de pessoal

As empresas do setor industrial começam a criar, desde 1930, a Seção de Pessoal – a primeira denominação da área de Recursos Humanos –, que burocratizava os aspectos jurídicos legais da relação empregatícia, além de procurar, de certa forma, afastar o trabalhador do empregador dando ao pri-meiro a impressão de atuar em seu nome (AQUINO, 1980).

Portanto, faz-se importante notar que esse profissional surge em um contexto de controle, pois vivia no país sob um regime ditatorial. As princi-pais atividades da Seção de Pessoal restringiam-se a controlar o trabalhador, além de cuidar dos protocolos da área: documentos, legislação, arquivos, re-muneração etc.

Praticamente até a década de 50, as atividades de Recursos Humanos se li-mitaram às questões legais e contábeis, deixando um legado que as gerações subsequentes tiveram (e ainda têm) muita dificuldade para abandonar.

Já no período pós-guerra, o Brasil se estabelecia como uma economia em franco desenvolvimento, sobretudo no início do “novo” governo Vargas, que tomou posse em 31 de janeiro de 1951 e promoveu várias medidas destinadas a incentivar o desenvolvimento econômico, com ênfase na industrialização.

Governo JK e a chegada das multinacionaisNo final da década de 50, no governo JK, com a abertura ao capital es-

trangeiro e a consequente instalação de empresas de capital multinacional, a influência exercida sobre a área de Recursos Humanos foi imediata, pois com a chegada das multinacionais ocorreu a implantação de modelos de ge-renciamento de Recursos Humanos mais organizados e formalizados do que os existentes até então. Esses modelos, gestados para as grandes empresas organizadas segundo princípios tayloristas-fordistas, foram sendo introduzi-dos com poucas alterações em diferentes realidades produtivas.

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Esse modelo pautou a estruturação da área de Recursos Humanos e o desenvolvimento de práticas e instrumentos gerenciais na maioria das gran-des empresas brasileiras durante as décadas subsequentes, o que, de certa forma, influenciou a formação de uma cultura própria aos profissionais dessa área.

O modelo de gestão de RH nesse período estava sob forte influência do modelo norte-americano, pois atendia uma demanda da época – as multina-cionais. Admite-se que houve certa evolução em termos de gestão de uma maneira geral, visto que os “moldes” de gestão vigentes, principalmente de gerenciamento de pessoas, ainda estavam arraigados no modelo escravo-crata – Casa Grande & Senzala (AQUINO, 1980).

Modernização tecnológica e administrativaDestacaram-se como mudanças nas características de gestão de Recur-

sos Humanos, nesse período, a confirmação do conceito de Relações Indus-triais, a implementação relativamente desfigurada em grandes organizações e a maior preocupação com a capacitação e o desenvolvimento gerenciais. Parte dessas mudanças influenciaram na importação de modelos das multi-nacionais, e refletiu as necessidades oriundas da multiplicação dos níveis de chefia e da sofisticação de técnicas e instrumentos gerenciais que passaram a ser adotados.

Em suma, o que parece inegável é que houve, em virtude desse movi-mento multinacional, uma importante evolução nas práticas de recursos humanos e de gestão administrativa. Muitas dessas empresas trouxeram ao país princípios de organização, planejamento e controle de processos já con-solidados nos países industrializados, criando, assim, uma demanda imedia-ta por mão de obra qualificada para lidar com novas formas de organização do trabalho, com base no know-how da matriz.

O golpe de 64 e o novo regime de exceçãoNo entanto, com a instalação do regime de exceção em 1964, que pro-

piciou a expansão da intervenção estatal sobre a vida civil, tornou-se ainda mais preponderante o papel do Estado na definição dos rumos da economia brasileira, pois muito do que evoluiu em termos de gestão e organização do trabalho ruiu.

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Evolução da Gestão de Pessoas no Brasil

Comprometendo o já frágil regime federalista vigente, estabeleceu-se um novo padrão de relacionamento entre o governo central e os estaduais, caracterizado por concentração de recursos e de centralização das decisões. Os instrumentos utilizados para consolidar esse processo foram: reformas administrativa, tributária e fiscal e a implantação do planejamento como estratégia para impor diretrizes padronizadas às atividades públicas e aos respectivos investimentos.

A modernização tecnológica e administrativa de certas áreas-chave do aparelho institucional permitiram ampliar a esfera de atuação do poder fe-deral, principalmente no concernente ao planejamento e controle, visando viabilizar os projetos de crescimento dos governos militares.

Foram elaboradas políticas públicas que explicitavam metas de desenvol-vimento industrial e tecnológico; houve, ainda, a interferência direta sobre as-pectos específicos das relações de trabalho, como a legislação previdenciária, a política salarial e a organização sindical.

Essas características do período exerceram importante influência nos padrões de gestão da força de trabalho, visto que as empresas trabalhavam em condições propícias ao estabelecimento de políticas organizacionais que não visavam a va-lorização dos Recursos Humanos e tendiam a depreciar o fator trabalho. Por um lado, os órgãos de formação profissional procuraram se adequar às necessidades do mercado; por outro, os investimentos em treinamento eram recompensa-dos pelo próprio retorno do trabalho qualificado, permitindo rebaixar em curto espaço de tempo o custo da força de trabalho (FLEURY; FISCHER, 1992).

O movimento dos trabalhadores do ABCA repressão à organização sindical independente adquiriu nesse período

sua face mais radical na esteira da violenta repressão política que o caracte-rizou, impedindo, de um lado, a articulação e a mobilização dos trabalhado-res para exercerem pressões em defesa de seus interesses, e, de outro, que a área de Recursos Humanos das empresas desenvolvesse sua capacitação gerencial e técnica para gerir as relações de trabalho fora dos marcos norma-tivos da Legislação e da Justiça Trabalhista.

Os anos 1970 e 1980 apresentaram sensíveis transformações da socieda-de e da economia brasileira que se refletiram em termos de políticas públi-cas, da ação empresarial e dos padrões de relações de trabalho vigentes.

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O novo sindicalismo emergente na passagem dos anos 1970 para os 1980 impulsionou a ocupação de espaço político pela classe trabalhadora, princi-palmente nos centros mais avançados, mudando também sua própria arti-culação e forma de atuação. A formação das centrais sindicais e a relevância do papel dos órgãos de assessoria técnica dos próprios sindicatos são indi-cadores dessas mudanças substantivas, que ficaram mais evidentes durante as discussões sobre os direitos sociais dos trabalhadores na Constituinte de 1988 (FLEURY; FISCHER, 1992).

Movimento da qualidade total e o envolvimento do RH

Na década de 1990, como já se viu, inúmeras mudanças transformaram o contexto das organizações empresariais, obrigando empresas e gestores a reverem uma série de paradigmas e práticas organizacionais, principalmen-te em função do reconhecimento da importância que passou a ter o cliente em ambientes competitivos (FISCHER, 1992).

O aumento do nível da educação formal, o grau de informação que o trabalhador possui e a adoção de novas tecnologias também contribuíram para alterar o cenário até então vigente, o que tornou imperativa a adoção de novos modelos de gestão, além de se organizarem por melhores condi-ções de trabalho, melhor remuneração, perspectiva de carreira, entre outros. No entanto, a Gestão de Recursos Humanos, em muitas empresas em pro-cesso de implementação, atendia principalmente a “onda” dos sistemas de qualidade – ISO 9000, Qualidade Total (TQC), CCQs, 5Ss, entre outros – que, em alguns segmentos, se tornara imperativo, sobretudo naqueles que, de alguma forma, mantinham relações comerciais com multinacionais.

No contexto nacional, observamos um certo atraso em relação a outros países no que tange ao ingresso no processo de mudança organizacional, sobretudo na Gestão de Recursos Humanos, e, conforme aponta Ruas (2001, p. 245), “além de retardatárias na mudança, as empresas brasileiras viram- -se diante de um novo contexto de competição global”. Para Albuquerque (1992, p. 20),

[...] no caso brasileiro, eram raras as “ilhas de excelência” (MARCOVITCH, 1990), nas quais essas condições de políticas de Recursos Humanos integradas e voltadas para a valorização do talento humano na empresa subsistem. Curiosamente, eram justamente os casos de empresas brasileiras ou multinacionais bem-sucedidas e competitivas no mercado.

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Evolução da Gestão de Pessoas no Brasil

O prejuízo provocado pelos acontecimentos históricos em termos de evolução na Gestão de Recursos Humanos foi bastante significativo, visto que essa é uma área que sistematiza componentes políticos, ideológicos, so-ciais e comportamentais, que orientam a ação e a decisão no contexto orga-nizacional, sobretudo em organizações empresariais. No entanto, a situação tornou-se mais evidente, e agravada, a partir da abertura comercial.

A queda das barreiras comerciais na década de 1990

É inegável que, de alguma forma, as transformações na economia mun-dial, a partir do final dos anos 1980 e início dos anos 1990, somadas à intensi-ficação da competição global, impuseram desafios e exigiram que as empre-sas dispensassem uma atenção permanente aos chamados novos modelos gerenciais, acompanhados de inúmeras inovações tecnológicas.

Naquele período, a política de importações do país sofreu significativas alterações e, depois de um longo período de fechamento das fronteiras co-merciais às importações de vários produtos, conhecido como “Reserva de Mercado”, acentuado pela crise do balanço de pagamentos dos anos 1980, fez com que o Brasil iniciasse seu processo de abertura comercial.

No final da década de 1980, as primeiras medidas nesse sentido foram adotadas, reduzindo-se as alíquotas de importação e adotando-se as saídas tópicas, visando restringir determinadas barreiras não tarifárias. No entanto, a consolidação dessa nova tendência cristalizou-se somente nos primeiros anos da década de 1990, com a eliminação da maior parte das restrições não tarifárias e o estabelecimento de um cronograma de redução das alíquotas de importação. Com o lançamento do Plano Real, a abertura entrou em uma nova fase, com avanços e recuos ditados pela necessidade do controle de preços. De fato, são essas três fases distintas que constituem o processo re-cente de liberalização das importações brasileiras.

Gestão de Pessoas como coautora das estratégias de negócios

Por conta de todas essas mudanças, à Gestão de Pessoas, em especial, tornou-se imperativa a incorporação de propostas de flexibilização e par-

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ticipação. Isso porque, segundo Lacombe e Tonelli (2004, p. 61), “até então, o foco das preocupações [das empresas] era muito mais em gerir a área fi-nanceira, dada a necessidade de convivência com as altas taxas de inflação e os inúmeros planos e choques econômicos”. Ao gestor da área de Recursos Humanos não restaram muitas alternativas, com isso teve que assumir, sob o ponto de vista empresarial, o papel de agente de transformação, no sentido de preparar, qualificar e comprometer a mão de obra. Conforme afirma Fis-cher (1992, p. 60), tornava-se imperativa

[a] necessidade de [se] redefinir os sistemas de Gestão de Recursos Humanos para que oferecessem apoio ao processo de mudança, evitando a defasagem entre os padrões organizacionais modernos e os de relações do trabalho antiquados e ineficientes, os quais tendiam a ser preservados.

Num ambiente de negócios cada vez mais competitivo, tornava-se impor-tante repensar a definição de políticas de Gestão de Pessoas que atendessem às novas exigências impostas em termos de competências e, sobretudo, em termos de novas formas de organização do trabalho, considerando-se como imprescindível a abordagem estratégica de Recursos Humanos.

Cabe ressaltar que, no jargão empresarial de management, abordagem estratégica significa focar as ações e definir diretrizes no sentido de tornar a empresa mais competitiva diante de seus concorrentes. Como um dos principais teóricos desse tema, Albuquerque (1992) sinaliza a necessidade de novos contornos para as políticas de Recursos Humanos, voltadas para a obtenção de resultados em termos de inovações, qualidade de produtos ou serviços e produtividade no trabalho. Segundo Albuquerque (1992, p. 26), “não é demais lembrar que as políticas de Recursos Humanos na antiga concepção se apoia nos parâmetros organizacionais do taylorismo e nos pa-râmetros tecnológicos do fordismo, no que tange à organização do trabalho e da produção”.

Esse autor entende Gestão de Pessoas como um conjunto de mecanismos – estratégias, políticas, instrumentos de gestão, processos e procedimentos – articulados de forma sistêmica, como um conjunto de partes interagentes e in-terdependentes, a fim de atrair, captar, reter, compensar, desenvolver e avaliar pessoas que possuam competências para atuarem com tecnologias, sistemas físicos e gerenciais inerentes a uma organização.

Essa definição reforça a ideia da Gestão de Pessoas – em organizações empresariais – assumir a responsabilidade de definir políticas e diretrizes fo-cadas e alinhadas à gestão por competências, sobretudo no sentido de de-senvolver pessoas a fim de se atingir objetivos organizacionais – resultados.

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O lado perverso dessa questão é que muitas das ações definidas pelos gestores, com relação às práticas dessa área, passaram a impactar direta-mente as relações de trabalho, em especial a gestão por competências, com pesadas consequências para os trabalhadores que se viram diante de um quadro de enxugamentos e substituição de mão de obra desqualificada cau-sado pela aceleração da automação de processos, sobretudo industriais.

Várias ações e práticas utilizadas em contextos organizacionais em mu-dança, sobretudo pós-90, por mais paradoxal que possam ser, polarizaram o discurso entre novo e velho, passado e futuro, e a reação dos atores sociais em face da mudança variou entre comportamentos de conformismo, pânico, evasão e negação da realidade (CALDAS, 2000).

Apesar disso, parece haver certa unanimidade quando o assunto é migra-ção para um Modelo Estratégico de Gestão de Pessoas. Uma recente pesqui-sa1 realizada por professores da Fundação Instituto de Administração de São Paulo(FIA) e FEA-USP, com executivos de grandes empresas – nacionais e multinacionais –, confirma essa tendência ao alinhamento entre Gestão de Pessoas e Estratégias de Negócios.

Segundo os pesquisadores2, uma expressiva parte dos participantes con-sidera que ocorrerão mudanças significativas em Gestão de Pessoas nos pró-ximos cinco anos no Brasil, no entanto para eles estas não serão radicais. É evidente, portanto, que o cenário de mudanças no mundo dos negócios, so-bretudo em ambientes de intensa competição, impactará na Gestão de Pes-soas, e obrigará esta a definir políticas e diretrizes alinhadas às estratégias de negócios.

No tocante à natureza das mudanças, os pesquisadores observam que as novas tendências deverão incidir predominantemente sobre os princípios, filosofia e estratégias gerais de gestão das empresas, e nas práticas e instru-mentos de gestão. No entanto, o que tange a estrutura e a forma de orga-nização do trabalho da função de RH, bem como o perfil do profissional da área, mostram-se mais estáveis, não devendo sofrer alterações substanciais no futuro na opinião dos respondentes.

O mais importante a se destacar, no entanto, é que a grande maioria, como citado anteriormente, entende que existe “o grande desafio de alinhar as pessoas, seu respectivo desempenho e competências com as estratégias do negócio e objetivos organizacionais”.

1 Pesquisa DELPHI RH 2010 é uma projeção de tendências para Gestão de Recursos Humanos no Brasil, tendo como objeti-vo contribuir para o aper-feiçoamento da prática de gestão de pessoas nas organizações brasileiras (Disponível em: <www.fia.com.br/portalfia/Default.aspx?idPagina=7708>.).

2 Andre Luiz Fischer e Lindolfo Galvão de Albu-querque.

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Nesse sentido, a pesquisa revela que,

na visão de 82,3% dos respondentes, este será o principal objetivo do Modelo de Gestão de Pessoas das empresas competitivas para os próximos anos seguido da preocupação com o desenvolvimento e a capacitação dos gestores (69,4%). Com percentuais um pouco menos expressivos destacam-se ainda três outros desafios que preocupam os profissionais de RH da atualidade: alinhar as políticas e práticas de Gestão de Pessoas aos objetivos organizacionais (33,3%), apoiar processos de mudança e de Gestão Estratégica (25,3%) e promover a capacitação das pessoas na organização genericamente (24,2%).

Mesmo diante de dados que colaboram com a ideia de migração para modelos mais estratégicos de Gestão de Pessoas, pode-se afirmar que não se trata de uma análise fácil, pois as raízes históricas da área configuram-se como pesado entrave à aceitação e internalização de novos paradigmas, tanto por parte da alta administração das empresas como de gerentes e profissionais de Recursos Humanos. Para Teixeira et al. (2009, p. 136), “essas aceitações e internalizações exigem que os atores mencionados adquiram e cultivem uma consciência estratégica como valor central de uma cultura orientada para um alto desempenho organizacional”.

Ampliando seus conhecimentos

Ainda falta muito para o RH ser mais estratégico(VALOR ECONÔMICO, 2007)

Marcos Kowalewiski, 51 anos, conseguiu o que há alguns anos pareceria uma proeza incrível para um executivo da área de Recursos Humanos. Deixou a Gestão de Pessoas para comandar uma nova unidade de negócios do grupo Hochtief no Brasil. Detalhe, todo o estudo sobre a viabilidade da nova unida-de foi realizado por ele, enquanto atuava na área de RH. A ideia de oferecer um serviço complementar ao desenvolvido pelo grupo da área de construção civil, focando o empreendimento já pronto, surgiu depois de Kowaleswiski observar de perto os rumos estratégicos que a empresa pretendia seguir.

Isso só foi possível porque a diretoria de Recursos Humanos era chamada para participar de todas as reuniões estratégicas da companhia. Tinha, inclu-sive, o mesmo poder de voto de outras áreas. Quando Kowalewiski foi esco-lhido para dirigir a nova Hochtief Facility Management, o fato de ter vindo da área de RH pesou a seu favor. “Nosso negócio depende muito da mão de obra e da qualidade de serviços”, diz. Ter alguém com um bom conhecimento do

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negócio e especializado na Gestão de Pessoas, nesse caso, pode ser um dife-rencial competitivo.

Há alguns anos, a ideia de ter um departamento “RH estratégico”, alinha-do com os objetivos da empresa, vem sendo amplamente divulgada como uma tendência mundial. No Brasil, entretanto, ainda temos poucos exemplos. Casos como o de Kowalewiski, que conseguiu migrar para a área de negócios impulsionado por sua atuação em Recursos Humanos, são raros.

Uma pesquisa realizada pela consultoria Deloitte com 531 executivos seniores e líderes da área de RH, de 468 empresas, com faturamento entre US$125 milhões e US$10 bilhões anuais, de diversos setores e regiões, mostra que o problema não está só nas empresas que atuam no Brasil. Mesmo nas companhias globais ainda existe muito a ser feito para que a área de Gestão de Pessoas mude de status no mundo corporativo.

Apenas 16% dos executivos entrevistados acreditam que o RH é bastante valorizado por seus CEOs. Nas grandes companhias esse percentual cai para 10%. O levantamento mostra que os executivos seniores ainda não acredi-tam que o RH está cumprindo um papel estratégico em suas empresas. Existe, portanto, uma importante lacuna a ser preenchida, já que 80% dos entrevis-tados reconhecem também que as pessoas são fundamentais para a melhoria da performance de suas companhias. “O estudo mostra que ainda existe um gap entre as necessidades do negócio e o foco dos RHs”, diz Vicente Picarelli, sócio da área de capital humano da Deloitte, responsável pelo levantamento na região da América Latina e Caribe.

Entre as companhias pesquisadas, os executivos destacam o crescimento da competição, a pressão dos consumidores para ter produtos melhores e os avanços tecnológicos como seus grandes desafios estratégicos. Assim como a atuação nos mercados emergentes e a distribuição demográfica da força de trabalho. “Tudo isso está relacionado com a produtividade e a boa performan-ce das pessoas nas companhias”, lembra Picarelli.

Algumas áreas na Gestão de Pessoas foram citadas pelos executivos como sendo vitais para o sucesso de suas organizações. O desenvolvimento de lide-ranças aparece em primeiro lugar, citado por 76% dos pesquisados, seguido pela administração dos talentos (71,9%) e a criação de uma cultura de alta performance (71,9%). “Isso pode ser traduzido como uma preocupação maior

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em melhorar a qualidade de quem já faz parte da organização”, diz o consul-tor. Implica em criar valor para o empregado, incentivar sua lealdade, segurá- -lo de uma forma produtiva, tanto para ele quanto para a companhia.

Em um mercado cada vez mais sem fronteiras, ter mobilidade global é uma questão de sobrevivência. Não é mais possível contar apenas com a força de trabalho local. A dificuldade para acessar os trabalhadores globais aparece na pesquisa como um dos maiores desafios a serem enfrentados pelos gestores de pessoas. Cabe ao RH buscar os melhores profissionais em qualquer lugar, pois não existem mais limites geográficos na disputa por talentos. “É preciso olhar para fora”, diz Picarelli.

Como a Gestão de Pessoas, segundo a pesquisa, parece estar na lista de prioridades das companhias globais, a tensão entre o que a companhia preci-sa e o que o RH entrega é crescente. Quase 60% dos executivos pesquisados responderam que consideram o trabalho do RH em suas companhias “mo-deradamente efetivo”. Só 25% acreditam que a área tem um papel crucial na elaboração da estratégia e do sucesso operacional de suas empresas.

Na prática, o RH vive à margem de muitas decisões importantes nas com-panhias. Por exemplo, 60% dos entrevistados dizem que suas empresas ra-ramente consultam a área antes ou depois de fazer uma fusão ou aquisição. Também 40% afirmam que ela é raramente consultada na contratação de ser-viços terceirizados. O RH acaba sendo acionado apenas para resolver as impli-cações administrativas e burocráticas desses movimentos.

Um termômetro de que o RH ainda não conquistou seu lugar no topo das decisões no mundo corporativo é que mais da metade das organizações pes-quisadas ainda não possui um CHRO (Chief Human Resources Officer) ou um executivo que responda pela área e que reporte-se diretamente ao CEO. A boa notícia é que dois terços dos entrevistados esperam ter alguém com essa responsabilidade nos próximos três ou cinco anos. “O líder de RH precisa ser um misto de administrador e estrategista, este é o futuro”, conclui Picarelli.

Atividades de aplicação1. Qual foi a opção encontrada pelos grandes latifundiários para substi-

tuir a mão de obra escrava no Brasil?

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2. Qual a principal medida do governo Vargas, no início da década de 1930, para que o Estado passasse a intervir diretamente em todas as instâncias da vida política, econômica e social do país?

3. Com a abertura comercial em 1990, como ficou a maioria das empre-sas instaladas no Brasil diante do novo contexto de mudanças?

Gabarito1. A grande opção foi a importação de mão de obra imigrante, em espe-

cial a empobrecida na Europa.

2. A principal medida foi a criação do Ministério do Trabalho, Indústria e Comércio.

3. A maioria das empresas se viu obrigada a rever uma série de paradig-mas e práticas organizacionais.

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