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1 GESTÃO DEMOCRÁTICA DO ENSINO E ELEIÇÃO DE DIRETORES Ionara Soveral Scalabrin Resumo A regra de direito constitucional da gestão democrática do ensino público, é uma regra em permanente disputa, que experimenta avanços e retrocessos ao longo da história. Da mesma forma, os seus desdobramentos apresentam interpretações diversas, como é o caso da função, formação e escolha de diretores escolares. O presente texto analisa a legislação que trata da gestão democrática no Estado do Rio Grande do Sul e a sua relação com as políticas educacionais nacionais, com especial atenção ao caso da escolha dos diretores escolares. A pesquisa, de cunho bibliográfico e documental, evidenciou que a gestão democrática e as formas de seleção dos diretores escolares permanecem em disputa nas políticas educacionais e no meio jurídico. A gestão democrática ampliou espaços de participação da comunidade escolar e proporcionou maior autonomia às escolas com a descentralização de alguns processos, acarretando em exigência de competência técnica e política aos diretores escolares. A atuação dos Conselhos Escolares e a eleição de diretores fortalecem a gestão democrática. Palavras-chave: Gestão democrática. Eleição de diretores escolares. Políticas educacionais. Considerações iniciais O dispositivo legal constitucional da “gestão democrática do ensino público” carrega consigo a história de luta de muitos movimentos educacionais em prol da democratização da educação, no entanto, a sua efetividade e formas de concretização permanecem em disputa nas políticas educacionais. As formas de seleção dos diretores escolares são um exemplo de disputas políticas e jurídicas, que se evidenciam nas legislações educacionais e nas suas contestações. Na medida em que as políticas educacionais foram sofrendo reformas, especialmente a partir dos anos de 1990, a função de diretor escolar, sua formação e seleção foram ganhando destaque, uma vez que as reformas educacionais só teriam efetividade se fossem levadas a cabo nas escolas com a mediação do trabalho do diretor escolar. Frente a essa problemática, pretende-se analisar a legislação que trata da gestão democrática no Estado do Rio Grande do Sul e a sua relação com as políticas educacionais nacionais, com especial atenção ao caso da escolha dos diretores escolares. Inicialmente, o texto apresenta as exigências que vêm sendo feitas aos diretores escolares de acordo com as políticas vigentes e, em seguida, passa a expor as mudanças e os tensionamentos na legislação educacional do Estado do Rio Grande do Sul no tocante à gestão democrática do ensino e à seleção de diretores escolares. Por fim, apresenta o estágio em que

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GESTÃO DEMOCRÁTICA DO ENSINO E ELEIÇÃO DE DIRETORES

Ionara Soveral Scalabrin

Resumo

A regra de direito constitucional da gestão democrática do ensino público, é uma regra em permanente disputa,

que experimenta avanços e retrocessos ao longo da história. Da mesma forma, os seus desdobramentos apresentam interpretações diversas, como é o caso da função, formação e escolha de diretores escolares. O

presente texto analisa a legislação que trata da gestão democrática no Estado do Rio Grande do Sul e a sua

relação com as políticas educacionais nacionais, com especial atenção ao caso da escolha dos diretores escolares.

A pesquisa, de cunho bibliográfico e documental, evidenciou que a gestão democrática e as formas de seleção

dos diretores escolares permanecem em disputa nas políticas educacionais e no meio jurídico. A gestão

democrática ampliou espaços de participação da comunidade escolar e proporcionou maior autonomia às escolas

com a descentralização de alguns processos, acarretando em exigência de competência técnica e política aos

diretores escolares. A atuação dos Conselhos Escolares e a eleição de diretores fortalecem a gestão democrática.

Palavras-chave: Gestão democrática. Eleição de diretores escolares. Políticas educacionais.

Considerações iniciais

O dispositivo legal constitucional da “gestão democrática do ensino público” carrega

consigo a história de luta de muitos movimentos educacionais em prol da democratização da

educação, no entanto, a sua efetividade e formas de concretização permanecem em disputa

nas políticas educacionais. As formas de seleção dos diretores escolares são um exemplo de

disputas políticas e jurídicas, que se evidenciam nas legislações educacionais e nas suas

contestações.

Na medida em que as políticas educacionais foram sofrendo reformas, especialmente a

partir dos anos de 1990, a função de diretor escolar, sua formação e seleção foram ganhando

destaque, uma vez que as reformas educacionais só teriam efetividade se fossem levadas a

cabo nas escolas com a mediação do trabalho do diretor escolar.

Frente a essa problemática, pretende-se analisar a legislação que trata da gestão

democrática no Estado do Rio Grande do Sul e a sua relação com as políticas educacionais

nacionais, com especial atenção ao caso da escolha dos diretores escolares.

Inicialmente, o texto apresenta as exigências que vêm sendo feitas aos diretores

escolares de acordo com as políticas vigentes e, em seguida, passa a expor as mudanças e os

tensionamentos na legislação educacional do Estado do Rio Grande do Sul no tocante à gestão

democrática do ensino e à seleção de diretores escolares. Por fim, apresenta o estágio em que

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se encontra a mais recente disputa jurídica da legislação estadual que trata da gestão

democrática do ensino público.

Gestão democrática: da administração à política

O cenário educacional brasileiro passa por mudanças significativas a partir dos anos

1990 com as reformas educacionais, sugeridas por organismos internacionais que passam a

discutir os problemas educacionais dos países em desenvolvimento, promover eventos

mundiais, publicar relatórios e firmar termos de compromisso e cooperação. Por meio destes

termos os países signatários têm acesso a financiamentos para investimento em educação,

condicionando as políticas educacionais aos interesses destas organizações.

Oliveira (2010, p. 365) acredita que as reformas dos sistemas públicos de ensino são

motivadas por “uma exigência de ajuste e adequação da educação às demandas do capital no

atual estágio de desenvolvimento”, o que implica formar para o trabalho e para a integração

social, com capacidade de adaptação, de flexibilidade e de aprendizagem, para transitar entre

empregos formais, informais e ocupações alternativas.

Para atender as demandas da economia global era necessário reformar o Estado, a

iniciar pelos processos de gestão, adotando a administração pública gerencial como estratégia

para desburocratizar os serviços públicos, inclusive os serviços educacionais.

A referida adequação envolve os sistemas de ensino e as escolas, que assumem papel

fundamental na implementação das reformas educacionais, uma vez que à gestão escolar

competiria a operacionalização e a concretização das mudanças, o que demandou igualmente

um novo perfil de diretor das instituições de ensino.

Até então, na gestão escolar predominava a administração na sua forma mais

tradicional, centrada na figura do diretor, que tinha como função principal comandar e

controlar a execução das ações e das normas determinadas pelos sistemas de ensino,

empregando, de forma racional e utilitária as pessoas e os recursos disponíveis, muitas vezes,

desresponsabilizando-se pelos resultados da sua própria ação.

Nesse contexto, a administração escolar reduzia “a organização do trabalho na escola a

uma questão técnica, esvaziando-a de qualquer conteúdo político” (OLIVEIRA, 2002, p.

137), como denunciavam os movimentos em prol da democratização da educação.

Com a afirmação da gestão democrática do ensino público, garantida pela Constituição

Federal de 1988, o caráter político da gestão escolar começa a ganhar evidência, uma vez que

“a gestão implicaria participação e, portanto, a presença da política na escola” (OLIVEIRA,

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2002, p. 137). Igualmente, passa-se a exigir do diretor escolar uma competência política, além

da competência técnica.

Dos movimentos pela democratização da escola, emergiu também a defesa da

autonomia que, de acordo com Oliveira (2002, p. 136), pode ser “entendida como o espaço de

explicitação da política, da possibilidade da própria escola refletir sobre si mesma e adequar-

se à realidade local, como exercício de autodeterminação [...]”, resultando em novas formas

de gestão dos sistemas escolares e das escolas. Estes processos resultaram, em alguma

medida, maior autonomia pedagógica, administrativa e financeira, passando a exigir novos

conhecimentos dos diretores escolares, já que, em última instância, são eles os responsáveis

pela gestão da escola.

Diante deste contexto, o papel do diretor escolar é questionado: seria ele um

representante político ou um administrador escolar, ou ainda, um gerente de produtividade

acadêmica? Quais conhecimentos e competências seriam imprescindíveis para exercer essa

função? Qual seria a melhor forma de seleção deste profissional? Eleição pela comunidade,

indicação técnica ou política, concurso público ou a combinação de mais de uma estratégia de

seleção?

O tensionamento pelas regras e formas de seleção dos diretores escolares não é

novidade no cenário educacional e continua em disputa nas políticas públicas e no poder

judiciário, como demonstraremos analisando o caso do Estado do Rio Grande do Sul.

Gestão democrática: disputas políticas e jurídicas

Após a redemocratização do país, a Constituição Estadual do Rio Grande do Sul

(CE/RS/1989), reproduziu o dispositivo do Art. 206 da Constituição Federal (CF/1988), no

seu Art. 213, submetendo o ensino público estadual ao princípio da “gestão democrática do

ensino público”, indo além e dispondo que as escolas públicas estaduais contarão com

conselhos escolares, constituídos pela direção da escola e por representantes dos segmentos da

comunidade escolar (Art. 213, Caput), assim como os diretores das escolas públicas estaduais

serão escolhidos, mediante eleição direta e uninominal, pela comunidade escolar, na forma da

lei (Art. 213, Parágrafo 1º).

Após a promulgação da CE/RS/1989, coube às leis estaduais nº 9.233/91 e nº 9.263/91

regulamentarem a eleição dos diretores das escolas estaduais no Rio Grande do Sul. Todavia,

em agosto de 1991, o governador do Estado, Alceu Collares, propôs uma Ação Direta de

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Inconstitucionalidade (ADIn)1, contra o Parágrafo primeiro do Art. 213 da CE/RS/1989 e

contra as leis supracitadas, tendo sido concedida decisão liminar impedindo a realização de

eleições.

Segundo o Centro dos Professores do Estado do Rio Grande do Sul

(CPERS/Sindicato) (2006, s. p.), em 1995, sob pressão sindical, “o governador [Antônio]

Britto enviou novo projeto ao Legislativo, denominado Gestão Democrática do Ensino

Público”. O projeto, no entanto, não contemplava as expectativas e propostas dos professores,

uma vez que “o candidato [a diretor] teria que passar primeiro por um curso fornecido pela

Secretaria de Educação, que também sugeria o programa de ação, não havendo campanhas e

ficando os mandatos reduzidos a dois anos” (CENTRO DOS PROFESSORES DO ESTADO

DO RIO GRANDE DO SUL, 2006, s. p.). Apesar do descontentamento anunciado, foi

aprovada a Lei Estadual nº 10.576/1995, chamada “Lei da Gestão Democrática do Ensino

Público”, antes que fosse realizado o julgamento final do mérito da ADIn 578 (o que somente

ocorreria em 1999).

A Lei nº 10.576/1995 estabelecia que “a administração dos estabelecimentos de

ensino” seria exercida pelos seguintes órgãos: “I – Diretor; II - Vice-Diretor ou Vice-

Diretores; III - Conselho Escolar” (Art. 4º), sendo assegurada a autonomia da gestão

administrativa “I - pela indicação do Diretor, mediante votação direta da comunidade escolar;

[...] IV - pela atribuição de mandato ao Diretor indicado, mediante votação direta da

comunidade escolar; V - pela destituição do Diretor, na forma regulada nesta lei” (Art. 5º).

Como já referido, o tempo de administração do Diretor foi limitado a mandato de dois anos,

permitida uma recondução (Art. 9º). O Vice-Diretor ou Vice-diretores seriam escolhidos

“pelo Diretor dentre os membros do Magistério em exercício na escola [...]” (Art. 15). A

indicação dos diretores escolares contemplava duas etapas: a primeira consistia na realização

“de curso para qualificação do exercício da função, organizado pela Secretaria da Educação”

e a segunda consistia na “indicação pela comunidade escolar de cada estabelecimento de

ensino, mediante votação direta”, no entanto, a designação para a função de diretor era

condicionada à aprovação no curso de qualificação (Art. 19 e Parágrafo Único). Para

concorrer à função de Diretor, o professor deveria possuir “curso de Pedagogia com

habilitação em Administração Escolar ou habilitação superior na área de educação” e ter “no

mínimo três anos de efetivo exercício no Magistério Público Estadual”, entre outros requisitos

(Art. 20). Em relação aos Conselhos Escolares, estabelecia que estes seriam formados “pela

1 ADIn nº 578/RS. Data do julgamento do mérito: 03/03/99. Disponível em:

<http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=AC&docID=266425>. Acesso em: 27 mar. 2012.

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direção da escola e representantes dos segmentos da comunidade escolar” (Art. 40) e teriam

“funções consultiva, deliberativa e fiscalizadora nas questões pedagógico-administrativo-

financeiras” (Art. 41) (RIO GRANDE DO SUL, 1995).

A ADIn 578 foi julgada em 1999 e trouxe, na decisão final, a declaração da

“inconstitucionalidade” do Art. 213, Parágrafo 1º, da CE/RS/1989 “que previa, como critério

de escolha de ocupantes dos cargos de direção dos estabelecimentos públicos de ensino, a

eleição pela comunidade escolar, bem como das Leis nº 9.233/91 e nº 9.263/91, do mesmo

Estado, que regulamentavam o referido dispositivo constitucional”. O Tribunal, por maioria,

entendeu que as normas impugnadas retirariam do chefe do executivo o poder de livre

nomeação e exoneração e de provimento e extinção de cargos públicos, conferidos pelos Arts.

37, Inciso II e 84, Inciso XXV, da CF/1988 2.

Frente a essa decisão, podemos inferir que, juridicamente, a Lei nº 10.576/95 e suas

alterações (Lei nº 11.695/01 e Lei nº 13.990/12) incorrem no mesmo “vício” da lei anterior,

pois o entendimento do Supremo Tribunal Federal (STF) é no sentido de que o cargo de

diretor de escola, na estrutura da administração pública brasileira, é considerado um “cargo

em comissão”, de livre indicação e nomeação pelo chefe do poder executivo. Além disso, no

entendimento do Ministro Relator da decisão, Carlos Velloso, a gestão democrática não passa

necessariamente pela eleição de diretor. Em seu voto, afirma que a gestão democrática do

ensino público “pode ser implementada através de muitas vias, sendo desarrazoado o

pensamento de que só se realizaria mediante a instituição de eleições para o provimento dos

cargos de direção nas escolas públicas”. Ele acredita que “o sistema de eleição de diretores de

escolas públicas não é o melhor e de democrático só tem a aparência”, justificando que a

exigência para o diretor escolar “é o saber abrangente de uma série de questões científicas e

do conhecimento humano”, de forma que “a eleição, por parte de toda a comunidade [...]

muita vez tem presente menos o conhecimento científico e mais a capacidade de agradar e de

fazer promessas vazias” (BRASIL, 1999). Percebe-se que o seu argumento ultrapassa a

questão meramente jurídica e entra no mérito dos conhecimentos necessários para o exercício

da função de diretor escolar.

Outro marco nas políticas educacionais se dá em 1996, com a promulgação da Lei de

Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB 9394/1996), que pela primeira vez, dispensa

atenção especial à gestão escolar, “marcando um momento em que a escola passa a

2 Art. 37, Inciso II: "a investidura em cargo ou emprego público depende de aprovação prévia em concurso

público de provas, ou de provas e títulos, ressalvadas as nomeações para cargo em comissão declarado em lei

de livre nomeação e exoneração"; Art. 84, Inciso XXV: "prover e extinguir os cargos públicos federais, na

forma da lei".

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configurar-se como um novo foco da política educacional” (VIEIRA, 2006, p. 34), entretanto,

não aborda a questão da escolha dos diretores escolares, apenas reproduz o princípio

constitucional da “gestão democrática do ensino, na forma da lei”, acrescentando “e da

legislação dos sistemas de ensino” (Art. 3º, Inciso VIII). O detalhamento da gestão

democrática se dá pelos Art. 14 e 15.

Art. 14. Os sistemas de ensino definirão as normas da gestão democrática do ensino

público na educação básica, de acordo com as suas peculiaridades e conforme os

seguintes princípios:

I - participação dos profissionais da educação na elaboração do projeto pedagógico

da escola;

II - participação das comunidades escolar e local em conselhos escolares ou

equivalentes.

Art. 15. Os sistemas de ensino assegurarão às unidades escolares públicas de

educação básica que os integram progressivos graus de autonomia pedagógica e

administrativa e de gestão financeira, observadas as normas gerais de direito

financeiro público.

Como se observa, a LDB 9394/1996 destaca a participação e a autonomia como

elementos fundamentais para a gestão democrática, assegurando que os sistemas de ensino

definam a melhor forma de operacionalizar tais princípios.

A promulgação da LDB 9394/1996 motivou a realização de eventos locais, regionais e

nacionais para discutir suas deliberações frente aos históricos problemas educacionais.

Discussões estas que chegam às disputas de proposições no Plano Nacional de Educação I

(PNE I, 2001-2011) (BRASIL, 2001).

No tocante à gestão democrática, o PNE I, em seus Objetivos e Prioridades, aponta

para a democratização da gestão do ensino público, “obedecendo aos princípios da

participação dos profissionais da educação na elaboração do projeto pedagógico da escola e a

participação das comunidades escolar e local em conselhos escolares ou equivalentes”

(BRASIL, 2001, Seção 2,). Referenda a autonomia dos sistemas de ensino na implantação da

gestão democrática, orientando a criação de “Conselhos de Educação que reúnam

competência técnica e representatividade dos diversos setores educacionais” para a gestão dos

sistemas de ensino e a “formação de conselhos escolares de que participe a comunidade

educacional”, além de “formas de escolha da direção escolar que associem a garantia da

competência ao compromisso com a proposta pedagógica emanada dos conselhos escolares e

a representatividade e liderança dos gestores escolares” para a gestão das escolas (BRASIL,

2001, Seção V - Financiamento e Gestão, 11.2 Diretrizes). Acrescenta, ainda, que os sistemas

de ensino devem definir “normas de gestão democrática do ensino público, com a

participação da comunidade” (BRASIL, 2001, Seção V - Financiamento e Gestão, 11.3

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Objetivos e Metas, 11.3.1 Financiamento, 22). Como se observa, preconiza a autonomia dos

sistemas de ensino nas formas de escolha dos diretores escolares, mas indica a associação de

competências técnicas e políticas.

Frente aos ordenamentos legais da LDB 9394/1996 e do PNE I, em 2001, no Rio

Grande do Sul, foi apresentado pelo governo de Olívio Dutra um novo projeto de Lei da

Gestão Democrática da Escola Pública, construído com a participação da comunidade escolar,

porém, “na Assembléia [sic] Legislativa, foi apresentado um substitutivo, votado e aprovado

apressadamente, transformado na Lei nº 11.695, em vigor atualmente” (CENTRO DOS

PROFESSORES DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL, 2006, s. p.).

A lei aprovada (Lei nº 11.695/01) apresentou tímidas mudanças em relação a lei

anterior (Lei nº 10.576/95) e desagradou a muitos que aspiravam maior transparência e

autonomia na gestão escolar. A nova lei ampliou o período do mandato de dois para três anos

e permitiu reconduções sucessivas, antes limitada a uma recondução (Art. 9º). O processo de

indicação dos diretores permaneceu por votação direta pela comunidade escolar e exigiu a

participação em curso de qualificação para a função, no entanto, não condicionou a indicação

à aprovação no curso, como estava previsto anteriormente (Art. 19). O rol dos que podem

concorrer à função de Diretor é ampliado para “todo membro do Magistério Público Estadual

ou servidor” que possua “curso superior na área de Educação” e que “seja estável no serviço

público estadual” (Art. 20). Talvez aqui esteja a mudança mais importante no sentido da

democratização da escola, qual seja, permitir que os agentes educacionais (servidores)

também possam se candidatar a diretor escolar. Em relação aos Conselhos Escolares, inova ao

estabelecer que os representantes dos segmentos da comunidade escolar deverão ser eleitos

(Art. 40) (RIO GRANDE DO SUL, 2001). Verifica-se que, embora atendendo parcialmente

as expectativas da comunidade escolar, a Lei nº 11.695/01 mobiliza processos democráticos e

se adequa à legislação em vigor.

Em 2010, na fase final da vigência do PNE I, intensificam-se as discussões acerca do

PNE II e as disputas por suas metas e estratégias. Esse movimento provoca reflexões e

revisões nas orientações adotadas pelos sistemas de ensino até então.

Decorrente destes processos, que contou com a participação de representantes de

diversos segmentos da sociedade, o Estado do Rio Grande do Sul, através do governador

Tarso Genro, apresenta, em 2012, nova proposta de Lei de Gestão Democrática, com

mudanças mais significativas em relação à indicação dos diretores e aos conselhos escolares.

A partir da aprovação da Lei nº 13.990/12, a administração das escolas passa a ser

exercida pelos seguintes órgãos: “I - Equipe Diretiva – ED – integrada pelo Diretor, pelo

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Vice-Diretor e pelo Coordenador Pedagógico; e II - Conselho Escolar (Art. 4º). Quando trata

da autonomia da gestão, acrescenta os aspectos financeiro e pedagógico ao aspecto

administrativo, já previsto na lei anterior, e estabelece sua efetivação “I - pela indicação do

Diretor e do(s) Vice-Diretor(es), mediante votação direta da comunidade escolar; [...]” (Art.

5º). Amplia os atores a operar na administração da escola quando indica os integrantes da

Equipe Diretiva: Diretor, Vice-Diretor e Coordenador Pedagógico, que deverão atuar de

forma integrada e em consonância com as deliberações do Conselho Escolar (Art. 6º). Não

somente os Diretores, mas também os Vice-Diretores passam a ser indicados pela comunidade

escolar, mediante votação direta por meio de chapa (Art. 7º). O período de gestão permanece

sendo de três anos, no entanto, permitida uma recondução sucessiva, com exceção do pleito

de 2012. A frequência a curso de gestão escolar de, no mínimo quarenta horas, promovido

pela Secretaria da Educação do Estado, é considerada parte do processo de indicação do

Diretor e do Vice-Diretor, devendo ocorrer antes da posse (Art. 9º). Os agentes educacionais

(servidores) além de poderem candidatar-se a diretor, também podem candidatarem-se à

função de Vice-Diretor(es), devendo integrar uma chapa, desde que possuam curso superior

na área de Educação e preencham os demais requisitos previstos na lei. Se a escola possuir

trinta ou mais integrantes no segmento magistério-servidores, a chapa concorrente deverá

apresentar “o apoio expresso de, no mínimo, dez membros da comunidade escolar, sendo

cinco do segmento magistério-servidores e cinco do segmento pais-alunos” (Art. 20) (RIO

GRANDE DO SUL, 2012).

Quanto às funções dos Conselhos, a Lei nº 13.990/12 inova ao acrescentar a função

executora às funções consultiva, deliberativa, e fiscalizadora nas questões pedagógico-

administrativo-financeiras. Os Conselhos Escolares, de natureza jurídica, passam a

constituírem-se Unidades Executoras “responsáveis pelo recebimento, execução, prestação de

contas e aplicação dos recursos financeiros transferidos às escolas por órgãos federais,

estaduais, municipais ou doações para a manutenção e o desenvolvimento do ensino” (Art.

41) (RIO GRANDE DO SUL, 2012).

Fica evidenciado o fortalecimento dos processos participativos e de autonomia nos

diversos segmentos da comunidade escolar a partir da vigência desse ordenamento legal, que

mantém a coerência com os dispositivos da política educacional vigente.

Entretanto, a questão da indicação dos diretores e vice-diretores pela comunidade

escolar não é uma questão resolvida, uma vez que o Estado do Rio Grande do Sul, desde a

edição da Lei nº 10.576/95, e suas alterações (Lei nº 11.695/01 e Lei nº 13.990/12), aplica

dispositivos de leis que foram declaradas inconstitucionais pelo STF. Portanto, ocorrem

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eleições, não porque a constituição assegura a gestão democrática do ensino, mas porque o

chefe do poder executivo ou outros proponentes legais3 não requerem a declaração da

inconstitucionalidade das leis.

O mesmo ocorre em inúmeros municípios do Rio Grande do Sul. Muitos deles

promulgaram leis garantindo a eleição direta para diretor de escola. Todavia, a maioria destas

leis foi encaminhada pelo Poder Executivo. Podendo assim, quando ocorre mudança de

governo, o novo dono do poder ingressar com uma ADIn contra a lei municipal, que é

declarada inconstitucional pelo Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJRS)4, sob o

argumento de que essas leis retiram a prerrogativa de livre nomeação dos diretores escolares

dada ao Prefeito Municipal.

Portanto, no STF e no TJRS, prevalece o entendimento de que é inconstitucional a

eleição direta para diretor de escola, só ocorrendo eleições por concessão do ocupante do

Poder Executivo e não por força da lei. Isso decorre do fato de que a função de diretor de

escola amiúde tem sido criada como cargo em comissão ou função de confiança. Para a

legalidade da eleição direta para diretor de escola, torna-se necessário, portanto, que essa

função tenha outra base legal, diferente de cargo comissionado.

Sem essa alteração de natureza jurídica, o direito da comunidade escolar à gestão

democrática da escola, aqui considerada no aspecto referente à possibilidade de participar da

escolha do gestor, através do voto, permanece sendo uma concessão do governo de agora.

A democratização da gestão da educação e das instituições educativas, com garantia

de participação de todos os segmentos da comunidade escolar na definição e realização das

políticas educacionais, com eleição direta de diretores escolares e reitores e formas colegiadas

de gestão, é reivindicação recorrente dos movimentos educacionais, como expresso nas

Conferências Nacionais de Educação de 2010 e 2014 (CONAE 2010 - Eixo II - Qualidade da

Educação, Gestão Democrática e Avaliação; CONAE 2014 - Eixo V: Gestão Democrática,

Participação Popular e Controle Social, Proposições e Estratégias, 21).

3 Podem propor a ação direta de inconstitucionalidade: I - o Presidente da República; II - a Mesa do Senado

Federal; III - a Mesa da Câmara dos Deputados; IV - a Mesa de Assembléia [sic] Legislativa ou a Mesa da

Câmara Legislativa do Distrito Federal; V - o Governador de Estado ou o Governador do Distrito Federal; VI -

o Procurador-Geral da República; VII - o Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil; VIII - partido

político com representação no Congresso Nacional; IX - confederação sindical ou entidade de classe de âmbito

nacional (BRASIL, 1999, Art. 2o).

4 Citamos, como exemplo, algumas decisões do TJRS (que adota o mesmo entendimento do STF): ADIn nº

70000995050, julgada em 02/10/2000 (referente à lei do Município de Condor); ADIn nº 70014805170,

julgada em 06/11/2006 (referente à lei do Município de Seberi); ADIn nº 70022342711, julgada em

02/06/2008 (referente à lei do Município de Agudo); ADIn nº 70058553231, julgada em 28/07/2014 (referente

à lei do Município de Santo Ângelo); ADIn nº 70058866971, julgada em 15/12/2014 (referente à lei do

Município de Barra do Ribeiro); Disponível em: <http://www.tjrs.jus.br/busca/?tb=proc>. Acesso em 10 mar.

2016.

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Apesar de não contemplar na sua totalidade as demandas da CONAE 2010 e 2014, o

PNE II (2014-2024), que tramitou de 2010 até a sua aprovação em 2014, representa um

avanço em relação ao PNE I no tocante à gestão democrática, incluída a participação da

comunidade na seleção do diretor escolar.

O PNE II prioriza “o repasse de transferências voluntárias da União na área da

educação para os entes federados que tenham aprovado legislação específica” que considere,

para a nomeação dos diretores escolares, conjuntamente, “critérios técnicos de mérito e

desempenho, bem como a participação da comunidade escolar”, constrangendo os sistemas de

ensino para aprovação de legislação específica no prazo de dois anos, ou seja, até 2016 (PNE

II, Meta 19, Estratégia 19.1).

Outras estratégias da Meta 19 do PNE II avançam no fortalecimento dos processos

participativos e de ampliação da autonomia dos sistemas de ensino e das escolas, prevendo

“programas de apoio e formação de conselheiros de acompanhamento de políticas

educacionais” (Estratégia 19.2); “fóruns permanentes de educação nos estados, municípios e

DF, com vistas à coordenação das conferências e o acompanhamento dos planos de educação”

(Estratégia 19.3); “constituição e fortalecimento de grêmios estudantis e associações de pais”

(Estratégia 19.4); “conselhos escolares e conselhos municipais de educação, como

instrumentos de participação e fiscalização da gestão escolar e educacional” (Estratégia 19.5);

“participação da comunidade escolar na formulação de projetos político-pedagógicos,

currículos, planos de gestão escolar e regimentos escolares” (Estratégia 19.6); “autonomia

pedagógica, administrativa e de gestão financeira nos estabelecimentos de ensino” (Estratégia

19.7); “programas de formação de gestores escolares” e “ aplicação de prova nacional

específica para subsidiar a definição de critérios objetivos para o provimento dos cargos”

(Estratégia 19.8).

O Plano Estadual de Educação do Rio Grande do Sul (2015-2025), por sua vez,

intenciona assegurar condições para a efetivação da gestão democrática da educação pública e

do regime de colaboração, por meio do fortalecimento de conselhos de participação e controle

social e da gestão democrática escolar, ancorado em três pilares, no âmbito das escolas

públicas: primeiro, conselhos escolares; segundo, descentralização de recursos e progressivos

mecanismos de autonomia financeira e administrativa; terceiro, provimento democrático da

função de gestor (Meta 19).

Na sequência, verificaremos se os Planos Nacional e Estadual de Educação, em vigor

atualmente, foram levados em consideração para a elaboração da nova Lei de Gestão

Democrática.

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A mais recente disputa política e jurídica da Gestão Democrática

A iniciativa da nova Lei de Gestão Democrática (Lei nº 14754/2015) partiu da

Assembleia Legislativa, pela Deputada Regina Becker Fortunati, que apresentou o Projeto de

Lei nº169/2015, o qual tão logo foi divulgado provocou movimentos contrários: o

CPERS/Sindicato se manifestou contra e solicitou Audiência Pública para ouvir a

comunidade escolar, a qual não foi realizada; o Conselho Estadual de Educação do RS se

manifestou contra, denunciando o retrocesso que se apresentava; nas redes sociais surgiu a

Campanha pela Legalidade e Gestão Democrática, que pedia apoio para a não aprovação da

lei; dentre outras manifestações. Em sentido contrário, um grupo denominado “Rede Escola”,

composto majoritariamente por diretores de escola, que estariam impedidos de concorrer

novamente, fizeram lobby pela sua aprovação.

A nova Lei de Gestão Democrática (Lei nº 14754/2015), ironicamente publicada em

15 de outubro, dia do professor, exclui a Equipe Diretiva (integrada pelo Diretor, pelo Vice-

Diretor e pelo Coordenador Pedagógico) dos órgãos da administração da escola, voltando a

incluir, isoladamente, o diretor e o(s) vice-diretor(es) (Art. 4º). Pelo mesmo dispositivo, os

coordenadores pedagógicos não fazem mais parte da equipe diretiva, o que representa uma

visão estreita da relação da administração e do pedagógico de uma escola, uma vez que, em

educação, as atividades administrativas e pedagógicas são interdependentes! Tanto as

atividades administrativas como as pedagógicas devem estar a serviço dos fins da educação

(RIO GRANDE DO SUL, 2015).

A nova Lei de Gestão Democrática (Lei nº 14754/2015) restringe a participação da

comunidade escolar à escolha dos diretores escolares, não podendo mais participar da escolha

dos vice-diretores (Art. 5º) o que, lamentavelmente, facilita as práticas clientelistas e

personalistas nas gestões escolares, pois cabe ao diretor eleito “escolher” os vice-diretores.

Essa prática afronta o essencial da democracia, pois o poder não pode pertencer aos

governantes; o poder pertence aos que elegem periodicamente os seus representantes. Neste

quesito, outro agravante é o fato de a nova Lei criar um dispositivo de exceção, que permite

apenas aos atuais diretores se reelegerem para um novo mandato, independentemente do

número de vezes que já tenha sido reconduzido ao cargo (Art. 20, §2º). Como este dispositivo

de exceção aplica-se somente ao pleito de 2015, a nova Lei acrescenta que “o Diretor, após a

recondução, poderá participar de uma futura administração do estabelecimento de ensino,

ocupando outro órgão” (Art. 9º, §3º), ou seja, favorecendo que as mesmas pessoas

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permaneçam à frente da gestão das escolas, mudando a cada tempo apenas o seu cargo (RIO

GRANDE DO SUL, 2015).

Em decorrência da candidatura não se dar mais por meio de chapa, e sim de forma

uninominal, foi excluída da nova Lei de Gestão Democrática (Lei nº 14754/2015) a exigência

do apoio expresso à chapa, que era feito por integrantes dos segmentos magistério-servidor e

pais-alunos para escolas com mais de trinta professores e agentes educacionais. Tal

dispositivo podia ser considerado motivador do diálogo com a comunidade, pois o apoio a

uma chapa representa, em última instância, o apoio a um plano de ação, a um projeto de

gestão, que precisa ser conhecido, discutido e decidido pelos seus apoiadores.

Os Conselhos Escolares, com as mudanças impostas pela nova Lei de Gestão

Democrática (Lei nº 14754/2015) perderam a sua função executora, o que enfraquece a

autonomia e o controle social sobre as ações dos setores administrativo e financeiro das

escolas. Como se não bastasse, ficam impedidos de fiscalizar as questões pedagógicas, o que

pode desmotivar ainda mais a participação da comunidade nos Conselhos Escolares (RIO

GRANDE DO SUL, 2015).

Como se observa, contrariando a intencionalidade de fortalecimento dos conselhos de

participação e controle social e da gestão democrática escolar, menos de quatro meses após a

promulgação do Plano Estadual de Educação-RS, é aprovada pela mesma câmara legislativa,

a Lei nº 14754/2015 que trata da Gestão Democrática, mas, contraditoriamente, fragiliza os

processos de participação e autonomia das escolas estaduais.

Após a promulgação da Lei nº 14754/2015, coube ao CPERS/Sindicato entrar com

uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADIn)5 com pedido liminar, alegando,

ironicamente, o mesmo princípio constitucional usado pelos poderes judiciários para declarar

a inconstitucionalidade das leis de gestão democrática que preveem a eleição de diretores

escolares, qual seja, que os cargos de confiança, ou comissão, nos termos do Art. 37, Inciso II,

da Constituição Federal, são de livre nomeação e exoneração do administrador público, não

podendo ser proposta pelo Poder Legislativo. A medida cautelar foi concedida, suspendendo

os efeitos da nova Lei de Gestão Democrática (Lei nº 14754/2015) para o pleito de 2015. A

Adin aguarda julgamento, que está previsto para maio de 2016.

Cabe referir que, quando o Projeto de Lei nº169/2015 foi apresentado, as escolas já

haviam recebido orientações para o processo de eleição de diretores. Com a aprovação da Lei

nº 14754/2015, novas orientações foram repassadas às escolas e posteriormente, com a

5 ADIn nº 700/70067108514.

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concessão do pedido de liminar outras orientações ainda foram enviadas pela Secretaria de

Educação do Estado do Rio Grande do Sul (SEDUC/RS) para as escolas, ocasionando a cada

nova orientação, a anulação do processo em andamento, num clima de incerteza e

desconfiança.

Conforme exposto, a nova Lei de Gestão Democrática (Lei nº 14754/2015) mantém a

indicação do diretor escolar mediante eleição da comunidade escolar, mas,

contraditoriamente, enfraquece a gestão democrática, na contramão das proposições dos

Planos Nacional e Estadual de Educação, em vigor atualmente.

A exposição apresentada até aqui permite inferir que a gestão democrática do ensino

público permanece em disputa no campo político e jurídico.

Considerações Finais

A partir dos anos 1990, com a globalização da economia, novas demandas foram

impostas para a escola, iniciaram-se os processos de descentralização, conferindo maior

autonomia para decidir e resolver sobre as suas questões cotidianas, no entanto, ampliaram-se

as responsabilidades da gestão escolar. A escola continua condicionada pelos influxos dos

sistemas de ensino e estes pelas influências dos organismos internacionais.

As novas políticas educacionais implantadas pelas reformas demandam novos

modelos de gestão escolar e exigem um novo perfil de diretor de escola, que acumule

competência técnica para os processos de autonomia pedagógica, administrativa e financeira e

competência política para os processos participativos. Observa-se que quanto mais espaço há

para a autonomia e a participação na gestão escolar, mais evidência aufere a função do diretor

de escola, igualmente, mais se acirra a disputa em torno das formas de seleção destes

profissionais.

O caso do Estado do Rio Grande do Sul confirma esse acirramento, que, para além da

seleção dos dirigentes escolares, permeia a forma de concretização dos dispositivos legais

acerca da gestão democrática do ensino público.

Como foi possível observar, as legislações educacionais apresentam um dinamismo e

os seus dispositivos são resultados de movimentos políticos, que ora direcionam para a

ampliação e o fortalecimento dos processos democráticos, ora apresentam retrocessos.

Na análise da legislação do Estado do Rio Grande do Sul no tocante à Gestão

Democrática e suas contestações jurídicas, evidenciou-se que a legislação nacional vem

provocando a revisão das leis estaduais, no sentido da ampliação da autonomia e da

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participação da comunidade escolar, com exceção da Lei de Gestão Democrática nº

14754/2015, que aguarda julgamento de inconstitucionalidade. Em relação à eleição dos

diretores escolares verifica-se que as novas legislações continuam a afirmando, embora já

exista jurisprudência quanto a sua inconstitucionalidade.

A eleição de diretores escolares é considerada um mecanismo da gestão democrática

da escola e representa uma possibilidade de mudança nas relações de poder e de autoridade.

Por meio dela os espaços de participação da comunidade escolar e os mecanismos de controle

social podem ser ampliados. Ademais, as eleições diretas de diretores escolares podem

minimizar a cultura do favor, o clientelismo e o personalismo, característicos das indicações

políticas.

A gestão democrática da escola, no entanto, não se realiza apenas com a eleição direta

de diretores escolares, ela depende da atuação dos conselhos escolares e da participação dos

diversos segmentos da comunidade nas tomadas de decisões, pois o poder centralizado na

figura do diretor enfraquece a instituição, enquanto o poder distribuído também divide

responsabilidades e envolve a comunidade na execução das ações. Nesse sentido, o

fortalecimento dos Conselhos Escolares é um imperativo para a concretização da gestão

democrática. É pela atuação dos Conselhos que as ações da gestão escolar são legitimadas e

se aproximam das aspirações da comunidade escolar.

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15

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