Gestão Participativa e Busca do Consenso na Resolução de ... · pode configurar no grupo,...

12
1 Gestão Participativa e Busca do Consenso na Resolução de Conflitos: Como Alcançá-lo se Todos Nós Temos Bons Argumentos? Autoria: Ana Lucia Castilho da Mota, Vânia Maria Jorge Nassif Resumo: O Instituto Passe de Mágica é uma ONG que utiliza o esporte educacional como promoção social para crianças e jovens que vivem em situação de alta vulnerabilidade social. Diagnóstico feito junto à diretora executiva do IPM, identificamos a dificuldade da equipe buscar consenso na tomada de decisão frente a uma situação-problema. Este relato objetivou analisar qualitativamente estas dificuldades por meio do grupo focal, envolvendo oito colaboradores do IPM. O resultado foi analisado discursivamente. A intervenção favoreceu a reflexão sobre tais aspectos, quais os fatores dificultadores vivenciados, os pontos fortes da equipe e a responsabilidade social que a função exercida requer. Palavras-chave: esporte educacional, equipe, decisão, consenso, ONG.

Transcript of Gestão Participativa e Busca do Consenso na Resolução de ... · pode configurar no grupo,...

 

 

Gestão Participativa e Busca do Consenso na Resolução de Conflitos: Como Alcançá-lo se Todos Nós Temos Bons Argumentos?

Autoria: Ana Lucia Castilho da Mota, Vânia Maria Jorge Nassif

Resumo: O Instituto Passe de Mágica é uma ONG que utiliza o esporte educacional como promoção social para crianças e jovens que vivem em situação de alta vulnerabilidade social. Diagnóstico feito junto à diretora executiva do IPM, identificamos a dificuldade da equipe buscar consenso na tomada de decisão frente a uma situação-problema. Este relato objetivou analisar qualitativamente estas dificuldades por meio do grupo focal, envolvendo oito colaboradores do IPM. O resultado foi analisado discursivamente. A intervenção favoreceu a reflexão sobre tais aspectos, quais os fatores dificultadores vivenciados, os pontos fortes da equipe e a responsabilidade social que a função exercida requer. Palavras-chave: esporte educacional, equipe, decisão, consenso, ONG.

 

 

Introdução A exclusão social ainda é um fenômeno presente em muitas sociedades contemporâneas. Devido à dificuldade do Estado em atender todos os apelos sociais, cada vez mais, organizações do terceiro setor têm buscado ocupar essa lacuna promovendo ações para o desenvolvimento social de grupos excluídos ou marginalizados no bojo da sociedade (Nassif, Prando & Cosentino, 2010). Por isso, as organizações do terceiro setor que, diferentemente das organizações de negócio, não têm como foco principal resultados financeiros, mas têm como objetivo final as ações e funções de cunho social à sociedade. As demandas sociais, ainda prementes em nossa sociedade, têm provocado um forte crescimento desse segmento no Brasil, entretanto a profissionalização no terceiro setor não acompanhou esse desenvolvimento. A ausência de modelos de gestão de natureza social fez com que algumas dessas organizações acabassem por desenvolver estilos próprios baseados na intuição do gestor e seus resultados adquiridos por meio de tentativa e erro da rotina gerencial. Consequentemente, legitimar mecanismos de gestão eficazes e compatíveis com a realidade das organizações do terceiro setor e aprimorar seu gerenciamento para que atinjam os resultados almejados são essenciais (Teixeira, 2004; Rico, 2008). Considerando que a gestão participativa tem como característica principal envolver seus membros nos processos de tomada de decisão e na resolução de problemas, ela é entendida como um dos principais fatores de sucesso nas organizações de terceiro setor na percepção dos seus gerentes, de acordo com Soares e Melo (2010). Não obstante o processo de decisão ser complexo, considerando a natureza subjetiva dos envolvidos, Simon (1997) pontua que as decisões dos indivíduos são permeadas por um conjunto de valores, experiências, estilo, maturidade, influência e até mesmo suas limitações. Complementando esses pressupostos, Schön (2000) sugere que os profissionais precisam desenvolver sua própria prática na expectativa de que a reflexão seja um instrumento de desenvolvimento do pensamento e da ação. Este autor propõe a reflexão-na-ação, definindo-a como o processo mediante o qual, frente a uma decisão, as pessoas observam a situação, dão coerência e direcionamento em suas ações. No entanto, dada à subjetividade, experiências, valores, a situação vivenciada pode configurar no grupo, conflito de difícil resolução, em função de que, muitas vezes, o problema é visto como um processo ontológico devido à visão de mundo dos envolvidos. Contudo, mesmo em um modelo participativo de gestão, no qual se valoriza os diferentes olhares e opiniões, essa diversidade pode gerar conflitos e criar obstáculos para se alcançar o consenso ou diminuir a eficácia na resolução de problemas. Sob esta perspectiva Schön e Argyris (1994a) afirmam que quase sempre uma situação problema transcende soluções de ordem teórica e de técnicas existentes e essas zonas indeterminadas da prática, a incerteza, a singularidade e os conflitos de valores escapam aos preceitos da racionalidade técnica e apresentam-se como centrais na prática profissional. Quanto ao conflito, este nem sempre é percebido como algo negativo, todavia, ele pode ser considerado o principal responsável e gerador de condições caóticas (Robbins, 2005). Por um lado, reforça a identidade social da equipe, por outro pode fornecer um obstáculo para a formação de equipes multifuncionais e dificultar a realização dos objetivos da organização (Valeriano, 2001; Ferreira, 2010). Um exemplo que demonstra esse embate é o caso de uma equipe de educadores, de uma organização sem fins lucrativos, Neste caso, por meio de um diagnóstico realizado, pôde-se perceber que a equipe apresenta algumas dificuldades quando vivenciam um dilema. Diante desse cenário, este relato tecnológico teve como objetivo analisar como a equipe de educadores do IPM, que se apoia no esporte educacional como instrumento de promoção social desenvolvido com crianças e jovens que vivem em situação de alta vulnerabilidade social, busca foco, consenso e tomam decisões frente a uma situação-problema. Por se tratar de assuntos decorrentes da demanda de mercado, de empresas de pequeno porte e, também na

 

 

área do terceiro setor, os resultados alcançados poderão ser de grande valia e auxiliar outras organizações na condução de suas atividades. Os constructos que foram abordados nesse relato tecnológico contemplam a administração de conflitos em organizações do terceiro setor, evidenciando que seus desafios vão além das exigências das organizações de negócios, pois, não obstante recursos financeiros serem essenciais para a sua sustentabilidade, a finalidade de suas ações é a promoção social. Esse relato tecnológico está estruturado trazendo, a partir dessa introdução, as reflexões teóricas acerca da gestão do terceiro setor, gestão participativa e administração de conflitos. A contextualização, diagnóstico e a situação-problema, descrevendo a ação dos atores envolvidos e as situações vivenciadas no cotidiano. E por fim, os resultados, as contribuições provenientes das intervenções vivenciada no grupo e as considerações finais.

Reflexões Teóricas A gestão participativa envolvendo liderança e equipes, bem como situações inerentes ao trabalho em equipe em um contexto institucional, mais especificamente no terceiro setor, são os tópicos tratados nas reflexões teóricas desse relato tecnológico. Esses temas foram abordados procurando entender contextos em que as equipes vivenciam situações de conflitos frente aos processos de tomada decisão no seu cotidiano. Visou-se assim, contribuir para a reflexão sobre a importância do desenvolvimento profissional de equipes que atuam no terceiro setor.

Gestão no Terceiro Setor: características e desafios Problemas sociais, destacando-se a exclusão social, estão presentes em muitas sociedades contemporâneas, dentre elas, a brasileira. A dificuldade do Estado em atender todas as demandas sociais tem atraído à atenção de organizações do terceiro setor que buscam promover ações para o desenvolvimento social junto aos indivíduos ou grupos que são excluídos ou marginalizados no bojo da sociedade. Essas ações buscam resolver ou minorar os resultados advindos da desigualdade social (Nassif, Prando & Cosentino, 2010). O terceiro setor integra organizações da sociedade civil, sem fins lucrativos, voltadas para questões de interesse público e que buscam autonomia tanto em relação ao Estado quanto ao mercado. Diferente das organizações de negócio, que têm como principal objetivo, os resultados financeiros, as organizações do terceiro setor focam seus resultados no contexto social (Teixeira, 2004; Rico, 2008). Um aspecto comum aos empreendimentos de cunho social é o fato de serem criados e mantidos por pessoas que acreditam que mudanças são necessárias e que desejam tomar providências nesse sentido (Hudson, 1999). Dentre as principais características atribuídas aos empreendedores sociais está a capacidade de ser visionário, ter senso de solidariedade, ser sensível aos problemas sociais, ser inconformado com a injustiça e a desigualdade, comprometido, leal e ético (Oliveira, 2004). Considerando o rápido crescimento das organizações do terceiro setor no Brasil, a profissionalização nesse segmento tornou-se um imperativo. Muitas dessas organizações acabaram por desenvolver estilos próprios de gestão baseados em tentativa e erro devido à ausência de modelos de gestão de natureza social. Assim, entre os desafios enfrentados pelas organizações do terceiro setor, está a forma como são administradas, visto que, por estarem inseridas num amplo contexto político, social e econômico, também são afetadas pelas grandes transformações que ocorrem na sociedade (Teixeira, 2004; Rico, 2008). Soares e Melo (2010) salientam que caracterizar as práticas de gestão do terceiro setor como uma prática social acarretará uma melhor compreensão dos seus processos e papeis gerenciais. A necessidade de legitimação das práticas gerenciais desse segmento foi alertada por Hudson (1999). Para o autor, elas podem aprimorar o gerenciamento dessas organizações, reforçando a necessidade de mecanismos de

 

 

gestão eficazes e compatíveis com a realidade delas, para que seus objetivos sejam atingidos e é possível cumprir este desafio por meio de uma gestão participativa, geradora de oportunidades de participação dos membros envolvidos no processo.

Gestão Participativa: um olhar para a relação do líder e equipe A força de uma equipe tem relação direta com a força de seu líder. Gerenciar pessoas é um ato de equilíbrio fino, intimamente ligado à capacidade de exercer liderança, inspirar motivação e conduzir as pessoas na direção dos objetivos definidos, afirma Curty (2001). Líderes precisam ter visão, perceber as mudanças no cenário local e mundial, escolher as melhores opções dos recursos humanos e tecnológicos, motivar as pessoas, criar equipes e, principalmente, comprometer-se a participar dos processos de mudança com honestidade e coragem (Oliveira, 2006; Kotter, 1992). Alaby (2006) apresenta, entre as classificações de liderança propostas na literatura acadêmica, o estilo democrático-participativo. Esse estilo promove um tipo de justiça distributiva caracterizada pelo equilíbrio do poder e pelo respeito à decisão de cada um e de todos. O estilo democrático-participativo é considerado próprio de líderes que acreditam que motivar os outros é envolvê-los nas tomadas de decisão e na resolução de problemas. O comprometimento dos membros de uma instituição social tende a ser maior quando ela apresenta uma gestão participativa, que valoriza a proximidade, a confiança e o respeito entre seus integrantes, estando entre os fatores determinantes para o sucesso ou fracasso de uma organização (Teixeira, 2004). Pesquisa de Soares e Melo (2010) corrobora essa visão e aponta que um dos principais fatores de sucesso nas organizações de terceiro setor, na percepção dos seus gerentes, é a gestão participativa, favorecendo o aumento da qualidade das decisões e da administração, além de melhorar a satisfação e a motivação da equipe. Em uma equipe de trabalho o nível de desempenho melhora quando a tarefa exige várias habilidades e experiências, pois cada um tem algo exclusivo para acrescentar e a combinação desses conhecimentos é maior do que a soma das contribuições individuais, embora o trabalho em equipe tome mais tempo e consuma mais recursos do que o individual (Baron & Shane, 2011, Schön & Argyris,1994a, Schön, 2000). Mesmo sob estas circunstâncias de entreajuda e de colaboração, os conflitos são proeminentes.

Administração de Conflito Os problemas mais frequentes e decorrentes de geração de conflitos são provenientes de diferentes situações, passando pela dificuldade de tomada de decisão, dos diferentes olhares e interpretações para a mesma situação, disputa de recursos, dentre outros, o que por vezes, dificulta o desenvolvimento das atividades necessárias para o bom funcionamento de qualquer organização, sobretudo nas organizações do terceiro setor. Conflito nas organizações foi um dos temas ocultados por anos e que passou a fazer parte da agenda de pesquisadores a partir da metade dos anos 1970 como um dos assuntos essenciais para a melhor compreensão da gestão (Chanlat,1996). São várias as vertentes que contemplam os estudos na área, como a fuga do risco (Jensen & Meckling,1976), divergência entre duas ou mais partes ou posições, além de ser entendido como uma força da organização que contribui para a liberação de energias criativas e que ajudam na solução de problemas (Montana & Charnov, 2001). O conflito pode ser um sério problema gerador de condições caóticas ou ser considerado como resultado natural de uma tentativa de mudança (Robbins, 2005). São vários os fatores geradores de conflitos no ambiente de trabalho. Por um lado, reforça a identidade social da força de trabalho, mas pode também fornecer um obstáculo poderoso para a formação de equipes multifuncionais (Ferreira, 2010), dificultando a realização dos objetivos de outra pessoa ou grupo (Valeriano, 2001). Robbins (2005, p. 326) define conflito como “um processo que tem início quando uma das partes percebe que a outra parte afeta, ou pode

 

 

afetar, negativamente, alguma coisa que a primeira considera importante”. Nos modelos clássicos de gestão, o conflito é tido como algo prejudicial à organização sendo, na maioria das vezes, ignorado. Tendências contemporâneas visualizam-no como um fenômeno inevitável, presente nas organizações dinâmicas e que necessitam ser admitidos, entendidos e administrados. Nessa ótica, o conflito não é necessariamente uma coisa negativa, visto que, uma equipe totalmente imune a ele tende a se tornar apática e estagnada ou pode melhorar a sua eficácia. (Valeriano, 2001; Robbins, 2005; Ferreira, 2010). As formas construtivas de conflito que melhoram o desempenho da equipe e estimulam a criatividade e a inovação, são chamadas de conflitos funcionais. Já as formas destrutivas que dificultam o desempenho da equipe e diminuem a eficácia são os disfuncionais. Os conflitos de relacionamento são quase sempre disfuncionais. Já os de tarefa, que se refere ao conteúdo e aos objetivos do trabalho e os de processo, referente à maneira como o trabalho é realizado, em níveis adequados e bem administrados, frequentemente são benéficos, pois favorecem a discussão, promovem a análise crítica de problemas e podem levar a melhores decisões da equipe. O nível ótimo seria aquele em que há conflito suficiente para evitar a estagnação e favorecer a criatividade e o processo de decisão, mas insuficiente para atrapalhar ou prejudicar o desenvolvimento das atividades (Robbins, 2005). Os constructos abordados são relevantes para a administração de conflitos em organizações do terceiro setor. Seus desafios vão além das exigências das organizações de negócios que acabam por voltar-se para os resultados financeiros. Embora recursos financeiros sejam fundamentais para a sobrevivência das organizações do terceiro setor, não são fins neles mesmos, pois o objetivo de suas ações é a promoção social. Portanto, trabalhar no terceiro setor requer comprometimento, ética e doação pessoal dos profissionais que optam por atuar em contextos de vulnerabilidade social. De maneira geral, o suporte teórico que sustenta a investigação a seguir, contemplou os pressupostos que alicerçam a gestão do terceiro setor, a administração participativa e de conflitos, temas estes que serão abordados no desenvolvimento do caso, apresentado a seguir.

Diagnóstico e preparação do trabalho Inicialmente, foi realizado um diagnóstico junto à diretora executiva do Instituto Passe de Mágica - IPM, cujo tema abordou a dificuldade da equipe em buscar consenso, tomar decisões e reagir, proativamente, frente a um dilema. De certa forma, percebemos que, mesmo diante de tais dificuldades, as atividades eram desenvolvidas com muita dedicação e sensibilidade, mas exigindo de cada educador um esforço adaptativo para conviver harmonicamente, já que essa postura é a esperada pela organização e preconizada na sua missão. Frente a esse contexto surge a questão de pesquisa que orientou esse relato tecnológico: como a equipe de educadores do Instituto Passe de Mágica (IPM) busca foco, consenso e tomam decisões frente a uma situação-problema geradora de conflito? O objetivo principal dessa investigação foi o de analisar como a equipe de educadores do IPM busca foco, consenso e tomam decisões frente a uma situação-problema, geradora de conflito. Os objetivos secundários visaram: a) identificar quais são os fatores dificultadores vivenciados pela equipe de educadores do IPM; b) conhecer quais são os pontos fortes e as dificuldades da equipe para dirimir uma situação-problema e, c) identificar os conflitos recorrentes no cotidiano do grupo. A abordagem metodológica escolhida para o desenvolvimento desse relato tecnológico foi a pesquisa qualitativa, utilizando-se da dinâmica do grupo de foco. Esse recurso consiste, conforme Godoy (1995) em um encontro grupal que obedece a critérios específicos, pois não se trata de uma entrevista em grupo, indo além, pois os integrantes são conduzidos por um moderador na discussão de um tema de acordo com os objetivos propostos. A opção pelo grupo de foco baseou-se também nos pressupostos de Flick (2009) cujas pessoas com diferentes experiências e posturas diante de um tema, convergem ou

 

 

divergem para aquilo que se pretende desvendar, trazendo respostas significativas e pragmáticas que contribuem para a situação em evidência. Com base neste levantamento, além de explicar nossa percepção do contexto, propusemos a realização de uma atividade grupal, visando dialogar esta temática com a equipe de educadores, que foi prontamente autorizada e aceita, além de bem recebida pelos participantes. Para tal, um roteiro semiestruturado foi desenvolvido e revisado por dois especialistas que conhecem o tema em estudo. As perguntas foram elaboradas tendo como referência os objetivos da pesquisa, a problemática em pauta, respaldadas na literatura. O passo seguinte foi o agendamos do encontro que durou aproximadamente 3 horas e foi gravado com autorização de toda a equipe e da diretora do IPM. Participaram do grupo 8 pessoas que assumem diferentes posições do IPM. O registro do encontro foi transcrito e analisado discursivamente, conforme Flick, 2009. Visando preservar a identidade dos participantes, doravante serão apresentados como P1, P2... P8 (participante 1, 2 e assim sucessivamente para todos os participantes do grupo focal). Já no contexto do grupo, explicamos o propósito do encontro, a dinâmica e o desenrolar da atividade, procurando dirimir as dúvidas, além de deixar os participantes bem à vontade e descontraídos para expressarem seus pensamentos, experiências e sugestões. Após todos estarem engajados na proposta, iniciamos com as perguntas do roteiro elaborado. Contextualização da Situação-problema A experiência relatada ocorreu no Instituto Passe de Mágica (IPM), uma organização sem fins lucrativos que atende aproximadamente 780 crianças e jovens em seus sete núcleos localizados na zona sul da cidade de São Paulo e na região conhecida como ABCD e outro em Piracicaba, no interior paulista. O IPM utiliza o esporte educacional, mais especificamente o basquete, como instrumento para a promoção social de crianças e jovens que vivem em situação de alta vulnerabilidade social. A equipe do eixo educacional do IPM é composta por 20 colaboradores alocados de acordo com o seguinte organograma: Diretoria – diretora executiva; Equipe de coordenação – coordenador de projeto, supervisora administrativa e auxiliar administrativo; Equipe técnica – supervisora técnica de basquete, educadores e auxiliares de educadores; Equipe de acompanhamento psicológico. Diferente do modelo tradicional de administração, o corpo dirigente declara que o IPM desenvolve uma gestão participativa em que a equipe atua efetivamente da construção do planejamento anual e das ações do dia a dia, da organização de eventos e de todos os processos de tomada de decisões relacionados às intervenções diretas realizadas com as crianças e jovens. A rotina de trabalho do grupo de coordenação inclui encontros semanais de toda a equipe para elaborar relatórios, planejar aulas, trocar informações e discutir eventuais problemas vivenciados ou identificados nos contextos específicos em que atuam. Duas vezes por semana os educadores e seus auxiliares estão em atendimento direto junto às crianças e jovens nos seus respectivos núcleos. Além disso, a equipe também realiza reuniões e encontros com os familiares dos educandos. O cotidiano dessa equipe se pauta por desafios nem sempre percebidos de forma homogênea por todos em função de suas diferentes experiências e expectativas. Embora a dinâmica das equipes gire em torno de encontros semanais visando o andamento dos projetos, quando uma situação-problema específica surge, a equipe é convidada a discutir soluções possíveis de equacioná-la. Essas discussões nem sempre são realizadas de forma assertiva e objetivamente, gerando divergências de opiniões, e eventualmente, conflitos em função dos diferentes olhares e crenças emanados pelos membros da equipe. Essas divagações levam a equipe a gastar um tempo excessivo, dificultando a análise objetiva do problema, a convergência de opiniões e, consequentemente, a busca de consenso para as ações necessárias visando dirimir tal situação. Mesmo com uma liderança atuante e participativa, nem sempre as decisões tomadas são de consenso da equipe. São muitas variáveis que entram no percurso

 

 

dessas decisões e que levam a respostas que às vezes não são do agrado da equipe de forma unânime, em função dos contextos específicos dos núcleos, dos recursos disponíveis, de pessoas envolvidas.

Situações em que ocorreram intervenções dos moderadores com os participantes Inicialmente, foi solicitado que cada um se apresentasse para a equipe moderadora do grupo focal. Em seguida, o tema conflito acompanhado de uma situação-problema foi colocado na roda e solicitado aos participantes que discutissem a situação posta, procurando trazer o mais próximo para a realidade que vivenciam. Solicitamos ainda que apontassem as principais dificuldades, geradoras de conflitos, vivenciados pela equipe do IPM em busca do foco, consenso e de tomada de decisões. A equipe moderadora tinha como objetivo observar as ações e reações, além de conduzir as atividades. O objetivo da intervenção foi a de propiciar aos participantes a identificação dos fatores desencadeantes de conflitos que dificultam a obtenção do consenso e a resolução dos problemas. Um grande diferencial do IPM, segundo sua equipe, é o fato de utilizar uma metodologia própria pautada pelos Quatro Pilares da Educação: aprender a conhecer, aprender a fazer, aprender a viver juntos, aprender a ser – fundamentos baseados no Relatório para a UNESCO da Comissão Internacional sobre Educação para o Século XXI (Delors, 1999). Alguns posicionamentos:

[...] a gente se utiliza dos nossos princípios, dos Quatro Pilares da Educação, que é hoje o nosso norte de trabalho, de desenvolvimento. (P1)

[...] com base em alguns fundamentos teóricos a gente traça a nossa expectativa de desenvolvimento junto à criança com base nos Quatro Pilares da Educação. (P2)

A forma participativa de gestão proposta no IPM foi também declarada: [...] o fato de gente desenvolver um planejamento estratégico participativo em nível de gestão é bem interessante... a equipe constrói com base em alguns fundamentos teóricos. (P2)

Temos uma forma de trabalhar bem democrática. O trabalho não vem pronto, os educadores, as duplas, a equipe se reúne toda 2ª feira... faz plano de aula para trabalhar pelo menos naquela semana. (P1)

Em relação às características de gestão do IPM, observamos que, segundo a equipe, No nosso jeito de funcionar, trabalho em dupla ajuda na autonomia [...] A dupla tem papel de articular problemas sociais do entorno que surgem... é o pano de fundo em que as famílias estão inseridas [...] (P2)

[...] temos autonomia para fazer mapeamento, buscar conhecimentos com o outro [...] se temos recursos, temos que encontrar novo núcleo... tal bairro tem tal dificuldade e nós começamos a articular (P3)

Entretanto, uma gestão participativa pode propiciar situações de conflito, perda de foco e de tempo. Podemos notar nestes momentos, o desafio de planejar aulas interessantes que levem em conta as particularidades de todos os educandos.

[...]a gente tem essa preocupação em relação ao planejamento até debatemos muito com a dupla em relação a esses objetivos, o que vai ser alcançado naquele momento e o que não vai ser alcançado [...] (P4)

No que tange à diversidade de opiniões e experiências da equipe, ouvimos que.... [...] temos diferentes experiências e opiniões e isso acaba conflitando... até manter o foco e chegar numa opinião, num senso comum é difícil e por essas diferenças, acabamos tendo muita dificuldade. (P5)

Em relação ao tempo gasto devido à falta de foco e de objetividade...

[...] o processo é longo, às vezes ficamos em reuniões três, quatro horas [...] já ficamos duas horas discutindo um assunto que acabou não dando em nada... (P2)

[...] temos educadores muito bons, eles não são “cones” e por isso acontecem todos esses problemas, que na verdade são soluções. Mas são problemas e acabamos em alguns momentos divergindo e às vezes gerando conflitos. Quando chega nesse ponto, as decisões não saem do papel... (P6)

[...] Aí para convencer esse educador que, embora no grupo dele tal ponto no regulamento não está certo, é difícil. (P7)

 

 

Também é evidenciada em situações nas quais a equipe precisa decidir se abre ou não exceção a uma regra por conta da especificidade de determinado núcleo.

[...] Ah, mas se abre exceção para cá, abre para lá, e você tem que avaliar qual é a questão [...] então, como é que a gente faz? É um desafio atrás do outro... a gente abre uma exceção para o (P8), para o (P6), mas não abre para a (P7)... ou abre para todo mundo ou não abre. Isso gera conflito o tempo todo. (P1)

Outro aspecto identificado pela equipe durante o processo de intervenção foi a dificuldade para chegar a um consenso. Observamos isso nos vários exemplos a seguir.

[...] nosso potencial de convencimento é bem grande. Ah, eu não concordo... Aí um vai falar, então você fala, ah! eu acho que eu também estou mudando de ideia. (P7)

Essa mudança de ideia na cabeça de todo mundo acontece a todo o momento. Começa a conversar, aí você... nossa... gostei daquele argumento. Aí outro apresenta outro argumento e você, vai para esse lado. (P6)

[...] Eu penso que convencer o outro a não jogar ou convencer que tem que jogar... E aí, meu Deus, pra chegar num consenso... leva dias ... às vezes meses. (P7)

Tem pontos bons e ruins, pois são muitas cabeças pensantes, não são “cones”, todos dão opinião e aí nesse momento é muito produtivo, mas para conseguir reinar o consenso é um processo muito doloroso. (P6)

Todo mundo é democrático, mas às vezes não chegamos num consenso...então vamos para votação, porque nesse compasso não conseguimos definir uma coisas e a situação exige uma definição... e passamos o dia todo falando da mesma coisa e, sabemos que nunca a decisão vai conseguir agradar todo mundo... (P1)

Durante a dinâmica buscou-se também identificar os pontos fortes da equipe e do IPM. O vínculo, a relação do instituto com os educadores, a valorização da equipe e o investimento em formação continuada foram ressaltados.

É o olhar para cada um de nós... um olhar cuidadoso, que cuida não só do profissional, mas também do pessoal, isso é um ponto alto que eu valorizo muito. Quando eu saio da minha casa eu saio alegre por saber que eu estou indo para um lugar que é considerado uma família, aqui a gente é uma família. (P3)

A equipe e os educadores, a qualificação técnica, ética, política é muito boa... é o ponto forte. (P2)

Eu acho um ponto alto a instituição estar preocupada com o processo de formação do educador. (P5)

O IPM se preocupa com a qualidade da formação que nós temos [...] Nós tivemos uma formação para o diálogo com a família [...] Tivemos várias capacitações nesse sentido. (P7) Essa formação é muito legal porque se eu for trabalhar com (P4), vou aprender muita coisa com ele, trabalhar com (P3), com cada um que você trabalhar, você pega o que ele tem de melhor. (P8)

A metodologia adotada pelo IPM foi apontada como um ponto positivo. Temos uma metodologia, todo mundo conhece e isso facilita muito. [...] Hoje definimos uma meta para o resultado almejado, temos os indicadores que evidenciam por onde e como a gente está chegando [...] (P2) [...] é muito difícil avaliar o comportamento, e procuramos de alguma forma fazer isso aqui na instituição. Esse processo realmente é um diferencial, e novo, mas é natural. (P5)

O ponto forte é mudar a vida de algumas crianças e gostar do que faz. [...] eu acho que esse gostar de fazer é o ponto mais forte que a gente tem. (P7)

Tem uma questão que a gente vê bastante na prática que é o feedback das famílias. Tem sido cada vez mais constante os pais em reuniões ou eventos vir agradecer pelo que a gente tem feito. (P1)

O ponto forte do nosso instituto é essa integração do educador com a comunidade. Ele passa a ser um agente que promove mudanças naquele ambiente. (P4)

De maneira geral, os relatos evidenciaram contextos em que levam os participantes do IPM a situações de conflitos, sobretudo quando necessitam tomar decisões. Mesmo envolvidos num processo de decisão e com uma gestão participativa, os diferentes olhares, por vezes, dificultam a busca do consenso. Demonstram também, o grau de satisfação da equipe com o

 

 

trabalho, com a liderança, com o envolvimento da comunidade e a crença nos projetos que estão desenvolvendo. No entanto, ficou claro que nem tudo é feito com total harmonia, principalmente no quesito de busca de consenso e contorno das questões geradoras de conflito. A seguir, apresentamos os resultados e suas análises. Resultados e Análise da Intervenção A vivência realizada com o grupo focal provocou um despertar frente ao grau de envolvimento entre eles, além de identificarem que muitas vezes, os conflitos vivenciados estão fundamentados em situações simples que poderiam ser revertida de maneira mais objetiva. Possibilitou ainda, identificar aspectos que levam à perda de foco, de energia e de tempo para equacionar alguns problemas advindos do contexto interno e/ou externo. Nessas situações, os encontros se prolongam por mais tempo do que o necessário, tornando-se cansativos, culminando quase sempre em ausência de consenso, o que por vezes, gera um desgaste emocional na equipe. Devido à diversidade de opiniões e em alguns casos à falta de assertividade na comunicação dos argumentos, a obtenção do consenso é dificultada, fazendo com que a questão em pauta seja decidida de forma pouco consensual, havendo a necessidade de ser resolvido por meio de votação, o que nem sempre agrada os participantes por terem demandas específicas. Isso muitas vezes significa abrir mão das convicções e valores pessoais tornando o processo doloroso para a equipe, como argumenta Ferreira (2010) e Valeriano (2001). Por outro lado, quando o consenso é conquistado, o estilo de gestão democrático-participativo contribui para promover um equilíbrio do poder e envolver toda a equipe no processo decisório e na resolução de problemas, conforme Alaby (2006). Além disso, existe um envolvimento grande entre os educadores e os educandos e o sincero desejo de fazer o melhor por eles acaba comprometendo uma análise mais objetiva e menos emotiva da situação-problema.

[...] é um desafio a gente sintetizar e organizar esse pensamento e fazer isso com mais eficiência, ser mais objetivo nesse processo. Não sei se tem tanta solução em um processo democrático, mas é um desafio. (P2) Precisamos ser mais objetivo. Falta objetividade, esse é um ponto que precisamos melhorar. Reuniões de 3, 4 horas sobre um ou dois assuntos. Isso é bom? É, mas temos outras questões administrativas, planejamento que precisamos fazer para a semana e a nossa falta de objetividade atrapalha. (P6) Vivemos tanto com os nossos educandos, tão intensamente, queremos que eles deem certo, que tudo aconteça bem pra eles, e na reunião ficamos longe da situação e achamos que isso não pode acontecer porque no meu grupo isso não encaixa [...] E é essa dificuldade do grupo que gera reuniões cansativas. (P7) É um processo democrático que podemos dar opinião, trazer ideias, mas não é simples abrir mão muitas vezes daquilo que você pensa [...] Às vezes a força do grupo está indo para um lugar que não tem total controle [...] é doloroso, isso traz bastante aprendizagem, mas não é fácil, não é tão simples assim. (P2)

Os relatos da equipe evidenciam que o conflito faz parte do processo de tomada de decisão e que existe uma grande dificuldade em se chegar ao consenso, pois todos creem ter bons argumentos, além de existir um grande envolvimento do grupo com a causa social. É possível observar que o conflito ocorre não por questões de relacionamento, que seria sua forma destrutiva, mas sim pelas relacionadas aos objetivos do projeto e às formas de execução das suas ações em busca de atingir esses objetivos, sendo, portanto, resultado natural de uma tentativa de mudança, como propõe Robbins (2005). Todavia, também ficou clara a dificuldade da equipe em administrar esses conflitos de forma a favorecer a análise crítica quando uma questão específica precisa ser resolvida, e a votação não é, necessariamente, a uma melhor decisão para o problema, conforme alertam Ferreira (2010), Robbins (2005) e Valeriano (2001). Assim, a intervenção favoreceu a reflexão sobre os aspectos que podem ser

 

10 

 

melhorados, os fatores dificultadores vivenciados no dia a dia, os pontos fortes da equipe e também sobre a responsabilidade social que a função exercida requer, que conforme Jensen e Meckling (1976) e Montana e Charnov (2001) são essas as reflexões que contribuem para o crescimento do grupo. Um dos moderadores propôs uma forma de tornar esse processo mais rápido e direto, por meio da organização de grupos menores, com uma pauta objetiva a ser discutida e, após o consenso desse pequeno grupo, uma reunião maior com todos para apresentação dos resultados e a socialização das propostas. Esta ponderação levou o grupo a novas proposições e a configuração de trabalhos para a próxima reunião. E estas medidas são corroboradas por Valeriano (2010), Robbins (2005) e Ferreira (2010), quando afirmam que os conflitos gerados nas equipes são inevitáveis, contudo necessitam ser melhores compreendidos e geridos. De certa forma, o grupo entendeu o senso de urgência para essas questões, no sentido de aprenderem a trabalhar melhor com o tempo e com questões mais polêmicas. Outra questão sugerida por um dos moderadores foi a de levarem propostas, situações-problemas, decisões que precisam ser tomadas, por escrito. Esse é um recurso que contribui para a manutenção do foco num processo de negociação, além do ganho em tempo e melhor divisão de recursos, tema amplamente discutido pelo grupo. A rodada final do encontro trouxe alguns depoimentos, demonstrando que a equipe percebeu a necessidade de alterarem a configuração dos processos vivenciados, por meio de novas dinâmicas. Embora afirmassem que a busca de consenso não é tarefa fácil, sobretudo para quem trabalha num ambiente com crianças e jovens que vivem em situação de alta vulnerabilidade social, demonstraram que mudanças são necessárias e desafiadoras e colocaram como meta do grupo. Alguns relatos...

Dá uma sensação assim, que eu tenho que fazer melhor. Não por vocês estarem olhando, mas pela consequência que isso vai trazer na vida das crianças. [...] eu tenho que passar aquilo que eu acredito, que eu quero fazer e que dê resultado. Não só pra que vocês vejam, mas para que aquilo aconteça. (P8)

[...] ouvir os educadores trazendo os pontos altos e baixos me faz pensar que visão que eles têm e aquilo que eu preciso com a coordenação e equipe auxiliá-los, o que eu preciso fazer pra melhorar esses pontos baixos e que atitude, que postura eu preciso ter para fortalecer ainda mais os pontos fortes que eles estão trazendo

[...] Em mim soa desse jeito, de olhar os pontos fortes e fracos da instituição que é trazida por eles e os meus enquanto profissional atuando aqui, como é que eu contribuo para isso. (P1)

Eu senti satisfação de poder estar levando para o outro algo que muitas vezes uma pessoa de fora não tem essa percepção. Satisfação de poder falar o que vivemos. Torna-se fácil falar do que você vive. (P3)

Senti satisfação de ver o feedback da equipe, de estarem afiados. Não foi combinado, ninguém planejou (P2)

Finalizando, as palavras expressadas pelos educadores sobre como estava saindo dali, após o encontro foram satisfação, orgulho da equipe, encontro produtiva, capacidade de desenvolvimento, força, reflexivo, esperançoso de que vai haver mudanças. Considerações Finais O relatório desta atividade foi encaminhado à diretora executiva do IPM cujo objetivo é o de subsidiar as ações frente aos dilemas vivenciados pela equipe. A gestão participativa mostrou ser favorável ao envolvimento e comprometimento dos membros do IPM para o alcance dos resultados, podendo servir de reflexão para outras ONGs. Esse contexto é propiciador de satisfação e de motivação da equipe, corroborando os achados de Soares e Melo (2010) e de Teixeira (2004). Evidenciou ainda que, participar da construção de projetos, planejar ações e procedimentos metodológicos, avaliar os resultados e propor solução de problemas contribui para a maturidade do grupo. Ressaltaram que a organização que valoriza seus funcionários, o trabalho em equipe, a aproximação e o respeito entre seus membros, gera sentimento de pertencimento e de responsabilidade social. Para que os trabalhos e atividades voltadas para

 

11 

 

causas sociais conquiste a busca de consenso, principalmente nos processos de tomada de decisão, os conflitos precisam ser encarados de forma construtiva e funcional, conforme Robbins (2005), pois assim, além de despertar para processos criativos, podem evitar a estagnação e o envolvimento do grupo na situação vivenciada. Foi possível observar que na organização pesquisada a obtenção do consenso por sua equipe nem sempre é um procedimento simples, requerendo por parte de alguns membros, abrirem mão de convicções pessoais, podendo se tornar um processo doloroso justamente porque, conforme Hudson (1999), organizações de cunho social têm missão orientada por valores e são mantidas por pessoas que desejam mudanças e buscam resultados sociais. Verificamos também que as discussões para solucionar uma determinada situação-problema eventualmente geram conflitos em função dos diferentes olhares e opiniões. Assim, o conflito tanto pode se tornar um problema sério em uma organização, dificultando o desempenho da equipe, diminuindo sua eficácia, como pode ser o resultado natural de uma tentativa de mudança. Em níveis adequados e bem administrados, os conflitos podem ser benéficos, pois promovem a análise crítica de problemas e podem levar a melhores decisões da equipe, de acordo com Robbins (2005), portanto, a existência de conflito passa a não ser um problema em si mesmo. Identificamos que a falta de foco e de assertividade, dificultam a análise objetiva do problema, a convergência de opiniões e, consequentemente, a obtenção de consenso, mesmo com uma liderança atuante e participativa. Entre os fatores identificados como geradores de conflitos estão à abertura de exceções devido aos diferentes contextos dos núcleos em que cada educador trabalha e a divergência de opiniões. Estes pontos foram identificados como dificultadores para a obtenção do consenso e a resolução dos problemas, requerendo outros encontros para que aprendam a trabalhar essas temáticas de forma mais natural. Não obstante apontarem as dificuldades, também pontuaram os pontos fortes da equipe e do IPM como a qualificação técnica, ética, política dos educadores, metodologia, respeito, cuidado com pessoas e o investimento em formação continuada para os educadores. A figura 1 sintetiza um olhar para o processo descrito neste relato tecnológico.

Figura 1 – Esquema sugestivo de orientação do gestor frente a uma situação de conflito Fonte: elaborado pelos autores Limitações Uma limitação que identificamos nesse relato tecnológico foi o fato de, por uma questão de logística, a intervenção ter envolvido apenas parte do grupo do IPM – equivalente a 40% do total da equipe, necessitando a expansão do mesmo cujo intuito é o de socializar essas reflexões que são comuns ao grupo mesmo estando em diferentes contextos. Outra limitação

 

12 

 

percebida pelos moderadores foi em função do número de encontros. Sabemos que mudar comportamento e atitudes demanda tempo, esforço, treino e, sobretudo, percepção do que cada um é capaz de fazer para conquistar novas competências. Assim, este relato tecnológico abre perspectivas para novos encontros visando identificar como equipes de ONGs que desenvolvem uma gestão participativa e atuam em segmentos diversos (lazer, cultura, esporte, educação) buscam o consenso na resolução das situações-problemas. Referências Bibliográficas Alaby, J. A. (2006). Liderança e Poder. Liderança é Poder? In: Oliveira, J. F. Profissão Líder: desafios e perspectivas. São Paulo: Saraiva. Baron, R., & Shane, S. (2011). Empreendedorismo - uma visão do processo. SP: Thomson. Chanlat, J. F. (1996). O indivíduo na organização. São Paulo: Atlas. Curty, A. L. (2001). Administração em organizações de produto social: articulações possíveis. In: Ávila, M. C. de. Gestão de projetos sociais. São Paulo: AAPCS. Delors, J. (1999). Educação: um tesouro a descobrir. São Paulo: Cortez. Ferreira, H. M. G. (2010). Conflito Interpessoal em equipes de trabalho: o papel do líder como gerente das emoções do grupo. Cadernos UniFOA, v. 5, n. 13, pp. 67-75. Flick, U. (2009). Desenho da pesquisa qualitativa. Porto Alegre: Artmed. Godoy, A. S. (1995). Pesquisa qualitativa: tipos fundamentais. Revista de Administração de Empresas. São Paulo, v.35, n.3, pp.20-29. Hudson, M. (1999). Administrando Organizações do Terceiro Setor: o Desafio de Administrar sem Receita. São Paulo: Makron Books. Jensen, M. C., & Meckling, W. H. (1976 Oct). Theory of the firm: managerial behavior, agency costs and ownership structure. Journal of Financial Economics, v. 3, n. 4, pp. 305-60. Kotter, J. P. (1992). O fator liderança. São Paulo: Makron, McGraw-Hill. Montana, P. J., & Charnov, B. H. (2001). Administração. São Paulo: Saraiva. Nassif, V. M. J., Prando, R. A., & Cosentino, H. M. (2010). Ações estatais assistencialistas e empreendedorismo social sustentável no Brasil: um estudo exploratório. Gestão e Planejamento, v. 11, n. 2, pp. 316-336. Oliveira, E. M. (2004). Empreendedorismo Social no Brasil: atual configuração, perspectivas e desafios. Revista da FAE. Curitiba, v. 7, n. 2, pp. 9-18. Oliveira, J. F. (2006). A Síndrome do Líder. In: OLIVEIRA, J. F. Profissão Líder: desafios e perspectivas. São Paulo: Saraiva. Rico, E. M. (2008). A filantropia empresarial e sua inserção no terceiro setor. In: Cavalcanti, M. Gestão social, estratégias e parcerias: redescobrindo a essência da administração brasileira de comunidades para o terceiro setor. São Paulo: Saraiva. Robbins, S. P. (2005). Comportamento organizacional. São Paulo: Pearson Prentice Hall. Schön, D. A., & Argyris, C. (1994a). Theory in Practice. San Francisco: Jossey-Bass. Schön, D. A. (2000). Educando o profissional reflexivo: um novo design para o ensino e a aprendizagem. Porto Alegre: Artes Médicas. Simon, H. (1997). Administrative Behavior: a study of decision making processes in administrative organizations. ed. 4: The Free Press. Soares, A. C. A. A., & Melo, M. C. O. L. (2010). Gestão do Terceiro Setor: uma prática social? Revista de Gestão USP. São Paulo, v. 17, n. 1, pp. 1-11. Teixeira, R. F. (2004). Discutindo o Terceiro Setor sob o Enfoque de Concepções Tradicionais e Inovadoras de Administração. Cadernos de Pesquisa em Administração. São Paulo, v. 11, n. 1, pp. 1-15. Valeriano, D. L. (2001). Gerenciamento Estratégico e Administração por Projetos. São Paulo: Makron Books.