Glutaraldeido e Acido Peracetico

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Endoscópios Flexíveis, Comparativo de Métodos de Desinfecção, no Hospital das Clínicas de Ribeirão Preto da Fac. Medicina da USP

P.R. Boaventura, F.C. Dal Picolo

Centro de Engenharia Clínica e de Infraestrutura

Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto, Ribeirão Preto-SP, Brasil [email protected]

[email protected]

Resumo - Este trabalho tem a proposta de avaliar o impacto nos índices de manutenção de endoscópios flexíveis, quando da utilização de ácido peracético e glutaraldeído nos processos de desinfecção desses equipamentos. Foi feito um acompanhamento no período de 1 (um) ano, no processo de desinfecção de alto nível dos endoscópios flexíveis do Centro de Endoscopia do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo (HCFMRPUSP), comparando os dados relativos a manutenções considerando a utilização de glutaraldeído e após a sua substituição por ácido peracético. Com os dados analisados, podemos concluir que na transição do glutaraldeído para ácido peracético recomenda-se fazer uma revisão prévia nos equipamentos que já passaram pelo processo de desinfecção em glutaraldeído, e após a introdução do ácido peracético, observamos também que os índices de manutenção tiveram aumento e após um determinado tempo, voltaram aos mesmos valores quando da aplicação de glutaraldeído. Outra conclusão que chegamos através dessa análise, é que é importante a utilização de produto recomendado pelos fabricantes dos endoscópios, e que suas manutenções também sejam realizadas pelos mesmos. Palavras Chave: Desinfecção, Endoscópios, Glutaraldeído, Ácido Peracético, Engenharia Clínica. Abstract - This work has the proposal to assess the impact on rates of maintenance of flexible endoscopes, when the use of peracetic acid and glutaraldehyde in the process of disinfection of such equipment. This was a follow-up period of 1 (one) year, in the process of high-level disinfection of flexible endoscopes Endoscopy Center of the Hospital das Clínicas de Ribeirão Preto, University of São Paulo (HCFMRPUSP), comparing data on maintenance considering the use of glutaraldehyde and after its replacement by peracetic acid. With the data analyzed, we conclude that the transition of glutaraldehyde to peracetic acid is recommended to do a prior review in outfits that have gone through the process of disinfection in glutaraldehyde, and after the introduction of peracetic acid, we also observed that the rates of maintenance had increased and after some time, returned to the same values when the application of glutaraldehyde. Another conclusion we reached through this analysis is that it is important to use products recommended by manufacturers of endoscopes, and their maintenance are also performed by them. Key-words: Disinfection, Endoscopes, Glutaraldehyde, Peracetic Acid, Clinical Engineering Introdução

A endoscopia tornou-se disponível e essencial como método diagnóstico e terapêutico a várias especialidades médicas, incluindo gastroenterologia, urologia, ortopedia, ginecologia e pneumologia. Ela permite visualizar lesões e realizar procedimentos com invasibilidade cirúrgica mínima, reduzir o tempo de internação do paciente (COSTA, 2000). Entretanto, como em todo procedimento de risco, problemas podem ocorrer, alguns imediatos, como perfurações, e outros mais difíceis de serem identificados, como as infecções. Rutala & Weber (1997) citam como uma das principais razões para a transmissão de infecções em endoscopia flexível a falha no cumprimento das recomendações de limpeza e desinfecção.

A equipe envolvida no procedimento de descontaminação pode estar exposta a dois tipos de risco. O primeiro refere-se à exposição de patógenos primários oriundos de pacientes portadores de uma doença infecciosa e parasitária, o segundo refere-se à exposição a vapores ou contato com agentes químicos utilizados durante a etapa de desinfecção.

O Centro de Endoscopia do Hospital das Clínicas de Ribeirão Preto sempre utilizou o glutaraldeído no processo de desinfecção de alto nível. No entanto, foi interpelado pela Promotoria Pública a não mais utilizar este processo, devido à inadequação da infraestrutura, conforme a Resolução SS-27, de 28/02/2007, que determina no capítulo 3, item 3.31.2 que especifica as características da sala onde é realizada a

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desinfecção que a sala possua no mínimo 4m2 e sistema de ventilação local exaustora ou capela de exaustão, dotado de sistema de filtro para retenção ou inativação química dos vapores de glutaraldeído.

O processo de desinfecção escolhido como substituto do glutaraldeído foi o ácido peracético. O uso do glutaraldeído forma um biofilme que mascara a existência de fissuras nos endoscópios. A engenharia clínica alertou que, antes de utilizar o ácido peracético, o equipamento deveria passar por uma revisão, fato este que não ocorreu devido à pressão exercida pelo Ministério Público.

Neste trabalho, são discutidos alguns métodos de desinfecção utilizados para endoscópios flexíveis. O enfoque dado envolve o ponto de vista da engenharia clínica, abordando aspectos como estrutura física, treinamento pessoal, quantidade de quebras e custos de manutenção de acordo com o processo de descontaminação utilizado, gerando assim um guia de ajuda para a tomada de decisão no momento de implementar um método de desinfecção de alto nível para endoscópios flexíveis. Dessa forma, pretende-se também contribuir com o gerenciamento de risco e gerenciamento de tecnologia médico-hospitalar (gTMH), atribuições do engenheiro clínico, no processo de Gestão de Tecnologia Médico-Hospitalar (GTMH) (BRONZINO, 1992). Metodologia

A metodologia utilizada para a elaboração deste trabalho iniciou com a pesquisa e revisão bibliográfica sobre o tema proposto.

A revisão bibliográfica aborda, inicialmente, os processos de desinfecção utilizados, as suas características de atuação, as vantagens e desvantagens. Após esse estudo, apresenta-se algumas características das tecnologias dos endoscópios flexíveis.

A interação com profissionais da área de enfermagem, com os médicos do centro de endoscopia, com representantes das indústrias de equipamentos e de germicidas, do estudo de caso e com outros profissionais do centro de engenharia clínica e de infraestrutura contribuiu muito para o esclarecimento das dúvidas, conceitos e melhor entendimento do processo para elaboração da proposta.

Na etapa seguinte, foram levantados através do sistema de ordem de serviço utilizado pelo CECIn, as seguintes informações referentes aos endoscópios flexíveis:

1- Quantidade de equipamentos e a sua respectivo tempo de uso; 2- Quantidade de manutenções, tempo médio entre falhas e custo de

manutenções, num período de 6 meses anterior a mudança para o ácido peracético; 3- Quantidade de manutenções, tempo médio entre falhas e custo de

manutenções, num período de 6 meses a partir da implantação do ácido peracético; 4- Quantidade de manutenções, tempo médio entre falhas e custo de

manutenções, de 6 a 11 meses após a implantação do ácido peracético; 5- Levantamento da quantidade de exames realizados por tipo de equipamento

(videogastroscópio, videocolonoscópio). 6- Custo de manutenção dos endoscópios.

Com base nos dados coletados, realizou-se uma análise destes, frente aos problemas destacados pelo serviço de endoscopia, buscando identificar as possíveis causas e consequentemente uma proposta para evitar os problemas ocorridos.

Resultados

Foram analisados dados como: idade dos equipamentos do serviço de endoscopia, quantidade de Ordens de Serviço antes e depois da implantação do ácido peracético, tempo médio entre falhas, os custos de manutenções antes e depois da mudança do processo de desinfecção, e o custo da manutenção em relação à quantidade de exames realizados comparando as empresas que realizam as manutenções.

Primeiramente, apresentamos a idade dos equipamentos utilizados no Centro de Endoscopia, para se ter a noção do parque de equipamentos que foram analisados e também a quantidade de OSs abertas para os equipamentos de acordo com o tempo de utilização e o método de desinfecção utilizado.

Pode-se identificar que o parque de equipamentos é relativamente novo, e que o tempo de utilização do equipamento não influencia nos casos de manutenção com a mudança do processo de desinfecção.

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Gráfico 1 – Porcentagem de equipamentos do Centro de Endoscopia por tempo de utilização.

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acima de10 anos

entre 3 e 5anos

de 6 mesesa 2 anos

abaixo de 6meses*

idade do equipamento

qu

anti

dad

e d

e O

S

glutaraldeído

ácido peracético

Gráfico 2 – Quantidade de OSs abertas por idade do equipamento e processo de desinfecção. * equipamento nunca foi utilizado no glutaraldeído Ainda na análise de quantidade de manutenções no período, chegamos ao valor total de OSs abertas

durante o período, onde mostra claramente que houve um acréscimo na quantidade de manutenções no momento da implantação do ácido peracético e após, o índice voltou aos valores de quando se usava apenas glutaraldeído, conforme gráfico abaixo.

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ANTES DO ÁCIDO PERACÉTICO PÓS ÁCIDO PERACÉTICO (maio/09 anovembro/09)

PÓS ÁCIDO PERACÉTICO (dezembro/09 aabril/10)

NÚMERO DE ORDEM DE SERVIÇO

Gráfico 3 – Quantidade de Ordem de Serviço por tempo de análise e processo de desinfecção

Outro indicador analisado, foi o tempo médio entre falhas (TMEF) dos equipamentos. Nos dados

apresentados, observa-se que o mesmo fenômeno ocorrido com a quantidade de Ordens de Serviço ocorre

77%

0%

19%

4%

EQUIPAMENTOS DE 0 À 5 ANOS

EQUIPAMENTOS DE 5 À 10 ANOS

EQUIPAMENTOS DE 10 À 15 ANOS

EQUIPAMENTOS DE 15 À 20 ANOS

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com TMEF, ou seja, logo após a implantação do ácido peracético, ocorre uma brusca alteração e após retorna aos valores anteriores a mudança.

Gráfico 4 – Tempo Médio Entre Falhas por processo de desinfecção

Na análise das ordens de serviços abertas desde maio/2004 até abril de 2010, foi verificado o motivo

das quebras dos endoscópios e classificados como quebras de parte mecânica ou devido a infiltrações. O resultado é que após a troca do processo de desinfecção o número de quebras mecânicas ficaram próximas porém, com relação a quebra por infiltração houve uma grande diferença quando mudado o processo de desinfecção, passando de 1,6 quebras por ano para 27,6 quebras por ano, fazendo uma aproximação para o período de um ano, haja visto que, o uso do ácido peracético na Instituição começou em maio/2009.

Esterilizante Quebras Mecânicas Infiltrações

Glutaraldeído 56/5 anos (11/ano) 8/5 anos (1,6 por ano)

Àcido Peracético 9/10 meses (10,8/ano) 23/10 meses (27,6/ano)

Tabela 1 - Quebras mecânicas e infiltrações através de borracha ou emendas de endoscópios submetidos à esterilização por glutaraldeído e ácido peracético

Dentro da análise de custos das manutenções realizadas, foram levantados custos das manutenções

conforme o motivo de quebra e o processo de desinfecção, corrigindo o valor proporcional para 1 ano, mostrando que houve um aumento de custo, após a introdução do ácido peracético. Somente com quebras por infiltração em torno de 700% e no total comparado gasto considerando todas as quebras foi um aumento de 115%.

Esterilizante VALOR TOTAL

Quebras Mecânicas

DO CONSERTO (R$)

Infiltrações

Total

Glutaraldeído 81.448,00 21.057,00 102.505,00

Ácido Peracético 53.187,00 167.554,00 220.741,00

Tabela 2 - Valor total dos consertos de endoscópios submetidos à esterilização por glutaraldeído e

ácido peracético

Além dos motivos de quebras e o processo de desinfecção utilizado, foi levantado o custo médio da manutenção dos endoscópios, sendo considerado o fabricante e duas outras empresas que prestam serviços de manutenção. Após calcular o valor médio da manutenção por empresa foi calculado o custo por

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ANTES DO ÁCIDO PERACÉTICO PÓS ÁCIDO PERACÉTICO (maio/09 a novembro/09)

PÓS ÁCIDO PERACÉTICO (dezembro/09 a abril/10)

DIAS

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exame de acordo com o valor pago pela manutenção, utilizando a quantidade de exames realizados por equipamento. O resultado mostra que, o fabricante, mesmo tendo um valor médio maior, no final é vantajoso pelo tempo médio entre falhas ser maior, fazendo com que o custo do exame seja menor do que nas outras empresas prestadoras de serviço.

Tipos de

Aparelhos

Fabricantes

Empresa A

Empresa B

Vídeo Gastro 7312 4959 9655

Vídeo Gastro de Tratamento

9668 7600 5770

Vídeo Duodeno

5463 6170 7700

Vídeo Colono 12379 5433 8957

Média Total 8705 6040 8020

Tabela 3 – Valor médio (R$) de manutenção por empresa.

Tipos de Aparelhos

Fabricante

Empresa A

Empresa B

Vídeo Gastro 8,46 17,58 26,23

Vídeo Gastro de Tratamento

39,42 76,51 443,00

Vídeo Duodeno

52,40 121,93 450,00

Vídeo Colono 36,31 56,87 182,00

Tabela 4 – Custo por exame, conforme custo de manutenção por empresa

Discussão e Conclusões

O emprego de técnicas de reprocessamento para endoscópios exige a efetividade, como em qualquer outro tipo de material que esteja expondo os pacientes e os profissionais a riscos de infecções. A Engenharia Clínica, nos estabelecimentos assistências à saúde, entre outros aspectos que atua, contribui para a permanência do atendimento de qualidade, sendo um deles o gerenciamento de riscos, como parte da GTMH.

Diante disso, neste trabalho buscou-se mostrar os cuidados necessários para o reprocessamento de endoscópios, com uma visão do engenheiro clínico como parte do processo de GTMH, com o objetivo de contribuir com a segurança e a qualidade no ambiente hospitalar, visando a diminuição de quebras, de tempo de parada e de custos de manutenção dos endoscópios.

A verificação realizada junto ao Cento de Endoscopia, identifica-se algumas deficiências em relação ao treinamento e a instrução, dos profissionais responsáveis pelo processo de limpeza e desinfecção, tanto sobre os conhecimentos sobre os conceitos e técnicas de reprocessamento como as características da tecnologia relevantes para o reprocessamento. Isto revela a necessidade de treinamento, uma vez que ocorre uma rotatividade de profissionais responsáveis pelo processo de limpeza e desinfecção, devido a férias e alta rotatividade de profissionais na Instituição.

Um fator importante para diminuição de quebras e de infiltração é o teste de vazamento ser realizado entre cada desinfecção e não somente no final do dia ou no início do outro. Desta maneira pode-se detectar um defeito ocorrido entre um exame e outro e, consequentemente, evita-se o agravamento do defeito,

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conseqüentemente com diminuição do custo e do tempo de parada do equipamento, principalmente num hospital com uma grande quantidade de exames diários.

Uma ferramenta importante no auxílio ao combate de infiltrações e conseqüentes danos aos equipamentos, são as lavadoras automatizadas de endoscópios, que realizam testes de vazamento e infiltrações antes da imersão no desinfetante e durante o processo de desinfecção, abortando imediatamente o ciclo em caso de detectar qualquer vazamento. Existem no mercado, equipamentos que trabalham tanto com glutaraldeído como com ácido peracético.

Conforme os dados analisados, não se pode afirmar que a idade do equipamento ou o tipo de desinfecção optado aumente o índice de quebras dos endoscópios, mas pode-se concluir que, o equipamento que foi desinfetado por glutaraldeído deve antes de ser imerso em ácido peracético, passar por uma revisão para se detectar possíveis fissuras mascaradas pelo biofilme criado com o uso constante do glutaraldeído. Tal recomendação é comprovada com os números de aumento de ordens de serviços e diminuição do tempo médio entre falhas e conseqüente retorno aos números anteriores à troca do processo de desinfecção e pelo aumento do número de quebras por infiltração.

Então, podemos concluir este trabalho com uma sequência a ser seguida para uma melhor efetividade no reprocessamento de endoscópios:

1- Treinamento técnico dos responsáveis pelo processo de limpeza e desinfecção;

2- Consulta ao fabricante do endoscópio sobre a compatibilidade com os desinfetantes existentes no mercado;

3- Consulta aos fabricantes de desinfetante sobre tempo de atividade, diluição e tempo de exposição;

4- Evitar a troca do processo de desinfecção, após imersão do endoscópio em um tipo de desinfetante;

5- Revisão dos endoscópios em caso de troca de desinfetante; 6- Utilização de lavadora automática, independente do desinfetante utilizado; 7- Evitar a troca do tipo de processo de desinfecção. 8- Manutenção no fabricante.

Diante disso, neste trabalho buscou-se mostrar os cuidados necessários para o reprocessamento de endoscópios, com uma visão do engenheiro clínico como parte do processo de GTMH, com o objetivo de contribuir com a segurança e a qualidade no ambiente hospitalar, visando a diminuição de quebras, de tempo de parada e de custos de manutenção dos endoscópios.

Referências

ANVISA - AGÊNCIA NACIONAL DE VIGILÂNCIA SANITÁRIA - ANVISA. Curso Básico de Controle de Infecção Hospitalar. In: Caderno C – métodos de proteção antiinfecciosa. Brasília, DF: ANVISA, 2000. BRASIL, Ministério da Saúde. Coordenação de Controle de Infecção Hospitalar. Processamento de Artigos e Superfícies em Estabelecimentos de Saúde. 2 ed. Brasília, DF, 1994. BRONZINO, Joseph. D, (editor). Management of Medical Technology: a primer for clinical engineers. Stonehan, MA: Butterworth-Heinemann. 1992. COSTA, Maria Luiza Monteiro da. Endoscopia. In: FERNANDES, Antonio T.; FERNANDES, Maria Olívia V.; RIBEIRO FILHO, Nelson (coord.). Infecção Hospitalar e suas interfaces na Área da Saúde. São Paulo: Atheneu, 2000, v. 2, p. 1061-69. RUTALA, Willian. A. Disinfection, Sterilization, and Waste Disposal. IN: WENZEL, Richard. P. (editor). Prevention and Control of Nosocomial Infections. Baltimore: Willian & Wilkins, 1997, p. 538-593.