GOMES, Alex Sandro. Concepções e representação de relações entre quantidades. Recife: UFPE,...
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7/30/2019 GOMES, Alex Sandro. Concepes e representao de relaes entre quantidades. Recife: UFPE, 1995. Mestrado
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Universidade Federal de Pernambuco
Curso de Mestrado em Psicologia
Concepes e representao de relaes
entre quantidades
Alex Sandro Gomes
DissertaodeMestrado
rea de concentrao: Psicologia Cognitiva
Recife,1995
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ORIENTADORES:
Dr. Luciano de Lemos Meira (1 Orientador)
Dr. David William Carraher (2 Orientador)
BANCA EXAMINADORA:
Dr. Luciano de Lemos Meira (Presidente)
Dr. Jorge Tarcsio da Rocha FalcoDr. Paulo Figueiredo
COORDENADORA DO MESTRADO:
Dra. Lcia Browne Rego
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In memoriam:
Hildevnio Gomes de Lima
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Agradecimentos
Sem dvida devemos muito a muitas pessoas. No entanto, h determinadas
aes de nossos amigos, familiares, colegas ou conhecidos que tm o poder de nos
tocar de forma mais significativa que outras. Esses detalhes nos fazem encontrar
respostas muito importantes. Todas as pessoas que vou citar a seguir foram
importantes e isso de uma forma genrica. No entanto, referindo-me a cada um deles
eu gostaria de destacar o aspecto de nossas relaes que mais significativo, os quais
eu tomo como marcos tericos de apoio para continuar a fazer esse Mestrado,
enquanto pensava sobre o assunto que irei apresentar, enquanto escrevia esse
documento, enquanto vivia.
A minha me. Dessa mulher fantstica, gostaria de registrar a confiana
madura que ela depositou em mim e em meus sonhos (mesmo quando esses pareciam
no ter sentido). Lembro bem do momento quando tive o insight do caminho
profissional que eu iria tomar. Ainda me recordo do local e o que estava lendo. Ela
estava l, ela est aqui e em ambas assituaes h apenas um invariante1, uma frase:
Faa aquilo que o seu corao mandar, e eu estou fazendo.
E voc, pai. Voc soube, como ningum, respeitar-me e aos meus sonhos,
mesmo vendo que poderia ser mais til, de forma imediata, se agisse de outras
formas. E como se no bastasse, ainda me mostrou como analisar um momento
presente e como projetar um futuro.
A minha irm, assim como para qualquer pessoa com menos idade do que eu,
no quero apenas agradecer, mas alm disso, quero deixar um exemplo e uma frase:
Acredite em seus sonhos.
Ao amigo Artur... no sei se h teorias sobre o funcionamento das amizades.
Caso no haja, gostaria de sugerir que as investigaes comeassem a partir do
seguinte modelo terico: o follow up. O estudo seria basicamente voltado a
investigao do conjunto de comportamentos cooperativos e seus respectivos
retornos ou feedbacks. A metodologia... bem, a metodologia fica a cargo dos
interessados. O que gostaria de significar com essa sugesto de estudo o meu
1Qualquer referncia a termos de uso tcnico ter sido apenas mera coincidncia.
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profundo agradecimento a todo o apoio logstico e estratgico, e de carter
providencial que sempre dele recebi.
Ao meu Professor Luciano Meira. A literatura no campo da Metodologia
Cientfica destaca diferentes tipos de relaes que existem entre orientando e
orientador. Em um dos tipos, destaca-se a explorao do primeiro pelo segundo, que
tende a forar o aluno a engajar-se no seu projeto atual de pesquisa. Nesse caso, o
aluno torna-se apenas um trabalhador intelectual e o seu direito de ser criativo
encontra-se sob controle alheio. Em outros casos, o orientador exerce o papel de
educador, no sentido amplo da palavra, orientado o estudante no desenvolvimento de
meta-conhecimento a respeito do labor intelectual. Luciano soube orientar-me e
respeitar-mea partir do meu ponto de vista terico, das minhas limitaes tcnicas e
da minha maneira de trabalhar. Portanto, no meu caso particular, eu contei com um
verdadeiro educadorcomo orientador.
Ao Professor David Carraher. Houve momentos em minha vida, geralmente
antes de fazer alguma escolha importante, nos quais procurei identificar a melhor
pessoa para me orientar. Quando terminei a graduao em Engenharia, eu j sabia
que queria criar brinquedos educativos (a escolha), e portanto procurei identificar a
pessoa que melhor me orientaria nessa passagem. Hoje, iniciado no labor de criar
instrumentos didticos, tenho a convico que fui feliz na escolha dessa pessoa.
Todo profissional teve algum que o ensinou os primeiros passos. Com
cientistas tambm assim. Foi com o Professor Joo Pereira de Brito que tive minha
iniciao. Sob sua orientao fiz minha primeira reviso bibliogrfica e escrevi meu
primeiro artigo.
Ao todo, vivo a 9 anos no ambiente universitrio. Conheci muitos colegas, fuiorientado por diversos professores e fiz duas amigas. Cludia, pessoa do mesmo
signo que eu; e Maria, pessoa de uma enorme viso. Com cada uma delas aprendi um
pouco mais sobre carinhoe solidariedade.
Ao CNPq e ao povo brasileiro, agradeo todo o apoio financeiroque permitiu
realizar este estudo.
A todos os professores do mestrado: Alina, Jorge, Profa. Lcia, Analcia,
gostaria de agradecer todo o apoio moral e conceitual que sempre pude dispor.
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Vera, Elaine e Irani gostaria de agradecer o acesso e a simpatia com os
quais me acolhem sempre que preciso.
diretoria da Escola Recanto Infantil, em nome da Professora Maria de
Ftima Morais e das coordenadoras Maria Ins Pires e Regina agradeo o carinho
com o qual me acolheram durante a coleta de dados deste estudo.
Aos alunos que participaram do mesmo, agradeo o tempo e a pacincia
dispensados.
A todas as pessoas que direta ou indiretamente contriburam para a realizao
deste trabalho, cujos nomes tenho receio de enunciar para evitar omisses, obrigado!
A Deus agradeo o fato de ter conhecido essas pessoas.
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Resumo
No presente estudo investigou-se a natureza da relao existente entre os
conhecimentos empregados por adolescentes de primeiro grau maior e segundo grau
ao resolver problemas de comparao entre taxas de variao, apresentados em
diferentes tipos de fenmenos, a maneira como os alunos criam e utilizam sistemas
de representaes autnticos, e ainda como essas representaes so utilizadas
durante tratamentos cognitivos de determinados invariantes.
Participaram do estudo 18 alunos de 5 e 7 sries do primeiro grau e do 1
ano do segundo grau de uma escola particular da cidade do Recife. Os dados foram
coletados atravs de entrevistas clnicas que incluram: tarefas de produo de
desenhos e tarefas de interpretao de grficos cartesianos. Nas tarefas do primeiro
tipoo, descreviam-se duas ou mais etapas de um fenmeno fsico. Pedia-se os
sujeitos que desenhassem algo que representasse cada um dos fenmenos descritos.
No segundo grupo de tarefas, foram apresentados aos sujeitos grficos cartesianos
que representavam fenmenos fsicos. Pedia-se aos sujeitos que interpretassem as
relaes quantitativas expressas nesses grficos.
A anlise das produes dos alunos mostrou que esses, mesmo aqueles que
ainda no foram introduzidos s representaes grficas cartesianas, so capazes de
criar desenhos adequados representao de fenmenos descritos verbalmente. Alm
disso, h muitos aspectos geomtricos em seus desenhos que os tornam instrumentos
potenciais resoluo dos problemas. Foram identificados trs categorias de
produes em observando os dois seguintes critrios: a presena de silhuetas de
objetos fsicos nos desenho e a utilizao de regras escolares na construo dos
desenhos. A anlise qualitativa do uso desses mostrou que todos os trs tipos
desenhos so igualmente prticos representao de fenmenos fsicos e igualmente
teis resoluo dos problemas de comparar taxas.
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Abstract
The present study investigated the nature of the relations between the
competencies of adolescents to solve rates comparison problems, involving different
kinds of phenomenon, and the way how students created and used paper and pencil
representation that can serve as instruments in the cognitive treatment of diverse
invariantes.
Eighteen students of 5th, 7th and 9th grades from a Brazilian private school,
in Recife, participated of the study. Data was collected throughout clinical
interviews, that included production and graphs interpretation tasks. In the first
group, there were described two or more phases of a physical phenomenon and asked
to the students to draw one representation to them. In the second group of tasks, there
were presented Cartesian graphs and asked to them about the quantitative relations
graphed.
The results showed that the students, as those who never had been instructed
about graphs systems, were capable to create adequate draws to represent the
phenomenons. There were many geometrical aspects in those draws that transformthen into potential instruments to the problems solving. There were identified three
groups of draws concerning the following criterias: the representation of physical
objects in the draws e the utilizations of school rules to the creation of those draws.
The analyses showed that all kinds of draws were equally practical to the
phenomenons representation and useful to problems solving involving rates
comparisons.
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ndiceAGRADECIMENTOS ......................................................................................................................... iv
RESUMO ............................................................................................................................................. vii
ABSTRACT ........................................................................................................................................ viii
NDICE ................................................................................................................................................. ix
NDICE DE FIGURAS ........................................................................................................................ xi
NDICE DE PROTOCOLOS ............................................................................................................ xiii
NDICE DE TABELAS ....................................................................................................................... xv
CAPTULO 1: INTRODUO ............................................................................................................ 1
1O CONCEITO DE TAXA E AS RELAES COM OS CONCEITOS DE RAZO E PROPORO................. 2
1.1 O conceito de taxa ....................................................................................................... 2
1.2 Os conhecimentos sobre razo e proporo ............................................................... 4
1.3 Concluses ................................................................................................................. 11
2O PROCESSO DE REPRESENTAO ............................................................................................. 11
2.1 O conceito Vygotskiano de mediao ........................................................................ 12
2.2 A relao entre invariante e representao .............................................................. 13
3FORMAS E FUNES DA REPRESENTAO ................................................................................. 15
3.1 As Funes da representao .................................................................................... 16
3.2 Interpretar grficos e o conceito de taxa .................................................................. 21
3.3 As competncias dos alunos para representar .......................................................... 26
3.4 Concluses ................................................................................................................. 33
CAPTULO 2: MTODO ................................................................................................................... 34
1SUJEITOS ................................................................................................................................... 34
2MATERIAL ................................................................................................................................ 35
2.1 Tarefas ....................................................................................................................... 35
3PROCEDIMENTOS ...................................................................................................................... 39
CAPTULO 3: ANLISE DE DADOS .............................................................................................. 42
1CARACTERSTICAS DOS DESENHOS E AS RELAO COM OS CONHECIMENTO SOBRE TAXA........ 44
1.1 Os tipos bsicos de desenhos .................................................................................... 44
1.2 Anlise e discusso .................................................................................................... 79
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2OS CONHECIMENTOS SOBRE RELAES ENTRE QUANTIDADES E SUA REPRESENTAO............ 87
2.1 Estratgia 1: nfase em q ou t .............................................................................. 89
2.2 Estratgia 2: Relaciona q, t, q e t atravs de desigualdades ........................ 91
2.3 Estratgia 3: Soluo aditiva .................................................................................... 97
2.4 Estratgia 4: nfase na relao q/t .................................................................... 106
2.5 Estratgia 5: nfase na relao t/q .................................................................... 116
2.6 Estratgia 6: No considera as variaes q, nem as t, nem as razes ............... 125
2.7 Anlise ..................................................................................................................... 126
CAPTULO 4: CONCLUSES E IMPLICAES DIDTICAS ............................................... 130
1CONCLUSES .......................................................................................................................... 130
2IMPLICAES .......................................................................................................................... 136
BIBLIOGRAFIA ................................................................................................................................ 138
ANEXO I - A DEFINIO MATEMTICA DO CONCEITO DE TAXA E AFINS ................ 146
1UM POUCO DA HISTRIA DO CONCEITO................................................................................... 146
2A TAXA DE VARIAO E A DERIVADA ..................................................................................... 148
2.1 Um exemplo da aplicao da derivada Fsica - O conceito de velocidade ......... 152
ANEXO II - AS TAREFAS ............................................................................................................... 154
1SIMPLES .................................................................................................................................. 154
2DUPLAS................................................................................................................................... 157
3TABELAS ................................................................................................................................. 159
4GRFICOS ............................................................................................................................... 160
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ndice de figurasFIGURA 1-DIAGRAMA DAS TRANSFORMAES SIMULTNEAS OCORRIDAS NUM PROBLEMA
ENVOLVENDO O CONCEITO DE TAXA, TENDO COMO CONTEDO A DEFINIO DE VELOCIDADE ...... 3
FIGURA 2-EXEMPLO DA APRESENTAO DE UMA TAXA POR MEIO DO USO DE UM GRFICO CARTESIANO 4
FIGURA 3-EXEMPLOS DE MATERIAIS USADOS PORSPINILLO &BRYANT (1991).(A)AS DUAS FIGURAS
ONDE A COMPARAO OCORRE COM REFERENCIAIS DE METADE,(B) FIGURAS ONDE A
COMPARAO ATRAVESSA O REFERENCIAL DE METADE (UM RETNGULO TEM A>B E O OUTRO
A
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FIGURA 18-DESENHO DA ALUNA J PARA A TAREFA TABELA-PLANTA ................................................... 60
FIGURA 19-DESENHO CRIADO PELO ALUNO A PARA REPRESENTAR A TAREFA VASO-DUPLO ................ 63
FIGURA 20-DESENHO DO ALUNO A PARA A TAREFA CAMINHO-CRESCENTE ....................................... 67
FIGURA 21-DESENHO FEITO PELO SUJEITO A PARA A TAREFA CAMINHO-TABELA .............................. 69
FIGURA 22-DESENHO CRIADO PELA ALUNA M PARA REPRESENTAR O MOVIMENTO COM VELOCIDADE
CONSTANTE DE UM CAMINHO ...................................................................................................... 74
FIGURA 23-DESENHO DO ALUNO P PARA A TAREFA VASO-CRESCENTE ................................................. 75
FIGURA 24-DESENHO DO ALUNO E NA TAREFA BALANO-CONSTANTE ................................................ 90
FIGURA 25-DESENHO CRIADO PELO ALUNO A PARA A TAREFA PLANTA-DUPLA.................................... 96
FIGURA 26-DESENHO DO ALUNO I NA TAREFA VASO-DECRESCENTE..................................................... 97
FIGURA 27-DESENHO DO ALUNO A NA TAREFA VASO-DECRESCENTE.A SEGUNDA TAXA Q/T
MENOR QUE A PRIMEIRA .............................................................................................................. 101
FIGURA 28-DESENHO CRIADO PELA ALUNA G NA TAREFA PLANTA-CRESCENTE ................................. 108
FIGURA 29-DESENHO DO SUJEITO F NA TAREFA BALANO CONSTANTE.............................................. 113
FIGURA 30-REPRESENTAO DA ALUNA J NA TAREFA PLANTA CONSTANTE....................................... 118
FIGURA 31-DESENHO DA ALUNA J CRIADO PARA A TAREFA PLANTA-CRESCENTE............................... 119
FIGURA 32-DESENHO QUE DESCREVE A VARIAO DE TEMPO COM RELAO A ALTURA DO BALANO,
CRIADO PELO ALUNO A, NA TAREFA BALANO-CRESCENTE.O ALUNO CRIA AS SRIES
ASSOCIANDO RETNGULOS S UNIDADES DE ALTURA PERCORRIDA.SEU DESENHO DEMONSTRA A
ESCOLHA DA ESTRATGIA DE COMPARAR AS TAXAS INVERTIDAS (T/Q E T/Q) ................. 122
FIGURA 33-DESENHO INDICANDO AS ALTURAS DO BALANO AO LONGO DO PERCURSO , PELO ALUNO A,
NA TAREFA BALANO-CRESCENTE.NESSE CASO O DESENHO CORRESPONDE A RELAO CORRETA
ENTRE AS TAXAS.O ALUNO USOU A ESTRATGIA DE COMPARAR AS TAXAS DIRETAS (Q/TE
Q/T) ...................................................................................................................................... 123
FIGURA 34-TERCEIRO DESENHO DO ALUNO A NA TAREFA BALANO-CRESCENTE.AQUI, RETNGULOS
REPRESENTAM INTERVALOS DE 1 S E AS ALTURAS DAS LINHAS INSCRITAS REPRESENTAM AS
ALTURAS SUCESSIVAS DA PLANTA............................................................................................... 124
FIGURA 35-VRIAS SECANTES DE UM GRFICO: APRESENTAO DA MESMA TAXA............................ 150
FIGURA 36-A DIFERENA ENTRE UMA SECANTA E UMA TANGENTE NUMA CURVA.............................. 150
FIGURA 37-A DIFERENA DE UMA SECANTE E UMA TANGENTE NO GRFICO ...................................... 151
FIGURA 38-INTERVALO ONDE A TAXA EST SENDO CALCULADA........................................................ 152
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ndice de protocolosPROTOCOLO 1-O ALUNO I EXPLICA O SEU DESENHO CRIADO PARA A TAREFA BALANO-CRESCENTE ... 47
PROTOCOLO 2-COMPARAO DAS VELOCIDADES DOS PRIMEIRO E SEGUNDO CAMINHES, NA TAREFA
CAMINHO-DUPLO PELO ALUNO J ................................................................................................. 50
PROTOCOLO 3-EXPLICAO DA REPRESENTAO DO ALUNO I NA TAREFA MAR-DECRESCENTE .......... 52
PROTOCOLO 4-O SISTEMA GRFICO CRIADO PELO ALUNO O NA TAREFA PLANTA-TABELA................... 55
PROTOCOLO 5-ALUNA J RESOLVENDO A TAREFA PLANTA-CRESCENTE ................................................. 57
PROTOCOLO 6-RESOLUO DA TAREFA PLANTA-CONSTANTE PELA ALUNA J ....................................... 58
PROTOCOLO 7-RESOLUO DA ALUNA J NA TAREFA PLANTA-DECRESCENTE ....................................... 59
PROTOCOLO 8-COMO A ALUNA J IDENTIFICA A DIFERENA ENTRE AS TAXAS NO DESENHO QUE FOI
CRIADO PARA A TAREFA QUE DESCREVE O CRESCIMENTO DE UMA PLANTA POR UMA SRIE DE DEZ
PARES DE VARIAES .................................................................................................................... 61
PROTOCOLO 9-ALUNO A TENTANDO ENCONTRAR A VARIAO A CADA MINUTO DA ALTURA DO NVEL
DE GUA NO PRIMEIRO VASO.DA TAREFA VASO-DUPLO. .............................................................. 64
PROTOCOLO 10-O ALUNO A DESCREVE O SEU DESENHO CRIADO PARA REPRESENTAR O MOVIMENTO
DESCRITO NA TAREFA CAMINHO-CRESCENTE .............................................................................. 67
PROTOCOLO 11-A CRIAO DE UM SISTEMA GRFICO PELO ALUNO A NA TAREFA CAMINHO-TABELA69
PROTOCOLO 12-COMPARAO ENTRE VELOCIDADE MDIAS DE DIFERENTES INTERVALOS DE TEMPO ,
ALUNO A NA TAREFA CAMINHO-TABELA .................................................................................... 71
PROTOCOLO 13-ALUNO P RESOLVENDO A TAREFA VASO-CRESCENTE (PARTE 1/3) .............................. 76
PROTOCOLO 14-ALUNO P RESOLVENDO A TAREFA VASO-CRESCENTE (PARTE 2/3) .............................. 77
PROTOCOLO 15-ALUNO P RESOLVENDO A TAREFA VASO-CRESCENTE (PARTE 3/3) .............................. 78
PROTOCOLO 16-O ALUNO E ESTIMA UMA RELAO COMPARANDO APENAS AS EXTENSES DOSINTERVALOS DE TEMPO, NA TAREFA BALANO-CONSTANTE ......................................................... 89
PROTOCOLO 17-O ALUNO E COMPARA APENAS A ALTURA PERCORRIDA PELO BALANO PARA
CONCLUIR QUAL A RELAO ENTRE AS TAXAS, TAREFA BALANO-DECRESCENTE ....................... 90
PROTOCOLO 18-ALUNO E UTILIZA A ESTRATGIAS DE COMPARAR AS QUANTIDADES ATRAVS DE
DESIGUALDADES.PRIMEIRA PARTE DA TAREFA VASO-DUPLO ....................................................... 92
PROTOCOLO 19-RELACIONAR AS VARIAES ATRAVS DE DESIGUALDADES PARECE SER SUFICIENTE
PARA O ALUNO A RESOLVER A PRIMEIRA PARTE DA TAREFA PLANTA-DUPLA ............................... 94
PROTOCOLO 20-EXEMPLO DE SOLUO ADITIVA EMITIDA PELO ALUNO I NA TAREFA VASO-
DECRESCENTE................................................................................................................................ 97
PROTOCOLO 21-CONTINUAO DO PROTOCOLO DA TAREFA VASO-DECRESCENTE COM O ALUNO I ...... 98
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PROTOCOLO 22-MUDANA DA ESTRATGIA ADITIVA PARA UMA ESTRATGIA MULTIPLICATIVA QUE
OCORREU ENQUANTO O ALUNO A AO RESOLVER UMA TAREFA QUE DESCREVIA O ENCHIMENTO DE
UM VASO NUMA SEQNCIA DECRESCENTE DE TAXAS. ............................................................... 102
PROTOCOLO 23-CONTINUAO...O ALUNO A ABANDONA A HIPTESE DE UMA RELAO ADITIVA
ENTRE AS VARIAES .................................................................................................................. 105
PROTOCOLO 24-RESOLUO DA TAREFA CAMINHO-DECRESCENTE PELO ALUNO J.ELE CALCULA O
VALOR UNITRIO: VARIAO DE POSIO EM 1 H. ...................................................................... 107
PROTOCOLO 25-EXPLICAO DA ALUNA G NA TAREFA PLANTA-CRESCENTE ..................................... 108
PROTOCOLO 26-A ALUNA G EXPLICA COMO OS INTERVALOS DE TEMPO FORAM REPRESENTADOS EM
SEU DESENHO, AINDA NA TAREFA PLANTA-CRESCENTE............................................................... 110
PROTOCOLO 27-O ALUNO F RESOLVENDO A TAREFA BALANO-CONSTANTE ..................................... 111
PROTOCOLO 28-A ALUNA J FOCALIZA A RELAO INVERSA T/Q PARA ENCONTRAR O RESULTADO DA
COMPARAO ENTRE AS TAXAS DESCRITAS NA TAREFA PLANTA-CONSTANTE............................ 117
PROTOCOLO 29-ERRO PROVOCADO PELO USO DA RAZO INVERSA NA COMPARAO FEITA PELO
ALUNO J NA TAREFA PLANTA-CRESCENTE ................................................................................... 118
PROTOCOLO 30-SOLUO CORRETA DO ALUNO A USANDO A ESTRATGIA DE COMPARAR RAZES
T/Q, NA TAREFA BALANO-CRESCENTE................................................................................... 120
PROTOCOLO 31-CONCLUSO DO ALUNO A, NA TAREFA BALANO-CRESCENTE, USANDO A TAXA T/Q121
PROTOCOLO 32-O USO DA ESTRATGIA DE RELACIONAR AS VARIAES ATRAVS DE DESIGUALDADES,
PELO ALUNO A, PARA REFORAR SUA CONCLUSO DA TAREFA BALANO-CRESCENTE .............. 124
PROTOCOLO 33-O ALUNO L NO CONSIDERA AS QUANTIDADES DESCRITAS COM A TAREFA BALANO-
CRESCENTE PARA COMPARAR AS TAXAS ..................................................................................... 125
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ndice de tabelasTABELA 1-FORMAO DOS GRUPOS DE FENMENOS DE ACORDO COM A DIREO PREFERENCIAL DAS
TRANSFORMAES OCORRIDAS NOS MESMOS ............................................................................... 36
TABELA 2-AS DIMENSES DAS QUANTIDADES ENVOLVIDAS EM CADA FENMENO ............................... 37
TABELA 3-ORDENS DE APRESENTAO DOS GRUPOS DE TAREFAS ........................................................ 40
TABELA 4-RELAO DOS ALUNOS: IDADE, SRIE E ORDEM DAS TAREFAS ............................................ 40
TABELA 5-RESUMO DAS SEQNCIAS DE TAREFAS ............................................................................... 41
TABELA 6-DISTRIBUIO DOS TIPOS DE DESENHOS POR SRIE .............................................................. 81
TABELA 7-DISTRIBUIO DOS TIPOS DE DESENHOS PELOS TIPOS DE FENMENOS ................................. 82
TABELA 8-A OCORRNCIA DE DIFERENCIAO DAS TAXAS, POR SRIE ................................................ 82
TABELA 9-ACERTO DOS PROBLEMAS DE COMPARAO DE TAXAS, POR SRIE...................................... 83
TABELA 10-DIFERENCIAO DAS TAXAS PELOS TIPOS DE FENMENOS DESCRITOS .............................. 83
TABELA 11-DISTRIBUIO DO DESENHO DE VARIAES, TOTAIS OU TAXAS, POR SRIE....................... 84
TABELA 12-DISTRIBUIO DO DESENHO DE VARIAES, TOTAIS OU TAXAS, POR TIPO DE FENMENO
REPRESENTADO ............................................................................................................................. 84
TABELA 13-DISTRIBUIO DE ERROS E ACERTOS NAS TAREFAS DE INTERPRETAO DE GRFICOS ..... 85
TABELA 14-RESUMO DOS TIPOS DE ESTRATGIAS EMITIDAS PELOS ALUNOS DURANTE A RESOLUO DE
PROBLEMAS DE COMPARAR TAXAS ................................................................................................ 88
TABELA 15-DISTRIBUIO DAS ESTRATGIAS, POR SRIE................................................................... 127
TABELA 16-DISTRIBUIO DAS ESTRATGIAS, PELA ORDEM DE APRESENTAO DAS TAXAS ............ 127
TABELA 17-DISTRIBUIO DAS ESTRATGIAS, PELO TIPO DE FENMENO REPRESENTADO ................. 128
TABELA 18-DISTRIBUIO DOS ACERTOS, POR ESTRATGIA............................................................... 129
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Captulo 1: Introduo
De modo geral, os alunos no utilizam conceitos matemticos da maneira
como so formalmente ensinados na escola. Esse fato verifica-se na literatura com
relao, por exemplo, aos algoritmos de resoluo de problemas de proporo.
Carraher, Carraher & Schliemann (1986) demonstraram que o ensino do algoritmo
da regra de trs no implicava na utilizao desses procedimentos durante a
resoluo de problemas cotidianos fora da escola.
Em contrapartida, alguns estudos demonstraram que as crianas, desde muito
cedo, j tm conhecimentos preliminares sobre conceitos matemticos, tais como:
proporo (Spinillo & Bryant, 1991), funo (Piaget, Grize, Szeminska & Bang,
1968), nmero e operaes com nmeros (Piaget & Szeminska, 1981).
Um outro exemplo de descontinuidade ocorre com o ensino de grficos
cartesianos. A atividade com grficos envolve, entre outras coisas, o processo de sua
interpretao. Janvier (1978) analisou esse processo e mostrou que o mesmo
problemtico para a maioria dos adolescentes. Esse autor apresenta os tipos de erros
de interpretao mais freqentes e aponta algumas causas.Por outro lado, desde muito jovens e mesmo sem terem recebido instrues
formais sobre a construo de grficos, as crianas so capazes de criar
representaes para situaes-problema (Nemirovsky & Rubin, 1991), e de utilizar
seus desenhos para tratar conceitos matemticos (Meira, 1995). Suas estratgias,
mesmo que distintas daquelas ensinadas na escola, so bastante sofisticadas e
adequadas resoluo desses problemas (Nunes, 1994).
O estudo de diSessa, Hammer, Sherin & Kolpakowski (1991) analisou como
representaes de um grupo de alunos poderiam ser utilizadas como parte do
processo de instruo sobre sistemas grficos. Nesse caso particular, os sujeitos
tinham de criar representaes grficas prprias para fenmenos especficos.
Observou-se ento que essas representaes, mesmo sofisticadas e eficientes como
instrumento resoluo dos problemas, no eram organizadas de forma sistemtica
como os grficos cartesianos, mesmo que os estudantes tivessem sido instrudos
sobre esse contedo.
Neste captulo ser apresentado o conceito de taxa de variao e sua
emergncia em atividades que envolvem o uso de sistemas simblicos. Em seguida,
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ser introduzido o conceito de representao, precisamente partir da anlise da
relao entre um objeto matemtico e sua representao. Esta ltima, definida como
sendo o processo pelo qual os indivduos atribuiem significados a formas grficas ou
simblicas, possue funo especfica que so exemplificadas e analisadas na terceira
parte deste captulo.
Logo a seguir, observa-se como o conceito de taxa tratado por meio do uso
de sistemas simblicos formais como os grficos cartesianos. Os autores mostram
que tipos de problemas ocorrem quando grficos cartesianos so usados como
instrumentos na resoluo de problemas envolvendo o conceito de taxa de variao.
Outros autores observaram, no entanto, que alguns alunos criam seus prprios
sistemas de representao. Seus desenhos, mesmo diferentes dos grficos
cartesianos, parecem ser eficazes no tratamento de conceitos especficos como:
velocidade, mudana e funo.
1O conceito de taxa e as relaes com os conceitosde razo e proporo
Neste Captulo ser analisado o conceito de taxa de variao: sua definio,
alguns sistemas de representao formais e algumas aplicaes. Do ponto de vista da
psicologia da aprendizagem, sero discutidos alguns estudos que analisam os
conhecimentos primitivos de crianas e adolescentes com relao aos conceitos de
razo, proporo e quantidades intensivas observando-se a ligao desses com a
aprendizagem do conceito de taxa.
1.1 O conceito de taxa mdia2
Formalmente, o conceito de taxa um caso particular do conceito de razo,
ou seja, a expresso dos tamanhos relativos de um par ordenado de nmeros ou
quantidades (Carraher, 1992b). Uma dessas quantidades corresponde medida da
variao de uma grandeza qualquer (com a exceo de quantidades temporais). A
segunda refere-se medida do intervalo de tempo decorrido durante a variao da
primeira (Nussenzveig, 1987).
2 Por simplicidade, usaremos o termo taxapara designartaxa mdia. Quando fizermos referncia auma taxa instantnea o mesmo ser especificado.
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Quando um fenmeno representado atravs de um grfico cartesiano, as
diferentes taxas so representadas atravs de diferentes inclinaes nesse grfico4.
Essas inclinaes so medidas a partir da direo horizontal, no sentido anti-horrio.
A comparao entre taxas ocorre atravs da comparao entre essas inclinaes. A
figura b abaixo apresenta como uma taxa de variao pode ser representada atravs
da inclinao de um segmento de reta (AB) desenhado num grfico. O valor dessa
inclinao depende das posies iniciais e finais do segmento, no importando o que
ocorre nos momentos intermedirios entre esses valores5.
Figura B - Grfico cartesiano de uma funo
O conceito de taxa est relacionado com os conhecimentos anteriores dos
alunos sobre razo e proporo. Pelo tipo de relao que envolve esse conceito
classificado como sendo uma relao de primeira ordem. A proporo, por sua vez, denominada relao de segunda ordem, por tratar-se de uma igualdades entre
relaes de primeira ordem6 (razes). Na seo a seguir sero analisados alguns
estudos que descrevem os conhecimentos que as crianas tm sobre os conceitos de
razo e proporo.
1.2 Os conhecimentos sobre razo e proporo
Alguns estudos sugerem que a base da compreenso do conceito de razoreside em atividades de julgamento perceptual no incio da infncia, sugerindo a
possibilidade de crianas muito jovens poderem apresentar alguma verso de
raciocnio proporcional. Lovett & Singer (1991) apresentaram a um grupo de
crianas cartelas com desenhos de flores e aranhas e perguntaram como estaria o
rosto de uma formiguinha que iria cair em cada arranjo. As respostas eram dadas
4 Veja a definio de tangente de um grfico na seo a taxa de variao e a derivada na pgina 154.
5 Observe no Apndice I as definies de secante e tangente e a sua aplicao na comparao entrediferentes taxas atravs do uso de grficos.
6 Os sentidos dados as expresses relaes de primeira ordeme relaes de segunda ordem so osmesmos adotados por Spinillo & Bryant (1991), analisado na prxima seo.
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pelas crianas em uma outra cartela onde estava representada uma escala do estado
emocional da formiguinha, desde muito triste at muito feliz. A criana tinha de
marcar uma posio na escala. Este estudo mostrou que a criana pode usar
informaes perceptuais e no quantitativas para estimar probabilidade atravs do
estabelecimento de relaes parte-parte, nesse caso, as quantidades de flores e de
aranhas.
O conceito de proporo tambm constitui o campo conceitual (Vergnaud,
1992) das estruturas necessrios resoluo de problemas de comparar taxas. Para
que exista uma relao de proporo faz-se necessrio que sejam estruturadas
relaes de igualdade ou de desigualdade, i.e., comparaes entre duas (ou mais)
relaes de primeira ordem (razes ou taxas de variao). As relaes de primeira
ordem podem ser parte-todo ou parte-parte, sendo as ltimas mais fceis de serem
compreendida que as primeiras (Spinillo & Bryant, 1991).
Singer, Kohn & Resnick (prelo), especulando sobre o conhecimento sobre
proporo, sugerem que esse pode ter algum fundo biolgico. Provavelmente inato
ou aprendido muito cedo, esse conhecimento permitiria que crianas muito novas
pudessem tomar decises diante de relaes proporcionais. Do ponto de vista da
evoluo, faz sentido que os organismos sejam capazes de tomar decises sobre
certas dimenses proporcionais, por exemplo, densidade de alimentos e velocidade
(p. 10). De acordo com esses autores, pode ser desvantajoso para um organismo ter
de realizar uma integrao de longo prazo de diferentes fontes. Os autores, ento,
imaginam que a apreenso direta de propores ocorre durante um nico passo
cognitivo, sem a necessidade de integrar duas ou mais variveis, isto , o conceito de
proporo seria aprendido de forma primitiva, direta, e no seria construdo via a
integrao de duas quantidades. Isso significa que a criana seria capaz de realizar
um julgamento sobre proporo sem ter de primeiro integrar outras dimenses.
Com relao ao conceito de velocidade, por exemplo, a criana realizaria o
julgamento sem ter de primeiro estimar o tempo, depois estimar a distncia, para
ento integr-las multiplicativamente determinando a velocidade. Fazendo-o
diretamente, a velocidade seria a nica quantidade a ser imaginada, percebida e
medida. Um resumo de situaes nas quais os conhecimentos que as crianas
pequenas tm sobre proporo e outros exemplos nos quais ocorre a utilizao de
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conhecimentos diretos de relaes proporcionais so apresentados em Singer, Kohn
& Resnick (prelo).
O conceito de proporo foi considerado por Piaget como sendo uma
aquisio do estgio das operaes formais. A criana, no estgio pr-operacional
concreto, reconhece claramente acontecimentos causais quando os encontra, i.e.,
reconhece as relaes de causa e efeito dos fenmenos. No entanto, no consegue
reconhecer adequadamente relaes proporcionais entre quantidades, pois no dispe
do equipamento intelectual necessrio para isso7. Ao contrrio, a criana no estgio
operacional concreto disporia dos equipamentos intelectuais necessrios para
reconhecer relaes como essas.
Segundo Piaget, h quatro os estgios no desenvolvimento do esquema de
proporcionalidade. Num primeiro estgio, pr-operacional, a criana consegue
estabelecer intuitivamente algumas das relaes entre quantidades envolvidas, sem
mostrar qualquer tentativa de quantificao. No segundo estgio, aparecem algumas
tentativas de quantificao, e as crianas conseguem ordenar sistematicamente
alguns exemplos de modo correto. Seus sucessos, porm restringem-se aos casos em
que suficiente considerar e quantificar apenas uma varivel8. Basta considerar a
nica varivel com valores diferentes nos dois grupos para responder corretamente.
No terceiro estgio, operatrio concreto final, a criana j busca uma quantificao
das duas variveis em jogo, porm no consegue alcanar essa quantificao em
termos de proporcionalidade. Suas tentativas permanecem aditivas, levando-os a
erros sistemticos em determinadas questes. Finalmente, no quarto estgio, a
criana torna-se capaz de reconhecer a impossibilidade de comparaes diretas entre
os valores das duas variveis em jogo, estabelecendo relaes quantitativas.
7Um exemplo de limitao desse tipo ocorreria quando o aluno tem de reconhecer uma relao deigualdade entre volumes iguais de lquidos, quando colocados em vasos de formas diferentes, mesmoo sujeito tendo acompanhado seu transvazamento a partir de quantidades iguais.
8 No caso, por exemplo, da tarefa de Quantificao de Probabilidade (Carraher, Schliemann &Carraher, 1986). Nessa tarefa o experimentador apresenta para a criana dois conjuntos de cartas.Cada carta pode ter uma de duas configuraes diferentes: possuir uma cruz ou no (cartas brancas).Os conjuntos so formados de cartas brancas e cartas com cruzes. Pergunta-se, ento, ao sujeito qual
dos dois conjuntos tem uma proporo maior de cartas com cruz ou brancas. A criana nesse estgioconsegue acertar sistematicamente as comparaes quando, por exemplo, o nmero de cartas comcruz constante (evento esperado), e apenas o nmero de cartas brancas varia, ou vice-versa. Ossujeitos nesse estgio conseguem, pois, ordenar as probabilidades quando a considerao de apenasuma varivel suficiente para realizao do julgamento correto.
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Alguns estudos demonstraram a capacidade que crianas pequenas tm de
realizar julgamentos em termos de uma relao de segunda ordem, em geral, nos
casos nos quais relaes de primeira ordem so comparadas. O estudo de Spinillo
(1992) avaliou o desempenho de crianas com idades por volta dos 6 anos ao realizar
julgamentos sobre proporo. Foram apresentadas diversas tarefas de proporo que
envolviam a distino entre relaes de primeira ordem entre dimenses
complementares de um estmulo (partes complementares de uma figura retangular,
dividida em duas parte pintadas com cores diferentes). A autora observou que essas
relaes tanto podiam ser estabelecidas atravs de comparaes parte-parte como
atravs de comparaes parte-todo, e que as crianas eram capazes de resolver
problemas de proporo quando as relaes de primeira ordem envolviam
comparaes parte-parte.
Em um trabalho anterior, Spinillo & Bryant (1991) tinham documentado que
as crianas estabeleciam relaes de segunda ordem entre algumas relaes parte-
parte, mas no entre outras. Segundo os autores, isso ocorria, porque entre relaes
de primeira ordem diferentes, a criana pode fazer julgamentos proporcionais usando
termos relacionais (por exemplo, maior do que versus menor do que,
maior/menor do que versus igual a), enquanto que entre relaes de primeira
ordem semelhantes9 a criana precisava usar cdigos absolutos que eram mais
sofisticados que os cdigos relativos.
Nas tarefas em Spinillo & Bryant (1991) foram solicitadas comparaes entre
dimenses complementares representadas no-numericamente: reas pintada e
no-pintada de retngulos. A rea A correspondia a parte pintada de azul de um
retngulo. A outra rea, B, correspondia parte deixada em branco deste mesmo
retngulo (figura c).
9Relaes de primeira ordem diferentes designam duas razes cuja diferena entre as mesmas podeser identificada facilmente atravs de um exame visual. o caso, por exemplo, de um par deretngulos que tm 1/4 e 3/4 de suas reas pintadas de azul. O segundo tipo, relaes de primeiraordem semelhantes so razes cuja diferena entre parte pintadas e parte no-pintadas so semelhantescomo, por exemplo, no caso em que 1/3 e 1/4 de suas reas so pintadas de azul.
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(a)
(b)
Figura C - Exemplos de materiais usados por Spinillo & Bryant(1991). (a) As duas figuras com a razo rea pintada:rea no-pintadaigual a 1/2; (b) figuras onde a comparao ocorre entre relaes de
primeira ordem diferentes (A>B e AB e o outro AB (ou AB e o outro A>B; (4) um retngulo tinha A
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relao forma como a criana resolvia os problemas de proporo, foi que
inicialmente ela o fazia atravs de uma comparao parte-parte, e no entre uma
parte e um todo e ela no podia coordenar uma tarefa de proporo na qual as
relaes de primeira ordem que ela tinha para trabalhar eram relaes parte-todo.
Esta concluso tambm foi evidenciada por Parrat-Dayan (1982, 1985). Outros
estudos que se preocuparam com as estratgias diretamente ligadas a julgamentos
perceptuais como meio para realizar julgamentos proporcionais encontram-se citados
em Spinillo (1993).
Para avaliar as contribuies do ensino formal da escola no desenvolvimento
da noo de proporcionalidade, Carraher, Carraher, Schliemann & Ruiz (1986)
observaram a compreenso de quantidades medidas por razes em situaes
familiares (comparao de preo por unidade) e em situaes menos familiares
(comparao entre velocidades, medidas em centmetros por segundo). O
desempenho de 49 adolescentes (de 10 a 16 anos), com ou sem instruo escolar
sobre proporo, foi comparado nessas duas situaes. Observou-se que o contedo
da tarefa afetou significativamente o desempenho. Em primeiro lugar, a porcentagem
de jovens que levava em considerao apenas uma das variveis foi bastante
reduzida (17%) em comparao com aquela obtida na tarefa de comparao de
preos (59%). Segundo, houve algumas respostas aditivas incorretas (10%), em
que os jovens pressupunham implicitamente que a cada segundo os carros deveria
percorrer um centmetro. Enquanto na tarefa de comparao de preos no foi
observada qualquer resposta do tipo aditiva. Observou-se ainda que o nvel de
escolaridade afetou significativamente apenas a tarefa menos familiar. Na tarefa
envolvendo o conceito de velocidade houve uma certa influncia da escolaridade
sobre o desempenho, uma vez que, dos oito sujeitos que mostraram respostas dequantificao correta, sete encontravam-se na srie mais avanada includa neste
estudo, sendo significativa a correlao entre a srie cursada e o nvel alcanado
nesta tarefa.
Do ponto de vista terico, os autores questionam a possibilidade de existncia
de uma fase, envolvendo comparaes aditivas e precedendo a quantificao
apropriada em problemas de proporcionalidade, como previa Piaget. Pois, se este
fosse, de fato, um estgio na construo do raciocnio proporcional, ele deveria
categoria limite em um senso restrito, porque algumas das notas de crianas na comparao dentro dametade, que no cruzam a metade como entre 1/3 e 1/4, foi melhor do que se podia esperar.
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aparecer em qualquer tarefa, independente do contedo. A explicao dos autores foi
que as respostas aditivas incorretas apareciam apenas quando era, de certa forma,
aceitvel para o sujeito a hiptese implcita de correspondncia um a um entre as
unidades das variveis em jogo. Quando esta hiptese no era intuitivamente aceita,
as respostas aditivas incorretas desapareciam.
H um outro tipo de estratgia aditiva, mais sofisticada que essa descrita
acima. Em um outro estudo no qual os sujeitos tinham de comparar medidas lineares
expressas numa planta baixa, foi usado um tipo de estratgia aditiva para resolver
problemas de proporo que, no entanto, preservava a razo entre as quantidades
(Carraher, 1986). Neste trabalho, a autora apresentou aos sujeitos (estudantes de
stima srie e mestres de obra, operrios da construo civil) problemas envolvendo
a utilizao de escalas para converso de medidas lineares. Foram utilizadas quatro
tipos de plantas baixas (blueprints) de construes com diferentes escalas: 1:100,
1:50, 1:40 e 1:33.3. A autora observou que a estratgia mais comumente empregada
foi uma denominada por rated addition, de acordo com a qual os sujeitos
encontravam uma simples razo (geralmente, 1/) e ento procediam adicionando
montantes de quantidades a cada uma das quantidades. Este mtodo deve ser
distinguido da soluo aditiva simples porque, ao contrrio dessa, a estratgia rated
addition mantm a razo constante. O que ocorre so adies simultneas; de um
lado o sujeito adiciona uma unidade a uma das quantidades, e depois procede
adio da quantidade correspondente a essa unidade, com relao taxa 1/. Esse
tipo de estratgia no gera erros sistemticos.
Em um outro estudo, Carraher, Carraher & Schliemann (1986) procuraram
verificar at que ponto era possvel fazer com que adolescentes se tornassem capazes
de resolver corretamente problemas de proporo aprendendo um algoritmo que
facilitasse a soluo desses problemas, e at onde essa aprendizagem em Matemtica
estaria condicionada ao nvel de desenvolvimento cognitivo do estudante. Estudantes
de 5, 6 e 7 sries foram submetidos as seguintes tarefas: a) Bonecos Alto e Baixo,
de Karplus; b) Problemas escolares; c) Quantificao de probabilidades, de Inhelder
e Piaget; e d) Equilbrio de uma balana, tambm de Inhelder e Piaget. As duas
primeiras tarefas foram aplicadas coletivamente e as duas ltimas individualmente.
Observou-se nos problemas escolares um desempenho inferior ao esperado, a partir
do desempenho nas tarefas que indicavam a habilidade de raciocnio proporcional.
Tal resultado sugere que a escola, ao tentar promover, por meio do ensino, a
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capacidade de resolver problemas de proporo, no tem aproveitado devidamente as
habilidades j existentes nos estudantes. Consistentemente com esta concluso,
observou-se entre os estudantes a utilizao mais freqente de estratgias intuitivas
ao uso da regra de trs, ensinada como o algoritmo para resoluo de problemas de
proporo.
1.3 Concluses
Nesse Captulo foram discutidos estudos que evidenciam as concepes das
crianas sobre razo e proporo. Alguns resultados colocam em questo a suposio
inicial de Inhelder & Piaget (1976) de que o esquema de proporcionalidade uma
aquisio das operaes formais, e portanto tardia (por volta dos 15 anos). O estudo
realizado por Spinillo & Bryant (1991) demonstrou que crianas com apenas 6 anos
de idade j eram capazes de fazer julgamentos corretos em problemas envolvendo
este tipo de relao. As crianas de 6 e 7 anos apresentavam um bom desempenho no
julgamento de proporcionalidade quando as relaes entre azul e branco em cada
uma das figuras encontravam-se separadas pelo limite do referencial de metade, i.e.,
uma das relaes menor que a metade e a outra maior do que esse valor (figura c.b).
O ensino de algoritmos como a regra de trs no contribui efetivamente para
tornar as crianas capazes de resolver problemas envolvendo os conceito de razo e
proporo em qualquer situao (Carraher, Carraher & Schliemann, 1986). Suas
estratgias intuitivas so muitas vezes adequadas para resolver os problemas. Em
alguns casos, no entanto, o uso de suas estratgias levam a erros sistemticos. Isso
ocorre, por exemplo, com a estratgia aditiva.
Discutidas algumas caractersticas das competncias relacionadas com os
conceitos de razo, proporo e taxa, sero discutidas a seguir o conceito de
representao, e finalmente a relao entre invariante e representao de um
conceito. Sero discutidas posies tericas de base com relao ao papel dos
sistemas simblicos na aprendizagem de um conceito.
2O processo da representao
Nesta seo ser discutida a funo mediadora do processo de representao
na atividade matemtica. Essa funo ser discutida luz da definio do conceito
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vygotskiano de mediao. Por outro lado, ser discutida a relao entre o invariante
de um conceito e a sua representao.
2.1 O conceito Vygotskiano de mediaoO ponto de vista Vygotskiano com relao ao desenvolvimento cognitivo tem
reflexos na forma de sua definio metodolgica. O elemento tomado como central
em sua anlise foi a noo deprocessos de desenvolvimento, num contexto no qual o
desenvolvimento no visto como um processo de aquisies quantitativas de
capacidades, mas sim como um processo de evolues qualitativas. Por esse motivo,
a sua abordagem denominada muitas vezes de gentica, na qual desenvolvimento
no deve ser entendido como desenvolvimento ontogentico na forma adotada por
Piaget, por exemplo. A anlise vigotskiana de que a prpria natureza do
desenvolvimento muda. Essa mudana dos processos de desenvolvimento reflete-se
diretamente na organizao material da atividade dos indivduos, e o elemento
analtico adotado para analisar essa interao foi o princpio da mediao.
A apario de uma nova forma de desenvolvimento estaria associado
apario de uma nova forma de mediao. Dependendo do domnio no qual se
processa o desenvolvimento, essa mediao pode ocorrer em forma de instrumentos
ou sinais. Em alguns casos, transies no desenvolvimento esto relacionadas a
novas formas de mediao, em outras, elas esto relacionadas a verses mais
avanadas de uma forma existente de mediao. (Wertsch, 1985, p.22). A distino
entre funes mentais elementares e superiores encontra-se subjacente s noes
vigotskianas de transformaes qualitativas e o papel da mediao o de estabelecer
essa distino. A idia de Vygotsky era investigar de que forma, funes como:
memria, ateno, percepo e pensamento, primeiro aparecem em formaselementares e depois mudam para formas superiores. A discusso descreve como
ocorre a passagem das formas naturais para as formas sociais, ou culturais, de
desenvolvimento.
Para Vygotsky, so quatro os fatores principais que so usados para distinguir
funes elementares de funes superiores: (1) o deslocamento do controle do
ambiente para o indivduo, i.e., a emergncia de uma regulao voluntria; (2) a
emergncia de uma realizao consciente de processos mentais; (3) a origem social e
a natureza social das funes mentais superiores; e (4) o uso de sinais para mediar as
funes mentais superiores. O controle voluntrio, a realizao consciente e a
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natureza social das funes mentais superiores, pressupem a existncia de
instrumentos psicolgicos, ou sinais11, que podem ser usados na atividade de si
mesmo ou de outras pessoas. Isso conduz concluso de que a noo de mediao
analiticamente anterior a outros aspectos da construo terica de Vygotsky.
Wertsch (1985) sintetiza, em forma de princpio, a influncia que h entre os
processos de mediao e o desenvolvimento qualitativo descrito por Vygotsky,
quando afirma que em sua descrio da histria dos sinais como dispositivos
mnemnicos ou meios de clculo assim como em sua explicao da relao entre
pensamento e fala, Vygotsky imaginava um princpio superior de desenvolvimento.
Esse princpio, o qual deveria chamar-se princpio de descontextualizao de meios
mediadores, substitui aquele [princpio] da evoluo Darwiniana aps a emergncia
da cultura. A descontextualizao de meios mediadores o processo pelo qual o
significado de sinais tornam-se menos e menos dependentes de um nico contexto
espao-temporal no qual eles so usados. (pp. 32-33).
Os sistemas simblicos, devido ao seu papel mediador, encontram-se
relacionados com os invariantes dos conceitos.
Na seo a seguir sero discutidas algumas perspectivas com relao natureza da ligao entre invariantes e sua representao.
2.2 A relao entre invariante e representao
Piaget, por muito tempo, utilizou a noo de estrutura invariante (sistema
equilbrio-equilibrao) como central na sua anlise do desenvolvimento cognitivo.
No entanto, um grande nmero de pesquisas nos ltimos vinte anos tm indicado
algumas limitaes dessa posio. Resultados consistentemente observados no
teriam explicao na teoria. Os resultados mais relevantes so aqueles que mostram
que o tipo de situao influencia na forma como a criana resolve um problema e a
constatao de que a representao desempenha um papel significativo no raciocnio.
Vergnaud, entre outros, promoveu novos constructos tericos a partir da
posio piagetiana. A noo de invariante foi mantida no centro da descrio de
conceitos matemticos, mas deixou de ser o nico elemento importante dessa
descrio. As aes, como origem dos conceitos matemticos, foram substitudas poruma noo mais ampla, a de situao (Nunes, 1994). O conceito de situao passa a
11O termo sinal usado por Vygotsky no sentido de ter significado.
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desempenhar um papel mais central na teoria, pois os conceitos no so mais
definidos somente em termos de seus invariantes, mas tambm em termos das
situaes relacionadas ao invariante.
Vergnaud incluiu ainda a idia de que as representaes simblicas so
centrais descrio psicolgica dos conceitos matemticos, no se tratando apenas
de um subproduto das estruturas cognitivas. Um tipo de representao pode facilitar
o reconhecimento de certas semelhanas e obscurecer outras, enquanto uma segunda
forma de representao pode facilitar o reconhecimento tambm de outras
semelhanas e diferenas. Os sistemas simblicos de representao desempenham
um papel estruturante nos processos de raciocnio.
importante analisar o significado das formas simblicas que so utilizadas
na formao dos conceitos. Vergnaud (1982), observa que algumas formas de
representao facilitam a resoluo de problemas. Ele observou que para os
estudantes na faixa etria entre 11 e 12 anos, diagramas so mais apropriados do que
equaes quando o objetivo era resolver problemas de adio e subtrao. Ele
admite, ento, que diagramas so ...um tipo de equao com informaes adicionais
especificadas. (p. 56). Uma das caractersticas dos smbolos matemticos que um
mesmo smbolo pode ser usado para representar diversos conceitos. Vergnaud (1985)
considera essa caracterstica como sendo uma limitao das representaes
algbricas, um obstculo aprendizagem dos conceitos: Uma representao
algbrica faz perder muitas informaes porque identifica sob o mesmo smbolo (+,
-, =) conceitos elementares relativamente diferentes uns dos outros.(p. 85). O autor
explicita essas limitaes: Alguns sistemas simblicos no permitem representar
todos os problemas, ou no permitem distinguir entre a representao dos
problemas e a representao das solues (p. 89). Decorrem desse fato muitas das
dificuldades encontradas pelas crianas quando tm de ampliar para outras classes de
problemas, e a outras relaes, as suas concepes sobre um determinado conceito.
Portanto, Vergnaud (1991) afirma que s possvel existir o significado de
um conceito quando ocorrer a coordenao entre trs componentes: as relaes entre
o conceito e seu invariante; a estrutura da situao na qual o conceito utilizado; e as
formas simblicas que so usadas para represent-lo. Esta uma teoria sobre
conceitos, matemticos em particular. Para Vergnaud (1984) um conceito consiste
em uma trade de trs conjuntos.
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conceito = (S, I, )
S: o conjunto de situaes que do sentido ao conceito; I: o conjunto de
invariantes (ou teoremas-em-ao) que caracterizam a variedade de competncias
dos estudantes, esses invariantes so propriedades do conceito enquanto construtos
psicolgicos; e, : o conjunto de representaes simblicas que podem ser usadaspara representar essas propriedades e as situaes. Em outras palavras, o autor chama
S de referente, I de significado, e de significante. Nesse modelo, a representao de
um conceito tem a mesma importncia, para sua formao que tm o invariante e as
situaes nas quais esse pode ser tratado.
A posio terica de Duval (1992) difere um pouco do modelo de camposconceituais de Vergnaud. Duval conclui que o invariante, ou objeto matemtico,
mais importante que a sua representao. No entanto, esses elementos esto
intimamente relacionados, pois as representaes so absolutamente necessrias. Os
objetos matemticos no so acessveis diretamente percepo, ou numa
experincia intuitiva imediata como os objetos ditos reais ou fsicos. A
possibilidade de efetuar tratamentos sobre os objetos matemticos depende do
sistema de escrita escolhido. Com relao funo da representao, Duval concluique no servem apenas para comunicar, mas interagem com partes importantes da
cognio.
Na seo a seguir sero discutidos alguns estudos que analisam diferentes
funes da representao perante a atividade matemtica. Sero adotadas dois pontos
de vista: em primeiro lugar, analisou-se como sistemas de grficos formais podem
ser usados para representar objetos matemticos e, como desenhos peculiares dos
alunos tambm podem exercer o papel de representar materialmente um invariante.
3Formas e funes da representao
A capacidade de tratar o invariante de um conceito, num amplo conjunto de
situaes, por meio do uso de um vasto conjunto de sistemas simblicos
conseqncia do conhecimento sobre um conceito. Dos sistemas grficos usados no
ensino de Matemtica, o grfico cartesiano um dos que permite, atravs de sua
interpretao, comparar diferentes taxas. Nesses, taxas diferentes so codificadas por
diferentes inclinaes desenhadas a partir de dois pontos distintos do grfico (Ver no
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Anexo I a discusso sobre o conceito de tangente). No entanto, a interpretao de
grficos uma atividades problemtica para os alunos (Janvier, 1978). Um tipo
freqente de erro cometido a confuso entre a altura de um ponto no grfico com a
sua inclinao nas proximidades desse ponto.
Alm disso, alguns estudos demonstram como crianas representam
fenmenos atravs da criao de desenhos diferentes daqueles ensinados na escola.
Nessa seo trs tpicos foram analisados: as diferentes funes da representao na
atividade matemtica; a relao entre a interpretao de grficos e a compreenso do
conceito de taxa; e o processo espontneo de representar dos alunos.
3.1 As funes da representaoEm uma recente reviso, Nunes (1994) discutiu vrios estudos empricos que
evidenciam as funes de diferentes formas de representaes em determinados
processos de resoluo de problemas. Num dos estudos analisados, essa autora
observou um primeiro tipo de funo: determinados tipos de representao exercem
um melhor controle dos processos de computao. Em Marton & Neuman (1990),
uma amostra de crianas de 7 anos resolveu eficientemente problemas aditivos, com
uma parcela desconhecida, usando finger numbers, ou seja, o reconhecimento de
padres visuais que indicavam uma quantidade. Num problema como se sua
professora tiver 4 lpis e 10 crianas quiserem desenhar, quantos lpis ela precisa ir
buscar na sala de material?, bastava a criana levantar os dez dedos, separar quatro,
e reconhecia o padro que se formava. As crianas bem sucedidas diziam a resposta
correta sem contar os dedos. Como afirmou a autora, ...os dedos funcionam como
objetos simblicos (Nunes, 1994, p. 21).
As caractersticas de um sistema de numerao especfico influenciam no
processo de raciocnio. Para exemplificar essa fato, Nunes (1994) observou, por
exemplo, o que ocorria com as crianas das camadas populares do Brasil que eram
expostas a dois tipos de aritmtica: a escrita e a oral. A primeira, aprendida na escola,
pode ser caracterizada pelo papel estruturante que os smbolos escritos exercem
sobre o processo de computao. No entanto, depois que os nmeros so escritos no
papel, deixa-se de pensar nas quantidades representadas e passa-se a trabalhar com
dgitos. Essa representao tem caractersticas espaciais especficas, e.g., os smbolos
tm de ser alinhados. Alm disso, no processo de reagrupamento de colunas, os
dgitos so tratados igualmente, independente de seu valor relativo. Essas
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caractersticas fazem com que o processo de controle do significado do resultado
fique enfraquecido.
Por outro lado, com a aritmtica oral, o processo de controle dos resultados
durante o clculo preservado. As quantidades permanecem representadas
explicitamente durante a computao. Os nmeros so tratados de acordo com o seu
valor relativo. Por exemplo, na aritmtica oral, duzentos e trinta mais cento e oitenta
so somados calculando-se: duzentos e trinta mais cem, trezentos e trinta; mais
oitenta, quatrocentos e dez. (Nunes, 1994, p. 21). A forma como os sistemas
simblicos oral e escrito so usados para resolver problemas envolvendo um sistema
de numerao tambm foi descrito em Schliemann, Santos & Costa (1992). Os
sujeitos resolveram contas oralmente preservando suas referncias s quantidades
fsicas (no caso, dinheiro). Os mesmos sujeitos, quando tentavam resolver as contas
usando cdigo escritos, demonstravam apenas um uso incorreto das tcnicas
aprendidas na escola. Efetivamente, suas representaes poderiam estar servindo
apenas para auxiliar no clculo mental, mas isso no ficou claro no estudo.
O uso de sistema simblico na resoluo de problemas aritmticos tambm
foi apresentado em Hatano (1994). Este autor descreveu como os grandes-mestres
utilizavam o baco para resolverem problemas desse tipo. Em sntese, os
grandes-mestres desenvolviam uma representao mental, com caractersticas
espaciais, que lhes permitia operar um baco mental com tanta eficincia como
operavam um baco fsico. Assim como na aritmtica escrita, o baco levava o
usurio a trabalhar com dgitos, e no com quantidades. Isso dificultava o processo
de controle dos resultados durante o clculo. O autor conclui que para todos os tipos
de representantes nos quais a referncia s quantidades fsicas perdida, a
influncia do sistema simblico, usado para simbolizar os nmeros sobre o processo
de clculo, provavelmente decorre do fato de que os smbolos tornam-se os objetos
sobre os quais operamos (p. 20).
Um outro papel dos sistemas simblicos analisada por Nunes (1994) a
influncia desses em processos de resoluo de problemas inseridos em prticas
culturais especficas. Basicamente, esse aspecto diz respeito atribuio de
significados s representaes em virtude de seu uso em prticas culturais anteriores.
A autora exemplificou este tpico demonstrando como o significado dos sinais + e
- so tratados no ensino bsico. Ambos so usados para indicar as operaes de
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soma e subtrao, no entanto, no se podem misturar duas operaes (p. 23). Com
a introduo do conjunto dos inteiros, o sinal de menos deixa de representar apenas
uma operao, para passar tambm a representar magnitudes negativas12. As crianas
demonstraram ter dificuldades ao resolver problemas que envolvam a descrio de
quantidades negativas, como na descrio de perdas e lucros de um agricultor. Os
alunos resolviam corretamente os problemas quando utilizavam o sistema oral de
representao, ao invs do sistema escrito. Uma anlise qualitativa demonstrou que
os erros dos alunos no podiam ser atribudos s dificuldades na compreenso dos
invariantes envolvidos na situao, mas pareciam resultar diretamente de problemas
relacionados notao.
Para avaliar a interferncia dos significados anteriores dos sinais de + e -,
os problemas foram apresentados em uma folha semelhante usada em armazns e
padarias nas quais se fazem anotaes das compras e pagamentos. Explicava-se para
os alunos que as anotaes indicavam lucros se fossem precedidas pelo sinal de mais
(+), e prejuzos, quando precedidas por um sinal de menos (-). Essa modificao
facilitou a compreenso dos significados dos nmeros negativos, por haver mudado a
interpretao dos sinais. No foram mais obtidos desempenhos significativamente
inferiores do que aqueles obtidos quando os problemas eram resolvidos na condio
oral. Os alunos saram-se to bem na condio escrita quanto na oral. Em sntese,
quando sistemas simblicos esto inseridos em determinadas prticas culturais, os
significados dos smbolos e as regras dessas prticas estruturam os processos de
raciocnio, ainda que em conflito com a anlise que os sujeitos fazem da situao-
problema (Nunes, 1994, p. 23).
Um terceiro exemplo de funo, analisado por Nunes (1994), revelou que a
maneira com a qual se representa uma situao-problema pode determinar o tipo de
esquema desenvolvido na anlise da mesma. A autora descreveu alguns resultados de
estudos sobre o conceito de rea os quais os alunos tm dificuldade em resolver
utilizando as medidas dos lados. Basicamente, havia dois grupos de alunos e ambos
tinham de resolver um problema de comparar duas reas diferentes. Os alunos do
primeiro grupo receberam duas rguas e o outro grupo de alunos recebeu 20
tijolinhos de 1 cm2. O nmero mdio de respostas erradas no grupo ao qual foram
dadas as rguas foi significativamente maior do que o nmero de respostas erradas
12Aspecto particularmente problemtico, tanto do ponto de vista da aprendizagem como do ponto devista epistemolgico no campo da Matemtica (Neto, 1995).
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observadas no outro grupo. Entre os alunos que dispunham de rguas, trs estratgias
foram mais freqentes: (1) medir os permetros dos retngulos e compar-los como
se fossem as reas; (2) calcular a rea e depois chegavam concluso que ainda no
sabiam qual das figuras tinha a maior rea; e (3) tentar utilizar a rgua como
instrumento de medida de rea, deslocando-a sucessivamente sobre a figura para
medir a rea. Este ltimo comportamento foi muito significativo, pois demonstrou a
insatisfao dos alunos em usar uma representao linear para comparar reas. Entre
os alunos que dispunham de tijolinhos, alguns tentaram cont-los, construindo uma
fileira junto base da figura. No entanto, um grupo significativo de alunos descobriu
uma frmula multiplicativa para o clculo da rea dos retngulos. Esta frmula
surgia a partir da constatao de que todas as fileiras tinham o mesmo nmero detijolinhos e apoiava-se claramente no esquema correspondncia um a muitos,
caracterstico da compreenso de problemas do tipo isomorfismo de medidas,
descrito em Vergnaud (1991). Quando foram apresentados ao problema que pedia
para comparar reas de um paralelogramo, os alunos que resolveram corretamente o
problema com os retngulos usando a estratgia de multiplicar as medidas dos lados,
geralmente confundiam o comprimento do lado inclinado com a altura, incidindo em
erro. Em contraste, muitos dos usurios dos tijolinhos conseguiram vencer essadificuldade, buscando identificar o nmero de tijolos por fileira e o nmero de
fileiras.
Meira (1991b) investigou, do ponto de vista da Teoria da Atividade13, como a
produo de representaes externas est relacionada com a atividade de resoluo
de problemas envolvendo o conceito de funo do primeiro grau. Foram observados
nove pares de alunos de oitava srie trabalhando em problemas sobre funes
lineares, instanciadas em trs diferentes dispositivos. Todos os pares receberamproblemas equivalentes, mas cada um dos grupos de trs pares tive apenas um dos
dispositivos para experimentar.
O primeiro dispositivo foi um conjunto de pesos, linhas e roldanas. Uma das
extremidades das linhas era fixa a roldanas que, ao girar, recolhiam as linhas. Na
outra extremidade havia um peso que mantinha a linha distendida no sentido vertical.
Neste caso, a altura inicial dos pesos, na ponta da linha, estaria associado ao termo
13Na Teoria da Atividade (Leontiev, 1947/1981) os componentes bsicos so as aes tomadas pelosagentes em meios sociais e materiais especficos. Essas aes envolvem aspectos cognitivos, sociais emateriais do mundo na forma de: (1) conhecimentos anteriores dos agentes; (2) sua interao comoutros; e (3) seu uso e produo de artefatos e convenes.
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independente da equao (b), o dimetro da roldana se referia ao coeficiente do
termo de primeiro grau (a), o nmero de voltas era representado pela varivel x e a
altura do peso em qualquer instante era simbolizado por y. A equao que
corresponderia posio dos pesos em funo no nmero de voltas seriay=ax+b.
O segundo dispositivo foi um sistema com molas de diferentes coeficientes de
elasticidade (K). Essas molas, dentro de limites prticos, respeitam a Lei de Hooke
(Resnick & Halliday, 1983). Essa lei diz que a fora exercida por uma mola, contra a
sua formao, diretamente proporcional ao seu deslocamento, e K a constante de
proporcionalidade. Essa relao tem a forma de uma equao do primeiro grau como
P Kx= , relacionando o peso suportado pela mola Pe a deformao observadax. O
comprimento da mola deformada, y, matematicamente expresso como sendo
y yM
Kn= +0 , onde yo o tamanho inicial da mola, M o peso de cada massa
pendurada mola, e n o nmero de massas penduradas na mola.
O terceiro dispositivo era um programa de computador que recebia um valor
de entrada e entregava um valor de sada. Para cada entrada, entre 0 e 5, o programa
mostrava um valor de sada segundo uma funo linear previamente programada. Os
estudantes no tinham acesso definio da funo, apenas podiam usar o programa
para obter os resultados das sadas.
Durante a seo de resoluo de problemas, tabelas de valores foram
extensamente produzidas por todos os alunos. Este tipo de representao serviu como
ferramenta que os alunos usaram para manipular os dados experimentais
relacionados aos dispositivos fsicos e para resolver problemas relacionados s
funes lineares. Muito provavelmente, tabelas, de uma forma geral, tinha uma
importncia particular na prtica de sala de aula dos alunos entrevistados.
O autor observou que tais produes, alm de servirem para auxiliar no
processamento cognitivo e dar suporte comunicao, tinham fundamental
importncia na organizao da atividade dos alunos. A relao entre a representao
e a atividade foi vista como uma relao dialtica. A representao externa feita em
papel tem a importante funo de moldar a atividade do indivduo, ao mesmo tempo
que o indivduo molda as representaes que produz. As representaes tm grande
importncia, principalmente quando ocorrem breakdowns na atividade dos sujeitos,
ou seja, quando ocorre a perda de uma linha de pensamento. Portanto, as
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representaes produzidas durante a atividade tm o papel de organizar, em um
sistema simblico, os aspectos circunstanciais envolvidos com sua atividade. Um
outro aspecto relativo ao papel de representaes est relacionado s inferncias
quantitativas. Nesse caso, as representaes servem como uma base material para
que quantidades sejam conduzidas e inferncias sejam feitas. O autor concluiu, ainda
com relao competncia em criar representaes e atribuir-lhes significado, que:
o conhecimento de representaes matemticas no apenas relembrado e aplicado
onde parece relevante. Ao contrrio, a competncia em criar representaes materiais
emerge em sua interao com as circunstncias de um especfico conjunto de fatores
sociais e materiais. Em particular, ferramentas matemticas, assim como tabelas de
valores, so apropriadas e continuamente transformadas conforme, por exemplo, asintenes comunicativas do estudante-designer ou a emergncia de situaes na qual
a manipulao do dispositivo fsico no possvel ou realizvel (p. 38).
A compreenso do conceito de taxa de variao tambm envolve a
capacidade de tratar seu invariante quando o mesmo apresentado por meio de
grficos cartesianos. No entanto, muitos estudos demonstraram que as crianas erram
com freqncia ao proceder com a interpretao de grficos. Na seo a seguir ser
caracterizado o processo de interpretao de grficos, identificando-se as principais
dificuldades encontradas pelos alunos e suas provveis causas.
3.2 Interpretar grficos e o conceito de taxa
Um estudo clssico sobre a interpretao de grficos foi realizado por Janvier
(1978). O autor observou como os estudantes percebiam a relao entre a forma dos
grficos e aspectos de um fenmeno descritos atravs deles. Com relao a essa
conexo, o autor afirmou que: no h interpretao sem situao (p. 3.6). Essasuposio inicial torna-se explcita quando o autor afirma que: a inteno principal
de nossa abordagem a de ilustrar a interferncia ou a influncia da situao
quando chamada na ao [de produzir e interpretar grficos] (p. 9.14). Essa tornou-
se central na anlise que o autor realizou sobre o processo de interpretao de
grficos.
Interpretar um grfico, segundo Janvier, consiste em colocar em forma verbal
informaes relacionadas a uma situao, fornecidas na forma grfica. Significa
descrever em palavras a relao que existe entre duas variveis descritas por meio de
um grfico. Segundo o autor, o processo de interpretao envolve uma relao
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dialtica entre o conhecimento dos aspectos envolvidos com a situao e as formas
particulares dos grficos. Por um lado, qualquer pergunta feita sobre um grfico
refere-se s quantidades fsicas, e no s caractersticas grficas como tais; porm
seus elementos grficos so utilizados para simbolizar aspectos das situaes
descritas. As respostas produzidas pelo sujeito podiam ser induzidas pela forma do
grfico, pelos conhecimentos sobre a situao subjacente, ou pela combinao de
ambos. Esses dois fatores foram, de modo geral, considerados como continuamente
relacionados. Em outras palavras, as concluses dos alunos so influenciadas por
aspectos geomtricos dos grficos, por seus conhecimentos sobre a situao
subjacente, ou podia ainda tratar-se de uma influncia hbrida. Em suma, o sujeito
tinha que coordenar, durante o processo de interpretao, o grfico e a situao. Ainterpretao de grficos podia ser melhor descrita como uma progressiva integrao
dos vrios pedaos de informaes transmitidas pelo grfico com o conhecimento
circunstancial subjacente.
Os elementos bsicos da interpretao de grficos eram, portanto, as
associaes Caractersticas Grficas Fatos Circunstanciais. Habilidades deleitura claramente inadequadas podiam tambm impedir a associao a ser
estabelecida ou suspender a leitura do grfico por parte das crianas. Que distino
podia ser feita entre leitura e interpretao? A leitura trata da decodificao dos
aspectos geomtricos de um grfico sem a preocupao de referir-se organizao
circunstancial da situao. um processo usado como meio para que sejam
estabelecidas relaes entre aspectos do grfico e aspectos ligados a situao descrita
por ele. Em cada caso, a interpretao diferia da leitura, pois a relao
Caracterstica Grfica Fatos Circunstanciais era estabelecida bemdiferentemente. No entanto, para existir a interpretao, faz-se necessrio que haja a
leitura do grfico.
Para o autor, o tipo de pergunta apresentada criana interferiria no tipo de
procedimento utilizado para interpretar um grfico. Uma pergunta na qual as
palavras apenas exigissem uma descrio dos aspectos figurativos do grfico no
implicava numa interpretao por parte do sujeito. Alguns exemplos de perguntas
que podem no suscitar o processo de interpretao de um grfico de crescimento
(altura tempo) podem ser as seguintes: Qual a mdia das alturas de meninos aos 8
anos?, ou De quantos centmetros a mdia das alturas das meninas aumentou entre
as idades de 3 e de 8 anos? Nesses dois casos, o sujeito podia encontrar respostas
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para ambas as perguntas sem ter de reportar-se aos aspectos particulares do
fenmeno descrito pelo grfico. Por outro lado, uma pergunta que envolve
reformulaes intermedirias podem ser considerada como uma chamada
interpretao. Por exemplo, com relao ao grfico da figura e, a seguir, a pergunta:
Quando esto as meninas mais altas do que os meninos? um exemplo de
pergunta que requer interpretao.
A relao entre taxa de variao de uma quantidade e a sua representao
atravs de grficos foi analisada por Nemirovsky & Rubin (1991). Os autores
descreviam uma corrida de carros e pediam que essa fosse representada. Nesse caso,
a quantidade corresponde posio de um caminho e a variao corresponde a sua
velocidade. Foram realizados dois encontros de 90 minutos nos quais realizaram-se
12 seqncias de tradues de grficos de Posio Tempo para grficos de
Velocidade Tempo. Todos os estudantes cursavam o segundo grau e no haviam
tido qualquer instruo formal sobre conceitos do Clculo Infinitesimal, como:
limite, derivada, taxa de variao, integral.
Os problemas foram colocados atravs do desenho de grficos em uma
cartela, onde se perguntava ao estudante o que ele esperava da forma de uma funo,
conhecida a forma da outra. Por exemplo, era mostrado ao estudante um grfico de
posio e era pedido que antecipasse a forma do grfico da velocidade. Durante as
entrevistas, os estudantes escolhiam qual experimento iriam realizar. Eles podiam,
por exemplo, dirigir um caminho de brinquedo com as mos. O procedimento
prosseguiu com a produo/interpretao de grficos criados pelos alunos com
softwares especficos ou desenhando-os mo.
Os protocolos foram analisados para encontrar certas idias guia, queajudaram os estudantes a articular predies especficas e para as quais eles
expressaram uma certa consistncia. Muitas idias desse tipo correspondiam regras
sintticas, sem ligao com o significado que as formas grficas mantinham do
fenmeno representado. Por exemplo, linhas retas no grfico de velocidade
correspondiam a linhas retas no grfico de posio. Geralmente, um estudante
construa um conjunto de idias no compatveis com o ponto de vista formal,
parecendo emergir de diferentes aspectos da situao, entretanto, sem uma
consistncia interna. A maioria dos episdios de aprendizagem do estudo incluram
experincias nas quais contradies entre diferentes idias-chaves tornavam-se
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salientes para o estudante. Ficava ento mais claro para o estudante que este deveria
construir uma traduo semntica como uma prova de seu conhecimento
reorganizado. Isso novamente demonstra que a interpretao dependia da relao que
os indivduos criam entre as formas dos grficos e aspectos das situaes a que os
grficos se referem.
O processo de interpretao, caracterizado pelo estabelecimento de
associaes Caractersticas Grficas Fatos Circunstanciais, misturado comvrias estratgias de leitura, pode ser desordenado por vrios fatores, os quais
provocam fracassos ou muitos tipos de regresses a esse processo. Os fatores,
segundo Janvier, que podem provocar erros de interpretao so: (1) dificuldades
com relao situao apresentada, o que faria a criana interpretar um grfico sem
qualquer referncia s quantidades fsicas ou a qualquer tipo de conhecimento
anterior. Esse fator pode provocar a ocorrncia de associaes errneas; (2) a prpria
natureza da apresentao de um grfico pode ser determinante no processo de
interpretao; (3) a criana pode no ter conhecimento da causalidade de
determinadas grandezas diretamente envolvidas como: temperatura, tempo, altura,
largura etc.; (4) ainda com relao aos conhecimentos que os sujeitos tm de fatos
circunstanciais, a criana pode no ter o domnio de conceitos derivados das relaes
entre quantidades, como: acelerao, rapidez, crescimento, altura, aumento de peso
etc.; e, (5) erros ocorridos no processo de interpretao podem ainda ser devidos as
prprias caractersticas dos grficos, como: relaes entre a forma do mesmo e escala
etc. Janvier identificou alguns dos tipos de erros mais freqentes, os