Gt17 Educacao Para Esperanca

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  • Perodo: 10 a 13 de novembro de 2013. UFPEInternacionalizao da Educao e Desenvolvimento Regional: implicaes para a ps

    GT17

    EDUCAO PARA

    RESUMO O presente ensaio fruto de uma pesquisa emprica realizada junto a professores da rede municipal do municpio de Moju (Par), prximo a capital, Belm, no ano de 2012.O instrumento utilizado para a coleta de dados fora a entrevista semiestruturada, aplicada em 4 escolas do referido municpio da rea urbana, sendo que 2 que possuam o maior IDEB e 2 que possuam o menor IDEB. Selecionei apenas docentes que atuam no ensino fundamental (sexto a nono ano) e que fossem concursados. A inteno era extrair a percepo desses sobre: 1) a educao; 2) sobre o trabalho que realizam; 3) como pensam a vida que levam; 4) o que esperam do futuro, da educao. A partir desses pontos elaborei os eixos temticos da entrevista a ser efetivada, tendo em vista identificar e analisar a relao estabelecida entre o trabalho educativo que realizam e a afinidade (ou no) com a construo de sonhos, esperanas, utopias diversas. O universo amostral apontou a existncia de nove professores a serem entrevistados. Os dados revelam que, mesmo diante do avassalador processo de desencanto, os depoimentos ainda revelam sinais de possibilidades utpicas e emancipatrias. Palavras-chave: Trabalho docente, e

    I CONSIDERAES INICIAIS

    Recuperar a viso do processo histrico que nos constitui gesto de rebeldia salutar contra o imediatismo e a absolutizao do presente que o sistema capitalista nos impinge. Sem esta irremediavelmente reprodutivista e mediocremente acrtico. Afinal, um dos atributos do ser humano pensarsocial em perene transformao (ALENCAR, 2007, p. 47).

    XXI EPENN Encontro de Pesquisa Educacional do Norte e Nordeste

    Perodo: 10 a 13 de novembro de 2013. UFPE

    Internacionalizao da Educao e Desenvolvimento Regional: implicaes para a ps

    GT17 Filosofia da Educao

    EDUCAO PARA ESPERANA NOS LABIRINTOS DO CAPITAL

    Raimundo Srgio de Farias Jnior (UEPA)

    O presente ensaio fruto de uma pesquisa emprica realizada junto a professores da rede municipal do municpio de Moju (Par), prximo a capital, Belm, no ano de 2012.O instrumento utilizado para a coleta de dados fora a entrevista semiestruturada, aplicada em 4 escolas do referido municpio da rea urbana, sendo que 2 que possuam o maior IDEB e 2 que possuam o menor IDEB. Selecionei apenas docentes que atuam no

    fundamental (sexto a nono ano) e que fossem concursados. A inteno era extrair a percepo desses sobre: 1) a educao; 2) sobre o trabalho que realizam; 3) como pensam a vida que levam; 4) o que esperam do futuro, da educao. A partir desses

    orei os eixos temticos da entrevista a ser efetivada, tendo em vista identificar e analisar a relao estabelecida entre o trabalho educativo que realizam e a afinidade (ou no) com a construo de sonhos, esperanas, utopias diversas. O

    apontou a existncia de nove professores a serem entrevistados. Os dados revelam que, mesmo diante do avassalador processo de desencanto, os depoimentos ainda revelam sinais de possibilidades utpicas e emancipatrias.

    Trabalho docente, esperana, desencanto, capitalismo.

    CONSIDERAES INICIAIS

    Recuperar a viso do processo histrico que nos constitui gesto de rebeldia salutar contra o imediatismo e a absolutizao do presente que o sistema capitalista nos impinge. Sem esta perspectiva, o trabalho educacional ser irremediavelmente reprodutivista e mediocremente acrtico. Afinal, um dos atributos do ser humano pensar-se ao longo do tempo, e como construo social em perene transformao (ALENCAR, 2007, p. 47).

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    Encontro de Pesquisa Educacional do Norte e

    Internacionalizao da Educao e Desenvolvimento Regional: implicaes para a ps-graduao

    ESPERANA NOS LABIRINTOS DO CAPITAL

    Raimundo Srgio de Farias Jnior (UEPA)

    O presente ensaio fruto de uma pesquisa emprica realizada junto a professores da rede municipal do municpio de Moju (Par), prximo a capital, Belm, no ano de 2012.O instrumento utilizado para a coleta de dados fora a entrevista semiestruturada, aplicada em 4 escolas do referido municpio da rea urbana, sendo que 2 que possuam o maior IDEB e 2 que possuam o menor IDEB. Selecionei apenas docentes que atuam no

    fundamental (sexto a nono ano) e que fossem concursados. A inteno era extrair a percepo desses sobre: 1) a educao; 2) sobre o trabalho que realizam; 3) como pensam a vida que levam; 4) o que esperam do futuro, da educao. A partir desses

    orei os eixos temticos da entrevista a ser efetivada, tendo em vista identificar e analisar a relao estabelecida entre o trabalho educativo que realizam e a afinidade (ou no) com a construo de sonhos, esperanas, utopias diversas. O

    apontou a existncia de nove professores a serem entrevistados. Os dados revelam que, mesmo diante do avassalador processo de desencanto, os depoimentos ainda revelam sinais de possibilidades utpicas e emancipatrias.

    sperana, desencanto, capitalismo.

    Recuperar a viso do processo histrico que nos constitui gesto de rebeldia salutar contra o imediatismo e a absolutizao do presente que o sistema

    perspectiva, o trabalho educacional ser irremediavelmente reprodutivista e mediocremente acrtico. Afinal, um dos

    se ao longo do tempo, e como construo social em perene transformao (ALENCAR, 2007, p. 47).

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    O presente ensaio, escrito sob uma tessitura de profundo desencanto com a

    educao e tambm com qualquer possibilidade utpica de transformao societal,

    emergiu da necessidade de ainda imaginarmos rupturas com a atual estrutura

    econmica, poltica, social e cultural em que estamos submersos. Alimentar sonhos,

    esperanas e pensamento utpicos ainda constitui uma aposta histrica necessria para a

    construo de uma ordem social mais humana, fraterna e igualitria. E a educao pode

    ainda representar um espao profcuo para que se germine e propague pensamentos

    subversivos, contrrios aos ditames estabelecidos.

    Todavia, muitos so os discursos que decretam a falncia de qualquer suspiro,

    reminiscncia e possibilidade da hodierna organizao societal vir a ruir. Muitos so os

    que advogam a inexorabilidade da eternidade do mundo permanecer presidido pela

    lgica do capital e, assim, objetivam afastar, por completo, qualquer probabilidade de

    que as classes dominantes vinham a tremer diante de uma revoluo (MARX e

    ENGELS).

    Tais discursos, impregnados de uma falcia fatalista, sofismam em prol da

    manuteno e preservao do presente regime de acumulao. Deste modo, procuram

    intensamente disseminar que qualquer espectro que possa ameaar a ordem estabelecida

    fora definitivamente exorcizado. Assim, mesmo as contradies sociais se avolumando,

    ainda que aberraes de toda ordem denunciem a existncia de uma ordem social que

    destrutivamente degrada nosso planeta em prol do incessante e voraz desejo de

    acumular capital, as energias utpicas parecem definharem diante da aparente

    irreversibilidade da racionalidade irracional do presente modo de produo.

    Inescrupulosamente, a acentuada explorao da mais valia por parte da

    burguesia, o que permite aos que no vivem de seu prprio trabalho o crescente e

    inaudito acmulo de capital, danifica paulatinamente cada vez mais as condies de

    existncia objetiva e subjetiva dos que vivem do trabalho.Marx (1985), ao analisar o

    processo de produo do capital, percebia que a explorao do trabalho alheio

    verificado em modos de produo anteriores havia sido aperfeioada no vigente sistema,

    o que submete os trabalhadores a uma degradante condio de existncia. Alterou-se

    apenas a forma de submisso e explorao, uma vez que sua essncia permanece a

    mesma, pois enquanto uma parte da sociedade possuir o monoplio dos meios de

    produo, o trabalhador, livre ou no, forado a acrescentar ao tempo de trabalho

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    necessrio para a sua prpria subsistncia um mais-valor destinado a sustentar o

    possuidor dos meios de produo (MARX, 1985).Essa situao arruna e condena a

    amargura milhares de indivduos que ainda vivem do trabalho, o que favorece, em

    funo das precrias condies de existncia a que esto contidos, o controle de suas

    vidas. Esses tm a existncia cada vez mais ritmada pela desesperana e o desespero

    diante da aparente fatalidade e da desgraa a qual o destino, engendrado pelo capital,

    lhes reservou.

    Nessa tessitura, oportuno recuperar a viso do processo histrico a fim de

    elaborarmos um gesto de rebeldia contra o aparente determinismo e a desesperana do

    presente, o que requer derrotar a resignao acrtica que se disseminou na sociedade e,

    tambm, no campo educacional em tempos cada vez mais obscuros e parcos de ousadia

    e rebeldia.Diante disso, que se faz emergencialmente necessrio potencializarmos e

    atualizarmos uma energia utpica capaz de se opor radicalmente ao discurso ideolgico

    conservador que objetiva contribuir para a legitimao e perpetuao inexorvel da

    lgica destrutiva reinante, reproduzida, tambm, pela educao em tempos de

    desesperana e desespero acentuado.

    A educao pode assumir fora subversiva potencialmente transformadora se

    proporcionar o fim do monoplio privado do conhecimento, que cada vez mais opera

    contra a dignidade humana, bem como favorece a reproduo de formas de excluso e

    humilhao subjacentes a um tipo de sociedade que progressivamente exclui as massas

    do acesso formao cultural, pois:

    A educao uma oportunidade para compartilhar nosso direito dignidade e uma oportunidade de lutar contra toda forma de humilhao; nosso direito de desestabilizar qualquer monoplio e expropriao privada do conhecimento. Educar contra a humilhao educar na utopia de saber que a luta democrtica caminho mais seguro contra o desencanto (GENTILI, 2008, p. 19).

    Derrotar o desencanto e revigorar a utopia a aposta que ainda podemos fazer

    no presente cenrio de desesperana e desespero presente no processo de sociabilidade

    dos mais simples. A omisso pode representar um erro histrico imperdovel e

    irreversvel, dado o clere processo de aniquilamento social e ambiental corrente, e a

    sucumbncia das energias verdadeiramente emancipatrias diante a lgica destrutiva

    existente.

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    O presente texto, assim, fruto de uma pesquisa emprica realizada junto a

    professores da rede municipal do municpio de Moju, cidade localizada no Estado do

    Par, prximo a capital, Belm e faz parte da pesquisa A precarizao do trabalho

    docente em Moju: reflexos da mundializao do capital, realizada sob minha

    coordenao no ano de 2012. O instrumento utilizado para a coleta de dados fora a

    entrevista semiestruturada. Apliquei esse instrumento em 4 (quatro) escolas do referido

    municpio da rea urbana, sendo que 2 (duas) que possuam o maior IDEB (ndice de

    Desenvolvimento da Educao Bsica) e duas que possuam o menor IDEB. Selecionei

    apenas docentes que atuam no ensino fundamental (sexto a nono ano) e que fossem

    concursados. A inteno era extrair a percepo desses sobre: 1) a educao; 2) sobre o

    trabalho que realizam; 3) como pensam a vida que levam; 4) o que esperam do futuro,

    da educao. A partir desses pontos elaborei os eixos temticos da entrevista a ser

    efetivada, tendo em vista identificar e analisar a relao estabelecida entre o trabalho

    educativo que realizam e a afinidade (ou no) com a construo de sonhos, esperanas,

    utopias diversas. Meu universo amostral apontou a existncia de 9 (nove) professores

    que, com certo receio, aceitaram participar dessa pesquisa, sob a condio da

    preservao do anonimato. Identifiquei os mesmos de forma simples: I, II, III, IV, V,

    VI, VII, VII, IX.Embora tenha adotado como recorte metodolgico a diversificao de

    informantes, conforme orienta Michelat (1982), uma vez que dos nove docentes

    entrevistados quatro pertenciam a escolas de IDEB elevado e cinco a escolas de IDEB

    baixo, no percebi diferenas substanciais entre os depoimentos. Por isso, no organizei

    o contedos das falas, para fins de comparao, tendo em vista o recorte amostral

    adotado.Parte do resultado desse estudo est consubstanciada nas linhas que segue.

    II A educao para a esperana nos labirintos do capital

    A utopia ou, o que a mesma coisa, a pedagogia da esperana, construda dia a dia, junto aqueles que sofrem a barbrie brutal de um sistema que nega os mais elementares direitos humanos a milhes de pessoas, meninos e meninas, jovens de mil cores, unidos pelo desprezo e a indiferena que os poderosos lhes concedem. E por sua silenciosa aspirao a ser, finalmente, os donos de sua prpria histria (GENTILI, 2008, p. 19).

    O poderoso sistema sociometabolismo do capital, constitudo pelo trip

    capital, trabalho e Estado, entendido por Mszros (2002) como uma lgica

    incontrolvel que torna o sistema do capital essencialmente destrutivo e dessa forma

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    que esse sistema vem atingindo seu incomensurvel e contraditrio crescimento ao

    longo da histria1.

    A expanso do capital implica, por conta de seu irracional sociometabolismo, o

    aumento de uma competitividade e concorrncia intercapitais altamente destrutiva da

    fora humana que trabalha, bem como acentua a degradao acelerada do meio

    ambiente (MSZROS, 2002). Ocorre que mesmo conseguindo se desenvolver de

    forma contraditria e revelando, cada vez mais, seu carter irracionalmente destrutivo, o

    capital aparenta possuir uma energia capaz de perenizar eternamente seu processo de

    acumulao desigual e combinado, excludente, opressor e humilhante.

    Nessa tessitura, como ainda sonhar com uma sociedade liberta dos grilhes do

    capital diante do avassalador processo de contaminao ideolgica produzido, em

    especial, pela indstria cultural? Como sonhar com a emancipao diante de uma escola

    que cada vez mais no consegue formar para a autonomia? Como decifrar os labirintos

    do capital que eclipsam o processo de esclarecimento, tal como entendia Kant

    (s/d)Como aspirar a um mundo verdadeiramente igual e democrtico se a educao

    dirigida s massas progressivamente definhou a capacidade subjetiva e utpica das

    mesmas? Reside a uma questo fundamental sobre a qual se ergue o fulcro de uma

    sociedade no-emancipada: a vida como ideologia da reificao, em funo sobretudo

    da formao social destinada s massas no ser propcia a potencializ-las

    subjetivamente para a interpretao crtica dos fundamentos que produzem variadas

    formas de grilhes.

    Como escapar desse labirinto em tempos de hegemonia do projeto neoliberal que

    afeta e danifica sensivelmente a educao? Se, como nos diria Freire, a educao,

    sozinha, pouca fora possui para efetivamente emancipar a sociedade, sem ela muito

    pouco se pode fazer. Neste sentido, concordo com Gentili (2008, p. 16) quando afirma

    que:

    O problema principal est em nos questionarmos se, de fato, a educao deveria ser a principal responsvel por salvar o mundo ou se, mais modestamente, constitui uma atividade que vale a pena ser exercida em uma sociedade democrtica, justamente porque no redime o mundo dos males,

    1 De acordo com Mszros (2002) qualquer tentativa de superar este sistema que se restrinja esfera institucional est fadado ao fracasso, pois o Estado moderno representa uma estrutura poltica que atua a favor do capital, uma espcie de pr-requisito para a converso do capital num sistema dotado de viabilidade para a sua reproduo, o que lhe confere grande importncia para a materialidade do capital.

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    mas pode realizar um minsculo papel na formao dos seres humanos que decidam transform-los.

    A perspectiva que este texto assume constitui mais uma tentativa, entre tantas

    outras j esboadas, em potencializar a modesta contribuio que a educao possui

    para formar e emancipar os indivduos. Desacredita, portanto, na tentativa de conferir a

    educao o milagroso papel salvacionista, ainda fortemente presente em nosso contexto

    social e educacional.

    Realizando esse pequeno papel, o que no que dizer insignificante e sem

    importncia, a educao poder contribuir para a formao de indivduos que se

    recusem a submergir e sucumbir diante da racionalidade presidida pela lgica destrutiva

    e irracional que administra a sociedade. A partir do exposto por Gentili (2008) observei

    nos depoimentos dos docentes partcipes desse estudo que, de um modo geral, alguns

    manifestam e creditam a educao o papel importante no processo de transformao

    social. J outros, ponderam a necessidade de se compreender a educao componente de

    um contexto social mais amplo, a estrutura social capitalista, e que, por isso, tem seu

    potencial emancipador reduzido. Todos os entrevistados, porm, ressaltam o processo

    de desvalorizao da profisso, as pssimas condies de trabalho e o aviltamento

    salarial como fatores que determinam a falta de expectativas com relao ao futuro, a

    educao e apropria vida deles. Sobre isso o docente II assim se manifesta:

    Sem a educao no tem como mudar o mundo. Mas ela sozinha, tambm, no pode tudo, diria Freire (ENTREVISTADO III). Se a educao no pode mudar tudo, sem a educao no d pra mudar nada tambm (ENTREVISTADO IV). No d pra negar que a desvalorizao, os salrios baixos comprometem a qualidade do trabalho. Comprometem e muito. Mas isso no pode implicar que eu no me esforce pra oferecer o melhor de mim. Se eu no fizer isso, acabo com os sonhos de meus alunos e isso terrvel pra um educador (ENTREVISTADO II).

    Os labirintos posto formao humana encontram poderosos obstculos,

    permeada pela danificao das condies objetivas para a realizao de uma aula de

    qualidade, o que dificulta o acesso a uma formao cultural que potencialize uma

    subjetividade crtica e transformadora. Presenciamos o aperfeioamento de uma

    formao que, por um lado, enfraquece subjetivamente os que poderiam aspirar

    transformao e, por outro, fortalece o sentimento de impotncia, resignao e

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    desesperana frente ao poderoso mastodonte, representado pelo modo de produo

    vigente que pisoteia e humilha os menores.

    preciso educar para a esperana (FREIRE, 1997), pois no d pra comear um

    embate sem um mnimo de esperana. Sem esperana, uma necessidade ontolgica dos

    seres histricos, certamente reinaria o desespero. Alm disso, desesperana e desespero

    reforam nos indivduos um imobilismo que potencializa os discursos fatalistas que

    tenta nos convencer de que somos demasiadamente fracos para almejar mudar alguma

    coisa...

    Pensar que a esperana sozinha transforma o mundo e atuar movido por tal ingenuidade um modo excelente de tombar na desesperana, no pessimismo, no fatalismo. Mas, prescindir da esperana na luta para melhorar o mundo como se a luta se pudesse reduzir a atos calculados apenas, pura cientificidade, frvola iluso.prescindir da esperana que se funda tambm na verdade como na qualidade tica da luta negar a ela um de seus suportes fundamentais (FREIRE, 1997, s/p).

    Cabe, destarte, modestamente a educao no contribuir para desesperanar e

    desesperar ainda mais os indivduos, cujos efeitos de uma educao danificada estorvam

    subjetividades subversivas. Diante desse colossal desafio, emerge nosso modesto papel

    na formao dos seres humanos: educar para a esperana, ainda que os labirintos do

    capital reforcem e estimulem em cada um dia ns o contrrio.

    Requer retomar um importante ensinamento de Freire (1996): ensinar acreditar

    que a mudana possvel e, por isso, que ela motiva a esperana, enquanto que a

    desesperana o aborto deste mpeto. O entrevistado V, por sua vez, mesmo

    percebendo as dificuldades que poderiam enfraquecer o potencial emancipador da

    educao enfatiza:

    O sistema no vai me pagar mais, no vai melhorar minhas condies de trabalho. Mas isso no pode me desanimar. Tenho que lutar com meus companheiros e ter esperana que ainda h uma possibilidade de alguma coisa mudar. No posso, tambm, ir pra sala de aula e desmotivar meus alunos. Isso no minha tarefa. No posso culp-los por isso. Minha tarefa educar e isso procuro fazer. Se nem isso eu fazer vou estar apenas alimentando tudo de mal que condeno nessa sociedade. Na verdade, reside em nossos alunos a esperana de que algo posso mudar. (ENTREVISTADO V).

    Penso que, tendo em vista a manuteno da esperana, preciso desvelar

    possibilidades de utopias verdadeiramente emancipatrias: a imaginao criativa e

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    crtica de um mundo radicalmente diferente do atual. Neste sentido, essa premissa nos

    afasta da crena de que a fatalidade um dado irreversvel na histria humana.

    Por outro lado, educar para a esperana pode germinar um ato histrico

    subversivo e potencialmente transformador das atuais relaes sociais de produo e do

    ethoshegemnico que, cada vez mais, nos confina na escurido da desesperana, do

    desespero e da amargura, cujos precedentes enfraquecem qualquer pensamento utpico.

    Predomina na escola pblica brasileira uma tradio cultural de estabelecer

    consensos de forma hierrquica e verticalizada e ignorando, por completo, potenciais

    insurgentes. Nessa tessitura, a escola brasileira se revela potencialmente cada vez mais

    funcional, elitista e excludente e pouco propulsora de energias subversivas. Segregando,

    discriminando e excluindo os indivduos pertencentes s camadas populares ela vai,

    tacitamente, se aproximando dos propsitos que almejam a reproduo perptua do

    processo sociometabolico que interessa as elites.

    Para Dubet (2003) preciso entender que a escola est inserida numa estrutura

    social perpassada pelos mecanismos de excluso, o que nos obriga a pensar: qual o

    lugar da escola numa estrutura social que desenvolve processos de excluso? Na

    estrutura social capitalista, com a qual a escola dialeticamente se relaciona, os

    mecanismos de excluso operam tendencialmente para a permanncia dostatus quo

    ostentado pelo sistema pblico de ensino. O depoimento do entrevistado VII

    elucidativo em relao a essa questo:

    D aula aqui em Moju no fcil. Temos alunos muito pobres e isso dificulta a aprendizagem. A maioria quer apenas terminar o fundamental e se der o mdio. Eles tm poucas perspectivas de futuro. No quero isso pra eles. Quero que eles consigam pensar num futuro melhor, numa vida melhor. Sei que a vida deles dura, sei que eles sofrem com a excluso... A nica forma que posso contribuir pra ajudar a mudar isso e procurando ensinar bem, d o melhor de mim. Mas reconheo que diante das dificuldades d um desnimo, um sentimento de impotncia porque parece que nada vai mudar nunca (ENTREVISTADO VII).

    Neste cenrio, parece cada vez mais remoto imaginar utopicamente a

    transformao societal. Neste sentido, parece mais fcil imaginar a deteriorao total da

    natureza do que um possvel colapso do capitalismo (JAMESON, 1997). Esse fato pode

    ser creditado ao formidvel xito com que as teses postuladas pela ideologia neoliberal

    alcanaram em nossos dias: o obscurecimento das conscincias, o que, por sua vez,

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    engendra a ocultao das contradies de toda ordem que se avolumam, mas no so

    notadas pela imediata percepo humana.

    Cabe notar, como salienta Alencar (2007) que o sistema capitalista institui uma

    lgica que se afirma como sendo definitiva e eterna, o que lhe confere um

    impressionante poder avassalador; um poderoso e intenso controle da subjetividade

    humana, algo que nos impele a necessidade de (re) pensar uma educao diferente.

    Educar o contrrio disso: edificao assentada nos pilares da originalidade, da cooperao e erguida com o cimento da solidariedade. O conhecimento que no compartilhado vazio. E perigoso. Pode fazer da maravilhosa fissura do tomo a bomba atmica, e da extraordinria clonagem a reproduo da opresso e do alinhamento amorfo. O neoliberalismo tambm ameaa a educao ao submet-la noo de que s a empresa e o lucro movimentam a sociedade. Com isso, a privatizao soluo, o particular toma lugar do pblico, o interesse de poucos substitui o interesse coletivo. A escola passa a ser um negcio e o ensino pblico, agonizante, vai fazendo parcerias crescentes que o subordinam s necessidades dos donos das indstrias e do capital (ALENCAR, 2007, p. 103).

    Objetivando, portanto, instituir um consenso acerca da eternidade do regime de

    acumulao, cabe educao, sob a tica preconizada pelos neoliberais, enfraquecer

    progressivamente a subjetividade dos que vivem do trabalho e isso acaba por favorecer

    a desesperana, o desespero e a fatalidade de seus destinos, ritmados pela excluso,

    humilhao e explorao.

    Mesmo o referido cenrio conspirando, acentuadamente, para a produo e

    reproduo de uma escola elitista, discriminatria e excludente, esse esforo no

    possibilita o xito absoluto das teses neoliberais e cuja pretenso implica na criao de

    um pensamento nico, laureado pelo pragmatismoe utilitarismo de nossos dias e

    completamente ajustado aos ditames estabelecidos.

    O crescente e progressivo enfraquecimento subjetivo dos que vivem do trabalho

    potencializa, demasiadamente, o poder de manipulao e da doutrinao ideolgica que

    os interessados na manuteno da ordem exercem sobre os indivduos, o que afeta

    sensivelmente, inclusive, o surgimento de pensamentos comprometidos com a

    emancipao das classes oprimidas. Sobre isso o Entrevistado I salienta que:

    O meu fazer educativo deve estar voltado para os que mais precisam. Preciso ensinar. Essa a minha tarefa. Se fizer isso da melhor forma, acho que estarei contribuindo para a libertao das pessoas. Hoje em dia t difcil isso. So muitos obstculos que aparecem. Mas no deixo me vencer por eles. Tem muito colega de trabalho aqui na escola que vem d suas aulas sem nenhum

  • 10

    compromisso com os alunos. No se importam mesmo. Meu compromisso com a vida. Por isso no desanimo e nem desisto.

    A contrapelo dos que objetivam os defensores da ordem, as contradies sociais

    ainda representam um instransponvel obstculo a ser vencido pelas teses outrora

    aludidas, circunstncia que lhes impinge a necessidade crescente de eclipsar, ao

    mximo, a realidade concreta, e, dessa forma, garantir a eficincia da dominao dos

    que vivem as contradies do mundo do trabalho.

    Se a inteno era educar para a desesperana, para o fatalismo e para o desespero

    embora em grande parte as teses neoliberais alcancem esse desgnio as

    determinaes internas e externas que atuam na formao sociocultural sociedade

    brasileira, bem como sobre a escola, no permitem o alcancem integral do desiderato

    dos poderosos grupos que administram a sociedade. Por outro lado, no podemos

    creditar a escola formal o principal papel subversivo para a transformao da estrutural

    societal em que nos encontramos. sob essa perspectiva que entendo a reflexo de

    Meszros (2005, p. 45): [...] fica bastante claro que a educao formal no a fora

    ideologicamente primria que consolida o sistema do capital; tampouco ela capaz de,

    por si s, fornecer uma alternativa emancipadora radical. (Grifos do autor).

    Observando por essa tica, uma educao progressista necessita aprender a

    trabalhar nas contradies que dia-a-dia se manifestam na concretude das relaes

    sociais, em especial as que se efetivam na realidade educacional do cho de nossas

    escolas e sob o qual se tecem a materialidade existencial dos sujeitos histricos nela

    inseridos.

    E justamente sobre esse cho que milhares de seres humanos encontram-se

    relegados ao desemprego e ao subemprego, a brutais formas de explorao e opresso, a

    marginalidade, criminalidade e demais formas de excluso que interagem na

    sociabilidade dos mais simples, dos mais humildes que so permanentemente

    humilhados pelos mandarins desse sistema, material ou simbolicamente2.

    2 Entendo que atualmente a escola tem cada vez mais realizando uma violncia simblica junto a nossos alunos. Em funo da necessidade de manter a base material sob sua determinao, as elites dirigentes edificam um sistema de relaes de fora simblica cujo papel reforar, por dissimulao, as relaes de fora material sob a qual se realizam relaes de dominao e explorao de uma classe sobre a outra (BOURDIEU e PASSERON, 1975).

  • 11

    Mas isso no pode ser interpretado como uma fatalidade inescapvel, um beco

    sem sada. Entendido, assim, refora-se a desesperana e o desespero, situao que

    potencialmente subtrai qualquer tipo de resistncia a ser empreendida. a que uma

    pedagogia da esperana necessita operar. E isso requer utopicamente engendrar uma

    sociedade e educao para alm do capital.

    No se pode desprezar o fato de que a educao dialeticamente impactada pela

    incorrigvel lgica do capital. Essa lgica incorrigvel procura inviabilizar qualquer

    processo formativo que possa desencadear mudanas estruturais profundas no sistema

    sociometabolico vigorante. A argumentao apresentado pelo entrevistado III , nesse

    caso, satisfatoriamente plausvel quando observa que:

    Sei que a escola importante na vida dessas crianas. Sei que pra maioria delas a nica forma que tero pra se livrar da misria. Mas diante da pobreza que acompanha a vida delas tudo mais difcil e remoto. Vejo a educao como um instrumento importante, mas ela pouco pode fazer diante dessa realidade de pobreza. Mas elas tem uma chance, que a educao. E pra isso alguma coisa posso fazer, indicando caminhos, fazendo refletirem, apontando caminhos, mudanas. Mas vejo tambm que a escola faz parte de um contexto mais amplo. E pra quem comanda a sociedade nesse contexto no interessa muito que as pessoas queiram se libertar (ENTREVISTADO III).

    Essa percepo nos impede de atribuir a educao formalo papel de principal

    responsvel por salvar o mundo das mazelas presentes na essncia da estrutura societal

    vigente, o que no invalida, por mais modestaque seja, a contribuio que essa possa

    oferecer para a construo de uma sociedade genuinamente democrtica, livre, justa

    eigualitria.

    Perceber criticamente que a educao afetada pela incorrigvel lgica do

    capital constitui tarefa basilar imprescindvel para tentar neutralizar, pelo menos em

    parte, seus efeitos sobre a formao humana. Desconsiderar isso, refora a construo

    de uma educao que sirva ao sistema, a dominao e a explorao que esta submetida a

    maioria que vive do trabalho. Sobre isso Mszros (2005, p. 35) observa que:

    O impacto da incorrigvel lgica do capital sobre a educao tem sido grande ao longo do desenvolvimento do sistema. [...]. por isso que hoje o sentido da mudana educacional radical no pode ser seno rasgar da camisa-de-fora da lgica incorrigvel do sistema: perseguir de modo planejado e consistente uma estratgia de rompimento do controle exercido pelo capital, com todos os meios ainda a ser inventados, e que tenham o mesmo esprito.

  • 12

    Essa lgica do capital, mesmo se assentando num carter irracional, afim de

    manter inalterada a estrutra social no qual esta sedimentada, inviabiliza, no horizonte

    histrico do capitalismo, sua alterao radical. Inserida nesse contexto, a educao

    acaba por ser seriamente afetada pela lgica sobra a qual se assenta o sociometabolismo

    do regime atual.

    Sendo assim, oportuno considerar que a escola se relaciona dialeticamente com

    o processo de transmisso do ethos subjacente as sociedades capitalistas, o que lhe

    impingi a conformao a uma determinada funcionalidade social inerente ao sistema

    produtivo. Mas algo que no determina, em ltima instncia, todas as suas finalidades.

    Mas oportuno observa que no a utilizao desta ou daquela pedagogia, desta

    ou daquela concepo de ensino ou metodologia empregada, desvinculado dos demais

    condicionantes sociais intrnsecos a realidade escolar, que ir conferir a educao um

    grandioso papel na alterao radical das presentes relaes sociais. Nesse sentido,

    concordo com a observao desenvolvida por Baudelot(1991, p. 36) quando analisa

    que:

    [...] a realidade escolar, como parte da realidade social, no se muda nem pela boa vontade dos professores nem pelos decretos do governo. No basta, como se poderia pensar, que os professores compreendam, amem a classe operria e desejem a salvao escolar de seus filhos para que desapaream as divises sociais na escola. Os obstculos encontrados no tm sua origem na "resistncia mudana dos professores" ou na "fora de inrcia do sistema": devem-se muito mais fundamentalmente s funes sociais reais do sistema escolar nas sociedades burguesas.

    Se, por um lado, a lgica incorrigvel do capital e o seu poderoso impacto sobre

    a educao pode desencantar aqueles que atribuem educao o papel salvacionista

    creditada a ela por muitos, por outro lado, essa compreenso pode nos desafiar a,

    criticamente, construir uma educao radicalmente contrria aos propsitos

    mercadolgicos em voga.

    As contradies sociais, impregnadas no duro cho da escola pblica, indicam

    alguma possibilidade de que algo diferente pode ser feito, a contrapelo dos interesses

    elitistas que reforam a submisso da escola aos ditames da reproduo do

    desenvolvimento sociometablico que presenciamos. Sob essa tica, cabe aos

    intelectuais orgnicos dos que vivem do trabalho que atuam na escola contribuir para

    a superao do senso comum que para Gramsci (1989) se constituiu numa concepo

    de mundo absorvida acriticamente, ocasional e desagregada , promovendo o

  • 13

    surgimento, segundo observa o mesmo Gramsci, de uma filosofia da prxis3 (p. 12).

    Para isso, ao intelectual orgnico4, Gramsci (1989, p. 27) sugere:

    [...] repetir constantemente, e didaticamente (de forma variada) os argumentos que concorrero para a ampliao da viso das massas; e a elevao cada vez maior da cultura da massa, fazendo surgir dela mesma a

    elite de seus intelectuais, capazes de uma ligao terica e prtica. Em funo do fato de os processos de reproduo societal mais amplos

    impactarem densamente na escola, isso no implica de realizar a cada dia uma educao

    para alm do capital j no seu interior, o que requer potencializar nosso papel diante do

    poderoso mastodonte que tentar pisotear desumanamente tudo lhe ope resistncia.

    Mesmo considerando que uma das principais funes que compete escola,

    segundo Mszros (2005, p. 45,) resida na tarefa de produzir tanta conformidade ou

    consenso quanto for capaz, a partir de dentro e por meio de seus prprios limites

    institucionalizados e legalmente sancionados, ainda possvel, em funo

    sobretudodos interstcios propiciados pelas contradies sociais, operar uma prxis

    oposta a dominao ideologia socialmente reproduzida pela escola.Considero

    importante destacar o depoimento do entrevistado VI quando analisa que:

    A educao que eu quero oferecer para meus alunos deve ser compatvel com o que eles precisam e merecem para poderem se desenvolver como seres humanos. O governo, acho isso mesmo, no tem interesse na educao das massas. Quando as massas pensam se tornam algo perigoso pra sociedade, pois elas comecem a exigir direitos, comear a se organizar, exigir mudanas. Ainda que eu trabalhe com a disciplina matemtica, com nmeros... acredito que se eu fizer o meu papel posso t ajudando meus alunos a descobrirem o mundo a sua volta, a raciocinarem melhor. Isso apenas uma aposta minha (ENTREVISTADO VI)

    3 Usado como expresso sinnima do materialismo dialtico de Marx, que expressa a forma dos

    homens produzirem sua vida a partir da base produtiva

    4 importante observar que, segundo Gramsci: A elaborao de uma viso organizada de mundo no se faz arbitrariamente em torno de uma ideologia qualquer, vontade de alguma personalidade, de grupos fanticos filosficos ou religiosos. A no adeso ou adeso da massa a uma ideologia demonstra a crtica da racionalidade histrica dos modos de pensar. As construes arbitrrias so as primeiras a serem eliminadas na competio histrica; j as construes que correspondem s exigncias de um perodo histrico complexo e orgnico terminam sempre por se impor e prevalecer, ainda que atravessem muitas fases intermedirias nas quais a sua afirmao ocorre apenas em combinaes mais ou menos bizarras e heterclitas (1999, p. 111).

  • 14

    A partir do exposto penso que a educao, ainda que prevalea o discurso

    governamental em prol de uma educao de qualidade para todos, tem seu papel

    limitado, dado que reduz suas possibilidades de atuar contra a crescente e inexorvel

    dominao ideolgica imposta pela ordem estabelecida. Assim, penso tornar-se

    imprescindvel compreendermos, a fim de potencializarmos e atualizarmos nossa

    atuao sociopoltica que: [...] os remdios no podem ser s formais; eles devem ser

    essenciais (MSZROS, 2005).

    Isso significa que no podemos esperar de quem se locupleta e se beneficie do

    regime sociometablico,ou apenas defenda organicamente os interesses desses, qualquer

    iniciativa que vislumbre a perspectiva da escola atuar contrrio aos desgnios para o

    qual engendrada. Significa, tambm, pensar em solues que atinjam a essncia no

    manifesta pelo sistema. Recupero, aqui, a preocupao de Mszros (2005, p. 45),

    quando observa que:

    Esperar da sociedade mercantilizada uma sano ativa ou mesmo mera tolerncia de um mandato que estimule as instituies de educao formal a abraar plenamente a grande tarefa histrica do nosso tempo, ou seja, a tarefa de romper com a lgica do capital no interesse da sobrevivncia humana, seria um milagre monumental. por isso que, tambm no mbito educacional, as solues no podem ser formais, eles devem ser essenciais. Em outras palavras, elas devem abarcar a totalidade das prticas educacionais da sociedade estabelecida.

    Isto , entendo que h a necessidade de considerar que escola ao longo de sua

    existncia na sociedade capitalista tem, por um lado, servido as demandas requeridas

    pela maquinaria produtiva e, por outro, transmitido um conjunto de valores que

    convalidam os interesses dos grupos economicamente dominantes.

    No plano formal, praticamente impossvel alterar essa relao. Mas nos

    interstcios que a escola oferece, que no se manifestam imediatamente, ainda podemos

    provocar perturbaes na sua essncia. Para isso, creio que seja indispensvel envolver

    a totalidade das prticas educacionais, mediadas pela relao com a sociedade

    estabelecida.A observao do entrevistado I pertinente sobre esse aspecto:

    Mudar difcil. Mas precisamos mudar. O sistema conspira contra. E ser que o conjunto da sociedade quer mudar? Mudar pra quem? Pra que? Sei que necessrio. Vejo que meus alunos, por diferentes razes, veem seus sonhos reduzidos. Minha tarefa precisa ser ir alm de professor, mas de educador que tenta resgatar o sonho desses alunos de fazer uma faculdade, de se humanizar, de mudar sua vida e seu futuro. Diria mesmo que a melhor

  • 15

    educao aquela que, diante dos obstculos, cuida da esperana e no deixar que ela morra nunca

    Talvez, em meio as turbulncias do momento, bem como diante das promessas

    enganosas, sobretudo em momento da elaborao e aprovao de um novo Plano

    Nacional de Educao uma vez que o ltimo fora apontado porDermeval Saviani

    como uma mera carta de intenes, sem atitudes concretas de operacionalizao , ainda

    podemos potencializar uma utpica ao sociopoltica, alm de no permitir que a

    esperana, ainda que posso vir a definhar, sucumbir.

    III. Consideraes finais

    Entre a grandiosidade sublime e muito humana, comum a todos os idealistas e que est pronto a pisotear desumanamente tudo o que pequeno enquanto mera existncia, e a grosseira ostentao dos opressores burgueses, existe a mais profunda concordncia. prprio da dignidade dos gigantes rir estrondosamente, explodir, destroar (ADORNO, 1993, p. 73. Grifos meus).

    Evitar que a risada do gigante seja cada vez mais estrondosa e intensa uma das

    contribuies que a educao pode oferecer construo de uma sociedade emancipada.

    Se ainda perdura uma forma humilhante e degradante de incluso social, resultado de

    processo de socializao desumano, estimulando em cada pessoa a desesperana, ainda

    h algo a ser feito, pois a peleja ainda no pode ser dada por vencida.

    A cada dia o poder colossal do sistema capitalista pisoteia e humilha

    impiedosamente os mais fracos socialmente. Uma educao que deseja a emancipao

    necessita implica em encorajar, a partir das contradies que o sistema oferece, uma

    prxis revolucionria que, pode ser construda e realizada a cada dia.

    Se em nossos dias a modelo de reproduo societal se mostra mais forte e

    poderoso do que nunca, ignorando nossa mera existncia, ainda podemos aposta que de

    sua risada estrondosa ele possa, por conta de suas prprias contradies, vir a se

    destroar. Se a assertiva de Marx e Engels (1998, p. 14) estiver certa, a burguesia no

    forjou apenas as armas que a levaro a morte; produziu tambm os homens que usaro

    essas armas. Cabe, portanto, aos educadores que ainda no sucumbiram ao iderio do

    capital tirar a educao da influncia da classe dominante (MARX e ENGELS, 1998,

    p. 24). No horizonte histrico do capitalismo a realizao disso no aspecto formal seria

  • 16

    um milagre monumental jamais visto na histria social. Mas no espao mais recndito

    deste sistema, podemos, a cada dia, partejar uma imensa sabotagem.

    Talvez essa sabotagem ao sistema possa ser oferecida por meio de uma utpica

    esperana que nossas prticas educativas podem(ou no) viabilizar nos dias de hoje. Por

    teimosia (ou no) reside a, na manuteno da esperana, um gesto histrico que pode

    ajudar modestamente a contribuir para o surgimento do grande dia. Assim entendo, a

    afirmativa de Freire (2004, p. 194)

    A razo de ser de minha esperana radica na natureza inacabada de meu ser histrico. Inconcluso, me acho inserido num movimento permanente de busca. Minha esperana se funda na impossibilidade de buscar desesperadamente. neste sentido que tenho afirmado que no sou esperanoso por pura teimosia, mas por uma questo de radicalidade ontolgica. A nossa esperana tem que ver com a nossa capacidade de decidir, de romper, de escolher, de ajuizar.

    Reside a, a meu ver, uma pedagogia potencialmente utpica e radicalmente

    esperanosa. Ainda que imersa no labirinto do capital, a educao pode servir,

    dialeticamente, como antdoto contra o desencanto dos tempos neoliberais. A pesquisa

    que constituiu esse texto se edificou mediante o quadro de desencanto preocupante

    manifestado pelos docentes antes da realizao da pesquisa emprica. Todavia, aps a

    realizao dessa, percebi que eles possuam muito mais esperana do que imaginara ter,

    o que reforou no prprio autor dessas linhas a necessidade de revigorar, nos outros e

    em mim, a esperana nossa de cada dia.

    Referncias bibliogrficas

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  • 17

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