Guilherme a. Silva - Dicionário de Relações Internacionais - Pesquisável - 2º Edição - Ano...

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GUILHERME A. SILVA WILLIAMS GONÇALVES ici o n á r i o E d " ° REVISTA E AMPLIADA de Relações  Internacionais Manole

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  • G U I L H E R M E A. SILVA

    W I L L I A M S G O N A L V E S

    icionrio Ed"REVISTA E AMPLIADAde Relaes Internacionais

    Manole

  • DicionriodeRelaes Internacionais

  • eionrio deRelaesInternacionais2a edio

    revista e ampliada

    G U I L H E R M E A . S I L V AAdvogado. Mestre em Histria com especializao em Relaes Internacionais pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro - UERJ. PhD Student em Relaes Internacionais pela University o Southern Califrnia (USC), Estados Unidos.

    W I L L I A M S G O N A L V E SLicenciado e bacharel em Histria pela Universidade Federal Fluminense - UFF, mestre em Filosofia Poltica pela Pontifcia Universidade Catlica do Rio de Janeiro - PUC-RJ e doutor em Sociologia pela Universidade de So Paulo - USP. Professor do programa de ps-graduao em Relaes Internacionais da UERJ e professor associado da UFF.

    _Manole

  • Copyright 2010 Editora Manole Ltda., conforme contrato com os autores.

    Projeto grfico e capa:Nelson Mielnik e Sylvia Mielnik

    Editorao eletrnica:Acqua Estdio Grfico e departamento editorial da Editora Manole

    Dados Internacionais de Catalogao na Publicao (cip) (Cmara Brasileira do Livro, SP, Brasil)

    Silva, Guilherme A.Dicionrio de relaes internacionais / Guilherme A. Silva, Williams Gonalves.

    2. ed. rev. e ampl. - Barueri, SP : Manole, 2010.

    Bibliografia.ISBN 978-85-204-2882-5

    1. Comrcio exterior - Dicionrios 2. Relaes internacionais - Dicionrios I. Gonalves, Williams. II. Ttulo.

    09-09219 CD D -327.03

    ndices para catlogo sistemtico:1. Dicionrios : Relaes internacionais 327.032. Relaes internacionais : Dicionrios 327.03

    Todos os direitos reservados.Nenhuma parte deste livro poder ser reproduzida, por qualquer processo, sem a permisso expressa dos editores. proibida a reproduo por xerox.

    I a edio - 2005 2;* edio - 2010

    Direitos adquiridos pela:Editora Manole Ltda.Avenida Ceei, 672 - Tambor06460-120 - Barueri - SP - BrasilFone: (11) 4196-6000 - Fax: (11) 4196-6021www. ma nole.com. br i n fo@m a nole.com. b r

    Impresso no Brasil Printed in Brazil

  • Prefcio segunda edio

    Conclumos o prefcio da primeira edio expondo nossas esperanas de que o Dicionrio de Relaes Internacionais tivesse boa acolhida por parte do pblico leitor. Para nossa enorme satisfao e orgulho, a primeira edio se esgotou rapidamente. Essa boa aceitao de nosso trabalho estimulou-nos a preparar nova edio. Nesse processo, buscamos no apenas revisar e atualizar dados histricos, mas adicionar ainda alguns verbetes que consideramos de relevncia crescente para os estudos internacionais em nosso pas. So eles: estudos estratgicos, governana global, grandes debates, operaes de manuteno da paz, paradigmas cientficos, paz de Westflia, sociedade civil global e teoria da dependncia. Ademais, buscamos incorporar sugestes de nossos leitores. Alm desses novos verbetes, inclumos um sumrio alfabtico, o qual permite imediato acesso lista completa de verbetes que compem o dicionrio. Acrescentamos tambm um ndice remissivo, de grande valia para a utilizao do dicionrio como material de pesquisa.

    Por fim, uma vez mais expomos nossas expectativas de que este trabalho seja de grande proveito e interesse para o pblico leitor e que, de alguma forma, contribua para a evoluo do conhecimento na rea das relaes internacionais.

    Guilherme A. Silva Williams Gonalves

  • Prefcio da primeira edio

    Um dicionrio uma obra de referncia. O uso compartilhado de terminologias lingsticas parece ser condio necessria, ainda que insuficiente, para a formao de identidades coletivas. Mais do que simples descries, palavras contm significados valorativos e normativos. Palavras nos informam sobre a natureza do mundo que nos rodeia e as vises que temos desse mundo. Dicionrios, por sua vez, proveem-nos acesso a esse universo lingstico de nossas relaes sociais. Em poucas linhas e de forma genrica, eis algumas razes de ser de dicionrios lingsticos. Resta-nos indagar, mais especificamente, qual a razo de ser de um Dicionrio de Relaes Internacionais.

    A busca pela promoo sistemtica de usos compartilhados de conceitos analticos tarefa qual se dedicam estudiosos nos mais variados campos de pesquisa das cincias humanas e sociais. Mas reconhecer, relacionar e catalogar palavras e expresses que se transformam em conceitos, e conceitos que se integram a vocabulrios sociais correntes, no tarefa nada fcil. Trata-se, em ltima instncia, de um desafio que no pode ser totalmente vencido; jamais.

    Conceitos evoluem com o tempo. Seus significados divergem em funo de circunstncias polticas e socioculturais. Definies mltiplas coexistem em funo de prticas investigativas e interpretativas distintas. Como resultado, mapeamentos conceituais tendem a ser, quase que por definio, arranjos transientes.

    Apesar de tudo, esse um desafio que no pode ser relegado a segundo plano. Primeiro, porque, apesar de transientes, tais arranjos capturam pocas sociais. Segundo, porque a interlocuo sistemtica sobre pocas sociais, para obter coerncia, necessita da estruturao de corpus lingsticos analticos legitimados pelos participantes

  • dos debates acadmicos. Sem eles, alcanar coerncia interna e dilogos interdisciplinares se torna por demais tortuoso.

    Acreditamos que tais consideraes bastariam para justificarmos a publicao da presente obra. No entanto, a publicao de um Dicionrio de Relaes internacionais em lngua portuguesa, brasileiro, deve ser celebrada ainda por vrios outros motivos, igualmente relevantes.

    Primeiro, esta uma publicao nica na rea de estudos em Relaes Internacionais no Brasil. Mais do que uma obra limitada enumerao de termos seguidos de definies bsicas, cada verbete representa, por assim dizer, um esforo em reunir contedo e preciso, complexidade e simplicidade. Cada verbete composto por breves textos analticos cuja funo essencial trazer ao leitor, de maneira resumida, os principais significados dos temas em questo e os componentes principais dos debates que lhes dizem respeito.

    Segundo, esta uma publicao que procura contribuir para o reconhecimento do estudo das Relaes Internacionais como uma rea prpria de investigao acadmico-cientfica. Nesse particular, cumpre mencionar que o Brasil tem experimentado nos ltimos anoso surgimento de novos cursos, pblicos e privados, de graduao e ps-graduao em Relaes Internacionais. Esse um fenmeno que parece estar em sintonia com o fato de que o pas tem experimentado uma maior insero no cenrio internacional, particularmente nos ltimos dez anos. Como conseqncia, observa-se uma crescente procura por profissionais e estudiosos habilitados a lidar produtivamente com as vrias facetas das realidades internacionais. Nesse sentido, a publicao de um Dicionrio de Relaes Internacionais faz parte de um projeto mais amplo, o de solidificao dos estudos internacionais no pas.

    Terceiro, e de forma ainda mais especfica, esta uma publicao que busca contribuir, portanto, para a edificao de uma literatura apropriada para a conduo dos estudos internacionais no Brasil. Entendemos que a dimenso internacional possui sua prpria lgica, assim como componentes e processos que lhe so especficos. Para que melhor possamos reconhecer desafios e oportunidades internacionais, e, baseados nessa compreenso, delinear estratgias de atuao eficientes, parece-nos importante contar com ferramentas

    | DICIONRIO DE RELAES INTERNACIONAIS__________________________________________________________________________ VW

  • analticas condizentes. A disponibilizao de uma literatura especializada importante passo nessa direo.

    Quarto, esta uma publicao cuja relevncia e utilizao no devem se restringir aos membros da comunidade mais restrita de estudiosos e praticantes das Relaes Internacionais. O fato que temas e processos globais tendem a influenciar, de uma forma ou de outra, atividades, prticas de trabalho e a prpria natureza do exerccio profissional nas mais diversas reas das cincias humanas e sociais. Histria, economia, cincia poltica, marketing, administrao, comunicao, direito e sociologia so apenas alguns dos exemplos de reas significativamente afetadas por contextos e processos globais contemporneos. Para os membros dessas comunidades in- vestigativas, o Dicionrio de Relaes Internacionais pode - e deve - representar um valioso instrumento de referncia conceituai sobre assuntos internacionais e globais.

    Quinto, esta uma publicao cujos verbetes e seus contedos buscam captar debates universais. Mas isso feito sem nos descuidarmos em refletir, tambm, sobre debates de carter mais regional, mais prximos s inmeras facetas das realidades brasileiras.

    Partimos do princpio de que o estudo das Relaes Internacionais possui dois componentes bsicos. De um lado, o Brasil est inserido em uma comunidade internacional que se utiliza amplamente de um conjunto especfico de terminologias com vistas s anlises de temas comuns. Se quisermos dialogar com o mundo, precisamos conhecer seu vocbulo. Por outro lado, o Brasil possui desafios e interesses especficos, prprios de sua conjuntura nacional e regional. Para que pudssemos maximizar a relevncia do Dicionrio de Relaes Internacionais, procuramos incorporar conceitos de tal forma a atender ambas as dimenses.

    Finalmente, e no menos importante, a feitura deste dicionrio reflete uma iniciativa caracterizada por esforos sinceros de cooperao entre seus autores. Podemos dizer que foi, de fato, um prazer trabalharmos na construo de nosso Dicionrio de Relaes Internacionais. Procuramos trabalhar aproveitando o que cada um de ns tem de melhor a oferecer, em funo de nossas experincias profissionais diferenciadas e interesses acadmicos distintos. Mais ainda, exercitamos de maneira sistemtica um processo de consulta e reviso dos verbetes, que se pautou pelo respeito intelectual mtuo e

    JX_____________________________________________________________________________________________PREFCIO DA PRIMEIRA EDIO |

  • DICIONRIO DE RELAES INTERNACIONAIS

    pela alegria que sentimos em podermos realizar um projeto no qual ambos acreditvamos. Nossa convico de que o resultado final reflete de maneira positiva nosso esforo conjunto.

    Para concluir, gostaramos de expressar nossa esperana de que este trabalho seja bem acolhido pelo pblico leitor. Isso seria um indicativo no apenas de que nossos esforos foram feitos na direo certa, mas tambm de que o pblico brasileiro cada vez mais se conscientiza da crescente importncia que o Brasil tende a ter no cenrio internacional.

    Guilherme A. Silva Williams Gonalves

  • Sumrio

    A ..................................................................................................................... 1A lca ................................................................................................................. 1Alianas......................................................................................................... 4Anarquia........................................................................................................ 6Armas de destruio em massa (ADM ).............................................. 8Ator internacional..................................................................................... 10

    B ...................................................................................................................... 12Balana de poder....................................................................................... 12Bretton W oods............................................................................................ 12

    C ..................................................................................................................... 16Comisso Econmica para a Amrica Latina e o Caribe(Cepal)............................................................................................................ 16Comunidade dos Pases de Lngua Portuguesa (C PLP)............. 18Com unism o.................................................................................................. 22Conferncia Afro-Asitica de Bandung ........................................... 27Consenso de Washington........................................................................ 29Construtivismo........................................................................................... 30Corporao multinacional (C M N ).................................................... 34Cultura poltica .......................................................................................... 38

    D ..................................................................................................................... 40Desenvolvimento....................................................................................... 40Desenvolvimento sustentvel................................................................ 42Dtente........................................................................................................... 47Dilema de segurana internacional.................................................... 50

  • | DICIONRIO DE RELAES INTERNACIONAIS XII

    Diplom acia................................................................................................... 51Direito internacional................................................................................. 57Direitos hum anos...................................................................................... 62

    E ...................................................................................................................... 67Economia poltica internacional......................................................... 67Equilbrio de poder................................................................................... 69Estado............................................................................................................. 72Estudos estratgicos.................................................................................. 75

    F ...................................................................................................................... 79Feminismo.................................................................................................... 79

    G ..................................................................................................................... 82Geopoltica................................................................................................... 82Globalizao................................................................................................ 85Governana global..................................................................................... 91Grandes debates........................................................................................ 95Grupo de Cairns......................................................................................... 104Grupo dos Oito - G - 8 ............................................................................. 105G uerra............................................................................................................ 106Guerra Fria ................................................................................................... 111

    H ..................................................................................................................... 118Hegemonia................................................................................................... 118

    I 121Idealismo....................................................................................................... 121Imperialismo................................................................................................ 123Instituio internacional......................................................................... 127Integrao econmica.............................................................................. 127Interdependncia........................................................................................ 129Interesse nacional...................................................................................... 132Intergovernamental................................................................................... 133Itamaraty....................................................................................................... 134

    L ...................................................................................................................... 139Liberalismo................................................................................................... 139

  • XIII _____________________________________________________________________________________________________________________SUMRIO |

    Liga das Naes.......................................................................................... 145

    M .................................................................................................................... 146Mediao internacional.......................................................................... 146Mercosul........................................................................................................ 149M todo........................................................................................................... 154Multilateralismo........................................................................................ 155

    N ..................................................................................................................... 158N ao ............................................................................................................. 158Nacionalismo............................................................................................... 158N afta ............................................................................................................... 162Negociao diplomtica......................................................................... 165Negociao internacional...................................................................... 165Neoliheralismo........................................................................................... 169Neorrealismo............................................................................................... 169

    O ..................................................................................................................... 170Operaes de manuteno da paz..................................................... 170Ordem mundial.......................................................................................... 175Organismo internacional........................................................................ 178Organizao das Naes Unidas (ONU).......................................... 180Organizao de Cooperao e de Desenvolvimento Econmico(OCDE) ........................................................................................................ 188Organizao do Tratado do Atlntico Norte (O ta n ) ................. 189Organizao dos Estados Americanos (OEA) .............................. 192Organizao Mundial do Comrcio (OM C) ................................. 195Organizao no governamental (ONG) ....................................... 197

    P ...................................................................................................................... 200Paradigma cientfico................................................................................. 200Paz de Westflia.......................................................................................... 2 0 7Poder internacional................................................................................... 209Poltica com parada................................................................................... 2 1 4Poltica externa........................................................................................... 216Poltica externa independente.............................................................. 219Poltica internacional............................................................................... 222Poltica mundial.......................................................................................... 225

  • | DICIONRIO DE RELAES INTERNACIONAIS XIV

    Ps-modernismo........................................................................................ 226Pragmatismo responsvel........................................................................ 229Protecionismo.............................................................................................. 231

    R ..................................................................................................................... 235Realismo........................................................................................................ 235Reciprocidade.............................................................................................. 240Regime internacional............................................................................... 242Relaes internacionais............................................................................ 244Relaes mundiais..................................................................................... 246Relaes transnacionais.......................................................................... 249

    S ...................................................................................................................... 250Santa Aliana............................................................................................... 250Segurana coletiva..................................................................................... 252Sistema internacional............................................................................... 254Sistema mundial......................................................................................... 256Soberania nacional................................................................................... 258Sociedade civil global............................................................................... 261Sociedade das naes............................................................................... 268Sociedade internacional.......................................................................... 271Sociedade mundial..................................................................................... 272

    T ..................................................................................................................... 274Teoria crtica................................................................................................ 274Teoria da dependncia............................................................................. 276Teoria do sistema-mundo...................................................................... 279Teoria dos jo g o s ........................................................................................ 279Terceiro Mundo.......................................................................................... 280Terrorismo.................................................................................................... 285Transnacional.............................................................................................. 287Tribunal Penal Internacional................................................................. 289

    U ..................................................................................................................... 291Unio Europia (U E ) ............................................................................... 291

    Bibliografia .................................................................................................. 295ndice alfabtico-remissivo..................................................................... 303

  • ALCA

    A rea de Livre Comrcio das Amricas (Alca) teve como ponto de partida a Primeira Cpula das Amricas, realizada em Miami em dezembro de 1994. Junto com o anfitrio do encontro, o ento presidente norte-americano Bill Clinton, 33 chefes de Estado e de governo da regio, entre eles o presidente do Brasil poca, Itamar Franco, e o presidente eleito Fernando Henrique Cardoso, decidiram criar uma rea livre de barreiras ao comrcio e ao investimento, da qual est excluda a ilha de Cuba, por no ser considerada pelos demais um pas democrtico. Esses lderes assumiram o compromisso de concluir as negociaes at o fim do ano de 2005 . As negociaes, porm, no foram concludas. Havendo sido iniciadas numa conjuntura internacional em que as teses neoliberais preponderaram em toda a regio, as negociaes foram interrompidas quando governos nacionalistas de esquerda foram sendo eleitos no subcontinente sul-ameri- cano nos primeiros anos da primeira dcada, sendo que alguns desses governos assumiram posies marcadamente antinorte-americana, o que impossibilitou qualquer avano no sentido de criao da rea de livre comrcio.

    Desde a deciso de criar a Alca, foram realizadas oito reunies dos representantes da rea de comrcio de cada pas para elaborar um plano de ao e lev-lo prtica: (1) 1995 - Denver, EUA; (2) 1996 - Cartagena, Colmbia; (3) 1997 - Belo Horizonte, Brasil; (4) 1998 - So Jos, Costa Rica; (5) 1999 - Toronto, Canad; (6) 2001 - Buenos Aires, Argentina; (7) 2 0 0 2 - Quito, Equador; e (8) 2003 - Miami, Estados Unidos.

  • ALCA

    Os princpios reguladores das negociaes so os seguintes:

    1. As decises sero tomadas por consenso.2. As negociaes sero conduzidas de maneira transparente.3. A Alca ser consistente com as regras e disciplinas da O M C e

    dever segui-las sempre que possvel e apropriado.4. A Alca constituir um compromisso nico (nada decidido, at

    que todos estejam de acordo ).5. A Alca poder coexistir com acordos bilaterais e sub-regionais,

    e os pases podero negociar e aceitar as obrigaes da Alca individualmente ou como membros de um grupo de integrao sub-re- gional.

    6. Ateno especial ser dada s necessidades das economias menores.

    A estrutura e a organizao das negociaes so as seguintes:

    1. Presidncia. A cada dezoito meses um pas designado para coordenar as negociaes. Canad, Argentina, Equador, Brasil e Estados Unidos foram os pases escolhidos.

    2. Comit de Negociaes Comerciais (CNC). Formado por vice-mi- nistros de comrcio, com o compromisso de se reunir pelo menos duas vezes por ano, de modo rotativo, nos pases do continente.

    3. Grupos de negociao. So nove grupos designados para negociar os textos de suas respectivas reas: acesso a mercados, investimentos, servios, compras governamentais, soluo de controvrsias, agricultura, direitos de propriedade intelectual, subsdios, antidumping e medidas compensatrias e polticas de concorrncia.

    4. Trs comisses e grupos so destinados a tratar de questes relevantes relacionadas s negociaes: Grupo Consultivo sobre Economias Menores; Comit de Representantes Governamentais na Participao da Sociedade Civil; e Comit Conjunto de Especialistas Governamentais e do Setor Privado em Comrcio Eletrnico.

    5. Comisso Tripartite de Apoio Tcnico e Analtico. formada pelo Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), pela O rganizao dos Estados Americanos (OEA) e pela Comisso Econmica para a Amrica Latina e Caribe (Ccpal).

  • ALCA

    6. Apoio administrativo. garantido pelo pas anfitrio das reunies e financiado pela Comisso Tripartite.

    7. Foro das negociaes. Trs cidades tm sediado as negociaes: Miami - Estados Unidos, de maio de 1998 at fevereiro de 2001 ; Cidade do Panam - Panam, de maro de 2001 at fevereiro de 2003 ; e Cidade de Puebla - Mxico, de maro de 2003 at dezembro de 2004 .

    Em virtude da enorme diferena entre a estrutura produtiva dos Estados Unidos e a dos demais pases do continente, as negociaes para a criao da Alca foram cercadas de grande polmica. Os que eram partidrios da rea de livre-comrcio consideravam que ela criaria condies favorveis ao crescimento de todas as economias envolvidas, uma vez que cada uma dessas economias poderia dispor de imenso mercado consumidor para suas exportaes, inclusive o gigantesco mercado norte-americano. Os que eram contrrios sua criao consideravam que a Alca nada mais era seno um instrumento da poltica imperialista dos Estados Unidos, que garantiria ao pas o domnio econmico absoluto sobre o continente.

    No que diz respeito participao do Brasil, o processo negociador mudou de rumo com a chegada de Luiz Incio Lula da Silva presidncia da Repblica. Desde a a diplomacia brasileira passou a questionar o carter da Alca. Isso porque, embora sempre a Alca fosse apresentada objetivando criar rea de livre-comrcio, a negociao previa clusulas to ou mais importantes que o comrcio para a economia do pas, que praticamente nunca eram divulgadas em pblico. Para melhor defender o interesse brasileiro, a diplomacia do novo governo passou a argumentar que aquelas clusulas, como proteo aos investimentos, propriedade intelectual e s compras governamentais, interpretadas como importantes mecanismos de promoo do desenvolvimento, deveriam ser mais bem discutidas em ambiente diplomtico multilateral adequado, a O M C . Ao recusar a proposta apresentada pelos negociadores dos Estados Unidos, segundo a qual a Alca deveria estabelecer parmetros para os entendimentos dos demais pases na O M C , por entender que a diplomacia brasileira tem compromisso histrico com o multilateralismo e com os demais pases em desenvolvimento e que no pode ser vantajoso para os interesses brasileiros negociar bilateralmente temas contro

  • versos com pas com tantos mais recursos como os que dispem os Estados Unidos, o governo brasileiro praticamente sepultou a Alca.

    ALIANAS

    Alianas so acordos formais que os Estados celebram entre si para garantir sua segurana. A ameaa a esse estado de proteo, que pode ser real ou apenas presumida, constitui a razo principal de os Estados negociarem alianas. Elas so parte importante da dinmica do processo do sistema internacional. A situao de anarquia do sistema internacional faz com que os Estados busquem nas alianas garantias para que seus interesses nacionais sejam assegurados, tanto para proteger suas posies como para se lanar na conquista de novas posies. As alianas no precisam ter necessariamente carter militar, os Estados tambm recorrem a elas por motivos econmicos e razes ideolgicas.

    A poltica de alianas mantm relao direta com a estrutura do sistema internacional. Um sistema marcado por uma estrutura bipo- lar tem uma lgica de alianas diferente de um sistema de estrutura multipolar. Um sistema internacional homogneo tambm impe uma racionalidade de alianas distinta da racionalidade de um sistema heterogneo. Num sistema bipolar heterogneo, como o que se instalou no tempo da Guerra Fria, as alianas tendem a ser mais previsveis, com a ideologia exercendo papel determinante na escolha que os Estados fazem para se aliar. A ideologia por si s no garante, porm, a conservao das alianas. No obstante a convergncia ideolgica entre Tito e Stalin, em 1948 a Iugoslvia rompeu a aliana que mantinha com a Unio Sovitica (URSS) e com o bloco comunista e abriu caminho para a criao do Movimento dos No Alinhados. Por outro lado, quando se trata de um sistema internacional multipolar, as opes de aliana que se oferecem so sempre maiores. Nesses casos a ideologia at pode ser motivo de afastamento. A ideia de equilbrio de poder impe-se, ento, como critrio decisivo. Para que isso acontea basta que haja mais de um conflito importante no sistema internacional. A aliana que o cardeal Richelieu fez com os protestantes para se opor poltica universalista dos Habs- burgos na Europa, no sculo XVII, constitui exemplo clssico do

    | ALIANAS___________________________________________________________________________________________________________________________ 4

  • predomnio da razo de Estado sobre as razes ideolgicas. Bis- marck, no ltimo quarto do sculo X IX , por privilegiar o conflito que separava o Imprio Alemo da Frana, abriu mo de participar da corrida colonial e preferiu uma aliana monrquica conservadora com o Imprio Russo e com o Imprio Austro-Hngaro, sendo por isso bastante criticado pelos segmentos imperialistas alemes que no se importavam de correr riscos, desde que essa poltica arriscada resultasse em conquistas coloniais.

    As alianas tanto podem ser explcitas como secretas. Estas ltimas foram muito comuns na Europa at o incio do sculo X X . Ao fim da Primeira Guerra Mundial, o presidente dos Estados Unidos Woodrow Wilson defendeu a tese segundo a qual as alianas secretas haviam sido uma das principais razes da guerra, o que o levou a considerar que as alianas abertas eram uma das condies indispensveis para a futura paz internacional.

    A homogeneizao do sistema internacional ocorrida depois da Guerra Fria, em virtude da dissoluo do bloco comunista e do colapso da URSS, tornou as alianas econmicas preponderantes. Alm dos blocos econmicos regionais, os Estados fazem as alianas de geometria varivel, que so aquelas realizadas para levar a cabo negociaes em foros multilaterais. Nesses casos as alianas so estabelecidas com base em alguns interesses setoriais comuns e sem nenhum outro compromisso seno aquele para o qual os Estados se mobilizaram originalmente. A aliana entre Brasil, China e ndia na O M C para lutar contra o protecionismo agrcola dos Estados Unidos, do Japo e da Europa constitui um exemplo desse tipo de acordo. Trata-se de alianas apenas parciais, porque os pases que se alinham para determinada negociao podem, diante de outro tema internacional, colocar-se em campos opostos, mobilizando outros aliados.

    Apesar da preponderncia dos temas econmicos ainda existem alianas militares importantes. A Organizao do Tratado do Atlntico Norte (Otan) a mais importante delas. A Otan foi formada em 1949, logo depois da Crise de Berlim (1948-1949). Ela rene o Canad, os Estados Unidos e catorze Estados europeus. Uma vez que sua criao se deveu ao medo de uma possvel expanso sovitica, houve a expectativa de ela ser dissolvida aps a extino do Pacto de Varsvia. No entanto, a Otan, longe de se desagregar, foi reforada

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  • mediante o ingresso de novos Estados antes integrados aliana militar dirigida pela URSS. Alm disso, a Otan ampliou o alcance de sua competncia, passando a trabalhar pela preservao da paz, como ocorreu quando procurou assegurar o respeito aos acordos de paz na ex-Iugoslvia.

    ANARQUIA

    O conceito de anarquia significa, primeiro, uma condio social caracterizada pela ausncia de governo e lei. Supe a crena de que possvel a estruturao de uma ordem social sem a presena de autoridade central alguma capaz de impor ou sancionar normas sociais.

    O termo est associado doutrina poltica conhecida como anarquismo, surgida no sculo X IX por influncia de autores como Wil- liam Godwin, Michael Bakunin e Pierre-Joseph Proudhon, entre outros. A ideia de eliminao da autoridade central est baseada na premissa de que a cooperao voluntria deve substituir a mquina coercitiva do Estado, uma vez que o aparato estatal corrompe a natureza do indivduo e da coletividade. O princpio de libertao de tudo aquilo que considerado autoritrio no se limita to somente esfera poltica, mas abrange tambm toda e qualquer dimenso em que a opresso e a imposio coletiva estejam presentes, como as de ordem ideolgica, religiosa, econmica, social e jurdico-legal.

    O conceito de anarquia difere do de caos, situao marcada pela ausncia significativa ou absoluta de regras de qualquer tipo. Mas, apesar dessa distino formal, o fato que esses termos so comu- mente utilizados como sinnimos. Nesse caso, a ideia de anarquia tende a significar a quebra da ordem social.

    Em Relaes Internacionais anarquia adquire sentidos que expem essa tenso conceituai. Segundo a viso realista, as relaes entre Estados se do sem que nenhuma autoridade superior possa lhes mediar interesses e aes. Da termos um sistema internacional anrquico, segundo o qual as relaes de poltica internacional se aproximam de um contexto hobbesiano de possibilidade permanente de guerra de todos contra todos (estado de natureza na viso de Tho- mas Hobbes). Isso no implica necessariamente um contexto de caos

    | ANARQUIA__________________________________________________________________________________________________________________________ 6

  • permanente nas relaes entre Estados, apenas denota que o alcance da ordem internacional depende de levarmos em considerao a natureza anrquica imutvel dessas relaes.

    Para outros estudiosos, no entanto, essa uma viso simplista do contexto internacional, que tende a aproximar o conceito de anrquico da viso de caos social. Para Hedley Buli, por exemplo, o contexto internacional pode ser definido como uma sociedade anrquica. A despeito da ausncia de uma autoridade central de poder coercitivo, regras e normas internacionais existem na forma de balano de poder, de direito internacional e no papel exercido pelas grandes potncias e at mesmo pela prpria guerra. Outros vo ainda mais longe e argumentam sobre a possibilidade de transposio da caracterstica anrquica por intermdio da implementao de um governo mundial - a nica opo para a obteno de uma ordem internacional estvel e duradoura. Essa uma viso associada a autores como Abb de Saint-Pierre, Jeremy Bentham e, em particular, Immanuel Kant, entre outros.

    Assim, no mbito da teoria das Relaes Internacionais, o conceito de anarquia central para a definio da prpria natureza dessa rea de estudo. Enquanto os realistas defendem o argumento de que a anarquia define a estrutura das relaes entre os atores participantes do sistema internacional, vises mais liberais discutem os meios necessrios para a superao dessa natureza anrquica, possvel graas a iniciativas de socializao poltica internacional, como a criao de organismos e tratados internacionais. Entretanto, para muitos esse um debate que legitima uma viso de mundo fundamentada na primazia do poder poltico de excluso e marginalizao de atores internacionais menos privilegiados e em temas que lhes so prioritrios, como o desenvolvimento econmico e social. Defensores da Teoria Crtica e Construtivista contestam essa problemtica da anarquia e enfatizam a capacidade de criao e transformao de normas sociais como fator inerente s relaes internacionais.

    De qualquer forma, a influncia que o conceito de anarquia exerce no estudo e na prtica das relaes internacionais marcante. A ideia de anarquia internacional implica a existncia de uma ordem internacional frgil, sob constante ameaa de conflitos. Induz a uma situao poltica em que os atores internacionais se guiam de forma egostica, racional e levando em conta principalmente e em

    7__________________________________________________________________________________________________________________________ ANARQUIA |

  • | ARMAS DE DESTRUIO EM MASSA (ADM) 8

    primeiro lugar os interesses nacionais prprios. Pressupe o Estado como unidade poltica central e impe a distino absoluta entre o domstico e o internacional.

    ARMAS DE DESTRUIO EM MASSA (ADM)

    As armas de destruio em massa (ADM), ou weapons o f mass destruction, em ingls, distinguem-se das armas convencionais por dois aspectos fundamentais. Em primeiro lugar, as ADM possuem extremo poder letal, proporcionalmente aos demais tipos de armamento, quando considerados seu tamanho e custo de fabricao. Em segundo lugar, as ADM praticamente desconsideram a possibilidade de discriminao de alvos e vtimas. Ou seja, caracterizam-se pelo alto teor de danos colaterais. H trs tipos de ADM: armas nucleares, armas qumicas e armas biolgicas.

    As armas nucleares so consideradas as de maior poder destrutivo e podem resultar do processo de fisso ou de fuso. A bomba atmica e as bombas-A se originam do primeiro mtodo. As bombas termonucleares, de hidrognio e as bombas-H se originam do processo de fuso nuclear. Uma nica arma nuclear pode devastar uma cidade inteira, produzindo ainda calor e radiao capazes de se expandir por centenas ou mesmo milhares de quilmetros a partir do ponto de exploso. O desenvolvimento de armas nucleares requer vastos investimentos financeiros para a aquisio de recursos materiais e humanos, bem como para a implementao de centros de pesquisa e testes sigilosos o bastante para no serem detectados por satlites espies. A aquisio de matrias-primas essenciais para a produo desses armamentos, como urnio e plutnio, est sujeita s restries de um mercado internacional altamente sensvel e controlado.

    Por todas essas razes, a produo de armas nucleares ainda tende a ser dominada pelas grandes potncias e est sujeita fiscalizao da comunidade internacional. No entanto, o tamanho reduzido dos armamentos atmicos torna vivel o trfico internacional e o desenvolvimento de mtodos alternativos para sua utilizao. Alm do mais, a quebra da Unio Sovitica tem gerado especulaes quanto possibilidade de venda, furto ou contrabando de seu antigo arsenal nuclear para Estados prias ou mesmo para grupos terroristas.

  • Acidentes resultantes de um sistema deficiente de manuteno desse arsenal so tambm uma fonte de preocupao. A restrio do uso de material nuclear e da proliferao desse tipo de tecnologia regida pelo Tratado de No Proliferao Nuclear, de 1968.

    As armas qumicas se caracterizam pela manipulao de agentes qumicos altamente txicos, cuja finalidade incapacitar ou matar seres humanos. Em ambos os casos esses componentes agem sobre o sistema nervoso e respiratrio, na corrente sangunea e em outras funes do corpo humano. Sua absoro se d pelo contato com a pele ou pela respirao. O gs lacrimognio, por exemplo, apenas provoca irritao nos olhos, dificuldade de respirao e tosse. Seus efeitos so temporrios e no deixam seqelas. O napalm, por sua vez (uma espcie de sabo de alumnio em p ou composto similar utilizado para gelatinizar gasolina ou leo diesel, com vistas fabricao de bombas incendirias), provoca efeitos devastadores, como a cegueira, o diabetes, o cncer e a deformao de braos e pernas. A produo de armas qumicas relativamente barata e simples. No requer instalaes especficas nem mesmo conhecimento extremamente avanado. Alm do mais, sistemas alternativos para sua utilizao esto amplamente disponveis. Assim, no apenas pases menos desenvolvidos como grupos privados e at pessoas fsicas so usurios em potencial desse tipo de armamento. A utilizao de armamentos qumicos foi banida da comunidade internacional pelo Protocolo de Genebra de 1925. Mas sua posse e produo foi banida apenas com a Conveno de Armas Qumicas concluda em 1992.

    Armas biolgicas so similares s qumicas, com a diferena que as primeiras se utilizam de microrganismos ou toxinas biolgicas que podem produzir tanto doenas incapacitantes ou no letais como doena fatais, como a peste bubnica e o antrax. Os efeitos potenciais indesejveis das armas biolgicas limitam sua eficcia, uma vez que o uso pode deflagrar epidemias incontrolveis. Portanto, na prtica, apenas grupos terroristas radicais talvez tenham inteno real de considerar esse tipo de armamento. A Conveno de Armas Biolgicas de 1972 probe o desenvolvimento, a produo e a posse de armas biolgicas.

    O surgimento das ADM fez intensificar a preocupao mundial com o tema contemporneo da proliferao de armamentos. Segundo a ptica das grandes potncias, h trs fatores a serem considerados.

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  • Primeiro, as ADM oferecem alternativas de empregabilidade de tal forma que tornam parcialmente obsoletos os sistemas tradicionais de defesa militar. Segundo, a obteno de ADM por parte de pases que no fazem parte do rol das grandes potncias reduz as desigualdades em termos de poderio militar entre os membros do sistema internacional. Terceiro, esses so armamentos que dispensam, ao menos a princpio, o investimento na formao e na manuteno das Foras Armadas (Marinha, Aeronutica e Exrcito), disponveis apenas para os Estados sob a tutela de seus governantes. Grupos privados, como organizaes terroristas, e at mesmo indivduos, tornam-se candidatos potenciais para a obteno de ADM. Como conseqncia, advertem os defensores da no proliferao desse tipo de armamento, o sistema internacional tende a ser mais instvel, uma vez que pequenas potncias, em particular Estados considerados prias, e grupos terroristas adquirem maior poder internacional sem que suas aes impliquem em contrapartida algum termo de responsabilidade poltica, jurdica e moral perante a comunidade internacional.

    ATOR INTERNACIONAL

    Ator internacional toda entidade que desempenha alguma funo no sistema internacional e sobre o qual produz algum efeito. Quanto sua constituio, os atores podem ser pblicos ou privados e individuais ou coletivos.

    Faz parte da tradio das Relaes Internacionais associar a ideia de ator internacional de Estado. Essa tradio est ancorada em duas linhas de anlise das relaes internacionais. A primeira a da anlise poltica, realizada pelos realistas. Para os adeptos da Teoria Realista das Relaes Internacionais, ainda que possam existir outros atores no mbito do sistema internacional, o Estado o nico ator com capacidade para decidir sobre o que o Realismo considera fundamental: o binmio guerra e paz. A segunda linha considera a anlise jurdica. Para aqueles que reduzem as relaes internacionais sua dimenso jurdica, apenas o Estado ator internacional, porque o sujeito de direito par excellence.

    Em vista das grandes mudanas por que passaram as relaes internacionais no sculo X X , principalmente depois da Segunda

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  • Guerra Mundial, quando foram criadas diversas instituies internacionais, a maioria dos estudiosos comeou a admitir a existncia de vrios outros atores alm dos Estados. Tais atores podem ser corporaes multinacionais, grupos terroristas, organizaes intergover- namentais, organizaes no governamentais, igrejas, internacionais sindicais e internacionais partidrias. Segundo esses estudiosos pluralistas, a incluso desses atores na anlise das relaes internacionais absolutamente indispensvel, uma vez que so peas fundamentais da dimenso transnacional dessas relaes. Para eles, a excluso desses atores eqivale a voltar as costas para os aspectos cooperativos das relaes internacionais, privilegiando exclusivamente os aspectos conflituosos.

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  • BALANA DE PODERVer Equilbrio dc poder.

    BRETTON WOODS

    A Conferncia Econmica de Bretton Woods, ao lado das conferncias polticas de Teer (1943), Yalta (1945) e Potsdam (1945), foi uma das mais importantes havidas durante a Segunda Guerra Mundial. Realizada entre 1 e 22 de julho de 1944 , num hotel da pequena cidade norte-americana de Bretton Woods, em New Hampshire, a conferncia reuniu representantes de 44 pases, inclusive da antiga Unio Sovitica, com a finalidade de criar as instituies que formariam os pilares da nova ordem econmica internacional do ps-guerra e estabelecer seus princpios.

    Os Estados Unidos eram um dos pases mais interessados no xito da conferncia. Para o governo de Franklin Roosevelt era absolutamente necessrio que ao trmino da guerra a nova arquitetura econmico-financeira internacional estivesse concluda. Essa arquitetura constitua condio fundamental para a insero do Estado norte-americano no novo sistema internacional.

    A Segunda Guerra Mundial ensejou a formao de novo consenso entre as elites norte-americanas; o isolacionismo que prevalecera at ento cedeu lugar a uma tendncia universalista. Uma vez iniciado o conflito, as elites norte-americanas convenceram-se da convenincia de uma diplomacia de escala global, orientada para a defesa dos interesses do Estado em todas as dimenses das relaes interna

  • cionais e em todas as partes do planeta. Pareceu-lhes evidente que a deciso da maioria republicana no Congresso de rejeitar a poltica de instaurao e manuteno de uma ordem econmica internacional liberal, proposta por Woodrow Wilson em Versalhes ao fim da Primeira Guerra Mundial, e a permanncia da poltica de poder nas relaes internacionais haviam sido determinantes para o desencadea- mento da Segunda Guerra Mundial.

    A viso norte-americana a respeito de como deveria funcionar a economia internacional no ps-guerra j estava delineada antes mesmo de o pas participar do conflito como beligerante. A Carta do Atlntico, assinada por Franklin Roosevelt e Winston Churchill em agosto de 1941 , que reafirmava o compromisso com o livre-comr- cio e com a autodeterminao dos povos, j demonstrava essa estratgia poltica dos Estados Unidos de impor aos aliados sua concepo acerca do sistema internacional. Com efeito, na Conferncia de Bretton Woods a proposta norte-americana sobre a nova ordem econmica internacional encontrava-se plenamente definida. E, em virtude do desproporcional poder econmico do pas, os delegados norte-americanos no encontraram dificuldades para fazer valer suas ideias sobre as dos demais.

    A nica delegao que se apresentou munida de ideias a respeito da nova economia internacional foi a da Gr-Bretanha, que era chefiada pelo grande terico Maynard Keynes. Para os norte-americanos, o plano apresentado por Keynes era excessivamente intervencionista e privilegiava demasiadamente as economias internas em detrimento da economia internacional. Esse plano consistia basicamente na criao de um Banco Central Internacional (International Clearing Union) e de uma nova moeda, a bancor. O banco deveria funcionar como uma cmara de compensao, para evitar tanto os dficits como os super- vits persistentes. As reservas de todos os pases seriam convertidas em bancor, e os saldos seriam transferidos para os deficitrios, de modo a financiar-lhes as importaes sob a forma de emprstimo. Alm de intervencionista, o plano apresentado pelos britnicos foi interpretado como tolerante para com o protecionismo comercial, visto que Keynes no acreditava em comrcio livre e vislumbrava para o comrcio internacional um futuro dominado pelos cartis internacionais.

    A chefia da delegao norte-americana foi exercida pelo secretrio do Tesouro Henry Morgenthau Jr., que apresentou o plano pre

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  • parado por seu secretrio assistente, Harry Dexter White. No mbito da teoria, o Plano White, como ficou conhecido, procurava um ponto de equilbrio entre o laissez-faire e o intervencionismo do Estado na economia. O objetivo era administrar o liberalismo. Para os tcnicos norte-americanos, o colapso dos anos 1930 havia sido provocado pela associao do capitalismo nacional com o livre-comr- cio. Para impedir que essa situao se repetisse, o Plano White tentou combinar mercado livre com determinadas regras que deveriam ser respeitadas por todos os governos.

    Na prtica, o resultado das negociaes de Bretton Woods foi a criao de duas instituies econmico-financeiras internacionais: o Fundo Monetrio Internacional (FMI) e o Banco Internacional de Reconstruo e Desenvolvimento (Bird), mais conhecido como Banco Mundial. Alm disso, foi tambm estabelecido o padro-ouro, mecanismo segundo o qual os Estados Unidos assumiam o compromisso de trocar dlares por ouro na proporo de US$ 35 por ona. Por meio dessas decises, os norte-americanos pretendiam obter estabilidade dos preos, possibilidade de interveno internacional nos mercados internos e comrcio internacional livre de barreiras tarifrias.

    O sistema de Bretton Woods funcionou a contento at o fim dos anos 1950. No incio dos anos 1970, o sistema dava sinais evidentes de desgaste. A perda de poder relativo dos Estados Unidos, em grande medida devida Guerra do Vietn, associada ao maior grau de interdependncia das economias nacionais comprometia o funcionamento do sistema. Para cobrir seus gastos, os Estados Unidos passaram a emitir moeda excessivamente, numa escala que levou ao fim da correspondncia entre dlar e ouro. Desse excesso de dlares sem lastro resultou uma inflao que, em virtude dos mecanismos de intercmbio de mercadorias e fluxo de capitais, foi se espalhando pelas demais economias e convertendo-se em inflao internacional, o que, em ltima anlise, levava a moeda norte-americana ao descrdito como moeda internacional.

    Para resolver as dificuldades econmicas internas e impedir que a converso macia de dlar em ouro provocasse um violento colapso financeiro, o governo de Richard Nixon optou pela denncia do sistema de Bretton Woods. Em 15 de agosto de 1971 , o presidente dos Estados Unidos anunciou a suspenso da conversibilidade do dlar em ouro e algumas outras importantes medidas financeiras. A

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  • partir de ento passou a vigorar o sistema de cmbio flutuante, mediante o qual o valor das moedas passava a ser determinado pelas leis do mercado.

    A crise que determinou o fim do padro-ouro, tal como havia sido fixado em Bretton Woods, no afetou, no entanto, o Fundo M o netrio Internacional nem o Banco Mundial, que sobreviveram a ela e continuam a desempenhar papel importante na evoluo da economia internacional. As crticas dirigidas a essas instituies so justificadas por uma linha de conduta que se caracteriza pela indiferena para com as dificuldades sociais dos pases pobres. Porm, essas instituies no apenas no do sinais de enfraquecimento como tambm se tm firmado como importantes engrenagens do processo de globalizao.

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  • COMISSO ECONMICA PARA A AMRICA LATINA E O CARIBE (CEPAL)

    A Comisso Econmica para a Amrica Latina e o Caribe (Cepal) uma das cinco comisses regionais do Conselho Econmico e Social da Organizao das Naes Unidas. Criada em fevereiro de 1948, a comisso teve como objetivo primeiro o exame da economia da Amrica Latina para explicar as razes de seu atraso diante das economias industrializadas e para recomendar as medidas necessrias para a superao dessa desigualdade. Em julho de 1984 , o conselho decidiu estender seu raio de ao para a regio do Caribe e incorporar s atribuies da Cepal a promoo do desenvolvimento social de todos os pases que compem a macrorregio. Desde a sua criao, a Cepal permanece sediada em Santiago, no Chile.

    Esse organismo tem desempenhado importante papel no processo de desenvolvimento da Amrica Latina. Alm de fornecer dados estatsticos sobre as economias em questo, a Cepal vem ajudando a formar uma bagagem terica da maior relevncia para o conhecimento histrico e econmico da regio. Assim, qualificou tcnicos para exercer tarefas de apoio junto a governos e instituies e tem servido como centro de discusso poltica.

    A elaborao de um quadro terico que toma como ponto de partida as peculiaridades histricas da regio constituiu, sem dvida, a mais importante das contribuies da Cepal, uma vez que tal foco resultou numa original teoria do desenvolvimento capitalista para as regies perifricas. Essa escola de pensamento econmico foi construda mediante a ao intelectual de personalidades como o argentino Ral Prebisch, o primeiro secretrio executivo da organizao,

  • e estudiosos brasileiros como Celso Furtado, Maria da Conceio Tavares, Fernando Henrique Cardoso, Jos Serra, Carlos Lessa, Antnio Barros de Castro e outros mais.

    Raiil Prebisch foi quem estabeleceu o marco terico da Cepal. Sua reflexo parte da crtica s teses defendidas pela teoria clssica e neoclssica do comrcio internacional, segundo a qual o desenvolvimento se realiza em etapas lineares, com as economias passando de atrasadas para avanadas medida que certas condies vo sendo cumpridas; e a economia mundial formada por economias nacionais diversificadas que concorrem entre si em igualdade de condies. Em sua crtica, Prebisch identifica uma fratura estrutural na economia mundial. Essa fratura, gerada pela lenta propagao do progresso tcnico e perpetuada pela diviso internacional do trabalho, divide a economia mundial em dois grupos de economias nacionais, as desenvolvidas do centro e as subdesenvolvidas da periferia.

    De acordo com a lei das vantagens comparativas da teoria clssica, o livre-comrcio entre as economias especializadas em produtos primrios e aquelas em produtos manufaturados garantiria benefcios para todas, uma vez que ocorreria a transferncia de ganhos de produtividade de umas para as outras. A especializao das economias, em lugar da diversificao e da busca da industrializao por parte daquelas que se baseiam em produtos primrios, constituiria a poltica econmica mais adequada para alcanar o crescimento econmico.

    Na concepo histrico-estrutural do pensamento econmico ce- palino, a lei das vantagens comparativas nada mais que a frmula que alimenta a relao desenvolvimento-subdesenvolvimento. Uma vez que o centro desenvolvido detm a capacidade de promover o progresso tcnico, com o passar do tempo a diferena que separa centro de periferia s ser acentuada. Por outras palavras, na concepo dos intelectuais da Cepal, essa a verdadeira frmula pela qual as economias ricas enriquecem e as economias pobres empobrecem.

    Para os pases subdesenvolvidos saltarem essa fratura estrutural, consubstanciada no jogo viciado do comrcio internacional, os intelectuais da Cepal formularam algumas recomendaes, que foram adaptadas s diferentes conjunturas que se sucederam ao longo do tempo. Segundo a teoria econmica de carter nacionalista, proposta por eles, convm ao Estado ter maior participao na vida econmica, seja como investidor direto no setor de infraestrutura, seja co

    J 7 _________________________________________ COMISSO ECONMICA PARA A AMRICA LATINA E O CARIBE (CEPAL) |

  • mo planejador de polticas econmicas especficas, seja como operador da poltica cambial. No plano externo, os tericos cepalinos recomendaram a integrao dos mercados, com o intuito de favorecer a produo em escala. De modo geral, as propostas da Cepal torna- ram-se conhecidas como industrializao baseada na substituio de importaes .

    Os tericos da Cepal, ao elaborar a histria da instituio, identificam cinco etapas em sua obra:

    1. origens e anos 1950: industrializao por substituio de importaes.

    2. anos 1960: reformas para desobstruir a industrializao.3. anos 1970: reorientao dos estilos de desenvolvimento na di

    reo da homogeneizao social e na direo da industrializao proexportadora.

    4. anos 1980: superao do problema do endividamento externo mediante crescimento.

    5. anos 1990: transformao produtiva com equidade.

    Depois de se destacar pelo importante papel terico-poltico entre os pases latino-americanos e no Terceiro Mundo em geral, por meio da ao da Conferncia das Naes Unidas sobre Comrcio e Desenvolvimento (Unctad), a Cepal passou para a obscuridade nos anos 1990. Aps a derrubada do Muro de Berlim, verificou-se o momentneo triunfo das teses econmicas liberais. Nos anos que se seguiram, ganhou fora entre intelectuais e burocratas a ideia de que a interveno do Estado na economia e o desenvolvimentismo base da substituio de importaes eram prticas inteiramente ultrapassadas, e que a Cepal, portanto, havia perdido o sentido.

    COMUNIDADE DOS PASES DE LNGUA PORTUGUESA (CPLP)

    A CPLP foi criada em 17 de julho de 1996 e est sediada na cidade de Lisboa, em Portugal. Integram essa organizao internacional os pases que tm o portugus como lngua oficial. So eles: Angola, Brasil, Cabo Verde, Guin-Bissau, Moambique, Portugal, So Tom e Prncipe e Timor Leste.

    COMUNIDADE DOS PASES DE LNGUA PORTUGUESA (CPLP) 18

  • A CPLP formada pela Conferncia de Chefes de Estado e de Governo, pelo Conselho de Ministros, pelo Comit de Concertao Permanente e pelo Secretariado Executivo.

    A Conferncia de Chefes de Estado e de Governo composta de chefes de Estado e de governo dos pases-membros; elege um presidente entre seus membros - geralmente o presidente do pas anfitrio - para um mandato de dois anos; rene-se ordinariamente a cada dois anos ou extraordinariamente de acordo com a convocao de dois teros dos membros. Compete Conferncia de Chefes de Estado e de Governo definir e orientar a poltica geral e as estratgias da CPLP; adotar instrumentos jurdicos necessrios para a implementao de estatutos, podendo, no entanto, delegar esses poderes ao Conselho de Ministros; criar instituies necessrias ao bom funcionamento da CPLP; e eleger o secretrio executivo e o secretrio executivo adjunto da CPLP.

    O Conselho de Ministros formado pelos ministros das Relaes Exteriores e dos Negcios Estrangeiros dos pases-membros; elege entre os seus membros um presidente - geralmente o ministro do pas anfitrio - para um mandato de um ano; promove reunies ordinrias anuais e extraordinrias convocadas por dois teros dos membros; e responde perante a Conferncia, qual deve apresentar relatrios. Ao Conselho de Ministros compete coordenar as atividades da CPLP; supervisionar seu funcionamento e desenvolvimento; definir e implementar polticas e programas de ao da CPLP; aprovar o oramento da CPLP; formular recomendaes Conferncia em assuntos de poltica geral, bem como no que diz respeito ao funcionamento e desenvolvimento eficiente e harmonioso da CPLP; recomendar Conferncia os candidatos para os cargos de secretrio executivo e secretrio executivo adjunto; convocar conferncias e outras reunies tendo em vista a promoo dos objetivos e programas da CPLP; e realizar outras tarefas que lhe forem atribudas pela Conferncia.

    O Comit de Concertao Permanente integrado por um representante de cada pas, geralmente os embaixadores em Lisboa, e o encarregado da CPLP no Ministrio dos Negcios Estrangeiros em Portugal; seu coordenador o representante do pas detentor da presidncia do Conselho; rene-se mensalmente, em Lisboa, ou com maior frequncia se houver convocao extraordinria de seu coor

    j 9 ______________________________________________________ COMUNIDADE DOS PASES DE LNGUA PORTUGUESA (CPLP ) |

  • denador. O Comit de Concertao Permanente deve acompanhar o cumprimento, pelo Secretariado Executivo, das decises e recomendaes da Conferncia de Chefes de Estado e de Governo e do Conselho de Ministros.

    O secretrio executivo e o secretrio executivo adjunto exercem mandato de dois anos, renovveis por mais dois, e devem ser de pases diferentes. Ao Secretariado Executivo cabe implementar as decises e resolues da Conferncia, do Conselho de Ministros e do C omit de Concertao Permanente; planejar e assegurar a execuo dos programas da CPLP; participar da organizao das reunies dos vrios rgos da CPLP; e responder pelas finanas e pela administrao geral da CPLP.

    A ideia de institucionalizar a reunio dos pases de fala portuguesa antiga. No sculo X X , mais precisamente em 1953, Brasil e Portugal assinaram o Tratado de Amizade e Consulta com esse propsito. O fato de os pases africanos e asiticos de lngua portuguesa estarem, quela altura, sob a condio de colnia de Portugal impedia, no entanto, a formao de uma verdadeira comunidade integrada, uma vez que o interesse portugus era usar o Tratado de Amizade e Consulta para perpetuar o domnio sobre aqueles povos.

    Com o fim do sistema colonial portugus, em 1975, as condies mudaram favoravelmente. Aps um perodo de ajustes econmicos, polticos e ideolgicos tanto em Portugal como em suas ex-colnias, decorrentes da integrao de Portugal Unio Europia e da luta pela consolidao da independncia nos pases africanos, o plano de institucionalizao de uma comunidade foi retomado. O passo inicial foi dado com a realizao do primeiro encontro dos Chefes de Estado e de Governo do Brasil, de Portugal e dos pases africanos, em novembro de 1989 , em So Lus, no Maranho. Na oportunidade, criou-se o Instituto Internacional de Lngua Portuguesa, e o ento presidente do Brasil, Jos Sarney (1 9 8 5 -1 9 8 9 ) , anunciou o compromisso assumido pelos sete pases de criar a CPLP.

    Na presidncia de Itamar Franco (1 9 9 2 -1 9 9 4 ) , um interregno de poltica externa nacionalista entre os governos de Fernando Collor de Mello e Fernando Henrique Cardoso, so retomadas as negociaes para a formao da CPLP. Por meio da persistente ao diplomtica do embaixador Jos Aparecido de Oliveira, ex-secretrio do presidente Jnio Quadros e entusiasta defensor dos princpios que

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  • orientaram a poltica externa independente nos anos 1960 , e do empenho do presidente de Portugal Mrio Soares, a Comunidade praticamente construda. No entanto, em virtude da dificuldade em agendar uma data comum a todos os chefes de Estado, a CPLP acabou sendo oficialmente criada no governo de Fernando Henrique Cardoso, em julho de 1996.

    Para os nacionalistas brasileiros, a ideia de instituir a CPLP sempre foi muito bem-vista. Na ptica desses representantes da poltica brasileira, a articulao do Brasil com os pases africanos de lngua portuguesa e com Portugal deve ser considerada parte fundamental de nossa poltica externa, porque favorece a segurana nacional no Atlntico Sul, ao mesmo tempo que permite ao pas apresentar-se no meio internacional como um defensor de interesses coletivos, o que, entre outras coisas, o legitima a postular assento permanente no Conselho de Segurana da ONU. Por outro lado, o processo de criao sempre foi emperrado em virtude da posio dos nacionalistas portugueses de fazer com que Portugal ocupe a liderana da Comunidade, sob a alegao de ser a matriz cultural de todos os Estados-mem- bros. Os governantes portugueses sentem-se vontade para reclamar essa posio pela incansvel poltica cultural de difuso da lngua portuguesa que promovem em todo o mundo.

    Para os liberais do Brasil e de Portugal a CPLP tem pouco valor. Uma vez que para eles poltica externa praticamente sinnimo de comrcio internacional e fluxos de investimentos de capital, a baixa densidade dos negcios com os pases africanos deve corresponder a uma baixa prioridade no relacionamento diplomtico. Segundo essa viso das relaes internacionais, as permanentes crises polticas em que vivem engolfados os pases africanos, bem como a incapacidade de se organizarem com fins produtivos, inviabilizam relaes mais intensas. A lngua comum, as demais identificaes culturais e as consideraes sobre segurana so, nessa mesma tica, mero exerccio retrico.

    Desde que se iniciou o governo de Luiz Incio Lula da Silva, a diplomacia brasileira voltou a atribuir importncia s relaes com os pases do continente africano, especialmente com aqueles que integram a CPLP. Alm de procurar intensificar as relaes econ- mico-comerciais, o governo brasileiro regulamentou o Acordo O rtogrfico, em 2 0 0 8 , operando mudanas na ortografia a partir de janeiro de 2009 . A deciso do governo brasileiro resultou na unifi-

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  • COMUNISMO 22

    cao da grafia do idioma, o que significa uma ao poltica que proporciona mais fora e projeo lngua portuguesa no mundo.

    COMUNISMO

    O comunismo comeou a se esboar como ideologia poltica com a publicao de O Manifesto do Partido Comunista, de Karl M arx e Friedrich Engels, em 1848. No livro, M arx e Engels procuraram traar uma linha demarcatria separando comunismo de socialismo. Para ambos, o comunismo era a posio da parcela mais avanada e mais decidida dos partidos operrios de cada pas da Europa. Esse carter radical dos partidos operrios devia-se sua disposio de suprimir a propriedade burguesa dos meios de produo e, por conseqncia, de eliminar, de uma vez por todas, a explorao de uma classe social por outra. O comunismo distinguia-se do socialismo, no sentido atribudo pelos dois autores, porque o primeiro devia resultar da luta de classes que rege o movimento histrico, enquanto o segundo nada mais seria que o resultado de ideias e princpios inventados ou descobertos por visionrios que alimentavam a pretenso de reformar o mundo.

    Apesar dessa tentativa dos pais do marxismo de distinguir com clareza as duas ideologias polticas, ao longo do sculo X IX e no incio do sculo X X a confuso entre comunismo e socialismo e, tambm, entre essas duas ideologias e os conceitos de coletivismo e social-democracia continuou a existir. Somente com o advento da Revoluo Russa, em outubro de 1917, que a ideologia comunista passou a destacar-se com toda nitidez. A revoluo bolchevique e a fundao da Terceira Internacional (Internacional Comunista ou Kominter), em maro de 1919, serviram como divisor de guas. As lideranas e os movimentos polticos de esquerda, antes integrados Segunda Internacional (1889-1914), dividiram-se em funo da aprovao ou reprovao das decises tomadas por Lenin e pelos demais revolucionrios russos. Os que consideraram que os bolcheviques, para obter xito em seu intento revolucionrio, estavam violando gravemente os princpios democrticos que deviam pautar a conduta poltica dos social-democratas logo passaram da crtica condenao. Os que entenderam, por outro lado, que as eventuais prticas

  • autoritrias atribudas aos bolcheviques constituam inevitveis acidentes de percurso no tortuoso processo revolucionrio afiliaram-se Terceira Internacional (1919-1943), aceitando o Partido Comunista da Unio Sovitica (URSS) como modelo, e passaram a se organizar politicamente como partidos comunistas. Dessa maneira, portanto, o socialismo comeou a se distanciar do marxismo, enquanto o comunismo passou a firmar-se como marxismo-leninismo.

    Apesar de a Revoluo Russa no ter sido seguida de outras revolues socialistas nos pases capitalistas desenvolvidos da Europa, como era ansiosamente esperado pelos lderes bolcheviques, a Rssia suportou a presso exercida pelas potncias vencedoras na Primeira Guerra Mundial, que tentaram sufocar o recm-criado Estado Sovitico mediante a formao do Cordo Sanitrio, e se tornou uma fora internacional muito importante. Pelo fato de alimentar uma hostilidade aberta contra o sistema capitalista e comandar uma rede mundial de partidos comunistas, a Unio Sovitica projetou-se como uma poderosa fora antissistmica nos anos 1930. Em virtude da perda de credibilidade que o liberalismo sofreu nesses anos em decorrncia da Grande Depresso iniciada em 1929, o comunismo sovitico passou a ameaar seriamente o mundo capitalista rivalizando com a ideologia poltica nazi-fascista.

    A fora poltica internacional do comunismo foi, todavia, temporariamente neutralizada entre agosto de 1939 e junho de 1941 , em razo do Pacto Molotov-Ribbentrop, em que Stalin e Hitler fizeram um acordo de no agresso, por meio de um protocolo secreto que previa a diviso da Polnia entre a Alemanha e a URSS. A partir do momento em que a Alemanha invadiu o territrio sovitico em 1941 , inserindo a URSS na Segunda Guerra Mundial, o comunismo voltou a apresentar-se como fora poltica internacional. No apenas pelo desempenho militar sovitico, que surpreendeu contendo o avano alemo e derrotando sua mquina de guerra, mas tambm pelo fato de os partidos comunistas terem funcionado como polos iman- tados ao redor dos quais se aglutinaram as demais foras polticas que resistiram ocupao nazista na Europa.

    No fim da Segunda Guerra Mundial, a fora do comunismo havia aumentado substancialmente. A vitria militar sobre a Alemanha e a conseqente ocupao fsica da regio leste da Europa pelo Exrcito Vermelho, alm do prestgio alcanado pelos partidos comunis

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  • COMUNISMO 24

    tas que comandaram o movimento de resistncia ao invasor alemo, levaram a mudanas polticas internacionais significativas. A partir de ento, a URSS passou a exercer incontestvel liderana sobre o bloco comunista formado pelas democracias populares - Albnia, Alemanha Oriental, Bulgria, Checoslovquia, Hungria, Polnia, R o mnia e Iugoslvia. Essa liderana foi ainda mais reforada com a formao do Centro de Informao dos Partidos Comunistas (Ko- minform, 1 9 4 7 -1 9 5 6 ) e do Conselho de Assistncia Econmica M tua (Caem, 1 9 4 9 -1 9 9 1 ) , conhecido como Comecom, com a conquista da arma atmica (1949) e com a criao do Pacto de Varsvia (1 9 5 5 -1 9 9 1 ) , acontecimentos que deram mais consistncia econmica e militar ao bloco comunista.

    O fim da guerra civil chinesa, no ano de 1949 , com a vitria do Partido Comunista Chins sobre as foras militares do Guomindang, que contavam com o ostensivo apoio dos Estados Unidos, representou uma grande demonstrao de fora da ideologia poltica comunista. A expressiva vitria comunista na sia, que compreendia tambm a Coreia do Norte e, logo a seguir, o Vietn, constitua uma prova da vitalidade dessa ideologia, que tambm mobilizava foras polticas na Amrica Latina e outras que lutavam pela descolonizao na frica.

    O xito obtido pela guerrilha rural do Partido Comunista Chins, comandado por Mao Zedong, representou uma inflexo importante na ideologia poltica comunista. At ento, ela era considerada a ideologia do movimento operrio. Apenas em pases capitalistas desenvolvidos, que contavam com uma classe operria numericamente expressiva, a revoluo comunista era considerada vivel. Em tais pases estariam reunidas as condies objetivas e subjetivas para a realizao da revoluo. As condies objetivas diziam respeito capacidade material de construir a sociedade comunista, baseada numa slida estrutura produtiva. As condies subjetivas referiam-se ao grau de conscientizao poltica e capacidade de mobilizao do operariado industrial. Diante dessa concepo marxista ortodoxa, a revoluo chinesa apontava para um novo rumo. Tendo em vista a insuficincia do desenvolvimento industrial daquele pas e o carter semicolonial de sua economia, os revolucionrios chineses mostravam que a revoluo comunista era, apesar disso, factvel. Para os comunistas chineses, a conscientizao poltica e a vontade de trans

  • formar a sociedade eram, portanto, os fatores mais importantes. Essa era uma tese de largo alcance poltico, uma vez que demonstrava ser possvel a realizao de revolues comunistas no Terceiro Mundo, desde que houvesse as indispensveis condies subjetivas.

    A coeso do mundo comunista sob a liderana da URSS, que fora um trao marcante da poltica internacional do ps-guerra, comeou a se romper em 1956. Nesse ano, por ocasio do X X Congresso do Partido Comunista da Unio Sovitica, o secretrio-geral do partido Nikita Kroutchev procedeu leitura de seu relatrio secreto, que continha srias acusaes a Stalin, morto em 5 de maro de 1953. O lder revolucionrio foi ento apresentado como um ditador desapiedado, que, alm de cometer diversos crimes, promoveu o culto da personalidade e desvirtuou o comunismo sovitico. Kroutchev, por conseqncia, anunciava a disposio de desestalinizar o mundo sovitico e de inaugurar uma nova etapa de coexistncia pacfica com o Ocidente.

    Ao admitir para o mundo comunista que Stalin havia cometido crimes e desvirtuado o comunismo sovitico, Kroutchev provocou enorme alvoroo e conduziu o bloco comunista irreversvel fragmentao. Isso porque, de um lado, estimulou os anti-stalinistas a acelerar a liberalizao de seus respectivos regimes (Alemanha Oriental, Polnia e Hungria, em 1956) e, de outro lado, fez crescer por parte daqueles que consideravam a crtica dirigida a Stalin infundada ou politicamente inadequada a resistncia em relao liderana dos soviticos. No caso da Hungria, os soviticos viram-se forados a intervir militarmente para no perder sua autoridade na Europa Oriental. No caso da China, as relaes com os soviticos desgastaram-se de tal modo que resultaram em rompimento em 1963.

    A perda de legitimidade da liderana sovitica, aprofundada pela ocupao militar da Checoslovquia com as tropas do Pacto de Varsvia em 1968 (Primavera de Praga), pulverizou o mundo comunista em orientaes terico-ideolgicas das mais distintas. Dentre as que passaram a desafiar a orientao sovitica, a chinesa foi a mais importante. A Revoluo Cultural, em 1966 , que devia levar superao de todas as limitaes do regime e produzir o novo homem comunista, constituiu-se na mais radical dessas novas orientaes para a ao revolucionria, de modo que o confronto entre a influncia sovitica e a chinesa tornou-se o aspecto central do debate no mundo

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  • comunista, dando lugar, inclusive, a choques armados entre os grupos polticos, como aconteceu no Vietn e no Camboja.

    Em meados dos anos 1970 era possvel constatar que a ideologia poltica comunista, no obstante as dissenses que a assaltavam, fora alada condio de fora poltica de grande envergadura. Em contradio com as ideias que lhe deram forma, no entanto, o comunismo s conseguiu impor-se nas sociedades perifricas da sia e da frica e, no caso da Amrica Latina, apenas em Cuba. Alm disso, em virtude das precrias condies econmicas de alguns desses pases, os regimes comunistas dependiam em grande medida da ajuda econmica sovitica. No houve, portanto, revoluo comunista em pases capitalistas desenvolvidos. Na Europa Ocidental, depois da Segunda Guerra, os partidos comunistas foram perdendo prestgio e s recuperaram parte dele quando se afastaram da orientao sovitica e se aproximaram dos partidos socialistas, outrora considerados adversrios polticos.

    Na dcada seguinte teve incio o ocaso do comunismo. A grave crise econmica por que passava a Unio Sovitica tornou-se explcita aps a morte do lder Leonid Brejnev. Os conhecedores do Estado sovitico j identificavam havia muito tempo os sinais de crise. O impasse poltico provocado pelo Sindicato Solidariedade na Polnia, em 198 1, constituiu prova inequvoca do debilitamento sovitico. As sucessivas substituies na chefia do Estado sovitico, decorrentes da morte de dois de seus idosos lderes, Yuri Andropov e Konstantin Chernenko, e da chegada ao poder de Mikhail Gorbatchev, em 1985, revelavam a gravidade da crise em toda a sua extenso.

    To logo se estabeleceu no poder, Gorbatchev anunciou medidas para reverter tal quadro. Em primeiro lugar, props a reestruturao do regime (perestroika) e, depois, a transparncia do processo de reestruturao (glasnost). Seu objetivo consistia em desburocratizar a mquina estatal, recuperar a capacidade produtiva interna, desonerar o Estado mediante a drstica reduo de ajuda econmica e militar aos pases do mundo comunista e negociar com os Estados Unidos o fim da corrida armamentista. O processo, no entanto, no foi bem-sucedido. Gorbatchev no conseguiu contar com o apoio necessrio para efetuar a transio do regime, diferentemente do que aconteceu na China, onde a transio da economia centralizadora- mente planificada para a economia mista foi operada de forma exi-

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  • tosa pelo Partido Comunista Chins. Em meio transio, Gorbatchev perdeu o apoio dos regimes comunistas da Europa Oriental, das repblicas soviticas e tambm de grupos polticos do prprio Partido Comunista da Unio Sovitica. Derrotado politicamente dentro e fora da Unio Sovitica, Gorbatchev desempenhou o papel histrico de ter conduzido o regime ao seu final.

    CONFERNCIA AFRO-ASITICA DE BANDUNG

    A Conferncia Afro-Asitica de Bandung foi um acontecimento marcante na histria das relaes internacionais contemporneas. Inaugurada em 18 de abril de 1955 em Bandung, cidade indonsia situada na ilha de Java, e encerrada no dia 24 do mesmo ms, a conferncia representou a primeira participao significativa do Terceiro Mundo nas relaes internacionais.

    O evento reuniu apenas pases dos continentes africano e asitico. Dele no participaram representantes da Europa, dos Estados Unidos nem da Amrica Latina, por no terem sido convidados. Vinte e nove pases estiveram presentes em Bandung: Afeganisto, Arbia Saudita, Camboja, China, Gana (Costa do Ouro), Egito, Etipia, Filipinas, Imen, ndia, Iraque, Ir, Indonsia, Japo, Jordnia, Laos, Lbano, Libria, Lbia, Mali, Mianmar (Birmnia), Nepal, Paquisto, Sria, Sri Lanka (Ceilo), Tailndia (Sio), Turquia, Vietn do Norte e Vietn do Sul. No foram convidadas as duas Corias, Israel, Taiwan, Monglia, repblicas soviticas da sia nem a frica do Sul. Dos pases convocados, apenas a Repblica Centro-Africana se recusou a comparecer.

    A Conferncia de Bandung foi antecedida pelas conferncias de Colombo, Sino-Indiana e de Bogor, realizadas no ano de 1954. Nas duas primeiras, discutiram-se frmulas para pr fim aos conflitos regionais na sia. No encontro de Bogor, o foco foi a convocao de uma conferncia mais ampla para o ano seguinte, com a finalidade de examinar os problemas comuns a todas as naes africanas e asiticas que haviam conquistado recentemente a independncia poltica de suas metrpoles europeias. Esses problemas eram basicamente a defesa da soberania nacional, o racismo, o colonialismo e o desenvolvimento econmico-social.

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  • Em que pesem as diferenas e rivalidades que separavam os pases representados em Bandung, a conferncia resultou em xito diplomtico. O Comunicado Final, formado pelos dez princpios da coexistncia pacfica, retratava a laboriosa ao diplomtica empreendida e exprimia as principais aspiraes desses povos:

    1. Respeito aos direitos humanos fundamentais, em conformidade com os objetivos e os princpios da Carta das Naes Unidas.

    2. Respeito soberania e integridade territorial de todas as naes.3. Reconhecimento da igualdade de todas as raas e da igualdade

    de todas as naes, pequenas e grandes.4. No interveno e no ingerncia nas questes internas dos ou

    tros pases.5. Respeito ao direito de cada nao de se defender individualmen

    te e coletivamente, conforme a Carta das Naes Unidas.6. Recusa em recorrer a medidas de defesa coletiva destinadas a ser

    vir os interesses particulares das grandes potncias, quaisquer que sejam elas, e recusa ao de uma potncia, qualquer que seja ela, de exercer presso sobre os outros.

    7. Absteno de atos ou de ameaas de agresso ou de emprego de fora contra a integridade territorial ou contra a independncia poltica de um pas.

    8. Equacionamento de todos os conflitos internacionais por meios pacficos, tais como a negociao, a arbitragem e a regulao diante dos tribunais, entre outros, conforme a Carta das Naes Unidas.

    9. Encorajamento dos interesses mtuos e cooperao.10. Respeito justia e s obrigaes internacionais.

    A Conferncia de Bandung concorreu decisivamente para a flexibilizao do sistema bipolar que se estruturara depois da Segunda Guerra Mundial. A partir de Bandung, o Terceiro Mundo converteu-se em ator internacional coletivo, inaugurando o novo eixo norte-sul nas relaes internacionais, cujo sentido era a luta pelo desenvolvimento. Seus principais desdobramentos polticos foram a realizao do processo de descolonizao na frica e a formao do Movimento dos Pases No Alinhados. Seus lderes - Jawaharlal Nehru (ndia), Gamai Abdel Nasser (Egito), Kwame Nkrumah (Gana) e Ach-

    CONFERNCIA AFRO-ASITICA DE BANDUNG 28

  • med Sukarno (Indonsia) - assumiram papel de vanguarda dos pases perifricos nessa nova fase do sistema internacional do ps-guer- ra, ao denunciar a corrida armamentista como sria ameaa paz mundial e ao propor uma nova ordem econmica internacional.

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    CONSENSO DE WASHINGTON

    Conjunto de recomendaes elaboradas por funcionrios do governo dos Estados Unidos, integrantes de organismos financeiros internacionais - FMI, BID e Banco Mundial - e economistas da Amrica Latina para melhorar o desempenho das economias latino-americanas. Essas recomendaes foram o principal resultado do seminrio intitulado Latin American Adjustment: How Much Has Hap- pened?, organizado pelo Institute for International Economics, em novembro de 1989 , na capital norte-americana.

    Embora as recomendaes no tivessem nenhum carter oficial e j fossem bastante conhecidas, elas exerceram enorme influncia entre as elites intelectuais, econmicas e polticas de toda a Amrica Latina ao longo da dcada de 1990. Esse conjunto de medidas, ento recomendado para ser adotado pelas autoridades econmicas latino-americanas, constitua parte importante do iderio ncoliberal que comeara a se esboar no fim dos anos 1970 e incio dos anos 1980, a partir da chegada de Margaret Thatcher e Ronald Reagan ao poder da Inglaterra e dos Estados Unidos, respectivamente.

    Em linhas gerais, as ideias-chave do Consenso de Washington conformavam uma viso economicista dos problemas concernentes s formaes sociais da Amrica Latina. A questo central, que tras- passava todas as medidas recomendadas, era que a modernizao das economias da regio dependia nica e exclusivamente de ajustamentos internos a se realizar em cada uma delas. Essa ideia ia de encontro s teses econmicas estruturalistas, segundo as quais o desempenho das economias latino-americanas dependia em grande medida das condies externas. De acordo com os defensores do Consenso de Washington, a prosperidade econmica dependia da disposio dos governos de adotar as medidas tcnicas adequadas, eliminando todos os erros herdados de governos nacionalistas e autoritrios passados. Reafirmava-se a tese de que o papel do Estado como indutor

  • do desenvolvimento estava esgotado e que o crescimento dependia da escrupulosa obedincia s leis do mercado.

    O Consenso de Washington era formado pelas seguintes recomendaes: (1) eliminao dos dficits pblicos por meio de rigorosa disciplina fiscal; (2) criteriosa priorizao dos gastos pblicos; (3) promoo de reforma tributria para desonerar os setores produtivos; (4) abertura do mercado financeiro; (5) flexibilizao do regime cambial com base em alguma referncia externa; (6) abertura do mercado s importaes; (7) captao de capital estrangeiro para investimentos diretos; (8) privatizao das empresas pertencentes ao Estado; (9) desregulamentao da economia; e (10) adoo de critrios para a proteo da propriedade intelectual.

    Em maior ou menor medida, os Estados da Amrica Latina seguiram os conselhos oferecidos pelo Consenso de Washington no decorrer da dcada de 1990. O governo argentino de Carlos Saul Menem foi, entre todos, aquele que mais se empenhou em levar s ltimas conseqncias essas medidas liberalizantes. O resultado geral da aplicao das medidas no foi, porm, aquele que se esperava. A virada do sculo na Amrica Latina acabou sendo marcada por srias dificuldades econmicas, em grande parte determinadas pelo ambiente externo, e foi justamente a Argentina o Estado que enfrentou as maiores dificuldades.

    CONSTRUTIVISMO 30

    CONSTRUTIVISMO

    Segundo Emanuel Adler (2003), construtivismo representa uma postura metafsica, uma teoria social e uma perspectiva emprica. O debate construtivista nas Relaes Internacionais traz todas essas dimenses. Mais ainda, Adler enumera vrios programas que se diferenciam sob esse manto construtivista. Em particular, o construtivismo originou-se de abordagens sociolgicas e filosficas vrias, como a hermenutica objetiva, a hermenutica subjetiva, a teoria crtica e o pragmatismo. Como resultado, diversas vertentes do construtivismo se formaram no mbito das Relaes Internacionais: o construtivismo modernista ou neoclssico, a lingstica modernista e o construtivismo radical, que inclui o ps-modernismo e o ps-estruturalismo, esto entre as principais.

  • A ttulo de simplificao, porm, e considerando as diferenas observadas no que diz respeito s influncias individuais efetivamente experimentadas pelas correntes vrias no estudo das relaes internacionais, adotaremos uma classificao distinta. Embora a teoria crtica tenha influenciado a formao de uma viso construtivista das relaes internacionais, na prtica, teoria crtica e construtivis- mo acabaram por ser reconhecidos como correntes distintas de investigao em Relaes Internacionais. O mesmo se pode dizer do ps-modernismo. Em comum, todas essas correntes tm abordagens reflexivistas das relaes internacionais. Ole Waever (1996) define reflexivismo como corrente ps-positivista. So abordagens que se propem autorreflexo, interpretao das relaes entre atores e instituies internacionais que se constituem mutuamente.

    Dessa tica, o construtivismo se apresenta como uma das principais correntes reflexivistas no mbito das Relaes Internacionais, junto com o ps-modernismo e a teoria crtica. Chamadas de teorias do conheciment