Lições do futuro: o que eu queria saber há alguns anos atrás sobre como manter uma suíte de testes
HÁ MUITO TEMPO ATRÁS UM ESTUDO SOBRE HAVER+ NOME ...
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Universidade Federal do Rio de Janeiro
Há muito tempo atrás
Um estudo sobre haver + nome com valor temporal
Maíra Silva de Paiva
2010
HÁ MUITO TEMPO ATRÁS
UM ESTUDO SOBRE HAVER + NOME COM VALOR TEMPORAL
Maíra Silva de Paiva
Dissertação de Mestrado apresentada ao Programa
de Pós-Graduação em Letras Vernáculas da
Universidade Federal do Rio de Janeiro como
requisito para a obtenção do Título de Mestre em
Letras Vernáculas (Língua Portuguesa).
Orientadora: Professora Doutora Marcia dos Santos
Machado Vieira.
Faculdade de Letras - UFRJ 2010
Há muito tempo atrás – Um estudo sobre haver + nome com valor temporal
Maíra Silva de Paiva Orientadora: Marcia dos Santos Machado Vieira
Dissertação de Mestrado submetida ao Programa de Pós-Graduação em Letras Vernáculas da Universidade Federal do Rio de Janeiro – UFRJ, como parte dos requisitos necessários para a obtenção do título de Mestre em Letras Vernáculas (Língua Portuguesa).
Examinada por: _____________________________________________________________________ Presidente, Professora Doutora Marcia dos Santos Machado Vieira – Departamento de Letras Vernáculas da UFRJ ______________________________________________________________________Professora Doutora Eliete Figueira Batista da Silveira – Departamento de Letras Vernáculas da UFRJ _____________________________________________________________________ Professora Doutora Vera Lucia Paredes Pereira da Silva – Departamento de Linguística e Filologia da UFRJ ______________________________________________________________________Professora Doutora Maria Aparecida Lino Pauliukonis – Departamento de Letras Vernáculas da UFRJ _____________________________________________________________________ Professora Doutora Maria Maura Cezario - Departamento de Linguística e Filologia UFRJ
Rio de Janeiro Fevereiro de 2010
Paiva, Maira Silva de.
Há muito tempo atrás - Um estudo sobre haver + nome com valor
temporal. / Maíra Silva de Paiva Rio de Janeiro: UFRJ/FL, 2010.
xvi, 165f.:il.; 31cm.
Orientadora: Marcia dos Santos Machado Vieira
Dissertação (Mestrado) – UFRJ/ FL/ Programa de Pós-Graduação em
Letras Vernáculas, 2010.
Referências Bibliográficas: f. 147 - 156
1. Funcionalismo 2. Caracterização das expressões temporais formadas
por haver 3. Gramaticalização de haver I. Machado Vieira, Marcia dos
Santos. II. Universidade Federal do Rio de Janeiro, Faculdade de Letras,
Programa de Pós-Graduação em Letras Vernáculas. III. Título.
In absentia:
Dedico este trabalho à minha doce e amada mãe, Dolores, a maior
responsável por essa conquista.
In praesentia:
A
Mirla, minha irmã, por todos os sacrifícios feitos para me manter
estudando, e por ter gerado a Luiza, um lindo presente que trouxe a
alegria de volta a minha vida.
Eduardo, meu amigo e namorado, pela paciência, companheirismo e
cumplicidade.
Idelmar, meu pai, por ter investido e acreditado na minha formação.
AGRADEÇO,
Primeiramente, a todos da minha família, por estarem a todos os
momentos ao meu lado dando força sempre que preciso e pelos sacrifícios para
que eu pudesse me dedicar ao Mestrado.
À minha orientadora, Marcia dos Santos Machado Vieira, por ter me
apresentado à pesquisa científica, pelos ensinamentos, pela paciência com os
prazos e, em especial, pela confiança por ter me dado, sempre, bastante
liberdade para criar, mudar, repensar e produzir, ao meu tempo, este trabalho.
Aos professores do Programa de Pós-Graduação em Letras Vernáculas e
em Linguística, por todos os ensinamentos ao longo de minha trajetória
acadêmica que me impulsionaram e me fizeram crescer acadêmica e
profissionalmente.
Às professoras Eliete Figueira Batista da Silveira, Vera Lucia Paredes
Pereira da Silva, Maria Aparecida Lino Pauliukonis e Maria Maura Cezario por
terem gentilmente aceitado participar da banca examinadora.
Ao meu querido amigo Thiago Giamattey, pelo companheirismo desde
os primeiros passos na iniciação científica até hoje (“pegamos” muito!).
Agradeço muito pelas maravilhosas discussões, sobre todos os textos lidos, por
ter despertado em mim grande interesse em diferentes assuntos, devido a sua
total sede de conhecimento.
À minha amiga Alessandra de Paula, que em pouco tempo se tornou
extremamente importante em minha vida. Minha companheira nas aulas de
mestrado, parceira nos desesperos dos trabalhos produzidos. Agradeço pela
paciência nas minhas crises e nas nossas discussões, muitas vezes calorosas.
A Rodrigo Campos Ribeiro, pela amizade (furona), pelas conversas sérias
e a cumplicidade. Em especial, pelos diversos momentos divertidos junto com a
Alê e o Thiago, pelas nossas “farrinhas”.
À Joana Mendes de Oliveira, Giselle Esteves, Leila Vasti da Paz, Lílian
Alves Jandir, por terem sido pacientes e atenciosas nos primeiros momentos de
Iniciação Científica, me ensinando e guiando nos primeiros passos e pelos
trabalhos em conjunto. Em especial, à Giselle, pelas ajudinhas, até mesmo via
telefone.
À Ana Paula Klem, à Adriana Rodrigues, à Cristina Marcia Monteiro de
Lima Correa, à Daniely Cassimiro de Oliveira Santos, à Maria de Fátima Vieira
e a Vinícius Maciel de Oliveira, pela companhia nos congressos e pelos
divertidos momentos na F-310.
À minha querida amiga, Nivia, que me atura, há quase 15 anos, com
muita paciência e companheirismo.
À Ana Paula, a Elson, à Mariana Corrêa, à Mariana Monteiro e a Wagner
Santa Cruz, pela amizade. E às amigas Aline Oliveira, Graziele Guerra, Luciane
Sant’ana e Renata de Carvalho, por estarem ao meu lado desde a infância e por
torcerem por mim, mesmo que distante.
Aos meus alunos e ex-alunos, por terem me proporcionado a descoberta
do amor que tenho por minha profissão.
Aos informantes que aceitaram produzir os textos narrativos e participar
dos testes de atitudes. Aos professores que me concederam um pouco de seu
tempo e ‘emprestaram’ seus alunos para que eu pudesse propor o tema das
narrativas e aplicar os testes. Aos colegas de profissão e de pesquisa que me
cederam redações.
Ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico
(CNPq), pelas bolsas de Iniciação Científica (PIBIC) e de Mestrado, que muito
auxiliam e estimulam o envolvimento nas pesquisas acadêmicas.
A todos aqueles que contribuíram direta ou indiretamente para o
desenvolvimento desta pesquisa.
E falamos do tempo e do tempo, dos tempos e ainda dos tempos:
“Quanto tempo ele falou?, “Quanto tempo ele levou para fazer
isso?”, “Há quanto tempo que não vejo isso?” e “Essa sílaba tem o
dobro do tempo de uma sílaba breve”. Dizemos essas coisas,
ouvimo-las, os outros compreendem quando as dizemos,
entendêmo-las. São claríssimas, utilizadíssimas e, no entanto, nada
é tão obscuro, nada tem uma interpretação tão fora do domínio
corrente.
(Santo Agostino, Confissões, XXII, 28)
Parte desta pesquisa foi desenvolvida com
financiamento do CNPq (03/2009 – 02/2010)
SINOPSE
Análise funcionalista dos usos das expressões
formadas pelo verbo haver + Nome/Sintagma
Nominal com valor temporal nos gêneros narrativa
escolar e notícia jornalística. Investigação sobre a
gramaticalização de haver em tais expressões com
base no comportamento observável em textos e na
percepção de falantes do Português
RESUMO
A presente dissertação focaliza o comportamento semântico e
morfossintático das expressões formadas pelo verbo haver + Nome/Sintagma
Nominal com valor temporal, a partir de uma amostra de dados do Português
Brasileiro dos gêneros narrativa escolar e notícia jornalística.
A pesquisa lida com as características funcionais das expressões
temporais, o estatuto do verbo haver na função de elemento integrante de tais
expressões e seu, possível, estágio de gramaticalização. Descreve o
comportamento desse verbo, considerando o processo de especialização
semântica e morfossintática, as motivações e as restrições desse processo.
A análise pauta-se em pressupostos da Teoria Funcionalista, da qual se
adotaram os conceitos de transitividade, planos discursivos (Hooper &
Thompson, 1980), status informacional (Chafe, 1984) e gramaticalização (Heine,
2003; Hopper, 1991 e Bybee, 2003).
Tratam-se separadamente os dois gêneros textuais, respeitando-se os
contextos discursivos. Ao exame de dados do uso, somam-se observações
resultantes da pesquisa em obras didático-pedagógicas e da pesquisa por meio
de testes de atitudes aplicados a alunos de diferentes níveis de escolaridade
(graduação, ensino fundamental e médio) e delineados com inspiração em
metodologia laboviana de testes de atitude.
Em linhas gerais, constata-se que há diferenças entre os dois gêneros
textuais nos usos das expressões temporais em estudo. Destacam-se, contudo,
características comuns: a estrutura haver + numeral/pronome indefinido +
substantivo com valor temporal, o ponto de ancoragem temporal no momento de
enunciação e a predominância de ocorrências em plano discursivo de fundo.
Sobre o verbo haver compondo a expressão, assume-se que esse item está
gramaticalizado, é um elemento instrumental formador de expressão adverbial.
Palavras chave: Funcionalismo, Gramaticalização, Expressão temporal, Haver
ABSTRACT
This dissertation focuses on the semantic and morphosyntactic behavior
of expressions formed by the verb haver + Noun/Noun Phrase with temporal
value, from an sample of Brazilian Portuguese data of school essays and
journalistic news.
The research deals with the functional characteristics of temporal
expressions, the status of verb haver (there is) on that kind of expressions and its
possible stage of grammaticalization. It describes the behavior of this verb,
taking into account the process of semantic and morphosyntactic specialization,
its motivations and restrictions.
The analysis is guided by some Functionalist theory's presuppositions,
such as concepts of transitivity, discourse level (Hopper & Thompson, 1980),
informational status (Chafe, 1984), and grammaticalization (Heine, 2003;
Hopper, 1991 e Bybee, 2003).
The two textual genres previously mentioned have been treated
separately, taking into account their discursive contexts. Besides the data
analysis, it has done an observation of didatic-pedagogical works and material
obtained from subjective evaluation tests, which were based on sociolinguistics
methodology of attitude tests, applied to students of different levels of
education.
Overall it has seen that there are differences between the two textual
genres in regard to the use of temporal expressions in exam. Nevertheless they
share some characteristics: structure haver + numeral/indefinite pronoun +
noun with a temporal value; temporal anchorage point located on the moment
of enunciation; and predominance of occurrences on discursive background. It
is also assumed the verb haver composing the past time expression is
grammaticalizated, it is an instrumental part of the adverbial expression.
Keywords: Funcionalism, grammaticalization, verb haver (there is)
SUMÁRIO
ÍNDICE DE QUADROS, FIGURAS E TABELAS.............................................. 15
INTRODUÇÃO....................................................................................................... 18
1. Revisão bibliográfica sobre haver e expressões de tempo passado............. 24
1.1. Origem e primeiros usos de haver................................................................. 24
1.2. Descrições sobre haver em dicionários de Língua Portuguesa.............. 27
1.3. Descrições sobre haver e expressões de temporais/advérbios em
gramáticas da Língua Portuguesa.......................................................................
31
1.4. Descrições sobre expressões de tempo decorrido em Gramáticas
descritivas e textos acadêmicos...........................................................................
36
2. Pressupostos teóricos......................................................................................... 42
2.1. Teoria Funcionalista........................................................................................ 42
2.1.1. Transitividade e planos discursivos.......................................................... 44
2.1.2. Fluxo de informação.................................................................................... 50
2.1.3. Processo de Gramaticalização.................................................................... 54
2.2. Gêneros e tipologias textuais ........................................................................ 59
2.2.1. Notícia jornalística........................................................................................ 64
2.2.2. Redação/narrativa escolar.......................................................................... 68
3. Metodologia........................................................................................................ 71
3.1. Dados do comportamento observável....................................................... 71
3.1.1. Constituição do corpus............................................................................... 71
3.1.2. Procedimentos de análise dos dados do comportamento observável.. 74
3.2. Testes de atitude.............................................................................................. 76
3.2.1. As principais orientações teórico-metodológicas.................................... 77
3.2.2. Os testes analisados...................................................................................... 78
3.2.3. Procedimentos de análise dos testes de atitude................................... 80
4. Expressões temporais com o verbo haver...................................................... 81
4.1. Caracterização das expressões...................................................................... 81
4.1.1. Análise estatística sobre as expressões nas narrativas escolares........... 90
4.1.2. Análise estatística sobre as expressões nas notícias jornalísticas.......... 99
4.1.3. Comparação entre observações feitas nas redações e nas notícias....... 107
4.2. As expressões temporais nos planos discursivos figura e fundo.............. 110
4.3. As expressões temporais no fluxo informação........................................... 117
4.4. O comportamento semi-gramatical de haver nas expressões temporais. 122
5. Considerações finais.......................................................................................... 143
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS..................................................................... 147
ANEXOS.................................................................................................................. 157
ÍNDICE DE QUADROS, FIGURAS, GRÁFICOS E TABELAS
QUADROS
Quadro 1 – Usos pessoais do verbo haver............................................................. 29
Quadro 2 – Usos impessoais do verbo haver......................................................... 30
Quadro 3 – Usos pronominais do verbo haver...................................................... 30
Quadro 4 – Componentes considerados em relação à transitividade por
Hopper e Thompson (1980).....................................................................................
44
Quadro 5 – Fatores considerados na individualização do Objeto por
Hopper e Thompson (1980).....................................................................................
45
Quadro 6 – Caracterização de gêneros e tipos textuais segundo Marcuschi
(2002)...........................................................................................................................
59
Quadro 7 – Quadro adaptado das características da tipologia textual
narrativa.....................................................................................................................
60
Quadro 8 – Distribuição dos dados: textos consultados e textos utilizados.... 71
Quadro 1 – Distribuição dos testes pelos níveis de escolaridade...................... 77
Quadro 2 – Posições dos adjuntos adverbiais segundo Martelotta (1994)..... 85
Quadro 11 – Adaptação das cadeias de gramaticalização propostas por
Travaglia (2003).........................................................................................................
133
FIGURAS
Figura 1 - Organograma adaptado da constituição do sistema temporal
segundo Fiorin (1996)..............................................................................................
82
Figura 2 – Pontos de ancoragem da expressão temporal .................................. 82
Figura 3 – Continuum de verbo predicador a verbo instrumental................... 94
Figura 4 – Continuum de verbo predicador a verbo auxiliar / verbo
funcional....................................................................................................................
133
GRÁFICOS
Gráfico 1 – Configuração Gráfico 1 – Produtividade das expressões
temporais nos textos consultados........................................................................
91
Gráfico 2 – Configuração do elemento nominal formador da expressão em
delimitável ou não delimitável.............................................................................
92
Gráfico 3 - Valor da expressão: durativo ou pontual........................................ 94
Gráfico 4 – Posição da expressão no texto nas notícias..................................... 103
Gráfico 5 - Posição da expressão na predicação nas notícias........................... 104
Gráfico 6 – Comparação entre aspectos durativo e pontual nas redações e
nas notícias..............................................................................................................
108
Gráfico 7 – Posição da expressão na predicação em narrativas e notícias..... 109
Gráfico 8 – Planos discursivos nas redações e notícias..................................... 117
Gráfico 9 – Status informacional nas narrativas e notícias............................... 114
Gráfico 10 – Fluxo de informação nas porções textuais.................................. 120
TABELAS
Tabela 1 –Distribuição dos dados das narrativas escolares pelas porções
textuais.....................................................................................................................
92
Tabela 2 – Distribuição dos dados das narrativas escolares pelas posições
das expressões na sentença...................................................................................
93
Tabela 3 – Distribuição das expressões com ou sem h e seguidas ou não
por atrás pelos grupos de séries...........................................................................
95
Tabela 4 – Distribuição das expressões temporais entre O Globo e o Extra
em relação ao aspecto e ao termo ao qual a expressão se liga.........................
97
Tabela 5 – Posição da expressão no texto nos dados do jornal O Globo e
Extra..........................................................................................................................
100
Tabela 6 – Distribuição das expressões por seções dos jornais........................ 102
Tabela 7 – Produtividade dos planos discursivos figura, fundo 2 e fundo
1 nos corpora.............................................................................................................
108
Tabela 8 – Relação entre as sentenças com as expressões temporais e o
fluxo de informação...............................................................................................
113
Tabela 9 – fluxo de informação nas posições textuais (percentuais) em
cada gênero.............................................................................................................
117
Tabela 10 – Resultado dos testes aplicados a graduandos sobre a
manutenção do sentido básico da expressão depois da manipulação da
mesma......................................................................................................................
125
Tabela 11 – Resultado dos testes aplicados a alunos do EF e EM sobre a
manutenção do sentido básico das expressões durativas depois da
manipulação da mesma.........................................................................................
128
Tabela 12 – Resultado dos testes aplicados a alunos do EF e EM sobre a
manutenção do sentido básico das expressões pontuais depois da
manipulação da mesma.........................................................................................
129
Tabela 13 – Resultados dos testes sobre as possíveis classificações para as
expressões temporais.............................................................................................
131
Tabela 14 – Tipos de substantivos que acompanham haver na formação da
expressão.................................................................................................................
136
18
INTRODUÇÃO
As questões relativas à expressão de tempo vêm sendo estudadas por
vários pesquisadores. Ainda assim, restam questões a responder, uma vez que
são diversas as expressões linguísticas temporais. Sabe-se que não se podem
tratar as expressões de tempo como uma classe homogênea, pois uma análise
mais profunda evidencia que esta designação recobre elementos distintos, tais
como: advérbios e sintagmas adverbiais em sentido estrito (ontem), (domingo
passado); outros advérbios a serviço desse tipo de referência (dez anos atrás);
sintagmas adverbiais compostos por preposições (desde anos) ou verbos
(há/faz/tem/vai (para) dez anos). Neste trabalho, observam-se, então, as expressões
temporais formadas pelo verbo haver em um conjunto de dados da variedade
brasileira da Língua Portuguesa.
O objeto de estudo são as expressões definidoras de intervalos as quais
operam uma medição a partir do um ponto de perspectiva, definido no eixo do
tempo. Pretende-se trabalhar apenas com um tipo de adverbial operador de
localização de tempo decorrido/escoado/passado, que indica (a) transcurso de
tempo ou (b) dado momento no passado em relação (b.i) ao momento presente
da enunciação ou (b.ii) a um momento anterior à enunciação.
As expressões configuram-se da seguinte forma:
haver + Nome/Sintagma Nominal1 indicador de valor temporal (+que)
1. A pouco tempo eu morava em um prédio de 6 andares [Redação, 9º ano]
2. Professores não recebem aumento há 11 anos. [Notícia, O Globo]
1 Tais formas serão respectivamente tratadas como N e SN.
19
Será feita uma análise do comportamento semântico e morfossintático
das expressões temporais formadas pelo verbo haver comparando-se os gêneros
textuais redação escolar do tipo narrativo2 e notícia jornalística.
Vale ressaltar que, até onde se sabe, pouco se estudou o assunto no
Brasil, mas, na literatura encontrada sobre a impessoalidade de haver, há
menção ao seu uso como formador de expressões temporais. Porém, a descrição
sobre haver especificamente nessas expressões, aparentemente, não foi
aprofundada. Além disso, o assunto não é diretamente tratado nas gramáticas
tradicionais ou descritivas; quando mencionado, encontra-se na seção sobre as
orações sem sujeito ou, mais raramente, na seção destinada à classificação de
orações num período composto.
Tomou-se como ponto de partida para a formulação de questões e
hipóteses descritivas sobre o comportamento do verbo haver nesse tipo de
expressão a tese de doutorado de Machado Vieira (2001), que, na seção “os
casos de fazer com referência a tempo cronológico”, indica:
O verbo impessoal fazer atuaria, então, como elemento funcional que
opera sobre sintagmas nominais com sentido cronológico para a
indicação do somatório de tempo a partir de dois pontos (origem e
destino) ou para a localização de um evento no eixo temporal. E, como
operandum/operador temporal, possuiria propriedades que o
relacionam às categorias de verbo predicador, operandum/operador
causativo e constituinte gramatical de expressão adverbial. (op. cit.:
299)
Contribuíram significativamente também para o desenvolvimento deste
estudo os trabalhos de Dapena (1983) e Móia (1999) que fomentaram algumas
inquietações sobre o comportamento do verbo e da expressão como um todo.
Em artigo sobre a semântica das expressões temporais com haver, Móia (1999)
2 Esse gênero será posteriormente tratado como narrativa escolar.
20
reforça a ideia de semelhança entre as expressões compostas por verbo e as
compostas por preposições/advérbios, tais como dentro de/daqui /daí a X-
TEMPO, X-TEMPO depois de/antes de ou a X-TEMPO de.
Dapena (1983), por sua vez, enfatiza a questão da função da expressão
temporal, apontando problemas em relação a esse assunto:
El primero de ellos corresponde al hecho insólito de que aquélla
pueda funcionar — ¿indistintamente? — como subordinante y como
subordinada (comp. Hace mucho tiempo que viven aquí junto a viven aquí
hace mucho tiempo). Por otro lado, en el uso subordinante se plantea la
cuestión de determinar el papel que la frase subordinada desempeña
dentro del conjunto oracional: ¿Se trata de una subordinada
substantiva o, más bien, de relativo?... Y por lo que se refiere al
empleo subordinado, resulta bastante extraño que una oración con
verbo en forma personal se subordine a otra sin ninguna marca o
elemento de relación, y que, a su vez, sea susceptible de ir regida
directamente por una preposición. (op. cit.: 485)
Motivada por uma pesquisa sobre a nomenclatura com que o assunto é
exposto em obras didáticas e gramaticais, Paiva (2007), em um artigo sobre as
possíveis classificações para as expressões temporais formadas pelo verbo
haver, constata que há incoerência quanto à categorização dessas estruturas e
indica que há, em gramáticas normativas, ao menos quatro possibilidades de
referência:
i) A oração introduzida pelo QUE é classificada como subordinada
adverbial temporal e, consequentemente, a com HAVER como
principal. (...)
ii) A oração com o verbo HAVER é classificada como oração
subordinada adverbial temporal. Sendo assim, a oração subordinada é
justaposta, visto que não se liga à principal por transpositor. (...)
21
iii) A oração introduzida por QUE é classificada como subordinada
substantiva subjetiva. (...)
iv) A expressão temporal é classificada como adjunto adverbial de
tempo. Não é considerada, então, como uma oração. (...)
Desses trabalhos e dessa situação de tratamento de tal tipo de estrutura,
surgiu o interesse pela análise do comportamento funcional não só das
expressões temporais em si, mas também pela investigação do estatuto do
verbo haver — elemento integrante de tais expressões. Nesta análise, interessa
averiguar aspectos relativos à possibilidade de haver se encontrar em algum
estágio de gramaticalização.
Esta pesquisa propõe-se, assim, a descrever o comportamento desse
verbo de modo mais aprofundado, considerando o processo de especialização
semântica e morfossintática ao qual se submete haver, as motivações e as
restrições desse processo, a configuração das estruturas que esse item compõe, a
relação entre a disposição dessas estruturas e efeitos de sentido na construção
de textos, entre outros aspectos.
Podem-se, então, enumerar os seguintes objetivos:
i. Verificar as características semântico-discursivas das expressões temporais
formadas pelo verbo haver + N/SN;
ii. Analisar os efeitos de sentido obtidos a partir da ordenação da estrutura no
período e de seus elementos internos;
iii. Averiguar a relação das expressões temporais com os planos discursivos e o
fluxo informacional.
iv. Comparar os fatores acima nas narrativas escolares e nas notícias, a fim de
descrever o uso das expressões em cada gênero textual focalizado.
v. Checar a pertinência do nível de gramaticalização do verbo haver como
elemento formador de expressão de tempo decorrido sugerido em Machado
Vieira (2001).
22
vi. Discutir, a partir da observação de testes de atitude linguística, a
possibilidade de terem "o mesmo sentido básico" as expressões formadas
apenas por haver e as acompanhadas de outro elemento indicador de tempo
decorrido com valor relativamente equivalente. Ainda a partir dos testes,
verificar se a supressão do verbo na expressão acarreta alteração semântica.
A análise fundamenta-se em pressupostos teórico-metodológicos da
Teoria Funcionalista. Para essa teoria, a função comunicativa possui um papel
predominante nas línguas, e a língua é concebida como um instrumento de
interação social. Seu foco é o uso da língua dentro de um contexto discursivo;
logo, encaminha que a observação das estruturas gramaticais se dê na situação
comunicativa.
Considerando, conforme princípios funcionalistas, a língua como uma
estrutura maleável e adaptativa e a função como elemento a partir do qual se
torna possível compreender a linguagem, este estudo parte da noção de que a
verdadeira gramática da língua opera no uso, levando em consideração, assim,
as motivações externas ao sistema linguístico e pressões comunicativas a que os
interlocutores estão expostos.
Para a análise das características das expressões, pretende-se levar em
conta conceitos da Teoria Funcionalista, tais como transitividade, planos
discursivos (Hooper & Thompson, 1980) e status informacional (Chafe, 1984).
E, por se considerarem as expressões temporais formadas por haver como
locuções adverbiais, é extremamente relevante, ainda, o conceito de
gramaticalização (Heine et al, 1991; Heine, 2003; Hopper, 1991 e Bybee, 2003).
Adotaram-se, também, tópicos da Linguística Textual sobre gêneros e
tipos textuais, a fim de se obterem fundamentos para a análise sobre as
diferenças de usos das expressões temporais em estudo nos gêneros adotados.
A análise terá como ponto de partida a observação de obras didático-
pedagógicas — de caráter normativo e descritivo — destinadas a público de
diferentes níveis de ensino, bem como pesquisas de cunho acadêmico. Terá
como objetos de análise empírica dados da produção linguística observada em
23
textos da variedade brasileira do Português e, ainda, material obtido em testes
de atitude confeccionados com inspiração em metodologia sociolinguística de
pesquisa de atitudes e aplicados a alunos de graduação, ensino fundamental e
médio. Os dados de uso são representativos da modalidade escrita de dois
gêneros textuais: notícias de jornais e redações escolares, ambos do tipo
narrativo. Com isso, busca-se organizar basicamente duas amostras para
análise: (i) uma com dados da observação (crítica e com algum grau de
consciência) dos usuários a respeito da língua que usam e (ii) outra com dados
do uso escrito do PB coletados em textos produzidos em dois gêneros.
Esta dissertação divide-se em quatro capítulos além desta introdução,
que se apresentam da seguinte forma: capítulo 1 – revisão bibliográfica sobre o
verbo haver e expressões de tempo decorrido; capítulos 2 e 3 – aspectos teórico-
metodológicos da pesquisa; capítulo 4 – análise do objeto de estudo e
interpretação dos resultados. Por fim, seguem as considerações finais e as
referências bibliográficas.
24
1. Revisão bibliográfica sobre haver e expressões de tempo passado
Fazem-se, neste capítulo, explanações sobre os usos do verbo haver e das
expressões temporais em gramáticas, dicionários e trabalhos de cunho
acadêmico de diversos autores. A análise das obras centrou-se nas expressões
indicadoras de tempo passado, e, em especial, nas formadas pelo verbo haver
— objeto de estudo deste trabalho. Entende-se, aqui, por expressões temporais
o que comumente se chama circunstanciais temporais ou locuções adverbiais.
Objetiva-se, com isso, sumariar aspectos de descrições já disponíveis que
possam contribuir para um melhor entendimento sobre o comportamento
dessas expressões e do verbo em estudo.
Na primeira seção, foi feita uma breve resenha da origem e dos primeiros
usos do verbo haver, verificando-se, também, suas acepções e funções descritas
em dicionários e gramáticas descritivo-normativas, bem como uma revisão
nestas das descrições sobre as expressões de tempo passado. Já na segunda
seção, procedeu-se à resenha das gramáticas de cunho descritivo e de trabalhos
e pesquisas acadêmicas sobre as expressões de tempo decorrido/escoado.
1.1. Origem e primeiros usos de haver
Haver é originário da forma latina habere que se apresentava com as
acepções de ‘possuir’, ‘obter’, ‘manter’, ‘reter’, ‘segurar’, ‘conter’ e ‘deter’.
Segundo Sampaio (1978), no latim clássico habere era verbo pleno empregado
com a noção de posse de coisas materiais — como em Tantas divitias habet: nescit
quid faciat auro.3 — e de posse espiritual, relacionando um sujeito a seu
complemento — como em vulneribus didicit miles habere metum4.
Nesse período, habere também era empregado como auxiliar dando à
conjugação perifrástica um matiz de dever, obrigação. Sampaio (1978) indica
que “a reunião de tempo e aspecto numa só forma verbal acabou por ocasionar 3 Ele tem tão grandes riquezas, que não sabe o que fazer com ouro. 4 Com os ferimentos o soldado aprendeu a ter medo.
25
o aparecimento da perífrase com habere, que exprimia a posse da ação concluída
e a continuidade deste estado até o presente” (Sampaio, 1978:3).
A noção de posse expressa por habere posteriormente, devido a um
desgaste semântico, generaliza-se, e o centro semântico passa para o particípio
do outro verbo. Então, nesse contexto, habere torna-se um verbo auxiliar
desprovido de conteúdo semântico.
No português arcaico as duas formas coexistem até o século XV, como se
verificam nos seguintes exemplos5:
"..., ou hás o sem perdido ou és encantada, que és donzela de grã guisa...” (A
demanda do Santo Graal.157) — perífrase indicando o estado de posse, a
manutenção de uma ação.
“Ora hei pavor que a havemos perdida.” (A demanda do Santo Graal pg.168) —
perífrase reduzida a um mero pretérito.
Mantém-se, então, apenas a perífrase reduzida a pretérito, que posteriormente
passou a ter como alternante a perífrase formada através do verbo ter.
Ainda segundo Sampaio (1978), embora o uso padrão de habere no latim
clássico fosse pessoal significando ‘ter, possuir’, há documentos do latim da
decadência e do latim vulgar, em que o verbo habere aparece com o sentido
existencial.
Para a passagem do uso pessoal para o impessoal, a autora aponta a
hipótese de Bassols de Climent de que “houve primeiro uma mudança de
formulação mental que resultou em uma mudança de construção” (op. cit.:10).
Para a frase Dominus habet multum vinum6, houve a correspondência Domus
habet multum vinum7. A casa, como um ser inanimado, não pode logicamente
possuir; assim, a construção se aproxima a outra que exprime existência e não
posse domi est multum vinum8. Domus passou, então, a ser visualizado como
locativo e a construção sem um sujeito.
5 Exemplos de Sampaio (1978). 6 O senhor tem muito vinho. 7 A casa tem muito vinho. 8 Em casa há muito vinho.
26
Mattos e Silva (1997) afirma que, no século XIII, habere com o sentido de
existir co-ocorre com o verbo esse. Em sua análise sobre as Cantigas de Santa
Maria, percebe que nesse uso há uma predominância do ser (56% das
ocorrências) em relação a haver (44% das ocorrências).
Em estruturas possessivas, haver é o verbo mais usual ocorrendo com
complemento de qualquer valor semântico, utilizado para posse de objetos
materiais adquiríveis, de bens/qualidades imateriais adquiríveis e posse
inadquirível e inalienável.
Ainda segundo Mattos e Silva (2000), do século XIV para o século XV, em
construções existenciais o verbo haver já apresenta maior número de
ocorrências do que o verbo ser. Na primeira metade do século XV, haver
possessivo torna-se menos frequente perdendo espaço para ter. O que ocorre
também em perífrases com particípio passado e nas construções em que tem
papel de auxiliar de tempo composto.
Na segunda metade do século XVI haver é suplantado por ter em todos
os contextos de posse. Nos séculos XVII e XVIII, haver só predomina em
contextos existenciais. Já no século XX, parece completar-se o processo de
esvaziamento semântico do verbo haver, usado essencialmente em construções
existenciais na modalidade escrita da língua.
Sintetizando-se os usos pode-se apresentar o seguinte quadro:
Latim clássico habere:
• verbo pleno — tem noção de posse.
• auxiliar — apresenta matiz de dever, obrigação.
• auxiliar — é desprovido de conteúdo semântico.
Latim da decadência e latim vulgar:
• Apresenta sentido existencial.
27
Português arcaico:
• As duas formas de particípio coexistem.
• Mantém-se apenas a perífrase reduzida a pretérito.
Século XIII:
• existencial — co-ocorre com esse.
Século XIV e XV:
• Existencial — haver é mais produtivo que ‘ser’.
Século XV:
• Possessivo — perde espaço para ‘ter’.
Segunda metade do século XVI:
• Possessivo — é suplantado por ter em todos os contextos de posse.
Séculos XVII e XVIII:
• Só predomina em contextos existenciais.
1.2. Descrições sobre haver em dicionários de Língua Portuguesa
Nos dicionários etimológicos de Silveira Bueno (1976), Machado (1973),
Cunha (1999) e, ainda, Houaiss (2007), verificou-se a origem de haver no verbo
habere do latim com acepções de ‘possuir’, ‘obter’, ‘manter’, ‘reter’, ‘segurar’,
‘conter’ e ‘deter’. Machado (1973) aponta, como fonte histórica, em 1012, a
forma avemus em kartula venditionis de ereditate nostra ue avvemus in Villa Fornele.
Em relação aos possíveis usos de haver, todos os autores consultados
apresentam as mesmas possibilidades: uso transitivo com diversas acepções9,
impessoal, pronominal ou emprego auxiliar.
Como verbo auxiliar, viu-se que ele pode aparecer: junto a particípio,
indicando tempo pretérito (havia sido); seguido de de mais presente do infinitivo
9 Cf. quadro de acepções página 29.
28
de outro verbo, exprimindo futuridade promissiva (hei de andar); seguido ou
não pela a preposição de, indicando futuro (havias-te surpreender).
Houaiss afirma que, no sentido de 'receber, ganhar' e nas extensões deste,
como 'experimentar, sentir' e 'ter', o verbo haver pode formar, com seu objeto
direto, uma unidade semântica e funcional.
Haver é impessoal nos sentidos de 'existir, continuar a existir, acontecer,
ocorrer'. Freire (1954) chama atenção para a questão de que o verbo haver como
verbo impessoal não deixa de ser transitivo. Os autores consultados ressaltam,
ainda, que, quando haver aparece em complexos verbais, seu auxiliar também
permanece invariável (há pessoas/deve haver pessoas), toda a locução é impessoal.
Houaiss afirma que, nas construções nas quais o haver possui o sentido
de 'existir', como nas orações do tipo há muito que fazer, o verbo não é auxiliar,
tem sentido pleno (impessoal). Indica, ainda, que, no Brasil, nas acepções
impessoais de 'estar presente, encontrar-se', 'existir', 'acontecer, realizar-se',
haver pode ser substituído, no registro da língua informal, pelo verbo ter,
também impessoal.
Encontraram-se registros, em todas as obras avaliadas, do uso impessoal
de haver como formador de expressão de tempo passado. Nesse uso, o verbo
haver é combinado a um elemento que faça referência temporal, tal como em
“há dias”.
Os autores chamam atenção para a correlação temporal de haver com o
outro verbo nessas construções. Se o verbo da frase seguinte estiver no passado,
haver deve apresentar-se também no passado. O uso no futuro denota
incerteza. Alguns autores, como Houaiss apontam, que, no registro informal,
haver costuma ser empregado no presente do indicativo. Verificou-se também
que, nessas construções de tempo, o verbo pode vir antecedido da preposição
de, em especial em Portugal.
Para Fernandes (1958), nesses casos a oração de haver é subordinada
adverbial, e o que, que às vezes aparece, deve ser considerado simples expletivo.
29
Para Freire (1954) e Almeida (2008), nessa acepção formam-se com o verbo
haver frases adverbiais.
Segundo Almeida (2008), nessas expressões temporais, o “há não é
percebido como verbo, mas antes como preposição, e daí o antepor-se-lhes de,
desde, até, por analogia com expressões como de então, desde ontem, até hoje”
(op. cit.: 337). Defende, assim, que essas construções são locuções adverbiais de
tempo em forma oracional intercaladas na oração; como prova, diz que vêm
modificando um verbo.
Esse autor ressalta, ainda, que há redundância no acréscimo de atrás e de
passados, à expressão (1954) "há dias". “A simples presença do verbo haver
dispensa essas e qualquer outra palavra que venha a denotar tempo decorrido.”
(op. cit.: 237).
Quadro resumitivo dos usos e acepções do verbo Haver10
Usos pessoais:
SIGNIFICADOS EXEMPLOS
ter ou obter comunicação de;
receber, alcançar
logo os Noronhas houveram notícia da
sua prisão
estar na posse de, ser proprietário
de; possuir
os Albuquerques hão cabedal de escudos
para muito mais
experimentar uma sensação, ser
afetado por; sentir
por presenciáreis tais atrocidades, haveis
receio de ali ficar
considerar, julgar Se houveres que é fraqueza morrer em tão
penoso e triste estado.
receber de volta; reaver nada conseguiu haver do que lhe havia
sido roubado
Quadro 1 - Usos pessoais do verbo haver
10 Os exemplos, com poucas exceções são de Houaiss.
30
Usos impessoais:
SIGNIFICADOS EXEMPLOS
ter existência (material ou
espiritual); existir, subsistir
para ela, só há no mundo o neto
estar ou encontrar-se concretamente
em determinado lugar ou situação
há alguém à porta, batendo
ter transcorrido ou ser decorrido
(tempo)
há cinco anos deixei de fumar
ser ou tornar-se realidade no tempo
e no espaço; acontecer, realizar-se
não houve sessão de cinema
ser possível – seguido de infinitivo
sem preposição
Não há fartar um moiro, se come na mesa
alheia.
Quadro 2 – Usos impessoais do verbo haver
Usos pronominais:
SIGNIFICADOS EXEMPLOS
proceder socialmente; conduzir-se, lidar
com, sair-se
elas se houveram com elegância na
discussão
andar às voltas com; arcar quem entra naquela repartição
começa a se haver com as
complicações da burocracia
ter trato com; lidar, prestar contas a; avir-
se
quem não for já para a cama vai
haver-se comigo depois
Quadro 3 – Usos pronominais do verbo haver
31
1.3. Descrições sobre haver e expressões de temporais/advérbios em
gramáticas da Língua Portuguesa
Todas as gramáticas consultadas mencionam os usos de haver
encontrados nos dicionários. São descritos, em especial, os usos como verbo
auxiliar e seus usos impessoais.
Dias (1959) descreve haver como auxiliar e formador de expressão
temporal. Defende que esse verbo pode ser empregado como substantivo em
expressões formadas por preposição e substantivo, tal como de há muito. Afirma,
ainda, que o que usado depois de construções temporais com o verbo haver
funciona como uma conjunção temporal.
Said Ali (1966), ao falar sobre verbos sem sujeito, apresenta a
possibilidade de análise do verbo haver nessas estruturas de forma semelhante
a sua acepção de posse — o que chama de abuso de alguns gramáticos. Esses
gramáticos apresentam, nas palavras de Said Ali, dois absurdos: a) há = tem =
possui. Ex.: Há homens = possui homens; b) devido à noção de posse pressupor
um possuidor, levantam a possibilidade de um sujeito oculto.
O autor afirma, então, que “nenhum substantivo ou palavra
substantivada é sujeito sintático dos verbos que exprimem fenômeno da
natureza; nenhum substantivo ou palavra substantivada pode tão pouco
exercer essa função em orações existenciais como 'há homens'”(op. cit.: 85).
A visão de Barreto (1903) se enquadra na linha criticada por Said Ali,
pois o autor, ao tratar não do verbo haver, mas de fazer em estruturas
temporais, comenta que, na estrutura “— Já esteve no Recife! Em que épocha?—
Fazem dois annos”, é erro supor que o sujeito do verbo fazer é “dois annos” (op.
cit.: 93).
O autor considera que “dois anos é complemento directo do verbo fazer,
verbo transitivo activo. Qual então é o sujeito? A proposição latente — que
estive no Recife. Logo, o verbo fazer deve estar no singular, porque uma oração
que exercita o officio de sujeito de um verbo qualquer, exprime uma noção
substantiva singular, e o verbo deve pois, ficar n'esse numero.” (op. cit.: 93).
32
Barreto afirma, ainda, que há outros autores que consideram fazer nessas
frases como impessoal. E finaliza o capítulo afirmando que “o infinitivo de fazer
comunica sua impessoalidade aos auxiliares. Tal como no caso de haver”.
Góis (1958), ao tratar da sintaxe de haver, defende que, quando
empregado impessoalmente, concorda com sujeito indeterminado. Para ele,
“nas formas — há dias, há pouco, havia meses, havia quatro semanas, — o
verbo HAVER é igualmente impessoal e intransitivo: como tal fica no singular,
concordando com sujeito indeterminado.” (op. cit.: 57) Diz, ainda, que haver
pode aparecer no futuro indicando incerteza sobre a quantidade de tempo
decorrido ou regido pela preposição de se estiver no presente do indicativo.
Maciel (1931), na seção sobre a sintaxe do verbo haver, defende que esse
verbo funciona como adjunto adverbial em frases ou expressões em que apenas
indica circunstância de tempo, podendo ser seguido às vezes do que expletivo,
que, ainda segundo o autor, funciona como elemento apenas decorativo e
pleonástico, sem prestabilidade sintática.
Bechara (1999:440) afirma que os adjuntos adverbiais temporais “podem
referir-se ao verbo, ao sintagma verbal ou a toda oração”. Enfatiza que podem
ser representados por advérbio, sintagmas preposicionados ou por oração e
representam o tempo propriamente dito, a duração, a quantificação temporal
etc.
Ainda segundo o autor, a ordem dos advérbios está diretamente ligada
ao seu papel sintático-semântico e sua relação com o verbo. Assim, os advérbios
mais internamente ligados ao núcleo verbal não possuem flexibilidade de
posição, já aqueles mais externamente ligados apresentam certa flexibilidade.
Em sua gramática, Bechara (1999) menciona as expressões em estudo
quando trata das orações subordinadas adverbiais temporais. O autor defende
que é opinião generalizada considerá-las como orações subordinadas adverbiais
temporais e o que que, às vezes, as segue como conjunção temporal.
Esse gramático apresenta outras possíveis classificações, propostas por
diferentes autores, para essas expressões. Dentre elas está a possibilidade de
33
considerar o que como expletivo dentro da oração principal e a oração com
haver como adverbial temporal, sendo, então, justaposta à oração subordinada
— opção que Bechara julga boa. Apresenta, também, a proposta seguida por
Barreto (1903) — considerar o verbo como pessoal nessa construção — e a
seguida por de Maciel (1931) — considerar a expressão como uma locução
adverbial.
O mesmo ressalta, porém, que “em tais orações, a análise se torna difícil
pelo fato de a construção ter-se fixado apesar de alterado o sentido lingüístico.
Há um visível descompasso entre sua estrutura de superfície e profunda.” (op.
cit.: 504)
Cunha e Cintra (1985) apenas comentam sobre a impessoalidade do
verbo haver quando formador de expressão de tempo, sem questionar, porém, a
função sintática de tal expressão.
Cunha (1976), ao falar sobre a colocação dos advérbios na sentença,
afirma que esses podem ser antepostos ou pospostos ao constituinte com o qual
se relacionam. Ressalta, porém, que há uma função de realce na antecipação do
advérbio ao verbo.
Esses autores levantam a questão da dificuldade de generalização sobre a
ordem dos advérbios. Apontam que, em função de pressões de informatividade
ou discursivas, eles podem deslocar-se na sentença.
Rocha Lima (1998) menciona a impessoalidade do verbo haver ao formar
expressões de tempo passado. E, comenta, ainda, sobre a classificação de tais
expressões ao tratar das orações subordinadas adverbiais temporais,
nomeando-as justapostas.
Em síntese, na investigação em gramáticas normativas sobre as
expressões temporais formadas por haver, perceberam-se ao menos quatro
classificações possíveis para tais expressões. Foram consultadas gramáticas de
décadas anteriores e gramáticas contemporâneas; as classificações vistas
encontram-se nos materiais das diferentes épocas. Abaixo são apresentadas e
34
exemplificadas as quatro classificações para as expressões em estudo e alguns
autores que as adotam:
i) A oração introduzida pelo que é classificada como subordinada adverbial
temporal e, consequentemente, a com haver como principal. Dessa forma, o que
é entendido como uma conjunção temporal. É esta, segundo Bechara (1999), a
orientação mais seguida.
3. Há duas semanas que o documentário vai ao ar noite e dia11 [O Globo]
Oração Principal (OP) Oração Subordinada Adverbial Temporal (OSAT)
Em construções como a seguinte, acredita-se na elipse do QUE
subordinativo.
4. o time carioca não sofria gol no Maracanã há quatro jogos [Jornal, Extra]
OSAT OP
há quatro jogos que o time carioca não sofria gol no Maracanã
ii) A oração com o verbo haver é classificada como subordinada adverbial
temporal. Sendo assim, a oração subordinada é justaposta, visto que não se liga
à principal por transpositor. Essa é a visão de alguns autores, incluindo Rocha
Lima (1999).
Neste caso, o que “reduzido a simples palavra memorativa, relembra, na
oração principal, a partir de que fato se faz alusão ao tempo na subordinada
anterior” (Bechara, 1999).
11 Nos corpora adotados não foram verificados dados nos quais a expressão temporal fosse seguida pelo conectivo que; por isso, para a exemplificação foram coletados alguns dados, em jornais, que servissem de exemplo.
35
5. Há duas semanas que o documentário vai ao ar noite e dia [O Globo]
OSAT OP
6. eu morava em Bangu a 4 anos atrás [Redação, 7º ano EF]
OP OSAT
iii) A oração introduzida por que é classificada como subordinada substantiva
subjetiva.
Neste caso, o que é entendido como conjunção integrante e o verbo haver
não é considerado impessoal, visto que possui uma oração como sujeito.
7. há dois meses que não fazia uma refeição completa12 [Jornal, O globo]
OP Oração Subordinada Substantiva Subjetiva (OSSS)
Tal classificação seria mais adequada para o verbo fazer, segundo os
autores que a consideram, como Mário Barreto e Cândido Jucá Filho. Porém,
ainda segundo eles, como as estruturas são equivalentes, pode-se aplicar a
ambos os verbos.
iv) A expressão temporal é classificada como adjunto adverbial de tempo. Não é
considerada, então, como uma oração.
8. A 1 mês atrás eu e minha prima estava brincando [Redação, 7º ano EF]
Adjunto Adverbial de Tempo
(AAT)
Predicação nuclear
12 Nos corpora adotados não foram verificados dados nos quais a expressão temporal fosse seguida pelo conectivo que, por isso para a exemplificação foram coletados alguns dados, em jornais, que servissem de exemplo.
36
9. O BuscaPé foi fundado há dez anos [Jornal, O Globo]
Predicação nuclear (AAT)
O autor Maximino Maciel, em sua Grammatica descriptiva de 1931, já
mencionava esta possibilidade de classificação na seção sobre a sintaxe do
verbo haver dizendo que ele pode atuar “como adjunto adverbial em phrases
ou expressões em que apenas indica circunstância de tempo, seguido ás vezes
do QUE expletivo.” Definia, ainda, que o que na frase funciona “como elemento
apenas decorativo e pleonástico, sem prestabilidade syntactica”
Há de se mencionar, também, que outros autores, tal como Antenor
Nascentes, por exemplo, consideram esta classificação apenas para as
expressões justapostas, isto é, sem a presença do que:
10. A disputa interna no Palácio começou há dois meses [Jornal, Extra]
1.4. Descrições sobre expressões de tempo decorrido em Gramáticas
descritivas e textos acadêmicos
Câmara Jr. (1977) defende que há três tipos de advérbios, dentre eles os
que se destinam a situar eventos no tempo. Afirma que esses são de natureza
pronominal — do mesmo modo que os de lugar — e são, portanto, diferentes
dos demais advérbios, de natureza nominal. Os advérbios temporais situam o
evento comunicativo no tempo em relação à posição temporal do falante,
podendo esse evento situar-se no momento da comunicação ou fora dele.
Segundo Mira Mateus et alii (2003),
os localizadores temporais são constituídos por advérbios capazes de
fornecer as coordenadas temporais que permitem situar a
eventualidade descrita numa frase, selecionando um intervalo de
tempo constituído como seu referente(op. cit.: 168).
37
A localização temporal pode ser relativa ou absoluta; no último caso, é
dêitica (referência estabelecida pelo momento de enunciação) ou anafórica
(referência em uma expressão na frase ou texto).
A autora indica que alguns adverbiais possuem certa duplicidade em
relação ao tipo de referência; ou seja, podem ser dêiticos ou anafóricos,
conforme o contexto em que aparecem. Apresenta como exemplos as frases
“Maria chegou há pouco.” e ”Os meus amigos foram ao Brasil apesar de terem
marcado a viagem há pouco.” (op. cit.: 169).
Fiorin (1996) apresenta três momentos na constituição do sistema
temporal: o momento da enunciação, o momento da referência, e o momento do
acontecimento. Segundo ele, os advérbios de tempo articulam-se em dois
sistemas, um enunciativo, isto é, centrado no momento de referência presente, o
da enunciação, e um enuncivo, centrado em um momento de referência
pretérito ou futuro, um momento de referência instalado no enunciado.
O sistema enunciativo expressa-se para revelar concomitância,
anterioridade ou posterioridade. Para revelar anterioridade, podem-se utilizar
ontem, em + SRT13 + passado, em + ultimo + SRT, há +numeral ou pronome + SRT;
numeral ou pronome + tempo ou SRT + atrás.
Fiorin lembra que “é possível usar conjuntamente um tempo verbal e
uma expressão adverbial temporal que não pertencem ao mesmo sistema de
referência, quando dois momentos distintos de referência estiverem
implicados” (op. cit.: 166). Com a expressão temporal em estudo, pode verificar-
se o exemplo “há dois anos eu faria isso”.
Moura Neves (2000), ao abordar as formas dos adverbiais, menciona,
entre outras, as formas verbais há/faz/havia/fazia + substantivo qualificativo.
Para ela, as categorias de lugar e de tempo são dêiticas, visto que “fazem
orientação por referência ao falante e ao aqui - agora, que constituem o
complexo modo-temporal que fixa o ponto de referência do evento de fala”.
(op. cit.: 258) 13 Substantivo de referência temporal
38
Os circunstanciais temporais podem ser em si mesmos fóricos ou não-
fóricos. Os fóricos “indicam circunstância que é referida no momento da
enunciação, numa escala de proximidade temporal” (op. cit.: 258). Já os não-
fóricos indicam a circunstância de tempo.
Moura Neves (2002) questiona o estatuto dos advérbios de tempo e
lugar, defendendo que possuem um estatuto particular, não avaliado pela
tradição gramatical. “De fato, se o advérbio se define como modificador do
verbo (ou, ainda, do adjetivo ou advérbio), como ocorre tradicionalmente, os
circunstanciais não pertencem à classe, já que nenhum advérbio de tempo ou
lugar realmente modifica o verbo. Por outro lado, se o advérbio se define como
a palavra que indica circunstância, conforme também ocorre tradicionalmente,
os circunstanciais são os advérbios por excelência.” (op. cit.: 250)
Novamente, nesse outro trabalho, Moura Neves define fórico como
“elemento que propicia a busca ou a recuperação de informação, por remissão a
um ponto do enunciado, ou à situação de enunciação” (op. cit.: 251). A autora
diferencia, então, dêixis de forismo, afirmando que todo circunstancial fórico é
dêitico.
Martelotta (1994) subdivide os circunstanciadores temporais em cinco
grupos de acordo com sua função discursiva. São eles circunstanciadores: de
tempo determinado, de tempo indeterminado, iterativos, de simultaneidade e
delimitativos.
A categoria com a qual se identificam as expressões temporais com haver
é a dos circunstanciadores temporais delimitativos. Para ele, “Sua função é
referir-se a situações estáticas ou a eventos não-específicos, delimitando o início
e/ou o fim de sua permanência no tempo” (op. cit.: 41). O autor apresenta os
exemplos: “há três anos, durante dois meses, até o ano que vem.”
Em relação à posição dos circunstancias na sentença, Martelotta (1994)
apresenta seis posições. As três antes do verbo são: 1) não ocorrendo sujeito
antes do verbo, 2) antes do sujeito, 3) entre o sujeito e o verbo. E as três depois
do verbo: 1) não ocorrendo complemento ou predicativo depois do verbo, 2)
39
entre o verbo e o complemento ou predicativo, 6) depois do complemento ou
predicativo.
Móia (1999) aponta que têm sido referidos, de maneira geral, casos em
que o complemento da expressão formada pelo verbo haver é um predicado de
quantidades de tempo, como três anos, muito tempo. Porém, esse complemento
pode também ser uma expressão que designa intervalos (há três domingos) ou
um predicado situacional (cinco refeições).
Ressalta, ainda, que as expressões com haver podem aparecer em, ao
menos, três contextos distintos: (i) como argumentos (geralmente
preposicionados) de predicados “Os vestígios arqueológicos encontrados datam
de há cem mil anos”; (ii) precedidas por uma preposição temporal em posição
adverbial “Esta cidade tem sido governada por autarcas socialistas desde há
duas décadas”; (iii) não precedidas de preposição e em posição adverbial “Esse
edifício foi demolido há dois anos”. Porém, o ator considera que “em todas
estas estruturas, os sintagmas encabeçados por haver são meramente expressões
designadoras de intervalos” (op. cit.: 220).
Toral (1992), ao analisar, na língua espanhola, o verbo hacer indicando
tempo cronológico, aponta que as expressões por ele formadas podem indicar
um caráter pontual (Hace seis ú ocho meses que dejé yo El cuartelllo) ou
durativo (¡Né! ¡Pero si hace diez dias que estoy aqui, gusano!) de “um estado de
coisas” a depender da correlação temporal entre o tempo do discurso e os
verbos envolvidos na construção.
Segundo a autora, o sintagma nominal que acompanha o verbo apresenta
as seguintes características: (i) São sempre substantivos que designam
transcurso de tempo; (ii) nunca aparecem precedidos do artigo definido, (iii)
podem ser contáveis, acompanhados por quantificadores (Hace dos años), ou
não contáveis (Hacia mucho tiempo).
Dapena (1983), também analisando a língua espanhola, questiona o
caráter funcional das expressões temporais formadas por hacer. Aponta algumas
dúvidas: essas expressões funcionam como subordinantes ou subordinadas?; se
40
subordinante, a que tipo de subordinada se relacionam?; como se ligam sem
conector?
Para ele, uma explicação pode ser considerar toda a expressão como uma
forma fixa, equivalente a um advérbio de tempo. O autor comenta, ainda, que
não há dúvida quanto ao caráter adverbial ou circunstancial da expressão, dada
a possibilidade de comutação com outros sintagmas adverbiais, como em: Su
padre murio { hace cuatro años / em mayo de 1982 / el domingo pasado / ayer / antes /
después etc.
Dapena afirma, porém, que tal explicação não dá conta de todas as
questões que envolvem as expressões com hacer e prossegue sua análise
buscando entender como funciona a oração formada por “hacer + que + or” e a
formada por or + hacer. As expressões formadas sem que14 são orações
adverbiais, porém são distintas das descritas nos tratados gramaticais. Afirma
que as orações temporais tradicionais situam temporalmente a ação de um
verbo em relação à ação de outro verbo, já as formadas por hacer situam
temporalmente a ação do segundo verbo em relação a quantidade de tempo
decorrido.
Sobre o verbo hacer, o autor diz “en este contexto se hallaría totalmente
gramaticalizado y cuya funcíon consistiría en indicar, por una parte, el término
ad quem del transcurso y, por outro lado, el carácter retospectivo del cómputo
realizado.” Por fim, menciona que se trata de um sintagma adverbial autônomo,
uma expressão adverbial.
Machado Vieira (2001), em sua tese de doutorado sobre predicações com
o verbo fazer, defende que esse verbo, ao atuar na indicação de tempo passado,
apresenta um comportamento gramaticalizado: “como operandum/operador
temporal, possuiria propriedades que o relacionam às categorias de verbo
predicador, operandum/operador causativo e constituinte gramatical de expressão
adverbial”.
14 As expressões formadas sem que assemelham-se às formadas por haver verificadas no corpus adotado.
41
Segundo ela, fazer junto de um SN temporal assume uma unidade com o
significado específico de “ter passado um determinado lapso de tempo, desde
certo fato”; “apresenta uma estrutura sintática e semântica previsível”; pode ser
substituído apenas por um número reduzido de verbos que tenham
comportamento sintático-semântico semelhante.
Por fim, Paiva, no trabalho Variação de HAVER, FAZER e TER em
expressões temporais15, apresentado na XXIX Jornada Giulio Massarani de
Iniciação Científica, Artística e Cultural da UFRJ, verificou que “a variante
HAVER é a mais produtiva em expressões temporais, seja na modalidade
escrita ou oral”. Nesse estudo, 81,8% das expressões foram formadas por haver,
13,1% por ter e 5,1 por fazer.
15 Trabalho de iniciação científica desenvolvido por Paiva, em 2007, juntamente com o grupo do projeto de pesquisa PREDICAR – coordenado pela Professora Doutora Marcia dos Santos Machado Vieira.
42
2. Pressupostos teóricos
Essa pesquisa baseia-se fundamentalmente em conceitos e pressupostos
da Teoria Funcionalista. Não obstante, lida ainda com teorizações da
Linguística Textual relativas aos conceitos de gêneros e tipos textuais e com
orientações teórico-metodológicas desenvolvidas no âmbito dos estudos
sociolinguísticos e relacionadas ao estudo das atitudes dos falantes de uma
língua e/ou das avaliações subjetivas de certas formas/estruturas linguísticas.
Recorreu-se a tópicos da Linguística Textual a fim de se obter
conhecimento sobre as diferenças de usos das expressões temporais em estudo
nos gêneros adotados e a métodos/técnicas e/ou materiais característicos dos
estudos sociolinguísticos com o intuito de se somar à análise qualitativa o
tratamento empírico e quantitativo de aspectos envolvidos no estudo do
fenômeno linguístico em foco.
2.1. Teoria Funcionalista
Na Teoria Funcionalista, concebe-se a língua como um instrumento de
interação social. Nessa corrente teórica, importa explicar as regularidades
observadas no uso com base no exame das circunstâncias discursivas em que se
dão as estruturas linguísticas e seus contextos prototípicos. Desta maneira, no
Funcionalismo rejeita-se a dissociação entre sistema e uso, ou língua e fala, já
que entende que pressões de ordem funcional moldam a estrutura da língua.
Conforme Martelotta & Áreas (2003: 20), “a língua não pode ser
analisada como objeto autônomo, mas como uma estrutura maleável, sujeita a
pressões oriundas das diferentes situações comunicativas, que ajudam a
determinar sua estrutura gramatical”.
Numa análise funcionalista, é relevante levar em consideração, além dos
fatores discursivos, os cognitivos e interacionais, tais como as intenções
comunicativas, o conhecimento de mundo partilhado entre falante e ouvinte e o
conhecimento a respeito do assunto. Moura Neves (1997:113) considera a
43
competência comunicativa como “a capacidade que os indivíduos têm não
apenas de codificar e decodificar expressões, mas também de usar e interpretar
estas expressões de uma maneira interacionalmente satisfatória.”
Por haver várias correntes, cada qual com suas particularidades, a
caracterização do Funcionalismo torna-se tarefa complexa. Porém, embora haja
vertentes distintas, todas apresentam pontos em comum, como aponta Moura
Neves (1997:2):
Qualquer abordagem funcionalista de uma língua natural, na
verdade, tem como questão básica de interesse a verificação de como
se obtém a comunicação com essa língua, isto é, a verificação do modo
como os usuários da língua se comunicam eficientemente.
Este trabalho segue pressupostos do funcionalismo norte-americano,
cujos textos pioneiros datam de 1970 e visam a observar a língua baseando-se
na situação de produção linguística. Alguns de seus principais representantes
são Talmy Givón, Paul Hopper, Sandra Thompson, entre outros.
Givón (apud Martellota et alii 2003: 28) apresenta um grupo de premissas
que caracterizam a visão funcionalista da linguagem:
i) A linguagem é uma atividade sociocultural;
ii) A estrutura serve a funções cognitivas e comunicativas;
iii) A estrutura é não-arbitrária, motivada, icônica;
iv) Mudança e variação estão sempre presentes;
v) O sentido é contextualmente dependente e não-atômico;
vi) As categorias não são discretas;
vii) A estrutura é maleável e não-rígida;
viii) As gramáticas são emergentes;
ix) As regras de gramáticas permitem algumas exceções.
44
Segundo essa concepção, a sintaxe é influenciada pela situação
comunicativa; isto é, a sintaxe, a semântica e a pragmática são interdependentes
e estão sempre relacionadas. Conforme Givón (1979), a sintaxe origina-se no
discurso, este considerado como o conjunto de estratégias aplicadas pelo falante
na organização funcional do seu texto para um dado ouvinte em determinada
situação comunicativa.
As questões principais investigadas na vertente norte-americana são as
circunstâncias discursivas envolvidas na utilização de diversas estruturas
linguísticas, a relação entre as estruturas e as necessidades/funções
comunicativas, os processos envolvidos na mudança linguística, entre outras.
Entre os temas presentes em estudos funcionalistas, vale destacar alguns
que interessam mais especificamente a esta pesquisa. São eles: transitividade,
planos discursivos, fluxo da informação e processo de gramaticalização.
2.1.1. Transitividade e planos discursivos
A relação entre transitividade e planos discursivos mostra-se
importante para o presente trabalho, pois eles correspondem a parâmetros que
são aqui analisados para a caracterização do comportamento das expressões
temporais em estudo. Em outras palavras, interessa verificar qual o contexto
prototípico para as expressões temporais, figura ou fundo. Parte-se da hipótese
de que as expressões, por indicarem circunstâncias, sejam mais produtivas em
trechos de fundo.
Segundo Hopper & Thompson (1980), o discurso narrativo apresenta as
duas estruturas, figura (foreground) e fundo (background), cada qual
caracterizada por determinados traços semântico-gramaticais. Esses conceitos
relacionam-se à noção de porção de texto central e periférica em termos de
estrutura.
Figura é a parte na qual são apresentados os pontos importantes do
discurso, caracterizada por sequência temporal de eventos concluídos,
pontuais, afirmativos, realis, sob a responsabilidade de um agente. Fundo, por
45
sua vez, é a parte que contém as informações que comentam ou ampliam o que
está sendo destacado pelo falante, correspondendo a localizações dos
participantes ou das situações, comentários avaliativos, descrições de ações,
estados e eventos simultâneos à porção textual de figura (Cunha, Oliveira &
Martelotta, 2003).
Conforme Hopper (1979), o plano discursivo figura está relacionado ao
que é narrado, é o conjunto das sequências narrativas; já fundo diz respeito a
fatores que estão fora da sequência em si, embora, de certa maneira, a
completem.
Esse conceito de planos discursivos está diretamente relacionado, de
acordo com Hopper e Thompson (1980), ao de transitividade. Dado isso, ambos
serão tratados em conjunto. Segundo esses autores, uma cláusula com alta
transitividade tende a funcionar no discurso no plano de figura, enquanto uma
com baixa transitividade tende a funcionar no discurso no plano de fundo.
De acordo com esses autores, a transitividade está relacionada à
efetividade de uma dada ação; isto é, quanto mais efetiva a ação, mais transitiva
é a sentença. Relaciona-se, também, à transferência, que se dá de um agente
para um paciente. Dessa forma, uma sentença transitiva envolve, ao menos,
dois participantes. Segue abaixo um quadro com os componentes considerados
para a verificação do grau de transitividade para os autores supracitados.
46
COMPONENTES ALTA TRANSITIVIDADE BAIXA TRANSITIVIDADE
1 Participantes um dois
2 Cinese ação não-ação
3 Aspecto télico atélico
4 Pontualidade pontual não-pontual
5 Volitividade intencional não-intencional
6 Polaridade afirmativa negativa
7 Modalidade modo realis modo irrealis
8 Agentividade mais agente menos agente
9 Afetamento do Objeto totalmente afetado não-afetado
10 Individualização do objeto muito individualizado não-individualizado
Quadro 4 – Componentes considerados em relação à transitividade por Hopper e Thompson (1980)
Esses componentes são utilizados para a verificação do grau de
transitividade da sentença através da atribuição de pontuação um para cada
item que confere alta transitividade à sentença e pontuação zero para os que
conferem baixa transitividade. Com base na baixa ou alta transitividade
apresentada pelas sentenças, é possível enquadrá-las nos planos discursivos
figura e fundo. Conforme os autores, os planos discursivos devem ser
analisados não só a partir de uma propriedade, mas de um conjunto delas.
Sobre os componentes, os autores defendem que só há transferência de
uma ação se houver, ao menos, dois participantes. Em relação à cinese, só há
transferência se houver ação; os estados não envolvem transferências entre
participantes. O aspecto diz respeito à completude da ação, em uma ação
perfectiva, a transferência é mais certa do que em uma ação em progresso. A
pontualidade é relacionada à duração, ações que se dão sem uma fase de
47
transição são mais efetivas que as que envolvem uma duração maior ou as
contínuas. Há volitividade quando o agente tem o propósito de fazer algo. A
polaridade é ligada a sentenças afirmativas, que indicam as ações que, de fato,
ocorreram, ou negativas, que indicam as ações que não se efetivaram. A
modalidade também está relacionada à concretização de uma ação: o modo
realis indica que algo, de fato, ocorreu, e o irrealis, algo que ainda não ocorreu.
Sobre a agentividade, um participante que é mais ativo pode transferir uma
ação mais efetivamente que um participante não ativo. Se o objeto é afetado, a
transferência se dá em maior grau. E, por fim, para a individualização do
objeto, Hopper e Thompson (1980) apresentam cinco fatores, conforme quadro
abaixo. O objeto será mais individualizado quanto mais características das
apresentadas na coluna “individualizado” do quadro o objeto possuir.
Individualizado Não-individualizado
próprio comum
humano, animado inanimado
concreto abstrato
singular plural
contável incontável
determinado, específico não-determinado
Quadro 5 – Fatores considerados na individualização do objeto por Hopper e Thompson (1980)
Com base nesses aspectos, percebe-se que a transitividade está presente
em diferentes partes de uma cláusula. Assim, a depender dessas partes, uma
sentença pode ser caracterizada como mais transitiva ou menos transitiva, de
acordo com uma noção de continuum (não categórico), uma concepção escalar.
Além disso, um componente da transitividade pode influenciar outro. A partir
48
dessa escala de transitividade, chega-se ao plano discursivo em que se encontra
o trecho no texto, conforme exemplo abaixo:
11. O dia amanheceu claro. Não tinha sol, mas, felismente, já não chovia
mais.
Era dia do meu aniversário, macabro porque na cidade em que eu moro
e Estile Estily, o dia do aniversário é dia de tortura. Falanse que a um
fantasma que aterrorisa a cidade a mais de 100 anos.
Todo mundo da cidade quando alguêm faz aniversário todo mundo foge
do local e vai para outro bem longe tem lendas que se o fantasma pegar
vai torturar até sair sangue. [Redação, 6º ano EF]
Fundo Figura
O dia amanheceu claro. Não tinha sol,
mas, felismente, já não chovia mais.
Era dia do meu aniversário, macabro
orque na cidade em que eu moro e
Estile Estily, o dia do aniversário é dia
de tortura.
Todo mundo da cidade quando
alguêm faz aniversário todo mundo
foge do local e vai para outro bem
longe tem lendas que se o fantasma
pegar vai torturar até sair sangue.
Falanse que a um fantasma que
aterrorisa a cidade a mais de 100 anos.
No texto acima, pode-se verificar que a sentença formada pela expressão
temporal com o verbo haver se encontra no plano discursivo figura, porque
49
apresenta alto grau de transitividade. Possui dois participantes (fantasma e
cidade); é uma ação na modalidade afirmativa; o sujeito é intencional e agente,
enquanto o objeto é afetado e individuado. Essa sentença apresenta pontuação
8, pois o verbo não é pontual e o aspecto dele não é perfectivo.
Silveira (1990), em estudo sobre a relevância em narrativas orais, faz uma
releitura da proposta de Hopper (1979). A autora destaca que Hopper (1979)
caracteriza figura pela sequencialidade e, então, propõe uma revisão desse
conceito, afirmando que, além da sequencialidade, a importância é outro fator
característico das cláusulas-figura.
Ela propõe também uma revisão do conceito de fundo, já que considera
muito abrangente a definição apresentada por Hopper (1979) de que essas
cláusulas ampliam e comentam as afirmações feitas pela figura. Segundo ela, há
distintos tipos de cláusulas-fundo e em seu estudo verificou 17 tipos dessas
cláusulas.
Assim, Silveira (1990) propõe uma hierarquia de fundidade abordando
os planos de figura e fundo como um processo contínuo. Para ela, há tipos de
fundo que se aproximam mais da figura e outros que se afastam. Adota, então,
em sua análise, cinco níveis de fundidade:
1º - apresentam informações concretas sobre o evento;
2º - especificam o âmbito em que os fatos ocorrem, as circunstâncias;
3º - especificam a cláusula anterior, ampliando as informações sobre ela;
4º - especificam relações inferidas dos fatos narrados através de especificação;
5º - apresentam interferências do falante no evento que está narrando.
Sobre a hierarquia proposta, a autora ressalta que serve apenas aos dados
de sua análise. No presente estudo, também será adotada uma hierarquia de
fundidade. Essa, porém, será baseada nos parâmetros de transitividade (cf. 4.2.).
50
2.1.2. Fluxo de informação
Na análise sobre a funcionalidade das expressões temporais formadas
por haver, chama atenção a questão da ordenação dos elementos na sentença,
que parece estar relacionada a aspectos discursivo-pragmáticos, como o fluxo
informacional. Sendo assim, fazem-se de extrema importância os postulados
sobre tal assunto neste trabalho. Dentre os autores que tratam o status
informacional, destacam-se Prince (1981) e Chafe (1984).
Prince contempla (a) a menção ou não do referente na sequência textual
anterior ou (b) sua presença no contexto situacional, adota as noções de
predicabilidade/recuperabilidade e conhecimento partilhado. Considera quatro
possibilidades de status informacional: novo em folha, inferível, disponível e
evocado. Por outro lado, Chafe não parte da menção no texto, mas centra-se na
noção de consciência do falante, em como são tratados os conceitos. Reformula,
então, a terminologia tradicional nova/velha e dado/novo em ativa,
previamente inativa, informações acessíveis ou previamente semi-ativas.
Optou-se, para a análise dos dados, pela adoção das categorias propostas
por Chafe (1984), focadas na consciência do falante. Segundo Furtado da Cunha
(2003:43), “a informatividade manifesta-se em todos os níveis da codificação
lingüística e diz respeito ao que os interlocutores compartilham, ou supõe que
compartilham, na interação”. O falante, na situação comunicativa, pressupõe o
que é ou não conhecido pelo ouvinte, e busca, a partir disso, moldar seu
discurso marcando as informações mais relevantes e as que seriam
desconhecidas do interlocutor.
Segundo Chafe (1984), o status informacional é relacionado a aspectos
cognitivos, tem relação com o “empacotamento” da informação, ou seja, com a
maneira como ela é armazenada na memória. O teórico preocupa-se, então, com
o que se passa na cabeça do falante quando manipula informação nova e velha,
tópico e comentário, sujeitos e predicados, unidades entonacionais, orações,
períodos e parágrafos — conceitos que, segundo o autor, são manifestações de
processos cognitivos básicos.
51
Ao analisar cognitivamente o fluxo de informação, Chafe reavalia os
conceitos de dado e novo e propõe em seu lugar os termos informação ativa
(que está no foco de consciência do falante), previamente inativa (localizados na
memória de longo prazo) e adiciona o conceito de informação semi-ativa (está
na consciência periférica, mas não no foco).
Afirma, também, que, embora a mente armazene muitas informações, a
cada momento apenas uma pequena parte pode estar ativa ou estar em foco,
devido a limitada capacidade do ser humano de ativar informações. Essas
informações temporariamente ativas são verbalizadas pelo falante, uma após a
outra, e cada porção dessas de informação compõe uma unidade entonacional.
Chafe define unidade entonacional como “uma seqüência de palavras
combinadas sob um único e coerente contorno entonacional, geralmente
precedido por uma pausa” (op. cit.: 22). As unidades entonacionais são,
geralmente, orações e servem para desenvolver o fluxo informacional no
discurso. Não ocorrem dois conceitos novos em uma única unidade
entonacional e elas têm a função de fornecer orientação (temporal, espacial,
epistêmica) para as adjacentes, seja anterior ou posterior. As ideias que são
expressas em unidades entonacionais (objetos, eventos e propriedades) são
denominadas pelo autor de conceitos. Os estados de ativação referem-se aos
conceitos que residem nas partes de informações expressas na unidade
entonacional.
Segundo Chafe, quando os conceitos estão ativados na mente do
comunicante, o mesmo julga que estejam também ativos para o interlocutor,
visto que são informações velhas. Esses conceitos são pronunciados de forma
atenuada (átona) e são passíveis de pronominalização ou omissão. Porém,
quando o comunicante reintroduz ou enfatiza uma informação já ativa, o
pronome pode aparecer com acento forte para contrastar com o discurso
anterior.
Os conceitos semi-ativos são aqueles dos quais os participantes têm
consciência ou conhecimento. Um conceito pode tornar-se semi-ativo por
52
desativação de um estado ativo anterior ou por associação a esquemas
cognitivos. Essa associação ocorre porque, quando um dado esquema é evocado
no discurso, conceitos relacionados a ele passam ao estado de semi-ativação,
podem ser inferíveis.
Os conceitos inativos são aqueles que não se tornaram ativos nem pelo
discurso prévio nem por evocação de esquema cognitivo, são informações
novas. Trazer esses conceitos não ativados requer um maior esforço cognitivo,
por isso só se ativa um conceito por vez durante a pausa inicial, que tem uma
duração maior.
Há duas formas de ativação de um conceito: passagem do estado
previamente não ativo para o ativo ou do semi-ativo para o ativo
(rememoração). E uma para a desativação de um conceito: passagem do estado
ativo para o semi-ativo.
No trecho abaixo, há um exemplo de ativação de um conceito
previamente inativo. Trata-se da introdução de uma informação nova. Ainda
não havia sido feita, no texto, qualquer referência à Guerra Mundial.
12. A Copa do Mundo do Brasil em 1950
A Segunda Guerra Mundial terminara havia cinco anos. E os países
europeus, com as finanças arrasadas, não puderam bancar a realização
da Copa do Mundo. O Brasil se apresentou como solução e pôs fim ao
período de 12 anos sem o maior evento do futebol (o último Mundial
tinha sido em 1938, na França). O país construiu o maior estádio do
planeta na época, o Maracanã. [Jornal, O Globo]
No exemplo 13, por outro lado, a expressão representa um conceito semi-
ativo. Já no título há informação sobre o grande número de assaltos. Então,
devido a uma associação a esquemas cognitivos, torna-se acessível a informação
de que “Há duas semanas, três homens armados invadiram, no início da
manhã, um prédio na Rua General Roca”.
53
13. Assaltos sobem 87%
Os índices da violência de julho, os últimos divulgados pelo Instituto de
Segurança Pública (ISP), da Secretaria de Segurança, mostram que o
número de assaltos a residências subiu 31% no estado, passando de 98
casos, em 2008, para 129 este ano. Na capital, o aumento foi maior: 87%,
de 24 casos, em julho de 2008, para 45, em julho deste ano. Segundo a
polícia, há quatro quadrilhas atuando na capital.
Há duas semanas, três homens armados invadiram, no início da manhã,
um prédio na Rua General Roca, na Tijuca. Os criminosos saquearam
cinco dos 14 apartamentos. (...) [Jornal, O Globo]
No trecho abaixo, há um exemplo de um conceito que estava
previamente ativo:
14. (...) Depois eu fui para casa do meu avó e passei o carnaval inteiro la foi
muito legal e me diverti bastante e reencontrei meus amigos porque eu
nasci e morei lá por bastante tempo, mas me mudei para o maracanã e
tou morando lá a 2 anos e meio (...) [Redação, 9º ano EF]
O narrador primeiro afirma que se mudou para o Maracanã, assim ativa
o conceito de que mora no Maracanã; depois afirma morar nesse lugar há 2
anos e meio, retomando o conceito.
Os autores afirmam que a forma mais comum de se apresentar uma
informação é escolher um conceito como ponto de partida e adicionar
informação acerca dele. A relação entre os conceitos de “ponto de partida” e
“informação acrescentada” ocorre ao passo que, geralmente, aquele é um
referente ativado (velho) ou acessível, só será novo no início do discurso, e este
contém um conceito novo, pode conter conceitos acessíveis, ou mesmo velho, se
expressar um contraste.
54
O conceito de oração aqui é ampliado (extended clauses), abrangendo
orações simples ou acrescidas de fragmentos de orações, orientações, etc. As
orações são unidades que os falantes encadeiam com marcas de conexão, tais
como e, aí, então etc. Vale ressaltar que o estudo do autor é baseado na língua
oral espontânea, e o presente trabalho centra-se na língua escrita; por isso, há
adaptações dos conceitos.
2.1.3. Processo de Gramaticalização
O termo gramaticalização é adotado por diversos autores funcionalistas
que investigam mudanças linguísticas decorrentes do uso; mas, segundo Moura
Neves (2004), há várias divergências e abrangências em relação a esse termo.
Identificam-se diferentes definições para gramaticalização, de acordo com a
concepção de cada estudioso.
Segundo Heine (2003), os estudos acerca da gramaticalização se dividem
em três fases históricas: i) filósofos franceses e ingleses do século XVIII, tais
como Etienne Bonnot de Condillac e John Horne Tooke; ii) linguistas alemães
do século XIX e início do século XX, Franz Bopp e Meillet e iii) Talmy Givón,
como principal representante da década de 70 em diante. Meillet é apontado
como o primeiro estudioso a definir gramaticalização tal como é concebida hoje.
Segundo ele, o termo refere-se “à passagem de uma palavra autônoma, à função
de elemento gramatical” (Meillet, 1912 apud Gonçalves, Lima-Hernandes e
Casseb-Galvão, 2007:19).
Para Moura Neves (2004), nas décadas de 80 e 90, autores tais como
Traugott e Heine apresentam ideias que vão ao encontro das do precursor
Meillet. Eles relacionam gramaticalização à parte da teoria da linguagem
ocupada pela interdependência entre langue e parole, o categorial e o menos
categorial, o fixo e o menos fixo da língua. Heine (2003) indica contribuições de
alguns autores para as teorias sobre gramaticalização, tais como: i) Traugott,
que colaborou com novas maneiras para a reconstrução da mudança semântica;
ii) Bybee, que se ocupou da descrição e explicação das estruturas de categorias
55
gramaticais de diferentes línguas; iii) Hopper, que evidenciou um movimento
contínuo envolvido em estratégias recorrentes usadas na construção de
discursos. Por fim, há a contribuição de Heine (2003), segundo o qual a
principal motivação que orienta a gramaticalização é a comunicação.
Neste trabalho, adotam-se os parâmetros e/ou princípios discutidos em
Hopper (1991), Heine (2003), Bybee (2003). Esses princípios enfatizam o aspecto
gradual da gramaticalização, visto que conferem aos elementos analisados o
grau de “mais” ou “menos” gramaticalizados. A gramaticalização, aqui, é vista,
então, como um processo por meio do qual elementos lexicais, ao longo do
tempo, se desenvolvem passando a elementos gramaticais em certas
construções, que podem tornar-se mais gramaticais ainda — um processo que
segue um continuum de mudança.
Nesse processo de mudança, um elemento ou expressão é utilizado(a)
desempenhando novas funções gramaticais ou novos significados na
organização da frase/discurso, diferentes do(a) inicial. Martelotta (2006) define
o termo gramaticalização como
processo unidirecional, segundo o qual itens lexicais e construções
sintáticas, em determinados contextos, passam a assumir funções
gramaticais e, uma vez gramaticalizados, continuam a desenvolver
novas funções gramaticais. Com o processo de gramaticalização, que
ocorre basicamente com itens ou expressões muito freqüentes, o termo
tende a sofrer desgaste fonético e perder expressividade, deixando de
fazer referência a entidades do mundo biossocial para assumir
funções de caráter gramatical, como ligar partes do texto, indicar
categorias gramaticais como o tempo de um verbo ou o gênero de um
nome.
Segundo Heine et alii (1991), no processo de gramaticalização está
envolvido o mecanismo da metáfora. Para a adoção de rótulos para novos
conceitos, a estratégia mais recorrente é a utilização de formas já existentes na
56
língua, que são introduzidas em contextos novos e aplicadas a novas situações.
Os autores apontam que conceitos mais concretos são usados para apresentar
conceitos menos concretos, conforme a escala de graus de abstração metafórica:
PESSOA > OBJETO > ATIVIDADE > ESPAÇO > TEMPO > QUALIDADE
Objetos concretos (partes do corpo), processos, verbos servem,
geralmente, como pontos de partida do processo de gramaticalização. O
processo, porém, tende a resultar em noções mais abstratas e elementos
relativos à organização interna do texto.
Heine (2003) apresenta quatro mecanismos básicos envolvidos na
gramaticalização de expressões linguísticas:
i) Dessemantização (bleaching) – perda semântica que uma expressão sofre num
determinado contexto;
ii) Extensão – uso de uma expressão em novos contextos;
iii) Decategorização – perda de propriedades características das formas fonte,
perda morfossintática;
iv) Erosão (redução fonética) – é a perda de substância fonética.
Esses mecanismos não são específicos de gramaticalização, mas, estando
inter-relacionados, são responsáveis por ela.
O autor descreve um modelo do processo de gramaticalização: há uma
expressão linguística A que é recrutada para a gramaticalização, ela adquire um
novo uso B, havendo ambiguidade entre A e B, depois A é perdido, havendo
somente o uso B. Porém, Heine afirma que nem todas as expressões linguísticas
chegam ao uso B.
Hopper (1991) propõe cinco princípios essenciais que auxiliam na
verificação dos estágios iniciais do processo de gramaticalização. São eles:
57
i) estratificação (layring) – em um domínio funcional complexo, surgem novas
formas que coexistem e interagem com as antigas, que não necessariamente
deixam de ser produzidas. Ou seja, está relacionado à tendência de as línguas
apresentarem mais de uma forma para desempenhar funções idênticas.
(ii) divergência (divergence) – quando uma forma sofre gramaticalização, pode
preservar sua forma lexical de origem, estando sujeita às mesmas mudanças de
qualquer outro item lexical. Da mesma origem podem surgir várias formas com
diferentes funções.
OBS: A diferença entre estratificação e divergência é que neste um mesmo item
lexical se gramaticaliza em um contexto e não em outro, e naquele, domínios
funcionais similares envolvem itens lexicais diferentes.
iii) especialização (specialization) – há uma redução de funções da forma
gramaticalizada, isto é, um estreitamento de possibilidades para expressão de
uma dada noção gramatical, assim, um número menor de formas assume a
expressão de sentidos mais gerais.
iv) persistência (persistence) – após passar pelo processo de gramaticalização,
uma forma pode continuar com traços de seu significado original e pode
manter também particularidades de sua história.
v) decategorização (de-categorization) – a forma gramaticalizada tende a perder
marcas morfológicas ou privilégios sintáticos característicos de categorias
plenas e passam a assumir características de categorias secundárias.
Um fator considerado como caracterizador do processo de
gramaticalização é a frequência de uso, segundo Bybee (2003). Quando uma
forma passa a ocorrer com maior frequência, ela começa a ser interpretada
como uma forma ‘padrão’ para expressar um conceito — há uma “ritualização”,
dada a repetição do processo. Essa ritualização é característica da
gramaticalização, visto que uma expressão usada de modo frequente passa a ser
automática, como uma única unidade de processamento, e seus componentes
58
individuais podem sofrer um enfraquecimento semântico, desassociando-se dos
demais usos.
O autor chama atenção para o fato de que toda a construção sofre
gramaticalização, não apenas o item — o processo ocorre porque o elemento
está inserido em um dado contexto. A frequência não é apenas o resultado da
gramaticalização, mas também um fator motivador de tal processo. Bybee
indica que frequência provoca:
1) um enfraquecimento da força semântica de determinado item linguístico pelo
hábito;
2) a redução ou fusão fonológica da construção em sentenças de informação
velha ou de fundo;
3) o condicionamento de uma maior autonomia para a construção, gerando
enfraquecimento ou perda de associação com outros usos dos mesmos itens;
4) a perda da transparência semântica, o que propicia o uso da construção em
novos contextos, estabelecendo mudança semântica;
5) a autonomia do elemento frequente, o que faz com que ele fique mais fixo na
língua.
Há dois métodos de controle frequência: o que examina a frequência de
ocorrência – que diz respeito à produtividade de um item em um dado corpus; e
o que verifica a frequência de tipo, relacionada a uma estrutura em particular,
um padrão específico dentre os possíveis.
Vale ressaltar que, conforme Hopper & Traugott (1993), há dois pontos
de vista para o estudo da gramaticalização: o histórico, focado no percurso
diacrônico de algumas formas linguísticas e nas mudanças típicas que as
afetam; e o mais focado nos padrões fluidos do uso linguístico, observando o
processo que pode passar por um percurso completo de mudança ou ser
interrompido em certo ponto. Este estudo caracteriza-se como o segundo tipo,
uma observação dos usos linguísticos de forma sincrônica.
59
2.2. Gêneros e tipologias textuais
A análise das características gerais das expressões em cada subamostra
adotada nesta pesquisa indicou a necessidade de entendimento dos gêneros
textuais que compõem o corpus. Assim, fez-se um levantamento teórico,
primeiramente, sobre gêneros e tipos textuais — em especial a tipologia
narrativa — e, em seguida, sobre o gênero notícia jornalística e o gênero
narrativa escolar.
O tratamento de gêneros textuais requer, primeiramente, o entendimento
do que é texto. Nesta análise, adotou-se o conceito de Koch & Travaglia (1991),
que caracterizam texto como
unidade lingüística concreta — perceptível pela visão ou audição —
que é tomada pelos usuários da língua — falante, escritor/ouvinte,
leitor — em uma situação de interação comunicativa, como uma
unidade de sentido e como preenchendo uma função comunicativa
reconhecível e reconhecida, independentemente da sua extensão. (op.
cit.: 10).
Segundo os PCN (1998:21), “O discurso, quando produzido, manifesta-se
linguisticamente por meio de textos. O produto da atividade discursiva oral ou
escrita que forma um todo significativo, qualquer que seja a sua extensão, é o
texto.”
Para o entendimento dos gêneros, tomou-se como base, entre outras, a
visão de Marcuschi (2002), que define gêneros textuais como textos
materializados, do cotidiano, que apresentam características sócio-cognitivas
definidas por conteúdos, propriedades funcionais, estilo e composição
característica. Aponta, também, que os gêneros se organizam internamente de
diferentes maneiras, e a essas formas de organização textual chamam-se tipos
textuais.
60
Travaglia (2007) indica que o gênero se caracteriza por exercer uma
função social específica de comunicação e que cada gênero possui uma função
sociocomunicativa. Ressalta, também, a natureza social dos gêneros, exterior ao
texto. Os falantes conhecem diversos gêneros e sabem qual gênero usar em cada
situação.
Mikhail Bakhtin define os gêneros como “tipos relativamente estáveis de
enunciados” (BAKHTIN, 1997, p. 279) e aponta:
A utilização da língua efetua-se em forma de enunciados (orais e
escritos), concretos e únicos, que emanam dos integrantes duma ou
doutra esfera da atividade humana. O enunciado reflete as condições
específicas e as finalidades de cada uma dessas esferas. (BAKHTIN,
1997, p. 279).
O tipo textual é definido, segundo Marcuschi (2002), pela natureza
linguística de sua composição, isto é, os aspectos lexicais, sintáticos, tempos
verbais e relações lógicas. No quadro abaixo, Marcuschi (2002:23) diferencia
tipos e gêneros textuais:
TIPOS TEXTUAIS GÊNEROS TEXTUAIS
• Constructos teóricos definidos por
propriedades lingüísticas intrínsecas.
• Constituem seqüências lingüísticas ou
seqüências de enunciados e não são
textos empíricos.
• Sua nomeação abrange um conjunto
limitado de categorias teóricas
determinadas por aspectos lexicais,
sintáticos, relações lógicas, tempo
• Realizações lingüísticas concretas
definidas por propriedades sócio-
comunicativas.
• Constituem textos empiricamente
realizados cumprindo funções em
situações comunicativas.
• Sua nomeação abrange um conjunto
aberto e praticamente ilimitado de
designações concretas determinadas
61
verbal.
• Designações teóricas dos tipos:
narração, argumentação, descrição,
injunção, exposição.
pelo canal, estilo, conteúdo,
composição e função.
• Exemplos de gênero: telefone,
sermão, carta comercial, romance,
bilhete, aula expositiva, reunião de
condomínio, horóscopo, outros...
Quadro 6 - Caracterização de gêneros e tipos textuais segundo Marcuschi (2002)
Marcuschi (2002:25) destaca que todos os gêneros são organizados por
tipos textuais, e um único gênero pode realizar diferentes tipos. “Assim, um
texto é em geral tipologicamente variado (heterogêneo)”. Ainda segundo ele,
“quando se nomeia um certo texto como ‘narrativo’, ‘descritivo’ ou
‘argumentativo’, não se está nomeando o gênero e sim o predomínio de um
tipo de sequencia base. (op. cit.: 27)
O autor indica que os tipos textuais se definem pelos traços linguísticos
predominantes, tais como aspectos lexicais, sintáticos, tempos verbais, relações
lógicas. Compõem-se pelos conjuntos de traços que formam uma sequência.
Marcuschi apresenta, então, cinco tipos textuais com base em Werlich (1973):
argumentativo, descritivo, expositivo, injuntivo e narrativo.
Segundo Travaglia (2007), a tipologia é constituída pelo modo de
comunicação, varia de acordo com a maneira de interlocução adotada pelo
produtor. Ele aponta quatro tipos textuais: descrição, dissertação, narração e
injunção.
Em especial sobre o tipo narrativo, Travaglia (1991) indica:
O tipo narrativo tem como conteúdo temático os acontecimentos ou
fatos organizados em episódios (indicação e detalhamento —
geralmente por meio de descrição — de lugar, tempo,
participantes/actantes/personagens + acontecimento: ações, fatos ou
fenômenos que ocorrem) (apud Travaglia, 2007:43)
62
O autor detalha algumas características da tipologia textual narrativa
(Travaglia, 2003).16
Perspectiva do produtor do
texto
Enunciador na perspectiva do fazer /acontecer
inserido no tempo.
Objetivo do enunciador
O que se quer é contar, dizer os fatos, os
acontecimentos, entendidos como os episódios, a
ação/o fato em sua ocorrência.
Forma como se instaura o
interlocutor
Como assistente, espectador não participante, que
apenas toma conhecimento do(s) episódio(s)
ocorrido(s).
Tempo referencial Não simultaneidade das situações, portanto
sucessão.
Relação entre o tempo de
enunciação e o referencial.
O tempo da enunciação pode ser posterior,
simultâneo ou anterior ao tempo referencial.
Quadro 7 – Quadro adaptado das características da tipologia textual narrativa
Em seu estudo sobre o funcionamento textual-discursivo do verbo no
Português do Brasil, Travaglia (1991) menciona relações entre o uso dos tipos
de verbos e situações por eles indicadas e o uso das formas e categorias verbais
e os tipos de textos (descrição, dissertação, injunção e narração). Destacam-se,
então, alguns pontos característicos dos verbos nos textos narrativos:
a) os verbos gramaticais predominantes são os marcadores temporais
e os auxiliares aspectuais, o que é coerente com a propriedade dada
pela perspectiva de inserção no tempo e também os auxiliares
semânticos (que dão detalhes ou nuances dos fatos narrados); 16 Quadro adaptado de Travaglia 2003. No original são tratados os quatro tipos textuais, aqui optou-se pela exposição apenas da tipologia narrativa – foco de análise.
63
b) são constituídos essencialmente por verbos dinâmicos (ações, fatos,
fenômenos, transformativos);
c) aparecem verbos enunciativos de contar e assistir, já que o produtor
é o contador e o receptor é o assistente dos episódios: presenciar,
assistir, ver (tudo/o que acontecer/suceder/ocorrer), contar, relatar,
narrar, falar/dizer (tudo/o que acontecer/ suceder/ocorrer);
d) só são possíveis com o aspecto perfectivo que caracteriza a
narração. Dos aspectos de duração, os mais característicos da narração
são o durativo, o iterativo e o pontual;
e) as modalidades características desse tipo de texto são a certeza e a
probabilidade, uma vez que são os textos que dão a conhecer os
acontecimentos;
f) também para a narração o tempo atualizado depende da relação
entre o tempo referencial e o da enunciação: a) presente na narração
presente (85,65% dos verbos com tempo atualizado. O passado
aparece com função retrospectiva.); b) passado na narração passada
(98,50% dos verbos com tempo atualizado). O presente aparece com
função de relevo emocional; c) futuro nas narrações futuras (os dados
não foram quantitativamente significativos, mas confirmam a
hipótese). (apud Travaglia, 2007:66)
Por fim, pode-se definir narrativa como:
entidade formal e funcional. Formal na medida em que se identifica
como discurso constituído à base de padrões recorrentes,
característicos, discriminados desde o nível da oração, passando por
unidades maiores, até o nível da narrativa simples completa.
Funcional, na medida em que esses padrões são identificados a partir
das funções que o discurso narrativo cumpre na situação da
comunicação: uma ‘função referencial’, uma vez que uma de suas
finalidades é recapitular experiências passadas, com a
particularidade de que a seqüência das orações narrativas se
organiza de maneira semelhante à seqüência temporal dos
acontecimentos vividos pelo personagem-narrador, e uma ‘função
64
avaliativa’, desde que, normalmente, o relato da experiência
passada revela o empenho pessoal do narrador no sentido de
valorizar os fatos narrados de forma a acentuar seu caráter 'narrável'.”
(LABOV & WALETZKY apud BASTOS, 1985, p. 23-4).
Com base nas propostas acima, caracterizam-se tanto as narrativas
escolares quanto as notícias jornalísticas como textos do tipo narrativo. A
seguir, procura-se caracterizar os dois gêneros textuais que compõem o corpus
dessa pesquisa.
2.2.1. Notícia jornalística
A notícia é um gênero bastante comum, do qual muitos usuários da
língua têm conhecimento e, por conseguinte, domínio, tanto no que diz respeito
à sua identificação/reconhecimento quanto ao emprego/produção. Ela é
caracterizada como um meio de divulgação de dados ou acontecimentos
socialmente relevantes no passado, presente ou futuro. Pode tratar de diferentes
assuntos, tais como política, economia, cultura, esporte etc.
Como em qualquer enunciado, identificam-se nas notícias um
enunciador (quem fala/produz o texto), seu interlocutor (para quem se
fala/produz) e um suporte (meio através do qual se efetua a comunicação). Os
textos analisados têm como suporte um jornal impresso. O enunciador é um
jornalista que tem como objetivo principal fazer de seu texto uma fonte de
informação. Esse enunciador centra-se na informação e no leitor, seu
interlocutor. Para garantir a precisão, oferece dados estatísticos, depoimentos,
indicações exatas das pessoas do discurso, do tempo e do espaço.
O enunciador usa, ainda, como recurso para provocar uma identificação
com o leitor uma linguagem objetiva em um texto sintético, formulado em
terceira pessoa. Devido à necessidade de concisão, e ao auxílio de outros
recursos, tais como fotografias e infográficos, o texto noticioso é, geralmente,
simplificado, e centrado nos elementos que potencialmente podem atrair a
65
atenção. As notícias são predominantemente do tipo narrativo, mas comumente
apresentam trechos descritivos e podem conter trechos dissertativos/
argumentativos.
Sobre a estrutura, sabe-se que, em geral, na porção inicial, há indicação
do que se trata o texto, declarando o evento principal e/ou outros eventos.
Aparecem inicialmente duas partes destacadas com letra diferenciada: o título
principal ou manchete e o subtítulo da manchete.
Na primeira sentença ou parágrafo da notícia, aparece o Lead, que repete
a declaração inicial e busca esclarecer as questões Quem?, O quê?, Onde?,
Quando? e Como?. Esse recurso facilita a compreensão do texto, já que esclarece
para o leitor o evento narrado e seus participantes.
No corpo do texto aparecem informações adicionais que situam e dão
clareza ao fato narrado. Em algumas notícias há um ativamento de informações
relacionadas à principal, com a inserção de dados relevantes para a
compreensão do evento. Essas informações podem ser de contexto (presente) —
correspondendo ao momento ou à situação em que o evento ocorre — ou
histórica (passado) — informando o leitor sobre circunstâncias anteriores ao
evento narrado.
As notícias podem apresentar, ainda, algumas consequências ou
indicações sobre o assunto. Podem dar informações posteriores ao evento,
declarações de envolvidos, ou de pessoas relacionadas ao acontecimento e as
implicações do evento narrado.
Há um esquema convencional da estrutura das notícias que é chamado
de pirâmide invertida:
66
_____________________________________________
Quem • O quê • Quando • Onde • Como • Por Quê (leade)
_____________________________________
Informações que complementam o leade
_______________________________
Detalhes de importância mediana
_________________________
Detalhes secundários
________________
(Zanchetta apud Frare & Oliveira, 2006)
Alguns desses pontos podem ser verificados na notícia jornalística da
subamostra do jornal O Globo que segue abaixo:
Título
Subtítulo
Lead
Evento
Contexto
presente
15. PMS EVITAM QUE MAIS UM ÔNIBUS SEJA INCENDIADO EM
FAVELA NA MARÉ
Criminosos assaltaram passageiros na Linha Amarela e sequestraram
veículo
A rápida ação de policiais do 22º BPM (Penha) evitou ontem de manhã
que traficantes da Vila do João, no Complexo da Maré, em Bonsucesso,
incendiassem um ônibus da linha 485 (Penha-Leblon), que fora assaltado
e sequestrado momentos antes num ponto na Linha Amarela, perto da
Vila dos Pinheiros.
Quando se preparavam para atear fogo ao veículo, os criminosos foram
surpreendidos pelos PMs. Os bandidos fugiram e o ônibus foi levado
pelos policiais para a 21ª DP (Bonsucesso).
Eram cerca de 6h quando três homens, um deles armado de pistola,
fizeram sinal ontem para o 485 parar. Os cerca de 35 passageiros foram
saqueados e liberados. Já o motorista e o trocador foram obrigados a
seguir com os bandidos até a Vila do João, onde só então receberam
ordem para descer.
67
Conse-
quências
Contexto
passado
Contexto
passado
Depois que os policiais resgataram o veículo, o motorista, que pediu para
não ser identificado, contou que ficara o tempo todo com uma arma
encostada em sua cabeça.
Ele informou que o ônibus não tem câmeras.
Polícia diz que parte do bando já foi identificada.
Segundo policiais da 21ª DP, parte da quadrilha que vem assaltando
ônibus na região já está identificada.
— Estamos de olho naquela região — disse a delegada titular Valéria de
Castro. — A Polícia Militar chegou a tempo de evitar que o ônibus fosse
incendiado. O veículo estava cheio de trabalhadores.
Eles tiveram roubados celulares e dinheiro.
Há oito dias, num caso parecido, quatro criminosos incendiaram um
ônibus da linha 634A (Ilha do Fundão-Del Castilho, que faz integração
com o metrô), na Vila dos Pinheiros, também na Maré, depois de
sequestrá-lo na Linha Amarela e assaltar os passageiros.
Os bandidos aproveitaram que o ônibus parou num ponto da via
expressa para render o motorista, que foi obrigado a levar o veículo para
a favela. Lá, cerca de 30 passageiros foram saqueados e depois receberam
ordem para desembarcar.
O ônibus, então, foi incendiado.
Policiais do 22º BPM (Maré) e do Serviço Reservado (P2) chegaram à
comunidade logo depois, mas não conseguiram evitar que o veículo fosse
destruído.
Segundo a delegada Valéria de Castro, tanto no caso de ontem como no
anterior, o ônibus foi sequestrado no mesmo ponto.
Ela informou que o trecho é o mesmo também onde, no dia 5 deste mês, a
professora de educação física Ciléa Cordeiro, de 27 anos, teve seu carro
atingido por uma pedra. Perto dali também, o fiscal da Secretaria de
Transportes Marcos Tognozzi teve o carro atacado a pedradas no último
dia 16.
Ônibus com funcionários da Petrobras também foi atacado Outro caso
registrado na Linha Amarela aconteceu no dia 26 de agosto passado. As
vítimas foram funcionários da Petrobras que eram levados para o
68
2.2.2. Redação / narrativa escolar17
O gênero redação escolar é estritamente ligado à situação de ensino, é
trabalhado em sala de aula, muitas vezes sem que se considerem os contextos
extra-instituição escolar e necessidades reais de interação, comunicação e
“ação”/intervenção/participação na sociedade. O enunciador nesse gênero é
um aluno, que, em geral, tem como objetivo exclusivo atender a uma tarefa
proposta pelo professor, que, por sua vez, lê o texto, entre outras finalidades,
com o intuito de corrigi-lo.
Na tarefa de produzir redações, percebe-se uma preocupação com o
domínio das regras gramaticais do registro formal e com o atendimento à
temática dada, visto que o aluno precisa atender ao que o professor propõe para
obter o grau de excelência em jogo nesse ambiente de produção textual.
A redação escolar é um gênero produzido sob a pressão desse ambiente e
sob a pressão da hierarquia que se estabelece entre os interlocutores
(professor/aluno). Por isso, em todos os níveis de escolarização é comum os
alunos-produtores reagirem negativamente ou, pelo menos, com certo
desconforto às situações de redação propostas.
Segundo Beth Marcuschi (2005),
17 As redações adotadas na presente pesquisa são do tipo narrativo; por essa razão, como já mencionado, serão tratadas como narrativas escolares.
trabalho de ônibus.
Por volta das 7h, três criminosos armados entraram no veículo, que fez
uma parada na via expressa, perto da Vila do João, para pegar mais um
passageiro.
Dos 28 ocupantes do ônibus, oito ficaram sem joias, celulares, carteiras,
bolsas e dinheiro, entre outros objetos de valor. Segundo as vítimas, os
assaltantes pareciam calmos. Após a fuga dos criminosos, o motorista
mudou seu itinerário e foi direto para a 21ª DP.
69
Com base em sua avaliação o professor faz com que o aluno, além de
absorver, aos poucos, a cultura escolar, incorpore a lição de que deve
escrever pouco e recorrer a frases estereotipadas. [...] Neste sentido, o
aprendiz exercita predominantemente a reprodução mecânica, e a
redação consolida-se como uma atividade controlada de escrita. (op.
cit.: 145)
As redações do tipo narrativo têm como características a presença de um
narrador, de personagens, de um fato, de acontecimentos ou ações que
localizam no tempo e no espaço. Quanto às propriedades linguísticas desse
tipo, utilizam-se referências diretas às personagens (eu, ele, meu, dele) e ao
quadro espaço-temporal (há dois anos, um dia, em São Paulo, em seu quarto
etc.), além do uso de verbos de ação no pretérito perfeito ou imperfeito. Espera-
se que nas narrativas escolares sejam apresentados elementos centrais, tais
como o anúncio do tema, apresentação de personagens, apresentação das
circunstâncias, problema, solução e a conclusão.
Segundo Bastos (2001), nas narrativas escolares é possível perceber um
maior ou menor grau de envolvimento dos alunos-produtores que depende da
situação de produção na qual ele está inserido. Esse envolvimento do aluno
pode provocar ou não particularidades no texto, tais como a presença de um
resumo/orientação ou a maneira como o aluno se coloca em seu texto.
Diferentemente das notícias, a narrativa escolar pode ser redigida em 1ª
ou 3ª pessoa. O aluno-produtor pode se incluir no texto, sendo um narrador-
personagem, ou não se incluir, sendo um narrador-observador. O narrador
pode, também, iniciar seu texto apresentando sentenças que resumem a
história, assim pode despertar o interesse do leitor.
Nas narrativas analisadas foi possível verificar os dois tipos de
narradores e ainda alguns textos iniciados por um resumo. Na narrativa (16), o
produtor do texto participa como narrador-personagem e inicia seu texto
apresentando uma orientação na frase “há dez anos ocorreu algo perigoso e
70
engraçado”. Já no exemplo (17), a narração é feita em 3ª pessoa, com um
narrador-observador.
16. O afogamento
Há dez anos ocorreu algo perigoso e engraçado. Eu estava em uma
reunião em família em uma sítio, nós fomos brincar em um lago
próximo, eu estava com o meu amigo jogando a bola para lá e para cá, ó
que em um momento a bola estorou. [...] [Redação, 9º ano]
17. Em um dia bem lindo, a muito tempo atrás, um garoto chamado Walace
andava calmamente até a locadora para trocar a fita e mega drive (FIFA
98), tudo foi dando certo, mas no meio do caminho de volta para casa,o
garoto pisa em um prego enferrugado, assim fazendo o correr
desesperado para casa, após chegar em casa, sua mãe calmamente tira o
prego do seu filho e todo mundo fica feliz. Fim da historia. [Redação, 2º
ano]
Sobre a ordenação, diferentemente das notícias, é comum, nas redações
escolares, que se faça a exposição das circunstâncias e justificativas
primeiramente, para posteriormente apresentar o foco da narrativa. Segue-se,
geralmente, a estrutura de introdução, desenvolvimento e conclusão de tal
forma que se apresentam as personagens e a localização espaço-temporal, para
posteriormente construir-se a trama e apresentar-se o desfecho.
Verificam-se algumas das características mencionadas no texto abaixo,
que compõe a subamostra das narrativas escolares:
71
Título
Apresentação de
personagens /
Localização
tempo- espaço
Fato
Ações/
acontecimentos
Conclusão
18. A sete anos atrás, aconteceu uma coisa muito engraçada!
Uma vez, a minha mãe estava na casa de uma amiga... E nesse dia
estava chovendo muito, então a minha mãe foi embora, e a chuva
ia cada vez mais aumentando, a minha mãe abriu o guarda-chuva
e deu na minha mão. Como eu só tinha 5 anos, eu era bem
pequenininha, e não tinha força suficiente para segurá-lo.
Então bateu um vento muito muito muito forte! E o guarda-
chuva saiu da minha mão, e desceu a rua dando cambalhotas, eu
bem que tentei correr atrás dele, mais eu não consegui.
Mais à frente eu ainda fiz o favor de pisar numa possa de lama, e
escurregar!
Moral da história: eu fiquei toda suja e molhada e no dia seguinte
o dia amanheceu ensolarado. [Narrativa escolar, 7ª. ano EF]
3. Metodologia
Este estudo sobre as expressões de tempo decorrido formadas por haver
adota essencialmente dois tipos de materiais de análise: (i) dados da variedade
brasileira do Português, representativos da modalidade escrita; (ii) material
obtido em testes de atitude aplicados a alunos e profissionais do curso de língua
portuguesa18.
3.1. Dados do comportamento observável
3.1.1 Constituição do corpus
Adotou-se, para a análise, um corpus constituído a partir de duas
diferentes subamostras, uma representativa do gênero textual narrativa escolar
e outra do gênero notícia jornalística. A opção por tais gêneros deve-se à
semelhança de tipologia textual: ambos se configuram predominantemente pela
18 Cf. anexos 1, 2 e 3
72
tipologia narrativa. Optou-se pela análise apenas de textos de caráter narrativo,
devido à maior produtividade das expressões em estudo nesse tipo de discurso,
visto que tempo é um dos elementos considerados essenciais à narrativa.
Inicialmente, pretendia-se trabalhar apenas com um corpus de redações,
mas foram consultados mais de mil textos nos quais se encontraram apenas 100
dados. A necessidade de uma apreciação mais ampla sobre os usos das
expressões levou a uma ampliação do número de dados, o que se conseguiu
com a adoção da subamostra de notícias jornalísticas. Essa decisão encaminhou,
consequentemente, a pesquisa para uma comparação entre os usos das
expressões nos gêneros.
A subamostra de redações foi formada a partir de 100 textos obtidos em
função da proposta de redação feita a alunos dos ensinos fundamental e médio
de diferentes escolas situadas na cidade do Rio de Janeiro. Indicou-se o seguinte
enunciado19:
Escreva um texto contando uma história que tenha ocorrido com você
ou algum conhecido. Procure contar algo que seja engraçado, triste ou
alegre, ou seja, uma história que você ache interessante. Não se
esqueça de contar: onde, com quem e quando ocorreu a história (em
que época - se é uma história muito antiga ou recente).
As produções textuais foram acompanhadas em algumas escolas pela
pesquisadora; em outras, pelo próprio professor. Visando a diminuir os efeitos
do ambiente escolar, foi avisado aos alunos que o texto não seria corrigido pelo
professor, que os participantes não teriam os nomes divulgados e que estavam
participando de uma pesquisa.
19 Deve-se esclarecer que nem todos os dados foram provenientes da aplicação do tema específico. A fim de acrescentar a amostra, agregaram-se algumas narrativas aplicadas em aula, pelos professores, como conteúdo dos cursos e com enunciados diversos.
73
A subamostra de notícias jornalísticas é formada por 100 textos de dois
jornais de circulação na cidade do Rio de Janeiro. Coletaram-se 50 dados em
textos do jornal O Globo e 50 em textos do jornal Extra, todos publicados no
período entre os anos de 2008 e 2009. Por haver discrepância entre o número de
cadernos e, consequentemente, entre o número de notícias nos dois jornais, não
há equivalência entre a quantidade de edições consultadas.
Abaixo há um quadro demonstrativo do número de textos pesquisados e
da quantidade de dados encontrados, além da distribuição dos dados por níveis
de escolaridade e pelos dois veículos jornalísticos.
Subamostra Origem dos dados Textos consultados Dados Coletados
Redações
3º , 4 e 5º anos EF 251 15
6º, 7º e 8º anos EF 314 28
9º ano EF e 1º ano EM 238 27
2º e 3º anos EM 235 30
Jornais O Globo 6 edições completas 50 dados
Extra 11 edições completas 50 dados
Quadro 8 – Distribuição dos dados: textos consultados e textos utilizados
Deve-se destacar que, em um primeiro momento de análise, se
observaram as redações narrativas de cada ano escolar separadamente. Em
seguida, foi feita uma distribuição dos textos por grupos de anos escolares. O
primeiro grupo abarca as séries do 1º segmento EF, e o segundo engloba as três
primeiras séries do 2º segmento EF. Já no terceiro grupo, foram reunidos textos
do 9º ano EF e 1º EM; tal junção foi motivada pelas semelhanças de
características gerais entre essas séries e pela finalidade de se obter um melhor
equilíbrio na distribuição dos dados. Por fim, o quarto grupo abarca as duas
séries finais no EM.
74
Pretende-se, com a adoção dos duas subamostras, verificar se há
mudança nos usos das expressões em relação aos anos escolares agrupados (1º
segmento EF, 2º segmento EF, 9º ano EF e 1º ano EM, 2º e 3º anos EM) e se há
diferença de usos em relação aos dois jornais adotados (Extra e O Globo). Serão
observadas, ainda, comparativamente, as semelhanças e diferenças entre os
usos das expressões nas redações e nos jornais.
3.1.2. Procedimentos de análise dos dados do comportamento observável
Os dados das subamostras de redações e notícias foram observados de
modo a levantarem-se características gerais e específicas dos usos das
expressões temporais formadas por haver em cada gênero. Elencaram-se, então,
alguns fatores característicos percebidos nessa observação que foram agrupados
para que se procedesse a um tratamento estatístico de sua relação com o
emprego das expressões temporais.
Foi feita, assim, uma codificação dos dados de cada subamostra em
função de propriedades dos fatores detectados. Para proceder à avaliação
estatística dessas características, recorreu-se a uma ferramenta usada em
estudos sociolinguísticos, o pacote de programas GOLDVARB. Vale ressaltar
que, embora tenha sido adotado esse programa computacional, o presente
estudo não se pretende variacionista, uma vez que não há um fenômeno
variável a ser estudado e nem hipóteses que justifiquem essa orientação teórico-
metodológica. Seguiram-se apenas alguns dos procedimentos de utilização do
GOLDVARB como ferramenta auxiliar na verificação da distribuição de valores
absolutos e percentuais das expressões em estudo pelas características
examinadas.
Observou-se, na comparação, a fonte original de cada dado: a
subamostra extraída do Extra e o do O Globo para as notícias, bem como o de
cada grupo de séries para as narrativas escolares. Para esse exame, consideram-
se ainda, inicialmente, 10 fatores característicos tanto de toda a expressão como
dos elementos integrantes da mesma. Foram eles:
75
• Sobre a configuração do elemento que acompanha haver
1) É um Nome ou Sintagma nominal?
2) Sua configuração é delimitável (contável) ou não?
3) Tem significado temporal ou não? Ou seja, é um predicado temporal ou
situacional/eventivo?
• Sobre a expressão
4) O valor aspectual da expressão é durativo ou pontual?
5) O ponto de ancoragem temporal ocorre na enunciação (dêitico) ou não
(anafórico)?
6) O elemento ao qual a expressão se refere é uma oração ou um nome?
7) A expressão está inserida no plano discursivo figura ou fundo?
8) O status da informação na qual está inserida a expressão é inativo ou
previamente (semi-)ativo?
• Quanto à localização da expressão
9) A posição na sentença, se relacionada a um verbo, é anterior, posterior ou há
uma relação de complementariedade com ele? Se relacionada a um nome, é
anterior ou posterior?
10) Na distribuição de porções textuais, está em trecho inicial, central, final?
Além desses, observaram-se dois fatores relativos apenas aos dados de
redações:
11) A expressão é acompanha por outro indicador temporal (atrás ou desde)?
12) O verbo haver foi redigido com ou sem a letra H?
E ainda, verificou-se um fator relativo apenas aos dados das notícias:
13) Em qual seção do jornal está o texto com a expressão temporal?
Para a observação das propriedades acima nas expressões temporais,
parte-se da hipótese de que o elemento que se junta ao verbo haver seja um
sintagma nominal contável, com significado temporal. Essa hipótese é motivada
pelos estudos de Toral (1992) e Machado Vieira (2001) sobre o verbo fazer
indicando tempo cronológico, que apontam uma maior frequência de
76
ocorrências de sintagmas nominais temporais contáveis. É motivada, ainda,
pelo estudo de Móia (1999), que indica que as expressões temporais formadas
pelo verbo haver podem admitir um predicado situacional, embora sejam mais
comuns os predicados temporais.
As considerações de Mira Mateus et alii (2003) e de Fiorin (1996) levaram
à observação do ponto de ancoragem da expressão temporal, pois, segundo os
autores, essa propriedade está relacionada ao contexto em que o circunstancial
aparece. A investigação do aspecto da expressão decorre de uma observação
em Machado Vieira (op. cit.: 281), que verificou que “a referência temporal de
fazer parece ser indistintamente pontual ou durativa”.
Com relação aos planos discursivos, parte-se da hipótese de que, por
indicarem uma circunstância, as expressões ocorram predominantemente no
plano fundo. Imagina-se, ainda, que possa haver relação entre a posição da
expressão no texto ou na sentença e o status da informação. Segundo Cunha
(1976) e Cunha & Cintra (1985), os adverbiais podem deslocar-se na sentença
em função de pressões de informatividade ou pressões discursivas e a
expressão em posição inicial atende a uma função de realce.
Quanto ao controle dos fatores próprios das expressões verificadas na
subamostra de redações, acredita-se que tenham relação com o nível de
escolaridade. Supõe-se que, nos textos produzidos por alunos das séries iniciais,
ocorra um maior número de expressões acompanhadas por outro indicador
temporal ou de expressões nas quais o verbo haver é redigido sem h, visto o
pouco contato com as regras de gramáticas normativas, que condenam os dois
usos.
3.2. Testes de atitude
Além da análise dos dados do comportamento linguístico observável,
conta-se com a observação de resultados de testes em que falantes avaliam
subjetivamente certas estruturas/expressões e/ou enunciados em que elas
ocorrem. A concepção de tais materiais de análise tem inspiração em
77
orientações da metodologia sociolinguística relativa a testes de atitudes
linguísticas.
3.2.1. As principais orientações teórico-metodológicas
Durante a comunicação, os falantes, mesmo que inconscientemente,
moldam e adaptam seu discurso à situação comunicativa. Ou seja, adotam uma
ou outra forma linguística de acordo com suas percepções e reações. Esse
comportamento reflete as atitudes do falante em relação a elementos e
estruturas línguísticas.
Entende-se atitude linguística, segundo Fasold (1987), por um estado
mental de predisposição a determinadas formas linguísticas. Essa relação pode
ser de preferência, recusa ou neutralidade. As atitudes linguísticas dependem
do contexto sociolinguístico, ou seja, dependem da situação comunicativa e
acabam por refletir um comportamento coletivo.
O autor indica que é bastante comum estudos sobre atitude de falantes se
basearem em um ponto de vista da atitude mentalista, isto é, na visão de que, a
partir de algum estímulo, um estado mental pode gerar um tipo de resposta e
não outro. Visto que a atitude é um estado interno, o pesquisador depende do
relato do falante, e este relato resulta de suas percepções e avaliações somadas a
suas expectativas e predileções sobre dadas estruturas linguísticas.
Falsod (1987) indica dois tipos de métodos de pesquisa para a
investigação das atitudes/percepções relacionadas à linguagem: testes diretos e
indiretos. Nos primeiros, os participantes expõem suas opiniões cientes de
contribuírem para uma investigação linguística; no segundo, por outro lado, os
informantes não têm ciência de que suas atitudes linguísticas estão sendo
investigadas.
Os testes podem ser, ainda, abertos — oferecendo liberdade para o
informante responder às questões — ou fechados — com um formato único de
respostas, do tipo múltipla escolha ou sim/não.
78
Tarallo (1990) apresenta, também, duas possibilidades de testes: de
percepção e de produção. Nos testes de percepção, o informante deve opinar
sobre a aceitabilidade de certas estruturas linguísticas, já, nos de produção, o
informante deve ser levado a produzir a variável optando por uma ou outra
variante linguística. Os testes de percepção são similares ao que Falsod (1987)
chama de teste de insegurança linguística, no qual o falante aponta a forma que
considera correta dentre as apresentadas.
3.2.2. Os testes analisados
Consideram-se, nesta análise, resultados obtidos em dois tipos de testes
de natureza fechada, visto que são compostos por questionários de múltipla
escolha. Há um teste que questiona a aceitabilidade de algumas estruturas
linguísticas, e outro que investiga a classificação mais aceita para as expressões
em estudo20. Ambos os testes classificam-se, segundo Falsod, como diretos, pois
nos dois os participantes têm ciência de que participam de uma pesquisa que
objetiva saber como eles compreendem ou utilizam certas expressões
linguísticas.
Os testes foram aplicados a estudantes de diferentes níveis de
escolaridade, como proposto por Labov (1972:214). Segundo o autor, não se
deve contar apenas com informantes mais escolarizados, pois esses são
inseridos, comumente, em situações comunicativas que exigem a adoção de um
padrão culto formal e, assim, podem ser influenciados por orientações
prescritivas.
O teste sobre a aceitabilidade de algumas estruturas linguísticas foi
apresentado a alunos de diferentes séries dos ensinos fundamental e médio e a
graduandos de quatro diferentes períodos do curso de Letras da UFRJ. O teste
sobre as possíveis classificações para a expressão foi aplicado apenas aos alunos
de Graduação.
20 Os dois testes aplicados encontram-se nos anexos 1, 2 e 3
79
O primeiro teve o intuito de averiguar possíveis efeitos semânticos
obtidos pelo acréscimo de elementos indicadores de tempo decorrido (atrás,
desde, já) à expressão, pela substituição do verbo por um desses elementos e/ou
pela omissão do verbo na construção.
A aplicação do segundo teste teve como objetivo verificar a percepção
dos futuros profissionais de Língua Portuguesa sobre as possíveis classificações,
segundo gramáticas normativas, para expressões temporais formadas pelo
verbo haver.
Em cada teste havia um cabeçalho solicitando a identificação do grau de
escolaridade dos participantes. Não foram pedidas quaisquer informações
pessoais, tais como nome ou idade. Havia, ainda, um texto informando que o
teste não contava com certo ou errado, que o objetivo era descobrir as opiniões
do falante de língua portuguesa sobre as estruturas marcadas nos trechos
dados.
As aplicações de testes foram supervisionadas pela própria pesquisadora
ou por uma professora, e os alunos tiveram ciência de tratar-se de uma pesquisa
que não seria avaliada pelo professor. Procurou-se entregar o questionário para
que fosse efetuada a leitura dos comandos, com a orientação de que os
participantes não conversassem entre si, e de que as dúvidas deveriam ser
esclarecidas com a pesquisadora/professora.
Sabe-se que os alunos tendem a tomar a pesquisa de opinião como uma
avaliação, por isso enfatizou-se o objetivo da pesquisa, com a indicação de não
haver uma resposta correta. Procurou-se, também, deixar os participantes
menos tensos afirmando-lhes que os testes não seriam vistos por seus
professores.
Abaixo há um quadro demonstrativo da quantidade de testes aplicados a
cada grupo de escolaridade.
80
Testes de atitude linguística
Escolaridade
Teste 1 (alterações
na estrutura da
expressão)
Teste 2
(classificação das
expressões)
Ensino Fundamental 27 ---
Ensino Médio 50 ---
Graduação 1º período 25 25
Graduação 3º período 25 25
Graduação 5º período 25 25
Graduação 8º período 18 18
Quadro 9 – Distribuição dos testes pelos níveis de escolaridade
3.2.3. Procedimentos de análise dos testes de atitude
Para o entendimento dos resultados dos testes de atitude, averiguaram-se
as respostas de cada uma das frases apresentadas em cada tipo de teste.
Posteriormente, para o teste sobre as manipulações na estrutura da expressão,
agruparam-se os resultados do conjunto de frases durativas e do conjunto de
frases pontuais, a fim de verificar se havia um padrão de respostas para cada
grupo. Já para o teste sobre as possíveis classificações para as expressões,
agruparam-se os resultados das frases nas quais as expressões estavam
inseridas em início ou em fim de predicação.
81
4. Expressões temporais com o verbo haver
Neste capítulo, expõem-se, primeiramente, os principais fatores
característicos das expressões temporais formadas pelo verbo haver, em cada
subamostra de narrativas, e tece-se uma comparação entre tais subamostras, a
fim de que se detectem particularidades de cada gênero textual relativas a esse
tema e generalizações sobre as expressões.
Nas seções 4.2 e 4.3 são estabelecidas relações entre as expressões em
estudo e os planos discursivos (figura e fundo) e o status informacional. Por
fim, descreve-se o comportamento semi-gramatical de haver nas expressões
temporais.
4.1. Caracterização das expressões
Na observação das características gerais das expressões temporais,
perceberam-se fatores relativos não apenas à configuração e ao comportamento
da expressão, mas também ao elemento que acompanha o verbo haver
expressando de tempo passado.
O termo que acompanha haver pode ser um ‘Nome’ (N) ou ‘Sintagma
Nominal’ (SN). Esse N é indicativo de tempo — que pode primariamente
indicar um intervalo de tempo ou ter outro referente no mundo biossocial —,
geralmente no plural, tal como “dias” ou “meses”. O SN é composto por um N
antecedido por um numeral, podendo haver entre eles um advérbio, como
“apenas” ou “exatamente”. Seguem exemplos de trechos do corpus com
expressão formada por N e por SN, respectivamente.
19. Ele poderia ter vendido e pago os seus atletas que estão há meses sem
receber salário, mas não foi isso que ele fez... Depois de perder a pose
agredido jornalistas o então presidente foi para uma boate gay revelar
sua outra personalidade, cantou, dançou. Fez tudo o que não poderia
fazer após a derrota de seu clube. [Redação, 9º ano EF]
82
20. O ministro de Minas e Energia, Edison Lobão, assinou ontem a primeira
ordem de serviço para o início das obras da usina nuclear de Angra 3. A
produção de energia elétrica deverá começar em maio de 2015, e o custo
total da obra será de R$ 8,112 bilhões. A construção será feita pela
empresa Andrade Gutierrez, que venceu a primeira licitação para obra,
há 20 anos. [Jornal, O Globo]
Outra característica do N/SN é poder formar um predicado temporal ou
situacional. Isto é, pode indicar tempo, como os nomes “dia”, “semana” ou
“mês”, por exemplo, ou apresentar uma situação ou evento que
metaforicamente indique uma quantidade temporal, como “aulas”, “jogos”,
conforme:
21. Há um ano atras, eu e minha família fomos ao zoológico, foi muito bom
divertimos muito, vimos todos os tipos de animais que possam imaginar,
mas o que foi o mais engraçado foi o macaco, ele era muito esperto,
quando chegamos perto dele, ele vinha e jogava lama na gente e ni todas
s pessoas que chegavam perto, rimos muito. [Redação, 3º ano EM]
22. Sem perder há três rodadas, o Duque de Caxias tenta dar sequência à
boa fase hoje, às 21h, contra o vice-líder Guarani, no Estádio Brinco de
Ouro, pela 30ª rodada. [Jornal, Extra]
O elemento nominal que se junta ao verbo haver pode também
apresentar uma configuração morfossemântica delimitável ou não. Ou seja, o
valor temporal indicado pela expressão pode ser exato ou não, ter uma
quantidade de tempo definida. Porém, sempre que o elemento for um N, a
configuração será não delimitável, pois só há delimitação, se houver um
numeral. Os exemplos seguintes representam um elemento nominal delimitável
e um não delimitável:
83
23. A um ano atrás eu e minha vó ia soutar o meu cachorro na rua ai ela
desamarrou o cachorro e levou par andar em pouco, depois de ter levado
o cachorro para andar quando ela amarrou na árvore em frente a casa
para falar com a colega dela, o cachorro tinha fogido. [Redação, 7º ano
EF]
24. Se há bem pouco tempo o mercado formal demonstrava preconceito em
relação aos trabalhadores que passavam dos 45 anos — desdenhando da
experiência acumulada —, hoje já há empresas absorvendo profissionais
que cruzaram a barreira dos 55 anos, e com direito a registro. [Jornal,
Extra]
No primeiro exemplo, o SN que se une ao verbo haver é delimitável, pois
apresenta a exata quantidade de tempo, “um ano” representada pela expressão.
Nesse exemplo, é possível precisar quando ocorreu o evento narrado. Já no
segundo, há um SN não delimitável, pois, a partir dele, não é possível definir
exatamente a quantidade de tempo que a expressão representa.
No que tange ao aspecto ou valor da expressão na sentença, segundo o
qual ela indica se o evento expresso é durativo ou pontual, observa-se se a
expressão se refere a um dado momento no passado ou representa um
transcurso de tempo desde um momento anterior. Segundo Ilari (1997:48), a
expressão “há cinco anos” pode aplicar-se a eventos pontuais, que ficam assim
localizados no tempo, ou, “quando aplicada a processos de tempo escoado, ela
mede uma duração (“cinco anos”) que tem como limite final o momento de
fala”.
Ainda segundo Ilari (1997: 40), “os adjuntos de duração, quando
combinados com predicados que referem um processo pontual, não indicam a
duração interna do processo, e sim o período no interior do qual o processo se
reitera ou o período além ou aquém do qual o processo ocorre”.
84
Abaixo verifica-se um exemplo de expressão durativa e um de pontual,
respectivamente:
25. Um dia eu estava já na janela á uns dez minutos, quando o menino me
tacou gelatina no meio da cara, eu fiquei com muita raiva e disse para ele
que eu ia me vingar. [Redação, 9ª ano EF]
26. Criada há nove anos por funcionários e professores da Unirio, a
fundação atua na área de "Ensino, Pesquisa e Assistência". De 2006 para
cá, a fundação participou da organização de 37 concursos, cinco deles em
andamento. [Jornal, O Globo]
No exemplo 25, a expressão temporal evidencia aspecto durativo, visto
que faz referência à duração do evento, indica por quanto tempo o narrador
ficou na janela (dez minutos). No exemplo 26, por outro lado, o aspecto da
expressão é pontual, sinaliza um ponto no passado, momento em que a
“fundação” foi criada.
Sobre a ancoragem da expressão, como já indica Mira Mateus et alii
(2003), sabe-se que pode ser dêitica ou anafórica (relacionada a uma expressão
na frase ou texto). Esse fator refere-se à relação entre o momento passado
indicado pela expressão temporal e o momento da enunciação.
Ilari (1997:13) apresenta, para o verbo, a “capacidade de relacionar
cronologicamente três tempos ou momentos”: momento de fala, momento de
realização da ação expressa pelo verbo, momento de referência. De forma
semelhante, Fiorin (1996) menciona três momentos na constituição do sistema
temporal: o momento da enunciação (ME), o momento da referência (MR), e o
85
momento do acontecimento (MA). Esse autor apresenta o seguinte
organograma21:
ME (presente implícito)
Sistema enunciativo concomitância MR presente
Sistema enuncivo Não concomitância
Concomitância MA presente
Não- concomitância
Anterioridade MR pretérito
Posterioridade MR futuro
Anterioridade MA pretérito
Concomitância MA presente
Não-concomitância
Anterioridade MA pretérito
Figura 1 - Organograma adaptado da constituição do sistema temporal segundo Fiorin (1996)
Nesse fator, verificou-se se a informação indicada pela expressão
está relacionada ao momento presente da enunciação (dêitica) ou a um
momento anterior (anafórica).
Anafórica
Dêitica
Momento Anterior 2
Momento Anterior 1
Momento da Enunciação
Figura 2 – Pontos de ancoragem da expressão temporal
21 O organograma foi adaptado; não foram apresentados o momento de referência (MR) e momento de acontecimento (MA) futuro, visto que só interessa à presente análise a expressão de tempo passado.
86
27. Tudo começou a 2 meses atráz quando eu descobri que o meu namorado
estava colocando uns “xifres” em mim. Na hora fiquei arrasada
perguntei para ele e como se esperava negou tudo.
Numa bela sexta-feira as minhas amigas viram essa garota que o meu
namorado estava me traindo e perguntaram se era verdade, e ela falou
que estava namorando com ele a um tempo e as minhas amigas falaram
que ele estava comigo a uns 10 meses no dia seguinte nós duas fomos
falar com ele e o cachorro não sabia onde enfiar a cara.
Hoje em dia nós viramos amigas e quando a gente lembra dessa história
rimos muito. [Redação, 2º ano EM]
No exemplo acima, verificam-se três expressões temporais formadas pelo
verbo haver. A primeira expressão “a 2 meses atráz” é ancorada no momento
da enunciação. Indica que o evento ao qual a expressão se refere ocorreu dois
meses antes do momento da enunciação.
Já as duas outras expressões temporais são anafóricas, ancoradas em um
momento anterior ao da enunciação. No trecho “estava namorando com ele a
um tempo”, a expressão é ancorada em “numa bela sexta-feira” e não na
enunciação. O mesmo ocorre com a terceira expressão no trecho “ele estava
comigo a uns 10 meses”. Os dez meses representados pela expressão são
ancorados no momento em que houve a conversa entre as amigas e a garota
com quem o namorado a traia, dois meses antes da enunciação.
A expressão pode, ainda, estar ligada a uma oração ou a nome22. A
indicação temporal pode ser relativa a uma ação, um evento, um estado ou até a
uma característica. No exemplo 28, a primeira expressão está relacionada a um
nome, e a segunda, a uma oração.
22 Estão sendo tratados por nome os substantivos, adjetivos e formas verbais não finitas.
87
28. Jordan, que jogou pelo Chicago Bulls, foi confundido com o cantor
Michael Jackson, morto há três meses (...)
Há um ano, ao ser perguntado sobre quais cidades ameaçavam o Rio na
disputa para sediar os jogos, não teve dúvidas: — Chicago e Japão!
[Jornal, O globo]
Foram observados dois fatores atinentes ao posicionamento da
expressão: i) a localização no texto; ii) a localização na predicação. Com relação
à posição da expressão no texto, ou seja, na distribuição dos parágrafos ou
porções textuais, consideram-se três possibilidades: porção inicial, central ou
final.
No texto abaixo há duas expressões temporais, a primeira está em uma
porção inicial de texto e a última em porção central. No exemplo 30, a expressão
está localizada na parte final do texto.
29. Um pedreiro que virou empresário
Atrás de uma vida mais promissora, o maranhense José Raimundo dos
Santos, de 28 anos, chegou ao Rio de janeiro, em 2002, com planos de
montar um negócio. Ex-pedreiro no nordeste, faltava-lhe capital para
iniciar a empreitada no estado. Há três anos, porém, descobriu, enquanto
folheava jornais, um projeto social que viabilizaria o antigo sonho. Hoje,
José Raimundo tem uma pequena gráfica em santa Cruz e já pensa em
expandi-la.
A ONG Fabricando Empresários foi a responsável pelo início da carreira
empreendedora. Por meio de um treinamento baseado em vendas de
livros, a instituição prepara pequenos empresários há quatro anos,
gratuitamente.
— Aprendi técnicas de convencimento e venda — conta José Raimundo.
Sempre motivado pelo desejo de abrir sua própria empresa, ele se
destacou nas vendas e foi promovido a instrutor. Na nova função,
88
formou cinco empreendedores, cumprindo a meta estabelecida pela
organização para financiamento de novos negócios. Com um
empréstimo de R$ 2 mil, Santos pagou três meses de aluguel de um
imóvel em Santa Cruz e começou a desenvolver seu projeto de vida.
[Jornal, Extra]
30. Profissão na área de beleza perto de ser regulamentada
Mais de três milhões de trabalhadores que atuam no setor de beleza
poderão ter a profissão regulamentada. Ontem, a Comissão de Assuntos
Sociais (CAS) do Senado aprovou um projeto de lei que beneficiará as
atividades de cabeleireiro, barbeiro, esteticista, manicure, pedicure,
depilador e maquiador. A matéria ainda passará por outras votações e,
caso seja aprovada, entrará em vigor.
De acordo com o projeto, para exercer qualquer uma dessas funções será
obrigatório ter o ensino fundamental completo e curso
profissionalizante. A proposta reconhece, entretanto, o direito de quem já
esteja trabalhando há, pelo menos, um ano de permanecer na função,
mesmo sem preencher as exigências. [Jornal, Extra]
Para verificar a ordem dos sintagmas que integram a predicação, isto é, a
posição das expressões temporais na sentença, tomou-se como base a proposta
de Martelotta (1994) que apresenta seis possíveis posições para o adjunto
adverbial:
Antes Do Verbo Depois Do Verbo
a) sem sujeito d) sem complemento
b) antes do sujeito e) entre o verbo e o complemento/predicativo
c) entre o sujeito e o verbo f) depois do complemento/predicativo
Quadro 10 – Posições dos adjuntos adverbiais segundo Martelotta (1994)
89
A partir dessa proposta, foram acrescidas três posições, devido a
necessidades verificadas na análise. Duas referem-se a expressões que não estão
relacionadas a um verbo, mas, sim, a um nome, como já visto. A outra, como
proposto por Móia (1999), refere-se a expressões que “complementam” um
verbo23.
Assim sendo, analisaram-se as sentenças considerando as posições da
expressão da seguinte forma:
a) Antes do verbo – sem sujeito (AV – SS)
31. Há pouco mais de 8 anos, havia meia dúzia de empresas oferecendo esse
serviço. [Jornal, Extra]
b) Antes do verbo – antes do sujeito (AV – AS)
32. A minha história é num dia de 6ª feira a uns dias eu fui pro cinema ver
Hanah Montana [Redação, 3º ano EF]
c) Antes do verbo – entre o sujeito e o verbo (AV – ESV)
33. Certo dia, João e Maria, há mais ou menos 2 anos, passeavam perto de
sua casa [Redação, 1º ano EM]
d) Depois do verbo – sem complemento predicativo, (locativo) (DV – SC)
34. Certo dia, um garoto estava andando perto da casa de um garoto que
morreu a muito tempo. [Redação, 3º ano EF]
e) Depois do verbo – entre o verbo e o complemento, predicativo, (locativo) (DV
– EVC)
23 Móia (1999) indica que expressões temporais com haver podem ocorrer “como argumentos (geralmente preposicionados) de predicados, não ocorrendo portanto em posição adverbial", como em “Os vestígios arqueológicos encontrados datam de há cem mil anos”.
90
35. A Polícia Nacional hondurenha (...) expulsou um grupo de sem-teto que
ocupava há três meses um prédio público em protesto contra a
destituição do presidente Manuel Zelaya [Jornal, o Globo]
f) Depois do verbo – depois do complemento, predicativo, (locativo) (DV – DC)
36. Eles não recebem salários, em média, há três meses. [Jornal, O Globo]
g) Relacionado ao Nome – Antes do nome (AN)
37. Estados Unidos e Cuba discutirão na quinta-feira a possível retomada de
um serviço postal direto há muito tempo suspenso. [Jornal, O Globo]
h) Relacionado ao Nome – Depois do nome (DN)
38. Budista há mais de 12 anos, responsável por uma comunidade religiosa
no Rio, Carmo leva a prática a sério. [Jornal, Extra]
i) “Complementando” um verbo (CV)
39. Maria Vitória Pinheiro Gonçalves, de 54 anos, cumpriu ontem um ritual
que começou há 20 anos. [Jornal, Extra]
4.1.1 Análise estatística sobre as expressões nas narrativas escolares24
As primeiras observações feitas sobre as redações foram em relação ao
número de dados e à distribuição dos mesmos pelos grupos de séries. Dos 1038
textos consultados, apenas 9,63% apresentaram expressões temporais com o
verbo haver. Esse resultado indica a baixa frequência dessas expressões, que são
formas alternantes a diversos advérbios e preposições, como se verifica nos
exemplos abaixo:
40. Há duas semanas, o Tribunal de Justiça do Distrito Federal decidiu
afastar Dácio Vieira (...) [Jornal, O Globo]25 24 Nesta seção, não são apresentados os números absolutos juntamente com os percentuais, pois se trata de um total de 100 dados, o que os faz equivaler.
Duas semanas atrás,
Duas semanas antes,
Anteriormente, o tribunal de Justiça do Distrito Federal havia decidido (...)
No dia 15 de setembro, o tribunal de Justiça do Distrito Federal decidiu (...)
Terça feira retrasada, o tribunal de Justiça do Distrito Federal decidiu (...)
Sobre os grupos de séries, percebeu
produtividade das expressões cresce conforme o nível de escolaridade. No
primeiro grupo, que abrange o 3º, 4º e 5º anos do EF, as expressões ocorreram
em 15 dos 251 textos. Já no segundo, referente aos 6º, 7º e 8º anos do EF, as
expressões ocorreram em
o 1º do EM, e em 27 dos 238 textos desse grupo houve a presença da expressão
em estudo. E, por fim, no quarto grupo, que abarca o 2º e 3º anos do EM, as
expressões com haver ocorreram em 30 dos 235 tex
Essa distribuição pode ser verificada em percentuais no gráfico abaixo:
Gráfico 1 - Produtividade das expressões temporais nos textos consultado
Das características do N/SN que acompanha
fortes tendências: o elemento formador da expressão é, em geral, um SN
temporal. Houve SN em 99% dos dados, e em 100% destes foi identificado um
predicado temporal. Apenas no dado abaixo ocorreu N temporal. 25 Notícia de 01/10/2009 26 As cinco frases em itálico exemplificar algumas formas alternantes às expre
5,97%
1º seg. EF
semanas atrás, o tribunal de Justiça do Distrito Federal decidiu
semanas antes, o tribunal de Justiça do Distrito Federal decidiu (...)
Anteriormente, o tribunal de Justiça do Distrito Federal havia decidido (...)
No dia 15 de setembro, o tribunal de Justiça do Distrito Federal decidiu (...)
retrasada, o tribunal de Justiça do Distrito Federal decidiu (...)
Sobre os grupos de séries, percebeu-se que, na subamostra
produtividade das expressões cresce conforme o nível de escolaridade. No
primeiro grupo, que abrange o 3º, 4º e 5º anos do EF, as expressões ocorreram
em 15 dos 251 textos. Já no segundo, referente aos 6º, 7º e 8º anos do EF, as
expressões ocorreram em 28 dos 314. O terceiro grupo engloba o 9º ano do EF e
o 1º do EM, e em 27 dos 238 textos desse grupo houve a presença da expressão
em estudo. E, por fim, no quarto grupo, que abarca o 2º e 3º anos do EM, as
ocorreram em 30 dos 235 textos.
Essa distribuição pode ser verificada em percentuais no gráfico abaixo:
Produtividade das expressões temporais nos textos consultado
Das características do N/SN que acompanha haver, destacam
tendências: o elemento formador da expressão é, em geral, um SN
temporal. Houve SN em 99% dos dados, e em 100% destes foi identificado um
predicado temporal. Apenas no dado abaixo ocorreu N temporal.
As cinco frases em itálico resultam de modificações feitas pela pesquisadora a fim de exemplificar algumas formas alternantes às expressões formadas por haver.
8,91%11,34% 12,75%
2º seg. EF 9º EF/1º EM 2º/3º EM
91
o tribunal de Justiça do Distrito Federal decidiu (...)
o tribunal de Justiça do Distrito Federal decidiu (...)
Anteriormente, o tribunal de Justiça do Distrito Federal havia decidido (...)
No dia 15 de setembro, o tribunal de Justiça do Distrito Federal decidiu (...)
retrasada, o tribunal de Justiça do Distrito Federal decidiu (...)26
na subamostra adotada, a
produtividade das expressões cresce conforme o nível de escolaridade. No
primeiro grupo, que abrange o 3º, 4º e 5º anos do EF, as expressões ocorreram
em 15 dos 251 textos. Já no segundo, referente aos 6º, 7º e 8º anos do EF, as
28 dos 314. O terceiro grupo engloba o 9º ano do EF e
o 1º do EM, e em 27 dos 238 textos desse grupo houve a presença da expressão
em estudo. E, por fim, no quarto grupo, que abarca o 2º e 3º anos do EM, as
Essa distribuição pode ser verificada em percentuais no gráfico abaixo:
Produtividade das expressões temporais nos textos consultados
, destacam-se duas
tendências: o elemento formador da expressão é, em geral, um SN
temporal. Houve SN em 99% dos dados, e em 100% destes foi identificado um
predicado temporal. Apenas no dado abaixo ocorreu N temporal.
modificações feitas pela pesquisadora a fim de
12,75%
2º/3º EM
41. Ele poderia ter vendido e pago os seus atletas que estã
receber salário, mas não foi isso que ele fez... Depois de perder a pose
agredido jornalistas o então presidente foi para uma boate gay revelar
sua outra personalidade, cantou, dançou. Fez tudo o que não poderia
fazer após a derrota de seu c
Sobre a configuração do elemento nominal em delimitável ou não, os
números evidenciam um pequeno equilíbrio entre os dois fatores, a diferença
foi de 14 dados. Do total de 100 dados, 57 apresentaram configuração contável e
43 configuração não-contável.
A distribuição dos dados pelos grupos de escolaridade pode ser
observada em percentuais no gráfico abaixo.
Gráfico 2 – Configuração do elemento nominal formador da expressão nos grupos escolares em
A distribuição pelas séries chamou atenção, porque, nos três últimos
grupos de escolaridade, se registrou maior produtividade de elemento nominal
delimitável. Diferentemente, no primeiro grupo o percentual de elementos
0102030405060708090
100
1º seg. EF
20%
80%
N/SN delimitável ou não delimitável
Ele poderia ter vendido e pago os seus atletas que estão
receber salário, mas não foi isso que ele fez... Depois de perder a pose
agredido jornalistas o então presidente foi para uma boate gay revelar
sua outra personalidade, cantou, dançou. Fez tudo o que não poderia
fazer após a derrota de seu clube. [Redação, 9º ano EF]
Sobre a configuração do elemento nominal em delimitável ou não, os
números evidenciam um pequeno equilíbrio entre os dois fatores, a diferença
foi de 14 dados. Do total de 100 dados, 57 apresentaram configuração contável e
contável.
A distribuição dos dados pelos grupos de escolaridade pode ser
observada em percentuais no gráfico abaixo.
Configuração do elemento nominal formador da expressão nos grupos escolares em delimitável ou não delimitável
A distribuição pelas séries chamou atenção, porque, nos três últimos
grupos de escolaridade, se registrou maior produtividade de elemento nominal
delimitável. Diferentemente, no primeiro grupo o percentual de elementos
1º seg. EF 2º seg. EF 9º EF/1º EM 2º/3º EM
57%67% 67%
80%
43%33% 33%
N/SN delimitável ou não delimitável
Delimitável Não delimitável
92
o há meses sem
receber salário, mas não foi isso que ele fez... Depois de perder a pose
agredido jornalistas o então presidente foi para uma boate gay revelar
sua outra personalidade, cantou, dançou. Fez tudo o que não poderia
Sobre a configuração do elemento nominal em delimitável ou não, os
números evidenciam um pequeno equilíbrio entre os dois fatores, a diferença
foi de 14 dados. Do total de 100 dados, 57 apresentaram configuração contável e
A distribuição dos dados pelos grupos de escolaridade pode ser
Configuração do elemento nominal formador da expressão nos grupos escolares em
A distribuição pelas séries chamou atenção, porque, nos três últimos
grupos de escolaridade, se registrou maior produtividade de elemento nominal
delimitável. Diferentemente, no primeiro grupo o percentual de elementos
2º/3º EM
33%
93
delimitáveis foi bastante baixo. Acredita-se que esse resultado possa estar
relacionado à faixa etária dos alunos, pois a quantificação temporal é uma
questão ainda complexa para as crianças nas faixas etárias mais baixas.
Segundo Antunes, Menandro e Paganelli
[…] há um longo caminho a ser percorrido pela criança no domínio
progressivo da noção de tempo. Essa construção é lenta e se dá
paralelamente ao processo de descentração, como ocorre com a noção
de espaço e com a própria socialização da criança […] (apud
ARRIADA, E.; NOGUEIRA, G. M.; SANTOS, R. de C. dos, 2008)
Tal resultado pode estar relacionado, ainda, à influência da literatura
infantil, em especial dos contos — gênero com o qual os alunos têm forte
contato nessa fase escolar. Nesse gênero, é comum a presença de expressões do
tipo “Há muito tempo” — com elemento não delimitável —, e esse foi o padrão
seguido em 11 dos 15 textos representativos do 1º segmento do EF. No total dos
100 dados das redações, em 32 o elemento nominal que acompanha haver é
formado pelo substantivo tempo (muito tempo, pouco tempo, um tempo).
Os resultados acima confirmam as hipóteses para essas propriedades,
pois acreditava-se que, semelhantemente ao resultados apresentados por
Machado Vieira (2001) para as expressões temporais com fazer, o elemento que
se junta ao verbo haver fosse predominantemente um sintagma nominal
contável. Esperava-se, ainda, que houvesse predominância de predicados
temporais, o que foi confirmado.
O trecho abaixo exemplifica as propriedades acima destacadas, um SN
contável e com valor temporal acompanhado o verbo haver na expressão.
42. A três meses atrás, foi notificado que João, menino de 15 anos, estuprou
uma criança de 3 anos de idade, o nome dele é Lucas e ele ficou muito
traumatizado com o que foi feito. [Redação, 9º ano]
Quanto aos fatores característicos da expressão, registra
que não houve variação em relação ao elemento ao qual se liga a expressão. Nas
redações vistas, em todos os dados a expressão estava ligada a uma oração, não
houve qualquer expressão ligada a um nome.
Sobre o aspecto da expressão, percebeu
para a apresentação de eventos pontuais, o que ocorreu em 88% das expressões
vistas. Os textos do 1º segmento outra vez chamaram atenção, porque o a
é pontual em 100% dos dados (cf. ex. 43 e 44)
que o uso de expressões com valor durativo aumenta conforme nível de
escolaridade.
43. A muintos e muintos ano
44. A minha história é num dia de 6ª feira
Hanah Montana [Redação, 4º ano]
Gráfico 3
0
20
40
60
80
100
1º seg. EF
100%
0%
Aspecto da expressão: durativo ou pontual
Quanto aos fatores característicos da expressão, registra-se, inicialmente,
que não houve variação em relação ao elemento ao qual se liga a expressão. Nas
redações vistas, em todos os dados a expressão estava ligada a uma oração, não
e qualquer expressão ligada a um nome.
Sobre o aspecto da expressão, percebeu-se uma tendência ao uso delas
para a apresentação de eventos pontuais, o que ocorreu em 88% das expressões
vistas. Os textos do 1º segmento outra vez chamaram atenção, porque o a
é pontual em 100% dos dados (cf. ex. 43 e 44). O gráfico abaixo evidencia, ainda,
que o uso de expressões com valor durativo aumenta conforme nível de
A muintos e muintos ano aconteceu uma inchente. [Redação, 3º ano]
A minha história é num dia de 6ª feira a uns dias eu fui pro cinema ver
Hanah Montana [Redação, 4º ano]
3 – Aspecto da expressão: durativo ou pontual
2º seg. EF 9º EF/1º EM 2º/3º EM
92% 89%77%
8% 11%23%
Aspecto da expressão: durativo ou pontual
Pontual Durativo
94
se, inicialmente,
que não houve variação em relação ao elemento ao qual se liga a expressão. Nas
redações vistas, em todos os dados a expressão estava ligada a uma oração, não
se uma tendência ao uso delas
para a apresentação de eventos pontuais, o que ocorreu em 88% das expressões
vistas. Os textos do 1º segmento outra vez chamaram atenção, porque o aspecto
O gráfico abaixo evidencia, ainda,
que o uso de expressões com valor durativo aumenta conforme nível de
aconteceu uma inchente. [Redação, 3º ano]
eu fui pro cinema ver
95
Novamente identifica-se a dificuldade que os alunos do primeiro
segmento do EF — faixa etária mais baixa — possuem com as relações
temporais. Conforme Piaget,
Se as relações de tempo resultam de uma intuição direta ou de uma
esquematização intelectual independente do seu conteúdo, é claro que
as questões precedentes não darão motivo a nenhuma dificuldade
para a criança, de vez que todos os acontecimentos que caracterizam
este processo temporal se desenvolvem sob os olhos do sujeito. Mas,
se o tempo é a coordenação operatória dos próprios movimentos,
então as relações de simultaneidade, de sucessão e de duração
deverão se construir, todas, progressivamente, e apoiando-se umas
nas outras […] (s/d, p. 13).
O ponto de ancoragem temporal foi na enunciação na grande maioria
dos dados, pois, em 92%, a expressão é dêitica. Esse padrão foi seguido em
textos de todos os anos escolares estudados, sem grandes diferenças. Foi
categórico nos textos do 1º segmento EF.
No que tange à localização da expressão na sentença, a posição inicial
mostrou-se a mais comum em todos os grupos de séries, e a posição final foi a
menos produtiva, como se verifica na tabela abaixo:
Porção de texto inicial Porção de texto central Porção de texto final
77 /77% 15 / 15% 8 / 8%
Tabela 1 – Distribuição dos dados das narrativas escolares pelas porções textuais
Sobre a localização da expressão na sentença, destaca-se, conforme tabela
um, uma grande tendência à posição inicial, antes do verbo, o que ocorreu em
60% dos dados. Chamaram atenção, também, os 16% de expressões
96
complementando um verbo e a falta de ocorrência de expressão temporal se
referindo a um nome.
As frases abaixo exemplificam os três tipos de verbos os quais as 16
expressões da subamostra “complementam”.
45. Este dia aconteceu a cerca de 2 anos e um montão de amigos meus
pulamos na casa do vizinho para tomar banho de piscina porque estava
muito quente. [Redação, 8º ano]
46. Esse ano minha mãe ficou triste com a noticia, que um colega nosso tinha
falecido em um acidente de moto, mas com essa notícia, veio a mente
dela, o fato que ocorreu a uns 2 anos atrás. [Redação, 9º ano]
47. Essa história foi a três meses atras. A história aparece Renan, eu, Luca,
minha mãe, minha vó, meu avô e o Renato. [Redação, 4º ano]
As posições menos produtivas foram: (i) a de expressão inserida entre o
sujeito e o verbo e (ii) a de expressão entre o verbo e o complemento. Isso já era
esperado por que, como se sabe, o português brasileiro tem como ordem
canônica a orientação SVO, e, nesses casos, a expressão está intercalada entre o
sujeito e o verbo ou entre o verbo e o complemento.
97
Escolaridade
Posição
1º seg.
EF
2º seg.
EF
9º/1º anos
EM
2º/3º anos
EM Total
Total
(%)
AV – SS 0 4 4 2 10
60% AV – ESV 0 0 1 0 1
AV – AS 11 16 7 15 49
DV – SC 2 0 6 3 11
24% DV – EVC 0 0 1 0 1
DV – DC 0 4 2 6 12
CV 2 4 6 4 16 16%
Tabela 2 – Distribuição dos dados das narrativas escolares pelas posições das expressões na sentença
Acredita-se que a tendência às expressões temporais ocorrerem em início
do texto e de sentença também se deva à influência de contos, gênero textual
geralmente trabalhado na escola. É bastante comum que os textos desse gênero
se iniciem com uma expressão temporal formada por haver, como nos contos
abaixo:
Há muito tempo, num reino distante, vivia um rei, uma rainha e sua filhinha, a princesa Branca de Neve. Sua pele era branca como a neve, os lábios vermelhos como o sangue e os cabelos pretos como o ébano. (Branca de Neve e os sete anões)
Era uma vez, há muito tempo, um rei e uma rainha jovens, poderosos e ricos, mas pouco felizes, porque não tinham concretizado maior sonho deles: terem filhos. (A Bela adormecida)
Há muitos anos, em uma terra distante, viviam um mercador e suas três filhas. A mais jovem era a mais linda e carinhosa, por isso era chamada de “Bela”. (A bela e a fera)
98
Além das características gerais apresentadas, verificaram-se duas outras
próprias das redações: a expressão pode ou não ser seguida por outro indicador
temporal (atrás ou desde); o verbo haver pode ser redigido com ou sem a letra H.
Podem-se verificar tais características no exemplo abaixo, no qual o verbo haver
redigido sem a letra h, semelhante a uma preposição — visto a crase — é
seguido pelo advérbio atrás:
48. Minha história, minha vida.
Quando eu nasci à 20 anos atrás, minha mãe presenciou um fato bem
engraçado. Ela me disse que assim que eu vim ao mundo meu destino já
estava traçado eu seria uma atriz. Os médicos ficaram encantados com
aquele bebê tão feio, mas engraçado. (...) [Redação, 2º ano EF]
Sobre esses dois fatores, os resultados estatísticos nas redações
apontaram 72% de expressões redigidas sem h e uma pequena tendência de a
expressão ser acompanhada de outro elemento temporal, o que ocorreu em 57%
dos dados.
Com relação aos grupos de séries, viu-se que a grafia padrão do verbo
ocorre com maior frequência na série final do EF e nas séries do EM; ainda
assim, em todos os grupos há mais expressões redigidas sem h. A observação
dos grupos de séries evidenciou que apenas no 1º segmento do EF não houve
tendência de a expressão ser seguida por outro elemento temporal.
Na tabela abaixo, a distribuição desses dois fatores pode ser verificada
em cada grupo de anos escolares em números totais e percentuais.
99
Escolaridade Com H Sem H Sem atrás Com atrás
1º seg. 3 / 20% 12 / 80 % 8 / 53,3% 7 / 46,7%
2º seg. 2 / 7,1% 26 / 92,9% 8 / 28,6% 20 / 71,4%
9º /1º EM 11 / 40,7% 16 / 59,3% 13 / 48,1% 14 / 51,9%
2º / 3º EM 12 / 40% 18 / 60% 14 / 46,6% 16 / 53,4%
Total 28 72 43 57
Tabela 3 – Distribuição das expressões com ou sem h e seguidas ou não por atrás pelos grupos
de séries
Os resultados da tabela acima confirmam a hipótese de que, no primeiro
segmento, é mais comum o verbo haver ser redigido sem h. Diferentemente, a
hipótese de que nesse segmento haveria mais expressões seguidas por atrás não
se confirma. Acredita-se que esse resultado possa estar relacionado à influência,
já mencionada, das histórias lidas na escola, que comumente apresentam a
expressão “há muito tempo”.
4.1.2 Análise estatística sobre as expressões nas notícias jornalísticas
A análise dos dados não evidenciou diferenças significativas entre o
comportamento funcional dos jornais analisados — O Globo e Extra. A margem
de variação de resultados foi de dois a três dados para grande parte dos fatores
avaliados. Apenas alguns fatores permitiram notar alguma dessemelhança
entre os jornais considerados, os quais serão observados mais atentamente.
Em dois dos três fatores referentes à configuração do elemento que
acompanha o verbo haver na formação da expressão temporal, verificou-se
grande similaridade entre os dois veículos de imprensa analisados. No jornal
Extra, não se encontrou qualquer dado do verbo haver acompanhado por um N,
apenas por SN, e todos delimitáveis. Semelhantemente, no jornal O Globo, em 99
100
dados, o elemento que se une a haver é um SN, houve apenas um dado com N;
desses 100 elementos, 97 são delimitáveis e três não-delimitáveis. Vale
mencionar que a observação dos três dados com SN não-delimitável mostrou
que dois estão na seção de esporte e são textos de um único autor (cf. exs.
abaixo).
49. Ele disse que, se aqui no Flamengo tem imperador, lá no Fluminense tem
o Digão. Está começando e já fala isso de uma pessoa que vem jogando
há muito tempo. [Jornal, O Globo]
50. Uma opção que vem estudando há muito tempo [Jornal, O Globo]
51. Amorim era filiado ao PMDB há muitos anos, mas não tinha militância
partidária. [Jornal, O Globo]
Nas notícias, foi predominante o predicado temporal, o que ocorreu em
91% do total de dados dos dois jornais. Porém, houve diferença entre os dois
jornais: no O Globo, identificaram-se 49 predicados temporais e um situacional;
já no Extra, 42 temporais e oito situacionais. Analisou-se cada um dos nove
dados com predicado situacional e observou-se que todos são da seção de
esportes e são compostos de SN de três tipos: (i) numeral + o nome “jogos”; (ii)
numeral + o nome “rodadas”; i) numeral + o nome “partidas”, como nos
exemplos abaixo:
52. Sem perder há três rodadas, o Duque de Caxias tenta dar sequência à
boa fase hoje. [Jornal, Extra]
53. O Vasco não perdia há cinco jogos, quando foi derrotado pelo Ceará no
Maracanã. [Jornal, Extra]
101
54. Estou no clube há seis partidas, com uma vitória, três empates e duas
derrotas. [Jornal, Extra]
Novamente, as hipóteses referentes ao elemento que se une a haver se
confirmam, visto que há predominância de SN contável, com valor temporal,
como no exemplo baixo:
55. Segundo o jornalista Mauro Ventura, em seu blog no site do GLOBO, o
Comitê Olímpico Brasileiro já tinha se queixado à revista, querendo
saber o porquê de a reportagem, feita há quatro meses, ainda não ter sido
publicada. [Jornal, O Globo]
Em relação ao ponto de ancoragem, não houve divergência entre os
jornais. A ancoragem foi na enunciação em 91% do total de 100 dados das
notícias: em 46 dados do O Globo e em 45 do Extra.
Perceberam-se pequenas diferenças entre dois fatores relativos à
configuração da expressão temporal, o aspecto e o termo ao qual a expressão se
liga. Os resultados podem ser verificados na tabela abaixo:
Jornal Aspecto Termo
Pontual Durativo
Oração Nome
Globo 25 25 41 9
Extra 31 19 37 13
Total 56 44 78 22
Tabela 4 – Distribuição das expressões temporais entre O Globo e Extra em relação ao aspecto e ao termo ao qual a expressão se liga
102
A tabela acima indica equilíbrio entre o aspecto durativo e o pontual
no jornal O Globo e uma leve tendência (62%) no Extra ao aspecto pontual. No
total de dados, considera-se que há equilíbrio entre os aspectos. Tal resultado
era previsto, visto que os jornalistas — diferentemente dos alunos do 1º
segmento do EF — possuem grande domínio de diversas estratégias linguísticas
e, devido à idade, como indica Piaget, já desenvolveram e construíram diversas
relações temporais.
As expressões temporais, nos textos jornalísticos, ligam-se
predominantemente a orações (77/100); ainda assim, diferentemente das
redações, elas podem estar ligadas a um nome, em geral adjetivo como morto,
fechado ou desaparecida. Em 23 dos 100 dados, a expressão refere-se a um nome;
desses 23 dados, 13 estão no jornal Extra e 10 no Globo. Abaixo verifica-se um
exemplo de expressão ligada a um nome e a uma oração, respectivamente.
56. Fechado há nove dias numa embaixada fortemente sitiada por soldados e
policiais armados, o presidente deposto de Honduras, Manuel Zelaya,
teve ontem momentos de festa em meio à tensão. [Jornal, Extra]
57. Há três semanas surgiu um buraco em frente ao número 160 da Rua dos
Açudes. [Jornal, O Globo]
Quanto à posição da expressão no texto, a análise dos 100 dados mostrou
que é mais comum nas notícias que a expressão esteja na porção textual central.
Mediante observação do gráfico 4, baseado em todos os dados de notícias,
percebe-se que a expressão ocorre com mais frequência localizada do meio para
o fim do texto. Atribui-se esse resultado a particularidades do gênero textual: as
notícias visam à informação em primeiro plano; por isso, apresentam
primeiramente o conceito, para posteriormente acrescentar outras informações
sobre ele, tais como as circunstâncias motivadoras, exemplos ou outros fatores
relacionados, como se verifica no exemplo abaixo.
103
58. Um artilheiro bem precoce
Matheus Cardoso, de 11 anos, foi selecionado para um projeto social e
está na equipe mirim do Botafogo
Aos seis meses de idade, Matheus Cardoso, como toda criança, ainda não
sabia andar.
Mas isso não o impediu de ensaiar os primeiros passos futebolísticos.
Engatinhando, ele conduzia a bola pela casa, em Campo Grande, e
chegava ao fim do dia com as mãos bem machucadas. Hoje, aos 11 anos,
Matheus continua viciado no esporte, mas o quintal ficou pequeno para
seus sonhos.
O menino expandiu seus horizontes e, há seis meses, treina com a equipe
mirim do Botafogo.
— Precisava colocar meias nas mãos dele para não machucar tanto. No
vídeo do aniversário de um ano, ele só aparece com a bola — conta a
mãe, Silvia da Conceição.
Matheus treina em escolinhas de futebol desde os 6 anos. Em 2007, os
pais souberam de um projeto social de um colégio particular do bairro e
resolveram inscrevê-lo. Logo no primeiro teste, o coordenador Antenor
Corrêa viu o potencial de goleador.
Matheus tem sido artilheiro de campeonatos intercolegiais e vai
participar da Copa Light, de futebol profissional. Questionado sobre a
escolha da posição de centroavante, o menino tem a resposta na ponta da
língua.
— Eu gosto é de fazer gol — diz Matheus, que também adora balançar as
redes em jogos de videogame.
Como a maioria das crianças, Matheus sonha alto. Seu maior desejo é
jogar no time inglês Manchester United. Mas, para chegar lá, falta muito
chão. Literalmente.
[...] [Jornal, O Globo]
104
Gráfico 4 - Posição da expressão no texto nas notícias
Na observação dos textos de cada um dos jornais analisados, por outro
lado, percebem-se diferenças entre os dados do O Globo e do Extra. Em ambos,
há mais dados com expressão em posição central, porém no Extra parece haver
um equilíbrio maior entre as posições inicial e central, o que não se verifica nos
textos do jornal O Globo.
Posição\ Jornal Globo Extra
Inicial 15/30% 17/34%
Central 27/54% 19/38%
Final 8/16% 14/28%
Tabela 5 – Posição da expressão no texto nos dados do jornal O Globo e do jornal Extra
32%
46%
22%
Posição da expressão no texto
Inicial
Central
Final
105
Sobre a posição da expressão na predicação, foi mais comum a expressão
vir depois do verbo, conforme gráfico abaixo27:
Na compa
às expressões te
nos dados do jo
dos 50 dados do
ainda, que 6 do
são de textos do
diferenças signif
59. Em Nilóp
igreja em
27 No gráfico refeconjuntamente os rrelativas a um nom28 A tabela com os anexo 4.
25%
46%
6%
16%
7%
Posição da expressão na predicação
Antes do Verbo
Depois do verbo
Antes do nome
Depois do nome
Complementando
G
ráfico 5 - Posição da expressão na predicação nas notíciasração entre os dois jornais chamou atenção que essa tendência
mporais virem nas posições posteriores ao verbo foi mais forte
rnal O Globo. A expressão encontra-se depois do verbo em 56%
jornal O Globo e em 36% dos 50 dados do Extra. Destaca-se,
s 7% de dados em que a expressão “complementa” um verbo
jornal Extra (cf. ex. 59). Nas demais posições não se perceberam
icativas entre os dois jornais28.
olis, na Paróquia Nossa Senhora Aparecida, os fiéis lotaram a
missas e festividades ao longo do dia. Maria Vitória Pinheiro
rente à posição da expressão na predicação, optou-se por apresentar esultados das posições anteriores ao verbo em oposição às posteriores, às e e às complementares ao verbo. resultados detalhados sobre a posição da expressão na sentença segue no
106
Gonçalves, de 54 anos, cumpriu ontem um ritual que começou há 20
anos. [Jornal, Extra]
Na observação dos dados de notícias jornalísticas, também foi
investigada a seção do jornal na qual a notícia com a expressão temporal está
inserida. Encontraram-se expressões nas partes de esportes, país, economia e
cadernos de bairro dos dois jornais. Essas seções são comuns aos dois jornais,
mas há outras próprias de cada jornal. No Extra, coletaram-se dados nos
cadernos “viva mais”, “geral”, “Informática” e, no O Globo, no “Primeiro
caderno”, “Rio”, “mundo”.
Como muitas dessas seções apresentam conteúdo semelhante, embora
tenham nomenclatura diferente, optou-se por agrupá-las. No quadro abaixo,
verifica-se a distribuição dos dados pelas seções dos jornais.
Seções Globo Extra Total
Geral (1º caderno e mundo) 4 22 26
Rio 9 0 9
País 13 2 15
Esportes 11 17 28
Economia 5 4 9
Cadernos (bairro, info e saúde) 8 5 13
Tabela 6 – Distribuição das expressões por seções dos jornais
No jornal Extra, a maior produtividade das expressões do tipo haver +
N/SN foi detectada na seção País; no O Globo, foi na seção Geral. Em ambos,
verificou-se um grande número de expressões na seção de esportes.
107
Ressalta-se que, embora todos os textos consultados sejam
predominantemente do tipo narrativo, em algumas seções, como Geral, País e
Economia, por exemplo, os textos apresentam consideráveis porções opinativas.
Esse caráter narrativo-opinativo de algumas notícias pode influenciar na
frequência das expressões em determinadas seções.
4.1.3 Comparação entre observações feitas nas redações e nas notícias
Na presente seção, será feita uma comparação entre os usos das
expressões temporais formadas por haver + N/SN nos gêneros textuais notícia
jornalística e narrativa escolar, a fim de sistematizar as características
aparentemente gerais das expressões e as próprias de cada gênero. Ressalta-se
que os resultados desta secção se baseiam em 200 dados, 100 de cada gênero.
Quanto aos fatores relativos ao elemento que acompanha haver na
formação da expressão, destacaram-se duas semelhanças entre as notícias e as
redações. Nos dois gêneros, o elemento foi predominantemente um predicado
temporal formado por um SN, confirmando a hipótese geral.
Porém, uma diferença significativa foi detectada em relação ao elemento
nominal que forma a expressão ser delimitável ou não. Se, por um lado, nas
narrativas houve um equilíbrio, por outro, nas notícias houve uma maioria de
97% de dados delimitáveis. Acredita-se que tal resultado esteja relacionado a
necessidades relativas ao gênero textual. A notícia jornalística visa a informar
da forma mais precisa possível; por isso, deve haver exatidão nas circunstâncias
em que se desenvolve a narrativa. Assim, se nas narrativas são comuns
expressões como a do exemplo (60), nas notícias elas quase não ocorrem,
havendo, quase predominantemente, expressões que indiquem precisão na
delimitação temporal, como no exemplo (61).
60. O que eu irei contar foi há bastante tempo atrás. [Redação, 3º ano]
61. Em São Paulo, a obra de ampli
Guarulhos está parada
No que concerne às características principais das expressões, destaca
tendência, em ambos os gêneros, de as expressões temporais em estudo serem
dêiticas. O ponto de ancoragem foi na enunciação em 91 dados de notícia e em
92 de redações. Acredita
tipologia, pois, nesses dois tipos de narração, o que há, de fato, são relatos de
acontecimentos anteriores a partir da perspectiva do momento presente.
O fator aspecto mostrou
gêneros. Se, por um lado, nos jornais houve equilíbrio entre os aspectos
durativo e pontual; por outro, nas redações o resultado foi bastante diverso, o
aspecto pontual foi predominante. O gráfico abaixo demonstra com clareza essa
diferença de tendência entre as notícias jornalísticas e as narrativas escolares.
Gráfico 6 - Comparação entre aspecto durativo e pontual nas redações
Imagina-se que esse resultado tenha a ver com a complexidade do
conceito de tempo. Como já havia sido visto, nas narrativas escolares, quanto
menor o nível de escolaridade, menor o uso de expressões durativas, sendo
nulo esse uso em textos do 1º segmento e
0
20
40
60
80
100
Redações
12%
Comparação entre aspecto durativo e pontual nas
Em São Paulo, a obra de ampliação das pistas do Aeroporto de
Guarulhos está parada há um ano e sete meses. [Jornal, O Globo]
No que concerne às características principais das expressões, destaca
tendência, em ambos os gêneros, de as expressões temporais em estudo serem
dêiticas. O ponto de ancoragem foi na enunciação em 91 dados de notícia e em
92 de redações. Acredita-se que tal resultado possa estar relacionado à
tipologia, pois, nesses dois tipos de narração, o que há, de fato, são relatos de
acontecimentos anteriores a partir da perspectiva do momento presente.
O fator aspecto mostrou-se muito interessante na compara
gêneros. Se, por um lado, nos jornais houve equilíbrio entre os aspectos
durativo e pontual; por outro, nas redações o resultado foi bastante diverso, o
aspecto pontual foi predominante. O gráfico abaixo demonstra com clareza essa
tendência entre as notícias jornalísticas e as narrativas escolares.
Comparação entre aspecto durativo e pontual nas redações e nas n
se que esse resultado tenha a ver com a complexidade do
conceito de tempo. Como já havia sido visto, nas narrativas escolares, quanto
menor o nível de escolaridade, menor o uso de expressões durativas, sendo
nulo esse uso em textos do 1º segmento escolar. Nas notícias, por outro lado, os
Redações Notícias
12%
56%
88%
44%
Comparação entre aspecto durativo e pontual nas redações e nas notícias
Durativo
Pontual
108
ação das pistas do Aeroporto de
. [Jornal, O Globo]
No que concerne às características principais das expressões, destaca-se a
tendência, em ambos os gêneros, de as expressões temporais em estudo serem
dêiticas. O ponto de ancoragem foi na enunciação em 91 dados de notícia e em
ue tal resultado possa estar relacionado à
tipologia, pois, nesses dois tipos de narração, o que há, de fato, são relatos de
acontecimentos anteriores a partir da perspectiva do momento presente.
se muito interessante na comparação entre os
gêneros. Se, por um lado, nos jornais houve equilíbrio entre os aspectos
durativo e pontual; por outro, nas redações o resultado foi bastante diverso, o
aspecto pontual foi predominante. O gráfico abaixo demonstra com clareza essa
tendência entre as notícias jornalísticas e as narrativas escolares.
e nas notícias
se que esse resultado tenha a ver com a complexidade do
conceito de tempo. Como já havia sido visto, nas narrativas escolares, quanto
menor o nível de escolaridade, menor o uso de expressões durativas, sendo
scolar. Nas notícias, por outro lado, os
Durativo
Pontual
109
enunciantes provavelmente possuem maturidade em relação ao conceito de
tempo e grande domínio de expressões linguísticas.
Acredita-se, então, que a forma mais básica do uso das expressões
temporais formadas pelo verbo haver + N/SN seja a indicação de
ponto/momento no passado. Consequentemente, a expressão de uma duração
por meio de tais estruturas seria uma construção mais complexa.
Outro ponto de divergência entre os dois gêneros textuais estudados que
parece estar ligado ao conhecimento de diversificadas estruturas linguísticas foi
a possibilidade de a expressão estar ligada a um nome ou a uma oração. Nas
redações, todas as expressões relacionam-se a uma oração, já nas notícias, isso
ocorreu em 77% dos dados.
Na comparação entre os gêneros quanto à localização da expressão, os
resultados foram bastante interessantes para as duas possibilidades: posição no
texto e na sentença.
Nas narrativas escolares a maior parte das expressões temporais está na
porção introdutória de texto. Como já visto, acredita-se que esse resultado seja
característico do gênero e influenciado por outros gêneros textuais trabalhados
na escola. É bastante comum, em gêneros baseados na tipologia narrativa, que
as circunstâncias, como tempo e lugar, apareçam na porção inicial de texto. Nas
notícias, porém, a configuração das expressões no texto é mais variável, embora
seja predominante a posição textual central.
Quanto à posição da expressão na predicação, viu-se que, nas narrativas,
não houve grande mobilidade; a posição mais frequente foi antes do verbo (cf.
ex. 62). Por outro lado, nas notícias, a expressão apareceu em diversas posições,
inclusive ligada a um nome; mas a posição mais frequente foi depois do verbo
(cf. ex. 63).
62. A muito tempo no parque eu estava sozinha mais, apareceu minha amiga
Gabriele ela é engraçada e alegre. [Redação, 5º ano]
110
63. O casal vivia há cerca de um ano e meio num apartamento de subúrbio.
[Jornal, Extra]
Gráfico 7 - Posição da expressão na predicação em narrativas e notícias
Por fim, vale salientar que a primeira análise indicou particularidades
entre os gêneros estudados, mas também semelhanças quanto aos usos das
expressões temporais.
4.2. As expressões temporais nos planos discursivos figura e fundo
O conceito de planos discursivos é relacionado à característica das
narrativas de apresentarem elementos destacados em relação a outros. Esses
elementos em destaque são os que inserem o conteúdo narrativo, a história/o
problema, (figura); e os demais são os que inserem informações, situam,
temporalizam, enriquecem a narrativa (fundo).
Hopper e Thompson (1980) relacionam diretamente o conceito de planos
discursivos ao de transitividade e apresentam dez parâmetros que caracterizam
juntos uma cláusula transitiva, e, consequentemente, o plano figura: i) ter dois
ou mais participantes; ii) ser ação; iii) ter aspecto perfectivo, iv) ser um evento
60%
25%24%
46%
0%22%16%
7%0102030405060708090
100
Redações Notícias
Posição da expressão na predicação em narrativas e notícias
Antes do verbo
Depois do verbo
Ligado a um nome
Complementando
111
pontual; v) ter sujeito intencional; vi) ser afirmativa; vii) estar no modo realis;
viii) ter sujeito agente; ix) ter objeto afetado; x) ter objeto individuado.
Considerando a noção de continuum dos planos discursivos, optou-se por
uma adaptação da proposta de Silveira (1990), estabelecendo uma escala que
considera dois níveis de fundidade. Assim, os parâmetros de transitividade
foram reorganizados em níveis de 0 a 10 em três grupos. O primeiro engloba as
pontuações de 0 a 4, o segundo, de 5 a 7, e o terceiro de 8 a 10. Dessa forma,
verifica-se o grau de fundidade do trecho no texto: o primeiro grupo representa
+ fundo (fundo 1); o segundo, um nível intermediário de fundo (fundo 2); e o
terceiro representa trechos de figura.
Caracterizam-se, então, as expressões temporais formadas por haver +
N/SN, de acordo com o plano discursivo, partindo-se da hipótese de que tais
expressões apareçam de forma predominante em contexto de fundo, visto que
indicam circunstâncias.
Deve-se ressaltar que, na observação dos dados, foram verificadas duas
questões em relação à análise da transitividade das cláusulas. A primeira
relaciona-se ao fato de que o conceito de transitividade não dá conta de
cláusulas passivas. A segunda diz respeito ao fato de que há expressões
inseridas em frases nominais, que não atendem a qualquer parâmetro.
Diante disso, havia três possíveis decisões: i) desconsiderar esses dados;
ii) adotar a proposta de Furtado da Cunha (1996) para análise de transitividade
de cláusulas passivas e, ainda assim, não resolver a questão das frases
nominais; iii) considerar tais dados como plano de fundo, visto que não
atendem a parâmetros de transitividade ou atendem a pouquíssimos.
Descartou-se a primeira porque se pretende verificar, de fato, as
tendências das expressões, sem que se percam informações. A segunda também
não foi adotada porque não daria conta das duas questões. Assim, optou-se por
categorizar as sentenças passivas e as frases nominais como plano discursivo
fundo 1, sem, porém, deixar de tecer observações sobre tais dados
separadamente.
112
A primeira observação feita na análise foi a confirmação da hipótese de
que as expressões são mais produtivas no plano discursivo fundo 1. O
resultado era esperado, pois a indicação de tempo e lugar — circunstâncias em
que ocorre a história — costuma aparecer em trechos de fundo.
Como se verifica na tabela abaixo, houve raríssimas expressões em
cláusulas figura (3,5%). As expressões ocorreram predominantemente nos
planos discursivos de fundo.
Fundo 1 Fundo 2 Figura
137/200
68,5%
56/200
28%
7/200
3,5%
Tabela 7 – Produtividade dos planos discursivos figura, fundo 2 e fundo 1 nas suamostra
Aplicando-se os parâmetros de transitividade propostos por Hopper e
Thompson (1980) no exemplo abaixo, mostra-se que a expressão temporal está
inserida em trecho de fundo 1, pois a cláusula com a expressão apresenta baixa
transitividade. Nela há apenas um participante envolvido (o casal), que é um
sujeito não agente e não intencional; não há objeto afetado e individuado; o
verbo não indica uma ação e é imperfectivo, embora esteja no modo realis; o
evento não é pontual, e a frase é afirmativa. A essa sentença, então, atribui-se
pontuação 2.
64. Brasileira é assassinada com dois tiros em Portugal
Lisboa – Uma brasileira foi assassinada na última sexta-feira na cidade
portuguesa de Belas, a 16 quilômetros de Lisboa. Sandra Ruela, de 39
anos, levou dois tiros e, segundo jornal “Diário de Notícias”, há indícios
de que o responsável pelo crime é o seu namorado, o agente de polícia
Vitor Manuel Contente, de 42, que teria cometido o crime durante cena
de ciúmes.
113
O jornal disse que Vitor se entregou à polícia, mas não houve
confirmação oficial. O casal vivia há cerca de um ano e meio num
apartamento de subúrbio. De acordo com uma vizinha, “quando o
policial bebia, alterava o seu comportamento e havia grandes brigas”.
[Jornal, Extra]
Percebe-se que a sentença com a expressão temporal está em plano de
fundo, além da baixa transitividade, porque ela apenas acrescenta elementos à
narrativa. O foco da narração está no fato de que uma brasileira levou tiros e
seu namorado, suspeito, se entregou à polícia.
Ainda em relação ao plano fundo 1, destaca-se a semelhança de
comportamento das expressões nos dois gêneros discursivos estudados. Nas
narrativas verificaram-se 68%29 e nas notícias 69% de expressões em trechos de
fundo 1.
Tal semelhança entre os gêneros pode ser verificada também nos demais
planos discursivos. Conforme gráfico 8, as expressões temporais em trechos de
fundo 2 (cf. ex. 65) ocorreram em 29% das redações e em 275 das notícias, e em
trechos de figura foram pouquíssimo produtivas (cf. ex. 66) nos dois gêneros.
29 Novamente aqui optou-se por não apresentar os números absolutos por serem equivalentes aos percentuais.
Gráfico 8
Abaixo verifica-se um exemplo de expressão em plano de
segundo os parâmetros de transitividade. Na cláusula com a expressão
temporal, verifica-se que há um sujeito agente e intencional; o verbo indica uma
ação perfectiva e está no modo
evento não é pontual, não há objeto afetado ou individuado e há apenas um
participante — parâmetros positivos para a transitividade. Sendo assim, atribui
se a tal sentença a pontuação 6.
65. Eu e meu amigo
A muito tempo um dia ruim para mim eu vim para escola e já tinha
chego tarde. Então eu so pode entra no segundo tempo e foi que
começou.
No recreio eu e o meu amigoRonald fomos pego pelo epeto no banheiro
e quando nois dos tava fugindo do espeto eu levei o maio tom
mundo foi tão feio que o espeto esqueceu até de me leve para a
secretaria. [Redação, 7º ano]
No exemplo abaixo
alta transitividade, já que atinge pontuação oito, segundo os parâmetros
0
20
40
60
80
100
Redações
68%
Planos discursivos nas narrativas e notícias
8 – Planos discursivos nas narrativas e notícias
se um exemplo de expressão em plano de
segundo os parâmetros de transitividade. Na cláusula com a expressão
se que há um sujeito agente e intencional; o verbo indica uma
e está no modo realis; a sentença é afirmativa. Por outro lado, o
evento não é pontual, não há objeto afetado ou individuado e há apenas um
parâmetros positivos para a transitividade. Sendo assim, atribui
se a tal sentença a pontuação 6.
um dia ruim para mim eu vim para escola e já tinha
chego tarde. Então eu so pode entra no segundo tempo e foi que
No recreio eu e o meu amigoRonald fomos pego pelo epeto no banheiro
e quando nois dos tava fugindo do espeto eu levei o maio tom
mundo foi tão feio que o espeto esqueceu até de me leve para a
secretaria. [Redação, 7º ano]
No exemplo abaixo, a expressão com haver está em uma cláusula com
alta transitividade, já que atinge pontuação oito, segundo os parâmetros
Redações Notícias
69%
29% 27%
3% 4%
Planos discursivos nas narrativas e notícias
114
se um exemplo de expressão em plano de fundo 2,
segundo os parâmetros de transitividade. Na cláusula com a expressão
se que há um sujeito agente e intencional; o verbo indica uma
a sentença é afirmativa. Por outro lado, o
evento não é pontual, não há objeto afetado ou individuado e há apenas um
parâmetros positivos para a transitividade. Sendo assim, atribui-
um dia ruim para mim eu vim para escola e já tinha
chego tarde. Então eu so pode entra no segundo tempo e foi que
No recreio eu e o meu amigoRonald fomos pego pelo epeto no banheiro
e quando nois dos tava fugindo do espeto eu levei o maio tombo do
mundo foi tão feio que o espeto esqueceu até de me leve para a
está em uma cláusula com
alta transitividade, já que atinge pontuação oito, segundo os parâmetros
Fundo 1
Fundo 2
Figura
115
adotados. Os pontos positivos para transitividade são: dois participantes
(quatro criminosos e um ônibus); ação perfectiva, no modo realis; o sujeito
intencional e agente; o objeto afetado; sentença afirmativa. Como pontos
negativos, indicam-se a não pontualidade do evento e a não individuação do
objeto.
66. PMs evitam que mais um ônibus seja incendiado em favela na Maré
Criminosos assaltaram passageiros na Linha Amarela e sequestraram
veículo
A rápida ação de policiais do 22º BPM (Penha) evitou ontem de manhã
que traficantes da Vila do João, no Complexo da Maré, em Bonsucesso,
incendiassem um ônibus da linha 485 (Penha-Leblon), que fora assaltado
e sequestrado momentos antes num ponto na Linha Amarela, perto da
Vila dos Pinheiros. [...]
Há oito dias, num caso parecido, quatro criminosos incendiaram um
ônibus da linha 634A (Ilha do Fundão-Del Castilho, que faz integração
com o metrô), na Vila dos Pinheiros, também na Maré, depois de
sequestrá-lo na Linha Amarela e assaltar os passageiros. Os bandidos
aproveitaram que o ônibus parou num ponto da via expressa para
render o motorista, que foi obrigado a levar o veículo para a favela. Lá,
cerca de 30 passageiros foram saqueados e depois receberam ordem para
desembarcar. [Jornal, O Globo]
Se observado, porém, o conteúdo narrativo da notícia acima, tal sentença
talvez não se enquadre no que se estipula ser figura, pois o trecho no qual está
inserida a expressão não apresenta o principal conteúdo narrativo. A
história/problema narrado é a tentativa de bandidos incendiarem um ônibus
que foi interrompida pela ação de policiais. O trecho com a expressão temporal
116
acrescenta demais informações à narrativa, indica um caso parecido que
ocorreu anteriormente.
Ressalta-se, no entanto, que, dos sete dados encontrados nos jornais e
redações com expressão em trecho de figura (segundo os parâmetros de
transitividade), em apenas três a sentença analisada apresenta o foco da
narrativa. Nos demais, os trechos em questão exemplificam ou adicionam
informação à narrativa.
A fim de entender e sistematizar as características das poucas expressões
no plano discursivo figura, comparam-se os resultados referentes a esse plano
discursivo com as posições da expressão tanto na predicação quanto no texto.
Nos dois gêneros, as expressões de figura estão predominantemente no
início da predicação. Isso ocorre nos três dados das redações e em três dos
quatro dados das notícias. Nas redações, as três expressões em trecho figura
estão em porção inicial de texto; nas notícias, há uma distribuição entre as
posições: uma em início de texto, uma no centro e duas em posição final.
Embora tenham sido verificadas semelhanças nos dois gêneros
analisados em relação aos dois planos fundo e ao plano figura, foi vista
também uma grande diferença entre os gêneros quanto aos dados de frases
passivas e nominais, mencionados anteriormente.
Como já indicado, essas frases foram consideradas como fundo 1 na
análise, mas se observaram uma a uma a fim de se entenderem tais estruturas.
Percebeu-se, então, uma grande discrepância entre os gêneros. Registraram-se
32 dados dessas frases, dos quais 29 estavam em textos de notícias e apenas três
em textos de narrativas escolares.
Tal discrepância é compreensível se detalhados os dados. Nas redações,
as três ocorrências foram de frases passivas, tal como:
67. Há três semanas passadas uma menina de comunidade carente foi
brutalmente morta por uma bala perdida na saída de uma escola
municipal. [Redação, 9º ano].
117
Já nas notícias, apenas sete dados foram de passivas, 22 foram de frases
nominais, como:
68. Prefeito há 25 dias, (...) [jornal, Extra]
Por não terem ocorrido expressões em frases nominais nas narrativas,
houve essa grande diferença. Assim, a opção de considerar essas frases como
fundo 1 influenciou significativamente no resultado dos jornais, mas não no das
redações.
4.3. As expressões temporais no fluxo de informação
O fluxo de informação relaciona-se ao armazenamento de informação na
memória. As informações no discurso podem ter três possibilidades de status de
acordo com o estado de ativação da informação: ativo (conceito focalizado),
semi-ativo (conceito do qual os interlocutores têm consciência ou
conhecimento) e inativo (conceito que ainda não esteve ativo ou semi-ativo).
A análise do fluxo de informação indicou, como se verifica na tabela
abaixo, que, no total de dados, foi mais comum o fato de as unidades
entonacionais com haver + N/SN expressarem conceitos semi-ativos ou
inativos.
Ativo Semi-ativo Inativo
38/200
19%
85/200
42,5%
77/200
38,5%
Tabela 8 – Relação entre as sentenças com as expressões temporais e o fluxo de informação
Na comparação do fluxo de informação entre os gêneros
grande diferença entre as narrativas escolares e as notícias. Nas narrativas, as
expressões estão predominantemente em unidades que introduzem uma
informação, ou seja, representam um conceito
por outro lado, há um maior número informações de conceitos
ex. 66) ou ativos (cf. ex.
divergência nos resultados de cada gênero pode ser verificada no gráfico
abaixo:
Gráfico 9
O percentual de ocorrências do fator mais produtivo foi similar nos dois
gêneros: 59% de conceitos
ativos para as notícias.
Na notícia abaixo, do jornal
em uma unidade que apresenta um conceito
dias”. Esse conceito foi considerado
sido inserida a informação de que o namoro havia terminado. Lo
conceito ainda estava em foco na comunicação.
0
20
40
60
80
100
Redações
14%
Status informacional nas narrativas e notícias
Na comparação do fluxo de informação entre os gêneros
grande diferença entre as narrativas escolares e as notícias. Nas narrativas, as
expressões estão predominantemente em unidades que introduzem uma
informação, ou seja, representam um conceito inativo (cf. ex. 67). Nos jornais,
por outro lado, há um maior número informações de conceitos semi
65), que totalizam 83% dos dados desse gênero. E
divergência nos resultados de cada gênero pode ser verificada no gráfico
– Status informacional nas narrativas e notícias
percentual de ocorrências do fator mais produtivo foi similar nos dois
gêneros: 59% de conceitos inativos para as narrativas e 60% de conceitos
Na notícia abaixo, do jornal O Globo, a expressão temporal está inserida
em uma unidade que apresenta um conceito ativo: “O namoro acabou
”. Esse conceito foi considerado ativo porque em trecho anterior já havia
a informação de que o namoro havia terminado. Lo
conceito ainda estava em foco na comunicação.
Redações Notícias
24%26%
59%60%
17%
Status informacional nas narrativas e notícias
118
Na comparação do fluxo de informação entre os gêneros, percebe-se
grande diferença entre as narrativas escolares e as notícias. Nas narrativas, as
expressões estão predominantemente em unidades que introduzem uma
). Nos jornais,
semi-ativos (cf.
83% dos dados desse gênero. Essa
divergência nos resultados de cada gênero pode ser verificada no gráfico
percentual de ocorrências do fator mais produtivo foi similar nos dois
para as narrativas e 60% de conceitos semi-
, a expressão temporal está inserida
O namoro acabou há nove
m trecho anterior já havia
a informação de que o namoro havia terminado. Logo, esse
Ativo
Semi-ativo
Inativo
119
69. Romance com sabor amargo
Pesquisa da Fiocruz revela que 85% das adolescentes já foram vítimas
de violência durante namoros
O namoro de Mariana (nome fictício), 16 anos, começou como qualquer
outro relacionamento adolescente, mas terminou com problemas de
gente grande. No início, o rapaz de 24 anos, seu primeiro namorado, era
calmo e presente. Quatro meses depois, ele se tornou autoritário,
ciumento, controlador e violento,a ponto de agredi-la verbalmente e
fisicamente diversas vezes. O namoro acabou há nove dias, quando ele,
depois de crise de ciúmes, bateu na adolescente, grávida de três meses.
(...) [Jornal, Extra]
O texto jornalístico abaixo exemplifica uma expressão contida em um
trecho com um conceito semi-ativo. No título e ao longo do texto, são
apresentas informações relativas a possibilidade de Juan jogar. Assim, por meio
de uma associação, torna-se previamente semi-ativada a noção de que há
interesse do técnico de que o jogador atue. Portanto, a informação de que o
técnico estuda essa opção há um tempo foi considerada semi-ativa.
70. Fla pode ter ala esquerda com Juan e Everton contra o Flu
Andrade faz treino secreto e experimenta uma nova formação para o
time
A medida em que o clássico contra o Fluminense se aproxima, o técnico
Andrade vai fazendo do mistério a grande arma do Flamengo. Ontem,
ele comandou um treino secreto e vai repetir a dose hoje. Tudo para
treinar uma possível mudança no time: a volta de Juan à lateral-
esquerda, com Everton passando para o meio campo e atuando ao lado
de Petkovic na armação das jogadas, com Zé Roberto e Adriano no
ataque.
Andrade nunca escondeu a sua admiração pelo futebol de Everton. Ao
120
mesmo tempo, não pode abrir mão da experiência e do talento de Juan
na lateral esquerda. Uma opção que vem estudando há muito tempo, e
que poderá pôr em prática diante do Fluminense, é a escalação de
Everton como um meia, tendo liberdade para chegar ao ataque,
revezando com Zé Roberto na função. [Jornal, O Globo]
Já na narrativa escolar abaixo, há um exemplo de conceito previamente
inativo. Ocorre, nesse dado, a ativação de um conceito, a introdução de uma
informação. Ainda não havia sido mencionada no texto a morte de alguém, nem
mesmo algum termo com o qual tal assunto pudesse ser associado.
71. Certo dia, um garoto estava andando perto da casa de um garoto que
morreu a muito tempo. O meu amigo foi lá e vil e ele e falou assustado!
- Sai daí rápido!!!!!! O garoto respondeu:
- Por-que? Porque, você vai morrer disse o meu amigo. E o garoto saiu
correndo. [Redação, 3º ano EF]
Dadas as diferenças de tendências de fluxo informacional entre os
gêneros textuais, procuraram-se relações entre este e os demais fatores, a fim de
entender a divergência de comportamento e de sistematizar as particularidades.
Confirmando a hipótese, percebeu-se uma aparente relação entre a
posição da expressão no texto e o fluxo informacional. Conforme o gráfico
abaixo, a maior parte dos dados (62/109) com a expressão em posição textual
inicial expressa conceitos inativos. Por outro lado, os conceitos semi-ativos e
ativos foram mais recorrentes em posição central (32/61) ou final (22/30).
Gráfico 10 - Fluxo de informação nas posições textuais (percentuais)
Na observação dos resultados referentes às notícias na tabela abaixo, não
se levantam muitas questões sobre a relação entre
posição da expressão no texto. Percebe
os tipos de conceitos, a posição central é mais produtiva. Já na parte
redações, chamaram atenção os conceitos
que introduzem um conceito estão em posição textual inicial.
Notícias
Ativo Semi
Inicial 9/24
37,5%
Central 12/24
50%
Final 3/24
12,5%
Tabela 9 - Fluxo de informação nas posições textuais (percentuais) em cada gênero
0
20
40
60
80
100
Ativo
14,7%
27,9%
Fluxo de informação nas posições textuais (percentuais)
Na observação dos resultados referentes às notícias na tabela abaixo, não
se levantam muitas questões sobre a relação entre status informacional e a
posição da expressão no texto. Percebe-se, apenas, que, na expressão de todos
os tipos de conceitos, a posição central é mais produtiva. Já na parte
redações, chamaram atenção os conceitos inativos, porque 93% das expressões
que introduzem um conceito estão em posição textual inicial.
Notícias Redações
Semi-ativo Inativo Ativo Semi-ativo
17/59
29%
6/17
35%
7/14
50%
14/26
54%
26/59
44%
8/17
47%
5/14
36%
6/26
23%
16/59
27%
3/17
18%
2/14
14%
6/26
23%
Fluxo de informação nas posições textuais (percentuais) em cada gênero
Ativo Semi-ativo Inativo
28,7%
59,9%
27,9%
52,4%
19,7%16,7%
73,3%
10%
Status informacional nas narrativas e notícias
121
Fluxo de informação nas posições textuais (percentuais)
Na observação dos resultados referentes às notícias na tabela abaixo, não
informacional e a
se, apenas, que, na expressão de todos
os tipos de conceitos, a posição central é mais produtiva. Já na parte referente às
, porque 93% das expressões
Redações
ativo Inativo
14/26
%
56/60
93%
6/26
%
4/60
7%
6/26
%
0/60
Fluxo de informação nas posições textuais (percentuais) em cada gênero
Inicial
Central
Final
122
Destaca-se a grande diferença nos dois gêneros quanto às informações
em posição inicial. Se por um lado, nas redações foram predominantes
conceitos inativos nessa posição; por outro, nas notícias, houve um grande
número de conceitos semi-ativos e ativos. Acredita-se que tal diferença se deva
à presença obrigatória, nas notícias, de um título, que comumente vem
acompanhado por um subtítulo. Juntos, eles ativam uma série de informações
que serão tratadas no texto. Já nas redações, a presença do título não foi
obrigatória, e em muitas há um título, porém este não dá conta do tema a ser
tratado.
4.4. O comportamento semi-gramatical de haver nas expressões temporais
Na investigação dos usos das expressões de tempo passado formadas
por haver + N/SN temporal, importa também tratar do estatuto funcional desse
verbo. Com essa perspectiva, busca-se verificar o estágio de gramaticalização de
haver a partir da hipótese de que esse verbo atuaria como elemento integrante
de expressão temporal (verbo funcional30, segundo Travaglia, 2002).
Travaglia (1991), ao tratar de verbos gramaticais, engloba haver em um
conjunto de verbos que podem atuar como marcadores temporais. Para ele,
Os marcadores temporais são verbos que, em conjunto com um
sintagma nominal, constituem uma espécie de adjunto adverbial de
tempo indicando sobretudo o quando de uma situação ou sua
duração. Às vezes podem ser substituídos apenas pelo sintagma
nominal ou por um sintagma adverbial. Sua substituição pode
implicar mudança de toda estrutura da frase. (op. cit.: 57) 30 Segundo Travaglia (2002), um verbo funcional “é um item que não marca uma categoria gramatical dos verbos e outras classes, mas desempenha, nos textos e outras seqüências lingüísticas, um papel nitidamente gramatical, ou seja, de significação externa à língua. Estão nesse caso os marcadores conversacionais, os marcadores temporais, os ordenadores textuais etc."
123
Na literatura consultada, encontraram-se diferentes possibilidades de
classificação para tais expressões: oração subordinada adverbial temporal;
oração principal de uma oração subordinada adverbial temporal; oração
subordinada substantiva subjetiva; adjunto adverbial.
Adotou-se, então, a última proposta, lembrando-se de que o verbo haver,
além de predicador, pode exercer uma função mais gramatical na predicação, a
de auxiliar. Acredita-se que, devido a uma adaptação às necessidades
comunicativas, o verbo predicador assuma outras diferentes funções, sofrendo
especializações morfossintáticas e semânticas e mudando seu status
convencional.
A observação dos dados neste estudo evidenciou que haver, de fato,
apresenta propriedades que podem relacioná-lo tanto à categoria de verbo
predicador — em uma de suas extensões de sentido — quanto à de constituinte
gramatical de expressão adverbial
Dentre as principais propriedades verificadas, destacam-se as seguintes:
i) Possibilidade substituição do verbo haver, em alguns casos, por outros verbos
predicadores, tais como completar ou somar(-se), como em:
72. Para se equiparar a São Paulo, que já tem seu museu do futebol em
funcionamento há um ano [Jornal, O Globo]
Para se equiparar a São Paulo, que já tem seu museu do futebol em
funcionamento soma um ano.
73. E às vésperas de um confronto com o vice-líder São Paulo, hoje, às
16h10m, no Maracanã, o bom momento do time, invicto há sete rodadas
[Jornal, Extra]
E às vésperas de um confronto com o vice-líder São Paulo, hoje, às 16h10m, no
Maracanã, o bom momento do time, invicto completam sete rodadas
124
Por outro lado, há contextos nos quais tal substituição não é possível:
74. A princesa Isabela
A muito tempo atrás, existia uma princesa chamada Isabela. Ela morava
num castelo no meio de um vale.[Redação, 3º ano]
Soma-se/completa muito tempo atrás, existia uma princesa chamada Isabela. Ela
morava num castelo no meio de um vale.[Redação, 3º ano]
ii) Possibilidade, em alguns casos, de substituição do verbo haver por
preposição ou por um advérbio, como, por exemplo, já, de, desde, antes, atrás. Ou
a substituição de toda expressão por um adjunto adverbial. A substituição
depende do aspecto da expressão; desde, por exemplo, substitui haver em
expressões durativas.
75. Estou no clube há seis partidas. [Jornal, Extra]
Estou no clube desde seis partidas.
76. O BuscaPé foi fundado há dez anos por quatro estudantes de engenharia
da USP [Jornal, O Globo]
O BuscaPé foi fundado dez anos atrás por quatro estudantes de engenharia da
USP
O BuscaPé foi fundado década passada por quatro estudantes de engenharia da
USP
iii) Possibilidade, em alguns casos, de supressão do verbo sem acarretar perda
ou alteração semântica, como em:
77. Ele trabalhava no circo a pouco tempo, todas as criança adorava ele.
[Redação, 6º ano EF]
Ele trabalhava no circo pouco tempo, todas as criança adorava ele.
125
78. Um dia eu estava já na janela á uns dez minutos, quando o menino me
tacou gelatina no meio da cara [Redação, 9º ano]
Um dia eu estava já na janela uns dez minutos, quando o menino me tacou
gelatina no meio da cara
Novamente há contextos nos quais essa propriedade não se aplica. A
possibilidade de supressão do verbo depende do contexto no qual a expressão
está inserida. Parece que só é possível suprimir o verbo se a expressão for
acompanhada por outro elemento temporal (cf. ex. 79) ou indicar um aspecto
durativo, como no exemplo (80). Se o aspecto for pontual, parece haver perda
ou alteração semântica (cf. ex. 81).
79. À um tempão atrás, fizeram votação para escolhermos o nome do
mascote, eram: Cauê, Cauã e Luka. O nome escolhido foi Cauê.
[Redação, 7º ano]
Um tempão atrás, fizeram votação para escolhermos o nome do mascote, eram:
Cauê, Cauã e Luka. O nome escolhido foi Cauê.
80. Sem perder há três rodadas, o Duque de Caxias tenta dar sequência à
boa fase hoje [Jornal Extra]
Sem perder três rodadas, o Duque de Caxias tenta dar sequência à boa fase hoje
[Jornal Extra]
81. A idéia, que surgiu há três meses, já rendeu mais de 240 obras doadas,
que incluem autores como Jorge Amado. [Jornal, Extra]
A idéia, que surgiu há três meses, já rendeu mais de 240 obras doadas, que
incluem autores como Jorge Amado.
iv) Pouca liberdade de manipulação posicional do verbo nas expressões. Haver
ocorre sempre em posição anterior ao termo que exprime somatório de tempo
(cf. ex. 82), não tendo sido verificada qualquer ocorrência com a ordem inversa
126
(Quatro annos ha que não recebemos aqui cartas de V. P. o que não podemos deixar de
sentir assi por careceremos da consolação31 / A’ par disso, annos há que nenhuma
molestia de caracter epidemico tem se manifestado no Estado, conservando-se em
excellentes condições a saúde pública.32)
82. A muito tempo, em uma Terra de um universo paralelo ao nosso, existia
um grande mago chamado Kalak [Redação, 9º ano EF]
Muito tempo a, em uma Terra de um universo paralelo ao nosso, existia um
grande mago chamado Kalak
Em estágios anteriores da língua, houve maior mobilidade entre os
elementos da expressão, haja vista as inversões documentadas em um dado
datado de 1601 e em outro de 1904. Ao que parece, tais expressões se
submeteram a um processo de especialização que acarretou a fixação da ordem.
v) Neutralização das marcas morfológicas e semânticas do verbo. Haver, em
expressões temporais, só admite flexão de 3ª pessoa do singular presente, com
poucas exceções, ocorrendo no imperfeito (cf. ex. 83). Assume, ainda,
características próprias de categorias secundárias, como de preposição, por
exemplo, visto que se apresenta de forma invariável ligando o elemento ao qual
a expressão se relaciona (“lutava”, no ex. 83) e a quantidade de tempo (“alguns
anos”, no ex. 83). Soma-se a isso, ainda, a atitude dos falantes de relacionar esse
verbo com a preposição a (cf. ex. 84).
31 Carta de D. Luís Cerqueira ao Padre Geral. Nagasaki, 5 de Outubro de 1601 in ARSI, Jap-Sin 20 II, fl. 99-99v. (cham.fcsh.unl.pt/jesuitasnooriente/files/16011005.pdf) consultado em 05/01/2010. 32 Mensagem apresentada ao congresso legislativo pelo Exmo. Snr. Dr. Francisco Xavier da Silva (governador do estado), em 1904. (www.arquivopublico.pr.gov.br/arquivos/File/pdf/msg1904_p.pdf) consultado em 05/01/2010.
127
83. Pouco antes, na noite de sexta-feira, o comunicador Francisco Carioca, de
69, que estava internado no Hospital do Câncer, em Vila Isabel, perdeu a
batalha coma doença contra a qual lutava havia alguns anos. [Jornal,
extra]
84. Os organizadores descubriram à pouco tempo que há relatos deque os
resultados estão sendo manipulados [Redação, 9º ano EF]
No trecho acima, fica claro que o aluno conhece a ortografia do verbo
haver, já que o representa com h em há relatos. Percebe-se, porém, pela
representação ortográfica de à pouco tempo, que o aluno, possivelmente, não
relaciona o elemento formador da expressão a um verbo, mas, talvez, a uma
preposição, haja vista o uso da crase.
Das cinco propriedades descritas anteriormente, a primeira parece
relacionar haver a um verbo predicador, uma vez que se assemelha a outros
verbos predicadores e pode ser substituído por alguns deles. As demais
propriedades, no entanto, respaldam o entendimento de que o verbo haver, ao
integrar uma expressão de tempo escoado, atua como elemento funcional, uma
espécie de verbo semi-gramatical. Afinal, revelam o processo de especialização
morfossintática e semântica ao qual se submete.
Exploraram-se alguns desses indícios de gramaticalização, na forma de
testes de atitudes linguísticas, direcionados a alunos de diferentes níveis de
ensino. Foram expostos quatro tipos de frases33 a alunos de Graduação e sete
outros tipos para alunos dos ensinos fundamental e médio.
Para os alunos de Graduação foram apresentadas as seguintes frases34:
(I) eu tô com uma rotina já há muito tempo, que, me deixa, muito, afastada do
comércio do bairro... [oral, NURC] 33 As frases utilizadas foram retiradas dos dados do trabalho Expressões temporais com HAVER, FAZER e TER (PAIVA, 2007). 34 Os teste são apresentados nos anexos 1,2 e3.
128
(II) eles têm às vezes não são... são certas... liberdades... que hoje existem... que há anos
atrás poderiam parecer excessivas mas que na realidade NÃO SÃO [oral, NURC]
(III) Há duas semanas que o documentário vai ao ar noite e dia. Liga lá, deve estar
passando agora. [escrito, O Globo]
(IV) mas vejam vocês ... há dois anos { } os estatutos do magistério não conseguem sair
[oral, NURC]
Nesse teste, dirigido a graduandos, questionou-se a aceitação dos
participantes em relação a algumas manipulações feitas nas frases apresentadas.
Perguntou-se se as modificações de supressão do verbo haver, de substituição
por desde ou de acréscimo de desde à expressão acarretariam alteração de sentido
em relação à frase original. Apresentaram-se as seguintes sentenças
modificadas:
(Ia) eu tô com uma rotina já muito tempo, que, me deixa, muito, afastada do
comércio do bairro...
(Ib) eu tô com uma rotina desde muito tempo, que, me deixa, muito, afastada
do comércio do bairro...
(Ic) eu tô com uma rotina já desde há muito tempo, que, me deixa, muito,
afastada do comércio do bairro...
(IIa) eles têm às vezes não são... são certas... liberdades... que hoje existem... que
anos atrás poderiam parecer excessivas mas que na realidade NÃO SÃO
(IIb) eles têm às vezes não são... são certas... liberdades... que hoje existem... que
desde anos atrás poderiam parecer excessivas mas que na realidade NÃO SÃO
(IIc) eles têm às vezes não são... são certas... liberdades... que hoje existem... que
desde há anos atrás poderiam parecer excessivas mas que na realidade NÃO
SÃO
(IIIa) Duas semanas que o documentário vai ao ar noite e dia.
(IIIb) Desde duas semanas que o documentário vai ao ar noite e dia.
(IIIc) Desde há duas semanas que o documentário vai ao ar noite e dia.
129
(IVa) mas vejam vocês ... dois anos { } os estatutos do magistério não
conseguem sair
(IVb) mas vejam vocês... desde dois anos { } os estatutos do magistério não
conseguem sair
(IVc) mas vejam vocês ... desde há dois anos { } os estatutos do magistério não
conseguem sair
Os resultados obtidos na aplicação do teste aos graduandos podem ser
verificados na tabela abaixo:
Frases35 Acréscimo Substituição Supressão
I – “já há muito tempo que” 63/68% 81/87,1% 44/47,3%
II – “há anos atrás” 34/36,5% 50/57,7% 71/76,3%
III – “há duas semanas” 64/68,8% 68/73,1% 39/41,9%
IV – “há dois anos” 56/60,2% 51/54,8% 42/45,1%
Total (372) 217/58,9% 250/67,2% 196/52,7%
Tabela 10 - Resultado dos testes aplicados a graduandos sobre a manutenção do sentido básico da expressão depois da manipulação da mesma
A observação dos resultados leva ao entendimento de que a manipulação
mais bem aceita é a da substituição do verbo na expressão pela preposição
desde. O resultado das demais possibilidades de manipulação indica que há
alguma aceitação por parte dos participantes de que apresentam os mesmos
sentidos a frase original e as modificadas. Isso se afirma porque 52,7% dos
participantes concordam com a supressão do verbo e 58,9% admitem o
acréscimo de desde.
35 Cada frase pode ser assinalada 93 vezes, número do total de participantes do teste.
130
Deve-se considerar, porém, que, como já afirmado, tais mudanças na
estrutura da expressão dependem do contexto em que elas ocorrem. Por isso,
fizeram-se observações sobre a aceitação das manipulações para cada frase
proposta, e pode-se salientar que:
(i) para o acréscimo de desde ao verbo, a frase “... são certas... liberdades... que
hoje existem... que desde há anos atrás poderiam parecer excessivas” foi a
menos aceita. Tal resultado pode ser justificado pelo caráter durativo da própria
preposição36, que só pode combinar-se com expressões que apresentem um
aspecto também durativo, o que não é o caso da frase proposta.
(ii) no caso da substituição de haver por desde, houve maior aceitabilidade para
as frases “eu tô com uma rotina já muito tempo que me deixa” e “Duas
semanas que o documentário vai ao ar”. Ambas as frases apresentam um
aspecto durativo, o que tenderia a combinar com a preposição desde; no entanto,
a frase II “dois anos { } os estatutos do magistério não conseguem sair” também
apresenta aspecto durativo e não foi bem aceita. O traço comum às frases
aceitas é que ambas são seguidas pelo conectivo que37.
(iii) houve maior aceitabilidade de supressão do verbo na única frase com
aspecto pontual, dentre as quatro apresentadas. Pode-se atrelar, então, a
possibilidade de supressão do verbo ao aspecto da expressão.
Para os alunos dos ensinos fundamental e médio, semelhantemente ao
proposto para os graduandos, apresentaram-se sete frases38, cada qual com três
possíveis modificações para que os participantes indicassem se as frases
modificadas mantinham o valor da original ou se havia alguma variação de
sentido. Solicitou-se que indicassem, ainda, se eles comumente não
produziriam alguma daquelas frases.
As frases apresentadas, com as devidas alterações foram: 36 Desde indica “movimento ou extensão a partir de um momento determinado”. 37 Ao longo das observações dos dados, não se trataram casos nos quais a expressão fosse seguida pelo conectivo que, porque não houve qualquer dado desse tipo nos corpora adotados. 38 A fim de evitar que os alunos copiassem as respostas uns dos outros, apresentaram-se quatro tipos de testes, cada qual com duas frases originais e três modificadas. Uma das frases foi repetida em dois testes distintos; por isso, são sete, não oito frases.
131
(I) João e Maria, há mais ou menos 2 anos, passeavam perto de sua casa.
(Ia) João e Maria, mais ou menos 2 anos atrás, passeavam perto de sua casa
(Ib) João e Maria, mais ou menos 2 anos, passeavam perto de sua casa.
(Ic) João e Maria, já mais ou menos 2 anos, passeavam perto de sua casa.
(II) Estou no clube há seis partidas.
(IIa) Estou no clube desde seis partidas.
(IIb) Estou no clube seis partidas.
(IIc) Estou no clube desde há seis partidas.
(III) A um fantasma que aterrorisa a cidade a mais de 100 anos.
(IIIa) A um fantasma que aterrorisa a cidade desde mais de 100 anos.
(IIIb) A um fantasma que aterrorisa a cidade desde a mais de 100 anos.
(IIIc) A um fantasma que aterrorisa a cidade mais de 100 anos.
(IV) Há duas semanas que o documentário vai ao ar noite e dia.
(IVa) Desde duas semanas que o documentário vai ao ar noite e dia.
(IVb) Desde há duas semanas que o documentário vai ao ar noite e dia.
(IVc) Duas semanas que o documentário vai ao ar noite e dia.
(V) O namoro acabou há nove dias.
(Va) O namoro acabou desde há nove dias.
(Vb) O namoro acabou há nove dias atrás.
(Vc) O namoro acabou nove dias atrás.
(VI) O RPG foi criado há muito tempo atras por estudantes
(VIa) O RPG foi criado já muito tempo atras por estudantes
(VIb) O RPG foi criado muito tempo atras por estudantes
(VIc) O RPG foi criado já há muito tempo atras por estudantes
(VII) Bárbara faz parte há pelo menos dois anos do programa.
(VIIa) Bárbara faz parte desde pelo menos dois anos do programa.
(VIIb) Bárbara faz parte desde há pelo menos dois anos do programa.
(VIIc) Bárbara faz parte pelo menos dois anos do programa.
132
Dados os resultados do primeiro teste, observaram-se separadamente as
frases que apresentam aspecto durativo e as que apresentam aspecto pontual.
Através da observação da tabela abaixo, percebe-se que, para o conjunto de
expressões durativas, os participantes avaliaram a anteposição da preposição
desde ao verbo haver como a estrutura que provoca mais alteração de sentido
(37,5%). A mesma estrutura foi considerada, também, como a que os
participantes menos usariam; 38,5% deles indicaram que não usam “desde há
+N/SN”.
Substituição Supressão Acréscimo
Altera
sentido
Não
usaria
Altera
sentido
Não
usaria
Altera
sentido
Não
usaria
II - há seis
partidas
5 /38
13,2%
7/38
18,4%
8/38
21%
12/38
31,6%
14/38
36,8%
15/38
39,5%
III - há mais de
100 anos
3/20
15%
6/20
30%
3/20
15%
1/20
5%
13/20
65%
10/20
50%
IV - Há duas
semanas que
5/18
27,8%
2/18
11,1%
5/18
27,8
2/18
11,1%
9/18
50%
12/18
66,7%
VII - há pelo
menos dois anos
11/20
55%
5/20
25%
2/20
10%
2/20
10%
0/20
0/20
Total 24/25% 20/20,8% 18/17,7% 17/17,7% 36/37,5% 37/38,5%
Tabela 11 - Resultado dos testes aplicados a alunos do EF e EM sobre a manutenção do sentido básico das expressões durativas depois da manipulação da mesma
Na observação de cada frase, percebe-se que:
(i) considerou-se como acarretando mais alteração de sentido a substituição de
haver por desde na frase VII “Bárbara faz parte desde pelo menos dois anos do
133
programa”. Acredita-se que tal resultado seja porque, quando o SN que
acompanha haver é o substantivo ano, parece haver duas possibilidades de
entendimento: quantidade de tempo ou indicação de idade. Então, na frase
criada pode-se pensar que Bárbara faz parte do programa desde que tinha dois
anos de idade.
(ii) a supressão do verbo causou mais alteração de sentido na frase IV, talvez
porque nela a expressão seja seguida pelo conectivo que “Duas semanas que o
documentário vai ao ar”.
(iii) em relação às frases que não usariam, percebeu-se grande rejeição dos
participantes à substituição de haver por desde nas frases em que o elemento
nominal que compõe a expressão é ano, pela razão já exposta. Na supressão do
verbo, a frase II foi a mais rejeitada, visto que o elemento nominal que
acompanha haver não é um nome com valor temporal, mas situacional; assim, a
noção de quantidade de tempo decorrido desbota-se com essa modificação. Por
fim, para o acréscimo de desde, a única frase para a qual não houve recusa foi a
VII.
Quanto às frases com aspecto pontual, houve poucas indicações de
alteração de sentido em razão das modificações propostas. Isso fica evidente
porque, das quatro frases propostas, em apenas duas os participantes
consideram que houve alteração semântica. O mesmo ocorreu em relação ao
uso das frases apresentadas (cf. tabela 12).
As modificações de substituição de haver por desde e de acréscimo de
atrás à expressão não foram apresentadas na tabela porque não se registrou
qualquer indicação de alteração de sentido ou rejeição para essas mudanças.
Não houve, também, qualquer indicação para as modificações da frase V “O
namoro acabou há nove dias”.
Destaca-se que, para a frase VI, 40% de participantes indicaram apenas
que não usariam a modificação de substituição de haver por já “O RPG foi
criado já muito tempo atras por estudantes”.
134
Supressão Acréscimo de já Substituição por já
Altera
sentido
Altera
sentido
Altera
sentido
Não
usaria
Altera
sentido
Não
usaria
I - há mais ou
menos 2 anos
3/20
15%
9/20
45%
5/20
25%
3/20
15%
9/20
45%
11/20
55%
VI - há muito
tempo atras
0/20
0/20
0/20
0/20
0/20
8/20
40%
Tabela 12 - Resultado dos testes aplicados a alunos do EF e EM sobre a manutenção do sentido básico das expressões pontuais depois da manipulação da mesma
Diferentemente das demais frases pontuais, para a frase I foram
sinalizadas mudanças de sentido em três modificações. A que mais se destaca é
a substituição de haver por já, para a qual 45% dos participantes indicaram
mudança de sentido. 55% dos participantes afirmaram, também, não usar essa
frase modificada.
Aplicou-se, também, um outro teste a fim de verificar qual das quatro
possíveis classificações39 para as expressões temporais os estudantes de língua
portuguesa consideram mais adequada. Buscou-se investigar a aceitação da
classificação adotada nessa pesquisa. Propuseram-se as seguintes frases40:
I - tem funcionários que ganham um mil a mais que a gente e trabalham aqui há dez...
onze anos [D&G, oral]
II - Teve um dia que eu quase fui assaltado, pois eu estou nesta escola a quase 4 anos
[D&G, escrito]
III - A muitos anos atrás em uma arca que o noé tinha potar todos os animais dentro
dela... [Redação, 3º ano EF] 39 Apresentam-se as classificações na seção 1.2.1 da revisão bibliográfica. 40 Nos testes não foram utilizadas apenas frases dos corpora adotados na presente dissertação, incluíram-se frases de outros corpora.
135
IV - há dois anos { } os estatutos do magistério não conseguem sair [NURC, oral]
Dadas as frases, os informantes, alunos de Graduação em Língua
Portuguesa, atribuíram para cada sentença a classificação que lhes parecia mais
pertinente. O resultado para as quatro frases pode ser verificado na tabela
abaixo.
Classificação
Fim de predicação Início de predicação
Total .../há dez
anos
.../a quase 4
anos
a muitos
anos atrás/...
há dois
anos/...
OSAT 50/93
53,7%
48/93
51,6%
32/93
34,4%
44/93
47,3%
174/372
46,8%
OP de OSAT 7/93
7,5%
6/93
6,4%
13/93
13,9%
7/93
7,5%
33/372
8,9%
OP de OSSS 7/93
7,5%
7/93
7,5%
9/93
9,6%
5/93
5,4%
28/372
7,5%
AAT 29/93
31,1%
32/93
34,4%
39/93
41,9%
37/93
39,8%
137/372
36,8%
Tabela 13 – Resultados dos testes sobre as possíveis classificações para as expressões temporais
Pela observação da tabela, percebe-se que as classificações mais
produtivas foram as que contemplam a expressão temporal como Oração
Subordinada Adverbial Temporal ou Adjunto Adverbial de Tempo. Os
números evidenciam que, embora muito influenciados pelas descrições
tradicionais, os alunos consultados já aceitam a possibilidade de a estrutura ser
concebida como uma expressão adverbial.
136
No caso da expressão em início de predicação, as duas opções de
classificação se mostraram equilibradas. Para essas expressões, 40,8% dos
participantes da pesquisa indicaram como classificação OSAT, e 40,8%
indicaram AAT.
As observações dos dados e dos resultados dos testes de atitudes
contribuem para embasar a tese de que o verbo haver atingiu algum grau de
gramaticalização nas construções temporais.
Revendo a análise sob a perspectiva dos princípios apontados por
Hopper (1991) para depreensão de estágios de gramaticalização, apreende-se o
seguinte:
Com relação ao parâmetro da estratificação (Hopper, 1991), verificou-se
que há distintas estruturas para a expressão do tempo passado coexistindo, tais
como diferentes sintagmas adverbiais (dois meses atrás estive com ele, desde anos
estudamos juntos) ou verbos (há dois anos eu estudo aqui / faz uns seis anos que
eu não a vejo/ eu me mudei tem três meses / vai para sete anos que estudo aqui).
Todas essas estruturas podem ser igualmente usadas na expressão de tempo
passado, porém algumas se encaixam em determinados contextos e não em
outros. A preposição desde, por exemplo, é usada em eventos durativos, e atrás,
em eventos pontuais.
Quanto ao princípio da divergência, haver, nessas expressões, revela um
comportamento diferente do que tem em outros contextos. Sabe-se que, na
literatura linguística, são descritos usos do verbo haver em categorias diversas:
verbo predicador (Segundo a polícia, há quatro quadrilhas atuando na capital), verbo
auxiliar (Em São Januário, o time só havia perdido na estreia), verbo semi-auxiliar
(Amanhã há de ter uma boa ideia!), suporte (Houve controle da situação) e, como
mostra esta pesquisa, verbo funcional formador de expressão de tempo (O filho
de Sarney havia recorrido há dois meses).
Com relação ao princípio da especialização, constatou-se que essas
expressões apresentam evidências de se submeterem a esse processo. Na
formação de expressões de tempo passado por meio de verbos, haver integra
137
um conjunto restrito de recursos, ao menos quatro tipos verbais podem ser
usados como recursos nesse sentido: haver, fazer, ter e ir. O verbo haver é o mais
utilizado na formação de tais expressões no português brasileiro, segundo
pesquisa já mencionada sobre a variação de haver, fazer e ter em expressões
temporais. E, ainda, haver, ao assumir juntamente com N/SN um valor
temporal, revela uma especialização semântico-funcional apresentando um
significado específico de “passagem temporal, desde um ponto no tempo”,
ocorrendo apenas na 3ª pessoa do singular e apresentando uma ordem fixa dos
elementos.
No que diz respeito ao princípio da persistência, haver, de certa forma,
mantém traços do significado original, pois há uma relação de
complementariedade entre o verbo e o elemento que o acompanha; e, ainda, o
verbo haver parece manter a ideia de existência.
Com isso, percebe-se que haver resulta de processo de decategorização:
de verbo predicador a verbo funcional. As expressões em questão parece
assemelharem-se a adjuntos adverbiais, haja vista a possibilidade de
substituição de uma estrutura por outra.
Segundo Castilho (1997:52), esses princípios propostos por Hopper
(1991) combinam em si processos e estágios. Por um lado, há os mecanismos
que levam à passagem de uma categoria lexical a categoria gramatical e, por
outro, há princípios gerais que conduzem essa mudança de estatuto. Para ele, os
princípios de especialização e persistência captam aspectos semânticos da
gramaticalização.
A partir dos princípios propostos por Hopper (1991), verifica-se que, de
fato, o verbo haver como formador de expressão temporal está em
gramaticalização. Então, a partir do pressuposto de que a gramaticalização é
um processo gradual, não é abrupta, pode-se propor um continuum de
gramaticalização do verbo haver:
138
Verbo predicador Verbo funcional + LEXICAL + GRAMATICAL
Figura 3 – Continuum de verbo predicador a verbo funcional41
Segundo Travaglia (2003), os verbos em gramaticalização podem seguir
duas cadeias de estágios:
(I) Verbo pleno42 > (forma perifrástica: verbos semi-auxiliares/auxiliares) >
verbo de ligação ou outro verbo funcional – marcador temporal, operador
argumentativo etc. > aglutinação (clítico > afixo)
(II) Verbo pleno > forma perifrástica (verbos semi-auxiliares/auxiliares) >
aglutinação (clítico > afixo)
Quadro 111 – Adaptação das cadeias de gramaticalização propostas por Travaglia
No quadro acima, cadeia I, a forma perifrástica é colocada entre
parênteses por não ser obrigatória, logo pode haver passagem de verbo pleno
para verbo funcional. Apontam-se, então, com base no continuum proposto pela
pesquisadora, na cadeia I de gramaticalização proposta por Travaglia (2002), e,
ainda, na análise de Sampaio (1978) sobre a trajetória diacrônica de haver,
exemplos das possíveis trajetórias desse verbo:
Sampaio (1978) considera que “o verbo haver é um caso típico de
gramaticalização, processo sofrido por verbos que se tornam auxiliares”. Para
José Roca Pons (apud, Sampaio, 1978) na conjugação perifrástica está
41 Segundo Travaglia, verbo pleno é o núcleo do predicado (elemento com conteúdo nocional); verbo funcional é um item que não marca categoria gramatical dos verbos e desempenha papel gramatical; verbos auxiliares são os que na forma nominal acompanham verbos nucleares indicando as categorias de número, pessoa, tempo e modo. 42 O autor chama de verbo pleno os verbos predicadores, porque trata da gramaticalização de verbos, que se dá pela passagem de um verbo lexical para um verbo gramatical.
139
“abandonada e olvidada a idéia de posse”. Assim sendo, conclui-se que o verbo
teria como exemplo de seu uso mais lexical, em seu sentido pleno, a seguinte
frase: E disse-lhe Lot: eu hei duas filhas, que ainda nom conhecerom barom. Seguindo
um caminho da trajetória de gramaticalização, há o uso auxiliar (mas ela me disse
que o nom faria, porque eu lhe havia feitas tantas enjúrias).
Com base no proposto, supõe-se que há uma outra trajetória seguida
pelo mesmo verbo: a partir do uso pleno, ocorrem extensões de sentido,
incluindo-se o valor impessoal existencial (Além destes soldados e capitães havia
outros, no recôncavo da cidade), e, como um tipo de uso impessoal, há o uso
funcional, mais gramaticalizado, indicador de circunstância de tempo (havia já
seis ou sete dias que era chegado) 43.
Castilho (1997) indica que o continuum de gramaticalização se constitui a
partir de categorias maiores (nome, verbos, pronomes) para categorias
medianas (adjetivo, advérbio) e posteriormente para categorias menores
(preposição, conjunção).
Consideraram-se, também, os mecanismos apresentados por Heine
(2003), a fim de aprofundar a análise do processo de gramaticalização. Assim,
acredita-se que a semi-gramaticalização do verbo haver em expressões de
tempo escoado seria iniciada pelo mecanismo de extensão, com a ampliação
dos contextos de uso. A partir do uso pleno, de posse, há a apresentação de
novos sentidos para os demais usos, incluindo os impessoais e o marcador
temporal, conforme os exemplos apresentados por Sampaio (1978):
I – ... nunca rei cristaaõ houve tantos cavaleiros, nem tantos homeēs bõos aa sua mesa,
como hoje eu hei, nem haverá jamais. (A demanda do Santo Graal, pág. 68) - posse
II - Rubião não sabia haver-se com senhoras. (Machado de Assis - Quincas Borba,
pág. 47) - “comportar-se”
43 Todos os exemplos expostos neste parágrafo e no anterior foram retirados de Sampaio (1978).
140
III - Êste era um cabelereiro... que vendera ao Tomé Gonçalves dez cabeleiras,... sem lhe
haver um real. (Machado de Assis – Histórias sem data, pág. 28) - “receber,
perceber”
IV - Lula “está diretamente envolvido com a candidatura brasileira desde o seu
início, há dois anos”44 (Jornal, O Globo)— marcador temporal
Consequentemente, é acionada a dessemantização, porque ocorre uma
perda ou esvaziamento de valor semântico. Ou seja, na expressão temporal, o
verbo haver deixa de carregar um significado semântico e passa a significar,
conjuntamente com o N/SN que o acompanha, “uma dada quantidade de
tempo que se passou a partir de uma dado momento.”
Esse processo de mudança pode chegar a decategorização, visto que há
perda de propriedades características da forma matriz, como, por exemplo, a
possibilidade de flexão ou possibilidade de se mover pela sentença. A
decategorização levaria, assim, o verbo haver a funcionar não mais como um
verbo predicador, mas como um verbo funcional — um operandum auxiliar
temporal (cf. Machado Vieira, 2001).
Dentre os mecanismos propostos por Heine (2003), não se verifica apenas
a erosão, uma vez que não há perda de substância fonética. O autor já aponta,
contudo, que tal mecanismo não é condição necessária para a ocorrência da
gramaticalização.
Além dos mecanismos analisados acima, foi observada, também, a
frequência, um outro forte elemento apontado por Bybee (2003) que corrobora a
hipótese da gramaticalização. Analisando a frequência de tipo, ou seja, o
número de instâncias diferentes de uma determinada unidade linguística em
uma dada amostra, verificaram-se os tipos de substantivos que acompanham o
verbo haver na formação da expressão temporal.
No total da amostra, ocorreram apenas nove tipos de substantivos: dias,
tempo, meses, anos, semanas, décadas, jogos, partidas e rodadas. Esses
substantivos podem ser divididos em dois tipos, conforme o valor semântico. Os
44 Exemplo retirado da subamostra de notícias.
141
seis primeiros são nomes que indicam quantidade de tempo e os três últimos,
embora, metaforicamente, também possam definir espaços temporais,
representam uma espécie de evento.
Eventos Dias Tempo Meses Anos Semanas Décadas
Jornal 9 9 3 20 47 11 1
Redação 0 5 32 16 41 6 0
Total 9/4,5% 14/7% 35/17,5% 36/18% 88/44% 17/8,5% 1/0,5%
Tabela 14 – Tipos de substantivos que acompanham haver na formação da expressão
O tipo mais frequente de elemento acompanhando haver na formação da
expressão foi o substantivo anos. Ainda que apareçam outros tipos de
substantivos, a expressão é formada essencialmente por nomes indicadores de
quantidades de tempo.
Analisando a frequência de ocorrência, percebe-se pouca produtividade
da expressão estudada, o que fica evidente se observada a coleta de dados de
redações: para um conjunto de 100 dados, foram consultados 1038 textos. Vale
ressaltar, todavia, que a pouca produtividade não é característica apenas das
expressões formadas pelo verbo haver, mas, sim, das expressões indicativas de
tempo passado de maneira geral, que ocorrem mais frequentemente em
narrativas.
Porém, em comparação com outras possibilidades de formação de
expressões temporais, percebe-se que o tipo mais frequente é o formado por
haver. Segundo Paiva (2007), a frequência desse verbo é maior até mesmo na
modalidade oral espontânea, — contexto esse propício para uma expressão
formada pelo verbo ter ou até mesmo sem verbo.
Dadas as considerações feitas, conclui-se que haver, ao atuar como
elemento formador de expressão temporal, não se enquadra em uma categoria
142
de predicador, mas também não se pode afirmar que seja um elemento
totalmente gramatical, tal como uma preposição. Percebe-se, ainda, no verbo
haver algum traço do caráter verbal, embora a expressão indique o significado
específico de tempo decorrido e admita substituição por um advérbio ou
preposição. Considera-se, então, haver, nesse contexto, como um verbo (semi-)
gramaticalizado, um elemento funcional que juntamente com sintagma nominal
com valor temporal compõe adjuntos adverbiais.
143
5. Considerações finais
Na presente dissertação, propôs-se investigar, à luz da Teoria
Funcionalista, os usos das expressões temporais formadas pelo verbo haver
que, juntamente com um elemento nominal, indica um transcurso de tempo ou
um dado momento no passado a partir de um ponto no eixo temporal.
Examinou-se, ainda, o processo de (semi-) gramaticalização de haver em tais
expressões.
Documentaram-se usos de haver em textos da modalidade escrita do
português brasileiro de: (i) redações escolares do tipo narrativo de níveis
distintos de escolaridade (primeiro e segundo segmentos do ensino
fundamental e ensino médio); (ii) textos do gênero notícia jornalística, oriundos
dos jornais Extra e O Globo. Além disso, registraram-se resultados obtidos em
testes de avaliação subjetiva de expressões temporais, realizados com base em
metodologia de pesquisa de atitudes.
A investigação sobre as propriedades das construções haver + N/SN
com valor temporal e seu comportamento sintático-semântico contribuiu para
uma descrição dos diferentes empregos desse tipo de expressão e, ainda, para
uma definição de seu estatuto, a partir da verificação do nível de
gramaticalização de haver.
Inicialmente, sintetizaram-se diferentes abordagens sobre as expressões
temporais, feitas por autores diversos. Verificando-se dicionários, gramáticas
normativas e pesquisas linguísticas, foi possível observar pontos de
similaridade e de diferença entre as interpretações sobre as expressões em
estudo. Não obstante, poucas são as pesquisas encontradas que se dedicam
aprofundadamente sobre o tema. Assim, o presente estudo contribui para um
conhecimento mais detalhado das expressões haver + SN temporal também pelo
fato de expor um pouco da literatura sobre o tema. Além disso, apresenta uma
investigação sobre as propriedades e o comportamento morfossemântico de
haver nessas estruturas e, ainda, sobre o seu estatuto categorial.
144
A partir das observações dos dados, foi possível sistematizar as
características mais recorrentes das expressões de tempo passado formadas por
haver: apresentam-se na estrutura haver + numeral/pronome indefinido +
substantivo com valor temporal; têm como ponto de ancoragem temporal o
momento de enunciação; ligam-se a uma oração e ocorrem,
predominantemente, em plano discursivo de fundo.
Com apoio de orientações da Linguística Textual referentes a gêneros e
tipologias textuais, observaram-se particularidades nos usos das expressões em
cada gênero.
Nas notícias jornalísticas, o elemento nominal que acompanha haver foi
predominantemente delimitável. Em relação ao aspecto durativo ou pontual da
expressão, houve equilíbrio; já quanto ao fluxo de informação, as notícias
apresentam com mais frequência conceitos semi-ativos. A posição da expressão
nos textos de notícias é variável, porém, viu-se uma predominância de posição
textual central. Para a posição da expressão na predicação, também se percebeu
uma maleabilidade, embora a posição mais frequente tenha sido depois do
verbo.
Por outro lado, nas redações escolares, houve um equilíbrio entre o
elemento que acompanha haver ser delimitável e não-delimitável. O aspecto da
expressão foi predominantemente pontual, e os conceitos apresentados inativos.
As expressões ocorreram mais frequentemente em porções introdutórias de
texto e antes do verbo.
A investigação sobre a gramaticalização de haver partiu da observação:
(i) das possibilidades de substituição desse verbo por preposição ou por um
advérbio e de supressão do verbo sem que esta acarretasse perda ou alteração
semântica; (ii) da pouca liberdade de manipulação do verbo, que ocorre sempre
em posição anterior ao termo que exprime somatório de tempo; (iii) da
neutralização das marcas morfossemânticas do verbo, já que haver nessas
expressões só admite flexão de 3ª pessoa do singular presente e juntamente SN
145
indica o significado específico de “ter-se decorrido um transcurso de tempo a
partir de um dado momento”.
Algumas dessas propriedades foram empiricamente verificadas por meio
de testes de atitude linguística. Constatou-se a aceitação dessas propriedades,
porém com algumas restrições: (1) houve mais aceitação da substituição da
expressão durativa pela preposição desde e da expressão pontual pelo advérbio
atrás; (2) a aceitação de supressão do verbo foi maior em frases pontuais.
Ressalta-se que esse teste foi aplicado para o ensino fundamental, ensino médio
e ensino superior e não houve diferença significativa entre os resultados por
níveis de escolaridade.
Averiguou-se, também por meio de testes de atitude, como estudantes de
graduação em Letras entendem a classificação das expressões em estudo, já que
na revisão da literatura sobre o assunto encontraram-se diferentes
possibilidades. Detectou-se que as expressões são entendidas, pelos
participantes, tanto como oração subordinada substantiva subjetiva, quanto
como adjunto adverbial.
Por fim, assumiu-se que haver, enquanto componente da expressão de
tempo passado, funciona como um elemento instrumental formador de
expressão adverbial. Dessa forma, a expressão composta por haver não se
caracterizaria como uma oração, mas, como um adjunto adverbial de tempo. Tal
concepção pode ser reforçada pela seguinte consideração de Adolfo Coelho
(apud Bechara 1999): “há muito se fixa como a indicação dum passado, há não é
apercebido como um verbo, mas antes como preposição (a)”.
Há que se mencionar, ainda, a questão da frequência, pois, embora as
expressões temporais não sejam muito produtivas na língua — tanto as
formadas por verbos como haver, fazer, ter, passar ou ir, quanto as formadas por
preposições ou advérbios —, sabe-se que, dentre todas as estratégias
mencionadas, a formada pelo verbo haver é a mais produtiva seja na
modalidade escrita seja na oral.
146
Salienta-se que, de modo geral, esta pesquisa contribui para a ampliação
das descrições de propriedades estruturais e semânticas dos empregos das
expressões de tempo passado formadas pelo verbo haver e para o entendimento
do processo de gramaticalização desse verbo. Ainda assim, há muito que se
pesquisar sobre tais expressões. Podem-se investigar corpora diversificados de
modo a contemplar distintas modalidades da língua portuguesa, além de
gêneros textuais diversos. É possível, também, investir em uma análise
comparativa sobre as expressões temporais formadas pelos verbos ter, fazer e
haver para que se verifiquem e comparem os níveis de gramaticalização desses
verbos nessas estruturas.
147
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157
ANEXOS
Anexo 1: Teste de atitude — Modelo 1
Pesquisa de opinião
Escolaridade: ( ) Ensino Médio ( ) Superior ( ) Mestrado
ATENÇÃO: NÃO EXISTE CERTO OU ERRADO. NOSSO OBJETIVO É DESCOBRIR AS OPINIÕES
DO FALANTE DE LÍNGUA PORTUGUESA SOBRE AS ESTRUTURAS MARCADAS NOS
TRECHOS DADOS. DÊ SUAS RESPOSTAS, BASEANDO-SE NA MANEIRA PELA QUAL VOCÊ
REALMENTE FALARIA SE USASSE OS TRECHOS EXPOSTOS.
I) Há alguma diferença semântica entre as construções sublinhadas e a em
destaque?
Ou o sentido delas é idêntico?
Analise os trechos e marque com o número da resposta que achar mais
adequada.
1 - Acho que as duas frases possuem o mesmo sentido.
2 - Acho que as formas sublinhadas dão sentidos diferentes para as frases.
a) eu tô com uma rotina já há muito tempo, que, me deixa, muito, afastada do
comércio do bairro...
( ) eu tô com uma rotina já desde muito tempo, que, me deixa, muito, afastada
do comércio do bairro...
( ) eu tô com uma rotina já desde há muito tempo, que, me deixa, muito,
afastada do comércio do bairro...
( ) eu tô com uma rotina já muito tempo, que, me deixa, muito, afastada do
comércio do bairro...
158
b) eles têm às vezes não são... são certas... liberdades... que hoje existem... que
há anos atrás poderiam parecer excessivas mas que na realidade NÃO SÃO
( ) eles têm às vezes não são... são certas... liberdades... que hoje existem... que
desde anos atrás poderiam parecer excessivas mas que na realidade NÃO SÃO
( ) eles têm às vezes não são... são certas... liberdades... que hoje existem... que
desde há anos atrás poderiam parecer excessivas mas que na realidade NÃO
SÃO
( ) eles têm às vezes não são... são certas... liberdades... que hoje existem... que
anos atrás poderiam parecer excessivas mas que na realidade NÃO SÃO
c) Há duas semanas que o documentário vai ao ar noite e dia. Liga lá, deve
estar passando agora
( ) Desde duas semanas que o documentário vai ao ar noite e dia. Liga lá, deve
estar passando agora
( ) Desde há duas semanas que o documentário vai ao ar noite e dia. Liga lá,
deve estar passando agora
( ) Duas semanas que o documentário vai ao ar noite e dia. Liga lá, deve estar
passando agora
d) mas vejam vocês ... há dois anos { } os estatutos do magistério não
conseguem sair
( ) mas vejam vocês ... desde dois anos { } os estatutos do magistério não
conseguem sair
( ) mas vejam vocês ... desde há dois anos { } os estatutos do magistério não
conseguem sair
( ) mas vejam vocês ... dois anos { } os estatutos do magistério não conseguem
sair
159
Anexo 2: Teste de atitude — Modelo 2a
Pesquisa de opinião
1º Nome: _____________________ Série:_____________
ATENÇÃO: NÃO EXISTE CERTO OU ERRADO. QUEREMOS SABER SUAS OPINIÕES SOBRE
AS ESTRUTURAS MARCADAS NOS TRECHOS DADOS (ALGUNS FORAM REDIGIDOS POR
ALUNOS). DÊ SUAS RESPOSTAS, BASEANDO-SE NA MANEIRA PELA QUAL VOCÊ
REALMENTE FALARIA SE USASSE OS TRECHOS EXPOSTOS.
I) Há alguma diferença de sentido entre a construção sublinhada e as outras?
(Marque a/as diferente/s) Você não usaria alguma delas? Qual?______________
Certo dia, João e Maria, há mais ou menos 2 anos, passeavam perto de sua casa.
a) Certo dia, João e Maria, mais ou menos 2 anos atrás, passeavam perto de sua
casa
b) Certo dia, João e Maria, mais ou menos 2 anos, passeavam perto de sua casa.
c) Certo dia, João e Maria, já mais ou menos 2 anos, passeavam perto de sua
casa.
II) Há alguma diferença de sentido entre a construção sublinhada e as outras?
(Marque a/as diferente/s) Você não usaria alguma delas? Qual?______________
Estou no clube há seis partidas.
a) Estou no clube desde seis partidas.
b) Estou no clube seis partidas.
c) Estou no clube desde há seis partidas.
160
Teste de atitude — Modelo 2b
Pesquisa de opinião
1º Nome: _____________________ Série:_____________
ATENÇÃO: NÃO EXISTE CERTO OU ERRADO. QUEREMOS SABER SUAS OPINIÕES SOBRE
AS ESTRUTURAS MARCADAS NOS TRECHOS DADOS (ALGUNS FORAM REDIGIDOS POR
ALUNOS). DÊ SUAS RESPOSTAS, BASEANDO-SE NA MANEIRA PELA QUAL VOCÊ
REALMENTE FALARIA SE USASSE OS TRECHOS EXPOSTOS.
I) Há alguma diferença de sentido entre a construção sublinhada e as outras?
(Marque a diferente) Você não usaria alguma delas? Qual?___________________
A um fantasma que aterrorisa a cidade a mais de 100 anos.
a) A um fantasma que aterrorisa a cidade desde mais de 100 anos.
b) A um fantasma que aterrorisa a cidade desde a mais de 100 anos.
c) A um fantasma que aterrorisa a cidade mais de 100 anos.
II) Há alguma diferença de sentido entre a construção sublinhada e as outras?
(Marque a diferente) Você não usaria alguma delas? Qual?___________________
Estou no clube há seis partidas.
a) Estou no clube desde seis partidas.
b) Estou no clube seis partidas.
c) Estou no clube desde há seis partidas.
161
Teste de atitude — Modelo 2c
Pesquisa de opinião
1º Nome: _____________________ Série:_____________
ATENÇÃO: NÃO EXISTE CERTO OU ERRADO. QUEREMOS SABER SUAS OPINIÕES SOBRE
AS ESTRUTURAS MARCADAS NOS TRECHOS DADOS (ALGUNS FORAM REDIGIDOS POR
ALUNOS). DÊ SUAS RESPOSTAS, BASEANDO-SE NA MANEIRA PELA QUAL VOCÊ
REALMENTE FALARIA SE USASSE OS TRECHOS EXPOSTOS.
I) Há alguma diferença de sentido entre a construção sublinhada e as outras?
(Marque a diferente) Você não usaria alguma delas? Qual?___________________
Há duas semanas que o documentário vai ao ar noite e dia.
a) Desde duas semanas que o documentário vai ao ar noite e dia.
b) Desde há duas semanas que o documentário vai ao ar noite e dia.
c) Duas semanas que o documentário vai ao ar noite e dia.
II) Há alguma diferença de sentido entre a construção sublinhada e as outras?
(Marque a diferente) Você não usaria alguma delas? Qual?___________________
O namoro acabou há nove dias.
a) O namoro acabou desde há nove dias.
b) O namoro acabou há nove dias atrás.
c) O namoro acabou nove dias atrás.
162
Teste de atitude — Modelo 2d
Pesquisa de opinião
1º Nome: _____________________ Série______________
ATENÇÃO: NÃO EXISTE CERTO OU ERRADO. QUEREMOS SABER SUAS OPINIÕES SOBRE
AS ESTRUTURAS MARCADAS NOS TRECHOS DADOS (ALGUNS FORAM REDIGIDOS POR
ALUNOS). DÊ SUAS RESPOSTAS, BASEANDO-SE NA MANEIRA PELA QUAL VOCÊ
REALMENTE FALARIA SE USASSE OS TRECHOS EXPOSTOS.
I) Há alguma diferença de sentido entre a construção sublinhada e as outras?
(Marque a diferente) Você não usaria alguma delas? Qual?__________________
O RPG foi criado há muito tempo atras por estudantes
a) O RPG foi criado já muito tempo atras por estudantes
b) O RPG foi criado muito tempo atras por estudantes
c) O RPG foi criado já há muito tempo atras por estudantes
II) Há alguma diferença de sentido entre a construção sublinhada e as outras?
(Marque a diferente) Você não usaria alguma delas? Qual?__________________
Bárbara faz parte há pelo menos dois anos do programa.
a) Bárbara faz parte desde pelo menos dois anos do programa.
b) Bárbara faz parte desde há pelo menos dois anos do programa.
c) Bárbara faz parte pelo menos dois anos do programa.
163
Anexo 3: Teste de atitude — Modelo 3
Pesquisa de opinião
Escolaridade: ( ) Ensino Médio ( ) Superior ( ) Mestrado
ATENÇÃO: NÃO EXISTE CERTO OU ERRADO. NOSSO OBJETIVO É DESCOBRIR AS OPINIÕES
DO FALANTE DE LÍNGUA PORTUGUESA SOBRE AS ESTRUTURAS MARCADAS NOS
TRECHOS DADOS. DÊ SUAS RESPOSTAS, BASEANDO-SE NA MANEIRA PELA QUAL VOCÊ
REALMENTE FALARIA SE USASSE OS TRECHOS EXPOSTOS.
I) Considerando que todas são contempladas pelas gramáticas tradicionais,
indique para as frases abaixo a classificação que lhe parece mais adequada.
a) tem funcionários que ganham um mil a mais que a gente e trabalham aqui /
há dez... onze anos
( ) 1- O. S. Adverbial Temporal 2- Oração Principal
( ) 1- Oração Principal 2- O. S. Adverbial Temporal
( ) 1- O. S. Substantiva Subjetiva 2- Oração Principal
( ) 1- Período Simples 2- Expressão Adverbial de tempo
b) Teve um dia que eu quase fui assaltado, pois eu estou nesta escola / a quase
4 anos
( ) 1- O. S. Adverbial Temporal 2- Oração Principal
( ) 1- Oração Principal 2- O. S. Adverbial Temporal
( ) 1- O. S. Substantiva Subjetiva 2- Oração Principal
( ) 1- Período Simples 2- Expressão Adverbial de tempo
164
c) A muitos anos atrás / em uma arca que o noé tinha potar todos os animais
dentro dela...
( ) 1- O. S. Adverbial Temporal 2- Oração Principal
( ) 1- Oração Principal 2- O. S. Adverbial Temporal
( ) 1- Oração Principal 2- O. S. Substantiva Subjetiva
( ) 1- Expressão Adverbial de
tempo
2- Período simples
d) há dois anos { } / os estatutos do magistério não conseguem sair
( ) 1- O. S. Adverbial Temporal 2- Oração Principal
( ) 1- Oração Principal 2- O. S. Adverbial Temporal
( ) 1- Oração Principal 2- O. S. Substantiva Subjetiva
( ) 1- Expressão Adverbial de tempo 2- Período simples
165
Anexo 4: Posição da expressão na sentença
Posição da expressão na sentença Globo Extra
Antes do verbo – sem sujeito 3 3
Antes do verbo – Entre Sujeito e verbo 1 2
Antes do verbo – Antes do sujeito 8 8
Depois do Verbo – Sem complemento 7 5
Depois do Verbo – Entre o Verbo e o Complemento 5 3
Depois do Verbo – Depois do Complemento 16 10
“Complementando” um verbo 1 6
Antes do nome 2 4
Depois do nome 7 9