Habermas e a Dialética da Razão (2)

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Habermas e a Dialética da RazãoartigoA razão de HabermasUnisantosMestrado em Educaçãoano: 1999Melissa Elias [email protected]

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Melissa Elias Viana 1999 UNISANTOS Mestrado em Educao A RAZO DE HABERMAS "A reflexo importante para a cincia, assim como a cincia importante para a filosofia". Aqui, trataremos da obra intitulada "Habermas e a dialtica da razo", escrita pelo professor de Filosofia da Loyola University of Chicago, David Ingram, em 1987 e somente traduzida para o portugus, em 1994. O livro uma anlise abrangente de uma parte das obras desse grande pensador, e no uma crtica. Habermas possui um estilo denso, o que afasta leitores potenciais, principalmente os de lngua inglesa que sentem certa dificuldade ao traduzir seus estudos em alemo. Antes de David Ingram, apenas um outro norte-americano havia escrito sobre Habermas: Thomas McCarthy, mas anteriormente sua principal teoria: a Teoria da Ao Comunicativa (1981). Habermas nasceu em 1929 e iniciou os seus estudos na rea de filosofia e cincias sociais. Quando estava preparando seu doutorado, acabou recebendo influncias bastante significativas de Marx, Lukcs e Hegel e convenceu-se de que a fragmentao espiritual e a alienao que aflingiam a Idade Moderna tinham causas sociais e no metafsicas. Foi o despertar dessa percepo que o aproximou da Escola de Frankfurt. Uma escola formada por filsofos e cientistas sociais que lecionavam no Instituto Social de Frankfurt, fundada nos anos 20. Esse grupo criou uma "teoria crtica" da sociedade. Uma tentativa de realizar um sistema de pensamento em relao lgica cientfica, sem cair no irracionalismo e seguindo as orientaes do materialismo marxista (a primeira gerao de Frankfurt estava preocupada com a crtica do capitalismo que se tornara autoritrio - vide nazismo - e queria mostrar que, por trs disso tudo, havia uma ideologia em prol de uma dominao, e vai buscar, muito de seus fundamentos, em Marx). Suas figuras mais importantes foram Theodor Adorno (Habermas foi assistente dele entre 1956 e 1959), Max Horkheimer, Walter Benjamin, Herbert Marcuse e Erich Fromm. Habermas considerado o representante da segunda gerao da Escola de Frankfurt. Ele mergulhou no estudo da economia de Marx, na psicanlise de Freud, na tradio sociolgica de Weber, Durkheim e Parsons, na influncia da hermenutica de Gadamer e na pragmtica comunicativa de Apel. A preocupao de Habermas que esto deixando de pensar no humano para pensar as cincias, mas o homem ser sempre homem e ter sempre suas virtudes e fracassos. Ele mostra, numa passagem onde, na Grcia Antiga, o que valia para o Estado, valia para o indivduo. A virtude do Estado era a virtude do cidado, ser justo era o mximo. No Iluminismo isso tambm acontece. Mas o foco deixa de ser o social. E para o social que o homem deve se voltar. De l pra c, muitas coisas mudaram em seu pensamento, principalmente pelas grandes polmicas e discusses que gerou e continua gerando. O livro trata da luta de um grande pensador para abordar o paradoxo central da vida moderna: a perda da liberdade, do respeito pela vida humana e seu significado. Os grandes pensadores de Frankfurt diziam que a razo s levaria destruio. Habermas diz que no a razo que deve ser criticada, mas sim, o conceito de que ela muito ampla. Habermas tem uma abrangncia impressionante e uma grande segurana das fontes que cita. A caracterstica mais notvel dele, nessas ltimas dcadas, o sentido de propsito moral. Vivemos numa poca em que a cincia e a tecnologia so soberanas e a vida do indivduo est, cada vez mais, fragmentada. A cincia e a tecnologia podem nos

ajudar a avaliar a consistncia de nossos objetivos e nos dizer os melhores meios para atingi-los, mas no dizem como determinar quais objetivos so meritrios ou moralmente obrigatrios. A cincia se resume cincia dos meios. Ela nos indica os meios para alcanar os fins, mas os fins continuam estranhos para ela. A razo impotente diante dos fins: no pode fundament-los. Os juzos cientficos constituem o conhecimento, visto que os juzos valorativos se fundamentam na deciso. Esse dualismo entre fatos e decises corresponde separao entre o conhecer e o avaliar e a exigncia metodolgica de se limitar s cincias experimentais. Para esclarecer as questes ticas da justia social, a autoridade poltica e a boa vida, Habermas se volta no para a metodologia das cincias exatas, mas para a interpretativa hermenutica das cincias humanas. Sabe-se que a crtica do direito natural demonstrou que as normas sociais no esto e nem podem estar baseadas na natureza, naquilo que existe, mas ela vai perguntar-se sobre a validade desse conceito. O importante saber que fins e meios no esto uns aqum e outros alm da razo. Eles so inseparveis, por isso fundamental considerar a totalidade da vida social, num mundo onde a legitimao social no dada s por valores, mas tambm pelo racionalismo. Mas, o que nos interessa saber que o pensamento assim, dialtico, no estanque, no parado. E o que a dialtica da razo se no a busca incessante da razo? Da perfeio? Habermas coloca que o grande erro da modernidade querer ter a relao sujeito - objeto (Kant - o mundo existe porque eu existo, sob o meu ponto de vista. Para voc, o mundo outro. No posso entender o objeto, precisaria s-lo) e no a relao sujeito - sujeito (onde h um subjetivismo, pois utiliza-se de todo o seu conhecimento anterior normativo e esttico). O autor coloca a questo de ser Habermas, um filsofo da moral, e afirma que hoje, devido conotao dada cincia, isto parece ser, puramente acadmico. Habermas, ao invs de se utilizar de metodologias tradicionais para solucionar questes ticas, busca o mtodo hermenutico de interpretao da realidade. O autor faz tambm uma digresso sobre o ensino desde a Idade Mdia at o sculo XIX, falando de Bacon a Hegel. A seguir, coloca a discusso entre Popper e Habermas que, na verdade, j era uma discusso antiga entre seu mestre Adorno e Popper. Os neopositivistas (ps-Comte), liderados por Popper, propem "pr prova" as cincias sociais aplicando a lei da "falseabilidade". Habermas diz que no, pois s o mtodo hermenutico capaz de dar conta das cincias sociais, pois ela vai estudar, caso a caso, de forma subjetiva. (Adorno j dizia que, para estudar uma cincia humana, voc no poderia se utilizar dos mtodos das cincias exatas. Habermas complementa e diz que para estudar cincias humanas, voc precisa conhecer o homem, e, para conhecer o homem, s atravs da hermenutica). Mas Habermas no s se preocupa em defender o mtodo hermenutico para anlise social, como tambm o fundamenta eticamente (a hermenutica defende questes de cada um, idias, limitaes e o tico aceitar a linha de raciocnio). A passagem do feudalismo (sociedade pr-ordenada por "Deus") para o capitalismo burgus (Estado que defende a sociedade e legitima-se atravs de uma sociedade no pr-ordenada por "Deus") no deixa de ser um progresso, mas Habermas considera, ainda, "negativo" porque a ideologia burguesa est implantada (de cima pra baixo) com burguesia e proletariado. A partir da Revoluo Industrial, v-se uma disputa de classes (classe dominante - burguesia - capitalistas - proletariados), com as classes hegemnicas (industriais, capitalistas) lanando mo da propaganda para obter o comando, o poder, implantando ideologia. No sculo XX, volta-se ao assistencialismo do Estado. Uma miscigenao da poltica feudal com a liberal. A tecnoburocracia domina as questes econmicas, colocando-na como uma necessidade da elite (que tem a formao necessria) de comandar todo o processo.

Habermas refuta, novamente, o tecnicismo de Popper e faz um retorno ao pensamento de Marx e Hegel (a questo da dialtica materialista X idealista), porm, criticando a questo do trabalho como humanizador (atravs da modificao/transformao da natureza que o homem se percebe humano (Ex.: a madeira da rvore transformada em cadeira), pois isto igualaria a racionalizao com o progresso cientfico e tecnolgico (Ex.: existem pessoas que no acreditam que o homem foi lua. Isso "humano"?). Para refutar essa tese, ele busca auxlio em Hegel, qual seja, esprito e vida social so a interseco da famlia, lngua e trabalho. A linguagem a base da integrao social e a comunicao o que une as expectativas comuns e, o trabalho que nos permite a segurana para alcanarmos os desejos. A linguagem pressupe permear uma tica, ou no compreendida. Ao desprezar a questo tica, nos tornamos um marginal da tica, daquela linguagem (Ex. um estuprador e a vtima - existe uma determinada hora em que a tica no mais existe, rompida e tudo pode ser feito, no existe sequer comunicao). David Ingram faz uma rpida passagem pela teoria hermenutica de Gadamer, ou seja, heideggeriana, pela idia de que atingimos o objeto de acordo com a nossa compreenso do mundo e interesse despertado, modificando o objeto e amoldando o sujeito de acordo com o interesse e os pressupostos culturais envolvidos. Da a relao sujeito e objeto estarem numa espcie de crculo ontolgico, fazendo quase que parte do mesmo "ser" (o seu ser se relaciona com o objeto mas ele nico, voc fala no limite do seu conhecimento, voc atinge o objeto devido ao seu conhecimento e ao nvel de interesse que voc o percebe. Depois de atingido, eu mudo o objeto e ele muda a minha maneira de ver). A sociologia positivista trata a sociedade de forma ntica e deveria ser ontolgica porque do "ser" que falamos. Gadamer coloca que a hermenutica prpria do sujeito e que ela sempre estabelecida, levando em considerao a historicidade do sujeito (no sentido de conhecimento) e que aps a compreenso do objeto, h, entre eles, uma relao de perguntas e respostas que culminam numa modificao mtua e se expande com essa nova "verdade". Habermas toma esse atalho de Gadamer para dizer que as cincias humanas so atravessadas por questes ticas profundas e toda compreenso d possibilidade ao sujeito de novas aes. Posteriormente, Habermas vai repensar esta questo, devido a ela ser, de certa forma, limitante, pois impossibilita o sujeito de um conhecimento pleno da sociedade e do Eu, uma vez que ele est limitado pela tradio prevalecente. Ele repensa a hermenutica filosfica devido questo da ideologia. E vai buscar a resposta em seu mestre Horkheimer que via a cincia moderna como continuao da metafsica tradicional, pois as duas constroem-se sobre dados eternos, imutveis e cerceiam a crtica, tornando a sociedade estanque. Horkheimer dizia que a cincia social crtica quem vai retirar o "vu" ideolgico que a cincia exata positivista coloca para exercer a dominao social. Habermas vai buscar na psicanlise, em Freud, o complemento para sua tese sobre a linguagem (agir comunicativo), o falar de integrao social e os descompassos acontecem quando h uma falha estrutural, no processo lingstico individual, tornando o sujeito portador de uma patologia somente curvel atravs da reconstruo lingstica, ou seja, que se calce os pilares que lhes faltem para dar conta de acompanhar o social. A estabilidade, a coerncia e a identidade so conseguidas quando o sujeito consegue uma interao intersubjetiva que possa inseri-lo comunidade. A sobrevivncia do indivduo social est em compasso com a sobrevivncia da prpria sociedade, pois depende da harmonia entre os sujeitos, como tambm do propsito moral, ao longo das geraes. Habermas acredita que os interesses cognitivos tenham uma gnese natural no homem e envolvem a necessidade do homem, no bem-viver. Para tanto, ele repensa a relao teoria e prtica, diferenciando o discurso da ao, dizendo que o discurso importante, pois somente o interesse cognitivo incapaz de justificar racionalmente, uma ao. A teoria deve, ento, ser "pasteurizada" (mtodo

fenomenolgico). importante ainda, para entender a teoria da ao comunicativa, compreender o que, para Habermas, significa mundo-da-vida (lebenswelt) e sistema. De uma forma simplificada, o primeiro termo o pano de fundo do processo comunicativo, pr-reflexivo e no tematizado, ligado aos nossos atos comuns (relacionados cultura: estoque de saber adquirido, sociedade: conjunto de normas de regulao e convivncia entre os homens e, personalidade: adquirida pelo prprio homem em sua existncia). O segundo termo, diz respeito aos complexos de aes reguladas pela razo instrumental: a Economia (que dispensa a linguagem intersubjetiva que visa ao entendimento) e o Estado (cujo meio o poder exercido atravs de ordens e imperativos). A ao comunicativa coordena as conseqncias das aes, independentemente das intenes dos atores. A teoria crtica vlida devido comunicao. E, o que interessa na comunicao, para Habermas, a verdade, pois o critrio de verdade estaria alm do critrio metafsico. Essa verdade deve ser recoberta de autenticidade, propriedade e sinceridade. Por isso, ele utiliza-se de alguns critrios para a verificao da linguagem, das aes sociais e dos atos da fala. O autor retrata essas verificaes mostrando que, para o pensador, o que dito deve ser inteligvel, ou seja, atravs da utilizao de regras semnticas inteligveis pelos outros. O emissor no deve tentar enganar o receptor ou isso acarretaria uma comunicao distorcida, implicando, inclusive, uma definio de carter universal. Para Habermas, a relao sujeito-objeto pragmtica e intencional e a ele incisivo ao dividir as nossas aes sociais em: estratgicas (teleolgicas), normativas (estabelecem normas de conduta), dramatrgicas (aes revestidas de uma "mscara", prpria de polticos) e comunicativas, as mais importantes para ele, em que duas ou mais pessoas procuram chegar a um acordo atravs de um dilogo cooperativo, baseado no consenso. E, dentro dessas aes comunicativas, temos quatro grupos de atos da fala: reguladores (pretendem uma correo, prescrevem, regulam, ordenam. Ex.: mdico X paciente); expressivos (revelam sentimentos, desejos. Ex.: namorados); executivos ou imperativos (baseados no poder. Para Habermas, esses atos j exprimem um fim em si, so teleolgicos. Ex.: patro X empregado) e, por ltimo, os atos de falar constativos (reivindicam a verdade, descrevem, afirmam ou negam uma situao objetiva. Ex.: advogado X promotor). Evidentemente, para Habermas, mesmo com a diminuio do espao da esfera pblica ou do aparecimento de uma nova esfera (a internet), a questo est na comunicao aberta e franca para se atingir um denominador comum. A anlise do dilogo apenas um fator da racionalidade. Ele quer uma fala que tenha um objetivo de verdade, despido de mentiras. E haver, a, sempre a questo da hermenutica.

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de

So

INTERNET Jrgen Habermas - pesquisa bibliogrfica: http://www.geocities.com/Eureka/2330/habermas.htm O direito e a democracia moderna: a crtica de Habermas a Weber. http://www.ccj.ufsc.br/~petdir/jesse.html Comentrios sobre a teoria da ao em Habermas http://www.msb.com.br/pro-ciencia/vol1num1/habermas/habermas.htm David Ingram and Julia Simons Ingram

http://www.paragonhouse.com/descriptions/d_1557783535.html

AGRADECIMENTOS

ESPECIAIS

Profa. Dra. Neusa Meirelles da Costa Prof. Me. Luis Antonio Lucena de Oliva Prof. Antonio Amaro Pereira