Hegel - Quem pensa abstratamente.PDF

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7/23/2019 Hegel - Quem pensa abstratamente.PDF http://slidepdf.com/reader/full/hegel-quem-pensa-abstratamentepdf 1/6 SINTT-BE  NOVA  TASF-: V.  22 N. 69  (1995):  235-240 QUEM  PENSA ABSTRATAM ENTE? a  W. F.  Hegel P ünsar? Abstrato? —  Sauve  qui peut Salve-se quem puder Desta forma já ouço exclamar um  traidor,  comprado pelo inimigo, denunciando que  esle  ensaio tratara de metafísica. Pois  tiielüfisica é  uma palavra, assim como  abstraio  e  pensamento,  da qual  todos mais ou menos fogem, como se corressem de um homem castigado pela peste. Contudo  não quero ser tão cruel a ponto de pretender que  aqui devam ser esclarecidos os significados dos terntos "pensamento" e "abstra to".  Para  o belo mundo (die schone  Wclt) não há nada de mais insu portável do que as explicações. Eu mesmo já acho  bastante horrível quando  alguém começa a explicar, pois em  caso  de  necessidade  enten do  eu mesmo tudo. Aliás, tais explicações mostrariam-se  aqui  como totalmente  supérfluas, pois precisamente porque o belo mundo já  sabe o que abstrato significa, é que ele o evita. Da mesma maneira que não é possível  desejar  aquilo que não se conhece,  também não se pode odiá-lo. Também não é meu propósito tentar astuciosamente reconciliar o belo mundo  com o pensar ou com o abstrato, como se, sob a aparência de uma  conversa ligeira,  ambos fossem  introduzidos sorrateiramente, de modo  que sem tomar conhecimento e, precisamente, sem provocar repulsas,  eles  penetrassem ou até mesmo fossem adotados impercep- tivelmente  pela própria sociedade, ou ainda como os  suabos  costu mam  dizer, como se eles  fossem engradados hereingeziíunseU).  Se fos se assim, então o autor desta trama teria simplesmente revelado  este Síntese Nova Fase, Belo  Horizonte,  o. 22, n. 69. 1995  236

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SINTT-BE

  N O V A

  TASF-:

V .

  2 2 N . 6 9  (1995):

  235-240

QU EM

  PENSA ABSTRA TAM ENT E?

a   W. F.  Hegel

P

ünsar? Abstrato? —

  Sauve

  q u i p e u t

Salve-se

  q u e m p u d e r

D esta fo r ma j á o u ç o exc l a ma r u m

  t r a i d o r ,

  c o m p r a d o p e l o

i n i m i g o ,

  d e n u n c i a n d o q u e

  esle

  ensaio tratara de metafísica.

Pois

  tiielüfisica é

  u m a p a l a v r a , a s si m c o m o

  abstraio

  e

  pensamento,

  d a

q u a l

  to d o s ma i s o u meno s fo g em, c o mo se c o r r essem d e u m ho mem

castigado pela peste.

C o n t u d o

  nã o qu er o ser tã o c r u e l a p o n to d e p r eten d er qu e

  a q u i

  d e v a m

ser esclarecidos os s ignif icados dos terntos "pensamento" e "abstra

t o " .

  Para

  o b e l o m u n d o ( d i e

 schone

  Wclt) não há nada de mais

  i ns u

portável do que as expl icações. Eu mesmo já

  acho

  bastante horrível

q u a n d o

  a l g u ém c o meç a a exp l i c a r , p o i s em

 caso

  d e

 necessidade

  enten

d o

  e u m e s m o

  t u d o .

  A l i á s , ta i s exp l i c a ç õ es mo str a r i a m-se

  a q u i

  c o m o

t o t a l m e n t e

  su p ér f l u a s , p o i s p r ec isa mente p o r qu e o be lo m u n d o j á sabe

o que abstrato s ig nif ic a , é que ele o ev i ta . Da mesm a m aneira que não

é possível  desejar  aqui lo que não se

  conhece,

  também não se pode

odiá-lo .

Também não é meu propósi to tentar astuciosamente reconci l iar o belo

m u n d o

  com o pensar ou com o abstrato , como se , sob a aparência de

u m a

  conversa

  l i ge i ra ,

  ambos fossem

  i n t r o d u z i d o s

  sorrateiramente, de

m o d o

  qu e sem to ma r c o nhec i mento e , p r ec i sa mente , sem p r o vo c a r

repulsas ,  eles  p enetr a ssem o u a té mesmo fo ssem a d o ta d o s i mp er c ep -

t i v e l m e n t e

  pela própria sociedade, ou ainda como os

  suabos

  c o stu

m a m   d i z er , c o mo se  eles  f o s s e m e n g r a d a d o s  hereingeziíunseU).  Se fos

se assim, então o autor desta trama ter ia s implesmente revelado

  este

Síntese Nova Fase,

 Belo

 Horizonte,  o. 22, n. 69. 1995

  236

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visi tante   e s t ian l io , a  saber,  o ab s trato , q ue pos s ive lm e n te h avia s ido   20

t r a t a d o  e re c on h e c ido c om o un i b om c on h e c ido por toda a s oc ie dade ,

só que sob um   o u t r o  nome. Kste  t i p o  d e

  cenas

  de reconhecim ento

Erkennungsszenen),

  a travé s das q uais o m u n d o de ve se r in s truído c on

tra  s ua própria von tade , c on té m e m s i um im pe rdoáve l e rro ; aq ue le

q ue as e n ge n dra q ue r ao m e s m o te m po

  causar

  h um ilh aç ão e ob te r

para s i um a pe q ue n a glór ia .

  Essa

  h u m i l h a ç ã o e

  essa

  vaid ade s us pe n - 25

d e m

  (aufhebcn)

  o e f e i to a lm e jado, pois

  elas

  ac ab am   m u i t o  m ais por

d i s s i p a r n o v a m e n t e o e n s i n a m e n t o o b t i d o

 deste

  m o d o .

E m   t o d o caso,  a c om pos iç ão de um ta l p lan o já e s tar ia arruin ada, pois

para a sua real ização

  exige-se

  q u e o t e r m o - c h a v e d o e n i g m a  {Ralscl)

n ã o  seja  pro n u n c iad o de an te m ão . Is so , n o e n tan to , já ac on te c eu n o

título. Se  este e n saio pre te n de ss e p ro m ov e r um a ta i c i lada , e n tão essas  30

p a l a v r a s n ã o d e v e r i a m

  aparecer

  n o in íc io , m as s im , c om o o

  m i n i s t r o

n a c om é dia , t ran s i tar duran te toda a pe ç a c ob e rtas por um m an to e

somente na últ ima  cena  desabotoá- lo, deixando-se raiar assim a estrela

da s ab e doria O de s ab otoar d e u m m an to m e taf ís ic o n ão f un c ion a tão

t>e m c om o o de s ab otoar do m an io do   m i n i s t r o ,  pois a travé s dis to

de s ve lam - s e  apenas  o s i g n i f i c a d o d e a l g u m a s p a l a v r a s ( o m e l h o r d a 3 5

b r i n c a d e i r a  d e v e r ia r e s i d i r p r o p r i a m e n t e e m q u e s e  mostrasse  que já

há   m u i t o  a sociPdade

  estava

  d e posse  de

  coisa

  em questão) ; a socieda

de gan h aria n o

  hm

  s on ic n te a lgun s n om e s , ao  passo  que a estrela do

m i n i s t r o  representa algo real

  (.reelleres):

 um a b ols a c o m   dinheiro^ .

Ü s ign i f ic ado de pe n s am e n to e de ab s trato — q ue todos os

  presentes

saibam isso, é o que se  espera  de um a boa sociedade e nós nus enco n- 4 0

(ramos numa boa sociedade. A questão consiste somente em   saber

quem  é  q u e  pensa  a t w t r a t a m e n t e .

  M i n h a

  in te n ç ão n ão é , c om o já f o i

m e n c ion ado, re c on c i l iar a s oc ie dade c om  essas

 coisas

  ou e x ig ir q ue e la

s e oc upe  dessas  d i f i c u l d a d e s ,  ou m e n os a in da ape lar à s ua c on s c iê n c ia

íiiis  Gcwisscn

  reden).

  a le r tan do- a para o f ato de q ue e la de s prwíc upada-

inente se descuid a de algo que é no rm a e pa drã o para lo d o ser do ta do 45

de razão. A intenção consiste  antes  e m r e c o n c i l i a r o b e l o m u n d o c o n

s i g o m e s m o a  esse  respeito. Se por um lado a sociedade não se ques

t iona

  e m re laç ão a

  essa

  n e g l i g ê n c i a , e l a m a n t é m p o r

  o u t r o

  l a d o u m

c e rto re s pe i to , ao m e n os  i n t e r i o r ,  pe lo pe n s am e n to ab s trato , c om o

pe ran te a lgo gran dios o . A s oc ie dade de s via o o lh ar do pe n s am e n to

ab s trato , n ão porq ue e le pos s ui um c aráte r   i n f e r i o r  para e la , mas por-

c[ue lhe é  m u i t o  su pe rio r; não po rqu e o pen sam ento abstrato lhe pa- 511

rece  m e s q u i n h o , se n ã o p o r q u e lh e parece  n ob re de m ais . O u vic e - ve rs a ,

p o r q u e

  p a r a o b e lo m u n d o o p en s a m e n t o a b s t r a t o su r g e c o m o u m a

Cspèce,  a lgo de e s pe c ia l , a t ravé s do

  q u a l

  não é possível se

  sobressair

  na

s oc ie dade e m ge ral — c om o q uan do s e us a roupas n ovas — m as

  m u i t o

mais como algo atravtS ; do

  q u a l

  se exclui da sociedade ou se torna

ridículo — com o qu an do se usa vestim entas ; ou até m esm o ricas ves- 55

["236

Sínlese

 Nova

 Fase. Belo Horizonte,

  v. 22,

 n .

 69, 1995

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t es , quando  elas se  c o m p õ e m p o r é m  de ped ras preciosas an tiqua das

e c o n t e n h a m t a n t o s b o r d a d o s , q u e  já há

  m u i t o

  sa í r am  de m o d a .

Q u e m pensa  abstratamente?  O h o m e m s e m i n s t r u ç ã o , n ã o o  instruído.

A   boa sociedade não pensa  a b s t r a ta m e n t e , p o r t a n t o , p o i s é

  m u i t o

  s i m

pl es ,

  m u i t o

  b a i x o , e  b a i x o  não  s e g u n d o  o  s t a t us ex t er i or nem  a

  part i r

60

  de uma

 nob r eza v azi a

  que se

  coloca ac i ma d aq ui l o

 que ela não é

capaz,

  mas

 s i m p o r  causa

  da

  i n f e r i o r i d a d e i n t e r i o r

  à

 coisa  mesma.

O   pr econcei t o

  e o

  respeito pelo pensamento abstrato

  são tão

  g r andes ,

q u e

 os

 mais perspicazes vão farejar

  de

 saída u m a sát ira o u um a  i ronia

nesse  ensaio. Uma vez que eles  t a m b é m  são lei tores  do

  Mor^enblalt^,

eles  sabem  que fo i ofer ec i do  um  pr êmi o par a uma sát i r a  e  q u e , p o r -

g5 t ant o ,

  eu

  pr efer i r i a acr edi t ar mer ecer  receber

  o

  p r ê m i o

  e

  concorrer

para

  esse do que

 desgast ar-me aq ui par a nada.

E u

  necessito  s o m e n t e  acrescentar  a l g u n s e x e m p l o s  à  m i n h a p r o p o s i

ç ã o ,

  c o m

  os

  quai s t odos concor dar ão

  que esses a

  c o n f i r m a m . U m

 as

sassino

 é

 c o n d u z i d o

 ao

  local

 de

 e x e c u ç ã o . Para

 o

  p o v o

 em

 g eral trafa-

se s o m e n t e  de  u m c r i m i n o s o e  n a d a m a i s . A l g u m a s d a m a s c o m e n t a m

70 talvez

  que ele é u m

 h o m e m f o r t e , be lo

  e

  interessante.

  O

  p o v o  reage

c o m r e p u l s a :  o que?  " u m assassino  b e lo ? " " C o m o se  pode pensar tão

e q u i v o c a d a m e n t e  a  p o n t o  de  c h a m a r u m  assassino  de b el o?" " v ocês

não são mel hor es do que e l e "

  O

  p a d r e , q u e

  conhece

  b e m

  a

  r azão

 das

coisas e os  c o r a ç õ e s , acrescenta  t a l v ez , que isto é  u m s i n a l  da  c o r r u p -

75  çâo dos costum es  que p e r m e i a  as

 classes

  super i or es .

U m a

  pessoa que

 r ea l ment e conheça

 o ser

  h u m a n o  Menschkenner)

  tra

ça

 o

 c a m i n h o

  de

  f o r m a ç ã o d o c r i m i n o s o ;

 ele

 e n c o n t r a rá

  na

 história

 do

c r i m i n o s o   uma educação def i c i ent e ; péss i mas r e l ações fami l i ar es ent r e

seu pai

 e sua

 m ã e ; a l g u m a p u n i ç ã o m o n s t ru o s a

  {ungeheiire

  Hiírtc)  após

gQ   u m l ev e  d e l i t o ,  que deixa

 esse

  h o m e m a m a r g u r a d o c o m

 a

 o r d e m  civi l ;

u m a

  p r i m e i r a r e a ç ã o

  dessa

  o r d e m c o n t r a

  ele,

 e x c l u i n d o - o

 da

  socieda

de e  p o s s i b i l i t a n d o - l h e a

 p art i r

  d aí a  sobrevivência somente através do

c r i m e .  Pr ov av el ment e ex i s t em

  pessoas que ao

  o u v i r e m  tais  coisas d i

r ã o : esle  quer isentar  o c r i m i n o s o de sua c u l p a Eu me l e m b r o b e m ter

o u v i d o ,

  q u a n d o era j o v e m , u m p r e f e i t o r e cl a m a n d o  que os  escritores

8S  es t av am passando dos l i mi t e s , poi s pr oc ur av am de st r ui r t ot a l ment e

 o

c r i s t i a n i s m o

  e a  h o n r a d e z  (Rechtscbaffenbeit).  S e g u n d o  o  p r e f e i t o ,  um

deles ter ia escri to uma apologia do suicídio ; horrível , horrível d em ais

A l g u m a s

  p e r g u n t a s m a i s

 e

  descobriu-se que

 se

  t ratava dos

 Sofrimentos

de

 Werther^.

Pensar  a t)s trata men t e s i gn i f i ca i s t o ; ver no assassino  soment e  o  fato

90 abstrato  que ele é um assassino  e  através desta simples qual idade

a n u l a r

  vertilgen)  toda

  a

  e s s ê n c i a h u m a n a a i n d a  remanescente  nele.

C o m p l e t a m e n t e d i fe r e n t e o c or re n o m u n d o

  f ino

 e  del icado de  L e i p z i g .

SíntesÈ Noua Fase, Belo HoruorUe, v.

 22,

 n .

 69, 1995

  \  237

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Eles

  espalham e enfeitam com  coroas  de flores a roda de execução e

0 criminoso a ela atado. — Isto é, no entanto, novamente a abstração

oposta. Os cristãos podem muito bem praticar a rosa-crucianismo ou

melhor, o cruz-roseanismo: transformar a cruz em rosas. Já há muito

que a cruz  é  o patíbulo e a roda santificados. Ela perdeu o seu

  s igni -

  95

ficado parcial de ser apenas o instrumento de punição desonrosa e, ao

contrár io ,

  representa ao mesmo

  tempo

 a dor máxima, o mais profun

d o  i h . M i L l i n i o  e o mais  forte  regozijo, a honra

  d i v i n a .

  Ao invés disso,

( 1

  m u i K l i >  L J e  L e i p z i g

  realiza uma conciliação a Ia  Rnlzebue *  com uma

cruz enfeitada de rosas e violetas: uma forma desmazelada de coni

vên i

entre sentímentalismo e maldade.  100

1  \ ' uma maneira bem diferente eu ouvi uma vez uma velha mulher,

que trabalhava num hospital, matar a abstração do assassino e Irazê-

lo

  de volta à vida e à honra. A cabeça decapitada sido colocada sob o

cadafalso e o sol brilhava. "Que belo", disse ela, "a graça

  d i v i n a

 do sol

resplandece sobre a cabeça de  Biiider .  "Você não merece que o sol lhe

i l u m i n e ,

  diz-se para um anão, que se quer provocar. Aquela mulher

  i05

viu  que a cabeça do assassino tinha sido iluminada pelo sol e que,

portanto, ainda tinha valor. Ela o elevou da punição do cadafalso para

a graça

  d i v i n a

 do sol. Ela não realizou a conciliação através de violetas

e de um sentímentalismo vaidoso, mas viu no sol elevado o criminoso

ser acolhido pela graça.

V e l h a ,  os seus ovos estão podres", diz uma freguesa para uma  UO

vendedora. " O que?" ela responde. "Meus ovos, estragados? Você  é

que deve estar estragada Você? O seu pai não comia piolhos na rua?

A   sua màe não fugiu com os franceses e a sua avó não morreu num

hospital público? Deixe-na primeiro conseguir um vestido de verdade

ao invés desse cachecol. Todos sabem a origem deste cachecol e dos

h péus

 que ela tem: se não fossem os oficiais, muitas delas não esta-  IJ5

r iam   vestidas  agora  desta maneira. E se algumas esposas prestassem

mais  atenção ao controle da própria casa, muitas delas estariam na

prisão . Deixem-na remendar os furos das meias " para resumir, ela só

  os defeitos da outra. Ela pensa abstratamente e subsume a freguesa

ao cachecol, ao chapéu, ao vestido, ele... assim

 como

 aos dedos e outras

partes dela, e ainda ao pai e ao  resto dos parentes também — tudo por

  120

causa do crime de ter considerado os ovos podres. Tudo o que ela vê

na

  freguesa é filtrado através desses ovos podres, ao passo que aque

le s

  oficiais mencionados pela vendedora  (caso  haja algo de verdade

neste comentário, o que no  entanto  é bastante duvidoso), poderiam

ser capazes de ver coisas muito diferentes.

E

  passando da empregada para o empregado, não há situação pior do

  125

que servir a um homem de classe inferior e de pequenos rendimentos,

ao passo que quanto mais distinto for o seu senhor,  tanto melhor será

Sínteêe

 Nova

 Fone.

  elú

 Horizoníe. v. 22, n. 69, 1995

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p a r a e l e , O h o m e m c o m u m

  pensa

  d e n o v o m a i s a b s i r a Ia m e n t e : e l e s e

f a z d e e l e g a n t e d i a n t e d o s e r v o e t r a t a - o   apenas  c o m o u m s e r v o ; e l e

i n s i s t e  nesse  ú n i c o p r e d i c a d o . O s e r v o

  v i v e

  m e l h o r e n t r e o s

  franceses.

I j f )

  O n o b r e é

  f a m i l i a r

  c o m o s e r v i ç a l , o n o b r e f r a n c ê s é a t é u m b o m a m i g o

d e l e . Q u a n d o

  eles

  e s t ã o s o z i n h o s é o s e r v o q u e m d o m i n a a d i s c u s s ã o .

É o

  caso

  p o r e x e m p l o d e

  Jacques  et

  sou

  maitre

  d e

  D i d e r o t " :

  o s e n h o r n ã o

f a z m a i s n a d a a l é m d e i n a l a r

  tabaco

  e o l h a r  t] u e h o r a s s ã o , e n q u a n t o

d e i x a o s e r v o c u i d a r d o r e s t o . O n o b r e  sabe  q u e o s e r v o n ã o é

  apenas

u m

  s e r v o , m a s

  conhece

  t a m b é m as n o v i d a d e s d a c i d a d e e a s g a r o t a s .

J3 5 Ü s e r v o t e m

  boas

  i d é i a s . O s e n h o r f a z p e r g u n t a s e o s e r v o t e m o  d i r e i t o

d e d i z e r o

  t

]u e  sabe  d e i m p o r t a n t e a r e s p e it o d o a s s u n t o . Ü s e r v o p o d e

n ã o  apenas  f a z e r i s t o c o m o s e n h o r f r a n c ê s , m a s t a m b é m p o d e t r a z e r

o l e m a d a d i s c u s s ã o à

  mesa,

  d e f e n d e r  suas  p r ó p r i a s o p i n i õ e s e i n s i s t i r

n e l a s .

  Caso

  o s e n h o r q u e i r a a l g o ,

  isso

  n ã o se d á a t r a v é s d e o r d e n s . A o

c o n t r á r i o e l e p r e c i s a

  p r i m e i r o

  e n t r a r e m

  consenso

  c o m o s e r v o e

  acres-

140 c e n t a r u m o b s é q u i o a f i m d e

  assegurar

  q u e a s u a o p i n i ã o p r e v a l e ç a .

N o  e x é r c i t o o c o r r e a m e s m a d i f e r e n ç a . B n i r e o s m i l i t a r e s p r u s s i a n o s '

u m

  s o l d a d o p o d e s e r e s p a n c a d o ;  este  é p o r t a n t o u m c a n a lh a , p o i s

  t u d o

q u e t e m o   d i r e i t o  p a s s i v o d e s e r e s p a n c a d o é c a n a l h a .

  lX'sse

  m o d o o

s o l d a d o c o m u m v a l e p a r a o

  o f i c i a l

  c o m o o

  Abstrakíiitu

  d e s er u m s u

j e i t o  s u s c e t í v e l d e s e r e s p a n c a d o , c o m o

  q u a l

  u m s e n h o r q u e t e n h a

1 45

  u n i f o r m e

  e  port  d'epée  ̂ possa  s e ( x : u p a r e i s t o s i g n i f i c a , f a z e r o d i a b o

c o m e l e .

Nota8 d o t r a d u t o r

G .  W ,  F.  H E G E U  W er  dcnkt  abslrakl?,  in  Werke.  Bd. 2,  Frankfurt,  1 9 8 6 ,  pp.

575-581.

2 NT. :  emtiora pareça evidente  que não sc  trata  de um exemplo fictício,

 ainda

não foi

  possível  determinar

  com

  exatidão qual

  é a obra  a que

  Hegel

  se

  refere

(Cf. A.  B i i N N U O L í T T - T n o M s i í N ,

  Hegcls

  Aufsnt/.: Wer

  Denkt Abstrakt?,

  in

  Ue^el-

Stuilien  5 (1%9) p. 166). cm

  todo

  caso,  tais  cenas  de  reconhecimenlo. onde

personn);ens

  se  desmascaram, revelando

 assim

 suas verdadeiras

  identidades,

oram

  desfechos

 comuns

  das

  comédias alemãs

  e

  francesas

  du

  século

  XVUl e

princípio  do  século  XIX.

3. NT.: O

 MoTgenblall  fU r •^cbildete Siãnde

 ofereceu

  u m

  pri?mio para

  um a

  sftín

na  edição  de  02.01.1807.  O  jornal  fo i  publicado  apenas  entre

  1 01

 18 7  e

1,07,1807,  o que  leva  a

 crer

 que

  Hegel

 teria

 escrito

 o

 ensaio

 durante  os primei

ros

  meses

  de 1807,

  quando fugindo

 da guerra  em

 Jena,

  se

  instalou

  em

  Bamtierg.

Síntese

 Nona

 Fase,

 Belo

 HoruotUe.

 u. 22. n.

  69.

  1996 \

  239[

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7/23/2019 Hegel - Quem pensa abstratamente.PDF

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4. NT. :

 Die Leiden des jungen

 Werther,  escrito  por Goetiie em 1774.

5.

 NT:

 A u g u st

 von

 K o twbu e

 (1761-1819),

  escritor, poeta

  e

  autor teatral,

 seu

nome

 era

  usado

  na

 época

 do

  Hegel para designar  dramaturgia

 de

  baixa qua

lidade.

6.

  N T . : jacques

  le falalisle el sou mailre,

  escrito

 por D. Dideral em 1774.

7.  NT,:

 Provavelmente

  por

  motivos políticos

  os

  respon.sáveis pela

  primeira

edição

 do ensaio

  substituíram

  a

 expressão "militares prussianos"

  por

 "milita

res

  austríacos".

8. NT: em

  francês

  -

  porte

 de

 arma  (espada).

Tradução: Charles Feilosa

240

Sín t ese Nova Fase

Belo

 H o r i z o n t e

v . 22.  n.

 €9 1995