Heterotopia nº 5, 40 anos dos Cursos de do Campus II - UNEB, Alagoinhas

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PÁGINA 2 PÁGINA 4 PÁGINA 10 PÁGINA 12 Letra como CIÊNCIA e AÇÃO direta LETRAS: PELO QUE SE LUTA? PROJETOS DE INICIAÇÃO CIENTÍFICA: IMAGENS E ALGUMAS REFLEXÕES ano 4 # 5 junho 2012 ISSN 2237-8340 CIÊNCIA E AÇÃO DIRETA: UMA HOMENAGEM AOS 40 ANOS DOS CURSOS DE LETRAS DO DEDC II/ UNEB – ALAGOINHAS CURSO DE LETRAS atuação e intervenção na vida da sociedade LITHOSILVA

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PÁGINA 12Letra como CIÊNCIA e AÇÃO direta

LETRAS: PELO QUE SE LUTA?

PROJETOS DE INICIAÇÃO CIENTÍFICA: IMAGENS E ALGUMAS REFLEXÕES

ano 4 # 5 junho 2012 ISSN 2237-8340

CIÊNCIA E AÇÃO DIRETA:

UMA HOMENAGEM AOS 40 ANOS DOS CURSOS DE LETRAS DO DEDC II/UNEB – ALAGOINHAS

CURSO DE LETRASatuação e intervenção na

vida da sociedade

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Universidade do estado da Bahia (UneB)Lourisvaldo Valentim da Silva - REITOR Adriana Marmori - VICE-REITORAJosé Cláudio Rocha - PRÓ-REITOR DE PESQUISA E ENSINO DE PÓS-GRADUAÇÃO

Mestrado eM CrítiCa CUltUral - Pós-CrítiCaDEDC / Campus II – Alagoinhas Coordenador: Osmar [email protected] - (75) 3422-1536 / 1139 - www.PosCritiCa.UneB.Br

núCleo de ProdUçãoExpresso 18 ProduçõesDavi Soares 75 9102-6927Isis Favilla 75 9102-8644LithoSilva 75 9142-1379

Projeto GráfiCo e diaGraMaçãoGermano Carvalho (75) 9977-4350

ilUstraçÕesLithoSilva

issn 2237-8340 tiraGeM 8 mil exemplares

CoordenaçãoOsmar Moreira

letras como CIÊNCIA e ação DIRETA

iMPressão A Tarde Serviços GráficosDistribuição gratuita

O que seria a consciência de um estudante e/ou profissional da área de Letras, enquanto um sujeito que atua num campo epistemológico arruinado? Como se tornar, após essa tomada de consciência, num colecionador de ruínas para liberar o cam-po da falsa ideia de progresso científico imposta pelo sistema científico brasileiro e internacio-nal? Seria essa prática política, ao longo desses 40 anos de existência, antes na Faculdade de Formação de Professores de Alagoinhas (1972 – 1997), hoje no Departamento de Educação do Campus II (criado pela lei 7176/97 em tempos carlistas), e considerando seus projetos científicos atuais, a criação de outro tempo histórico combati-vo tanto ao idealismo quanto ao positivismo parasitários?

Um estudante Letras, cheio de sonhos com a universidade pública, gratuita, laica, de qualidade e socialmente refe-renciada, ao chegar ao Cam-pus II, mesmo com a calorosa recepção de seus colegas e professores, a demonstração de nossa produção em livros, jornais, painéis, projetos de pesquisa, ensino e extensão, não tem como não observar salas sem ar condicionado, banheiro sem papel higiênico, biblioteca com pouco exempla-res da área de estudos, casa do estudante com instalações precárias, ausência de labora-tórios de língua e literatura, nem confrontar com todos os tipos de tensão envolvendo desde a falta de esperança de seus colegas em via de conclu-são de curso, passando pela ausência de política científica do Departamento de Educação, ao medo da comunidade – pro-fessores e alunos da educação básica, bem como, as agentes de cultura – de vir e interagir com a universidade.

Mesmo envolvido nessa re-

alidade problemática, o parâme-tro que em geral utilizamos é o da produção científica propalado pelas ciências exatas e/ou áre-as tecnológicas que, fundadas numa falsa ideia de progresso e desenvolvimento do país, dificil-mente questiona o capitalismo e seu canto de cisne voltado à acumulação de riquezas, quan-do, ao contrário, e por termos a nosso favor a descoberta do signo e sua potência semiótica, deveríamos começar pelo des-fazimento do positivismo que atravessa essas concepções de progresso e de modernidade e nos colocarmos como coleciona-dores das ruínas presentes a re-alidade a nossa volta para, num gesto libertário, agenciarmos o “ocorrido” a partir da ação direta dos profissionais da área Letras formados ao longo desses 40 anos, e reinventar o verdadeiro lugar de nossas transformações históricas.

Apenas dois exemplos paradigmáticos: as atuações, a partir da fome e da coleção de ruínas, da FIGAM (Fundação Iraci Gama de Cultura) e do Pós-Crítica (Programa de Pós--graduação em Crítica Cultural. Através da professora de Lín-gua Portuguesa Iraci Gama San-ta Luzia, os cursos de Letras, ainda na década de setenta, e em plena ditadura militar no Brasil, e em vários países da América Latina, mobilizaram os mais diferentes segmentos artísticos de Alagoinhas e ci-dades circunvizinhas para além de uma prática de uma estética da existência, planejar uma re-composição da memória dessa importante região ferroviária. Hoje não apenas temos um museu financiado quase que com os recursos da professo-ra de Letras, mas uma série de projetos cadastrados em instituições como IPAC, IPHAN, entre outros, como promessas museais de recepção, cataloga-ção, tratamento especializado e disponibilização pública dessas ruínas deixadas pelo progresso avassalador.

O Programa de Pós-gra-duação em Crítica Cultural, através de seu coletivo de

Por osmar Moreira(Pós-Crítica/UNEB)

Professor de Literatura

40 anos de existência para um curso de Letras pressupõe a existência de um coletivo muito forte, sobretudo num contexto universitário em que cursos de letras são criados e fechados como coisa natural, alegando, os criadores e fecha-dores de cursos, que não há mercado para os profissionais formados na área ou que não há mais demanda social. Isso impõe uma pergunta: será que o Brasil, que pretende ser pro-tagonista internacional – hoje já é a 5a maior potência finan-ceira do mundo – não precisa-rá difundir a sua língua oficial aos quatro cantos do mundo? E quem fará senão os profes-sores de língua e de literatura formado nos cursos de Letras? Ou ainda: com a instituciona-lização da malha cultural nos mais de 5.500 municípios do B rasil, em que os segmentos artísticos (literatura, teatro, música, cinema, artes visuais, entre outros) assumirão o pa-pel de proposição e fiscalização dos planos decenais de cultura, qual o papel dos profissionais das letras, para além do ensino de língua e literatura na rede de escolas públicas e privadas?

Para se ter respostas para estas questões basta ler os artigos deste número dedi-cado aos 40 anos dos cursos de Letras do Departamento de Educação do Campus II da UNEB e, a partir dessa leitura, mobilizar-se para trabalhar e pensar conosco uma história de longa duração das letras não somente aqui, entre nós, mas na Bahia e no Brasil.

Eis uma imagem sumária de nossos atuais projetos: pri-meiro, a construção até dezem-bro, próximo, do Projeto Político

EDITORIAL

EXPEDIENTE

AP

OIO

Pedagógico dos Cursos de Le-tras (Vernáculas, Francês e In-glês) que aponta para a criação da Empresa Jr. de Letras, com os estudantes sendo prepara-dos para além da sala de aula dar uma guinada em relação ao trabalho no campo cultural. Acrescente-se, a isso, a criação do Observatório da Educação Básica e sua relação com a Política Cultural, em que mais de 50 professores das áreas de Língua e Cultura, Literatu-ra e Cultura, Ensino e Cultura, ampliarão o alcance de seus projetos de ensino, pesquisa e extensão, a partir dos equi-pamentos (Centro de Pesquisa Avançada + Cinema Digital + Es-tação do Livro Digital + F ábrica de Letras) recentemente ad-quiridos pelo Programa de Pós--Graduação em Crítica Cultural. Essa articulação dos cursos de graduação com o programa de Crítica Cultural, através do Projeto Político Pedagógico dos Cursos de Letras, indica um se-gundo passo: a construção do conhecimento com os coletivos que compõem a rede de esco-las e equipamentos culturais e, ao mesmo tempo, a transferên-cia de resultados de pesquisa.

Um exemplo: as pesquisas, através da PARFOR, TCC dos cursos regulares, IC, mestrado, doutorado, poderão levantar um acervo contendo jornais, cartas de alforria, cadernos literários, álbuns com fotos raras, etc., e esse material ser tratado, fotodigitalizado e dis-ponibilizado para download nos centros de cultura, centros de memória, núcleos de estudos das escolas, bibliotecas comu-nitárias, ou mesmo nas casas das pessoas, que passarão a ter outro feeling com a cul-

tura. Além disso, os pesquisadores nacionais e internacionais que circulam no programa, os pesquisado-res docentes e discentes que circulam pelos mais diversos centros nacionais e internacio-nais de pesquisa, alimentarão a cultura local, fortalecendo sua vocação universal em diferen-ça. Isso nos credibiliza para um sonho ainda maior: transformar os cursos de Letras do DEDC II num Departamento, por exem-plo, de Letras, Tecnologias e Ciências da Informação.

Em suma, os 40 anos dos cursos de Letras do DEDC II/UNEB, não só formaram gera-ções de intelectuais e profes-sores, que atuam em escolas e equipamentos de cultura, por todo Brasil, e mesmo em outros países, mas implicaram uma experiência científica e política que, atualmente nos habilita, e de forma sustentável, a propor uma zona autônoma, uma área de fronteiras entre campos disciplinares, capaz de ampliar o oxigênio para as ciências humanas, liberando-as de seu positivismo matemático, bem como acolhendo as contribui-ções de uma matemática mul-ticultural para disseminarmos uma permanente oficina do sig-no: rachando a relação entre as palavras e as coisas; mapeando os déspotas que, ignorando as assembleias de communards e seus encaminhamentos, que-rem se confundir com a lei; reinventando as estruturas do pensamento para não sucum-birmos ao logocentrismo e sua lógica excludente. Lições, en-fim, de pintura rupestre e sua semiologia inesgotável!

osmar Moreira - Editor Coordenador do pós-critica/Uneb - Campus II

professores e estudantes, conquistou a construção de um prédio onde instalar seus gabinetes de estudos, laboratórios de restauração de impressos, ilhas de edição gráfica e áudio visual, fábrica de letras, Centro de Pesquisa Avançada, mas esse prédio já é uma ruína tanto literal-mente falando (com goteiras em muitas salas, falta de acabamento, inconclusão de auditório, amontoado de li-vros e equipamentos) quanto simbolicamente, por repre-sentar uma promessa radical de revolução das instalações científicas no interior de uma universidade sem tradição de pesquisa, mas que se esbarra na miséria ao lado, em geral vivenciada por quem nunca fez nada ou fez pouco a par-tir da miséria, ou das ruínas, enquanto forma de produção (uma reunião de Departamen-to teria impedido o reenvio da proposta de Programa a Capes, alegando não termos infraestrutura, conquistada, depois, por aquele coletivo, mesmo à revelia...).

Afinal, quem é que seria uma ação em Letras como coleção de ruínas? Como na Comuna de Paris, em que blanquistas, proudhonianos, internacionalistas radicais, impediram qualquer forma de centralismo e fizeram do poder um espaço vazio, o mesmo acontece, com o sig-no literário, cujo sentido se reveza sem transcendência e a favor dos consensos locais relativos ao repertório dos interlocutores. Essa relação entre a mobilidade de sen-tidos no texto literário e no gesto político radical nos co-loca no limiar de outra práti-ca histórica, sem necessidade de cursos de história ou de história entendida como es-teira rolante, para, a exemplo de Walter Benjamin, não só detonar o idealismo e o po-sitivismo, mas reverter o tra-tamento dado às coisas ar-ruinadas, fazendo delas uma dramatização a favor de uma estética da existência.

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wilson sousa oliveira (Mestrando em Crítica Cultural/UNEB- CAMPUS II Alagoinhas, Bahia) Bolsista

CAPES) Mestrando em Crítica Cultural pela Universidade do Estado da Bahia – Campus

de Alagoinhas, Bahia.Linha de Pesquisa: Margens da Literatura.Orientador: Prof. Dro Osmar Moreira Santos

E-mail: [email protected]

Proveniente do Curso de Letras da UESB, campus de Vitória da Con-quista, ingresso-me no Programa de Mestrado em Crítica Cultural da UNEB – Campus de Alagoi-nhas–BA (em 2011) e, de cara, percebo que outras molduras, outras formatações, outros dis-cursos seriam meus parceiros permanentes e que iriam me convidar ao jogo dos desafios. Percebe-se de imediato que o ar revolucionário que se respirava no Crítica Cultural já tinha uma semente plantada na graduação do Curso de Letras. Meu espanto foi incomensurável!

Imediatamente percebo que o terreno, por onde iriam palmi-lhar meus pés, era um desses mais movediços possíveis. Pelo que acabava de descobrir, o curso de Letras do Campus II, ao contrário do olhar panorâmico e descritivista de minha formação sobre o campo da arte literária, se apresentava para mim com um olhar enviesado por onde se abria múltiplas possibilidades para se conceber o mundo, a arte, a lite-ratura, o cinema e outras instân-cias do mundo simbólico e prático cultural.

Assim, de carona ou de ôni-bus coletivo, já no trajeto que fazia até a UNEB, constatava nos falares dos alunos/as do curso de Letras e na forma de exprimirem suas cenas de vida, um misto de alegria e subversão quando, por

elisabeth silva de almeida

amorim (Mestrando em Crítica

Cultural/UNEB- CAMPUS II- Alagoinhas, Bahia)

“I have a dream!” Quem não sonha com dias melho-res? Será que os 40 anos dos cursos de Letras em Alagoinhas proporcionaram maturidade para lidar com os anseios dos estudantes novatos ou desejos são castrados como se fossem despejos? Martin Luther King Jr em 1963 através de um inflamado discurso clamou por uma socieda-de mais igualitária. Desejo ou despejo? O programa da Crítica Cultural é resul-tado de muitas vontades potencializadas oriundas desses cursos, mas como buscar afirmação identitária e libertária neste labirinto institucional permeado de símbolos e leis quando a vida enquanto obra de arte (SANTOS,2011) grita por reparações, esvaziamentos dos significados prontos?

Indiscutivelmente o desejo impulsiona as ações emprenhando as idéias de mudança, revertendo or-dem, desarrumando casas, promovendo um caos lin-güístico, filosófico, históri-co, artístico, literário... Caos aqui são despejos ativados de diferentes posições em transformação constante colocando-nos em xeque: liguemos nossa “máquina de guerra” para atuarmos de forma competente nesta sociedade pós-moderna ou seremos deglutidos pela inércia diante dos signi-ficados transcendentais. Conforme Derrida (2001) é hora de quebrar os sen-tidos fixados, esvaziá-los para questionar tais cons-truções. Que desejo!

As novas críticas (mu-lheres em maioria absoluta) do programa de mestrado estão marcando passo para o esvaziamento de pré--conceitos endurecidos pela repetição temporal, perfis comprometidos buscam ouvir o “canto do sabiá” mesmo se deparando com um cenário de “desmatação das palmeiras”. Sem árvores não há pássaros! Numa uni-versidade mais acolhedora. os diálogos departamentais fluem e o coletivo ganha. Que despejo! A crítica só se

UM CHOQUE. oUtras PerCePçÕes, oUtro MUndo..

novas CrítiCas e velhos ProBleMas da UneB: DESPEJOS E

DESEJOS no PÉ das letras

faz necessá-ria quando o ser humano é acometido por al-guma sorte de mal estar. (SEIDEL, 2010). O desen-canto pode ser uma marca.

O primeiro ca-pítulo do Regimento do Programa de Mestra-do da Crítica Cultu-ral/2008 pela Uni-versidade do Estado da Bahia, Campus II, em Alagoinhas pro-põe de forma articulada com o ensino, pesquisa e extensão preparar os recursos humanos de alto nível seja para o campo da Lingüística ou das Letras. Com isso os investimentos para fomentação da proposta é fundamental.

Infelizmente, as lacunas são visíveis, variam das precá-rias condições das instalações do prédio da UNEB (quadro desolador em dias chuvosos) a falta de equipamentos tec-nológicos fixos nas salas. Os demais problemas antigos da UNEB encheriam páginas e não se esgotariam, apenas fariam eco com outras vozes.

40 anos das Letras em Alagoinhas! O Programa da Crítica Cultural está além de Alagoinhas e das Letras. Se ele nasceu sendo do “pé” das Letras, a forma peculiar abraça outras áreas. A nossa crítica já rompeu as fronteiras sejam territoriais, estaduais e inter-nacionais. O Pós-crítica, como é conhecido, é resultado de desejos, determinação, lutas e doações de uma equipe de profissionais qualificados. Equi-pe, liderada pelo então coorde-nador do programa o professor Dr. Osmar Moreira Santos que

não se acomodou com os “cortes das palmeiras,” incansá-vel busca parcerias e juntos plantam, com

os parcos instrumentos disponíveis, “novas árvores” no Campus II.

Os números indicam 75 pessoas aprovadas desde a

implantação do programa no Departamento de Educação em 2008. Em 2009 dos 19 aprovados, 11 mulheres, 2010 dos 18, 15 mulheres, 2011 foram 12, sendo 7 mulheres, em 2012 são 20 mulheres dos 26 aprovados. É inegável que houve modificação da trajetória em busca de novos (ou velhos) sonhos, talvez, mais desencan-to... Porém é fato: a mulher está cada vez mais crítica.

Com isso “Mestrado de Ala-goinhas” cresce despindo-se da possessividade inicial, a crítica é nossa! Nós de Salvador, Fei-ra de Santana, Pojuca, Seabra, Iaçu, Paulo Afonso e Petrolina. Ah, e do Congo também. Nós, encalouradas montamos as ce-nas, identificamos os símbolos, criamos séries e desmotamos\remotamos as estruturas. Ca-minhamos labiríntica, simbólica e culturalmente na afirmação desse novo perfil desenhado. Desejo ou despejo?

UNEB, coloque a vontade de potência acima das vontades pessoais e excludentes. Invis-ta no tripé: ensino, pesquisa e extensão, afinal, as idéias de mudança não precisam ser abortadas, mas a escrita dife-rente faz-se necessária porque we have dreams, too!

LITHO

SILVA

referênCiasDERRIDA, Jacques. Posições. Trad. Tomaz Tadeu e Silva. Belo Ho-rizonte: Autêntica,2001GUATTARI, Felix. ROLNEIK, Suely. Micropolítica. Cartografías Del deseo. Trad. Florência Gomez. Petrópolis: Vozes Ltda, 2005.JAMENSON, Fredric. Cultura: a lógica do capitalismo tardio. In:JAMESON, Fredric. Pós-Modernismo: a lógica cultural do capi-talismo tardio, 4 ed. São Paulo:Ática.SAIDEL, Roberto Henrique. Crítica e mal-estar. Heterotopia: repa-rações. Ano 3, número 4, dez|2012. p. 8SANTOS, Osmar Moreira. Uma estranha idéia de reparação. Hete-rotopia: reparações. Ano 3, número 4, dez\2011. p.2

exemplo, relacionava vínculos diretos e indiretos entre gra-duação e o mestrado em Crítica Cultural. De certo é que, como cria uesbiano, meu olhar atrofiado, destravava-se, transmutava-se do panorâmico para as passagens e paisagens. Claro, uma coisa não excluía a outra: à minha formação, vieram somar outros horizontes.

O que me fazia a cada dia

perceber era que patinava por um terreno em que muitas das minhas “certezas” se destroça-vam a cada aula no Crítica Cul-tural. Notava que o que rolava no programa do Mestrado, um pouco já estava lá no programa do curso de Letras.

Não era novidade nenhuma a estudantes da graduação em Letras do Campus II a obra de Homi Bhabha, Edward Said, nem Deleuze, Foucault e Guatarri, como “velhos” conhecidos. Fui pego, sim, de surpresas agradá-veis, obviamente, ao presenciar que Foucault já era lido com uma

certa desenvoltura entre eles e que a visão de “Cultura como um modo de vida” – de Raymond Wi-liams – já era algo que se discu-tia e repercutia entre eles, quan-do, na UESB, ainda não tínhamos escapado de Alfredo Bosi.

Na verdade, o curso de Le-tras – Alagoinhas, juntamente com o Mestrado em Crítica Cultu-ral, apresentaram-me a Comuna de Paris como uma cidade literá-

ria e libertária em que Bakunin, Kropotkin, Proudhon e mesmo Marx... além de atearem fogo

nas representações burguesas e seu caráter fetichista convi-davam-nos a repensar novas e potentes maneiras de rein-ventar a vida, sem amarras. Percebe-se que rizomatica-

mente os tentáculos espargidos pelo/do Crítica Cultural colocam o curso de Letras de Alagoinhas em sintonia com os destravamentos que fazem melhor tomar a litera-tura como uma potência da vida e pela vida.

Enfim, o que essa ex-periência me proporcionou

de melhor e mais positivo foi a construção de um entre-lugar que me fez sair da minha zona de conforto e me lançar na arena dessa guerra de relatos que mar-ca as lutas minoritárias, além de fazer-me perceber que a arte, ou a arte-educação, meu projeto de pesquisa, se projeta como uma necessidade vital ao ser humano em seu ato de (re)pensar, (re)criar seu mundo, sua realidade, uma espécie de ressurgimento de um communard em teatro brechtiano: distanciamento e au-tocrítica para, ao invés continuar batendo a cara contra muro, sim-plesmente implodi-los.

LITHO SILVA

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Para comemorar os quarenta anos da UNEB no Território Agreste de Alagoinhas/Litoral Norte, escolhi fazer um brevíssimo passeio

acerca de reações de estudantes de Letras a mudanças de concepção de ensino de Língua Portuguesa, no Curso que faziam na Unidade de Alagoinhas. Trata-se de algumas lem-branças, esparsas, que sinalizam, em minha opinião, o impacto do Curso frente a sua formação anterior, no ensino básico.

Para começar a contar essa história, de forma muito breve e também parcial, lembro que impactavam-se os/as es-tudantes já no primeiro semestre de curso, ao entrarem em contato com concepções de língua e linguagem desestabiliza-doras de crenças equivocadas construídas durante o ensino fundamental e médio.

Assim, nas aulas, os novos estudantes passavam por uma espécie de choque: como era possível defender-se que todas as variedades linguísticas são legítimas, sistemáticas, possuem regras e não cabem julgamentos de valor diante dos falares coexistentes em uma comunidade? Então, cientifica-mente falando, não existe falar errado?

Com o tempo, acostumavam-se com a ideia de seguir o que a Linguística prevê, ou seja, as línguas são heterogêneas, passam por variação e mudança. Acomodada essa constata-ção, geralmente vinha uma outra questão. Diante das críticas feitas à gramática normativa, reinava uma certa desesperança de mudar o ensino de Língua Portuguesa, minimizando o es-paço dado às lições de gramática, focalizando o texto, pois haveria resistência de outros professores/as, dos pais, da direção da escola.

As abordagens discursivas, a partir da Linguística Tex-tual e da Análise do Discurso, me parece que eram melhor “aceitas”, quem sabe por já circularem nas escolas os Parâme-tros Curriculares Nacionais – PCN, que trazem propostas com base no discurso. O peso da recomendação oficial pode ter

facilitado as coisas, de modo que os/as estudantes demons-travam interesse pelos estudos embasados nas chamadas Teorias do Texto.

Mais recentemente, sem abandonar as abordagens lin-guísticas baseadas na Sociolinguística, Análise do Discurso, Linguística Textual, perspectivas identitárias relacionadas a raça e gênero vêm sendo incorporadas às anteriores, fazendo com que comecem a figurar, nos Trabalhos de Conclusão de Curso do DEDC II, por exemplo, temas que buscam a relação com estas categorias, seja nos estudos associados ao Núcleo de Estudos Literários, mas também, aos de Estudos Linguísti-cos e Conhecimentos Pedagógicos.

Esta perspectiva, inter/trans/indisciplinar, é bastante desejável, considerando a indissociação entre áreas de estudo no campo das linguagens, revelando ainda mais sua natureza múltipla, multifacetada, reveladora, também, de discrimina-ções inscritas no discurso, para além da sala de aula.

Dessa forma, é digna de nota a receptividade dos estu-dantes para aprender ensinar a língua, considerando que este aprender/ensinar não é neutro e, logo, não pode ser assim considerado, embasados em teorias críticas e pós-críticas, onde as ideologias, as relações sociais, de gênero, de raça têm um peso que não pode ser ignorado ou minimizado.

O melhor de tudo isso, deixando de lado as questões problemáticas que professores/as e alunos/as vivenciamos cotidianamente no âmbito da institucionalidade acadêmica, é que parece haver mais conscientização acerca das exclusões e necessidade de empoderamento de sujeitos e grupos histo-ricamente marginalizados, a partir da ação e prática educativa.

Ainda estamos longe das utopias de equidade e igualdade na educação, na escola, na sala de aula, mas a formação de professo-res/as, conforme praticada no Campus, mostra sua potencialidade na construção de valores para uma convivência, respeito e afirmação das diferenças, inclusive linguísticas, no espaço escolar.

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Através de contos fantásticos, durante toda a minha infância fui instigada a imergir no mundo da imaginação. Nessas primeiras leituras, o prazer da descoberta e a curiosidade de buscar algo novo me guiavam por deliciosas aventuras pelas páginas literárias. O prazer e a imaginação andavam juntos em minhas imersões pelos espaços ficcionais que, pela idade tenra, não se diferenciavam muito dos espaços reais. Na adolescência, a escola me apresentou o mundo ficcional dos escritores brasileiros. Assim, meu reper-tório foi astuciosamente completado: de Machado de Assis, José de Alencar, Aluísio de Azevedo, conheci velhos ícones da literatura brasileira, dessa vez não mais instigada a imaginar, mas a contemplar. Estava pronta! Espírito pacificado, moldado, regulado, decepado. No entanto, diante desse controle, minha imaginação buscou outras saídas para o prazer do texto literário. Com esse intuito, durante a graduação em Letras, acedi à mais ordinária literatura através dos contos eróticos do Marquês de Sade – se é que toda aquela libertinagem poderia ser chamada literatura. Como resultado, fiquei atônica e confusa. Nesse primeiro contato, senti nojo. Um desvirtuado, isso sim! – pensava eu – literatura era outra coisa. Todavia, passei a avaliar aquela primeira impressão diante dos textos de Sade. Afinal, que olhar contemplativo é esse que nos tolhe a criticidade?

Depois de algumas reflexões, entendi que, com o espírito modelado pelo conceito de belo, eu não poderia exergar nos textos sadianos, marcados pela obscenidade descarada, algum sentido além dos explícitos e óbvios: lascivo e pornográfico. Limites das exíguas linhas do texto, em que o não compreender pode perigosamente ser mascarado por ingênuas discussões pouco analíticas, pouco críticas, pouco ou (des)contextualizadas. Contrária a essa postura, percebi que havia outras posições para se ler e entender a obra de Sade, uma vez que esperando apenas o grosso conhecimento entrar vigorosamente com todo seu dogmatismo, não podemos esperar produzir criticidade, pois esta floresce a partir de questionamentos, de desconstru-ções.

Assim, logo descobri que, naquela leitura de Sade, eu precisava compre-ender que “de quatro”, “frango assado” ou “canguru-perneta”, não importava a posição, os escritos sadianos representavam não simplesmente luxúria e masoquismo, mas transgressão e denúncia. O contexto do século XVIII ao qual o autor produziu suas obras era marcado pelo terror de práticas des-póticas e por severas interdições morais e políticas. Com seu ateísmo con-tundente, Sade afrontou a ordem social predicada por discursos religiosos que tolhiam a liberdade da sociedade francesa, naquele momento histórico, pré-republicana. Dessa forma, por vias de uma denúncia à Maquiavel, induziu a transgressão de valores e a tomada de consciência da população por uma sociedade livre.

Em Sade, conforme nos ensina Deleuze, a linguagem se desterritorializa e ganha “estranhos usos menores”, capazes de elencar uma gama de sig-nificados ao que era concebido como pura indecência, estabelecendo linhas de fuga para o devenir politique. A corrupção dos costumes promovida por personagens pervertidas assume o singular papel de contradizer a lógica moral da sexualidade e igualmente questionar o aprisionamento coletivo em interdições capazes de forjar as imposições eclesiásticas e estatais uma autenticidade pautada no conceito de legalidade. Esse movimento de sen-tidos no universo literário atua como transformador de alienações políticas em consciências potenciais.

Essa interpretação do sadismo é apenas um modelo para a percepção da literatura enquanto máquina de guerra, no sentido deleuziano do termo, ou seja, como potência revolucionária, nesse caso, contra a repressão do Estado e da Igreja. Torna-se arriscado, então, cair nas armadilhas do contemplativo, pois este pode se reverter em consumo de conhecimento sentencioso.

Hoje, sem a inocência das primeiras leituras, aluna do programa de pós-graduação de Crítica Cultural, transitando entre os textos literários tra-dicionais e textos produzidos pelos excluídos: gay, negros, mulheres pobres, entre a beleza instituída e a literatura “menor” percebo que as concepções pautadas por uma formação tradicionalista, ao longo de anos e mais anos, precisam ser contínua e constantemente descentradas. Nesse sentido, as leituras de Sade foram fundamentais para minha formação de crítica cul-tural, pois sua contestação sádica é parte da crise da modernidade. Dessa forma, o exercício da leitura deve se tornar uma prática de ressignificação dos sentidos culturais a partir de um olhar crítico e questionador capaz de colocar em xeque ideias conservadoras que nos impede de conhecer, de fazer ciência.

PROJETOS DE iniCiação CientífiCa: IMAGENS e alGUMas refleXÕes

O texto tem como objetivo apre-sentar as imagens de projetos

e subprojetos de Iniciação Científica e algumas reflexões acerca de alguns resultados. Os projetos intitulados Letramento cultural juvenil: o que os jovens lêem fora da escola? E Nar-rativas de professores rurais: modos de leitura e suas implicações no fazer pedagógico têm como objetivo analisar memórias, biografias, narra-tivas e práticas culturais escolares construídas e rememoradas por es-tudantes e professores da educação básica da zona urbana e zona rural de Alagoinhas e região.

O projeto Letramento cultural juvenil: o que os jovens lêem fora da escola buscou dar visibilidade às práticas de letramento social e cultural realizados por jovens às margens da escola. Com isso, observamos quais os sentidos, as identidades sociais e culturais são construídas e reconstruídas a partir das diversas práticas leitoras em espaços não-escolares. A bolsista de Iniciação Científica Juliane Costa Silva (2010-2011), com subproje-to2: A leitura juvenil às margens da escola procurou investigar e identi-ficar as leituras realizadas às mar-gens da escola e que sentidos sim-bólicos e culturais são produzidos.

Os resultados do projeto de Ini-ciação Científica (2010-2011) apon-tam aspectos importantes inerentes a práxis construída no cotidiano escolar que merecem um aprofun-damento teórico, como: a) nos dis-cursos dos estudantes, a escola não tem atuado de maneira satisfatória na formação de leitores uma vez que os dados analisados nos permitem refletir sobre como o conteúdo tem sido transmitido aos discentes, haja vista que eles vivenciam uma reali-dade social distinta dos parâmetros norteadores dos conteúdos tradicio-nais, fruto de uma perspectiva de formatação do conhecimento; b) os jovens e adolescentes tem consciên-cia do papel da escola nas suas vidas como uma auxiliar na sua formação enquanto sujeito e por isso apontam as falhas nos mecanismos escolares por quererem uma escola que os formem sujeitos críticos, mas que acima de tudo construam junto com eles sua práticas e planejamentos; c) a escola é vista por muitos estudan-tes como pode ser visualizado nas falas a seguir como uma instância le-gislativa e executiva que censura de maneira velada estabelecendo o que os alunos devem ler como devem, quando, onde e o que devem ler; d) a leitura escolar tem funcionado com um ciclo de aprendizagem forçada, na qual os alunos são obrigados a ler as indicações do professor e são co-brados atividades a partir do ato de ler como um mecanismo avaliativo,

Por áurea da silva PereiraProfessora de Estágio do Curso de

Letras do CAMPUS II –UNEB

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no qual os estudantes não possuem poder de interagir no planejamento das atividades.

Visualizamos a necessidade de a escola pensar um projeto que dê visibilidade às “culturas ou vo-zes dos grupos minoritários e/ou marginalizados que não dispõem de estruturas importantes de poder costumam ser silenciadas, quando não estereotipadas ou deformadas, para anular suas possibilidades de reação” (SANTOMÉ, 1995,p.161). A urgência é por currículo que possa trazer à tona a diversidade cultural presente na sala de aula.

O projeto intitulado Narrati-vas de professores rurais: modos de leitura e suas implicações no fazer pedagógico teve como obje-tivo analisar as narrativas de vida de professores rurais, observando as trajetórias de vida associadas às aprendizagens do processo formativo docente e as práticas educativas experienciadas em sala de aula. Neste projeto, a bolsista de Iniciação Científica3 Priscila Lima de Carvalho (2011-2012), com o subprojeto Trajetórias de vida de Professores de Língua Portuguesa: entre cidade e zona rural de Po-juca, BA. E a bolsista de Iniciação Científica4 Edilange Borges de Sou-za(2011-2012), com o subprojeto Memórias narrativas de professores aposentados da zona rural da co-munidade de Quizambu, Riacho da Guia, município de Alagoinhas, BA.

Os resultados parciais do Projeto de Iniciação Científica (2011-2012) mostram que há uma desvalorização do Magistério pelos poderes públi-cos no período de 1970 a 1980, pois entendiam que para exercer a profissão não era necessário co-nhecimento aprimorado. Sabemos que conforme pesquisas o saber docente não é formado apenas da prática, mas que a práxis se nutre pelas teorias da educação. Os pro-fessores aposentados da zona rural sem formação acadêmica recriaram seus modos de exercer a docência construindo uma pedagogia baseada em seus saberes experienciais e das experiências que vivenciaram na condição de discentes.

O projeto intitulado Estágio de Letras na formação de professores de Língua Portuguesa: retratos,

imagens e registros de narrativas, portfólios e memoriais (2012-2014) pretende analisar as narrativas au-tobiográficas, memoriais e portfólios construído por estudantes/professo-res de Língua Portuguesa e Literatu-ras do Curso de Letras - Universida-de do Estado da Bahia - Campus II construído no período de estágio de Língua Portuguesa, observando as aprendizagens do processo formati-vo, a profissionalização e as práticas educativas experienciadas em sala de aula, registradas nos portfólios. A proposta de pesquisa que apre-sento neste projeto vai para além do Estágio de formação de professores, pois ao investigar os processos for-mativos dos estudantes-professores de Língua Portuguesa do Campus II, traz-se à tona, os impactos positivos e negativos da formação na Educação Básica. Assim, a partir do corpus e análise dos dados e das categorias que irão emergir no decorrer da pes-quisa poderemos visualizar os retra-tos e imagens da formação universi-tária que está sendo oferecida, bem como as suas contribuições e impac-tos nos processos de letramento e desenvolvimento intelectual.

Percebemos, portanto, que ain-da temos um longo caminho a trilhar na pesquisa, no ensino e extensão, pois é preciso conhecer, vivenciar e experienciar “o chão da escola”, para então podermos pensar e traçar projetos que possam dar visibilida-des aos protagonistas da educação – professores e estudantes. Estes são sujeitos produtores de cultura, de educação, de política e, certamen-te, de transformação social.

2. O subprojeto de Iniciação Cientí-fica financiado pelo PICIN-UNEB.

3. O subprojeto de Iniciação Cien-tifica financiado pelo FAPESB pro-curou examinar as narrativas dos professores de rurais do município de Pojuca, BA, observando como seu percurso de vida influencia na formação docente e nas práticas educativas em sala de aula.

4. O projeto de Iniciação Científica financiado pelo PICIN-UNEB analisou as narrativas de vida e formação dos professores da comunidade rural de Quizambu, distrito de Riacho da Guia, município de Alagoinhas/BA.

referênCiasSANTOMÉ, Jurgo Torres. As culturas negadas e silenciadas no currículo.In: SILVA,Tomaz Tadeu (Org.). Aliení-genas na sala de aula: uma introdu-ção aos estudos culturais em edu-cação. Petrópolis, RJ: Vozes, 1995.

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Estudos recentes apontam a necessidade de trabalhos funda-mentados na concepção histórico-cultural que consideram como ponto de partida a dimensão dialógica da linguagem. Pautada neste pensamento pode-se pensar na possibilidade de leitura e produção de textos literários como possibilidade de inclusão.

Outro ponto a ser considerado reside na construção de sen-tido dos textos que depende do repertório pessoal e varia de acordo com o lugar ocupado por cada pessoa. E, quando se trata de prática pedagógica esse lugar passa por um protocolo especí-fico e é nesse ponto que a formação intervém porque “A ativação do conhecimento prévio [...] é essencial à compreensão, pois é o conhecimento que o leitor tem sobre o assunto que lhe permite fazer as inferências necessárias para relacionar diferentes partes [...] do texto num todo coerente”. (KLEIMAN, 2004, p. 25).

Logo, uma atividade realizada em diferentes bairros de uma cidade pode ser pensada e desenvolvida na possibilidade de siste-matização de leitura e escrita partindo de conhecimentos formais, oferecendo-se oportunidades que permitam a inserção da popu-lação, de modo geral, a contextos considerados privilegiados. Por sua vez, o discurso do sistema educacional contribui, muitas vezes, para que a população acredite que não pode relatar e rever suas experiências. Por isto, os estudos regionais locais fornecem subsí-dios importantes para que repensem suas experiências e, deste modo, podem se transformar em meio à riqueza das diferenças.

Ao longo de doze anos coordenando o “Projeto Histórico-Cultu-ral: História Literária Alagoinhense” esclarece-se o desconhecimen-to da população sobre a historiografia literária do município. Este projeto de pesquisa possibilitou uma revisão no contexto literário municipal e adjacências, pois permitiram que, ao lado de pesqui-sadoras voluntárias apoiadas pelo Departamento de Educação (UNEB-CAMPUS II), em tempos iniciais e atualmente, divulgasse sua produção literária em outras cidades baianas e brasileiras por meio de participações em congressos, simpósios, seminários, mesas de debates, fóruns e exposições. Esta iniciativa fortaleceu o grupo de poetas e escritoras/es que, mesmo com as recentes iniciativas do governo do estado ainda continua sem apoio das políticas públicas locais no que se refere a publicação de livros e atividades outras que carecem de patrocínio.

De posse desse dado, em 2010 escrevemos o projeto de

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-BA Por Maria josé de oliveira santos - Professora de Literatura Brasileira

A FIGAM e os arQUivos da MEMÓRIA DE ALAGOINHAS

eliana Correia Brandão Gonçalves (Pós-Crítica/UneB) - Professora de Linguística

Nesse momento em que é considerada a ação di-reta da comunidade de Letras, é preciso lembrar da intervenção crítica, direta e incisiva da FIGAM (Fundação Iraci Gama), por meio da Professora Iraci Gama Santa Luzia, que ao longo desses 40 anos, como uma agente valorosa de formação da memória tem lutado incessantemente contra a destruição de arquivos que representam uma importante parte da memória e da história de Alagoinhas, que poderia ter ficado esquecida ou perdida no tempo.

E com uma atitude generosa e voluntária da Profa. Iraci Gama foi possível resgatar a me-mória de um passado que estava em fase de ruínas e destruição e, por sua vez, preservar cenas, imagens, relatos e espaços que tema-tizam a comunidade alagoinhense, favorecendo o conhecimento desse território, contribuindo para a sobrevivência das referências culturais locais e regionais. Essa atitude de preservação da memória representa não só uma questão do passado e do tempo, mas dos “homens no tempo” – na relação dialética presente e passa-do- na história. (RICOEUR, 2007).

A FIGAM (Fundação Iraci Gama) possui acer-vos bastante diversificados, contendo documen-tos textuais como livros, revistas, jornais, textos literários, além de documentos registrados em variados suportes como fotografias, pinturas, objetos artísticos, obras de artesanato, ferra-

mentas, peças do vestuário escolar, peças do vestuário de trabalhadores, entre outros, que refletem a história, a memória e a produção ala-goinhense.

Esses arquivos se projetam como “lem-brança de exílio e desterritorialização, polisse-mia e multiculturalidade”, articulando o local e o universal, valorizando as raízes, o discurso tido, por vezes, como minoritário, descentrando as significações e, ao mesmo tempo, acompanhan-do seus movimentos (MIRANDA, 2003, p. 39).

Por outro lado, o incentivo à produção por meio de projetos de ensino, pesquisa e extensão voltados para os acervos da FIGAM representa uma ação bastante significativa para a história do Campus II, a fim de que a vida saia desses arquivos, pois quando se é problematizada a importância dessas fontes, e, também, a forma como são construídas as pesquisas, é possível entrever a relação que é estabelecida entre os arquivos que testemunham o silêncio e a cons-trução crítica que pode ser instaurada a partir dos mesmos. Dessa forma, faz-se necessário o resgate desses documentos, a fim de que sejam compostos arquivos que reflitam a memória lite-rária e cultural, buscando o “resíduo de um saber escritural em ritmo acelerado de apagamento”; pois “salvar esses arquivos é fazer do resíduo a ponte para a fixação” (MIRANDA, 2003, p. 39).

Essas ações que se colocam contra o es-

quecimento são, também, potencializadas com a intervenção de pesquisadores do Programa de Pós-Graduação em Crítica Cultural que têm investido em escavar e garimpar esses rastros e vestígios, por meio de intervenções e proje-tos de pesquisa que dão a esses arquivos, voz, espaço e visibilidade, estreitando os vínculos entre a Universidade e à comunidade.

Entre os projetos desenvolvidos por pes-quisadores que tem como temática os arquivos da FIGAM, cito o projeto que coordeno intitulado A produção cultural do Litoral Norte e da Mi-crorregião de Alagoinhas em arquivos: escritos, linguagens e memória que tem como objetivo não só tematizar a análise do arquivo como um diagnóstico, considerando “as regiões e as zonas” por meio de produção do Território de Identidade do Agreste de Alagoinhas e Litoral Norte, mas também desenvolver um mapea-mento da produção literária de autores baianos pouco conhecidos, com o fim de catalogar e di-vulgar esses resultados aos especialistas, bem como aos demais interessados no estudo das fontes da produção literária.

No mais, o que se vê nos ‘bastidores’ não é mais ‘real’ ou ‘verdadeiro’, mas dá outras di-retrizes para o trabalho de pesquisa”. Desse modo, pode-se (re)significar os acontecimentos sociais, históricos e culturais, buscando fontes como essas para a reconstituição do “objeto” de

pesquisa, seja ele o indivíduo ou as comunidades (CASTRO, 2008, p. 54-55).

É preciso analisar as fontes documentais e as imagens construídas no território cultural alagoinhense, por meio dos signos verbais e não-verbais, localizadas nos arquivos de pro-duções literárias e culturais, de sujeitos alagoi-nhenses, presentes em jornais, revistas, livros, fotografias, escritos de si, textos jurídicos, constantes em instituições oficiais e particu-lares, bibliotecas, pesquisadores, representan-tes culturais e autores. Só assim será possível fazer o resgate da memória literária e cultural não apenas de autores, mas de uma comunida-de, restaurando as representações da cultura local e regional.

referênCiasCASTRO, Celso. Pesquisando em arquivos. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2008.MIRANDA, Wander Mello. (2003) Archivos e memória cultural. In: SOUZA, Eneida Maria de; MIRANDA, Wander Melo. (Orgs.) Arquivos literários. São Paulo: Ateliê Editorial, p. 35 - 42. RICOEUR, Paul. (2007) Memória, história e esquecimento. Trad. Alain François [et al.] Campinas: EDUNICAMP.

extensão “(Re) lendo Alagoinhas através de textos literários e informativos: revirando e revivendo memórias” iniciativa apoiada pelo Programa de Extensão da UNEB (PROEX). E, neste sentido a leitura de textos produzidos por escritoras e escritores locais pode ser um rico instrumento para repensar a realidade – a leitura de crônicas, poe-mas, romances e cordéis permite pensar na cidade, porque um texto literário aproxima de realidades antigas e atuais, norteando sobre trajetórias de ruas, rios, avenidas, igrejas e pessoas dentre outras situações e acontecimentos.

A argumentação acerca da relação entre leitura e escrita parte das experiências das (os) participantes por meio da leitura de textos literários e informativos, ocasionando prazer nos que conviveram com as imagens lite-rárias antigas e a curiosidade da juventude. Trata-se de uma atividade que conta com a colaboração da União de Associação de Moradores de Alagoinhas (UAMA) a fim de que tenham a oportunidade de enriquecer-se com cenas literárias diversificadas da cidade.

Ler e escrever enriquece desde que provoque e seja provocado pelo prazer. A leitura literária local proporciona a inserção da população alagoinhense na sua riqueza, sugerindo e suscitando fatos de um município marcado por tensões, conflitos e transformações ao longo de seus 159 anos de emancipação política.

referênCiaKLEIMAN, Ângela. Texto e leitor: aspectos cognitivos da leitura. 9. ed. São Paulo: Pontes, 2004.

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o Riacho do Mel é uma comunidade, talvez remanescente quilombola (hipótese a ser estudada), localizada a menos de um quilômetro do campus II da Universidade do Estado da Bahia, UNEB. Como pequena comunidade, e isolada à (terceira) margem

da rodovia Alagoinhas-Salvador – BR 110, pouco se tem de informações sobre este lugar simples, lugar entre lugares; não presente na grande mídia, muito menos na eletrônica. E apesar da proximidade, e até mesmo da ligação física entre o referido campus da universi-dade (reconhecido espaço formal de [re]construção de conhecimento) e o pequeno rio que nasce na comunidade de mesmo nome, Riacho do Mel, pouco se percebe de (re)reconstrução na relação entre estes dois espaços; ou dos sujeitos que neles transitam.

Por que o nome Riacho do Mel? Na voz de alguns de seus moradores, as crianças do Riacho: “Ah, tio, porque o rio é de mel, é doce!”. Mas apesar da referência, mesmo o Riacho do Mel se apresentando um ‘doce’ lugar (ao menos à sua gente), ao mesmo tempo parece ser um desses não lugares, inexistentes no imaginário coletivo; porém, lugar de gente que se encontra em outros lugares, simples, acolhedora e desconfiada, comum. Constatação derivada a partir da percepção da atenção dispensada pela maioria dos sujeitos envolvidos com a universidade, os quais todos os dias passam e veem, porém, poucos realmente enxergam o Riacho do Mel; e suas possibilidades...

Diante do que os nossos olhos não deixam de ver e enxergar e do que o coração não pode deixar de sentir, após várias passagens nas idas e vindas entre o centro da cidade e a universidade (e inquietados por este não lugar), resolvemos (sem muitos preparos) sentar debaixo da sombra de uma árvore (hábito a muito esquecido nestes tempos de ‘falta de tempo’ dos mercados globalizados...) na tarde ensolarada do dia 07 de julho de 2012, com alguns sujeitos dessa comunidade, as crianças; para com elas iniciarmos uma conversa sincera (como só elas conseguem por muito tempo manter), a fim de entender um pouco sobre os modos de vida deste local ao qual a universidade fica à margem (a partir da perspectiva delas), em resumo: um diagnóstico discursivo.

A escolha destes grandes pequeninos sujeitos deu-se por conta do fato de que apenas elas e eles, possuem o doutoramento no letramento da felicidade (e sinceridade); além de seu potencial transformador enquanto sujeitos em constante constituição inseridos em sua pequena comunidade. Dizemos constituição para salientar a noção de movimento, de processo, referente tanto à ideia de sujeito social mencionada por Moita Lopes, quanto ao entendimento de letramento emancipatório crítico, proposto por Magda Soares. E estes, por sua vez, dialogam com a noção de rizoma proposta por Deleuze e Guattari, na qual letrar se torna um agenciamento às necessidades de aprendizagem daquilo que se trata como diferente do que é socialmente privilegiado pelas classes dominantes e um combate das relações de dominação através de muitas e distintas linhas de fuga. Necessidades de nosso tempo globalizado, que a partir de seus referenciais homogeneizantes tentam negar todos os conceitos anteriormente apresentados.

Neste contexto, as dominações se dão, contrariamente, pela via do carinho através dos sorrisos de quem sente a falta de um campo de futebol para viver ainda mais feliz no Riacho do Mel, “Só falta um campo de futebol, tia, o que tem é muito longe!”, mesmo com as tantas adversidades que nós, gente que passeia pelos “bancos da academia”, pode reconhecer pelo mínino de entendimento do que são condições básicas de sobrevivência.

A partir do que vimos, enxergamos e sentimos, percebemos que o Riacho do Mel, repre-sentado por sua juventude, assim como outros espaços constituídos por sujeitos relegados ao esquecimento, muito tem a nos oferecer: Letras de Vida, Letramentos de Felicidade e Literaturas de Modos de Vida; estes suficientes inclusive, a transbordar qualquer espirito que lá se disponha desarmado; e eles podem e desejam muito mais. Mas também (como qualquer comunidade digna de atenção), precisam das Letras, Letramentos e Literaturas as quais a universidade, representada por outra juventude (não muito diferente da de lá), numa relação dialógica pode oferecer.

O que entendemos é que o doce letramento da felicidade (realizado pelas e para as crianças do Riacho do Mel) pode ser uma via de escape das certezas e das determinações. O movimento do aprender na perspectiva destas crianças abrange o espaço entre o saber e o não saber, onde a aprendizagem se configura como o espaço que se percorre na resolução de problemas diversos e os caminhos que se pode escolher são incontáveis. No mundo dos adultos, não há problema que não se dissolva com um abraço e a pergunta “Tia, é daqui a 15 dias de novo, né?”. Certamente, não sabemos até onde vamos chegar com estes encontros com os erês do Riacho do Mel, mas estamos certa e certo de que no mesmo lugar, não conseguimos mais não estar, e daqui a poucos dias, debaixo daquela mesmo árvore estaremos todas e todos sentados em círculo, para conver-sar, desenhar e sermos letrados (e tentar letrar) a partir da doçura do universo infantil. Diante da pergunta “Vamos ganhar presente?”, respondemos: “Presenteados fomos nós!”. Mas do que pipoca e refrigerante, tintas e papeis, elas desejam relações onde afetividade e curiosidade se misture, em equilíbrio com os tons que naturalmente elas trazem dentro de si, e nós adultos por vezes esquecemos; diferente de nós, ela não querem nem pão, nem circo, apenas sinceridade.

referênCias - DELEUZE, Gilles & GUATTARI, Félix. Mil platôs: Capitalismo e esquizofrenia. São Paulo, Ed. 34. 1997.LOPES, Luiz Paulo da Moita. Identidades fragmentadas: a construção discursiva de raça, gênero e sexualidade em sala de aula. Campinas, SP: Mercado das Letras, 2002. (Coleção Letramento, Educação e Sociedade).SOARES, Magda. Linguagem e escola: uma perspectiva social. São Paulo, Ática, 1980.

Para compreendermos a dinamicidade que envolve a epistemologia do “verbo” e sua materiali-dade, é necessário nos debruçarmos diante de algumas implicações teóricas que englobam o seu uso enquanto representação cultural. Assim, é importante situar a nossa reflexão para o contexto da produção de seus sentidos, inicialmente com a cosmogonia grega, cuja ênfase, se constituía na ansiosa busca por respostas universais sobre a questão do archê como princípio de todas as coisas.

Nessa especulação de motivos, a mitologia grega desenvolvia a produção conceptual de que o arché representava a gênese em relação ao que antecede no tempo; contudo, para os pré-socráticos, recebia a atribuição de constitutivo de todas as coisas. Com essa conformidade, o filósofo Heráclito (século VI a.C.) mesmo ao desenvolver a teoria e significação do devir, como processo incessante de transformação, não se desprendeu da ideia de regulação desse constan-te movimento da existência com base na origem e na causalidade dos acontecimentos, o que para ele estava representado pelo fogo.

Diante desses caminhos constituintes da concepção da origem (arqué), o verbo (logos), entra também na cena da discussão da filosofia grega, sob a égide do pensamento de Heráclito. Para este filósofo, o logos se configura como agente regulador, causador da ordem e da harmonia universal o qual está intrinsecamente existenciado nas coisas; segundo Heráclito, sem o logos não se consegue estabelecer a harmonização do devir.

Supostamente, a teologia “joanina” bebe da fonte helenista ao desenvolver sua abordagem teológica diferentemente dos demais escritores dos documentos bíblicos neo-testamentários denominados de evangelhos sinóticos. O escritor João ao escrever seus registros acerca da ori-gem de Jesus, o Cristo, aponta enfaticamente não para a sua historicidade com base biográfica na árvore genealógica, mas, para a sua existência na eternidade e precisamente na posição de “o verbo eternizado” agente intrínseco e regulador da criação que se materializa, se faz carne e habita no meio de nós. Isto, o diferencia dos demais evangelistas, Mateus, Marcos e Lucas que narram para as suas comunidades a ênfase do Jesus histórico, que atuou nas comunidades da palestina demarcando o seu espaço discursivo de subvertor das ordens preconceituosas da metafísica religiosa judaica.

A construção da noção de verbo (palavra, logos), já traz dentro da lógica grega os sinais de um olhar metafísico que se sobrepõe ao movimento do signo. Ao mesmo tempo, em que Heráclito reconhece a importância do devir na constância do movimento, na itinerância dos acontecimentos, ele se volta para a necessidade de aprisionar, regular e harmonizar e fundar a moral diretamente com o logos. Por esta ordem, a subjugação das forças de existência se dá pelo agenciamento da palavra (logos), que assume a condição de cerceador dos intrínseco dos acontecimentos, razão que justifica a sua materialidade.

A partir da compreensão da metafísica ocidental, a palavra (logos) ganha um sentido ar-bitrário divinizado e moralístico, que se interpõe aos processos de liberdade dos movimentos existenciais, enfatizando as antinomias entre a “verdade” enquanto condição de ascendência e “prazer” como emblema de descendência.

No contraponto desse discurso da verdade, é necessário que a interpretação da materiali-dade do logos seja desfigurada de sua potência divina; desse modo, a sua proposta de encar-nação, deve coadunar indissociavelmente com o campo dos desejos sociais e existenciais. Isto representa uma intervenção materializada de vigoramento e realização de novas possibilidades, cuja ação, consiste em deslocar e inverter as posições essencializadas e instituídas em sua veracidade.

O pensamento do pós-estruturalista Jacques Derrida, na sua obra Posições (2001), vem corroborar com esse processo desconstrutivo e com ele insurge a contestação ao aprisionamen-to dos signos. Concomitante a isto, reconhece na gramatologia a importância da escritura como uma estratégia de abalar e substituir as oposições binárias, bem como, o descentramento do logocentrismo e do fonocentrismo.

Assim, com base no pensamento desconstrutivo de Derridá, inferimos que aprisionamento do devir ao domínio do logos a partir de sua relação com o arché, deve ser desconstruído. Sob esta perspectiva derridiana, declaramos que nem o “logos e nem o arché” (Nem Deus, nem o fogo) deve estagnar na sua materialidade o movimento das existências (o devir).

Diante disso, nesse movimento constante dos estudos em crítica cultural, o investigador mobilizado de inquietações deve valorizar, nas atividades dos espaços em pesquisas culturais e sociais, uma metodologia que não mais se pauta no desejo fixo da verdade da palavra, nem muito menos no deciframento da gênese, cuja materialidade se decodifica como um sentido na-tural e incontestável. Em suma, sem a conquista linguístico-literário da arbitrariedade do signo, como potência das letras, e da semiologia da daí derivada, não teríamos Derrida, nem a cultura da desconstrução do verbo encarnado.

as iMPliCaçÕes da MATERIALIDADE enCarnada da Palavra (LOGOS)

vanderly vitoriano de oliveiraMestrando em Crítica Cultural

Por UM doCe letraMento: PossiBilidades (d)Às Crianças do riaCho do Mel

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“No princípio era o verbo (...). E o verbo se fez carne e entre nós”... (Jó. 1.1a, 14a)

Por dayse sacramento (Mestranda em Crítica Cultural/ UNEB) ejackson de jesus (Graduando em Letras – Francês e suas

Literaturas – UNEB – Campus II)

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Por UM doCe letraMento: PossiBilidades (d)Às Crianças do riaCho do Mel

A história dos cursos de Letras da UNEB-Campus II tem muitas

fases e retratos diversos, conforme as perspectivas lançadas sobre sua textualidade. Sei bem pelos registros de pesquisa da Profa. Iraci Gama da importância de quando esta ainda era a Faculdade de Formação de Pro-fessores, a chamada FFPA, inclusive no fomento à atividade cultural da cidade. Entretanto, meu foco, ou meu relato desta história, será lançado sobre um período que se inicia há dez anos até os dias de hoje. Período justamente em que ingressei como professora neste curso do Departa-mento de Educação da UNEB de Ala-goinhas e que comecei a fazer parte desta narrativa, como personagem e também como autora.

Assim, com o olhar que percorre este tempo demarcado, posso dizer que a pesquisa e a extensão nos cursos de Letras, no campus II da UNEB, têm sido revertidas em diversas atividades, contribuindo com uma nova pers-pectiva de ensino e do próprio cur-so junto à comunidade científica e externa da UNEB.

Os Seminários do Núcleo de Estudos da Subalternidade (NUES) são um exemplo dessa imagem promissora que foi e está sendo tecida para os cursos de Letras. Com estes, iniciados em 2001 e realizados, em média, uma vez a cada dois meses, foi se construin-do um ambiente mais científico, articulando pesquisa e extensão, em sua inter-relação com o ensi-no. Estes Seminários congregavam professores de outras instituições e da comunidade como um todo, entretanto sua marca inicial foi congregar principalmente os pro-fessores de Letras em inter-relação com professores de outros cursos e os pesquisadores discentes, bolsistas e voluntários, que come-çavam a ganhar a cena neste con-texto acadêmico do campus II e, de alguma forma, em toda a UNEB, visto que a pesquisa institucionali-zada e apoiada, com jornadas cien-tíficas, por exemplo, é um fato que teve seu início não muito distante desta época em que o NUES ani-mava cientificamente o campus II.

Prova dessa animação e insti-tucionalização da pesquisa, articu-lada à extensão, é o crescimento do Núcleo de Ensino, Pesquisa e Exten-são do campus II, que passou a ter existência de fato ou renovada, com funcionários, expediente etc., gra-ças a essa animação iniciada ou re-engendrada pelos cursos de Letras, através da realização dos Seminá-rios do NUES, disseminando perio-dicamente resultados de pesquisa, debatendo questões locais e cien-tíficas, criando um outro cotidiano, para além de uma noção de aula e expandindo o senso de pesquisa e extensão que foi alocado em polos opostos desvinculando suas possi-bilidades de junção. Podemos dizer que estes seminários marcam o início do desenvolvimento da Inicia-ção Científica (IC) do Campus II, pois com eles começamos a participar dos primeiros editais, inclusive lis-tando um número de pesquisadores voluntários discentes, de modo que se ampliasse o número de bolsas para uma demanda que estávamos inventando-construindo. E esta demanda cresceu de tal forma que

hoje podemos dizer que somos des-taque, proporcionalmente falando, em Iniciação Científica junto aos campi da UNEB. A Iniciação Científica, inclusive, foi a base para construirmos o Mes-trado em Crítica Cultural que temos na área de Letras, em nosso campus II. Primeiro e único programa de Pós-gra-duação stricto sensu funcionando ex-clusivamente nesta unidade da UNEB.

Foi a partir desta base que outros eventos e atividades foram criados ou multiplicados, como os Se-minários Interdisciplinares de Letras, que eram realizados semestralmente, hoje anualmente, articulando as pes-quisas de Trabalho de Conclusão de Curso (TCC), de IC e as outras refle-xões e trabalhos feitos no âmbito do ensino propriamente dito. A extensão da UNEB se configurava como uma socialização entre nós e entre os ou-tros. Se com os Seminários do NUES também íamos realizando atividades nas praças, em salões de associa-ções, nos centros culturais e artís-ticos de Alagoinhas e outras cidades da região etc., ou seja, para além dos muros da sala de aula, da universi-dade, com os Seminários Interdiscipli-nares firmamos nosso compromisso com o ensino médio e fundamental, através de encontros regulares com as escolas, ou seja, ouvindo, discutin-do, socializando pesquisas, buscando intervir em uma realidade educa-cional-cultural, juntamente com os professores e estudantes, renovando este intercâmbio.

Nessa linha, de buscar sempre a inter-relação entre comunidade interna e externa à UNEB, várias outras ativi-dades foram e estão sendo realizadas como: cursos de contação de estórias, de alfabetização de adultos, de for-mação de agentes culturais, sobre o ensino de línguas, inclusive estrangei-ras, de políticas públicas em diversos campos articulados a Letras, artes e lingüística; cursos de língua, inclusive como instrumental; encontros para (auto)avaliação dos cursos de letras; colóquios sobre prática pedagógica, sobre Literatura e identidades cultu-rais microrregionais, sobre Modos de produção e circulação cultural, Semi-nários sobre leituras, sobre Literatura popular e oralidades, sobre a questão étnico-racial e os estudos de gênero e de sexualidades; atividades como ca-minhadas, saraus, rodas de conversas, visitas, atos estético-culturais, fóruns de crítica cultural e de línguas etc.

Muitos desses eventos, como uma expressão de tudo o que já ci-tamos, ou seja, de tudo que estamos construindo nos proporcionaram um nível de amadurecimento cientifico para, como já dissemos, criarmos o Mestrado. Com ele, inclusive, já re-alizamos várias dessas atividades,

sofisticando e enriquecendo o nível de intervenção e interlocução. Como alguns exemplos, citamos os Seminá-rios interdisciplinares em consonância com semanas de início de aulas do Mestrado, Observatórios de Letras ar-ticulando graduação e Pós-graduação em inícios de semestres, o projeto Le-tras multicultural que articula o está-gio e tirocínio docente junto à gradu-ação, abrindo, em certo grau, para a extensão e o Fórum de Crítica Cultural que tem sido nosso grande evento, no que diz respeito a intervenções e conexões. Os registros que refletem estes outros passos têm sido feitos, através de diversas publicações, que, a partir dessa nova conjuntura, têm se avolumado, têm ganhado lugar em nossa agenda científica. Uma prova desse caminhar resultante deste pro-cesso, bem como criador de outros produtos ou conquistas é a revista Pontos de Interrogação, uma publica-ção semestral do Mestrado em Crítica cultural, que, já na sua terceira edi-ção, recebeu uma média de cinquenta textos de diversos pesquisadores, entre eles doutores e doutorandos, de várias instituições do país.

Assim, os passos têm sido dados nos apontando uma solidificação e (re)sistematização acadêmica, na esfera de um amadurecimento crítico-científico--cultural que tem nos permitido já pen-sar na possibilidade de um doutorado, apesar das dificuldades estruturais, apesar de sabermos que muito mais podemos e devemos fazer, apesar, enfim, do descompasso entre os que lutam para criar uma realidade e os que se submetem, apesar das queixas, a uma realidade que busca o tempo todo estrangular nosso potencial sub-jetivo cultural transformador. Para mim, portanto, estes 40 anos dos cursos de Letras, aqui recortados em dez, revelam este salto criativo, frente às pedras que se fazem presentes no caminho.

MOREIRA, Jailma dos Santos Pedreira. Crítica cultural, campo de trabalho, trabalho de campo: propostas para um novo profissional das letras. In. Jornal Heterotopia, vol 1, dez/2009. MOREIRA, Jailma dos Santos Pedreira. Mestrado em Crítica cultural: por uma diferença que faça a diferença. In. Jor-nal Heterotopia, vol 3, N. 2, set/2011. MOREIRA, Jailma dos Santos Pedreira; COSTA, Edil Silva; PEREIRA, Áurea da Silva; BASTOS, Pérola Cunha e SILVA, Elizabete Bastos. Seminários Inter-disciplinares de Letras: Ensino, pes-quisa e extensão integrados, (des)construindo práticas no campus II. In. Anais do Colóquio Práticas Peda-gógicas inovadoras na UNEB. Salvador: UNEB, 2011.www.nuescampus2.uneb.br. Acesso em 10 de junho de 2012.

Cursos de Letras da Uneb-Campus II: um salto a partir da pesquisa e extensão

LITHOSILVA

AA

Nasce a esperança de um lugar no mundo da pós-graduação stricto sensu a partir da possi-bilidade de ser aluna especial do Pós-Crítica na cidade de Alagoinhas-BA. Esperança? Claro!!! Gra-duada em Letras pela UFCG - Universidade Federal de Campina Grande – e morando em Pernambuco, teria que percorrer mais de 500 km de Petrolina--PE a Alagoinhas-BA toda semana para assistir às aulas. Assim, ingressei como aluna especial des-se campus e percebo que tal fase foi muito rele-vante para a minha inserção como aluna regular deste Programa de Mestrado. Distante? Em rela-ção à geografia, sim! No entanto, tão próximo da minha linha de desejo: o lugar do pesquisador/a, do observador/a, do/a crítico cultural.

Mais uma vez o mundo das letras, de acordo com Derrida, me faz virar e revirar os significados fixados pela situação metodológica de um pen-sar arbitrário, de significados transcendentais, naturalizados como eternos. É tempo de Pós--Crítica... “Nada do que foi será de novo do jeito que já foi um dia...” É assim que diz a canção... e é assim que eu me sinto hoje enquanto mes-tranda em Crítica Cultural. As novas roupagens, as construções e/ou reconstruções dos saberes trazidos comigo permeiam os novos desafios que me acompanharão nesta nova situação contex-tual. Que olhar deve ter o crítico cultural no seu ambiente de pesquisa?

Isso ardia na cabeça, já que como aluna da UFCG, quase tudo foi novidade para o meu mundo intelectual. Leituras como as de Deleuze, Guatar-ri, Lukács, Homi Bhabha, Benjamim, Derrida, den-tre outros, me fizeram olhar mais criticamente para as minhas “verdades” tão bem arrumadas e guardadas na minha bagagem. Comecei perceber a reviravolta do pensamento que este novo con-texto estava a me proporcionando. Aprendi que a diferença que faz diferença é aquela gerada a partir do desejo, quando se toma posições, quan-do se questiona e/ou desconfia.

Agora as cenas são nossas companheiras. No exercício das séries configuradas aos dados, entremeiam-se as desconstruções do “pronto e acabado”. Rizomaticamente falando, esvaziar a casa faz-se necessário para, assim, pensar, in-ventar, reinventar as múltiplas possibilidades de pensamento. A crítica cultural reinventa nosso modo de pensar, e, dessa forma, coloca-nos em movimento, movimento primeiro do pensamento como abordava o nosso querido professor Dr. Os-mar Moreira em suas aulas de Metodologia da

Pesquisa em Crítica Cultural. Ser um pensador do serial é papel do crítico cultural.

Nesta direção, compreendo o Pós-Crítica como um facilitador das múltiplas possibilidades para que o Curso de Letras da Uneb campus II continue avançando e repensando o fazer dos graduandos em relação ao contexto libertário e multicultural de mestrado.

Cá estou eu com as minhas indagações. In-clusa na Linha 2: Letramento, Identidades e For-mação de Professores, venho adentrando com a minha “máquina revolucionária” neste espaço do múltiplo, do dito e interdito, do montar e des-montar de textos, fascinada pela teoria de Deleu-ze em que o sujeito sempre está em construção, logo inicia-se o rompimento com as representa-ções fixas pelo homem, “nem isso, nem aquilo... é uma outra coisa”, é uma outra perspectiva na potência do criar.

Por ser o homem um ser de linguagem, en-tendo que diversas são as formas de representar as estruturas subjetivas do sentido. Seja através da música, da dança, da poesia, da literatura, as letras constituem muitos espaços entre nós. É assim que parabenizo o Curso de Letras da UNEB Campus II pelos seus quarenta anos de existên-cia e pertinência relembrando a canção do Ivan Lins que diz “No novo tempo, apesar dos perigos/Da força mais bruta, da noite que assusta, esta-mos na luta/ Pra sobreviver, pra sobreviver, pra sobreviver/Pra que nossa esperança seja mais que a vingança/Seja sempre um caminho que se deixa de herança. No novo tempo, apesar dos castigos/ De toda fadiga, de toda injustiça, esta-mos na briga/ Pra nos socorrer, pra nos socorrer, pra nos socorrer...”

referênCiaDELEUZE, Gilles; GUATARRI, Felix. Rizoma. In: Mil Platôs – capitalismo e esquizofrenia, tradução de Aurélio e Celia Pinto Costa, Rio de Janeiro: Ed 34.1995DERRIDA, Jacques. Posições. Trad. Tomaz Tadeu e Silva. Belo Horizonte: Autêntica, 2001.SANTOS, Jaci Leal Pereira dos. Crítica Cultural em Cordel. Heterotopia: reparações. Ano 3, número 3, set/2011. p.1.

O MOVIMENTODAS LETRAS...NO REPENSAR INTELECTUAL

Por Katia Maria rodrigues Gomes Mestranda em Crítica Cultural - UNEB - CAMPUS II - Alagoinhas-BA

jailma dos santos Pedreira Moreira (Pós-Crítica/UneB) - Professora de Literatura

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angela Carla de farias(mestranda em Crítica Cultural/UNEB bolsista/CAPES)

sempre busquei compre-ender a condição

do ser mulher na sociedade brasilei-ra, entender de onde advém e como se dá a divisão dos papéis sociais masculinos e femininos construí-dos historicamente e atravessados pela cultura, percebi o quanto ainda precisa ser percorrido e pesquisado para que se possa desvendar as relações de gênero no tempo e no espaço, no entanto o Mestrado em Crítica cultural embora multidiscipli-nar está na área de concentração do curso de graduação em Letras que entre tantos desafios completa este ano quatro décadas de exis-tência/resistência e representa nas suas propostas e linhas de pesqui-sa uma excelente oportunidade de desvendar os discursos histórico culturalmente produzidos sobre as mulheres localizando suas consequ-ências para a condição subalterna da mulher na contemporaneidade e o porque da permanência de certos fenômenos como a violência contra

o Pós-CrítiCa sitiando os disCUrsos ProdUZidos CULTURALMENTE soBre as MULHERES

a mulher principalmente quando esta culmina em femicídio (SAFFIOTI, 2004).

Falo em femicídio também como um contra discurso a hete-ronormatividade da língua portu-guesa e da nossa cultura patriarcal que sempre remete os fenômenos ao masculino sem flexionar o gê-nero, assim buscar esvaziar o sig-no e analisar os discursos cultu-ralmente produzidos sobre o que é ser homem e o que é ser mulher representa uma importante caixa de ferramentas teórico metodoló-gica para desconstruir a máquina machista engendrada pelas diver-sas instituições sociais: igrejas, mídia, judiciário, escola, enfim o Estado.

Vale ressaltar que a Igreja Católica no apogeu da Idade Média produziu e patrocinou discursos depreciativos sobre as mulheres que ecoaram ferozmente no Oci-dente e influenciaram a literatura ocidental desde a literatura mé-dica até a jurídica como também as formas de se pensar sobre “o que eram as mulheres e os seus devidos lugares”, analisar esses

discursos ladeados por poderes institucionais localizando suas abrangências, incongruências, re-sistências e permanências no coti-diano desmontando-os através das teorias metodológicas fornecidas pela crítica cultural é oportunizar outras formas de pensar e propor políticas de enfrentamento da vio-lência contra a mulher.

Recentemente assisti a um programa de um importante e in-fluente canal de televisão aberto que comparava uma personagem

de uma novela de horário nobre a um animal, no caso a uma “pi-ranha” simplesmente por esta ser uma mulher sexualmente ativa que declarava abertamente se relacionar com vários parceiros, o interessante é que o referido programa dedicou cerca de uma hora a essas analogias ridiculari-zadoras fazendo correlações entre a personagem da novela e o animal devorador de carne, o interessante é que esse tipo de situação nun-ca é feita com homens na mesma

condição, isso nos leva a refletir o quanto a mídia que também é considerada como o quarto poder principalmente em uma país pobre como o Brasil com pouquíssimas possibilidade de acesso a bens culturais diversos em que as pes-soas passam em média quatro ho-ras por dia em frente a televisão, forma estereótipos sobre como devem ser os comportamentos e atributos de homens e mulheres.

Alguns dados sobre as mulhe-res valem a pena ser ressaltados, o femicídio, ou seja, o assassina-to de mulheres aparece como a terceira principal causa da morte de mulheres na região nordeste e sudeste (MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2002, on-line), e é comedido em 70% dos casos por companheiros, namorados ou ex, sendo o ciúme considerado como a principal cau-sa, de acordo com os cadernos de Saúde Pública 19% dos anos perdidos por morte ou incapaci-dade física de mulheres em idade produtiva se deve a violência de gênero (HEISE, 1994, on-line), a cada oito segundos uma mulher é espancada (Fundação Perseu Abra-mo). O número de mulheres assas-sinas é infinitamente menor que o de homens assassinos, mas quais seriam as questões que envolvem os crimes movidos por ciúme, os denominados crimes passionais? Haveria uma relação entre esses

femicídios e os papéis sócio cul-turais designados as mulheres? Para responder essas questões a análise do discurso se apresenta como uma importante ferramenta investigativa.

Como nos lembra Foucault (2010) sobre os discursos ins-titucionalizados: “a instituição responde (...) o discurso está na ordem das leis; que a muito tem-po se cuida da sua aparição; que lhe foi preparado um lugar que o honra mas o desarma; e que, se ocorre ter algum poder, é de nós, que ele lhe advém’’.

referênCiasFOUCAULT, Michel. A ordem do Discurso: aula inaugural no Collè-ge de France, pronunciada em 2 de dezembro de 1970. Trad. Laura Fraga de Almeida Sampaio. São Paulo: Loyola, 2010.HEISE, L., 1994. Violência e gênero: Uma epidemia global. Cadernos de Saúde Pública. Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/sausoc/v9n1-2/02.pdf. Acesso em: 20 mar de 2012.MINISTÉRIO DA SAÚDE. Disponível em: http://portal.saude.gov.br/portal/arquivos/pdf/coletiva_sau-de_061008.pdf. Acesso em 20 de mar de 2012. SAFFIOTI, Heleieth I. B. Gênero, patriarcado, Violência. São Paulo: Fundação Perseu Abramo, 2004.

Pensar o curso de Letras Vernáculas para mim não é uma das tarefas mais difíceis; primeiro, porque sou egressa do curso de Letras Vernácula da UNEB – campus II/Alagoinhas; depois porque sou aluna regular do Mestrado em Crítica Cultural – Campus II e, por fim, porque minha pesquisa discute a atuação da UNEB na formação de professores/a de língua portuguesa e literatura.

Mas, neste momento me limitarei a relatar a importância dos/as pro-fessores/as dessas instituição pública de ensino superior na trajetória de uma menina criada no interior que sai da graduação para o mestrado, sem se permitir abandonar o “rótulo” de estudante unebiana.

Ingressei na UNEB- Campus II no ano de 2006, no curso Letras Ver-náculas, mas, como grande parte dos/as ingressantes de cursos de li-cenciaturas, ser professora não era o meu sonho; contudo, o curso de Letras acabou me conquistando, sobretudo por conta da atuação dos/as professores/as que fizeram-me acreditar que esta é uma das profissões mais importantes que existe.

Durante o curso fui compreendendo a responsabilidade de ser for-mada em Letras, e a importância da pesquisa para esta formação e para a minha atuação profissional, a medida que entendia a escola como um espaço de multiplicidade identitária, e, portanto, não passível de aplica-ção de fórmulas e manuais de ensino.

E, a partir dessa compreensão de sala de aula, fruto, sobretudo, das aulas e experiências de estágios sob orientação/supervisão da profes-sora Áurea, que aceitei a sugestão do professor Osmar Moreira, naquele momento, um dos maiores fomentadores de pesquisa do curso de Letras, em tornar-me uma pesquisadora de Iniciação científica, já que a essa época já estava dialogando com a professora Maria Nazaré, minha orien-tadora de monografia.

Os diálogos com a professora Nazaré me fizeram ter certeza da im-

portância do/a professor/a e da discussão étnico-racial na cons-trução de uma sociedade justa e igualitária, discussão que fez de mim, a princípio, uma pesquisadora de Iniciação científica, e, logo no ano seguinte, uma pesquisadora mestranda do Crítica Cultural.

Foi no campus II que aprendi a entender como atuação do/a professor/a é fundamental para que consigamos construir a sociedade que de-sejamos, e, hoje, como mestranda em Crítica Cultural, aluna desse campus, defendo a im-portância do compromisso das instituições de ensino superior na formação de professores/as capazes de lidar com as demandas que emergem com a diversidade racial.

Claro que o meu posicionamento quanto à formação de professores/as está relacio-nado ao fato de a revisão bibliográfica que movimento apontar para isso, mas, não é só isso; foram os meus/minhas professores/as da graduação que me ajudaram, ou me-lhor, me ensinaram a entender o papel do/a professor/a, e principalmente do/a licenciado/a em Letras na sociedade. Foram as contribuições deles/as que fizeram de mim uma profissional habilitada a trabalhar com as Letras, e porque não dizer que foram eles/as que me fizeram descobrir o quanto o ser professora é capaz de me realizar como ser humano.

EU, P r o f e s s o r a ?tássia fernanda de oliveira silva

(Mestranda em Crítica Cultural, bolsista FAPESB/UNEB)

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Talvez eu devesse ser impessoal na escrita de um texto cuja proposta é mostrar a contribuição das letras enquan-to ciência e ação direta, porém não posso falar sobre isso sem antes fazer uma retrospectiva de minha experiência nessa área.

Não fiz minha graduação na UNEB. Como morava em Salvador e precisava trabalhar, a solução foi estudar numa universidade particular. Isso nos anos oitenta do século passado. Meu sonho era me tornar uma pesquisadora, principalmente porque li num daqueles manuais de testes vocacionais que o curso de letras me permitiria dominar várias línguas. Imaginei como seria maravilhosa minha vida: A universidade ia me oferecer o aporte teórico e prático para que eu viajasse mundo afora, analisando textos lite-rários em várias línguas e também me levasse a descobrir a língua que deu origem a todas as outras. Já estava me vendo citada nos livros didáticos.

Triste engano o meu. Para começar, a universidade na qual fui estudar, só oferecia licenciatura. A estrutura era tão ou mais precária que a que hoje temos na UNEB. Os professores, salvo poucas exceções, eram medíocres. Encontrei-me numa situação conflitante, o curso não ofe-recia nem uma boa bibliografia. Essa se constituía de três teóricos básicos para a literatura: Alfredo Bosi, Antônio Cândido e Massaud Moisés. Para a linguística: John Lyons. Quanto aos escritores de ficção, estudei apenas José de Alencar e João Cabral de Melo Neto. Porém, como já estava lá, terminei o curso.

Saí de lá tão medíocre quanto o curso. Contudo com uma ânsia de aprender tão grande que comecei a fazer leituras caóticas que, se não foram de toda inúteis, também não ajudaram muito a me situar como um ser crítico e ter per-

cepção da importância das letras como ciência e ação direta. O que veio operar alguma transformação em mim foi um curso de especialização que fiz, anos mais tarde, na UNEB - Alagoinhas e que me permitiu uma atuação mais crítica.

Apesar de alguns poucos professores bem-intencio-nados que lutam para mudar essa estrutura perversa, ainda estamos distantes de ter um curso de letras, com objetivos claros e currículo que atenda às novas demandas

exigidas pela sociedade. A maioria das instituições onde é oferecido o curso

de Letras, além da penúria na estrutura física que torna o ambiente inapropriado para a “festa do pensamento” (não tem o básico, como biblioteca, salas arejadas, recursos das novas tecnologias, etc.,), ainda vivem uma crise de identidade.

Poucas são as instituições que oferecem o curso de Letras com o bacharelado. Quase todas são para formar professores e isso pressupõe contribuir para formar seres capazes de pensar as letras como ciência e produzir saberes e transformações junto à sociedade. Pensar as letras como instrumento de poder tanto de libertação, quanto de opressão. Infelizmente isso não acontece, pois esses cursos vivem no entre-lugar: Não sabem se formam professores, pois não os instrumentalizam para uma sala de aula, nem sabem se formam bacharéis, pois não existem condições financeiras e nem estrutura física para formar pesquisadores.

Porém, para além da precariedade das instalações, há a precariedade da formação do profissional. Qual será o papel das faculdades que dão formação no campo das letras? Formar professores? Formar pesquisadores? Ou uma coisa não exclui a outra e, portanto, elas têm a obrigação de fazer as duas coisas com qualidade?

Num país onde não há um projeto de desenvolvimento que beneficie a todos, onde instituições acadêmicas ficam a mercê de interesses políticos, em que o conhecimento não é visto como essencial porque pode afetar o interesse do capi-tal, só mesmo a vontade e a determinação de alguns podem nos salvar da preguiça e da mediocridade que atingem os cursos de letras, principalmente no Nordeste.

ieda leones nascimento - Mestranda em Crítica Cultural/UNEB - Alagoinhas

CRISE DE IDENTIDADEdos CUrsos de letras

o CUrso de LETRAS VERNÁCULAS: novos aGenCiaMentos CRÍTICOS CULTURAIS

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Se somos livres de coração, não haverá correntes feitas pelo homem com força suficiente para sujeitar-nos. Mas, se a men-te do oprimido é manipulada (...) até o ponto dele se consi-derar inferior, não será capaz de fazer nada para enfrentar o seu opressor.

steve Biko

O curso de Letras Vernáculas, em minha vida, é mais que uma escolha profissional, é uma escolha

por uma vida mais crítica e culturalmente mais ativa. No momen-to em que tomei a decisão de atuar como educadora encontrei, no campo das Letras, um caminho permeado de desafios que me trouxeram inúmeras conquistas positivas e aprendizados que me fizeram uma mulher mais forte e feliz!

Encarando o curso de Letras como uma maquinaria revolucio-nária do campo do saber, entendo que, nós profissionais da área de Letras, temos, em nossas mãos, a possibilidade de agenciar-mos novas e outras vozes, engendrando, desta forma, a ruptura com as ações hegemônicas e ditatoriais que (ainda) circundam a sociedade. Esta compreensão tornou-se mais intensa, para mim, quando inicie minha caminhada nos trilhos do mestrado em Crítica Cultural, porquanto foi neste espaço libertário que fortaleci (ainda mais) a minha base epistemológica e as minhas identidades como educadora e pesquisadora da área de Letras, Linguística e Artes.

Michel Foucault (2010) nos aponta que os discursos sociais são controlados por formas de poder e de repressão. Ademais, estes discursos são marcados pela busca incessante do desejo por um controle da fala e, consequentemente, da ação do outro. O autor supramencionado acrescenta que "por mais que o discurso seja aparentemente bem pouca coisa, as interdições que o atin-gem revelam logo, rapidamente, sua ligação com o desejo e com o poder" (FOUCAULT, 2010, p.10).

Assim, com base nas palavras foucaultianas, o meu objetivo maior, como mestranda do Programa de Pós- Graduação em Crítica

Cultural, é que o desejo que tenhamos, como profissionais da área de Letras, seja o de não mais representar o outro (marginalizado), mas sim deixá-lo falar e, mormente escutá-lo e nos escutarmos também, visto a nossa condição secular de marginalizados/mi-norizados.

Na esteira de Foucault (2010), dialogamos com Spivak (2010), nos alertando para a necessidade de não fortalecermos as formas de repressão aplicadas aos sujeitos subalternos. Para a autora, a postura mais crítica, consciente e persistente que podemos (e devemos) ter é “tentar revelar e conhecer o discurso do Outro da sociedade” (SPIVAK, 2010, p. 22), desta maneira, engendraremos novos espaços revolucionários e libertários em prol de uma socie-dade que visa mais a equidade entre os sujeitos.

É com este espirito critico cultural que intento continuar a minha caminhada por Letras, (re)afirmando a importância da pos-tura crítica e ideológica do profissional desta área, uma vez que somos multiplicadores rizomáticos do conhecimento em busca de novas linhas de fuga e de produção cognoscente para a descons-trução/ destruição da dicotomia opressor X oprimido.

referênCiasFOUCALT, Michel. A ordem do discurso. Aula inaugural no College de France, pronunciada em 2 de dezembro de 1970. Trad.: Laura Fraga de Almeida Sampaio. São Paulo: Loyola, 2010.SPIVAK, Gayatri Chakravorty. Pode o subalterno falar? Tradução de Sandra Regina Goulart Almeida, Marcos Pereira Feitosa, André Pereira Feitosa. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2010.

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O texto em questão preten-de socializar as primeiras

reflexões do projeto de Iniciação Científica “Literatura, gênero, fe-minismo e políticas públicas cul-turais: onde estão na Biblioteca escolar?”, que tem como objeti-vo principal, de um modo geral e como diz o título, identificar quais livros de literatura escritos por mulheres estão presentes nas bibliotecas escolares da ci-dade de Alagoinhas e quais as políticas públicas de incentivo a produção literária feminina, atre-ladas ao contexto destas biblio-tecas. Junto com este propósito também pretendemos refletir sobre esta ação direta do curso de Letras junto a bibliotecas es-colares de Alagoinhas.

Sabemos que historicamen-te, desde os tempos mais remo-tos, o lugar e o papel da mulher na sociedade sempre foram categoricamente frisados como sendo inferiores ao do homem. Os Estudos de Gênero surgem com o propósito de discutir, refletir e relativizar sobre esse “lugar” feminino patriarcalmente demarcado. Os estudos teóricos sobre mulher ascenderam no espaço acadêmico a partir de 1968, como nos afirma Guacira Lopes Louro (1997). A mesma autora ressalta que:

Tornar visível aquela que fora ocultada foi o grande objetivo das estudiosas feministas desses primeiros tempos. A segregação social e política a que as mulheres foram historicamente conduzidas tivera como consequência a sua ampla invisibilidade como sujeito da Ciência. (LOURO, 1997, p.17,

grifo nosso). Se a mulher não era vista

como sujeito da Ciência, conse-quentemente ela também não poderia ser vista como sujeito leitor, crítico, reflexivo, ou até mesmo como sujeito capaz de escrever. Sendo assim, torna-vam invisível também a escrita da mulher. Mas é pertinente destacar que apesar da escrita feminina ter sido invisibilizada desde os séculos passados, isso não quer dizer que as mulheres não tenham escrito literatura ou que não escrevem. Hoje, obras de escritoras como Rachel de Queiroz e Clarice Lispector, por exemplo, estão sendo sugeri-das até em alguns vestibulares de universidades do Estado brasileiro. Sabemos também, pelos projetos de pesquisa de-senvolvidos por nosso grupo e que partem do curso de letras da UNEB-Campus II, desde 2001, que há inúmeras escritoras ne-gras que produziram e que ain-da são desconhecidas tanto do grande público em geral, como de professores da rede pública de ensino. Assim como, a partir destas pesquisas efetuadas, tomamos conhecimento dos mo-dos de produção de escritoras locais, da sua escrita resistente apesar da ausência de políticas públicas culturais locais voltadas para a cadeia produtiva que en-volve este segmento excluído do campo da produção.

Sendo assim, ciente de que as mulheres escrevem, têm ca-pacidade para isso, embora não tenham as condições muitas vezes favoráveis para este exer-

BIBLIOTECAS ESCOLARES de alaGoinhas: onde estão os LIVROS PRODUZIDOS POR MULHERES?

cício, o subprojeto em questão busca averiguar se suas produções estão nas prateleiras das bibliotecas escolares, como estas bibliotecas estão sendo alimentadas neste sentido, de modo que constem em seus arquivos produções de autoria feminina e que estejam sendo consultadas. Os primeiros dados colhidos com esta pesquisa nos mos-tram uma situação precária das bibliotecas e salas de leitura de esco-las de Alagoinhas, bem como a insistência de alguns professores em criar projetos e mesmo espaços de leitura que incentivem a formação de leitores e a participação ativa da escola neste processo, através destes recursos.

Visitando alguns destes estabelecimentos, inclusive salas de leitu-ra que figuram como bibliotecas nas escolas onde estas não existem, tanto na zona urbana como a rural, encontramos livros pouco organi-zados, alguns até rasgados, jogados pelo chão, estantes empoeiradas, configurando uma situação de descaso, de falta de apoio e estrutura para tais espaços de leitura. Até encontramos alguns livros de escrito-ras como Clarice Lispector, Rachel de Queiroz, Miriam Fraga, Cora Cora-lina, entre outras, mas alguns deles, como dissemos, rasgados. Quase não vimos computadores auxiliando às pesquisas nestes ambientes além de alguns dos mesmos servirem também para outras funções da escola e apresentarem cadeiras e mesas por vezes quebradas. Em contraponto a isso, percebemos que o II Plano Nacional de Políticas para Mulheres (PNPM) propõe a construção de uma cultura igualitária, buscando, inclusive, dar visibilidade à produção cultural feminina em âmbito nacional. Com isso, ficamos a nos perguntar como esta propos-ta parece ainda não ter chegado por aqui, visto que em comparação à produção escrita masculina a de mulheres não corresponde nem mesmo à metade, sem contar que não encontramos quase nenhum livro de escritora local ou regional ou negra.

O Programa Nacional de Biblioteca Escolar (PNBE) fala em distri-buição diversificada e sistemática de livros, mas no que diz respeito à produção feminina isto ainda se mostra de forma tímida ou ainda res-trita àquelas escritoras já consagradas e o Plano Nacional do Livro e da Leitura (PNLL) embora registre como linhas de ação a democratização do acesso, através, por exemplo, da incorporação e uso de tecnologias de informação, o fomento a literatura e a formação de mediadores, bem como o desenvolvimento da economia do livro, de sua cadeia pro-dutiva, o cenário que presenciamos está ainda bem distanciado destas proposições, refletindo, inclusive, em um desconhecimento, muitas ve-zes, por parte de agentes ligados a estes espaços e que poderiam ser mediadores de leitura. Os planos abrem novos ângulos importantes que merecem ser acompanhados, reivindicados, (melhor)conhecidos e suplementados. Entretanto, os dados também nos mostraram que, mesmo em meio a esta desarticulação ou diferença entre as esferas das políticas e as esferas reais dos espaços de leituras de algumas bibliotecas escolares, mesmo em meio a uma precariedade sentida e percebida, encontramos professores que criaram e fazem funcionar a sala de leitura de sua escola com projeto voltado para a dinamização do espaço, de modo que este possa servir de fomento a rodas de

leitura e atividades prazerosas e críticas que conectam todos da escola no movimento da e pela leitura.

Sendo assim, ainda no cami-nhar desta pesquisa e refletindo sobre os 40 anos dos cursos de Letras da UNEB-Campus II, sobre sua ação direta, nós, como par-ticipantes deste curso e faze-dores, também, de sua história, nos questionamos sobre qual a contribuição desta pesquisa, que parte do curso de Letras da UNEB de Alagoinhas, para a comunidade em geral. Para nos ajudar a responder tal ques-tão, conversamos com uma das funcionárias dos espaços biblio-tecários pesquisados, repassa-mos a pergunta e a mesma nos responde ressaltando que esta pesquisa das Letras alagoinhen-se é muito importante, uma vez que a biblioteca não deveria ser apenas um “depósito de livros” e com a realização e divulgação deste trabalho os alunos e a própria comunidade escolar po-derá interessar-se pela leitura e pelo próprio espaço.

Corroborando com o que foi percebido por este sujeito da pesquisa, ressaltamos que o trabalho em questão só foi pos-sível devido à percepção de um curso de Letras que pesquisa e se interessa pela realidade local sem desmembrá-la de um víncu-lo com uma esfera mais ampla. Ou seja, foi possível por conta de uma ação que transcende os muros da academia e, além disso, nos oferece a possibilida-de de nos prepararmos teorica-mente para refletirmos de forma crítica e autocrítica, intervindo na e com a comunidade, visto que a discussão proposta na

pesquisa abre questionamentos e proposições para o incentivo a leitura e o melhor tratamento não somente dos livros de au-toria feminina, mas também dos livros de escritores no geral, dos espaços que os guardam e pos-sibilitam o acesso a estes. Nesta ação de letras nós não ficamos de fora do cenário que nos en-volve e encampamos uma luta pela escuta das demandas deste ambiente, de seus sujeitos, as-sim como nos posicionamos em prol da visibilidade da produção feminina, da acessibilidade desta produção, ciente que estamos do possível potencial das Letras.

referênCias:CATIZ – MONTORO, Carmem. Femi-nismo radical e o lugar da nova mestiça. In: HOLANDA, Heloisa Buarque de. CAPELATO, Helena Rolim (orgs.) Relações de gêne-ro e diversidades culturais nas Américas. Rio de Janeiro: Expres-são e Cultura, São Paulo: EDUSP, 1999. FREITAS, Zilda de Oliveira. A li-teratura de autoria feminina. In: FERREIRA, Silvia Lúcia. NASCI-MENTO, Enilda Rosendo (orgs). Imagens da mulher na cultura contemporânea. Salvador: NEIM/ UFBA, 2002.LOURO, Guacira Lopes. A emer-gência do gênero. IN: LOURO, Gua-cira Lopes. Gênero, sexualidade e educação: uma perspectiva pós--estruturalista. Petrópolis, RJ: Vozes, 1997.MOREIRA, Jailma dos Santos Pe-dreira. Crítica cultural, campo de trabalho, trabalho de campo: propostas para um novo profis-sional das letras. In. Jornal Hete-rotopia, vol. 1, dez/2009.

leitUra esColar: o QUe as PesQUisas revelaM juliane silva Costa Estudante do VII semestre de Letras - UNEB - Profa. áurea da silva Pereira (Orientadora)

O texto tem como objetivo apresentar a lei-tura que fizemos dos resultados da pesquisa de Iniciação Científica. O projeto Letramento cultural juvenil: o que os jovens lêem fora da escola teve como campo de pesquisa um Co-légio da rede pública estadual, numa turma ensino médio, situado no centro da cidade de Alagoinhas, BA.

Adotamos pesquisa de base qualitativa e foram realizadas observações no cotidiano escolar e sua tessitura, seja nas observações de sala de aula, nas conversas dos corredo-res e nas relações dos sujeitos com os outros estudantes e docentes. Além disso, foram realizados entrevistas narrativas e ateliês au-tobiográficos a fim organizarmos as categorias de análise da pesquisa.

A escola como uma instituição social tem sido responsável por uma formação de leitores durante muito tempo, porém seus mecanismos muitas vezes ultrapassados e sistemáticos têm afastado cada vez mais os adolescentes e jovens da leitura dita escolar, uma vez que ela se apresenta de maneira tra-

dicionalista, conteudista e descontextualizada da vida desses estudantes.

Os estudantes apontaram a escola como uma instituição que legitima e determina as leituras realizadas por esses indivíduos, ela deixa de ser considerada como prazerosa, dessa maneira os adolescentes não conse-guem se visualizar como leitores como pode ser visto nos registros (auto) biográficos dos sujeitos; pois as maneiras como eles se vêem possuem marcas muito fortes da maneira como são tratados pelos seus professores e pela Escola em si como um organismo social.

As entrevistas revelaram que os adoles-centes muitas vezes vistos pelos professores como não interessados na sua vida escolar, demonstraram que eles possuem uma visão muito crítica em relação a sua formação e que sentem falta da escola apresentar conteúdos mais dinâmicos e próximos da sua realidade.

Os resultados da pesquisa apontaram a escola como uma instituição que legitima e determina as leituras realizadas para os es-tudantes, deixando de ser considerada como prazerosa. Dessa maneira os adolescentes não conseguem se visualizar como leitores como pode ser visto nos registros (auto) biográficos desses sujeitos. Pois as maneiras como eles

se vêem possuem marcas muito fortes da ma-neira como são tratado pelos seus professores e pela Escola em si como um organismo social.

Afastados da leitura pela escola, os es-tudantes buscam outras práticas leitoras que sejam realizadas como objeto de desejo e fruição. Obtemos dados bastante relevantes à pesquisa quando percebemos que esses jo-vens estão lendo muito fora do espaço escolar e se construindo socialmente como sujeitos críticos – reflexivos.

Assim, as primeiras leituras apontadas pelos adolescentes estão ligadas a internet, uma vez que estamos vivenciando um pro-cesso tecnológico cada vez mais acentuado. Percebemos a internet como uma grande ferramenta de informação e dinamismo, eles apontam que ela se constitui como uma gran-de “parceira” na sua formação leitora.

Observamos também que as leituras con-sideradas infanto-juvenis representam um acervo de leituras realizadas pelos estudan-tes, assim como “revista falando sobre fofo-cas, sobre signos e romances.

Almejamos construir uma escola que con-siga despertar nos alunos uma leitura como objeto de prazer, fomentando seu senso críti-co e permitindo que ele exerça-a de maneira

espontânea e não mais como um mecanismo de decodificação obrigatório e sem sentido.

Acabar com os métodos que norteiam hoje a imposição da leitura não é uma missão de fácil realização já que o senso de cultura tem se permeado por uma estrutura rígida que privilegia um acervo literário em detrimento das leituras realizadas fora do ambiente esco-lar. Desse modo, a escola limita os discentes a uma concepção de leitura pouco atraente aos novos leitores por não haver uma identificação entre os contextos da obra e do leitor, sobre essa ótica nos questionamos como devemos atuar a fim de que possamos construir um am-biente no qual visualizaremos a dialógica dos conhecimentos que a sociedade define como obrigatório com as leituras objeto de desejo desses estudantes, assim como é necessário refletir sobre as novas formas de fazer com que esse conhecimento seja interessante ao publico que necessita dele? Temos questões que precisam ser perguntadas mais temos ao menos a resposta de um por que, aquele que nos remete saber quais os motivos de estar-mos falhando dia a dia no fomento a leitura dentro das nossas escolas e este motivo se modela pela falta de reconhecimento entre os leitores e a leitura que lhes é apresentada.

jailma dos santos Pedreira Moreira (Pós-Crítica/UneB)e luane tamires dos santos Martins - Iniciação Científica

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11a partir da iniciativa dos Colegiados de Letras, Língua

Inglesa e Literaturas, e Língua Francesa e Li-teraturas, a revista BABEL iniciou suas atividades no mês de dezembro de 2011 com o lançamento de seu primeiro número. A Comissão Edi-torial pretende que a revista seja um veículo de difusão das pesquisas realizadas pela comunidade acadêmica da UNEB de Alagoinhas, outras universidades e centros de pesquisa do país e do exterior. Através do site na internet (http://www.babel.uneb.br), a revista reunirá as mais variadas perspectivas e abordagens de estudo e pesquisa na área de Línguas Estrangeiras com foco específico na Língua Inglesa e Francesa, além de trabalhos desenvolvidos sobre outras Línguas no cenário da sociedade contemporânea.

A publicação está vinculada ao Grupo de Pesquisa: Línguas e Litera-turas Estrangeiras na Sociedade Contemporânea (GPELLE), cadastrado no Diretório de Grupos de Pesquisa do CNPQ com a chancela da UNEB. O corpo de conselheiros que avalia as submissões de trabalhos é formado por doutores e mestres de diversas instituições de ensino superior do país, selecionando produções que apresentem contribuições significativas para o debate envolvendo a área de conhecimento das Línguas Estrangeiras Modernas, sob aspectos linguísticos e literários, e sua inserção no deba-te pedagógico, político e cultural da contemporaneidade. De periodicidade semestral e com número ISSN válido, a revista propõe chamadas de publi-cação com prazos definidos para o primeiro e segundo semestre, assegu-rando o lançamento de dois números por ano. A proposta também permite a publicação de resumos expandidos de alguns Trabalhos de Conclusão de Curso da Graduação de Letras dos Colegiados de Língua Inglesa e Literatu-ras e Língua Francesa e Literaturas do Departamento de Educação da UNEB, campus de Alagoinhas. A revista recebe artigos em língua portuguesa, inglesa ou francesa com temáticas nos estudos linguísticos, literários e pedagógicos preferencialmente voltados para Línguas Estrangeiras Moder-nas; Tradução de textos teóricos e artísticos ainda inéditos em Língua Portuguesa; Linguística Aplicada ao ensino de Línguas Estrangeiras. As submissões de trabalhos, dúvidas, comentários e sugestões devem ser enviados para o email [email protected].

BABEL: revista eletrÔniCa de línGUas e literatUras estranGeiras a CoMissão editorial

LITHOSILVA

as atividades de ENSINO PESQUISA e eXtensão no FAZER ACADÊMICO

Na tradição humanista, a universidade é considerada uma instituição na qual

a produção e difusão do conhecimento se esta-belecem como funções primordiais. Acrescenta--se a essa concepção que o papel da universida-de é também contribuir para a transformação da sociedade primando pela autonomia acadêmica e pela liberdade de consciência nas diversas ins-tâncias de suas ações.

No Brasil, para que a universidade exerça suas funções em obediência aos ditames da Constitui-ção Federal de 1988, nos termos do artigo 207, é preciso atender aos princípios da indissociabi-lidade entre ensino, pesquisa e extensão. Deve considerar que a pesquisa e a extensão quando relacionadas ao ensino, à universidade e à socie-dade permitem que haja não só a interação entre teoria e prática, mas também a democratização do saber, fazendo com que o saber, depois de testado e reelaborado, retorne às instâncias da universida-de. Dessa forma, a universidade se constitui como um espaço aberto à sociedade, no qual se con-cretiza a premissa de que as escolas foram cria-das como um avanço da humanidade, um espaço privilegiado do exercício criativo do conhecimento para o desenvolvimento humano, uma importante salvaguarda da “barbárie” que sempre ameaçou a civilização e suas conquistas.

A Universidade do Estado da Bahia – UNEB, Campus II, ao completar 40 anos de existência, embora tenha desenvolvido esforços para se ade-quar às atividades típicas da universidade (ensino, pesquisa e extensão) sua atuação na docência é notadamente maior. Portanto, nesse momento de maturidade, é preciso repensar as ações acadê-micas e pedagógicas do Campus II, no sentido de ampliar a produção de conhecimentos e torná-los acessíveis à formação de profissionais e aos mais variados segmentos da sociedade.

Não se pode perder de vista que a indis-sociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão deve estar relacionada à formação do graduan-do, permitindo-lhe a aplicação dos conhecimen-tos adquiridos no decorrer do curso. Ao tomar essa orientação como meta, o Campus II estará contribuindo para o desenvolvimento científico, tecnológico e cultural da região, do Estado e, por conseguinte, do país, justificando, assim, sua função social de instituição pública e gratuita.

No Campus II, não resta dúvida de que o Pro-

grama de Pós-Graduação em Crítica Cultual é um exemplo de determinação e responsabilidade com o desenvolvimento da pesquisa e extensão na área de letras com ênfase em literatura, na região. Mesmo assim, é preciso avançar mais na pesquisa e extensão, implantando outros cursos de stricto sensu que possibilitem a ampliação da pesquisa, considerando a localização geográfica e estratégica do Campus de Alagoinhas no Estado da Bahia. Além disso, deve promover a implementação de cursos de pós-graduação latu sensu que focalizem e revisem os conhecimentos adquiridos pelo aluno ao longo da graduação, contribuindo para o seu desenvol-vimento intelectual e aprimorando sua capacidade para atuar melhor no mercado de trabalho com um objeto de estudo mais especializado.

E, para que a pesquisa ocorra de forma in-tegrada, é necessário instalar uma política aca-dêmica que visualize não só a integração entre os departamentos e colegiados, mas também a possibilidade de diálogo entre as áreas do conhe-cimento que atuam no Campus II. Estimulando o diálogo entre os saberes, a universidade estará promovendo a interdisciplinaridade e, por conse-guinte, o crescimento da massa crítica do corpo docente e discente.

Ao aproximar a pesquisa da prática docen-te, o pesquisador deve primar pela liberdade de consciência, produzir sua pesquisa com respon-sabilidade e autonomia. Deve manter o espírito crítico e desenvolver ações que tragam benefí-cios para a sociedade. É preciso considerar que a produção de saberes no espaço democrático da universidade deve a todo tempo superar a ordem do discurso, para permitir o surgimento de outra ordem, porque enquanto a ordem acomoda os conhecimentos, a desestabilização da ordem pro-move a emergência de outra ordem, que contém a primeira, mas é diferente dela. Assim, em um processo dialético, a sociedade e os discursos irão se transformando constantemente.

Diante do que foi colocado, conclui-se dizen-do que a universidade, na condução do processo pedagógico e democrático de ensino e aprendi-zagem relacionado à pesquisa, deve ser um es-paço por excelência criativo e motivador, sempre em busca de abertura para novos horizontes do conhecimento, onde se respeite o contraditório, trilhando caminhos para uma sociedade justa, igualitária, fraterna e libertária.

Maria neuma Mascarenhas Paes

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Desde os seus primeiros anos de funcionamento a FFPA já buscava interagir com a comunidade alagoinhense, pelas suas habilitações do curso de Letras – o primeiro cur-so dessa Faculdade. Assim, pelo curso de Francês, as atividades conjuntas com a Aliança Francesa trouxeram informações para os estudantes do curso e novidades para os professores de Francês da cidade/ região.

Na área de Língua Portuguesa, as mudanças co-meçaram com a discussão de conteúdos lingüísticos e literários como fundamentação teórica para o ensino da língua materna, e , em 1976, os contatos com os professores de Português se amplia - dos que já são estudantes da Faculdade para os que atuam nas escolas de 1o e 2o Graus. É importante considerar que, nesse tempo, a Lei no 5692, de 1971, se implantava, em todo o Esta-do e as novidades apresentadas no Parecer 853 que fundamentava a lei quanto ao currículo – orientavam para o trabalho escolar com a área de comunicação e Expressão no lugar do tradicional “ensino gramatical” baseado na gramática normativa, com estudo de re-gras e exceções, muito mais para decorar do que para compreender o processo. Por tudo isso, a atuação da Faculdade se torna tão importante, porque o estudo de texto com a busca da compreensão das idéias, a distinção entre compreender e interpretar, a relação entre leitura e produção textual, estudo gramatical, a partir do texto produzi-do e respeitando a gramática internalizada são alguns dos pon-tos centrais da discussão sobre o ensino de língua portuguesa.

O Projeto do Curso de Extensão “Revisão Gramatical e Pla-nejamento elaborado pela disciplina Metodologia e Prática do Ensino da Língua Portuguesa aconteceu entre julho e agosto de 1976 quando se discutiu o Plano de Trabalho envolvendo a FFPA e a comunidade de professores de Comunicação e Expressão em Língua Portuguesa de 1o e 2o Graus” que foi elaborado em outubro desse ano, com os seguintes considerandos:

“Considerando: 1 - o interesse da FFPA em acompanhar o trabalho que, na cidade, se desenvolve em torno das Lín-guas para as quais prepara professores; 2 – as mudanças que se vêm processando no ensino da Língua Materna; 3- a necessidade de integração – FFPA e professores da cidade, visando um objetivo comum: o aluno; 4- a responsabilidade da FFPA no que se refere a uma posição mais atuante junto à comunidade; 5 – a variedade de nível dos professores de 1o e 2o graus em nossa cidade.” (p.3)

Com os propósitos de:

“1)Propor um Encontro de Professores de Comunicação e Expressão em Língua Portuguesa para:1.1 analisar a nossa real situação de trabalho; 1.2. discutir as possibilidades de prováveis mudanças” (p.3)

Esse trabalho envolveu o Desap na supervisão do aspecto pedagógico; a Coordenadoria Regional 3 com a liberação quan-do o horário do encontro coincidia com o da aula; as escolas públicas e particulares com levantamento de todo o pessoal docente, em exercício e a combinação dos horários de aula e de encontro, e a Faculdade com a preparação do material de aula – textos e exercícios, supervisão e avaliação das atividades. A previsão era para setembro, mas só aconteceu no ano seguinte.

É assim que, em 1977, o curso de Letras oferece à sua comunidade, a oportunidade de aplicar o Projeto “Primeiro En-contro de Professores de Comunicação e Expressão em Língua Portuguesa – 1o e 2o Graus” sob a responsabilidade dos dois

CURSO DE LETRASATUAÇÃO E INTERVENÇÃO NA VIDA DA SOCIEDADE

Profa. iraci Gama santaluziadedC ii/letras - alagoinhas

Departamentos: Letras e Educação. A finalidade do Encontro é assim expressa:

“A finalidade desse encontro é levantar problemas refe-rentes ao atual trabalho de Comunicação e Expressão em Língua Portuguesa, na cidade de Alagoinhas, principalmente nos níveis II e III e 2o grau. A discussão será feita pelos próprios professores que deverão indicar, também, os pro-váveis meios de solucionar os problemas levantados” (p.2)

É importante considerar que o curso da Faculdade era licencia-tura de curta duração, preparando professores o 1o grau, mas os docentes já atuavam também no 2o grau e precisavam de ajuda para aplicação das determinações legais da 5.692, pelo Parecer 853/71 que dizia:

“A marcha do ensino será decerto aquela que se vem preco-nizando. No início da escolarização, a aprendizagem se fará principalmente à base de atividades, a serem desenvolvidas de modo e com intensidade que o idioma surja diante do aluno menos com uma sucessão de palavras do que sob a forma natural de comportamento. Neste “saber lingüístico prévio”, que à escola compete orientar e disciplinar, resi-de uma das diferenças básicas entre a didática da língua vernácula e a dos idiomas estrangeiros. Daí por diante, insinua-se e amplia-se progressivamente a preocupação da língua como tal, até que se chegue às sistematizações gramaticais, a partir das séries finais do primeiro grau, para ordenar as experiências assim colhidas.” (p.3)

E, se, nesse início de trabalho, não era fácil o exercício pro-posto para as séries iniciais, muito pior para o 2o grau, porque ainda não havia tempo para a seqüenciação das atividades, já que a aplicação era concomitante. E o “nó” da questão estava no entendimento da expressão “saber lingüístico prévio” que dependia de fundamentação teórica trazida agora pelo curso de

Letras, cujo corpo docente buscava por isso mesmo, discutir e ampliar para quem estava fora da Faculdade.

Esse espírito de integração e cooperação mútua estimula os docentes da FFPA no trabalho de investigação dos caminhos do ensino de Português na cidade de Alagoinhas e região, uma vez que a Faculdade já atendia aos municípios vizinhos. Prepa-

ra para isso um projeto, submete ao DESAP e dele recebe aprovação e acompanhamento técnico durante o período de aplicação com alunos da 8a série do Centro Integrado Luiz Navarro de Brito. Duas professoras assumiram duas turmas

de oitava série – Dilma Evangelista da Silva e Iraci Gama Santa Luzia com a assistência de outras duas – Maria da Glória Rocha

e Marinalva Costa que acompanhavam as aulas e faziam anotações sobre os acontecimentos das aulas para avaliação posterior com as regentes, visando a reorganização do planejamento e continuidade das aulas. No relatório da pesquisa, a constatação da realidade do que ainda acontecia no ensino de Português:

“Apesar de toda a fundamentação teorico-prática da com-posição curricular da atual lei de Diretrizes e Bases da Edu-cação Nacional, o trabalho de Comunicação e Expressão, em

nossas escolas, não foi modificado para corresponder ao espírito da Lei, e a Língua Portuguesa conti-nua a ser ensinada através do estudo dos fatos lingüísticos e da memorização de nomeclaturas e regras de uma gramática que, via de regra, está dissociada do uso falado e escrito da língua do aluno” (p.5).

E, na conclusão, as docentes declaram a positividade do trabalho e o interesse na continuidade da pesquisa, como se observa pela sugestão no 2:

“(...) novo estudo seja implementado envolvendo o procedi-mento descrito, porém utilizando grupos de controle, com vistas a comparar-se a metodologia utilizada com esque-mas habituais desenvolvidos na área.”(p.33)

Até 1977 o curso de Letras era exclusivo (até porque Estu-dos Sociais só começa no 2o semestre) e o Jornal “A Tarde”, em dezembro desse ano, traz “Notícias de Alagoinhas” que cabem, perfeitamente, no presente texto:

“Alagoinhas foi a cidade com maior número de participantes na ‘Semana de Estudos Franceses’, realizada na Biblioteca Central, em Salvador, de 28 de novembro a 2 de dezembro. Participaram do encontro os seguintes professores e alunos da Faculdade de Formação de Professores de Alagoinhas: Profa Denise Maria Gurgel Nascimento (Diretora), Profa Iracy Simões Rocha, Profa Marly Maria da Silva Luz, Profa Aidil da Rocha Dias, Profa Ana Maria Costa Baptista, Profa Milfa Valério Sabadelli; Profa Eva Maria do Carmo Nery. As professoras do Departamento de Letras da Faculdade de Formação de Pro-fessores de Alagoinhas foram convidadas pelo Departamento Superior de Educação para ministrarem um curso sobre o en-sino de comunicação e Expressão do primeiro grau. O curso que teve início no dia 28 de novembro, findou-se no último dia 09, sendo que todo curso foi desenvolvido na Faculdade de Formação da Bahia. A equipe de professores convidadas esteve assim formada: Dilma Evangelista Silva, Iraci Gama Santa Luzia e Maria da Glória Rocha”.

Cabe ainda destacar, como produção do curso de Letras, na organização do Departamento de Educação. Mas esse conteúdo não cabe mais nesse texto, ficando como ponto de atração para a continuidade da análise que estamos produzindo sobre os primeiros anos do Curso de Letras da querida FFPA. Aguardem.

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nazarete andrade Mariano(Mestrando em Crítica Cultural – Linha 2/UNEB- CAMPUS II- Alagoinhas, Bahia

Como uma pessoa que mora no Sertão Médio, às margens do Velho Chico descobre um Campus que tem um mestrado em Crítica Cultural situado no curso de Letras? Atravessar as margens foi o pri-meiro passo para descobrir que a critica cultural vem sendo construídas no Campus da UNEB em Alagoinhas, margens: para o conhecimento, para as descobertas, criando novas pontes para che-gar nesse universo intenso de pesquisa, de no-vas leituras, de novas vivências, de novas teorias e novas práticas.

Assim me vejo, após dez anos de conclusão da graduação em Letras e vários estudos voltados para a Linguística textual, algo discutido cotidianamente nos meios acadêmicos em Petrolina, inspirada pelas discussões presentes nas instancias estaduais de ensino em Pernambuco, que vão dos campi à educa-ção básica de ensino, atravessando às margens do Rio São Francisco através da ponte que liga Per-nambuco à Bahia com destino ao curso de Mestra-do em Crítica Cultural em Alagoinhas, em busca de outras margens e outros rios, cujas águas limpam a casa deixando-a vazia ou com algumas ruínas para que o novo surja em um reconstruto de olha-res outrem, distantes daquelas margens voltadas apenas à textura dos gêneros textuais, criando links com outras discussões, com outras leituras, com outros professores/as, com outros teóricos e consequentemente com outro campus e outros métodos, pontuando essa coesão, pois o outro é primordial para fazer a travessia “do movimento no pensamento”.

Travessia essa que tornou prioridade para mim, pois o Mestrado de Crítica Cultural da UNEB de Ala-goinhas nos envolve a cada dia, descobrindo que é possível ressignificar, ensinando a desmontar e re-montar, fazendo-nos perceber a diversidade como uma potência, nos apresentando, pelo menos para mim, aluna de Letras da UPE, teóricos como Deleu-ze e Guatarri, Bourdieu, Kristeva e Derrida, entre tantos, que já se tornaram figuras frequentes nos discursos dos mestrandos, fazendo do rizoma verbo para rizomatizar questões antes não rizomatizadas,

simbolizando as representações da vida, ajudando a observar as séries e os dados que potencializarão nossas problemáticas.

Chegar à UNEB Campus II – em Alagoinhas e encontrar um espaço de conhecimento e pesquisa é algo gratificante, pois adentramos em um ambiente que já tem traçada sua trajetória, com seus mestres e doutores nos mostrando como se faz pesquisa, anunciando ao Nordeste e, por que não, ao Brasil o lugar da Crítica Cultura, que por sinal tem como área as Letras que democraticamente convida outras áreas para agregar as linhas de pesquisas, entre outras linhas, o Letramento, identidade e formação de professores, para fomentar novos espaços para discussões renovadas.

Assim, a Quarentona UNEB Alagoinhas, em-bala seu mais novo filho, o mestrado em Crítica Cultural com olhar materno, de sabedoria e de mantenedora, pois o Pós-Critica vem resistindo as mazelas de quem vive nas margens, resurgin-do todos os dias, mostrando que é preciso ser uma maquina de luta, maquina de guerra e uma maquina de saber.

Ultrapassando a 4a década de existência que essa jovem senhora continue criando pontes de discussões prioritárias dentro do espaço unebia-no, pontes estas de acesso, também, ao Mestrado Crítica Cultural que é um garoto com sabedoria impar que precisa ser difundido não apenas em Alagoinhas, mas ultrapassar outras pontes, outros rios, enfim outros espaços. Parabéns às Letras do Campus II da UNEB pelos 40 anos!

atravessando as PONTES PARA UM LUGAR eM CrítiCa CULTURAL UneBiano

LITHO

SILVA

referênCiasGOMES, Carlos Magno. Os deslocamentos da Crítica Cultural . In: Critica Cultura e Educação Básica. Org Cosmes B. dos Santos, Paulo Cesar . García e Rober-to Henrique Seidel. São Paulo. Cultura Acadêmica. 2011. SANTOS, Osmar Moreira. Critica Cultural: campos de trabalho e trabalho de campo. In: Estudos de Crí-tica Cultural: diálogos e fronteiras/ Org Ari Lima e Edil Costa. Salvador. Quarteto Editora, 2010. SILVA, Evanildes Teixeira da e SANTOS, Osmar Mo-reira, Formação Cultural d o estudante de Letras. In: Critica Cultura e Educação Básica. Org Cosmes B. dos Santos, Paulo Cesar . García e Roberto Henrique Seidel. São Paulo. Cultura Acadêmica. 2011.

O Programa de Pós-graduação em Crítica Cultural abrange as áreas de

Linguística, Letras e Artes, em nível de mestrado, objetiva formar profissionais qualificados para as atividades de ensino e pesquisa no campo da cultura. O mes-trado contém três linhas de pesquisa, nas quais se desenvolvem estudos sobre a língua, literatura marginal, cultura, forma-ção de professor, letramento, narrativas orais, testemunhos e modos de vida.

O Programa em sua riqueza de rigor, deta-lhes e multiplicidade apresenta uma ruptura com a homogeneização do ensino e pesqui-sa de Letras, por se tratar de um curso que se forma pesquisadores críticos culturais na busca da diversidade e descentralização das investigações, problematizando os variados contextos e práticas letradas.

O mestrado se destaca, também, por apresentar pesquisadores não somente de Letras, mas nas diversas áreas do co-nhecimento como Comunicação, Jornalismo, Sistema de Informação, História, Pedagogia, Matemática, Museologia, Administração, Psicologia, Antropologia, Sociologia.

Os projetos apresentam investigações sobre as comunidades rurais, os quilom-bolas, os pescadores, os indígenas, os fazedores de farinha, os pichadores, os

pintores, os fotógrafos, os internautas, os músicos, os menores infratores, as mu-lheres, os negros, os homossexuais, os marginais, os educadores e os estudan-tes; nas redes sociais, nos hipertextos, na literatura homoerótica, no ensino de Língua e Literatura, nas narrativas orais e escritas, nos testemunhos de vida, nas li-teraturas afro-brasileira e afro-americana, nos periódicos, nos estudos de gêneros, na teoria queer, na literatura de cordel, nos poemas, nas músicas.

Através desses pesquisadores múltiplos e rizomáticos, o Pós-Crítica se torna cada vez mais um programa que consegue dar voz aos esquecidos e excluídos pelo sistema centralizador, hegemônico e uno presente. Problematizando questões omitidas pela so-ciedade e o poder, para desenvolver consci-ência e luta pela transformação da situação “deficiente” que se encontra.

Dessa forma, percebe-se a importância do mestrado em Crítica Cultural, desen-volvido pela UNEB de Alagoinhas, por se tratar de um curso que consegue desen-volver pesquisadores diferenciais, inova-dores, múltiplos e “malditos” em Letras em busca da desterritorialização, ruptura, superação e transformação da situação de hegemonia e dominação existente.

Por olinson Coutinho MirandaMestrando em Critica Cultural, UNEB/Campus II

O PÓS-CRITICA e a forMação do

PesQUisador diferenCial EM LETRAS“o pesquisador em Crítica Cultural é um maldito” Osmar Moreira

POEMA 1

Mulheres e MulheresPor jeanne lopes santana Mestranda em Crítica Cultural (UNEB- CAMPUS II- Alagoinhas, Bahia)

SIMPLESMENTE MULHERES DAS LETRAS.....Mulheres formosas, gostosas, cultas e puras,Mulheres de casa, castradas, puritanas,Secas, escravas, partidas e cansadas.Mulheres remédios, fingidas e sonsas,Colecionadoras de ilusões,Prisioneiras de princípios banais,Companheiras da própria solidão.Mulheres estas por natureza,Mulheres anônimas, famosas, debochadas, retadas, abertas e sensuais,Mulheres com cheiro de flor,Mulheres da cidade, do mato,Mulheres racionais,Mulheres estas por convicção.Mulheres da vida, putas, sacanas, atiradas, frias, irracionais.Mulheres pecadoras, carentes, querentes, plenas e absolutas.Mulheres da noite e da rua, com gosto de comida, práticas e curtidas,Aventureiras, agitadas e venenosas,Mascates do amor.Mulheres essas por opção.Mulheres jovens e idosas, meninas, anjos e santas,Mulheres normais, realistas e sonhadoras.Mulheres de todas as épocas e raças,De todas as cores e religião,Femininas e machões.Frutos do paraíso e pescadoras de paixões.Mulheres divinas,Esculturas de letras,Mulheres maçãs!Mulher simplesmente, de qualquer jeito mulher.Um mistério, muito além da imaginação!

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LEXICOGRAFIA e CoMUniCação interCUltUralCosme Batista dos santos (UneB) | norma lúcia fernandes de almeida (Uefs)

Os estudos sobre o léxico, numa vertente culturalmente si-tuada, valoriza a relação entre as diferentes lexias e os povos que as usam. A rigor não é apenas o conhecimento

da estrutura linguística da unidade lexical que interessa, mas funda-mentalmente, o que as pessoas manifestam e como se manifestam através dela. Qual é a identidade cultural que o léxico revela e qual é identidade lexical que nos faz conhecer certo grupo ou região de usuários da língua?O léxico não pode ser reduzido a uma lista de palavras. As palavras revelam a identidade cognitiva, sociolinguística e cultural do grupo social que as usam e das condições sociais e históricas em que são usadas (ISQUERDO, 1998; MARCUSCHI, 2004).

A trajetória lexical é reveladora do trajeto histórico seguido pelos agrupamentos comunitários, marca as relações de identidade ao tempo em que nomeia o meio circundante. A construção de palavras, mais que uma escolha simples, insinua a relação com o contexto social e a recep-ção de mudanças, quase sempre chegadas por intermédio das transfor-mações tecnológicas. Além disso, o léxico pode indicar ritos, celebrações, relações laborais ou, por outro lado, silêncios, interdições, tabus.

Alguns estudos, seguindo essa vertente, tem se dedicado à lexicografia regional, por exemplo, investigando a influência cultural e geográfica na definição da identidade lexical da região locais (IS-QUERDO, 1998; CARDOSO, 2012). Aparecida Neri Isquerdo realizou um estudo sobre o“vocabulário regional na Amazônia acreana”. Trata-se de um estudo sobre o vocabulário do seringueiro do Estado do Acre que objetivou inventariar, descrever e analisar aspectos do léxico utilizado pelo grupo com vistas a verificar em que medida esse nível da língua pode retratar a realidade física, social e cultural da região acreana e do grupo de seringueiros em particular. Em seu estudo, Isquerdo (1998) concluiu que

“o predomínio de lexias não dicionarizadas e de emprego espe-cífico do grupo recai no campo referente à atividade da seringa (...).Por integrarem o vocabulário básico do grupo com significação já cristalizada no âmbito dos seringais, essas lexias são próprias e específicas de um subsistema regional. Por nomearem referentes muito particulares de um tipo de atividade extrativista, quando ocorre, é resultado de um processo muito lento. Dessa forma, essa parcela significativa de unidades lexicais enriquece sobremaneira o universo lexical da língua portuguesa do Brasil com regionalis-mos característicos de uma região notadamente marcada pelas suas peculiaridades físico-culturais, econômicas e linguísticas”.

(ISQUERDO, p. 103) Outra conclusão importante

relativo à lexicografia regional da Amazônia acreana é que ela acrescenta a esta pesquisa os modos de investigação sobre a identidade lexical regional, por exemplo, quando aponta que o isolamento em termos geográfi-cos e sociais e, inclusive, as di-ficuldades de acesso aos meios de comunicação de massa, mo-tivam a estabilidade lexical na

inclusive nos dicionários em uso nas escolas. A ausência dos dois vocábulos indica espaços em branco cru-

ciais, o do umbu e da umbuzada. Por um lado, a dificuldade da cultura letrada em nomear o mundo sertanejo, em perceber a pai-sagem sertão para além da seca, dos gravetos e dos mandacarus retorcidos. Essa lacuna é fruto da estereotipização, principalmente midiática, que produz um Nordeste seco, apenas seco. Por outro lado, a umbuzada, beberagem deliciosa, construto cultural resultado da experimentação, das vivências da experiência sertão e dos encon-tros do rico bioma caatinga com a pecuária bovina. O seu silencia-mento pode sugerir um bloqueio, de parte da cultura urbanizadora, de recepcionar as construções culturais rurais.

A introdução da lexicografia no processo de ensino-aprendizagem é, sem dúvida, uma experiência de letramento intercultural (SANTOS, 2008) a ser valorizada nesta pesquisa. No nosso entendimento, a escolarização da lexicografia como parte da pesquisa, trará importantes implicações no letramento dos professores e dos alunos. Em primeiro lugar, porque permite uma formação lexicográfica tão necessária para os professores e alunos do ensino fundamental nas escolas públicas. Em segundo lugar, porque terá como um dos seus produtos a edição de dicionários ilustra-dos a serem utilizados pelos alunos e professores nas escolas publicas da região e do país, o que levará ao processo de gramatização, via dicio-nário, de uma variedade linguística pouco estudada, pouco reconhecida, a sertaneja; entendendo-se aqui gramatização como “o processo que conduz a descrever e a instrumentar uma língua na base de duas tec-nologias, que são ainda hoje os pilares do nosso saber metalinguístico: a gramática e o dicionário" (AUROUX (1992: 65).

LITHOSILVA

Em 2012, os Cursos de Letras da UNEB em Alagoinhas completam 40 anos. Fosse casamento, seriam Bodas de

Rubi. E eu faço parte de mais da metade dessa história. Completei em maio passado 23 anos como professora desta Universidade. Fosse casamento, seriam Bodas de Palha. Entre a palha e o rubi há uma distância enorme, mas ambos me dão uma imagem bem apropriada para pensar a Universida-de do Estado da Bahia: uma casa coberta de palha com rubis espalhados pelo chão.

Nessas quatro décadas encenamos, na poé-tica de nosso cotidiano, a peleja dos unebianos contra o dragão da maldade. O dragão aqui repre-sentado pelas forças reativas que atravancam o livre exercício de nossas funções: a falta de infra-estrutura, a precariedade de nossas bibliotecas, das residências estudantis e dos docentes, de uma política acadêmica que deveria pautar nos-sas ações coletivas. Como resultado dessa labuta, formamos professores que atuaram e atuam no ensino fundamental, médio e superior.

A Faculdade de Formação de Professores de Alagoinhas já tinha uma história antes da UNEB e terá para além dela porque nasceu e se fortaleceu conectada com a sociedade de seu entorno, não

só do município, mas de toda uma região. A forma como a Universidade do Estado da Bahia foi criada e sua desordenada expansão acarretou inúmeros problemas que se refletem nas dificuldades de alcance da administração que, centralizada, não consegue ser ágil o suficiente. Muitos professores e funcionários já nos deixaram por falta de condi-ções melhores de trabalho; muitos estudantes já nos deixaram com seus sonhos frustrados. Per-demos alguns rubis pelo caminho. Mas não basta a descentralização administrativa. Precisamos de investimentos sólidos em Educação e uma gestão que seja antes acadêmica que política, porque o acadêmico – o exercício do livre pensar, do poético, do ético e do estético – é político por natureza.

Oferecer ensino público de qualidade ainda é um projeto distante que construímos a duras pe-nas. Abdias do Nascimento, ao receber o título de doutor honoris causa concedido pela Universidade do Estado da Bahia, na noite de 17 de março de 2008, discursou:

Desde que comecei minha luta, já sonhava em fazer parte desta universidade. Ela ainda nem existia, mas eu já sonhava com ela. E ela era isso que vi aqui: uma universidade do povo, sem

elitismo. Que pode viver com o povo, que pode chorar com o povo. Salve o povo brasileiro!Faço minhas suas belas palavras. Esse proje-to poderá ser alcançado se não esquecermos o cuidado com as pessoas, como na cantiga popular: Se essa rua fosse minhaEu mandava ladrilhar Com pedrinhas de brilhantesPara o meu amor passar.

É para as pessoas que devemos nos voltar, permitindo que brilhem. Trabalhar aqui é apostar que o talento está em todos os cantos e que sur-gem dos modos mais improváveis. E assim vamos lapidando joias no nosso barracão de palha. Ser unebiana é ter orgulho de levar a todas as regiões do Estado o ensino superior e perceber a melhoria na qualidade de vida das comunidades onde está instalada. A crença de que a educação muda sim a vida das pessoas, ladrilhando de brilhantes seu ca-minho. Nas formaturas, constatar que, em muitas famílias, aquele professor que conclui o curso é o primeiro a receber o um diploma de nível superior. Constatar que hoje formamos filhos de professores formados pela Faculdade de Formação de Professo-

res de Alagoinhas. De ter entre meus estudantes irmãos e irmãs de ex-alunos, tecendo nessa rede familiar novas possibilidades. Prestar serviços a professores da zona rural e das periferias dos cen-tros urbanos das cidades da região que são aten-didas pela UNEB. Valorizar o árduo trabalho desses profissionais que retornam às salas de aula nos cursos das licenciaturas especiais, lotando nosso campus numa efervescência que não via desde os tempos da Praça Rui Barbosa.

Foram apenas quarenta anos. Muita coisa mudou nessas quatro décadas, muito ainda está por se fazer. Começamos com a licenciatura curta e hoje temos um curso de Mestrado. Vida longa aos Cursos de Letras da Universidade do Estado da Bahia! Dentre as novas ações a curto e médio prazo, necessitamos do projeto do novo curso de Francês, desejamos a ampliação da Iniciação Científica que tem se fortalecido ano após ano; o aperfeiçoamento do TCC, a consolidação do Mes-trado em Crítica Cultural com a implantação do doutorado, a criação de outros mestrados. En-fim, a ampliação do conhecimento e a melhoria de condições de trabalho para a construção de uma casa digna de abrigar nossa tão preciosa produção.

a Universidade e seU PaPel soCial: entre a PALHA e o RUBIedil silva Costa - Docente do Curso de Letras Vernáculas e do Mestrado em Crítica Cultural

língua falada que, por sua vez, é passada de geração para geração sem significativas alterações.

Em nosso corpus, por exemplo, as unidades lexicais são geradas a partir da língua falada em uso em comunidades rurais, indígenas e quilombolas do semiárido baiano e, por isso, as conclusões relati-vas à lexicologia da Amazônia acreana constituem um antecedente valioso nesta pesquisa.

Elizângela Cardoso realizou um estudo sobre a lexicografia sertaneja, analisando um corpus que foi coletado na região de Canudos, mais espe-cificamente, no município e Uauá (BA). Em seu estudo, Cardoso (2012), fez um levantamento de aproximadamente 500 palavras em uso na zona rural e urbana do município. Essas palavras foram transformadas em verbetes por alunos do Colégio Estadual Senhor do Bonfim, em Uauá, como ocorreu com a palavra Bacuri no verbete abaixo.BaCUri – s.m. 1. Porco pequeno, 2. Menino. Ex: 1. Leve a lavagem para o bacuri. 2. Esse bacuri já fala que nem homem feito.

O estudo baseou-se em uma visão sociocultural do léxico e sugere que a estruturação do gênero verbete deve considerar os se-guintes campos constituintes: entrada, categoria gramatical, fonte, área, definição e, por fim, o contexto (DIONISIO, 2007). No processo, a pesquisadora envolveu estudantes e professores de língua portu-guesa para, entre outras atividades, entrevistar moradores antigos das comunidades sertanejas, transcrever os itens lexicais mais es-táveis nas narrativas populares e, por fim, editar um dicionário re-gional. Um conflito marcante na edição dos verbetes foi o estudo da lexia umbuzeiro. Uma parte deste estudo mostra que o léxico umbu, fruto do umbuzeiro, e a lexia umbuzada não são dicionarizados,

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A FACE NOBRE DO FACEBOOK: U M r e e n C o n t r o C o M a l U n a s

d a f f P a d a d É C a d a d e 9 0

a nossa homenagem aos quarenta anos do curso de Letras do Campus II da UNEB tem relação com uma indagação que nos foi fei-

ta ao iniciar a graduação no ano de 2010: o que realmente pode um curso de Letras? Este questio-namento tem sido uma força propulsora das nos-sas ações e tem nos levado para além do espaço universitário. Este artigo é produzido a partir da reflexão sobre uma dessas ações que realizamos em conjunto: aulas de Redação no Curso Básico Vida - CBV, em Alagoinhas.

Em 2011 a coordenadora do projeto, que é gra-duada em Letras Vernáculas no Campus II da UNEB, Marluce Campos Silva, realiza uma visita em cada sala de aula da Universidade com o objetivo de apre-sentar o Curso Básico Vida e convidar graduandos que desejassem atuar como voluntários no mesmo. Como podem presumir fomos uns dos estudantes que abraçaram o projeto, e logo começamos a per-cebê-lo como um mecanismo que pretende e solapa estruturas sociais, econômicas e de poder instaura-das na nossa sociedade e mais especificamente em Alagoinhas, vejamos abaixo o porquê.

De acordo com o projeto do Curso Básico Vida, este surgiu através do idealizador Professor Miguel Silva em 29 de Setembro de 1999, no bairro Sil-va Jardim, com o principal objetivo de oferecer aos alunos – oriundos de escolas públicas – o suporte necessário para que, resgatando sua auto-estima, pudessem lidar com a competitividade de forma mais equilibrada.

Para atingir tal objetivo o projeto promove, de modo filantrópico, reforço para o ensino fun-damental; curso preparatório para vestibulares e

concursos; utilizando, também, a arte, modalidades esportivas e temas transversais que possibilitem aos alunos compartilharem suas ideias e aspectos socioculturais inerentes à origem de cada um deles.

Esta postura abre portas para um ensino menos tecnicista, no qual o aluno é conduzido a se adequar a um modelo pré-estabelecido e ainda considerado eficaz, sendo a identidade deste aluno, muitas vezes, completamente ignorada. Contra isso, o curso contri-bui não só para diminuir as distâncias entre estas pessoas e as diversas áreas do conhecimento, mas, também, para formação de cidadãos capazes de ob-servar, refletir, criticar e atuar de forma consciente na sociedade em que vive.

Hoje, este projeto possui extensão no bairro de Santa Terezinha, oferecendo curso para concursos públicos; e no Estevão, zona rural de Alagoinhas, promovendo a alfabetização de jovens e adultos. Para que o CBV possa acontecer conta com insti-tuições parceiras como a Prefeitura Municipal de Alagoinhas, através do convênio com a SEDUC; com a Campanha Nacional de Escolas da Comunidade – CENEC que colabora com o espaço físico; Clinica Novo Ser, que contribui com a Psicopedagogia e o espaço físico; e com a UNEB – Campus II, que possibilita o trabalho dos professores/alunos voluntários.

A nossa atividade, como professores voluntários desse curso, não poderia ser apenas a de instruir os alunos acerca de técnicas de produção textual, como normalmente eles estão habituados na rede pública, o que pretendemos é que o uso destas téc-nicas potencialize a escrita destes sujeitos, de for-ma a ser uma expressão crítica e autônoma contra modos de pensar estereotipados e legitimados por

uma sociedade sexista e racista, ou seja, a escrita não seria só uma expressão do pensamento mais uma arma de luta que permitirá aos nossos alunos transitar por diferentes espaços.

Este modo de ensinar, que se alia a proposta do CBV, não se deu como um estalo, mas, parte exa-tamente de um exercício contínuo – proposto por alguns professores desta universidade – de Crítica Cultural. Esses professores permitem que suas aulas sejam um espaço de discussão e reflexão, onde nos tornamos conscientes das relações de poder exis-tentes na sociedade, em especial nos discursos: a linguagem em uso. Além de pensarmos que é através da linguagem que construímos outro sentido para o curso de Letras, que subverte as imposições hege-mônicas sobre o mesmo.

O nosso curso de Letras, e dizemos com proprie-dade e orgulho, tem nos incitado a repensar, também, os sentidos dados ao papel do docente da língua ma-terna. Temos vivenciado no CBV que os nossos alunos muitas vezes são destinados à margem pela própria educação, visto que chegam até nós com poucas no-ções de produção textual, sendo impossibilitados de concorrerem igualitariamente a concursos públicos e vestibulares pela falta de domínio eficaz da escrita.

Após esta experiência no projeto, compreen-demos e vivenciamos que o poder de um curso de Letras está em mexer com a vida dos sujeitos, e através da língua(gem) e possibilitar que estes construam outros sentidos para a sua própria exis-tência, desconstruindo e minando – ainda que seja aos poucos – mecanismos de poder que oprimem, excluem e segregam. E para você, o que realmente pode um curso de Letras?

OS ESPAÇOS DE SE PENSAR OUTROS SENTIDOS

LITH

OSI

LVA

anderson Cleiton sales roChaPesquisador discente da Iniciação Científicaorientador: Dr. Osmar Moreira

tássia BorGes do nasCiMentoPesquisadora discente da Iniciação Científicaorientadora: Dra. Jailma Pedreira

LITHOSILVA

Por jaci leal Pereira dos santosMestranda em Crítica Cultural - UNEB - CAMPUS II - Alagoinhas-BAorientadora: Profa. Dra. Cláudia Martins Moreira

a tecnologia representa hoje uma corrente inquebrável entre os agenciamentos, capaz de conseguir provar, comprar, unir pes-soas pelo laço afetivo ou amoroso. É uma coisa de “loucos”.

Imagina a dificuldade entre as pessoas que conviveram a cinco ou seis décadas atrás quando pensavam em enviar uma notícia a outro? Comprar uma mercadoria em uma cidade que não fosse a de sua ori-gem? Comprar uma passagem e preparar-se para esse deslocamento? Não dá para mensurar todas as dificuldades, mas, no imaginário fértil, consegue-se perceber as intempéries que foram enfrentadas.

Pensando na facilidade de conseguir todas essas informações e outras com auxilio das redes de comunicação, através do facebook foi possível juntar quase todos os alunos e alunas da década de noventa. Saber onde está, o que fazem, onde trabalham, o progresso da família, se estão estudando ou não, se seus sonhos permanecem ou apare-ceram outros... É possível analisar as marcas deixadas pelo tempo, comparando os relatos e as imagens fotográficas: o antes e o depois. Mover as emoções. Reviver. Construindo e contando histórias a partir de tudo que se aprendeu para a vida no curso de Letras da UNEB, Campus II, em Alagoinhas.

Entre os achados e perdidos, nos encontramos “face a face” na web. As redes de relacionamento proporcionaram essa oportunidade. Até a ideia de um encontro com todos já circulou no face. Interessante! Nesse contexto, será apresentado um pouco do caminho traçado e percorrido

por alguns, tomando como base o tema sugerido: “Onde identificar a atuação dos profissionais de Letras nos bairros de Alagoinhas (escolas, equipamentos de cultura, centros de memória, bibliotecas comunitárias, entre outros) e/ou em cidades do Agreste de Alagoinhas e Litoral Norte.”

entre os Perdidos, os aChados

Onde estão os alunos e as alunas da FFP que ingressaram em 1993 a 1997? Que resistiram a preconceitos, que enfrentaram dificuldades em vários campos. As datas representadas são aproximadas/representati-vas da época. Época em que acumulamos aprendizado com a professora Florentina, professor Osmar Moreira (atual coordenador do Pós Crítica), professora Milfa, Maria da Glória, Edvaldo, Márcia Rios, Olga, Paulo, Walde-mar, Lígia Freire, Adilson e outros.

O campus II nos remonta a um grupo que sonhou com melhores condições e com o crescimento intelectual e, porque não dizer, financeiro também, que pode contar com aulas que inspiraram a futuros profissio-nais a entenderem a crítica filosófica nietzcheana, aos estudos literários que já vislumbravam as possibilidades da Crítica. Um sonho que foi com-provado pelo progresso de cada aluno e aluna unebiano(a).

Assim, a partir das conversas no face, foi possível notificar que, ou na educação ou em outras áreas, eles/elas estão atuando, adentrando os “espaços”. Nesse texto, serão indicados alguns espaços ocupados

por aquelas e aqueles que circularam na UNEB em um determinado momento.

Elenice Secundino, técnica legislativa na câmara municipal de Ala-goinhas. Áurea Pereira, doutoranda, professora concursada da UNEB, campus II. Silvia Marinho, professora substituta da UNEB e atuando na Fundação José Carvalho de Pojuca. Simone Almeida, professora concur-sada na secretaria do estado da Bahia. Kátia Alcântara, vice-diretora de escola estadual em Catu. José Olívio, poeta. Márcia Cristina, professora concursada da Secretaria do Estado e do município de Camaçari. Manueli-ta Santos, professora concursada da secretaria do município de Salvador. Jeane Paim, professora concursada da secretaria do Estado da Bahia. Ivana Sacramento, mestra pelo Pós-Crítica e coordenadora do programa do Gestar em Alagoinhas. Raivalda Ramos, Funcionária da Secretaria de Educação do Estado. Sueli e Silvada atuam na educação, mas já concluí-ram o curso de Direito. Conceição atuando na área de saúde, no Hospital Dantas Bião.

Não obstante às escolhas profissionais, todos iniciaram no curso de Letras Vernáculas ou de dupla formação: Português, literaturas e Língua inglesa - Português, Literaturas e Língua francesa. Os citados represen-tam todos da década para mostrar como o curso de Letras do Campus II construiu, constrói e continuará construindo profissionais pesquisadores e críticos culturais, num rede contínua, regida pela emoção do conhecimento e pela razão da busca do conhecimento.

Uma restauração do tempo que as letras representam

res de Alagoinhas. De ter entre meus estudantes irmãos e irmãs de ex-alunos, tecendo nessa rede familiar novas possibilidades. Prestar serviços a professores da zona rural e das periferias dos cen-tros urbanos das cidades da região que são aten-didas pela UNEB. Valorizar o árduo trabalho desses profissionais que retornam às salas de aula nos cursos das licenciaturas especiais, lotando nosso campus numa efervescência que não via desde os tempos da Praça Rui Barbosa.

Foram apenas quarenta anos. Muita coisa mudou nessas quatro décadas, muito ainda está por se fazer. Começamos com a licenciatura curta e hoje temos um curso de Mestrado. Vida longa aos Cursos de Letras da Universidade do Estado da Bahia! Dentre as novas ações a curto e médio prazo, necessitamos do projeto do novo curso de Francês, desejamos a ampliação da Iniciação Científica que tem se fortalecido ano após ano; o aperfeiçoamento do TCC, a consolidação do Mes-trado em Crítica Cultural com a implantação do doutorado, a criação de outros mestrados. En-fim, a ampliação do conhecimento e a melhoria de condições de trabalho para a construção de uma casa digna de abrigar nossa tão preciosa produção.

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Mas, o que há (...) de tão perigoso no fato de as pessoas falarem e de seus discursos proliferarem indefinidamente? (FOUCAULT, 1996, p. 8) É a partir desse questionamen-to que busco refletir e homenagear aqueles que fizeram de suas posições políticas na UNEB, em especial, no Curso de Letras de Alagoinhas, uma luta constante pela des-montagem de signos, concepções, e demais engrenagens que subjugam e desqualificam os discursos minoritários, além de proble-matizar a identidade institucional e seus entrecruzamentos com as demais identida-des que a constitui.

São diversos os artifícios que há na so-ciedade discursiva para inviabilizar a circu-lação e reprodução dos discursos, os modos de vida e a organização cultural dos grupos minoritários (negros, mulheres, homossexu-ais, pobres etc.). As instituições (em geral) realizam esse controle, seleção, organização e distribuição. E quando entrei nesse espa-ço discursivo, em que o poder, o público, o “dominador” e o “dominado” se estabelecem, comecei a perceber que não tinha, e muitas vezes não tenho, consciência dos “procedi-mentos em jogo” na universidade, no curso, na sala de aula, enfim, nos meus textos. E, também, já caí na frustração diante do sucateamento da universidade e quiçá da educação, sem perceber que o descaso é mais um estratagema para silenciar gritos de liberdade. Contudo, o Colegiado de Letras soube “mover-se entre as coisas” e criar li-nhas de fugas contra tanto descaso.

Hoje, enquanto egressa do Curso de Letras, professora de Língua Portuguesa e aluna especial do Mestrado em Crítica Cultu-ral, relendo o trabalho de conclusão do cur-so intitulado Literatura e cultura em campo: pela voz das egressas de Letras DEDC II, ao investigar minha prática docente, nos textos do componente Literatura Cultura e Modos de Produção e nas rodas de discus-sões, fica ainda mais evidente que nesse espaço de poder há sujeitos comprometidos com o sentido prático das teorias (produção intelectual), os quais se reinventam para sabotar a “verdade” no campo institucional. São a eles e demais funcionários que rendo as minhas homenagens. Sou-lhes grata por permanentemente estarem criando as con-

dições para essa festa do pensamento no campo das letras!

Tenho aprendido e ensaiado na sala de aula aquilo que venho aprendendo com vo-cês, nos últimos cinco anos que vivi nesse lugar, por exemplo, a me perguntar: pelo que se luta? E não esquecer o sujeito. Mas não é tarefa fácil. E quem disse que seria? Lidamos com a invenção mais complexa da humanidade – a linguagem, portanto, li-damos com os sujeitos que a constroem. E se a academia, a escola tem medo da linguagem do minoritário, e, assim, cria e mantém instrumentos para desprestigiar suas produções, nossa tarefa realmente não é simples. Pois, também, podemos ser cooptados, e para não cair nessa cilada o/a egresso/a não pode isolar-se. Cadê o encon-tro dos ex-alunos?

É válido ainda dizer que se toda institui-ção é construída histórica e discursivamente, aquilo que ainda não temos na UNEB pode ser desmontado e montado, numa tarefa perma-nente. Nesses termos, é relevante multiplicar os relatos (TCC, dissertações, teses, artigos, ensaios etc.), diários, poemas, garatujas, en-contros nas comunidades, nos movimentos sociais, performances... Essa ciência menor, pelo viés da Crítica Cultural, além das condi-ções para a vez e voz de mulheres, negros, índios, homossexuais, sertanejos, comunas e comunidades periféricas, funciona como um espaço para se fazer das marcas e traços em seus corpos, uma prática política voltada a um compromisso com a emergência de no-vas e outras sociabilidades, bem como de um outro sentido de justiça entre esses seres humanos.

Socializo, nessas últimas linhas, como um “singelo presente” para a ciranda de Le-tras, a contribuição da pesquisa na gradu-ação: o curso de Letras de Alagoinhas tem avançado muito em suas atribuições, mas nos parece que para defender e aprofundar as conquistas alcançadas nesses 40 anos, talvez seja preciso refletir acerca da forma-ção em políticas públicas culturais, como propõe Moreira (2010), e por isso sugiro que se criem componentes como “Política Cultural”, “Gestão Cultural”, “Produção Cul-tural”. Eis a razão da luta: “grande e revolu-cionário, só o menor”. Vida longa!

LETRAS:

evanildes teixeira (recém-formada em Letras com Habilitação em Língua Portuguesa e Literaturas)

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Ao recordar o início minha trajetória como aluna da Graduação em Letras na extinta Faculdade de Formação de Professores de Alagoinhas, re-tomo precisamente os meus anseios e a curio-sidade em saber que tipo de professora iria me tornar. A minha inserção no Curso de Letras com Inglês insinuava a possibilidade de tomar posse da chave que abriria portas para o co-nhecimento científico gramatical, mas também para a provocação do jogo de palavras propicia-do pela literatura.

Respostas obtive no contato com os alunos, no exercício da profissão, que me fez experi-mentar o choque da teoria com a prática. O falar e o escrever rígido proposto pela gramática nor-mativa eram deliciosamente contrariados pelo coloquialismo eficiente dos meus alunos, das pessoas da minha comunidade, diga-se de pas-sagem, periférica. Observando e vivendo junto àquelas pessoas, pude associar, como num in-sight, como as palavras se assemelham ao nos-so cotidiano: demarcam territórios, abrem ou fecham portas, submetem-nos ou nos libertam, enfim, dizem de nós, representam-nos.

Desta forma, captei que ao mesmo tempo em que elas são usadas para submeter, são armas de guerrilha, disparam canhões contra a dominação, o silenciamento, a segregação. Começo a entender então o meu papel como educadora, em especial, orientadora nos per-cursos da língua portuguesa (formal!) que não é nada menos que incitar o manuseio com as palavras de forma tal que, no momento em que fosse preciso usá-las, isto sinalizasse que po-demos usar a linguagem do dominador como um canhão contra ele mesmo, trabalhando na resistência, mas nos dando possibilidade de circular em qualquer espaço com desenvoltu-ra, tomando posse do conhecimento que nos é direito buscar. O conhecimento como alavanca, como impulsão para ler, interpretar o mundo de forma não mais ingênua, não mais tímida.

Na comunidade de onde vim, composta basicamente por pessoas negras, convivi com pessoas que faziam operações matemáticas no chão, liam revistas velhas à luz de vela e isto os fazia se sentirem grandes, enormes, os sábios ali no nosso meio. Eles davam notícias do mun-do e orientações aos mais novos, incitando-os a irem mais além. Eu fui uma delas que riscava com pedras de cal a porta da cozinha da minha

casa, como se fosse um quadro de giz, usando minhas bonecas como se fossem alunos. Tinha como arma o giz e a palavra.

Hoje, graduada em Letras, Mestranda em Crítica Cultural fui com as palavras a lugares que jamais me seria permitido ir, sem o verniz das palavras formais, porém foi com a versatili-dade do coloquialismo que marquei o meu lugar de fala e incito meus alunos a fazerem o mes-mo. Quero dizer com isto que provoco o uso das palavras como forma de furar o bloqueio dos discursos construídos, de tudo o que disseram de nós, negros, pobres, da periferia.

O Crítico Cultural como analista do seu tempo e como descentralizador de “poderes”, de promotor das “inversões” destaca as letras, a literatura marginal para o centro das discus-sões acadêmicas, alia o pensar filosófico à teo-ria ao dizer daquele que foi secularmente con-siderado como um ser não pensante, um não humano e, por isto, não merecedor de direitos, a ter conhecimento e a conhecer-se também.

Encontro-me então no meu lugar, no espaço de combate que é o da observação, da pesqui-sa, da intervenção, da humanização, se é as-sim então a importância das letras para o meu trabalho científico, como pesquisadora da linha 1, do Mestrado em Crítica Cultural, que se de-bruça sobre o estudo intitulado Cânone, Raça e Gênero na mira do contradiscurso literário cul-tural de Conceição Evaristo (escritora negra! E entendam o uso deste adjetivo como marcação de lugar de fala, de resistência!), objetivando com isto dar notícia aos meus alunos que, ao contrário do que sempre se disse, negro pensa, escreve, sente, ama e faz ciência.Desta maneira cabe reforçar com esta poesia:Confere a peça!No alto da primeira listaNão agrido ninguémNão odeio ninguémAo sentir dor, porémDou golpes de capoeira em quem me violaAtenção... Cuidado...Com a minha dor...Com a minha fúria...Com a minha garraTome nota agora!Sou negra!E da sombra da escravidãoEstou fora!

Por alda PereiraMestranda em Crítica Cultural (UNEB - CAMPUS II - Alagoinhas, Bahia)

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