HISTÓRIA E DANÇA: PERPECTIVA DE PRODUÇÃO … · da sociedade branca, o Country e o Folk....

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HISTÓRIA E DANÇA: PERPECTIVA DE PRODUÇÃO HISTORIOGRÁFICA COM BASE NA MANIFESTAÇÃO ESTÉTICA DO ROCK ‘N’ ROLL, NOS ANOS 50 Sônia Maria Flach de Almeida Trabalho Final exigido para a conclusão do PDE sob a orientação da Prof. Drª. Sarah Iurkiv Gomes Tibes Ribeiro. Resumo O Rock ‘n’ roll e a sua dança surgem após a Segunda Guerra Mundial como significado de rebeldia e contestação apresentadas pela juventude, isto é, como manifestação cultural no contexto histórico dos anos 50. Desta forma este artigo pretende apresentar uma abordagem considerada como objeto de análise ou fonte documental desta forma de manifestação estética, cultural e artística. As interpretações culturais desta década mereceram investigação histórica para perceber que a maneira de abordar a relação entre o Rock ‘n’ roll nos anos 50 e a História é mais do que uma ilustração, ou seja, ocorre uma transcendência da perspectiva lúdica. Implica em utilizar a dança enquanto uma prática da juventude estadunidense e brasileira, como sujeitos inseridos no contexto sócio-histórico da década de 50, ou seja, do Pós-Guerra. Pautada em referencial teórico denominado história social da cultura será adequada como instrumento de análise do contexto sócio-histórico do Rock ‘n’ roll e a Dança. É relevante compreender os significados da rebeldia e da contestação manifestadas pela juventude. A prática levada a efeito pelos jovens remete à relevância das conseqüências ou resultados involuntários que a influenciaram. A Indústria Cultural criou necessidades de consumo que revelaram o cotidiano, ações, atitudes, hábitos mentais que indicaram mudanças de novos padrões comportamentais que se sucederam a partir dos anos 50 e os significados que a prática do Rock ‘n’ roll assumiu para a juventude. Palavras Chave: Dança. Rock ‘n’ roll anos 50. Indústria Cultural.Juventude. Contestação.

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HISTÓRIA E DANÇA: PERPECTIVA DE PRODUÇÃO HISTORIOGRÁFICA

COM BASE NA MANIFESTAÇÃO ESTÉTICA DO ROCK ‘N’ ROLL, NOS

ANOS 50

Sônia Maria Flach de Almeida

Trabalho Final exigido para a conclusão do PDE sob a orientação da Prof. Drª.

Sarah Iurkiv Gomes Tibes Ribeiro.

Resumo

O Rock ‘n’ roll e a sua dança surgem após a Segunda Guerra Mundial como significado de rebeldia e contestação apresentadas pela juventude, isto é, como manifestação cultural no contexto histórico dos anos 50. Desta forma este artigo pretende apresentar uma abordagem considerada como objeto de análise ou fonte documental desta forma de manifestação estética, cultural e artística. As interpretações culturais desta década mereceram investigação histórica para perceber que a maneira de abordar a relação entre o Rock ‘n’ roll nos anos 50 e a História é mais do que uma ilustração, ou seja, ocorre uma transcendência da perspectiva lúdica. Implica em utilizar a dança enquanto uma prática da juventude estadunidense e brasileira, como sujeitos inseridos no contexto sócio-histórico da década de 50, ou seja, do Pós-Guerra. Pautada em referencial teórico denominado história social da cultura será adequada como instrumento de análise do contexto sócio-histórico do Rock ‘n’ roll e a Dança. É relevante compreender os significados da rebeldia e da contestação manifestadas pela juventude. A prática levada a efeito pelos jovens remete à relevância das conseqüências ou resultados involuntários que a influenciaram. A Indústria Cultural criou necessidades de consumo que revelaram o cotidiano, ações, atitudes, hábitos mentais que indicaram mudanças de novos padrões comportamentais que se sucederam a partir dos anos 50 e os significados que a prática do Rock ‘n’ roll assumiu para a juventude. Palavras Chave: Dança. Rock ‘n’ roll anos 50. Indústria Cultural.Juventude. Contestação.

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Abstract

The Rock’n’roll and your costumer dance appear after Second World War like rebelliousness and contestation significance by the youths, it means, cultural manifestation in historical context fifties. This article intends to approach to a topic or documental source for manifestation aesthetics, cultural and artistic. The interpretations cultural of fifties deserved historical investigation to realize the way to board the relation between Rock’n’roll in the History is most more than an illustration, occurs a transcendence of the ludicrous perspective. It implies in use of the dance while a youth's practice United States of America and Brazilian youth, as subjects inserted in decade context social-historical, in other words, of the Postwar. Rulered in reference denominated theoretical social history of the culture, will be adequate as context social-historical analysis instrument of the Rock’n’roll and your costumer dance. It is important to comprehend the rebelliousness meanings and of the contestation, manifested by the youth. The practice for effect by the young people, remits to the consequences relevance or involuntary results, that influenced then. The Cultural Industry created needs to consumption, that revealed the costume everyday, actions, attitudes, mental habits that indicated changes of new behavioral standards that were happened from fifties and the meanings that the Rock’n’roll practice took over for the youth.

Key words: Dance. Rock’n’roll years 50. Cultural Industry, Youths,

Rebelliousness, Contestation.

Introdução

O Rock ‘n’ roll estabelece uma aproximação com aspectos que lembram

autores como Friedlander, Muggiati, Coelho e alguns artigos de jornais e

revistas publicados desde aquela época. Contribuem com elementos

fundamentais para a compreensão da Dança e Rock ‘n’ roll. Entretanto, apesar

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disso, faz-se necessário que a investigação se fundamente por meio de

recolhimento de dados históricos pautados no sentido de compreender o

fenômeno, como manifestação estética, artística e cultural relacionado com o

contexto sócio-histórico do Pós-Guerra.

A verificação investigativa do Rock ‘n’ roll se faz sob o recorte dos anos

50, para não incorrer em superficialidades. Isso possibilita uma análise do

Rock ‘n’ roll e sua Dança enquanto uma prática dos jovens inseridos nos

contextos estadunidense e brasileiro, de modo a perceber e compreender os

significados que a prática do Rock ‘n’ roll assume para a juventude da década

de 50.

O Rock ‘n’ roll surge como feito coletivo, atividade em cuja realização da

juventude se funde com a ação, emoção, desejo, rebeldia e contestação de

moldes predeterminados de valores conservadores, patriarcais e religiosos,

Reflete a impressão da época utilizando-o como matéria-prima, como

testemunha deste fenômeno nos anos 50 nos EUA e absorvido pelo Brasil

como produto cultural. Torna-se símbolo de ruptura, contestação e irreverência

que atinge a juventude na década de 50. Entretanto, a análise da Indústria

Cultural, percebe estes jovens apenas como consumidores, público alvo de

mudanças comportamentais e ideológicas, que afetam também a sociedade

conservadora com novos valores produzidos pelo fenômeno do Rock ‘n’ roll.

A partir da realização de um breve recorte cronológico, se busca indicar

um panorama histórico que permita uma melhor compreensão desse fenômeno

conhecido como Rock ‘n’ roll nos anos 50, também utilizado como memória

para documentar ao revivê-lo. Entretanto o convite à dança do Rock ‘n’ roll se

vale da representação dos fatos ocorridos, onde a juventude rebelde de

diversas classes sociais lhe imprimem seu próprio caráter.

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Desenvolvimento

O Rock ‘n’ roll surge após a II Guerra Mundial e a sua proposta era

contestar os velhos costumes da época. É um ícone da contracultura, mistura

elementos da música negra como o Blues e o Rhythm´n´Blues com a música

da sociedade branca, o Country e o Folk. Gênero musical este, a princípio,

sempre ligado à transgressão, em um momento em que a sociedade

americana da década de 50, principalmente no sul dos Estados Unidos,

ocorria uma forte segregação racial. O Rock inspirado em ritmos africanos

estava destinado a ser marginalizado.

Possivelmente ele serviu para evidenciar as idéias contestatórias da

juventude insatisfeita com o sistema cultural, educacional e político dos

Estados Unidos nos anos 50. Assim, o Rock ‘n’ roll, usando a guitarra, a

bateria, o contrabaixo e convidando para a dança rompeu com outras formas

musicais, sugerindo ritmo, melodia e volume diferentes deflagrando a

transgressão. Identificou assim, as rupturas dos padrões sociais que se

apresentavam na sociedade da época: a moda se transformava em algo

colorido, extravagante, desafiando os padrões da época; a sexualidade

apresentava-se de modo quase obceno pelos artistas. Assim, vários padrões

foram formulados, contestados e rompidos.

O movimento musical denominado Rock ‘n’ roll surgiu nos Estados

Unidos, nos anos 50 como um grito do negro, vindo da África como escravo. As

origens desse ritmo já haviam surgido há muito tempo, mas foi somente após a

Segunda Guerra Mundial que a musicalidade negra foi abraçada pela geração

americana. O Blues, significa triste, melancólico, advindo dos hematomas que

surgiam nos escravos devido à depressão que sentiam. Assim esta música

“doce-amarga” causou uma revolução sonora da década de 50 e fundou as

suas estruturas. (MUGGIATI,1973).

O Blues surge do encontro de tradições africanas e européias no sul do

EUA. Ao final do século XIX fundindo o seu grito com as canções de trabalho,

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os acordes dos hinos religiosos e a estrutura das baladas, o negro chegou ao

Blues. O grito era uma espécie de reconhecimento do ambiente em meio às

plantações de algodão. Simbolizava a comunicação do escravo. A proibição do

uso de instrumentos explica parcialmente o fortalecimento da tradição oral. As

canções de trabalho (work songs) refletem uma concepção diferente de

música: para o negro da África Ocidental, “a música e a dança não são

manifestações isoladas de arte e sempre foram usadas como uma função

estritamente comunitária”. (CHACON,1992).

Havia canções de jovens para conquistar moças, de mães para acalmar

filhos, de chefes para impor ordem na comunidade, de guerreiros para criar

coragem, de sacerdotes para influenciar sobre a natureza, de trabalhadores

para cadenciar e suavizar suas tarefas. Destas tradições surgem work-songs

nas plantations de algodão do sul do EUA, algumas em forma de pergunta e

resposta, o que animaria mais tarde o Blues e o Rock.

Em sua adaptação no continente americano, os escravos se convertem

ao cristianismo. Surgiram as Gospel Songs, hinos costurados com trechos da

Bíblia e work-songs, reforçando a recriação musical negra que daria origem ao

Blues, que estabeleceu uma ponte entre as work-songs do século XIX e o Rock

‘n’ roll dos anos 50 do século XX, legando para a posteridade elementos da

cultura africana, remodelados pela convivência européia nos EUA, o que se

estenderia para todo o mundo ocidental, seja pela força das redes de produção

e comercialização, seja pela imediata identificação corporal e das atitudes com

a juventude.

Produzido originalmente em pequenos estúdios do sul dos EUA, o Rock

‘n’ roll alcança um sucesso rápido e inesperado, muito além da capacidade

americana absorver ou aceitar o seu impacto. Seu sucesso é explicado pela

imediata simpatia que o ritmo provoca numa geração de adolescentes, brancos

e negros. Mas também, é explicado pelo rápido golpe comercial dos grandes

estúdios do Leste e Oeste dos EUA (RCA, Capitol, Mercury).

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O puritanismo sexual e o conformismo do vestuário são atacados sob os

aplausos de jovens que já procuram manter distância dos rígidos valores

tradicionais dos pioneiros norte-americanos do século XVIII. Trabalho,

preparação para o casamento, acúmulo de capital, patriotismo são substituídos

pela descontração, sensualidade, irreverência e liberdade de se divertir.

O convívio racial em festas, salões de dança e shows foi sem dúvida

uma vitória moral do Rock ‘n’ roll nos anos 50, já que havia quase um século

que os adultos se recusavam a tal convívio na sociedade. Entretanto, a quebra

de tabus morais e raciais provocam nos setores conservadores uma reação:

escândalos criados encerram carreiras, já desgastadas pelo sucesso

relâmpago, e versões adocicadas do Rock ‘n’ roll (Platters) são

cuidadosamente promovidas para ocupar o espaço de figuras desafiantes

como Little Richard e Chuck Berry. Afinal, o mercado não podia parar.

Chuck Berry, Bill Haley e os Everly Brothers gravaram músicas que

falavam do próprio rock e das dificuldades da vida dos adolescentes. Estas

músicas eram as mais apreciadas, pois as letras transmitiam valores novos.

Berry cantava que a escola era cansativa. Bill Halley desafiava todo mundo a

dançar, dançar, dançar.... Nos anos 50 não havia ataque direto aos valores

conservadores dominantes. (FRIEDLANDER, pág.398, 2006).

Chuck Berry, com a música “Rock ‘n’ roll Music” (novembro de 1957),

celebrava a música e seus vários componentes e os impulsos cinestésicos

para dançar, derivados do backbeat. Em “Sweet Little Sixteen” descrevia uma

garota implorando à mãe que convencesse o pai de que não há problema em

se divertir com a dança. Ao mesmo tempo, indica as ciladas de dançar o Rock

‘n’ roll com vestidos apertados e usando batom (id, 429, 2006).

A batida backbeat, centrada na batida rítmica 2/4 foi constante entre as

variáveis musicais. Com as raízes do Gospel ao Rock Clássico, passando pelo

R&B (marcado geralmente pela bateria) fornecia o contraponto Roll para o

acelerado Rock do baixo e outros instrumentos. Este era o ritmo que

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estimulava os corpos dos adolescentes a se mexer incontrolavelmente na

dança e ameaçava os padrões morais de seus pais. (id, 396, 2006).

A reação moralista atinge a carreira de Chuck Berry, acusado de raptar

uma jovem fã que lhe acompanhava em seu carro (ela era branca); atinge Jerry

Lee Lewis, envolvido em um escândalo por ter se casado com sua prima

adolescente. Little Richard não resiste à vida de astro e se refugia numa fase

mística.

O corpo tem suas razões. Elvis foi um fenômeno da expressão corporal.

O primeiro a usar não só a voz, gestos, rosto enquanto cantava, mas sim o

corpo todo – e o rock fica devendo isso a ele. A coreografia de Elvis era

demoníaca. Ainda é. Não era só uma questão de requebros ou passes. Era

uma coisa animal, inevitavelmente charmosa. Elvis imitava movimentos dos

performers negros, girava o traseiro, agarrava o microfone, caía de joelhos e

levantava o lábio superior dando seu famoso sorriso. Gerou milhões de

imitadores com topetes, blusões com a gola levantada, queixos enterrados no

peito e olhares raspando pelas sobrancelhas invadiu os EUA. (DIGESTIVO

CULTURAL, 2006)

Elvis serve o exército na Alemanha, no auge da Guerra Fria e foi o

melhor garoto propaganda que o exército americano poderia ter sonhado. Foi

absorvido pelo sistema, virou bom moço e namoradinho da América. Utilizou

um estilo único e inconfundível, criando sua versão do swing negro, com o

Blues, mexendo freneticamente quadris e pernas. O jeito sensual de dançar

chocou, passou por censura, fascinou, fez as mulheres delirarem e lhe rendeu

o apelido de “Elvis the Pelvis” (id, 2006).

Elvis era desejado pelas garotas, imitado pelos garotos, e odiado pelos

pais da garotada. Elvis incendiava platéias por onde passava com sua bela

voz, seu carisma de galã e seu inconfundível estilo de dança, inédita até então,

considerado indecente para os padrões da conservadora sociedade americana.

Esse jeito de dançar rendeu a ele o apelido “The Pelvis”, uma referência ao

conjunto de ossos que formam a cintura, a qual Elvis balançava

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freneticamente. Aos 21 anos instintivamente Elvis colocou toda sua energia na

performance de “Hound Dog”, tocada no início de forma acelerada e dançante,

e no final de forma bem lenta , sexy e insinuante.(id 2006)

Vozes conservadoras vindas da Imprensa, de grupos religiosos e da

sociedade, já se manifestaram contra o Rock & roll. Elvis havia trazido a

música dos negros aos lares americanos. Acusavam-no de ser imoral, um mau

exemplo para a juventude e um perigo para as recatadas filhas de família do

“american way of life”. O movimento anti Elvis crescia na mesma proporção que

a fama do rapaz de topete e costeletas que se vestia e dançava de maneira

espalhafatosa, culminando com a censura imposta a ele em sua terceira

apresentação na televisão. A censura federal determinou que Elvis fosse

filmado apenas da cintura para cima, para proteger os olhares de milhares de

famílias americanas de seus rebolados indecentes. Isto serviu para aumentar a

sua popularidade, e aumentar de maneira astronômica a audiência. (id Elvis

serve o exercito na Alemanha, no auge da Guerra Fria, Elvis foi o melhor

garoto propaganda com o exército americano poderia ter sonhado (id,2006)

Elvis, conduzido pelos seus empresários, ensaia uma “recuperação,”

afasta-se temporariamente para cumprir o serviço militar e volta com a imagem

de patriota, devotado aos velhos valores puritanos. Abandona os requebros e

ataca de “It´s now or never” e de “Love me tender”! E para completar, acasos

do destino retiram de cena cantores originais como Eddie Cochran.

Paralelamente, as rádios divulgam versões amenas do Rock, como “Let´s Twist

Again” (Trini Lopez), “Only You” (Platters) e a música dos Everly Brothers.

Nesta época a tradicional sociedade americana começou a ser

contestada pelos jovens, que foram rotulados de rebeldes sem causa: Mais do

que o cinema, a música e a dança canalizaram as idéias contestatórias dos

jovens, frente à insatisfação com o sistema cultural, educacional e político. O

Rock ‘n’ roll era o ritmo que iria acompanhar esse comportamento”. O Rock ‘n’

roll estava do lado oposto à postura tradicional e à manutenção das instituições

vigentes na época.

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O ‘Rhythm and Blues’ é a vertente negra do Rock. São quase

exclusivamente daí as origens do Rock. Reprimidos pela sociedade branca,

anglo-saxônica e protestante, os operários negros se refugiavam na música (o

Blues), e na dança para dar vazão, pelo corpo, aos protestos, que não eram

permitidos.(CHACON 1922) Os estilos de dança popular tornam-se mais

desenvoltos. Os negros criam o Twist que fazia parte da mesma proposta,

chamando a atenção do mundo todo no final dos anos 50, por um aspecto

inovador: as duplas não precisavam se tocar enquanto dançavam. Os pares

dançam juntos e obedecem a uma seqüência marcada de passos. Quem

tornou o ritmo conhecido foi Chubby Checker, que subia ao palco para

requebrar com os joelhos dobrados, e deslizava os pés de um lado ao outro,

sem retirá-los do chão.

Quem deu nome ao novo ritmo que surgia foi um disc-jockey americano,

Alan Freed, que se inspirou em um velho Blues. Ele foi um dos personagens

importantes para os primeiros momentos do Rock ‘n’ roll, pois passou a

divulgar eventos de Rock ´n Roll após o programa de música clássica que

mantinha em uma rádio em Ohio. Tudo começou quando Freed foi convidado

por um amigo a visitar uma loja de discos em que viu vários jovens dançando

ao som de uma música que até então ele nunca havia parado para ouvir: o

Rhythm and Blues.

Na América Latina não foi diferente, a contestação e a rebeldia eram

representadas nessas músicas que fascinavam multidões: “Surgiu na América

Latina como um movimento da contracultura que utilizava muito a temática

sexual para manifestar sua rebeldia, figuravam convites à dança e ao amor

(não necessariamente ao casamento), descrições de carros e de garotas,

histórias de colégio e dramas da adolescência”. O Rock surge, então, como um

movimento da contracultura, já que as suas manifestações iam de encontro aos

valores da época.

O Rock chega ao Brasil em 1955, quando Nora Ney grava a versão

Rock Around the Clock. A primeira estrela nacional do gênero é Celly Campelo

(1942-) que lança no início dos anos 60, Banho de Lua e Estúpido Cupido. Na

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mesma época o Rock se populariza com outras versões de sucessos norte-

americanos, por Nick Savoia e Ronnie Cord (1943-). A partir de 1965 Roberto

Carlos, Erasmo Carlos e Wanderléia tornam-se os expoentes da Jovem

Guarda, variação do Rock. Em 1966, os Mutantes revelam Rita Lee. Embora

este período seja caracterizado por uma expressiva diversidade de gêneros

musicais, essa opção de recorte foi no intuito de evitar incorrer em

superficialidades.

Nos anos 50, o Brasil perdia a copa do mundo (1950), morte de Getúlio

Vargas (1954), morte de Carmem Miranda (1955), presidência de JK em 1956,

entretanto em 24 de outubro de 1955 algo mudou completamente a vida dos

jovens e todas as gerações seguintes... Nora Ney grava a versão de “Rock

around the clock”, surge o rock brasileiro, que será popularizado nos anos 60

como iê iê iê. Ela exerceu papel relevante no rock brasileiro na medida em que

despertou na juventude brasileira ainda não transviada a percepção para

jornais, revistas e programas de rádio que apresentavam os reis do rock Chuck

Berry, Jerry Lee Lewis, Little Richard, Elvis Presley. Com o auxílio do cinema e

seus artistas perniciosos, Marlon Brando e James Dean bombardeavam e

moldavam toda uma geração.

Revistas como “O Cruzeiro”, “Revista do Rádio”, e as “Seleções do

Reader Digest” apresentavam o rock de modo nu e cru, isto é, guitarras

gritando, pianos enlouquecidos, voz e quadris dançando em sintonia com o

ritmo, teatros lotados por platéias dançantes. O Brasil surpreendido se divide

entre os pais repressores e a juventude insana, ansiosa pela igualdade e

excitação que o Rock ‘n’ roll proporciona. O Rock ‘n’ roll era a trilha sonora da

década.

Em 1956, ao assumir a presidência, JK prometia desenvolver o Brasil

“50 anos em 5”. Brasília se construiu em 3 anos, a indústria automobilística foi

implementada. No cinema estreou o filme “Rock Around the Clock”, que

apresentou também as músicas “Only You” e “See You Later Alligator" nas

paradas de sucesso. Igual sucesso se repetiu com “O Selvagem” (Marlon

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Brando) e “Juventude Transviada” (James Dean). Rapidamente a juventude

incorpora esses modelos de comportamento vindos dos EUA.

A década de 50 foi marcada por contrastes. Sonhos rebeldes de

gangues de motocicletas ou lambretas, tênis, camiseta branca e blusão de

couro. Os ternos, as saias rodadas, meias de seda, foram cedendo lugar às

costeletas, topetes, jeans apertados, tênis conga, rabo de cavalo, goma de

mascar ping pong. Este comportamento da juventude mostrava uma rebeldia

ingênua, imitada dos ídolos do cinema como James Dean e Marlon Brando,

que apresentava um clima de delinqüência juvenil. O visual , o ritmo alucinante

e a música de incendiar, mexia com os quadris, a cabeça e fascinavam a

juventude.

Não existiam roqueiros brasileiros legítimos no Brasil, nesta época. Tudo

era assimilado e reproduzido com o “jeitinho brasileiro” pelos músicos. Assim o

rock nacional começava a ganhar cantores brasileiros com nomes

“americanos”, roupas chamativas, espalhafatosas e produzidas. De modo

contrário, dos rebeldes sem causa que apavoravam os EUA, as gravadoras

brasileiras se concentraram na procura de rapazes de bem e moças de família

para iniciar o rock no Brasil.

Tonny e Celly Campelo lançam seu primeiro disco, com as versões de

“Perdoa-me” e “Belo Rapaz”. Estrearam na TV TUPI, em São Paulo, e por mais

dois anos apresentaram o programa Celly e Tonny. Em HiFi, também

conhecido por Crush HiFi na TV Record. Celly e Tonny foram considerados reis

do rock. Em 1958 se formaram os “Golden Boys”, cuja participação expressiva

se manifestou na Jovem Guarda. A Revolução Cubana inspirou o surgimento

de um drink, no mínimo original, a mistura de rum (Cuba) com coca-cola (EUA),

para concorrer com o HiFi (vodca com suco de laranja, e após, com crush).

Ao final da década de 50, programas de rádio invadiam o país

divulgando o som pop dos EUA. Muito mais que o cinema, a televisão divulgou

a cultura do rock no Brasil. Acessórios indispensáveis a este comportamento

eram a lambreta, óculos escuros, cuba livre, camisetas para impressionar os

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“brotos”, e outras modas na juventude brasileira. A mudança ocorreu porque a

TV, do mesmo modo que o carro, eram objetos de consumo inacessíveis a

todas as classes sociais. O acesso a esses bens era limitado às famílias mais

abastadas, porém a parafernália eletrônica para propiciar conforto e bem estar

já se encontravam no Brasil no fim dos anos 50, como ventiladores, batedeiras,

liquidificadores, refrigeradores, etc. Assim como os supermercados e os

enlatados. O que se pregava na época, o modelo era “se é bom para o EUA é

bom para o Brasil”. Desse modo, claro que o rock surgiria por aqui como

música popular dominante na década de 50.

Em 1957 em 16 de janeiro o então prefeito de São Paulo, Jânio

Quadros, proíbe o Rock ‘n’ roll nos bailes. Mandou prender quem se

manifestasse histericamente durante as exibições públicas do filme No Balanço

das Horas. A rapaziada pulava nas poltronas, rasgava as cortinas, batia os pés,

assoviava, ousava levantar as saias das garotas,enfrentar os seguranças e

desafiar a policia para dançar Rock ‘n’ roll nas ruas e calçadas.Jânio Quadros

proibiu a execução de músicas do estilo Rock ‘n’ roll nos bailes públicos do

estado. A razão era a reação descontrolada dos jovens esse tipo de música.

Proibidos de fazê-lo em público, os paulistas continuam a dançar o ritmo do

Rock ‘n’ roll, nas festas particulares e se comportar de acordo com os moldes

da juventude transviada, com seus casacos de couro e suas lambretas

.(FOLHA.BANCO DE DADOS).

Surge neste mesmo ano no Rio de Janeiro uma das primeiras bandas de

rock verdadeiramente nacional , denominada “Turma do Matoso”. Ouviam o

som de Elvis, Chuck Berry e Little Richard. O nome da banda muda para “The

Sputnicks”, cuja formação consistia em Tim Maia, China, Arlênio, Trindade,

Erasmo e Roberto Carlos. Entretanto, em 1958 houve a dissolução da The

Sputnicks. A Jovem Guarda surge no final dos anos 50. Roberto Carlos canta

“Tutti Frutti”, de Little Richard no programa Teletur da TV TUPI. Logo seria

contratado e trilhava como rei do iê iê iê.

Quando os anos 50 terminaram o Brasil tinha perdido a sua

característica inocente e ingênua, apesar de ter ingressado na sociedade de

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consumo, através do surto desenvolvimentista de JK, as desigualdades sociais

começavam a aumentar de maneira vertiginosa. Na música do final dos anos

50, isso ainda não era perceptível, entretanto no cinema, arte e literatura sim. A

mudança de valores, então passa a enfatizar temas diferentes àqueles do Rock

‘n’ roll dos anos 50.

Na década de 60 sentia-se uma mudança no ar e tudo se alterou com a

chegada em 1961 do “Let´s Twist Again”, de Chubby Checker. Reprovada

como uma dança imprópria, foi ganhando cada vez mais força. Fácil de

aprender, divertida de dançar no seu ritmo característico, jovens e velhos

dançavam o Twist toda noite. O Twist trouxe consigo uma nova idéia: os

dançarinos não precisavam ter parceiros, as meninas não tinham que esperar

quem as convidassem para dançar; toda a gente podia se juntar e dançar. No

início havia figuras facilmente reconhecíveis, mas à medida que se enraizou o

Twist, foram se desenvolvendo inúmeras variações até o estilo de cada um se

tornar pessoal e único. A influência do Twist espalhou-se: os vestidos eram

feitos com pequenas tiras que brilhavam quando os dançarinos se abanavam;

os modelos posavam em linhas Twist; Havia queixas de músculos doloridos e

dores nas costas, mas a sua popularidade era suprema.

Em fins de 1950, o Rock ‘n’ roll já podia se considerar como um

produto inserido no sistema cultural. A postura de diversos setores da

sociedade havia mudado em relação ao Rock: de maldito, condenado pelos

conservadores, agora era objeto de consumo de boa parte da população jovem

tanto do Brasil quanto dos EUA.

O rock foi chegando devagar no Brasil, para se estabelecer se fixar

como uma epidemia que atingiu o país inteiro. Todos pediam Bill Halley, Elvis

Presley, Little Richard, etc. As gravadoras lançaram discos rapidamente, para

aproveitar do modismo e faturar com a Indústria Cultural que o Rock ‘n’ roll

permitia. O incessante desenvolvimento da tecnologia, torna o Rock ‘n’ roll

cada vez mais sofisticado, principalmente nos meios de comunicação

(fotografia, fonografia, cinema, rádio, televisão, etc).Ele passou a atingir um

grande número de pessoas, dando origem a chamada cultura de massa,

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ditando comportamentos, a partir de modelos mìticos como representação

coletiva produzida e difundida maciçamente pela mídia.

Com a explosão demográfica e expansão econômica dos EUA, durante

e após a II Guerra Mundial, a população jovem estadunidense aumentou

consideravelmente. Apesar do progresso e da industrialização, a sociedade

norte-americana permaneceu com valores morais arcaicos e preconceituosos,

criando um vazio e uma insatisfação na juventude, principalmente da classe

média.É nesse contexto que surge na juventude ocidental uma nova cultura,

reflexo de tendências comportamentais de revolta, expressa principalmente

pela música e pela dança. A partir disso começa a se configurar a formação de

um mercado consumidor que fortaleceu a Indústria Cultural, constituído

basicamente por jovens de diferentes classes sociais.

Embora estivesse inicialmente fora dos padrões preconizados pela

sociedade estabelecida, caracterizada por ser patriarcal, conservadora e

moralista, a cultura jovem passou a ser devidamente assimilada e

comercializada pela Indústria Cultural, que a divulgou através dos meios de

comunicação, tornando-a universal. O Rock ‘n’ roll então se propagou

rompendo com os dogmas pregados pela família, escola, igreja e outras

instituições.

Apesar dessa comercialização, foi somente a partir dos anos 60 que a

juventude passou a apresentar críticas mais contundentes à sociedade

moderna, não só negando seus valores, mas tentando criar e vivenciar um

estilo de vida alternativo e coletivo, contra o consumismo, a industrialização

indiscriminada, o preconceito racial, as guerras, etc.

A Indústria Cultural tem uma característica específica do mundo

capitalista. Insere na produção de objetos de consumo, a arte em várias

modalidades, como produto a ser consumido, isto é, a arte é um produto

voltado para uma Indústria Cultural. (ADORNO, 1997).

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Adorno afirma que a cultura de massas é produto da Indústria Cultural. A

Indústria Cultural é uma produção direcionada para o consumo das massas

segundo um projeto pré-determinado e estabelecido, seja qual for a

modalidade, aqui, o Rock ‘n’ roll nos anos 50. Há uma estrita relação entre

produção e consumo. A produção determina o que deve ser consumido e vice-

versa.

A inter-relação, em termos culturais, faz com que o Rock ‘n’ roll

culturalmente produzido se pareça com qualquer produto industrializado. Existe

toda uma estratégia para que este produto alcance o público consumidor. Não

interessa à Indústria Cultural a que modalidade pertença, desde que se gere

nas massas a necessidade de consumo, chegue às massas, manipulando de

modo gigantesco os meios de comunicação pelos produtores, a fim de criar no

público-alvo principal, o jovem, novas necessidades de consumo e ainda de

novos produtos, como: mais músicas, mais discos, mais brilhantina, mais

jaquetas de couro, mais calças jeans, mais goma de mascar ping pong, mais

tênis conga, mais óculos de gatinhos, mais meias soquete, isto é, o

comportamento rebelde que identifique todos como sendo um só, sem

escolher, ouvir, vestir ou dançar algo diferente.

A intenção da Indústria Cultural, espalha uma névoa na percepção das

pessoas, isto é intencional principalmente por aqueles que formam opiniões.

Ela é a própria ideologia. Os valores passam a ser regidos por ela. Até a

intensidade da felicidade do jovem é influenciado e condicionado por esta

cultura. A Indústria Cultural alimenta nos jovens necessidades, não as básicas

(primárias ou secundárias), mas sim a necessidade de consumir

incessantemente. O jovem consumidor sempre estará insatisfeito, querendo

consumir constantemente. Assim o consumo se torna cada vez maior. O desejo

de posse é alimentado e renovado pelo progresso técnico e científico das

gravadoras, de modo que torna-se quase impossível se libertar desta realidade

uma vez que os apelos são inúmeros e convincentes.

O Rock ‘n’ roll feito em série industrialmente, para um grande número,

passa a ser visto não como instrumento de crítica e conhecimento, mas como

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produto trocável por dinheiro e que deve ser consumido como se consome

qualquer coisa... produto padronizado, como uma espécie de kit para montar,

feito para atender necessidades e gostos médios de um público que não tem

tempo de questionar o que consome. (COELHO, pág. 10, 1989). Porém, para

Adorno existe uma solução, observar a própria cultura do homem: a limitação

do sistema e a estética, ou seja, a arte. Segundo Adorno, a arte possibilita ao

homem se libertar e gozar de certa autonomia, e desse modo torna-se em ser

humano, com coração humano e não coração-máquina.(ADORNO, 2002)

Enquanto na Indústria Cultural o homem é mero objeto de trabalho e

consumo, quando faz Arte é um ser livre que pensa, sente e age. A Arte é algo

perfeito que solta as amarras da ideologia encontrando dentro dela uma

maneira de limitá-la, ou seja, a limitação e a arte na própria Indústria Cultural.

Os valores foram deixados de lado em troca do interesse econômico. O que

rege a sociedade é a lei do mercado. O jovem que não conseguisse

acompanhar este ritmo e essa ideologia de vida era considerado fora de seu

tempo, ou seja, à margem da sociedade. Isto é fruto da Indústria Cultural. (id

2002)

Adorno afirma que tudo na Indústria Cultural se torna negócio. Desse

modo, percebe-se de maneira programada, sistemática, orientada, para

explorar os bens culturais. O Rock ‘n’ roll, que antes manifestava rebeldia,

contestação e era um modo de lazer e divertimento, nutriu a percepção de que

era um meio extremamente eficaz de manipulação, exercendo uma função

específica, em que através da Indústria Cultural traduz-se em sentimento para

todo o sistema. O jovem, na Indústria Cultural, é um mero instrumento de

trabalho e consumo, isto é, um objeto. Ele é manipulado e ideologizado de tal

modo que até o seu lazer se torna uma extensão do trabalho. O consumidor

não precisava se dar ao trabalho de pensar, era só escolher qual artista,

música ou dança desde que fosse Rock ‘n’ roll. Aplicava-se assim ao fim a que

se destina, ou seja, nada escapa à voracidade da Indústria Cultural. (id 2002)

O Rock ‘n’ roll estava ligado a um grupo social específico, a juventude. Era

transmitido de maneira industrializada para um público generalizado, de

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diferentes camadas sócio-econômicas. Ocorria a formação de um enorme

mercado de consumidores em potencial, atraídos pelos produtos oferecidos

pelo Rock ‘n’ roll. Esse mercado caracterizava-se pela chamada sociedade de

consumo. Com a industrialização dos elementos da cultura popular, o

produto cultural se apresentava de uma forma esteticamente nova e diferente.

Para a difusão do Rock ‘n’ roll utilizou-se dos meios de comunicação para o

seu lançamento, isto é, produto em grande quantidade e, depois, induzia os

jovens a consumirem esse produto, apelando para outras razões além de seu

valor artístico. Ao divulgar produtos culturais de diferentes origens, possibilitou

o seu conhecimento por jvens de diferentes camadas sociais de maneira

atraente, voltada para o consumo generalizado da sociedade jovem.

Na Europa e EUA, no final da década de 50, os jovens próximos de

atingir a maioridade não tinham motivos para se orgulhar da civilização

ocidental: duas guerras ocorreram antes do seu nascimento. Conflitos regionais

ocorreram ou ainda permaneciam, deixando mortos ou inválidos. A convivência

com a presença desastrosa de seus países: EUA na Guerra da Coréia (1950-

1953) e a Guerra do Vietnã (1956-1975); a França nas guerras da Indochina

(1945-1954); Inglaterra contra a desobediência civil de Mahatma Gandhi; e

auge do capitalismo que aparentemente não empolgava a juventude. Nos EUA

o racismo dos adultos procurava separar jovens brancos e negros, unidos pelo

som do Rock desde os anos 50. Mesmo para os filhos da classe média que

passou o Pós-Guerra acumulando bens para oferecer um futuro seguro, as

perspectivas de realização pessoal não eram atraentes. Não havia sentido

seguir os passos dos pais, significando assim a restrição da existência ao

mundo individualista de um emprego estável, casamento e ideais patrióticos.

Do bloco socialista poucas informações confiáveis atravessavam a

cortina de ferro da Guerra Fria, algumas nada animadoras: invasão soviética

em países socialistas que buscavam seu próprio caminho, como a Hungria

(1956) e a Tchecoslováquia (1958). Qual a direção o jovem deveria seguir?

Propostas sedutoras se apresentaram aos garotos do mundo: ouvir e dançar

Rock ‘n’ roll, comunidades alternativas, onde compartilhar era a senha de

convivência, como os hippies da costa oeste dos Eua; militância política para

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derrubar o racismo (Black Panthers, Martin Luther King); ou para derrotar o

próprio país, agente agressor internacional (pacifismo); reencontro com a

natureza popular e folclórica de sua nação; busca de experiências místicas e

psicodélicas.

As novas experiências juvenis, algumas desconcertantes, outras

autodestrutivas, outras ainda extremamente subversivas e combatidas, tinham

em comum a rejeição da cultura tradicional, daí serem rotulados de

contracultura, conjunto das manifestações artísticas, existenciais e culturais

características da revolta contra as instituições, os valores, os hábitos, as

hierarquias e as tradições dominantes da sociedade.

Com isso, essa juventude mais crítica e politizada nega a cultura

vigente, até então sustentada e manipulada em sua maior parte pela Indústria

Cultural. Essa reação jovem é conhecida como contracultura, simbolizada

principalmente pelos hippies no final dos anos 50 e década de 60.

Mesmo opondo-se à industrialização da cultura, é através da Indústria

Cultural que esses movimentos jovens acabam se expandindo e se deixando

assimilar. Por um lado, introduzem temas e questões até então ignorados ou

pouco discutidos pela maioria da sociedade, como por exemplo, drogas, sexo,

racismo, ecologia e pacifismo. Por outro lado, evidenciam o aspecto

transformador da cultura jovem que, expressando uma visão crítica da

realidade, acaba por modificá-la, mesmo estando submetida a um rígido

processo de industrialização e comercialização.

O Rock ´n Roll, símbolo de ruptura, de contextação e de irreverência

acabou despertando grandes iras e desgostos nos defensores e

representantes maiores do discurso conservador, ou seja, no clero (católico e

protestante) e em toda a comunidade puritana. O Rock passou a ser

considerado por muitos como a ruína dos ditos bons costumes, a perdição dos

jovens e de todos aqueles que o ouvissem. “Qualquer pai ficaria horrorizado e

chocado ao saber que seus filhos estão ouvindo uma música dessas”. O Rock

‘n’ roll começou a se popularizar ao final dos anos 50 e a destruir os valores

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cristãos. Para os conservadores, a civilização ocidental esteve sob a mira de

um plano deliberado de guerra cultural, com o propósito de eliminar a herança

cultural judaico cristã. (CIAPPINO 2006)

A linguagem do Rock passa a ser observada como um espaço histórico-

ideológico de onde eclode significado através de sua materialidade. O sentido

do Rock é percebido na medida em que contesta o aspecto religioso, jurídico,

ateu, travando-se, assim, uma luta ideológica, isto é, a luta pelo sentido,

contestando a ordem autoritária de poder, que propõe verdades absolutas

como os da educação, da mídia, da ciência, da política, etc.( id 2006)

È indiscutível a contribuição e a relação do Rock ‘n’ roll nas mudanças

de novos padrões comportamentais que se sucederam a partir dos anos 50.

Este movimento marca uma divisão provocando mudanças comportamentais e

ideológicas com seus músicos rebeldes desvairados e contestadores, ou seja,

se constroem sentidos de contestação, afronta e ruptura com a moralidade

cristã. O Rock ‘n’ roll é entendido como manifestação estética, como espaço

histórico-ideológico de onde os sentidos surgem por meio de sua manifestação.

O significado é produzido por sujeitos que ocupam posições, as quais são

determinadas, por sua vez, por reais condições de existência, isto é, são

posições de sujeitos estabelecidas em uma região social, histórica, ideológica e

cultural. As condições sociais, podem, entre outras, ser de classe,

paralelamente as condições de produção definem e organizam a sociedade

determinando o modo com que cada um produz sentido sobre determinados

acontecimentos. Determinam a posição com a qual o sujeito vai se identificar,

determinado por suas reais condições de existência.

Passaram-se meses até a definição do tema para este artigo. A única

certeza é que seria sobre Dança. Isto não restringia meu objeto, já que o

campo da Dança é vasto. Com as leituras o tema foi surgindo. Apaixonada pela

Dança veio a decisão, seria História e Dança: perspectiva de produção

historiográfica com base na manifestação estética do Rock ‘n’ roll nos anos 50.

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As questões surgiram antes do projeto, durante as leituras de referência,

porém as prioridades foram se definindo para o âmbito teórico porque a Dança

faz parte da minha prática pedagógica a alguns anos. A Dança expressa a

brasilidade, através da diversidade cultural de que o Brasil é formado. A Dança

possui conteúdos históricos, sociais e políticos, ou seja, práticas levadas a

efeito por sujeitos históricos em contextos sócio-históricos determinados.

Considerando a inserção de tais sujeitos no seu universo e a diversidade

cultural, expressos pelo movimento do corpo, investigar a memória da dança,

faz sentido aos alunos para que possam aprender através da pesquisa “para

poder mostrar”, experimentando novas formas de expressão que não são

possíveis demonstrar por meio das palavras. A prática pedagógica permite,

através da pesquisa da memória da Dança, trabalhar História de modo

interessante, produtivo e significativo.

A Dança contribui para reforçar laços de amizade, trabalhar, conhecer o

grupo e conhecer a si próprios de outra maneira, enfatizando a importância da

auto-estima, envolvendo a família no desenvolvimento do processo, facilitando

a compreensão da revelação do cotidiano, das ações, atitudes, hábitos mentais

e rituais que indicam ocasiões especiais na vida dos indivíduos e das

comunidades, relacionando sua vida cotidiana à memória e à dança,

mostrando como de fato fazem parte da História.

A investigação da História da Dança e o registro da memória de

referenciais relevantes, sobre a Dança como criação artística e referencial de

memória, para compreender o real sentido e significado da Dança como

manifestação cultural. O exercício da memória e da cidadania garantem a

continuidade da memória da Dança enquanto manifestação cultural e seus

diversos modos de criar composições coreográficas.

O trabalho com a Dança estimula a memória dos alunos e das pessoas

historicamente vinculadas à comunidade, contribuindo para garantir sua

identidade cultural, proporcionar bem-estar, melhorar sua qualidade de vida,

auto-estima, inclusão, solidariedade, amizade, responsabilidade, respeito,

gosto pela pesquisa em aprender, experimenta, investigar e utilizar diversos

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estímulos para criar composições coreográficas de memórias obtidas através

de: notícia de jornal, poesia, literatura, História, emoções, sentimentos, mitos,

obras de arte, quadros, esculturas, elementos de movimento, sons e silêncio,

etc.

A primeira pergunta era como transportar a prática pedagógica utilizada

para tornar as aulas de História interessantes, de modo a alterar a perspectiva

do uso da Dança utilizada até então.

Os referenciais teóricos possibilitaram perceber o significado de um

determinado contexto sócio-cultural a ser investigado e tomar como objeto de

análise a manifestação estética do Rock ‘n’ roll na década de 50.

O modo de observar a relação entre Dança e História nesse caso é mais

do que mera ilustração. Implica em utilizar a memória da dança enquanto uma

prática dos sujeitos inseridos em contextos sócio-históricos do EUA e do Brasil

na década de 50, de modo a possibilitar a compreensão dos significados que

esta prática assume para os mesmos, assim se fez necessário investigar a

relação do Rock ‘n’ roll dos anos 50 com a Indústria Cultural.

Conclusão

A investigação, apesar da escassez de registros documentais sobre a

Dança do Rock ‘n’ roll, permitiu a percepção de que o Rock ‘n’ roll se tornou

símbolo de ruptura e mudança. Novos padrões de comportamento foram

revelados pela juventude rebelde e contestatória da década de 50, que se

tornou público alvo das estratégias de consumo da Indústria Cultural.

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Os valores conservadores e patriarcais no contexto sócio-histórico do

Pós-Guerra se tornaram sem sentido, e são substituídos pela descontração,

sensualidade e liberdade de se divertir. O cinema estadunidense apresenta o

Rock ‘n’ roll ao Brasil, que não permaneceu estanque e evoluiu para o iê iê iê,

absorvendo o Rock ‘n’ roll pela influência sócio-histórica de cada década.

Torna-se relevante sugerir novas investigações ou suscitar novas

discussões de estilos e décadas que consagraram o Rock ‘n’ roll, onde cada

década contribui para a construção da outra. A comunicação próxima do Rock

‘n’ roll, não elimina a história anterior de nenhuma década, pois esta poderá

servir de estímulo, suporte ou princípio para investigar o Rock ‘n’ roll nas

décadas de 60, 70, 80, 90...

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Resumo feito por André Heavyman Morize, com base em textos de José Júlio do Espírito Santo e Adriana Magalhães, Revistas Pop Rock, Revistas o Cruzeiro, capas e contracapas de discos e jornais antigos.

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