HISTÓRIA E MEIO AMBIENTE: DESCOBRINDO O PASSADO PARA VIABILIZAR O FUTURO

download HISTÓRIA E MEIO AMBIENTE: DESCOBRINDO O PASSADO PARA VIABILIZAR O FUTURO

of 21

Transcript of HISTÓRIA E MEIO AMBIENTE: DESCOBRINDO O PASSADO PARA VIABILIZAR O FUTURO

  • 8/6/2019 HISTRIA E MEIO AMBIENTE: DESCOBRINDO O PASSADO PARA VIABILIZAR O FUTURO

    1/21

    HISTRIA E MEIO AMBIENTE: DESCOBRINDO O PASSADO PARAVIABILIZAR O FUTURO1-2

    Vlademir Jos Luft3

    RESUMO: Falar em histria , antes de mais nada, falar em natureza e por conseqncia em sociedadeshumanas. assim que antes de darmos conta dos grupos sociais com os quais temos nos ocupado, devemosconstruir os conceitos a partir dos quais os pensamos. Baseados nisto e de posse de conceitos diversos,estamos trabalhando no Programa Arqueolgico Puri-Coroado, com o intuito de reconstituir as sociedadesindgenas que pela regio de Visconde do Rio Branco, Zona da Mata de Mineira, circulavam at meados dosculo XIX, quando da chegada, em massa, do elemento branco e da destruio definitiva de sua natureza,seja a da sociedade, seja a de seu meio ambiente.PALAVRAS-CHAVE: Arqueologia, Histria, Meio-Ambiente

    Apresentao

    Falar em histria , antes de mais nada, e necessariamente, falar em natureza e por

    conseqncia em sociedades humanas. assim que antes de darmos conta dos grupos

    sociais com os quais nos ocupamos como objeto de trabalho, alguns dos grupos indgenas

    historicamente denominados como Puri, Coroado e Corop, devemos construir os

    conceitos a partir dos quais os pensamos. O primeiro, e principal deles, o de natureza,

    pensado a partir de concepes construdas em Marx4, Engels5, de Kosik6, Whitehead7,

    Fleischer8, Jameson9, Habermas10, Morin11, Chartier12e Quaini13, entre outros, onde o

    1 - Este artigo uma verso revisada do texto apresentado, e no publicado, no XXIII Simpsio Nacional de Histria, realizado em julho de 2005 em Londrina - PR

    2 - Editora UNIVALE E-Book, Histria, Natureza e Territrio. Coletnea de Histria Ambientalapresentados nos simpsios temticos: Historia, meio ambiente e sociedade & histria ambiental: balanos eperspectivas, durante o XXIII Simpsio Nacional de Histria, da ANPUH, na Universidade Estadual deLondrina, no perodo de 17 a 22 de Julho de 2005, tendo como organizadores: Haruf Salmen Espindola eGilmar Arruda, disponvel em http://www.univale.br/sites/editora/e_books/listar.asp?codgrupo=633 - Bahcarel em Arqueologia, Mestre em Histria do Brasil e Doutor em Histria Social; Diretor e Pesquisador do Centro Regional de Ensino e Pesquisa Palmyos

    Paixo Carneiro; Coordenador do Programa Arqueolgico Puri-Coroado, Professor do Centro Universitrio Moacyr Sreder Bastos; [email protected] -

    [email protected]

    4 - Marx, Karl. Contribuio crtica da economia poltica, editora Martins Fontes, coleo Novas Direes, So Paulo SP, 1983

    5 - Engels, Friedrich. A dialtica da natureza, editora Paz e Terra, coleo Pensamento Crtico, volume 8, 4a edio, Rio de Janeiro RJ, 1979

    6 - Kosik, Karel. Dialtica do concreto, editora Paz e Terra, coleo Rumos da Cultura Moderna, 4a edio, Rio de Janeiro RJ, 1976

    7 - Whitehead, Alfred North. O conceito de natureza, editora Martins Fontes, Coleo Tpicos, So Paulo SP, 1994

    8 - Fleischer, Helmut. Concepo marxista da histria, edies 70, coleo Lugar da Histria, Lisboa Portugal, 1978

    9 - Jameson, Fredric. O marxismo tardio: Adorno, ou a presistncia da dialtica, editora UNESP, coleo Biblioteca Bsica, So Paulo, 1997

    http://www.univale.br/sites/editora/e_books/listar.asp?codgrupo=63http://www.univale.br/sites/editora/e_books/listar.asp?codgrupo=63http://www.univale.br/sites/editora/e_books/listar.asp?codgrupo=63
  • 8/6/2019 HISTRIA E MEIO AMBIENTE: DESCOBRINDO O PASSADO PARA VIABILIZAR O FUTURO

    2/21

    homem, fruto de sua evoluo biolgica capaz de construir-se socialmente e com isso

    produzir seu modo de vida, a partir do conhecimento do meio que o circunda. desta

    forma que Marx e Engels14

    nos falam de que

    A histria pode ser considerada de dois lados, dividida emhistria da natureza e histria dos homens. No entanto, esses doisaspectos no se podem separar; enquanto existirem homens, ahistria da natureza e a histria dos homens condicionam-semutuamente. p. 11

    Baseados nesta concepo, ou seja, de que, antes de mais nada, somos um produto

    da natureza e de que ao vivermos, vivemos nela e no ela a partir de ns, e de posse de

    conceitos como histria, dialtica, totalidade, patrimnio e natureza, estamos trabalhando,

    no Programa Arqueolgico Puri-Coroado, em seu projeto Arqueologia e Meio Ambiente15,

    de forma interdisciplinar, com o intuito de reconstituir as sociedades indgenas que pela

    regio de Visconde do Rio Branco, Zona da Mata de Minas Gerais, circulavam at meados

    do sculo XIX, quando da chegada, em massa, do elemento branco e da destruio

    definitiva de sua natureza, seja a da sociedade, seja a de seu meio ambiente.

    A nossa inteno ao propormos este trabalho no Simpsio Histria, Meio Ambiente

    e Sociedade, coordenado pelo professor Haruf Salmen Espindola, no XXIII Simpsio

    Nacional de Histria, realizado em Londrina PR em julho de 2005, est suportada

    ... pelo fato de considerarem, especialmente o meio ambiente, naanlise das sociedades humana ...

    10 - Habermas, Jurgen. O futuro da naturaza humana, editora Martins Fontes, Coleo Tpicos, So Paulo SP, 2004

    11 - Morin, Edgar. O mtodo 1. a natureza da natureza, editora Sulina, 2a edio, Porto Alegre - RS, 2003

    12 - Chartier, Roger. A histria cultural, entre prticas e representaes, Difel editora, coleo Memria e Sociedade, Lisboa Portugal, 1990

    13 - Quaini, Mximo. Marxismo e geografia, editora Paz e Terra, coleo Geografia e Sociedade, volume 1, Rio de Janeiro RJ, 1979

    14 - Marx, Karl e Engels, Friedrich. A ideologia alem, editora Moraes, So Paulo SP, 1984

    15 - deste projeto tambm fazem parte as professoras Dra. Mrcia Gomide da Silva Mello e Ms. Mnica Armond Serro

  • 8/6/2019 HISTRIA E MEIO AMBIENTE: DESCOBRINDO O PASSADO PARA VIABILIZAR O FUTURO

    3/21

    conforme o que fazemos e acreditamos, baseados nos autores acima indicados, de que

    fazer Histria antes de mais nada buscar as sociedades e entend-las em seu meio.

    Portanto, vamos aqui propor e questionar alguns procedimentos e entendimentos buscando

    a troca de informaes e conhecimentos. A respeito disso, vale lembrar das sugestes de

    Silva16, onde,

    ... cabe ao historiador deixar alguns pr-conceitos de lado eaproximar o meio ambiente das relaes sociais por este vincular-

    se diretamente s aes empreendidas pelo homem.,

    bem como de que

    ... no podemos perder de vista as transformaes sofridas pelohomem no seu fazer histrico, assim como sua relao com anatureza ao longo do tempo.

    Baseados nesta concepo, conforme j dissemos, percebemos que podem existir

    duas formas de ver a natureza. A primeira pelo fato de a mesma existir, independente da

    presena do homem e neste caso somos um sub-produto dela, ou seja, somos um de seus

    elementos. Sobre isto, Whitehead17 diz que

    ... em determinado sentido, portanto, a natureza independe dopensamento. .

    16 - SILVA, Andra Cristina Fontes. Ecossistema como relao social ?, trabalho apresentado no XXIII Simpsio Nacional de Histria, Londrina PR, 17 22 de julho

    de 2005

    17 - Op. Cit.

  • 8/6/2019 HISTRIA E MEIO AMBIENTE: DESCOBRINDO O PASSADO PARA VIABILIZAR O FUTURO

    4/21

    A segunda forma de vermos a natureza pelo fato de somente existir quando

    pensada pelo homem que a esta construindo, histrica e socialmente, no tempo e no

    espao. Neste caso, o mesmo Whitehead18

    diz que

    ... a natureza aquilo que observamos pela percepo obtidaatravs dos sentidos.

    Esta nossa proposta baseia-se, portanto, na preservao do patrimnio cultural e

    natural, dentro de uma viso dialtica, considerando os seus diversos elementos

    constituintes, a partir dos quais acontece a evoluo das espcies animais, dentre as quais

    est o homem, e vegetais. Para tanto, a conexo com a Histria e a Arqueologia, atravs do

    Programa Arqueolgico Puri-Coroado, cujo desenvolvimento esta a cargo do Centro

    Regional de Ensino e Pesquisa Palmyos Paixo Carneiro (CREP), com o apoio da

    Prefeitura Municipal de Visconde do Rio Branco e do Museu Municipal de Visconde do

    Rio Branco, faz-se pela prxis cotidiana, expressa em Quaini19 quando diz que

    ... Marx interessa-se pela natureza antes de mais nada comomomento da prxis humana, porque a natureza tomadaabstratamente, em si, separada do homem, nada para ohomem.. Por isto pode afirmar tranqilamente, como teseconclusiva do seu historicismo materialista integral, que nsconhecemos uma nica cincia, a cincia da histria. A histria

    continua Marx pode ser considerada sob dois aspectos distintana histria da natureza e na cincia dos homens. Contudo os doisaspectos no podem ser separados; enquanto existirem homens,histria da natureza e histria dos homens se condicionaromutuamente.. p. 45

    A idia de relacionar aspectos ambientais, histricos e arqueolgicos de uma

    mesma regio surgiu da necessidade de se demonstrar como a ocupao humana, ao longo

    18 - Op. Cit.

    19 - Op. Cit.

  • 8/6/2019 HISTRIA E MEIO AMBIENTE: DESCOBRINDO O PASSADO PARA VIABILIZAR O FUTURO

    5/21

    do tempo, em uma mesma rea, pode influenciar na qualidade de vida das comunidades

    que ocuparam aquele espao at os dias de hoje. Dessa forma, buscamos evidenciar como

    cada um dos diferentes modos de utilizao do espao esteve, e continua a estar,

    diretamente relacionado ao modelo de desenvolvimento econmico, vigente nesta regio e

    em cada um de seus perodos histricos.

    As informaes provenientes da Histria e da Arqueologia, complementadas com

    os dados geogrficos, ecolgicos, sociais, econmicos e culturais, juntos e sistematizados,

    fornecero os subsdios necessrios para a elaborao de um diagnstico, no apenas que

    demonstrem o modo de vida, mas a forma como aquele ambiente foi ocupado pelos seus

    habitantes. Sobre esta construo, terica, Quaini20 mais uma vez nos diz que

    ... no pode haver anlise histrica (digna deste nome) semconceituao, isto , sem teoria, sem tipificao sociolgica, em

    suma, sem aquelas abstraes empricas ou cientficas, ... Portanto,no ser possvel, em concluso, histria sem teoria, isto , semcincia, nem poder existir, por sua vez, cincia (das disciplinasmorais) que no proceda do sentido vivo e marcante dadiversidade das pocas ou que esquea, de algum modo, asdistines entre as vrias formaes histrico-sociais. p. 21

    Entendemos que a Histria e a Arqueologia, traro como contribuio, as

    informaes sobre as populaes que utilizaram aquele espao, em um tempo anterior

    chegada do elemento europeu, permitindo, dessa forma, a compreenso das relaes entrea disperso e a ocupao humana na regio. A ocupao deste espao, em seus primrdios

    ocupado pelos grupos indgenas Puri, Coroado e Corop, nos apontam para as serras de

    Santa Maria, Piedade e So Geraldo, que so uma extenso da serra da Mantiqueira na

    Zona da Mata Mineira, e onde esto a maioria dos eventos, histricos e arqueolgicos,

    localizados at este momento, nos Municpios de Visconde do Rio Branco e So Geraldo.

    20 - Op. Cit.

  • 8/6/2019 HISTRIA E MEIO AMBIENTE: DESCOBRINDO O PASSADO PARA VIABILIZAR O FUTURO

    6/21

    AS TRANSFORMAES AMBIENTAIS AO LONGO DO TEMPO

    1 - A ocupao humana

    O Municpio de Visconde do Rio Branco est situado na Zona da Mata Mineira, em

    um territrio montanhoso formado por um brao da serra da Mantiqueira. Um de seus

    primeiros habitantes teriam sido, seguramente, os ndios Puri, Coroado e Corop. A

    chegada, ou a estada, destes grupos nesta regio pode ser vista por duas verses21. Na

    primeira delas, os ndios Puri e Coroado seriam provenientes do Norte do Estado do Rio de

    Janeiro, conhecido como Norte Fluminense, onde, segundo alguns documentos, teriam

    fugido do litoral temendo o ataque de outras tribos indgenas, principalmente os Goitac,

    migrando, atravs do rio Paraba do Sul e posteriormente o rio Pomba e o rio Muriah, para

    o ento serto22 mineiro, at atingirem as fraldas da Mantiqueira, nas proximidades do rio

    Chopot, tributrio da margem esquerda do rio Pomba e que corta o atual Municpio de

    Visconde do Rio Branco. Na segunda verso estes ndios teriam como bero estas mesmas

    serras e a partir delas feito sua disperso, chegando a atingir, alm do Sudeste do Estado de

    Minas Gerais, o Sul do Estado do Esprito Santo, o Norte do Estado do Rio de Janeiro e o

    Nordeste do Estado de So Paulo. com esta segunda verso que trabalhamos.

    A partir da metade do sculo XVIII os primeiros europeus chegaram calha do rio

    Chopot, fazendo o mesmo caminho que supe-se para a primeira verso de disperso dosndios Puri e Coroado, ali estabelecendo-se e lanando os fundamentos de uma nova forma

    de ocupar aquele espao. As informaes histricas indicam que at aquele momento o uso

    dos recursos naturais da regio baseava-se em um modelo exclusivamente extrativista, isto

    21 - LUFT, Vlademir Jos. Da Histria Pr-Histria: as ocupaes das sociedades Puri e Coroado na bacia do Alto Rio Pomba (o caso da serra da Piedade), Tese

    apresentada para a obteno do grau de doutor no Insituto de Filosofia e Cincias Humanas da Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro RJ, 2000

    22 - Termo definido e historisizado por Mrcia Amantino em seu artigo O serto Oeste em Minas Gerais: um espao rebelde, publicado pela revista Varia Historia, da

    UFMG, nmero 29, Janeiro 2003, pp. 79-97

  • 8/6/2019 HISTRIA E MEIO AMBIENTE: DESCOBRINDO O PASSADO PARA VIABILIZAR O FUTURO

    7/21

    , explorava-se apenas os recursos naturais encontrados no ecossistema florestal, o que no

    provocou grandes transformaes ambientais naquela rea.

    a partir do final do sculo XVIII, quando se deu uma nfase catequese indgena

    que surgem as primeiras lavouras organizadas na regio. Portanto, a partir do sculo

    XIX que se tem, com maior intensidade, as transformaes daquele ambiente, antes

    coberto por densas florestas que comearam a dar espao s lavouras de culturas trazidas

    pelo elemento europeu. neste momento que temos, de forma mais sistematizada, o

    surgimento das primeiras vilas.

    Desde ento, as florestas, tpicas da Zona da Mata, foram gradativa e

    sistematicamente substitudas, principalmente por plantaes de cana-de-acar, seguidas

    de outras culturas de subsistncia como o arroz, o milho, o caf e as pastagens para o

    desenvolvimento da pecuria bovina.

    2 Os problemas ambientais

    No sculo XX, os desmatamentos continuaram e aumentaram na mesma proporo

    em que cresceu a populao regional. Segundo dados fornecidos pelo censo do Instituto

    Brasileiro de Geografia e Estatstica (IBGE), de 1991, dos 28.451 habitantes de Visconde

    do Rio Branco, 74 % estariam vivendo na zona urbana e 26 % na zona rural, valores que secomparados aos da dcada de 50, indicam um processo do xodo rural no municpio. Fato

    talvez explicado pela manuteno de um sistema agrcola baseado na monocultura e na

    grande propriedade, onde a cana-de-acar, manteve-se como a principal atividade

    econmica da regio.

    Este processo tem levado regio um alto nvel de degradao ambiental, o que

    entre outras coisas, tem provocado a eroso do solo, dificultando, por exemplo, o trabalho

  • 8/6/2019 HISTRIA E MEIO AMBIENTE: DESCOBRINDO O PASSADO PARA VIABILIZAR O FUTURO

    8/21

    de pesquisa Arqueolgica, principalmente no que diz respeito ao fato de se poder encontrar

    os locais com os restos das ocupaes humanas anteriores chegada do elemento europeu.

    Isto ocorre devido a retirada da vegetao, principalmente, das encostas, o que provocou,

    com a ao do tempo, uma eroso que levou, e continua a levar, os sedimentos e com eles

    os restos materiais, que poderiam comprovar as ocupaes at as regies mais baixas da

    serras, soterrando os restos ali j existentes e dispersando os que da serra foram trazidos.

    Para a Arqueologia isto significa a impossibilidade de encontrar os locais de ocupao. O

    que se passa a encontrar, portanto, so materiais diversos e dispersos pelas regies mais

    baixas das serras.

    Esses dados iniciais sobre as principais atividades econmicas da regio indicam

    que o processo de concentrao urbana, decorrente de um xodo rural continuado no

    Municpio, vem se ampliando com o empobrecimento das terras cultivadas, utilizadas

    principalmente, at recentemente, para a cana-de-acar e pastagens.

    Hoje, com terras completamente degradadas, uma poltica de criao de reas de

    proteo ambiental municipais (APA), de instalao de indstrias que aproveitem a

    produo frutfera, da recuperao das nascentes e margens dos rios e riachos que nas

    serras da Piedade e Santa Maria nascem, est sendo iniciada. Este processo est sendo

    baseado no reflorestamento de uma vegetao nativa e no re-assentamento de uma

    populao com costumes rurais, onde sua atividade produtiva ser calcada na produoagrcola com base na fruticultura.

    3 Em busca de soluo

    Diante disso surgem algumas questes:

  • 8/6/2019 HISTRIA E MEIO AMBIENTE: DESCOBRINDO O PASSADO PARA VIABILIZAR O FUTURO

    9/21

    Qual o significado da manuteno de um tipo de produo, como a cana-de-acare o gado, como principal opo econmica da regio ?

    Quais os custos ambientais que tais atividades impuseram qualidade de vida desua populao ?

    Porque sua populao, majoritariamente urbana, ainda tem como principalatividade econmica a agricultura ?

    Que opes e caminhos poderiam ser trilhados por esta comunidade ?

    Essas so questes que talvez possam ser respondidas a partir da anlise e

    sistematizao dos dados obtidos por nossa pesquisa, que tem como objetivo o

    levantamento da histria da ocupao regional.

    Espera-se que a partir do estudo arqueolgico das populaes ali encontradas,

    possam ser resgatadas formas harmnicas de interao com o meio ambiente. Pois, ao

    levar em conta as experincias seculares, e at milenares, que esses povos estabeleceram

    com o ecossistemas, possamos confirmar a relao de equilbrio e interao do homem

    com o ambiente ocupado, refletindo um conhecimento profundo dos seus habitats naturais.

    Com base nos resultados dessa pesquisa, pretende-se fornecer subsdios para que

    estratgias de ao em Educao Ambiental possam ser elaboradas junto comunidade,

    principalmente junto s escolas, valendo-se para isso da histria e da realidade local.

    Ao diagnosticar, em um primeiro momento, e posteriormente divulgar os principais

    problemas ambientais do Municpio, esperamos estar contribuindo para a transformao da

    realidade local. Acreditamos que atravs de atividades educativas, que possibilitem a

    percepo da problemtica ambiental em todos os seus aspectos, histricos, ecolgicos,

    sociais, econmicos e culturais, surjam propostas inovadoras para o desenvolvimento local.

    Tais propostas, para serem consideradas realmente inovadoras, devero considerar em suas

  • 8/6/2019 HISTRIA E MEIO AMBIENTE: DESCOBRINDO O PASSADO PARA VIABILIZAR O FUTURO

    10/21

    atividades a utilizao das potencialidades locais, de forma a no causar impactos

    ambientais que comprometam a qualidade de vida daquela populao.

    Este novo modelo de desenvolvimento tem o desafio de conjugar a tradio e a

    tecnologia moderna, em uma nova sntese, que utilize as muitas lies que os ancestrais

    indgenas ofereceram para a nossa histria.

    neste sentido que desde 2001, a partir dos estudos realizados, principalmente

    histricos, geogrficos e ambientais, cartilhas23 vm sendo produzidas e distribudas. O

    objetivo destas, familiarizar e envolver a populao local e regional com seu ambiente,

    natural e social, e sua histria, relacionando-os no sentido de alcanar uma resoluo

    adequada para os problemas cotidianos vivenciados e com isso propiciar um futuro com

    condies, de vida, melhores que as atuais. Alm disso, as cartilhas propiciam a

    participao efetiva da comunidade, gerando uma maior conscincia a cerca de seus

    problemas, sua participao na soluo dos mesmos, bem como evitando o avano em sua

    destruio.

    Entendemos que quando da percepo, histrica, dos problemas, a comunidade

    acaba por participar ativamente de sua resoluo.

    assim que questes como o tratamento do esgoto (de origem sanitria, de cozinha

    e de lavanderia); o tratamento dgua (com a preservao das nascentes e margens de

    crregos, riachos e rios); o tratamento do lixo (de origem residencial e urbana com a coletae o depsito adequado); o tratamento ambiental (com a recuperao de reas degradadas

    pelo uso excessivo e conseqente abandono); o tratamento histrico (com a preservao de

    reas com restos histricos) e o tratamento econmico (com a criao de condies para

    produo econmica adequada s necessidades locais), tm sido tratadas, buscando-se uma

    soluo com a qual a comunidade possa ter um modo de vida mais apropriado, gerando,

    23 - 2001, Arqueologia e Meio Ambiente (Vlademir Jos Luft); 2002, Xopot dos Coroados (Theresinha de Almeida Pinto); 2003, Plano Diretor do Comit Gestor da

    Bacia do Xopot (Marco Aurlio Carone)

  • 8/6/2019 HISTRIA E MEIO AMBIENTE: DESCOBRINDO O PASSADO PARA VIABILIZAR O FUTURO

    11/21

    por sua interao com o natureza, condies de continuar produzindo e consumindo em

    consonncia com a seu meio.

    O OBJETO DE TRABALHO: OS NDIOS PURI, COROADO E COROP

    A - a rea de ocupao

    Os primeiros europeus chegaram ao vale do rio Chopot a partir da primeira

    metade do sculo XVIII, fazendo o mesmo caminho que se supe para uma das verses de

    disperso dos grupos indgenas Puri e Coroado, ou seja, a de que seriam provenientes da

    regio Norte Fluminense, no Estado do Rio de Janeiro, onde, segundo a documentao

    escrita, teriam "fugido" do litoral temendo os ataques de outras tribos indgenas,

    principalmente os Goitac, migrando, atravs dos rios Paraba do Sul, da Pomba e

    Muriah, para o "serto mineiro", at atingirem as "fraldas da Mantiqueira", nas

    proximidades do rio Chopot, tributrio da margem esquerda do rio da Pomba, que corta,

    entre outros, o atual territrio do Municpio de Visconde do Rio Branco. Com isso

    estavam estabelecidos e lanando os fundamentos de uma nova forma de ocupao daquela

    regio.

    As informaes histricas indicam que at aquele momento, o uso dos recursos

    naturais da regio baseava-se em um modelo exclusivamente extrativista, isto ,exploravam-se apenas os recursos naturais encontrados no ecossistema florestal, o que no

    teria provocado grandes transformaes ambientais naquela regio.

    a partir do final do sculo XVIII, quando se tem uma nfase na catequese

    indgena, que surgem as primeiras lavouras "organizadas". Portanto, a partir do sculo

    XIX que se tem, com maior intensidade, as transformaes daquele ambiente, antes

    coberto por densas florestas e que comearam a dar espao s lavouras de culturas trazidas

  • 8/6/2019 HISTRIA E MEIO AMBIENTE: DESCOBRINDO O PASSADO PARA VIABILIZAR O FUTURO

    12/21

    pelo elemento europeu. neste momento que temos, de forma mais sistematizada, o

    surgimento das primeiras vilas.

    Desde ento, as florestas, tpicas da Zona da Mata Mineira, foram sistemtica e

    gradativamente substitudas pela monocultura da cana-de-acar, acompanhadas de

    culturas de subsistncia como o arroz, o milho e o caf, alm das pastagens para o

    desenvolvimento da pecuria.

    No sculo XX, os desmatamentos continuaram, aumentando na mesma proporo

    de seu crescimento populacional. Segundo dados da Fundao Instituto Brasileiro de

    Geografia e Estatstica, em 1991, dos 28.451 habitantes do Municpio de Visconde do Rio

    Branco - MG, 74% estariam vivendo na zona urbana, valores que, comparados aos da

    dcada de 50, indicam um acentuado processo no xodo rural, fato que reforou a

    manuteno da monocultura da cana-de-acar como sua principal atividade econmica.

    Estes dados indicam que o processo de concentrao urbana, decorrente de um xodo rural

    continuado, vem se ampliando juntamente com o empobrecimento das terras cultivadas,

    utilizadas, principalmente, para a cana-de-acar.

    Este processo de degradao ambiental tem provocado uma acentuada eroso do

    solo, dificultando, entre outras coisas, at mesmo o trabalho da Arqueologia,

    principalmente no que diz respeito a possibilidade de encontrarmos os locais com os restos

    das ocupaes anteriores chegada do elemento europeu. Isto ocorre devido a retirada davegetao das encostas que provocou, por conseqncia, com a ao do tempo, uma eroso

    que retira o sedimento, e com ele os restos de ocupaes, levando-o at as regies mais

    baixas, soterrando os restos ali j existentes e dispersando os que da serra foram trazidos.

    Dessa forma as possveis ocupaes existentes no sop das serras estariam soterradas pelo

    sedimento que desceu das mesmas devido a eroso, bem como as ocupaes existentes nas

    encostas estariam destrudas pela eroso e tendo seu material disperso pelos "vales" atuais.

  • 8/6/2019 HISTRIA E MEIO AMBIENTE: DESCOBRINDO O PASSADO PARA VIABILIZAR O FUTURO

    13/21

    Para a Arqueologia isto significa a impossibilidade de encontrar muitos dos locais

    de ocupao indgena. Em nosso caso, esta poderia ser uma das explicao para o fato de

    encontramos hoje, dispersos pelas regies mais baixas, uma quantidade muito grande de

    material arqueolgico dos mais variados tipos. Sempre isolados e dissociados de qualquer

    estrutura arqueolgica.

    B - o panorama atual na viso da arqueologia

    Apresentar um panorama arqueolgico atualizado sobre a rea de nosso projeto de

    trabalho significa, antes de mais nada, falarmos a respeito das pesquisas arqueolgicas

    realizadas nos Estados do Rio de Janeiro e de Minas Gerais, sobre as quais Dias Jnio r24,

    em meados da dcada de 70, dizia que ...

    Um problema tem se afigurado ultimamente, o qual aindano pode ser plenamente ultrapassado. Trata-se danecessria relao entre as pesquisas nos Estados de MinasGerais e no Estado do Rio de Janeiro, pesquisas estas, at omomento, efetuadas completamente, isoladas umas dasoutras. Na realidade, os limites polticos atuais entre os dois

    Estados tm atuado como verdadeira barreira prtica., (p.110).

    Alm disso, devido s especificidades e especificaes das pesquisas arqueolgicasrealizadas nesta regio, dois distintos panoramas foram traados. O primeiro deles, que

    pode ser considerado como de carter arqueolgico, nos mostra os stios arqueolgicos, seu

    respectivo material cultural e suas possveis interpretaes e associaes. O segundo

    panorama, que pode ser considerado como de carter histrico, antropolgico e/ou

    etnolgico, nos mostra as possveis associaes destes stios arqueolgicos e seu respectivo

    26 - DIAS JNIOR, Ondemar Ferreira. Evoluo Cultural em Minas gerais e no Rio de Janeiro. In: Anurio de Divulgao Cientfica, Universidade Catlica de Gois

    / Instituto Goiano de Pr-Histria e Antropolgia, nmeros 3 e 4, Goinia, 1976 / 1977, pp. 110-130.

  • 8/6/2019 HISTRIA E MEIO AMBIENTE: DESCOBRINDO O PASSADO PARA VIABILIZAR O FUTURO

    14/21

    material cultural, com os grupos indgenas historicamente, antropologicamente e

    etnologicamente registrados para a regio.

    No que diz respeito ao panorama de carter arqueolgico, apesar de um acrscimo

    substancial nas pesquisa realizadas no Brasil, em seus significativos resultados e de 20

    anos terem sido passados, pouco de seu panorama, construdo em meados da dcada de 70,

    foi modificado no que diz respeito ao Norte do Estado do Rio de Janeiro e ao Sudeste do

    Estado de Minas Gerais. dessa forma que o esboo para a ocupao destes Estados,

    traado por Dias Jnior em 1976-197725; 1978-1979-198026e 1978-1979-198027continua

    vlido. Seu esquema operacional de ocupao foi construdo da seguinte forma:

    No Estado do Rio de Janeiro, a evoluo cultural pr-histrica pode ser sumarizada em pelo menos dois grandes

    perodos, com sub-divises. Cada perodo devecorresponder a pocas distintas, mas evidente queocorreram variaes e interrelacionamentos entre eles aolongo do espao fluminense.O primeiro perodo, e mais antigo, corresponderia scomunidades de bando (segundo Service: 1966), onde aeconomia deveria ser, no nosso caso, basicamente coletora.

    A maior soma de informaes se encontra no litoral e apodemos ter dois momentos caracterizadores do perodo. ...O momento inicial corresponderia economia sambaquiana... O seguinte, com uma maior variao econmica ecultural, ao que denominamos Itaipu. ...O segundo perodo, que se relaciona aos coletores,agricultores, tambm pode ser dividido em dois. Um que

    corresponde aos grupos da Tradio local denominada Una... o outro, Tupiguarani, que sem dvida resulta da chegadade novos grupos tribais vindos do Sul e que muitas vezes,

    segue caminho para o Norte, ...Para o territrio mineiro, frente vasta rea ainda nopesquisada, esta reconstituio muito mais difcil. ...pressupomos que a antigidade do povoamento poder

    27 - op. cit.

    28 - DIAS JNIOR, Ondemar Ferreira. O Paleo-ndio em Minas Gerais. In: Anurio de Divulgao Cientfica, Temas de Arqueologia Brasileira # 1 Paleo-ndio,

    Universidade Catlica de Gois / Instituto Goiano de Pr-histria e Antropologia, nmero 5, Goinia, 1978 / 1979 / 1980, pp. 51-54.

    29 - DIAS JNIOR, Ondemar Ferreira. Os Cultivadores do Planalto e do Litoral. In: Anurio de Divulgao Cientfica, Temas de Arqueologia Brasileira # 5 Os

    Cultivadores do Planalto e do Litoral, Universidade Catlica de Gois / Instituto Goiano de Pr-histria e Antropologia, nmero 9, Goinia, 1978 / 1979 / 1980, pp. 15-

    74.

  • 8/6/2019 HISTRIA E MEIO AMBIENTE: DESCOBRINDO O PASSADO PARA VIABILIZAR O FUTURO

    15/21

    atingir escala superior a 20.000 anos. ... O perodocermico representado por trs grupos.

    Podemos caracterizar os primeiros grupos como ... vindosdo interior, talvez de Gois, sendo que alguns grupos se

    fixaram na regio e outros alcanaram o litoral fluminense eo interior de So Paulo. Trata-se das fases filiadas Tradio Una.Outro grupo, mais recente, mas que conviveu com oprimeiro, ... deixou seus vestgios em grandes stios decampo aberto. bem possvel que se relacione smigraes relatadas pelos cronistas como que vindas do

    Norte, subindo o vale sanfranciscano. possvel ainda quetenha se expandido igualmente para o interior paulista emuito possivelmente tenha relaes com a Tradio Aratu,de Caldern. Trata-se da Tradio Sapuca.

    O grupo que aparentemente chegou por ltimo otupiguarani. Este se estendeu por todo o vale do So

    Francisco, da regio da floresta atlntica ao cerrado.Grosso modo, deve refletir a migrao Sul-Norte, mastambm pode estar relacionado aos movimentos costa-interior referido por alguns autores, entre eles Pierson eSenna. ...O Estado de Minas Gerais, pois, ao que tudo indica, foi umaregio de intensa troca de influncias culturais, cujo estudocada vez mais se reveste de importncia e cujos resultados

    podero esclarecer muitos problemas ainda pendentes napr-histria da regio Sudeste e Centro-Oeste., (DiasJnior, 1978/1979/1980, pp. 124-126)28

    Dando continuidade a este esquema operacional de ocupao e reportando-se, desta

    vez, especificamente ao Estado do Rio de Janeiro, Dias Jnior & Carvalho29 propem que .

    Em sstese, pois, a ocupao arqueolgica do Estado podeassim ser sumariamente reconstituda, segundo os dadosdisponveis at o momento:

    A Pr-cermico: Grupos de economia coletora,sambaquianos em toda a costa, num horizonte antigo,possivelmente superior a 10.000 anos. Em partecontemporneo, sucede-lhe o perodo da Tradio Itaipu,onde a coleta cede parcialmente a vez pesca. A caa,muito provavelmente foi importante nos dois perodos. Aagricultura parece, pelas provas indiretas, surgir no final do

    28 - op. cit.

    31 - DIAS JNIOR, Ondemar Ferreira & CARVALHO, Eliana. A Pr-Histria Fluminense e a utilizao das grutas do Estado do Rio de Janeiro. In: Pesquisas, srie

    Antropologia, nmero 31, Instituto Anchietano de Pesquisa, So Leopoldo, 1980, pp. 43-86.

  • 8/6/2019 HISTRIA E MEIO AMBIENTE: DESCOBRINDO O PASSADO PARA VIABILIZAR O FUTURO

    16/21

    perodo. No interior, caadores com pontas de projteis e pequenos artefatos. Nenhum dado ainda tecnicamentecomprovado da existncia de grupos relacionados aohorizonte pr-pontas, embora o avano da pesquisa posa vir

    a localizar stios do tipo em ambas as reas. At omomento, dado ainda escassez de stios e aos trabalhosreduzidos, no dispomos de suficientes informes que possamnos dar idias claras sobre as origens e a procedncia doselementos constituintes do perodo.

    B Perodo cermico: Provavelmente se desenvolveulocalmente uma ocupao antiga de grupos ceramistasvinculados Tradio Una. No litoral central e Norte,ocupando a plancie, os grupos da fase Una; na serra, baixoe mdio curso do rio Paraba, aqueles da fase Mucuri. Noincio da Era Crist, novas levas, desta vez vinculados

    Tradio Tupiguarani e, provavelmente, oriundas do Sul: nacosta central localizaram-se aqueles grupos denominadosatualmente, dentro da fase Guaratiba, seguidos por aquelesda fase Sernambetiba, com os quais repartiram a regiodurante um certo tempo. Estes se estenderam mais para o

    Norte e devem ter mantido contato com os elementos da faseUna; ao Norte, aps a foz do rio Paraba, localiza-se a fase

    Itabapoana, mais recente. No mdio curso do rio Paraba, amontante da rea da fase Mucuri, est situada a fase

    Itaocara, com ocupao que se estende at o incio do altocurso daquele rio. Ainda em mdio curso e se alongandoem direo foz do rio, atingindo ainda boa poro de seuafluente Muria, estabeleceu-se, mais recentemente, a fase

    Ipuca, com contatos marcantes com a fase Mucuri. interessante notarmos que se no podemos observar traosdeste contato na fase Itaocara, eles se materializam namorfologia cermica da fase Ipuca, demonstrando aexistncia de um processo de aculturao, que muito

    provavelmente foi prolongado, entre grupos pertencentes aTradies culturais ceramistas diferenciadas., (pp. 56-57).

    Para o Sudeste do Estado de Minas Gerais, por sua vez, alm de apresentar as

    mesmas caractersticas arqueolgicas, culturais, ambientais, histricas, antropolgicas e

    etnolgicas identificadas nas ocupaes do Norte do Estado do Rio de Janeiro, reconhece-

    se uma srie de fases30 (Piumhi, Una, Mucur e Una, entre outras31) e tradies32 (Una,

    32 - Definida por MENDONA DE SOUZA, Alfredo Augusto Castro.. Dicionrio de Arqueologia, ADESA, Rio de Janeiro, 1997, como: Qualquer complexo de

    cermica, ltico, padres de habitao, etc, relacionado no tempo e no espao, num ou mais stios (PRONAPA, 76)., p. 55.

    31 - A fase Una, com pontos de contato com a fase Mucuri, no Estado do Rio de Janeiro, possui uma datao de 1.135 DC; localizada inicialmente na bacia do alto rio

    Paracatu; possui um sentido de deslocamento que vai de Oeste para Leste, ou seja do interior para o litoral. A fase Piumhi, com stios arqueolgicos localizados

  • 8/6/2019 HISTRIA E MEIO AMBIENTE: DESCOBRINDO O PASSADO PARA VIABILIZAR O FUTURO

    17/21

    Sapuca e Tupiguarani, entre outras33) que auxiliam na conformao deste panorama, como

    por exemplo o material cultural, provenientes de escavaes arqueolgicas e identificados

    como da fase Mucuri.

    A Tradio Una, de definio arqueolgica, constantemente identificada e

    relacionada, por pesquisadores das mais diversas reas, aos grupos indgenas Puri e

    Coroado, grupos estes que, acrescidos dos Corop, so o objeto de nosso trabalho, e citada

    como uma das principais tradies arqueolgicas para o Sudeste brasileiro, apresentada

    por Dias Jnior34 da seguinte forma:

    O material cermico da Tradio Una no Estado do Rio deJaneiro geralmente de formas simples, vasilhamesglobulares, cnicos ou piriformes, de pequenas dimenses,paredes delgadas, resistentes e de cor predominantementeescura. As decoraes so raras e, quando ocorrem,

    geralmente se limitam rea superior das peas e denotaminfluncia tupiguarani (sobretudo no corrugado e ungulado).O material ltico de ambas excepcionalmente pobre, mas,em compensao, ocorre regular variao em padres de

    sepultamentos.O mais antigo o enterramento secundrio em urnas,

    seguindo-se-lhe o sepultamento secundrio, ainda em urnas,mas sendo estas depositadas em cavernas de difcil acesso.

    Finalmente, prximo aos stios da fase, ocorremsepultamentos em cavernas, cujo nico acompanhamentocultural o urucum (Bixa Orellana Linn), em contrastecom os outros tipos de enterramentos onde oacompanhamento cultural variado e farto (tecidos, contas

    basicamente em cavernas; possui um vasilhame cermico de pequeno porte, em formato globular, cnico e piriforme e de cor predominantemente negra; com datao de

    110 DC; foi localizada inicialmente na bacia do alto rio So Francisco; possui um sentido de deslocamento que segue do interior para o litoral. A fase Mucuri, com

    localizao na regio da bacia sedimentar de Campos dos Goitacases, possui dataes de 520 1.230 DC; pauprrima em material ltico. A fase Una, com localizao

    litornea, principalmente na rea de Cabo Frio, possui uma datao de 890 DC; possvel encontrar seu material cermico sobre os stios arqueolgicos da tradio

    Itaip; possui um material ltico vasto e variado e em conformidade com as narrativas de viajantes e cronistas.

    32 - Definida por MENDONA DE SOUZA, Alfredo Augusto Castro.. Dicionrio de Arqueologia, ADESA, Rio de Janeiro, 1997, como: 1 - Grupos de elementos ou

    tcnicas, com persistncia temporal (PRONAPA, 76). 2 - Uma seqncia de estilos ou de culturas que se desenvolvem no tempo, partindo uns dos outros, e formam

    uma continuidade cronolgica., p. 124.

    33 - A tradio Sapuca, associada, por viajantes e cronistas, ao grupos indgenas Catagu, com stios arqueolgicos de grandes dimenses e associados a ocupaes em

    campo aberto. Apresenta grande quantidade de material cermico, onde o vasilhame, com pouca decorao, quando reconstituido, apresenta um porte que pode variar

    de mdio a grande. Suas urnas funerrias so geralmente em formato piriforme. Suas principais fase so Ibiraci, Paraopeba e Jaragu. A tradio Tupiguarani, a mais

    recente das ocupaes pr-histricas da regio, influnciou, provavelmente, vrios outros grupos indgenas, fato registrado atravs da mistura de seu material cultural

    arqueolgico com o de vrios stios arqueolgicos da tradio Una, principalmente em suas fases Piumhi e Mucuri. No h certeza do momento de sua chegada ao

    territroio mineiro.

    36 - op. cit.

  • 8/6/2019 HISTRIA E MEIO AMBIENTE: DESCOBRINDO O PASSADO PARA VIABILIZAR O FUTURO

    18/21

    de osso, pingentes e adornos sseos, cabaas, etc.). (pp.117-118).

    Schmitz35

    , por sua vez, diz que a Tradio Una

    "Est localizada nos cerrados imediatamente ao Sul daTradio Aratu/Sapuca, estendendo-se numa estreita faixadesde o Araguaia at o litoral do Rio de Janeiro. No interiosocupava principalmente reas acidentadas, onde a

    populao vivia em abrigos rochosos, com ou sem aldeiasexternas complementares; mas em Minas Gerais e no Rio de

    Janeiro, em reas sem abrigos, construa pequenas aldeias a

    cu aberto. A cermica simples, de pequeno tamanho e semdecorao. a mais antiga do Planalto, recuando em MinasGerais talvez a 2.000 anos AC. Os cultivos eram variados:milho, mandioca, amendoin, feijes, abboras e cabaas; aomenos algumas dessas plantas eram ainda bastante

    primitivas e incompletamente domesticadas. Frutos docerrado e caa completavam sua nutrio.

    possvel que essa tradio ceramista tenha nascido nomeio dos caadores e coletores que moravam nos abrigos,tocados pelos novos horizontes tecnolgicos, portadorestanto dos cultivos como da cermica. As pequenas roas

    ficavam na frente mesmo dos alcantilados em que viviam. Ofato de continuarem morando em abrigos naturais at achegada do homem branco pode transmitir a impresso deque a ficaram como que refugiados, enquanto os terrenosmais aplainados eram progressivamente invadidos peloscultivadores das grandes aldeias da Tradio Aratu/Sapuca,de cuja origem talvez sejam corresponsveis.Tambm a Tradio Una certamente da grande famlialingstica J."(p. 41)

    J para Prous36, as manifestaes da tradio Una esto

    "... espalhadas sobre um grande territrio (rio de Janeiro,Minas Gerais, Gois, Esprito Santo), enquanto sua durao

    parece abranger pelo menos dois milnios, as manifestaesda tradio Una certamente no formam um conjuntohomogneo. Tentamos no presente trabalho, subdividi-las em

    35 - SCHMITZ, Pedro Igncio. O povoamento do Brasil. In: Histria Pr-Colonial do Brasil (Coordenado por ALVES FILHO, Ivan), Editora Europa, Rio de Janeiro,

    1993, pp. 27-49.

    36 - PROUS, Andr. Arqueologia brasileira, Editora UNB, Braslia, 1992.

  • 8/6/2019 HISTRIA E MEIO AMBIENTE: DESCOBRINDO O PASSADO PARA VIABILIZAR O FUTURO

    19/21

    duas variedades, sem que que esta operao, prticadidaticamente, talvez no seja justificada pelas pesquisas

    posteriores.A tradio Una variedade "A", definida geograficamente (o

    Norte mineiro e Gois meridional) e cronologicamente, jque forneceu as dataes mais antigas atualmentedisponveis para a tradio. Parece, portanto que estavariedade corresponde zona nuclear a partir da qual atradio ter-se-ia espalhado."(p. 333)

    "A tradio Una variedade "B", formada pelos primeirosstios encontrados em Minas Gerais, no Esprito Santo e,sobretudo, no Rio de Janeiro. Ocupam uma posioperifrica em relao ao grupo "A", do qual poderiam ser

    oriundos."(p. 338)

    Alm disso, deve-se mencionar que em termos de pesquisa arqueolgica, a regio

    que engloba o Norte do Estado do Rio de Janeiro e o Sudeste do Estado de Minas Gerais,

    que por proposio e trabalho de Dias Jnior, por ter os mesmos problemas e questes,

    forma uma rea cultural e arqueolgica nica, possui:

    as pesquisas realizadas pelo Instituto de Arqueologia Brasileira, com seu Programa dePesquisas Grutas Mineiras;

    as pesquisas realizadas pelo Instituto Superior de Cultura Brasileira, com seu ProgramaArqueolgico do Norte Fluminense;

    as pesquisas realizadas pelo Setor de Arqueologia do Museu Nacional do Rio deJaneiro, com seu trabalho na Pedra da Babilnia, Municpio de Rio Novo MG;

    as pesquisas realizadas pelo Programa Arqueolgico Puri-Coroado, primeiramente como apoio institucional da Universidade Estcio de S e atualmente do Centro Regional

    de Ensino e Pesquisa e do Centro Educacional Palmieri.

  • 8/6/2019 HISTRIA E MEIO AMBIENTE: DESCOBRINDO O PASSADO PARA VIABILIZAR O FUTURO

    20/21

    Referindo-se aos aspectos da cultura material, Beltro37 falando sobre o interior, diz

    que sua cermica

    "... ocorre em acampamentos Puri e cemitrios Puri. Acermica Puri, das lapas de Santa Maria Madalena, descrito

    por Faria (1942, ms.) apresenta as seguintes caractersticas:"vasos de cor escura; superfcie do corpo lisa;. bordo comligeiro espessamento na face externa e decorao constitudade traos inclinados. Observando-se o bordo da pea na

    parte fraturada, verifica-se que o espessamento era obtido pela aposio de novos rolos, nesse caso trs. Assimconseguiam uma espcie de escalonamento, e a cada um

    desses rolos correspondia uma faixa de ornatos. Pasta muito porosa, contendo grande quantidade de areia. Os traos.incisos no bordo so apenas inclinados mas com umaregularidade aprecivel, de sorte que o conjunto se apresentabastante harmonico"."(p. 37)

    Por sua vez, sobre a morfologia das populaes indgenas, Beltro38, diz que

    "No puderam ainda ser definidas as caractersticasmorfolgicas do Puri. Seus esqueletos foram encontradosnas lapas de Santa Maria Madalena (zona montanhosa dointerior do Estado do Rio de Janeiro). Essa indefinio damorfologia do grupo Puri (tronco Macro-J, famliaCoroado) deve-se no s ao reduzido nmero de esqueletosat agora encontrados, como tambm exiguidade deinformaes por parte dos especialistas."(p. 41-42)

    Com relao ao segundo panorama, de carter histrico, antropolgico e/ou

    etnolgico, temos o relacionamento constante e, ao que tudo indica, afirmativo, associado,principalmente, aos stios da tradio Una, nos Estados do Rio de Janeiro e de Minas

    Gerais, aos grupos indgenas Puri e Coroado. Apesar dos diversos autores que fazem esta

    relao, so nas concluses de Dias Jnior & Carvalho39 que encontramos as principais

    colocaes sobre o tema.

    37 - BELTRO, Maria da Conceio de Morais Coutinho. Pr-Histria do Rio de Janeiro, Forense Universitria / Instituto Estadual do Livro, Rio de Janeiro, 1978.

    38 - op. cit.

    41 - op. cit.

  • 8/6/2019 HISTRIA E MEIO AMBIENTE: DESCOBRINDO O PASSADO PARA VIABILIZAR O FUTURO

    21/21

    Embora no possamos relacionar com certeza absoluta osdados etnogrficos aos arqueolgicos, podemos utiliz-los

    como elementos de raciocnio e reconstituio e acreditarque o povoamento pr-histrico ... , da serra guardou traosde similaridade com aquele do perodo histrico e queexistem elementos de coeso entre ambos.

    Por outro lado, as provas arqueolgicas apontam umpovoamento Tupiguarani (fase Ipuca) para a mesma reareferida pelos cronistas como habitat dos Coroados (rioMuria) e tambm para o local onde eles foram aldeados noincio do sculo XIX, em So Fidlis. Embora Mtraux, entreoutros, classifique-os como do mesmo grupo lingstico doPuri (da denomin-los Puri-Coroado) e avente a hiptese de

    que ambos tenham partilhado um passado comum, areconstituio arqueolgica no confirma a teoria, pelaexistncia, at o momento, de vestgios no Tupiguarani narea designada para os Coroado. Alis, observando-seatentamente NeuWied, nota-se que ele aponta diferenassomticas e culturais entre os dois grupos, alm de se referir tradicional inimizade entre ambos. Ele se refere, ainda, aouso dos antigos Coroado, de enterrar seus mortos sentados,isto , fletidos, em urnas que chamavam "camucis", ... , (pp.75-76)

    "Em todo caso, no nos parece haver dvida de que os dadosarqueolgicos confirmam, aqui, o que a tradio etnogrficaindica, de que Guaitac, Corop e Puri compartilhavam umatradio cultural comum, da qual a evidncia mais notada,alm dos artefatos, era a lngua aparentada."(p. 77)