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www.penalemfoco.com.br HOMICÍDIO, NO ENTENDIMENTO DO STF Princípio da consunção: homicídio e posse ilegal de arma A 1ª Turma, por maioria, julgou extinto “habeas corpus” em que se discutia a aplicabilidade do princípio da consunção em hipótese de prática de homicídio com o uso de arma de fogo de numeração raspada. No caso, o paciente fora absolvido sumariamente em relação ao delito de homicídio, uma vez sua conduta haver caracterizado legítima defesa. Não obstante, remanescia a persecução penal no tocante ao crime de posse e porte de arma de fogo. A Turma reputou que os tipos penais seriam diversos, e que a excludente de ilicitude reconhecida quanto ao homicídio não alcançaria a posse ilegal de arma de fogo com numeração raspada. Vencido o Ministro Luiz Fux (relator), que concedia a ordem de ofício, por entender incidir o princípio da consunção. HC 120678/PR, rel. orig. Min. Luiz Fux, red. p/ o acórdão Min. Marco Aurélio, 24.2.2015. RHC N. 116.950-ES RELATORA: MIN. ROSA WEBER EMENTA: RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS. HOMICÍDIO NA DIREÇÃO DE VEÍCULO AUTOMOTOR. DOLO EVENTUAL. CULPA CONSCIENTE. PRONÚNCIA. TRIBUNAL DO JÚRI. 1. Admissível, em crimes de homicídio na direção de veículo automotor, o reconhecimento do dolo eventual, a depender das circunstâncias concretas da conduta. Precedentes. 2. Mesmo em crimes de trânsito, definir se os fatos, as provas e as circunstâncias do caso autorizam a condenação do paciente por homicídio doloso ou se, em realidade, trata-se de hipótese de homicídio culposo ou mesmo de inocorrência de crime é questão que cabe ao Conselho de Sentença do Tribunal do Júri. 3. Não cabe na pronúncia analisar e valorar profundamente as provas, pena inclusive de influenciar de forma indevida os jurados, de todo suficiente a indicação, fundamentada, da existência de provas da materialidade e autoria de crime de competência do Tribunal do Júri. 4. Recurso ordinário em habeas corpus a que se nega provimento..Julgado em 17.02.2014. Racha” e dolo eventual A 1ª Turma, por maioria, denegou habeas corpus em que alegado constrangimento ilegal decorrente de: a) falta de fundamentação da sentença de pronúncia, porquanto genérica; b) substituição indevida de relatores na ocasião do segundo julgamento de recurso em sentido estrito, uma vez que a mesma desembargadora que anteriormente proferira voto prevalecente pelo provimento do apelo mudara sua convicção; c) excesso de linguagem no acórdão confirmatório da decisão que pronunciara o réu; e d) contradição neste decisum, haja vista que o conselho de sentença entendera que o co-réu não participara da disputa dolosamente, mas culposamente. No mérito, a defesa sustentava que a conduta objeto da denúncia não caracterizaria dolo eventual, mas culpa consciente, pelo que pugnava pelo deferimento da ordem, a fim de que fosse determinada a competência do juízo singular, e não do tribunal do júri, para julgar o paciente. De início, assinalou-se que o juízo pronunciante teria cumprido seu dever de fundamentação, de modo a não incidir em excesso de linguagem, tendo em vista que ele apenas teria demonstrado seu convencimento acerca da materialidade do crime e dos indícios de autoria. Outrossim, ressaltou-se que a fundamentação do voto condutor do acórdão que confirmara a pronúncia também teria observado os limites inerentes à espécie de provimento jurisdicional, ao assentar a comprovação da materialidade do fato e dos indícios suficientes de autoria, consoante a norma vigente à época (CPP, art. 408: “Se o juiz se convencer da existência do crime e de indícios de que o réu seja o seu autor, pronunciá-lo-á, dando os motivos do seu

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HOMICÍDIO, NO ENTENDIMENTO DO STF Princípio da consunção: homicídio e posse ilegal de arma A 1ª Turma, por maioria, julgou extinto “habeas corpus” em que se discutia a aplicabilidade do princípio da consunção em hipótese de prática de homicídio com o uso de arma de fogo de numeração raspada. No caso, o paciente fora absolvido sumariamente em relação ao delito de homicídio, uma vez sua conduta haver caracterizado legítima defesa. Não obstante, remanescia a persecução penal no tocante ao crime de posse e porte de arma de fogo. A Turma reputou que os tipos penais seriam diversos, e que a excludente de ilicitude reconhecida quanto ao homicídio não alcançaria a posse ilegal de arma de fogo com numeração raspada. Vencido o Ministro Luiz Fux (relator), que concedia a ordem de ofício, por entender incidir o princípio da consunção. HC 120678/PR, rel. orig. Min. Luiz Fux, red. p/ o acórdão Min. Marco Aurélio, 24.2.2015. RHC N. 116.950-ES RELATORA: MIN. ROSA WEBER EMENTA: RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS. HOMICÍDIO NA DIREÇÃO DE VEÍCULO AUTOMOTOR. DOLO EVENTUAL. CULPA CONSCIENTE. PRONÚNCIA. TRIBUNAL DO JÚRI. 1. Admissível, em crimes de homicídio na direção de veículo automotor, o reconhecimento do dolo eventual, a depender das circunstâncias concretas da conduta. Precedentes. 2. Mesmo em crimes de trânsito, definir se os fatos, as provas e as circunstâncias do caso autorizam a condenação do paciente por homicídio doloso ou se, em realidade, trata-se de hipótese de homicídio culposo ou mesmo de inocorrência de crime é

questão que cabe ao Conselho de Sentença do Tribunal do Júri. 3. Não cabe na pronúncia analisar e valorar profundamente as provas, pena inclusive de influenciar de forma indevida os jurados, de todo suficiente a indicação, fundamentada, da existência de provas da materialidade e autoria de crime de competência do Tribunal do Júri. 4. Recurso ordinário em habeas corpus a que se nega provimento..Julgado em 17.02.2014. Racha” e dolo eventual A 1ª Turma, por maioria, denegou habeas corpus em que alegado constrangimento ilegal decorrente de: a) falta de fundamentação da sentença de pronúncia, porquanto genérica; b) substituição indevida de relatores na ocasião do segundo julgamento de recurso em sentido estrito, uma vez que a mesma desembargadora — que anteriormente proferira voto prevalecente pelo provimento do apelo — mudara sua convicção; c) excesso de linguagem no acórdão confirmatório da decisão que pronunciara o réu; e d) contradição neste decisum, haja vista que o conselho de sentença entendera que o co-réu não participara da disputa dolosamente, mas culposamente. No mérito, a defesa sustentava que a conduta objeto da denúncia não caracterizaria dolo eventual, mas culpa consciente, pelo que pugnava pelo deferimento da ordem, a fim de que fosse determinada a competência do juízo singular, e não do tribunal do júri, para julgar o paciente. De início, assinalou-se que o juízo pronunciante teria cumprido seu dever de fundamentação, de modo a não incidir em excesso de linguagem, tendo em vista que ele apenas teria demonstrado seu convencimento acerca da materialidade do crime e dos indícios de autoria. Outrossim, ressaltou-se que a fundamentação do voto condutor do acórdão que confirmara a pronúncia também teria observado os limites inerentes à espécie de provimento jurisdicional, ao assentar a comprovação da materialidade do fato e dos indícios suficientes de autoria, consoante a norma vigente à época (CPP, art. 408: “Se o juiz se convencer da existência do crime e de indícios de que o réu seja o seu autor, pronunciá-lo-á, dando os motivos do seu

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convencimento”). Ademais, consignou-se que nada impediria que o mesmo magistrado, ao participar de nova apreciação de recurso, revelasse convencimento diverso, desde que devidamente motivado. No ponto, asseverou-se que, verificada a anulação do primeiro julgamento, este não condicionaria a manifestação do órgão julgador no segundo. Quanto ao mérito, distinguiu-se o caso dos autos daquele versado no HC 107801/SP (DJe de 13.10.2011), que cuidara de homicídio na direção de veículo automotor cometido por agente sob o efeito de bebidas alcoólicas. Rememorou-se que o Colegiado limitara a aplicação da teoria da actio libera in causa aos casos de embriaguez preordenada. Sublinhou-se, entretanto, que não se deveria generalizar a compreensão de que qualquer homicídio praticado na direção de veículo automotor seria culposo, desde que tratasse de embriaguez preordenada. Elucidou-se que a diferença entre dolo eventual e culpa consciente encontrar-se-ia no elemento volitivo do tipo penal. Todavia, ante a impossibilidade de se adentrar a psique do agente, essa análise exigiria a observação de todas as circunstâncias objetivas do caso concreto. Nesse sentido, dessumiu-se, da descrição dos fatos realizada pelas instâncias ordinárias, que o réu, ao lançar-se em prática de altíssima periculosidade em via pública e mediante alta velocidade, teria consentido com que o resultado se produzisse, de sorte a incidir em dolo eventual (CP, art. 18, I: “Diz-se o crime: I – doloso, quando o agente quis o resultado ou assumiu o risco de produzi-lo”). No ponto, assentou-se que o Supremo firmara jurisprudência no sentido de que o homicídio cometido na direção de veículo automotor em virtude de “pega” seria doloso. Desta feita, aludiu-se que a prática de competições automobilísticas em vias públicas seria crime autônomo, doloso e de perigo concreto (CTB, art. 308: “Participar, na direção de veículo automotor, em via pública, de corrida, disputa ou competição automobilística não autorizada pela autoridade competente, desde que resulte dano potencial à

incolumidade pública ou privada”). Enfatizou-se que este tipo penal, se resultar em lesão corporal ou homicídio, progrediria para os delitos dispostos nos artigos 129 ou 121 do CP, em sua forma dolosa, visto que seria contra-senso transmudá-lo para a modalidade culposa em razão do advento de resultado mais grave. Assim, reconheceu-se presente o elemento volitivo do dolo eventual. Por fim, explicou-se tanto haver hipótese de “racha” entre dois condutores, assim como de apenas um motorista, que poderia perseguir outro veículo, o que denotaria um único imputável para a prática. Vencido o Min. Marco Aurélio, que concedia a ordem, para que os 2 réus respondessem criminalmente pelo fato tendo em conta o art. 302 do CTB (“Praticar homicídio culposo na direção de veículo automotor”). HC 101698/RJ, rel. Min. Luiz Fux, 18.10.2011.

HC N. 111.442-RS

RELATOR: MIN. GILMAR MENDES Habeas corpus. 2. Homicídio de trânsito. Embriaguez. Alta velocidade. Sinal vermelho. 3. Pronúncia. Homicídio simples. 4. Dolo eventual não se compatibiliza com a qualificadora do art. 121, § 2º, IV (traição, emboscada, dissimulação). 4. Ordem concedida para determinar o restabelecimento da sentença de pronúncia, com exclusão da qualificadora. Julgado em 28.08.2012. Dolo eventual e qualificadora da surpresa: incompatibilidade São incompatíveis o dolo eventual e a qualificadora da surpresa prevista no inciso IV do § 2º do art. 121 do CP (“§ 2° Se o homicídio é cometido: ... IV - à traição, de emboscada, ou mediante dissimulação ou outro recurso que dificulte ou torne impossível a defesa do ofendido”). Com base nesse entendimento, a 2ª Turma concedeu habeas corpus para determinar o restabelecimento da sentença de pronúncia, com exclusão da mencionada qualificadora. Na espécie, o paciente fora denunciado pela suposta

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prática dos crimes previstos no art. 121, § 2º, IV, c/c o art. 18, I, ambos do CP, e no art. 306 da Lei 9.503/97 porque, ao conduzir veículo em alta velocidade e em estado de embriaguez, ultrapassara sinal vermelho e colidira com outro carro, cujo condutor viera a falecer. No STJ, dera-se provimento a recurso especial, interposto pelos assistentes de acusação, e submetera-se a qualificadora da surpresa (art. 121, § 2º, IV) ao tribunal do júri. Considerou-se que, em se tratando de crime de trânsito, cujo elemento subjetivo teria sido classificado como dolo eventual, não se poderia, ao menos na hipótese sob análise, concluir que tivesse o paciente deliberadamente agido de surpresa, de maneira a dificultar ou impossibilitar a defesa da vítima. HC 111442/RS, rel. Min. Gilmar Mendes, 28.8.2012. HC N. 106.605-MG RELATOR: MIN. MARCO AURÉLIO JÚRI – QUALIFICADORA – EXCLUSÃO. A exclusão de qualificadora pressupõe quadro a torná-la imprópria, o que não ocorre quando simplesmente se aponta que a vítima saberia das ameaças perpetradas pelo agente. Examina-se, sob o ângulo de recurso a impossibilitar a defesa da vítima, o mecanismo adotado no evento, sendo neutras as ameaças. Julgado em 03.04.2012. Ementa: PENAL E PROCESSO PENAL. CONSTITUCIONAL. HABEAS CORPUS SUBSTITUTIVO DE RECURSO ORDINÁRIO. HOMICÍDIO. “PEGA” OU “RACHA” EM VIA MOVIMENTADA. DOLO EVENTUAL. PRONÚNCIA. FUNDAMENTAÇÃO IDÔNEA. ALTERAÇÃO DE ENTENDIMENTO DE DESEMBARGADORA NO SEGUNDO JULGAMENTO DO MESMO RECURSO, ANTE A ANULAÇÃO DO PRIMEIRO. AUSÊNCIA DE ILEGALIDADE. EXCESSO DE LINGUAGEM NO ACÓRDÃO CONFIRMATÓRIO DA PRONÚNCIA NÃO CONFIGURADO. DOLO EVENTUAL X CULPA CONSCIENTE. PARTICIPAÇÃO EM COMPETIÇÃO NÃO AUTORIZADA EM VIA PÚBLICA MOVIMENTADA. FATOS ASSENTADOS NA ORIGEM.

ASSENTIMENTO QUE SE DESSUME DAS CIRCUNSTÂNCIAS. DOLO EVENTUAL CONFIGURADO. AUSÊNCIA DE REVOLVIMENTO DO CONJUNTO FÁTICO-PROBATÓRIO. REVALORAÇÃO DOS FATOS. ORDEM DENEGADA. 1. O habeas corpus impetrado como substitutivo de recurso ordinário revela sua utilização promíscua e deve ser combatido, sob pena de banalização da garantia constitucional, tanto mais quando não há teratologia a eliminar, como no caso sub judice. I - DA ALEGADA FALTA DE FUNDAMENTAÇÃO DA PRONÚNCIA 2. A fundamentação da sentença de pronúncia deve observar os limites inerentes ao juízo de admissibilidade da acusação, restringindo-se a declinar as razões para o convencimento acerca da materialidade do fato e de indícios suficientes de autoria. Precedentes: HC 94274/SP, rel. Min. Carlos Britto, 1ª Turma, DJ de 4/2/2010; AI 458072-ED/CE rel. Min. Joaquim Barbosa, 2ª Turma, DJ de 15/10/2009; RE 521813/PB, rel. Min. Joaquim Barbosa, 2ªTurma, DJ de 19/3/2009. 3. A fórmula ideal para a fundamentação da sentença de pronúncia encontra-se no art. 413, § 1º do CPP, na redação da Lei nº 11.689/2008, que aperfeiçoou a redação outrora disposta no art. 408 do CPP, atentando para o problema do excesso de linguagem discutido amplamente na doutrina e para os julgados do Supremo e do STJ acolhendo a tese. 4. In casu, o Juízo pronunciante acautelou-se o quanto possível para não incidir em excesso de linguagem, e indicou os elementos que motivaram o seu convencimento acerca da materialidade do crime e dos indícios de autoria, apontando peças, declarações e testemunhos, por isso que a fundamentação declinada mostrou-se robusta e harmônica com a jurisprudência desta Corte. II - NULIDADES APONTADAS NO SEGUNDO JULGAMENTO QUANTO À ALTERAÇÃO DO VOTO DE DESEMBARGADORA 5. O sistema do livre convencimento motivado ou da persuasão racional permite ao magistrado revelar o seu convencimento sobre as provas dos autos livremente, desde que demonstre o raciocínio desenvolvido. 6. Verificada a anulação do primeiro julgamento, nada impede que o mesmo magistrado, participando de nova apreciação do recurso, revele convencimento diverso, desde que

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devidamente motivado, até porque o primeiro, ante a anulação, não surte qualquer efeito – muito menos o de condicionar a manifestação do Órgão Julgador. 7. Utile per inutile non vitiatur, por isso que ainda que a Desembargadora tivesse mantido o seu voto anterior, isto não implicaria em qualquer benefício para o paciente, porquanto já estava formada a maioria desprovendo o recurso. Vale dizer: se a declaração da nulidade pretendida não trará qualquer benefício à defesa, é de se concluir que o suposto vício não importou em prejuízo ao paciente, atraindo a incidência do art. 563 do CPP: “Nenhum ato será declarado nulo, se da nulidade não resultar prejuízo para a acusação ou para a defesa.” III - EXCESSO DE LINGUAGEM NO ACÓRDÃO CONFIRMATÓRIO DA PRONÚNCIA 8. A Lei nº 11.689/08, conferindo nova redação ao art. 478, inciso I, do CPP, vedou a alusão à sentença de pronúncia ou à decisão que a confirme em Plenário do Júri, justamente a fim de evitar a influência no ânimo dos jurados, fragilizando sobremaneira a tese do excesso de linguagem da pronúncia, uma vez que a referência a tais atos, na sessão do Júri, gera nulidade que pode ser alegada oportunamente pela defesa. Precedentes: HC 94274/SP, rel. Min. Carlos Britto, 1ª Turma, DJ de 4/2/2010; HC 86414/PE, rel. Min. Marco Aurélio, 1ª Turma, DJ de 5/2/2009. 9. In casu, a fundamentação do voto condutor do acórdão confirmatório da pronúncia observou os limites inerentes à espécie de provimento jurisdicional, assentando a comprovação da materialidade do fato e dos indícios suficientes de autoria, conforme dispunha o art. 408 do CPP, então em vigor. 10. O aprofundamento maior no exame das provas, no afã de demonstrar que havia elementos no sentido de tratar-se de delito praticado com dolo eventual, dada a relevância da tese então levantada pela defesa e a sua inegável repercussão sobre o status libertatis do paciente cumpre o postulado constitucional da motivação das decisões judiciais. É que, para afastar a competência do Tribunal do Júri, faz-se mister um juízo de certeza acerca da ausência de dolo. Nesse sentido a doutrina de Eugênio Pacelli de Oliveira: “O que se espera dele [juiz] é o exame do material probatório ali produzido, especialmente para a comprovação da

inexistência de quaisquer das possibilidades legais de afastamento da competência do Tribunal do Júri. E esse afastamento, como visto, somente é possível por meio de convencimento judicial pleno, ou seja, por meio de juízo de certeza, sempre excepcional nessa fase.” (Curso de Processo Penal, 10. ed., Lumen Juris, Rio de Janeiro: 2008, pp. 575-576) IV – ELEMENTO SUBJETIVO DO TIPO 11. O caso sub judice distingue-se daquele revelado no julgamento do HC nº 107801 (rel. min. Luiz Fux, 1ª Turma, DJ de 13/10/2011), que cuidou de paciente sob o efeito de bebidas alcoólicas, hipótese na qual gravitava o tema da imputabilidade, superada tradicionalmente na doutrina e na jurisprudência com a aplicação da teoria da actio libera in causa, viabilizando a responsabilidade penal de agentes alcoolizados em virtude de ficção que, levada às últimas consequências, acabou por implicar em submissão automática ao Júri em se tratando de homicídio na direção de veículo automotor. 12. A banalização do crime de homicídio doloso, decorrente da sistemática aplicação da teoria da “ação livre na causa” mereceu, por esta Turma, uma reflexão maior naquele julgado, oportunidade em que se limitou a aplicação da mencionada teoria aos casos de embriaguez preordenada, na esteira da doutrina clássica. 13. A precompreensão no sentido de que todo e qualquer homicídio praticado na direção de veículo automotor é culposo, desde não se trate de embriaguez preordenada, é assertiva que não se depreende do julgado no HC nº 107801. 14. A diferença entre o dolo eventual e a culpa consciente encontra-se no elemento volitivo que, ante a impossibilidade de penetrar-se na psique do agente, exige a observação de todas as circunstâncias objetivas do caso concreto, sendo certo que, em ambas as situações, ocorre a representação do resultado pelo agente. 15. Deveras, tratando-se de culpa consciente, o agente pratica o fato ciente de que o resultado lesivo, embora previsto por ele, não ocorrerá. Doutrina de Nelson Hungria (Comentários ao Código Penal, 5. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1980, v. 1., p. 116-117); Heleno

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Cláudio Fragoso (Lições de Direito Penal – parte geral, Rio de Janeiro: Forense, 2006, 17. ed., p. 173 – grifo adicionado) e Zaffaroni e Pierangelli (Manual de Direito Penal, Parte Geral, v. 1, 9. ed – São Paulo: RT, 2011, pp. 434-435 – grifos adicionados). 16. A cognição empreendida nas instâncias originárias demonstrou que o paciente, ao lançar-se em práticas de expressiva periculosidade, em via pública, mediante alta velocidade, consentiu em que o resultado se produzisse, incidindo no dolo eventual previsto no art. 18, inciso I, segunda parte, verbis: (“Diz-se o crime: I – doloso, quando o agente quis o resultado ou assumiu o risco de produzi-lo” - grifei). 17. A notória periculosidade dessas práticas de competições automobilísticas em vias públicas gerou a edição de legislação especial prevendo-as como crime autônomo, no art. 308 do CTB, in verbis: “Art. 308. Participar, na direção de veículo automotor, em via pública, de corrida, disputa ou competição automobilística não autorizada pela autoridade competente, desde que resulte dano potencial à incolumidade pública ou privada:”. 18. O art. 308 do CTB é crime doloso de perigo concreto que, se concretizado em lesão corporal ou homicídio, progride para os crimes dos artigos 129 ou 121, em sua forma dolosa, porquanto seria um contra-senso transmudar um delito doloso em culposo, em razão do advento de um resultado mais grave. Doutrina de José Marcos Marrone (Delitos de Trânsito Brasileiro: Lei n. 9.503/97. São Paulo: Atlas, 1998, p. 76). 19. É cediço na Corte que, em se tratando de homicídio praticado na direção de veículo automotor em decorrência do chamado “racha”, a conduta configura homicídio doloso. Precedentes: HC 91159/MG, rel. Min. Ellen Gracie, 2ª Turma, DJ de 24/10/2008; HC 71800/RS, rel. Min. Celso de Mello, 1ªTurma, DJ de 3/5/1996. 20. A conclusão externada nas instâncias originárias no sentido de que o paciente participava de “pega” ou “racha”, empregando alta velocidade, momento em que veio a colher a vítima em motocicleta, impõe reconhecer a presença do elemento volitivo, vale dizer, do dolo eventual no caso

concreto. 21. A valoração jurídica do fato distingue-se da aferição do mesmo, por isso que o exame da presente questão não se situa no âmbito do revolvimento do conjunto fático-probatório, mas importa em mera revaloração dos fatos postos nas instâncias inferiores, o que viabiliza o conhecimento do habeas corpus. Precedentes: HC 96.820/SP, rel. Min. Luiz Fux, j. 28/6/2011; RE 99.590, Rel. Min. Alfredo Buzaid, DJ de 6/4/1984; RE 122.011, relator o Ministro Moreira Alves, DJ de 17/8/1990. 22. Assente-se, por fim, que a alegação de que o Conselho de Sentença teria rechaçado a participação do corréu em “racha” ou “pega” não procede, porquanto o que o Tribunal do Júri afastou com relação àquele foi o dolo ao responder negativamente ao quesito: “Assim agindo, o acusado assumiu o risco de produzir o resultado morte na vítima?”, concluindo por prejudicado o quesito alusivo à participação em manobras perigosas. 23. Parecer do MPF pelo indeferimento da ordem. 24. Ordem denegada. (HC 101698, Relator(a): Min. LUIZ FUX, Primeira Turma, julgado em 18/10/2011, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-227 DIVULG 29-11-2011 PUBLIC 30-11-2011) Desclassificação de homicídio doloso para culposo na direção de veículo automotor Em conclusão, a 1ª Turma deferiu, por maioria, habeas corpus para desclassificar o delito de homicídio doloso para culposo na direção de veículo automotor, descrito na revogada redação do art. 302, parágrafo único, V, da Lei 9.503/97 – CTB (“Art. 302. Praticar homicídio culposo na direção de veículo automotor: … Parágrafo único. No homicídio culposo cometido na direção de veículo automotor, a pena é aumentada de um terço à metade, se o agente: … V – estiver sob a influência de álcool ou substância tóxica ou entorpecente de efeitos análogos”) — v. Informativo 629. Inicialmente, ressaltou-se que o exame da questão não demandaria revolvimento do conjunto fático-probatório, mas apenas revaloração jurídica do que descrito nas instâncias inferiores. Em seguida, consignou-se que a aplicação da teoria da actio libera in causa somente seria

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admissível para justificar a imputação de crime doloso no caso de embriaguez preordenada quando ficasse comprovado que o agente teria se inebriado com o intuito de praticar o ilícito ou assumir o risco de produzi-lo, o que não ocorrera na espécie dos autos. Asseverou-se que, nas hipóteses em que o fato considerado doloso decorresse de mera presunção em virtude de embriaguez alcoólica eventual, prevaleceria a capitulação do homicídio como culposo na direção de veículo automotor em detrimento daquela descrita no art. 121 do CP. O Min. Marco Aurélio acrescentou que haveria norma especial a reger a matéria, com a peculiaridade da causa de aumento decorrente da embriaguez ao volante. Sublinhou que seria contraditória a prática generalizada de se vislumbrar o dolo eventual em qualquer desastre de veículo automotor com o resultado morte, porquanto se compreenderia que o autor do crime também submeteria a própria vida a risco. Vencida a Min. Cármen Lúcia, relatora, que denegava a ordem por reputar que a análise de ocorrência de culpa consciente ou de dolo eventual em processos de competência do tribunal do júri demandaria aprofundado revolvimento da prova produzida no âmbito da ação penal. HC 107801/SP, rel. orig. Min. Cármen Lúcia, red. p/ o acórdão Min. Luiz Fux, 6.9.2011. Ementa: PENAL. HABEAS CORPUS. JÚRI. HOMICÍDIO CONSUMADO E TENTADO DUPLAMENTE QUALIFICADO, RECEPTAÇÃO, ADULTERAÇÃO DE SINAL IDENTIFICADOR DE VEÍCULO AUTOMOTOR E FORMAÇÃO DE QUADRILHA OU BANDO (CPB, ARTS. 121, § 2º, IV E ; 121, § 2º, IV E V, C/C ART. 14, II; 180, 288 E 311). CONDENAÇÃO CONTRÁRIA À PROVA DOS AUTOS, QUANTO AOS CRIMES DE HOMICÍDIO CONSUMADO E TENTADO E AUSÊNCIA DE AUTORIA NO QUE TANGE AOS DEMAIS. TEMAS QUE DEMANDAM APROFUNDADO REEXAME DE FATOS. INVIABILIDADE EM HABEAS CORPUS. PENA. INDEVIDA EXACERBAÇÃO. INOCORRÊNCIA. PERSONALIDADE VOLTADA AO CRIME

E MAUS ANTECEDENTES COMPROVADOS POR ANTERIOR SENTENÇA CONDENATDÓRIA TRANSITADA EM JULGADO. BASE EMPÍRICA. PRESENÇA. 1. O Habeas corpus não é o instrumento processual adequado ao reexame de fatos e provas no que se visa a demonstrar a ausência do animus necandi e, em consequência, condenação contrária a prova dos autos, nem a ausência de autoria em relação a outros crimes conexos com o homicídio (HC 62.321, Rel. Min. Néri da Silveira, 1ª Turma, DJ de 08/03/85; HC 86.033, Rel. Min. Carlos Britto, 1ª Turma, DJ de 03/02/06; HC 72.555, Rel. Min. Néri da Silveira, 2ª Turma, DJ de 28/04/00; HC 72.378, Rel. Min. Celso de Mello, 1ª Turma, DJ de 06/11/2006, e HC 69.489, Rel. Min. Celso de Mello, 1ª Turma, DJ de 06/11/2006). 2. In casu, não há como acolher, sem aprofundado reexame de fatos e provas, a tese de condenação do Tribunal do Júri contrária à prova dos autos e, desse modo, afastar o animus necandi, quando evidenciado que o paciente implementou as condições logísticas para a ocorrência do evento delituoso, ao providenciar crachás e uniformes médicos e veículo para que ele e seus comparsas adentrassem hospital público, armados, para resgatar preso que estava sob escolta de policiais civis, resultando as condutas em um homicídio consumado e outro tentado, resultados previsíveis. 3. O art. 29 do Código Penal estabelece que "quem, de qualquer modo concorre para o crime incide nas penas a ele cominadas, na medida da sua culpabilidade". Por isso que, comprovada a relevância da conduta do paciente na consumação e tentativa de homicídio, descabe afastar sua responsabilidade penal por tais crimes. 4. A negativa de autoria quanto aos crimes subjacentes ao homicídio e submetidos ao Júri por conexão, consistentes na receptação, adulteração de sinal identificador de veículo e formação de quadrilha é insuscetível em habeas corpus. 5. A associação eventual para o crime de homicídio, como tese de defesa, visando a afastar o delito de formação de quadrilha, esbarra na prova inequívoca de que o paciente e os

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demais eram componentes da societas sceleris para a prática de outros delitos. 6. A dosimetria da pena, com a exacerbação da pena-base à consideração da personalidade do paciente voltada para o crime e de seus maus antecedentes, circunstâncias devidamente vinculadas à base empírica, porquanto demonstrada a propensão ao crime e anterior condenação penal transitada em julgado, resta imune de error in judicando. Consectariamente, resta impossível de reforma o acórdão que assentou: "HABEAS CORPUS. HOMICÍDIOS QUALIFICADOS, TENTADO E CONSUMADO, FORMAÇÃO DE QUADRILHA, RECEPTAÇÃO E ADULTERAÇÃO DE SINAL IDENTIFICADOR DE VEÍCULOS. PACIENTE CONDENADO À PENA DE 36 ANOS DE RECLUSÃO EM REGIME INICIAL FECHADO E MULTA. INEXISTÊNCIA DE DECISÃO CONTRÁRIA À PROVA DOS AUTOS. SOBERANIA DOS VEREDICTOS. IMPROPRIEDADE DO MANDAMUS PARA AFERIR A INOCÊNCIA DO ACUSADO. PRECEDENTES. DOSIMETRIA DA PENA. PENA-BASE FIXADA ACIMA DO MÍNIMO LEGAL. CIRCUNSTÂNCIAS JUDICIAIS DESFAVORÁVEIS. PERSONALIDADE VOLTADA PARA A PRÁTICA DELITUOSA. ANTECEDENTES CRIMINAIS (DIVERSAS CONDENAÇÕES TRANSITADAS EM JULGADO). CONSEQUÊNCIAS DO CRIME. PARECER DO MPF PELA DENEGAÇÃO DO WRIT. ORDEM DENEGADA. Não há que falar em decisão manifestamente contrária à prova dos autos quando se constata que, diante das versões apresentadas pela acusação e pela defesa, concluiu o Tribunal do Júri por afastar a tese de desclassificação do homicídio, reconhecendo a conduta do paciente da forma expressada na denúncia e sustentada pela acusação. 2. O Habeas Corpus não é o meio adequado para se rever decisão soberana tomada pelo Júri Popular, pois não se comporta dilação probatória; por isso, infirmar os fundamentos consignados no acórdão impugnado com o objetivo de reconhecer que o julgamento foi contrário à prova dos

autos é medida que não cabe em sede de Habeas Corpus, marcado por cognição sumária e rito célere, motivo pelo qual não comporta o exame de questões que, para seu deslinde, demandem aprofundado exame do conjunto fático-probatório dos autos, peculiar ao processo de conhecimento (HC 69.567/DF, Rel. Min. ARNALDO ESTEVES LIMA, DJU 06.08.07). 3. Inexiste constrangimento ilegal a ser sanado em Habeas Corpus, se a majoração da pena-base acima do mínimo legal restou devidamente motivada pelo Julgador, na forma do art. 59 do CPB, em vista do reconhecimento de circunstâncias judiciais desfavoráveis ao paciente, tais como maus antecedentes, conduta social e personalidade desajusta e voltada para a prática de ilícitos e consequências do crime. 4. Ordem denegada, em consonância com o parecer ministerial." 7. Recurso ordinário em habeas corpus a se nega provimento. (RHC 103542, Relator(a): Min. LUIZ FUX, Primeira Turma, julgado em 06/09/2011, DJe-185 DIVULG 26-09-2011 PUBLIC 27-09-2011 EMENT VOL-02595-01 PP-00065) ED: dosimetria e circunstância judicial Em conclusão, a 1ª Turma rejeitou embargos declaratórios opostos de acórdão denegatório de habeas corpus impetrado em favor de pronuniciado por homicídio simples entretanto, por maioria, concedeu a ordem de ofício — v. Informativo 631. No caso, a juíza-presidente do tribunal do júri evocara na primeira fase da dosimetria, a título de circunstâncias judiciais, dados que consubstanciariam qualificadoras como o motivo fútil, a premeditação e a surpresa da vítima. Ressaltou-se que a sentença não aludira a qualquer outra circunstância judicial. Concluiu-se que aqueles aspectos não poderiam ser considerados à luz do art. 59 do CP, porquanto não seria possível a magistrada substituir o Ministério Público, tampouco o corpo de jurados, já que o paciente não fora denunciado, pronunciado e julgado por homicídio qualificado. Vencidos os Ministros Cármen Lúcia, relatora, e Luiz Fux, que consignavam que a alteração da pena

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exigiria o revolvimento de prova, atividade incompatível com os limites do habeas. HC 107501 ED/GO, rel. orig. Min. Cármen Lúcia, red. p/ o acórdão Min. Marco Aurélio, 2.8.2011. Dolo eventual e qualificadora: incompatibilidade São incompatíveis o dolo eventual e a qualificadora prevista no inciso IV do § 2º do art. 121 do CP (“§ 2º Se o homicídio é cometido: … IV – à traição, de emboscada ou mediante dissimulação ou outro recurso que dificulte ou torne impossível a defesa do ofendido”). Com base nesse entendimento, a 2ª Turma deferiu habeas corpus impetrado em favor de condenado à pena de reclusão em regime integralmente fechado pela prática de homicídio qualificado descrito no artigo referido. Na espécie, o paciente fora pronunciado por dirigir veículo, em alta velocidade, e, ao avançar sobre a calçada, atropelara casal de transeuntes, evadindo-se sem prestar socorro às vítimas. Concluiu-se pela ausência do dolo específico, imprescindível à configuração da citada qualificadora e, em conseqüência, determinou-se sua exclusão da sentença condenatória. Precedente citado: HC 86163/SP (DJU de 3.2.2006). HC 95136/PR, rel. Min. Joaquim Barbosa, 1º.3.2011. Portador do Vírus HIV e Tentativa de Homicídio – Em conclusão de julgamento, a Turma deferiu habeas corpus para imprimir a desclassificação do delito e determinar o envio do processo para distribuição a uma das varas criminais comuns estaduais. Tratava-se de writ em que se discutia se o portador do vírus HIV, tendo ciência da doença e deliberadamente a ocultando de seus parceiros, teria praticado tentativa de homicídio ao manter relações sexuais sem preservativo. A defesa pretendia a desclassificação do delito para o de perigo de contágio de moléstia grave (CP: “Art. 131 Praticar, com o fim de transmitir a outrem moléstia grave de que está contaminado, ato capaz de produzir o contágio: …”) — v.

Informativo 584. Entendeu-se que não seria clara a intenção do agente, de modo que a desclassificação do delito far-se-ia necessária, sem, entretanto, vinculá-lo a um tipo penal específico. Tendo em conta que o Min. Marco Aurélio, relator, desclassificava a conduta para o crime de perigo de contágio de moléstia grave (CP, art. 131) e o Min. Ayres Britto, para o de lesão corporal qualificada pela enfermidade incurável (CP, art. 129, § 2º, II), chegou-se a um consenso, apenas para afastar a imputação de tentativa de homicídio. Salientou-se, nesse sentido, que o Juiz de Direito, competente para julgar o caso, não estaria sujeito sequer à classificação apontada pelo Ministério Público. HC 98712/SP, rel. Min. Marco Aurélio, 5.10.2010. Homicídio: Compatibilidade entre Dolo Eventual e Qualificadora da Torpeza O dolo eventual pode coexistir com a qualificadora do motivo torpe do crime de homicídio. Com base nesse entendimento, a Turma desproveu recurso ordinário em habeas corpus interposto em favor de médico pronunciado pela prática dos delitos de homicídio qualificado e de exercício ilegal da medicina (artigos 121, § 2º, I e 288, parágrafo único, ambos c/c o art. 69, do CP, respectivamente), em decorrência do fato de, mesmo inabilitado temporariamente para o exercício da atividade, havê-la exercido e, nesta condição, ter realizado várias cirurgias plásticas — as quais cominaram na morte de algumas pacientes —, sendo motivado por intuito econômico. A impetração sustentava a incompatibilidade da qualificadora do motivo torpe com o dolo eventual, bem como a inadequação da linguagem utilizada na sentença de pronúncia pela magistrada de primeiro grau. Concluiu-se pela mencionada compossibilidade, porquanto nada impediria que o paciente — médico —, embora prevendo o resultado e assumindo o risco de levar os seus pacientes à morte, praticasse a conduta motivado por outras razões, tais como torpeza ou futilidade. Afastou-se, também, a alegação de excesso de linguagem, ao fundamento de que a decisão de pronúncia estaria bem

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motivada, na medida em que a juíza pronunciante — reconhecendo a existência de indícios suficientes de autoria e materialidade do fato delituoso — tivera a cautela, a cada passo, de enfatizar que não estaria antecipando qualquer juízo condenatório, asseverando que esta seria uma competência que assistiria unicamente ao Tribunal do Júri. RHC 92571/DF, rel. Min. Celso de Mello, 30.6.2009. Enquadramento Jurídico e Latrocínio Tentado A Turma indeferiu habeas corpus no qual pronunciado por tentativa de latrocínio alegava que a não apreciação das teses da defesa, apresentadas antes da sentença monocrática, configuraria nulidade insanável, na medida em que, se essas tivessem sido examinadas, ele poderia ser responsabilizado apenas por lesões corporais. No caso, o paciente fora denunciado pela suposta prática do crime de tentativa de homicídio qualificado em concurso material com roubo circunstanciado (CP, art. 121, § 2º, V, c/c o art. 14, II e o art. 157, § 2º, I, II e V), mas sua defesa requerera a impronúncia tanto por homicídio quanto por latrocínio tentado ou, alternativamente, a desclassificação para lesões corporais. Ocorre que o juízo sentenciante o impronunciara somente das imputações contidas na denúncia, o que ensejara a interposição, pela defesa, de recurso em sentido estrito, ao argumento de ofensa ao princípio da ampla defesa, já que não examinados seus argumentos. Não provido esse recurso, foram impetrados habeas corpus perante as demais instâncias, também denegados. Daí a presente impetração, sob idêntico fundamento. Aduziu-se que, reconhecido, pela sentença condenatória, o dolo de matar, ficara suficientemente respondida a preliminar da defesa. Entretanto, por considerar que a referida sentença não enquadrara corretamente os fatos, concedeu-se a ordem, de ofício, para anular a sentença condenatória, a fim de que o paciente seja submetido ao Tribunal do Júri. Asseverou-se que os fatos por ele praticados ocorreram em 2 momentos. Iniciado o roubo, os agentes, diante da reação inesperada das vítimas, teriam desistido da empreitada, saindo do veículo

e liberando-as. No segundo momento, a vítima que estava na direção decidira perseguir os assaltantes em fuga, ocasião em que o paciente, temendo ser preso, atirara contra ela, causando-lhe ferimentos. Assim, tendo em conta que a cadeia causal relativa ao delito de roubo rompera-se quando o paciente desistira da sua prática, concluiu-se restar caracterizado o crime de constrangimento ilegal consumado (CP, art. 146) em concurso material com a tentativa de homicídio qualificado (“V – para assegurar … a impunidade … de outro crime;”). Observou-se, ao final, que, em caso de nova condenação, a pena aplicada não poderá superar aquela fixada na sentença anulada. HC 97104/SP, rel. Min. Eros Grau, 26.5.2009. Homicídio Culposo: Inobservância de Regra Técnica e Bis in Idem Por reputar configurado bis in idem, a Turma deferiu habeas corpus para afastar a causa de aumento de pena decorrente da inobservância de regra técnica de profissão (CP, art. 121, § 4º, primeira parte). Na espécie, as pacientes foram acusadas de homicídio culposo agravado pela “inobservância da boa técnica da profissão médica” no pós-operatório da vítima, a qual teria falecido em conseqüência de infecção, cujos sintomas não foram observados pelas pacientes que, dessa forma, teriam deixado de adotar as medidas cabíveis, dentre elas, a realização de exame específico. A impetração alegava em síntese: a) que a peça acusatória não indicaria a norma técnica que deveria ter sido observada, impossibilitando a ampla defesa; b) que o fato — a suposta inobservância da regra técnica de profissão — seria apresentada na denúncia como núcleo da culpa (na modalidade negligência) e, ao mesmo tempo, como causa especial de aumento de pena, contrariando o princípio do ne bis in idem e c) que a desconsideração da agravante tornaria possível a suspensão condicional do processo (Lei 9.099/95, art. 89). Esclareceu-se, inicialmente, não ter a legislação penal previsto a figura de homicídio culposo qualificado por inobservância de regra técnica. Asseverou-se, entretanto, que isso não significaria que a causa de aumento de

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pena fosse inaplicável, mas apenas que seria mister a concorrência de duas condutas distintas: uma para fundamentar a culpa, e outra para configurar a majorante. Ressaltou-se ser impróprio atribuir-se, a priori, maior reprovabilidade penal à omissão negligente, que ofende dever fundado em norma regulamentar, que à violação das pautas sociais de cuidado. Observou-se haver, na denúncia, a descrição de uma sucessão de atos que, em tese, indicariam a negligência das médicas em ignorar os sintomas da doença que, diante das circunstâncias, não lhes era permitido desconhecer. Salientou-se, contudo, que, no caso, se as médicas ignoraram a presença dos sintomas, seria natural que tivessem procedido como se não houvesse doença por tratar. Daí a não realização do exame — que, segundo a peça exordial acusatória, teria diagnosticado o problema — ser mera decorrência da primeira omissão, e não nova conduta. Desse modo, patenteou-se ter a mesma conduta servido à denúncia como fundamento da culpa e da causa de aumento da pena. Por fim, determinou-se que fosse dada vista dos autos ao Ministério Público para manifestação a respeito do disposto no art. 89 da Lei 9.099/95. HC 95078/RJ, rel. Min. Cezar Peluso, 10.3.2009.

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HOMICÍDIO, NO

ENTENDIMENTO

DO STJ

Sexta Turma

AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO

EM RECURSO ESPECIAL. HOMICÍDIO

CULPOSO NA DIREÇÃO DE VEÍCULO

AUTOMOTOR (ART. 302 DO CÓDIGO DE

TRÂNSITO BRASILEIRO - CTB).

SUSPENSÃO DA HABILITAÇÃO POR

TEMPO INFERIOR AO DA PENA

PRIVATIVA DE LIBERDADE. PRAZO

RAZOÁVEL E PROPORCIONAL À

GRAVIDADE DO FATO TÍPICO E AO

GRAU DE CENSURA MERECIDO PELO

AGENTE.

AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO.

- A suspensão da habilitação para dirigir

veículo automotor constitui uma

penalidade que pode ser aplicada

isolada ou, como no caso concreto,

cumulada com pena privativa de

liberdade (art. 292 do CTB). O prazo de

duração dessa suspensão varia de 2

meses a 5 anos (art. 293 do CTB),

devendo ser proporcional à gravidade

do fato típico e ao grau de censura

merecido pelo agente.

- Levando-se em consideração esses

elementos, na hipótese dos autos, em

que um ciclista morreu em decorrência

da negligência do recorrente na direção

do veículo automotor, delito de extrema

gravidade, não se mostra

desproporcional ou irrazoável a

suspensão da habilitação por 1 ano,

prazo inferior ao da pena privativa de

liberdade. Aliás, essa suspensão

representa de forma mais considerável a

finalidade preventiva da resposta

estatal, resguardando a integridade

física de terceiros.

- Incide o Enunciado n. 83 do Superior

Tribunal de Justiça - STJ quando a

decisão proferida pelo Tribunal de

origem encontra-se em harmonia com a

jurisprudência desta Corte.

Agravo regimental desprovido.

(AgRg no AREsp 466.124/AL, Rel.

Ministro ERICSON MARANHO

(DESEMBARGADOR CONVOCADO DO

TJ/SP), SEXTA TURMA, julgado em

09/06/2015, DJe 24/06/2015)

Sexta Turma

RECURSO ESPECIAL. EMBRIAGUEZ AO

VOLANTE (ART. 306 DA LEI

N.9.503/1997) E HOMICÍDIO CULPOSO

NO TRÂNSITO (ART. 302 DA LEI N.

9.503/1997). PRINCÍPIO DA

CONSUNÇÃO. INCIDÊNCIA. RECURSO

ESPECIAL PROVIDO.

1. A violação da norma que regula o fato

de menor gravidade, relacionada, em

termos, à proibição de um ato que

conduza ao fato mais grave, esgota-se

concretamente no resultado desse

último.

2. O crime de embriaguez (art. 306 da Lei

n. 9.503/1997) ao volante é antefato

impunível do crime de homicídio

culposo no trânsito (art.

302 da Lei n. 9.503/1997), porquanto a

conduta antecedente está de tal forma

vinculada à subsequente que não há

como separar sua avaliação (ambos

integram o mesmo conteúdo de injusto).

Precedentes.

3. Recurso especial provido, a fim de

que seja o réu absolvido do crime

descrito no art. 306 da Lei n. 9.503/1997.

(REsp 1481023/DF, Rel. Ministro

ROGERIO SCHIETTI CRUZ, SEXTA

TURMA, julgado em 07/05/2015, DJe

08/05/2015)

Sexta Turma

HABEAS CORPUS. HOMICÍDIO SIMPLES

E LESÃO CORPORAL LEVE NA

DIREÇÃO DE VEÍCULO AUTOMOTOR.

WRIT SUBSTITUTIVO DE RECURSO

ESPECIAL. NÃO CABIMENTO.

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VERIFICAÇÃO DE EVENTUAL COAÇÃO

ILEGAL À LIBERDADE DE

LOCOMOÇÃO. VIABILIDADE. DOLO

EVENTUAL. PRETENSÃO DE

DESCLASSIFICAÇÃO PARA A FORMA

CULPOSA. PRONÚNCIA QUE ADMITIU A

ACUSAÇÃO DO PACIENTE, QUE, EM

TESE, DIRIGINDO SOB A INFLUÊNCIA

DE ÁLCOOL E EM ALTA VELOCIDADE

NA CONTRAMÃO DE DIREÇÃO, VEIO A

OCASIONAR A MORTE DE DUAS

PESSOAS E LESÃO CORPORAL EM

OUTRA. CIRCUNSTÂNCIAS DO FATO

CAPAZES DE DEMONSTRAR A

OCORRÊNCIA DO DOLO EVENTUAL.

OFENSA À INTEGRIDADE DAS VÍTIMAS

QUE FAZ PARTE DO RESULTADO

ASSUMIDO PELO AGENTE. ALCANÇAR

CONCLUSÃO INVERSA. REEXAME DE

PROVAS. TAREFA RESERVADA AO

CONSELHO DE SENTENÇA.

1. O Supremo Tribunal Federal e o

Superior Tribunal de Justiça, em

recentes decisões, não admitem mais a

utilização do habeas corpus como

sucedâneo do meio processual

adequado, seja o recurso próprio ou

mesmo a revisão criminal, salvo em

situações excepcionais.

2. O Superior Tribunal de Justiça tem

decidido que o dolo eventual não é

extraído da "mente do agente", mas das

circunstâncias do fato, de modo que a

ocorrência das duas mortes e da lesão

corporal, ou seja, a ofensa à integridade

física de três vítimas, faz parte do

resultado assumido pelo agente, que,

sob a influência de álcool e em alta

velocidade, trafegou na contramão de

direção.

3. No caso, tais elementos foram bem

delineados na denúncia, demonstrando-

se a antevisão do acusado a respeito do

resultado assumido, sendo capaz,

portanto, de justificar a imputação.

4. Alcançar conclusão inversa da

estampada pelas instâncias ordinárias,

além de demandar reexame de provas, é

tarefa que compete ao Conselho de

Sentença, quando do julgamento do

paciente pelo Tribunal do Júri.

Precedentes.

5. Writ não conhecido.

(HC 301.295/SP, Rel. Ministro

SEBASTIÃO REIS JÚNIOR, SEXTA

TURMA, julgado em 28/04/2015, DJe

13/05/2015)

Sexta Turma

PENAL E PROCESSO PENAL. AGRAVO

REGIMENTAL NO AGRAVO EM

RECURSO ESPECIAL. HOMICÍDIO

CULPOSO E LESÃO CORPORAL

CULPOSA NA DIREÇÃO DE VEÍCULO

AUTOMOTOR. AUSÊNCIA DE

INDICAÇÃO DO PERMISSIVO

CONSTITUCIONAL. SÚMULA N. 284 DO

SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL - STF.

CULPA EXCLUSIVA DE TERCEIRO.

SÚMULA N. 7 DO SUPERIOR TRIBUNAL

DE JUSTIÇA - STJ. PERDÃO JUDICIAL.

VÍNCULO AFETIVO ENTRE RÉU E

VÍTIMA.

NECESSIDADE. SÚMULA N. 83/STJ.

RECURSO DESPROVIDO.

- A ausência de indicação do permissivo

constitucional que autoriza a

interposição do recurso especial torna

sua fundamentação deficiente, a atrair a

incidência do verbete nº 284 da Súmula

do Supremo Tribunal Federal (AgRg no

AREsp 165.022/SP, Rel. Ministro Marco

Aurélio Bellizze, Quinta Turma, DJe

3/9/2013).

- A pretensão da defesa em ver

reconhecida a culpa exclusiva de

terceiro demandaria o reexame de todo

o contexto fático-probatório dos autos,

o que é defeso a esta Corte, em vista do

óbice da Súmula n. 7/STJ.

- A melhor doutrina, quando a avaliação

está voltada para o sofrimento

psicológico do agente, enxerga no § 5º a

exigência de um vínculo, de um laço

prévio de conhecimento entre os

envolvidos, para que seja "tão grave" a

consequência do crime ao agente. A

interpretação dada, na maior parte das

vezes, é no sentido de que só sofre

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intensamente o réu que, de forma

culposa, matou alguém conhecido e

com quem mantinha laços afetivos

(REsp 1455178/DF, Rel. Ministro Rogerio

Schietti Cruz, Sexta Turma, DJe

06/06/2014).

- Incide o Enunciado n. 83/STJ quando a

decisão proferida pelo Tribunal de

origem encontra-se em harmonia com a

jurisprudência desta Corte.

Agravo regimental desprovido.

(AgRg nos EDcl no AREsp 604.337/RJ,

Rel. Ministro ERICSON MARANHO

(DESEMBARGADOR CONVOCADO DO

TJ/SP), SEXTA TURMA, julgado em

28/04/2015, DJe 11/05/2015)

Sexta Turma

PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO

AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL.

HOMICÍDIO DOLOSO QUALIFICADO

PELO PERIGO COMUM NA FORMA

TENTADA.

COMPATIBILIDADE ENTRE O DOLO

EVENTUAL E A MODALIDADE TENTADA

DO DELITO. ACÓRDÃO ESTADUAL EM

HARMONIA COM A JURISPRUDÊNCIA

DESTA CORTE SUPERIOR. SÚMULA N.

83 DO SUPERIOR TRIBUNAL DE

JUSTIÇA - STJ. SENTENÇA DE

PRONÚNCIA. PRETENSÃO DE

EXCLUSÃO DE QUALIFICADORA.

IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA N. 7/STJ.

AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO.

- Esta Corte Superior de Justiça já se

posicionou no sentido da

compatibilidade entre o dolo eventual e

o crime tentado.

(AgRg no REsp 1199947/DF, Rel.

Ministra Laurita Vaz, Quinta Turma, DJe

17/12/2012) - Analisar se as

qualificadoras mantidas pelo Tribunal de

origem são ou não manifestamente

improcedentes implica,

necessariamente, no reexame do

material fático-probatório dos autos,

procedimento inadmissível em recurso

especial. Incidência da Súmula n.

7/STJ.

Agravo regimental desprovido.

(AgRg no AREsp 608.605/MS, Rel.

Ministro ERICSON MARANHO

(DESEMBARGADOR CONVOCADO DO

TJ/SP), SEXTA TURMA, julgado em

28/04/2015, DJe 07/05/2015)

Quinta Turma

PROCESSUAL PENAL. RECURSO

ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS.

CRIME DE HOMICÍDIO CULPOSO NA

DIREÇÃO DE VEÍCULO AUTOMOTOR.

INÉPCIA DA DENÚNCIA. AUSÊNCIA

DOS REQUISITOS DO ART. 41, DO CPP.

NULIDADE.

RECURSO PROVIDO.

I - A alegação de inépcia da denúncia

deve ser analisada de acordo com o que

dispõem os arts. 41, do CPP, e 5º, LV, da

CF/88. A peça acusatória deve conter a

exposição do fato delituoso em toda a

sua essência e com todas as suas

circunstâncias. Denúncias genéricas,

que não descrevem os fatos na sua

devida conformação, não se coadunam

com os postulados básicos do Estado

de Direito (HC 86.000/PE, Segunda

Turma, Rel. Min. Gilmar Mendes, DJU de

2/2/2007).

A inépcia da denúncia caracteriza

situação configuradora de desrespeito

estatal ao postulado do devido processo

legal.

II - In casu, a inicial acusatória, pelo

crime de homicídio culposo na direção

de veículo automotor, não preenche os

requisitos exigidos pelo art. 41 do CPP.

Isso porque o simples fato de o

recorrente dirigir motocicleta sem

habilitação não possui o condão de

autorizar a imediata subsunção ao tipo

penal. Deveria o Parquet ter evidenciado

qual foi, in casu, a conduta imprudente

ou negligente que veio a ocasionar a

morte da vítima (precedentes do STF e

do STJ).

Recurso ordinário provido.

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(RHC 44.990/AL, Rel. Ministro FELIX

FISCHER, QUINTA TURMA, julgado em

07/04/2015, DJe 29/04/2015)

Quinta Turma

PENAL E PROCESSUAL PENAL. ART.

261, § 3º E 263 DO CÓDIGO PENAL.

CONTRADIÇÃO APONTADA.

INEXISTÊNCIA DE REFORMATIO IN

PEJUS. OMISSÃO.

INEXISTÊNCIA. REDISCUSSÃO DA

MATÉRIA. IMPOSSIBILIDADE.

VIOLAÇÃO AO ART. 68, PARÁGRAFO

ÚNICO, DO CP. OMISSÃO. MATÉRIA

NÃO PREQUESTIONADA. CAUSA DE

AUMENTO. COMPATIBILIDADE.

I - Decisão que julga o recurso especial,

mas é tornada sem efeito pela Relatora

por constatar error in procedendo não

vincula exame posterior do mérito das

insurgências manifestadas por ambas

as partes. Não há que se falar, portanto,

em reformatio in pejus.

II - São cabíveis embargos declaratórios

quando houver na decisão embargada

qualquer contradição, omissão ou

obscuridade a ser sanada.

Podem também ser admitidos para a

correção de eventual erro material,

consoante entendimento preconizado

pela doutrina e jurisprudência, sendo

possível, excepcionalmente, a alteração

ou modificação do decisum embargado.

III - Inviável, entretanto, a concessão do

excepcional efeito modificativo quando,

sob o pretexto de ocorrência de

omissão na decisão embargada, é nítida

a pretensão de rediscutir matéria já

incisivamente apreciada.

IV - A apontada violação ao art. 68,

parágrafo único, do CP, não foi

enfrentada pelo acórdão embargado,

caracterizada, neste ponto, omissão.

Não obstante, a matéria não foi

apreciada pelo eg.

Tribunal de origem nem tampouco

suscitada em sede de contrarrazões de

apelação, configurada, portanto, a falta

de prequestionamento.

(Precedentes).

V - Não há incompatibilidade na

aplicação do disposto no art. 258 do CP

e, simultaneamente, da majorante

inserta no art. 121, § 4º do mesmo

diploma legal.

Embargos de declaração parcialmente

acolhidos sem efeitos modificativos.

(EDcl no REsp 1458012/MT, Rel. Ministro

FELIX FISCHER, QUINTA TURMA,

julgado em 24/03/2015, DJe 10/04/2015)

Quinta Turma

PENAL E PROCESSO PENAL. HABEAS

CORPUS SUBSTITUTIVO DE RECURSO

ESPECIAL. NÃO CABIMENTO.

HOMICÍDIO CULPOSO. APLICAÇÃO DA

MAJORANTE PREVISTA NO § 4º DO

ART. 121 DO CP. ADMISSIBILIDADE.

AUSÊNCIA DE CUIDADO OBJETIVO

DEVIDAMENTE INDICADA.

I - A Primeira Turma do col. Pretório

Excelso firmou orientação no sentido de

não admitir a impetração de habeas

corpus substitutivo ante a previsão legal

de cabimento de recurso ordinário. As

Turmas que integram a Terceira Seção

desta Corte alinharam-se a esta dicção,

e, desse modo, também passaram a

repudiar a utilização desmedida do writ

substitutivo em detrimento do recurso

adequado.

II - Portanto, não se admite mais,

perfilhando esse entendimento, a

utilização de habeas corpus substitutivo

quando cabível o recurso próprio,

situação que implica o não

conhecimento da impetração.

Contudo, no caso de se verificar

configurada flagrante ilegalidade apta a

gerar constrangimento ilegal,

recomenda a jurisprudência a

concessão da ordem de ofício.

III - Delineada a ausência do dever

objetivo de cuidado, associada à

inobservância de regra técnica

específica da profissão, correta a

incidência do § 4º, primeira parte, do art.

121 do Código Penal.

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"Tal dispositivo só se aplica quando se

trata de um profissional, pois somente

em tal caso se acresce a medida do

dever de cuidado e a reprovabilidade da

falta de atenção, diligência ou cautela

exigíveis" (FRAGOSO, Heleno Cláudio.

Lições de Direito Penal - Parte Especial -

Volume 1: Ed. Forense, 11ª edição, 1995,

p. 46-47).

IV - Não configura bis in idem

considerar, a partir do exame de uma

mesma conduta (comissiva ou

omissiva), realizado o tipo culposo

descrito no art. 121, § 3º, do Código

Penal, e, ao mesmo tempo, entender

pela causa de aumento prevista no § 4º

do citado tipo legal (precedentes).

Ordem não conhecida.

(HC 281.204/SP, Rel. Ministro FELIX

FISCHER, QUINTA TURMA, julgado em

19/03/2015, DJe 26/03/2015)

Quinta Turma

DIREITO PENAL. MORTE INSTANTÂNEA

DA VÍTIMA E OMISSÃO DE SOCORRO

COMO CAUSA DE AUMENTO DE PENA.

No homicídio culposo, a morte

instantânea da vítima não afasta a causa

de aumento de pena prevista no art. 121,

§ 4°, do CP – deixar de prestar imediato

socorro à vítima –, a não ser que o óbito

seja evidente, isto é, perceptível por

qualquer pessoa. Com efeito, o aumento

imposto à pena decorre do total

desinteresse pela sorte da vítima. Isso é

evidenciado por estar a majorante

inserida no § 4° do art. 121 do CP, cujo

móvel é a observância do dever de

solidariedade que deve reger as

relações na sociedade brasileira (art. 3º,

I, da CF). Em suma, o que pretende a

regra em destaque é realçar a

importância da alteridade. Assim, o

interesse pela integridade da vítima

deve ser demonstrado, a despeito da

possibilidade de êxito, ou não, do

socorro que possa vir a ser prestado.

Tanto é que não só a omissão de

socorro majora a pena no caso de

homicídio culposo, como também se o

agente “não procura diminuir as

consequências do seu ato, ou foge para

evitar a prisão em flagrante”. Cumpre

destacar, ainda, que o dever imposto ao

autor do homicídio remanesce, a não ser

que seja evidente a morte instantânea,

perceptível por qualquer pessoa. Em

outras palavras, havendo dúvida sobre a

ocorrência do óbito imediato, compete

ao autor da conduta imprimir os

esforços necessários para minimizar as

consequências do fato. Isso porque “ao

agressor, não cabe, no momento do

fato, presumir as condições físicas da

vítima, medindo a gravidade das lesões

que causou e as consequências de sua

conduta. Tal responsabilidade é do

especialista médico, autoridade

científica e legalmente habilitada para,

em tais circunstâncias, estabelecer o

momento e a causa da morte” (REsp

277.403-MG, Quinta Turma, DJ 2/9/2002).

Precedente citado do STF: HC 84.380-

MG, Segunda Turma, DJ 3/6/2005. HC

269.038-RS, Rel. Min. Felix Fischer,

julgado em 2/12/2014, DJe 19/12/2014.

Sexta Turma

DIREITO PROCESSUAL PENAL.

INÉPCIA DE DENÚNCIA QUE IMPUTE A

PRÁTICA DE CRIME CULPOSO.

É inepta a denúncia que imputa a prática

de homicídio culposo na direção de

veículo automotor (art. 302 da Lei

9.503/1997) sem descrever, de forma

clara e precisa, a conduta negligente,

imperita ou imprudente que teria gerado

o resultado morte, sendo insuficiente a

simples menção de que o suposto autor

estava na direção do veículo no

momento do acidente. Isso porque é

ilegítima a persecução criminal quando,

comparando-se o tipo penal apontado

na denúncia com a conduta atribuída ao

denunciado, não se verificar o

preenchimento dos requisitos do art. 41

do CPP, necessários ao exercício do

contraditório e da ampla defesa. De fato,

Page 16: Homicídio - Stf e Stj

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não se pode olvidar que o homicídio

culposo se perfaz com a ação

imprudente, negligente ou imperita do

agente, modalidades de culpa que

devem ser descritas na inicial

acusatória, sob pena de se punir a mera

conduta de envolver-se em acidente de

trânsito, algo irrelevante para o Direito

Penal. A imputação, sem a observância

dessas formalidades, representa a

imposição de indevido ônus do

processo ao suposto autor, ante a

ausência da descrição de todos os

elementos necessários à

responsabilização penal decorrente da

morte da vítima. Configura, ademais,

responsabilização penal objetiva,

derivada da mera morte de alguém, em

razão de acidente causado na direção de

veículo automotor. HC 305.194-PB, Rel.

Min. Rogerio Schietti Cruz, julgado em

11/11/2014, DJe 1º/12/2014.

Sexta Turma

DIREITO PENAL. APLICABILIDADE DO

PERDÃO JUDICIAL NO CASO DE

HOMICÍDIO CULPOSO NA DIREÇÃO DE

VEÍCULO AUTOMOTOR.

O perdão judicial não pode ser

concedido ao agente de homicídio

culposo na direção de veículo

automotor (art. 302 do CTB) que, embora

atingido moralmente de forma grave

pelas consequências do acidente, não

tinha vínculo afetivo com a vítima nem

sofreu sequelas físicas gravíssimas e

permanentes. Conquanto o perdão judicial

possa ser aplicado nos casos em que o

agente de homicídio culposo sofra

sequelas físicas gravíssimas e

permanentes, a doutrina, quando se volta

para o sofrimento psicológico do agente,

enxerga no § 5º do art. 121 do CP a

exigência de um laço prévio entre os

envolvidos para reconhecer como “tão

grave” a forma como as consequências da

infração atingiram o agente. A interpretação

dada, na maior parte das vezes, é no

sentido de que só sofre intensamente o réu

que, de forma culposa, matou alguém

conhecido e com quem mantinha laços

afetivos. O exemplo mais comumente

lançado é o caso de um pai que mata

culposamente o filho. Essa interpretação

desdobra-se em um norte que ampara o

julgador. Entender pela desnecessidade do

vínculo seria abrir uma fenda na lei, não

desejada pelo legislador. Isso porque, além

de ser de difícil aferição o “tão grave”

sofrimento, o argumento da

desnecessidade do vínculo serviria para

todo e qualquer caso de delito de trânsito

com vítima fatal. Isso não significa dizer o

que a lei não disse, mas apenas conferir-

lhe interpretação mais razoável e humana,

sem perder de vista o desgaste emocional

que possa sofrer o acusado dessa espécie

de delito, mesmo que não conhecendo a

vítima. A solidarização com o choque

psicológico do agente não pode conduzir a

uma eventual banalização do instituto do

perdão judicial, o que seria no mínimo

temerário no atual cenário de violência no

trânsito, que tanto se tenta combater.

Como conclusão, conforme entendimento

doutrinário, a desnecessidade da pena que

esteia o perdão judicial deve, a partir da

nova ótica penal e constitucional, referir-se

à comunicação para a comunidade de que

o intenso e perene sofrimento do infrator

não justifica o reforço de vigência da norma

por meio da sanção penal. REsp

1.455.178-DF, Rel. Min. Rogerio Schietti

Cruz, julgado em 5/6/2014.

DIREITO PROCESSUAL PENAL. LIMITES

DA COMPETÊNCIA DO JUIZ DA

PRONÚNCIA.

O juiz na pronúncia não pode decotar a

qualificadora relativa ao “meio cruel” (art.

121, § 2º, III, do CP) quando o homicídio

houver sido praticado mediante efetiva

reiteração de golpes em região vital da

vítima. O STJ possui entendimento

consolidado no sentido de que o decote de

qualificadoras por ocasião da decisão de

pronúncia só está autorizado quando forem

manifestamente improcedentes, isto é,

Page 17: Homicídio - Stf e Stj

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quando completamente destituídas de

amparo nos elementos cognitivos dos

autos. Nesse contexto, a reiteração de

golpes na vítima, ao menos em princípio e

para fins de pronúncia, é circunstância

indiciária do “meio cruel”, previsto no art.

121, § 2º, III, do CP, que consiste em meio

no qual o agente, ao praticar o delito,

provoca um maior sofrimento à vítima. Não

se trata, pois, a reiteração de golpes na

vítima de qualificadora manifestamente

improcedente que autorize a excepcional

exclusão pelo juiz da pronúncia, sob pena

de usurpação da competência

constitucionalmente atribuída ao Tribunal

do Júri. Precedente citado: HC 224.773-

DF, Quinta Turma, DJe 6/6/2013. REsp

1.241.987-PR, Rel. Min. Maria Thereza de

Assis Moura, julgado em 6/2/2014.

Sexta Turma

DIREITO PENAL. HOMICÍDIO CULPOSO

COMETIDO NO EXERCÍCIO DE

ATIVIDADE DE TRANSPORTE DE

PASSAGEIROS.

Para a incidência da causa de aumento

de pena prevista no art. 302, parágrafo

único, IV, do CTB, é irrelevante que o

agente esteja transportando

passageiros no momento do homicídio

culposo cometido na direção de veículo

automotor. Isso porque, conforme

precedente do STJ, é suficiente que o

agente, no exercício de sua profissão ou

atividade, esteja conduzindo veículo de

transporte de passageiros. Precedente

citado: REsp 1.358.214-RS, Quinta

Turma, DJe 15/4/2013. AgRg no REsp

1.255.562-RS, Rel. Min. Maria Thereza de

Assis Moura, julgado em 4/2/2014.

Quinta Turma

DIREITO PENAL. NÃO

CARACTERIZAÇÃO DE BIS IN IDEM NO

CASO DE APLICAÇÃO DE CAUSA DE

AUMENTO DE PENA REFERENTE AO

DESCUMPRIMENTO DE REGRA

TÉCNICA NO EXERCÍCIO DA

PROFISSÃO.

É possível a aplicação da causa de

aumento de pena prevista no art. 121, § 4º,

do CP no caso de homicídio culposo

cometido por médico e decorrente do

descumprimento de regra técnica no

exercício da profissão. Nessa situação, não

há que se falar em bis in idem. Isso porque

o legislador, ao estabelecer a circunstância

especial de aumento de pena prevista no

referido dispositivo legal, pretendeu

reconhecer maior reprovabilidade à

conduta do profissional que, embora tenha

o necessário conhecimento para o

exercício de sua ocupação, não o utilize

adequadamente, produzindo o evento

criminoso de forma culposa, sem a devida

observância das regras técnicas de sua

profissão. De fato, caso se entendesse

caracterizado o bis in idem na situação, ter-

se-ia que concluir que essa majorante

somente poderia ser aplicada se o agente,

ao cometer a infração, incidisse em pelo

menos duas ações ou omissões

imprudentes ou negligentes, uma para

configurar a culpa e a outra para a

majorante, o que não seria condizente com

a pretensão legal. Precedente citado do

STJ: HC 63.929-RJ, Quinta Turma, DJe

9/4/2007. Precedente citado do STF: HC

86.969-6-RS, Segunda Turma, DJ

24/2/2006. HC 181.847-MS, Rel. Min.

Marco Aurélio Bellizze, Rel. para

acórdão Min. Campos Marques

(Desembargador convocado do TJ/PR),

julgado em 4/4/2013.

Quinta Turma

DIREITO PENAL. CRIME DE ABORTO.

INÍCIO DO TRABALHO DE PARTO.

HOMICÍDIO OU INFANTICÍDIO.

Iniciado o trabalho de parto, não há

crime de aborto, mas sim homicídio ou

infanticídio conforme o caso. Para

configurar o crime de homicídio ou

infanticídio, não é necessário que o

nascituro tenha respirado, notadamente

quando, iniciado o parto, existem outros

Page 18: Homicídio - Stf e Stj

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elementos para demonstrar a vida do

ser nascente, por exemplo, os

batimentos cardíacos. HC 228.998-MG,

Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, julgado

em 23/10/2012.

Sexta Turma HABEAS CORPUS. HOMICÍDIO DUPLAMENTE QUALIFICADO E ABORTO PROVOCADO POR TERCEIRO. CONCURSO FORMAL IMPRÓPRIO VERSUS CONCURSO FORMAL PRÓPRIO. DESÍGNIOS AUTÔNOMOS. EXPRESSÃO QUE ABRANGE TANTO O DOLO DIRETO QUANTO O EVENTUAL. DELAÇÃO PREMIADA. PRETENDIDO RECONHECIMENTO. IMPOSSIBILIDADE. AUSÊNCIA DE COLABORAÇÃO EFETIVA. CONSTRANGIMENTO ILEGAL NÃO EVIDENCIADO. 1. O concurso formal perfeito caracteriza-se quando o agente pratica duas ou mais infrações penais mediante uma única ação ou omissão; já o concurso formal imperfeito evidencia-se quando a conduta única (ação ou omissão) é dolosa e os delitos concorrentes resultam de desígnios autônomos. Ou seja, a distinção fundamental entre os dois tipos de concurso formal varia de acordo com o elemento subjetivo que animou o agente ao iniciar a sua conduta. 2. A expressão "desígnios autônomos" refere-se a qualquer forma de dolo, seja ele direto ou eventual. Vale dizer, o dolo eventual também representa o endereçamento da vontade do agente, pois ele, embora vislumbrando a possibilidade de ocorrência de um segundo resultado, não o desejando diretamente, mas admitindo-o, aceita-o. 3. No caso dos autos, os delitos concorrentes - falecimento da mãe e da criança que estava em seu ventre -, oriundos de uma só conduta - facadas na nuca da mãe -, resultaram de desígnios autônomos. Em consequência dessa caracterização, vale dizer, do reconhecimento da independência das intenções do paciente, as penas devem ser aplicadas cumulativamente, conforme a regra do concurso material,

exatamente como realizado pelo Tribunal de origem. 4. Constatando-se que não houve efetiva colaboração do paciente com a investigação policial e o processo criminal, tampouco fornecimento de informações eficazes para a descoberta da trama delituosa, não há como reconhecer o benefício da delação premiada. 5. Ordem denegada. (HC 191.490/RJ, Rel. Ministro SEBASTIÃO REIS JÚNIOR, SEXTA TURMA, julgado em 27/09/2012, DJe 09/10/2012)

Quinta Turma

RECURSO ESPECIAL. PROCESSUAL

PENAL E PENAL. HOMICÍDIO

QUALIFICADO. LESÕES CORPORAIS

DE NATUREZA GRAVE. PRONÚNCIA.

ALEGAÇAO DE NEGATIVA DE

VIGÊNCIA AO ART. 408 DO CÓDIGO DE

PROCESSO PENAL. SÚMULA Nº 284 DO

STF. PEDIDO DE INCLUSAO DA

QUALIFICADORA DO /03/12EMPREGO

DE FOGO, AFASTADA PELO TRIBUNAL

DE JUSTIÇA LOCAL EM SEDE DE

RECURSO EM SENTIDO ESTRITO.

APLICAÇAO DO VERBETE SUMULAR Nº

283 DO STF. COMPATIBILIDADE ENTRE

O DOLO EVENTUAL E O MOTIVO FÚTIL.

DIVERGÊNCIA JURISPRUDENCIAL

DEMONSTRADA. RECURSO

PARCIALMENTE CONHECIDO E, NESSA

EXTENSAO, PROVIDO EM PARTE.

1. O art. 408 do Código de Processo penal

não contém comando normativo capaz de

alterar a conclusão a que chegou o

Tribunal de origem sobre a improcedência

das qualificadoras indicadas na decisão de

pronúncia.

2. O fundamento adotado pelo Tribunal de

origem, no aresto atacado, para afastar a

qualificadora do emprego de fogo, restou

inatacado nas razões do apelo nobre,

incidindo, no particular, a Súmula n.º 283

do Pretório Excelso.

3. O fato de o Recorrente ter assumido o

risco de produzir o resultado morte,

Page 19: Homicídio - Stf e Stj

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aspecto caracterizador do dolo eventual,

não exclui a possibilidade de o crime ter

sido praticado por motivo fútil, uma vez que

o dolo do agente, direto ou indireto, não se

confunde com o motivo que ensejou a

conduta, mostrando-se, em princípio,

compatíveis entre si. Divergência

jurisprudencial devidamente demonstrada.

4. Recurso especial conhecido em parte e,

nessa extensão, parcialmente provido para,

reformando o acórdão recorrido, incluir na

pronúncia a qualificadora do inciso II do 2.º

do art. 121 do Código Penal. Resp

912.904-SP, Rel. Min. Laurita Vaz,

julgado em 06/03/12.

Sexta Turma

HOMICÍDIO CULPOSO. AUMENTO.

PENA. REGRA TÉCNICA. BIS IN IDEM.

Trata-se de recurso em habeas corpus em

que se discute o afastamento da causa de

aumento de pena constante do § 4º do art.

121 do CP, relativa à inobservância de

regra técnica de profissão, sustentando o

recorrente que essa mesma causa foi

utilizada para a caracterização do próprio

tipo penal. A Turma, ao prosseguir o

julgamento, por maioria, deu provimento ao

recurso sob o fundamento de que, embora

a causa de aumento de pena referente à

inobservância de regra técnica de profissão

se situe no campo da culpabilidade,

demonstrando que o comportamento do

agente merece uma maior censurabilidade,

não se pode utilizar do mesmo fato para, a

um só tempo, tipificar a conduta e, ainda,

fazer incidir o aumento de pena.

Consignou-se que, no caso, a peça

exordial em momento algum esclarece em

que consistiu a causa de aumento de pena,

apenas se referindo à inobservância de

regra técnica como a própria circunstância

caracterizadora da negligência do agente,

fazendo de sua ação uma ação típica.

Assim, entendeu-se estar claro que a

inobservância de regra técnica foi

utilizada para configurar o próprio

núcleo da culpa, não podendo servir

também para possibilitar o aumento de

pena, visto que não se pode recair em

indesejável bis in idem. Precedentes

citados do STF: HC 95.078-RJ, DJe

15/5/2009; do STJ: REsp 606.170-SC, DJ

14/11/2005. RHC 22.557-SP, Rel. Min.

Haroldo Rodrigues (Desembargador

convocado do TJ-CE), julgado em

17/5/2011.

Sexta Turma

CONSUNÇÃO. PORTE ILEGAL. ARMA

DE FOGO.

Em habeas corpus, o impetrante defende a

absorção do crime de porte ilegal de arma

de fogo pelo crime de homicídio visto que,

segundo o princípio da consunção, a

primeira infração penal serviu como meio

para a prática do último crime. Explica o

Min. Relator que o princípio da

consunção ocorre quando uma infração

penal serve inicialmente como meio ou

fase necessária para a execução de

outro crime. Logo, a aplicação do

princípio da consunção pressupõe,

necessariamente, a análise de existência

de um nexo de dependência das

condutas ilícitas para verificar a

possibilidade de absorção daquela

infração penal menos grave pela mais

danosa. Assim, para o Min. Relator, impõe-

se que cada caso deva ser analisado com

cautela, deve-se atentar à viabilidade da

aplicação do princípio da consunção,

principalmente em habeas corpus, em que

nem sempre é possível um profundo

exame dos fatos e provas. No entanto, na

hipótese, pela descrição dos fatos na

instrução criminal, na pronúncia e na

condenação, não há dúvida de que o porte

ilegal de arma de fogo serviu de meio para

a prática do homicídio. Diante do exposto,

a Turma concedeu a ordem para, com

fundamento no princípio da consunção,

excluir o crime de porte de arma de fogo da

condenação do paciente. Precedentes

citados: REsp 570.887-RS, DJ 14/2/2005;

HC 34.747-RJ, DJ 21/11/2005, e REsp

232.507-DF, DJ 29/10/2001. HC 104.455-

Page 20: Homicídio - Stf e Stj

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ES, Rel. Min. Og Fernandes, julgado em

21/10/2010.

Sexta Turma

JÚRI. HOMICÍDIO QUALIFICADO.

VINGANÇA. MOTIVO TORPE.

In casu, o recorrido foi condenado como

incurso no art. 121, § 2º, I e IV, do CP à

pena de 13 anos, cinco meses e 11 dias de

reclusão a ser cumprida inicialmente no

regime fechado. Em sede de apelação, o

tribunal a quo anulou o julgamento e

submeteu o réu, ora recorrido, a novo júri.

No REsp, o MP, ora recorrente, alegou

violação do art. 593, III, d, do CPP, bem

como do art. 121, § 2º, I, do CP, ao

sustentar que a qualificadora do motivo

torpe encontra-se devidamente

comprovada nos autos. Nesta instância

especial, inicialmente, observou o Min.

Relator que as circunstâncias

qualificadoras reconhecidas pelo plenário

do júri somente podem ser excluídas em

sede de apelação, com base no art. 593,

III, d, do CPP, quando absolutamente

improcedentes, sem amparo nos elementos

dos autos, o que não se verificou na

espécie. Ressaltou que “manifestamente

contrária à prova dos autos é a decisão

arbitrária, dissociada do conjunto fático-

probatório produzido, e não aquela que

apenas diverge do entendimento firmado

pelo órgão julgador a respeito da matéria.”

Segundo o Min. Relator, no caso vertente,

constata-se que o Conselho de Sentença,

diante das versões apresentadas pela

acusação e pela defesa, concluiu que o

homicídio foi praticado por motivo torpe.

Assim, reconhecida a qualificadora pelo

tribunal do júri em conformidade com os

fatos apresentados, não poderia o tribunal

de origem, via recurso de apelação,

desconstituir a escolha dos jurados,

procedendo à interpretação que, sob sua

ótica, coaduna-se melhor com a hipótese

dos autos. Anotou-se, ainda, que, “a

verificação se a vingança constitui ou

não motivo torpe deve ser feita com

base nas peculiaridades de cada caso

concreto, de modo que não se pode

estabelecer um juízo a priori, positivo ou

negativo”. Conforme assentou o STF, “a

vingança, por si só, não consubstancia

o motivo torpe; a sua afirmativa,

contudo, não basta para elidir a

imputação de torpeza do motivo do

crime, que há de ser aferida à luz do

contexto do fato.” Diante desses

fundamentos, a Turma, ao prosseguir o

julgamento, deu provimento ao recurso

para cassar o acórdão impugnado e

restabelecer a decisão proferida pelo

Tribunal do Júri. Precedentes citados do

STF: HC 83.309-MS, DJ 6/2/2004; do STJ:

REsp 21.261-PR, DJ 4/9/2000; REsp

256.163-SP, DJ 24/4/2006; REsp. 417.871-

PE, DJ 17/12/2004, e HC 126.884-DF, DJe

16/11/2009. REsp 785.122-SP, Rel. Min.

Og Fernandes, julgado em 19/10/2010.

Quinta Turma

QUALIFICADORA. COMPETÊNCIA.

TRIBUNAL. JÚRI.

Trata-se de cinco denunciados por suposta

prática do crime previsto no art. 121, § 2º,

II, III e IV, do CP e um deles também

denunciado pelo art. 129 do mesmo codex.

Discute-se, no REsp, se o acórdão

recorrido que deu provimento ao recurso

em sentido estrito, retirando a qualificadora

de ter sido o crime cometido por meio que

impossibilitou a defesa da vítima,

devidamente apresentada na exordial e

reconhecida na pronúncia, invadiu a

competência do Tribunal do Júri de analisar

as provas em crimes dolosos contra a vida.

Para o Min. Relator, com base em

precedentes deste Superior Tribunal, não

compete ao juiz, no momento da pronúncia,

ainda de formação de culpa, decidir o

mérito da pretensão punitiva sob pena de

invasão da competência do Tribunal do

Júri. Observa que, nessa fase processual

(art. 413, § 1º, do CPP), são estreitos os

limites de atuação do julgador, sendo

absolutamente inviável, durante o juízo de

formação de culpa, adentrar o conjunto

probatório, o que poderia influenciar os

Page 21: Homicídio - Stf e Stj

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jurados. Ademais, explica que o

argumento utilizado pelo tribunal a quo

para afastar a qualificadora de que a

superioridade numérica dos acusados

frente à vítima, por si só, não seria

capaz de sustentar a qualificadora

também poderia ensejar argumento

contrario sensu. Conclui assim que,

quando não há prova plena da

procedência da qualificadora, prudente

seria analisar sua manutenção pelo

conselho de sentença na fase de

julgamento em plenário diante das

provas dos autos. Diante do exposto, a

Turma deu provimento ao recurso para

restabelecer os efeitos da sentença de

pronúncia. Precedentes citados: REsp

214.245-GO, DJ 11/3/2002; REsp 973.603-

MG, DJe 10/11/2008; REsp 707.303-DF,

DJ 10/9/2007, e REsp 816.506-DF, DJ

19/6/2006. REsp 1.102.422-DF, Rel. Min.

Jorge Mussi, julgado em 14/9/2010.

Sexta Turma

CIÚME. MOTIVO FÚTIL. HOMICÍDIO.

O Tribunal a quo, ao analisar recurso em

sentido estrito, extirpou da pronúncia a

qualificadora do motivo fútil, ao afirmar,

peremptoriamente, não se encaixar o

ciúme nessa categoria. Nesse contexto, a

Turma, ao prosseguir o julgamento,

entendeu, por maioria, caber ao

conselho de sentença decidir se o

paciente praticou o ilícito motivado por

ciúme e, consequentemente, analisar,

no caso concreto, se esse sentimento é

motivo a qualificar o homicídio

perpetrado. Apenas as circunstâncias

qualificadoras manifestamente

improcedentes podem ser excluídas, de

pronto, da pronúncia, pois não se deve

usurpar do Tribunal do Júri o pleno exame

dos fatos da causa. Anotou-se, por último,

que este Superior Tribunal já assentou a

tese de o reconhecimento do ciúme como

motivo fútil, ou mesmo torpe, depender do

caso concreto. Precedentes citados: HC

123.918-MG, DJe 5/10/2009; HC 104.097-

RS, DJe 13/10/2009; HC 112.271-PE, DJe

19/12/2008; HC 95.731-RJ, DJe 18/8/2008,

e REsp 857.080-MG, DJ 18/12/2006. REsp

810.728-RJ, Rel. Min. Maria Thereza de

Assis Moura, julgado em 24/11/2009.

Sexta Turma

MERGULHADOR PROFISSIONAL.

CAUSALIDADE. MORTE.

Prosseguindo o julgamento, a Turma,

por maioria, concedeu a ordem, dada a

ausência de causalidade entre a conduta

do acusado, engenheiro naval, e a morte

da vítima, mergulhador profissional

contratado para mergulhar em águas

poluídas com agentes químicos, tais

como a nafta. No caso, não há falar em

negligência do réu, porquanto ele

prestou as informações pertinentes ao

êxito do trabalho do profissional

qualificado, alertando sobre a sua

exposição à substância tóxica.

Outrossim, no âmbito jurídico, “a

afirmação da causalidade (…) deve estar

respaldada em elementos empíricos que

demonstrem que o resultado não

ocorreria, com um grau de probabilidade

nos limites da certeza, se a ação devida

fosse efetivamente realizada, tal como o

contexto o determinava.” Não

demonstrada empiricamente essa

relação, é de se negar a causalidade. HC

68.871-PR, Rel. originário Min. Maria

Thereza de Assis Moura, Rel. para

acórdão Min. Og Fernandes, julgado em

6/8/2009.

Sexta Turma

COMPETÊNCIA.

PRONÚNCIA DECRETADA.

Trata-se de habeas corpus impetrado

contra decisão do TJ que, provendo

recurso em sentido estrito interposto pelo

MP estadual, pronunciou o paciente como

incurso nas penas do art. 121, caput, do

CP, alterando a decisão de primeiro grau

que desclassificara os fatos para delito de

competência do juiz singular, ante a

inexistência de prova de que o paciente, à

Page 22: Homicídio - Stf e Stj

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direção de um veículo, agira com animus

necandi. A denúncia imputara ao

paciente ter atingido a bicicleta pilotada

pela vítima, o que resultara na morte

dela. E agira com dolo, porque,

participando de um “racha”, assumira o

risco de produzir o resultado morte,

caracterizando o dolo eventual. O

paciente esclareceu que a estrada

estava movimentada, com trânsito

intenso, razão pela qual não se poderia

disputar corrida de automóvel naquele

local. O acidente ocorreu porque, sendo

seu veículo ultrapassado por outro que

derivou à direita, cortando a trajetória do

automóvel conduzido pelo paciente, ele

foi, por sua vez, obrigado a derivar ainda

mais para a direita, adentrando o

acostamento, por onde trafegavam as

duas bicicletas, atingindo a vítima.

Assim, alega que não teve a intenção de

atingir o ciclista ou de aceitar esse

resultado. Diante disso, a Turma, por

maioria, concedeu a ordem para arredar

a decisão de pronúncia proferida pelo

Tribunal a quo, ao argumento de que é

acertada a decisão do juízo de primeiro

grau, desclassificando os fatos para

delito de competência de juízo singular,

sem prova razoável de que o paciente

prestara anuência ao resultado morte.

Na espécie, a invasão de acostamento

para evitar a colisão com o automóvel

que interceptara abruptamente a

trajetória do veículo conduzido pelo

paciente, provocando a colisão contra o

ciclista que por ele trafegava, afasta o

dolo eventual, pois o paciente não quis

nem assumiu o risco de matar a vítima.

Ausente tal elemento volitivo, não há dolo,

nem na modalidade eventual. O habeas

corpus, no caso, é hábil para os fins

pretendidos pelo impetrante, desde que,

como nos autos, demonstre o excesso de

imputação. HC 126.974-SP, Rel. Min.

Celso Limongi (Desembargador

convocado do TJ-SP), julgado em

4/8/2009.

Quinta Turma

DIREITO PENAL. RECURSO ESPECIAL.

PERDÃO JUDICIAL. EXTENSÃO DOS

EFEITOS. IMPOSSIBILIDADE.

Não é possível a extensão do efeito de

extinção da punibilidade pelo perdão

judicial, concedido em relação a

homicídio culposo que resultou na

morte da mãe do autor, para outro

crime, tão-somente por terem sido

praticados em concurso formal

(Precedente do STF). Recurso provido.

Resp 1009822/RS Rel. Felix Fischer,

julgado em 26/8/2008.