HOMOFOBIA INTRAFAMILIAR POLÍTICAS PÚBLICAS E SERVIÇOS DE ATENDIMENTO

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1. INTRODUÇÃO Pró-Reitoria de Graduação Curso de Serviço Social Trabalho de Conclusão de Curso HOMOFOBIA INTRAFAMILIAR: POLÍTICAS PÚBLICAS E SERVIÇOS DE ATENDIMENTO Autor: Eliseu Gomes de Matos Costa Orientadora: Profª Dra. Luciana de Castro Alvares Co-orientador: Daniel Borsatto da Silva Brasília - DF 2012

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Artigo apresentado como Trabalho de Conlusão do Curso de Serviço Social na Universidade Católica de Brasilia do meu amigo Eliseu Gomes de Matos Costa

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1. INTRODUÇÃO

Pró-Reitoria de Graduação Curso de Serviço Social

Trabalho de Conclusão de Curso

HOMOFOBIA INTRAFAMILIAR: POLÍTICAS PÚBLICAS E

SERVIÇOS DE ATENDIMENTO

Autor: Eliseu Gomes de Matos Costa Orientadora: Profª Dra. Luciana de Castro Alvares

Co-orientador: Daniel Borsatto da Silva

Brasília - DF

2012

ELISEU GOMES DE MATOS COSTA

HOMOFOBIA INTRAFAMILIAR: POLÍTICAS PÚBLICAS E SERVIÇOS DE ATENDIMENTO

Artigo apresentado ao curso de graduação em Serviço Social da Universidade Católica de Brasília, com requisito parcial para obtenção do título de Bacharel em Serviço Social. Orientadora: Prof.ª Dra. Luciana de Castro Alvares Co-orientador: Daniel Borsatto da Silva

Brasília – DF 2012

Artigo de autoria de Eliseu Gomes de Matos Costa, intitulado “HOMOFOBIA

INTRAFAMILIAR: POLÍTICAS PÚBLICAS E SERVIÇOS DE ATENDIMENTO” apresentado com requisito parcial para obtenção do grau de Bacharel em Serviço Social da Universidade Católica de Brasília, em 13 de junho de 2012, defendido e aprovado pela banca examinadora abaixo assinada:

_______________________________________________________

Prof.ª Dra. Luciana de Castro Alvares Orientadora

Curso de Serviço Social - UCB

________________________________________________________

Prof.ª MsC. Cilene Sebastiana Braga Lins Curso de Serviço Social – UCB

__________________________________________________________

Prof. MsC . Luís Alberto Delgado Curso de Serviço Social – UCB

Brasília – DF 2012

AGRADECIMENTOS

À minha orientadora Luciana, pois nos momentos de euforia, com sua doçura

fez com que eu acreditasse que tudo daria certo, além da atenção e paciência no

decorrer da elaboração de todo o artigo.

Ao meu co-orientador, Daniel, pois com sua disposição esteve ao meu lado,

com ótimas sugestões durante a realização deste trabalho.

A todos e todas as professoras, que contribuíram de certa forma com o meu

processo de formação acadêmica, e que me fizeram refletir na construção do TCC e

na minha militância política junto aos movimentos sociais e em especial ao

movimento LGBT.

À minha família, que mesmo não tendo acompanhado de perto a minha

formação, sabem das dificuldades enfrentadas nessa trajetória, e sempre

acreditaram e confiaram que essa carreira daria certo.

Aos meus amigos e minhas amigas de trabalho (TSI), que estiveram ao meu

lado, torcendo para que eu conseguisse concluir o curso.

Aos meus amigos e minhas amigas que conquistei no decorrer desses

quatros anos na Universidade, e que estiveram comigo nesta adorável e cansativa

caminhada.

À todos que de alguma forma cooperaram para que eu pudesse realizar esse

trabalho e concluir essa jornada, que, por sinal, foi um grande desafio na minha vida.

“Dedico este trabalho a todas as pessoas vitimas de homofobia especialmente às vivenciadas no contexto intrafamiliar. A todos aqueles que lutam por uma sociedade mais justa e igualitária, pelo fim do machismo e da homofobia. E por fim, e não menos importante, à categoria do serviço social que tanto nos orgulha reconhecendo os direitos da população LGBT, através das resoluções 489/2006 e 615/2011 do Conjunto CFESS/CRESS. Não ao machismo, não à homofobia! E sim a criminalização da homofobia!”

O Tempo Não Para

Disparo contra o sol Sou forte, sou por acaso

Minha metralhadora cheia de mágoas Eu sou um cara

Cansado de correr Na direção contrária

Sem pódio de chegada ou beijo de namorada

Eu sou mais um cara

Mas se você achar Que eu tô derrotado

Saiba que ainda estão rolando os dados Porque o tempo, o tempo não para

Dias sim, dias não Eu vou sobrevivendo sem um arranhão

Da caridade de quem me detesta

A tua piscina tá cheia de ratos Tuas ideias não correspondem aos fatos

O tempo não paraEu vejo o futuro repetir o passado

Eu vejo um museu de grandes novidades O tempo não para

Não para, não, não para

Eu não tenho data pra comemorar Às vezes os meus dias são de par em par

Procurando agulha num palheiro

Nas noites de frio é melhor nem nascer Nas de calor, se escolhe: é matar ou morrer

E assim nos tornamos brasileiros Te chamam de ladrão, de bicha, maconheiro

Transformam o país inteiro num puteiro Pois assim se ganha mais dinheiro

Dias sim, dias não Eu vou sobrevivendo sem um arranhão

Da caridade de quem me detesta

Cazuza

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HOMOFOBIA INTRAFAMILIAR: POLÍTICAS PÚBLICAS E SERVIÇOS DE ATENDIMENTO

ELISEU GOMES DE MATOS COSTA

Resumo: O presente artigo tem como objetivo contribuir com a discussão sobre a homofobia intrafamiliar, as políticas públicas e serviços de atendimento às vítimas de homofobia disponíveis em nosso país. Nesse sentido, este estudo buscou como eixo central a identificação das políticas e dos serviços que executam ações, visando o combate à homofobia e a promoção da cidadania de pessoas LGBT. A metodologia utilizada foi à análise qualitativa, utilizando-se a pesquisa bibliográfica e exame documental. Nos resultados obtidos constatou-se a existência de serviços que prestam atendimento a população LGBT, vinculados ao programa Brasil Sem Homofobia, concretizados a partir dos Centros de Referência e Direitos Humanos pelo Enfrentamento e Combate à Homofobia, os CREAS e outros estabelecimentos da Proteção Social Especial de Média Complexidade, previstos na Política Nacional de Assistência Social. Palavras-chave: Homofobia. Família. Políticas Públicas. Serviços Socioassistenciais. 1 INTRODUÇÃO

Este trabalho de conclusão de curso, intitulado “Homofobia intrafamiliar:

políticas públicas e serviços de atendimento” foi idealizado a partir do estágio supervisionado I e II, disciplina de cunho obrigatório do curso de Serviço Social. O estágio foi realizado no Núcleo de Atendimento Especializado ás Pessoas em Situação de Discriminação Sexual, Racial e Religiosa – NUDIN, que é uma unidade pública estatal, de prestação de serviços de Proteção Social Especial de Média Complexidade, que está prevista na Política Nacional de Assistência Social – PNAS, inserido no âmbito Institucional da SEDEST - Secretaria de Estado de Desenvolvimento Social e Transferência de Renda do Distrito Federal. A experiência do estágio fez com que várias indagações fossem desenvolvidas acerca dos serviços oferecidos pelo Estado, para o enfrentamento da homofobia e a promoção da cidadania de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis, Transexuais e Transgêneros – população LGBT - que vivencia cotidianamente vários tipos de violências em decorrência de sua orientação sexual.

O estudo em foco partiu desses questionamentos, enquanto estagiário do referido núcleo, a partir do acesso aos prontuários dos usuários que transitavam na referida instituição, como também na participação nos atendimentos psicossociais realizados pelos profissionais de serviço social e psicologia. Desde então foi observado que grande parte das violências sofridas pelas pessoas em situação de homofobia tinha histórico de violência familiar e/ou suas famílias não contribuíam ou não sabiam lidar com essa questão. Dados de uma pesquisa em janeiro desse ano, realizada no Centro de Referência do RJ, mostram que 22% dos casos de homofobia acontecem no âmbito da família, em sua maioria atingem a adolescentes e jovens. Também houve o questionamento, quanto às políticas e serviços, se estes estão preparadas para atender a demanda existente de homofobia intrafamiliar de adolescentes e jovens.

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Diante disso, surgiram várias inquietações para entender de que forma o estado brasileiro tem contribuído para a efetivação dos direitos e cidadania da população LGBT. Para responder a essa indagação, foi realizada uma pesquisa bibliográfica, com foco nas políticas públicas destinadas a população LGBT. Observou-se a existência de serviços de atendimento psicossocial e sóciojurídico, que tem como finalidade a superação da violência vivenciada, a autonomia de seus usuários, e por fim a viabilização da garantia de direitos.

Uma das políticas de enfrentamento, combate e atendimento às vítimas de homofobia é executada pela Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República, através do Programa Brasil Sem Homofobia. No âmbito do programa está previsto o atendimento às vitimas de discriminação em decorrência de sua orientação sexual através dos Centros de Referência em Direitos Humanos Prevenção e Combate à Homofobia.

Além dessa política, outra que abarca o atendimento a indivíduos e famílias em situação de violência – violação de direitos, e aqui se destaca a violência em decorrência de orientação sexual; é a Política Nacional de Assistência Social (PNAS) no âmbito da Proteção Especial de Média Complexidade que é executada através dos Centros de Referência Especializado de Assistência Social (CREAS). Cabe também pontuar que a PNAS no âmbito da proteção especial de alta complexidade, através de seus serviços sócioassistenciais atendem famílias e indivíduos em situação de violência – rompimento de vínculos familiares.

Para a exploração do tema foi usada a pesquisa exploratória de natureza qualitativa, que buscou dissertar e localizar essa temática dentro de um determinado contexto social, histórico, econômico e cultural, além de fazer relação com as formas desiguais de identidade de gênero e orientação sexual. Foi realizada também a pesquisa bibliográfica, que segundo Gil (1999) é desenvolvida a partir de material já elaborado, constituído principalmente de livros e artigos científicos; e análise documental, que são materiais que não receberam ainda um tratamento analítico, ou que ainda podem ser reelaborados de acordo com os objetivos da pesquisa.

Desta forma, este estudo está dividido em três tópicos: no primeiro é feita uma reflexão sócio-histórica da homossexualidade, como também se busca a conceituação da homofobia; no segundo é abordada a contextualização da família, os valores machistas e patriarcais e suas interferências na homofobia intrafamiliar; e no terceiro é analisada a intervenção do estado brasileiro na formulação e execução de políticas públicas de combate a homofobia e seus serviços de atendimento as vítimas em decorrência de sua orientação sexual, tendo como maior enfoque o atendimento aos adolescentes e jovens em situação de homofobia intrafamiliar.

Espera-se então, com este trabalho, contribuir de forma significativa com o debate da questão LGBT e as políticas públicas voltadas ao combate da homofobia e atendimento as suas vítimas, junto à academia e sociedade, e aqui se ressalta o maior interesse no âmbito do serviço social, que é uma profissão de caráter interventivo, que se apropria das expressões da questão social, e busca a transformação da realidade.

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2 BREVE RELATO DA HISTÓRIA DA HOMOSSEXUALIDADE SOB O CONTEXTO DA QUESTÃO LGBT1

Neste primeiro tópico partir-se da discussão sobre a história das homossexualidades2 e das teorias sobre os direitos sexuais enquanto direitos humanos, pois entender a razão pela qual um indivíduo está sujeito à discriminação sexual significa compreender o sentido de “não” liberdade. A análise dos direitos sexuais estuda como o ser humano está sujeito a ser impedido de exercer livremente a orientação sexual3 e as diferentes identidades de gênero4.

Para analisar a questão LGBT é importante levar em consideração as variadas produções teóricas do século XVIII, sobre a referida questão. Silva (2009) aponta que essas teorias se fundamentavam em uma vertente funcionalista, que visavam à manutenção do status quo, analisando o assunto LGBT com caráter moralista, caracterizando-a como doença ou distúrbio de personalidade.

A análise da autora também pode ser reafirmada na fala de outros autores, como Simões e Facchini (2009), que apresentam as concepções conservadoras como hegemônicas, e nesse sentido é possível afirmar que essas teorias:

Se orientavam por um conjunto de preocupações políticas e morais voltadas a identificar toda sorte de anomalias, perversões ou ameaças na esfera da sexualidade (incluindo a prostituição e as relações extraconjugais) que poderiam causar dano à saúde da família e, por extensão, à saúde da nação. Pelo mapeamento das supostas anomalias, tratava-se de circunscrever um modelo ideal de sexualidade moral e saudável, na forma da heterossexualidade praticada entre adultos, dotados de identidade de gênero tida como adequada ao seu respectivo sexo biológico, unidos por vínculo conjugal, monogâmico e destinado á reprodução (SIMÕES, FACCHINI, 2009).

Nesse sentido, é possível afirmar, como coloca Foucault (2009), que na sociedade ocidental a sexualidade está posta no campo da reprodução, da procriação, sob a influência da moral judaico-cristã, gerando forte repressão. Dessa forma, tudo o que se diz sobre sexo ganha valor mercantil. Isso pode ser reafirmado

1Essa sigla é hegemonicamente usada no movimento social representativo de Lésbicas (mulheres que sentem atração afetiva e sexual por mulheres), Gays (homens que sentem atração afetiva e sexual por outros homens), Bissexuais (homes e mulheres que sentem atração afetiva e sexual por ambos os sexos/gêneros), Travestis (pessoas que passam a se vestir e a comportar como pessoas do sexo oposto), Transexuais (pessoas que nascem com o sexo diferente do seu gênero) e Transgêneros (pessoas que mudam de gênero), para referir-se à população que não heterossexual. Anteriormente era usada a sigla GLBT e, antes dessa, GLS (S significa simpatizante, ou seja, pessoa heterossexual que luta pelos direitos LGBT ou apoia o referido movimento). 2 Enquanto que a homossexualidade é a atração afetiva sexual sentida por indivíduo do mesmo sexo,

ou seja, é uma simples manifestação do pluralismo sexual, uma variante constante e regular da sexualidade humana (Borrillo, 2010), as homossexualidades referem-se à diversidade de identidades das pessoas LGBT, que podem ser traduzidas através de comportamentos efeminados, másculos, masculinizadas, femininos, andróginos; como também papeis sexuais, tais como ativo e passivo. A homossexualidade é a atração afetiva sexual sentida por uma pessoa do mesmo sexo. 3O conceito de Orientação Sexual pode variar dentre os/as vários/as autores/as. Nesse caso, será

considerado o conceito em que está relacionado ao desejo sexual que uma pessoa sente pelo sexo oposto, do mesmo sexo ou para ambos (CARDOSO, 2008). 4 Enquanto que o sexo é biológico – genitália – o gênero é socialmente construído, pois segundo

Lessa, (2006) ninguém nasce homem nem mulher, no decorrer da vida se/é transforma/ado como tal. Mesmo que possa haver diferentes formas de abordar a questão de gênero, é possível afirmar que a desigualdade socialmente construída entre o masculino e o feminino define a sua compreensão.

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em Iamamoto (2011), que não é possível analisar as relações de gênero na sociedade capitalista de forma fragmentada, pois esta é condicionada ao modo de produção vigente e à luta de classes.

A terminologia homossexualidade surgiu na Hungria em 1869, pelos médicos higienistas para diferenciar das pessoas que praticavam a sexualidade considerada “normal”, ou seja, casal formado por homem e mulher. Pois até então os termos que eram usados para designar os relacionamentos homoafetivos, eram baseados em referências da bíblia judaico-cristã, como a “sodomia” utilizada para referirem-se as pessoas que sentem desejo afetivo/sexual por pessoas do mesmo sexo, que é considerado pecado (Fisher, 2008). Faz-se necessário também pontuar, que o termo utilizado a princípio era “homossexualismo”, o que o caracterizava como doença, através da Classificação Internacional de Doenças, sob o código 302, sendo a terminologia cambiada em 1985, a partir de discussões no campo da psiquiatria, que a desconsiderou enquanto doença.

No entanto, mesmo que a homossexualidade só tenha sido caracterizada no século XIX, a prática homossexual é algo presente em toda a história da humanidade, tendo suas peculiaridades em cada época e cultura, pois o que parecia "natural" em uma civilização era condenado por outra e vice-versa.

Na Grécia Antiga e no Império Romano, em alguns aspectos, a relação homoafetiva era tão presente que chegava a ser tanto quanto ou mais nobre que os relacionamentos heterossexuais. Além de legitimadas, aquelas relações aconteciam de forma planejada, pois as famílias elegiam um homem mais velho, dotado de conhecimentos filosóficos, para educar os adolescentes de suas famílias. Nessas relações, existia também a prática sexual como parte do ritual de aprendizagem (DOVER, 2007).

A visão que estes povos tinham com relação à homossexualidade foi alterada juntamente com a construção de novos interesses políticos, que surgiram a partir dos valores religiosos da época – o cristianismo – e a homossexualidade passou a ser vista com outros olhos, sendo condenada por não ser uma prática considerada natural, ou seja, a da procriação; e os indivíduos que contrariassem esses valores, eram perseguidos, condenados e repudiados pela sociedade.

No final do século IV, o Império Romano, através do Imperador Constantino, elegeu o cristianismo como a única religião, um dos primeiros efeitos da nova época foi uma lei que previa a morte na fogueira para quem praticasse a “sodomia”, como era denominada a homossexualidade. Nesse mesmo período, o imperador do Oriente, Justiniano, mandou executar publicamente bispos homossexuais. As práticas dessa religião passavam a influenciar o Estado na punição aos indivíduos homossexuais (Fo, Tomat E Malucelli, 2010). É importante mencionar que o Brasil viveu um período de forte influência da Igreja Católica na condenação da “sodomia”, através da Santa Inquisição, no período colonial – Século XVI a XIX-5que violou o direito a vida, de muitos cidadãos LGBT´s no Brasil, conforme MOTT (2003).

Observa-se que apesar de algumas sociedades reconhecerem a homoafetividade em suas culturas, a história da homossexualidade é marcada por

5Em sua obra, o autor pontua alguns fatos históricos como: O primeiro sodomita degredado pelo

Tribunal da Santa Inquisição em Pernambuco – O jovem português Estevão Redondo-; a morte do primeiro sodomita em 1593 pelo Tribunal da Santa Inquisição – Índio Timbira Tupinambá do Maranhão e o fim da instituição do Tribunal do Santo Ofício Português, e o fim da pena de morte contra os sodomitas.

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vários tipos de violências – físicas, psicológicas, simbólicas6, que perpassaram a história da humanidade até a contemporaneidade Green (2000). Uma breve análise sobre a história da homossexualidade nos revela que a população LGBT é percebida de forma negativa, ou seja, carregada de estigma, marginalização, estereótipos, reproduzindo a heteronormatividade,7 o que gera sérios impactos na vivência da comunidade LGBT em sociedade.

Essas violências muitas das vezes são baseadas e justificadas pela moral judaica cristã8, que condenavam os comportamentos de homens efeminados, mulheres masculinizadas; uso de vestimentas e acessórios do sexo oposto, troca de afeto em ambientes públicos e o fato de assumir publicamente sua orientação sexual não heterossexual (BORRILLO, 2010).

Dessa forma entende-se que a marginalização se materializa através da moral, na qual os indivíduos homossexuais, bissexuais e transgêneros são culpabilizados por sua orientação sexual, a partir de uma visão de matriz conservadora que associa a homossexualidade, a feminilização e masculinação9, à prostituição, às doenças sexualmente transmissíveis, à promiscuidade, à pedofilia; tendo como grande exemplo a discriminação sofrida por LGBT´s no período de expansão da AIDS que ficou conhecida como a “peste gay”.

Prado e Machado (2008) afirmam que o discurso que veicula maior poder se estabelece colocando todas as outras formas de manifestação da sexualidade, como subalternas, anormais, patologizadas, marginalizadas o que resulta na discriminação, intolerância e desrespeito, sendo que, nesse sentido, a sociedade moderna tentou reduzir a sexualidade à prática heterossexual como legítima.

No Brasil a homossexualidade sempre foi tratada como anormal e patologizada, marginalizando a população LGBT e a restringindo a guetos, conforme se refere Green (2000). O autor fez um grande estudo referente à homossexualidade no Brasil a partir das cidades do Rio de Janeiro e São Paulo, que foram marcadas pela marginalização aos guetos “gays” 10. Segundo Green (2000), esses guetos eram pontos de encontros definidos da comunidade LGBT, que se apropriavam de um linguajar próprio, como também estabeleciam uma rede de amizade, sendo esses espaços locais da “caça11”, onde aconteciam os encontros e romances, e posteriormente as práticas sexuais nos pensionatos da região da Praça Tiradentes no Rio de Janeiro e no Vale do Anhangabaú em São Paulo.

O autor também relata as constantes perseguições da polícia a esses ditos “sodomitas”, e que essas ações eram de caráter higienista, pois estes incomodavam a vizinhança, eram tidos como os “anormais”, ao ponto de serem realizadas várias pesquisas pela Escola de Medicina de São Paulo sobre a diferenciação dos homens “gays” dos homens heterossexuais.

6Através do uso da noção de violência simbólica, Bourdieu (1992) tenta desvendar o mecanismo que

faz com que os indivíduos vejam como "naturais” as representações ou a ideologias dominantes. A violência simbólica é desenvolvida pelas instituições e pelos agentes que as animam e sobre a qual se apoia o exercício da autoridade. 7 A partir da heteronormatividade, a heterossexualidade é instituída e vivenciada como única

possibilidade legítima de expressão identitária e sexual (WARNER, 1993). 8 Na atualidade ainda existem grupos organizados que se baseiam na defesa da Tradição Família e

Propriedade – TFP. 9 A partir do comportamento heteronormativo de nossa sociedade, entende-se que homens devem se

comportar de forma dominadora, já as mulheres de forma frágil e submissa. 10

No livro o autor fala somente de homens, portanto homossexuais e bissexuais. 11

Esse termo é um linguajar gay, para refere-se a paquera.

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Alguns desses médicos – higienistas - por vezes afirmaram que a homossexualidade estava atrelada a deformações, onde era possível diferenciar facilmente os homens “gays” dos não gays, pois declaravam que estes eram mais franzinos, tinha aparência mais feminalizada. O autor também menciona em sua obra sobre as várias intervenções médicas e familiares aos “transviados” e seus processos de internação junto ao Sanatório do Juqueri12 na cidade de São Paulo.

Se desperta a curiosidade no que tange as ações higienistas realizadas pelo Estado, através de seus organismos de controle e forças coercitivas, pois a homossexualidade no Brasil não era considerada crime desde 1890.

Ainda sobre o processo de higienização Trevisan (2000) faz importante colocação sobre a forte intervenção do Estado por uma sociedade livre de qualquer anomalia, nesse sentido, a sexualidade heteronormativa era baseada a partir do rigor cientifico. Assim o autor afirma que foi através dos médicos higienistas que o Estado imiscuiu-se no interior das famílias, passando a ter livre trânsito nesse espaço, impondo sua autoridade em vários níveis.

Conforme analisado, o Estado, através das várias instituições sob seu domínio, como os tribunais, as ordens médicas ou a polícia, tinham mecanismos suficientes para controlar quem apresentasse comportamento não heteronormativos. Fica claro que a sociedade ocidental e aqui especificamente a brasileira, recriminava o afeto público não heterossexual, controlava as reproduções das homossexualidades em seus vários aspectos, reduzindo essa à marginalização e a precarização do humano enquanto sujeito, não permitindo assim a sua plena realização através da sexualidade e suas reproduções, ou seja, a negação de direitos é algo constantemente presenciado na questão LGBT.

Na atualidade, observa-se que houve vários avanços em relação à afirmação de direitos LGBT pós-governo Lula, como a criação do Programa Brasil Sem Homofobia e de outros marcos legais da legislação brasileira voltado e este público, como a união estável, os variados posicionamentos dos tribunais brasileiros na defesa e garantia de direitos da população como: a adoção, a instituição do casamento civil , a punição de algumas práticas homofóbicas, mesmo não havendo ainda uma lei específica que criminalize a homofobia.

Também é perceptível que com a conquista dos direitos da população LGBT houve uma reorganização das forças conservadoras que se baseiam na maioria das vezes em discursos religiosos, com vista a impedir o avanço e a garantia de direitos e da cidadania LGBT, planejando, assim, estratégias cruciais, apresentando discursos moralistas com vistas a manter o status de subordinação desta comunidade (SCHULMAN, 2010).

Um dos grandes exemplos, de retrocesso dos direitos LGBT no Brasil, é o posicionamento da sociedade brasileira conservadora, a favor do veto do chamado “Kit Gay”. Foi perceptível à alteração da nomenclatura pela mídia, pois originalmente se denomina “kit anti-homofobia”13. A partir do momento em que a grande mídia e a massa conservadora denominaram o “kit anti-homofobia” como “Kit Gay” houve uma descaracterização de seu propósito, pois essa terminologia não se refere às variadas identidades sexuais que compõem às homossexualidades.

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Foi uma das maiores colônias de psiquiatria do Brasil, localizada na cidade de Franco da Rocha – SP (Antiga cidade de Juqueri). Existiu desde o século XIX, tendo encerrado suas atividades em 2005, após um incêndio. 13

O kit foi composto por materiais didáticos referentes ao universo LGBT, para serem apresentados aos estudantes do ensino médio. O kit visava promover o respeito à diversidade sexual.

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2.1 CONCEITUANDO A HOMOFOBIA14: Ao abordar a questão LGBT, se faz necessário definir o conceito de

homofobia nos seus diferentes contextos, pois esta terminologia tem sido constantemente utilizada no cenário nacional e internacional para referir-se às várias violências praticadas contra pessoas LGBT. Assim, pode-se apresentar a homofobia como violências reproduzidas por indivíduos, grupos ou instituições, através de atitudes de hostilidade contra homossexuais, bissexuais, travestis, transexuais e transgêneros.

A terminologia de origem Estadunidense surgiu em 1971, no entanto, foi somente no final dos anos de 1990 que apareceu nos dicionários15, no qual é escrito que “homofóbico” é aquele que experimenta aversão pelos homossexuais; por sua vez, em Le Petit Larousse a “homofobia” é a rejeição da homossexualidade, a hostilidade sistemática contra homossexuais (BORRILLO, 2010).

Mesmo que seu componente primordial seja, efetivamente, a rejeição irracional e, até mesmo, o ódio em relação aos gays e às lésbicas, o autor considera que a homofobia não pode ser reduzida a esse aspecto. É importante que se levem em consideração os fatores sócios históricos que se estendem no âmbito das instituições, das culturas, respaldadas através de uma ideologia homofóbica, considerando que o problema não se limita a uma crise pessoal, ou seja, uma opção individual de repúdio aos comportamentos não heterossexuais e sim, diz respeito a uma situação resultante de fatores sócios históricos e culturais.

Além da comunidade LGBT, a população heterossexual também pode ser alvo de homofobia, a partir do momento que são caracterizadas como LGBT através de representações sociais desta comunidade, como o comportamento e as vestimentas. Nesse sentido Borrillo (2010) afirmar que a homofobia afeta indivíduos independente da orientação sexual:

Os homossexuais deixaram de serem as únicas vítimas da violência homofóbica, que acabam visando, igualmente todos aqueles que não aderem à ordem clássica dos gêneros: travestis, transexuais, bissexuais, mulheres heterossexuais dotadas de forte personalidade, homens heterossexuais delicados ou que manifestam grande sensibilidade (BORRILLO, 2010).

Isso mostra que o estigma da discriminação sexual atinge não só a comunidade LGBT, mas também as/os heterossexuais, como é o caso da demonstração de afeto em público de pessoas heterossexuais do mesmo sexo16, que representem para os agressores, casais homoafetivos.

Ainda no contexto dos espaços em que a homofobia é reproduzida, Fischer (2008) coloca que não é possível afirmar que esse tipo de violência se limita somente por parte das pessoas heterossexuais, pois a homofobia é tão fortemente reproduzida em nossa sociedade, até mesmo entre as diferentes identidades

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Além dessa terminologia, o Movimento LGBT usa outros termos para especificar esse tipo de violência em cada orientação sexual e identidade de gênero, como lesbofobia para referir-se às Lésbicas, bifobia às pessoas bissexuais, travestifobia às pessoas travestis, transfobia às pessoas transexuais. 15

Referência descrita no dicionário francês Le Petit Larousse. 16

Troca de afeto entre pai e filho, mãe e filha, irmãs, irmãos, amigas, amigos, etc. Tendo como

exemplo um ataque veiculado na mídia, ocorrido no estado de São Paulo, no dia 19/07/2011, contra pai e filho que demonstraram afeto em público.

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sexuais LGBT. Tendo como exemplo a invisibilidade das identidades sexuais do gênero feminino.

Além das violências sistemáticas sofridas, algo que contribui também para que a homofobia se materialize é a repressão sexual17, na qual existe uma espécie de controle social sistematicamente pensado para reproduzir o ódio às pessoas LGBT, como é o caso da mídia, em que colocam em evidência algumas frases proferidas por conservadores para chantagear a população, escrevendo “Quem em sua família desejaria ter um homossexual? Tenho certeza que ninguém! Tenho certeza que esta infeliz prática, deveria ser combatida e não defendida” (MOTT, 2003).

O impacto desse tipo de incitação ao ódio às pessoas LGBT é desastroso nos ambientes familiares, pois a família deveria ser o ponto de diálogo em relação á sua sexualidade; e muita das vezes age em atitudes contrarias. Esses costumes podem anular os sentimentos do indivíduo homossexual, não o permitindo que se compreenda enquanto homossexual, ao contrário, impõe valores heteronormativos e discursos homofóbicos ao ponto de o individuo não aceitar a si próprio no que se refere à sua sexualidade. No entanto, as famílias deveriam ser o espaço de conversa e apoio em relação à sua sexualidade. E as ações contrárias das famílias à sexualidade do indivíduo o diminuem ao ponto de o sujeito não visualizar mais sentido para a vida, passando a cometer até o suicídio (MOTT, 1997).

Atualmente há grande contradição no enfrentamento da homofobia, pois o Brasil tem a maior parada LGBT do mundo, além de ter uma diversidade cultural, religiosa e racial bastante significativa que poderia servir de relação de bom convívio para as outras culturas, contudo a referida nação é uma das mais violentas, chegando ser a campeã em assassinatos registrados contra essa população, sendo esses registros usados como subsídio até pelo State Department do Governo Norte-Americano (MOTT, 2003).

Assim como outras instituições, observa-se que a família é marcada de forma significativa por esse tipo de violência, passando também a reproduzir desde as discriminações mais sutis, como a falta de apoio aos integrantes que se reconhecem como Lésbica, Gay, Bissexual, Travesti, Transexual, Transgêneros, como também a agressão física e a rejeição por parte da família.

A reprodução dessa violência pode ser confirmada por Borrillo (2010), trazendo algumas reflexões, ao afirmar que:

A homofobia é algo familiar e, ainda, consensual, sendo percebida como um fenômeno banal: quantos pais ficam inquietos ao descobrir a homofobia de um (a) filho (a) adolescente, ao passo que simultaneamente, a homossexualidade de um (a) filho (a) continua sendo fonte de sofrimento para as famílias, levando-as, quase sempre a consultar um psicanalista? (BORRILLO, 2010).

Nota-se, então, que o convívio cotidiano e íntimo de seus integrantes favorece o controle da reprodução do comportamento heteronormativo na construção do homem e da mulher, sendo essa submissa, aquele dominador e ambos heterossexuais.

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Segundo Chauí (1985), a repressão sexual pode ser considerada como um conjunto de interdições, permissões, normas, valores, regras estabelecidos histórica e culturalmente para controlar o exercício da sexualidade.

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Entretanto, Schulman (2010) afirma que a família está mais propensa a “tolerar” os/as ditos/as não heterossexuais tradicionais18, ou seja,

[...] mantê-los em uma posição de menor valor do que aprender com eles e se inspirar em seu conhecimento. É mais provável ver um político que tenha um filho abertamente gay se opondo ativamente aos direitos gays do que vê-lo exaltando aquele filho por ter tido a sensibilidade pessoal e integridade de se assumir (SHULMAN, 2010).

A homofobia interfere historicamente tão fortemente na vida da comunidade

LGBT a ponto de serem excluídos de forma sistematizada de direitos mais elementares, tais como o referido agrupamento familiar e o acesso aos direitos sociais (Borrillo, 2010), e esses são tidos nessa perspectiva, como um direito subalterno ou não direito de acordo com a sociedade e os períodos históricos (PRADO; MACHADO, 2008).

Os processos de inferiorizacão não apenas retiram direitos sociais, mas categorizam grupos subalternos a partir de conceitos e significações, atribuindo-lhes características naturais, e não históricas, as quais condicionam esses grupos como portadores de determinados elementos impeditivos que pertença ao projeto de sociedade, em que haja respeito às diferenças e igualdade de direitos (PRADO; MACHADO, 2008).

Com base nos autores estudados, é possível afirmar que a homofobia familiar, se caracteriza pela não conformidade familiar em ter uns de seus membros/filhos não heterossexuais assumidos, de forma que este exponha o núcleo familiar a valores não estabelecidos pela sociedade, estigmatizando-a perante os valores morais machistas, patriarcalistas e religiosos.

3 A CONSTRUÇÃO SOCIOHISTÓRICA DA FAMÍLIA E A REPRODUÇÃO DA HOMOFOBIA:

A família pode ser considerada a instituição mais antiga da humanidade, no entanto, a sua configuração passou por diversas mudanças de acordo com o momento histórico e social, se constituindo de diferentes formas, além de ser a provedora inicial de satisfações de necessidades básicas, exercendo forte influência na constituição dos indivíduos (Zanardo e Valente, 2009). Mesmo que considerada a partir de diferentes concepções e perspectivas19, adotou-se o termo instituição para referir-se à família neste estudo, considerando que este é caracterizado por um conjunto de pessoas interligadas (consanguineamente ou não), com algumas regras de direitos e deveres estabelecidas. Além disso, a família como instituição social sempre existiu e apesar de ter suas configurações mudadas de acordo com o momento histórico e a localização (THERBORN, 2006).

Engels (1982) faz abordagens das fases clássicas da evolução da humanidade, que apresenta transformações significativas da formação da família. Assim, faz considerações de três estágios. O primeiro estágio abordado é o Estado

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O termo “tradicional” foi adicionado ao termo “não heterossexual” para restringir-se aos heterossexuais que nascem com sexo compatível com o gênero diferentemente das pessoas transexuais, nesse contexto. 19

Os sociólogos Nurgess e Locke (1945) consideram que a família, ou pelo menos a família americana, estava passando por uma transição no último século e que estavam deixando de ser uma instituição, passando a ser uma espécie de “companheirismo”.

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Selvagem, existente no início da humanidade, ou seja, quando a sobrevivência acontecia basicamente a partir da apropriação dos meios e produtos naturais prontos para a utilização. Já o segundo estágio é denominado de Estado da Barbárie em que o trabalho humano chega também a uma prática relativamente avançada, pois começa a ser configurado a partir da agricultura e da domesticação dos animais para incrementar a produção dos recursos da natureza. E por fim, no terceiro estágio, encontra-se a Civilização, que é caracterizada a partir do surgimento da indústria, em que os produtos naturais são incrementados de forma mais complexa e relativamente refinada, além do surgimento das artes. No primeiro estágio a família tinha uma configuração bastante diferente, predominando a comunidade conjugal, ou seja, originariamente abarcava a tribo inteira, em que cada homem se relacionava sexualmente com todas as mulheres e a mulher se relacionava com todos os homens20 livremente, sendo que tal sociedade era essencialmente matriarcal; no segundo estágio é apresentada a família sindiásmica21, tendo como suas maiores características, a redução do grupo ao casal; e no terceiro e último estágio, apontado pelo autor, a família é configurada a partir do casal monogâmico, que tem como base o patriarcado, ou seja, nessa sociedade há uma sobreposição dos homens em relação às mulheres, cujo seus objetivos expressos são a procriação dos filhos e a preservação da propriedade privada através da herança. No último estágio, a qual se encontra a sociedade ocidental contemporânea, a economia ganha forma e conteúdo, representada concretamente através da propriedade privada, que substitui a propriedade primitiva e comunitária, na qual a sociedade era matriarcal. Portanto, pode-se afirmar que a base do machismo e do patriarcalismo está diretamente conectada ao modelo econômico vigente, ou como coloca Iamamoto (2011), não é possível analisar na contemporaneidade as questões de gênero dissociado do sistema capitalista.

Na medida em que a sociedade passa por transformações em seus vários aspectos, como o econômico, o político, o cultural e o social; a configuração e a estrutura da família também passam a sofrer alterações, ou seja, os impactos daquela interfere nessa. Esses impactos acontecem através do exercício dos papéis de cada membro da família, em que o homem/marido/pai é o provedor e a mulher/esposa/mãe se limita aos serviços domésticos e a cuidar dos filhos e filhas, enquanto esses vivem sob a alteridade daqueles.

Como mencionado anteriormente, em algumas culturas da antiguidade, como na Grécia e no Império Romano, as famílias aceitavam que seus adolescentes (Erômenos) se relacionassem sexualmente com outros homens (Erastes). Nessa relação, o homem que iria se relacionar com o adolescente passava pelo crivo de aprovação da família e também dependia de aceitação do adolescente, para que então o Erastes viesse a servir como amigo e educador deste adolescente (FILHO, 2010).

Já na sociedade do século XX, Therborn (2006) pondera as significativas mudanças da família, afirmando que ela é cercada nos campos de batalha abertos pelo sexo e pelo poder, delimitando suas ações através de fronteiras entre membros e não membros dotados de direitos e obrigações. Além disso, essa instituição é analisada a partir das concepções jurídico-política, histórica, antropológica,

20

O autor analisa essas relações a partir de um olhar heteronormativo. 21

O autor refere-se aos casamentos grupais, em que o homem se relacionava com várias mulheres, mas tendo dentre essas uma companheira principal, assim como a mulher também se relacionava da mesma forma, com vários homens.

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demográfica, possibilitando visualizar significativos impactos a partir de três aspectos: o primeiro é o patriarcado22, que perde espaço significativo, dependendo da sociedade, pois apesar de um considerável número de sociedades terem fortes movimentos sociais feministas a ponto de impactar em legislações e políticas públicas e sociais, o patriarcado poderá ressurgir com os novos fundamentalismos religiosos. O outro aspecto é o do casamento, como uma espécie de controle da sexualidade, regulando vínculos e comportamentos sexuais em que passa por profunda transformação, numa conjuntura marcada pela revolução sexual que chegou ao ápice nos anos 60 e 70, em que diminuiu o número de casamento/matrimônio formalizado e legalizado. E o terceiro aspecto de grande importância ocorreu no século XX, que é o da fecundidade e seu controle, diminuindo consideravelmente, a nível mundial, a taxa de natalidade. Isso não significa que as mudanças apontadas foram necessariamente evolucionárias, nem unilineares.

Os arranjos familiares são mudados de acordos com o decorrer da história. Assim, características clássicas para definir família não condizem mais com a realidade, que são sexualidade, procriação e convivência. Nesta perspectiva, pode-se dizer que se deparam diante de uma “família quando se encontra um conjunto de pessoas que se acham unidas por laços consanguíneos ou não, afetivos e, ou, de solidariedade” (BRASIL, 2004).

Analisar a atual família na sociedade requer um olhar para a estrutura da sociedade em seu modo de produção – o capitalismo - ou seja, a economia, a política, a cultura, que atualmente é marcada pela lógica neoliberal, marcada pelo consumo desenfreado, trabalho precarizado e desemprego estrutural, que tem impacto direto na família.

Além disso, essa família contemporânea é caracterizada em suas mudanças por surgirem novos arranjos familiares, tendo como exemplos as famílias monoparentais e homoafetivas, o que antes se limitava somente as famílias nucleares - heterossexuais. Atualmente os casais homoafetivos estão cada vez mais comuns em na sociedade, e já possuem alguns direitos, como: a adoção e os direitos previdenciários. Essa conquista começou em 2001, na Holanda e estendeu-se por vários países, sendo que no Brasil essa conquista só aconteceu em 2011, através da legalização da união homoafetiva, no Supremo Tribunal Federal.

De acordo com Therbon (2006) o grande problema no Brasil é a desigualdade nas famílias em relação às crianças, ou seja, há a reprodução dos valores adultocêntricos, assim como entre classes sociais, raças, homens e mulheres. No início do século XX, o país era uma sociedade patriarcal explícita, com uma formalidade sexual advinda da dominação machista masculina, sendo que atualmente o Estado tem fundamental importância no comportamento da família, usando normativas para o convívio em sociedade.

Através dessas normativas as famílias passam a ter direitos e obrigações, construindo novos valores morais, noções de certo e errado, como é o caso da Constituição Federal Brasileira (1988), que por meio do artigo 227 informa que:

É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à

22

O autor se utiliza do termo patriarcado para referir-se ao século XX. Sendo que para o século XXI, o autor utiliza o termo “pós-patriarcado”, mesmo considerando a existência de conflito de gênero nessa sociedade.

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dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão (BRASIL, 1988).

Isso mostra que o Estado tem valor fundamental na condução dos costumes da família, pois tais regras norteiam de certa forma, o comportamento de tal instituição na construção de valores, formando laços de interesses, solidariedade e reciprocidade.

Assim, a família também tem considerável papel no processo de formação de cidadãos, exercendo forte influência na constituição da personalidade do indivíduo, pois é através dela que se adquiri algumas noções básicas de comportamento admiráveis para o convívio em sociedade. Cada integrante da família é moldado nessa, passando a reproduzir valores reproduzidos na sociedade. No entanto, de acordo com a cultura, estratificação social, valores religiosos, conceitos e preceitos de família, podem ser que seja reforçada a reprodução da homofobia, dentre outras violências, como a opressão, discriminação e preconceito submetidos (as) há milhões de jovens (JUNQUEIRA, 2009).

A família contribui de forma significativa na construção dos valores: [...] de suas crianças e jovens, mesmo aquelas que nunca falam abertamente sobre isso. O comportamento dos pais entre si, na relação com os filhos, no tipo de “cuidados” recomendados, nas expressões, gestos e proibições que estabelecem, e é carregado de determinados valores associados à sexualidade que a criança apreende. O fato de a família ter valores conservadores, liberais ou progressistas, professar alguma crença religiosa ou não e a forma como o faz determina em grande parte a educação das crianças (BRASIL, 1997).

Por vezes, se algum membro da família, principalmente adolescentes for

notado pela família como homossexual ou apresentando subtendem-se que sejam homossexuais, passam a sofrer discriminação devido à orientação sexual, ou seja, o lugar que deveria ser o refúgio para essas pessoas, é onde muitas vezes se inicia o processo de discriminatório; como também de violências de ordem moral, física e psicológica. Isso os/as levam a uma situação de vulnerabilidade social, fragilidade emocional e psicológica; e em alguns casos até o rompimento dos vínculos familiares.

Casos bem típicos como esses acontecem com adolescentes LGBT, principalmente travestis e transexuais, que saem de casa ainda na adolescência, devido ao cotidiano marcado por homofobia intrafamiliar. Assim, abandonam seus lares, ou são expulsos, para viverem em ambientes onde possam conviver com pessoas que aceitem sua orientação sexual. Contudo, isso contribui para intensificar a fragilização desses indivíduos no convívio em sociedade (PRATA, 2007).

De acordo com Costa (2007), existe um ciclo da situação de homofobia/violência intrafamiliar, sendo tal ciclo composto por fases que se manifestam na medida em que o adolescente revela sua orientação sexual, seu desejo afetivo/sexual por pessoas do mesmo sexo para os responsáveis.

As fases da homofobia intrafamiliar são:

1. Conflito: Há um acúmulo do conflito que se manifesta por meio de atritos, com insultos e ameaças, nasce de uma desconfiança sobre a orientação do/a adolescente; 2. Agressão psíquica e verbal: Há uma descarga descontrolada de desconfiança e o conflito aumenta, o agressor/a atinge a/o adolescente com

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xingamentos, humilhações, exemplo, “prefiro ter uma filha puta a sapatona, ou um filho ladrão do que bicha”. Dai vem à tortura, afasta a/o adolescente dos/as amigos/as, tentando isola-lo/a, trancando dentro de casa, obrigando a ir ao médico, psicólogo e a igreja, depois vem à indiferença, que consiste no silêncio ou na rejeição de carinho por parte deste filho/a. 3. Violência física: bate, espanca, utiliza objetos para bater e marcar como ferro, pau, garrafa, ate a expulsão da casa ou fuga por parte do/a adolescente (COSTA, 2007).

A partir das reivindicações e pressão do Movimento LGBT, os meios de comunicação tornaram essas violências cada vez mais visíveis, como é o caso de uma publicação realizada em janeiro desse ano, pelo Centro de Referência do Rio de Janeiro, que mostra um levantamento no âmbito da homofobia intrafamiliar. A publicação descreve que o grande número das pessoas que assumem a sua homossexualidade sofre agressão no próprio seio familiar, sendo que dos 5.070 atendimentos realizados pela entidade, entre julho de 2010 e julho de 2011, mais de 22% foram referentes à homofobia familiar, onde os pais, mães e demais parentes são os principais autores homofóbicos. Schulman (2010) reafirma isso, colocando que devido à natureza invertida do comportamento dominante, as pessoas LGBT são punidas frequentemente no interior da estrutura de suas famílias. Essas punições têm consequências dramáticas, tanto nas experiências sociais quanto nas relações de maior confiança dessas pessoas, como em suas relações afetivo-sexuais.

É Importante ressaltar que por não haver normativa específica contra crimes de homofobia, a garantia de direitos aos adolescentes que vivenciam essa situação, por vezes, é mais viabilizada junto aos órgãos de responsabilização, do que os dos jovens maiores de 18 anos, que não são mais contemplados pelo Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA. No entanto na maioria das vezes os crimes contra adolescentes homossexuais não são caracterizados pela discriminação e violência motivada pela sua orientação sexual, e sim por outras contravenções penais no âmbito da violência física, moral, verbal e psicológica.

Em relação aos momentos iniciais de materialização da reprovação das famílias aos indivíduos LGBT, Schulman (2010) articula como e por que os sistemas de homofobia familiar operam, ou como podem ser transformados. Referenciam-se, de acordo com a autora, duas experiências, uma delas é quando acontece o “assumir-se”, pois a família espera de certa forma, que o/a filho seja heterossexual, ou seja, é o momento de frustração desta. A segunda experiência comum é quando o indivíduo que assumiu a sua orientação sexual passa a externalizar as representações sociais que os/as diferenciam dos indivíduos heterossexuais, assim, são inferiorizados/as simplesmente pelo fato de não ser heterossexual.

Nota-se que o comportamento no cotidiano das famílias, frente à questão da homofobia, não é neutro (Lionço; Diniz, 2009), pois como explicito, não é de forma aleatória que acontece esse tipo de violência. Assim, aumenta a possibilidade de rompimento dos vínculos familiares, através da saída de seus lares, da fuga ou da expulsão por parte dos pais e familiares, em virtude de sua orientação sexual. Observa-se que a partir do momento em que as regras heteronormativas impostas não forem obedecidas, é estabelecida uma espécie de hierarquização de comportamentos, passando a ser materializadas através de coerções, privações e

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anulações; podendo essas atitudes de violências, levarem ao rompimento dos vínculos familiares, ao suicídio, ou homicídio23. 4 POLÍTICAS PÚBLICAS E PROGRAMAS DE GOVERNO DE COMBATE A HOMOFOBIA: E SEUS SERVIÇOS SÓCIOASSISTENCIAIS DE ATENDIMENTO AS VÍTIMAS DE HOMOFOBIA COM ÊNFASE NA FAMÍLIA

Desde o final do século XIX; quando a homossexualidade passou a ser

considerada doença através da Classificação Internacional de Doenças (CID- 10), os atendimentos à população LGBT eram realizados no âmbito da medicina e da coerção policial, a primeira se dava com maior intensidade no campo da psiquiatria e era de caráter higienista. Essas ações médicas eram voltadas ao ajustamento do indivíduo, aos valores da sociedade heteronormativos, ou tinham como objetivo a cura do “desvio de personalidade”, antes denominada.

Devido à mobilização dos movimentos sociais e em especial o movimento LGBT, foi a partir do governo Lula que ocorreu grandes avanços para a cidadania das pessoas LGBT, pois até esse momento o Estado brasileiro não oferecia serviços socioassistenciais direcionados às pessoas em situação de discriminação sexual, sendo que somente a partir do Programa Brasil Sem Homofobia - BSH; e da Política Nacional de Assistência Social - PNAS que esses serviços passaram a existir no Brasil, sendo que o primeiro foi criado e a segunda instituída no ano de 2004.

O serviço socioassistencial ao referido público no âmbito do Programa BSH é o Centro de Direitos Humanos Prevenção e Combate a Homofobia, e no da PNAS a demanda é direcionada a Proteção Especial de Média Complexidade. No entanto é importante ressaltar que ambos os serviços, muitas vezes, são co-depedentes dos serviços assistenciais da Proteção Especial de Alta Complexidade da PNAS. O tópico a seguir abordará esses serviços e suas complexidades e desafios na atualidade. 4.1 PROGRAMA BRASIL SEM HOMOFOBIA - BSH: IMPACTOS POSITIVOS E NEGATIVOS

O Programa BSH, é uma política de governo24, criado no ano de 2004,

vinculado a então Secretaria Especial de Direitos Humanos, e tem como finalidade a prevenção e o combate à violência e a discriminação contra pessoas LGBT e a promoção da cidadania homossexual. O referido programa é fruto da articulação e pressão dos movimentos sociais, tendo sido elaborado a partir do Plano Plurianual - PPA 2004-2007 que definiu a esfera do Programa Direitos Humanos, uma agenda de combate à discriminação sexual contra homossexuais, e que a partir deste foi elaborado o Plano de Combate à Discriminação contra Homossexuais.

O programa BSH que tem como princípios:

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Uma pesquisa da Universidade de Columbia nos Estados Unidos, após realizar estudos com 32.000 adolescentes de 13 a 17 anos, de escolas públicas estadunidenses, reafirma que a possibilidade de suicídios, entre adolescentes que vivem em ambientes repressores a sua orientação sexual, é cinco vezes maior em relação ao suicídio. 24

Fonseca (2008) afirma que discutir as políticas sociais na conjuntura atual leva se em consideração como arena de disputa as políticas de Estado e políticas de governo, em prejuízo da universalização de direitos inscrita na constituição nomeada cidadã.

21

A inclusão da perspectiva da não discriminação por orientação sexual e de promoção dos direitos humanos de gays, lésbicas, transgêneros e bissexuais, nas políticas públicas e estratégias do Governo Federal, a serem implantadas (parcial ou integralmente) por seus diferentes Ministérios e Secretarias.

A produção de conhecimento para subsidiar a elaboração, implantação e avaliação das políticas públicas voltadas para o combate à violência e à discriminação por orientação sexual, garantindo que o Governo Brasileiro inclua o recorte de orientação sexual e o segmento GLTB

25 em

pesquisas nacionais a serem realizadas por instâncias governamentais da administração pública direta e indireta.

A reafirmação de que a defesa, a garantia e a promoção dos direitos humanos incluem o combate a todas as formas de discriminação e de violência e que, portanto, o combate à homofobia e a promoção dos direitos humanos de homossexuais é um compromisso do Estado e de toda a sociedade brasileira (BRASIL, 2004).

Este programa visa à garantia de direitos da população LGBT, através da

intersetorialidade das políticas públicas, e entre os entes federativos, sendo que a sua implementação significa para esta referida comunidade um avanço do Estado brasileiro, pois esse pela primeira vez implanta uma política pública de governo focada na garantia desses direitos. Essa ação governamental tem um impacto direto na garantia dos direitos humanos, das minorias estigmatizadas pelas concepções machistas, patriarcalistas e religiosas, tão presentes na sociedade, proporcionando uma quebra de paradigma.

O serviço socioassistencial, previsto no BSH para atendimento a população LGBT vítima de homofobia, são os Centros de Referência de Direitos Humanos Prevenção e Combate a Homofobia – CRDHPCH, compostos por uma equipe multidisciplinar de assistentes sociais, psicólogos e advogados. Seu intuito é o atendimento psicossocial e sócio jurídico dos usuários LGBT´s, proporcionando a garantia e a efetivação de seus direitos, através do acesso aos órgãos de responsabilização e demais serviços socioassistenciais das políticas públicas, de acordo com a demanda existente. Executam-se desta forma o caráter desta política, que é o combate à discriminação e a promoção da cidadania homossexual de forma intersetorial.

A garantia de direitos da população LGBT se dá de forma integrada as Delegacias de Polícia, Ministério Público, Justiça, pela Política de Seguridade Social, a de Educação, a de Direitos Humanos, com a participação da sociedade civil organizada, com profissionais e serviços capacitados para atenderem as demandas oriundas desta população, de acordo com suas especificidades.

No entanto a partir do parecer de Massari (2009), é possível avaliar, que na atualidade existe a falta de capacitação dos profissionais brasileiros dos mais variados serviços públicos, para atenderem as demandas de homofobia, e também de programas dentro das políticas públicas voltadas às necessidades da população LGBT, e ainda Irineu (2008) ressalta que “É notável a emergência de setores públicos que se constituam em espaços de multiplicação de uma cultura do respeito à diversidade sexual [...]”.

25

Até o Encontro Brasileiro de Gays, Lésbicas, Bissexuais, Travestis e Transexuais (EBGLT), no ano de 2005, a sigla hegemonicamente usada pelos movimentos sociais que lutam contra a discriminação sexual era GLBT, sendo que a partir de então passou a ser usada a sigla LGBT.

22

Sobre o programa BSH e os CRDHPCH´s, Irineu (2008) avalia que “a criação desses serviços vem como um marco no combate a homofobia”, que o Programa Brasil Sem Homofobia “caminhou a passos de formiga na defesa da garantia dos homossexuais, não tendo sido efetivado conforme sua proposta original”.

Outra crítica ao BSH, que deve ser pontuada, é que a implantação e gestão dos CRDHPCH´s não se restringiam somente ao poder público, mas também as organizações não governamentais. A crítica a essa ação por parte do Estado não se dá no campo da falta de credibilidade dessas organizações, mas porque, é perceptível que o avanço da garantia de direitos através da implantação dos CRDHPCH´s, por vezes foi prejudicado pela quebra de convênio com essas organizações. Montaño (2002) aponta que o terceiro setor não tem como garantir a universalidade de suas ações, mas que somente o Estado é capaz de assegurar os direitos universais.

A partir de uma análise do programa BSH, no estado de Mato Grosso, Irineu (2008) discorre que:

Diante disso, coloca-se em questão o modelo neoliberal de políticas sociais implantados desde Collor, e a transferência de responsabilidades das “lógicas do Estado às lógicas da sociedade civil”. Vemos então, que a realidade posta em nosso Estado reitera e fortalece a cultura anti-Estado, que exime o Estado de suas responsabilidades políticas. Os CRDHCCH precisam ser incorporados aos órgãos estatais, pois resgatar a responsabilidade estatal pode contribuir para garantir que a homofobia esteja pautada na agenda pública. E, além disso, garantir também que o Programa BSH, torne-se uma política de Estado e não apenas de governo (IRINEU, 2008).

Sobre esta explanação pode-se citar como exemplo o Distrito Federal-DF,

onde o serviço foi implantado por uma ONG – Casa Roxa – em 2008, através do Programa Brasil Sem Homofobia. Diante disso, o movimento LGBT do DF reivindicou para que o serviço fosse efetivado diretamente pelo Estado. Assim, o governo, após muita pressão, implantou o Núcleo de Atendimento Especializado às Pessoas em Situação de Discriminação Sexual, Racial e Religiosa - NUDIN. No entanto, esse serviço não é vinculado ao Programa BSH, e o convênio com a referida ONG foram finalizados em 2009, deixando assim a população LGBT deste estado sem referência ao serviço do Programa. É necessário pontuar, conforme já citado, que essas ações governamentais se deram mediante a pressão dos movimentos sociais, pois é sabido que sem a pressão popular não haveria a instituição de um programa voltado à população LGBT, pois como coloca Behring;Boschetti (2008), “toda a análise de processos e relações sociais, na verdade é impregnada de política e disputa de projetos societários”, ou seja, é impossível analisar o programa BSH sem deixar de pontuar a atuação dos movimentos sociais LGBT e a visibilidade dada a comunidade pelas Paradas do Orgulho Gay, que impactaram a sociedade brasileira através de sua divulgação na grande mídia, proporcionando assim uma reflexão sobre os direitos e a cidadania LGBT, mesmo que por vezes de maneira sensacionalista, chegando assim essa reflexão ao governo brasileiro, e a concretização de uma ação pública por parte do Estado.

Concordando com Aredent (1989), acredita-se que os direitos sociais são conquistados, dessa forma analisa-se que as políticas públicas no estado capitalista, se concretizam sob pressão dos movimentos sociais. E como coloca Montaño (2002), atualmente vive-se um momento de desresponsabilização do estado perante

23

as políticas públicas, que tem transferido essa responsabilidade a sociedade civil, sendo esta uma característica do atual modelo neoliberal.

E ainda como coloca Irineu (2008), “é necessário o diálogo entre sociedade civil e Estado para a efetivação de direitos”, ou seja, os programas de governo e as políticas públicas devem ser articulados com os movimentos sociais, para assim atenderem as demandas existentes, em caráter universal, de forma a garantir a efetivação dos direitos pelo Estado.

No entanto mesmo com todas as críticas e entraves o Programa BSH em sua execução, o trabalho realizado nos CRDHPCH´s, através das intervenções psicossociais e sócias jurídicas das equipes multiprofissionais, tem sua contribuição e impacto social na garantia dos direitos, cidadania e autonomia de seus usuários, vítimas de violência em decorrência de sua orientação sexual. 4.2 A POLÍTICA DE ASSISTÊNCIA SOCIAL E A PROTEÇÃO SOCIAL ESPECIAL

A Assistência Social brasileira como direito social garantido pelo Estado é

fruto de um amplo processo de debates e da participação de inúmeros sujeitos políticos da sociedade brasileira, que antes mesmo da promulgação da Constituição de 1988 e da Lei Orgânica de Assistência Social - LOAS em 1993 vinham propondo a Assistência Social enquanto política pública de estado, na garantia dos mínimos sociais.

A política de Assistência Social foi instituída pelos artigos 203 e 204 da Constituição Federal e foi regulamentada pela Lei Orgânica de Assistência Social (LOAS), que, por sua vez promoveu três condições resolutivas de sua eficácia, nos três níveis federativos: a elaboração da Política de Assistência Social, por meio de conselhos, com a participação de representantes da população interessada; sua corporificarão em um Plano de Assistência Social; sua viabilização material, por meio de um Fundo de Assistência Social (SIMÕES, 2006).

Conforme a referida citação acima, sobre as condições resolutivas

promovidas pela Constituição Federal e a LOAS, a instituição da Política Nacional de Assistência Social só ocorreu no ano de 2004, ou seja, onze anos após a LOAS e dezesseis anos após a promulgação da constituição, sendo que a PNAS referenciou o Sistema Único de Assistência Social, que tem dentre os seus princípios:

Universalização dos direitos sociais, a fim de tornar o destinatário da ação assistencial, alcançável pelas demais políticas públicas;

Respeito à dignidade do cidadão, a sua autonomia e ao seu direito a benefícios e serviços de qualidade, bem como a convivência familiar e comunitária [...].

Igualdade de direitos no acesso ao atendimento, sem discriminação de qualquer natureza [...] (BRASIL, 2005).

Segundo Sposati (2007):

O paradigma de proteção social (básica e especial) rompe com a noção dos cidadãos como massa abstrata e os reconstrói a partir da realidade de suas vidas. Operam a partir de potencialidades, talentos, desejos, capacidades de cada um dos grupos e segmentos sociais. A proteção social da assistência social opera sob três situações: proteção às vulnerabilidades próprias ao ciclo de vida; proteção às fragilidades da convivência familiar;

24

proteção à dignidade humana e combate às suas violações (SPOSATI, 2007).

E quanto a Proteção Especial define-se como:

O segundo eixo protetivo da assistência social decorre do direito à dignidade humana, expresso pela conquista da equidade, isto é, o respeito à heterogeneidade e à diferença sem discriminação e apartações. No caso, a ruptura com as discriminações para com mulheres, índios, afrodescendente, entre outros, é central na dinâmica dessa política. Inclui, ainda, a proteção especial contra as formas predatórias da dignidade e cidadania em qualquer momento da vida e que causam privação, vitimização, violência e até mesmo o extermínio. As pessoas em desvantagens pessoais, em abandono ou em deficiência são possíveis vítimas dessa predação, além de crianças, jovens vítimas da violência sexual, drogadição, ameaças de morte (SPOZATI, 2007).

Dessa forma a PNAS através da Proteção Especial, se estrutura enquanto

política de garantia de direitos, que passou a reconhecer o seu usuário como sujeito sócio histórico, intervindo assim em benefício das minorias e da dignidade humana.

Os serviços de Proteção Especial de Média Complexidade são de certa forma co-depedentes da Proteção Especial de Alta Complexidade, pois há algumas situações de violação de direitos, a qual as equipes da média complexidade, sentem a necessidade de recorrer aos serviços de Alta Complexidade, como forma de proteção integral ao indivíduo em situação de violação de direitos e rompimento dos vínculos familiares.

Segundo Galvão (2003), a política de assistência social visa à prevenção ou à superação de diferentes formas de exclusão e à garantia de padrões de cidadania e qualidade de vida. Essa política é hierarquizada segundo a PNAS (2004) e a Norma Operacional Básica - NOB - SUAS, 2005, entre proteção básica e proteção social especial de média e de alta complexidade. No entanto como o foco deste trabalho é contextualizar a homofobia intrafamiliar e os serviços socioassistenciais, e que como referenciado o atendimento a estas demandas ocorrem no âmbito da proteção social especial de média e alta complexidade, o foco desta contextualização é análise nesse âmbito da política.

A Proteção social especial de média complexidade organiza-se para responder às situações em que os direitos sociais, coletivos e individuais estão ameaçados e/ou violados por omissão ou ação de pessoas ou instituições, podendo assim gerar o rompimento dos vínculos familiares e comunitários, sendo esta proteção oferecida através do serviço socioassistencial previsto na PNAS e na NOB SUAS, concretizada através do CREAS, que é definido segundo a Tipificação dos deste serviço como:

[...] integrante do Sistema Único de Assistência Social, constitui-se numa unidade pública estatal, polo de referência, coordenador e articulador da proteção social especial de média complexidade, responsável pela oferta de orientação e apoio especializados e continuados a indivíduos e famílias com direitos violados, direcionando o foco das ações para a família, na perspectiva de potencializar e fortalecer sua função protetiva (BRASIL, 2009).

E a mesma referência bibliográfica, coloca como público alvo do CREAS:

25

Crianças vítimas de violência física, psicológica, negligência e abandono; Crianças e Adolescentes vítimas de Exploração Sexual ou Abuso Sexual; Crianças e Adolescentes em situação de Trabalho Infantil; Adolescentes em Conflito com a Lei; Vítimas de Tráfico de Pessoas; Pessoas em Situação de Rua ou Mendicância; Gays, Lésbicas, Bissexuais e Travestis vítimas de Discriminação em decorrência de sua orientação sexual; Mulheres Vítimas de Violência; Pessoas com Deficiência em situação de violação de seus direitos; Idosas; Vítimas de Violência Física, Psicológica, Negligência e Abandono; Vítimas de Discriminação em Decorrência de sua Raça ou Etnia (BRASIL, 2009).

É importante ressaltar que os municípios em gestão inicial e básica da PNAS,

podem dar prioridade ao atendimento de crianças e adolescentes, diferenciando-se

dos municípios em gestão plena, que deverão atender a todas as especificidades de

demandas, conforme a tipificação do serviço (CREAS, 2011).

No entanto, para dar conta de atender às famílias em situação de homofobia,

é possível considerar que os serviços devem preparar-se para atender todas as

demandas, ou seja, prestar atendimento tanto às crianças e adolescentes como as

demais especificidades. Sobre esse processo, ilustra-se como exemplo a

perspectiva de entender a necessidade da criação de um serviço especializado para

as demandas de usuários de direitos violados em decorrência de orientação sexual,

como é a situação do DF, que criou um serviço de atendimento especializado a

população LGBT, vítimas de discriminação sexual, racial e religiosa, através do

NUDIN, que está no âmbito da Proteção Social Especial, assim como o CREAS, que

atende todas as demandas de usuários de direitos violados.

A PNAS a partir da proteção social se define como uma política que busca a autonomia de seus usuários, rompendo assim com os moldes da assistência social de caráter assistencialista e ajustador, que tinha como viés a responsabilização do “cliente” sobre a situação vivenciada.

Segundo a PNAS (2005):

Os serviços de proteção social especial de alta complexidade são aqueles que garantem proteção integral - moradia, alimentação, higienização e trabalho protegido para famílias e indivíduos, que se encontram sem referência e, ou, em situação de ameaça, necessitando ser retirados de seu núcleo familiar e, ou, comunitário. Tais como: Atendimento Integral Institucional; Casa Lar; República; Casa de Passagem; Albergue; Família Substituta; Família Acolhedora; Medida Socioeducativas restritivas e privativas de liberdade (semiliberdade, internação provisória e sentenciada); trabalho protegido (BRASIL, 2005).

Desta maneira, é possível afirmar que a Alta Complexidade, materializa em sua proposição, no que diz respeito à proteção integral a família e ao indivíduo. No entanto esta não tem sido a realidade do Estado brasileiro, onde profissionais e usuários do SUAS, tem enfrentado grandes desafios frente a desresponsabilização do Estado na manutenção dos serviços da alta complexidade, que tem sido cada vez mais repassada ao terceiro setor (Violin, 2008). Estas não atendem muitas das vezes as demandas reais da população usuária, ou seja, é notável que os serviços da alta complexidade ainda necessitem de um remodelamento, para que sejam realmente efetivadores de direitos e de cidadania, garantindo assim a autonomia dos usuários da Assistência Social, e não ser compreendido como um espaço de

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“abrigamento” de pessoas renegadas pela família e pela sociedade, que devem ser controladas (BRASIL, 2005).

Conforme Massari (2009), ao analisar a violação dos direitos das travestis e transexuais, por meio do serviço social e das políticas públicas, a autora pontua as seguintes questões:

[...] ao ser expulsa muitas vezes da família, da escola e até da cidade de origem, acaba tendo como opção o trabalho nas ruas, tornando-se trabalhadoras do sexo. A prostituição entra na vida dessas mulheres

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geralmente de maneira muito cruel. Muitas ainda adolescentes têm seus corpos transformados coma ajuda de silicone industrial e de uso indiscriminados dos hormônios, sem a menor orientação, apenas coma promessa de uma vida melhor e com dinheiro para comprarem o que desejarem. Mas infelizmente muitas terminam assassinadas, ou morrem por uso de drogas e atualmente ficam em situação de rua, com necessidade de encaminhamento para o serviço de albergues, que na sua maioria estão despreparados para recebê-las e onde, mais uma vez, sofrem atos homofóbicos quando a identidade de gênero não é respeitada e, para pernoitar nesses serviços, se submetem a dormir no quarto masculino, correndo risco de sofrerem violência sexual ou até mesmo de serem mortas (MASSARI, 2009).

Desta forma é importante ressaltar que os serviços socioassistenciais, devem preparar-se para atenderem as demandas oriundas de homofobia, e aqui específicas de homofobia intrafamiliar, pois a partir do momento que os serviços não se adéquam a esse público, ao invés de garantirem direitos acentuam ainda mais a violação de direitos. As situações de homofobia ocorrem em todas as classes sociais, gerando por vezes até o rompimento dos vínculos familiares, no entanto os LGBT´s oriundos de classes subalternas estão propensos a maior violação dos direitos e mais próximos a violência, pois conforme cita Massari (2009):

Essa população de classe média e alta também sofrem preconceitos e discriminação, porém dependendo da rejeição familiar a mais chance de estudar, se qualificar e obter trabalho e meios de viver como cidadão. A homofobia não escolhe classe social, porém quanto mais desprovido de acesso aos bens e serviços, quanto mais escasso o poder econômico, maior é a violação dos direitos e mais próximo à violência.

Acredita-se que a PNAS precisa avançar e se consolidar enquanto política

pública, que visa à garantia de direitos e a autonomia de seus usuários, pois assim terá seu caráter realmente universal, a partir da qualificação de seus profissionais perante a demanda LGBT, e adequação dos serviços ao atendimento da demanda da população LGBT. No entanto estas questões não devem se restringir apenas ao âmbito da Proteção Social Especial de Média e Alta Complexidade, mas também na Proteção Social Básica e demais políticas públicas, garantindo assim o atendimento adequado, o acesso aos programas, o respeito às identidades sexuais e de gênero, a não imposição dos valores heteronormativos e a conscientização educativa do respeito à diversidade sexual pelos demais usuários dos serviços socioassistencias.

Pois segundo Junqueira (2009):

A repressão sexual (enquanto prática institucional, da qual a homofobia é uma de suas expressões, embora a transcenda) opera não só pelo conjunto explicito de interdições, censuras ou por um código negativo e excludente,

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Travestis e Transexuais

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mas se efetiva, sobretudo, por meio de discursos, ideias, representações, práticas e instituições que definem e regula o permitido, distinguindo o legítimo do ilegítimo, o dizível do indizível, delimitando, construindo e hierarquizando seus campos (JUNQUEIRA, 2009).

Dessa forma é preciso pensar para o Brasil, uma adequação das políticas

públicas e seus serviços às demandas LGBT´s, e que essas sejam formuladas de na configuração consultiva a esta comunidade, atendendo assim as suas reais necessidades, através dos conselhos e movimentos sociais, pois somente assim o Estado brasileiro terá e exercerá o seu caráter democrático de direito, com o respeito à diversidade humana, com leis que beneficie as minorias, e que deem respaldo para a punição dos crimes de homofobia.

Para se tratar a questão da homofobia, e aqui em especial a homofobia intrafamiliar, é necessária uma ação conjunta do Estado e Sociedade Civil, que vise os atendimentos individuais e familiares de forma sistemática, contribuindo assim para a autonomia humana, a quebra de paradigma familiar e o fortalecimento dos laços familiares e comunitários.

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Como exposto nesta pesquisa, à homofobia intrafamiliar a princípio é

camuflada, pois a família por vezes, ao não aceitar a orientação sexual do adolescente e do jovem, os caracterizam como os rebeldes, os problemáticos. No entanto, muitas vezes estes adolescentes/jovens encontram-se em uma situação de não aceitação de sua orientação sexual ou sente-se repudiado por sua família. Essas questões por vezes os fragilizam emocionalmente, psicologicamente, afetando assim os vínculos familiares por falta de conhecimento sobre as questões referentes à homossexualidade, o que pode acentuar as vulnerabilidades sociais.

É perceptível à necessidade de intervenção por parte do Estado por meio das Políticas Públicas de Combate a Homofobia e Promoção da Cidadania LGBT, pois é somente através dessas que se construirá um país mais justo e equitativo, com as minorias estigmatizadas. Também se faz necessário que as demais políticas adéquem os seus serviços às demandas da contemporaneidade, no que se refere à população LGBT. E é claro que a efetivação dos direitos LGBT, não se dará apenas através de políticas públicas, mas também pelas normativas que criminalize a homofobia, e referencie as políticas e serviços às necessidades de demandas existentes da população LGBT, como também por meio de campanhas educativas sobre a homossexualidade e de prevenção à homofobia, em especial a intrafamiliar.

Quanto às famílias, acredita-se que há a necessidade de se estabelecer programas e projetos de apoio aos pais e familiares dos LGBT´s, como também a eles próprios, proporcionando a este suporte psicossocial, que preze pela autonomia dos indivíduos, e também o fortalecimento de vínculos familiares e comunitários. É reconhecível que as políticas estudadas nesse trabalho, têm um forte impacto no marco da garantia de direitos da população LGBT, no entanto ressalta-se que elas ainda não contemplam as complexidades que rodeiam a questão LGBT, e deixam a desejar.

No entanto, para que haja uma consolidação dessas políticas, tornando-se amplas as demandas existentes, é necessário também destacar a participação da sociedade LGBT e seus familiares, através dos conselhos de direitos da população

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LGBT/Diversidade Sexual, que precisam ser ampliados para todos os entes federativos, e que se constituam em espaços de construção da cidadania.

É imprescindível a intersetorialidade da Política Nacional de Assistência Social, com a Política Nacional de Direitos Humanos, e as demais políticas públicas, como forma de proteção a população LGBT.

No que se refere à PNAS, um dos grandes problemas no enfrentamento aos direitos da população LGBT, em situação de homofobia, é no atendimento inadequado pelos serviços da Proteção Especial de Alta Complexidade; no que tange a convivência desses usuários, como os demais heterossexuais que apresentam características que não condizem com sua identidade sexual, agravando ainda mais a situação quando ele (a) se identifica como Travesti, Transexual ou Transgênero; o que o leva a vivenciar situações vexatórias pelo próprio serviço que lhe deveria garantir direitos, e promover a dignidade humana e social. Assim, serviços que compõem a rede socioassistencial do Sistema Único de Assistência Social - SUAS, chegam a rejeitá-los, por não saberem como lidar com a sua orientação sexual, identidade de gênero, o seu nome social e o uso dos sanitários coletivos da instituição.

No Quando se trata de homofobia familiar, há certa rejeição da família em tratar sobre o assunto, o que pode dificultar as ações interventivas dos serviços socioassistenciais nos fortalecimentos dos vínculos familiares, devendo assim o Estado proporcionará aos usuários meios de empoderamento humano e social, como forma de garantia de direitos e autonomia.

É preciso que o Estado brasileiro se atente a essas demandas, pois a falta de serviços socioassistenciais adequados a esse público pode estigmatizá-los ainda mais, contribuindo assim para a negação de seus direitos e baixa autoestima. Uma questão referente a essas demandas, que deve ser pontuada neste trabalho é o acolhimento institucional de jovens maiores de idade em situação de homofobia familiar, junto a pessoas em situação de rua. Não que estejam estigmatizando as pessoas em situação de rua, mas acha-se inviável tratar a questão destes jovens, que apenas estão em situação de rompimento de vínculos familiares, da mesma maneira que os usuários dos serviços voltados à população em situação de rua, que vivenciam situações de vulnerabilidade diferenciadas, pois ao invés dos serviços contribuírem com o fortalecimento psicossocial desses jovens, pode assim contribuir com a acentuação de sua vulnerabilidade social. HOMOPHOBIA INTRA-FAMILY: PUBLIC POLICY AND SERVICES TO THE VICTIMS OF HOMOPHOBIA

Abstract: This article is intended to contribute to the discussion on homophobia intervention, public policies and services to victims of homophobia available in our country. Accordingly, this study sought as axle identification of policies and services that perform actions, aiming at combating homophobia and the promotion of citizenship of LGBT people. The methodology was qualitative analysis using the bibliographic search and document review. Outcomes was noted the existence of services they provide service to LGBT population, linked to the Brazil without Homophobia program, implemented from reference centres and human rights by Confronting and combating Homophobia, CREAS and other special Social protection establishments medium complexity, contained in the national policy for Social Assistance.

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Keywords: Homophobia. Family. Public Policies. Socioassistenciais. Services.

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ANEXO A – CENTRO DE REFERÊNCIA EM DIREITOS HUMANOS DE PREVENÇÃO E COMBATE À HOMOFOBIA

UF Cidade Nome do Centro Entidade Responsável

AC Rio Branco Núcleo de Direitos Humanos e Combate à Homofobia

UFAC - Universidade Federal do Acre

AL Maceió Centro de Referência às Vítimas de Discriminação e Violência

Secretaria da Mulher, Cidadania e dos Direitos Humanos

AM Manaus

Centro de Referência em Direitos Humanos de Prevenção e Combate à Homofobia Adamor Guedes

Secretaria de Justiça e Direitos Humanos

BA Salvador Em Implantação Governo do Estado da Bahia

BA Vitória da Conquista

Em Implantação Governo do Estado da Bahia

CE Fortaleza Centro de Referência em Direitos Humanos GLBT Janaína Dutra

Grupo de Resistência Asa Branca – GRAB

DF Brasília Centro de Referência em Direitos LGBT de Brasília - Casa Roxa

Instituto de Bioética, Direitos Humanos e Gênero - ANIS

ES Vitória Centro de Atendimento às Vítimas de Preconceito e Discriminação

Prefeitura Municipal de Vitória

GO Goiânia Centro de Referência no Combate à Homofobia - SEMIRA

Secretaria de Estado de Políticas para Mulheres e Promoção da Igualdade Racial

MG Alfenas Centro Sul Mineiro de Referência Homossexual

Movimento Gay de Alfenas - MGA

MG Belo Horizonte

Centro de Referência GLBTTT do Estado de Minas Gerais

Secretaria de Desenvolvimento Social - SEDESE

MS Campo Grande

Centro de Referência em Direitos Humanos de Prevenção e Combate à Homofobia

Secretaria Estadual de Trabalho e Assistência Social

MS Dourados Centro de Referência em Direitos Humanos e Combate à Homofobia LGBT

Associação de gays, lésbicas e transgêneros de Dourados-MS

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MT Cuiabá Centro de Referência LGBT de Combate à Homofobia - SEJUSP

Secretaria de Justiça e Segurança Pública de Mato Grosso

PA Belém Centro de Referência, Prevenção e Combate a Homofobia

Defensoria Pública do Estado do Pará

PB João Pessoa Centro de Referência em Direitos Humanos para LGBT

Associação das Travestis da Paraíba – Astrapa

PE Salgueiro Centro de Referência Especializado de Assistência Social e Direitos Humanos

Centro de Prevenção às Dependências

PE Recife Centro de Referência em Direitos Humanos contra a Homofobia Leões do Norte

Movimento Gay Leões Do Norte

PI Teresina Centro de Referência Homossexual Raimundo Pereira

Secretaria Estadual de Assistência Social e Cidadania

PR Curitiba Centro de Referência João Antônio Mascarenhas

Grupo Dignidade – Pela Cidadania de Gays, Lésbicas e Transgêneros

RJ Duque de Caxias

Centro de Referencia de Enfrentamento à Homofobia

Organização de Direitos Humanos Projeto Legal

RJ Nova Friburgo Centro de Referência em Prevenção e Combate à Homofobia Hanna Suzart

Prefeitura Municipal de Nova Friburgo

RN Natal

Centro de Referência em Direitos Humanos de Prevenção e Combate à Homofobia - CRCH

Secretaria de Estado da Justiça e da Cidadania – Coordenadoria de Direitos Humanos e Defesa das Minorias - CODEM

RO Porto Velho Centro de Referência Núbia Lafayete

Núcleo de Promoção da Livre Orientação Sexual TUCUXI

RR Boa Vista Centro de Referência em Direitos Humanos MEREMÊ - Roraima

Associação Roraimense pela Diversidade Sexual

RS Porto Alegre Centro de Refêrencia de Porto Alegre - NUANCES

Nuances – Grupo pela Livre Orientação Sexual

RS Tramandai

Centro de Referência em Direitos Humanos de Prevenção e Combate à Homofobia de Tramandaí

Igualdade Tramandaí

SC Balneário de Camboriú

Centro de Referência em Direitos Humanos de Santa Catarina

Associação dos Profissionais do Sexo do Vale do Itajaí

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SC Lages

Centro de Referência em Direitos Humanos a Vítimas do Preconceito e Discriminação LGBT

Associação Catarinense de Apoio Social e Educacional à Família - ACASEF

SC Florianópolis Centro de Combate às Violências GLBTTT da Grande Florianópolis

Associação em Defesa dos Direitos Homossexuais - ADEH

SE Aracaju

Centro de Referência em Direitos Humanos de Prevenção e Combate à Homofobia de Sergipe

Secretaria de Segurança Pública de Sergipe

SP São Paulo

Centro de Referência em Direitos Humanos de Prevenção e Combate à Homofobia de São Paulo

Secretaria Municipal de Participação e Parceria - CADS

SP S. José do Rio Preto

Centro de Referência LGBT de Rio Preto

Grupo de Amparo ao Doente de Aids (GADA)

SP Campinas Centro de Referência GLTTB de Campinas

Prefeitura Municipal de Campinas - Secretaria Municipal de Cidadania, Trabalho, Assistência e Inclusão Social

SP São Vicente

Centro de Referência em Direitos Humanos de Luta e Combate a Homofobia na Baixada Santista Professora Mara Valéria

Associação Vida Esperança

SP Assis

Centro de Referência em Direitos Humanos e Combate à Homofobia do Sudoeste Paulista

Núcleo de Estudos e Pesquisa sobre as Sexualidade (NEPS)

TO Palmas Centro de Referência GLBT de Palmas - Tocantins

Associação Grupo Ipê Amarelo de Conscientização e Luta Pela Livre Orientação Sexual