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IMPÔSTO DE VENDAS E CONSIGNAÇOES: ANÁLISE DpS SISTEMAS DE ARRECADAÇAO ALCIDES J. COSTA Em que estágio do ciclo econômico deve incidir o impôsto de vendas? Por quê? o impôsto de vendas e consignações, no Brasil, é provà- velmente exemplo singular de tributo instituído por sugestão dos contribuintes. O artigo 219 do Código Comercial mandava que, nas vendas em grosso ou po~ atacado, entre comerciantes, o vendedor apresentasse ao comprador, em duplicata, no ato da entrega das mercado- rias, a fatura ou conta dos gêneros vendidos. O vendedor e o comprador deviam assinar ambas as vias da fatura, ficando um exemplar em poder de cada um dêles. Essas contas assinadas estavam sujeitas ao impôsto do sêlo des- de o decreto n.? 4.505, de 9 de abril de 1870, e eram aceitas como título de dívida, para efeito de desconto bancário. Dois fatôres contribuíram para que as duplicatas de fatura deixassem de ser utilizadas em descontos bancários. Por um lado, generalizou-se o hábito de o comprador não de- volver a conta devidamente assinada. Por outro, o de- creto n.? 2.044, de 31 de dezembro de 1908, que regulou ALCIDESJ. COSTA - Advogado, Ex-Juiz do Tribunal de Impostos e Taxas do Estado de São Paulo.

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IMPÔSTO DE VENDASE CONSIGNAÇOES: ANÁLISE DpS

SISTEMAS DE ARRECADAÇAOALCIDES J. COSTA

Em que estágio do ciclo econômico deve incidir oimpôsto de vendas? Por quê?

o impôsto de vendas e consignações, no Brasil, é provà-velmente exemplo singular de tributo instituído porsugestão dos contribuintes. O artigo 219 do CódigoComercial mandava que, nas vendas em grosso ou po~atacado, entre comerciantes, o vendedor apresentasse aocomprador, em duplicata, no ato da entrega das mercado-rias, a fatura ou conta dos gêneros vendidos. O vendedore o comprador deviam assinar ambas as vias da fatura,ficando um exemplar em poder de cada um dêles. Essascontas assinadas estavam sujeitas ao impôsto do sêlo des-de o decreto n.? 4.505, de 9 de abril de 1870, e eramaceitas como título de dívida, para efeito de descontobancário.

Dois fatôres contribuíram para que as duplicatas de faturadeixassem de ser utilizadas em descontos bancários. Porum lado, generalizou-se o hábito de o comprador não de-volver a conta devidamente assinada. Por outro, o de-creto n.? 2.044, de 31 de dezembro de 1908, que regulou

ALCIDESJ. COSTA - Advogado, Ex-Juiz do Tribunal de Impostos e Taxasdo Estado de São Paulo.

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a letra de câmbio e a nota promissória, trouxe sérias dú-vidas a respeito da qualidade de título de crédito que seatribuía a essas duplicatas de fatura.

Desprovido de um título de aceitação obrigatória e defácil circulação, o comércio movimentou-se para conseguira instituição definitiva de um título com essas caracterís-ticas. Sua primeira tentativa corporificou-se na lei orça-mentária editada em 1914 para vigorar em 1915. Umdispositivo dessa lei equiparava as contas assinadas àsnotas promissórias e criava, por simples menção, um im-pôsto sôbre essas contas, ao mesmo tempo em que dele-gava ao Poder Executivo a regulamentação dêsse tributo.O citado dispositivo integrava o que se chamava de "caudaorçamentária", prática abusiva que só terminou com areforma constitucional de 1926, e que consistia em inserir,na lei orçamentária, matéria totalmente estranha ao or-çamento.

A duraçãodêsse nôvo título de crédito foi curta, poislogo no ano seguinte, em 1915, o dispostivo que o haviainstituído foi revogado pela Lei n.? 3.070-A, sobretudopor ter sido-entendida como inconstitucional a delegaçãode podêres ao Executivo.

O Comércio, porém, não desistiu do seu intento. O Con-gresso das Associações Comerciais do Brasil, reunido noRio de Janeiro em 1922, propôs que se desse caráter detítulo cambiário às duplicatas de fatura, acenando com acobrança de um impôsto sôbre as vendas documentadaspor essas duplicatas, como atrativo para obter a adesãodo poder público à idéia.

As sugestões foram aceitas pelo Govêrno Federal e pos-tas em prática através da lei n.? 4.625, de 31 de dezembrode 1922. Estava criado o impôsto de vendas e consigna-ções, que a Constituição de 1934 transferiu para a compe-tência impositiva dos Estados.

Como se verifica, no Brasil êsse tributo foi criado paraatender a uma quase solicitação do comércio e não como

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forma de enfrentar dificuldades financeiras do poder pú-blico, que foi o que aconteceu em quase todos os paísesonde êsse impôsto existe.

No período em que tem sido arrecadado pelos Estados,o impôsto de vendas e consignações sempre atingiu, demaneira uniforme, tôdas as vendas efetuadas por comer-ciantes e produtores, inclusive industriais. Embora cons-titua a viga-mestra dos orçamentos estaduais há quasetrinta anos, os efeitos econômicos de um impôsto dessanatureza não foram ainda examinados. A única experiên-cia feita foi a do Estado do Rio Grande do Sul, que es-tabeleceu um impôsto com alíquotas variáveis em funçãoda natureza da mercadoria vendida, sistema que já foirevogado.

No segundo semestre de 1961, o Govêrno do Estado deSão Paulo promoveu estudos dos quais resultou um pro-jeto de lei que, embora publicado, não chegou a ser re-metido à Ass~mbléiaLegislativa, e que alterava o sistemade incidência e arrecadação do impôsto de vendas e con-signações.( 1) Segundo êsse projeto, a incidência do im-pôsto ficaria limitada às vendas e consignações ocorridasno ciclo da produção industrial. Ficariam isentas as ven-das e consignações feitas por produtores agropecuários epor comerciantes.

Sem considerar aspectos laterais do projeto, verifica-seque nêle se instituía um sistema de incidência que atingiaapenas a produção industrial, quer a de produtos inter-mediários, quer a de finais. O projeto suscitou algumasdiscussões que se foram esmaecendo, até cessarem porcompleto. Todavia, o simples fato de ter sido elaboradodemonstra a necessidade de algumas reflexões a propó-sito dos sistemas usados para a arrecadação do impôsto devendas.

1) Jornal "O Estado de S. Paulo", de 5·1-1962, pág , 19.

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SISTEMAS DE ARRECADAÇÃO

o impôsto de vendas pode, bàsicamente, ser arrecadadode acôrdo com três sistemas: o do estágio múltiplo, o doestágio singular e o do valor acrescido. (2)

No primeiro sistema (estágio múltiplo) o impôsto incidesôbre tôdas as vendas ocorridas no ciclo da produção eno da comercializaçâo , No segundo sistema (estágio sin-gular), o impôsto incide apenas uma vez na produção ecomercialização dos produtos; essa incidência pode loca-lizar-se na fonte de produção (impôsto sôbre o produtor),nas vendas de atacadistas a varejistas, ou nas dêstes aoconsumidor . Assinale-se que não há exemplo de impôstoincidente unicamente sôbre as vendas de produtores agro-pecuários. Em todos os países que se limitam a tributaras vendas dos produtores, os atingidos são os industriais,

No sistema do impôsto sôbre o valor acrescido, são tribu-tadas tôdas as vendas, mas o vendedor sempre desconta,do impôsto que deve recolher, aquêle que já foi pago pelosindustriais ou comerciantes em cujas mãos a mercadoriahouver passado antes.

O IMPÔSTO DE ESTÁGIO MÚLTIPLO

o impôsto de estágio múltiplo, que é o que existe na quasetotalidade dos Estados brasileiros, tem alguns aspectos po-sitivos a par de muitos outros negativos. (3)

2) o impôsto é conhecido entre nós como "de vendas e consignações". Seráaqui denominado "impôsto de vendas" para maior facilidade.3 ) Os autores que tratam da matéria repetem substancialmente as mesmasobservações em tôrnc das vantagens e desvantagens de cada um dos sistemasde incidência e arrecadação do impôsto de vendas. Êste trabalho baseou-seespecialmente em: (a) Francesco Forte, artigo publicado na Révue de .ScienceF'inanciêre, 1956, págs, 386 e segs., sob o título "A quel state du cyc1e éco-nomique doit-on percevoir l'impôt sur le chiffre d'affaires?"; (b) Impôt SUl'

Transactions, Transmissions et Chiffre d'Affaires - dirigido por Masoin eMorselli e publicado pelo Lnstit ut de Sciences Finenciêres de L'Université dePalerme, 1959; e (c) principalmente em John F. Due, Sales Taxation, Lcn-dres, Routledge & Kegan Paul, 1957, sem dúvida a melhor obra sôbre o as-sunte.

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Êsse tipo de impôsto permite que determinada arrecada-ção seja conseguida com urna alíquota muito mais baixado que a exigida por qualquer dos tipos de impôsto deestágio singular, para conseguir o mesmo rendimento!Essa é sua vantagem mais acentuada.

Apesar disso, no Brasil, são bastante altas as alíquotas doimpôsto de vendas. No Estado de São Paulo, por exem-plo, êsse tributo é cobrado à alíquota de 4,8%, só infe-rior entre, os países onde existe impôsto de vendas damesmo tipo à da existente na Áustria (5,25%). Note-se,porém, que na Áustria as vendas de produtos alimentí-cios básicos e as efetuadas por agricultores estão sujeitasao impôsto de 1,7%, e as vendas de atacadistas, ao de1,8% .

Teoricamente, um impôsto mais baixo constitui um incen-\

tivo menor à sonegação e portanto, sob êsse aspecto, oimpôsto do tipo de estágio múltiplo seria o ideal. Mas ogrande número de contribuintes - urna vez que o tri-buto atinge todos os industriais, comerciantes e produto-res agropecuários - torna difícil a fiscalização; êsse fatoré um incentivo à sonegação e compensa a ausência deoutro incentivo derivado de alíquotas baixas.

Entre nós, o impôsto de vendas é cobrado a alíquotasbastante elevadas para um sistema de estágio múltiplo.A multiplicidade de alíquotas tão altas é um convite àfuga aos deveres fiscais, ao qual se junta o que decorreda dificuldade de fiscalização. Do conjunto, resulta urnasonegação que não deve ser pequena.Um impôsto de estágio múltiplo, com alíquota uniformee sem grande número de isenções, é de fácil compreen-são para os contribuintes e, à parte o inconveniente dogrande número de emprêsas a serem fiscalizadas, de gran-de simplicidade de administração pelos agentes do poderpúblico.Um impôsto de vendas dêsse tipo fica bastante diluídopela indústria e pelo comércio atacadista e varejista. Oseu impacto faz sentir-se com menos intensidade em cada

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um dêsses estágios do ciclo da produção e da comercia-lização, porque o tributo que onera cada produto atinge-ogradativamente e não de uma só vez, como no impôstode estágio singular.

Tôdas essas vantagens do impôsto de vendas de estágiomúltiplo não são suficientes para compensar-lhe as des-vantagens, que têm levado a maior parte dos países aoptar pelo impôsto de estágio singular. E dessas desvan-tagens, a mais acentuada é a de que o impôsto de vendasde estágio múltiplo constitui um incentivo de mera na-tureza' fiscal à integração vertical das emprêsas.

Êsse aspecto é bastante sensível no setor da produçãoindustrial. Se uma emprêsa deve ficar onerada com umimpôsto ao comprar componentes manufaturados ousemimanufaturados para fabricar seus produtos, será bas-tante tentada a examinar a possibilidade de produzir êssescomponentes, economizando assim o tributo, mormente seêste fôr alto. Se essa economia compensar, em certo pra-zo, o investimento adicional necessário, ou se essa econo-mia permitir melhores condições para enfrentar os com-petidores, essa emprêsa, certamente, passará a fabricartais componentes.

o mais notável analista do impôsto de vendas, JOHN F.DUE, atribui ao impôsto de estágio múltiplo da Itália ainexistência, nesse país, da encomenda, a terceiros, departes do produto final, muito comum nos Estados Unidos.

O incentivo à integração age também no ciclo da comer-cialização, notando-se uma tendência à eliminação do ata-cadista e ao estabelecimento de relações diretas entre ofabricante e o varejista e até entre o fabricante e o con-sumidor. (4)

4) Entre nós, não existem estudos sôbre os E,feitos econormcos do impôstode vendas, mas seus efeitos de integração são evidentes. Na indústria auto-mobilística, por exemplo, há uma tendência à integração, produzida talvezem parte pela ausência de uma indústria ccmpleta de auto-peças e em partepela ação do impôsto de vendas.

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A própria lei, ao procurar diminuir os efeitos de integra-ção do impôsto de vendas de estágio múltiplo, fornece osmelhores exemplos do incentivo aqui tratado. A lei pau-lista n.? 1.037, de 28 de maio de 1c)S1, ainda em vigorpor fôrça de sucessivas prorrogações de seu prazo, con-cedeu isenção do impôsto de vendas e consignações paraas operações internas da praça de Santos, realizadas comcafé, quando destinadas à formação de lotes para a ex-portação. Não fôra esta lei, talvez já tivesse desapareci-do, em Santos, o comércio de café era sua modalidadetradicional. Provàvelmente, êsse comércio ter-se-ia con-centrado nas mãos dos grandes exportadores que só ma-nipulam o café por êles adquirido dos produtores. Aindaem São Pauio, a Iei n.? 6.026, de 31 de dezembro de 1960,concedeu isenção de impôsto para as vendas e consigna-ções de algodão em pluma, exceto quando realizadas parafora do país ou quando feitas a industriais. que adquiremo algodão para utilizá-lo em suas indústrias. Tambérnesta lei eliminou qualquer incentivo à integração verti-cal no comércio do algodão em pluma .

Desde que apontamos como desvantagem do impôsto deestágio múltiplo a de constituir êle um incentivo mera-mente tributário à integração vertical, a esta altura ca-beria perguntar se motivos de outra natureza aconselhamo combate a essa integração ou tornam preferível seu fa-vorecimento. A resposta foge ao objetivo dêste trabalho.O legislador pode, conscientemente, utilizar-se do impôs-to de vendas como instrumento de incentivo à integraçãovertical; o que não parece razoável é que, em circunstân-cias em que êsse objetivo não é desejado em virtude derazões de política econômica, êsse incentivo não seja cor-rigido ou compensado, quando resultante pura e simples-mente da aplicação da lei tributária, contrariando, talvez,a tendência da economia.

Porém, a desvantagem até aqui abordada não é a únicaatribuída ao impôsto de vendas de estágio múltiplo que étambém suscetível de alterar o comércio de importação eexportação.

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Se não existir impôsto de vendas no país de origem do pro-duto importado, êste ficará em posição vantajosa, na com-petição com produtos nacionais. O importador pagará oimpôsto apenas uma vez, ao vender o produto. No entan-to, o comerciante que estiver colocado no mesmo momen-to do ciclo da comercialização e que tiver comprado o pro-duto no, país, recebê-lo-á onerado pelo impôsto incidentesôbre a mercadoria, em cada venda, desde a fonte de pro-dução. Os produtos exportados, por seu turno, terão situa-ção de inferioridade em relação aos provenientes de paísesonde o impôsto de vendas não exista.

Embora nenhum estudo tenha sido feito, é de supor-seque a tarifa aduaneira e, mais do que a tarifa, o regimecambial, anulem os possíveis efeitos do impôstode vendas.nas importações feitas pelo Brasil.

O mesmo não acontece nas exportações e, por diversas vê-zes, la indústria sugeriu que fôsse concedida isenção do im-pôsto de vendas para os produtos exportados. Constitui,aliás, prática muito difundida conceder essa isenção. É ocaso da Itália e da Alemanha, para limitar as citações apaíses onde o impôs to de vendas é do tipo de estágiomúltiplo. A Itália, além de isentar a venda para o Exte-rior, adota um sistema de reembôlso do impôsto que hou-ver onerado a mercadoria, antes de exportada.

Não é preciso ir tão longe para encontrar exemplos deisenção para as exportações. Concede-a a nossa legislação,do impôsto de consumo, tributo que, do ponto de vistaeconômico, identifica-se com o impôsto de vendas.

Por último, entre as desvantagens do impôsto de estágiomúltiplo, encontra-se a de o tributo dêsse tipo ocasionardistorções no ônus real que recai sôbre o contribuinte defato.

As mercadorias cujo ciclo de produção e comercializaçãoé longo ficam sujeitas a um impôsto relativamente maisalto, porque atinge o produto por várias vêzes. Ocorre que,entre essas mercadorias, encontram-se algumas de uso ne-

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cessário ou muito difundido, de modo que a grande massade consumidores fica, na realidade, em relação a tais pro-dutos, sujeita a um impôsto mais alto do que o que atingeoutros produtos menos necessários mas sujeitos a um ciclode produção e comercialização menos longo. As jóias, porexemplo, têm um ciclo de produção e comercialização mui-to curto, em comparação com as roupas.

Na verdade, o impôsto de estágio múltiplo em sua formapura é bastante raro. O que existe em São Paulo e noBrasil, de modo geral, aproxima-se bastante dessa formapura. Se, até hoje, nenhum estudo se fêz a propósito dosefeitos econômicos de um impôsto dessa natureza e se sãoesporádicas as medidas para evitar os efeitos não deseja--dos, é certo que o progresso econômico do País forçaráa adoção de medidas dessa ordem, se o mesmo sistemafôr mantido.

É o que tem acontecido em outros países. Para diminuiro incentivo à integração vertical, na Alemanha, uma em-prêsa que produz o fio e o tecido fica sujeita ao impôstoquando transfere o fio para a seção de tecelagem; as ven-das a varejo feitas por fabricantes ficam sujeitas a um im-pôsto mais elevado. Na Itália, são tributadas as transfe-rências de mercadorias que uma fábrica faz para arma-.zéns de varejo a ela pertencentes. Na Áustria, o Ministro-das Finanças pode aplicar um impôsto adicional a firmasintegradas, para igualar o ônus que as atinge ao das firmasnão integradas.

Outros e numerosos exemplos poderiam ser aduzidos. Masa lição a deduzir é a de que as medidas de correção dosdefeitos do impôsto de vendas de estágio múltiplo tendema destruir a sua maior vantagem, que é a simplicidade.Êsse motivo, aliado à dificuldade de fiscalização decor-rente do grande número de contribuintes, tem levado mui-tos países a preferir o impôsto de vendas cobrado apenasnum dos momentos do ciclo da produção e da comercia-lização.

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o IMPÔSTO DE VENDAS DE ESTÁGIO SINGULAR

o sistema de estágio singular pode traduzir-se em umatributação no nível da produção, no do atacado ou no dovarejo.

Em qualquer dêsses níveis, o sistema de estágio singularelimina o incentivo à integração porque se o impôsto in-cide apenas uma vez, seja qual fôr o número de vendasa que esteja sujeito um produto até alcançar o consumi-dor, torna-se inútil agregar à emprêsa outros estágios dociclo da produção ou da comercialização apenas para evi-tar a incidência múltipla do impôsto. A carga tributáriapode ser melhor calculada e atender melhor aos desejosdo legislador, pois passa a independer da maior ou menorextensão do ciclo de produção e comercialização, fatorque é, às vêzes, circunstancial.

o impôsto de estágio singular torna mais fácil dispensaraos bens importados um tratamento que os coloque em péde igualdade com os produzidos no país, e às mercadoriasexportadas um tratamento que não lhes crie situação des-favorável nos mercados internacionais. O número de con-tribuintes é muito inferior ao encontrado num sistema deestágio múltiplo, do que decorre a possibilidade de serexercida melhor fiscalização. Ao lado de tôdas essasvantagens, porém, o impôsto de estágio singular, cobra-do urna só vez, exige a aplicação de uma alíquota mui-to mais elevada para obter a mesma arrecadação.Certos exemplos práticos parecem demonstrar que essadesvantagem é mais de ordem teórica e que umaalíquota alta, num impôsto dêsse tipo, não produz efei-tos desastrosos para a economia globalmente conside-rada. No Canadá o impôsto é de 10% e na Finlândia de20%, pagos pelos fabricantes, em ambos os casos. NaNoruega, há um impôsto de 10%, devido pelos varejis-tas, e na Nova Zelândia um de 2O%, incidente sôbre 03

atacadistas. De qualquer modo, uma alíquota muito altaconduz a maior sonegação, ou, pelo menos, é um atrativomaior à sonegação.

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Êste conspecto geral sôbre o impôsto de vendas de estágiosingular requer o complemento de um exame de suas trêsmodalidades.

O IMPÔSTO DE VAREJISTA,DE ATACADISTAE DE FABRICANTE

No consenso geral, a modalidade mais perfeita, sob o as-pecto econômico, é a do impôsto de vendas incidente ape-nas sôbre as vendas de varejo.

Admitido que êsse impôsto se destina a atingir o consu-mo, é claro que sua cobrança no nível do varejo assegurauma repercussão mais perfeita do que a conseguida coma tributação em qualquer outro nível. Um impôsto cobra-do do fabricante ou do atacadista representa, para o con-tribuinte de fato, um ônus variável em função da margemde lucro do varejista. Se, para um mesmo produto, a mar-gem de lucro de um varejista é maior do que a de outro,daí resulta que, no primeiro caso, o ônus tributário serámenor, em relação ao preço final da mercadoria, se a inci-dência houver ocorrido no nível de fabricação ou no deatacado.

o impôsto de varejo evita êsse inconveniente, além de sero que melhor se presta a adequar o tributo ao preço final,sejam quais forem as circunstâncias que cerquem a últi-ma venda. Num impôsto de atacado ou de fabricante, oônus do consumidor que adquire o produto numa loja ele-gante é o mesmo que o do que faz sua compra em loja mo-desta. Daí decorre que o ônus dêste último é maior por-que, para um preço mais baixo, suportou o mesmo impôsto,

o impôsto de vendas incidente no nível de fabricação édiscriminatório contra os fabricantes que vendem no vare-jo. Se o fabricante vende a atacadistas ou varejistas, seupreço é mais baixo que o das vendas que faz a consumi-dores, uma vez que não está acrescido das despesas de dis-tribuição. Por essa razão, as mercadorias que o fabricantevende a consumidor ficam mais oneradas do que as que

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o varejista adquire do fabricante para revenda a consumi-dores.

Pelas mesmas razões, o impôsto de vendas cobrado do ata-cadista é discriminatório contra os atacadistas que efetuamvendas no varejo.

o impôsto de vendas cobrado no varejo elimina êsses in-convenientes, pois permite uma alíquota menor para obtero mesmo produto final, por ser calculado com base no pre-ço de venda no varejo, que, naturalmente, é mais alto queo de atacadista ou de fabricante.

Cada comerciante calcula sua margem de lucro sôbre ocusto da mrecadoria e, depois, adiciona o impôsto de ven-das, ressalvada a hipótese de as condições de mercado nãolhe permitirem repercutir o tributo. Se êste é pago pelofabricante, a tendência do atacadista será a de calcular oseu lucro com base no custo, em que incluirá o impôstoantes recolhido. O varejista, por seu turno, fará o mesmoe calculará seu lucro sôbre o custo, onde estarão compu-tados o impôsto pago pelo fabricante e a margem de lucrodo atacadista, inclusive a parcela calculada sôbre o im-pôsto. O resultado é a formação de uma verdadeira pirâmi-de, onde aparecem margens de lucro sôbre margens delucro, tendo o impôsto na base. Êsse efeito, que não é es-tranho ao impôsto de estágio múltiplo, não existe quandoo tributo é cobrado no nível do varejo.

Êste tipo de impôsto de vendas faz também desaparecera dificuldade de tratamento de mercadorias importadas ouexportadas,

Em países organizados em federação, como o Brasil, o im-pôsto de vendas incidente apenas sôbre varejistas faz re-duzir ao mínimo os atritos entre estados, nas operaçõesinterestaduais, muito agudos entre nós, como demonstraa luta que, no Congresso Nacional, vem sendo travada háalguns anos em tôrno da revogação do sistema instituído

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pelos decretos-leis n.? 915, de 1.0 de dezembro de 1938e n.? 1.061, de 20 de janeiro de 1939. (5)

A cobrança de impôsto no varejo permite que se deter-mine o destaque da parcela relativa ao tributo, para queo consumidor tenha consciência do que está pagando. Ascircunstâncias decidirão, em cada caso, se essa possibilida-de deve ser utilizada.

Como se verifica, do ponto de vista econômico, o impõstode vendas cobrado no nível do varejo é o que mais van-tagens apresenta. Tôdas elas, porém, podem não ser su-ficientes para compensar a desvantagem representada pelaenorme dificuldade de combate à sonegaçao.

O maior índice de fuga ao cumprimento de obrigação tri-butária encontra-se no varejo, não só porque nesse nívelse concentra o maior número de contribuintes, mas tam-bém porque o comércio varejista é o mais difícil de fisca-lizar, sobretudo onde predomina o pequeno comércio, des-provido de registros contábeis ou, pelo menos, de registrosaceitáveis, e exercido pelo proprietário do estabelecimen-to auxiliado por seus familiares ou por poucos empregados.

No Estado de São Paulo, o volume do pequeno comérciodesaconse1ha a adoção de um sistema de cobrança do irn-pôsto de vendas apenas no varejo. É verdade que hoje, nosistema de estágio múltiplo, o varejo é tributado, mas nãoé menos verdade que, sendo alto o índice de sonegação,tornar-se-ia perigoso assentar a arrecadação do principalímpôsto do estado num impôsto de vendas cobrado ape-

5) Segundo êsses decretos-leis, o impôsto sôbre vendas' e consignações é de-vido no lugar em que se efetuar a operação. Para os efeitos fiscais, considera-selugar em que se efetua a operação (venda OU consignação) aquêle em quee~tá situado o estabelecimento de vendedor ou consignante, seja matriz, fi-lial, sucursal, agência ou representante, com depósito, a seu cargo, dasmercadorias vendidas ou consignadas, salvo quando se tratar de ven-da ou consignação efetuada diretamente pelo próprio fabricante ou pro-dutor, caso em que o lugar da operação será aquêle onde foi fabricada ouproduzida a mercadoria. Nos cases em que houver simples depósitos de mer-cadorias a rerem negociadas por estabelecimentos situados em território deestado diferente, o lugar da operação é aquêle em que estiver situado o depó-sito conde se encontra a mercadoria.

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nas dos varejistas. Note-se que na Holanda, por exem-plo, país pequeno, onde existe o impôsto de vendas de es-tágio múltiplo, foi abolida, a partir de 1955, a tributaçãodas vendas a varejo, sob o fundamento de que havia gran-de possibilidade de sonegação.

Em lugares onde a produção artesanal ocupa posição deimportância, a cobrança de impôsto de vendas no varejopode levar a conseqüências que o legislador não desejou.Pequenos estabelecimentos de caráter artesanal tendem aabastecer-se no varejo, de modo que tudo quanto adquiremjá lhes chega às mãos com uma carga tributária que se vairepetir quando o seu produto atingir o consumidor.

Por outro lado, o impôsto no nível do atacado permiteuma alíquota um pouco menor para obter a mesma arre-cadação, uma vez que os preços são mais altos que os dofabricante. Torna-se mais fácil com êste impôsto do quecom o de fabricação dar aos produtos importados e expor-tados um tratamento que não os coloque, respectivamen-te, em posição superior à dos produzidos no local ou infe-rior à dos produtos de outros países. Essas vantagens, tam-bém encontradas no impôsto de vendas cobrado no vare-jo, resultam do fato de que o atacado está próximo do va-rejo que é, econômicamente, o nível ideal para a cobrançado impôsto de vendas.

A existência de número muito grande de pequenos ataca-distas, ou de atacadistas que são simultâneamente varejis-tas, desaconselha a cobrança do impôsto de vendas apenasno nível do atacado, não só pela dificuldade de fiscalizar opequeno atacadista, como pela dificuldade ainda maiorde, num mesmo estabelecimento, distinguir, de modo sa-tisfatório, as vendas de atacado das de varejo.

Um dos argumentos invocados contra a tributação no ní-vel da fabricação é o de que o impôsto deve ser cobradoa uma alíquota bastante elevada e que o impacto recaisôbre os fabricantes, que têm, então, de aumentar seu ca-pital de giro.

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o argumento é exato mas não se aplica apenas aos fabri-cantes. Como já foi dito acima, um impôsto de estágiomúltiplo vai onerando a mercadoria gradativamente, demodo que a carga atinge seu total na venda feita pelo va-rejista. Num impôsto de estágio singular, o ônus total re-cai sôbre o produto de uma só vez. Se é o fabricante quepaga o impôsto, e admitida uma repercussão perfeita, opreço é acrescido da parcela do tributo desde a fonte atéo consumidor. Dessa maneira, também o atacadista e ovarejista terão necessidade de aumentar seu capital degiro.

O IMPÔSTO SÔBRE o VALOR ACRESCIDU

o impôsto sôbre O valor acrescido apresenta algumas van-tagens resultantes do fato de ser uma combinação dos sis-temas de estágio múltiplo e do de estágio singular. Asse-melha-se ao de estágio múltiplo por incidir sôbre tôdasas vendas do ciclo da produção e da comercialização, como que o impacto fica distribuído pelo produtor e pelos cu-merciantes.

Identifica-se com o sistema de estágio singular porque aincidência é uma só, pois cada contribuinte desconta, doimpôsto a pagar, o que antes incidiu sôbre as vendas domesmo produto. Dessa maneira, evita-se o incentivo à in-tegração vertical e torna-se possível uma conveniente ade-quação do impôsto ao preço final da mercadoria.

O impôsto sôbre o valor acrescido permite ainda que cadacontribuinte seja fiscalizado através dos outros, em vir-

o .tude do desconto do impôsto antes pago.

Teoricamente, é um tipo bastante simples. Na prática,apresenta dificuldades de não pequena monta, o que ébem demonstrado pelo impôsto de consumo, que é, umimpôsto sôbreo valor acrescido cobrado apenas no cicloda produção industrial.

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De qualquer maneira, o impôsto de vendas do tipo dovalor acrescido é inaplicável no Brasil pela impossibilida-de prática de um estado fiscalizar com eficiência o des-conto relativo ao impôsto pago em outros estados.

UMA TENTATIVA DE REFORMADO IMPÔSTO DE VENDAS EM SÃO PAULO

A exposição feita permite examinar a idéia central do pro-jeto de lei elaborado pela Secretaria da Fazenda do Esta-do de São Paulo.

Essa idéia é a de fazer incidir o impôsto de vendas só-mente sôbre as vendas feitas por industriais, mediante aaplicação de uma alíquota diferencial. As vendas de in-dustriais a industriais pagariam um impôsto de 3% e asde industriais a comerciantes um impôsto de 12%. Asvendas feitas por comerciantes ficariam isentas do impôs-to, bem como as realizadas por produtores agrícolas e pe-cuários. Eis aí, em poucas palavras, a essência do projeto.Por fugirem ao objeto dêste artigo, ficam de lado outrosaspectos do projeto, como o tratamento das mercadoriasenviadas para outros estados ou dêles recebidas.

O projeto de lei adota um tipo misto de impôsto de ven-das, qual seja o de incidência múltipla e diferencial, masrestrita ao ciclo da produção industrial.

O projeto não elimina o incentivo à integração verticaldas indústrias, embora o diminua em relação ao atual, por-que fixa a alíquota das vendas entre industriais em 3%,quando hoje ela é de 4,8%.

O impôsto de estágio múltiplo é discriminatório contra osprodutos cujo ciclo de produção e comercialização é longo.O projeto diminui o impôsto nas vendas de produtos inter-mediários da indústria e elimina o tributo incidente sôbreas vendas feitas por ·produtores agropecuários e por comer-ciantes. Em conseqüência, para manter a mesma arreca-dação, teve que aumentarsubstancialmente a alíquota doimpôsto sôbre as vendas de industriais colocados nó extre-

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mo do ciclo da produção. Daí resulta um impôsto altamen-te discriminatório contra as mercadorias cujo ciclo de pro-dução é curto.Um exemplo poderá esclarecer melhor a afirmativa. O ci-mento, normalmente, passa do produtor ao revendedor edêste ao consumidor, ficando, hoje, sujeito a duas incidên-cias de 4,8% cada uma. No sistema do projeto, o tributoserá pago só uma vez, pelo produtor, mas à alíquotade 12%.

O projeto não elimina, embora amenize, o tratamentomais favorável de que gozam os produtos provenientes depaíses onde não existe impôsto de vendas ou onde há isen-ção para as exportações. Por outro lado, indústrias que re-cebem tôda ou a maior parte da matéria-prima de outrasunidades federativas terão um forte incentivo fiscal parase instalarem fora do território paulista. (6) Se a vendafinal é onerada com um impôsto de 12% e se a matéria--prima provém de estados onde já sofreu incidências à alí-quota uniforme, será interessante para o industrial loca-lizar-se fora de São Paulo, para que sua venda sofra a in-cidência a uma alíquota uniforme. Dessa maneira, seu pro-duto será menos onerado nas vendas que fizer para os es-tados outros que não São Paulo. E nas vendas para êsteestado, seu produto sofrerá um ônus médio de apenas 4%se vender diretamente a consumidores, sendo êsse ônus oimpôsto cobrado pelo estado de origem. Tanto faz que avenda seja direta como feita através de filial, em virtudedo regime instituído pelos Decretos-leis n.? 915, de 1938e n.? 1 061, de 1939.Se o produtor vender a comerciante de São Paulo, a vau-tagem desaparecerá pràticamente, porque, neste caso, ocomerciante ficará sujeito a um impôsto de 7% nos têr-mos do projeto. De qualquer maneira, porém, o industrial

6) Tôdas as considerações desenvolvidas a propósito do comércio interee-tadual baseiam-se em duas hipóteses _ A primeira, real com pouquíssimasexceções, é a de que os estados arrecadam o impôsto de vendas utilizando-sede um sistema de estágio múltiplo, com alíquota uniforme. A segunda é ade que essa alíquota uniforme anda, nos estados, por volta da média de 4,5%.

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de outro estado, ao vender a comerciante não localizadoem São Paulo, terá sofrido uma incidência de apenas 4%em média, e não de 7%, que seria a alíquota aplicávela vendas para fora do estado se o industrial fôsse estabe·lecido em São Paulo.

Por último, ficarão em total desvantagem em relação aosproduzidos noutros estados os produtos fabricados em SãoPaulo e vendidos a comerciantes, para revenda em outrosestados. Como as alíquotas do projeto foram calculadas,para incidindo no ciclo da produção industrial, produzirrendimento igual ao de uma alíquota uniforme em siste-ma de estágio múltiplo, os produtos chegarão ao comer-ciante paulista com um ônus idêntico ao que, em outrosestados, só é atingido na última venda, uma vez que emtodos os estados é vigente o sistema de estágio múltiplo.Em conseqüência, o comerciante paulista venderá merca-dorias tão oneradas quanto as produzidas fora de São Pau-lo e vendidas noutros estados por varejistas.

Se o comerciante paulista vender diretamente a consumi-dores de outros estados, o que será hipótese rara, o ônusdo produto vendido equilibrar-se-á com o que atinge asmercadorias produzidas fora de São Paulo. Mas as mer-cadorias produzidas em São Paulo ficarão em desvanta-gem se o fabricante as vender a comerciante aqui estabe-lecido e se êste as revender a comerciantes de outros esta-dos. E a desvangem será rxaior se o comerciante paulistatransferir a mercadoria para filial situada noutro estado,porque êsse comerciante, ao efetuar a venda, será aindadevedor do impôsto de vendas ao estado onde estiver afilial.

De qualquer modo, o sistema do projeto deverá provocaralterações no tipo de relações comerciais entre São Pauloe os outros estados, com tendência ao aumento de con-tactos diretos entre os industriais paulistas e comercian-tes não localizados em território paulista.

Uma última observação pode ser feita a respeito do pro-jeto. Parece que o fator determinante de sua elaboração

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e conseqüente abandono do sistema de estágio múltiplofoi o volume da sonegação do impôsto de vendas, facili-tado pelo grande número de contribuintes a fiscalizar.

Nesse campo, é preciso não esquecer que quanto maioro número de grandes indústrias, tanto mais amplas serãoas possibilidades de sucesso de um impôsto de vendas in-cidente sôbre o ciclo de produção industrial. O inversotambém é exato, sendo mesmo inviável um impôsto dêssetipo em lugares onde predomine o artesanato ou a indús-tria familiar.

Ora, segundo o Relatório anual do Departamento Regio-nal em São Paulo do SENAI, em junho de 1961, havianeste Estado 56.918 estabelecimentos industriais em fun-cionamento, empregando 1.016.419 trabalhadores. Infor-ma o mesmo Relatório que o número médio de emprega-dos, por estabelecimento, no estado, era de 17,9, assim dis-tribuído: Capital, 19,7; e Interior 15,9. (7)

Como se verifica, apesar do aumento de estabelecimentosindustriais de grande porte, ultimamente ocorrido em SãoPaulo, ainda predomina a pequena ou a média indústria.Essa circunstância não pode deixar de ser objeto de CUl-

dadoso estudo antes da implantação do sistema de impôs-to de vendas de estágio singular, no nível da produção in-dustrial, porque a fiscalização da pequena indústria apre-senta dificuldades talvez até maiores do que a do pequem)comércio.

CONCLUSÕES

A rigor, não existe um tipo ideal do impôsto de vendas queatenda, simultâneamente, ao ótimo econômico e à maisfácil administração do tributo. As circunstâncias aconse-lharão, em cada caso, qual o tipo mais conveniente.

Não é certo que o impôsto do tipo de estágio múltiplo sejao que melhor corresponde às necessidades e possibilida-

7) Segundo notícia do jornal "O Estado de S. Paulo", de 13-3-1962.

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des da economia paulista ou das atividades fiscalizadorasdas autoridades fazendárias dêste estado. Mas a respostaexata a essa dúvida depende de pesquisas e estudos que,por seu turno, só podem ser levados a cabo depois de co-lhidos dados apropriados, cuja inexistência não permite nomomento uma conclusão sôbre a viabilidade e a conveniên-cia da substituição, por outro do sistema em vigor.

O projeto de lei elaborado pela Secretaria da Fazenda doEstado de São Paulo teve o mérito de iniciar discussõessôbre assunto tão importante e até agora não estudado.Mas qualquer sistema nôvo deve ser cuidadosamente exa-minado em todos os seus aspectos e inclusive quanto aosseus reflexos no comércio interestadual.