Inconstitucionalidade Da Medida Cautelar Prevista No Art. 319, VI, Do CPP

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    A (IN)CONSTITUCIONALIDADE DA MEDIDA CAUTELAR PESSOAL DO

    ARTIGO 319, VI, DO CPP EM RELAO AO LIVRE EXERCCIO DA

    ADVOCACIA.

    Mateus Marques1

    Sabrina Zasso2

    "Uma histria muda de sentido a partir do ponto do qual se comea a cont-la."

    Luiz Eduardo Soares

    RESUMO: Reflexo sobre o papel da advocacia na sociedade contempornea, o

    processo administrativo tico disciplinar de competncia da Ordem dos Advogados do

    Brasil e a interferncia do Poder Judicirio na limitao do exerccio profissional com

    a utilizao das medidas cautelares previstas no art. 319, do Cdigo de Processo Penal.

    Anlise horizontal do art. 133, da Constituio Federal de 1988 e o direito ao livre

    exerccio da profisso de advogado.

    Palavras-chave:AdvocaciaMedida CautelarProcesso tico DisciplinarOrdemdos Advogados do BrasilLei n 8.906/1994Cdigo de Processo Penal.

    1- Consideraes iniciais

    Ana Regina Prado3, de profisso advogada, estava ainda dormindo quando foi

    surpreendida pelo som do interfone da portaria de seu condomnio quando o porteiro lheanunciou com a voz um pouco embaraada que havia um agente da Polcia Federal lhe

    aguardando no hall de entrada do prdio e que dizia ter uma ordem judicial para lhe

    entregar. Doutora Ana, como lhe chamava o porteiro, achou muito estranha aquela

    1Advogado Criminalista. Professor de Direito Penal e Processo Penal da Faculdade Meridional IMED.

    Mestrando em Cincias Criminais PUCRS, Especialista em Cincias Penais PUCRS, Especialista em

    Direito Penal Econmico e Empresarial pela Universidad Castilla-La Mancha. Membro do IBCCRIM.2 Professora convidada da Escola Superior do Ministrio Pblico RS, Mestranda em Direito

    UNIRITTER, Especialista em Direito Tributrio UNIRITTER.3Ana Regina Prado nome fictcio.

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    visita, pois ainda estava escuro, s 5 horas, mas colocou uma roupa e foi ao encontro do

    agente da Polcia Federal que em voz alta lhe entregou a autorizao judicial dando-lhe

    cincia que havia uma investigao criminal contra ela e que deveriam dirigir-se ao seu

    escritrio para cumprimendo da ordem judicial de busca e apreenso dos equipamentos

    de informtica e documentos que encontravam em seu estabelecimento profissional.

    Aps a coleta dos equipamentos, foi-lhe cientificada que a mesma ordem judicial que

    autorizava a busca e apreenso dos referidos equipamentos de informtica e documentos

    tambm lhe restringia, de forma cautelar, e de acordo com o artigo 319, VI, do Cdigo

    de Processo Penal, o exercicio da advocacia.

    Essa foi a ltima manh que Ana Regina Prado sentiu orgulho de ser advogada.

    Desse modo que se inicia o presente estudo com principal objetivo de analisar o

    direito ao livre exerccio da profisso de advogado e as medidas cautelares disciplinadas

    no artigo 319 do Cdigo de Processo Penal, em especial a prevista no inciso VI do

    referido artigo, principalmente aps as modificaes introduzidas pela Lei n 12.403/11,

    que alterou a estrutura do CPP no que se refere a prises processuais, liberdade

    provisria e ainda medidas cautelares diversas.

    Em outro momento estudar-se- os aspectos do livre exerccio da advocacia de

    acordo com a Lei n 8.906/94 (Estatuto da OAB), como garantia constitucional, tendo

    em vista que instrumento de sua independncia a partir dos aspectos normativos de

    direito/dever sob o prisma dos direitos fundamentais.

    Por fim, se analisar no mbito do exerccio legal da advocacia, que as medidas

    cautelares, sendo elas disciplinares ou no, devem ser reguladas pelo Estatuto da OAB

    (Lei n 8.906/94), e somente aps, caso houver necessidade, se aplicar

    subsidiariamente os ditames do Cdigo de Processo Penal.

    2-

    Das medidas cautelares diversas priso.

    Aps uma dcada de tramitao no Congresso Nacional, foi aprovado o

    Projeto de Lei n 4.208, de 2001, transformado agora na Lei n 12.403, de 04 de maio

    de 2011, embora com profundas modificaes do anteprojeto originrio.

    A nova legislao trouxe significantes modificaes no que se refere s prises

    e liberdade provisria, sendo inseridas, cuidadosamente, medidas alternativas ao

    crcere, conforme preceitua a redao do artigo 319, do Cdigo de Processo Penal.

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    As medidas cautelares, de acordo com o artigo 282, 2, do CPP, podero ser

    decretadas pelo juiz, de ofcio ou a requerimento das partes ou ainda, quando no curso

    da investigao criminal, por representao da autoridade policial ou mediante

    requerimento do Ministrio Pblico.

    Cabe ressaltar que a medida cautelar diversa somente dever ser utilizada

    quando cabvel a priso preventiva, mas em razo da proporcionalidade, houver outra

    razo menos onerosa que sirva para tutelar aquela situao.

    Diante deste aspecto, pode-se dizer que as medidas cautelares diversas tm

    carter substitutivo, servindo como alternativa priso cautelar, restando esta como

    instrumento de ultima ratioa ser utilizado.

    Assim, assumiu-se a natureza cautelar4 de toda priso antes do trnsito em

    julgado e, com isso, ampliou-se o leque de alternativas para a proteo da regular

    tramitao do processo penal, com a instituio de diversas medidas cautelares

    alternativas priso.

    Concordamos com o entendimento de VICENTE GRECO5, quando sustenta

    que medida cautelar a providncia jurisdicional protetiva de um bem envolvido no

    processo. O processo cautelar a relao jurdica processual, dotada de procedimento

    prprio, que se instaura para a concesso de medidas cautelares. O processo cautelar

    o instrumento natural para a produo e deferimento de medidas cautelares, mas nem

    todas (medidas cautelares) so determinadas ou deferidas em processo cautelar.

    As medidas cautelares alternativas priso tem aplicabilidade aos crimes cuja

    pena mxima seja inferior a 4 anos, sendo que representam significativa restrio da

    liberdade6, no podendo, nesse sentido, ser banalizadas sob pena de se tornar pena

    antecipada, e assim perder completamente seu carter de urgncia.

    Nesse sentido, podem ser empregadas a qualquer tempo, no curso da

    investigao criminal ou do processo, quando houver real necessidade, ou ainda comomedida alternativa priso preventiva j decretada e que revele desproporcional ou

    desnecessria. Pode ser aplicada juntamente com a liberdade provisria, no momento da

    4OLIVEIRA, Eugnio Pacelli de. Curso de Processo Penal. 16. ed. So Paulo: Atlas. 2012. p 488.5GRECO FILHO, Vicente. Notas sobre medidas cautelares e provimento definitivo. In: Justitia,

    125/1984, p. 85.6LOPES JUNIOR, Aury. Direito Processual Penal e sua Conformidade Constitucional. Vol. II. 7 Ed. Rio

    de Janeiro: Lumen Juris. 2011. p. 136.

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    homologao da priso em flagrante pelo juiz, como medida alternativa priso em

    flagrante, ou ainda permitida a cumulao de outras medidas, quando for necessrio.

    A problemtica central do tema em destaque no perigo da banalizao na

    decretao das medidas cautelares diversas priso com a finalidade de aumentar a

    interveno penal de forma injustificada. Pois a finalidade deste sistema servir como

    um redutor de danos, e no uma expanso de controle jurisdicional.

    Por fim, e de acordo com AURY LOPES JUNIOR7, caber ao juiz observar

    o carter situacional e, quando no se fizer mais necessria (e/ou proporcional) a

    medida, substitu-la por outra menos onerosa ou revog-la por inteiro.

    3- Da gravidade na decretao da medida cautelar prevista no artigo 319, VI,

    do CPP.

    A medida cautelar alternativa priso cautelar que suspende o exerccio de

    funo pblica ou de atividade de natureza considerada econmica est prevista no

    artigo 319, VI do CPP8.

    Este procedimento, hoje em dia, tem sido utilizado por magistrados em casos

    de possibilidade de cometimento de atos ilcitos por advogados, mdicos e etc. Ocorre

    que a referida medida quando utilizada pelo Magistrado em desfavor a advogado

    extremamente gravosa, para no se dizer pior que a priso preventiva, e deve ser

    utilizada com suma prudncia, sendo inclusive de discutvel constitucionalidade, pois as

    medidas cautelares no tem a finalidade de tutelar o processo ou seu objeto,

    aproximando-se tal medida a uma (ilegal) antecipao da funo de preveno especial

    da pena.

    Cabe recordar que tal medida alm de ser extremamente gravosa, no h

    consagrao no sistema cautelar brasileiro de um prazo mximo de durao, conduzindoa resultados gravssimos para aquele que se v submetida, neste caso um advogado, por

    prazo indeterminado, a severas restries de direitos fundamentais, ou seja, no

    podendo exercer a advocacia.

    7LOPES JUNIOR, Aury. Op. cit. p. 137.8Artigo 319So medidas cautelares diversas da priso:

    VI suspenso do exerccio de funo pblica ou de atividade de natureza econmica ou financeira

    quando houver justo receio de sua utilizao para a prtica de infraes penais;

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    Para termos ideia do perigo na decretao de medidas cautelares previstas no

    artigo 319 do Cdigo de Processo Penal a advogados, a sano disciplinar de suspenso

    do exerccio profissional (pena de natureza grave) prevista no artigo. 35 do Estatuto da

    Advocacia da OAB est revestida de provisoriedade, tendo data de incio e fim de

    vigncia, somente podendo sofrer prorrogao no perodo de vigncia quando a espcie

    de infrao tica disciplinar assim determinar.

    Com a imposio da medida cautelar prevista no artigo 319, VI do CPP, sem

    informar a periodicidade de tal deciso, a Autoridade Judicial deixa de analisar o carter

    situacional, sendo nesse momento necessria e proporcional sua revogao, ou ainda

    substituio por outra menos onerosa.

    Para finalizar, importante salientar que tal medida representa uma antecipao

    de pena e, principalmente, a morte da atividade laboral do imputado, pois a

    Advocacia considerada atividade meio, no havendo como prever o resultado e

    muito menos ainda o lucro que se possa obter.

    Assim, preocupante a decretao desta medida cautelar, uma vez que

    penaliza de forma antecipada e retira do Advogado o livre exerccio da profisso

    (garantia constitucional) sendo determinada e revestida de provisoriedade, ou ainda,

    caso haja necessidade, outra medida cautelar diversa, que em razo da

    proporcionalidade, no seja a imposio to onerosa e que possa tutelar a situao.

    4- Breves consideraes da origem histrica da profisso de advogado.

    No Brasil, durante o perodo colonial, os primeiros a exercerem a advocacia

    foram bacharis o que tambm era permitido aos rbulas. Com o surgimento da Ordem

    dos Advogados do Brasil, em 1930, h a regulamentao da profisso de advogado,

    obrigatoriamente de formao universitria, salvo em algumas regies do pas em quese fazia necessria a figura do rbula ou provisionado.

    Em 1994, a Lei n 8.906, de 04 de julho, conhecida popularmente como o

    Estatuto da Advocacia, afirma, pela primeira vez na histria do Brasil, a

    indispensabilidade do advogado para a administrao da justia. E, a Constituio

    Federal de 1988 recebe a profisso de advogado e reconhece a grandeza do papel

    poltico, social e jurdico da profisso, registrando sua importncia no art. 133.

    Atualmente, a advocacia desempenha papel fundamental na defesa dacidadania, da garantia dos direitos humanos individuais e coletivos, sendo indispensvel

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    para a recuperao e (re)construo dos valores ticos e morais da sociedade brasileira.

    A palavra advogado tem como origem etimolgica latina advocatus9resultado da unio

    entre ad e vocare (falar por). Ento, esta profisso independente no poder ficar

    exposta s normas inconstitucionais e tampouco discricionariedade do Poder

    Judicirio.

    Por essas razes, necessrio o conhecimento das normas que orientam a

    profisso, principalmente, a competncia dos rgos da Ordem dos Advogados do

    Brasil responsveis pela persecuo disciplinar a fim de facultar uma reflexo sobre a

    (in)constitucionalidade da medida cautelar pessoal do art. 319, VI, do CPP em relao

    ao exerccio da advocacia.

    5- Persecuo tico disciplinar pela Ordem dos Advogados do Brasil.

    A proibio temporria ou definitiva do exerccio profissional dos advogados

    somente pode se determinada pela Ordem dos Advogados do Brasil. Quanto primeira

    modalidade, a suspenso do exerccio profissional em todo o territrio nacional, de

    forma cautelar, somente poder ser efetivada pelo Conselho Seccional da inscrio

    principal do advogado, no sendo competente os demais Conselhos Seccionais para

    condenar um advogado pelo comentimento de infrao tico disciplinar que tenha

    repercutido de forma prejudicial dignidade da advocacia. E, tal exegese se extrai do

    art. 7010, 3 do Estatuto da Advocacia e da OAB. Ainda, tambm compete ao

    9Em Roma, a advocacio, ligada ao verbo advocare, que significa convocar, chamar a si, chamar em

    auxlio, era exercida pelo advocatus. No perodo do sistema das aes, o advocatus atuava em alguns

    casos, apenas, quando houvesse interesse pblico a defender (pro populo); quando a liberdade fosse o

    objeto da defesa (pro libertate) ou nas hipteses de interesse dos tutelados (pro tutela). Deve ser citada,ainda, a presena do advogado em favor de um ausente que tivesse sido furtado ( ex lege Hostilia)

    (Antonio Claudio Mariz de Oliveira, A formao do advogado, in Nalini (coord.), Formao Jurdica,

    1994, p. 18).10Art. 70. O poder de punir disciplinarmente os inscritos na OAB compete exclusivamente ao Conselho

    Seccional em cuja base territorial tenha ocorrido a infrao, salvo se a falta for cometida perante o

    Conselho Federal.

    1 Cabe ao Tribunal de tica e Disciplina, do Conselho Seccional competente, julgar os processos

    disciplinares, instrudos pelas Subsees ou por relatores do prprio Conselho.

    2 A deciso condenatria irrecorrvel deve ser imediatamente comunicada ao Conselho Seccional onde

    o representado tenha inscrio principal, para constar dos respectivos assentamentos.

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    Conselho Seccional da inscrio principal do advogado proibir de forma definitiva o

    exerccio da profisso, medida esta que se far com a manifestao de dois teros dos

    membros do Conselho Seccional e que acarretar o cancelamento de sua inscrio

    principal. E, destaca-se, ser instaurado um processo administrativo tico disciplinar

    para excluso11do advogado observando-se os princpios constitucionais da mais ampla

    defesa e do contraditrio.

    Tais consideraes so oportunas, pois demonstram que o Poder Judicirio,

    nem mesmo em sede de cognio sumria, detm competncia para determinar a

    suspenso, embora temporria, do direito ao exerccio profissional. O Estatuto da

    Advocacia e da OAB taxativo quanto s espcies de sanes disciplinares 12, so elas:

    censura, suspenso, excluso e multa. Inclusive, quando sancionado um advogado

    inscrito com a penalidade de suspenso dever ser determinado o marco inicial do

    cumprimento da sano e seu final, assim como, nas hipteses de prorrogao das

    penalidades somente poder observar quando a espcie de infrao tica disciplinar (art.

    34 e incisos, do EAOAB) assim prever.

    Por tais razes, resta evidente que somente a Ordem dos Advogados do Brasil

    detm competncia para suspender o exerccio profissional no podendo o Poder

    Judicirio utilizar-se da medida cautelar prevista no art. 319, VI, do Cdigo de Processo

    Penal.

    3 O Tribunal de tica e Disciplina do Conselho onde o acusado tenha inscrio principal pode

    suspend-lo preventivamente, em caso de repercusso prejudicial dignidade da advocacia, depois de

    ouvi-lo em sesso especial para a qual deve ser notificado a comparecer, salvo se no atender

    notificao. Neste caso, o processo disciplinar deve ser concludo no prazo mximo de noventa dias.11Art. 38. A excluso aplicvel nos casos de:

    Iaplicao, por trs vezes, de suspenso;IIinfraes definidas nos incisos XXVI a XXVIII do art. 34.

    Pargrafo nico. Para a aplicao da sano disciplinar de excluso necessria a manifestao favorvel

    de dois teros dos membros do Conselho Seccional competente.12Art. 35. As sanes disciplinares consistem em:

    Icensura;

    IIsuspenso;

    IIIexcluso;

    IVmulta.

    Pargrafo nico. As sanes devem constar dos assentamentos do inscrito, aps o trnsito em julgado da

    deciso, no podendo ser objeto da publicidade a de censura.

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    O Poder Judicirio com a utilizao equivocada da medida poder antecipar a

    pena e, principalmente, a morte do exerccio profissional do advogado.

    6- A advocacia independente e indispensvel justia.

    A independncia da profisso de advogado e da advocacia encontra amparo no

    principio constitucional, pois o artigo 133que dispe ser o "advogado indispensvel

    administr ao da justia".

    Alm deste princpio fundamental, o artigo 5, inciso XIII da Constituio da

    Repblica Federativa do Brasil de 05 de outubro de 1988CRFB/88, textualmente diz:

    Todos so iguais perante a lei, sem discrio de qualquer natureza, garantindo-se aos

    brasileiros e aos estrangeiros residentes no Pas a inviolabilidade do direito vida,

    liberdade, igualdade, segurana e propriedade, nos termos seguintes: (...) XIII

    livre o exerccio de qualquer trabalho, ofcio ou profisso, atendidas as qualificaes

    profissionais que a lei estabelecer;

    Como se depreende destes textos legais, indispensabilidade e a liberdade esto

    diretamente ligados ao exerccio profissional em razo da Lei n. 8.906, de 04 de julho

    de 1994, o denominado Estatuto da Advocacia e da Ordem dos Advogados do Brasil

    EAOAB, ou seja, a Lei Especial citada no texto constitucional.

    Assim, cabe salientar que o artigo 133 da CRFB/88 refere que os advogados

    tm, sob a gide deste artigo, uma aparncia de servidor da justia. O Estado, por

    outro lado, em atendimento do preceito constitucional ora comentado, conferiu Ordem

    dos Advogados do Brasil, a sua fiscalizao. Por isso, o advogado, em sua atividade

    cotidiana, ou seja, no regular exerccio da advocacia, tem a seu favor, no s os seus

    direitos e prerrogativas, mas tambm os deveres, para que o seu livre ser profissional

    seja preservado.O artigo 2 da Lei 8.906/94 repete em parte o artigo 133 da CRFB/88. Os

    pargrafos 1 e 2 deste artigo refere-se que esta atividade tem carter pblico, exerce

    uma funo social e seus servios so tidos como mnus pblico. Por sua vez, o

    pargrafo 3 estabelece a inviolabilidade profissional, garantindo-lhe segurana

    necessria na defesa da sociedade.

    O Estatuto da Advocacia da OAB deixa claro em seu artigo 7 quais so os

    direitos, trazendo a LIBERDADE PROFISSIONAL no inciso primeiro, seno

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    vejamos:So direitos do advogado: I exercer , com l iberdade, a prof isso em todo

    territrio nacional;

    J o artigo 3113do EAOB, determina que o advogado no s tem a seu favor os

    direitos de sua atividade profissional, mas, de modo taxativo e enumerativo, na

    aplicao dos preceitos de ordem tica, deve pautar suas atividades nos limites

    apontados em lei.

    No tocante liberdade pessoal do profissional advogado que age segundo a sua

    prpria determinao, no mbito de uma sociedade organizada, mas que, sem outra

    escolha, est limitado por normas de aes e condutas definidas pelos contornos da tica

    profissional. Essas normas, expressamente estipuladas por textos legais mencionados,

    so na verdade, as balizas imutveis da atividade profissional e que, a primeira vista,

    tolhem a faculdade do livre agire ou do decidir.

    7- A Lei 8.906/94 e a aplicao subsidiria do Cdigo de Processo Penal.

    Disciplina o artigo 68 da Lei 8.906/94 que: Salvo disposio em contrrio,

    aplicam-se subsidiariamente ao processo disciplinar as regras da legislao

    processual penal comum e, aos demais processos, as regras gerais do procedimento

    administrativo comum e da legislao processual civil, nessa ordem.

    Assim, primeiramente necessrio que as medidas referentes aos

    procedimentos cautelares disciplinares (no caso a suspenso) sejam regulados pelo

    Estatuto da Advocacia, e somente aps, caso seja necessrio, se aplica, subsidiariamente

    os ditames do Cdigo de Processo Penal. Inverter esse procedimento afronta Lei

    Federal que regulamenta a atividade do advogado, alm dos princpios constitucionais

    da ampla defesa, contraditrio, proporcionalidade e necessidade.

    Portanto, necessrio demonstrar que a utilizao forada da medida cautelar parafazer cessar a atividade profissional ao exerccio da advocacia com fora no artigo 319,

    VI, do CPP desproporcional, despida de legitimidade, tendo em vista a

    regulamentao da Lei 8.906/94.

    13Art. 31. O advogado deve proceder de forma que o torne merecedor de respeito e que contribua para o

    prestgio da classe e da advocacia.

    1. O advogado, no exerccio da profisso, deve manter independncia em qualquer circunstncia.

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    Cabe salientar que a Lei Federal quando estabelece a competncia do Tribunal

    de tica e Disciplina e exige a convocao de uma sesso especial, mostra a

    preocupao do legislador com a repercusso da medida eventualmente imposta e do

    seu carter imediatista, ante a ausncia de um efeito suspensivo a eventual recurso

    interposto.

    Para finalizar, e de acordo com os ensinamentos de AURY LOPES JUNIOR14,

    a provisoriedadeest relacionada ao fator tempo, de modo que toda medida cautelar

    deve(ria) ser temporria, de breve durao. Manifesta-se assim, na curta durao que

    deve ter a medida cautelar, at porque apenas tutela de uma situao ftica

    (provisionalidade) e no pode assumir contornos de pena antecipada.

    8- Consideraes Finais.

    Assim, conclui-se o presente artigo com a certeza de que a Constituio Federal

    afirma a indispensabilidade da advocacia para a concreo da justia. incabvel, sob

    pena de desrespeitar o preceito constitucional do Estatuto da Advocacia, que nenhum

    poder, nem o Judicirio, poder retirar da Ordem dos Advogados do Brasil sua

    independncia e autonomia para fiscalizar, processar e punir seus inscritos, pois a norma

    infra constitucional em debate reveste-se de caractersticas inconstitucionais que ferem

    dignidade da pessoa humana quando restringem o direito livre ao exerccio da nobre

    profisso de advogado, como o caso das medidas cautelares alternativas priso

    previstas no artigo 319, VI do Cdigo de Processo Penal.

    Ademais, constata-se que a cultura de urgncia disseminada na sociedade de

    risco afeta o tempo do direito15, bem como enfraquece as garantias fundamentais de

    liberdade e dignidade da pessoa humana, privilegiando, de certa forma o poder judicial,

    em detrimento ao saber judicial.

    9- Referncias Bibliogrficas

    14LOPES JNIOR, Aury. Op cit. p. 100.15Segundo OST, as foras instituintes (tempo) se moldaro s formas institudas (direito), que, com o

    desenvolvimento social (com passar do tempo), pediro para serem substitudas por novos modelos

    instituintes. Esse ritmo nos conduz temperana que a sabedoria do tempo, a justa medida da

    continuidade e da mudana que assegura o equilbrio das relaes sociais. In: OST, Francois. O Tempo doDireito. 1. ed. So Paulo: EDUSC. 2005. p. 377.

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    RAMOS, Gisela Gondin. Estatuto da Advocacia Comentrios e Jurisprudncia

    Comentada. 4 ed. Florianpolis: OAB/SC Editora, 2003.

    http://www.justitia.com.br/revistas/4a9b0a.pdfhttp://www.justitia.com.br/revistas/4a9b0a.pdfhttp://www.justitia.com.br/revistas/4a9b0a.pdfhttp://www.justitia.com.br/revistas/4a9b0a.pdf