Independência do Brasil

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N ossa história começa na Europa de 1806, quando o continente estava mer gulhado nas guerras napoleônicas. Napoleão havia organizado um sistema eficiente de países aliados - Reinos italianos, ducado de Varsóvia, Confederação do Reno, além de Áustria, Prússia e Rússia, submetidas em níveis diferentes. Entretanto, apesar da vantagem Napo- leão, não conseguia a conquista da Inglaterra. Invadir o território inglês se mostrava impossível, pois na frente existia a fantástica marinha britâni- ca. Diante desse impasse, Napoleão vivia uma situação atípica: tinha a Europa continental sob controle, mas não conseguia a derrota da Inglaterra. Buscando uma saída estratégica, o imperador francês decretou em 1806 o Blo- queio Continental, proibindo o co- mércio com a Inglaterra. Com essa medida, Napoleão procurava su- focar a economia inglesa e dar o cheque-mate no grande rival. O Bloqueio colocaria Por- tugal no centro dos acontecimen- tos. Ao mesmo tempo em que Napoleão assinava o Bloqueio Continental, o embaixador da França em Lis- boa, entregava um documento a D. João VI comuni- cando as ordens francesas. A notícia agitou a “vidinha tranqüila” dos portugueses, pois o país realizava in- tenso comércio com a Inglaterra. Aliás, esse contato, ou melhor dizendo, essa dependência dos portugueses em relação a economia inglesa começou em 1702, após o tratado de Methuen, quando Portugal se reduziu a mero apêndice da economia inglesa. Napoleão sabia da presença de mercadores in- gleses nas cidades portuguesas, sobretudo Lisboa, por isso deu “a facada” em Portugal em tom imperativo, não admitindo contestação. Em resposta, D. João VI alegou aceitar os termos do Bloqueio, mas por debaixo do pano tramava a fuga, para dar um nó em Napoleão. Em 1807, o ministro francês Talleyrand foi a Lisboa, transmitindo a imposição final do imperador: fechamento dos portos portugueses aos navios ingleses e confisco dos bens e propriedades dos ingleses resi- dentes em Portugal. Acuado, o rei de Portugal aparen- tou seguir as ordens de Napoleão, mas ao mesmo tem- po, negociava em segredo com os diplomatas ingleses, a concessão de todo o comércio da ilha da Madeira e a vinda para o Brasil. “A emancipação política realizada pelas categorias dominantes interessadas em assegurar a preservação da ordem estabelecida, cujo único objetivo era romper o sistema colonial no que ele significava de restrição à liberdade de comércio e à autonomia administrativa, não ultrapassaria seus próprios limites. A ordem econômica seria preservada, a escravidão mantida. A nação independente continuaria subordinada à enconomia colonial, passando do domínio português à tutela britânica. A fachada liberal construída pela elite europeizada ocultava a miséria e a escravidão da maioria dos habitantes do país. Conquistar a emancipação definitiva da nação, ampliar o significado dos princípios constitucionais seria tarefa relegada aos pósteros”. Emília V da Costa Autoria: Edgard Chaves

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Texto sobre a Independência do Brasil que explica o processo de fuga da Corte Portuguesa para o Brasil e as mudanças processadas culminando com a independência.

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Page 1: Independência do Brasil

Nossa história começa na Europa de1806, quando o continente estava mergulhado nas guerras napoleônicas.

Napoleão havia organizado um sistema eficiente depaíses aliados - Reinos italianos, ducado de Varsóvia,Confederação do Reno, além de Áustria, Prússia eRússia, submetidas em níveis diferentes. Entretanto,apesar da vantagem Napo-leão, não conseguia aconquista da Inglaterra.Invadir o território inglêsse mostrava impossível,pois na frente existia afantástica marinha britâni-ca.

Diante desse impasse,Napoleão vivia uma situaçãoatípica: tinha a Europa continentalsob controle, mas não conseguiaa derrota da Inglaterra. Buscandouma saída estratégica, o imperadorfrancês decretou em 1806 o Blo-queio Continental, proibindo o co-mércio com a Inglaterra. Com essamedida, Napoleão procurava su-focar a economia inglesa e dar ocheque-mate no grande rival.

O Bloqueio colocaria Por-tugal no centro dos acontecimen-tos. Ao mesmo tempo em que Napoleão assinava oBloqueio Continental, o embaixador da França em Lis-boa, entregava um documento a D. João VI comuni-cando as ordens francesas. A notícia agitou a “vidinhatranqüila” dos portugueses, pois o país realizava in-tenso comércio com a Inglaterra. Aliás, esse contato,ou melhor dizendo, essa dependência dos portuguesesem relação a economia inglesa começou em 1702, apóso tratado de Methuen, quando Portugal se reduziu amero apêndice da economia inglesa.

Napoleão sabia da presença de mercadores in-gleses nas cidades portuguesas, sobretudo Lisboa, porisso deu “a facada” em Portugal em tom imperativo,não admitindo contestação. Em resposta, D. João VIalegou aceitar os termos do Bloqueio, mas por debaixodo pano tramava a fuga, para dar um nó em Napoleão.

Em 1807, o ministro francês Talleyrand foi aLisboa, transmitindo a imposição final do imperador:fechamento dos portos portugueses aos navios inglesese confisco dos bens e propriedades dos ingleses resi-dentes em Portugal. Acuado, o rei de Portugal aparen-tou seguir as ordens de Napoleão, mas ao mesmo tem-po, negociava em segredo com os diplomatas ingleses,a concessão de todo o comércio da ilha da Madeira e avinda para o Brasil.

“A emancipação política realizada pelas categorias dominantesinteressadas em assegurar a preservação da ordem estabelecida,cujo único objetivo era romper o sistema colonial no que elesignificava de restrição à liberdade de comércio e à autonomiaadministrativa, não ultrapassaria seus próprios limites. A ordemeconômica seria preservada, a escravidão mantida. A naçãoindependente continuaria subordinada à enconomia colonial,passando do domínio português à tutela britânica. A fachada liberalconstruída pela elite europeizada ocultava a miséria e a escravidãoda maioria dos habitantes do país. Conquistar a emancipação definitiva da nação, ampliar o significado dos princípiosconstitucionais seria tarefa relegada aos pósteros”.

Emília V da Costa

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A FUGA DA FAMÍLIA REAL PARA OA FUGA DA FAMÍLIA REAL PARA OA FUGA DA FAMÍLIA REAL PARA OA FUGA DA FAMÍLIA REAL PARA OA FUGA DA FAMÍLIA REAL PARA OBRASILBRASILBRASILBRASILBRASIL

Aceitar o confisco de bens dos cidadãosingleses tinha sido puro jogo de cena, pois a deci-são não saiu do papel. Ao fim de 1807, o rei D.João VI procurava ainda ganhar tempo “co-zinhando” o imperador. O problema é queNapoleão começava a ficar irritado, e parapiorar, até a Inglaterra cobrava do monarcaportuguês, uma atitude mais coerente.

O embaixador inglês em Lisboa, LordStrangford, deu outro ultimato ao rei: a corteportuguesa não aceitando o bloqueio deve-ria se transferir imediatamente para o Brasil. Aopção de vir para a colônia não era de todoruim. Concretamente Portugal havia arruinadosua economia, dependendo em excesso dos pro-dutos comercializados na colônia. Na prática, a colôniahavia se tornado mais importante e produtiva do que ametrópole. Por isso, quando Napoleão ameaçou invadir,já tinha gente fazendo a bagagem.

Em 1808 Napoleão determinou a invasão. En-quanto a população atônita, assistia à chegada das tro-pas francesas, os nobres numa atitude de desespero,lotavam os navios ancorados à espera da corte portu-guesa. A cena poderia ser tema de qualquer comédia.No cais abarrotavam-se centenas de pessoas, nobresnão muito educados, proporcionavam um vexame queprovocava gargalhadas.

Conta-se que a rainha mãe (a biruta D. Maria I!)na hora da fuga resolveu ficar e paracoloca-la no navio foi preciso encenarum cortejo imperial com trombetas,como se o embarque fosse absolutamen-te normal. Na hora que os navios saí-ram de Lisboa, muitos nobres ainda che-gavam para embarcar e alguns, no de-sespero, pateticamente se jogavam nomar.

Como afirma Nélson WerneckSodré “Quase de súbito, e no maioratropelo, tomaram-se as providênciaspara o embarque da Coroa, quando asnotícias da aproximação das tropas deJunot traziam alarma para toda popu-lação. Foi um salve-se quem puder trá-gico, amargo, característico do nível dedegradação a que chegara o reino de

Portugal sob o governo bragantino e de uma classefeudal inepta e corrupta”. 1 O espetáculo tragicômi-co continuaria no Brasil, pois a chegada da Coroafoi motivo para uma série de festas e comemorações.Muitas pessoas acreditavam na idéia que o rei nuncamais sairia do Brasil. No tumulto não deu para per-ceber que muitos nobres desembarcavam com a ca-beça lotada de piolhos!!!

MUDANÇAS NO COMPORTAMENTOMUDANÇAS NO COMPORTAMENTOMUDANÇAS NO COMPORTAMENTOMUDANÇAS NO COMPORTAMENTOMUDANÇAS NO COMPORTAMENTO

“Com a chegada da Coroa, o apuro notrajar tornou-se uma questão de orgulho. O gran-de número de modistas, chapeleiros e sapateirosexistentes no Rio de Janeiro, após 1808, indi-cam tal preocupação. Na rua dos Alfaiates, osescravos não largavam as agulhas um só instan-te, e eram vistos nas calçadas, à soleira das por-tas, trabalhando incessantemente. Poucos seadaptavam aos modelos europeus. Pelo contrá-rio, tecidos pesados e botinas eram considera-dos elegantes. Não é de estranhar que, no interi-or de suas residências, as pessoas desejassem des-pojar-se de todos esses incômodos adereços.”

Em princípio oestilobonachão deD. Joãoconquistou asimpatia dopovo, que logose irritou comsuashesitações

Foi um salve-se quem puder trá-gico, amargo, característico donível de degradação a que chega-ra o reino de Portugal sob o

governo bragantino e de umaclasse feudal inepta e corrupta”

Em dez anos apopulação doRio de Janeirosaltou de 50 milpara mais de 100mil habitantes

Não corram tanto!Pensarão que estamos

fugindo.”D. Maria I , a Louca.

Autoria: Edgard Chaves

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Quanto à vida fora do ambiente doméstico, tor-nou-se ainda mais atraente após 1808. as procissõesreligiosas, um dos divertimentos mais típicos da épo-ca, ganharam mais alegria e movimento. Nas Memó-rias de um Sargento de Milícias, Manuel An-tônio de Almeida reporta-nos ao movimen-to da cidade, seguindo as peripécias deLeonardo, o atrapalhado herói do ro-mance. Mas se por um lado o ambienteera mais festivo e tumultuado, por outro,situações geralmente simples tornavam-se difíceis, devido ao crescimento da cida-de.

A falta de pessoas especializadas em determi-nadas funções e o embaraço causado pela burocra-cia eram um constante atropelo no dia a dia de seushabitantes. um simples pacote a ser transportado re-queria um escravo de ganho. Jamais um homem queusufruísse certa posição poderia carregar embrulhos,nem mesmo uma caixa de ferramentas. Encontrar ummarceneiro ou chaveiro, em determinadas horas po-deria ser um verdadeiro transtorno. A vida culturalna colônia era pouco enfatizada. Os conhecimentosgeográficos e literários, bastante reduzidos, costu-mavam dar origem a várias anedotas a respeito daignorância dos habitantes do Brasil. Os espetáculosteatrais, por sua vez, despertavam as piores críticaspor parte dos estrangeiros.2

ABERTURA DOS PORTOSABERTURA DOS PORTOSABERTURA DOS PORTOSABERTURA DOS PORTOSABERTURA DOS PORTOS

Muito mais complicado do que o penteado dasmadames, era resolver o problema do abastecimentode mercadorias visando o consumo da Corte.

Com o rei e sua imensa comitiva, veio uma multi-dão ociosa acostumada ao luxo. De imediato, optou-se

pela solução paliativa da Abertura dos Portosàs Nações Amigas. A medida em cará-

ter provisório, mais tarde, se torna-ria irreversível. A introdução das re-lações de livre-comércio estava, naprática, assinando a sentença demorte do Pacto Colonial.

“Conde da Ponte, do meuConselho, Governador e Capitão Ge-

ral da Capitania da Bahia. Amigo, Euo Príncipe Regente vos envio muito saudar, como

aquele que amo. Atendendo à representação, quefizestes subir a minha real presença sobre se acharinterrompido e suspenso o comércio desta Capitania,com grave prejuízo dos meus vassalos e da minha RealFazenda, em razão das críticas, e públicas circuns-tâncias da Europa; e querendo dar sobre este impor-tante objeto alguma providência pronta e capaz demelhorar os progressos de tais danos, sou servido a

ordenar interinamente e provisoriamente, en-quanto não consolido um sistema geral que ado-te semelhantes matérias, o seguinte: Primo, quesejam admissíveis nas Alfândegas do Brasil to-dos e quaisquer gêneros fazendas e mercadori-as transportadas, ou em navios estrangeiros dasPotências, que se conservam em paz e harmoniacom a minha leal Coroa, ou em navios dos meusvassalos, pagando por entrada 24 %; Que nãosó os meus vassalos mas também os sobreditosestrangeiros possam exportar para os portos,que bem lhes parecer o benefício do comércio eda agricultura, que tanto desejo promover, to-dos e quaisquer gêneros e produções coloniaisà exceção do pau-brasil, ou outros notoriamen-te estancados...O que tudo assim deveis execu-tar com zelo e atividade que de vós espero. Es-crita na Bahia em 28 de janeiro de 1808. Prín-cipe para o Conde da Ponte”. 3

A decisão de liberar os portos acarretouprofundas mudanças na colônia. Representou aprimeira oportunidade da prática do livre-comér-cio.

livre-comércio

Navios deoutras naçõestornaram-sefreqüentes noporto deSalvador, naBahia.

Autoria: Edgard Chaves

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MANUFATURAS E A INGLATERRAMANUFATURAS E A INGLATERRAMANUFATURAS E A INGLATERRAMANUFATURAS E A INGLATERRAMANUFATURAS E A INGLATERRA

A seqüência dos fatos confirma essas idéias.Em abril de 1808, D. João VI revogou o

nefasto Alvará de Proibição de Manu-faturas, decretado por D. Maria I, em

1785. No mesmo espírito dos decretosanteriores, o rei buscava o melhor paraa Corte ao incentivar a produção demanufaturas na colônia. Muito bom,tudo ótimo! Só que, ironicamente, essedecreto teve alcance limitado, pois acolônia mal saiu da estaca zero.

Não é difícil identificar as razões dofracasso. Em primeiro lugar, não havia burguesia colo-nial. Aqui existia uma elite atrasada e preconceituosa,em relação a tudo que se relacionasse a trabalho manu-al. Os comerciantes eram normalmente desprezados pe-los latifundiários, que se julgavam os “donos do país”.O mercado interno era outra piada, pois metade da po-pulação era constituída de escravos,que obviamente não consumiam. Oresto da população estava longe derepresentar um bom mercado con-sumidor, devido ao baixo poder aqui-sitivo. O pior é que nem a indepen-dência tiraria o país dessa condição.

Além de tudo isso, D. JoãoVI assinou com a Inglaterra oTratado de Aliança, Comércio eAmizade, em 1810. O acordo garan-tia aos cidadãos ingleses o direitode extra-territorialidade, possibilitan-do o julgamento na Inglaterra, emcaso de delitos cometidos no Brasil.Para as mercadorias inglesas, redu-zia a taxa de alfândega de 24%, para 15%.

O favorecimento aos produtos ingleses ficamais evidente, quando se observa que os produtos dePortugal pagavam o taxa de 16% e as outras nações24%. Na pratica, o Brasil se desligava da tutela de Por-tugal, para se submeter à Inglaterra. A importação ma-ciça de mercadorias provocou uma orgia de consumona colônia. Além do que era necessário, importava-seesqui, patins de gelo, casacos de lã e mercadorias ade-quadas a lugares de clima frio.

A ESTRUTURA ADMINISTRATIVAA ESTRUTURA ADMINISTRATIVAA ESTRUTURA ADMINISTRATIVAA ESTRUTURA ADMINISTRATIVAA ESTRUTURA ADMINISTRATIVA

A falta de condições para governar a colônia,levou D. João VI a criar uma estrutura administrativavisando garantir a permanência da Corte. Foramcriadas: Biblioteca Nacional, Casa da Moeda, Alfân-dega Real, Academia de Belas Artes e Banco do Brasil.Os recursos foram obtidos com extorsivos impostos.A historiografia tradicional bajulou as “grandes obrasdo rei,” exaltando o seu ímpeto realizador e seu sinceroamor pelas terras brasileiras!

Analisando-se de forma mais isenta, observa-se que nada disso teria acontecido, não fosse a pre-sença compulsória da Corte nessas terras tropicais.

O decreto tinha por objetivo, garantir à Coroa produtos que tão cedo não seriam produzidos nacolônia, principalmente os artigos de luxo. Na colônia, a produção têxtil se restringia a roupas gros-seiras para escravos. Além disso ficava claro, que “nações amigas” era uma clara referência a Ingla-terra, naquela altura, o único país que Portugal poderia contar. No que se refere à situação colonial,o livre comércio era um caminho sem volta , pois os comerciantes e a elite, não aceitariam abrir mãodessa privilegiada situação.

“O certo é que se os marcos cronológicos com que os historiadores assinalam a evoluçãopolítica e econômica dos povos se não se estribassem unicamente nos caracteres externos e formais,mas refletissem a sua significação íntima, a independência seria antedatada de quatorze anos, e secontaria justamente da transferência da Coroa em 1808. Estabelecendo no Brasil, a sede da monar-quia, o regente aboliu de fato o regime de colônia em que o país até então vivera. Todos os caracteresde tal regime desaparecem restando apenas a circunstância de continuar à sua frente um governoestranho. São abolidas uma atrás da outra, as velhas engrenagens da administração colonial, e subs-tituídas já por outras de uma nação soberana. Naquele mesmo ano de 1808 são adotadas mais oumenos todas as medidas que mesmo um governo propriamente nacional, não poderia ultrapassar”. 4

O aumentoincessante docusto de vidatornava asmercadoriasacessíveisapenas aos ricos

Autoria: Edgard Chaves

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Entretanto, de uma forma ou de outra, a estru-tura administrativa nos deu um salto de autonomia emrelação à metrópole. “Os que saudaram a fundaçãodo Banco do Brasil em 1808 logo ficaram decepcio-nados com sua atuação: ao invés de auxiliar o co-mércio e a indústria, servia ao erário real cuja despe-sa era em dois terços destinado ao custeio da CasaReal, exército, tribunal, pensões e soldos. A

imprevidência da corte joanina era proverbial: a po-pular imagem ridícula de um D. João comendocoxinhas de galinha sem parar, era justificada pelofato de que, nos dias normais, em que não houvesseas caríssimas festas cortesãs, abatiam-se no palácio620 aves para duas refeições apenas.” 5

A COLÔNIA E O REINO UNIDO!A COLÔNIA E O REINO UNIDO!A COLÔNIA E O REINO UNIDO!A COLÔNIA E O REINO UNIDO!A COLÔNIA E O REINO UNIDO!

Com a derrota de Napoleão foi convocado oCongresso de Viena, que promoveu a reorganizaçãodo mapa europeu. Todas as nações envolvidas no con-flito, participariam do encontro na condição dos mo-narcas reassumirem o trono real. Visando participardo Congresso de Viena, D. João elevou o Brasil à con-dição de Reino Unido. A idéia foi defendida pelo mi-nistro Talleyrand, da França alegando a conveniênciadeexistir uma monarquia legítima para neutralizar as“aventuras republicanas” na América. Para D. João amudança “engordava” o território português unindo-o ao Brasil.

A transformação em Reino Unido incentivou apermanência da Coroa no Brasil. O lógico seria o retor-no a Portugal, uma vez que acabava o impedimentonapoleônico. Nas terras lusitanas o quadro eradesesperador, como afirma Antônio Mendes:“a ocu-pação dos franceses e a guerra que se seguiu pela suaexpulsão (1808-1810 ), com a ajuda das tropas ingle-sas deixaram o país arruinado: os campos abandona-

dos, a produção de vinho e azeite, princi-pais gêneros do país, desorganizada; aindústria estagnada; o comércio maríti-mo e os portos paralisados, no início de-vido a ocupação estrangeira depois du-ramente atingidos pelos efeitos das histó-ricas medidas do príncipe regente no Bra-sil (abertura dos portos e tratado decomércio com a Inglaterra. Tão grave eraa situação do reino que um historiadorao referir-se ao período afirmou que o paísparecia “mais um cadáver que uma na-ção viva”. 6

A cruel realidade portuguesa piora-va ainda mais com a persistência do rei em

permanecer no Brasil. Em nome da Inglaterra, o LordBeresford assumiu o governo em Portugal, no cargo detutor da Coroa. Aliás, essa situação já era esperada, emfunção do abandono a que fora relegado o governoportuguês. Os ingleses preencheram um vácuo políti-co, comprovando pela milésima vez a dependência totalde Portugal. Sem alternativa momentânea, coube aosportugueses a espera do momento adequado de reagir,o que terminou acontecendo em 1820.

O Tempo da História

1806

BLOQUEIOCONTINENTAL

1808

FUGA DA FAMÍLIA

REAL1810

TRATADO DEALIANÇA

COMÉRCIO EAMIZADE

1815

FORMAÇÃODO

REINOUNIDO

1820

REVOLUÇÃODO

PORTO

1822

INDEPENDÊNCIA

A imprevidência da corte joaninaera proverbial: a popular imagem ridícu-

la de um D. João comendo coxinhas degalinha sem parar, era justificada pelo

fato de que, nos dias normais, em que nãohouvesse as caríssimas festas cortesãs,

abatiam-se no palácio 620 aves para duasrefeições apenas.

Lisboa em 1815,na mesma épocaque o Brasil foielevado acondição deReino Unido.

Autoria: Edgard ChavesAutoria: Edgard Chaves

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A inusitada presença do rei e sua Coroa no Bra-sil, terminaram causando descontentamento em Portu-gal. Em 1820, o país se encontrava no perigo, de setransformar em colônia. A economia arrasada prejudi-c a v a burguesia e comerciantes, que não acei-

tavam a teimosia do rei e sua per-manência no Brasil. Contra essalouca situação se rebelou um gru-po de militares, que se reuniaem lojas maçônicas. Em 1820,num contexto político

favorável, com várias revoltas li-berais em todo o continente,

eclodiu a Revolução do Porto.No Brasil, intelectuais e figuras importantes da

Coroa alertaram o rei, diante da situação complicada emPortugal. A burguesia portuguesa nãoaceitava a Abertura dos Portos e oTratado de Aliança com a Inglaterra. An-teriormente, a burguesia lusitana lucra-va com o comércio de mercadorias coma colônia. A prática do livre-comérciona colônia prejudicava a precáriaburguesia de Portugal, tirando “agalinha dos ovos de ouro”. Reagir àsmedidas de D..João VI era uma questãode sobrevivência para a burguesia por-tuguesa.

Em agosto de 1820 na cidade doPorto, os integrantes da sociedade se-creta — Sinédrio — leram em praçapública, o documento que expressava os objetivos domovimento. A participação de militares atraiu o apoiodo exército ao movimento. O objetivo inicial era criarum governo provisório, convocar as cortes, elaboraruma constituição e realizar a reforma no país.

O difícil foi conseguir unidade, pois a composi-ção heterogênea dos rebeldes provocava a discórdia

quanto aos rumos da revolta. A Revoluçãodo Porto, como ficou conhecida, se alastroupor outras cidades, incluindo Lisboa. Emagosto de 1820, proclamaram a Junta Provi-sória do Governo do Reino e a Junta Prepara-tória das Cortes. Após o início do movimen-to, propagou-se pelas ruas a adesão das ca-madas populares. De imediato, convocarameleições para as Cortes lusitanas. Em janeirode 1821, começou a atividade parlamentar. NoBrasil a revolta foi encarada de forma positi-

va, pois a colônia teria direito a representação no Par-lamento lusitano.

No Rio de Janeiro, o povo foi às ruas exigindoque o rei aceitasse a Constituição, aprovada em Portu-gal. Como bom malandro, o rei ganhava tempo procu-rando encontrar a melhor saída (para ele lógico). Onovo contexto político criou a brecha para a que seformassem três partidos nas principais cidades brasi-leiras.

O partido português, identificado com os inte-resses dos comerciantes de Portugal. Descontentescom liberalismo de D. João VI, queriam a volta dosantigos privilégios. O partido brasileiro que reunia aelite rural do sudeste identificada, desde o início, coma presença da Corte no Brasil. O partido contava como apoio de intelectuais e comerciantes que aumenta-

ram os negócios após a vinda da Corte. O ideal deindependência era estranho ao partido que defendiaapenas a manutenção da Abertura dos Portos.

E os liberais radicais que formavam um gruporazoavelmente coeso de profissionais liberais, in-telectuais, padres etc. Tinham como ob-jetivo a defesa da independência,como solução para os problemas queafligiam a colônia. No confuso cal-deirão político colonial, sobressai-am os liberais radicais pelo idealde emancipação política.

Pregavam o regime republi-cano e o incentivo à pro-dução manufatureira.Um dos líderes – obaiano Cipriano Barata,se destacou por suasidéias revolucionárias.

A Revolução doPorto

No palácio, apedido de D.João VI, o padreJosé Maurícioexecutavaclássicos nosrecitaispromovidos pelaCorte.

Cipriano Barata

D. Maria I, aLouca

A prosperidade do Riode Janeiro dependia dos

impostos que pesavam cadavez mais sobre as outras

regiões do Brasil

Autoria: Edgard Chaves

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Contudo, a situaçãosocial da colônia serviu defreio aos liberais radicais, im-pedindo a propagação doideal republicano. No Brasila prática política era exclusi-va das elites que se conten-tavam com as migalhas de D.João. O partido brasileiro jus-tificava o nome, apenas pelofato de estar no Brasil. Maistarde, exitaria até o último ins-tante em lutar pela indepen-dência. Enquanto existisse a Abertura dos Portos nãomoveriam uma palha para alterar a situação.

Quietinho no seu canto, o esperto D. João VI

adiava a decisão em relação à Revolução do Porto. Opovo ingenuamente aplaudia o monarca acreditandoque ele defenderia o Brasil. Em Portugal, os rebeldesresolveram dar o cheque-mate no rei.

Criaram um Parlamento com feição liberal, masagiam de forma recolonizadora em relação ao Brasil,exigindo o imediato retorno do rei a Portugal. A voltado monarca era apenas parte do plano de anulação

dos atos assinados após 1808, dentre eles a Aberturados Portos.

Depois de muita pressão, em abril de 1821 aFamília Real e vários nobres da Coroa voltaram “es-pontaneamente”, numa viagem tão tumultuada comoa vinda para o Brasil. Acreditando na iminente reaçãoda colônia contra às atitudes recolonizadoras das Cor-tes, surpreendeu a todos nomeando o filho D. Pedro

como Príncipe Re-gente do Brasil. A fa-mosa frase foi a sínte-se perfeita das intenções do rei: “Filho, se háde acontecer a independência, antes que seja para tido que para algum aventureiro”. O presente do paipara o filho foi bem recebido pela elite colonial, quedepositaria em D. Pedro a esperança de uma indepen-dência tranqüila e ordeira, sem revoltas e agitações po-pulares.

Depois do retorno de D. João, a colônia concen-trou as atenções na eleição dos deputados que repre-sentariam o Brasil nas Cortes de Lisboa. O votocensitário, excluía a grande maioria da população des-tituída da renda mínima exigida. Atuando no Parlamen-to português, os 70 “heróis representantes do povo bra-sileiro” viram-se diante de uma grande palhaçada, poiso número de deputados portugueses era bem maior queo grupo da colônia. Com isso, os portugueses ganha-vam todas as votações, de nada adiantando o choro dosbrasileiros.

Em setembro, o Parlamento português aprovoumedidas contrárias à colônia. Limitaram a autoridade dopríncipe regente D. Pedro, restringindo-a à província

do Rio de Janeiro. As outras províncias ficari-am subordinadas diretamente ao controle dePortugal. Decidiram também pela reativação dataxa de 30%, sobre as mercadorias importadas,incluindo os produtos ingleses. A modificaçãodos termos do Tratado de Aliança e Amizadede 1810, causou veementes protestos dos co-merciantes ingleses. O passo seguinte foi subs-tituir a Abertura dos Portos, por uma lei de res-trição ao desembarque de navios.

Em outubro de 1821, o Parlamento apro-vou a volta imediata do príncipe regente à Por-tugal. D. Pedro cada vez mais em acordo comas elites, não demonstrava intenção de acataressas ordens. Reforçava a união de interessesda elite com D. Pedro, o temor que aconteces-

se no Brasil, o mesmo que ocorria no restante da Amé-rica. A luta pela independência nessas colônias espa-nholas, se dava com participação decisiva das camadaspopulares. O caso mais “assustador” era o Haiti — ex-colônia francesa que após a independência acabou coma escravidão.

A crise com as Cortes de Portugal acelerou asarticulações políticas, empurrando a colônia para a in-

Em Lisboa, apopulação foi àsruas naRevolução doPorto

D. João tentouo quanto pôdeevitar sua voltaa Lisboa.Contudo,cedendo a umadas exigênciasdas Cortes,deixou o Brasilem 26 de abrilde 1821

Sem alternativas diante dapressão dos verdadeiros donosdo poder em Lisboa, muito acontragosto o rei deciciu-se

pelo regresso a Portugal.

Autoria: Edgard Chaves

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dependência. O príncipe regente e a elite, buscavam amelhor forma de se desligar da metrópole, não descar-tando a possibilidade do Brasil continuar colônia dePortugal, desde que se mantivesse a Abertura dos Por-tos.

Essa posição ambígua era defendida pelo famo-so – José Bonifácio. O político paulista enaltecido pelahistoriografia tradicional, começou a fulminante car-reira quando regressou de Portugal, em 1819. Em Lis-boa, conseguiu fama e prestigio, devido aos estudos naárea de metalurgia e a participação no exército portu-guês, na época da invasão napoleônica.

Em São Paulo, presidiu a Junta Provisória for-mada na crise de 1820. Bonifácio soube se aproveitarda fragilidade e debilidade política de D. Pedro. O prín-

cipe regente não tinha “jogo de cintura”,freqüentemente espantando as pessoas com atitudesexplosivas e autoritárias. José Bonifácio tornou-se ointerlocutor do príncipe, destacando-se em todos osepisódios anteriores à independência. A situação polí-tica do Brasil era tão confusa, que políticos oportunis-tas como José Bonifácio e um príncipe português comoD. Pedro, terminaram por assumir papel de destaque nanossa “inusitada independência”.

A queda de braço com as Cortes de Portugalganharam uma dimensão especial, em dezembro de1821, quando o partido Brasileiro começou a coleta deassinaturas de apoio a permanência de D. Pedro. O fato

foi muito explorado pela imprensa, que se engajou nacampanha, exaltando o príncipe como grande líder edefensor dos interesses nacionais. Em 9 de janeiro de1822, uma comissão de intelectuais e figuras importan-tes da elite, entregou o manifesto com oito mil assina-turas pedindo a D. Pedro, que rompesse definitiva-mente com as Cortes portuguesas. O príncipe que es-perava o momento certo para decidir a permanência noBrasil, disse: “Se é para o bem do povo e para a feli-cidade geral da nação, digo ao povo que fico”.

“O dia do Fico, revela que o ato terminoucom uma série de vivas levantadas da janela do Paçopelo presidente do Senado da Câmara e repetidospelo imenso povo que se aglomerava no local: Viva aReligião, Viva a Constituição, Viva as Cortes, VivaEl Rei Constitucional, Viva o Príncipe Constitucio-nal, Viva a União do Brasil com Portugal.! Assim, nopróprio ato em que se desobedeciam às ordens dasCortes determinando a volta de D. Pedro e asubordinação das Juntas Governativas às Cortes, da-vam-se vivas às Cortes e proclamavam-se a intençãode manter unidos os dois reinos.7

Osbrasileirosestavam emevidentedesvantagemna Corte deLisboa.

A populaçãobrasileira foi àsruas dar vivas àRevolução doPorto, como noCampo de SãoCristovão, noRio de Janeiro

Pressionado pela popula-ção e cada vez mais impaci-ente com as exigências dasCortes, D. Pedro decidiupermanecer no Brasil.

Autoria: Edgard Chaves

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Até a independência, em setembro, a colônia viveu uma seqüência dos fatosincríveis. Por suas “corajosas e deste-

midas atitudes” D. Pedro tornou-se o Defensor Per-pétuo do Brasil. Em seguida, determinou que nenhu-ma lei das Cortes, seria respeitada sem o seu Cumpra-se. A briga do príncipe com as Cortes contou com oapoio do Partido Brasileiro e dos ingleses, que se mos-travam satisfeitos com a liderança de D. Pedro. Emjulho, na Bahia, começou a rebelião contra a presençadas tropas portuguesas do Gal. Madeira de Melo. NoRio de Janeiro, José Bonifácio redigiu (e assinou) ummanifesto de independência, entregue às nações ami-gas, evidenciando o rompimento na condição de reinoirmão de Portugal!

Em setembro D. Pedro regressava de Santos,após um encontro com portugueses descontentes,quando se deparou com um grupo que trazia umamensagem de José Bonifácio. No bilhete estava a no-tícia da iminente invasão do Brasil por ordem das Cor-tes. Segundo a versão oficial, o príncipe irritado, lan-çou um “brado retumbante, ouvido até mesmo nas ter-ras portuguesas”. O grito de Independência ou Morte,foi exaltado por inúmeros historiadores, como subli-me momento da nossa história, mitificando D. Pedrocomo destemido e corajoso herói.

Mas, em outra versão, do historiador AntônioMendes, observamos que:“tudo se passa, mitologica-mente em uma atmosfera caríssima aos românticos:D. Pedro usando, uma roupa simples, é transformadoem jovem e arrebatador príncipe da casaca forradade galões, montado em um soberbo cavalo.

À pequena distância do local sacrossanto fica-va a casa em que se encontrava Domitila de Castro, aMarquesa de Santos, expulsa da casa do marido, bri-oso tenente de milícias, numa cena lascinante de ciú-mes. A narrativa lança inequívocas insinuações sobreum possível olhar amoroso da amante apaixonada, àdistância, no momento crucial do brado fundador doimpério tropical.. Pedro Calmon, como um românticotardio, chega a falar, referindo-se à marquesa, na mis-tura de amor e heroísmo com que caracteriza a cenado grito: Amaram-se no mesmo dia em que se viram,com a paixão que pesou ,sete anos, nos destinos doImpério. Os seus olhos negros e infelizes ajudaram aprendê-lo à verde colina do Ipiranga”.8

Na verdade, o festejado 7 de setembro não pas-sou de arranjo político, entre D. Pedro e as elites brasi-leiras (principalmente do Sudeste). Participaram tambémos políticos aproveitadores do partido Português e oscomerciantes ingleses estabelecidos no Brasil. Todosinteressados em assegurar um clima de “perfeita calma,ordem e tranqüilidade”. Os políticos mais radicais, comoGonçalves Ledo, foram banidos do país. Para elaborar aConstituição, havia sido convocada em junho, a As-sembléia Constituinte, com o papel de redigir a primeiraConstituição do país. Comparando com o restante daAmérica Latina, a nossa independência adquiriu um ca-ráter singular, devido a ausência de participação popu-lar. A história conturbada do período imperial estariadiretamente relacionada à forma elitsta e restrita comose obteve a independência.

1822A Independência

Ao contrário detodo o romantismoa respeito daIndependência doBrasil, D. Pedronão usava trajes degala na ocasião,tampouco montavauma magníficocavalo. Vestia, sim,trajes sujos deviagem e eratransportado emuma prosaicamula.

Ao expulsar ocomandante dastropasportuguesas, D.Pedro começou oprocesso deruptura com asCortes de Lisboa.

Autoria: Edgard Chaves

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Não aceitando a separação, as Cortes de Portu-gal escolheram a Bahia como local para reverter a situ-ação. A idéia era utilizar Salvador como ponto de parti-da para o ataque às outras regiões da colônia. Após oinício das hostilidades um grande contingente militarportuguês, tomou a área de Salvador transformando-aem reduto da marinha portuguesa. Porém, formou-seno Recôncavo um grupo rebelde que se deslocou parao interior estabelecendo suas bases na região de Ca-choeira. A manutenção das áreas interioranas nas mãosdos rebeldes, isolou as tropas portuguesas das áreasfornecedoras de alimentos.

Em novembro de 1822, ocorreu a célebrebatalha de Pirajá, indicando para os rebeldes ocaminho da vitória. Daí em diante, osportugueses foram perdendo terreno, até a ren-dição final em 2 de julho de 1823. A luta na Bahiafoi repleta de lances heróicos, como a morte dafreira Joana Angélica, tentando impedir a entra-da de soldados portugueses no convento daLapa. A independência da Bahia se distancia do7 de setembro pela significativa participação dascamadas populares. Mesmo conduzido pelas eli-tes, o povo pegou em armas para lutar contraPortugal. Houve também uma intervenção maisostensiva da Inglaterra, através dos navios co-mandados pelo almirante Lorde Cochrane bombarde-ando, sem perdão, os navios de Portugal. Como nãohavia marinha organizada na colônia, D. Pedro contra-tou os serviços do almirante inglês, nomeando-o co-mandante da nova marinha nacional.

Com a derrota na Bahia não restou outra opçãoa Portugal. A independência era um fato consumadocoroando o processo inaugurado em 1808, com a che-gada da Corte no Brasil. Mesmo assim, os portugue-ses demoraram três anos para reconhecer oficialmentea independência da colônia. Foi preciso a mediação daInglaterra e o pagamento de 2.000.000 de libras esterli-nas, para que Portugal admitisse a perda da colônia.Curiosamente, os Estados Unidos foi o primeiro país aestabelecer relações diplomáticas com o Brasil, com oobjetivo de se aproximar do jovem país idependente ede olho nas eventuais vantagens comerciais. De acor-do com os princípios da Doutrina Monroe de 1823,os Estados Unidos exerciam o papel de nação proteto-ra dos países da América Latina! É claro que a proteçãoficava só no papel, pois na prática os EUA sugaria ospaíses da América, tornando-os completamente depen-dentes de sua poderosa economia.

O Brasil independente ingressava em novomomento de sua história, mas nem por isso muito me-lhor do que a situação anterior. Durante décadas, seriavergonhosamente mantida a escravidão. A sociedadenada mudou e mesmo as alterações políticas atendiamapenas à minoria da sociedade. Na economia modifi-cou-se apenas o endereço da exploração direta, poisse antes, Portugal era a metrópole, após 1808, essepapel seria assumido pela Inglaterra. A nova fase exi-gia a imediata elaboração da Constituição. Bem, masisso é história para o capítulo do Primeiro Reinado.

Independência da BahiaIndependência da Bahia

Nas vésperas doGrito doIpiranga,brasileiros eportuguesesviviam um climatenso tanto emSalvador comopor todo o Brasil

Na cidade deCachoeira, naBahia, teve iníciouma série debatalhas por todoo Recôncavo

Autoria: Edgard Chaves

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No Brasil a situação econômica ia de mal a pior,sobretudo nas regiões de condição mais deplorável, aexemplo das províncias do Nordeste. O açúcar e o al-godão atravessavam uma fase caótica de falta de mer-cados além da seca que não parava de castigar a re-gião. A crise levou os agricultores ao desespero au-mentando as dívidas em progressão geométrica. En-quanto isso, a Coroa no Rio sugava os impostos até aúltima gota, destruindo a econo-mia colonial. Em Pernambuco, amaioria dos gêneros alimentíci-os e produtos do comércioestava na mão dos portugue-ses, que cobravam preçosexorbitantes nas mercadorias.O quadro tenso e potencial-mente explosivo, colocou aprovíncia à beira de uma rebe-lião.

A discrepante condiçãoeconômica foi alvo de manifesta-ções contrárias ao monopólio co-mercial. Some-se a tudo isso, a ri-gorosa política fiscal responsável

por um arrocho indiscriminado, atingindo também oslatifundiários que sempre haviam desfrutado dos bene-fícios concedidos pela Coroa. O descontentamentoacentuou o sentimento anti-lusitano, deixando os por-tugueses na berlinda. Enquanto isso, no Rio de Janeiro,D.João VI ficava alheio aos problemas, mais preocupa-do com as coxinhas de galinha.

Para você saber mais

Leia agora essa “comovente” carta de D. Pedro:

“Jazemos por muito tempo nas trevas, hoje vemos a luz. Se Vossa Majestade cáestivesse seria respeitado e então veria que o povo brasileiro, sabendo prezar sua liber-dade e independência, se empenha em respeitar a autoridade real, pois não é umabando de vis carbonários e assassinos, como os que têm a Vossa Majestade no maisignominioso cativeiro. Triunfa e triunfará a Independência brasílica, ou a morte noshá de custar. O Brasil será escravizado mas os brasileiros não, porque enquanto houversangue em nossas veias há de correr e primeiramente hão de conhecer melhor oRapazinho, e até que ponto chega a sua capacidade, apesar de não ter viajado pelascortes estrangeiras. Peço a Vossa Majestade que mande apresentar esta às Cortes! ÀsCortes que nunca foram gerais, e que são hoje em dia só de Lisboa, para que tenhamcom que se divirtam e gastem ainda um par de moedas a esse tísico tesouro. Deusguarde a preciosa saúde de Vossa Majestade, como todos nós brasileiros desejamos.Sou de Vossa Majestade, com todo o respeito, filho que muito o ama e súdito quemuito o venera. Pedro ”.

Carta de D. Pedro a D. João VI - setembro de 1822.

Revolução Pernambucana

A alfândega doRecifetestemunhou osmomentos deglória e dedesepero de umasociedade quedependia damonocultura.

Autoria: Edgard Chaves

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O clima tenso provocou pequenos embates an-tes da revolta começar. Nas festas típicas o brinde pelaliberdade, atacando ostensivamente a colonização por-tuguesa. Os colonos cumprimentavam-se como “patri-otas” e reuniam-se em locais secretos acobertados pelamaçonaria, tramando a hora de enfrentar as forças por-tuguesas.

A conspiração chegou aos ouvidos do gover-nador da província que, prontamente, ordenou a prisãodos líderes da revolta. Quando foram para a Fortalezadas Cinco Pontas, aconteceu o inesperado: um dos lí-deres, apelidado de “Leão Coroado” escapou matandodois oficias portugueses. Esse episódio foi o estopimpara o início da revolta no dia 6 de março. O governa-dor foi de pijama para o forte de Brum, prometendoreagir até à morte. O candidato a herói caiu no ridículo.Acuado pelo grupo rebelde, jogou a arma no chão im-plorando perdão. No dia 7 de março, os rebeldesproclamaram o Governo Provisório e a República emPernambuco aprovando uma carta de princípios combase em idéias liberais.

“O texto da Lei Orgânica revolucionáriaexplicitava o regime republicano a ser implantado. A leiOrgânica vigoraria até a Constituição a ser elaboradapor uma Assembléia Constituinte. Ela delimitava ospoderes do Governo Provisório e regulamentava a novaordem jurídica em que se afirmava a idéia de nacionali-dade. Tinha como princípios a liberdade de consciên-cia, de imprensa, tolerando outras religiões que não areligião católica, embora fosse essa a do Estado, sendoseus ministros assalariados por ela. As medidas revo-lucionárias tenderam a se aprofundar, pelo menos numprimeiro momento, e a se estender, principalmente paraa Capitânia da Paraíba”. 9

Na repressão aos rebeldes foi usada a Bahiacomo ponto de apoio. De Salvador, embarcaram forçasde terra e mar, sob as ordens do Conde dos Arcos –lacaio de D. João VI. Do Rio de Janeiro embarcou umdestacamento para dar apoio ao grupo da Bahia. O con-fronto com os rebeldes se alastrou até a Paraíba eAlagoas.

A insurreição tinha repercutido positivamenteem muitas vilas do interior, que lutavam sob o coman-do de Recife. As tropas da Coroa foram minando aresistência dessas vilas e cortando o fornecimento dealimentos que abasteciam a cidade de Recife. Em 19de maio, as tropas do rei marcharam em Recife come-morando a vitória. Fizeram um grande número de pri-sões e executaram os líderes capturados. O bloqueioda cidade deixou o local isolado sem contato com ou-tras regiões, impedindo qualquer tipo de ajuda.

Concordando com a análise de Luís RobertoLopes,da liberdade podemos observar que,“os even-tos de 1817 possivelmente não merecem o qualificati-vo de revolução. É verdade que latifundiários e povose uniram em nome da“liberdade”e contra a “opres-são”, isto é, os impostos cobrados pelo Rio deJaneiro.Contudo o povo foi cooptado para o movi-mento na medida em que foi levado a crer que seusmales (custo de vida, etc.) se originavam da domina-ção portuguesa via comerciantes radicados emPernambuco(na verdade tais males se originavam daprópria estrutura monocultora,latifundiária e escravistajá que o uso do escravo impedia o crescimento de ummercado interno capaz de orientar o crescimento eco-nômico dinamicamente para dentro).

Além disso, a participação dos latifundiáriosimpediu que a amplitude dos propósitos políticoscorrespondessem a uma amplitude equivalente no pro-grama social.Ou seja, não se tocou na terra e nem nosistema escravista.Tais limitações do movimento de1817 impediram-no de alcançar o caráter de uma ver-dadeira revolução.Houve propostas de reformas e deum reordenamento do sistema político.Não havia, po-rém, condições de alterar a essência das estruturas vi-gentes. 10

1 In. Koshiba, Luís e Denise Manzi - Históriado Brasil. Atual Editora. Pág. 134.

2 In. Algranti, Leila Mezan. D. João VI. Osbastidores da Independência.. Editora Ática. Pág. 36/38.

3 In. Holanda, Sérgio Buarque de. Carta Ré-gia da Abertura dos Portos - 28 de Janeiro de 1808 . -O Brasil Monárquico - Difel Editora Pág. 38.

4 In. Caio Prado Junior. Evolução Política doBrasil . Editora Brasiliense. Pág. 78.

5 In. Lima Oliveira. D João VI no Brasil .Editora José Olimpio. Volume 1. Pág. 127.

6 In. Mendes Antônio, Ricardo Maranhão eoutros . Brasil História.. Texto e Consulta . EditoraBrasiliense. Pág. 140.

7 In. Viotti, Emilia. - Introdução ao estudo daEmancipação Política do Brasil. Brasil em Perspecti-va. Difel Editora. Pág. 103.

8 In. Mendes Antônio, Ricardo Maranhão eoutros. Op. Cit. Pág. 155.

9 In. Mendes Antônio, Ricardo Maranhão eoutros. Op. Cit. Pág. 126.

10 In. Roberto Lopez, Luiz. História do Bra-sil Imperial- Editora Mercado Aberto. Pág. 26.

A repressãoabateu-se comselvageriasobre os líderesrevolucionários,caso do padreMiguelinho quemorreu fuzilado

Autoria: Edgard Chaves