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Informativo 590-STJ (16/09 a 03/10/2016) Esquematizado por Márcio André Lopes Cavalcante | 1 Márcio André Lopes Cavalcante Todos os julgados foram comentados. ÍNDICE DIREITO CIVIL CONTRATO DE SEGURO O atraso do segurado em comunicar o seguro que houve um sinistro com o veículo nem sempre irá gerar a perda da indenização securitária. DPVAT Súmula 580-STJ. AÇÕES POSSESSÓRIAS Particular pode ajuizar ação possessória tendo como objeto bem público de uso comum do povo. ALIMENTOS A genitora possui legitimidade para prosseguir na execução de alimentos proposta na época em que tinha a guarda do filho com o objetivo de ser ressarcida pelas prestações pretéritas. DIREITO DO CONSUMIDOR PLANO DE SAÚDE Quando um hospital credenciado não prestar determinados serviços para os usuários do plano, este deverá informar ao consumidor a restrição existente, sob pena de estarem todas incluídas. Prazo prescricional da pretensão condenatória decorrente de nulidade de cláusula de reajuste de plano ou seguro de assistência à saúde. DIREITO EMPRESARIAL RECUPERAÇÃO JUDICIAL Súmula 581-STJ. DIREITO PROCESSUAL CIVIL JUSTIÇA GRATUITA Possibilidade de concessão de assistência judiciária gratuita ao contratante de serviços advocatícios ad exitum. RECURSOS Possibilidade de aplicação da teoria da causa madura em julgamento de agravo de instrumento. LIQUIDAÇÃO DE SENTENÇA É possível a utilização de deduções e presunções na apuração de lucros cessantes. DIREITO PENAL ARREPENDIMENTO POSTERIOR Não se aplica o arrependimento posterior em homicídio culposo na direção de veículo.

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Informativo 590-STJ (16/09 a 03/10/2016) – Esquematizado por Márcio André Lopes Cavalcante | 1

Márcio André Lopes Cavalcante Todos os julgados foram comentados.

ÍNDICE DIREITO CIVIL

CONTRATO DE SEGURO O atraso do segurado em comunicar o seguro que houve um sinistro com o veículo nem sempre irá gerar a perda

da indenização securitária. DPVAT Súmula 580-STJ. AÇÕES POSSESSÓRIAS Particular pode ajuizar ação possessória tendo como objeto bem público de uso comum do povo. ALIMENTOS A genitora possui legitimidade para prosseguir na execução de alimentos proposta na época em que tinha a

guarda do filho com o objetivo de ser ressarcida pelas prestações pretéritas.

DIREITO DO CONSUMIDOR

PLANO DE SAÚDE Quando um hospital credenciado não prestar determinados serviços para os usuários do plano, este deverá

informar ao consumidor a restrição existente, sob pena de estarem todas incluídas. Prazo prescricional da pretensão condenatória decorrente de nulidade de cláusula de reajuste de plano ou seguro

de assistência à saúde.

DIREITO EMPRESARIAL

RECUPERAÇÃO JUDICIAL Súmula 581-STJ.

DIREITO PROCESSUAL CIVIL

JUSTIÇA GRATUITA Possibilidade de concessão de assistência judiciária gratuita ao contratante de serviços advocatícios ad exitum. RECURSOS Possibilidade de aplicação da teoria da causa madura em julgamento de agravo de instrumento. LIQUIDAÇÃO DE SENTENÇA É possível a utilização de deduções e presunções na apuração de lucros cessantes.

DIREITO PENAL

ARREPENDIMENTO POSTERIOR Não se aplica o arrependimento posterior em homicídio culposo na direção de veículo.

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LESÃO CORPORAL Perda de dois dentes configura lesão grave (e não gravíssima). ROUBO Súmula 582-STJ. EXTORSÃO Incide a majorante do § 1º do art. 158 do CP no caso da extorsão do § 3º. ART. 273 DO CP Venda de substâncias que estão na Portaria SVS/MS 344/98 e princípio da consunção. DIREITO PROCESSUAL PENAL

CONTROLE EXTERNO DA ATIVIDADE POLICIAL O MP, no exercício do controle externo da atividade policial, pode ter acesso às OMPs. PROVAS É lícito o acesso aos dados armazenados em celular apreendido com base em autorização judicial. INDENIZAÇÃO POR ERRO JUDICIÁRIO Indenização em razão de equívoco no reconhecimento de reincidência. SAÍDA TEMPORÁRIA Possibilidade de concessão de mais de cinco saídas temporárias por ano Prazo mínimo entre saídas temporárias Possibilidade de fixação de calendário anual de saídas temporárias por ato judicial único Competência do juiz da execução para fixação do calendário prévio de saídas temporárias

DIREITO TRIBUTÁRIO

SIMPLES Inexistência de alvará de localização e funcionamento não impede empresa de aderir ao Simples. DIREITO ADUANEIRO Não se deve conceder o drawback suspensão se não houver beneficiamento/agregação de valor à mercadoria a

ser exportada.

DIREITO PREVIDENCIÁRIO

PREVIDÊNCIA PRIVADA A súmula 340 do STJ é aplicável para os planos de previdência privada.

DIREITO CIVIL

CONTRATO DE SEGURO O atraso do segurado em comunicar o seguro que houve um sinistro com o veículo

nem sempre irá gerar a perda da indenização securitária

O art. 771 do CC determina que o segurado deverá comunicar imediatamente à seguradora quando ocorrer algum sinistro envolvendo o veículo, já que isso possibilita que esta tome medidas que possam amenizar os prejuízos da realização do risco, bem como a sua propagação. Esse dispositivo legal prevê que, se não houver esta comunicação imediata, o segurado perderá o direito à indenização.

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Vale ressaltar, no entanto, que, para que ocorra a sanção prevista no art. 771 do CC, é necessário que fique demonstrada a ocorrência de uma omissão dolosa do segurado, que beire a má-fé, ou culpa grave e que, com isso, prejudique, de forma desproporcional, a atuação da seguradora.

Assim, se o segurado demorou três dias para comunicar à seguradora que o veículo foi roubado porque foi ameaçado pelo criminoso, ele não perderá o direito de ser indenizado já que, neste caso, não poderia ser dele exigido comportamento diverso.

Resumindo: o segurado que, devido às ameaças de morte feitas pelo criminoso a ele e à sua família, deixou de comunicar prontamente o roubo do seu veículo à seguradora não perde o direito à indenização securitária (art. 771 do CC).

STJ. 3ª Turma. REsp 1.404.908-MG, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 2/8/2016 (Info 590).

Imagine a seguinte situação hipotética: João fez um contrato de seguro de veículos com a “Seguradora X”. No dia 02/02, João foi roubado por um assaltante armado na porta de sua casa, que levou o carro, o agrediu e ainda ameaçou que se este contasse o ocorrido à Polícia em menos de uma semana iria voltar para matar a sua família. Três dias depois, João procurou a seguradora e comunicou o roubo. A seguradora, no entanto, negou o pagamento da indenização afirmando que o segurado demorou a comunicar o ocorrido, descumprindo, portanto, o art. 771 do Código Civil:

Art. 771. Sob pena de perder o direito à indenização, o segurado participará o sinistro ao segurador, logo que o saiba, e tomará as providências imediatas para minorar-lhe as consequências.

Ainda de acordo com a seguradora, o aviso tardio propiciou ao criminoso tempo suficiente para vender o veículo a terceiro. Se a comunicação tivesse sido imediata, como diz a lei, o veículo tinha grandes chances de recuperação pela Polícia.

João propôs, então, ação contra a seguradora pedindo o pagamento da indenização e alegando que demorou a comunicar o ocorrido porque estava com medo diante das ameaças feitas pelo assaltante.

A tese defendida por João foi aceita? Ele terá direito à indenização securitária? SIM.

O segurado que, devido às ameaças de morte feitas pelo criminoso a ele e à sua família, deixou de comunicar prontamente o roubo do seu veículo à seguradora não perde o direito à indenização securitária (art. 771 do CC). STJ. 3ª Turma. REsp 1.404.908-MG, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 2/8/2016 (Info 590).

Realmente, é ônus do segurado comunicar imediatamente à seguradora quando ocorrer algum sinistro envolvendo o veículo, já que isso possibilita que esta tome medidas que possam amenizar os prejuízos da realização do risco bem como a sua propagação.

Todavia, não é em qualquer hipótese que a ausência da pronta notificação do sinistro acarretará a perda da indenização securitária. Em outras palavras, esta sanção não incide de forma automática.

Para que ocorra a sanção prevista na parte inicial do art. 771 do CC é necessário que fique demonstrada a ocorrência de uma omissão dolosa do segurado, que beire a má-fé, ou culpa grave e que, com isso, prejudique, de forma desproporcional, a atuação da seguradora.

Assim, não haverá a sanção do art. 771 do CC se:

ficar demonstrado que não havia medidas a serem tomadas de imediato pela seguradora e que poderiam minorar os efeitos do sinistro. Ex: o veículo foi completamente incendiado no momento do acidente.

ou se existirem fatos relevantes que impeçam o segurado de fazer a imediata comunicação do sinistro.

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Nestes dois casos, não há como punir o segurado com a drástica sanção da perda do direito à indenização, especialmente considerando a presença da boa-fé objetiva, princípio-chave que permeia todas as relações contratuais, incluídas as de natureza securitária. Na situação concreta, não houve má-fé ou omissão injustificada do segurado quanto ao atraso na comunicação do aviso de sinistro, de modo que não merece ser sancionado com a perda do direito à indenização securitária. O atraso de 3 dias para informar o roubo do automóvel se deu em razão de ameaças de morte feitas pelo criminoso quando da subtração do bem à mão armada no interior da residência da própria vítima. Na ocasião, o meliante havia prometido ao segurado retornar para matar seus familiares, ordenando que não comunicasse à polícia por pelo menos uma semana. Assim, o temor de represálias era real e não era razoável exigir do segurado comportamento diverso, que poderia colocar em risco não só sua segurança, mas também de sua família. Não houve nenhum conluio entre o segurado e o criminoso, tampouco vontade deliberada de fraudar o contrato de seguro ou de piorar os efeitos decorrentes do sinistro em detrimento dos interesses da seguradora.

DPVAT Súmula 58-STJ

Súmula 580-STJ: A correção monetária nas indenizações do seguro DPVAT por morte ou invalidez, prevista no § 7º do art. 5º da Lei nº 6.194/1974, redação dada pela Lei nº 11.482/2007, incide desde a data do evento danoso.

STJ. 2ª Seção. Aprovada em 14/09/2016, DJe 19/09/2016 (Info 590).

O que é o DPVAT? O DPVAT (Danos Pessoais Causados por Veículos Automotores de Via Terrestre) é um seguro obrigatório de danos pessoais causados por veículos automotores de via terrestre, ou por sua carga, a pessoas, transportadas ou não. Em outras palavras, qualquer pessoa que sofrer danos pessoais causados por um veículo automotor, ou por sua carga, em vias terrestres, tem direito a receber a indenização do DPVAT. Isso abrange os motoristas, os passageiros, os pedestres ou, em caso de morte, os seus respectivos herdeiros. Ex: dois carros batem e, em decorrência da batida, acertam também um pedestre que passava no local. No carro 1, havia apenas o motorista. No carro 2, havia o motorista e mais um passageiro. Os dois motoristas morreram. O passageiro do carro 2 e o pedestre ficaram inválidos. Os herdeiros dos motoristas receberão indenização de DPVAT no valor correspondente à morte. O passageiro do carro 2 e o pedestre receberão indenização de DPVAT por invalidez. Para receber indenização, não importa quem foi o culpado. Ainda que o carro 2 tenha sido o culpado, os herdeiros dos motoristas, o passageiro e o pedestre sobreviventes receberão a indenização normalmente. O DPVAT não paga indenização por prejuízos decorrentes de danos patrimoniais, somente danos pessoais. Quem custeia as indenizações pagas pelo DPVAT? Os proprietários de veículos automotores. Trata-se de um seguro obrigatório. Assim, sempre que o proprietário do veículo paga o IPVA, está pagando também, na mesma guia, um valor cobrado a título de DPVAT. O STJ afirma que a natureza jurídica do DPVAT é a de um contrato legal, de cunho social. O DPVAT é regulamentado pela Lei nº 6.194/74.

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Como a pessoa obtém a indenização do DPVAT? A pessoa deverá procurar uma das empresas seguradoras que seja consorciada ao DPVAT e apresentar a documentação necessária. Para requerer o seguro DPVAT não é necessário advogado, despachante ou qualquer outra ajuda de terceiros. Existe um prazo para pagamento? SIM. A Lei prevê que a indenização deve ser paga, em cheque nominal aos beneficiários, no prazo de 30 dias da entrega dos documentos que comprovem o acidente, o óbito, a invalidez etc. (art. 5º, § 1º). Qual é o valor da indenização de DPVAT prevista na Lei? • no caso de morte: R$ 13.500,00 (por vítima) • no caso de invalidez permanente: até R$ 13.500,00 (por vítima) • no caso de despesas de assistência médica e suplementares: até R$ 2.700,00 como reembolso a cada vítima.

Esses valores estão previstos textualmente no art. 3º da Lei n. 6.194/74 e foram previstos nesta Lei por força da MP340/2006. Confira:

Art. 3º Os danos pessoais cobertos pelo seguro estabelecido no art. 2º desta Lei compreendem as indenizações por morte, por invalidez permanente, total ou parcial, e por despesas de assistência médica e suplementares, nos valores e conforme as regras que se seguem, por pessoa vitimada: I - R$ 13.500,00 (treze mil e quinhentos reais) - no caso de morte; II - até R$ 13.500,00 (treze mil e quinhentos reais) - no caso de invalidez permanente; e III - até R$ 2.700,00 (dois mil e setecentos reais) - como reembolso à vítima - no caso de despesas de assistência médica e suplementares devidamente comprovadas.

Obs: os três incisos acima foram incluídos pela Medida Provisória 340/2006, convertida na Lei n. 11.482/2007. Antes, tais valores eram previstos em salários-mínimos. Pois bem. Imagine agora a seguinte situação hipotética: A esposa de João faleceu em um acidente de trânsito. João pleiteou, então, o pagamento da indenização

de R$ 13.500,00 prevista no inciso I do art. 3º da Lei n. 6.194/74. No entanto, João defendeu a seguinte tese: ora, esse valor é o mesmo desde 2006 (quando a MP 340/2006 foi editada). Isso não é justo porque em todos os pagamentos de valores deverá haver correção monetária. Desse modo, João sustentou que o valor que seria pago a ele, ou seja, os R$ 13.500,00, deveria ser corrigido monetariamente desde 2006 até o momento do seu pagamento. A tese de João foi aceita pela jurisprudência? Os valores da indenização do DPVAT deverão ser atualizados (corrigidos monetariamente) desde 2006, ou seja, quando tais quantias foram previstas na lei em quantias fixas? NÃO. A MP 340/2006 (convertida na Lei 11.482/2007) não previu que os valores deveriam ser corrigidos desde 2006. Isso não foi determinado pela MP. Assim, infelizmente, tais indenizações foram, ao longo dos anos, perdendo valor real diante da inflação.

Mas a Lei do DPVAT (Lei n. 6.194/74) não prevê nenhum tipo de correção monetária? Ela não fala disso em nenhum dispositivo?

Prevê sim. O § 7º do art. 5º da Lei n. 6.194/74 (Incluído pela Lei nº 11.482/2007) estabelece o seguinte:

Art. 5º (...) § 7º Os valores correspondentes às indenizações, na hipótese de não cumprimento do prazo para o pagamento da respectiva obrigação pecuniária, sujeitam-se à correção monetária segundo índice oficial regularmente estabelecido e juros moratórios com base em critérios fixados na regulamentação específica de seguro privado.

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Desse modo, a única correção monetária que a Lei do DPVAT previu foi para o caso de a indenização não ser quitada no prazo de 30 dias, que é o tempo previsto na Lei para que a seguradora pague o beneficiário (art. 5º, § 1º). Assim, demorando mais de 30 dias para ser paga a indenização, deverá incidir correção monetária, que será contada, no entanto, desde a data do evento danoso. Resumindo:

Existe correção monetária dos valores do DPVAT desde 2006? NÃO. Tais valores foram previstos em quantias fixas e a MP e a Lei não previram formas de corrigir essas quantias (infeliz opção do legislador, que não pode ser consertada pelo Poder Judiciário);

Existe alguma forma de correção monetária dos valores do DPVAT? SIM. A Lei prevê que, se a seguradora demorar mais que 30 dias para pagar a indenização após o recebimento dos documentos, o beneficiário deverá receber os valores com correção monetária, mas o termo inicial desta correção não é 2006 e sim a data do evento danoso.

O tema já estava pacificado no STJ por meio do REsp 1.483.620-SC, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, julgado em 27/5/2015 (recurso repetitivo) (Info 563).

AÇÕES POSSESSÓRIAS Particular pode ajuizar ação possessória tendo como objeto bem público de uso comum do povo

Particulares podem ajuizar ação possessória para resguardar o livre exercício do uso de via municipal (bem público de uso comum do povo) instituída como servidão de passagem.

Ex: a empresa começou a construir uma indústria e a obra está invadindo a via de acesso (rua) que liga a avenida principal à uma comunidade de moradores locais. Os moradores possuem legitimidade para ajuizar ação de reintegração de posse contra a empresa alegando que a rua que está sendo invadida representa uma servidão de passagem.

STJ. 3ª Turma. REsp 1.582.176-MG, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 20/9/2016 (Info 590).

Imagine a seguinte situação hipotética: A empresa "XX" começou a construir uma indústria em um terreno localizado na área rural do Município. Ocorre que a obra avançou sobre uma rua que liga uma comunidade de 12 casas com a avenida principal. Em outras palavras, parte da indústria em construção está invadindo a via de acesso para as casas dos moradores locais. Diante disso, os moradores ajuizaram ação de reintegração de posse contra a empresa alegando que a rua que está sendo invadida representa uma servidão de passagem que dá acesso aos loteamentos há mais de 20 anos. A ré alegou, dentre outros argumentos, que a estrada objeto da controvérsia é bem público municipal de uso comum, não podendo sua proteção possessória ser requerida por particulares. Isso porque os particulares não detêm a posse dos bens públicos, mas sim a mera detenção, que não pode ser tutelada por ações possessórias. A tese da empresa foi acolhida pelo STJ? NÃO. Particulares podem ajuizar ação possessória para resguardar o livre exercício do uso de via municipal (bem público de uso comum do povo) instituída como servidão de passagem. STJ. 3ª Turma. REsp 1.582.176-MG, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 20/9/2016 (Info 590).

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Bem de uso comum do povo O art. 99 do Código Civil classifica os bens públicos de acordo com a sua destinação (ou afetação):

a) bens de uso comum do povo b) bens de uso especial c) bens dominicais

São aqueles destinados à utilização geral pelos indivíduos, podendo ser utilizados por todos em igualdade de condições, independentemente de consentimento individualizado por parte do Poder Público (uso coletivo). Exs: ruas, praças, rios, praias etc.

São aqueles utilizados pela Administração para a prestação dos serviços administrativos e dos serviços públicos em geral, ou seja, utilizados pela Administração para a satisfação de seus objetivos. Exs: prédio onde funciona um órgão público.

São aqueles que não estão sendo utilizados para nenhuma destinação pública, abrangendo o denominado domínio privado do Estado. Exs: terras devolutas, terrenos de marinha, prédios públicos desativados, móveis inservíveis, dívida ativa etc.

Desse modo, quando se fala em bem de uso comum do povo, o particular é o usuário concreto do bem e, como tal, pode ser considerado como titular de direito subjetivo público. Em outras palavras, se o seu direito de utilizar o bem de uso comum for violado, seja por terceiro, seja pela própria Administração Pública, ele poderá defender o seu direito de usar o bem, seja na via administrativa ou judicial. Exemplo: se um rico empresário resolve construir uma casa na beira da praia e fechá-la, tornando-a privativa, qualquer outra pessoa poderá questionar judicialmente esta medida. Nesse sentido: DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 27ª ed., São Paulo: Atlas, 2014. p. 763-764. Possibilidade jurídica de o particular requerer a proteção possessória de bem público de uso comum Realmente, o STJ possui inúmeros julgados afirmando que a ocupação irregular de bem público dominical não caracteriza posse, mas mera detenção, hipótese que afasta o reconhecimento de direitos em favor do particular com base em alegada boa-fé. Assim, por exemplo, se o particular invade um bem público que não é utilizado para nada (ex: um terreno baldio), a jurisprudência entende que ele não é considerado possuidor, mas mero detentor. Logo, não poderá invocar a proteção possessória contra o Poder Público. Esse entendimento, porém, não se aplica para o caso de um particular que está defendendo seu direito de usar um bem público de uso comum do povo. Aqui a situação é diferente. No caso de bens públicos de uso comum do povo, podemos sim falar em posse e o particular poderá defendê-la em juízo. Nesse sentido: THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de Direito Processual Civil – Procedimentos Especiais – vol. III, Rio de Janeiro: Forense, 2014, p.122). Desse modo, podemos concluir que: o ordenamento jurídico não permite a proteção possessória em caso de particular que ocupe bens

públicos dominicais, sendo esta situação caracterizada como mera detenção; é possível, no entanto, que particulares exerçam proteção possessória para garantir seu direito de

utilizar bens de uso comum do povo, como é o caso, por exemplo, da tutela possessória para assegurar o direito de uso de uma via pública.

ALIMENTOS A genitora possui legitimidade para prosseguir na execução de alimentos proposta na época em

que tinha a guarda do filho com o objetivo de ser ressarcida pelas prestações pretéritas

A genitora que, ao tempo em que exercia a guarda judicial do filho, representou-o em ação de execução de débitos alimentares possui legitimidade para prosseguir no processo executivo com intuito de ser ressarcida, ainda que, no curso da cobrança judicial, a guarda tenha sido transferida ao genitor (executado).

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Ex: João e Maria foram casados e são pais de Lucas. Depois que se separaram, iniciou-se uma disputa pela guarda do filho. Enquanto não se definia a questão, a guarda foi provisoriamente deferida para Maria. O juiz determinou que João pagasse pensão alimentícia em favor do filho. O pai ficou devendo 4 meses de pensão (abril a julho/2015). Em razão disso, Lucas, representado por Maria, ajuizou execução de alimentos cobrando a quantia. Em novembro de 2015, o juiz, na sentença, determinou que a guarda de Lucas deveria ficar com o pai, revogando a decisão interlocutória anterior que havia deferido a guarda em favor de Maria. Mesmo assim, a genitora possui legitimidade para prosseguir na execução dos débitos alimentares relacionados com a época em que ela era guardiã do filho. Isso porque ela teve que assumir as despesas com o filho no período em que o pai não pagou a pensão alimentícia e precisa ser ressarcida.

STJ. 4ª Turma. REsp 1.410.815-SC, Rel. Min. Marco Buzzi, julgado em 9/8/2016 (Info 590).

Imagine a seguinte situação hipotética: João e Maria foram casados e são pais de Lucas. Depois que se separaram, iniciou-se uma disputa pela guarda do filho. Enquanto não se definia a questão, a guarda foi provisoriamente deferida para Maria. O juiz determinou que João pagasse pensão alimentícia em favor do filho. O pai ficou devendo 4 meses de pensão (abril a julho/2015). Em razão disso, Lucas, representado por Maria, ajuizou execução de alimentos cobrando a quantia. Em agosto de 2015, João voltou a pagar regularmente todos os meses a pensão. A execução continuava tramitando normalmente, mas aí, em novembro de 2015, houve uma reviravolta: no processo da guarda, o juiz, na sentença, determinou que a guarda de Lucas deveria ficar com o pai. Com isso, foi revogada a decisão interlocutória anterior que havia deferido liminarmente a guarda da criança para Maria. Diante da sentença proferida, João peticionou no processo de execução afirmando que não deveria mais pagar os 4 meses atrasados porque ao final a guarda do filho ficou com ele. O juiz concordou com o pedido e extinguiu a execução sem resolução do mérito, ao fundamento de que a transferência da guarda do menor para o genitor acarretou a ilegitimidade da mãe para a execução e a perda superveniente do interesse de agir, considerando que se João pagasse o valor dos 4 meses, estes reverteriam em favor da criança e esta já está sob a guarda do "devedor". Logo, como João é quem administra o dinheiro do filho menor, eventual pagamento seria dado para ele mesmo. Agiu corretamente o juiz? NÃO. O pai, mesmo estando atualmente com o filho, continua obrigado a pagar os meses de pensão alimentícia atrasados nos quais a guarda da criança estava com a mãe. Isso porque, neste período, enquanto não recebia o dinheiro da pensão, ela teve que assumir os gastos com a criação e sustento do filho e tais despesas devem ser ressarcidas. Assim, decidiu o STJ que:

A genitora que, ao tempo em que exercia a guarda judicial dos filhos, representou-os em ação de execução de débitos alimentares possui legitimidade para prosseguir no processo executivo com intuito de ser ressarcida, ainda que, no curso da cobrança judicial, a guarda tenha sido transferida ao genitor (executado). STJ. 4ª Turma. REsp 1.410.815-SC, Rel. Min. Marco Buzzi, julgado em 9/8/2016 (Info 590). Realmente a partir do momento em que houve a alteração da guarda para o pai, cessou a obrigação do genitor de pagar a pensão alimentícia. No entanto, tal fato não o exime da dívida alimentar pretérita, contraída nos meses em que a guarda da criança estava com a mãe. Assim, o débito alimentar no período em que Lucas estava sob a guarda materna permanece inalterado e a genitora tem legitimidade para continuar executando tal quantia. Maria Berenice Dias já se debruçou sobre este tema e ensina:

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"Para evitar prejuízo enorme, como o genitor que detém a guarda é quem acaba sozinho provendo ao sustento da prole, indispensável reconhecer a ocorrência de sub-rogação. Ou seja, resta ele como titular do crédito vencido e não pago enquanto o filho era menor, ainda que relativamente capaz. Se ele está sob sua guarda, como o dever de lhe prover o sustento é de ambos os genitores, quando tal encargo é desempenhado somente por um deles, pode reembolsar-se com relação ao omisso. (...) O mesmo ocorre quando o filho passa para a guarda do outro genitor. Se existe um crédito alimentar, quem arcou sozinho com o sustento do filho pode reembolsar-se do que despendeu. Dispõe ele de legitimidade para cobrar os alimentos. Age em nome próprio, como credor sub-rogado." (DIAS, Maria Berenice. Manual de Direito das Famílias. 9ª ed. São Paulo: RT, 2013. p. 582.)

Mas na execução agora constará como exequente a mãe ou permanecerá sendo o filho? A mãe. O STJ entende que há neste caso sub-rogação. A mãe, como arcou com a dívida que era do pai da criança, sub-rogou-se no direito de cobrar o pai como se fosse o filho. O CPC permite que o sub-rogado que não receber o crédito do devedor possa prosseguir na execução já iniciada pelo credor originário. Veja:

Art. 857 (...) § 2º A sub-rogação não impede o sub-rogado, se não receber o crédito do executado, de prosseguir na execução, nos mesmos autos, penhorando outros bens.

No processo de execução, a mãe poderá pedir a prisão civil do devedor? NÃO. O STJ entendeu que, como houve a alteração da guarda e a execução atualmente está correndo no interesse da mãe, não é mais possível pedir a prisão civil do devedor, razão pela qual o prosseguimento do feito deve seguir o rito previsto no art. 913 do CPC/2015.

DIREITO DO CONSUMIDOR

PLANO DE SAÚDE Quando um hospital credenciado não prestar determinados serviços para os usuários do plano, este deverá informar ao consumidor a restrição existente, sob pena de estarem todos incluídos

No caso em que, nas informações divulgadas por plano de saúde aos seus usuários, determinado hospital particular figure como instituição credenciada sem ressalvas, se o usuário optar pela realização de tratamento contratado e disponibilizado pelo aludido hospital, a operadora do plano será obrigada a custeá-lo, ainda que o serviço seja prestado em parceria com instituição não credenciada, cuja unidade de atendimento funcione nas dependências do hospital, sendo irrelevante o fato de haver, na mesma localidade, outras instituições credenciadas para o mesmo tipo de tratamento de saúde.

Ex: João, cliente do plano de saúde, precisava fazer quimioterapia. Na página do plano na internet consta que o Hospital São Carlos integra a rede credenciada. Dentro deste hospital, no setor de oncologia, funciona o Instituto Santa Marta. Diante disso, ele pediu as guias de serviço para fazer a quimioterapia lá. O plano de saúde não autorizou alegando que o Instituto Santa Marta, apesar de funcionar dentro do Hospital São Carlos, é uma instituição diferente e que apenas o Hospital é credenciado. João terá direito de fazer o tratamento lá. Quando um hospital credenciado não prestar determinados serviços para os usuários do plano, este deverá informar ao consumidor, de forma clara, qual é a restrição existente e quais as especialidades oferecidas pela entidade que não estão cobertas, sob pena de todas elas estarem incluídas no credenciamento.

STJ. 3ª Turma. REsp 1.613.644-SP, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 20/9/2016 (Info 590).

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Informativo 590-STJ (16/09 a 03/10/2016) – Esquematizado por Márcio André Lopes Cavalcante | 10

Imagine a seguinte situação adaptada: João, cliente do plano de saúde Unimed, descobriu que estava com câncer e que precisava fazer quimioterapia. Ele pesquisou na página do plano na internet e descobriu que o Hospital São Carlos integra a rede credenciada da Unimed. Dentro deste hospital, no setor de oncologia, funciona o Instituto Oncológico Santa Marta, uma referência no tratamento do câncer. Diante disso, ele pediu as guias de serviço para fazer a quimioterapia no Instituto Oncológico Santa Marta. O plano de saúde não autorizou o procedimento alegando que o Instituto Santa Marta, apesar de funcionar dentro do Hospital São Carlos, é uma instituição diferente e que apenas o Hospital é credenciado. O plano alegou, ainda, que na cidade existem outras instituições credenciadas para realizar tratamento quimioterápico, de forma que o consumidor não seria prejudicado. Inconformado com a justificativa, João propôs ação de obrigação de fazer contra a Unimed pedindo que ela fosse condenada a custear o tratamento. Argumentou que, se o Hospital São Carlos é credenciado pela operadora ré, o seu serviço de oncologia, ainda que realizado em parceria com outra instituição, também deve ser disponibilizado aos usuários do plano de saúde. A tese de João foi aceita pelo STJ? SIM. No caso em que, nas informações divulgadas por plano de saúde aos seus usuários, determinado hospital particular figure como instituição credenciada sem ressalvas, se o usuário optar pela realização de tratamento contratado e disponibilizado pelo aludido hospital, a operadora do plano será obrigada a custeá-lo, ainda que o serviço seja prestado em parceria com instituição não credenciada, cuja unidade de atendimento funcione nas dependências do hospital, sendo irrelevante o fato de haver, na mesma localidade, outras instituições credenciadas para o mesmo tipo de tratamento de saúde. STJ. 3ª Turma. REsp 1.613.644-SP, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 20/9/2016 (Info 590). Os planos de saúde são regidos pela Lei nº 9.656/98. Esta lei determina que as operadoras de planos de saúde deverão ajustar com as entidades conveniadas, contratadas, referenciadas ou credenciadas, mediante instrumentos formais, as condições de prestação de serviços de assistência à saúde. Em outras palavras, quando a operadora de saúde contratar um hospital, laboratório ou profissional para que estes prestem serviços para os usuários do plano, deverá ser celebrado um contrato escrito, no qual as obrigações de cada uma das partes fiquem bem definidas. Isso está previsto nos arts. 16, VI, 17-A, § 2º, e 18, I, da Lei nº 9.656/98. Desse modo, quando a operadora do plano de saúde divulga para os seus usuários a lista dos prestadores credenciados (ex: hospitais), ela deverá também descrever, de forma bem clara, os serviços que cada um está apto a executar, pessoalmente ou por meio de terceiros, segundo o contrato de credenciamento que foi assinado. Assim, por exemplo, quando um hospital credenciado não prestar determinados serviços para os usuários do plano, este deverá informar ao consumidor qual é a restrição existente e quais as especialidades oferecidas pela entidade que não estão cobertas, sob pena de o usuário considerar, com razão, que todas estão incluídas no credenciamento. No caso concreto, na página do plano de saúde na internet constava o Hospital São Carlos como uma das instituições credenciadas pela Unimed. Não havia, na informação divulgada aos usuários, nenhuma ressalva quanto aos serviços oferecidos pela entidade, ou seja, não havia indicação de nenhuma restrição.

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Informativo 590-STJ (16/09 a 03/10/2016) – Esquematizado por Márcio André Lopes Cavalcante | 11

Somente ao tentar realizar a quimioterapia foi que o consumidor descobriu que os serviços de oncologia do hospital são prestados, em sistema de parceria, com o Instituto de Oncologia Santa Marta, outra instituição, mas que funciona dentro do hospital. O fato de o plano de saúde ter credenciado o hospital, sem restrições, faz com que seus serviços abranjam, para fins de cobertura, todas as especialidades médicas oferecidas pela instituição, ainda que prestadas sob o sistema de parceria com instituição não credenciada. Divergências de índole administrativa entre a operadora e o prestador (hospital) sobre quais serviços estariam efetivamente cobertos no contrato de credenciamento não podem servir de pretexto para prejudicar o consumidor de boa-fé, que confiou na rede conveniada e nas informações divulgadas pelo plano de saúde. As partes, nas relações contratuais, devem manter posturas de cooperação, transparência e lealdade recíprocas, de modo a respeitar as legítimas expectativas geradas no outro, sobretudo em contratos de longa duração, em que a confiança é elemento essencial e fonte de responsabilização civil.

PLANO DE SAÚDE Prazo prescricional da pretensão condenatória decorrente de nulidade

de cláusula de reajuste de plano ou seguro de assistência à saúde

Em caso de pretensão de nulidade de cláusula de reajuste prevista em contrato de plano ou seguro de assistência à saúde ainda vigente, com a consequente repetição do indébito, a ação ajuizada está fundada no enriquecimento sem causa e, por isso, o prazo prescricional é trienal, nos termos do art. 206, § 3º, IV, do Código Civil.

Em outras palavras, se o usuário do plano de saúde (ou do seguro-saúde), ainda com o contrato em vigor, pretende declarar a nulidade da cláusula de reajuste e obter a devolução dos valores pagos a mais, o prazo prescricional para isso é de 3 anos.

No Código Civil passado, não havia uma previsão como a do art. 206, § 3º, IV, do CC/2002. O art. 177 do CC/1916 afirmava que, se para a situação concreta não houvesse prazo prescricional expressamente previsto na lei, deveria ser aplicado o prazo de 20 anos caso a ação versasse sobre direitos pessoais. Logo, se o fato ocorreu na vigência do CC/1916, o prazo prescricional aplicável é de 20 anos.

Resumindo, foi fixada a seguinte tese:

Na vigência dos contratos de plano ou de seguro de assistência à saúde, a pretensão condenatória decorrente da declaração de nulidade de cláusula de reajuste nele prevista prescreve em 20 anos (art. 177 do CC/1916) ou em 3 anos (art. 206, § 3º, IV, do CC/2002), observada a regra de transição do art. 2.028 do CC/2002.

STJ. 2ª Seção. REsp 1.361.182-RS, Rel. Min. Marco Buzzi, Rel. para acórdão Min. Marco Aurélio Bellizze, julgado em 10/8/2016 (recurso repetitivo) (Info 590).

Imagine a seguinte situação hipotética: João mantinha um contrato de seguro-saúde. Quando completou 60 anos de idade, a mensalidade por ele paga aumentou significativamente. Inconformado, João procurou a companhia de seguro, que lhe explicou que existe uma cláusula no seu contrato que autoriza o aumento do valor da mensalidade quando o usuário completa 60 anos. O usuário procurou a Defensoria Pública, que ajuizou ação contra a seguradora pedindo que:

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1) essa cláusula seja declarada inválida, por violar o art. 15, § 3º do Estatuto do Idoso (Lei n. 10.741/2003)

Art. 15 (...) § 3º É vedada a discriminação do idoso nos planos de saúde pela cobrança de valores diferenciados em razão da idade.

2) a ré seja condenada a devolver os valores cobrados a mais decorrentes do aumento abusivo (repetição de indébito). Prazo prescricional Surgiu, no entanto, uma discussão quanto ao prazo prescricional dessa ação: 1ª) a Defensoria Pública sustentou que a pretensão seria imprescritível porque se trata de ação declaratória de nulidade. Subsidiariamente, caso assim não se entendesse, requereu o reconhecimento de que o prazo é de 5 anos, nos termos do art. 27 do CDC:

Art. 27. Prescreve em cinco anos a pretensão à reparação pelos danos causados por fato do produto ou do serviço prevista na Seção II deste Capítulo, iniciando-se a contagem do prazo a partir do conhecimento do dano e de sua autoria.

2ª) A empresa de seguro saúde, por sua vez, argumentou que o prazo prescricional deveria ser de 1 ano, nos termos do art. 206, § 1º, II, “b”, do CC:

Art. 206. Prescreve: § 1º Em um ano: (...) II - a pretensão do segurado contra o segurador, ou a deste contra aquele, contado o prazo: (...) b) quanto aos demais seguros, da ciência do fato gerador da pretensão;

Qual das duas correntes foi acolhida pelo STJ? Nenhuma das duas. 1ª) Não se pode falar que a ação é meramente declaratória, considerando que o autor, partindo da premissa de que a cláusula é abusiva, deseja, na verdade, o ressarcimento pelos pagamentos supostamente indevidos que realizou. Desse modo, se a ação não se restringe à declaração de nulidade da cláusula contratual, havendo pedido de obtenção de efeitos patrimoniais decorrente desta declaração, não temos no caso concreto uma ação puramente declaratória, mas sim condenatória, estando sujeita, portanto, ao prazo prescricional. Não se pode utilizar o art. 27 do CDC, por sua vez, porque, pela simples leitura do dispositivo, percebe-se que ele se aplica apenas para as ações de reparação de danos causados por fato do produto ou do serviço (acidente de consumo / defeito de segurança), não incidindo, portanto, nos casos em que se discute abusividade de cláusula contratual. 2ª) Não se pode aplicar o art. 206, § 1º, II, “b”, do CC ao presente caso. Isso porque o seguro-saúde, apesar de ter esse nome, é considerado, por força de lei, como “plano privado de assistência à saúde” (art. 2º da Lei 10.185/2001). Segundo a doutrina e a jurisprudência, os planos privados de assistência à saúde executam uma obrigação de fazer consistente na prestação de serviços voltados a garantir a preservação da saúde do usuário/segurado. Desse modo, o serviço que prestam não pode ser considerado como “contrato de seguro”, já que tais empresas não se limitam ao pagamento de indenização securitária. Vale ressaltar, ainda, que o prazo de 1 ano do art. 206, § 1º, II, “b”, do CC aplica-se para os casos em que a parte requer judicialmente o pagamento da indenização securitária contratada. No caso, a parte quer a nulidade de cláusula do contrato e o ressarcimento dos valores pagos.

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Qual foi, então, o prazo prescricional firmado pelo STJ para este tipo de pretensão? 3 anos, com base no art. 206, § 3º, IV, do Código Civil:

Art. 206. Prescreve: (...) § 3º Em três anos: IV - a pretensão de ressarcimento de enriquecimento sem causa;

Em caso de pretensão de nulidade de cláusula de reajuste prevista em contrato de plano ou seguro de assistência à saúde ainda vigente, com a consequente repetição do indébito, a ação ajuizada está fundada no enriquecimento sem causa e, por isso, o prazo prescricional é trienal, nos termos do art. 206, § 3º, IV, do Código Civil. Em outras palavras, se o usuário do plano de saúde (ou do seguro-saúde), ainda com o contrato em vigor, pretende declarar a nulidade da cláusula de reajuste e obter a devolução dos valores pagos a mais, o prazo prescricional para isso é de 3 anos. STJ. 2ª Seção. REsp 1.361.182-RS, Rel. Min. Marco Buzzi, Rel. para acórdão Min. Marco Aurélio Bellizze, julgado em 10/8/2016 (Info 590). Por que se fala aí em “enriquecimento sem causa”? O argumento utilizado pelo autor para obter a restituição dos valores pagos a maior é o de que a cláusula contratual de reajuste é inválida. Ao reconhecer que esta cláusula é ilegal ou abusiva, a consequência lógica é a “perda da causa que legitimava o pagamento efetuado”. Em outras palavras, se a cláusula é abusiva, a causa que justificava o recebimento das quantias pelo plano de saúde deixa de existir. Logo, o plano de saúde enriqueceu sem causa, devendo, portanto, fazer a repetição do indébito, ou seja, a restituição dos valores cobrados, nos termos dos arts. 182, 876 e 884 do CC:

Art. 182. Anulado o negócio jurídico, restituir-se-ão as partes ao estado em que antes dele se achavam, e, não sendo possível restituí-las, serão indenizadas com o equivalente. (...) Art. 876. Todo aquele que recebeu o que lhe não era devido fica obrigado a restituir; obrigação que incumbe àquele que recebe dívida condicional antes de cumprida a condição. (...) Art. 884. Aquele que, sem justa causa, se enriquecer à custa de outrem, será obrigado a restituir o indevidamente auferido, feita a atualização dos valores monetários. Parágrafo único. Se o enriquecimento tiver por objeto coisa determinada, quem a recebeu é obrigado a restituí-la, e, se a coisa não mais subsistir, a restituição se fará pelo valor do bem na época em que foi exigido.

No Código Civil de 1916 havia previsão de prazo prescricional para as pretensões de enriquecimento sem causa? NÃO. No Código Civil passado, não havia uma previsão como a do art. 206, § 3º, IV, do CC/2002. O CC/1916 afirmava que, se para a situação concreta não houvesse prazo prescricional expressamente previsto na lei, deveria ser aplicado o prazo de 20 anos caso a ação versasse sobre direitos pessoais. Isso estava no art. 177 do CC/1916:

Art. 177. As ações pessoais prescrevem, ordinariamente, em 20 (vinte) anos, as reais em 10 (dez), entre presentes, e entre ausentes, em 15 (quinze), contados da data em que poderiam ter sido propostas.

Logo, se o fato ocorreu na vigência do CC/1916, o prazo prescricional aplicável é de 20 anos, nos termos do art. 177 em razão de não haver prazo expresso no Código revogado regulando a matéria. Resumindo. Qual é o prazo prescricional para o usuário de plano de saúde questionar a nulidade da cláusula que impôs o reajuste das parcelas e cobrar os valores pagos indevidamente a maior?

Se o fato ocorreu sob a vigência do CC/1916: 20 anos.

Se o fato ocorreu sob a vigência do CC/2002: 3 anos.

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E se o fato começou na época do CC/1916 e continuou durante o CC/2002, neste caso, qual dos dois prazos será aplicado? Neste caso, deverá ser observada a regra de transição do art. 2.028 do CC/2002:

Art. 2.028. Serão os da lei anterior os prazos, quando reduzidos por este Código, e se, na data de sua entrada em vigor, já houver transcorrido mais da metade do tempo estabelecido na lei revogada.

Resumindo: Na vigência dos contratos de plano ou de seguro de assistência à saúde, a pretensão condenatória decorrente da declaração de nulidade de cláusula de reajuste nele prevista prescreve em 20 anos (art. 177 do CC/1916) ou em 3 anos (art. 206, § 3º, IV, do CC/2002), observada a regra de transição do art. 2.028 do CC/2002. STJ. 2ª Seção. REsp 1.361.182-RS, Rel. Min. Marco Buzzi, Rel. para acórdão Min. Marco Aurélio Bellizze, julgado em 10/8/2016 (Info 590). E quanto ao mérito? É abusiva a cláusula que determina o aumento de preço da mensalidade do plano de saúde pelo fato de o usuário ter passado para uma nova faixa de idade? Em regra, NÃO. A previsão de reajuste de mensalidade de plano de saúde em decorrência da mudança de faixa etária de segurado idoso não configura, por si só, cláusula abusiva, devendo sua compatibilidade com a boa-fé objetiva e a equidade ser aferida em cada caso concreto. STJ. 2ª Seção. REsp 1280211/SP, Rel. Min. Marco Buzzi, julgado em 23/04/2014. Em regra, é válida a cláusula prevista em contrato de seguro-saúde que autoriza o aumento das mensalidades do seguro quando o usuário completar 60 anos de idade. Exceções. Essa cláusula será abusiva quando: a) não respeitar os limites e requisitos estabelecidos na Lei nº 9.656/98; ou b) aplicar índices de reajuste desarrazoados ou aleatórios, que onerem em demasia o segurado. STJ. 4ª Turma. REsp 1.381.606-DF, Rel. originária Min. Nancy Andrighi, Rel. para acórdão Min. João Otávio de Noronha, julgado em 7/10/2014 (Info 551).

DIREITO EMPRESARIAL

RECUPERAÇÃO JUDICIAL Súmula 581-STJ

Súmula 581-STJ: A recuperação judicial do devedor principal não impede o prosseguimento das ações e execuções ajuizadas contra terceiros devedores solidários ou coobrigados em geral, por garantia cambial, real ou fidejussória.

STJ. 2ª Seção. Aprovada em 14/09/2016, DJe 19/09/2016 (Info 590).

RECUPERAÇÃO JUDICIAL

A recuperação judicial surgiu para substituir a antiga “concordata” e tem por objetivo viabilizar a superação da situação de crise do devedor, a fim de permitir que a atividade empresária se mantenha e, com isso, sejam preservados os empregos dos trabalhadores e os interesses dos credores. A recuperação judicial consiste, portanto, em um processo judicial, no qual será construído e executado um plano com o objetivo de recuperar a empresa que está em vias de efetivamente ir à falência.

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Informativo 590-STJ (16/09 a 03/10/2016) – Esquematizado por Márcio André Lopes Cavalcante | 15

FASES DA RECUPERAÇÃO

De forma resumida, a recuperação judicial possui três fases: a) postulação: inicia-se com o pedido de recuperação e vai até o despacho de processamento; b) processamento: vai do despacho de processamento até a decisão concessiva; c) execução: da decisão concessiva até o encerramento da recuperação judicial. JUÍZO FALIMENTAR

A Lei nº 11.101/2005, em seu art. 3º, prevê que é competente para deferir a recuperação judicial o juízo do local do principal estabelecimento do devedor ou da filial de empresa que tenha sede fora do Brasil. A falência e a recuperação judicial são sempre processadas e julgadas na Justiça estadual. PLANO DE RECUPERAÇÃO

Em até 60 dias após o despacho de processamento da recuperação judicial, o devedor deverá apresentar em juízo um plano de recuperação da empresa, sob pena de convolação (conversão) do processo de recuperação em falência. Este plano deverá conter: discriminação pormenorizada dos meios de recuperação a serem empregados (art. 50); demonstração de sua viabilidade econômica; e laudo econômico-financeiro e de avaliação dos bens e ativos do devedor, subscrito por profissional

legalmente habilitado ou empresa especializada. Os credores analisam o plano apresentado, que pode ser aprovado ou não pela assembleia geral de credores. Credores são avisados sobre o plano, podendo apresentar objeções Após o devedor apresentar o plano de recuperação, o juiz ordenará a publicação de edital contendo aviso aos credores sobre o recebimento do plano e fixando prazo para a manifestação de eventuais objeções. Desse modo, os credores serão chamados a analisar esse plano e, se não concordarem com algo, poderão apresentar objeção. O prazo para os credores apresentarem objeções é de 30 dias. Se não houver objeção dos credores Caso nenhum credor apresente objeção ao plano no prazo fixado, considera-se que houve aprovação tácita. Nessa hipótese, não será necessária a convocação de assembleia-geral de credores para deliberar sobre o plano. Se houver objeção por parte dos credores Havendo objeção de algum credor, o juiz deverá convocar a assembleia-geral de credores para que ela decida sobre o plano de recuperação apresentado. A assembleia-geral, após as discussões e esclarecimentos pertinentes, poderá: a) aprovar o plano sem ressalvas; b) aprovar o plano com alterações; c) não aprovar o plano. Se o plano não for aprovado: o juiz decreta a falência (salvo na hipótese do art. 58, § 1º).

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Se o plano for aprovado: o juiz homologa a aprovação e concede a recuperação judicial, iniciando-se a fase de execução. Atenção: no regime atual, o plano de recuperação é aprovado pelos credores e apenas homologado pelo juiz. APROVADO O PLANO, OCORRE A NOVAÇÃO DOS CRÉDITOS ANTERIORES AO PEDIDO

A homologação do plano de recuperação judicial autoriza a retirada do nome da empresa recuperanda e dos seus respectivos sócios dos cadastros de inadimplentes, bem como a baixa de eventuais protestos existentes em nome destes? SIM. A atual Lei de Falências e Recuperação Judicial estabelece que o plano de recuperação judicial acarreta a novação dos créditos anteriores ao pedido:

Art. 59. O plano de recuperação judicial implica novação dos créditos anteriores ao pedido, e obriga o devedor e todos os credores a ele sujeitos, sem prejuízo das garantias, observado o disposto no § 1º do art. 50 desta Lei.

Qual é a consequência jurídica de haver a novação dos créditos? A novação ocorre, dentre outras hipóteses, quando o devedor contrai com o credor nova dívida para extinguir e substituir a anterior (art. 360, I, do CC). Desse modo, o que o art. 59 está afirmando é que, quando o plano de recuperação judicial é homologado, as dívidas que o devedor (recuperando) possuía com os credores são extintas e substituídas por outras novas obrigações. Como a novação induz a extinção da relação jurídica anterior, substituída por uma nova, não será mais possível falar em inadimplência do devedor com base na dívida extinta (Min. Nancy Andrighi). Diante disso, não se justifica a manutenção do nome da recuperanda ou de seus sócios em cadastros de inadimplentes em virtude da dívida novada. Assim, “a novação extingue a dívida anterior; estando o autor adimplente quanto ao novo débito, é ilícita a inscrição em órgãos de proteção ao crédito fundamentada em inadimplemento de parcela vencida anteriormente à novação” (AgRg no Ag 948.785/RS, 3ª Turma, Rel. Min. Ari Pargendler, DJe de 05.08.2008). Essa regra do art. 59 tem como norte a preocupação de recuperar a empresa em dificuldade financeira, atendendo ao chamado “princípio da preservação da empresa”. A novação decorrente da recuperação judicial implica a extinção de garantias que haviam sido prestadas aos credores? NÃO. A novação prevista no Código Civil extingue sim os acessórios e as garantias da dívida, sempre que não houver estipulação em contrário (art. 364). No entanto, na novação prevista no art. 59 da Lei nº 11.101/2005 ocorre justamente o contrário, ou seja, as garantias são mantidas, sobretudo as garantias reais, as quais só serão suprimidas ou substituídas “mediante aprovação expressa do credor titular da respectiva garantia”, por ocasião da alienação do bem gravado (art. 50, § 1º).

Novação do CC: em regra, extingue as garantias prestadas.

Novação da recuperação judicial: em regra, não extingue as garantias prestadas. Portanto, muito embora o plano de recuperação judicial opere novação das dívidas a ele submetidas, as garantias reais ou fidejussórias, de regra, são preservadas, circunstância que possibilita ao credor exercer seus direitos contra terceiros garantidores e impõe a manutenção das ações e execuções aforadas em face de fiadores, avalistas ou coobrigados em geral. STJ. 4ª Turma. REsp 1.326.888-RS, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 8/4/2014 (Info 540).

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Exemplo: A sociedade GW Ltda. emitiu uma nota promissória em favor da empresa X. Gabriel (sócio da GW) figurou como avalista na nota promissória, ou seja, ele ofereceu uma garantia pessoal de pagamento da dívida. Ocorre que a sociedade GW Ltda. requereu recuperação judicial e o plano foi aprovado. A empresa X ajuizou, então, execução de título extrajudicial cobrando de Gabriel o valor da nota promissória vencida. Gabriel defendeu-se alegando que, como foi aprovado o plano de recuperação judicial, houve novação e a execução deveria ser extinta. O STJ não concordou com a tese. Para a Corte, a homologação do plano de recuperação judicial da devedora principal não implica a extinção de execução de título extrajudicial ajuizada em face de sócio coobrigado. Conforme já explicado, muito embora o plano de recuperação judicial opere novação das dívidas anteriores, as garantias (reais ou fidejussórias), como regra, são preservadas. Logo, o aval (garantia) prestado por Gabriel não foi extinto com a aprovação do plano. Diante disso, o credor poderá exercer seus direitos contra Gabriel (terceiro garantidor), devendo, portanto, ser mantida a execução proposta contra ele. Qual é o fundamento legal para essa conclusão?

O § 1º do art. 49 da Lei n. 11.101/2005:

§ 1º Os credores do devedor em recuperação judicial conservam seus direitos e privilégios contra os coobrigados, fiadores e obrigados de regresso.

O STJ reafirmou esse entendimento em recurso especial repetitivo, fixando a seguinte tese: A recuperação judicial do devedor principal não impede o prosseguimento das execuções nem induz suspensão ou extinção de ações ajuizadas contra terceiros devedores solidários ou coobrigados em geral, por garantia cambial, real ou fidejussória, pois não se lhes aplicam a suspensão prevista nos arts. 6º, caput, e 52, inciso III, ou a novação a que se refere o art. 59, caput, por força do que dispõe o art. 49, § 1º, todos da Lei n. 11.101/2005. (STJ. 2ª Seção. REsp 1333349/SP, Rel. Min.Luis Felipe Salomão, julgado em 26/11/2014) Na I Jornada de Direito Comercial do CJF⁄STJ já havia sido aprovado enunciado espelhando a posição:

Enunciado 43: A suspensão das ações e execuções previstas no art. 6º da Lei n. 11.101⁄2005 não se estende aos coobrigados do devedor.

Agora o tema foi sumulado.

DIREITO PROCESSUAL CIVIL

JUSTIÇA GRATUITA Possibilidade de concessão de assistência judiciária gratuita

ao contratante de serviços advocatícios ad exitum

É possível o deferimento de assistência judiciária gratuita a jurisdicionado que tenha firmado com seu advogado contrato de honorários com cláusula ad exitum.

Obs: cláusula ad exitum (ou quota litis) é aquela na qual fica previsto que o advogado somente irá receber de seu cliente os honorários advocatícios contratuais ao final da causa, se esta for exitosa.

STJ. 2ª Turma. REsp 1.504.432-RJ, Rel. Min. Og Fernandes, julgado em 13/9/2016 (Info 590).

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Informativo 590-STJ (16/09 a 03/10/2016) – Esquematizado por Márcio André Lopes Cavalcante | 18

Imagine a seguinte situação hipotética: João propôs ação contra Pedro. Na petição inicial, o autor requereu os benefícios da justiça gratuita, ou seja, pediu para não pagar as custas judiciais e as despesas processuais, conforme previsto no art. 98 do CPC/2015:

Art. 98. A pessoa natural ou jurídica, brasileira ou estrangeira, com insuficiência de recursos para pagar as custas, as despesas processuais e os honorários advocatícios tem direito à gratuidade da justiça, na forma da lei.

O juiz proferiu o seguinte despacho: "Segundo o art. 98 do CPC/2015, os benefícios da justiça gratuita somente poderão ser deferidos para o jurisdicionado que não tenha condições de pagar as custas, as despesas processuais e os honorários advocatícios. Constato que o autor está sendo assistido juridicamente por advogado particular. Logo, presume-se que ele está pagando os honorários deste profissional ou que ele está trabalhando pro bono. Diante do exposto, como condição para o deferimento do benefício, intime-se o autor para que apresente declaração do advogado de que não está cobrando honorários advocatícios do requerente, havendo patrocínio gratuito incondicional." O autor respondeu ao despacho afirmando que celebrou com o advogado contrato ad exitum, ou seja, ele não pagou nada ainda e o profissional só receberá caso a ação seja julgada procedente, hipótese na qual o requerente entregará um percentual de 30% sobre o que vier a receber do réu. O que acontecerá neste caso? O autor terá direito ao benefício da justiça gratuita? SIM. É possível o deferimento de assistência judiciária gratuita a jurisdicionado que tenha firmado com seu advogado contrato de honorários com cláusula ad exitum. STJ. 2ª Turma. REsp 1.504.432-RJ, Rel. Min. Og Fernandes, julgado em 13/9/2016 (Info 590). O STJ possui entendimento consolidado no sentido de que a parte que celebrou com seu advogado contrato de honorários com cláusula ad exitum possui direito de receber os benefícios da justiça gratuita. Nesse sentido: STJ. 3ª Turma. REsp 1.404.556/RS, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 10/6/2014. Essa solução é consentânea com o propósito da Lei, pois garante ao cidadão de poucos recursos o direito de escolher o advogado que, aceitando o risco de não auferir remuneração no caso de indeferimento do pedido, melhor represente seus interesses em juízo. Além disso, esta exigência feita pelo magistrado de que o advogado deverá apresentar declaração de patrocínio gratuito incondicional não encontra previsão na lei, tendo sido, portanto, criado um novo requisito em afronta ao princípio da legalidade (art. 5º, II, da CF/88).

RECURSOS Possibilidade de aplicação da teoria da causa madura em julgamento de agravo de instrumento

Admite-se a aplicação da teoria da causa madura (art. 515, § 3º, do CPC/1973 / art. 1.013, § 3º do CPC/2015) em julgamento de agravo de instrumento.

Ex: o MP ingressou com ação de improbidade contra João, Paulo e Pedro pedindo a indisponibilidade dos bens dos requeridos. O juiz deferiu a medida em relação a todos eles, no entanto, na decisão não houve fundamentação quanto à autoria de Pedro. Diante disso, ele

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interpôs agravo de instrumento. O Tribunal, analisando o agravo, entendeu que a decisão realmente é nula quanto a Pedro por ausência de fundamentação. No entanto, em vez de mandar o juiz exarar nova decisão, o Tribunal decidiu desde lodo o mérito do pedido e deferiu a medida cautelar de indisponibilidade dos bens de Pedro, apontando os argumentos pelos quais este requerido também praticou, em tese, ato de improbidade.

STJ. Corte Especial. REsp 1.215.368-ES, Rel. Min. Herman Benjamin, julgado em 1/6/2016 (Info 590).

Julgamento do mérito diretamente pelo Tribunal ("teoria da causa madura") O CPC/1973, em seu art. 515, § 3º, permitia que o TJ ou o TRF, ao decidir a apelação interposta contra sentença terminativa, julgasse ele próprio (o Tribunal) o mérito da ação caso entendesse que o juiz não deveria ter extinguido o processo sem resolução do mérito. Ex: João ajuíza ação contra Pedro e o magistrado profere sentença extinguindo o processo sem resolução do mérito por entender que o autor seria parte ilegítima. João interpõe apelação ao TJ. O Tribunal analisa o recurso e entende que ele é sim parte legítima, ou seja, não havia razão jurídica para o magistrado ter extinguido o processo sem examinar o mérito. Em vez de mandar o processo de volta à 1ª instância, o próprio TJ poderá julgar o mérito da demanda. Para isso, no entanto, a causa tem que estar em condições de imediato julgamento (ex: se a sentença indeferiu a petição inicial, não há condições de o Tribunal julgar o mérito; ao contrário, se a sentença foi proferida após a fase instrutória, em tese, já haveria essa possibilidade). O CPC/2015 repetiu essa regra do Código revogado e foi além, trazendo mais três hipóteses em que o Tribunal, ao dar provimento à apelação, poderá julgar diretamente o mérito, sem ter que devolver a questão ao juiz. Nomenclatura Esse julgamento do mérito diretamente pelo Tribunal ficou conhecido na prática como "teoria da causa madura", ou seja, estando a causa "em condições de imediato julgamento" (leia-se: madura), o Tribunal já deverá decidir desde logo o mérito. Comparativo Com uma melhor redação, o CPC/2015 repetiu a regra do § 3º do art. 515 do Código passado. Além disso, acrescentou três novas hipóteses (incisos II, III e IV). Algumas delas já eram admitidas pela jurisprudência, mas agora constam expressamente na legislação. Compare:

CPC/1973 CPC/2015

Art. 515 (...) § 3º Nos casos de extinção do processo sem julgamento do mérito (art. 267), o tribunal pode julgar desde logo a lide, se a causa versar questão exclusivamente de direito e estiver em condições de imediato julgamento.

Art. 1.013. (...) § 3º Se o processo estiver em condições de imediato julgamento, o tribunal deve decidir desde logo o mérito quando: I - reformar sentença fundada no art. 485; II - decretar a nulidade da sentença por não ser ela congruente com os limites do pedido ou da causa de pedir; III - constatar a omissão no exame de um dos pedidos, hipótese em que poderá julgá-lo; IV - decretar a nulidade de sentença por falta de fundamentação.

Em provas de concurso, fiquem atentos para a redação dos incisos II a IV do § do art. 1.013 porque eles serão exaustivamente cobrados. Feitas estas considerações, imagine agora a seguinte situação hipotética: O Ministério Público ingressou com ação de improbidade contra João, Paulo e Pedro pedindo a indisponibilidade dos bens dos requeridos.

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O juiz, por meio de decisão interlocutória, deferiu a indisponibilidade em relação a todos eles, no entanto, na decisão não houve qualquer fundamentação quanto ao réu Pedro. Diante disso, ele interpôs agravo de instrumento contra a decisão. O Tribunal, analisando o agravo, decidiu que a decisão realmente é nula quanto a Pedro por ausência de fundamentação. No entanto, em vez de mandar o juiz exarar nova decisão, o Tribunal decidiu desde lodo o mérito do pedido e deferiu a medida cautelar de indisponibilidade dos bens de Pedro, apontando os argumentos pelos quais este requerido também praticou, em tese, ato de improbidade. Pedro interpôs recurso especial contra a decisão do Tribunal argumentando que o CPC, ao tratar sobre a teoria da causa madura, é expresso ao falar em "sentença". Além disso, o parágrafo que trata sobre esse assunto está inserido dentro do artigo que cuida da apelação. Assim, não seria possível a aplicação da teoria da causa madura para agravos de instrumento. Agiu corretamente o Tribunal neste caso? É possível que o Tribunal, ao julgar agravo de instrumento, aplique a teoria da causa madura e aprecie desde logo o mérito? SIM. Admite-se a aplicação da teoria da causa madura (art. 515, § 3º, do CPC/1973 / art. 1.013, § 3º do CPC/2015) em julgamento de agravo de instrumento. STJ. Corte Especial. REsp 1.215.368-ES, Rel. Min. Herman Benjamin, julgado em 1/6/2016 (Info 590). O entendimento adotado pelo STJ é amplamente aceito pela doutrina: "(...) Está aí, portanto, a questão da dimensão do disposto pelo novo parágrafo do art. 515 - se ele abrange apenas o recurso de apelação, ou também outros. Figure-se a hipótese da decisão interlocutória com que o juiz determina a realização de uma prova e a parte manifesta agravo de instrumento com o pedido de que essa prova não seja realizada: se o tribunal aceitar os fundamentos do recurso interposto, para que a prova não se realize, e entender também que nenhuma outra existe a ser realizada, é de rigor que passe desde logo ao julgamento do meritum causae, porque assim é o espírito da Reforma - acelerar a oferta da tutela jurisdicional, renegando mitos seculares, sempre que isso não importe prejuízo à efetividade das garantias constitucionais do processo nem prejuízo ilegítimo às partes (...)" (DINAMARCO, Cândido Rangel. A reforma da reforma. 6ª ed., São Paulo: Malheiros, 2003, p. 162-163). "Inclinamo-nos pela admissibilidade de aplicação do art. 515, §3º também ao agravo de instrumento. (...)" (WAMBIER, Teresa Arruda Alvim. Os agravos no CPC brasileiro. 4ª ed., São Paulo: RT, 2006, p. 350). "Cumpre esclarecer que o §3º do art. 515 não se restringe ao âmbito do recurso de apelação, sendo comum a todos os meios de impugnação, tendo em vista que, salvo exceções, a modificação legislativa não é restritiva, mas sim extensiva a todo o sistema recursal." (ROGRIGUES, Marcelo Abelha. Manual de Direito Processual Civil. 5ª ed., São Paulo, RT, p. 644). Já sob a égide do novo CPC, Daniel Assumpção Neves também defende o mesmo entendimento: "Conforme se nota da expressa previsão do art. 1.013, § 3.º, I, do Novo CPC, a norma diz respeito à apelação, sabidamente uma das espécies recursais. Ocorre, entretanto, que parcela considerável da doutrina entende ser a regra pertencente à teoria geral dos recursos. Dessa forma, defende-se a aplicação da regra em todo e qualquer recurso, em especial no agravo de instrumento (...)" (NEVES, Daniel Amorim Assumpção. Novo CPC comentado. Salvador: Juspodivm, 2016, p. 1.680).

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LIQUIDAÇÃO DE SENTENÇA É possível a utilização de deduções e presunções na apuração de lucros cessantes

É possível ao julgador, na fase de liquidação de sentença por arbitramento, acolher as conclusões periciais fundadas em presunções e deduções para a quantificação do prejuízo sofrido pelo credor a título de lucros cessantes.

A utilização de presunções não pode ser afastada de plano, uma vez que esta espécie de prova é utilizada pelo direito processual nacional como forma de facilitação de provas difíceis, desde que razoáveis.

Na apreciação de lucros cessantes, o julgador não pode se afastar de forma absoluta de presunções e deduções, porquanto deverá perquirir acerca dos benefícios legítimos que não foram realizados por culpa da parte ex adversa. Exigir prova absoluta do lucro que não ocorreu, seria impor ao lesado o ônus de prova impossível (prova diabólica).

STJ. 3ª Turma. REsp 1.549.467-SP, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, julgado em 13/9/2016 (Info 590).

O que é sentença líquida? Segundo posição majoritária, para o CPC, sentença líquida é aquela que define o quantum debeatur, ou seja, é aquela que fixa exatamente o valor da obrigação devida. Sentença deve ser líquida Em regra, o juiz deverá prolatar a sentença líquida (art. 491). O CPC prevê, no entanto, duas situações excepcionais em que será autorizado que o magistrado profira sentença ilíquida. Confira: REGRA (art. 491, caput): na ação de obrigação de pagar quantia, ainda que a parte tenha formulado pedido genérico, a decisão deverá definir desde logo a extensão da obrigação ("quanto se deve"), o índice de correção monetária, a taxa de juros, o termo inicial de ambos e a periodicidade da capitalização dos juros. EXCEÇÕES. Em duas situações será permitido que o magistrado deixe de fixar os parâmetros acima: a) quando não for possível determinar, de modo definitivo, na sentença, o montante devido; b) quando a apuração do valor devido depender da produção de prova de realização demorada ou excessivamente dispendiosa, assim reconhecida na sentença. Ocorrendo um desses dois casos, o valor devido deverá ser apurado por meio de liquidação de sentença. O que é a liquidação da sentença? A liquidação da sentença pode ser conceituada como a etapa do processo que ocorre após a fase de conhecimento e que se destina a descobrir o valor da obrigação (quantum debeatur) quando não foi possível fixar essa quantia diretamente na sentença. Objetivo da liquidação Descobrir o quantum debeatur e, assim, permitir o cumprimento da sentença (execução). Natureza A liquidação da sentença não gera um processo autônomo. Trata-se apenas de uma nova fase do processo. Sua natureza é, portanto, de fase procedimental. A liquidação tem natureza cognitiva, ou seja, trata-se de uma fase de conhecimento, não sendo considerada como uma fase executiva (execução). Espécies O art. 509 do CPC/2015 prevê apenas duas espécies de liquidação:

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POR ARBITRAMENTO PELO PROCEDIMENTO COMUM (antiga liquidação por artigos)

Ocorre quando for necessária a realização de uma PERÍCIA para se descobrir o quantum debeatur. A liquidação por arbitramento deverá ser feita quando: a) o magistrado assim determinar na sentença; b) as partes convencionarem que será feito dessa forma; c) a natureza do objeto da liquidação exigir que seja feita dessa forma. Requerida a liquidação por arbitramento, o juiz nomeará o perito e fixará o prazo para que ele entregue o seu laudo.

Ocorre quando for necessário alegar e provar um FATO NOVO para se descobrir o quantum debeatur. É utilizada quando forem necessários outros meios de prova para se determinar o valor da condenação, além da perícia. Deve-se esclarecer que, na liquidação por artigos, também pode ser realizada perícia se esta for necessária para provar um fato novo. O critério que a diferencia da liquidação por arbitramento é que na liquidação por artigos será necessário provar um fato novo. Obs.: fato novo é aquele que não tenha sido analisado e decidido durante o processo. Não significa necessariamente que tenha surgido após a sentença. Novo = ainda não apreciado no processo.

Prevista no art. 510: Art. 510. Na liquidação por arbitramento, o juiz intimará as partes para a apresentação de pareceres ou documentos elucidativos, no prazo que fixar, e, caso não possa decidir de plano, nomeará perito, observando-se, no que couber, o procedimento da prova pericial.

Prevista no art. 511: Art. 511. Na liquidação pelo procedimento comum, o juiz determinará a intimação do requerido, na pessoa de seu advogado ou da sociedade de advogados a que estiver vinculado, para, querendo, apresentar contestação no prazo de 15 (quinze) dias, observando-se, a seguir, no que couber, o disposto no Livro I da Parte Especial deste Código.

Ex.: João estava construindo um prédio, tendo essa construção causado danos na estrutura do imóvel vizinho. O juiz condena João a indenizar o autor da ação. Na fase de liquidação, um engenheiro irá fazer um laudo dos prejuízos causados.

Ex.: Pedro foi vítima de infecção hospitalar. O juiz condena o hospital a pagar todas as despesas que ele já teve por conta da moléstia, bem como as que ainda terá após a sentença. Na fase de liquidação da sentença, Pedro irá alegar e provar os gastos que teve após a sentença.

Algumas vezes a sentença traz todos os parâmetros para se encontrar o quantum debeatur, mas o valor exato da condenação dependerá de alguns cálculos aritméticos (ex: o juiz condena o réu a pagar 500 mil, acrescidos de multa de 2%, mais juros legais e correção monetária). Neste caso, será necessária realizar liquidação? NÃO. Quando a apuração do valor depender apenas de cálculo aritmético, o credor poderá promover, desde logo, o cumprimento da sentença (§ 2º do art. 509 do CPC). Nestes casos, o próprio credor (com o auxílio do seu advogado e de programas existentes na internet) elabora os cálculos e, após eles estarem prontos, apresenta-os em juízo, instaurando-se logo em seguida o cumprimento de sentença. Obs: na época do CPC/1973 isso era chamado de liquidação por mero cálculo aritmético (liquidação por cálculos do credor). O CPC/2015 deixou claro que esses cálculos aritméticos não são uma terceira espécie de liquidação e que só existem atualmente duas espécies: liquidação por arbitramento e pelo procedimento comum. Feita a revisão acima, imagine agora a seguinte situação hipotética: A indústria "AA" ingressou com ação de indenização contra a empresa "ZZ" por ela ter fornecido moldes errados, o que fez com que houvesse um paralisação na sua linha de produção. A demanda foi julgada procedente, tendo a ré sido condenada a pagar:

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a) danos emergentes, no valor de R$ 200 mil; b) lucros cessantes, a serem calculados em liquidação por arbitramento. Vale ressaltar que quando na sentença houver uma parte líquida e outra ilíquida, o credor poderá promover simultaneamente: 1) a execução da parte líquida e 2) a liquidação da outra parte (em autos apartados). Foi o que fez a indústria "AA". Iniciou-se, então, a liquidação por arbitramento. O perito nomeado pelo juízo calculou que o prejuízo da autora, a título de lucros cessantes, foi de R$ 300 mil. O juiz acatou as conclusões da perícia. A empresa devedora, contudo, não concordou com a decisão do juiz e recorreu alegando que a perícia chegou a esse valor baseada em presunções e deduções do quanto seria produzido e vendido e que essa metodologia não poderia ser aplicada na liquidação. A tese da empresa devedora foi aceita pelo STJ? NÃO. Os argumentos da empresa devedora não foram acolhidos pelo STJ e a decisão do juiz que acolheu a perícia foi mantida. É possível ao julgador, na fase de liquidação de sentença por arbitramento, acolher as conclusões periciais fundadas em presunções e deduções para a quantificação do prejuízo sofrido pelo credor a título de lucros cessantes. STJ. 3ª Turma. REsp 1.549.467-SP, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, julgado em 13/9/2016 (Info 590). As presunções não são apenas admitidas pelo direito processual, como em algumas situações são fundamentais para a decisão do juiz. Quando se fala em lucros cessantes estamos tratando sobre o ganho que a parte prejudicada deixou de obter e que ela conseguiria naturalmente com o exercício do seu trabalho normal. Na apuração dos lucros cessantes a utilização de deduções e presunções é, na maioria dos casos, imprescindível. Isso porque não se pode exigir do credor que aponte uma conta exata do quanto deixou de lucrar em decorrência do ato ilícito praticado pelo devedor, sob pena de se exigir do credor a prova de fatos que não aconteceram. Essa exigência é considerada como prova diabólica e impossível. O resultado disso seria praticamente negar a reparação integral do dano considerando que o credor não teria condições de provar algo que não ocorreu (um lucro que não aconteceu por culpa do devedor).

DIREITO PENAL

ARREPENDIMENTO POSTERIOR Não se aplica o arrependimento posterior em homicídio culposo na direção de veículo

Não se aplica o instituto do arrependimento posterior (art. 16 do CP) para o homicídio culposo na direção de veículo automotor (art. 302 do CTB) mesmo que tenha sido realizada composição civil entre o autor do crime a família da vítima.

Para que seja possível aplicar a causa de diminuição de pena prevista no art. 16 do CP é indispensável que o crime praticado seja patrimonial ou possua efeitos patrimoniais.

O arrependimento posterior exige a reparação do dano e isso é impossível no caso do homicídio.

STJ. 6ª Turma. REsp 1.561.276-BA, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, julgado em 28/6/2016 (Info 590).

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Arrependimento posterior O arrependimento posterior é previsto no art. 16 do Código Penal, nos seguintes termos:

Art. 16. Nos crimes cometidos sem violência ou grave ameaça à pessoa, reparado o dano ou restituída a coisa, até o recebimento da denúncia ou da queixa, por ato voluntário do agente, a pena será reduzida de 1/3 a 2/3.

Trata-se de um benefício ou prêmio para estimular o agente a restituir a coisa ou reparar os danos causados com sua conduta. Requisitos: 1) O crime deve ter sido praticado sem violência ou grave ameaça à pessoa. Se o agente praticou violência contra a coisa: pode receber o benefício. Se o agente praticou, culposamente, violência contra a pessoa: pode receber o benefício. O art. 16 vale para todos os crimes com que ele seja compatível, sem distinção, inclusive contra a Administração Pública. Assim, é errado pensar que o arrependimento posterior aplica-se apenas para os crimes contra o patrimônio. 2) O agente, voluntariamente, deve ter reparado o dano ou restituído a coisa. A reparação do dano ou restituição deve ser total ou pode ser parcial? A doutrina afirma que o benefício somente deveria ser concedido em caso de reparação integral. Vale ressaltar, no entanto, que a 1ª Turma do STF decidiu que a incidência do arrependimento posterior, contido no art. 16 do CP, prescinde da reparação total do dano. Em outras palavras, entendeu-se que a reparação poderia ser parcial (HC 98658/PR, red. p/ o acórdão Min. Marco Aurélio, julgado em 9/11/2010). 3) Essa reparação ou restituição deve ter acontecido antes do recebimento da denúncia ou queixa. Se for feita após o recebimento, o agente terá direito apenas à atenuante genérica prevista no art. 65, III, “b” do CP:

Art. 65 - São circunstâncias que sempre atenuam a pena: III - ter o agente: b) procurado, por sua espontânea vontade e com eficiência, logo após o crime, evitar-lhe ou minorar-lhe as consequências, ou ter, antes do julgamento, reparado o dano;

Redução A redução da pena, no caso de arrependimento posterior, varia de 1/3 a 2/3. Qual é o parâmetro para a redução? A 1ª Turma do STF já decidiu que o juiz, ao definir o quanto da pena será reduzido, deverá levar em consideração a extensão do ressarcimento (se total ou parcial) e também o momento de sua ocorrência. Assim, se a reparação for total e no mesmo dia dos fatos, a redução deve ser a máxima de 2/3 (HC 98658/PR, red. p/ o acórdão Min. Marco Aurélio, julgado em 9/11/2010). Comunicabilidade no concurso de pessoas O benefício do arrependimento posterior comunica-se aos coautores e partícipes que não tenham participado da restituição da coisa ou da reparação do dano. Assim, uma vez reparado o dano integralmente por um dos autores do delito, a causa de diminuição de pena do arrependimento posterior, prevista no art. 16 do CP, estende-se aos demais coautores. STJ. 6ª Turma. REsp 1.187.976-SP, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, julgado em 7/11/2013 (Info 531). Feita esta breve revisão, imagine a seguinte situação hipotética: João, na condução de um veículo automotor, atropelou Pedro, causando-lhe a morte.

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Duas semanas depois do ocorrido, João e os herdeiros de Pedro celebraram composição civil por meio do qual o autor do homicídio pagou indenização à família da vítima. Passadas mais algumas semanas, o Ministério Público denunciou João pela prática de homicídio culposo na direção de veículo automotor (art. 302 do CTB).

Diante disso, indaga-se: João poderá ser beneficiado com a causa de diminuição de pena do art. 16 do CP? O arrependimento posterior pode ser aplicado para o homicídio culposo na direção de veículo automotor? NÃO.

Não se aplica o instituto do arrependimento posterior (art. 16 do CP) para o homicídio culposo na direção de veículo automotor (art. 302 do CTB) mesmo que tenha sido realizada composição civil entre o autor do crime a família da vítima. Para que seja possível aplicar a causa de diminuição de pena prevista no art. 16 do CP é indispensável que o crime praticado seja patrimonial ou possua efeitos patrimoniais. STJ. 6ª Turma. REsp 1.561.276-BA, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, julgado em 28/6/2016 (Info 590).

O delito do art. 302 do CTB não é um crime patrimonial ou de efeito patrimonial. O bem jurídico por ele tutelado é a vida. Não se pode reconhecer o arrependimento posterior porque é impossível a reparação do dano cometido contra o bem jurídico "vida". Além disso, a vítima não poderá aproveitar a composição financeira realizada entre a sua família e o autor do crime. Sendo assim, inviável o reconhecimento do arrependimento posterior na hipótese de homicídio culposo na direção de veículo automotor.

LESÃO CORPORAL Perda de dois dentes configura lesão grave (e não gravíssima)

Importante!!!

A lesão corporal que provoca na vítima a perda de dois dentes tem natureza grave (art. 129, § 1º, III, do CP), e não gravíssima (art. 129, § 2º, IV, do CP).

A perda de dois dentes pode até gerar uma debilidade permanente (§ 1º, III), ou seja, uma dificuldade maior da mastigação, mas não configura deformidade permanente (§ 2º, IV).

§ 1º Se resulta: III - debilidade permanente de membro, sentido ou função;

§ 2º Se resulta: IV - deformidade permanente;

STJ. 6ª Turma. REsp 1.620.158-RJ, Rel. Min. Rogerio Schietti Cruz, julgado em 13/9/2016 (Info 590).

Lesão corporal grave e gravíssima O art. 129 do Código Penal prevê o crime de lesão corporal:

Art. 129. Ofender a integridade corporal ou a saúde de outrem: Pena - detenção, de três meses a um ano.

No § 1º deste artigo estão previstas as hipóteses de lesão corporal grave. Confira o inciso III:

§ 1º Se resulta: I - Incapacidade para as ocupações habituais, por mais de trinta dias; II - perigo de vida; III - debilidade permanente de membro, sentido ou função; IV - aceleração de parto: Pena - reclusão, de um a cinco anos.

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No § 2º, por sua vez, estão elencadas as hipóteses chamadas pela doutrina de lesão corporal gravíssima. Veja o que diz o inciso IV:

Art. 129 (...) § 2º Se resulta: I - Incapacidade permanente para o trabalho; II - enfermidade incuravel; III - perda ou inutilização do membro, sentido ou função; IV - deformidade permanente; V - aborto: Pena - reclusão, de dois a oito anos.

Imagine agora a seguinte situação hipotética: João estava dirigindo seu veículo quando discutiu com um motoqueiro. O motoqueiro seguiu seu caminho na rua, mas João, de forma raivosa e descontrolada, o seguiu acelerando o carro e, de forma voluntária e consciente, jogou seu veículo na traseira da motocicleta, acarretando a sua queda e arrastamento. Em virtude do ocorrido, o motoqueiro perdeu dois dentes e sofreu inúmeras escoriações. Segundo o exame de corpo de delito, a vítima sofreu a perda de elementos dentários, especificamente, o "incisivo central superior esquerdo" e o "incisivo lateral superior esquerdo". De acordo com os peritos, a lesão corporal noticiada resultou em deformidade permanente do ofendido. Qual o crime praticado, em tese, por João? A depender das circunstâncias do caso concreto, João poderia responder por: Tentativa de homicídio (se ficasse demonstrado que agiu com animus necandi, ou seja, com intenção

de matar, ainda que na forma de dolo eventual); ou Lesão corporal dolosa. Vale ressaltar que não há possibilidade de o agente responder pelo delito do art. 303 do CTB considerando que ele agiu com dolo (e não de forma culposa). O Ministério Público, com base no laudo pericial, denunciou o autor por lesão corporal gravíssima, afirmando que a perda dos incisivos superiores acarretou "deformidade permanente", nos termos do art. 129, § 4º, IV. O STJ concordou com esta tipificação? NÃO. A lesão corporal que provoca na vítima a perda de dois dentes tem natureza grave (art. 129, § 1º, III, do CP), e não gravíssima (art. 129, § 2º, IV, do CP). STJ. 6ª Turma. REsp 1.620.158-RJ, Rel. Min. Rogerio Schietti Cruz, julgado em 13/9/2016 (Info 590). A deformidade permanente prevista no art. 129, § 2º, IV, do CP é aquela irreparável, indelével. A perda da dentição pode implicar redução da capacidade mastigatória e até, eventualmente, dano estético. No entanto, não se pode considerar que se trate de algo tão grave a ponto de se dizer que se trata de uma pessoa "deformada". Desse modo, a perda dos dois dentes pode até gerar uma debilidade permanente, ou seja, uma dificuldade maior da mastigação, mas não configura deformidade permanente. A debilidade permanente é hipótese apenas de lesão corporal grave (§ 1º, III).

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Informativo 590-STJ (16/09 a 03/10/2016) – Esquematizado por Márcio André Lopes Cavalcante | 27

Existe um outro precedente do STJ no mesmo sentido:

(...) I. Hipótese em que a vítima, ao levar um soco na boca em meio a uma briga com colega, perdeu dois dentes inferiores. II. Impossibilidade de equiparação da hipótese dos autos, de amolecimento e perda de dois dentes em razão de um soco desferido na boca em meio a uma briga, com casos de mutilações de membros, de nariz ou orelhas, de cicatrizes grandes advindas de queimaduras a fogo ou por substâncias químicas, ocasionadas de forma violenta e dolosa, que só podem ser revertidas através de cirurgia plástica. III. Caracterização da qualificadora que necessita da aferição de critérios de índole subjetiva. IV. A deformidade permanente apta a caracterizar a qualificadora no inciso IV do § 2º do art. 129 do Código Penal, segundo parte da doutrina, precisa representar lesão estética de certa monta, capaz de produzir desgosto, desconforto a quem vê ou humilhação ao portador, não sendo qualquer dano estético ou físico. Embora se entenda que a deformidade não perde o caráter de permanente quando pode ser dissimulado por meios artificiais, ela precisa ser relevante. (...) STJ. 5ª Turma. REsp 1220094/MG, Rel. Min. Gilson Dipp, julgado em 22/02/2011.

ROUBO Súmula 582-STJ

Súmula 582-STJ: Consuma-se o crime de roubo com a inversão da posse do bem mediante emprego de violência ou grave ameaça, ainda que por breve tempo e em seguida à perseguição imediata ao agente e recuperação da coisa roubada, sendo prescindível a posse mansa e pacífica ou desvigiada.

STJ. 3ª Seção. Aprovada em 14/09/2016, DJe 19/09/2016 (Info 590).

Em que momento se consuma o crime de roubo? Existem quatro teorias sobre o tema: 1ª) Contrectacio: segundo esta teoria, a consumação se dá pelo simples contato entre o agente e a coisa alheia. Se tocou, já consumou. 2ª) Apprehensio (amotio): a consumação ocorre no momento em que a coisa subtraída passa para o poder do agente, ainda que por breve espaço de tempo, mesmo que o sujeito seja logo perseguido pela polícia ou pela vítima. Quando se diz que a coisa passou para o poder do agente, isso significa que houve a inversão da posse. Por isso, ela é também conhecida como teoria da inversão da posse. Vale ressaltar que, para esta corrente, o crime se consuma mesmo que o agente não fique com a posse mansa e pacífica. A coisa é retirada da esfera de disponibilidade da vítima (inversão da posse), mas não é necessário que saia da esfera de vigilância da vítima (não se exige que o agente tenha posse desvigiada do bem). 3ª) Ablatio: a consumação ocorre quando a coisa, além de apreendida, é transportada de um lugar para outro. 4ª) Ilatio: a consumação só ocorre quando a coisa é levada ao local desejado pelo ladrão para tê-la a salvo. Resumo. Para cada uma das quatros teorias, quando se consuma?

Contrectacio Apprehensio (amotio) Ablatio Ilatio

Tocar Inversão da posse Transportar Lugar seguro

Qual foi a teoria adotada pelo STF e STJ? A teoria da APPREHENSIO (AMOTIO). Nos países cujos Códigos Penais utilizam expressões como “subtrair” ou “tomar” para caracterizar o furto e o roubo (Alemanha e Espanha, por exemplo), predomina, na doutrina e na jurisprudência, a utilização da teoria da apprehensio (ou amotio). Foi a corrente também adotada no Brasil.

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O STJ, ao apreciar o tema sob a sistemática do recurso especial repetitivo, fixou a seguinte tese: Consuma-se o crime de roubo com a inversão da posse do bem, mediante emprego de violência ou grave ameaça, ainda que por breve tempo e em seguida a perseguição imediata ao agente e recuperação da coisa roubada, sendo prescindível a posse mansa e pacífica ou desvigiada. O tema agora se encontra sumulado. Exemplo concreto João apontou a arma de fogo para a vítima e disse: “perdeu, passa a bolsa”. A vítima entregou o aparelho e o assaltante subiu em cima de uma moto e fugiu. Duas ruas depois, João foi parado em uma blitz da polícia e, como não conseguiu explicar o motivo de estar com uma bolsa feminina e uma arma de fogo, acabou confessando a prática do delito. Assim, por ter havido a inversão, ainda que breve, da posse do bem subtraído, o fato em tela configura roubo consumado. STF Este é também o entendimento do STF:

Para a consumação do crime de roubo, basta a inversão da posse da coisa subtraída, sendo desnecessária que ela se dê de forma mansa e pacífica, como argumenta a impetrante. STF. 2ª Turma. HC 100.189/SP, Rel. Min. Ellen Gracie, DJe 16/4/2010.

É prescindível, para a consumação do roubo, que o agente consiga a posse tranqüila da coisa subtraída, mesmo que perseguido e preso por policiais logo após o fato. STF. 2ª Turma. HC 91.154/SP, Rel. Min. Joaquim Barbosa, DJe 19/12/2008.

Esta Corte tem entendimento firmado no sentido de que a prisão do agente, ocorrida logo após a subtração da coisa furtada, ainda sob a vigilância da vítima ou de terceira pessoa, não descaracteriza a consumação do crime de roubo. STF. 1ª Turma. HC 94.406/SP, Rel. Min. Menezes Direito, DJe 05/09/2008.

EXTORSÃO Incide a majorante do § 1º do art. 158 do CP no caso da extorsão qualificada

pela restrição da liberdade da vítima (§ 3º)

Importante!!!

O § 1º do art. 158 do CP prevê que se a extorsão é cometida por duas ou mais pessoas, ou com emprego de arma, a pena deverá ser aumentada de um terço até metade.

Essa causa de aumento prevista no § 1º do art. 158 do CP pode ser aplicada tanto para a extorsão simples (caput do art. 158) como também para o caso de extorsão qualificada pela restrição da liberdade da vítima (§ 3º).

Assim, é possível que o agente seja condenado por extorsão pela restrição da liberdade da vítima (§ 3º) e, na terceira fase da dosimetria, o juiz aumente a pena de 1/3 até 1/2 se o crime foi cometido por duas ou mais pessoas, ou com emprego de arma (§ 1º).

STJ. 5ª Turma. REsp 1.353.693-RS, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, julgado em 13/9/2016 (Info 590).

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Extorsão (art. 158 do CP) O Código Penal prevê o crime de extorsão nos seguintes termos:

Art. 158. Constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça, e com o intuito de obter para si ou para outrem indevida vantagem econômica, a fazer, tolerar que se faça ou deixar fazer alguma coisa: Pena - reclusão, de 4 (quatro) a 10 (dez) anos, e multa.

Em que consiste o delito: O agente, usando de violência ou de grave ameaça, obriga a vítima a adotar determinado comportamento, com o objetivo de obter uma vantagem econômica indevida. A vítima é coagida pelo autor do crime a fazer, tolerar que se faça ou deixar fazer alguma coisa. Ex.: “A” exige que “B” assine um cheque em branco em seu favor, senão contará a todos que “B” possui um caso extraconjugal. Ex.2: Golpe do falso sequestro via celular. “A” (de um presídio em SP) liga para “B” (em Brasília) e afirma que sua filha foi sequestrada exigindo, por meio de ameaças, depósito de dinheiro em determinada conta bancária. Obs: o juízo competente é o do local onde estava a pessoa que recebeu os telefonemas (STF ACO 889/RJ). Extorsão majorada

§ 1º - Se o crime é cometido por duas ou mais pessoas, ou com emprego de arma, aumenta-se a pena de um terço até metade.

Extorsão qualificada pelo resultado

§ 2º - Aplica-se à extorsão praticada mediante violência o disposto no § 3º do artigo anterior.

Extorsão mediante restrição da liberdade da vítima ("sequestro-relâmpago") O § 3º do art. 158 possui a seguinte redação:

§ 3º Se o crime é cometido mediante a restrição da liberdade da vítima, e essa condição é necessária para a obtenção da vantagem econômica, a pena é de reclusão, de 6 (seis) a 12 (doze) anos, além da multa; se resulta lesão corporal grave ou morte, aplicam-se as penas previstas no art. 159, §§ 2º e 3º, respectivamente. (Incluído pela Lei nº 11.923/2009)

O objetivo deste dispositivo foi o de punir o chamado "sequestro-relâmpago", também chamado de "saidinha", situação muito comum na qual o agente, mediante ameaça ou violência, leva a vítima consigo e fica com ela durante certo tempo com o objetivo de obter uma vantagem econômica (ex: sacar dinheiro no caixa eletrônico). Vale ressaltar, no entanto, que a Lei nº 11.923/2009 não criou um novo delito autônomo, chamado de "sequestro relâmpago", sendo isso apenas um desdobramento do crime de extorsão, uma vez que o legislador apenas definiu um modus operandi do referido delito. Causa de aumento de pena do § 1º pode ser aplicada para os casos de extorsão mediante restrição da liberdade da vítima? Imagine que João e Pedro praticaram a conduta descrita no § 3º do art. 158 do CP (sequestro-relâmpago). Neste caso, ao condenar os réus, é possível que o juiz aplique também a causa de aumento de pena prevista no § 1º? Em outras palavras, a causa de aumento de pena do § 1º, além de se aplicar para os casos de extorsão simples (caput), pode também incidir nas hipóteses de sequestro-relâmpago (§ 3º)? SIM. A causa de aumento de pena prevista no § 1º do art. 158 do CP é aplicável tanto na forma simples (caput) quanto nas formas qualificadas (§§ 2º e 3º) do delito de extorsão. Não existe nenhuma incompatibilidade entre a majorante prevista no § 1º e as qualificadoras do § 4º. São circunstâncias diversas, que incidem em momentos diferentes da aplicação da pena. Ainda que, topologicamente, a qualificadora do § 3º esteja situada após a causa especial de aumento de

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pena (§ 1º), isso, por si só, não é obstáculo para que a majorante incida no presente caso considerando que tal fato se deu por mera ausência de técnica legislativa. A causa de aumento prevista no § 1º do art. 158 do CP (concurso de pessoas ou emprego de arma) incide também para a extorsão qualificada pela restrição da liberdade da vítima (art. 158, § 3º, do CP). Assim, é possível que o agente seja condenado por extorsão pela restrição da liberdade da vítima (§ 3º do art. 158 do CP) e, na terceira fase da dosimetria, o juiz aumente a pena de 1/3 até 1/2 se o crime foi cometido por duas ou mais pessoas, ou com emprego de arma (§ 1º do art. 158). STJ. 5ª Turma. REsp 1.353.693-RS, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, julgado em 13/9/2016 (Info 590).

ART. 273 DO CP Venda de substâncias que estão na Portaria SVS/MS 344/98 e princípio da consunção

Se o agente criou farmácia de fachada para vender produtos falsificados destinados a fins terapêuticos ou medicinais, ele deverá responder pelo delito do art. 273 do CP (e não por este crime em concurso com tráfico de drogas), ainda que fique demonstrado que ele também mantinha em depósito e vendia alguns medicamentos e substâncias consideradas psicotrópicas no Brasil por estarem na Portaria SVS/MS nº 344/1998.

Assim, mesmo tendo sido encontradas algumas substâncias que podem ser classificadas como droga, o crime do art. 33 da Lei nº 11.343/2006 ficará absorvido pelo delito do art. 273 do CP, que possui maior abrangência. Aplica-se aqui o princípio da consunção.

STJ. 6ª Turma. REsp 1.537.773-SC, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, Rel. para acórdão Min. Rogerio Schietti Cruz, julgado em 16/8/2016 (Info 590).

Imagine a seguinte situação hipotética: João tinha muitos contatos no Paraguai que comercializavam remédios adulterados. Ele teve, então, uma ideia: decidiu montar uma farmácia de fachada ("Farmácia Farmaline"), fingindo que comercializaria remédios legalizados, mas, na verdade, iria vender mesmo era medicamentos falsificados. O negócio foi muito bem sucedido e João passou a vender centenas de medicamentos falsificados, dos mais variados tipos. Ocorre que a polícia descobriu o esquema criminoso, todos os medicamentos foram apreendidos e João foi preso. Dentre os remédios que havia local, a polícia encontrou alguns medicamentos que continham substâncias psicotrópicas, capazes de causar dependência. Foi o caso, por exemplo, do diazepam, que era importado do Paraguai, sem registro na Anvisa e vendido como calmante por João. Diante disso, como foram encontrados tanto remédios adulterados como também medicamentos nos quais há substâncias psicotrópicas, o Ministério Público entendeu que João praticou dois crimes em concurso: Art. 273 do CP, em relação aos medicamentos adulterados; Art. 33, caput, da Lei de Drogas, quanto aos medicamentos com substâncias psicotrópicas.

Art. 273. Falsificar, corromper, adulterar ou alterar produto destinado a fins terapêuticos ou medicinais: Pena - reclusão, de 10 (dez) a 15 (quinze) anos, e multa. § 1º - Nas mesmas penas incorre quem importa, vende, expõe à venda, tem em depósito para vender ou, de qualquer forma, distribui ou entrega a consumo o produto falsificado, corrompido, adulterado ou alterado. § 1º-A - Incluem-se entre os produtos a que se refere este artigo os medicamentos, as matérias-primas, os insumos farmacêuticos, os cosméticos, os saneantes e os de uso em diagnóstico. § 1º-B - Está sujeito às penas deste artigo quem pratica as ações previstas no § 1º em relação a produtos

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em qualquer das seguintes condições: I - sem registro, quando exigível, no órgão de vigilância sanitária competente; II - em desacordo com a fórmula constante do registro previsto no inciso anterior; III - sem as características de identidade e qualidade admitidas para a sua comercialização; IV - com redução de seu valor terapêutico ou de sua atividade; V - de procedência ignorada; VI - adquiridos de estabelecimento sem licença da autoridade sanitária competente.

Art. 33. Importar, exportar, remeter, preparar, produzir, fabricar, adquirir, vender, expor à venda, oferecer, ter em depósito, transportar, trazer consigo, guardar, prescrever, ministrar, entregar a consumo ou fornecer drogas, ainda que gratuitamente, sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar: Pena - reclusão de 5 (cinco) a 15 (quinze) anos e pagamento de 500 (quinhentos) a 1.500 (mil e quinhentos) dias-multa.

Vale ressaltar que as substâncias psicotrópicas encontradas no depósito de João, a exemplo do diazepam, estão listadas na Portaria SVS/MS nº 344/1998, que traz o rol das substâncias que são consideradas como "droga", para fins penais. A denúncia formulada pelo Ministério Público foi correta? NÃO. João deverá responder por um único crime, qual seja, o delito do art. 273 do CP. Princípio da consunção da única finalidade do agente No caso concreto temos uma hipótese de conflito aparente de normas penais, que deve ser resolvido pelo critério da absorção (também chamado de "princípio da consunção"). A intenção criminosa do agente, em última análise, era a de adquirir, ter em depósito, guardar, prescrever especificamente "produtos terapêuticos ou medicinais", utilizando-se, para tal finalidade, de uma farmácia de fachada, a qual ele denominou de "Farmácia Farmaline". Segundo decidiu o STJ, não se mostra plausível dizer que houve a prática de dois crimes distintos e em concurso material quando, em um mesmo cenário fático, se observa que a intenção criminosa era dirigida para uma única finalidade, perceptível, com clareza. Art. 273 do CP tem espectro mais amplo e completo que o tráfico de drogas Realmente, na farmácia do agente eram vendidos alguns medicamentos que continham, em sua composição, substâncias que estão previstas na Portaria da ANVISA como substâncias psicotrópicas no Brasil (exs: diazepam, zopiclona, zolpidem, bromazepam). Desse modo, é inegável que, dentre as substâncias encontradas, havia aquelas que, em princípio, caracterizariam o tráfico de drogas. A empreitada criminosa, no entanto, não foi dirigida para a prática do tráfico de drogas. A conduta do réu, desde o seu início, foi voltada para montar uma farmácia de fachada e com isso ser possível falsificar, manter em depósito e vender produtos falsificados destinados a fins terapêuticos e medicinais. Assim, a conduta do réu se amolda perfeitamente ao delito do art. 273 do CP e este delito possui espectro mais amplo e mais completo do que o tráfico de drogas. Por essa razão, o delito do art. 273 do CP deve absorver o crime do art. 33 da Lei nº 11.343/2006. O fato punido pelo art. 33 da Lei nº 11.343/2006 encontra-se, na inteireza, também sancionado pelo art. 273 do CP que deverá, portanto, prevalecer. Conclusão Se o agente criou farmácia de fachada para vender produtos falsificados destinados a fins terapêuticos ou medicinais, ele deverá responder pelo delito do art. 273 do CP (e não por este crime em concurso com tráfico de drogas), ainda que fique demonstrado que ele também vendia alguns medicamentos que

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contêm substâncias consideradas psicotrópicas no Brasil pela Portaria SVS/MS nº 344/1998. Assim, mesmo tendo sido encontradas algumas substâncias que podem ser classificadas como droga, o crime do art. 33 da Lei nº 11.343/2006 ficará absorvido pelo delito do art. 273 do CP, que possui maior abrangência. Aplica-se aqui o princípio da consunção. STJ. 6ª Turma. REsp 1.537.773-SC, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, Rel. para acórdão Min. Rogerio Schietti Cruz, julgado em 16/8/2016 (Info 590).

DIREITO PROCESSUAL PENAL

CONTROLE EXTERNO DA ATIVIDADE POLICIAL O MP, no exercício do controle externo da atividade policial, pode ter acesso às OMPs

Importante!!!

O Ministério Público, no exercício do controle externo da atividade policial, pode ter acesso a ordens de missão policial (OMP).

Ressalva: no que se refere às OMPs lançadas em face de atuação como polícia investigativa, decorrente de cooperação internacional exclusiva da Polícia Federal, e sobre a qual haja acordo de sigilo, o acesso do Ministério Público não será vedado, mas realizado a posteriori.

STJ. 1ª Turma. REsp 1.439.193-RJ, Rel. Min. Gurgel de Faria, julgado em 14/6/2016 (Info 587).

Controle da atividade policial O controle da atividade policial é realizado de duas formas: a) controle interno: feito por meio das corregedorias de polícia; b) controle externo: realizado por intermédio do Ministério Público. Controle externo da atividade policial Foi a Constituição Federal que determinou que uma das funções institucionais do Ministério Público é a de exercer o controle externo da atividade policial (art. 129, VII). Quais são as finalidades do controle externo realizado pelo MP? O MP, no exercício do controle externo, deverá fiscalizar, de forma geral, a atuação dos órgãos policiais, podendo ser citados como exemplos:

fiscalizar como tem sido o trabalho policial na prevenção e investigação dos crimes;

examinar se a polícia tem respeitado os direitos e garantias constitucionais dos presos que estejam sob sua responsabilidade;

conferir se os órgãos policiais estão dando devido cumprimento às determinações judiciais. Ausência de subordinação Vale ressaltar que o fato de o Ministério Público realizar o controle externo da atividade policial não significa que exista uma hierarquia entre os órgãos policiais e o Parquet. A polícia não está subordinada hierarquicamente ao Ministério Público. Este controle externo decorre do sistema de freios e contrapesos que pode existir não apenas entre os poderes, mas também entre órgãos. Nesse sentido: LIMA, Renato Brasileiro de. Manual de Processo Penal. Salvador: Juspodivm, 2015, p. 189. Disciplina legal A LC 75/93 dedicou três artigos para tratar sobre o controle externo da atividade policial. Chamo especial atenção para o art. 9º, que é o mais importante deles:

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Art. 3º O Ministério Público da União exercerá o controle externo da atividade policial tendo em vista: a) o respeito aos fundamentos do Estado Democrático de Direito, aos objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil, aos princípios informadores das relações internacionais, bem como aos direitos assegurados na Constituição Federal e na lei; b) a preservação da ordem pública, da incolumidade das pessoas e do patrimônio público; c) a prevenção e a correção de ilegalidade ou de abuso de poder; d) a indisponibilidade da persecução penal; e) a competência dos órgãos incumbidos da segurança pública.

Art. 9º O Ministério Público da União exercerá o controle externo da atividade policial por meio de medidas judiciais e extrajudiciais podendo: I - ter livre ingresso em estabelecimentos policiais ou prisionais; II - ter acesso a quaisquer documentos relativos à atividade-fim policial; III - representar à autoridade competente pela adoção de providências para sanar a omissão indevida, ou para prevenir ou corrigir ilegalidade ou abuso de poder; IV - requisitar à autoridade competente para instauração de inquérito policial sobre a omissão ou fato ilícito ocorrido no exercício da atividade policial; V - promover a ação penal por abuso de poder.

Art. 10. A prisão de qualquer pessoa, por parte de autoridade federal ou do Distrito Federal e Territórios, deverá ser comunicada imediatamente ao Ministério Público competente, com indicação do lugar onde se encontra o preso e cópia dos documentos comprobatórios da legalidade da prisão.

Apesar de esses artigos falarem sobre o MPU, eles também são aplicados aos Ministérios Públicos estaduais, por força do art. 80 da Lei nº 8.625/93. Existem duas Resoluções do CNMP que regulamentam o controle externo da atividade policial pelo Ministério Público:

Resolução nº 20/2007, que regulamenta o art. 9º da LC 75/93 e o art. 80 da Lei 8.625/93, disciplinando, no âmbito do Ministério Público, o controle externo da atividade policial.

Resolução nº 129/2015, que estabelece regras mínimas de atuação do Ministério Público no controle externo da investigação de morte decorrente de intervenção policial.

Obs: caso você esteja nas fases discursivas, prática ou oral do concurso do Ministério Público, recomenda-se a leitura dessas duas resoluções. Espécies de controle externo exercido pelo MP sobre a atividade policial:

Controle difuso Controle concentrado

Exercido por todos os membros do Ministério Público com atribuição criminal, quando do exame dos procedimentos que lhes forem atribuídos.

Exercido por alguns membros do MP que tenham a atribuição específica de realizar o controle externo da atividade policial, conforme disciplinado no âmbito de cada Ministério Público.

Ex: o membro do MP que atua na vara criminal, ao receber o inquérito policial, deverá verificar se a autoridade policial cumpriu todas as exigências legais, se os prazos foram cumpridos, se as diligências necessárias foram realizadas etc. Essa atividade consiste em uma forma de controle externo difuso da atividade policial.

Ex: no MPE, existem promotorias especializadas no controle externo da atividade policial (normalmente chamadas de PROCEAP). No âmbito do MPF, existe, em cada Estado, um grupo de Procuradores da República designados pelo PGR para exercer esta função (é o GCEAP). Os membros designados para essa função

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dedicam-se ao controle concentrado da atividade policial e poderão tomar diversas iniciativas, como: a) realizar visitas nas repartições policiais; b) fiscalizar a destinação de armas, drogas e objetos apreendidos; c) fiscalizar os mandados de prisão; d) expedir recomendações; e) instaurar inquéritos civis ou procedimentos de investigação criminal para apurar condutas policiais.

Obs: os controles difuso e concentrado não se excluem e são exercidos concomitantemente. Feitas estas considerações, imagine a seguinte situação hipotética: O Procurador da República, no exercício do controle externo da atividade policial, requisitou ao Superintendente de Polícia Federal no Estado as pastas com ordens de missão policial (OMP) expedidas nos últimos 12 (doze) meses. O pedido foi fundamentado no art. 9º, II, da LC 75/93 e no art. 5º, II, da Resolução 20/2007-CNMP:

Art. 9º O Ministério Público da União exercerá o controle externo da atividade policial por meio de medidas judiciais e extrajudiciais podendo: II - ter acesso a quaisquer documentos relativos à atividade-fim policial;

Art. 5º Aos órgãos do Ministério Público, no exercício das funções de controle externo da atividade policial, caberá: II – ter acesso a quaisquer documentos, informatizados ou não, relativos à atividade-fim policial civil e militar, incluindo as de polícia técnica desempenhadas por outros órgãos, em especial:

A Polícia Federal se recusou a remeter as ordens de missão policial (OMP) (listados no item "c") alegando que tais documentos não são relacionados com a atividade-fim policial. A questão chegou até o STJ. O pedido formulado pelo MPF, no presente caso, deverá ser atendido? SIM. O Ministério Público, no exercício do controle externo da atividade policial, pode ter acesso a ordens de missão policial. STJ. 1ª Turma. REsp 1.439.193-RJ, Rel. Min. Gurgel de Faria, julgado em 14/6/2016 (Info 587). A ordem de missão policial é um documento de natureza policial e obrigatório em qualquer missão de policiais federais e tem por objetivo, entre outros, legitimar as ações dos integrantes da Polícia Federal em caráter oficial. As denominadas ordens de missão policial, ainda que relacionadas à atividade de investigação policial, representam direta intervenção no cotidiano dos cidadãos, a qual deve estar sujeita ao controle de eventuais abusos ou irregularidades praticadas por seus agentes, ainda que realizadas em momento posterior, respeitada a necessidade de eventual sigilo ou urgência da missão. Por outro lado, a realização de qualquer investigação policial, ainda que fora do âmbito do inquérito policial, em regra, deve estar sujeita ao controle do Ministério Público. Portanto, é evidente que a pasta com ordens de missão policial (OMP) deve estar compreendida no conceito de atividade-fim e, consequentemente, sujeita ao controle externo do Ministério Público. Desse modo, deve a Polícia Federal fornecer ao MPF todos os documentos relativos as ordens de missão policial (OMP).

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Informativo 590-STJ (16/09 a 03/10/2016) – Esquematizado por Márcio André Lopes Cavalcante | 35

Ressalva Algumas vezes a Polícia Federal atua como polícia investigativa decorrente de cooperação internacional. Nestes casos, ela também expede ordens de missão policial para realizar as diligências investigativas. Ocorre que tais investigações são muitas vezes consideradas sigilosas por força de acordos internacionais. Em virtude disso, o STJ decidiu que o MPF somente poderá ter acesso as OMPs da Polícia Federal relacionadas com cooperação internacional depois que elas já tiverem sido cumpridas. Assim, "no que se refere às OMPs lançadas em face de atuação como polícia investigativa, decorrente de cooperação internacional exclusiva da Polícia Federal, e sobre a qual haja acordo de sigilo, o acesso do Ministério Público não será vedado, mas realizado a posteriori."

PROVAS É lícito o acesso aos dados armazenados em celular apreendido com base em autorização judicial

A obtenção do conteúdo de conversas e mensagens armazenadas em aparelho de telefone celular ou smartphones não se subordina aos ditames da Lei nº 9.296/96.

O acesso ao conteúdo armazenado em telefone celular ou smartphone, quando determinada judicialmente a busca e apreensão destes aparelhos, não ofende o art. 5º, XII, da CF/88, considerando que o sigilo a que se refere esse dispositivo constitucional é em relação à interceptação telefônica ou telemática propriamente dita, ou seja, é da comunicação de dados, e não dos dados em si mesmos.

Assim, se o juiz determinou a busca e apreensão de telefone celular ou smartphone do investigado, é lícito que as autoridades tenham acesso aos dados armazenados no aparelho apreendido, especialmente quando a referida decisão tenha expressamente autorizado o acesso a esse conteúdo.

STJ. 5ª Turma. RHC 75.800-PR, Rel. Min. Felix Fischer, julgado em 15/9/2016 (Info 590).

Imagine a seguinte situação hipotética: A Polícia Federal deflagrou operação policial para investigar delitos que teriam sido praticados por uma organização criminosa liderada por João. No curso do inquérito, o Delegado representou pela realização de diversas medidas cautelares, dentre elas a busca e apreensão na casa de João. O juiz deferiu as medidas cautelares e expressamente autorizou que fossem apreendidos telefones celulares (smartphones) do investigado, sendo autorizado o acesso ao seu conteúdo. Confira trecho da decisão: "Poderão ser apreendidos HDs, laptops, pen drives, smartphones, arquivos eletrônicos, de qualquer espécie, agendas manuscritas ou eletrônicas, dos investigados ou de suas empresas; (...) No desempenho desta atividade, poderão as autoridades acessar dados armazenados em eventuais computadores, arquivos eletrônicos de qualquer natureza, inclusive smartphones. Autorizo desde logo o acesso pelas autoridades policiais do conteúdo dos computadores e dispositivos no próprio local das buscas e de arquivos eletrônicos apreendidos, mesmo relativo a comunicações eventualmente registradas. (...) Consigne-se estas autorizações específicas no mandado." Os mandados de busca e apreensão foram cumpridos e a Polícia teve acesso e transcreveu no inquérito inúmeras conversas comprometedoras mantidas pelo investigado com outras pessoas e que estavam armazenadas no whatsapp de seu telefone celular.

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Informativo 590-STJ (16/09 a 03/10/2016) – Esquematizado por Márcio André Lopes Cavalcante | 36

O investigado impetrou habeas corpus alegando que foi ilícita a conduta dos policiais de terem acessado suas conversas registradas no aparelho celular. A tese foi acolhida pelo STJ? NÃO. Se o juiz determinou a busca e apreensão de telefone celular ou smartphone do investigado, é lícito que as autoridades tenham acesso aos dados armazenados no aparelho apreendido, especialmente quando a referida decisão tenha expressamente autorizado o acesso a esse conteúdo. STJ. 5ª Turma. RHC 75.800-PR, Rel. Min. Felix Fischer, julgado em 15/9/2016 (Info 590). A proteção do art. 5º, XII, da CF abrange apenas a comunicação de dados (e não os dados já armazenados) O art. 5º, XII, da CF/88 prevê a seguinte garantia:

XII - é inviolável o sigilo da correspondência e das comunicações telegráficas, de dados e das comunicações telefônicas, salvo, no último caso, por ordem judicial, nas hipóteses e na forma que a lei estabelecer para fins de investigação criminal ou instrução processual penal;

Analisando o texto da CF/88, percebe-se que o constituinte procurou proteger quatro liberdades: a) a comunicação de correspondência; b) a comunicação telegráfica; c) a comunicação de dados; e d) a comunicação telefônica. O sigilo que a Constituição Federal protege é apenas relacionado com a "comunicação" em si e não abrange os dados já armazenados. Em outras palavras, a CF só protege a efetiva troca de informações. Este é o objeto tutelado pela norma inserta no art. 5º, inciso XII, da Constituição da República. Os arquivos contidos no aparelho celular, por exemplo, não são protegidos pelo texto constitucional. Nesse sentido:

(...) A proteção a que se refere o art. 5º, XII, da Constituição, é da 'comunicação de dados' e não dos 'dados em si mesmos', ainda quando armazenados em computador. (cf. voto no MS 21.729, Pleno, 5.10.95, red. Néri da Silveira - RTJ 179⁄225, 270). STF. Plenário. RE n. 418416-8, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, DJ de 19/12/2006.

Lei nº 9.296/96 protege apenas o fluxo de comunicações (e não os dados obtidos e armazenados) A Lei nº 9.296/96 foi editada com o objetivo de regulamentar o art. 5º, XII, da CF/88 e ela dispõe em seu art. 1º, parágrafo único:

Art. 1º A interceptação de comunicações telefônicas, de qualquer natureza, para prova em investigação criminal e em instrução processual penal, observará o disposto nesta Lei e dependerá de ordem do juiz competente da ação principal, sob segredo de justiça. Parágrafo único. O disposto nesta Lei aplica-se à interceptação do fluxo de comunicações em sistemas de informática e telemática.

Ao analisar este art. 1º, percebe-se que houve uma preocupação do legislador em distinguir duas situações diferentes: "fluência da comunicação em andamento" e "dados obtidos como consequência desse diálogo". Em outros termos, comunicações em andamento não se confundem como os dados da comunicação já armazenados. O parágrafo único do art. 1º é enfático ao proteger apenas o "fluxo de comunicações em sistemas de informática e telemática", ou seja, ele somente resguarda a integridade do curso da conversa que é desenvolvida pelos interlocutores. A Lei nº 9.296/96 não proíbe que as autoridades policiais tenham conhecimento do conteúdo dessa comunicação depois que elas ocorreram caso fiquem armazenadas no computador, celular etc (sistemas de informática e telemática). Entende-se que cada interlocutor poderia ter excluído a informação e se não o fez, não poderá invocar a Lei nº 9.296/96.

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Marco Civil da Internet protege o sigilo das comunicações privadas armazenadas Por outro lado, a Lei nº 12.965/2014, que regulamenta os direitos e deveres para o uso da internet no Brasil (Marco Civil da Internet), protege as conversas armazenadas, conforme se observa em seu art. 7º, III:

Art. 7º O acesso à internet é essencial ao exercício da cidadania, e ao usuário são assegurados os seguintes direitos: III - inviolabilidade e sigilo de suas comunicações privadas armazenadas, salvo por ordem judicial.

No caso concreto, contudo, houve a autorização judicial exigida pela lei, tendo o magistrado, inclusive, sido expresso ao permitir o acesso aos dados contidos nos smartphones apreendidos. Situação diferente do RHC 51.531-RO Vale ressaltar que o caso acima explicado é diferente do RHC 51.531-RO, divulgado no Informativo 583. Neste precedente, cuidava-se de prisão em flagrante no curso da qual se apreendeu aparelho de telefone celular e a polícia acessou as conversas do whatsapp sem autorização judicial. Na situação agora comentada (RHC 75.800-PR), houve autorização judicial. Relembre abaixo o que foi decidido no RHC 51.531-RO: Sem prévia autorização judicial, são nulas as provas obtidas pela polícia por meio da extração de dados e de conversas registradas no whatsapp presentes no celular do suposto autor de fato delituoso, ainda que o aparelho tenha sido apreendido no momento da prisão em flagrante. STJ. 6ª Turma. RHC 51.531-RO, Rel. Min. Nefi Cordeiro, julgado em 19/4/2016 (Info 583).

INDENIZAÇÃO POR ERRO JUDICIÁRIO Indenização em razão de equívoco no reconhecimento de reincidência

Os efeitos deletérios da reincidência perduram pelo prazo máximo de cinco anos, contados da data do cumprimento ou da extinção da pena (art. 64, I, do CP).

No caso em que o reconhecimento da reincidência tenha origem em infração anterior cuja pena tenha sido cumprida ou extinta há mais de 5 anos, deferido o pedido revisional para diminuir a pena equivocadamente fixada, será devida a indenização ao condenado que tenha sofrido prejuízos em virtude do erro judiciário.

Ex: João praticou tráfico de drogas, foi condenado e terminou de cumprir sua pena em 02/02/2010. Em 03/03/2015, ou seja, mais de 5 anos depois de ter cumprido a pena, ele comete novo tráfico de drogas. João foi condenado pelo novo tráfico e na 2ª fase da dosimetria, o juiz aumentou a pena do réu reconhecendo que ele seria reincidente. Por conta desse reconhecimento, a pena de João foi aumentada em mais 1 ano. Além disso, como reincidente específico a execução penal de João ficou submetida a critérios mais rígidos para progressão de regime (art. 2º, § 2º, da Lei nº 8.072/90). A defesa ingressa com revisão criminal alegando que a sentença violou o art. 64, I, do CP. O Tribunal, ao julgar procedente a revisão, deverá condenar o Poder Público a indenizar o réu pelos prejuízos sofridos (art. 630 do CPP).

STJ. 5ª Turma. REsp 1.243.516-SP, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, julgado em 22/9/2016 (Info 590).

O que é reincidência? A definição de reincidência, para o Direito Penal brasileiro, é encontrada a partir da conjugação do art. 63 do CP com o art. 7º da Lei de Contravenções Penais. Com base nesses dois dispositivos, podemos encontrar as hipóteses em que alguém é considerado reincidente para o Direito Penal (inspirado no quadro contido no livro de CUNHA, Rogério Sanches. Manual de Direito Penal. Salvador: JusPodivm, 2013, p. 401):

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Informativo 590-STJ (16/09 a 03/10/2016) – Esquematizado por Márcio André Lopes Cavalcante | 38

Se a pessoa é condenada definitivamente por

E depois da condenação definitiva pratica novo(a)

Qual será a consequência?

CRIME (no Brasil ou exterior)

CRIME REINCIDÊNCIA

CRIME (no Brasil ou exterior)

CONTRAVENÇÃO (no Brasil)

REINCIDÊNCIA

CONTRAVENÇÃO (no Brasil)

CONTRAVENÇÃO (no Brasil)

REINCIDÊNCIA

CONTRAVENÇÃO (no Brasil)

CRIME NÃO HÁ reincidência. Foi uma falha da lei.

Mas gera maus antecedentes.

CONTRAVENÇÃO (no estrangeiro)

CRIME ou CONTRAVENÇÃO NÃO HÁ reincidência.

Contravenção no estrangeiro não influi aqui.

A reincidência é uma agravante da pena Se o réu for reincidente, sofrerá diversos efeitos negativos no processo penal. O principal deles é que, no momento da dosimetria da pena em relação ao segundo delito, a reincidência será considerada como uma agravante genérica (art. 61, I do CP), fazendo com que a pena imposta seja maior do que seria devida caso ele fosse primário.

Art. 61. São circunstâncias que sempre agravam a pena, quando não constituem ou qualificam o crime: I — a reincidência;

Os efeitos negativos da reincidência duram para sempre? NÃO. Os efeitos deletérios da reincidência perduram pelo prazo máximo de cinco anos, contados da data do cumprimento ou da extinção da pena. Após esse período, ocorre a caducidade da condenação anterior para fins de reincidência. É o que afirma o art. 64, I, do CP:

Art. 64. Para efeito de reincidência: I — não prevalece a condenação anterior, se entre a data do cumprimento ou extinção da pena e a infração posterior tiver decorrido período de tempo superior a 5 (cinco) anos, computado o período de prova da suspensão ou do livramento condicional, se não ocorrer revogação;

Assim, diz-se que, em tema de reincidência, o Código Penal adota o sistema da temporariedade, uma vez que os efeitos negativos da reincidência duram apenas por determinado período de tempo. O prazo de 5 anos em que a reincidência ainda vigora é chamado de “período depurador”. Curiosidade: na redação original do Código Penal (antes da Reforma de 1984), vigorava o sistema da perpetuidade, ou seja, os efeitos negativos da reincidência duravam para sempre. Feitas esta breve revisão, imagine a seguinte situação hipotética: João praticou tráfico de drogas, foi condenado e terminou de cumprir sua pena em 02/02/2010. Em 03/03/2015, ou seja, mais de 5 anos depois de ter cumprido a pena, ele comete novo tráfico de drogas. João foi condenado pelo novo tráfico e na 2ª fase da dosimetria, o juiz aumentou a pena do réu reconhecendo que ele seria reincidente, o que é considerada uma agravante. Por conta do reconhecimento da reincidência, a pena de João foi aumentada em mais 1 ano. Além disso, como reincidente específico a execução penal de João ficou submetida a critérios mais rígidos para progressão de regime (art. 2º, § 2º, da Lei nº 8.072/90).

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Agiu corretamente o juiz? NÃO. Conforme vimos acima, os efeitos deletérios da reincidência perduram pelo prazo máximo de cinco anos, contados da data do cumprimento ou da extinção da pena (art. 64, I, do CP). Como esse prazo já havia se passado, o magistrado não poderia ter utilizado este condenação anterior como reincidência (agravante). Revisão criminal Apesar do erro do juiz, o advogado dativo do condenado não recorreu e o processo transitou em julgado. João começou a cumprir pena e alguns anos depois a Defensoria Pública passou a fazer a assistência jurídica do réu. O Defensor Público percebeu que o magistrado, na sentença, violou o art. 64, I, do CP e, diante disso, ingressou com revisão criminal com fundamento no art. 621, I, do CPP:

Art. 621. A revisão dos processos findos será admitida: I - quando a sentença condenatória for contrária ao texto expresso da lei penal ou à evidência dos autos;

A defesa demonstrou que, não fosse o erro judiciário, João já teria obtido a progressão de regime. O Tribunal julgou procedente a revisão criminal e, com isso, reduziu em 1 ano a pena do réu. Neste caso, o réu poderá também ser indenizado por conta do erro judiciário de que foi vítima? SIM. Esta possibilidade encontra-se prevista expressamente no art. 5º, LXXV, da CF/88 e no art. 630 do CPP:

Art. 5º (...) LXXV - o Estado indenizará o condenado por erro judiciário, assim como o que ficar preso além do tempo fixado na sentença;

Art. 630. O tribunal, se o interessado o requerer, poderá reconhecer o direito a uma justa indenização pelos prejuízos sofridos.

Quem pagará esta indenização? Se o processo era da Justiça Federal ou da Justiça do DF: a União; Se o processo era da Justiça Estadual: o respectivo Estado-membro. Situações em que a indenização não é devida O CPP prevê algumas hipóteses nas quais a indenização não será devida: a) se o erro ou a injustiça da condenação decorrer de ato ou falta imputável ao próprio impetrante, como a confissão ou a ocultação de prova em seu poder; b) se a acusação houver sido meramente privada. A situação concreta não se enquadrava em nenhuma dessas hipóteses, razão pela qual João terá direito à indenização. Veja o que decidiu o STJ:

No caso em que o reconhecimento da reincidência tenha origem em infração anterior cuja pena tenha sido cumprida ou extinta há mais de 5 anos, deferido o pedido revisional para diminuir a pena equivocadamente fixada, será devida a indenização ao condenado que tenha sofrido prejuízos em virtude do erro judiciário. STJ. 5ª Turma. REsp 1.243.516-SP, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, julgado em 22/9/2016 (Info 590). Informação adicional. Vamos voltar no tempo. Em vez de valorar o primeiro crime como reincidência, o juiz poderia ter utilizado a primeira condenação como maus antecedentes? Após o período depurador, ainda é possível considerar a condenação como maus antecedentes?

SIM. Posição do STJ NÃO. Posição do STF

Para o entendimento pacificado no STJ, mesmo A existência de condenação anterior, ocorrida em

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ultrapassado o lapso temporal de cinco anos, a condenação anterior transitada em julgado pode ser considerada como maus antecedentes, nos termos do art. 59 do CP. “Apesar de desaparecer a condição de reincidente, o agente não readquire a condição de primário, que é como um estado de virgem, que, violado, não se refaz. A reincidência é como o pecado original: desaparece, mas deixa sua mancha, servindo, por exemplo, como antecedente criminal (art. 59, caput)” (BITENCOURT, Cezar Roberto. Código Penal Comentado. São Paulo: Saraiva, 2007, p. 238).

prazo superior a cinco anos, contado da extinção da pena, também não poderá ser considerada como maus antecedentes. Após o prazo de cinco anos previsto no art. 64, I, do CP, cessam não apenas os efeitos decorrentes da reincidência, mas também quaisquer outras valorações negativas por condutas pretéritas praticadas pelo agente. Ora, se essas condenações não mais servem para o efeito da reincidência, com muito maior razão não devem valer para fins de antecedentes criminais. “O homem não pode ser penalizado eternamente por deslizes em seu passado, pelos quais já tenha sido condenado e tenha cumprido a reprimenda que lhe foi imposta em regular processo penal. Faz ele jus ao denominado ‘direito ao esquecimento’, não podendo perdurar indefinidamente os efeitos nefastos de uma condenação anterior, já regularmente extinta.” (Min. Dias Toffoli). Esse lapso de cinco anos é chamado de "período depurador".

Reincidência: sistema da temporariedade. Maus antecedentes: sistema da perpetuidade.

Tanto a reincidência como os maus antecedentes obedecem ao sistema da temporariedade.

STJ. 5ª Turma. AgRg no HC 323.661/MS, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, julgado em 01/09/2015 STJ. 6ª Turma. HC 240.022/SP, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, julgado em 11/03/2014.

STF. 1ª Turma. HC 119200, Rel. Min. Dias Toffoli, julgado em 11/02/2014. STF. 2ª Turma. HC 126315/SP, Rel. Min. Gilmar Mendes, julgado em 15/9/2015 (Info 799).

SAÍDA TEMPORÁRIA Possibilidade de concessão de mais de cinco saídas temporárias por ano

Prazo mínimo entre saídas temporárias Possibilidade de fixação de calendário anual de saídas temporárias por ato judicial único

Competência do juiz da execução para fixação do calendário prévio de saídas temporárias

Importante!!!

Atualize seus livros!

Possibilidade de concessão de mais de cinco saídas temporárias por ano

Respeitado o limite anual de 35 dias, estabelecido pelo art. 124 da LEP, é cabível a concessão de maior número de autorizações de curta duração.

Prazo mínimo entre saídas temporárias

As autorizações de saída temporária para visita à família e para participação em atividades que concorram para o retorno ao convívio social, se limitadas a cinco vezes durante o ano, deverão observar o prazo mínimo de 45 dias de intervalo entre uma e outra. Na hipótese de

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maior número de saídas temporárias de curta duração, já intercaladas durante os doze meses do ano e muitas vezes sem pernoite, não se exige o intervalo previsto no art. 124, § 3º, da LEP.

Possibilidade de fixação de calendário anual de saídas temporárias por ato judicial único

É recomendável que cada autorização de saída temporária do preso seja precedida de decisão judicial motivada. Entretanto, se a apreciação individual do pedido estiver, por deficiência exclusiva do aparato estatal, a interferir no direito subjetivo do apenado e no escopo ressocializador da pena, deve ser reconhecida, excepcionalmente, a possibilidade de fixação de calendário anual de saídas temporárias por ato judicial único, observadas as hipóteses de revogação automática do art. 125 da LEP.

Competência do juiz da execução para fixação do calendário prévio de saídas temporárias

O calendário prévio das saídas temporárias deverá ser fixado, obrigatoriamente, pelo Juízo das Execuções, não se lhe permitindo delegar à autoridade prisional a escolha das datas específicas nas quais o apenado irá usufruir os benefícios.

STJ. 3ª Seção. REsp 1.544.036-RJ, Rel. Min. Rogerio Schietti Cruz, julgado em 14/9/2016 (recurso repetitivo) (Info 590).

NOÇÕES GERAIS

O que é a saída temporária? Saída temporária é... - uma autorização concedida pelo juiz da execução penal - aos condenados que cumprem pena em regime semiaberto - por meio da qual ganham o direito de saírem temporariamente do estabelecimento prisional - sem vigilância direta (sem guardas acompanhando/sem escolta) - com o intuito de:

a) visitarem a família; b) frequentarem curso supletivo profissionalizante, de ensino médio ou superior; ou c) participarem de outras atividades que ajudem para o seu retorno ao convívio social.

Obs: o juiz pode determinar que, durante a saída temporária, o condenado fique utilizando um equipamento de monitoração eletrônica (tornozeleira eletrônica).

Obs2: os presos provisórios que já foram condenados (ainda sem trânsito em julgado) e estão cumprindo a pena no regime semiaberto podem ter direito ao benefício da saída temporária, desde que preencham os requisitos legais que veremos abaixo.

Previsão

A saída temporária encontra-se disciplinada nos arts. 122 a 125 da Lei n. 7.210/84 (LEP).

Quem concede a saída temporária? A autorização para saída temporária será concedida por ato motivado do Juiz da execução, devendo este ouvir antes o Ministério Público e a administração penitenciária, que irão dizer se concordam ou não com o benefício.

Requisitos A concessão da saída temporária dependerá da satisfação dos seguintes requisitos (art. 123 da LEP):

I - comportamento adequado do reeducando; É chamado de requisito subjetivo. Normalmente isso é provado por meio da certidão carcerária fornecida pela administração penitenciária.

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II - cumprimento mínimo de 1/6 da pena (se for primário) e 1/4 (se reincidente). Trata-se do requisito objetivo. Deve-se lembrar que o apenado só terá direito à saída temporária se estiver no regime semiaberto. No entanto, a jurisprudência permite que, se ele começou a cumprir a pena no regime fechado e depois progrediu para o semiaberto, aproveite o tempo que esteve no regime fechado para preencher esse requisito de 1/6 ou 1/4. Em outras palavras, ele não precisa ter 1/6 ou 1/4 da pena no regime semiaberto. Poderá se valer do tempo que cumpriu no regime fechado para preencher o requisito objetivo. Com outras palavras, foi isso o que o STJ quis dizer ao editar a Súmula 40: “Para obtenção dos benefícios de saída temporária e trabalho externo, considera-se o tempo de cumprimento da pena no regime fechado.” III - compatibilidade do benefício com os objetivos da pena.

Ressalte-se que o simples fato de o condenado que cumpria pena no regime fechado ter ido para o regime semiaberto não significa que, automaticamente, ele terá direito ao benefício da saída temporária. Isso porque o juiz deverá analisar se ele preenche os demais requisitos do art. 123 da LEP (STJ. 6ª Turma. RHC 49.812/BA, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, julgado em 06/11/2014). Quantidade de saídas por ano e tempo de duração

Regras gerais:

Cada preso terá o máximo de 5 saídas temporárias por ano (1 mais 4 renovações).

Cada saída temporária tem duração máxima de 7 dias. Em outras palavras, o preso receberá a autorização para ficar 7 dias fora do estabelecimento prisional.

Peculiaridade: no caso da saída temporária para estudo, o prazo será igual ao que for necessário para o exercício das atividades discentes (ex: pode ser autorizada a saída temporária todos os dias).

Recomendo ler o art. 124 porque as vezes ele é cobrado literalmente nas provas:

Art. 124. A autorização será concedida por prazo não superior a 7 (sete) dias, podendo ser renovada por mais 4 (quatro) vezes durante o ano. (...) § 2º Quando se tratar de frequência a curso profissionalizante, de instrução de ensino médio ou superior, o tempo de saída será o necessário para o cumprimento das atividades discentes.

Prazo máximo de 35 dias divididos em menos tempo, com mais saídas por ano: Vimos acima que, como regra, por ano, o apenado tem direito a 5 saídas temporárias, cada uma de, no máximo, 7 dias. Isso significa que, somando todas as 5, a pessoa tem direito a, no máximo, 35 dias de saída temporária por ano. Diante disso, surgiu a seguinte dúvida: seria possível que o condenado tivesse mais que 5 saídas por ano, se fosse respeitado o prazo máximo de 35 dias por ano? A jurisprudência entendeu que sim. Para o STJ, podem ser concedidas mais que 5 saídas temporárias ao longo do ano, desde que seja respeitado o prazo máximo de 35 dias por ano. Ex: o juiz pode autorizar que o condenado saia 7 vezes por ano, desde que em cada uma dessas saídas ele só fique até 5 dias fora, com o objetivo de não extrapolar o limite anual de 35 dias por ano. O art. 124, caput, deve ser interpretado teleologicamente e conceder maior número de saídas temporárias, com menor duração é uma providência que ajuda no processo reeducativo e de reinserção gradativa do apenado ao convívio social. Essa conclusão do STJ foi transformada em tese para fins de recursos repetitivos:

Respeitado o limite anual de 35 dias, estabelecido pelo art. 124 da LEP, é cabível a concessão de maior número de autorizações de curta duração.

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STJ. 3ª Seção. REsp 1.544.036-RJ, Rel. Min. Rogerio Schietti Cruz, julgado em 14/9/2016 (recurso repetitivo) (Info 590). PRAZO MÍNIMOS ENTRE AS SAÍDAS TEMPORÁRIAS

Existe algum prazo mínimo que deverá ser observada entre uma saída temporária e outra. Ex: o apenado recebeu saída temporária hoje, ele terá que esperar algum tempo para ter direito novamente ao benefício? 1) Se a saída temporária tiver como objetivo permitir que o apenado estude: NÃO. No caso da saída temporária para estudo, o prazo será igual ao que for necessário para o exercício das atividades discentes. Assim, poderá ser autorizada a saída temporária todos os dias, por exemplo. É o que prevê o § 2º do art. 124 da LEP:

Art. 124. (...) § 2º Quando se tratar de frequência a curso profissionalizante, de instrução de ensino médio ou superior, o tempo de saída será o necessário para o cumprimento das atividades discentes.

2) Se a saída temporária tiver como objetivo permitir que o preso visite a família ou participe de atividades que o ajudem a retornar ao convívio social: SIM. Neste caso, a LEP prevê um prazo mínimo de 45 dias entre uma saída e outra. Veja:

Art. 124 (...) § 3º Nos demais casos, as autorizações de saída somente poderão ser concedidas com prazo mínimo de 45 (quarenta e cinco) dias de intervalo entre uma e outra.

Situação em que não se aplica o § 3º Vimos mais acima que, como regra, por ano, o apenado tem direito a 5 saídas temporárias, cada uma de, no máximo, 7 dias. Isso significa que, somando todas as 5, a pessoa tem direito a, no máximo, 35 dias de saída temporária por ano. É possível, no entanto, que o juiz autorize que o apenado saia mais que 5 saídas temporárias ao longo do ano, desde que seja respeitado o prazo máximo de 35 dias por ano. Ex: o juiz pode autorizar que o condenado saia 7 vezes por ano, desde que em cada uma dessas saídas ele só fique até 5 dias fora, com o objetivo de não extrapolar o limite anual de 35 dias por ano. Resumindo: Situação 1 (regra): a lei prevê 5 saídas de 7 dias (total = 35 dias). Situação 2 (exceção): o juiz pode autorizar mais que 5 saídas, desde que o total fique em 35 dias (ex: 7 saídas de 5 dias, cada). Pois bem. Quando estivermos diante da situação 1, o intervalo entre uma saída e outra deve ser de, no mínimo, 45 dias. Ex: terminou a saída hoje, somente poderá receber novamente o benefício daqui a 45 dias. Por outro lado, quando estivermos diante da situação 2, o intervalo entre uma saída e outra não precisa ser de 45 dias. Pode ser menor. Ex: terminou a saída hoje, poderá receber o benefício de novo daqui a 20 dias.

Como regra, o juiz autoriza que o apenado tenha direito a 5 saídas de 7 dias (total = 35 dias).

O juiz pode, no entanto, autorizar mais que 5 saídas por ano, desde que o total fique em 35 dias (ex: 35 saídas de 1 dia).

Se o juiz autorizar apenas as 5 saídas, o intervalo mínimo entre uma saída e outra deverá ser de 45 dias.

Se o juiz autorizar mais que 5 saídas por ano, o intervalo entre uma saída e outra poderá ser menor que 45 dias.

Neste caso, aplica-se o § 3º do art. 124. Nesta caso, não se aplica o § 3º do art. 124.

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A razão para essa distinção: se as saída for autorizada por um longo período (7 dias), é mais salutar ao apenado que seja respeitado o intervalo mínimo entre uma saída e outra a fim de que ele possa melhor distribuir ao longo do ano o benefício. Aplica-se, portanto, o § 3º do art. 124. Ao contrário, se as saídas forem curtas (ex: 1 dia, 2 dias) não há justificativa para se exigir intervalo mínimo entre elas. Tese fixada pelo STJ em recurso repetitivo: As autorizações de saída temporária para visita à família e para participação em atividades que concorram para o retorno ao convívio social, se limitadas a cinco vezes durante o ano, deverão observar o prazo mínimo de 45 dias de intervalo entre uma e outra. Na hipótese de maior número de saídas temporárias de curta duração, já intercaladas durante os doze meses do ano e muitas vezes sem pernoite, não se exige o intervalo previsto no art. 124, § 3º, da LEP. STJ. 3ª Seção. REsp 1.544.036-RJ, Rel. Min. Rogerio Schietti Cruz, julgado em 14/9/2016 (recurso repetitivo) (Info 590). Quadro-resumo. Existe intervalo mínimo entre uma saída temporária e outra? 1) Saída para estudos: NÃO. 2) Saída para visitar família etc.: DEPENDE 2.1) Se o apenado terá 5 saídas de 7 dias no ano (regra geral): deve haver um intervalo mínimo de 45 dias. 2.2) Se o apenado terá mais que 5 saídas no ano: não se exige intervalo mínimo entre uma e outra. CONDIÇÕES E REVOGAÇÃO

Condições Ao conceder a saída temporária, o juiz imporá ao beneficiário as seguintes condições legais (obrigatórias): I – o condenado deverá fornecer o endereço onde reside a família a ser visitada ou onde poderá ser encontrado durante o gozo do benefício; II – o condenado deverá se comprometer a ficar recolhido na residência visitada, no período noturno; III – o condenado não poderá frequentar bares, casas noturnas e estabelecimentos congêneres.

Além dessas, o juiz pode fixar outras condições que entender compatíveis com as circunstâncias do caso e a situação pessoal do condenado. Nesse caso, chamamos de condições judiciais (ou facultativas). Revogação O benefício da saída temporária será automaticamente revogado quando o condenado: 1. praticar fato definido como crime doloso (não se exige condenação; basta a notícia); 2. for punido por falta grave (aqui se exige que o condenado tenha recebido punição disciplinar); 3. desatender as condições impostas na autorização; ou 4. revelar baixo grau de aproveitamento do curso. Recuperação do direito após ter sido revogado: Se o benefício for revogado por uma das causas acima listadas, o condenado só poderá recuperar o direito à saída temporária se: a) for absolvido no processo penal (hipótese 1); b) for cancelada a punição disciplinar imposta (hipótese 2); ou c) se ficar demonstrado seu merecimento a novo benefício (hipóteses 3 e 4). CALENDÁRIO DE SAÍDAS TEMPORÁRIAS (SAÍDAS TEMPORÁRIAS AUTOMATIZADAS)

Em que consiste o calendário de saídas temporárias (saídas temporárias automatizadas)? Pela literalidade da Lei de Execução Penal, a cada saída temporária deve ser formulado um pedido ao juiz que, então, ouve o MP e a administração penitenciária, e, após, decide. Em algumas partes do Brasil, no entanto, como é o caso do RJ, os juízes da execução penal adotaram um procedimento para simplificar a concessão dessas saídas temporárias.

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Quando o condenado formula o primeiro pedido de saída temporária, o juiz ouve o MP e o diretor do Presídio, e, se estiverem preenchidos os requisitos, concede o benefício (segue, portanto, todo o rito previsto na LEP). No entanto, nesta primeira decisão o juiz já fixa um calendário de saídas temporárias. Veja um exemplo de decisão nesse sentido: “Ante o exposto, preenchidos os requisitos previstos nos arts. 122, I, e 123, da LEP, CONCEDO ao apenado JOÃO DA SILVA autorização para 5 (cinco) saídas temporárias por ano, com duração de 7 (sete) dias cada, para visita à família, que deverá ser realizada nas seguintes datas: I – Páscoa - dias XX a XX; II – dia das mães - dias XX a XX; III – dia dos pais - dias XX a XX; IV – Natal - dias XX a XX; V – Ano Novo - dias XX a XX.

Verificando-se a prática de quaisquer das hipóteses do art. 125 da LEP, ficam automaticamente revogadas as autorizações para as saídas subsequentes.” Desse modo, após o juiz deferir o benefício para o apenado nesta primeira vez, as novas saídas temporárias deste mesmo reeducando não mais precisarão ser analisadas pelo juiz e pelo MP, sendo concedidas automaticamente pela direção do Presídio, desde que a situação disciplinar do condenado permaneça a mesma, ou seja, que ele tenha mantido o comportamento adequado no cumprimento da pena. Se cometer falta grave, por exemplo, é revogado o benefício. A esse procedimento simplificado deu-se o nome de “saída temporária automatizada”, "saída temporária em bloco" ou “calendário de saídas temporárias”. Insurgência do Ministério Público Alguns Ministérios Públicos pelo país têm se insurgido contra este procedimento e interposto recursos que chegam aos Tribunais Superiores. Segundo argumenta o Parquet, ao adotar essa saída temporária automatizada, o juiz da execução penal está transferindo (delegando) para a autoridade administrativa do estabelecimento prisional a decisão de conceder ou não a saída temporária, o que viola frontalmente o art. 123 da LEP (“Art. 123. A autorização será concedida por ato motivado do Juiz da execução...”). Além disso, para alguns Promotores, essa prática seria vedada porque cada saída temporária, para ser autorizada, deve ser individualmente motivada com base no histórico do sentenciado. O que entendem os Tribunais Superiores? O calendário de saídas temporárias é permitido? A prática da saída temporária automatizada é válida?

Primeira posição do STJ: NÃO O STJ, inicialmente, decidiu que não seria legítima a prática de se permitir saídas temporárias automatizadas. Para o Tribunal, a cada pedido de saída temporária, deveria haver uma nova decisão motivada do Juízo da Execução, com intervenção do MP. Nesse sentido: STJ. 3ª Seção. REsp 1166251/RJ, Rel. Min. Laurita Vaz, julgado em 14/03/2012 (recurso repetitivo) (Info 493). Posição do STF: SIM O STF, contudo, ao apreciar o tema, discordou do STJ e decidiu que é legítima a decisão judicial que estabelece calendário anual de saídas temporárias para visita à família do preso. Para o STF, um único ato judicial que analisa o histórico do sentenciado e estabelece um calendário de saídas temporárias, com a expressa ressalva de que as autorizações poderão ser revistas em caso de cometimento de infração disciplinar, mostra-se suficiente para fundamentar a autorização de saída temporária. O Min. Gilmar Mendes apontou que, em regra, os requisitos das saídas temporárias são os mesmos, independentemente do momento do ano em que ocorrem. “A saída do Natal não tem requisitos mais

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brandos do que a saída da Páscoa, por exemplo. Não há razão funcional para afirmar que uma única decisão que a ambas contemple é deficiente de fundamentação”. Além disso, essa prática não exclui a participação do MP, que poderá se manifestar sobre seu cabimento e, caso alterada a situação fática, pedir sua revisão. A exigência feita pelo STJ no sentido de que haja uma decisão motivada para cada saída temporária coloca em risco o direito do sentenciado ao benefício, em razão do grande volume de processos nas varas de execuções penais. STF. 1ª Turma. HC 130502/RJ, Rel. Min. Marco Aurélio, julgado em 21/6/2016 (Info 831). STF. 2ª Turma. HC 128763, Rel. Min. Gilmar Mendes, julgado em 04/08/2015. Atual posição do STJ: Depois que o STF decidiu que o calendário anual de saídas temporárias é válido, o STJ teve que, na prática, rever o seu entendimento. Assim, ao reapreciar o tema em sede de recurso repetitivo o STJ firmou as seguintes conclusões: Como regra, antes de cada saída temporária do preso deverá haver uma decisão judicial motivada.

Isso é o ideal, o recomendável. Excepcionalmente, será permitido que o juiz, por meio de uma única decisão, fixe um calendário anual

de saídas temporárias definindo todas as datas em que o apenado terá direito ao benefício durante o ano. O calendário anual de saídas temporárias somente deverá ser fixado quando ficar demonstrado que há uma deficiência do aparato estatal (ex: muitos processos para poucas varas de execuções penais) e que, por causa disso, se os pedidos fossem analisados individualmente, haveria risco de não dar tempo de o apenado receber o benefício mesmo tendo direito. Essa deficiência do aparelho estatal é a realidade que se observa na maioria dos Estados do Brasil, de forma que a exigência de decisão isolada para cada saída temporária tem causado inúmeros prejuízos aos apenados.

Vale ressaltar, no entanto, que, se for adotada a sistemática da saída temporária automatizada, quem deverá, obrigatoriamente, fixar o calendário é o juiz das execuções penais, não podendo ele delegar esta atividade para o diretor do presídio. Assim, é o juiz quem define as datas específicas nas quais o apenado irá usufruir os benefícios ao longo do ano.

Importante destacar também que o benefício será revogado se ocorrer algumas das hipóteses de revogação automática revogação automática da saída temporária, previstas no art. 125 da LEP.

Para fins de recurso repetitivo, o STJ firmou duas teses que sintetizam o raciocínio acima exposto:

Primeira tese: É recomendável que cada autorização de saída temporária do preso seja precedida de decisão judicial motivada. Entretanto, se a apreciação individual do pedido estiver, por deficiência exclusiva do aparato estatal, a interferir no direito subjetivo do apenado e no escopo ressocializador da pena, deve ser reconhecida, excepcionalmente, a possibilidade de fixação de calendário anual de saídas temporárias por ato judicial único, observadas as hipóteses de revogação automática do art. 125 da LEP. Segunda tese: O calendário prévio das saídas temporárias deverá ser fixado, obrigatoriamente, pelo Juízo das Execuções, não se lhe permitindo delegar à autoridade prisional a escolha das datas específicas nas quais o apenado irá usufruir os benefícios. STJ. 3ª Seção. REsp 1.544.036-RJ, Rel. Min. Rogerio Schietti Cruz, julgado em 14/9/2016 (recurso repetitivo) (Info 590). Com a decisão acima, a Súmula 520 do STJ foi cancelada? NÃO. Este enunciado prevê o seguinte:

Súmula 520-STJ: O benefício de saída temporária no âmbito da execução penal é ato jurisdicional insuscetível de delegação à autoridade administrativa do estabelecimento prisional.

A Súmula 520 foi editada em um momento no qual o STJ repudiava a prática da saída temporária automatizada. Desse modo, ela era invocada sempre que o Tribunal queria dizer que não cabia o

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calendário de saídas temporárias. No entanto, como houve esta mudança de entendimento do STJ, o enunciado foi mantido, mas agora deverá ser interpretado de outra forma. De acordo com a concepção atual do STJ, o que a Súmula 520 quer dizer não é que seja proibida a saída temporária automatizada. O que o enunciado proíbe é apenas que o juiz delegue ao diretor do presídio a fixação das datas da saída. A administração penitenciária será ouvida e poderá subsidiar o magistrado com informações relacionadas à rotina carcerária, a fim de melhor escolher as datas que serão ideais para a fiscalização do cumprimento dos horários e das condições do benefício. Todavia, o diretor do presídio não detém atribuição legal, ou mesmo as garantias constitucionais da magistratura, para escolha, por discricionariedade, da data em que, por conveniência do presídio ou por pedido particular do reeducando, deverá ser usufruída a saída temporária do art. 122 da LEP. A execução penal não constitui mera atividade administrativa. Ela envolve também decisões judiciais que, por óbvio, somente podem ser tomadas pelos magistrados. A LEP é expressa ao estabelecer as hipóteses nas quais é possível a atuação direta do diretor do presídio e isso ocorre sempre em situações pontuais, mediante comunicação do Poder Judiciário e do Ministério Público. Exs: a permissão de saída do art. 120 da LEP, a regressão cautelar de regime, entre outras. Neste reduzido rol de atribuições dos diretores não está elencada a fixação das datas das saídas temporárias, sendo este um ato privativo do magistrado. Vale ressaltar, ainda, que não há dificuldade ou obstáculos relevantes que impeçam o juiz de indicar as datas das saídas temporárias, de sorte que não se justifica e não se mostra legítima a pretensão de transferir ao diretor do presídio tal competência. Assim, a Súmula 520 do STJ mantém-se válida, proibindo que o juiz transfira para o diretor do presídio a competência para fixar as datas das saídas temporárias. Importante esclarecer, mais uma vez, que a Súmula 520 do STJ não proíbe a adoção das saídas temporárias automatizadas, desde que o calendário seja fixado pelo magistrado. Manual Prática de Rotinas das Varas Criminais e de Execução Penal Para aqueles que atuam no dia-a-dia forense (juízes, promotores, defensores públicos, advogados, servidores etc.), vale ressaltar que a fixação de um calendário anual de saídas temporárias é uma medida recomendada pelo CNJ no seu "Manual Prático de Rotinas das Varas Criminais e de Execução Penal". Segundo o CNJ, as saídas temporárias devem ser processadas “num só provimento anual”, pois a “medida evitará o trabalho hercúleo que decorre com as inúmeras juntadas individuais de requerimento em cada processo de execução, vista de cada um dos autos ao Ministério Público, aos Defensores e, consequentemente, decisões e seus registros” (Disponível em: <http:⁄⁄www.cnj.jus.br).

DIREITO TRIBUTÁRIO

SIMPLES Inexistência de alvará de localização e funcionamento não impede empresa de aderir ao Simples

A ausência de alvará de localização e funcionamento não impede que a Empresa de Pequeno Porte ou a Microempresa ingressem ou permaneçam no regime do Simples Nacional.

O inciso XVI do art. 17 da LC 123/2006 prevê que não poderá aderir ao regime as empresas que não tiverem inscrição em cadastro fiscal federal, municipal ou estadual ou, então, se possuírem irregularidade em algum desses cadastros.

Os cadastros a que se refere esse inciso são apenas os cadastros fiscais (Cadin, no âmbito federal e similares nas esferas estadual e municipal).

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Assim, a falta de alvará de localização e funcionamento não significa "ausência de inscrição em cadastro fiscal" ou "irregularidade em cadastro fiscal", tal como previsto no art. 17, XVI, da LC 123/2006. Vale ressaltar que a empresa não possuía débitos tributários.

STJ. 2ª Turma. REsp 1.512.925-RS, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, julgado em 2/6/2016 (Info 590).

O que é o Simples Nacional? O Simples Nacional é um regime unificado de arrecadação, cobrança e fiscalização de tributos, aplicável às microempresas e empresas de pequeno porte, estando previsto na Lei Complementar nº 123/2006. A empresa que aderir ao Simples desfruta da vantagem de recolher quase todos os tributos (federais, estaduais e municipais) mediante um único pagamento, calculado sobre um percentual de sua receita bruta. O objetivo do Simples é fazer com que as microempresas e empresas de pequeno porte tenham um regime jurídico simplificado e favorecido, com menos burocracia e menor carga tributária. Fundamento constitucional O tratamento diferenciado para microempresas e empresas de pequeno porte é um mandamento constitucional, previsto em pelo menos dois dispositivos da CF/88:

Art. 146. Cabe à lei complementar: (...) III — estabelecer normas gerais em matéria de legislação tributária, especialmente sobre: (...) d) definição de tratamento diferenciado e favorecido para as microempresas e para as empresas de pequeno porte, inclusive regimes especiais ou simplificados no caso do imposto previsto no art. 155, II das contribuições previstas no art. 195, I e §§ 12 e 13, e da contribuição a que se refere o art. 239. Parágrafo único. A lei complementar de que trata o inciso III, "d", também poderá instituir um regime único de arrecadação dos impostos e contribuições da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, observado que: I - será opcional para o contribuinte; II - poderão ser estabelecidas condições de enquadramento diferenciadas por Estado; III - o recolhimento será unificado e centralizado e a distribuição da parcela de recursos pertencentes aos respectivos entes federados será imediata, vedada qualquer retenção ou condicionamento; IV - a arrecadação, a fiscalização e a cobrança poderão ser compartilhadas pelos entes federados, adotado cadastro nacional único de contribuintes. Art. 170. A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios: (...) IX — tratamento favorecido para as empresas de pequeno porte constituídas sob as leis brasileiras e que tenham sua sede e administração no País. Art. 179. A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios dispensarão às microempresas e às empresas de pequeno porte, assim definidas em lei, tratamento jurídico diferenciado, visando a incentivá-las pela simplificação de suas obrigações administrativas, tributárias, previdenciárias e creditícias, ou pela eliminação ou redução destas por meio de lei.

Desse modo, a fim de cumprir o mandamento constitucional previsto no art. 146, III, "d", foi editada a LC 123/2006, que estabelece tratamento diferenciado e favorecido para as microempresas e para as empresas de pequeno porte, além de instituir um regime único de arrecadação dos impostos e contribuições para essas empresas.

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Feita esta breve revisão, imagine a seguinte situação hipotética: "ABC Comércio Ltda - EPP" pediu para ser incluída no regime do Simples Nacional, tendo o requerimento sido negado em virtude de ela não ter alvará de localização e funcionamento. Para o Fisco, esta situação se enquadra na vedação contida no art. 17, XVI, da LC 123/2006:

Art. 17. Não poderão recolher os impostos e contribuições na forma do Simples Nacional a microempresa ou a empresa de pequeno porte: (...) XVI - com ausência de inscrição ou com irregularidade em cadastro fiscal federal, municipal ou estadual, quando exigível.

A empresa ingressou com ação judicial questionando o indeferimento e alegou que está devidamente inscrita nos cadastros fiscais que lhe são obrigatórios e que não possui débitos tributários pendentes, sendo o alvará de localização e funcionamento o único documento que se encontra pendente na hipótese. Argumentou que a ausência deste alvará é mera irregularidade administrativa sem caráter fiscal, não configurando, portanto, óbice para o regime do Simples Nacional. Os argumentos da empresa foram acolhidos pelo STJ? Ela poderá ingressar e permanecer no Simples mesmo não tendo alvará de localização e funcionamento? SIM. A ausência de alvará de localização e funcionamento não impede que a Empresa de Pequeno Porte ou a Microempresa ingressem ou permaneçam no regime do Simples Nacional. STJ. 2ª Turma. REsp 1.512.925-RS, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, julgado em 2/6/2016 (Info 590). Irregularidade em cadastro fiscal federal, municipal ou estadual A LC 123/2006 traz, em seu art. 17, as hipóteses nas quais é vedado o ingresso no Simples Nacional. O inciso XVI prevê que não poderá aderir ao regime as empresas que não tiverem inscrição em cadastro fiscal federal, municipal ou estadual ou, então, se possuírem irregularidade em algum desses cadastros. A expressão "irregularidade em cadastro fiscal federal, municipal ou estadual" utilizada pela lei é muito elástica e, em tese, poderia significar uma infinidade de situações. Justamente por isso, o STJ entendeu que não é razoável interpretar esse dispositivo de forma tão ampla a ponto de impedir que a empresa seja afastada do Simples por qualquer irregularidade cadastral. Não há que se confundir, portanto, cadastro fiscal com qualquer outro tipo de cadastro ou exigência administrativa imposto pelos entes públicos, tais como o alvará de funcionamento e localização do município. No caso em análise, a empresa foi proibida de ingressar e se manter no regime em razão da ausência de alvará de localização e funcionamento. Este argumento não é razoável, especialmente porque a empresa se encontra devidamente inscrita e adimplente com os tributos que lhe são devidos, de forma que sua exclusão do Simples Nacional por ausência do referido alvará vai contra o objetivo da Constituição e da lei que foi o de dar tratamento jurídico diferenciado para as microempresas e empresas de pequeno porte. Cadastros fiscais = Cadin federal (ou similar estadual ou municipal) No âmbito federal, a expressão "cadastro fiscal federal" prevista no inciso XVI do art. 17 da LC 123/2006 significa o Cadin, instituído pela Lei nº 10.522/2002. O Cadin é um banco de dados que contém os nomes:

de pessoas físicas e jurídicas com obrigações pecuniárias vencidas e não pagas para com órgãos e entidades da Administração Pública Federal, direta e indireta;

de pessoas físicas que estejam com a inscrição no CPF cancelada e de pessoas jurídicas que sejam declaradas inaptas perante o CNPJ.

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A sigla Cadin significa “Cadastro Informativo de créditos não quitados do setor público federal”. Dessa forma, para o STJ, a aplicação do inciso XVI do art. 17 da LC 123/2006, no que tange à irregularidade em cadastro fiscal, somente se aplica às empresas inscritas no Cadin, ou nas versões estaduais e municipais similares do referido cadastro (nos Estados e Municípios onde houver). Portanto, como a pendência da empresa era apenas relacionada com alvará de localização e funcionamento, não havendo nenhum registro de crédito não quitado no âmbito municipal ou registro da suspensão/cancelamento/inaptidão do CPF/CGC/CNPJ não se pode falar que esta empresa tenha irregularidade em cadastro fiscal. A falta de alvará de localização e funcionamento não significa "ausência de inscrição em cadastro fiscal" ou "irregularidade em cadastro fiscal", tal como previsto no art. 17, XVI, da LC 123/2006.

DIREITO ADUANEIRO Não se deve conceder o drawback suspensão se não houver

beneficiamento/agregação de valor à mercadoria a ser exportada

Não se concede o regime tributário de drawback na modalidade suspensão à importação de cantoneiras de plástico rígido, filtros de etileno e termógrafos elétricos destinados a conferir maior segurança ao transporte exportador de frutas, já devidamente acondicionas em caixas e caixotes e envoltas por folhas de papel alveolado.

STJ. 2ª Turma. REsp 1.404.148-PE, Rel. Min. Humberto Martins, Rel. para acórdão Herman Benjamin, julgado em 17/5/2016 (Info 590).

Drawback Drawback é uma palavra de origem inglesa, cuja tradução literal seria algo como "arrastar de volta". Trata-se de uma operação pela qual o contribuinte se compromete a importar a mercadoria, beneficiá-la e, depois, mandá-la de volta ao exterior (exportá-la). Nas palavras do Min. João Otávio de Noronha, "drawback" é a operação mediante a qual o contribuinte, para fazer jus a incentivos fiscais, importa mercadoria com o compromisso de exportá-la após o beneficiamento. (STJ REsp 385634/BA).

Com a maestria de quem conhece muito sobre o assunto, a Min. Regina Helena Costa explica, de forma mais técnica, em que consiste o drawback: "O drawback constitui um regime aduaneiro especial, que pode apresentar-se em três modalidades - isenção, suspensão e restituição de tributos - e é classificado como incentivo à exportação, nos termos dos arts. 1º, I, da Lei nº 8.402/92 e 383, caput, do Decreto nº 6.759/09. O incentivo consubstancia-se na desoneração do processo de produção o que acaba tornando a subsequente mercadoria nacional mais competitiva no mercado global." (STJ REsp 1313705/PR).

Exemplo: uma indústria de automóveis importa matérias-primas, fabrica carros no Brasil e os revende para o exterior. Para o Brasil, isso é algo produtivo, considerando que favorece a balança comercial, já que houve o ingresso de uma mercadoria que será em seguida reenviada para o exterior com um valor maior em razão do melhoramento do produto (agregou-se valor à mercadoria que será exportada). Com isso, em tese, mais divisas ficam no país, gerando aqui emprego e renda. Diante desse cenário, o país incentiva a referida operação, concedendo benefícios fiscais para o contribuinte que se compromete a realizar o drawback.

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Modalidades Existem três modalidades de drawback: a) isenção: consiste na concessão de isenção dos tributos que incidem na importação das mercadorias que serão utilizadas na industrialização do produto a ser exportado. b) suspensão: é a suspensão dos tributos incidentes na importação de mercadoria a ser utilizada na industrialização de produto que deve ser exportado. As obrigações tributárias ficam suspensas por determinado prazo e, caso não ocorra a comprovação das exportações nos termos e condições previstos na legislação, os tributos suspensos deverão ser recolhidos com os devidos acréscimos legais. c) restituição: é a devolução, em forma de créditos, do valor dos tributos pagos na importação de insumo importado utilizado em produto exportado. Imagine a seguinte situação hipotética: A empresa "ABC Agrícola S/A" exporta frutas para diversas partes do mundo. Ela importa da Alemanha cantoneiras de plástico rígido, filtros de etileno e termógrafos elétricos, que são utilizados para conferir maior segurança ao transporte das frutas.

Cantoneira de plástico

Filtro de etileno

Termógrafo

As cantoneiras são utilizadas para melhor fixação em “palets” das caixas contendo as frutas a serem exportadas, com a função tão-somente de conferir maior segurança ao transporte das mercadorias, fixando-as nos estrados ou plataformas móveis. Os filtros absorvedores de gás etileno e os termógrafos elétricos, por sua vez, são instalados no interior dos “conteiners” utilizados no transporte das frutas exportadas e têm por objetivo controlar a temperatura e evitar a prolação de bactérias. A absorção do gás etileno e o controle da temperatura desaceleram a deterioração das frutas a serem transportadas, mantendo-as frescas por mais tempo. A utilização desses equipamentos é uma exigência imposta pelos mercados europeu e norte-americano a fim de garantir a preservação da qualidade das frutas devido ao seu alto grau de fragilidade. Pedido da empresa para drawback A empresa pediu que as três mercadorias acima fossem incluídas no regime especial do drawback suspensão e que ela não tivesse que pagar os tributos inerentes à sua importação, sob a alegação de que tais produtos são necessários ao acondicionamento das suas mercadorias (uvas e mangas para exportação). O pedido foi negado pelo Fisco sob o argumento de que: 1) as frutas exportadas pela empresa são acondicionadas em caixas envoltas por folhas de papel alveolado. Logo, estas caixas e estes papeis são a embalagem das mercadorias. 2) os filtros de etileno, cantoneiras e termógrafos não se caracterizam como embalagem ou acondicionamento e, portanto, não fazem jus ao incentivo fiscal do regime aduaneiro especial do drawback.

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Diante disso, a empresa ingressou com ação judicial questionando a recusa. A questão chegou até o STJ. A empresa terá direito ao drawback suspensão na importação desses três produtos? NÃO. Não se concede o regime tributário de drawback na modalidade suspensão à importação de cantoneiras de plástico rígido, filtros de etileno e termógrafos elétricos destinados a conferir maior segurança ao transporte exportador de frutas, já devidamente acondicionas em caixas e caixotes e envoltas por folhas de papel alveolado. STJ. 2ª Turma. REsp 1.404.148-PE, Rel. Min. Humberto Martins, Rel. para acórdão Herman Benjamin, julgado em 17/5/2016 (Info 590). Regramento sobre a matéria Segundo o art. 78, II, do DL 37/1966:

Art. 78. Poderá ser concedida, nos termos e condições estabelecidas no regulamento: (...) II - suspensão do pagamento dos tributos sobre a importação de mercadoria a ser exportada após beneficiamento, ou destinada à fabricação, complementação ou acondicionamento de outra a ser exportada;

Este dispositivo é complementado, em sede infralegal, pelo Regulamento Aduaneiro. O atual Regulamento Aduaneiro foi aprovado pelo Decreto 6.759/2009 e prevê:

Art. 383. O regime de drawback é considerado incentivo à exportação, e pode ser aplicado nas seguintes modalidades: I - suspensão - permite a suspensão do pagamento do Imposto de Importação, do Imposto sobre Produtos Industrializados, da Contribuição para o PIS/PASEP, da COFINS, da Contribuição para o PIS/PASEP-Importação e da COFINS-Importação, na importação, de forma combinada ou não com a aquisição no mercado interno, de mercadoria para emprego ou consumo na industrialização de produto a ser exportado (Lei nº 11.945, de 4 de junho de 2009, art. 12, caput); (...)

Art. 389. As mercadorias admitidas no regime, na modalidade de suspensão, deverão ser integralmente utilizadas no processo produtivo ou na embalagem, acondicionamento ou apresentação das mercadorias a serem exportadas.

Art. 384-B. Os atos concessórios de drawback poderão ser deferidos, a critério da Secretaria de Comércio Exterior, levando-se em conta a agregação de valor e o resultado da operação (Lei nº 11.945, de 2009, art. 14).

Portanto, a concessão do drawback-suspensão pressupõe, cumulativamente, que: a) a mercadoria importada seja destinada ao acondicionamento do produto exportado ou a exportar; e b) haja comprovadamente agregação de valor ao produto final. O STJ entendeu que os três produtos em discussão (cantoneiras, filtros de etileno e termógrafos) não se caracterizam como material destinado à embalagem ou acondicionamento. A função das cantoneiras é tão-somente conferir maior segurança ao transporte das frutas, fixando-as nos estrados ou plataformas móveis (paletes), frutas essas que já estão devidamente acondicionadas em caixas ou caixotes e envoltas por folhas de papel alveolado. Os filtros absorvedores de gás etileno e termógrafos elétricos instalados no interior dos “conteiners”, utilizados no transporte das frutas exportadas são instrumentos para garantir a qualidade das frutas no transporte. Desse modo, não há agregação de valor ao produto exportado, mas mero atendimento de exigência de importador atinente à preservação da qualidade das frutas.

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Assim, as cantoneiras, os filtros e os termógrafos apenas evitam que as frutas percam o seu valor. Para o STJ, o acondicionamento realizado não tem uma utilidade adicional que valoriza o produto. Não se pode invocar que retardar a deterioração seja uma utilidade adicional do acondicionamento, até porque o usual é que toda a embalagem e acondicionamento onde é feito o transporte de uma mercadoria se destine a sua proteção e conservação. Pensar de modo diverso significaria entregar isenção para todas as embalagens de transporte, já que todas, de um modo ou de outro, umas mais e outras menos, objetivam a preservação do valor da mercadoria embalada. Consequentemente, inexistindo beneficiamento/agregação de valor à mercadoria a ser exportada, fica descaracterizada a concessão do benefício fiscal pleiteado. Observação No caso concreto, o pedido formulado pela empresa ocorreu ainda na vigência do antigo Regulamento Aduaneiro (Decreto nº 4.544/2002). Não se pode ter certeza de como o STJ decidiria a questão sob a égide do atual Regulamento (Decreto 6.759/2009).

DIREITO PREVIDENCIÁRIO

PREVIDÊNCIA PRIVADA A súmula 340 do STJ é aplicável para os planos de previdência privada

A norma de regulamento de plano de previdência privada aplicável à concessão de complementação de pensão por morte é aquela vigente na data do óbito do participante, ainda que seja editada norma superveniente mais vantajosa ao beneficiário.

A súmula 340 do STJ, apesar de ter sido editada com base em precedentes envolvendo a previdência pública, também é aplicável para a previdência privada.

STJ. 3ª Turma. REsp 1.404.908-MG, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 2/8/2016 (Info 590).

Previdência complementar Previdência complementar é um plano de benefícios feito pela pessoa que deseja receber, no futuro, aposentadoria paga por uma entidade privada de previdência. A pessoa paga todos os meses uma prestação e este valor é aplicado por uma pessoa jurídica, que é a entidade gestora do plano (ex: Bradesco Previdência). É chamada de "complementar" porque normalmente é feita por alguém que já trabalha na iniciativa privada ou como servidor público e, portanto, já teria direito à aposentadoria pelo INSS ou pelo regime próprio. Apesar disso, ela resolve fazer a previdência privada como forma de "complementar" a renda no momento da aposentadoria. O plano de previdência complementar é prestado por uma pessoa jurídica chamada de "entidade de previdência complementar" (entidade de previdência privada). Imagine agora a seguinte situação hipotética: Maria, ex-funcionária do Banco do Brasil foi aposentada e passou a receber aposentadoria privada complementar oferecida àqueles que trabalham na referida empresa (Caixa de Previdência dos Funcionários do Banco do Brasil - PREVI). Em 2000, Maria faleceu e deixou um único dependente, seu filho Lucas, de 18 anos. Na época do falecimento, o regulamento do plano de previdência previa que os filhos dos aposentados teriam direito de receber pensão por morte complementar até que completassem 21 anos de idade.

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Com isso, Lucas passou a receber o benefício. Em 2002, foi aprovada uma mudança no regulamento do plano e a pensão por morte foi ampliada e passou a ser devida para os filhos dos aposentados até que eles completassem 24 anos, desde que estejam cursando universidade. Lucas, que é acadêmico de Direito, ficou muito feliz com a notícia. Ocorre que, em 2003, assim que fez 21 anos de idade, ele teve a pensão cessada. Inconformado, ajuizou ação pedindo que tivesse direito de receber a pensão até completar 24 anos de idade, conforme a redação atual do regulamento do plano de previdência. O pedido de Lucas foi acolhido? NÃO. Tempus regit actum Ao analisar inúmeros casos envolvendo pensão por morte na previdência pública, o STJ firmou o entendimento de que as regras que deverão reger o benefício são aqueles que vigoravam no momento da concessão do benefício, não sendo aplicadas quaisquer alterações que sejam realizadas na lei, sejam para beneficiar ou piorar a situação do pensionista. Isso se tornou, inclusive, uma súmula:

Súmula 340-STJ: A lei aplicável à concessão de pensão previdenciária por morte é aquela vigente na data do óbito do segurado.

Esse entendimento é baseado em um princípio segundo o qual tempus regit actum. Em uma tradução literal, significa "o tempo rege o ato", ou seja, os atos jurídicos são regidos pela lei que vigorava no momento em que eles foram editados. Em palavras mais técnicas, os benefícios previdenciários devem ser regulados pela lei ou pelo estatuto vigentes ao tempo em que foram implementados os requisitos necessários à consecução do direito. As normas editadas após a concessão do benefício não podem retroagir, ainda que mais favoráveis ao beneficiário. Súmula 340-STJ aplica-se à previdência privada A súmula 340 do STJ, apesar de ter sido editada com base em precedentes envolvendo a previdência pública, também é aplicável para a previdência privada. Logo, a nova norma, ainda que mais benéfica, não pode ser aplicada aos benefícios previdenciários já concedidos, pois, além de incorrer em indevida retroatividade, contrariará o ato jurídico perfeito. Resumindo: A norma de regulamento de plano de previdência privada aplicável à concessão de complementação de pensão por morte é aquela vigente na data do óbito do participante, ainda que seja editada norma superveniente mais vantajosa ao beneficiário. STJ. 3ª Turma. REsp 1.404.908-MG, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 2/8/2016 (Info 590).

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EXERCÍCIOS Julgue os itens a seguir: 1) O segurado que, devido às ameaças de morte feitas pelo criminoso a ele e à sua família, deixou de comunicar

prontamente o roubo do seu veículo à seguradora não perde o direito à indenização securitária. ( ) 2) A correção monetária nas indenizações do seguro DPVAT por morte ou invalidez incide desde a data do

requerimento administrativo na seguradora. ( ) 3) (DPE/AC 2012 CESPE) Segundo entendimento jurisprudencial do STJ, não é possível a posse de bem público, pois

sua ocupação irregular representa mera detenção de natureza precária; portanto, na ação reivindicatória ajuizada pelo ente público, não há que se falar em direito de retenção de benfeitorias, o qual pressupõe a existência de posse. ( )

4) Particulares podem ajuizar ação possessória para resguardar o livre exercício do uso de via municipal (bem público de uso comum do povo) instituída como servidão de passagem. ( )

5) (PGM-Salvador 2015 CESPE) Quanto à destinação, os bens públicos classificam-se em bens de uso comum do povo, bens de uso especial e bens dominicais, sendo definidos como bens de uso comum do povo aqueles que se destinem a utilização específica pelos indivíduos. ( )

6) A genitora que, ao tempo em que exercia a guarda judicial do filho, representou-o em ação de execução de débitos alimentares possui legitimidade para prosseguir no processo executivo com intuito de ser ressarcida, ainda que, no curso da cobrança judicial, a guarda tenha sido transferida ao genitor (executado). ( )

7) Na vigência dos contratos de plano ou de seguro de assistência à saúde, a pretensão condenatória decorrente da declaração de nulidade de cláusula de reajuste nele prevista prescreve em 20 anos (art. 177 do CC/1916) ou em 3 anos (art. 206, § 3º, IV, do CC/2002) ( )

8) (Juiz TJPB 2015 CESPE) Deve ser suspensa a ação de execução em que o autor seja portador de nota promissória firmada por empresário em recuperação e o réu seja o garante desse título executivo extrajudicial, uma vez que a recuperação judicial do devedor principal induz suspensão de ações contra seus coobrigados. ( )

9) (PGM-Campinas 2016 FCC) Empresa X firmou contrato de adiantamento de crédito com o Banco Y e emitiu, em garantia, títulos de crédito avalizados por seus sócios. Posteriormente, firmou com o Banco Y contrato de financiamento que foi afiançado por seus sócios, os quais se obrigaram solidariamente pelo pagamento do empréstimo, renunciando ao benefício de ordem. Inadimplidos ambos os negócios, o Banco Y ajuizou duas ações de execução contra os sócios da Empresa X, uma tendo como objeto o aval dos títulos de crédito, outra tendo como objeto a fiança prestada ao contrato de financiamento. Posteriormente, foi deferida a recuperação judicial da Empresa X. De acordo com jurisprudência consolidada do Superior Tribunal de Justiça, a recuperação judicial do devedor principal A) impede o prosseguimento das execuções ajuizadas apenas contra os devedores solidários coobrigados por garantia fidejussória, as quais são extintas, em razão de novação, quando da aprovação do plano de recuperação judicial. B) impede o prosseguimento das execuções ajuizadas apenas contra os devedores solidários coobrigados por garantia cambial, as quais são extintas, em razão de novação, quando da aprovação do plano de recuperação judicial. C) não impede o prosseguimento nem induz a extinção das execuções ajuizadas contra os devedores solidários coobrigados por garantia cambial ou fidejussória. D) impede o prosseguimento das execuções ajuizadas contra os devedores solidários coobrigados por garantia cambial ou fidejussória, as quais são extintas, em razão de novação, quando da aprovação do plano de recuperação judicial. E) não impede, quando de seu deferimento, o prosseguimento das execuções ajuizadas contra os devedores solidários coobrigados por garantia cambial ou fidejussória, mas leva à extinção de tais ações, em razão de novação, quando da aprovação do plano de recuperação judicial.

10) É possível o deferimento de assistência judiciária gratuita a jurisdicionado que tenha firmado com seu advogado contrato de honorários com cláusula ad exitum. ( )

11) Se o processo estiver em condições de imediato julgamento, o tribunal deve decidir desde logo o mérito quando decretar a nulidade da sentença por não ser ela congruente com os limites do pedido ou da causa de pedir. ( )

12) Admite-se a aplicação da teoria da causa madura em julgamento de agravo de instrumento. ( ) 13) Não é possível ao julgador, na fase de liquidação de sentença por arbitramento, acolher as conclusões periciais

fundadas em presunções e deduções para a quantificação do prejuízo sofrido pelo credor a título de lucros cessantes. ( )

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14) (Promotor MPDFT 2015) A reparação espontânea e integral do dano pelo agente, após o recebimento da denúncia ou queixa, mas antes do julgamento do processo, é causa de diminuição de pena. ( )

15) (AGU 2015 CESPE) João, empregado de uma empresa terceirizada que presta serviço de vigilância a órgão da administração pública direta, subtraiu aparelho celular de propriedade de José, servidor público que trabalha nesse órgão. Se devolver voluntariamente o celular antes do recebimento de eventual denúncia pelo crime, João poderá ser beneficiado com redução de pena justificada por arrependimento posterior. ( )

16) (DPE-RN 2015 CESPE) O arrependimento posterior, por ser uma circunstância subjetiva, não se estende aos demais corréus, uma vez reparado o dano integralmente por um dos autores do delito até o recebimento da denúncia. ( )

17) Aplica-se o instituto do arrependimento posterior para o homicídio culposo na direção de veículo automotor se foi realizada composição civil entre o autor do crime a família da vítima. ( )

18) A lesão corporal que provoca na vítima a perda de dois dentes tem natureza grave, e não gravíssima. ( ) 19) (Juiz TJ/ES 2012 CESPE) Adota-se, em relação à consumação do crime de roubo, a teoria da apprehensio, também

denominada amotio, segundo a qual é considerado consumado o delito no momento em que o agente obtém a posse da res furtiva, ainda que não seja de forma mansa e pacífica. ( )

20) A causa de aumento prevista no § 1º do art. 158 do CP pode ser aplicada tanto para a extorsão simples como também para o caso de extorsão qualificada pela restrição da liberdade da vítima. ( )

21) Consuma-se o crime de roubo com a inversão da posse do bem mediante emprego de violência ou grave ameaça, ainda que por breve tempo e em seguida à perseguição imediata ao agente e recuperação da coisa roubada, sendo prescindível a posse mansa e pacífica ou desvigiada. ( )

22) O Ministério Público, no exercício do controle externo da atividade policial, pode ter acesso a ordens de missão policial. ( )

23) A obtenção do conteúdo de conversas e mensagens armazenadas em aparelho de telefone celular ou smartphones não se subordina aos ditames da Lei nº 9.296/96. ( )

24) Se o juiz determinou a busca e apreensão de telefone celular ou smartphone do investigado, é lícito que as autoridades tenham acesso aos dados armazenados no aparelho apreendido, especialmente quando a referida decisão tenha expressamente autorizado o acesso a esse conteúdo. ( )

25) (Juiz Federal TRF5 2015) A quebra de sigilo dos dados telefônicos submete-se ao princípio constitucional da reserva de jurisdição, de modo a se preservar a esfera de privacidade das pessoas. ( )

26) Respeitado o limite anual de 35 dias é cabível a concessão de maior número de autorizações de curta duração. ( ) 27) As autorizações de saída temporária para visita à família e para participação em atividades que concorram para o

retorno ao convívio social, se limitadas a cinco vezes durante o ano, deverão observar o prazo mínimo de 45 dias de intervalo entre uma e outra. Na hipótese de maior número de saídas temporárias de curta duração, já intercaladas durante os doze meses do ano e muitas vezes sem pernoite, não se exige intervalo mínimo. ( )

28) É recomendável que cada autorização de saída temporária do preso seja precedida de decisão judicial motivada. Entretanto, se a apreciação individual do pedido estiver, por deficiência exclusiva do aparato estatal, a interferir no direito subjetivo do apenado e no escopo ressocializador da pena, deve ser reconhecida, excepcionalmente, a possibilidade de fixação de calendário anual de saídas temporárias por ato judicial único, observadas as hipóteses de revogação automática da LEP. ( )

29) O calendário prévio das saídas temporárias deverá ser fixado, obrigatoriamente, pelo Juízo das Execuções, não se lhe permitindo delegar à autoridade prisional a escolha das datas específicas nas quais o apenado irá usufruir os benefícios. ( )

30) O benefício de saída temporária no âmbito da execução penal é ato jurisdicional insuscetível de delegação à autoridade administrativa do estabelecimento prisional. Por essa razão, é indevida a prática das saídas temporárias automatizadas. ( )

Gabarito

1. C 2. E 3. C 4. C 5. E 6. C 7. C 8. E 9. Letra C 10. C

11.C 12.C 13.E 14.E 15.C 16.E 17.E 18.C 19.C 20.C

21.C 22.C 23.C 24.C 25.E 26.C 27.C 28.C 29.C 30.E