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Moser indivíduo e ambienteCapítulo 9 v04 06/07/2022 1 / 42 9 – AMBIENTE GLOBAL 9.1. – Ambiente global e problemas ecológicos 9.2. – Atitudes em relação aos comportamentos ecológicos 9.3. – Os modelos de comportamento e desenvolvimento sustentável 9.4. – A gestão da relação com o ambiente “Think globally, act locally” (“Pensar globalmente, agir localmente”) René Dubos, Conferência das Nações Unidas sobre o Ambiente Humano, Estocolmo, 1972 Neste início do Século 21, a degradação do ambiente, as mudanças climáticas e a aparente multiplicação de catástrofes naturais e tecnológicas são objeto de preocupações crescentes. Os problemas ambientais são cada vez mais considerados em escala global, e, ao mesmo tempo, descontextualizados e dificilmente concebíveis para o indivíduo (Uzzell, 2000). Promover a compreensão dos desafios planetários e a adoção de comportamentos favoráveis ao ambiente é um dos maiores desafios postos à psicologia ambiental. Nos próprios encontros científicos internacionais, que envolvem psicólogos ambientais (IAPS, IAAP, IUPsy), as pesquisas relativas às condições de adoção de comportamentos ecologicamente compatíveis são cada vez mais numerosas. 9.1 Ambiente global e problemas ecológicos As preocupações ambientais, no quadro de um desenvolvimento sustentável, implicam que o indivíduo pense a nível global, ou seja, a nível do planeta. As mudanças ambientais são globais, têm a particularidade de unir os indivíduos através dos países e continentes. Causada por todos os indivíduos, mesmo que a contribuição individual possa parecer mínima, a acumulação de comportamentos individuais tem consequências globais. Tradicionalmente os indivíduos pensam e agem em função e relação

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9 – AMBIENTE GLOBAL

9.1. – Ambiente global e problemas ecológicos

9.2. – Atitudes em relação aos comportamentos ecológicos

9.3. – Os modelos de comportamento e desenvolvimento sustentável

9.4. – A gestão da relação com o ambiente

“Think globally, act locally” (“Pensar globalmente, agir localmente”)

René Dubos, Conferência das Nações Unidas sobre o Ambiente Humano, Estocolmo, 1972

Neste início do Século 21, a degradação do ambiente, as mudanças climáticas e a aparente multiplicação de catástrofes naturais e tecnológicas são objeto de preocupações crescentes. Os problemas ambientais são cada vez mais considerados em escala global, e, ao mesmo tempo, descontextualizados e dificilmente concebíveis para o indivíduo (Uzzell, 2000). Promover a compreensão dos desafios planetários e a adoção de comportamentos favoráveis ao ambiente é um dos maiores desafios postos à psicologia ambiental. Nos próprios encontros científicos internacionais, que envolvem psicólogos ambientais (IAPS, IAAP, IUPsy), as pesquisas relativas às condições de adoção de comportamentos ecologicamente compatíveis são cada vez mais numerosas.

9.1 Ambiente global e problemas ecológicos

As preocupações ambientais, no quadro de um desenvolvimento sustentável, implicam que o indivíduo pense a nível global, ou seja, a nível do planeta. As mudanças ambientais são globais, têm a particularidade de unir os indivíduos através dos países e continentes. Causada por todos os indivíduos, mesmo que a contribuição individual possa parecer mínima, a acumulação de comportamentos individuais tem consequências globais. Tradicionalmente os indivíduos pensam e agem em função e relação aos outros: a família na esfera privada, os vizinhos e os cidadãos a níveis urbanos e rurais. As preocupações ambientais globais exigem que os indivíduos ajam em relação à população global a nível planetário. Embora a dimensão não seja a mesma a diversos níveis, os problemas são estreitamente interconexos e a distinção tradicional entre local e global é uma distinção teórica e artificial. É evidente que, conquanto a relação entre local e global possa ser distinguível no plano da análise e da intervenção, ela torna-se não pertinente no plano dos efeitos dos comportamentos individuais. Problemas ambientais como o reaquecimento do planeta, a penúria de água ou a desertificação, fazem parte de um saber societal largamente partilhado. Mas, além de um conhecimento de tais fenômenos, há pouca compreensão ou

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consciência do perigo potencial. Estes problemas não podem ser resolvidos só a um nível individual ou local, nem unicamente a nível governamental ou internacional.

A competência dos peritos e o saber técnico são importantes na solução dos problemas ambientais, tais como as mudanças climáticas, a penúria de recursos e a gestão do lixo. Para serem eficazes, eles precisam da colaboração entre as ciências naturais e as ciências humanas. Ao lado do conhecimento dos processos biológicos, físicos e químicos, as competências da psicologia ambiental são essenciais na análise e uso de estratégias de intervenção no quadro de um desenvolvimento sustentável. A conservação dos recursos naturais e o controle da poluição necessitam de uma mudança, e não só dos comportamentos individuais; implicam também o conjunto das atividades humanas, as trocas comerciais e as atividades industriais, os lazeres, etc. (Montada & Kals, 2000).

Nós estamos amplamente conscientes de que os recursos naturais não são inesgotáveis, que produzimos lixo em quantidade crescente e que os nossos comportamentos de consumo geram problemas ambientais muitas vezes irreversíveis (poluição do ar e da água, irregularidades climáticas). Para limitar o esbanjamento dos recursos, a produção de lixo e a deterioração do ambiente, as medidas governamentais e legislativas, tanto as incitantes como as coercitivas, se em vigor, não poderão ser eficazes, se não forem cumpridas, aceitas e acompanhadas de modelos comportamentais adequados. Acrescente-se a isso que, muitas vezes, os problemas ambientais são o resultado de uma acumulação de comportamentos individuais. A responsabilidade dos comportamentos individuais como fator de preservação do ambiente impõe-se também atualmente com plena evidência. E não é só recentemente que se observa uma conscientização relativa às relações existentes entre os fatores individuais, por um lado, e aos fatores ambientais, por outro. No início dos anos 80, os problemas ambientais eram quase desconhecidos e negligenciáveis, a “saúde” da natureza parecia quase intocável e os recursos, infinitos (Lévy-Leboyer & Duron, 1991); mas os problemas ligados ao ambiente interpelavam cada vez mais os decisões políticos e a mídia, e criaram-se numerosos grupos de pressão.

Paralelamente, atribuiu-se uma importância crescente aos aspetos psicológicos e sociais do comportamento humano, considerado como uma das causas principais dos problemas ambientais. Contudo, os nossos concidadãos não se aperceberam espontaneamente da amplidão e gravidade das mudanças que surgiam no ambiente. Em consequência, arriscam-se a não poderem adaptar-se ou reagir de maneira apropriada a tais mudanças: não há formação de novas atitudes, os processos de motivação não são postos em andamento e o comportamento não sofre modificações adequadas (Pawlik, 1991). Para compreender e analisar os determinantes do fator humano, bem como o seu papel na e para com as mudanças ambientais, o lugar da psicologia e, especialmente, da psicologia ambiental, parece essencial: as relações entre o indivíduo e os diversos aspectos do seu ambiente local e global devem estar claramente identificados, caso se aspire a modificar as atitudes e os comportamentos em relação a esse ambiente.

As ações orientadas em benefício do ambiente devem necessariamente envolver a coletividade, tanto à escala nacional como à escala internacional. Mas os comportamentos, os valores, as atitudes, as crenças, as percepções não são idênticos de um país para outro. Os problemas ambientais não são concebidos em toda a parte

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da mesma maneira. A sua perceção depende (1) do estado real do ambiente nos diversos países, (2) do contexto geográfico e climático, (3) dos motivadores econômicos, tais como os preços dos combustíveis e dos produtos não nocivos ao ambiente, (4) das disposições institucionais – por exemplo, as leis ou os costumes que controlam o acesso aos recursos naturais, e (5) do contexto político – as medidas governamentais e os sistemas de taxas. Acrescente-se a isto os diferentes contextos culturais. Na Europa, nos países nórdicos, a natureza é concebida como ameaçada e em perigo, enquanto nos países latinos a representação da natureza diz mais respeito aos aspectos estéticos. Tais diferenças são necessariamente acompanhadas de comportamentos ambientais diferentes, igualmente influenciados por variáveis de contexto local, tais como as políticas dos países em matéria ambiental ou as medidas já empenhadas (triagem seletiva dos lixos domésticos, taxação das emissões de produtos poluentes, etc.). Os políticos, as instituições e as demais estruturas nacionais determinam comportamentos que diferem conforme os países, porque se referem a indivíduos que são, também eles, diferentes.

Os problemas ambientais agrupam fenômenos heteróclitos e fortemente diversos (Cone & Hayes, 1980). Eles podem representar um perigo imediato ou a longo prazo para a saúde e para a sobrevivência, como a energia, ou simplesmente representar um dano estético (os papéis na via pública). Nos dias de hoje, os limites dos recursos naturais comuns tornam-se cada vez mais evidentes na maioria dos seus aspectos. Entre os recursos comuns, alguns regeneram-se rapidamente (pastagens), outros mais lentamente (árvores, água potável), outros, pelo contrário, esgotam-se gradualmente (petróleo, algumas espécies de animais). Os fenômenos ambientais podem ser classificados segundo as suas caraterísticas próprias e segundo a maneira como se inserem na evolução temporal:

(1) perceptíveis / imperceptíveis. A poluição do ar ou da água não é necessariamente perceptível em razão dos limites dos nossos sentidos. Outros fenômenos evoluem demasiado lentamente para que o indivíduo o possa notar;

(2) curto prazo / longo prazo. Enquanto a poluição de um litoral por uma mancha de petróleo é imediata em seus efeitos, algumas evoluções como o reaquecimento do planeta e o efeito estufa são fenômenos de longo prazo;

(3) permanente / temporário. A poluição do lençol freático por dejetos é muitas vezes irreversível, enquanto a poluição de uma corrente de água pelos dejetos de uma usina pode ser temporário;

(4) reversível / irreversível. As chuvas ácidas são reversíveis, enquanto os recursos naturais, tais como o gás ou o petróleo, se esgotam irremediavelmente;

(5) potencialmente controlável / potencialmente não controlável. A maior parte dos fenômenos induzidos pelo homem são potencialmente controláveis; na realidade, o que é incontrolável são só os efeitos.

Não é, portanto, surpreendente que, mesmo que a proteção do ambiente se apresente como uma preocupação global, as atitudes, os conhecimentos e representações estejam ligados aos problemas ambientais concretos. O indivíduo estará pronto a

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adotar um comportamento de proteção relativo a um aspecto da qualidade do ambiente, mas arriscar-se-á a ficar indiferente a outros. Constata-se na realidade que o fato de separar o lixo não é necessariamente acompanhado de outros comportamentos em favor do ambiente (Stern & Oskamp, 1987). Deste modo, os pesquisadores estão mais voltados para as condições da adoção de um comportamento em relação com um problema específico: a poluição, a eliminação de desperdícios, a reciclagem, a estocagem e o transporte dos resíduos tóxicos, as economias de energia e, recentemente, os perigos da energia nuclear, das chuvas ácidas, do efeito estufa e do buraco na camada de ozônio, que constituem o objeto de preocupações crescentes (Lévy-Leboyer & Duron, 1991).

A ação individual a ser promovida em face dos problemas ambientais pode assumir formas variadas. Pode tratar-se de um comportamento ativo e positivo ou, ao invés, de um comportamento de evitação. A ação pode ser seguida de um feed-back em razão de uma proximidade temporal dos efeitos, ou da sua amplitude, ou até mesmo de uma vantagem (no caso de economia de energia). Em terceiro lugar, caberá considerar os custos e benefícios respectivos de um comportamento orientado ao interesse comum, ou, ao invés, egoísta (os dilemas sociais). Globalmente, se poderá querer encorajar os comportamentos de proteção do ambiente (reciclagem, por exemplo) e/ou desencorajar os comportamentos de destruição do ambiente (dirigir demasiado rápido, desperdiçar energia).

9.2 Atitudes em relação aos comportamentos ecológicos

A atitude é uma estrutura relativamente estável que depende, ao mesmo tempo, de um juízo ou opinião, da afetividade (nomeadamente do envolvimento emotivo e da força com que o sujeito está pronto a defender o seu ponto de vista), e da ação ou da intenção de comportamento. A atitude prepara o indivíduo para enfrentar situações novas. É triplo o interesse das atitudes no funcionamento psicológico. De fato, as atitudes têm: uma função adaptativa na medida em que permitem ao indivíduo agir numa situação e elaborar uma resposta adaptada, uma função afirmativa de si e de se diferenciar em relação aos outros, e uma função defensiva em face de questionamentos eventuais.

Embora as atitudes sejam uma preparação para a ação, elas não estão ligadas, de maneira sistemática, aos comportamentos. É, portanto, arriscado anunciar de antemão os comportamentos conforme as atitudes expressas. A ligação hipotética entre atitudes e comportamentos pode ser ilustrada por uma experiência relativa ao recolhimento dos papéis espalhados pelo chão (Bickman, 1972). Quando da conversa, 95% dos interrogados expressaram sentimentos de responsabilidade pessoal em relação à situação. Todavia, foram menos de 2% os que recolheram efetivamente os papéis lançados ao chão. Perante à dificuldade de relacionar atitudes e comportamentos, é possível tentar antever o comportamento e, sobretudo, predizer o comportamento eventual a partir: (1) das normas às quais os sujeitos aderem, (2) das suas “intenções de comportamento”, e (3) dos comportamentos que eles atribuem a outrem (Moser, 1996, pesquisa não publicada). Caso se examine esses três aspectos e se comparar os resultados com o comportamento efetivo, constatar-se-á que a norma é a de se comportar em função do desejável e que as intenções do comportamento estão próximas da norma (o sujeito estima e declara que se

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comportaria, numa situação particular, de maneira muito próxima do que é considerado como norma de comportamento). Quanto a si próprio, o indivíduo atribui aos outros comportamentos distantes da norma e muito mais egoístas. A comparação destas avaliações com o comportamento efetivo numa mesma situação mostra que é a atribuição a outro que está conforme com o comportamento efetivo, que se pode constatar na situação.

Algumas pesquisas interessam-se pela preocupação ambiental dos indivíduos de um modo geral. Em outros termos, tentam descobrir as caraterísticas das pessoas que se dizem preocupadas com a degradação do ambiente. Foram assim estudados diversos traços e caraterísticas individuais suscetíveis de desempenhar um papel determinante nas preocupações relativas ao ambiente: as atitudes e valores concernentes ao ambiente, variáveis de personalidade e estatus sociodemográfico.

9.2.1 Valores e atitudes pró-ambientais

Van Liere e Dunlap (1981), tal como Stern e Oskamp (1987) sustentam a ideia de uma variância comum entre as atitudes referentes aos diversos aspectos do ambiente. Outros constatam uma forte heterogeneidade que põe em dúvida a existência de uma atitude ambiental geral (Heberlein, 1981). Os diferentes instrumentos que existem atualmente referem-se a conceitos distintos, cujos itens são avaliados como justificativas de uma atitude em favor do ambiente. Assim, a “consciência ecológica” como valor, medida pela escala “New Environmental Paradigm”, elaborada por Dunlap e Van Liere em 1978, tem sido objeto de retoques e desenvolvimentos (cf. Corral e cols., 2007). O “altruísmo antropocêntrico” concebe a preocupação com a preservação do ambiente como motivada pelo cuidado de proteger um grande número de seres vivos das consequências negativas e das ameaças resultantes da degradação do ambiente. O “altruísmo-egoísmo ambiental” justifica a preocupação com a preservação do ambiente por receio de se ver a si mesmo e seus chegados ameaçados pela degradação do ambiente (Hughey e cols., 1985; van der Pligt e cols., 1986). Uma quarta abordagem visa os valores ditos fundamentais: valores religiosos (Eckberg e Blocker, 1989), materialismo oposto a idealismo (Inglehart, 1990), bem como os valores “terminais” na classificação de Rokeach (1967).

Os autores que têm utilizado estes diversos instrumentos, têm analisado os seus possíveis determinantes (particularmente a educação, a idade, o lócus de controle, o sexo, as atitudes políticas) e os seus efeitos nos comportamentos. Stern e Oskamp (1987) e Hines e outros (1987) mostraram, em particular, que a relação entre atitudes e comportamentos é modelada pela natureza dos comportamentos considerados e pela amplitude da autodescrição deles. Além disso, muitas pesquisas sublinham o papel intermediário entre atitudes e valores, de um lado, e, do outro, o comportamento de fatores como o custo dos equipamentos necessários (Archer e outros, 1987) e da dificuldade que representa a adoção de alguns comportamentos pró-ambientais (De Young, 1990; Vining e Ebreo, 1990). As informações e os conhecimentos relativos à pertinência e eficácia dos diferentes comportamentos desempenham um papel nada desprezível, particularmente no caso de adoção de comportamentos de economia de energia (Kempton e cols., 1985). Uma meta análise (Hines e cols., 1986; 1987) apoiada em dezessete dessas pesquisas põe em evidência uma correlação bastante menor entre conhecimentos e comportamentos.

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9.2.1.1 As variáveis individuais

Somente uma única das caraterísticas ligadas ao indivíduo parece desempenhar um papel na adoção de comportamentos ecológicos, a saber, o altruísmo como valor ou norma (van Liere e Dunlap, 1978; Black e outros, 1985; Stern e outros, 1986). Uma norma pessoal altruísta traduz-se por um comportamento pró-ambiental. Schwartz (1968; 1973; 1977) defende a ideia de que as normas sociais influem nas normas pessoais usadas pelo indivíduo em duas etapas sucessivas. A primeira etapa é conscientizar-se das consequências do comportamento; a segunda é a atribuição da responsabilidade. Heberlein (1975) mostra que os indivíduos que têm uma nota elevada nas duas avaliações do modelo de Schwartz, relativas ao fato de jogar os detritos na natureza, aderem a uma norma moral contra tal comportamento. Black (1978) encontrou resultados similares no que diz respeito à economia de energia. Stern, Dietz e Black (1986) estenderam o modelo de Schwartz à adesão dos indivíduos às leis e regulações ambientais e demonstraram que as normas pessoais e as duas etapas de avaliação influenciam o julgamento dos indivíduos quanto às responsabilidades morais da indústria e do governo referentes à situação ambiental. Enfim Hopper e McCarl Nielsen (1991) descobriram que a reciclagem pode ser considerada como uma forma de comportamento altruísta: a norma social que impele a reciclar, influencia o comportamento do indivíduo apenas se ele tem uma nota elevada pelas duas avaliações do modelo de Schwartz.

O papel das variáveis sociodemográficas é relativamente contraditório. Van Liere e Dunlap (1980) analisaram 23 artigos e concluíram que há pouca ligação entre interesse ambiental e variáveis demográficas. Samdahl e Robertson (1989) encontraram resultados similares, deduzindo deles que essas variáveis têm um valor explicativo limitado. Entre as pesquisas recentes, se pode, contudo, citar os dados seguintes que oferecem uma ideia da complexidade.

Samdahl e Robertson (1989) observam um interesse ambiental mais forte entre os jovens. De igual modo, Schahn e Holzer (1990) julgam que, quanto mais jovens são os indivíduos, mais forte é o seu interesse (atitude ambiental afetiva e cognitiva, comportamento, conhecimento) pelo ambiente; e Arbuthnot (1977) constata que aqueles que reciclam os detritos, são mais jovens que aqueles que não os reciclam, mas Vining e Ebreo (1990) obtêm resultados opostos: os recicladores seriam mais idosos que os não recicladores. Os pesquisadores que estudam o vínculo entre o sexo e o interesse pelo ambiente obtêm resultados contraditórios. Eles evidenciam, quer uma relação positiva (Van Liere e Dunlap, 1981), quer uma relação negativa (Arcury, Scollai e Johnson, 1987). Amelang e cols. (1977), Braun (1983), Langeheine e Lehmann (1986), mostraram que as mulheres têm notas mais elevadas nas escalas de atitudes e comportamentos, mas notas mais baixas quanto aos bons conhecimentos relativos aos problemas ambientais. Schahn e Holzer (1990) confirmam tais diferenças: os homens têm mais conhecimentos que as mulheres, mas as mulheres mostram-se mais sensíveis aos problemas ambientais. De modo geral, a preocupação pelo ambiente está associada a um nível de escolaridade elevado: Schahn e Holzer (1990), assim como Samdahl e Robertson (1989), constatam que, quanto maior for o nível de escolaridade, mais forte será o interesse pelo ambiente. Weigel (1977) compara recicladores e não recicladores: os primeiros têm um nível mais elevado que os segundos. Este último resultado não é, todavia, confirmado por Oskamp e outros (1991), que não dão relevo às diferenças entre recicladores e não recicladores,

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referentes ao nível de estudo. As diferenças relativas ao nível socioeconômico são coerentes com as relativas ao nível de estudo. Os recicladores inquiridos por Arbuthnot (1977), tal como os interrogados por Weigel (1977), possuem um nível socioeconômico mais elevado que os não recicladores. Do mesmo modo, os proprietários reciclam mais que os locatários (Oskamp e outros, 1991).

São várias as pesquisas que têm utilizado com sucesso escalas de locus de controle (Hines e outros, 1987; Petrus e Giles, 1987). Arbuthnot (1977) observa que os que reciclam os seus desperdícios têm, de preferência, um locus de controle interno. Tucker (1978) compara os membros de uma associação pró-ambiental aos não aderentes e mostra que os aderentes possuem mais frequentemente um locus de controle interno. Eles possuem também um nível socioeconômico mais elevado que os sujeitos não pró-ambientalistas. Huebner e Lipsey (1981) e Webster (1975) põem em evidência uma relação positiva entre o sentimento de eficácia pessoal na solução dos problemas ambientais e um comportamento pró-ambiental.

9.2.1.2 A mudança de atitudes e as incitações comportamentais

De uma maneira geral, existe uma forte resistência à mudança. Desse modo, o indivíduo concede uma importância desmedida aos casos isolados (exemplos vividos, concretos e muito expressivos, experiências dos vizinhos, dos colegas, dos amigos) e não dá atenção às informações mais gerais. Quando contradizem as nossas crenças, as informações têm enormes dificuldades em franquear o limiar da nossa atenção. Numerosas pesquisas tentaram analisar a maneira como uma mensagem é suscetível de fazer mudar as atitudes na perspectiva de que um indivíduo adote um certo comportamento. Três técnicas em particular foram testadas: o apelo ao medo, que se revela eficaz nas campanhas de prevenção de algumas doenças. Trata-se de medos suscitados nos indivíduos e de ações de prevenção imediatas e individuais; a coerção ou a ameaça (no caso, o efeito da punição) e a técnica do comprometimento ou do “pé na porta” (pedir pouco para conseguir muito), que consiste em agir sobre o próprio comportamento. Este último método foi especialmente utilizado com sucesso para reforçar o comportamento de reciclagem (Arbuthnot e outros, 1976-77).

Fischer, Bell e Baum (1984) consideram que responder às múltiplas demandas pró-ambientais com que os indivíduos se veem quotidianamente confrontados, aumenta a probabilidade de responder favoravelmente às demandas futuras. Sob outro ponto de vista, a teoria da autopercepção em psicologia social implica inferirmos as nossas próprias atitudes a partir da observação do nosso próprio comportamento em situações apropriadas (Bem, 1972). Por conseguinte, os programas de reciclagem por incitações monetárias causam a perceção nos indivíduos atingidos de um comprometimento pró-ambiental unicamente associado ao benefício de uma recompensa e não a uma consciência ambiental.

9.2.1.3 A ação sobre as condutas

Para agir sobre as condutas em matéria de ambiente, três meios foram essencialmente utilizados: a educação ambiental, a comunicação e as técnicas de reforço.

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A educação ambiental baseia-se no princípio de que a consciência ambiental vai trazer consigo comportamentos como consequência (Bruvold, 1973; O’Riordan, 1976; Winston, 1974). A relação entre consciência ambiental e comportamento é, contudo, bastante débil (Cone e Hayes, 1980; Heberlein, 1976). Além disso, foi demonstrado (Howel e Warmbrod, 1974; Winston, 1974) que a educação não tem qualquer influência nas atitudes. A comunicação com a ajuda de cartazes ou notícias é, a maior parte do tempo, destinada a reforçar a norma ambiental. Este tipo de incitamento não é eficaz, a não ser que ele se refira a um comportamento pouco custoso e não toque em domínios essenciais (Geller, Winet e Everett, 1982). Assim, o fato de pedir às pessoas que não utilizem a sua viatura particular por causa da poluição, não terá nenhum efeito nos automobilistas (Piragés e Ehrlich, 1976). Os métodos que utilizam o reforço, agem sobre a consequência do comportamento. De um modo geral, o reforço positivo é menos eficaz do que o reforço negativo. Além disso, as estratégias que agem sobre as consequências são suscetíveis de influir na nossa percepção de controle e, se o sujeito julgar ser manipulado ou perder a liberdade, não se envolverá no comportamento desejado. O reforço negativo é amplamente utilizado para consolidar a legislação, mas quase não tem sido objeto de pesquisas. Em geral, nos programas ambientais, ele é utilizado em combinação com um feed-back sobre as consequências do comportamento do sujeito. O reforço positivo é uma estratégia socialmente desejável. Pode consistir numa recompensa imediata ou diferida, quando um certo objetivo foi alcançado. Embora os reforços imediatos (a remuneração de um comportamento preciso) proporcionem ao sujeito um modelo do comportamento desejável, os reforços diferidos só raramente têm essa capacidade e são, por conseguinte, também menos eficazes. É assim que Schmidt e Ulrich (1969) e Wilson e Hopkins (1973) utilizaram, com sucesso, reforços positivos com estudantes, a fim de diminuir o barulho.

9.3 Os modelos de comportamento e o desenvolvimento sustentável

A aparição e conservação das relações compatíveis com um desenvolvimento sustentável são freadas ou favorecidas por alguns fatores individuais, ambientais e culturais. No que concerne aos recursos naturais, sabe-se que as condutas que favorecem a sua preservação, estão ligadas aos conhecimentos dos efeitos de longo prazo, à eficácia percebida das ações individuais, assim como a uma visão funcional ou ecológica do ambiente (Dunlap e Van Liere, 1978; Stern e Oskamp, 1987). Para Grob (1995), os melhores fatores previsíveis dos comportamentos adotados, relativos, por exemplo, à água, são as atitudes e os valores associados aos problemas ambientais, aos quais se ajuntam o controle percebido, o comprometimento pessoal e o ser tocado física e/ou afetivamente por tais aspetos. É assim que a percepção do risco (poluição ou degradação do recurso) foi identificada na literatura como motor de alguns comportamentos de preservação (Rogers, 1983; Gardner e Stern, 1996).

Algumas abordagens vindas da psicologia social podem ser aplicadas ao estudo do comportamento individual face aos problemas ambientais. Entre elas, as análises referentes à identidade social e representação de si, fornecem um quadro teórico que explica certos comportamentos ambientais. A estas teorias gerais, ajuntam-se as análises em termos do dilema social e que concernem mais particularmente às

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dificuldades que são colocadas aos indivíduos com comportamentos favoráveis ao interesse de todos.

9.3.1 Identidade social e representação de si

A representação de si e a representação dos outros são determinantes essenciais dos comportamentos do indivíduo nas situações ligadas aos problemas ambientais. Segundo Sarbin e Kulik (1965), a identidade social do indivíduo é parte do processo do “self”, que representa as cognições que resultam do seu lugar numa “ecologia social” específica. Assim, os comportamentos do indivíduo numa situação precisa são determinados pelas representações de si e dos outros e pela comparação entre ambos (Abric e Kahan, 1973; Orcutt e Anderson, 1977). Kramer e Brewer (1984) mostraram que uma identidade social coletiva pode conduzir a um comportamento mais cooperativo nas situações que implicam em um dilema social. Numerosas pesquisas sublinham que a cooperação é maior entre indivíduos que possuem uma identidade coletiva (Kramer e Brewer, 1984; Daws, van de Kragt e Orbell, 1988). Por exemplo, Oskamp e cols. (1991) observaram que os recicladores têm vizinhos e amigos igualmente recicladores, e Belsie (1990) sugere que a reciclagem é um comportamento facilmente aceito pelo indivíduo, porque ela propõe um objetivo comum aos indivíduos. Este modelo pode ser aplicado aos comportamentos ambientais, na medida em que os indivíduos são influenciados por outros mediante a percepção das normas sociais (Black e cols., 1985; Jones, 1990; Kahle e Beatty, 1987; Vining e Ebreo, 1990).

Margolis (1981) e Baron (1988) demonstram que um dos meios eficazes para que o indivíduo inclua as gerações futuras nas decisões que ele toma no presente, é o de o incitar a identificar-se com os seus filhos e a integrar os interesses deles na avaliação do benefício de um comportamento. A representação dos outros é importante para efetuar a comparação entre o comportamento individual e o dos outros “importantes” para si. Assim, Hopper e Nielsen (1991) demonstraram que as normas sociais são um fator importante na implicação do indivíduo num comportamento de reciclagem.

9.3.2 As análises referentes ao dilema social

O dilema social representa uma escolha alternativa entre a ação em função de um interesse individual e a ação em função do interesse comum, sempre que ambas ações se revelem contraditórias. São numerosas as pesquisas que mostraram que o indivíduo é absolutamente capaz de agir pelo interesse comum, por exemplo, diminuindo a própria refeição ou baixando a temperatura do apartamento. Seja qual for a situação, é geralmente mais fácil e mais benéfico para o próprio indivíduo, a curto prazo, optar por um comportamento egoísta e individual, mesmo que isso onere a comunidade, enchendo, por exemplo, a sua piscina em tempo de seca. Em caso de recursos limitados, o comportamento altruísta é, muitas vezes, mais custoso, mais difícil, exige mais tempo e é, absolutamente, menos gratificante.

Os dilemas sociais podem ser analisados em referência aos três aspetos comportamentais seguintes: (1) a cooperação (comportamento orientado a ganhos partilhados); (2) o individualismo (comportamento orientado a ganho pessoal; e (3) a competição (comportamento orientado a ganho pessoal relativo ao ganho dos outros).

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De maneira geral, os dilemas pessoais funcionam assim: se um participante age em termos de interesse pessoal, quando os outros agem em termos de interesse público, o indivíduo que age em termos de interesse pessoal, recebe a recompensa mais elevada. Se todos agem no sentido de interesse público, cada um recebe uma recompensa superior àquela que cada um receberia, se todo o mundo agisse em seu próprio interesse. Se todo o mundo age em seu próprio interesse, o bem público se esgota. Parece que a escolha egoísta é a mais atrativa, mas cada um obtém melhor benefício, se cada qual não agir de maneira egoísta.

(1) A teoria da escolha trágica (Hardin, 1968; Calabresi e Bobbit, 1978). Os recursos ambientais disponíveis não estão equitativamente repartidos, o que ocasiona, para alguns, a indisponibilidade deles e, para outros, o excedente, estado, de fato, não muito modificável. Na medida em que a maior parte dos indivíduos adere aos ideais de liberdade, a sua maioria não é sensível a comportamentos voltados para o interesse público. Hardin (1968) julgava que a democracia não conduz a uma repartição igualitária dos recursos e que, em consequência, não deixa de ser um sistema autoritário que torna apenas possível a sua alocação igualitária. Daí resulta que o indivíduo aceite ser beneficiário em detrimento da comunidade. Mais particularmente, a “tragédia dos comuns” representa um conflito a nível das relações de interdependência entre os indivíduos e os grupos de interesse a que pertencem. Segundo esta abordagem, todo o indivíduo deve escolher entre dois tipos de ações de resultados contraditórios: um, benéfico para o indivíduo, mas capaz de poder causar prejuízo aos outros; o outro, fonte de perda ou carência para o indivíduo, mas benéfico para o grupo. Esta abordagem permite “pôr em cena” os conflitos entre o interesse particular e o interesse comum.

(2) O modelo de “armadilha social” (Platt, 1973). Segundo este modelo, a maior parte das situações ambientais oferece escolhas comportamentais caraterizadas por uma recompensa a curto prazo combinada com uma perda a longo prazo. A “armadilha social” põe, dessa maneira, em relevo a dimensão temporal. O sujeito sucumbe às gratificações imediatas que, entretanto, veiculam custos inerentes e progressivos (o fato de fumar, o uso de pesticidas, por exemplo). Podemos distinguir armadilhas de dimensão temporal, que trazem relativamente poucas consequências à comunidade, e armadilhas sociais que implicam em conflitos de interesses entre o indivíduo e a coletividade. Este modelo é particularmente pertinente, na medida em que leva expressamente em conta a dimensão temporal, longa e imprecisa, que caracteriza a evolução dos recursos. Ele permite explicar o pouco entusiasmo que o indivíduo mostra em se comportar de maneira altruísta face a uma ameaça que atingirá a geração seguinte, e mesmo até a geração que viria depois. Em outras palavras, é difícil fazer aceitar medidas de proteção, penalizantes para o indivíduo, quando os efeitos negativos que poderiam assim ser evitados, só se farão sentir, várias gerações depois.

(3) Os dilemas sociais (Dawes, 1973; 1980). Representam a superutilização dos recursos comuns como resultado de conflitos de interesses entre o indivíduo e a coletividade. Um dilema social é caraterizado pelo fato de que (1) cada

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participante ganhe mais ou seja menos penalizado, no caso de uma escolha individualista, do que no caso de uma escolha altruísta, e (2) os membros da coletividade ganhem mais, se cada um embarcar numa escolha em favor da coletividade, do que se cada um embarcar numa escolha individualista. É particularmente o caso dos comportamentos relativos aos recursos naturais.

(4) A teoria da equidade (Walster, 1976; 1978). As análises referentes à equidade evidenciam os processos cognitivos pelos quais o indivíduo decide partilhar os recursos com outros. Mais em particular, a base de decisão é a relação entre o investimento e os benefícios do indivíduo, comparada com a relação entre investimentos e benefícios de outros. Na medida em que a equidade ou a justiça é representada pela relação entre os investimentos pessoais (esforço, capacidades, educação, etc.) e os benefícios do indivíduo, pode haver equidade sem igualdade de recursos para todo o mundo. Em outros termos, o indivíduo julga ter direito a mais recursos na medida em que proporciona um esforço superior ao dos outros.

Estudos da área (Agras e cols., 1980; Berk e cols., 1980) mostram que os comportamentos de conservação dos recursos são mais importantes nos pequenos grupos de consumidores, nos quais existe uma solidariedade significativa entre os membros e uma identificação com os direitos da propriedade privada, do que nos outros. Neuman (1986) obteve uma correlação entre o comportamento de conservação de energia e a integração nas atividades do município. Vários fatores podem influir nas soluções aplicadas ao dilema social, como a possibilidade de comunicar (Dawes e cols., 1977, 1988; Jorgensen e Papciak, 1981), as disposições individuais relativas à cooperação (Alcock e Mansell, 1977) e o tamanho do grupo (Komorita e cols., 1980). Lynn e Oldenquist (1986) indicam que o aumento dos comportamentos pró-ambientais, apelando a motivações egoístas, se revela ineficaz. Pelo contrário, os argumentos que encorajam ao altruísmo e o interesse pelo grupo, fornecem soluções mais válidas.

Os modelos do dilema social aplicam-se a numerosos problemas relacionados ao ambiente (utilização de recursos naturais, utilização de energia, poluição, reciclagem). Se o comportamento individual afeta pouco o ambiente, a acumulação de tais comportamentos por numerosos indivíduos pode ter consequências significativas a breve prazo e, principalmente, a longo prazo. É assim que Thompson e Stoutemeyer (1991) entendem a utilização dos mananciais de água como dilema social e mostram que a informação dos sujeitos sobre as consequências a longo prazo de comportamentos do uso abusivo, reduzirá esse tipo de comportamentos.

9.3.3 As condições de comprometimento em prol do bem comum

Quais são as condições em que o indivíduo age pelo interesse comum? Podemos distinguir três conjuntos de variáveis: (1) As variáveis ligadas aos tipos de recursos: a sua importância para o indivíduo, o fato de serem renováveis, o fato de serem livremente disponíveis ou em quantidade limitada. (2) As variáveis descritivas do grupo: os membros conhecem-se ou não, são numerosos ou pouco numerosos, quais são as suas caraterísticas individuais. (3) As regras do jogo: quais são os benefícios relativos do comportamento altruísta e do egoísta? Os participantes podem comunicar-

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se ou não? As escolhas são públicas ou anônimas? Os participantes têm conhecimento do que arriscam?

(1) A natureza dos recursos. À medida que o valor do recurso aumenta, a taxa de cooperação declina (Kelley, Condry, Dalke e Hill, 1965). Isto não foi demonstrado senão em relação a recursos que representam relativamente pouco valor, mas os indivíduos empenham-se fortemente por benefícios relativamente medíocres (Mintz, 1951). O comportamento de cooperação é mais importante no caso de uma diminuição evidente do recurso numa situação degradada, particularmente no que se refere à poluição da água (Watzke, Doktor, Dana e Rubenstein, 1972; Rubenstein, Watzke, Doktor e Dana, 1975). Perante um ambiente manifestamente poluído, os indivíduos cooperam mais do que se ele estivesse só ligeiramente poluído. Todavia, Brechner (1977) põe em evidência uma estratégia inversa no caso de uma situação de recurso disponível em quantidade limitada para cada individuo. A individualização dos recursos é uma estratégia eficaz, particularmente no caso de recursos em terras ou em concessões de pesca (Acheson, 1975). Estes resultados sugerem uma limitação da prodigalidade, se a gestão dos recursos domésticos, tais como a eletricidade ou o gás, está confiada a pequenas comunidades ou aos indivíduos.

(2) As características dos participantes. Assistimos a uma diminuição dos comportamentos altruístas à medida que o número de participantes aumenta (Dawes, 1980; Komorita e Lapworth, 1982). Trata-se aí, manifestamente, de um fenômeno de diluição da responsabilidade (Latané e Darley, 1970). A não participação de um dos membros é então menos perceptível na medida em que o número de participantes aumenta. Além disso, a perda causada é menos perceptível pelo sujeito (Edney, 1981), o que incita o autor a sugerir que o limite superior, para que uma comunidade funcione de maneira cooperativa, é de 150 membros. Quanto mais os participantes se conhecem e apreciam mutuamente, mais o comportamento cooperativo aumenta (Grzelak e Tyska, 1974). Mas foi essencialmente mediante o conceito de altruísmo definido como “o fato de ser alvo dos benefícios de outrem” que as pesquisas foram efetuadas. Caso se insista na necessidade de mostrar altruísmo, provoca-se maior número de comportamentos no interesse geral (Dawes, 1980; Edney e Bell, 1983). Além disso, caso se informe sobre o comportamento dos outros membros do grupo (Messick e outros, 1983), constata-se um ajustamento do sujeito ao comportamento dos outros.

(3) As variáveis de processo. Uma das caraterísticas dos dilemas sociais é que aqueles que “não tomam parte no jogo” têm mais benefícios que aqueles que cooperam, mas que, se todos agem de maneira egoísta, todos são perdedores. Os ganhos relativos dos indivíduos que cooperam e dos que não cooperam, condicionam o comportamento altruísta. Se o benefício do comprometimento em comportamento altruísta é demasiado elevado, não há dilema. Aumentar os benefícios aumenta o comportamento altruísta (Grzelak e Tyska, 1974). Kelley e Grzelak (1972) fazem variar os ganhos individuais e os ganhos da comunidade e constatam, desse modo, que são os ganhos individuais que decidem o comportamento altruísta. McClintock, Moskowitz e

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McClintock (1977) constatam também que os indivíduos estão essencialmente orientados para os seus próprios benefícios.

Em matéria de ambiente, é muito difícil para alguém compreender a complexidade dos fenômenos. Por causa disso, corre-se o risco de agir unicamente em seu próprio interesse. Se as regras são mais simples e os benefícios equitativamente repartidos entre os membros do grupo (Edney e Bell, 1983, 1984), o comportamento altruísta é mais frequente. E são os benefícios da cooperação, mais que as punições por não cooperar, que incitam a adotar um comportamento a favor da coletividade (Komorita e Barth, 1985).

Constata-se que, caso se proporcione aos sujeitos uma explicação detalhada e um feedback do seu comportamento, os recursos são mais preservados (Seligman e Darley, 1977; Stern, 1976). O mesmo acontece, se o grupo discute sobre isso (Brechner, 1977; Edney e Harper, 1978; Dawes, McTavish e Shaklee, 1977). A consciência da interdependência dos sujeitos no diz respeito aos recursos, aumenta o comportamento prosocial (Brechner, 1977; Cass e Edney, 1978). Do mesmo modo, os grupos que têm a oportunidade de discutir entre si e recebem, ao mesmo tempo, um feedback dos seu comportamento, são, com mais razão, preservadores dos recursos (Jorgensen e Papciak, 1981). Enfim, a presença de observadores diminui os comportamentos egoístas (Jerdee e Rosen, 1974).

A comunicação entre os membros de uma comunidade tem muitas vantagens: permite tornar mais claros os benefícios da cooperação, facilita a organização da distribuição dos benefícios, reduz a desconfiança no tocante ao comportamento dos outros membros do grupo, favorece a discussão sobre os méritos da cooperação, etc. Não é, portanto, de admirar que o contato e a discussão entre os membros do grupo favoreçam a cooperação (Brechner, 1977; Caldwell, 1976; Dawes, McTavish e Shaklee, 1977; Harper, 1978). A possibilidade de discutir em grupo não aumenta só a cooperação imediata, mas também favorece a tendência geral a cooperar (Dawes, Orbell e Van Kragt, 1985). Em situação real, a comunicação só raramente é possível (tamanho do grupo, falta de vontade de entabular relações com os outros e de comunicar o seu próprio comportamento, etc.). Se os participantes são informados de quem “participa do jogo” e quem não participa, a taxa de cooperação fica mais elevada (Bixenstine, Levitt e Wilson, 1966; Jerdee e Rosen, 1974; Fox e Guyer, 1978). Certas realizações só podem acontecer por meio de uma cooperação. Caso se queira estabelecer um espaço de jogo num grande conjunto, não será, muitas vezes, senão por meio da boa vontade e da contribuição de um certo número de habitantes que o projeto poderá ser realizado (Van Kragt, Orbell e Dawes, 1983). É só quando o grupo pode discutir a contribuição, que ela se instala da melhor maneira (Dawes, Orbell e Van Kragt, 1985).

Do conjunto de pesquisas sobre os comportamentos em favor da gestão racional do bem comum, três pontos podem ser fixados: (1) É necessário repartir os recursos de maneira que cada indivíduo ou grupo de indivíduos administre uma parte dos recursos totais disponíveis; manter, em escala reduzida, os grupos de indivíduos ou comunidades e antes encorajar materialmente as ações em favor do bem público do que punir qualquer comportamento egoísta. (2) É preciso estimular a confiança mútua entre os membros de uma comunidade. Os indivíduos comprometidos devem poder comunicar-se entre si e responsabilizar-se publicamente pelas decisões que tomaram.

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(3) A comunicação e, particularmente, a valorização dos benefícios morais e materiais do altruísmo, como o outorgar, tanto quanto possível, a responsabilidade aos indivíduos ou grupos, facilitam de igual modo o comportamento em prol da coletividade.

De maneira geral, é manifesto que a maior parte destas pesquisas se limitam a identificar as condições de comprometimento com comportamentos particulares (Hines, Hungerfort e Tomera, 1986-1987) e raras são as que vão além da produção de um catálogo de técnicas mais ou menos eficazes na promoção de comportamentos ecológicos (Dwyer e outros, 1993; Geller, 1990). A aplicação dos modelos que tentaram pôr em evidência os fatores capazes de influenciar a motivação ou a hesitação em adotar novas condutas, tais como as teorias da ação planejada (Ajzen e Fishbein, 1980) ou do comportamento planificado (Ajzen, 1991), revelou-se limitada na medida em que tais modelos não levam em conta os aspectos contextuais, tanto físicos quanto sociais. O modelo estrutural, proposto para predizer o comportamento ambiental responsável (Hines, Hungerfort e Tomera, 1987), reata fatores de personalidade, tais como as atitudes, o lócus de controle e a responsabilidade pessoal, fatores cognitivos, tais como os conhecimentos dos problemas ambientais, estratégias de ação e consequências de ação e, enfim, fatores situacionais.

9.3.4 Valores e pensamento social

Nos anos 90 e na perspectiva de uma “psicologia do desenvolvimento sustentável” (Schultz e Schmuck, 2002), numerosos estudos insistiram nos valores ou “visões do mundo” suscetíveis de favorecer os comportamentos pró-ambientais: a importância de valores universais e altruístas, opostos a valores individualistas e egoístas, foi muitas vezes posta em evidência (Stern, Dietz, Abel, Guagnano e Kalof, 1999). Na realidade, a assimilação dos comportamentos pró-ambientais a comportamentos altruístas ou de ajuda é problemática, na medida em que a perspectiva ambiental se situa mais a um nível coletivo que interindividual. Os comportamentos face a um problema ambiental são particulares; os indivíduos podem, por exemplo, considerar a sua ação como ineficaz ou insuficiente perante a amplitude do problema a resolver (Uzzell, 1996), o que limita a adoção de um novo comportamento. A eficácia é então entendida como um resultado antes coletivo que individual. O sentido da comunidade e das responsabilidades representa então um papel primordial na tomada de decisões, particularmente no contexto local. Esta abordagem do dilema dos bens comuns insiste também no fato de que, o mais das vezes, quando alguém busca obter comportamentos pró-ambientais, se dirige a indivíduos “conscientemente incompetentes”, isto é, que preferem não agir em favor do ambiente, porque preferem alcançar um objetivo positivo e certo, ou evitar consequências negativas, imediatas e prováveis. Modificar esses comportamentos conscientemente incompetentes é difícil, já que isso exige uma mudança de motivação pessoal. Sendo o ideal obter comportamentos “inconscientemente competentes”, isto é, hábitos de proteção ambiental, é preciso, além disso, fazer com que o comportamento competente se torne em seguida automático, o que implica uma ação a longo prazo (Geller, 2002).

Uma outra dificuldade reside, quanto ao ser humano, na impossibilidade de ele perceber o estado do ambiente a nível global: este é geralmente caraterizado pela incerteza, tanto do ponto de vista perceptivo quanto cognitivo. Assim o indivíduo é

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incapaz de distinguir, por exemplo, certos tipos de poluição (nuclear, ozônio, etc.). Além disso, a lentidão das mudanças ambientais (como as mudanças climáticas) torna a sua percepção impossível à escala humana. É esta a razão pela qual a maior parte dos estudos põem em evidência os comportamentos individuais localizados, abandonando o nível mais global (Bonnes e Bonaiuto, 2002). Um paradoxo das pesquisas sobre o desenvolvimento sustentável é: interessar-se pelos comportamentos pontuais e pelas condições do seu aparecimento, embora o risco seja o futuro do planeta. Este paradoxo reflete precisamente a dificuldade, para os indivíduos, de pôr em relação estes dois níveis, local e global, assim como as consequências imediatas e as a longo prazo dos seus comportamentos. Mas, mesmo a nível local, existe sempre, nos dilemas ambientais, uma grande incerteza quanto à quantidade e qualidade do recurso disponível. Esta incerteza está associada a uma falta de conhecimentos, mas também a uma ilusão perceptiva (“the big pool illusion”), segundo a qual essa falta de conhecimento leva a entender o nível do recurso como infinito ou, pelo menos, maior do que é na realidade (Gärling, Biel e Gustafsson, 2002). Essa ilusão de imutabilidade do recurso é fortalecida pelo fato de que os indivíduos não podem, quase sempre, experimentar as consequências do seu comportamento, sendo essas consequências indiretas, incertas, pouco claras e/ou distantes (Geller, 2002).

Os diferentes quadros de análise, como os numerosos instrumentos propostos para medir os fatores que se supõe desempenharem um papel na implicação perante ações de preservação das qualidades, mostram que os comportamentos ecológicos não obedecem a uma lógica determinista simples. A dificuldade de explicar as mudanças comportamentais, ou a resistência à mudança, está associada à complexidade das interações entre o indivíduo e a sua percepção do ambiente (Ratiu, 2003). Por exemplo, elementos situacionais particulares podem ocasionar comportamentos pró-ambientais pontuais em indivíduos recalcitrantes ou à priori oposicionistas. Inversamente, a implantação de um equipamento indispensável, mas nocivo aos vizinhos, cria, muitas vezes, forte oposição. Este tipo de reação foi amplamente estudado, especialmente no quadro do fenômeno NIMBY - Not In My Backyard (Casal, 2006). Deste modo, a relação entre atitudes, comportamentos pró-ambientais e contextos locais permanece incerta.

O conjunto de pesquisas neste domínio permitiu, todavia, evidenciar quatro grandes dimensões capazes de intervir nas decisões e ações individuais face aos problemas ambientais. Essas dimensões referem-se, por um lado, aos efeitos do comportamento, seja ele considerado do ponto de vista temporal (quando as consequências do desenvolvimento individual ou coletivo implica uma projeção sobre as gerações futuras), espacial (segundo os diferentes graus de proximidade do sujeito em relação ao ambiente) e social (avaliação dos seus próprios comportamentos, mas também dos comportamentos dos outros membros do seu grupo). Por outro lado, essas dimensões dizem respeito à perceção do risco ambiental, que corresponde à avaliação pessoal e subjetiva da situação, feita pelo indivíduo. Na tomada de decisão perante o risco ambiental, os sujeitos devem escolher entre várias possibilidades de comportamento que possuem, cada uma delas, consequências de valor positivo ou negativo. A percepção do risco e os níveis de aceitabilidade do perigo vão constituir determinantes capitais das práticas sociais e dos comportamentos ambientais. A análise da percepção do ambiente (percepção da natureza e dos seus recursos; e do problema

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ambiental tomado em consideração) constitui uma base necessária para apreender, de um lado, as percepções e valores e, de outro, as práticas ligadas ao ambiente. A conscientização dos problemas relativos ao ambiente é facilitada pela percepção das mudanças e da gravidade dos riscos associados a essas mudanças (de Vanssay e outros, 1997). O perigo é avaliado em função da percepção dos riscos incorridos pelos viventes e pelo homem em particular e, sobretudo, em função da percepção da irreversibilidade das modificações do ecossistema. Essa tomada de consciência é preponderante entre quem tem uma visão ecológica global antes que fragmentada. Desse modo, as respostas às solicitações ambientais poderiam estar intimamente ligadas ao modo de percepção e apreensão do meio natural, intimamente ligadas às ideologias e valores.

9.3.5 Da ideologia às práticas

No decorrer dos últimos anos, a psicologia ambiental tentou fixar modelos das condições de comprometimento com comportamentos favoráveis ao ambiente em função dos valores (Vlek, Skolnik e Gattersleben, 1998).

Segundo a teoria cultural (Douglas e Wildavsky, 1982; Poortinga, Steg e Vlek, 2002; Thompson, Ellis e Wildavsky, 1990), a disposição de empenhar-se em comportamentos ecológicos depende dos valores e, em especial, dos mitos da natureza a que os indivíduos aderem. Podemos distinguir quatro concepções. A primeira, “individualista”, consiste em considerar a natureza como um sistema robusto e flexível e, portanto, inofensivo; a segunda, “fatalista”, concebe a natureza como imprevisível e versátil. Os indivíduos que aderem a estas duas concepções, estão pouco inclinados a comprometer-se com comportamentos de proteção. Inversamente, os que possuem uma concepção “hierárquica”, têm uma visão da natureza de tolerante e moderadamente vulnerável; remete-se preferencialmente à intervenção das autoridades. E resta a concepção “igualitária” que considera a natureza como efêmera e, portanto, como um sistema frágil e precário; é acompanhada de uma consciência ambiental elevada e, com frequência, também de comportamentos ecológicos consequentes.

O modelo explicativo dos comportamentos de integração no quadro do ativismo ambiental (McFarlane e Boxall, 2003) demonstra que a orientação dos valores individuais (isto é, antropocêntricos em oposição a biocêntricos) influi nas atitudes específicas dos indivíduos as quais, por sua vez, exercem um impacto no comportamento específico ou geral dos sujeitos em relação ao ambiente. Este modelo corrobora, em parte, os modelos propostos por Stern e Dietz (1994) e Fransson e Gärling (1999). Segundo Stern e Dietz, existiria um vínculo entre as ações pró-ambientais e a afeição a valores ecocêntricos, que exaltam o respeito e a proteção ao ambiente, mas também a valores egocêntricos que põem em relevo os interesses pessoais. Isso se explicaria pelo fato de que o comportamento ecológico encontra a sua origem, tanto no que os indivíduos valorizam, como nas crenças específicas sobre as consequências dos problemas ambientais. O interesse que os indivíduos têm por si, pelos outros e pela biosfera dependeria de uma atitude mais geral relativa aos objetivos que eles valorizam (Stern e Dietz, 1994). Fransson e Gärling (1999) mostram, quanto a eles, que o interesse ambiental, considerado como uma atitude positiva para com o ambiente, desempenha um papel importante na adoção de novas

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condutas. Esta atitude geral tem um impacto, entre outros, no grau de responsabilidade pessoal, que age como um determinante poderoso do comprometimento pró-ambiental. Tratando-se da água, a adoção de comportamentos de preservação deste recurso natural dependeria da conscientização do problema e da elaboração de um diagnóstico construído em função da percepção de uma evolução do estado da água, do ponto de vista quantitativo e qualitativo. Esta tomada de consciência seria dependente das representações do problema, sendo ela própria influenciada pelas caraterísticas contextuais e pelo sistema de valores dos indivíduos e da sociedade (Moser e outros, 2004).

9.3.5.1 O papel das representações sociais

Qual é o vínculo entre práticas, de um lado, e contexto ideológico e cultural, do outro? É possível supor que as representações relativas ao ambiente e aos recursos naturais nos vários contextos culturais constituem filtros interpretativos da realidade e dos meios normativos que orientam os comportamentos tanto individuais como coletivos. Sabe-se que a perceção, as atitudes e os comportamentos atinentes ao ambiente diferem de um país para o outro, na medida em que são modulados pelas condições ambientais e, em especial, pelo estado dos recursos e o contexto societal (cultura, valores, regulamentação, infraestrutura, oportunidades de ação) (Lévy-Leboyer e cols., 1996). As relações com o ambiente estabelecem-se em função da representação que a pessoa organiza com sua experiência, seus valores, suas expetativas e suas preferências. As representações asseguram a organização e a estruturação do real, como a sua conceptualização, organizam-se no âmbito de um sistema cognitivo coerente que estrutura o mundo em que vive o sujeito; tal estruturação é que lhe permite compreender esse mundo, mas também atuar sobre ele. Esse sistema “depende das caraterísticas pessoais do indivíduo, da sua experiência passada e presente em relação com o seu ambiente (e, mais além, com a sua pertença a uma cultura e a uma rede de subcultura) e da antecipação que ele faz dos acontecimentos futuros” (Codol, 1969). Ele se constrói e evolui na prática das relações sociais (Moscovici, 1989). Como sistema de interpretação do mundo, ele torna-se um meio de informação e de desenvolvimento das atitudes em face do objeto da representação.

No que diz respeito à água, por exemplo, as representações são ainda mais importantes, dado que as poluições aquáticas difusas não são objetivamente perceptíveis e podem consequentemente conduzir a interpretações contraditórias (Moser, 1984a). Desse modo, a partir do nível perceptivo, entra em jogo uma interpretação-avaliação do contexto: a água é percebida como ligada a certas atividades, condutas ou significações (Gibson, 1979). As representações sociais ocupam uma posição central entre contextos ideológicos e societais, de um lado, e práticas quotidianas de relação com a água, do outro. Ponto de articulação entre o psicológico e o social, as representações sociais dão conta da maneira como o sujeito interpreta a realidade com que se vê confrontado (Moscovici, 1961; Jodelet, 1989). A condição de produção de uma representação social depende, ao mesmo tempo, da ideologia, dos valores societais e das praxes desenvolvidas em relação com o objeto. O papel da ideologia há de ser considerado como quadro de produção de uma representação social (Rouquette, 1996; Rateau, 2000). A ideologia e os valores

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societais funcionam como condições diretrizes e referenciais que contribuem para as representações sociais do ambiente e dos seus recursos.

As representações sociais revelam-se deste modo como lugar de construção do objeto mediante o qual se expressam as relações com esse mesmo objeto, mas também como o ponto de ancoragem sobre o qual é indispensável agir para favorecer a adoção de comportamentos compatíveis com um desenvolvimento sustentável. Desta maneira, podem ser consideradas algumas soluções a fim de contrariar os efeitos da dita “tragédia dos comuns” e favorecer o desenvolvimento sustentável. Elas apoiam-se numa concepção do homem, quer como irredutivelmente egoísta, quer como capaz de modificar as suas relações com a natureza. A primeira concepção conduz a uma regulação a nível institucional, pela introdução de medidas coercitivas, normativas e incitativas, a fim de encorajar os comportamentos individuais, não obstruindo o interesse geral e preservando os recursos a longo prazo. Esta solução não implica um comprometimento individual profundo no que diz respeito ao problema ambiental e não assegura necessariamente uma constância dos comportamentos pró-ambientais na ausência de pressões normativas. Mas o conflito entre representação e prática, imposta como o hábito comportamental, permite prever a longo prazo a introdução de comportamentos desejáveis. Na perspectiva da responsabilização individual, os meios apropriados concernentes à sensibilização pela problemática ambiental e à transmissão de valores pró-ambientais, no âmbito de pequenos grupos e comunidades, figuram logo como dispositivo retransmissor, qual apelo de sentido moral e de princípios éticos, a fim de suscitar e manter os comportamentos que preservam os bens comuns (Gardner e Stern, 1996). A leve modificação das representações por intermédio da difusão dos conhecimentos, a transmissão de valores ligados à transcendência pessoal e à valorização do ambiente natural, a percepção do controle e da eficácia dos comportamentos adotados, são suscetíveis de causar uma mudança profunda nas relações com o ambiente e comprometer o indivíduo a desenvolver comportamentos compatíveis com um desenvolvimento sustentável.

9.3.5.2 Certezas ambientais e sociais como antecedente do comportamento

A articulação das representações sociais com as certezas ambientais e sociais permite dar conta das condições em que o indivíduo é capaz de se comprometer com ações pró-ambientais. Ele põe em relação os valores societais e as condições ambientais e sociais de uma ação em prol do ambiente (cf. Figura).

Figura 9.1: Ação pró-ambiental e certezas ambiental e social

Valores estéticos e identitários Representação

Sistêmica (ecológica) e global

Valores funcionais e éticosRepresentação

Factual e fragmentadaPercepção de uma evolução quantitativa

e/ou qualitativa⬇

Incerteza ambiental⬇

Certeza social

Percepção de uma inalterabilidadedo recurso⬇

Certeza ambiental⬇

Incerteza social

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Controle individual e societal⬇

Ação de preservação

Ausência de controle⬇

Inação

A incerteza ambiental é uma condição necessária para que uma ação possa ser tomada em consideração. Mas essa ação não pode ser posta em prática sem que haja, ao mesmo tempo, a certeza de que o indivíduo não se encontra só a pôr em prática comportamentos pró-ambientais, isto é, comportamentos valorizados pela sociedade e capazes de produzir efeito (Biel e Gärling, 1995). Inversamente, caso falte percepção da degradação ambiental (grau de utilização abusiva e de degradação do recurso), acompanhada de uma incerteza social, isto é, que falte provavelmente suporte da parte de outros e controle sobre a consequência das suas próprias ações eventuais, o comprometimento com comportamentos pró-ambientais é pouco provável, senão impossível.

Foi assim possível mostrar que a relação dos agricultores com a água, sendo eles grandes consumidores, remete ao seu posicionamento segundo as práticas e à avaliação da tomada de consciência do problema, tomada de consciência que decorre das representações e dos valores individuais e sociais (Weiss, Moser e German, 2006; Moser, Ratiu e DeVanssay, 2004). O comportamento dos agricultores está assim condicionado pelas certezas ambientais e pelas incertezas sociais. Embora valorizando o problema da água, eles, os agricultores, sentem-se pouco atingidos ou responsáveis pela degradação da qualidade da água. Ora, este fator parece indispensável na adoção de um comportamento pró-ambiental (Fransson e Gärling, 1999). Para além de assumir uma responsabilidade, a avaliação da capacidade de ação individual desempenharia um papel absolutamente importante ao nível do comprometimento (Moser e outros, 2004). É precisamente o que distingue os agricultores que mantêm as práticas tradicionais, dos agricultores que adotam práticas pró-ambientais. Embora reconheçam, em sua maioria, a existência de um problema, os conservadores avaliam mais dificilmente a sua capacidade de ação com a água que os outros. A possibilidade de ação concebida pelos agricultores ambientalmente comprometidos pode ser considerada como uma forma de racionalização do seu comprometimento (Joule e Beauvois, 1998). Algumas das diferentes práticas pró-ambientais adotadas foram postas em evidência. Os agricultores biológicos, e, em menor medida, os agricultores implicados em grupos locais, distinguem-se dos agricultores implicados em outras tentativas pró-ambientais, no que diz respeito à valorização do problema e a atribuição de responsabilidades. Os agricultores biológicos valorizam mais o problema da água e atribuem mais responsabilidade que os outros. Além de uma forte pressão social que leva alguns agricultores a lançar-se numa tentativa de agricultura biológica, uma ideologia própria destes agricultores leva-os a dirigir-se a este tipo de tentativa e a justificar o seu comprometimento por valores ecocêntricos que são a própria base da sua profissão (Giraudel e Caplat, 1995).

9.3.5.2 Comunidade, cidadania e desenvolvimento sustentável

A solidariedade revela-se como um conceito-chave, quando se trata de abordar a questão dos comportamentos pró-ambientais, comportamentos absolutamente opostos ao individualismo.

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O desenvolvimento sustentável implica (1) uma solidariedade, uma capacidade de cooperação e de ajuda mútua, mediante um suporte social formal e informal, no interior de uma mesma geração, e (2) uma solidariedade com as gerações futuras. Trata-se aí da construção, por meio da participação, de uma ética do bem comum, eminentemente importante, quando se trata de agir de maneira a permitir um desenvolvimento sustentável. Junta-se a isto a apropriação do ambiente, expressa por um sentimento de afeição e pertença que contribui para aumentar o sentido de responsabilidade individual e coletivo por esse mesmo ambiente.

Uma sociedade organizada e a coesão social favorecem a sustentabilidade, em oposição às “estratégias individuais de sobrevivência”. Sem uma textura social bem estabelecida e sólida e a presença de uma identidade social e espacial, o desenvolvimento sustentável não pode ser assegurado. O desenvolvimento sustentável deve poder apoiar-se numa comunidade que tenha uma identidade social, o que implica responsabilidade pelo ambiente, solidariedade e equidade (Pol, 2002). Ao contrário, uma sociedade dominada por estratégias de sobrevivência individual não pode ativar comportamentos compatíveis com um desenvolvimento sustentável. É o que especialmente mostrou Navarro (2008), numa pesquisa sobre os desafios em torno da água na Sierra Nevada de Santa Marta, na Colômbia, um assunto geopolítico e culturalmente muito complexo. De fato, além dos aldeãos e citadinos consumidores de água corrente, várias entidades territoriais partilham o mesmo território e os seus recursos de água, particularmente três reservas indígenas. Baseados nas representações sociais, os resultados põem em evidência, não só as particularidades da concepção da água nas diferentes populações atingidas (índios, rurais e citadinos), mas também os usos diferenciados que dela fazem. As concepções da água estão intimamente ligadas aos usos e, intermediando uma legitimidade subjetivamente construída, elas tornaram-se fonte de conflito.

A solidariedade necessária à proteção eficaz dos recursos naturais não pode ser gerada senão por intermédio das comunidades, isto é, pelo sentimento de fazer parte de uma rede social de relações nas quais o indivíduo pode confiar. A comunidade gera os seus próprios símbolos que, através da qualificação do espaço, permitem a emergência de um sentido da comunidade que consolida a coesão social e o sentimento de poder, facilitando uma melhor participação e um sentimento de responsabilidade partilhado pelos membros da comunidade (Garcia, Giuliani e Wiesenfeld, 1994, p. 78).

Reconhece-se que as bagagens teóricas que trazem consigo a psicologia das comunidades e a psicologia ambiental, são complementares. É só com referência às duas abordagens que os problemas relativos ao desenvolvimento sustentável poderão ser resolvidos de maneira satisfatória. E os meios de ação, como os costumeiros na abordagem comunitária, são totalmente similares aos usados pela psicologia ambiental.

9.4 A gestão das relações com o ambiente global

As ações concretas suscetíveis de serem ativadas dependem da existência ou não de um feedback (proximidade temporal e amplitude) e dos custos e benefícios respectivos de um comportamento orientado ao interesse comum. Globalmente, pode-se querer

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encorajar os comportamentos de proteção ambiental (reciclagem, por exemplo) e/ou desencorajar os comportamentos nocivos ao ambiente (destruição da flora e/ou da fauna, utilização de veículos poluentes, por exemplo).

Toda a ação em favor de um comportamento ecológico deve, antes de tudo, elucidar as questões que se seguem: quais são as normas locais e regionais nesta matéria? Qual é a população à qual deve ser dirigida a incitação? Qual é o seu grau de conhecimento consciente e de informação sobre o assunto? Quais são as vantagens para o indivíduo em comprometer-se com um comportamento particular? Como na maior parte dos problemas com que os psicólogos ambientais têm de se confrontar, as soluções em matéria de comportamentos ecológicos não obedecem a uma lógica determinista simples. Para serem eficazes, as intervenções devem levar em conta o contexto individual e societal, apoiar-se no uso simultâneo de várias abordagens e inserir-se num espaço temporal. Por si sós, os programas de conscientização e de educação ambiental resultam em magros resultados e o reforço positivo do comportamento desejável ou o apelo à responsabilidade produzem resultados medíocres. Em matéria de economia de energia, do respeito pela natureza, da preservação dos recursos naturais ou da triagem dos desperdícios, as estratégias que combinam e integram esses diversos meios, acompanhados de uma multiplicação de oportunidades comportamentais facilmente disponíveis (distribuição de sacos de lixos específicos, contêineres na proximidade, etc.) são os mais eficazes. Sendo assim, é nas abordagens, no sentido de “funcionalismo ambiental” (“affordance”), que se podem apoiar as intervenções neste sentido.

As economias de energia, a poluição do ar e a gestão do lixo (triagem e reciclagem) são outros tantos aspectos ambientais para com os quais hão de ser postos em ação comportamentos preocupados com o ambiente.

9.4.1 As economias de energia

Dado que, como na maior parte dos problemas ambientais, sejam também o governo e as grandes indústrias os maiores utilizadores de energia, os habitantes têm normalmente o controle sobre os dispositivos de consumo dos recursos energéticos. A economia no habitat pode ter consequências importantes no consumo global de energia (cf. horários de verão/inverno, diminuição da temperatura de conforto nos imóveis coletivos). As economias de energia têm não só consequências individuais diretas, tais como a redução do custo por cliente, mas também consequências mais vastas, como a redução da dependência internacional do país.

As economias de energia, além dos arranjos técnicos, necessitam de mudanças nos hábitos dos residentes. O comportamento de consumo de energia está fortemente dependente dos modos de vida e das atitudes dos moradores: caraterísticas da habitação (unifamiliar ou não), dos habitantes (ricos, numerosos ou não) e das atitudes em relação às economias de energia (Richie, MacDougall e Claxton, 1981). Uma das maneiras mais correntemente utilizadas para influenciar o consumo de energia nos conjuntos residenciais é a educação ambiental por meio da distribuição de brochuras explicativas. Mas estas medidas são ineficazes para mudar os comportamentos (Heberlein, 1975; Palmer, Lloyd e Lloyd, 1978).

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Uma atitude favorável às economias de energia não traz necessariamente consigo os comportamentos adequados (Olsen, 1981). Os próprios residentes que se sentem afetados não adotam senão os comportamentos que lhes são familiares e fáceis de seguir (Simmons, Talbot e Kaplan, 1984, 1985). E aquilo que adotaram não dura para sempre (Kantola, Syme e Campbell, 1984). Além disso, os que declaram adotar certos comportamentos de economia, nem sempre os mantêm efetivamente (Kantola, Syme e Campbell, 1984). Constata-se que, embora os sujeitos tenham assistido a uma formação sobre a economia de energia, formação que inclui as várias medidas a adotar, e tenham saído convencidos disso, não há coisa menos segura do que a adoção efetiva do comportamento (Geller, 1981). Os programas de educação destinados aos estabelecimentos de ensino exercem efeitos positivos nos jovens e nos pais (Steven e outros, 1979). Se as medidas educativas forem acompanhadas de estímulos que facilitem a redução do consumo, constatar-se-á efetivamente uma maior economia (Stern e Gardner, 1981).

Quais são os indivíduos mais capazes de adotar medidas de economia de energia? São as pessoas relativamente pobres e as pessoas relativamente abastadas. Estes últimos têm um nível de instrução mais elevado e podem mais facilmente comprar os equipamentos necessários para uma regulação do consumo. As pessoas relativamente pobres tudo têm a ganhar, restringindo o consumo. Consequentemente, as campanhas de economia de energia têm interesse de pôr à disposição dos pobres os meios necessários. As pessoas que aderem a valores de simplicidade (Leonard-Barton, 1981) e que foram abrangidas pelas privações (Olson, 1981), assim como aqueles que atribuem à sua própria responsabilidade o esbanjamento de energia, estão mais inclinados a adotar soluções de regulação do consumo individual, enquanto os que atribuem o esbanjamento a causas externas, privilegiam soluções coletivas (Belk, Painter e Semenik, 1981). Nos imóveis coletivos, onde o esbanjamento de alguns é repartido entre o total dos locatários, o consumo médio de energia é mais elevado.

Entre os meios que podem ser usados para incitar a população a fazer economia de energia, há três que foram especialmente mais aplicados: as campanhas de incitação, de sensibilização e educação, o feedback e as recompensas monetárias. E quais foram relativamente as eficácias?

A incitação é globalmente mais eficaz que os programas de sensibilização (Wodarski, 1982). As informações ao pé dos consumidores quanto à maneira de economizar a energia e, portanto, dinheiro, não tiveram nenhuma influência (Cone e Hayes, 1980; Geller, Winett e Everett, 1982) O feedback sobre o consumo de energia tem de ser imediato (contador) para ser eficaz. Seligman e Darley (1977) informaram quatro vezes por semana a algumas famílias sobre o seu consumo efetivo de eletricidade. As famílias assim informadas fizeram uma economia de 10% comparadas com as não informadas regularmente. Estes resultados estão de acordo com outros estudos que obtiveram, na totalidade, economias de 5 a 15% (Geller, Winett e Everett, 1982). Becker (1978) mostra que tais economias são ainda maiores, se as famílias se fixarem livremente uma percentagem a alcançar (20%). Becker e Seligman (1978) introduziram uma testemunha luminosa que se acendia, logo que a temperatura exterior não necessitava de ar condicionado, cujo funcionamento cessava, caso o aparelho se mantivesse aceso. Tratava-se ali também de um procedimento que produzia efeitos positivos substanciais. A informatização dos lares abre assim

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possibilidades de feedback de consumo que não se deve negligenciar. As incitações materiais como reforço positivo do comportamento desejado, foram amplamente utilizadas. Nos imóveis coletivos, Slaven e cols. (1981) e Walter (1979) obtiveram efeitos massivos, redistribuindo pela metade aos locatários os benefícios da economia de energia. Nos alojamentos individuais, certos descontos cedidos aos que economizam, também podem influenciar favoravelmente o consumo (Winett, Neale e Grier, 1979; Winet e cols., 1979). Inversamente, o reforço negativo, isto é, o aumento progressivo do preço da energia em função do consumo não produz efeitos substanciais (Stern e Gardner, 1981). De modo geral, o feedback parece ser o melhor meio de fazer economizar a energia. Ellis e Gashell (1978) fazem notar que os habitantes devem ser motivados e devem ter recebido as informações necessárias sobre as consequências deste ou daquele comportamento de economia. Embora a informação e a educação não motivem os consumidores, as incitações monetárias motiva-os, mas não lhes ensina como agir; o único meio eficaz parece ser o feedback que inclui os elementos motivacionais e informativos necessários.

9.4.2 Poluição do ar e transportes

Embora grande parte da poluição do ar seja ocasionada pelas indústrias, os indivíduos contribuem com os seus comportamentos para aumentar a poluição quotidiana, particularmente utilizando o seu veículo pessoal. Os benefícios a curto prazo do veículo particular são bem conhecidos e são essencialmente individuais (privacidade, prestígio, velocidade adaptada, controle), enquanto os inconvenientes (poluição e esbanjamento de energia) são efeitos coletivos a longo prazo. Os estudos sobre este tema referente (a) às condições da redução e utilização do veículo particular, (b) a partilha dos trajetos, e (c) as maneiras de promover uma utilização crescente dos transportes em comum.

Foxx e Hake (1977) expõem as recompensas a quem restringe o uso da sua viatura, obtendo uma redução de 20% nos quilômetros percorridos. A partilha de uma quantidade limitada de gasolina (o racionamento) teria, segundo Cass e Edney (1978), efeitos positivos. Os hábitos de condução também podem levar à economia de energia. Um estudo com feedback de consumo aplicado a automobilistas, combinado com recompensas, deu resultados encorajadores (Lauridsen, 1977). Runnion e cols. (1978) retomaram, com sucesso, esse procedimento num estudo sobre uma empresa têxtil. O encorajamento à partilha de viatura particular, num mesmo trajeto, pode obter-se mediante um reforço positivo. Mas, tratando-se de um acordo social – o sujeito tem de se pôr de acordo com um estranho – os obstáculos são fundamentais (Barkow, 1974). É claro que quem se aproveita disso vê essencialmente aí uma redução dos custos de transporte e a vantagem de não ter de dirigir todos os dias.

9.4.3 A gestão do lixo

No que diz respeito ao lixo, há dois aspetos a considerar: por um lado, o fato de se desembaraçar dos detritos, não importa onde e como; por outro, participar na triagem dos desperdícios.

O desfazer-se dos detritos, não importa onde, representa um problema cada vez mais relevante em certos ambientes (cidades, praias, redondezas de grandes estradas,

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parques naturais, etc.). Trata-se essencialmente de comportamentos de desleixo individual que se tornam graves pela sua acumulação. Os jovens jogam mais lixo que os outros, os homens mais que as mulheres, os indivíduos, quando sós, mais que em grupo (Osborne e Powers, 1980). Neste domínio, tem sido efetuada uma considerável quantidade de pesquisas (cf. Brasted, Mann e Geller, 1979; Cone e Hayes, 1978; Geller, 1980; Osborne e Powers, 1980).

A presença de detritos incita a livrar-se dos detritos. Lugares sujos e cheios de detritos aumentam cinco vezes mais a probabilidade de que quem passa, jogue ali os seus (Finnie, 1973; Geller, Vitmer e Tuso, 1977; Krauss, Friedman e Whitcup, 1978). Cialdini (1977) mostra que a percentagem de pessoas que joga os seus papéis é menor (10%), quando há um único papel no caminho, do que quando não há nenhum (18%); mas, segundo a regra, um aumento do número de papéis, além de um único, aumenta outro tanto o comportamento de desembaraçar-se dos desperdícios: dois papéis, 20%; quatro, 23%; oito, 41%; e dezesseis, 40%. Com nenhum ou um só detrito, a norma da limpeza torna-se evidente, enquanto com muitos papéis, é a norma inversa que prevalece.

Enquanto as atitudes negativas de poluir o ambiente, livrando-se dos detritos, são amplamente partilhadas, o comportamento não parece consequente. Para influir nele, três medidas podem ser tomadas: dar reforço positivo imediato ao comportamento desejável, aumentar o valor desse comportamento e recompensá-lo. Geller, Winett e Everett (1982) expõem várias estratégias: multiplicar as mensagens sobre tudo o que corre o risco de ser jogado: a mensagem mais eficaz “Tenha a gentileza de nos ajudar a reciclar os desperdícios, jogue os desperdícios no caixote do lixo verde que se encontra ao lado da saída”, mostra bem que o comportamento deve ter uma nota positiva e ser encorajado pela descrição dos meios de agir. Daí resulta uma diminuição de um terço dos desperdícios, enquanto a mensagem “Não jogue, por favor” não tem senão uma taxa de sucesso de menos de 10%.

Jason, Zolik e Matese (1979) constatam que a observação de um modelo de recolha dos dejetos caninos pode ter um efeito positivo. Dar mais oportunidades de comprometimento com o comportamento desejável, multiplicando as ocasiões de o indivíduo nele se envolver, limpando imediatamente todos os lugares onde há desperdícios no chão, com resultados no sentido desejado (Finnie, 1973; O’Neill, Blanck e Joyner, 1980). De um modo geral, os lugares limpos assim continuam por mais tempo, enquanto a presença de papéis provoca rapidamente uma acumulação de desperdícios (Cone e Parban, 1973). Robinson e Frisch (1975) distribuíram prospetos, tanto num lugar limpo como num lugar sujo, e constataram que, no primeiro caso, 13% dos prospetos estavam no chão, no segundo caso, quase metade (44%) foram jogados na praça. A limpeza do local obtém efeitos diferentes segundo os locais. Os comportamentos não são, contudo, os mesmos nas áreas de piquenique ou de camping. Crump, Nunes e Cossman (1977) observaram o comportamento nos locais de piquenique limpos ou sujos. Nos que estavam sujos, constatou-se que os sujeitos limpam o lugar após a sua partida que se encontra assim mais limpo que antes. Podia parecer que, nos locais cujo interesse é essencialmente ambiental, o que os outros deixaram é recolhido, porque aquilo interfere com a concepção do local que os usuários têm (Geller, Winett e Everett, 1982). Uma razão adicional parece ser o fato de que, durante o piquenique, o local se transforma em território privado. O sentimento de pertença seria acompanhado por um comportamento de preservação.

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Uma quarta abordagem consiste em tornar o comportamento desejado particularmente atraente, oferecendo caixotes de lixo graciosos e agradáveis à vista. Constata-se então um aumento de 35% de desperdícios nos caixotes e menos papel no chão. Finnie (1973) verifica que a presença de caixotes de lixo bem visíveis aumenta em 15% nas cidades e 30% nas autoestradas o comportamento de os utilizar. O fato de os fazer atraentes (coloridos, por exemplo) produz sempre um efeito positivo (Miller e outros, 1976; O’Neill e outros, 1980).

Os meios que se pode usar para fazer com que se adote o comportamento de triagem dos desperdícios caseiros, são essencialmente os mesmos recomendados para não se jogar o lixo onde quer que seja. Humphrey, Bord, Hammond e Mann (1977) puseram à disposição nos escritórios cestos variados para facilitar a triagem. Os resultados mostraram que o implantar um em cada escritório era apenas ligeiramente mais eficaz que dispor um único por andar (92% e 84% dos desperdícios corretamente reciclados).

As estratégias que combinam e integram os vários meios (cartazes, educação e reforço positivo) parecem ser as mais eficazes. Na verdade, a educação ambiental, ela só, produz os resultados menos significativos; os cartazes e anúncios, resultados medíocres; é o reforço positivo, empregado exclusivamente, que parece o mais eficaz (Cones e Haynes, 1980). Um estudo que combinava estes diversos meios foi efetuado por Clark, Hendee e Burgess (1972). Eles avaliaram a eficácia destes meios: uma educação ambiental com a ajuda de um desenho animado, instruções e um reforço monetário do comportamento desejado para levar as pessoas a depositar o lixo nos caixotes. A condição “caixa de lixo mais recompensa” é claramente a mais eficaz, enquanto o pôr à disposição caixas de lixo, elas por si sós, ou o filme educativo, não exerceram praticamente nenhuma influência sobre o comportamento. Estes resultados são confirmados por outros estudos que vão no mesmo sentido (Geller, Chafee e Ingram, 1975; Hayes e Cone, 1977; Kohlenberg e cols., 1976; Luyben e Bailey, 1975). Todavia, não se deve esquecer que cada método representa custos particulares: os pequenos cartazes não são caros, enquanto o reforço positivo necessita da instalação de um controle específico e, portanto, custoso.

9.5 A gestão e a prevenção dos riscos

Poder abrigar-se constitui uma das principais necessidades do indivíduo. As catástrofes naturais e tecnológicas ou os fatos de guerra, ao ameaçarem a sobrevivência e destruírem o habitat, constituem um traumatismo importante para as pessoas que disso são vítimas e necessitam de adaptar-se a novas situações, que são fonte de estresse. A ajuda material de urgência, acompanhada pela autoridade controladora da circulação da informação a fim de evitar rumores, são as primeiras ações a empreender para controlar a situação de crise. Dispor de abrigos de urgência para as pessoas vítimas de catástrofes naturais ou deslocados em virtude de ações de guerra, não pode representar uma solução, se os abrigos não forem instalados na proximidade imediata do habitat destruído, impedindo, desse modo, manter o tecido social, ainda mais importante numa situação dessas. Os deslocamentos massivos de pessoas jamais são coroados de sucesso, dado que as vítimas de catástrofes naturais aspiram, em primeiro lugar, reconstruir o seu habitat, a fim de o reintegrar o mais rápido possível e, por isso, não se preocupam quase nada com prestar atenção às

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autoridades. A análise, com o conjunto de atores das ações empreendidas no setor, logo a seguir ao “retorno da experiência” (de Vanssay, 2002), permite fazer um balanço e melhorar a eficácia da regulação em caso de crise, facilitando às populações enfrentar melhor, no futuro, catástrofes, se elas se repetirem.

Além da sua intervenção após a crise, a psicologia ambiental pode fornecer uma visão particular sobre as catástrofes naturais e tecnológicas, alargando a análise, que tem por objeto o (ou os) fenômeno (s) causador (es), à totalidade do contexto ambiental e das interações entre o indivíduo e o seu ambiente. Nas catástrofes, sejam elas naturais ou industriais, o ambiente sofre evoluções repentinas e importantes que constrangem os indivíduos, os grupos e as instituições a interagir e a adaptar os seus comportamentos; as decisões tomadas, quando adotadas, exercem, em retorno, ação sobre os aspectos tanto sociais quanto ambientais. A dinâmica desta relação particular com o ambiente em situação de crise deve ser levada em conta em todas as etapas da gestão do risco. São poucas as situações em que o tipo e a qualidade da interação indivíduo-ambiente tenham um impacto tão sensível, cujas consequências possam inverter uma situação de acidente menor em situação de crise e acabar por pôr em causa o próprio funcionamento da sociedade.

Em matéria de prevenção e gestão de riscos, o retorno de experiência pós-catástrofe responde, de um lado, a uma demanda social e a uma demanda técnica de explicação da catástrofe ou do acidente, e da busca das causas do acontecimento; e, do outro lado, responde a uma demanda de ensinamentos utilizáveis no futuro. Trata-se de responder a uma necessidade de explicar para controlar; a demanda de explicação emana, ao mesmo tempo, da sociedade civil e dos peritos, a fim de voltar ao acontecimento para tirar dele ensinamentos e desenvolver um instrumento de formação para uso dos serviços. A matriz de análise da catástrofe (Drabek, Miletti e Haas, 1975) cruza assim as fases cronológicas da catástrofe (preparação, alerta, impacto, reação pós-impacto, reabilitação e reconstrução) e os grupos humanos que devem responder a isso (o indivíduo, o pequeno grupo, a organização, a coletividade, a nação, a comunidade internacional). Esta matriz foi retomado por numerosos pesquisadores; ela tem o mérito de clarificar os problemas suscitados pelas interações entre o acaso e os diferentes grupos de populações.

O estudo dos contextos em que se desenrola o acontecimento, propagado em todas as retrospectivas como um elemento explicativo da catástrofe, encontra-se reforçado e justificado pelas teorias de Getzel (1975) sobre a maneira como nós damos feição ao espaço construído e à importância das significações do ambiente na ligação ao território. As teorias referentes às apropriações dos territórios e das suas caraterísticas de produção de segurança, de previsibilidade e de estabilidade podem ser explicativas dos comportamentos das pessoas instaladas nas zonas de risco. O indivíduo apropria-se do espaço a fim de exercer um domínio psicológico sobre ele. O controle do espaço pode expressar-se por um poder legítimo que permite o desenvolvimento de atividades e usos. É um processo dinâmico durante o qual o sujeito procura ter um controle psicológico sobre um quadro físico determinado, o que faz dele um território tranquilizante. A ameaça ocasiona a perda de confiança dos habitantes na sua relação com o ambiente. A catástrofe provoca uma desordem que perturba o processo da apropriação do ambiente (Weiss, Colbeau-Justin e Marchand, 2006). A restauração de um quadro securitário ou de um modo de controle ambiental permite refazer uma relação satisfatória com o ambiente. A noção de “espaços controláveis”, que permite a

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regulação das intrusões, é um dos temas do “domínio do ambiente” no discurso dos que realizam a gestão do risco.

O exemplo do terremoto mortífero de Quindio (Colômbia), em 1999, que relatam B. De Vannsay e L. Colbeau-Justin (2003), ilustra esta relação. A única maneira de integrar os novos parâmetros da realidade (falecimento de vizinhos, destruição do habitat, destruição do bairro, etc.) foi a reapropriação do espaço. Foi feita graças à reespacialização dos sinais de demarcação e à reinserção no espaço de práticas interrompidas ou deslocadas (materialização da casa arrasada por meio dos objetos pessoais recuperados sob os escombros, avisos e inscrições a indicar a deslocação de uma atividade econômica para outro lugar, etc.).

Por serem pertinentes, os métodos de retrospectiva, hoje requeridos, não podem poupar uma abordagem de psicologia ambiental, seja o objetivo o de antecipar explicações do acidente e dele tirar lições, ou o de produzir instrumentos de formação (Vannsay e Colbeau-Justin, 2003). Esta abordagem, nova nas ciências sociais e nos estudos de catástrofes, permite explicar comportamentos considerados até aqui como absurdos ou não explicados. Viu-se recentemente, quando da erupção do Nyiragongo, os habitantes de Goma regressar em massa para habitar lugares devastados pelas lavas ainda fumegantes: o apego aos lugares continua sendo o último baluarte da identidade desses refugiados e do seu sentimento de segurança, por muito precário que seja.

Resumo

Os problemas ambientais reagrupam fenômenos muito diversos cujas consequências são dificilmente concebíveis pelo indivíduo, além disso, é impossível perceber o estado do ambiente a um nível global.

Embora as atitudes sejam uma preparação para a ação, elas não são ligadas de maneira sistemática aos comportamentos. Outros modelos apoiados sobre a representação de si e a representação dos outros, o dilema social, isto é, a escolha alternativa entre a ação em favor do interesse individual e a ação em favor do interesse comum, os valores e notadamente os mitos da natureza aos quais os indivíduos aderem e a representação que o indivíduo forja por meio de suas experiências, seus valores, suas expectativas e suas preferências, mostram-se os determinantes essenciais do comportamento do indivíduo em matéria de preservação do ambiente. Ao nível societal, a coesão social favorece a sustentabilidade em oposição às estratégias individuais de sobrevivência. Sem um tecido social bem estável e sólido e a presença de uma identidade social e espacial o desenvolvimento sustentável não pode ser assegurado.

Palavras- chave

Preservação do ambiente

Representação de si

Dilema social

Interesse comum

Valores

Mitos da natureza

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Expectativa

Preferências

Coesão social

Questões

1. Numerosos fatores parecem favorecer ou, ao contrário, frear a adoção de comportamentos compatíveis com o desenvolvimento sustentável. Por que não se pode aplicar diretamente os saberes?

2. Por que falar em dilema social em relação à adoção de comportamentos pro ambientais?

3. Qual é a relação entre identidade e engajamento nos comportamentos pro ambientais?

4. O que se entende por oportunidades ambientais e qual o papel que elas desempenham nos comportamentos pro-ambientais?

5. Como intervém a comparação social nos processos de engajamento dos comportamentos em favor do desenvolvimento sustentável?

6. Em que sentido cada problemática ambiental global é singular?