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Informativo 938-STF (03/05/2019) – Márcio André Lopes Cavalcante | 1 Informativo comentado: Informativo 938-STF Márcio André Lopes Cavalcante Processos excluídos deste informativo pelo fato de não terem sido ainda concluídos em virtude de pedidos de vista ou de adiamento. Serão comentados assim que chegarem ao fim: RE 566622 ED/RS; HC 157012/MS. ÍNDICE DIREITO PROCESSUAL CIVIL RECLAMAÇÃO O ato impugnado na reclamação deve ser posterior à decisão paradigma que se alega violada. DIREITO PENAL PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA Possibilidade de aplicar o regime inicial aberto ao condenado por furto, mesmo ele sendo reincidente, desde que seja insignificante o bem subtraído. DIREITO PROCESSUAL PENAL RECLAMAÇÃO O ato impugnado na reclamação deve ser posterior à decisão paradigma que se alega violada. DIREITO TRIBUTÁRIO ISSQN É inconstitucional lei municipal que crie restrições não previstas no art. 9º, §1º, do DL 406/68 para que sociedades de advogados tenham direito ao regime do ISSQN Fixo. IPI Empresas que adquirem insumos, matéria prima e material de embalagem de indústrias da ZFM possuem direito ao creditamento de IPI mesmo que a venda tenha ocorrido sob o regime de isenção. DIREITO FINANCEIRO ORÇAMENTO LC federal deve fixar os valores mínimos a serem aplicados anualmente pela União, Estados, Distrito Federal e Municípios em ações e serviços públicos de saúde, não podendo norma de Constituição estadual ou lei orgânica prever esses percentuais.

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Márcio André Lopes Cavalcante Processos excluídos deste informativo pelo fato de não terem sido ainda concluídos em virtude de pedidos de vista ou de adiamento. Serão comentados assim que chegarem ao fim: RE 566622 ED/RS; HC 157012/MS.

ÍNDICE DIREITO PROCESSUAL CIVIL

RECLAMAÇÃO O ato impugnado na reclamação deve ser posterior à decisão paradigma que se alega violada.

DIREITO PENAL

PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA Possibilidade de aplicar o regime inicial aberto ao condenado por furto, mesmo ele sendo reincidente, desde que

seja insignificante o bem subtraído.

DIREITO PROCESSUAL PENAL

RECLAMAÇÃO O ato impugnado na reclamação deve ser posterior à decisão paradigma que se alega violada.

DIREITO TRIBUTÁRIO

ISSQN É inconstitucional lei municipal que crie restrições não previstas no art. 9º, §1º, do DL 406/68 para que sociedades

de advogados tenham direito ao regime do ISSQN Fixo. IPI Empresas que adquirem insumos, matéria prima e material de embalagem de indústrias da ZFM possuem direito

ao creditamento de IPI mesmo que a venda tenha ocorrido sob o regime de isenção.

DIREITO FINANCEIRO

ORÇAMENTO LC federal deve fixar os valores mínimos a serem aplicados anualmente pela União, Estados, Distrito Federal e

Municípios em ações e serviços públicos de saúde, não podendo norma de Constituição estadual ou lei orgânica prever esses percentuais.

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DIREITO PROCESSUAL CIVIL

RECLAMAÇÃO O ato impugnado na reclamação deve ser posterior à decisão paradigma que se alega violada

Importante!!!

Na reclamação fundada no descumprimento de decisão emanada pelo STF, o ato alvo de controle deve ser posterior ao paradigma.

Ex: em 2016, o Juiz proferiu decisão negando a homologação do acordo de colaboração premiada celebrado com o Delegado de Polícia sob o argumento de que a autoridade policial não poderia firmar esse pacto. Em 2018, o STF proferiu decisão afirmando que o Delegado de Polícia pode formalizar acordos de colaboração premiada na fase de inquérito policial. Não cabe reclamação contra esta decisão do Juiz de 2016 sob o argumento de que ela teria violado o acórdão do STF de 2018. Isso porque só há que se falar em reclamação se o ato impugnado por meio desta ação é posterior à decisão paradigma.

STF. 2ª Turma. Rcl 32655 AgR/PR, Rel. Min. Edson Fachin, julgado em 23/4/2019 (Info 938).

Ver comentários em Direito Processual Penal.

DIREITO PENAL

PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA Possibilidade de aplicar o regime inicial aberto ao condenado por furto, mesmo ele sendo

reincidente, desde que seja insignificante o bem subtraído

A reincidência não impede, por si só, que o juiz da causa reconheça a insignificância penal da conduta, à luz dos elementos do caso concreto.

No entanto, com base no caso concreto, o juiz pode entender que a absolvição com base nesse princípio é penal ou socialmente indesejável. Nesta hipótese, o magistrado condena o réu, mas utiliza a circunstância de o bem furtado ser insignificante para fins de fixar o regime inicial aberto. Desse modo, o juiz não absolve o réu, mas utiliza a insignificância para criar uma exceção jurisprudencial à regra do art. 33, § 2º, “c”, do CP, com base no princípio da proporcionalidade

STF. 1ª Turma. HC 135164/MT, Rel. Min. Marco Aurélio, red. p/ ac. Min. Alexandre de Moraes, julgado em 23/4/2019 (Info 938).

É possível aplicar o princípio da insignificância em favor de um réu reincidente ou que já responda a outros inquéritos ou ações penais? A aplicação do princípio da insignificância envolve um juízo amplo (“conglobante”), que vai além da simples aferição do resultado material da conduta, abrangendo também a reincidência ou contumácia do agente, elementos que, embora não determinantes, devem ser considerados. A reincidência não impede, por si só, que o juiz da causa reconheça a insignificância penal da conduta, à luz dos elementos do caso concreto.

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Apesar disso, na prática, observa-se que, na maioria dos casos, o STF e o STJ negam a aplicação do princípio da insignificância caso o réu seja reincidente ou já responda a outros inquéritos ou ações penais. Negando o princípio da insignificância no furto por conta da reincidência, o juiz deve conceder o regime inicial aberto Se o juiz entender que deve negar o princípio da insignificância para o furto porque o agente é reincidente, então, neste caso, a pena privativa de liberdade deverá ser fixada em regime inicial aberto. Trata-se de uma “exceção” jurisprudencial feita ao art. 33, § 2º, “c”, do CP, com base no princípio da proporcionalidade:

Art. 33 (...) § 2º As penas privativas de liberdade deverão ser executadas em forma progressiva, segundo o mérito do condenado, observados os seguintes critérios e ressalvadas as hipóteses de transferência a regime mais rigoroso: (...) c) o condenado não reincidente, cuja pena seja igual ou inferior a 4 (quatro) anos, poderá, desde o início, cumpri-la em regime aberto.

Assim, em regra, o condenado reincidente não pode começar a cumprir a pena em regime inicial aberto. No entanto, se o bem furtado foi insignificante e o juiz entendeu que não deveria absolver o réu, deverá, pelo menos, conceder o regime inicial aberto. Nesse sentido:

(...) 1. A aplicação do princípio da insignificância envolve um juízo amplo (“conglobante”), que vai além da simples aferição do resultado material da conduta, abrangendo também a reincidência ou contumácia do agente, elementos que, embora não determinantes, devem ser considerados. 2. Por maioria, foram também acolhidas as seguintes teses: i) a reincidência não impede, por si só, que o juiz da causa reconheça a insignificância penal da conduta, à luz dos elementos do caso concreto; e ii) na hipótese de o juiz da causa considerar penal ou socialmente indesejável a aplicação do princípio da insignificância por furto, em situações em que tal enquadramento seja cogitável, eventual sanção privativa de liberdade deverá ser fixada, como regra geral, em regime inicial aberto, paralisando-se a incidência do art. 33, § 2º, c, do CP no caso concreto, com base no princípio da proporcionalidade. (...) STF. Plenário. HC 123108, Rel. Min. Roberto Barroso, julgado em 03/08/2015 (Info 793).

Resumindo. Condenado reincidente pode ser absolvido do crime de furto com base no princípio da insignificância? • Sim. A reincidência não impede, por si só, que o juiz da causa reconheça a insignificância penal da conduta, à luz dos elementos do caso concreto. • No entanto, com base no caso concreto, o juiz pode entender que a absolvição com base nesse princípio é penal ou socialmente indesejável. Nesta hipótese, o magistrado condena o réu, mas utiliza a circunstância de o bem furtado ser insignificante para fins de fixar o regime inicial aberto. Desse modo, o juiz não absolve o réu, mas utiliza a insignificância para criar uma exceção jurisprudencial à regra do art. 33, § 2º, “c”, do CP, com base no princípio da proporcionalidade. Imagine agora a seguinte situação concreta: Erik subtraiu de uma loja uma camisa polo e uma bermuda, avaliadas em R$ 130,00. O agente foi denunciado pela prática de furto simples (art. 155, caput, do CP). Vale ressaltar que, antes da prática desta conduta, Erik já havia sido condenado anteriormente por furto. Em outras palavras, Erik era reincidente. A defesa pediu a absolvição invocando a aplicação do princípio da insignificância.

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A tese não foi acolhida e Erik restou condenado a 1 ano e 9 meses de reclusão, em regime inicial semiaberto, nos termos do art. 33, § 2º, do CP:

Art. 33 (...) § 2º As penas privativas de liberdade deverão ser executadas em forma progressiva, segundo o mérito do condenado, observados os seguintes critérios e ressalvadas as hipóteses de transferência a regime mais rigoroso: (...) c) o condenado não reincidente, cuja pena seja igual ou inferior a 4 (quatro) anos, poderá, desde o início, cumpri-la em regime aberto.

A defesa levou o caso até o STF. O que ficou decidido? O réu foi absolvido? NÃO. O STF reafirmou que é possível ao juiz, com base nas circunstâncias do caso concreto, afastar a absolvição do réu com base no princípio da insignificância no caso de ele já ser reincidente. Por outro lado, admitiu a fixação do regime aberto na hipótese.

A reincidência não impede, por si só, que o juiz da causa reconheça a insignificância penal da conduta, à luz dos elementos do caso concreto. No entanto, com base no caso concreto, o juiz pode entender que a absolvição com base nesse princípio é penal ou socialmente indesejável. Nesta hipótese, o magistrado condena o réu, mas utiliza a circunstância de o bem furtado ser insignificante para fins de fixar o regime inicial aberto. Desse modo, o juiz não absolve o réu, mas utiliza a insignificância para criar uma exceção jurisprudencial à regra do art. 33, § 2º, “c”, do CP, com base no princípio da proporcionalidade. STF. 1ª Turma. HC 135164/MT, Rel. Min. Marco Aurélio, red. p/ ac. Min. Alexandre de Moraes, julgado em 23/4/2019 (Info 938).

Veja como o tema já foi cobrado em prova: (Juiz TJ/CE 2018 CESPE) A reincidência do acusado não é motivo suficiente para afastar a aplicação do princípio da insignificância. (certo)

DIREITO PROCESSUAL PENAL

RECLAMAÇÃO O ato impugnado na reclamação deve ser posterior à decisão paradigma que se alega violada

Importante!!!

Na reclamação fundada no descumprimento de decisão emanada pelo STF, o ato alvo de controle deve ser posterior ao paradigma.

Ex: em 2016, o Juiz proferiu decisão negando a homologação do acordo de colaboração premiada celebrado com o Delegado de Polícia sob o argumento de que a autoridade policial não poderia firmar esse pacto. Em 2018, o STF proferiu decisão afirmando que o Delegado de Polícia pode formalizar acordos de colaboração premiada,na fase de inquérito policial. Não cabe reclamação contra esta decisão do Juiz de 2016 sob o argumento de que ela teria violado o acórdão do STF de 2018. Isso porque só há que se falar em reclamação se o ato impugnado por meio desta ação é posterior à decisão paradigma.

STF. 2ª Turma. Rcl 32655 AgR/PR, Rel. Min. Edson Fachin, julgado em 23/4/2019 (Info 938).

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O que é a reclamação? Reclamação é uma... - ação - proposta pela parte interessada ou pelo MP - com o objetivo de cassar uma decisão judicial ou um ato administrativo que tenha violado: a) a competência de um tribunal (Tribunal de 2º grau ou Tribunal Superior); b) a autoridade de uma decisão do tribunal (Tribunal de 2º grau ou Tribunal Superior); d) súmula vinculante; e) decisão do STF em controle concentrado de constitucionalidade; f) acórdão proferido em julgamento de incidente de resolução de demandas repetitivas ou de incidente de assunção de competência. Natureza jurídica Existe intensa divergência sobre a natureza jurídica da reclamação. Há julgado do STF no qual se afirmou que este instituto seria mero exercício do direito de petição (ADI 2.212/CE, julgado em 02/10/2003). No entanto, a posição que prevalece amplamente na doutrina é de que a reclamação possui natureza jurídica de ação. • STF: direito de petição. • Doutrina: ação. Hipóteses de cabimento As hipóteses de cabimento da reclamação (mesmo que se refiram a processos criminais) estão previstas no art. 988 do CPC/2015:

Art. 988. Caberá reclamação da parte interessada ou do Ministério Público para: I - preservar a competência do tribunal; II - garantir a autoridade das decisões do tribunal; III - garantir a observância de enunciado de súmula vinculante e de decisão do Supremo Tribunal Federal em controle concentrado de constitucionalidade; IV - garantir a observância de acórdão proferido em julgamento de incidente de resolução de demandas repetitivas ou de incidente de assunção de competência; (...) § 4º As hipóteses dos incisos III e IV compreendem a aplicação indevida da tese jurídica e sua não aplicação aos casos que a ela correspondam.

Existe ainda uma quinta hipótese que está prevista no § 5º do art. 988. Trata-se da reclamação proposta contra decisão que tenha descumprido tese fixada pelo STF em recurso extraordinário julgado sob o rito da repercussão geral. A Lei exige, no entanto, que, antes de a parte apresentar a reclamação, ela deve ter esgotado todos os recursos cabíveis nas “instâncias ordinárias”. Veja a redação do dispositivo:

Art. 988 (...) § 5º É inadmissível a reclamação: (...) II – proposta para garantir a observância de acórdão de recurso extraordinário com repercussão geral reconhecida ou de acórdão proferido em julgamento de recursos extraordinário ou especial repetitivos, quando não esgotadas as instâncias ordinárias.

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Atenção para a reclamação contra ato administrativo que violou súmula vinculante A Lei nº 11.417/2006 prevê o cabimento de reclamação contra ato administrativo que violar súmula vinculante. A Lei exige, no entanto, que, antes da reclamação, tenha havido o prévio esgotamento das vias administrativas. Confira:

Art. 7º Da decisão judicial ou do ato administrativo que contrariar enunciado de súmula vinculante, negar-lhe vigência ou aplicá-lo indevidamente caberá reclamação ao Supremo Tribunal Federal, sem prejuízo dos recursos ou outros meios admissíveis de impugnação. § 1º Contra omissão ou ato da administração pública, o uso da reclamação só será admitido após esgotamento das vias administrativas. § 2º Ao julgar procedente a reclamação, o Supremo Tribunal Federal anulará o ato administrativo ou cassará a decisão judicial impugnada, determinando que outra seja proferida com ou sem aplicação da súmula, conforme o caso.

Imagine agora a seguinte situação adaptada: Neusa estava sendo investigada na operação “Lava Jato” por ter praticado inúmeros crimes. Em 2015, Neusa aceitou firmar um acordo de colaboração premiada com a Polícia Federal. Uma das cláusulas previa que Neusa teria direito de ficar com 15 apartamentos de sua propriedade. Este acordo foi assinado pela colaboradora e pelo Delegado de Polícia Federal. Ocorre que o Juiz se recusou a homologar o acordo sob o argumento de que o Delegado de Polícia não poderia celebrar acordo de colaboração premiada. Para o magistrado, somente o Ministério Público poderia firmar este tipo de ajuste. Diante desta negativa, em 2016, a investigada firmou novo acordo, desta vez com o Ministério Público Federal. Ocorre que esse segundo ajuste foi mais desvantajoso, considerando que nele ficou previsto que ela teria direito de ficar com “apenas” cinco apartamentos. Este segundo acordo, celebrado com o MPF, foi homologado pelo Juiz Federal. Decisão do STF em 2018 Em 2018, o STF, ao contrário do que havia decidido o Juiz, entendeu que é possível sim que o Delegado de Polícia celebre acordo de colaboração premiada:

O Delegado de Polícia pode formalizar acordos de colaboração premiada, na fase de inquérito policial, respeitadas as prerrogativas do Ministério Público, o qual deverá se manifestar, sem caráter vinculante, previamente à decisão judicial. STF. Plenário. ADI 5508/DF, Rel. Min. Marco Aurélio, julgado em 20/6/2018 (Info 907).

Reclamação Diante do cenário acima, Neusa ingressou com reclamação no STF afirmando que a decisão proferida pelo Juiz Federal (em 2015) recusando-se a homologar o acordo celebrado com o Delegado de Polícia afrontou a autoridade da decisão do Supremo na ADI 5508/DF. Assim, Neusa explicou que foi prejudicada pelo fato de o Juiz não ter homologado o primeiro acordo e, assim, pediu que o STF assegurasse a ela a incidência das cláusulas negociais estabelecidas com a Polícia Federal e contidas no primeiro ajuste, com base na aplicação da lei mais benéfica em favor da Reclamante, (art. 5º, XL, da CF/88). O pedido da defesa foi acolhido pelo STF? NÃO. Não cabe reclamação neste caso. Isso porque:

Na reclamação fundada no descumprimento de decisão emanada pelo STF, o ato alvo de controle deve ser posterior ao paradigma. STF. 2ª Turma. Rcl 32655 AgR/PR, Rel. Min. Edson Fachin, julgado em 23/4/2019 (Info 938).

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A decisão do Juiz que não homologou o acordo com a Polícia Federal foi proferida em 2016, antes, portanto, da decisão paradigma que supostamente teria sido violada (acórdão do STF na ADI 5508/DF proferido em 2018). Logo, não se pode dizer que um ato de 2016 tenha violado uma decisão de 2018, considerando que, quando o ato foi praticado (decisão do Juiz negando a homologação), o STF ainda não tinha posicionamento sobre o tema. O que a reclamante pretende é conferir eficácia retrospectiva ao acórdão proferido na ADI 5508/DF, fazendo prevalecer o acordo celebrado com a autoridade policial. Não se trata de pedido possível de ser feito em reclamação. A reclamação não se presta a tutelar o direito objetivo, mas, sobretudo, a salvaguardar a competência e a autoridade dos pronunciamentos do STF. Eventual inobservância da retroatividade da lei penal benéfica não se insere no escopo de proteção da reclamação, devendo o interessado, se cabível, socorrer-se da tutela jurisdicional pelas vias próprias.

DIREITO TRIBUTÁRIO

IPI Empresas que adquirem insumos, matéria prima e material de embalagem de indústrias da ZFM

possuem direito ao creditamento de IPI mesmo que a venda tenha ocorrido sob o regime de isenção

Há direito ao creditamento de Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) na entrada de insumos, matéria-prima e material de embalagem adquiridos junto à Zona Franca de Manaus sob o regime da isenção, considerada a previsão de incentivos regionais constante do art. 43, § 2º, III, da Constituição Federal, combinada com o comando do art. 40 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias.

STF. Plenário. RE 592891/SP, Rel. Min. Rosa Weber e RE 596614/SP, rel. Min. Marco Aurélio, red. p/ ac. Min. Edson Fachin, julgados em 24 e 25/4/2019 (repercussão geral) (Info 938).

NOÇÕES GERAIS SOBRE IPI

IPI IPI é a sigla para Imposto sobre Produtos Industrializados. Trata-se de um tributo federal que incide sobre a produção e a circulação de produtos industrializados. O IPI foi instituído por meio da Lei nº 4.502/64. Fato gerador do IPI Segundo o art. 46 do CTN, o IPI possui três fatos geradores: I - o desembaraço aduaneiro do produto industrializado, quando de procedência estrangeira; II - a saída do produto industrializado do estabelecimento industrial ou equiparado a industrial; III - a arrematação do produto industrializado, quando apreendido ou abandonado e levado a leilão. Princípio da não-cumulatividade O IPI é um imposto não cumulativo (art. 153, § 3º, II, da CF/88), o que significa que é possível compensar o que for devido em cada operação com o montante cobrado nas anteriores, ou seja, o valor pago na

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operação imediatamente anterior pode ser abatido do mesmo imposto em operação posterior (art. 49 do CTN). “A cada aquisição tributada de insumo, o adquirente registra como crédito o valor do tributo incidente na operação. Tal valor é um ‘direito’ do contribuinte, consistente na possibilidade de recuperar o valor incidente nas operações subsequentes (é o ‘IPI a recuperar’). A cada alienação tributada de produto, o alienante registra como débito o valor do tributo incidente na operação. Tal valor é uma obrigação do contribuinte, consistente no dever de recolher o valor devido aos cofres públicos federais ou compensá-los com os créditos obtidos nas operações anteriores (trata-se do ‘IPI a recolher’). Periodicamente, faz-se uma comparação entre os débitos e créditos. Caso os débitos sejam superiores aos créditos, o contribuinte deve recolher a diferença aos cofres públicos. Caso os créditos sejam maiores, a diferença pode ser compensada posteriormente ou mesmo, cumpridos determinados requisitos, ser objeto de ressarcimento.” (ALEXANDRE, Ricardo. Direito Tributário esquematizado. São Paulo: Método, 2016, p. 586). NOÇÕES GERAIS SOBRE A ZONA FRANCA DE MANAUS

Zona Franca de Manaus (ZFM) A Amazônia é uma região de enorme relevância para o Brasil e o mundo em razão de sua biodiversidade. Em razão disso, existe uma grande pressão interna e até estrangeira para que essa área seja preservada. O Governo Federal chegou à conclusão de que precisava tomar medidas para evitar que a Floresta Amazônica fosse devastada. No entanto, ao mesmo tempo, seria necessário garantir que a população que vive na região tivesse uma alternativa econômica, ou seja, pudesse trabalhar e ter renda sem precisar desmatar. Diante desse cenário, decidiu-se que seria interessante criar um polo industrial em Manaus, capital do Amazonas, a fim de permitir que as pessoas tivessem emprego e não precisassem explorar, de forma desordenada, os recursos naturais existentes principalmente no interior no Estado. Ocorre que Manaus é distante dos grandes centros consumidores do Brasil (exs: SP, RJ, MG), de sorte que não havia motivos econômicos que justificassem uma indústria decidir se instalar no Amazonas. Para o setor industrial, seria muito mais vantajoso se manter nos Estados do centro-sul do país. Nesse contexto, o Governo Federal percebeu que seria indispensável fomentar a instalação das indústrias no Amazonas. Para fazer isso, mostrou-se imprescindível conceder incentivos fiscais, ou seja, a isenção ou redução drástica de impostos. Assim, quando uma indústria estivesse decidindo onde ficaria a sua unidade produtiva, poderia escolher se instalar em Manaus, já que, estando lá, pagaria menos impostos. Desse modo, em 1957, foi editada a Lei nº 3.273/57 criando uma zona franca na cidade de Manaus. Os incentivos, contudo, ainda eram muito restritos e não surtiram tanto efeito prático. Dez anos mais tarde, o Governo Federal publicou o Decreto-Lei nº 288/1967 ampliando bastante o modelo e estabelecendo que a Zona Franca de Manaus seria uma área de livre comércio. Veja o art. 1º:

Art. 1º A Zona Franca de Manaus é uma área de livre comércio de importação e exportação e de incentivos fiscais especiais, estabelecida com a finalidade de criar no interior da Amazônia um centro industrial, comercial e agropecuário dotado de condições econômicas que permitam seu desenvolvimento, em face dos fatores locais e da grande distância, a que se encontram, os centros consumidores de seus produtos.

As indústrias que se instalam na Zona Franca de Manaus gozam de incentivos fiscais, como a isenção total ou parcial de alguns impostos e contribuições federais, como é o caso do IPI, do imposto de importação, do imposto de renda e do PIS/PASEP. Conforme já expliquei, essa Zona Franca foi criada com o objetivo de levar o desenvolvimento para a Amazônia, fomentando a formação de um centro industrial e comercial na região. Com isso, os habitantes

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da localidade possuem alternativas econômicas para não precisarem utilizar, de forma devastadora, os recursos ambientais. A Zona Franca de Manaus é constitucional ou viola o princípio da uniformidade geográfica ou uniformidade tributária prevista no art. 151, I, da CF/88? Segundo o princípio da uniformidade geográfica, também chamado de princípio da não-discriminação tributária ou da defesa da identidade de alíquotas, os tributos federais deverão ser uniformes em todo o território nacional. Trata-se de previsão expressa do art. 151, I, da CF/88:

Art. 151. É vedado à União: I - instituir tributo que não seja uniforme em todo o território nacional ou que implique distinção ou preferência em relação a Estado, ao Distrito Federal ou a Município, em detrimento de outro, admitida a concessão de incentivos fiscais destinados a promover o equilíbrio do desenvolvimento sócio-econômico entre as diferentes regiões do País;

A Zona Franca de Manaus não viola esse princípio porque se enquadra na parte final do inciso I do art. 151, ou seja, a concessão dos incentivos tem por objetivo desenvolver uma região do País que precisa de um tratamento diferenciado em razão de suas peculiaridades geográficas. Além disso, quando a CF/88 foi editada, a Zona Franca de Manaus (que já existia desde 1957) foi incluída no art. 40 do ADCT:

Art. 40. É mantida a Zona Franca de Manaus, com suas características de área livre de comércio, de exportação e importação, e de incentivos fiscais, pelo prazo de vinte e cinco anos, a partir da promulgação da Constituição. Parágrafo único. Somente por lei federal podem ser modificados os critérios que disciplinaram ou venham a disciplinar a aprovação dos projetos na Zona Franca de Manaus.

O legislador constituinte optou por essa medida para que não houvesse dúvidas de que ela está de acordo com o princípio da uniformidade geográfica ou uniformidade tributária. Assim, a Zona Franca de Manaus é CONSTITUCIONAL porque foi mantida pela própria CF/88 (art. 40 do ADCT) e também porque se enquadra na parte final do art. 151, I, acima destacado. Prazo de duração da ZFM A ZFM é temporária. A ideia é a de que, com o tempo, a região se desenvolva, encontre outras matrizes econômicas e não precise mais dos incentivos fiscais. Infelizmente, contudo, essa alternativa econômica ainda não aconteceu. Em virtude disso, recentemente, o prazo de duração da ZFM foi prorrogado por mais 50 anos pela EC 83/2014. Assim, a ZFM irá durar até o ano de 2073. CREDITAMENTO DE IPI NA ENTRADA DE INSUMOS ADQUIRIDOS JUNTO À ZFM

Aquisição de insumos e princípio da não-cumulatividade Conforme já explicado, o IPI é um imposto regido pelo princípio da não-cumulatividade. Isso significa que, se uma indústria adquirir um insumo, ela terá direito a um crédito de IPI. Logo, quando essa indústria vender seu produto, ela terá direito de utilizar esse crédito e, consequentemente, pagar menos imposto. Imagine agora a seguinte situação hipotética: Morlan S/A é uma indústria de São Paulo que comprou insumos da empresa SATI S/A, localizada na ZFM. A adquirente pediu para ter direito ao crédito de IPI relativo a essa compra.

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Ocorre que os insumos que a Morlan comprou das empresas da ZFM são isentos do pagamento de IPI. Diante disso, a Receita Federal afirmou que a Morlan não teria direito a creditamento. Isso porque se a operação é isenta, ela não gera crédito de IPI. Assim, não houve imposto efetivamente cobrado. A Morlan contra argumentou dizendo que o valor que a SATI pagaria de IPI por ter vendido os insumos deverá gerar crédito em favor dela (Morlan). Se esse creditamento não for possível, a SATI perde o atrativo, ou seja, a isenção não vai ter poder real de incentivo. Isso porque será melhor para a Morlan comprar os insumos de uma empresa de São Paulo. Se a Morlan comprar os insumos de uma empresa de SP (ex: PATUS S/A), esta vendedora – por não ser isenta de IPI – irá repassar o custo do imposto para o preço do produto vendido. Ocorre que a Morlan poderá utilizar esse custo repassado (valor do IPI) como crédito. Logo, na prática, a Morlan terá o mesmo custo na operação feita com a SATI do que ela teria se fizesse com a PATUS, com a vantagem de que na PATUS ela não pagaria frete. Exemplo fictício (apenas para fins didáticos): • Comprando da SATI: pagou R$ 500 mil pelo insumo. Dentro desse “preço” não está embutido IPI porque a SATI não pagou este imposto. Para a Receita Federal, a Morlan não teria direito ao creditamento do IPI. Logo, o “custo final” dos insumos seria R$ 500 mil (mais o frete). • Comprando da PATUS: pagaria R$ 510 mil pelo insumo. Dentro desse “preço”, R$ 10 mil é de IPI que a PATUS repassou para a Morlan, que, por sua vez, terá direito de utilizar esse crédito de R$ 10 mil para abater impostos que ela vai pagar. Logo, o “custo final” dos insumos seria R$ 500 mil, já que os R$ 10 mil serão aproveitados. Além disso, ela não terá que pagar frete. A tese da indústria foi acolhida pelo STF? A indústria terá direito ao creditamento do IPI mesmo tendo adquirido os insumos de empresa situada na ZFM? SIM.

Há direito ao creditamento de Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) na entrada de insumos, matéria-prima e material de embalagem adquiridos junto à Zona Franca de Manaus sob o regime da isenção, considerada a previsão de incentivos regionais constante do art. 43, § 2º, III, da Constituição Federal, combinada com o comando do art. 40 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias. STF. Plenário. RE 592891/SP, Rel. Min. Rosa Weber e RE 596614/SP, rel. Min. Marco Aurélio, red. p/ ac. Min. Edson Fachin, julgados em 24 e 25/4/2019 (repercussão geral) (Info 938).

Assim, por exemplo, se uma indústria de SP, do RJ, do RS etc. comprar um componente de uma indústria da ZFM (ex: uma peça utilizada para fabricar um carro), esta empresa adquirente terá direito de usar o valor do IPI como crédito tributário como se o imposto tivesse sido pago. ZFM é uma exceção à técnica da não cumulatividade Como regra geral, no caso de tributo não cumulativo, quando a operação anterior é isenta, não existe realmente direito de crédito em favor do adquirente. Isso porque, segundo a técnica da não cumulatividade, prevista no art. 153, § 3º, II, da CF/88, somente é possível creditar o imposto que foi cobrado na operação anterior. Se não foi cobrado imposto (por ser isento), não é possível creditamento. Veja o dispositivo constitucional:

Art. 153. (...) § 3º O imposto previsto no inciso IV (obs: IPI): (...) II – será não cumulativo, compensando-se o que for devido em cada operação com o montante cobrado nas anteriores;

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No entanto, com relação à Zona Franca de Manaus, é devido o aproveitamento de créditos de IPI mesmo se a operação anterior é isenta. Isso porque há, neste caso, uma exceção constitucionalmente justificada à técnica da não cumulatividade (art. 153, § 3º, II), que legitima o tratamento diferenciado. Redução das desigualdades regionais A regra da não cumulatividade cede espaço para a realização da igualdade, do pacto federativo, dos objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil. À luz de uma hermenêutica constitucional de índole sistemática, essa exceção se justifica pela conjugação de diversos dispositivos constitucionais que, interpretados no seu conjunto como um sistema e somados com a legislação infraconstitucional, admitem tal exceção. Há um arcabouço de múltiplos níveis normativos com vista a estabelecer uma importante região socioeconômica, por razões de soberania nacional, inserção nas cadeias globais de consumo e de produção, integração econômica regional e redução das desigualdades regionais e sociais em âmbito federativo. A interpretação mais consentânea com a Constituição é a que reconhece esse tratamento favorecido à ZFM, ao lado do princípio que estimula, nas interpretações constitucionais, a redução das desigualdades regionais, por se tratar de uma alternativa econômica dentro de um Estado distante, de difícil acesso. Sem algum tipo de incentivo, essa região não teria nenhuma condição de ser competitiva no plano nacional. A exegese dos benefícios fiscais direcionados para a Zona Franca deve ser ampla, o mais abrangente possível, para neutralizar as desigualdades existentes e dar máxima efetividade aos incentivos fiscais, como forma de potencializar o desenvolvimento da região. O art. 40 do ADCT não beneficiou a região como uma mera formalidade, mas sim representou um programa que encabeça uma realidade normativa e material caracterizada pela manutenção da área de livre comércio com seus incentivos fiscais (ADI 2348). A despeito da ressignificação constitucional da Zona Franca de Manaus no curso de décadas da história republicana, a sua relevância persiste, conforme se depreende das Emendas Constitucionais 42/2003 e 83/2014. A opção do legislador constituinte em assegurar-lhe um regime jurídico diferenciado até o ano de 2073, perpassando gerações, reflete que o projeto tem desempenhado o seu papel, que vai além do desenvolvimento regional, como centro industrial, comercial e agropecuário, que se soma aos demais parques econômicos do Brasil, verdadeiro motor do crescimento do País. Cumpre, assim, à Zona Franca, por um lado, seu relevante papel de promover a redução das desigualdades regionais e sociais, bem como, por outro, de colaborar com a preservação da soberania nacional, auxiliando na defesa do território brasileiro pela ocupação física diária de sua geografia, cujas riquezas e importância são reconhecidas internacionalmente. Ademais, a exigência de lei federal específica para a concessão de subsídio ou isenção, redução da base de cálculo, concessão de crédito presumido, anistia ou remissão, de que trata o art. 150, § 6º, da CF/88, tem lugar nas hipóteses em que a incidência de determinado tributo é a regra aplicável. Contudo, não é esse o caso, uma vez que a própria Constituição se adiantou em assegurar a isenção relativamente à Zona Franca de Manaus. Se a incidência do tributo for a regra, a Carta Magna exige a observância de um procedimento por meio de lei específica. Todavia, tal procedimento não tem lugar quando a própria CF exclui determinada hipótese da regra geral. A situação ora apresentada, portanto, está fora do alcance da norma inserta no referido dispositivo constitucional.

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ISSQN É inconstitucional lei municipal que crie restrições não previstas no art. 9º, §1º, do DL 406/68

para que sociedades de advogados tenham direito ao regime do ISSQN Fixo

É inconstitucional lei municipal que estabelece impeditivos à submissão de sociedades profissionais de advogados ao regime de tributação fixa em bases anuais na forma estabelecida por lei nacional.

STF. Plenário. RE 940769/RS, Rel. Edson Fachin, julgado em 24/4/2019 (repercussão geral) (Info 938).

ISSQN O ISSQN significa Imposto Sobre Serviços de Qualquer Natureza. Algumas vezes, você encontrará apenas a sigla ISS. É a mesma coisa. Trata-se de um tributo de competência dos Municípios. Em âmbito nacional, o ISSQN é disciplinado pela LC 116/2003, que estabelece suas normas gerais. Vale ressaltar, no entanto, que cada Município, para cobrar este imposto, precisa editar uma lei ordinária municipal tratando sobre o assunto. Esta lei local, obviamente, não pode contrariar a LC 116/2003 e nem prever serviços que não estejam expressos na lei federal. Fato gerador O ISSQN incide sobre a prestação dos serviços listados no anexo da LC 116/2003. Confira o texto constitucional:

Art. 156. Compete aos Municípios instituir impostos sobre: III - serviços de qualquer natureza, não compreendidos no art. 155, II, definidos em lei complementar. (...) § 3º Em relação ao imposto previsto no inciso III do caput deste artigo, cabe à lei complementar: I - fixar as suas alíquotas máximas e mínimas; II - excluir da sua incidência exportações de serviços para o exterior; III - regular a forma e as condições como isenções, incentivos e benefícios fiscais serão concedidos e revogados.

Veja agora o que diz o art. 1º da LC 116/2003:

Art. 1º O Imposto Sobre Serviços de Qualquer Natureza, de competência dos Municípios e do Distrito Federal, tem como fato gerador a prestação de serviços constantes da lista anexa, ainda que esses não se constituam como atividade preponderante do prestador.

Exemplos: quando o médico atende o paciente em uma consulta, ele presta um serviço, sendo isso fato gerador do ISSQN; quando o cabeleireiro faz uma escova progressiva na cliente, ele também presta um serviço e deverá pagar ISSQN. Todos os serviços que estão sujeitos ao pagamento de ISSQN encontram-se previstos na lista anexa à LC 116/2003. Se não estiver nesta lista, não é fato gerador deste imposto. Vale ressaltar que esta lista é taxativa (exaustiva). As sociedades profissionais de advogados, quando prestam seus serviços, devem pagar ISS? SIM. A LC 116/2003 estabelece que as sociedades profissionais de advogados deverão pagar ISS, considerando que o serviço de advocacia se encontra previsto no item 17.14 da lista anexa:

17 – Serviços de apoio técnico, administrativo, jurídico, contábil, comercial e congêneres.

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(...) 17.14 – Advocacia.

Regime especial de tributação do ISS previsto no DL 406/68 A regra geral é que a base de cálculo do ISS é o preço do serviço (art. 7º da LC 116/2003). O § 1º do art. 9º do Decreto-Lei nº 406/68, no entanto, traz uma exceção a essa regra e prevê que os contribuintes que prestam serviço sob a forma de trabalho pessoal (pessoas físicas) têm direito ao regime do chamado “ISSQN Fixo”, segundo o qual é fixada uma alíquota sem relação com o preço do serviço. Vejamos o que diz o DL nº 406/68:

Art. 9º A base de cálculo do imposto é o preço do serviço. § 1º Quando se tratar de prestação de serviços sob a forma de trabalho pessoal do próprio contribuinte, o imposto será calculado, por meio de alíquotas fixas ou variáveis, em função da natureza do serviço ou de outros fatores pertinentes, nestes não compreendida a importância paga a título de remuneração do próprio trabalho. (...)

O regime do ISSQN Fixo, em geral, é mais vantajoso para o contribuinte que, na prática, acaba pagando menos. Recepcionada pela CF/88 O STF entende que essa forma especial (diferenciada) de tributação foi recepcionada pela CF/88, considerando que ela tem por objetivo concretizar a isonomia e a capacidade contributiva:

Súmula 663-STF: Os §§ 1º e 3º do art. 9º do DL 406/68 foram recebidos pela Constituição.

Status de lei complementar Vale ressaltar que, segundo o STF, o DL 406/68 foi recepcionado pelo atual ordenamento constitucional com status de lei complementar nacional, nos termos do art. 146, III, “a”, da CF/88:

Art. 146. Cabe à lei complementar: (...) III - estabelecer normas gerais em matéria de legislação tributária, especialmente sobre: a) definição de tributos e de suas espécies, bem como, em relação aos impostos discriminados nesta Constituição, a dos respectivos fatos geradores, bases de cálculo e contribuintes;

O DL 406/68 foi recepcionado pela Constituição como norma tributária de caráter geral. Em se tratando de norma de status de Lei Complementar, tem vigência sobre todo território nacional, não havendo que se falar em isenção heterônoma na espécie. STF. 1ª Turma. RE 600192 AgR-segundo, Rel. Min. Roberto Barroso, julgado em 15/03/2016.

O DL 406/68 regulamentava o imposto sobre serviços. Ocorre que, posteriormente, foi editada a LC 116/2003 com o objetivo de disciplinar o ISS, substituindo o DL 406/68. Diante disso, indaga-se: o § 1º do art. 9º do DL 406/68 ainda está em vigor? SIM. A LC 116/2003, em seu art. 10, revogou expressamente apenas os arts. 8º, 10, 11 e 12 do DL 406/68, mantendo, a contrario sensu, a vigência do art. 9º. De igual sorte, não houve revogação tácita, considerando que LC 116/2003 não tratou inteiramente da matéria prevista no § 1º do art. 9º do DL. Essa é a opinião da doutrina e da jurisprudência:

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O art. 9º, §§ 1º e 3º, do DL 406/68, que dispõe acerca da incidência de ISS sobre as sociedades civis uniprofissionais, não foi revogado, expressa ou tacitamente, pelo art. 10 da LC 116/03. STJ. 2ª Turma. AgRg no Ag 1229678/MG, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, julgado em 19/08/2010.

Não há redução da base de cálculo, mas apenas uma forma de tributação diferente As normas inscritas nos §§ 1º e 3º, do art. 9º do DL 406/68 não implicam redução da base de cálculo do ISS. Elas simplesmente disciplinam base de cálculo de serviços distintos. STF. 1ª Turma. RE 277806, Rel. Min. Moreira Alves, julgado em 10/10/2000. Serviço em caráter personalíssimo e sem intuito empresarial O benefício da alíquota fixa do ISS somente é devido às sociedades uni ou pluriprofissionais que prestam serviço em caráter personalíssimo sem intuito empresarial. O que define uma sociedade como empresária ou simples é o seu objeto social, e não a forma societária. No caso de sociedades formadas por profissionais intelectuais, cujo objeto social é a exploração da respectiva profissão intelectual dos seus sócios, são, em regra, sociedade simples, uma vez que nelas faltará o requisito da organização dos fatores de produção, elemento próprio da sociedade empresária. STJ. 1ª Turma. AgInt no AREsp 1226637/SP, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, julgado em 23/10/2018. As sociedades de advogados possuem direito ao regime do ISSQN Fixo? SIM. A jurisprudência do STJ firmou o entendimento de que as sociedades de advogados, que não possuem natureza mercantil e são uniprofissionais, gozam do tratamento tributário diferenciado previsto no art. 9º, §§ 1º e 3º, do Decreto-Lei 406/1968, não recolhendo o ISS com base no seu faturamento bruto, mas sim no valor fixo anual calculado de acordo com o número de profissionais que as integram. STJ. 2ª Turma. REsp 1740420/PR, Rel. Min. Herman Benjamin, julgado em 12/06/2018. Legislação municipal que cria restrições para que sociedades de advogados tenham direito ao regime do ISSQN Fixo O Município de Porto Alegre (RS) editou lei complementar e decreto criando restrições para que as sociedades de advogados pudessem ter direito ao regime do ISSQN Fixo. Nesse sentido, veja o que diz o inciso II do §4º do art. 20 da LC municipal 07/1973, com a redação da LC Municipal 501/2003:

Art. 20. A base de cálculo do imposto é o preço do serviço. (...) § 3º Quando os serviços a que se referem às alíneas abaixo forem prestados por sociedades, independentemente do número de funcionários que possuírem, essas ficarão sujeitas ao imposto na forma do parágrafo anterior, calculado em relação a cada profissional habilitado, sócio, empregado ou não, que preste serviços em nome da sociedade, embora assumindo responsabilidade pessoal, nos termos da lei aplicável: (...) l) Advogados; (...) § 4º Para fins do parágrafo anterior, considera-se sociedades de profissionais aquelas: (...) II - em que, relativamente à execução de sua atividade-fim, não ocorra a participação de pessoa jurídica ou de pessoa física inabilitada;

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Desse modo, a lei complementar do Município de Porto Alegre previu que somente poderia ser utilizado o regime do ISSQN Fixo nas hipóteses em que a execução da atividade-fim não ocorra com participação de pessoa jurídica ou de pessoa física inabilitada ao exercício da advocacia. Ademais, utilizou-se, como base de cálculo, a importância paga a título de remuneração pelo trabalho do próprio contribuinte. Com isso, a lei municipal reduziu o âmbito de incidência do art. 9º, §§ 1º e 3º, do DL 406/68. Essa legislação municipal é constitucional? NÃO.

É inconstitucional lei municipal que estabelece impeditivos à submissão de sociedades profissionais de advogados ao regime de tributação fixa em bases anuais na forma estabelecida por lei nacional. STF. Plenário. RE 940769/RS, Rel. Edson Fachin, julgado em 24/4/2019 (repercussão geral) (Info 938).

Conforme já explicado, o art. 9º, §1º, do DL 406/68 possui status de lei complementar nacional e somente poderá ser alterado por lei complementar nacional. A legislação municipal que traz restrições ao art. 9º, §1º, do DL 406/68 viola o art. 146, III, “a”, da CF/88.

DIREITO FINANCEIRO

ORÇAMENTO LC federal deve fixar os valores mínimos a serem aplicados anualmente pela União, Estados, Distrito Federal e Municípios em ações e serviços públicos de saúde, não podendo norma de

Constituição estadual ou lei orgânica prever esses percentuais

A LC federal 141/2012 fixa os valores mínimos a serem aplicados anualmente pela União, Estados, Distrito Federal e Municípios em ações e serviços públicos de saúde.

O art. 11 desta Lei estabelece que as Constituições dos Estados ou as Leis Orgânicas dos Municípios podem fixar valores mais altos do que o previsto na LC 141/2012 de repasses em prol da saúde.

O STF julgou inconstitucional esse art. 11 da LC 141/2012 porque, segundo o art. 198, § 3º, I, da CF/88, os percentuais mínimos que os Estados, DF e Municípios são obrigados a aplicar na saúde devem estar previstos em lei complementar federal editada pelo Congresso Nacional, não podendo isso ser delegado para os Estados/DF e Municípios.

Além disso, o STF afirmou que são inconstitucionais normas da Constituição Estadual que prevejam percentuais de aplicação mínima na saúde em patamares diferentes daquele fixado pela Lei complementar federal.

STF. Plenário. ADI 5897/SC, Rel. Min. Luz Fux, julgado em 24/4/2019 (Info 938).

Art. 198, § 3º, da CF/88 O art. 198 da CF/88 trata sobre o sistema único de saúde (SUS). O § 2º do art. 198 prevê percentuais mínimos que os entes públicos deverão aplicar na saúde:

Art. 198 (...) § 2º A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios aplicarão, anualmente, em ações e serviços públicos de saúde recursos mínimos derivados da aplicação de percentuais calculados sobre:

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I - no caso da União, a receita corrente líquida do respectivo exercício financeiro, não podendo ser inferior a 15% (quinze por cento); II – no caso dos Estados e do Distrito Federal, o produto da arrecadação dos impostos a que se refere o art. 155 e dos recursos de que tratam os arts. 157 e 159, inciso I, alínea a, e inciso II, deduzidas as parcelas que forem transferidas aos respectivos Municípios; III – no caso dos Municípios e do Distrito Federal, o produto da arrecadação dos impostos a que se refere o art. 156 e dos recursos de que tratam os arts. 158 e 159, inciso I, alínea b e § 3º.

O § 3º, por sua vez, determina que seja editada uma lei complementar federal estabelecendo algumas regras sobre o custeio do SUS. Uma das regras que deve ser estabelecida são os percentuais que deverão ser investidos pelos Estados e DF na saúde. Isso foi determinado pelo inciso I do § 3º do art. 198:

§ 3º Lei complementar, que será reavaliada pelo menos a cada cinco anos, estabelecerá: I - os percentuais de que tratam os incisos II e III do § 2º; (...)

Lei complementar federal 141/2012 A fim de regulamentar o § 3º do art. 198 da CF/88, o Congresso Nacional editou a LC 141/2012 que, dentre outros assuntos, dispõe sobre os valores mínimos a serem aplicados anualmente pela União, Estados, Distrito Federal e Municípios em ações e serviços públicos de saúde. Veja o que diz o art. 11 da LC 141/2012:

Art. 11. Os Estados, o Distrito Federal e os Municípios deverão observar o disposto nas respectivas Constituições ou Leis Orgânicas sempre que os percentuais nelas estabelecidos forem superiores aos fixados nesta Lei Complementar para aplicação em ações e serviços públicos de saúde.

Desse modo, o art. 11 falou o seguinte: esta LC 141/2012 prevê percentuais mínimos a serem aplicados pelos Estados, DF e Municípios. No entanto, as Constituições dos Estados ou as Leis Orgânicas dos Municípios podem fixar valores mais altos de repasses em prol da saúde. Se tais normas estaduais ou municipais fizerem isso, elas é que deverão ser observadas (e não os percentuais mais baixos da LC). Emenda 72/2016 alterando a CE/SC Em 2016, a Assembleia Legislativa do Estado de Santa Catarina editou a Emenda Constitucional 72, que alterou o art. 155 da CE/SC e o art. 50 do ADCT da CE/SC. Confira a redação modificada:

Art. 155. (...) (...) § 2º O Estado e os Municípios anualmente aplicarão em ações e serviços de saúde, no mínimo, 15% (quinze por cento), calculados: I - no caso dos Municípios, sobre o produto da arrecadação dos impostos a que se refere o art. 156 e dos recursos de que tratam os arts. 158 e 159, inciso I, alínea “b” e § 3º, todos da Constituição Federal; e II - no caso do Estado, sobre o produto da arrecadação dos impostos a que se refere o art. 155 e dos recursos de que tratam os arts. 157 e 159, inciso I, alínea “a” e inciso II, todos da Constituição Federal, observado o disposto no art. 50 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT). § 3º Lei Complementar federal estabelecerá as normas de fiscalização, avaliação e controle das despesas com saúde nas esferas estadual e municipal.

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§ 4º Os montantes a que se referem os incisos I e II do § 2º, serão aplicados por meio do Fundo Estadual de Saúde, sob acompanhamento e fiscalização do Conselho Estadual de Saúde, sem prejuízo do disposto no art. 62.

Art. 50. A aplicação mínima a que se refere o art. 155, § 2º, inciso II, da Constituição do Estado, em ações e serviços públicos de saúde, será gradativamente implementada até o exercício fiscal de 2019, observado que: I - no exercício fiscal de 2017 serão aplicados 13% (treze por cento); II - no exercício fiscal de 2018 serão aplicados 14% (quatorze por cento); III - no exercício fiscal de 2019 serão aplicados 15% (quinze por cento).

Vale ressaltar que o percentual do § 2º do art. 155 da CE/SC (15%) é maior do que o previsto na LC 141/2012 (12%). ADI O Governador do Estado de Santa Catarina ajuizou ADI contra a Emenda Constitucional 72 alegando, dentre outros argumentos, que: • os percentuais mínimos que os Estados, DF e Municípios devem aplicar na saúde devem estar previstos em lei complementar federal editada pelo Congresso Nacional. Foi isso que a CF/88 ordenou no inciso I do § 3º do art. 198; • o art. 11 da LC 141/2012 não poderia ter dito que os Estados, DF e Municípios podem estabelecer percentuais diferentes daqueles fixados pela LC. Este artigo delegou indevidamente uma atribuição que a CF/88 conferiu ao Congresso Nacional; • o art. 155, § 2º, da CE/SC e o art. 50 do ADCT da CE/SC, ao fixarem percentuais mínimos diferentes daqueles previstos na LC federal, violaram o comando constitucional do inciso I do § 3º do art. 198; • em suma, os percentuais mínimos de aplicação em serviços de saúde somente podem ser fixados em lei complementar federal, não sendo válida a sua previsão em normas estaduais ou municipais; • vale ressaltar, ainda, que a EC estadual nº 72/2016 foi de iniciativa parlamentar, o que também violaria o art. 61, § 1º, II, da CF/88. A tese do Governador do Estado foi acolhida pelo STF? SIM. O STF, por maioria, julgou procedente a ADI e declarou a inconstitucionalidade forma e material: • do art. 11 da Lei Complementar federal nº 141/2012; • do art. 155 da Constituição do Estado de Santa Catarina, na redação dada pela Emenda Constitucional estadual nº 72/2016; e • do caput e inciso III do art. 50 do ADCT da CE/SC, também com a redação conferida pela EC estadual 72/2016. Os incisos I e II do art. 50 do ADCT da CE/SC não foram declarados inconstitucionais porque se referem a 2017 e 2018 e os orçamentos desses anos já haviam sido executados quando do julgamento da ADI (2019). Iniciativa reservada ao Executivo O art. 165 da CF/88 reserva ao Poder Executivo a iniciativa das leis que estabelecem o plano plurianual, as diretrizes orçamentárias e os orçamentos anuais:

Art. 165. Leis de iniciativa do Poder Executivo estabelecerão: I - o plano plurianual; II - as diretrizes orçamentárias; III - os orçamentos anuais.

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Informativo 938-STF (03/05/2019) – Márcio André Lopes Cavalcante | 18

Esse artigo está relacionado diretamente com o princípio da separação dos Poderes e é considerado como uma norma de observância obrigatória pelos demais entes federados. Isso significa que, em âmbito estadual, a iniciativa das leis que tratam sobre orçamento também é do chefe do Poder Executivo (no caso, o Governador do Estado). Logo, a EC estadual nº 72/2016 ao fixar, na CE/SC, um percentual mínimo de aplicação dos recursos na saúde, engessou o Poder Executivo estadual, subtraindo do Governador do Estado a possibilidade de manifestação quanto a esta matéria.

Delegação indevida O Congresso Nacional recebeu uma delegação do Poder constituinte. O art. 11 da LC federal 141/2012, ao atribuir à CE ou à lei orgânica, a competência legislativa para fixar outros percentuais de aplicação na saúde, violou o comando do art. 198, § 3º, I, da CF/88. O caráter irrestrito da possibilidade de aumento dos percentuais mínimos pelos entes federados, autorizada pelo art. 11 da LC 141/2012, atribui às assembleias estaduais e câmaras de vereadores o poder ilimitado de vincular quaisquer recursos, distorcendo o processo legislativo orçamentário insculpido no art. 165 da CF/88. A alocação de recursos orçamentários em montante superior aos percentuais mínimos instituídos constitucionalmente cabe aos poderes eleitos, nos limites de sua responsabilidade fiscal e em cada exercício.

Violação aos arts. 165, 167, IV e 198, § 3º, I, da CF/88 A EC estadual 72/2016, ao fixar percentuais que excedem aqueles previstos na LC federal nº 141/2012, instituiu uma vinculação orçamentária não autorizada pela Constituição Federal, o que viola os arts. 165, 167, IV e 198, § 3º, I:

Art. 167. São vedados: (...) IV - a vinculação de receita de impostos a órgão, fundo ou despesa, ressalvadas a repartição do produto da arrecadação dos impostos a que se referem os arts. 158 e 159, a destinação de recursos para as ações e serviços públicos de saúde, para manutenção e desenvolvimento do ensino e para realização de atividades da administração tributária, como determinado, respectivamente, pelos arts. 198, § 2º, 212 e 37, XXII, e a prestação de garantias às operações de crédito por antecipação de receita, previstas no art. 165, § 8º, bem como o disposto no § 4º deste artigo;

EXERCÍCIOS

Julgue os itens a seguir: 1) (Juiz TJ/CE 2018 CESPE) A reincidência do acusado não é motivo suficiente para afastar a aplicação do princípio da insignificância.

( ) 2) Na hipótese de o juiz da causa considerar penal ou socialmente indesejável a aplicação do princípio da insignificância por furto,

em situações em que tal enquadramento seja cogitável, eventual sanção privativa de liberdade deverá ser fixada, como regra geral, em regime inicial aberto, paralisando-se a incidência do art. 33, § 2º, c, do CP no caso concreto, com base no princípio da proporcionalidade. ( )

3) Na reclamação fundada no descumprimento de decisão emanada pelo STF, o ato alvo de controle deve ser anterior ao paradigma. ( )

4) (MP/PI 2019 CESPE) Do ato administrativo que contrariar a súmula vinculante, ou que indevidamente a aplicar, caberá reclamação ao Conselho Nacional de Justiça. ( )

5) Não há direito ao creditamento de Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) na entrada de insumos, matéria-prima e material de embalagem adquiridos junto à Zona Franca de Manaus sob o regime da isenção. ( )

6) É inconstitucional lei municipal que estabelece impeditivos à submissão de sociedades profissionais de advogados ao regime de tributação fixa em bases anuais na forma estabelecida por lei nacional. ( )

Gabarito

1. C 2. C 3. E 4. E 5. E 6. C